Dissertação Contabilidade Gerencial

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Dissertação de Mestrado: O desenvolvimento da contabilidade gerencial nas empresas: uma perspectiva de ciclo de vida

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  • 1. UNIVERSIDADE DE SO PAULO FACULDADE DE ECONOMIA, ADMINISTRAO E CONTABILIDADEDEPARTAMENTO DE CONTABILIDADE E ATURIAPROGRAMA DE PS-GRADUAO EM CINCIAS CONTBEIS O DESENVOLVIMENTO DA CONTABILIDADE GERENCIAL NAS EMPRESAS:UMA PERSPECTIVA DE CICLO DE VIDAGeorge Anthony NecykOrientador: Prof. Dr. Fbio FrezattiSO PAULO2008

2. Profa. Dra. Suely VilelaReitora da Universidade de So Paulo Prof. Dr. Carlos Roberto Azzoni Diretor da Faculdade de Economia. Administrao e Contabilidade Prof. Dr. Fbio FrezattiChefe do Departamento de Contabilidade e Atuaria Prof. Dr. Gilberto de Andrade Martins Coordenador do Programa de Ps-Graduao em Cincias Contbeis 3. GEORGE ANTHONY NECYK O DESENVOLVIMENTO DA CONTABILIDADE GERENCIAL NAS EMPRESAS:UMA PERSPECTIVA DE CICLO DE VIDADissertao apresentada ao Departamento deContabilidade e Aturia, da Faculdade deEconomia, Administrao e Contabilidade daUniversidade de So Paulo como requisitopara a obteno do ttulo de Mestre emCincias Contbeis.Orientador: Prof. Dr. Fbio FrezattiSO PAULO2008 4. Dissertao defendida e aprovada no Departamento de Contabilidade e Aturia da Faculdade de Economia, Administrao e Contabilidade da Universidade de So Paulo Programa de Ps-Graduao em Cincias Contbeis, pela seguinte banca examinadora: FICHA CATALOGRFICA Elaborada pela Seo de Processamento Tcnico do SBD/FEA/USP Necyk, George Anthony O desenvolvimento da contabilidade gerencial nas empresas: uma pers- pectiva de ciclo de vida / George Anthony Necyk. -- So Paulo, 2008. 187 p. Dissertao (Mestrado) Universidade de So Paulo, 2008 Bibliografia. 1. Contabilidade gerencial 2. Ciclo de vida 3. Arqutipos I. Universi-dade de So Paulo. Faculdade de Economia, Administrao e Contabilidade 5. v Aos amados.Jerry J. Necyk (in memoriam), meu pai, Vilma Necyk, minha me, Mrcia Teresa Campos Necyk, minha esposa, Nicholas Campos Necyk eLucas Campos Necyk, meus filhos. 6. vi AgradeoA Deus cuja providncia nos faculta a vida e todas as suas realizaes.Aos meus pais, pelo amor e confiana que sempre depositaram em mim, pela inspirao de buscar sempre o certo e de aprender continuamente com a vida. minha esposa e filhos cujo carinho e compreenso para com o tempo que me exigiram os estudos mantiveram meu nimo e determinao ao longo de todo o tempo.A Alice, Ricardo, Otvio, Osvaldo, Tom e Bosco, sem cuja generosidade, confiana e interesse este trabalho no teria sido possvel. Gostaria de registrar o sentimento de reverncia, como por algo sagrado, que tive diante do relato da histria da empresa, com a qual, sei, se confunde a histria de suas prprias vidas, e que me foi narrada de forma to desprendida e com tanta paixo.Ao Professor Doutor Fbio Frezatti, meu orientador, pelo entusiasmo, pela disponibilidade constante, pelo estmulo liberdade de pensamento que fizeram desta jornada um aprendizado constante, instigante e leve.Ao Professor Doutor Gilberto A. Martins por suas contribuies metodolgicas a este trabalho, incentivando sempre a expanso dos meios de desenvolvimento e de disseminao do conhecimento.A todos os professores da Faculdade de Economia, Administrao e Contabilidade da Universidade de So Paulo, com quem tive o privilgio de conviver como aluno no Programa de Ps-Graduao em Cincias Contbeis: Doutores L. Nelson G. Carvalho, Gilberto A. Martins, Ariovaldo dos Santos, Geraldo Barbieri, Reinaldo Guerreiro, Luiz Joo Corrar, Eliseu Martins, Fbio Frezatti, Carlos Alberto Pereira e Welington Rocha.A todos os colegas da ps-graduao com quem repartimos nossas ansiedades e expectativas, pelo apoio, incentivo e companheirismo, por terem contribudo para o ambiente de cooperao estimulante e saudvel, fundamental para o avano do conhecimento. 7. vii A vida s se compreende mediante um retorno ao passado,mas s se vive para dianteSoren Kierkegaard 8. viii RESUMO Este trabalho teve como objetivo ampliar o entendimento de como a Contabilidade Gerencial se desenvolve ao longo do tempo em uma organizao, tomando como base um modelo de estgios de ciclo de vida. Pressupe-se que, em cada estgio de ciclo de vida, a organizao assume caractersticas particulares e tem necessidades de informaes especficas, o que impacta em suas prticas contbeis gerenciais. O modelo de ciclo de vida de Miller e Friesen (1984), para organizaes em geral, e o trabalho de Moores e Yuen (2001), que o aplicou ao estudo da Contabilidade Gerencial, ambos baseados na Teoria da Configurao, formam o principal referencial terico deste trabalho. A estratgia de pesquisa utilizada foi a de um estudo de caso nico, que se justifica pela complexidade do tema e pela abordagem longitudinal retrospectiva. A empresa objeto deste estudo foi uma indstria de transformao com mais de 40 anos de idade. O horizonte de anlise compreendeu o intervalo da histria da empresa que iniciava de 1994 e findava em 2006, o momento presente, conforme os relatos dos profissionais da empresa selecionados como participantes da pesquisa. De um modo geral, as caractersticas observadas nos perodos identificados foram compatveis com a descrio dos estgios correspondentes no referencial terico. Foi possvel constatar como a evoluo dos estgios de ciclo de vida afeta o desenvolvimento da Contabilidade Gerencial dentro do mesmo estgio e na transio entre estgios distintos. Observou-se que o processo de transio no necessariamente linear, em que o novo estgio se estabelece e da os atributos de Contabilidade Gerencial so alterados. As evidncias coletadas permitiram suportar as proposies nos estudos de Miller e Friesen (1984), mas apenas parcialmente aquelas derivadas do trabalho de Moores e Yuen (2001), j que nem todos os estgios de ciclo de vida puderam ser observados, neste caso. O trabalho conclui com sugestes para estudos futuros, na expectativa de que se continue ampliando o entendimento do tema do desenvolvimento da Contabilidade Gerencial. 9. ixABSTRACT The objective of this work was to expand the understanding of how Management Accounting develops through time in an organization, taking a life cycle stage model as reference. It is assumed that, in each life-cycle stage, the organization takes in particular characteristics and has specific information needs, which impacts its management accounting practices. Miller and Friesen (1984) life cycle model, for organizations in general, and Moores and Yuen (2001) work, that applied it to the study of Management Accounting, both based on Configuration Theory, are the main theoretical references of this work. A single case study research strategy was utilized, justified by the complexity of the theme and by a retrospective longitudinal approach. The subject of this study was a manufacturing company of over 40 years of age. The analyzed time horizon comprised a span of company history that started in 1994 and ended in 2006, the current period, in accordance to the interviews with the company professionals that were selected as participants of this research. In general terms, the observed characteristics in the identified periods were compatible with the corresponding life cycle stages descriptions as found in the referenced theory. It was possible to verify how life cycle stage evolution affects Management Accounting development within the same stage and in the transition between distinct stages. It was observed that the transition process is not necessarily linear, where a new stage establishes itself and then Management Accounting attributes are changed. The gathered evidences allowed the support of the propositions based on the Miller and Friesen (1984) studies, but only partially of those derived from the Moores and Yuen (2001) work, since not every life cycle stage was observed in this case. This work concludes with suggestions for future studies, hoping that the understanding of the Management Accounting development subject continues to grow. 10. x 11. 1 SUMRIO 1INTRODUO ..............................................................................................................5 1.1 Caracterizao do problema ............................................................................................51.1.1 O tema ....................................................................................................................51.1.2 A Teoria Neoclssica ..............................................................................................61.1.3 A Teoria da Contingncia........................................................................................71.1.4 A Teoria Institucional .............................................................................................81.1.5 Ciclo de Vida ........................................................................................................ 10 1.2 Questo de pesquisa ......................................................................................................11 1.3 Objetivos..... .................................................................................................................12 1.4 Justificativas .................................................................................................................13 1.5 Proposies...................................................................................................................14 1.6 Estrutura do trabalho.....................................................................................................152REFERENCIAL TERICO .........................................................................................19 2.1 Modelos de Ciclo de Vida .............................................................................................192.1.1 Modelos de Desenvolvimento ............................................................................... 192.1.2 Retrospectiva dos modelos de ciclo de vida ........................................................... 242.1.3 Crticas aos modelos de ciclo de vida .................................................................... 27 2.2 O Modelo de Ciclo de Vida de Miller e Friesen ............................................................29 2.3 Teoria da Configurao.................................................................................................362.3.1 Aspectos Gerais .................................................................................................... 362.3.2 Paralelo com a Teoria da Contingncia ................................................................. 392.3.3 Paralelo com as Teorias Institucionais ................................................................... 41 2.4 Contabilidade Gerencial e Ciclo de Vida.......................................................................483ASPECTOS METODOLGICOS ................................................................................53 3.1 Estratgia de Pesquisa ...................................................................................................53 3.2 Abordagem.. .................................................................................................................54 3.3 Fontes de evidncia.......................................................................................................57 3.4 Mtodos de coleta de dados ..........................................................................................583.4.1 Documentao ...................................................................................................... 583.4.2 Questionrio ......................................................................................................... 583.4.3 Registro em arquivos ............................................................................................ 593.4.4 Artefatos ............................................................................................................... 603.4.5 Entrevista .............................................................................................................. 603.4.5.1 Entrevistas em profundidade .........................................................................603.4.5.2 Histria oral ..................................................................................................623.4.5.3 Incidentes crticos..........................................................................................633.4.5.4 Sntese das tcnicas de entrevista ...................................................................65 3.5 Mtodos de anlise .......................................................................................................66 12. 2 3.6 Protocolo..... .................................................................................................................693.6.1 Viso Geral ........................................................................................................... 693.6.2 Procedimentos de campo ....................................................................................... 703.6.2.1 Entrevista preliminar .....................................................................................713.6.2.2 Primeira Entrevista Situao Atual .............................................................723.6.2.3 Segunda Entrevista Incidentes Crticos .......................................................723.6.2.4 Terceira Entrevista Mudanas .....................................................................723.6.3 Questes do Estudo de Caso.................................................................................. 733.6.4 Guia para o relatrio ............................................................................................. 75 3.7 Validade e Confiabilidade .............................................................................................764RELATRIO DO ESTUDO DE CASO .......................................................................79 4.1 A empresa.... .................................................................................................................79 4.2 Anlise da situao atual ...............................................................................................814.2.1 Anlise quantitativa do questionrio...................................................................... 824.2.2 Anlise qualitativa do questionrio........................................................................ 864.2.2.1 Contexto Organizacional ...............................................................................864.2.2.2 Estratgias .....................................................................................................884.2.2.3 Caractersticas Estruturais .............................................................................894.2.2.4 Estilo de Tomada de Deciso.........................................................................924.2.2.5 Contabilidade Gerencial ................................................................................934.2.3 Resumo da anlise da situao atual ...................................................................... 96 4.3 Anlise dos estgios de ciclo de vida ............................................................................984.3.1 O diagrama de eventos crticos .............................................................................. 994.3.2 Anlise individual dos estgios do ciclo de vida .................................................. 1034.3.2.1 Perodo pr-1994 ......................................................................................... 1034.3.2.2 Perodo de 1994 a 1998 ............................................................................... 1044.3.2.3 Perodo de 1998 a 2001 ............................................................................... 1064.3.2.4 Perodo de 2001 a 2005 ............................................................................... 1084.3.2.5 Perodo de 2005 em diante .......................................................................... 1124.3.3 Anlise conjunta dos estgios do ciclo de vida .................................................... 1144.3.4 Resumo da anlise dos estgios do ciclo de vida ................................................. 118 4.4 Anlise das mudanas na Contabilidade Gerencial ...................................................... 1194.4.1 Dinmica externa ................................................................................................ 1194.4.2 Dinmica interna ................................................................................................. 1214.4.3 Resumo da anlise das mudanas na Contabilidade Gerencial ............................. 124 4.5 Reviso das proposies do estudo de caso ................................................................. 1255CONCLUSES .......................................................................................................... 131REFERNCIAS ................................................................................................................. 137APNDICES...................................................................................................................... 145ANEXOS .......................................................................................................................... 171 170 13. 3 LISTA DE FIGURAS Figura 1 Ilustrao dos conceitos de evento, mudana, processo e desenvolvimento. .........20 Figura 2 Tipologia dos tipos-bsicos de teorias de desenvolvimento ..................................23 Figura 3 Evoluo e revoluo ...........................................................................................26 Figura 4 Abordagem evolutiva das organizaes ...............................................................29 Figura 5 O constructo de estgios de ciclo de vida .............................................................34 Figura 6 Relacionamento entre contexto, estrutura e desempenho ......................................41 Figura 7 Mudana organizacional segundo Greenwood e Hinings......................................44 Figura 8 Modelo do estudo de Moores e Yuen ...................................................................49 Figura 9 Fontes e tipos de evidncias .................................................................................58 Figura 10 Viso Geral do Estudo .......................................................................................70 Figura 11 Composio acionria da empresa. ....................................................................79 Figura 12 Organograma da empresa...................................................................................80 Figura 13 Diagrama de eventos crticos (1. Parte) ........................................................... 101 Figura 14 Diagrama de eventos crticos (2. Parte) ........................................................... 102 14. 4 15. 5 1 INTRODUO 1.1Caracterizao do problema 1.1.1 O tema A Contabilidade Gerencial o ramo das Cincias Contbeis que se ocupa das necessidades de informao dos gestores ou, genericamente, dos usurios internos das organizaes. A Contabilidade Gerencial subsidia com informaes o processo de gesto das empresas, contribuindo para o controle gerencial, isto , o atingimento dos objetivos estratgicos estabelecidos pela Direo do negcio. (ANTHONY; GOVINDARAJAN, 2000, p. 6). Diferentemente da Contabilidade Financeira, voltada para o usurio externo, a Contabilidade Gerencial no est sujeita a marcos regulatrios e legais, portanto, as empresas tm um grau de liberdade maior na concepo e implementao de suas solues de Contabilidade Gerencial. Tal liberdade se reflete em uma variedade de perfis de Contabilidade Gerencial entre as empresas, conforme constatado em pesquisas empricas no Brasil e no mundo. (SCAPENS, 1984; FREZATTI, 2005; SOUTES, 2006). Mais intensamente aps o final da Segunda Guerra Mundial, estudiosos e pesquisadores do assunto utilizaram-se de vrias teorias para conceber solues e entender o processo de implementao de prticas contbeis gerenciais. A reviso das contribuies das principais teorias utilizadas no passado e no presente demonstra que, desde ento, houve uma nfase crescente nos aspectos relativos implementao de prticas contbeis gerenciais e, mais recentemente, sobre o desenvolvimento da Contabilidade Gerencial nas empresas. O processo de desenvolvimento, compreendido como uma sucesso de mudanas ao longo do tempo, abre a possibilidade para uma viso mais abrangente da concepo e da implementao de solues de Contabilidade Gerencial, ao deixar de se concentrar nas prticas adotadas em um momento especfico da histria ou na mudana provocada pela introduo de uma prtica em particular. Para a caracterizao do problema de desenvolvimento da Contabilidade Gerencial, tema deste trabalho, resumem-se, a seguir, as contribuies das principais correntes de estudo nesse 16. 6 perodo, a saber: a Teoria Neoclssica, a Teoria da Contingncia e a Teoria Institucional. O resumo foca, primordialmente, os pressupostos gerais e a perspectiva a respeito da mudana da Contabilidade Gerencial em cada uma dessas correntes e as limitaes dessas abordagens no entendimento de um processo de desenvolvimento. A perspectiva de estgios de ciclo de vida apresentada como uma alternativa nova para enderear algumas dessas limitaes. 1.1.2 A Teoria Neoclssica A pesquisa em Contabilidade Gerencial, at a dcada de 70 do sculo XX, enfatizou a busca das solues ideais para as necessidades de controle e de tomada de deciso (SCAPENS; ARNOLD, 1986, p. 80) das empresas. Como a Contabilidade s vezes considerada por alguns autores (SCAPENS; ARNOLD, 1986, p. 80) como um ramo aplicado da Economia, no surpreendente, portanto, que tenha sido influenciada pelos paradigmas econmicos. O paradigma neoclssico da firma, tradicionalmente, teve um papel central no desenvolvimento da Contabilidade Gerencial. As premissas de maximizao de lucro, mercados perfeitos e informao completa e correta esto por detrs de praticamente todas as prticas tradicionais de planejamento e controle: anlise de custo-volume-lucro, decises de mix de produtos, decises de investimento de capital, oramentos, custeio-padro, entre outros. Prescreviam-se, assim, as melhores prticas que as empresas em geral deveriam perseguir de modo a alcanar seus objetivos de maximizao do lucro. A Teoria Neoclssica da firma foi desenvolvida pelos economistas para prever o comportamento no nvel de mercados e setores industriais e no para explicar o comportamento de agentes dentro das empresas. (SCAPENS; ARNOLD, 1986, p. 83). No que tange a mudanas, essa teoria [...] est mais interessada em predizer resultados racionais ou timos, ao invs de explicar o desdobramento dos processos que conduzem de um estado de equilbrio a outro (BURNS; SCAPENS, 2000), ou seja, no h preocupao com o processo de mudana propriamente dito, que explicaria a progresso de um estado inicial para o estado ideal, prescrito pela teoria. Diante das restries s premissas neoclssicas, a partir dos anos 70 do sculo XX, comearam a surgir pesquisas em Contabilidade Gerencial utilizando-se de teorias 17. 7 organizacionais para estudar o desenvolvimento, a manuteno e a mudana das prticas contbeis gerenciais nas organizaes. (COVALESKI et al, 1996; CHENHALL; LANGFIELD-SMITH, 1999; BURNS; SCAPENS, 2000). Destacam-se duas correntes de contribuies: a Teoria da Contingncia e a Teoria Institucional. 1.1.3A Teoria da Contingncia A adoo da abordagem contingencial para o estudo da Contabilidade Gerencial representou um avano em relao perspectiva neoclssica vigente at ento, pois, embora ainda dentro de uma abordagem estritamente racional, admite a possibilidade de escolha de solues alternativas a depender do contexto externo ou interno da empresa. A premissa bsica a de que no h um sistema contbil universalmente apropriado que possa ser igualmente aplicado a todas as organizaes, em todas as circunstncias, assim, a abordagem contingencial deveria identificar aspectos especficos do sistema contbil associado com certas circunstncias identificadas e demonstrar um matching apropriado. (OTLEY, 1980, p. 413). Essa perspectiva enseja uma anlise funcionalista da organizao. (DENT, 1986, p. 149). Solues de estruturas e de processos gerenciais so avaliadas pelo grau de suas contribuies para o sucesso organizacional. Os decisores, a partir dos objetivos explicitados ou assumidos, analisam as alternativas de solues e definem as prticas mais adequadas s exigncias de seu contexto operacional, externo e interno. O relacionamento de fatores contingentes com atributos da organizao e da Contabilidade Gerencial foi intensamente estudado ao longo dos anos, abrangendo: caractersticas da informao (financeira/no-financeira,foco interno/externo, histrico/forecast), freqncia de relatrios, estilos de uso de oramentos, etc. Apesar da longa tradio acumulada no uso dessa abordagem, h crticas (OTLEY, 1980; FISHER, 1995; CHAPMAN, 1997; CHENHALL, 2003), especialmente a respeito do mtodo cross-sectional que utilizado na maioria dos estudos. Geralmente, os estudos cross-sectional tendem a associar fatores contingentes a caractersticas do sistema de Contabilidade Gerencial em um determinado momento do tempo, para um grande nmero de empresas, o que possibilita o uso de mtodos estatsticos e, conseqentemente, a tentativa de generalizao dos achados. No entendimento de Otley (1980, p. 424) e Fisher (1995, p. 45), estudos 18. 8 longitudinais, em que a interao das variveis ao longo do tempo pode ser observada, permitiriam melhor entendimento das relaes causais, indo alm da mera constatao das suas associaes. Dent (1986, p. 155) pondera que os tericos dessa escola no deram adequada ateno a respeito de como se d o processo de adaptao s contingncias. Em outras palavras, o processo de mudana, assim como na perspectiva da Teoria Neoclssica, ignorado. A alterao de uma contingncia deveria levar rapidamente a um novo estado compatvel com o novo contexto. Outra crtica diz respeito ao conceito de contingency fit (ou matching). A maior parte dos estudos aborda um conjunto restrito de variveis, muitas vezes, sem relacion-la ao desempenho da organizao. (DRAZIN; VAN DE VEN, 1985; SELTO et al, 1995; DONALDSON, 1999). A profuso de estudos desse tipo termina por oferecer uma viso fracionada da Contabilidade Gerencial. Otley (1980, p. 421) argumenta que a Contabilidade Gerencial parte de um sistema de controle gerencial mais amplo, o qual, por sua vez, faz parte de um pacote de controles organizacionais, no qual esto includos diversos aspectos do desenho da organizao. Conclui dizendo que impossvel separar o efeito de um sistema de Contabilidade Gerencial dos outros controles organizacionais (OTLEY, 1980, p. 422), pois agem dentro de um mesmo pacote, complementando um ao outro e, portanto, devem ser analisados e avaliados em conjunto. 1.1.4A Teoria Institucional Em meados da dcada de 80 do sculo XX, estudos empricos, como o de Scapens (1984), constataram que a realidade prtica da Contabilidade Gerencial, dentro das empresas, diferia daquilo que a teoria prescrevia como ideal. Outras pesquisas sobre o perfil da Contabilidade Gerencial foram realizadas desde ento, inclusive no Brasil (FREZATTI, 2005; SOUTES, 2006), constatando as mesmas diferenas. A pesquisa da Contabilidade Gerencial passou, ento, busca de teorias que pudessem explicar a diferena observada nas empresas. Se os instrumentos sugeridos pela teoria no fossem uma prescrio essencialmente incorreta, deveria haver razes que no a racionalidade econmica, de influncia equivalente ou maior, para justificar os perfis encontrados. 19. 9 Scapens (1994), depois de ter constatado o gap entre a teoria e a prtica, explorou um caminho de investigao atravs da abordagem institucional, em substituio ao paradigma neoclssico, como forma de entender como as mudanas se processavam. A Teoria Institucional revelou-se um terreno frtil de pesquisa com vrias escolas, acentuando aspectos ou perspectivas particulares do fenmeno. Mais adiante, Scapens e Burns (2000, p. 3) elaboraram um framework para explicar como ocorreria a mudana na Contabilidade Gerencial, considerando as prticas e os sistemas contbeis gerenciais como regras e rotinas institucionalizadas, seguindo as idias da escola OIE, Old Institutional Economics. As regras constituiriam as prticas formais, como definidas em manuais de procedimento, e as rotinas seriam as prticas realmente em uso. As mudanas nas prticas contbeis ocorreriam, assim, por meio de um processo de institucionalizao, que se inicia pelo estabelecimento de regras que, se assimiladas, so transformadas em rotinas, a ponto de serem aceitas sem questionamento (taken for granted), formando o senso comum. O processo de mudana poderia ser iniciado de maneira intencional e racional, como na deciso de adotar uma nova tcnica para melhorar a eficincia do negcio, mas sua implementao efetiva dependeria da resposta institucional, ou seja, da influncia das rotinas e instituies existentes. Portanto, pode haver resistncia quando h forte questionamento dos significados e valores prevalentes. Do embate entre novas regras e rotinas existentes, um outro conjunto adaptado poderia surgir. Mas, na ausncia de fortes presses externas, a tendncia seria manter os arranjos vigentes. Burns e Scapens (2000, p. 9) explicam que seu propsito foi descrever e explicar os conceitos analticos que podem ser usados em estudos de casos interpretativos de mudana da Contabilidade Gerencial. No tinham a pretenso de predizer resultados de processos individuais, nem criar bases para generalizaes estatsticas. Outra escola da Teoria Institucional, a NIS, New Intitutional Sociology, tambm tem sido referenciada para ampliar o entendimento de processos de mudana da Contabilidade Gerencial, especialmente quando a presso institucional advm de agentes fora do mbito organizacional estudado. Nesse caso, as organizaes adotariam certas prticas, incluindo as contbeis gerenciais, no necessariamente por racionalidade econmica, mas para se legitimarem perante seus stakeholders. (DIMAGGIO; POWEL, 1983). Os autores ressaltaram a tendncia homogeneizao entre as organizaes, que denominaram de isomorfismo, o qual foraria uma organizao a se parecer com as demais do seu grupo ou setor, submetidas 20. 10 s mesmas condies ambientais. DiMaggio e Powell (1983, p. 150) identificaram trs mecanismos de isomorfismo: 1)coercitivo, que deriva da influncia poltica e o problema da legitimidade (ex: agncias reguladoras, matrizes da corporao); 2)mimtico, que resulta de respostas-padro s incertezas (ex: benchmarking); 3)normativo, relacionado profissionalizao (ex: associao de classes). De um modo geral, as abordagens institucionais foram adotadas em estudos de caso que enfocam mudanas especficas da Contabilidade Gerencial, como a introduo de um novo conceito ou de uma nova tcnica. No entanto, as perspectivas institucionais, particularmente as baseadas na escola NIS, tm sido criticadas por pressuporem uma postura das organizaes tendente passividade nos processos de mudana e por enfatizar a inrcia organizacional. (OLIVER, 1991, p. 149; 1992; DONALDSON, 1995, p. 128; SCOTT, 2001, p. 181). 1.1.5Ciclo de Vida Muito recentemente, surgiram alguns estudos envolvendo estgios de ciclo de vida e Contabilidade Gerencial (MOORES; YUEN, 2001; GRANLUND; TAIPALEENMAKI, 2005; AUZAIR; LANGFIELD-SMITH, 2005; DAVILA, 2005), que trazem uma nova viso ao tema de desenvolvimento, mudana e manuteno das prticas contbeis gerenciais. Esses estudos utilizam a perspectiva de que as organizaes passam por estgios ao longo de suas vidas e cada estgio est associado a padres ambientais, estratgicos, estruturais e de tomada de deciso caractersticos. A Contabilidade Gerencial, que seria um aspecto integrante da estrutura organizacional, deveria assumir caractersticas distintas conforme as necessidades de informaes gerenciais de cada estgio do ciclo de vida. E, medida que a organizao se desenvolvesse ao longo dos estgios, a Contabilidade Gerencial mudaria para acompanhar as novas necessidades. No s haveria uma caracterizao abrangente das prticas em cada estgio, mas tambm, potencialmente, um entendimento integrado da dinmica das mudanas entre os estgios. Dos estudos citados acima, destaca-se o de Moores e Yuen (2001), alis referenciado por todos os demais que o sucederam. Nesse estudo, utilizou-se o modelo de ciclo de vida de Miller e Friesen (1980, 1984) em um estudo cross-sectional com uso de anlise multivariada 21. 11 de 49 empresas, complementado com entrevistas em 10 empresas selecionadas da amostra. s variveis que caracterizavam os estgios no modelo de ciclo de vida de Miller e Friesen (1984), Moores e Yuen (2001) associaram atributos relativos s caractersticas e s tcnicas de Contabilidade Gerencial. Constataram, principalmente, que o grau de formalizao das prticas contbeis influenciado pelo estgio de ciclo de vida, embora suas concluses sobre o grau de formalizao em cada estgio no correspondam exatamente ao de outros experimentos. Mas o que o estudo decididamente no captou, em razo da abordagem cross- sectional, foi a dinmica de mudanas entre os estgios, ou seja, as relaes de causa-e-efeito quanto mudana de estgios: o que causa a mudana de estgio e como isso afeta o desenvolvimento da Contabilidade Gerencial. 1.2Questo de pesquisa Segundo Kerlinger (1980), o problema [...] em sentido geral, uma questo que mostra uma situao necessitada de discusso, investigao, deciso ou soluo. Na pesquisa cientfica, em particular, a questo geralmente pergunta alguma coisa a respeito das relaes entre fenmenos ou variveis. A resposta questo , ento, procurada pela pesquisa. As abordagens contingenciais e institucionais constituem duas escolas distintas, com premissas muitas vezes incompatveis ou mutuamente excludentes, que fornecem perspectivas importantes, mas diversas, sobre o que seriam mudanas especficas da Contabilidade Gerencial. A primeira sugere a possibilidade de haver uma mudana especfica no desenho ou no uso da Contabilidade Gerencial quando alguma varivel do contexto ambiental ou organizacional for alterada. A segunda, alm de acrescentar razes de legitimao social como fonte de mudanas, descreve e explica o processo de implementao de uma mudana especfica. So contribuies que no tm conversado entre si. Todo esse processo que trata de uma mudana especfica, at agora, se encontra pouco articulado e integrado. Em sntese, hoje, h um corpo de conhecimento que auxilia a explicar e, tentativamente, predizer, por que a Contabilidade Gerencial mudaria, em que direo se daria essa mudana e como ela se efetivaria (ou no), porm no h uma articulao integrada dessas etapas. Muito menos, h uma articulao da seqncia de mudanas, s quais as prticas contbeis 22. 12 gerenciais so submetidas ao longo da vida de uma empresa, no decurso de sua histria, que levariam a uma viso ampla e abrangente do desenvolvimento da Contabilidade Gerencial. Por outro lado, embora a perspectiva de ciclo de vida abra novas possibilidades de compreenso do fenmeno do desenvolvimento da Contabilidade Gerencial nas empresas, h poucos estudos realizados, conforme a reviso da literatura realizada, e mesmo os estudos existentes adotam preferencialmente uma abordagem cross-sectional. Ao optar por essa abordagem, o potencial que essa perspectiva tem de lanar luz sobre a relao de causa e efeito entre a progresso de estgios de ciclo de vida e a sucesso de mudanas da Contabilidade Gerencial ao longo do tempo no foi devidamente explorado. Considerando, portanto, as limitaes dos estudos baseados nas abordagens contingenciais e institucionais e o potencial pouco explorado de novas perspectivas como o oferecido pelos modelos de ciclo de vida para a compreenso do desenvolvimento da Contabilidade Gerencial, apresentados anteriormente, coloca-se a seguinte questo: COMO A EVOLUO DOS ESTGIOS DE CICLO DE VIDA AFETA O DESENVOLVIMENTO DA CONTABILIDADE GERENCIAL NAS EMPRESAS?A questo envolve a relao entre dois fenmenos de desenvolvimento: um no nvel da organizao, os estgios do ciclo de vida, e outro de um aspecto do desenho organizacional, qual seja, a Contabilidade Gerencial. A idia de desenvolvimento, como ser mais explorada adiante, est associada mudana de estados organizacionais ao longo do tempo, refletindo a natureza longitudinal desse fenmeno. 1.3 Objetivos De um modo geral, esta pesquisa pretende ampliar o entendimento de como a Contabilidade Gerencial se desenvolve ao longo do tempo em uma organizao, tomando como base um modelo de estgios de ciclo de vida, na forma de um estudo de caso como estratgia de pesquisa. Pressupe-se que, em cada estgio de ciclo de vida, a organizao assume caractersticas particulares, sendo a Contabilidade Gerencial um dos componentes da organizao. Interessa estudar a sucesso e a natureza das mudanas que a Contabilidade 23. 13 Gerencial sofre, medida que a organizao se desenvolve atravs dos estgios de ciclo de vida. Especificamente, este trabalho objetiva criar e testar empiricamente um constructo de modelo de estgios de ciclo de vida, o qual contemple uma ampla caracterizao da Contabilidade Gerencial. Esse constructo pretende refletir a interdependncia e a influncia mtua entre os atributos do contexto ambiental e organizacional, que caracterizam os estgios do ciclo de vida, compreendendo tambm os da Contabilidade Gerencial (caractersticas da informao, tcnicas e usos). Com base na reviso bibliogrfica realizada, adianta-se que o estudo ter, como ponto de partida, os trabalhos de Miller e Friesen (1984) e de Moores e Yuen (2001), os mais representativos e bem sucedidos experimentos encontrados a respeito do tema. Adicionalmente, para que este estudo possa ser aplicado em um enfoque longitudinal, um protocolo ser desenvolvido de modo a captar como os eventos de mudana (externos ou internos) agem sobre a evoluo e transio de estgios de ciclo de vida, ou seja, na transformao do contexto ambiental e organizacional e, por conseguinte, sobre a Contabilidade Gerencial. Este protocolo ficar disponvel para eventualmente ser replicado no futuro. 1.4 Justificativas Esta pesquisa justifica-se pelas novas perspectivas que pode vir a lanar sobre o fenmeno do desenvolvimento e da mudana da Contabilidade Gerencial nas empresas. A reviso bibliogrfica realizada revela que so poucos os estudos que utilizaram uma perspectiva de desenvolvimento organizacional na pesquisa de Contabilidade Gerencial. E nos estudos que mesclaram modelos de ciclo de vida e Contabilidade Gerencial no predominou uma viso longitudinal do fenmeno. A partir de um estudo longitudinal de modelos de ciclo de vida aplicado Contabilidade Gerencial, possvel ter uma viso do processo de desenvolvimento das prticas contbeis gerenciais em uma empresa, no decurso do tempo. A existncia de padres poderia facilitar o diagnstico de problemas e auxiliar na antecipao de requerimentos de solues compatveis 24. 14 com futuros desafios que a empresa venha a enfrentar, ou seja, no s se aumenta o poder explicativo de situaes encontradas no presente, mas tambm se amplia a capacidade preditiva de como a Contabilidade Gerencial deveria ser configurada em situaes futuras planejadas. Espera-se, tambm, que a pesquisa longitudinal possa lanar luz sobre a dinmica de progresso entre os estgios e o efeito que isso teria sobre as prticas contbeis gerenciais antes vigentes, ou seja: se haveria progresso em um s sentido ou se poderiam ocorrer reverses, se haveria saltos de estgios. Uma abordagem longitudinal permite, alm disso, uma viso da relao das causas, dos eventos impulsionadores da mudana, e os seus efeitos sobre a organizao e as prticas contbeis gerenciais. Outra contribuio a possibilidade de, partindo de um modelo genrico de estgios de ciclo de vida, identificar padres particulares de desenvolvimento para setores especficos ou tipos particulares de empresas (ex: empresas familiares). 1.5Proposies Sobre proposies, Martins (2006, p. 68) observa: As proposies teses expostas para serem demonstradas e defendidas permitem a correta direo para o desenvolvimento de um Estudo de Caso [...] As proposies (teses) podem ser entendidas com uma teoria preliminar, criado pelo autor, que buscar, ao longo do trabalho, defender e demonstrar [...] substituem os objetivos e hipteses normalmente formuladas em pesquisas convencionais. Com base no referencial terico (Captulo 2), relacionaram-se proposies de estudo, como forma de iniciar o desdobramento da questo de pesquisa, o qual ir culminar na identificao das evidncias que fundamentaro a coleta, anlise e concluses do estudo. Proposio 1: h consistncia entre os atributos organizacionais em um dado estgio organizacional (configurao). Proposio 2: o desenvolvimento de um atributo dentro de uma configurao evolutivo: gradual e incremental. 25. 15 Proposio 3: o desenvolvimento de um atributo entre duas configuraes revolutivo: radical e rpido. Proposio 4: no h uma ordem preestabelecida para a sucesso de estgios de desenvolvimento. Proposio 5: h uma tendncia permanncia em um mesmo estgio organizacional (inrcia). Proposio 6: a mudana drstica de atributos isolados tende a ser revertida se no acompanhada de mudanas consistentes dos demais atributos organizacionais. Proposio 7: o grau de formalizao da Contabilidade Gerencial aumenta atravs dos estgios organizacionais nascimento, crescimento, maturidade e renovao -, conforme a maior complexidade organizacional, exceto pelo estgio de declnio. Proposio 8: h maior amplitude na seleo de instrumentos de Contabilidade Gerencial nos estgios de crescimento e maturidade do que nos estgios de nascimento, renovao e declnio. Proposio 9: os nveis de agregao e integrao das informaes contbeis gerenciais sero maiores e o escopo mais amplo nos estgios de crescimento e renovao do que nos outros estgios. Proposio 10: nos estgios de crescimento e renovao, as informaes devem ser mais tempestivas do que nos outros estgios. 1.6Estrutura do trabalho O restante do trabalho est organizado em quatro partes: o referencial terico, os aspectos metodolgicos, o relatrio do estudo de caso e as concluses. 26. 16 O referencial terico foi desenvolvido como base para a derivao das proposies do estudo de caso. O modelo de ciclo de vida bsico, inicialmente, foi comparado a outros modelos de desenvolvimento e de mudana. Em seguida, procedeu-se retrospectiva dos exemplos de modelo de ciclo de vida encontrados na literatura, os quais foram avaliados em termos de similaridades e diferenas e, principalmente, em termos de sua validao emprica. As principais crticas dos pressupostos dos modelos de ciclo de vida foram apresentadas, para fundamentar a escolha do modelo de ciclo de vida de Miller e Friesen (1984) como a principal base terica deste trabalho. A Teoria da Configurao que , por sua vez, a base do modelo de ciclo de vida de Miller e Friesen (1984), foi revista e paralelos com a Teoria da Contingncia e a Teoria Institucional foram traados, com vistas a estabelecer a possibilidade de articulao daquela com essas correntes de estudo. Na seqncia, os trabalhos envolvendo Contabilidade Gerencial e ciclo de vida foram revisados, com destaque para o de Moores e Yuen (2001), que aplicou o modelo de Miller de Friesen (1984) ao tema da Contabilidade Gerencial. O captulo seguinte trata dos aspectos metodolgicos da pesquisa, iniciando pela justificativa da estratgia de estudo de caso nico. Considerando a complexidade do fenmeno estudado e o fato de envolver aspectos contemporneos e histricos, uma abordagem quantitativa e qualitativa foi desenvolvida para a coleta e anlise de dados. Distintos mtodos de coleta de dados foram combinados para dar objetividade reconstituio do processo de desenvolvimento da organizao e de suas prticas contbeis gerenciais, bem como para apoiar o processo de anlise, tanto no aspecto descritivo, quanto no explanatrio. O protocolo de estudo de caso foi detalhado, descrevendo os processos de coleta e de anlise de dados. Finalmente, foi feita uma avaliao da validade e confiabilidade do projeto de pesquisa (ver seo 3.7). O relatrio de estudo de caso apresenta as principais anlises e a reviso das proposies tericas iniciais do estudo. Inicialmente, fez-se uma apresentao sucinta da empresa, incluindo seu histrico e forma de atuao. Na anlise da situao atual, buscou-se caracterizar o estgio atual de ciclo de vida da empresa, decorrente da evoluo histrica havida. Essa, por sua vez, foi analisada na seo seguinte, na qual os estgios de ciclo de vida identificados foram comparados com o modelo terico, assim como as transies observadas entre os estgios. A anlise das mudanas na Contabilidade Gerencial concentrou-se na 27. 17 explanao das transformaes ocorridas vis--vis as teorias do referencial. Com base nas anlises anteriores, as proposies tericas inicias foram revistas. Nas concluses, avalia-se o grau de resposta questo original do estudo, apresentam-se as contribuies para a ampliao do entendimento do fenmeno do desenvolvimento da Contabilidade Gerencial, discutem-se as limitaes da pesquisa e sugestes para futuros trabalhos. 28. 18 29. 19 2 REFERENCIAL TERICO Yin (2005, p.50) enftico ao afirmar que [...] essencial que se desenvolva uma teoria antes que se faa a coleta de dados para qualquer estudo de caso. Martins (2006, p. 18) esclarece que as as referncias que [...] ajudaram a definir as questes orientadoras e proposies (teses) devero integrar o arcabouo terico da pesquisa. Sutton e Staw (1995, p. 378 apud YIN, 2005, p. 50) definem proposies tericas como uma histria [hipottica] sobre por que ocorreram atos, acontecimentos, estrutura e pensamentos. Portanto, nesse captulo, reuniram-se as principais referncias existentes na teoria sobre modelos de ciclo de vida e de seu suporte emprico, a fim de fundamentar as proposies que orientaram a coleta e anlise de dados. Vale ressaltar que a utilizao da teoria, ao realizar estudos de caso, no apenas apresenta uma ajuda imensa na definio do projeto de pesquisa e na coleta de dados adequados, como tambm se torna o veculo principal para a generalizao dos resultados do estudo de caso, lembrando que o mtodo de generalizao a generalizao analtica, no qual se utiliza uma teoria previamente desenvolvida como modelo com o qual se devem comparar os resultados empricos do estudo de caso. (YIN, 2005, p. 53 e 54). Na generalizao analtica, o pesquisador est tentando generalizar um conjunto particular de resultados a alguma teoria mais abrangente. A generalizao analtica d-se atravs da replicao em outros casos, atravs de experimentos mltiplos, nos quais a teoria supe deveriam ocorrer os mesmos resultados. A existncia de uma teoria por detrs do estudo de caso fundamental para sua validade externa, ou seja, saber se as descobertas de um estudo so generalizveis alm do estudo de caso imediato. Alm disso, retira-se o risco de tornar o estudo exclusivamente exploratrio. 2.1 Modelos de Ciclo de Vida 2.1.1Modelos de Desenvolvimento Como o tema desenvolvimento central a esta pesquisa, cabem, inicialmente, algumas definies a respeito. Os conceitos esto baseados no trabalho de Van de Ven e Poole (1995), 30. 20 por ocasio de uma reviso interdisciplinar da literatura que conduziram para identificar teorias alternativas que explicam processos de mudana nas cincias sociais, biolgica e fsica. Processo uma progresso, isto , uma ordenao ou seqncia, de eventos ao longo da existncia de uma entidade. Mudana um tipo de evento, uma observao emprica de uma diferena em forma, qualidade ou estado atravs do tempo em uma entidade. Uma entidade pode ser o trabalho de um indivduo, um grupo de trabalho, uma estratgia organizacional, um programa, um produto, ou a organizao como um todo. Desenvolvimento, dadas as definies anteriores, um processo de mudana, isto , a progresso de eventos de mudana que se desdobra ao longo da durao da existncia de uma entidade, do seu incio ao seu trmino. = evento genrico = mudana, provoca diferena de forma, qualidade ou estado, ao longo do tempo t= processo, seqncia de eventos t= desenvolvimento, processo de mudana, seqncia de eventos de mudana Figura 1 Ilustrao dos conceitos de evento, mudana, processo e desenvolvimento Van de Ven e Poole (1995) identificaram cerca de 20 teorias a respeito de desenvolvimento nos mais diversos campos de conhecimento: psicologia, sociologia, educao, negcios, economia, biologia, medicina, meteorologia e geografia. De todas as teorias analisadas constataram ser possvel agrup-las em quatro conjuntos: ciclo de vida, evolutiva, dialtica e teleologia. Esses seriam tipos puros e idealizados, j que, segundo os autores, os estudiosos comumente combinam elementos desses tipos-bsicos para explicar processos de mudanas em contextos ou reas especficas. 31. 21 Quadro 1 Tipos-bsicos de teorias de desenvolvimentoCiclo de VidaEvolutiva Dialtica TeleologiaExemplos DesenvolvimentismoEvoluo darwinianaTeoria do conflito Definio de metas, OntogneseGentica MendelianaMaterialismo planejamento Metamorfose Saltationism dialticoFuncionalismo Modelos de Estgios e Equilbrio Pontual Pluralismo Construo social Ciclos Ao coletivaInterao simblica Pioneiros Comte (1798-1857) Lamarck (1744-1829)Hegel (1770-1831)Mead (1863-1931) Spencer (1820-1903) Darwin (1809-1882) Marx (1818-1883) Weber (1864-1920) Piaget (1896-1980)Mendel (1822-1884) Freud (1856-1939)Simon (1916-) Gould & Eldridge (1977)Metfora-Crescimento orgnicoSobrevivnciaOposio, conflito Cooperao chave competitiva intencional LgicaPrograma obrigatrioSeleo natural entreForas Viso do estado Seqncia pr-competidores numacontraditrias final configurada populaoTese, anttese e Construo social AdaptaosnteseEquifinalidade (compliance)Progresso Seqncia linear eSeqncia de variaoSeqnciaSeqnciade eventos irreversvel de seleo reteno recorrente e recorrente e estgios pr-definidos, recorrente, cumulativa descontnua de descontnua de como decorrncia de e probabilstica confrontao,definio de meta, potenciais imanentes conflito e sntese implementao e presentes no incioentre valores eadaptao de meioseventospara alcanar estadocontraditrios final desejado FONTE: VAN DE VEN; POOLE, 1995, p. 514. O tipo-bsico ciclo de vida ilustra o processo de mudana em uma entidade como progredindo atravs de uma seqncia obrigatria de estgios. O uso da metfora orgnica do crescimento para explicar o desenvolvimento de entidades organizacionais uma das mais comumente utilizadas na literatura. Pressupe que uma entidade singular e discreta sofra mudanas sem perder sua identidade. A entidade passa por estgios distinguveis em forma e funo. H um programa, uma lgica interna que regula o progresso entre os estgios, o qual invariavelmente leva a entidade a estgios mais maduros e diferenciados. Embora eventos externos possam influenciar a forma da entidade, sempre mediado por essa lgica interna de desenvolvimento. Na forma bsica, a teoria de ciclo de vida estabelece que h uma seqncia nica de progresso entre os estgios. Um programa institucional, natural ou lgico prescreve o contedo especfico desses estados. A lgica pode ser dada pela cultura de negcios da sociedade ou pelas instituies que regulam o setor. O tipo-bsico teleolgico encara o desenvolvimento como um ciclo de formulao de metas, implementao, avaliao e modificao dessas metas, com base no que foi aprendido pela entidade. Essa seqncia fruto da construo social intencional dos indivduos pertencentes 32. 22 entidade. Baseia-se em uma doutrina filosfica de que o propsito ou a meta a causa para a mudana de uma entidade. O funcionalismo e a maior parte dos modelos de planejamento estratgico e de definio de metas segue essa abordagem. Esse tipo-bsico permite criatividade, pois h liberdade para escolher quaisquer metas. No h uma seqncia prescrita de eventos, mas o desenvolvimento s ocorre medida que a entidade se move no sentido do estado final desejado. Algumas variantes incorporam a eqifinalidade, isto , o conceito de que h formas alternativas de se alcanar o mesmo objetivo. Reconhece que h limites liberdade de ao, dadas as restries ambientais e de recursos, incluindo presses institucionais. As influncias externas podem provocar mudanas no desenvolvimento. No h uma trajetria pr-especificada. No mximo, h uma lista de possveis caminhos. No tipo-bsico dialtico o conflito emerge entre entidades com teses opostas e a coliso de ambas produz uma sntese, que se torna a tese para o prximo ciclo de progresso dialtica. A oposio pode ser interna organizao, pois pode haver metas e interesses conflitantes em grupos que competem entre si, ou externa organizao, quando a entidade persegue direes que colidem com a direo de outras organizaes. A mudana ocorre quando esses valores, foras ou eventos ganham suficiente poder para confrontar o status quo. Nem sempre o conflito produz uma sntese criativa. s vezes, a oposio simplesmente derruba e substitui o status quo. No primeiro caso, h uma soluo do tipo ganha-ganha; no segundo, do tipo ganha-perde. Um tipo-bsico evolutivo consiste de uma seqncia repetitiva de eventos de variao, seleo e reteno, entre entidades de uma mesma populao. Diz respeito ao acmulo de mudanas nas formas estruturais de uma populao de entidades especficas. As variaes emergem de modo aleatrio. A seleo das formas mais adaptadas entre as organizaes da populao ocorre pela competio por recursos escassos, sendo que o ambiente privilegia aquelas que adotam as melhores solues estruturais de obteno de recursos. A reteno envolve processos de inrcia e persistncia que perpetuam certas formas organizacionais na populao em detrimento de outras. H vertentes do modelo evolutivo que encaram o processo de evoluo de forma gradual (Darwinista) ou aos saltos (Punctuated Equilibrium). H tambm vises distintas sobre como os traos so adquiridos: entre geraes (Darwin) ou na prpria gerao, atravs de processos de aprendizagem e imitao (Lamarck). 33. 23EvolutivoDialtico MltiplasEntidades TeseVariao Seleo RetenoConflito SnteseAntteseUnidadedeMudana Ciclo de Vida TeleolgicoEstgio 4 (Terminar) Insatisfao UmaEstgio 3 Estgio 1 ImplementarProcurar/Entidade (Colher)(Start-up)metasInteragir Estgio 2Definir/Visualizar(Crescer)MetasPrescritivoModo deConstrutivoMudanaFigura 2 Tipologia dos tipos-bsicos de teorias de desenvolvimento FONTE: VAN DE VEN; POOLE, 1995, p. 520. As teorias especficas de desenvolvimento, encontradas na literatura, so mais complexas do que os tipos-bsicos. De fato, normalmente, encontra-se nas teorias complexas uma combinao de dois ou mais tipos-bsicos. Isso porque mais de um motor de mudana pode ser acionado ao longo do tempo e qualquer tipo-bsico inerentemente incompleto, por serem idealizaes. Os tipos-bsicos ciclo de vida e o teleolgico, por exemplo, aplicam-se a uma entidade somente, enquanto o evolutivo e dialtico requerem a interao de pelo menos duas. Por outro lado, os tipos-bsicos evolutivos e ciclo de vida tendem a ser mais prescritivos, nos quais as mudanas ocorrem em direes previsveis, que dependem do estado anterior. J os tipos-bsicos dialtico e teleolgico no oferecem bases para tal previsibilidade, operando em um modo construtivo, sem uma seqncia de mudanas preestabelecida. de se esperar ora a dinmica interna da organizao possa explicar sozinha eventos de mudana e que ora a dinmica da interao entre entidades venha ser a explicao. Similarmente, haver processos mais determinsticos de desenvolvimento e outros mais intencionais e abertos escolha. Van de Ven e Poole (1995, p. 510) defendem a integrao de elementos de distintas perspectivas como forma de ampliar o poder explanatrio dos processos de desenvolvimento quando dizem: 34. 24[...] a inter-relao entre diferentes perspectivas que ajuda a ter um entendimento maisabrangente da vida organizacional, porque qualquer perspectiva terica isoladamenteinvariavelmente oferece apenas uma viso parcial de um fenmeno complexo. Adicionalmente, ajustaposio de diferentes perspectivas tericas traz a foco vises de mundo contrastantes arespeito da mudana e desenvolvimento sociais. Entendendo o relacionamento entre visesaparentemente divergentes prov oportunidades para desenvolver novas teorias que tm maior emais amplo poder explicativo do que as perspectivas iniciais. Essa tipologia pode ajudar a caracterizar o alcance e limitaes de teorias especficas de mudana e desenvolvimento organizacional, tal qual o modelo em particular que foi utilizado neste estudo. Com base nas caractersticas de cada tipo-bsico seria possvel verificar que motor de mudana est operando em um determinado evento de mudana. 2.1.2 Retrospectiva dos modelos de ciclo de vida Como visto no tpico anterior, modelos de ciclo de vida das organizaes abordam a questo de como as organizaes se desenvolvem no tempo. Autores que adotam essa abordagem defendem que as mudanas organizacionais ocorrem em padres previsveis caracterizados por estgios de desenvolvimento. Transies tpicas so esperadas medida que as organizaes simples, jovens e pequenas se tornam mais complexas, velhas e grandes. Na sua forma bsica, a teoria de ciclo de vida utiliza o crescimento orgnico como metfora, o que se reflete inclusive em muitas denominaes dos estgios organizacionais (nascimento, adolescncia, maturidade, etc.). Uma variedade relativamente grande de modelos foi desenvolvida ao longo do tempo. Quinn e Cameron (1983), em um dos primeiros levantamentos de modelos de ciclo de vida organizacional, identificaram e compararam nove exemplos. Constataram que esses modelos diferiam em termos da enumerao de estgios organizacionais e em termos dos atributos que foram utilizados para caracterizar cada um desses estgios. No obstante essas diferenas, os autores lograram integrar os modelos analisados em um conjunto comum de estgios organizacionais: a) estgio empreendedor (inovao, formao de nichos e criatividade); b) estgio coletivo (alta coeso, comprometimento); c) estgio de formalizao e controle (estabilidade e institucionalizao); d) estgio de estruturao e adaptao (expanso dos domnios e descentralizao). 35. 25 Alguns dos estudos que Quinn e Cameron (1983) analisaram subdividiam certos estgios do modelo integrado em subestgios, enquanto outros ignoram o primeiro ou o ltimo estgio. Com uma nica exceo, nenhum dos modelos considerava a fase de declnio e morte da organizao, levando os autores a conjecturar que apenas os estgios que levam do nascimento maturidade seriam previsveis. O tempo que cada organizao despende em um dado estgio tambm no clarificado nos modelos analisados. Quinn e Cameron (1983), tambm, salientaram que h diferenas entre os modelos em termos do fenmeno organizacional que orienta o desenvolvimento (estrutura, mentalidade individual, problemas funcionais, etc.). Cada modelo tende a enfatizar um fio condutor principal do desenvolvimento da organizao. Em uma reviso mais recente, Levie e Hay (1999) identificaram 63 modelos de ciclo de vida, sendo 29 genricos, aplicveis a qualquer organizao, e 34 especficos, que tratam um subconjunto de estgios (estgios iniciais em organizaes novas ou emergentes) ou organizaes com caractersticas restritas (tamanho, organizaes pequenas; ou de um setor, como o de tecnologia, por exemplo). A reviso da literatura abrangeu um perodo de 1962 a 1996, demonstrando que houve uma proliferao de modelos propostos pelos tericos. Da reviso identificaram trs premissas comuns a todos os modelos de ciclo de vida: a) h estgios organizacionais distintos e identificveis; b) os estgios ocorrem em seqncia; c) a seqncia comum a todas as organizaes no escopo do modelo. Por detrs dessas premissas, estaria, segundo Levie e Hay (1999), uma metfora comum das organizaes, na qual essas teriam um desenvolvimento anlogo ao dos organismos vivos. Apesar dessas semelhanas entre os modelos, os autores concluram pelas mesmas diferenciaes entre as distintas proposies de modelos analisadas, tal qual Quinn e Cameron (1983) anteriormente. Os modelos estudados diferem em termos da descrio detalhada dos estgios individuais e do nmero de estgios. Uma contribuio importante de Levie e Hay (1999) foi a de traar a genealogia dos modelos de ciclo de vida, atravs das referncias que suas proposies faziam a modelos anteriores. Com isso, puderam montar uma linhagem de modelos e determinar as fontes originais dos modelos existentes. Por ordem de influncia, identificaram quatro modelos-fonte: Greiner (1972), Christensen e Scott (1964), Rhenman (1973) e Lippett e Schmidt (1967). 36. 26 Idade e tamanho so duas variveis-chaves que emergem na abordagem de ciclo de vida das organizaes. Segundo Greiner (1972, 1998), a histria demonstra que as mesmas prticas organizacionais no so mantidas indefinidamente ao longo do horizonte de vida da entidade. Assim, os problemas gerenciais e suas solues teriam suas razes no tempo. Por outro lado, a passagem do tempo contribuiria para a institucionalizao das atitudes gerenciais, tornando mais difcil uma mudana. O tamanho tambm influiria nos problemas que a organizao enfrenta e, conseqentemente, nas solues adotadas. medida que cresce, a organizao tende a apresentar maiores problemas de coordenao e comunicao. Grande Empresa emsetor de altocrescimento Empresa emsetor de baixo Tam. crescimento da Org.Evoluo:estgios de Pequena crescimentoRevoluo: estgios de crisesJovemMadura Idade da OrganizaoFigura 3 Evoluo e revoluo FONTE: GREINER, 1998, p.56. Greiner (1972) teoriza que as organizaes se desenvolvem em ciclos alternados de evoluo e revoluo cujas transies so marcadas por crises. Assim, aps sobreviver a uma crise, a organizao goza de um perodo de crescimento contnuo at que algum novo evento externo ou interno provoque uma outra ruptura. Nesses perodos, apenas pequenos ajustes seriam necessrios s prticas gerenciais, sem alterar o padro geral de gesto, com o objetivo de manter o crescimento. Nos perodos de revoluo, as prticas gerenciais sofreriam grandes modificaes para se ajustarem s novas caractersticas organizacionais. Aquelas companhias que insistissem nas prticas antigas estariam condenadas estagnao ou declnio. O autor considera, ainda, que os perodos de evoluo podem ser prolongados e a revoluo postergada, quando os lucros so fceis. 37. 27 Christensen e Scott (1964), inspiraram-se conceitualmente em modelos de estgios de desenvolvimento e empiricamente nos estudos de Chandler (1962) sobre a histria de quatro grandes empresas cones da histria americana, tomando o que fora comum ao desenvolvimento delas como descrio dos estgios e de sua caracterizao. So trs os estgios preconizados pelo modelo: 1)estrutura informal, produto nico, controle pessoal e recompensas paternalsticas; 2)especializao funcional, procedimentos institucionalizados e avaliao de desempenho impessoal; 3)mltiplas linhas de produtos, mercados diversificados, estrutura divisionalizada. O questionamento a essa abordagem est na generalizao a partir de um nmero restrito de exemplos, tirados de um determinado contexto, assumindo sua validade para toda e qualquer situao. Rhenman (1973), embora no integralmente defensor da metfora do organismo vivo para o desenvolvimento da organizao, entendia o fenmeno como um processo de aprendizagem em que os padres similares de organizaes seriam o produto de condies ambientais similares. Essa abordagem se aproxima mais da perspectiva evolutiva nos estudos mais recentes de desenvolvimento organizacional. Lippett e Schmidt (1967) geraram um dos primeiros modelos de ciclo de vida para o setor privado, tendo por base a analogia com organismos vivos, contemplando os seguintes estgios: 1)nascimento, em que a preocupao se tornar vivel; 2)juventude, quando se busca a estabilidade e desenvolver uma reputao no mercado; 3)maturidade, cuja nfase a adaptabilidade, ao mesmo tempo em que os domnios continuam a se expandir. 2.1.3Crticas aos modelos de ciclo de vida A maior crtica abordagem de ciclo de vida tem sido a tendncia a enfatizar uma seqncia nica de desenvolvimento e a existncia de poucos estudos empricos. Levie e Hay (1999) afirmam que, das trs premissas que encontraram na literatura, s h maiores evidncias 38. 28 empricas para a existncia de estgios organizacionais distintos e identificveis, com destaque para o estudo emprico de Miller e Friesen (1984). Portanto, no haveria suporte para a existncia de uma seqncia nica e determinstica aplicvel a toda e qualquer organizao. Sugerem um modelo que, ao invs de utilizar a metfora de vida orgnica subjacente aos ciclos de vida, adotasse uma nfase na metfora evolutiva, na qual os estgios de crescimento seriam substitudos por fases de gesto, no necessariamente encadeados em uma seqncia predeterminada. Tais concluses parecem estar em linha com as de Aldrich (2004, p. 196-222). O autor defende uma abordagem alternativa aos modelos bsicos de ciclo de vida organizacional, que seria centrada em um framework que enfatiza a histria da organizao (ou comunidade/populao) estudada. Segundo esse pesquisador, todas as transformaes seriam dependentes do contexto histrico (e geogrfico). Da, prope o termo life course (curso da vida, biografia, crnica) no lugar de life cycle (ciclo de vida). O autor critica a suposta linearidade e determinismo na sucesso das fases em algumas proposies de ciclo de vida, argumentando que, na realidade, h muito mais abertura para escolha e aleatoriedade. Prope, alternativamente, um modelo de evoluo organizacional sujeito a trs tipos de influncias. Primeiramente, considera o efeito da idade, que so mudanas associadas com a passagem do tempo da organizao, tais como o afastamento do fundador. So a-histricas, isto , independentes do contexto histrico. Mesmo em pocas e pases diferentes, as organizaes passariam por problemas similares proporo que envelhecem. A idade em si, porm, no seria o fator crtico para a transformao. O envelhecimento criaria oportunidades para a aprendizagem dos membros da organizao, que, ento, podem escolher entre manter as prticas antigas ou explorar outras novas. Esses efeitos, normalmente esto contemplados nos modelos conhecidos de ciclo de vida. Logo em seguida, considera o efeito do perodo, que seria uma descontinuidade histrica que impacta similarmente em todas as organizaes de uma dada populao, indistintamente de suas idades, tais como: mudanas polticas ou de regime, mudanas legais ou regulatrias, alterao de valores e normas da sociedade e mudanas na disponibilidade de recursos. Por fim, contempla o efeito de grupo (cohort), o qual ocorre quando eventos em um dado perodo afetam diferentemente grupos de organizaes, conforme suas respectivas pocas de fundao. Nesse caso, a idade da organizao interage com o perodo para produzir esse 39. 29 efeito. O exemplo clssico a competio por recursos escassos entre uma organizao recm-fundada e outra estabelecida h mais tempo. A primeira teria mais dificuldade de encontrar solues e sobreviver do que a segunda. Os efeitos de perodo e de grupo constituiriam um complemento dos modelos de ciclo de vida organizacional, trazendo uma perspectiva externa adicional para aumentar seu poder explicativo.IdadePerodo 1 Perodo 2Grupo A35Grupo B30Grupo C2520Grupo D15Grupo E10EstgioGrupo F 10 anos 5de vida 0 50 607080 90 0010TempoFigura 4 Abordagem evolutiva das organizaesFONTE: ALDRICH, 2004, p. 203. Assim, no lugar de um modelo bsico de ciclo de vida, estudos empricos parecem sugerir um modelo hbrido de ciclo de vida, que conteria estgios organizacionais bem identificados e uma dinmica de transio entre estgios que pudesse incorporar outras perspectivas, sem uma seqncia predeterminada, sujeita a algum grau de aleatoriedade e de escolha organizacional. 2.2O Modelo de Ciclo de Vida de Miller e Friesen Entre os vrios modelos de estgios de ciclo de vida existentes, o de Miller e Friesen (1984) destaca-se no s por sua profundidade conceitual, como tambm pelos testes empricos realizados. Por essas caractersticas, esse modelo tem o reconhecimento dos estudiosos da rea e tem sido utilizado como base em novos estudos empricos, incluindo os da Contabilidade Gerencial. Por essas razes e mais o fato de que esse modelo foi testado em um enfoque longitudinal, esta pesquisa toma-o como a sua principal base terica. 40. 30 O objetivo de Miller e Friesen (1984) foi o de estabelecer uma tipologia que pudesse ser utilizada para prever diferenas nas caractersticas ambientais e organizacionais em distintos estgios de desenvolvimento. A justificativa do trabalho que desenvolveram residia na ausncia de estudos longitudinais, que evidenciassem a seqncia evolutiva entre os estgios do ciclo de vida. At ento, os estudos eram eminentemente cross-sectional, identificando caractersticas estticas de diferentes organizaes em distintos estgios de vida, no mesmo momento histrico. Com base em estudos anteriores, Miller e Friesen (1984) definiram cinco estgios de desenvolvimento cujas caractersticas esto resumidas no quadro abaixo. 41. 31 Quadro 2 Estgios do ciclo de vidaEstgioSituao OrganizaoInovao e Estratgia Nascimento firma pequena estrutura informal inovao considervel nas jovem indiferenciadalinhas de produto dominada pelo poder altamente estratgia de nicho fundador centralizado assume riscos substanciais ambiente mtodos primitivos de homogneo, plcido processamento de informaoe de tomada de deciso Crescimento tamanho mdio alguma formalizao da ampliao do escopo de mais velha estrutura produtos e mercados em reas mltiplos acionistas base organizacional relacionadas ambiente maisfuncional inovaes incrementais nas heterogneo e diferenciao moderadalinhas de produto competitivo algo menos centralizada crescimento rpido desenvolvimento inicial deprocessamento formal deinformaes e mtodos detomada de deciso Maturidade maior estrutura formal e consolidao da estratgia mais velha ainda burocrtica de produtos e mercados propriedade base organizacional foco em suprir mercados dispersa funcional bem definidos de forma ambiente ainda mais diferenciao moderada eficiente heterogneo e centralizao moderada conservadorismo competitivo processamento de crescimento menorinformaes e tomada dedeciso como na fase decrescimento Renovao muito grande base organizacional estratgia de diversificao ambiente muito divisionalde produtos e mercados, heterogneo, alta diferenciaomovimentao para algumas competitivo e dinmico controles, monitoramento, reas no relacionadascomunicao e processamento alta propenso a riscos ede informao sofisticados; planejamentoanlise mais formal na tomada inovao substantivade deciso crescimento rpidoDeclnio tamanho de estrutura formal e baixo nvel de sofisticao mercadoburocrtica corte de preos ambiente base organizacional consolidao de produtos e homogneo efuncional na maioriamercados competitivo diferenciao e liquidao de subsidiriascentralizao moderadas averso a risco e sistemas de processamento conservadorismode informao e mtodos de crescimento baixotomada de deciso menossofisticados FONTE: MILLER; FRIESEN, 1984, p. 1163. O tema central desse modelo como a organizao responde crescente complexidade da tarefa administrativa medida que progride em seu ciclo de vida. Seus achados comprovaram que os desafios so respondidos atravs de solues estruturais, de estilo de deciso e de estratgia crescentemente complexos. 42. 32 Os estudos dos autores basearam-se em relatos histricos registrados de diversas organizaes. Eles desenvolveram um mtodo para classificar as organizaes, segundo esses relatos, nos distintos estgios de ciclo de vida teorizados. As caractersticas apresentadas nessas fases foram comparadas para comprovar ou no a aderncia das configuraes teorizadas. O carter de configurao dos estgios do ciclo de vida fica mais bem evidenciado quando se analisam as caractersticas por cada fase. Em especial, destacaram-se aquelas que so relacionadas Contabilidade Gerencial, a rea de interesse desta dissertao. No nascimento (birth), as estruturas so simples e centralizadas. H poucos controles formais e sistemas de informao. A firma dominada pelo fundador, o qual concentra as decises, prescindindo de um staff especializado. Um estilo intuitivo de deciso predomina, em lugar de um modelo analtico. Projetos no so detalhados, nem alternativas consideradas, poucas opinies so levadas em conta em uma deciso-chave. Na fase de crescimento (growth) a linha de produtos ampliada e mercados so abordados de forma segmentada. A estrutura torna-se mais especializada e a influncia do pioneiro na rotina administrativa diminui. Maior esforo despendido na coleta e processamento de informao a respeito do ambiente competitivo (monitoramento), para controle do desempenho financeiro dos diversos produtos e para facilitar a comunicao e coordenao entre os vrios departamentos. O grau de ousadia das decises ainda est presente, mas reduzido, uma vez que mais gerentes so envolvidos nas decises, diminuindo o apetite a riscos e proatividade. As decises tendem a ser mais analticas, menos dependentes do palpite do pioneiro e mais centradas nas discusses entre os gerentes. Ao atingir a maturidade (maturity), o grau de inovao diminui, arranjos polticos so perseguidos para manter a estabilidade do ambiente e a meta passa a ser a melhoria da eficincia e a lucratividade das operaes. A estrutura mais profissionalizada e o fundador provavelmente j tenha se retirado. H maior nfase na formalidade dos controles, oramentos e indicadores de desempenho. O estilo de deciso mais conservador, menos inclinado a assumir riscos e a inovaes. O nvel de anlise similar ao da fase anterior. 43. 33 Na fase de renovao1 (revival), h mais inovaes do que em qualquer outro perodo do ciclo de vida. A diversidade de produtos e mercados leva a uma estrutura divisionalisada. A direo da empresa utiliza controles sofisticados para monitorar o desempenho de suas divises, a fim de orientar suas decises estratgicas. A maior complexidade exige outros tipos de controle de monitoramento ambiental e de coordenao interna, alm daqueles comuns fase anterior. O estilo de deciso volta a privilegiar a inovao e o risco, de modo a gerar crescimento. A ousadia renovada, no entanto, equilibrada por uma abordagem mais analtica e participativa de deciso. H uma tentativa consciente de formular uma estratgia para orientar o curso futuro da organizao. No declnio (decline), as organizaes se tornam estagnadas. O foco interno. H uma ausncia marcante de sistemas de controle internos ou externos. A comunicao entre reas e nveis hierrquicos deficiente, diminuindo a capacidade de reao aos desafios. A tomada de deciso caracterizada por extremo conservadorismo e centralizao. A gesto das crises deixa pouco tempo para a direo se dedicar anlise. A organizao regride para solues simples aos graves problemas que enfrenta. Vale ressaltar que o estudo de Miller e Friesen (1984) faz referncia a trs dos modelos-fonte citados anteriormente: Greiner (1972), Christensen e Scott (1964) e Lippett e Schimidt (1967). A prpria denominao dos estgios organizacionais adotadas por Miller e Friesen (1984) segue a tradio da metfora dos organismos vivos (nascimento, crescimento, etc.). A construo terica do modelo tambm sugere uma seqncia crescente de complexidade organizacional ao longo dos estgios organizacionais, como sendo o caminho esperado em geral. No entanto, a concluso do estudo emprico no confirma a seqncia nem um padro nico de desenvolvimento para todas as organizaes, aproximando-se mais, sem cit-lo em seu estudo, do modelo de Rhenman (1973). Portanto, o modelo de Miller e Friesen (1984) no um modelo de ciclo de vida bsico, abrindo a possibilidade de integrar outras perspectivas de desenvolvimento. 1O termo revival tem vrias tradues do Ingls para o Portugus. Optou-se pelo termo renovao para traduzir o sentido de um resgate de caractersticas comumente associadas ao perodo inicial da existncia da organizao, como seu vigor e crescimento, porm utilizando novas bases organizacionais, estruturas e sistemas. 44. 34EventoEvento Crtico Crtico Atributos do Estgio de Ciclo de Vida Tempo 1 23 45 67 89 ... n-1 nExternosAmbiente InternosEstratgia Estrutura...C. Gerencial... Estilo de Tomada de Deciso Transio Perodo 1 Perodo 2 Perodo 3 Estgio A Estgio B Estgio BFigura 5 O constructo de estgios de ciclo de vida O estudo longitudinal de ciclo de vida de Miller e Friesen (1984) baseou-se na ampliao de um mtodo desenvolvido em um trabalho anterior da dupla sobre a transio entre arqutipos organizacionais. (MILLER; FRIESEN, 1980). Reconstituram a histria de cerca de 36 organizaes, a partir de livros, relatrios da administrao, artigos escritos em peridicos voltados comunidade de negcios sobre essas firmas. Concentraram o estudo em empresas com pelo menos 20 anos de vida, de modo a aumentar a probabilidade de haver mais de uma transio de estgio de ciclo de vida ao longo do tempo estudado. Desenvolveram uma heurstica complexa para subdividir a histria de cada empresa em perodos. A Figura 5 resume o processo. Cada perodo iniciava a partir de um evento crtico que causasse uma mudana significativa em um conjunto de variveis nas diversas dimenses e se encerrava quando havia uma relativa estabilidade das variveis ambientais e organizacionais. Somando- se todos os perodos identificados de todas as empresas estudas, obtiveram 171 perodos. Para cada perodo, de cada organizao, utilizando a informao obtida a partir da pesquisa documental, atriburam valores s variveis que caracterizavam o contexto ambiental e a estratgia, estrutura e estilo de tomada-de-deciso da organizao. Ao todo, trabalharam com 54 variveis. Por fim, esses perodos foram classificados em um dos cinco estgios de ciclo de vida, de acordo com critrios estabelecidos no quadro abaixo. 45. 35 Quadro 3 Critrios de classificao em estgios de ciclo de vidaNascimento CrescimentoMaturidade RenovaoDeclnio Idade< 10 anosTaxa de> 15% < 15% > 15% Estagnada crescimento EstruturaInformalFuncional (incio Funcional Divisionalda formalizao)(burocratizaomais avanada) Propriedade* Proprietrio-gestor Diversificao daAlta linha de produtos* Grau de Inovao*BaixoLucratividade* Em quedaSofisticao dos Alta SCG* (*) utilizar se necessrio para a classificao FONTE: MILLER; FRIESEN, 1984, p. 1166. Para cada varivel do modelo, tomou-se a mdia do conjunto dos perodos identificados como sendo do mesmo estgio de ciclo de vida, produzindo um conceito do respectivo atributo organizacional para aquele estgio. A partir do quadro geral obtido, desenvolveram uma rica descrio das caractersticas ambientais e organizacionais em cada estgio e identificaram os padres de transio (tendncias de evoluo) das mesmas atravs dos estgios sucessivos. Os autores constataram que a seqncia das fases no segue exatamente os modelos encontrados na literatura. No existe uma seqncia que seja irreversvel, nica e definitiva, portanto, a progresso nas fases do ciclo de vida no seria determinstica. Ao analisarem a freqncia de transies de fase entre perodos, em uma viso probabilstica, a tendncia maior observada a de a empresa se manter na mesma fase. O tempo que se passa em cada fase, para as empresas na amostra, varia imensamente: a mdia observada foi de 6 anos, sendo o menor perodo de 18 meses e o mais longo de 20 anos. Verificaram que h coeso e complementaridade entre as variveis em cada estgio e que entre cada estgio h uma mudana significativa em muitas variveis. Argumentam que empresas que no crescem ou diversificam, simplesmente envelhecem, no devem mudar de estgio, pois a idade por si s no traz maior complexidade ambiental ou administrativa. 46. 36 2.3Teoria da Configurao 2.3.1Aspectos Gerais Subjacente abordagem de ciclo de vida das organizaes de Miller e Friesen (1984), jaz o conceito de configurao, conforme desenvolvido por Miller e Friesen (1980a, 1980b e 1984) e Miller (1986, 1987 e 1996). Cada estgio de ciclo de vida corresponde a uma configurao, definida por Miller (1996, p. 508) como o grau pelo qual os elementos organizacionais so orquestrados e conectados por um tema singular. Tambm conhecida como gestalt, arqutipo ou tipo genrico, o conceito de configurao foi desenvolvido a partir das tipologias e taxonomias geradas pelos primeiros estudos organizacionais, principalmente, da teoria da contingncia, os quais se concentravam no relacionamento de um nmero restrito de variveis ambientais, estratgicas e estruturais. A premissa bsica a de que os elementos da estrutura, da estratgia e do ambiente se combinam em um nmero finito de formas alternativas comuns, apesar de a multiplicidade de atributos de uma organizao sugerir teoricamente um nmero infinito de combinaes. Miller (1986, p. 236) cita trs argumentos a favor desse conceito: a)a ecologia organizacional defende a tese de que o ambiente realiza uma seleo natural das diversas formas organizacionais existentes, sendo que apenas algumas sobrevivem, ou seja, prosperam s custas de outras formas concorrentes; b)os atributos organizacionais so inter-relacionados em formas complexas e um tema central d ordem e harmonia aos elementos organizacionais individuais; c)as organizaes tendem a mudar seus atributos de forma a aprofundar as caractersticas de uma dada configurao ou a se mover rapidamente para uma nova configurao que, ento, preservada por um longo perodo de tempo. As configuraes teriam um alto valor preditivo. A deteco da presena de certos elementos poderia apoiar uma predio confivel dos elementos remanescentes, assim caracterizando a configurao. (MILLER, 1996, p.505). O poder preditivo reside no fato de a maior parte das combinaes de elementos serem pouco provveis, enquanto um nmero relativamente pequeno de combinaes seria bem mais comum. As implicaes tericas e prticas seriam relevantes, medida que se pudessem fazer predies sobre detalhes da forma organizacional 47. 37 de uma entidade a partir de traos que caracterizem sua configurao ou, no caso deste estudo, seu estgio de desenvolvimento de ciclo de vida. Uma explicao para a dinmica das mudanas organizacionais tambm oferecida pela Teoria da Configurao (MILLER; FRIESEN; 1980b), considerando que mudanas em elementos da organizao isolados so normalmente evitadas ou malsucedidas medida que destroem as complementaridades entre os vrios elementos da configurao. No mximo, dentro de uma mesma configurao, os elementos evoluem, aperfeioando ou aprofundando as mesmas caractersticas, compatveis com o modelo adotado (ex: uma nfase burocrtica em padronizao e formalidade favorece o desenvolvimento de novos controles). Somente quando uma mudana absolutamente necessria ou altamente vantajosa que ocorrem mudanas revolucionrias, levando a organizao de uma configurao a outra diferente. Teoriza-se que tais mudanas deveriam ocorrer rapidamente para encurtar o perodo de transio e de incoerncia entre os elementos organizacionais. Essas revolues seriam caras e arriscadas e, portanto, no aconteceriam freqentemente. Conseqentemente, as organizaes privilegiariam a manuteno de suas configuraes por longos perodos. A evoluo configuraria uma mudana de magnitude, enquanto a revoluo seria uma mudana de padro. Miller (1987) argumenta que um imperativo singular e dominante a causa, a fora organizadora, por detrs da configurao, sendo que cada estgio de ciclo de vida, dominado por um: a) Nascimento, liderana; b) Crescimento, ambiente externo; c) Maturidade, estrutura; d) Renovao, estratgia (secundada por liderana e ambiente). Embora em cada fase possa haver mais de uma influncia, uma teria carter dominante. A natureza da mudana em cada configurao teria caractersticas distintas. O imperativo da liderana, comum em empresas na fase de nascimento ou de pequeno tamanho, engendraria o empreendedorismo, sendo que a orientao bsica do lder empreendedor mantida at que esse se afaste. O imperativo do ambiente, caracterstico de empresas na fase de crescimento, de tamanho relativamente pequeno e submetidas a grande competio, geraria configuraes 48. 38 mais orgnicas e adaptveis, que mudariam rapidamente e de forma incremental. O imperativo da estrutura caracterizaria organizaes burocrticas, em ambientes estveis, com barreiras de entrada, geralmente de tamanho grande, mais resistentes mudana, que s mudariam sob fortes crises. Por fim, o imperativo da estratgia seria caracterstico de conglomerados, que buscam a mudana proativamente, aproveitando as oportunidades e interagindo com o ambiente. Miller e Friesen (1980b, p.596) relacionam os principais eventos de mudana que poderiam desencadear a transio para uma nova configurao: 1) Estilo de tomada-de-deciso (liderana): a troca do principal executivo; 2) Ambiente: mudana do ambiente externo causada por estratgia de competidor,obsolescncia tecnolgica, boom ou recesso econmica, etc.; 3) Estrutura: deciso de construir uma nova fbrica ou adotar uma tecnologiasignificativamente diferente, modificao da estrutura organizacional ou da distribuiode autoridade, aquisies, fuses ou adio de novas divises de negcio, mudana nasprticas administrativas referentes a sistemas de informao e controle ou mtodos deplanejamento e 4) Estratgia: introduo de um novo produto ou estratgia de mercado, mudanasignificativa em distribuio, promoo, estratgia ou tcnicas de precificao. Acaracterstica comum desses eventos a de provocar grandes mudanas, isto , afetarcom intensidade muitas variveis organizacionais como conseqncia. Uma vez concluda a transio para a nova configurao, no significa que haja uma estabilidade absoluta, mas, como observado anteriormente, ocorrem mudanas evolutivas e incrementais, reforando as caractersticas do tema central da configurao, essa sim estvel. As razes oferecidas (MILLER; FRIESEN, 1980b, p. 603) para esse fenmeno so: 1) a continuidade decorre de uma tentativa consciente de perseguir a orientao que seprovou bem sucedida at ento; 2) limitaes cognitivas sobre a realidade criam resistncia a reformulaes; 3) h relutncia ou incapacidade de perturbar o complexo equilbrio entre as variveisestratgicas, estruturais e do ambiente. A mudana revolucionria, por outro lado, podeocorrer quando h uma insatisfao grande com o status quo e h uma mudana 49. 39 significativa na base de poder entre os grupos com diferentes ideologias e perspectivas (MILLER; FRIESEN, 1980b, p. 607). Em se tratando da relao entre os modos de mudana e o desempenho, Miller e Friesen (1980b, p. 610) ressaltam uma certa ambigidade. A mudana evolutiva, por um lado, evita mudanas custosas, mas, por outro lado, pode procrastinar a mudana de uma orientao que j se mostrou disfuncional. A mudana revolutiva pode trazer novas orientaes em linha com o contexto externo, ou reverter uma estratgia e estrutura ajustadas, por erro de avaliao. No obstante a ambigidade, os autores esperam que, no limite da mudana evolutiva, que ocorre dentro de uma mesma configurao, haja uma deteriorao do desempenho. O insucesso invariavelmente o principal estmulo para a mudana revolutiva. Aps a transio, espera-se um desempenho melhor quando h uma resposta revolutiva acertada. Enfim, concluem os autores que as organizaes se desenvolvem de uma forma paradigmtica, como o conhecimento cientfico. Desenvolvem-se de maneira consistente com uma perspectiva, estratgia, ideologia ou misso prpria, que se manifestam pelo alinhamento das variveis ambientais, estratgicas e estruturais. No faria sentido trocar a orientao por qualquer problema enfrentado. Um estmulo significativo necessrio para promover uma revoluo, tal qual aquele representado pelas crises que as entidades atravessam periodicamente. 2.3.2Paralelo com a Teoria da Contingncia A relao entre a Teoria da Contingncia e a Teoria da Configurao tem sido explorada na literatura. Enquanto alguns autores vem a segunda como um caso mais sofisticado da primeira, outros, sem desconsiderar esse aspecto, reconhecem haver pressupostos metodolgicos que tornam as duas abordagens distintas. MEYER et al (1993) resgatam a histria do pensamento a respeito de configuraes desde de os primrdios das cincias sociais, com as noes de Weber sobre carisma, tradicionalismo e burocracia, para caracterizar as tentativas de classificao das organizaes. Relembram a polmica em torno de tipologias, com sua nfase terica e dedutiva, em contraposio s taxonomias, com nfase emprica e indutiva, para conclurem (MEYER et al, 1993, p.1184) que tipologias e taxonomias so igualmente valiosas abordagens complementares para a representao de configuraes organizacionais. 50. 40 Segundo esses autores a abordagem por meio de configuraes tem o potencial de sintetizar os conceitos fragmentados da teoria da contingncia em padres que contm um amplo conjunto de elementos. Essa perspectiva, leva em conta as contribuies de dcadas de pesquisa, as quais demonstram que a interao de um conjunto limitado de caractersticas organizacionais com um conjunto limitado de caractersticas situacionais se d em um contexto restrito de formas organizacionais vlidas. No entanto, ressaltam que o enfoque em configuraes representa um novo conjunto de premissas de estudo, resumidas e comparadas no quadro a seguir.Quadro 4 Premissas da teoria da contingncia e da configurao PremissasTeoria da Contingncia Teoria da Configurao Modo dominante de pesquisa Anlise reducionistaSntese holstica Sistema de coeso e restries Agregados de componentesConfiguraes de componentesfracamente restringidos fortemente restringidos Relacionamento entre atributos Unidirecional e linearRecproco e no-linear Equilbrio Quase estacionrioPontual Modo principal de mudanaIncremental Ruptura Distribuio temporal da mudana Progresso contnua Impulsos episdicos EfetividadeDeterminado pelo contexto Equifinalidadesituacional FONTE: adaptado de Meyer et al (1993). A viso holstica da abordagem de configurao baseia-se na premissa de que parte da entidade social sob estudo no pode ser entendida isoladamente, sem considerar o todo, enquanto a abordagem contingencial admite entender o funcionamento da organizao analisando suas partes constituintes. Realidades sociais para a teoria da configurao formam amlgamas de aspectos interdependentes, sendo que esses componentes no podem ser alterados independentemente dos demais. Assim, as organizaes alternam estados de equilbrio e desequilbrio, com perodos de descontinuidade, separando os perodos de estabilidade.