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Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC-SP Wagner José Penereiro Armani DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE PROFISSIONAL Doutorado em Direito Comercial São Paulo 2017

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Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

PUC-SP

Wagner José Penereiro Armani

DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE PROFISSIONAL

Doutorado em Direito Comercial

São Paulo

2017

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Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

PUC-SP

Wagner José Penereiro Armani

DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE PROFISSIONAL

Doutorado em Direito Comercial

Tese apresentada à Banca Examinadora

da Pontifícia Universidade Católica de

São Paulo, como exigência parcial para

obtenção do título de Doutor em Direito

Comercial, sob a orientação do Prof. Dr.

Marcus Elidius Michelli de Almeida.

São Paulo

2017

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Banca Examinadora:

Dr. Marcus Elidius Michelli de Almeida.

Dr. Armando Luiz Rovai

Dra. Maria Eugênia Finkelstein

Dr. Daniel Blikstein

Dr. Cláudio José Franzolin

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O tempo nunca é o tempo, afinal.

Você nunca pode partir

sem deixar um pedacinho de juventude.

E as nossas vidas são mudadas para sempre.

Nunca mais seremos os mesmos.

Quanto mais você muda, menos você sente.

(Tradução livre – Música: Tonight,

Tonight – Artista: The Smashing

Pumpkins)

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DEDICATÓRIA:

Dedico esta tese de doutorado a meus pais,

meus irmãos, minha esposa e meu filho.

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AGRADECIMENTOS

Inicialmente, agradeço àqueles que me deram o dom da vida, meus pais, Wagner

Sotello Armani e Marinilce Penereiro Armani, que sempre confiaram na minha

capacidade de conquistar tudo aquilo que desejo.

Aos meus irmãos, Walter e Wictor, companheiros de todas as horas e para toda

vida.

À minha esposa, Bárbara, companheira de todos os momentos e principal

incentivadora para a conclusão do doutorado.

Ao meu pequeno Joaquim, bênção divina. Meu filho. Minha vida. Meu amor.

Aos meus amigos inseparáveis: Fábio, Cássio, César, Daniel, Diogo e Júnior.

Aos meus colegas do escritório Sartori Advogados, especialmente aos sócios Dr.

Flávio Sartori, Marcelo Sartori, Gustavo Sartori, Bruno Yohan e Rodrigo Eduardo

Ferreira, e a todos os da área cível que me acompanham dia a dia.

Aos meus colegas professores e funcionários da PUC-Campinas, especialmente ao

Dr. Cláudio Franzolin, ao Dr. Paulo de Tarso Barbosa Duarte e ao Dr. Diogo

Cressoni Jovetta pelo auxílio e orientação durante todo o trabalho; aos Drs. Peter

Panuto, Luiz Arlindo Feriani, Luiz Arlindo Feriani Filho, Marcelo Hilkner Altieri e

Denis Paulo Rocha Ferraz, que apostaram no meu potencial acadêmico e

incentivaram-me a seguir esse caminho; a Maria Helena Campos de Carvalho e a

Pablo Francisco Santos, por me acompanharem nas idas e vindas das aulas no

doutorado e serem ótimos companhias e ouvintes.

Aos meus queridos alunos, a razão da minha dedicação acadêmica.

Aos professores e funcionários da PUC-SP, aos membros da banca de qualificação,

Dr. Armando Luiz Rovai e Dra. Maria Eugênia Finkelstein e, especialmente, ao Dr.

Marcus Elidius Michelli de Almeida, orientador dedicado e compreensivo.

Obrigado!

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RESUMO

Este estudo pretende analisar a sociedade profissional que é aquela constituída

para proporcionar o exercício em comum de profissão intelectual ou regulamentada.

A Constituição Federal não trata somente da livre iniciativa dos empresários, mas

também da de outros profissionais eventualmente dedicados ao exercício de

atividade econômica para o mercado, dentre eles os profissionais intelectuais e as

sociedades. Assim, este trabalho se dispôs a estudar as características específicas

da sociedade profissional e as implicações dessas especificidades no caso de

dissolução parcial e a consequente apuração de haveres para quantificar o valor

devido ao sócio que se desliga, por qualquer motivo, de sociedade profissional. E é

aqui que a sociedade profissional ganha relevância para este trabalho, pois o

tratamento dispensado a ela, de forma equivocada, retira-lhe seu caráter

organizacional e, portanto, também a possibilidade de ser detentora de bens

imateriais e aviamento, prejudicando eventual sócio que dela se desligue. Essa

discussão ganhou novos ares com a vigência do atual Código de Processo Civil, em

18 de março de 2016, e que modificou substancialmente o instituto da dissolução

parcial de sociedade. A análise apurada da doutrina, de material acadêmico, da

legislação, da jurisprudência, de estatísticas e de casos práticos demonstrou ser

método capaz de perseguir exame crítico do instituto, buscando dar-lhe nova

roupagem. Conclui-se, portanto, que, dependendo da forma organizacional da

sociedade profissional, pode haver elementos objetivos que valorizam o negócio,

inexistindo qualquer impedimento legal para excluir os bens imateriais e o

aviamento da avaliação feita na apuração de haveres do sócio que se desligar de

sociedade profissional.

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ABSTRACT

This study intends to analyze the professional society that is constituted to provide

the common exercise of intellectual or regulated profession. The Brazilian

Constitution grants not only to the liberty of initiative of the entrepreneurs, but also to

other professionals who may be engaged in the exercise of economic activity,

including intellectual professionals and societies. This study will show the specific

characteristics of the professional society and the implications of these specificities

in the case of partial dissolution and the consequent determination of assets to

quantify the value due to the member who leaves, for any reason, from a

professional society. And this is where the professional society gains relevance,

because the treatment given to it nowadays, in a mistaken way, deprives it of its

organizational character and, therefore, also the possibility of being a holder of

immaterial goods and compensation, harming eventual partner who leaves the

society. This discussion gained new ground with the validity of the current Brazilian

Civil Procedure Code, on March 18, 2016, and substantially modified the institute of

partial dissolution of society. Accurate analysis of doctrine, academic material,

legislation, jurisprudence, statistics, and practical cases has proven to be a method

capable of pursuing a critical examination of the institute, seeking to give it a new

meaning. It is concluded, therefore, that, depending on the organizational form of the

professional society, there may be objective elements that value the business, there

being no legal impediment to exclude intangible assets and the assessment of the

valuation made in the determination of assets of the member that leaves from

Professional society.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ................................................................................................................................... 12

CAPÍTULO I - DA SOCIEDADE PROFISSIONAL ....................................................................... 15

1.1. A Teoria dos Atos do Comércio do Código Comercial de 1850 – Sociedade Comercial e Civil .............................................................................................................................. 15

1.2. A Teoria da Empresa no Código Civil Brasileiro de 2002 ............................................. 18

1.3. Do empresário ........................................................................................................................... 20

1.4. Dos não empresários – os profissionais intelectuais .................................................... 24

1.5. Das formas de exploração da atividade econômica ....................................................... 31

1.6. As sociedades ........................................................................................................................... 33

1.6.1. Da personificação da sociedade ....................................................................................... 36

1.7. As espécies de sociedade – Sociedades Empresárias e Simples .............................. 40

1.8. Das distinções entre a sociedade empresária e a sociedade simples ...................... 43

1.9. Das Sociedades profissionais .............................................................................................. 45

1.9.1. Das Sociedades profissionais e o elemento de empresa. ......................................... 52

1.10. A reinclusão da sociedade profissional como empresária por constituir elemento de empresa ........................................................................................................................................ 57

1.11. Os tipos societários .............................................................................................................. 60

CAPÍTULO II - DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADES CONTRATUAIS ...................... 63

2.1. Das sociedades contratuais .................................................................................................. 63

2.2. Considerações iniciais da dissolução parcial de sociedade no Brasil ..................... 64

2.2.1. A expressão dissolução parcial ........................................................................................ 66

2.3. Breves considerações sobre a dissolução parcial no Direito Comparado .............. 69

2.4. Os princípios aplicados à dissolução parcial .................................................................. 74

2.4.1. Princípio da preservação da empresa ............................................................................. 75

2.4.2. Princípio da função social da empresa ........................................................................... 76

2.4.3. Princípio da livre associação ............................................................................................. 77

2.5. Da dissolução parcial das sociedades contratuais ........................................................ 78

2.6. Da dissolução parcial das sociedades limitadas e a regência supletiva das normas da lei de sociedade anônima ......................................................................................... 81

2.7. As espécies de dissolução parcial das sociedades contratuais ................................. 85

2.7.1. Direito de retirada ................................................................................................................. 86

2.7.1.1. Direito de retirada na sociedade por tempo indeterminado .................................. 87

2.7.1.2. Direito de retirada na sociedade por tempo determinado ...................................... 91

2.7.2. Direito de recesso ................................................................................................................. 92

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2.7.3. Exclusão de sócio ................................................................................................................. 94

2.7.3.1. Exclusão judicial de sócio por falta grave .................................................................. 94

2.7.3.2. Exclusão judicial de sócio por incapacidade superveniente ................................ 99

2.7.3.3. Exclusão de sócio por declaração de falência ou liquidação de quotas ......... 100

2.7.3.4. Exclusão de sócio remisso ........................................................................................... 102

2.7.3.5. Exclusão extrajudicial de sócio por falta grave de sócio minoritário ............... 104

2.7.4. Morte do sócio ..................................................................................................................... 107

2.7.5. Outras causas de dissolução parcial ............................................................................ 108

2.7.5.1. Vontade dos sócios ........................................................................................................ 108

2.7.5.2. Renúncia da qualidade de sócio ................................................................................. 108

2.7.5.3. Dissolução parcial strito sensu ................................................................................... 110

CAPÍTULO III - APURAÇÃO DE HAVERES ............................................................................... 111

3.1. Apuração de haveres ............................................................................................................ 111

3.2. Apuração de haveres extrajudicial .................................................................................... 113

3.3. Apuração de haveres judicial.............................................................................................. 113

3.4. Data da resolução .................................................................................................................. 115

3.5. Os critérios de apuração dos haveres .............................................................................. 117

3.5.1. O critério convencional ..................................................................................................... 118

3.5.2. O critério legal ..................................................................................................................... 121

3.6. O balanço ................................................................................................................................. 123

3.6.1. Balanço de exercício .......................................................................................................... 124

3.6.2. Balanço de cessão ............................................................................................................. 125

3.6.3. Balanço de liquidação ....................................................................................................... 125

3.6.4. Balanço de determinação ................................................................................................. 126

CAPÍTULO IV - AVALIAÇÃO DO PATRÍMÔNIO LÍQUIDO NA DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADES CONTRATUAIS ............................................................................................. 129

4.1. O estabelecimento ................................................................................................................. 129

4.2. Os elementos e os atributos do estabelecimento ......................................................... 135

4.3. Os principais elementos na apuração de haveres ........................................................ 139

4.3.1. A inclusão dos bens imateriais e do aviamento na apuração de haveres .......... 141

4.3.2. Os lucros, reversas, fundos e o pro labore ................................................................. 147

4.3.3. O passivo .............................................................................................................................. 148

CAPÍTULO V - APURAÇÃO DE HAVERES DE SOCIEDADE PROFISSIONAL ................ 150

5.1. Da dissolução parcial da sociedade profissional .......................................................... 150

5.2. Da apuração de haveres na sociedade profissional e a atual posição do Superior Tribunal de Justiça ........................................................................................................................ 151

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5.3. Questão de ordem .................................................................................................................. 156

5.4. A existência de organização empresarial, de estabelecimento e de aviamento na sociedade profissional ................................................................................................................. 158

5.4.1. Da organização da sociedade profissional .................................................................. 163

5.4.2. Da existência de estabelecimento na sociedade profissional ................................ 167

5.4.3. O aviamento e a clientela na sociedade profissional ................................................ 171

5.4.4. Apuração de haveres na sociedade profissional ....................................................... 177

CAPÍTULO VI - MÉTODOS DE AVALIAÇÃO NA APURAÇÃO DE HAVERES ................... 192

6.1. Métodos de avaliação ........................................................................................................... 192

6.1.1. Métodos patrimoniais ........................................................................................................ 193

6.1.1.1. Método de avaliação patrimonial contábil ................................................................ 194

6.1.1.2. Método de liquidação ..................................................................................................... 194

6.1.1.3. Método de avaliação patrimonial pelo mercado ..................................................... 195

6.1.2. Métodos econômicos ......................................................................................................... 195

6.1.2.1. Avaliação com base em empresas similares ........................................................... 196

6.1.2.2. Múltiplos de faturamento ............................................................................................... 196

6.1.2.3. Múltiplos de fluxo de caixa operacional .................................................................... 197

6.1.3. Avaliação com base no Economic Value Added (EVA) ............................................ 198

6.1.4. Método de avaliação com base no fluxo de caixa descontado .............................. 199

6.2. Do método de avaliação na apuração de haveres......................................................... 201

6.3. A revisão dos critérios de apuração de haveres ........................................................... 205

CAPÍTULO VII - PAGAMENTO ..................................................................................................... 208

7.1. Forma de pagamento ............................................................................................................ 208

7.2. Juros e correção monetária ................................................................................................ 211

CAPÍTULO VIII - RESPONSABILIDADE DO SÓCIO APÓS SEU DESLIGAMENTO DA SOCIEDADE ..................................................................................................................................... 214

8.1. A responsabilidade do sócio após seu desligamento da sociedade ....................... 214

CONCLUSÂO ................................................................................................................................... 217

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA .................................................................................................. 220

ANEXO I ............................................................................................................................................ 243

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12

INTRODUÇÃO

O Código Civil introduziu no direito brasileiro a Teoria da Empresa,

em seu Livro II - Do Direito de Empresa, reflexo do Código Civil Italiano (Codice

Civile), que trata da empresa em seu Livro Quinto – Do Trabalho (Libro Quinto - Del

Lavoro).

Ocorre que o atual Código Civil, além de incorporar na sistemática

legislativa nacional a figura do empresário, sujeito de direito que exerce empresa,

substituindo o caráter objetivo da antiga figura do comerciante previsto no Código

Comercial de 1850, unificou o Direito Privado, disciplinando, no mesmo corpo

legislativo, as obrigações e os contratos civis e mercantis.

É certo que a unificação do Direito Privado não se traduziu na perda

da autonomia do Direito Comercial em face do Direito Civil, pois, em termos de

ciência jurídica, a diferença entre as duas áreas continua grande e bem delimitada

pelos princípios que as norteiam.

Para identificar as hipóteses sobre as quais as regras do Direito

Comercial teriam de aplicar-se, o vigente Código Civil apoiou-se na citada Teoria da

Empresa, conceituando, em seu artigo 966, o empresário, como o sujeito de direito

que exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a

circulação de bens ou de serviços e afastando desse âmbito os profissionais

intelectuais que, por força do parágrafo único do mesmo preceito legal, não são

considerados empresários.

Nessa mesma linha, o Código Civil, ao tratar no Livro II, Título II, do

Direto Societário, também restringiu apenas às sociedades que exerçam atividades

próprias de empresário os benefícios do Direito Comercial, distinguindo a sociedade

empresária da sociedade simples (ou seja, não empresária), nos termos de seu

artigo 982.

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Daí ser a sociedade profissional tratada como espécie de sociedade

simples, porquanto não caracterizada como empresária mercê da exclusão legal do

parágrafo único do artigo 966 do Código Civil.

Dessa forma, o Código Civil buscou traçar uma linha entre

empresários e não empresários, para aplicação, ou não, das normas do Direito

Comercial.

Todavia, analisando o tema com maior profundidade, nos parece,

em princípio, que as distinções apontadas pela doutrina não esgotam o tema e

deixam de lado uma das principais celeumas do direito societário: o valor dos

haveres de sócio que se retira da sociedade profissional em caso de dissolução

parcial.

Traçaremos neste trabalho as linhas gerais da teoria da empresa e

de sua aplicação no direito societário, de modo a verificar onde é que se situa, a

rigor, a sociedade profissional (Capítulo I).

Delimitado o tema da posição da sociedade profissional dentro da

teoria da empresa, analisaremos as hipóteses de dissolução parcial das sociedades

contratuais, cujas normas regentes sofreram recentemente novas perspectivas com

a vigência do Código de Processo Civil em 18 de março de 2016 (Capítulo II).

E, via de consequência, diante da saída de sócio em caso de

dissolução parcial da sociedade profissional, cuidaremos da apuração de haveres

(Capítulo III) e da inclusão, ou não, de bens imateriais no cômputo do valor devido

ao sócio desligado, a seus herdeiros ou a seus sucessores (Capítulo IV).

Assentadas essas premissas, iremos nos aprofundar na questão-

chave desta tese que é a da disciplina da apuração de haveres na sociedade

profissional (Capítulo V).

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Nos Capítulos VI e VII serão assentados os métodos de avaliação e

o modo de pagamento decorrentes da análise de bens, direitos e passivo que serão

computados na apuração de haveres.

Por fim, no capítulo VIII será tratado da responsabilidade do sócio

que se desligou da sociedade.

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CAPÍTULO I

DA SOCIEDADE PROFISSIONAL

1.1. A Teoria dos Atos do Comércio do Código Comercial de 1850 – Sociedade

Comercial e Civil

O comércio é da essência da convivência em grupo, sendo que, no

início da civilização conhecida, a troca se fazia de bens por bens. A necessidade de

facilitar a valoração das coisas ocasionou a troca de um determinado bem pela

moeda, para isso servindo, inicialmente, um bem qualquer (conchas, gado, certos

metais raros) e, depois, algumas mercadorias determinadas, com valor intrínseco.

Com a evolução dos tempos, essas simples mercadorias foram sendo

sucessivamente substituídas por outras de maior valia (cobre, prata, ouro), até

chegar, nos dias atuais, à sua emissão pelo Estado, com a progressiva substituição

de seu valor intrínseco por outro, a pensar-se em substituí-la por um valor não

intrínseco, mas fictício, mas dependendo de certos fatores de garantia do Estado

emissor. Essa garantia pode ter por fundamento a riqueza potencial do Estado

emissor e não a existência, em espécie, de certa quantidade de metais, em

depósito, equivalente ao valor atribuído às moedas emitidas1.

Os comercialistas divergem quanto à origem do Direito Comercial,

porém afirmam que, na Idade Antiga, não havia distinção entre o que hoje

conhecemos como Direito Civil e Direito Comercial, pois ambos estavam

incorporados no conceito de Direito Privado Comum. 2 A doutrina tem pontuado ser

a Idade Média o berço do Direito Comercial como regime jurídico autônomo ao Civil,

garantindo certos privilégios àqueles que buscavam empreender-se por meio de 1 MARTINS, Fran. Curso de direito comercial: empresa comercial, empresários individuais microempresas, sociedades empresárias, fundo de comércio. 35. ed. ver. atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2012, p. 1-2. 2 Os grandes historiadores do Direito Comercial, versando sobre aquela época, são praticamente unânimes em afirmar que a disciplina da atividade comercial em Roma estava submetida ao Direito Privado Comum, ou seja, ao Direito Civil (ius privatorum). Havendo necessidade, o conteúdo deste Direito era alargado pelos poderes do pretor, elaborado e adaptado sobre a base do princípio da equidade. Nas circunstâncias sob as quais se desenvolvia o comércio na sociedade romana, tal sistema revelou-se suficientemente adequado. Anota Angelo De Martini que o comércio em Roma apresentava um caráter tipicamente externo, ou seja, regulado pelo jus gentium e aplicado pelo praetor peregrinas ou pelo praetor urbanus, tutelando o comércio exercitado por estrangeiros (VERÇOSA, Haroldo Malheiros Dulclerc. Curso de Direto Comercial: Teoria Geral do Direito Comercial e das Atividades Empresariais Mercantis. Introdução à Teoria Geral da Concorrência e dos Bens Imateriais. 2. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2008, p. 35).

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atividade mercantil. Por conta da fragilidade do Estado à época e de não existir um

poder centralizado, mas pulverizado em feudos, a burguesia, a então classe social

em ascendência, cujo principal ofício era o comércio, criou a denominada

Corporações de Ofício que tinham como função regular as relações entre

comerciantes3. O Direito Comercial, nessa época, tem como marca o

corporativismo, sendo considerado comerciante quem estivesse inscrito em uma

corporação de ofício. Surgem nessa fase a matrícula dos comerciantes, o regime

dos livros comerciais, as instituições financeiras, a letra de câmbio etc.4

Passada a fase corporativista – subjetiva, de proteção de classe –,

iniciou-se na França, com a promulgação do Código Napoleônico de 1807, a fase

objetiva do Direito Comercial, com a adoção da Teoria dos Atos de Comércio, pela

qual era considerado comerciante quem habitualmente, com intuito de lucro,

praticasse os chamados Atos de Comércio5, uma série de condutas constantes da

legislação mercantil em uma lista taxativa. Nessa fase não era levada em

consideração a pessoa que exercia a atividade, mas, sim, a atividade por ela

exercida6.

3 Desta feita, o direito comercial surgiu na Idade Média, “como um fenômeno histórico, cuja origem é ligada à afirmação de uma civilização burguesa e urbana, na qual se desenvolve um novo espírito empreendedor e uma nova organização dos negócios. Essa nova civilização urge, justamente, nas comunas italianas” (FINKELSTEIN, Maria Eugênia. Manual de direito empresarial. 8. ed. rev., ampliada e reformulada. São Paulo: Atlas, p. 4, 2016). 4 Na Idade Média, houve um deslocamento do centro econômico do campo para as cidades, que passaram a desempenhar um papel econômico, político e social contrastante com o regime até então existente. A burguesia nascente contrapôs-se ao feudo. Classes de profissionais (mercadores e artesãos) passaram a exercer as atividades negociais sob o manto de associações profissionais – as corporações de artes e de ofícios. A par do papel relevante exercido pelas cidades medievais, as feiras e os mercados contribuíram decisivamente para o desenvolvimento de um forte comércio interno e internacional na Europa. (VERÇOSA, Haroldo Malheiros Dulclerc. Curso de Direto Comercial: Teoria Geral do Direito Comercial e das Atividades Empresariais Mercantis. Introdução à Teoria Geral da Concorrência e dos Bens Imateriais. 2. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2008, p. 36). 5 Um fenômeno social e político, todavia, próprio da época de Bonaparte, provocou nova orientação, essa arraigadamente objetivista. O Código Napoleônico de 1807 adotou declaradamente o conceito objetivo, estruturando-o sobre a teoria dos atos de comércio. Agindo assim, os legisladores do Império punham-se a serviço dos ideais da Revolução Francesa, de igualdade de todos perante a lei, excluindo o privilégio de classe. Não se concebia, diante dessa filosofia política, um código destinado a garantir, numa sociedade fundada sobre o princípio da igualdade de todos perante a lei, prerrogativas e privilégios dos mercadores. É de se recordar que "todas as espécies de corporações de cidadãos do mesmo estado e profissão", resquícios da organização feudal, haviam sido proibidas pela Lei de 14 de junho de 1791, a célebre Lei Le Chapelier, "sob qualquer forma que seja...". Com isso pretendia a Convenção assegurar a plena liberdade profissional, extinguindo todos os privilégios que as corporações acumularam através de séculos a favor dos comerciantes. O Código de Comércio passava a ser, destarte, em 1807, um estatuto disciplinador dos atos de comércio, a que estavam sujeitos todos os cidadãos. (REQUIÃO, Rubens, Curso de Direito Comercial. v. 1, 31. ed., São Paulo: Saraiva, 2012, p. 14). 6 [...] a grande inovação do Código francês foi o caráter objetivo que imprimiu ao direito comercial. Rompendo com a tradição que via nele o direito de uma classe – o direito dos comerciantes –, o Código francês quis ser unicamente o direito dos atos de comércio. (BORGES, João Eunápio. Curso de direito comercial terrestre. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1971, p. 32).

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No Brasil colônia, as primeiras regras comerciais foram as ditadas

por Portugal, que continuaram vigendo mesmo após a Declaração de

Independência, em 1822, estando entre elas a Lei da Boa Razão, que determinava

a aplicação subsidiária das leis comerciais vigentes nas “nações cristãs, iluminadas

e polidas, que com elas estavam resplandecendo na boa, depurada e sã

jurisprudência”, ensejando, assim, fossem aqui aplicadas as regras comerciais

francesa e espanhola.7

Após essa fase inaugural, foi promulgada a Lei nº. 556, de 25 de

junho de 1850, que instituía o Código Comercial do Império do Brasil, com forte

influência dos códigos francês, espanhol e português. Diferentemente do que se

poderia imaginar, o Código Comercial de 1850 não adotou a Teoria dos Atos de

Comércio, uma vez que, em seu artigo 4º, conceituou como comerciante aquele que

tivesse matrícula em algum dos Tribunais do Comércio do Império e que fizesse da

mercancia sua profissão habitual8. Todavia, como o conceito de comerciante trazido

pelo código gerava dificuldade sobre o que vinha a ser mercancia, foi editado o

Regulamento 7379 do mesmo ano, norma de direito processual, que, em seu artigo

1910, definiu o conceito de mercancia, integrando o conceito de comerciante do

Código Comercial de 1850 e, assim, introduzindo o caráter objetivo da Teoria dos

Atos de Comércio.

O Código Comercial de 1850 tratava do comerciante individual e

também das Companhias e Sociedades Comerciais (artigos 287 e seguintes),

destinadas à prática habitual de atos de comércio, vindo o Código Civil de 1916 a

chamá-las de Sociedades Mercantis (art. 16, II), reservando para as que não

exercessem os atos de comércio de forma habitual a denominação de Sociedades 7 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Marcia Carla Pereira. Curso avançado de Direito Comercial. 4. ed., atual. e ver. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 29. 8 Artigo 4º do Código Comercial de 1.850. “Ninguém é reputado comerciante para efeito de gozar da proteção que este Código liberaliza em favor do comércio, sem que tenha matriculado em algum dos Tribunais do Comércio do Império, e faça da mercancia profissão habitual”. 9 Decreto n.º 737, de 25 de novembro de 1850. Determina a ordem do Juízo no Processo Commercial. 10 Artigo 19 - Considera-se mercancia: § 1º A compra e venda ou troca de effeitos moveis ou semoventes para os vender por grosso ou a retalho, na mesma especie ou manufacturados, ou para alugar o seu uso. § 2º As operações de cambio, banco e corretagem. § 3º As emprezas de fabricas; de com missões; de depositos; de expedição, consignação e transporte de mercadorias; de espectaculos publicos. § 4.º Os seguros, fretamentos, risco, e quaesquer contratos relativos ao cornmercio maritimo. § 5. º A armação e expedição de navios.

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Civis (art. 16, I), figurando entre elas, por exemplo, as prestadoras de serviços e,

pois, as sociedades profissionais dedicadas a medicina, enfermagem, engenharia,

advocacia etc.

A extinção dos Tribunais do Comércio, em 1875 e a consequente

unificação da jurisdição civil e da comercial em uma só minimizaram a importância

da distinção entre a condição jurídica do comerciante e a do não comerciante, e o

elenco do art. 19 do Regulamento 737 acabou por tornar-se mero indicativo para a

definição da atividade mercantil, perdendo sua força legal imperativa. Comerciante

deixa de ser aquele que pratica determinados atos delimitados pela lei e passa a ser

aquela pessoa que, profissionalmente, pratica a mercancia considerada como a

atividade de intermediação entre o produtor e o consumidor, exercida com fim

lucrativo11.

1.2. A Teoria da Empresa no Código Civil Brasileiro de 2002

A Teoria da Empresa foi adotada pelo Código Civil Italiano de

194212, que alterou o foco do Direito Comercial – antes de caráter objetivo –, pois

que, posto na Teoria dos Atos de Comércio do Código de Comércio francês de

1807, lhe realçava o aspecto subjetivo. Nessa nova perspectiva, importa é o sujeito

de direito que exerce profissionalmente atividade econômica organizada com o fim

da produção ou troca de bens ou de serviços, vale dizer, o empresário.

A evolução ocorrida a partir da Teoria dos Atos do Comércio para a

Teoria da Empresa está relacionada à distinção entre ato e atividade. Enquanto ato

é cada parte de uma peça, significa algo que se exaure, que é completo e alcança o

resultado pretendido, que atinge a finalidade para a qual foi praticado sem a

necessidade de outro ato; a atividade é o conjunto de atos coordenados para

alcançar um fim comum. Não é uma mera sequência de atos, é necessária a

11 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Marcia Carla Pereira. Curso avançado de Direito Comercial. 4. ed. atual. e rev. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 30. 12 ITÁLIA. Regio decreto-legge 16 marzo 1942, n.º 262. Codice Civile Italiano Del 1942. Disponível em: <

http://www.normattiva.it/uri-res/N2Ls?urn:nir:stato:decreto.regio:1942-03-16;262!vig=> Acesso em: 09 abr. 2017.

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coordenação, como ocorre, por exemplo, com as linhas de produção de

automóveis.13

Com a entrada em vigor da Lei n.º 10.406, de 10 de janeiro de 2002,

que instituiu o Código Civil14, foi revogada a primeira parte da Lei n.º 556, de 25 de

junho de 1850 (Código Comercial de 1850)15, e deixado de lado o modelo francês

da Teoria dos Atos de Comércio, adotando-se o modelo italiano da Teoria da

Empresa, positivado em seu Livro II – Do Direito de Empresa16. Com a parcial

revogação do Código Comercial de 1850, restou, todavia, em plena vigência, a sua

segunda parte (artigos 457 a 796), que trata do direito marítimo.

Em sentido oposto, buscando nova codificação do Direito Comercial,

retomando a sistemática anterior de separação do Direito Privado em códigos

independentes, Civil e Comercial, tramita, no Congresso Nacional, o Projeto do

Código Comercial17 de iniciativa do deputado Vicente Candido.18 Referido código

projetado também utiliza a Teoria da Empresa, mantendo o atual entendimento

sobre o tema, mas buscando sistematizar de forma própria o Direito Comercial.

13 TEIXEIRA, Tarcisio. Direito Empresarial Sistematizado. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 32. 14 O Projeto de Código Civil tramitou nas casas legislativas desde 1975. 15 Artigo 2.045 do Código Civil - Revogam-se a Lei no 3.071, de 1º de janeiro de 1916 - Código Civil e a Parte Primeira do Código Comercial, Lei n. 556, de 25 de junho de 1850. 16 Artigo 966 a 1.195 do Código Civil 17 Projeto de Lei nº 1.572/2011. Deputado Vicente Candido. Projeto do Código Comercial. 18 O Projeto de Lei n. 1.572/2011 adotou este modelo de sistematização do direito comercial. Quando aprovado, ele conviverá, de um lado, com o Código Civil, pondo-se em relação a este como um microssistema; e conviverá, de outro lado, com a Lei de Propriedade Industrial (lei n. 9.279/96), com a Lei Falimentar (lei n. 11.101/2005) e com a Lei das Sociedades por Ações (lei n. 6.404/76), que não serão revogadas. Estas serão, em relação ao Código Comercial, estruturadoras de microssistemas. O direito comercial, hoje, no Brasil, reclama urgente sistematização. Um Código Comercial cumpre melhor esta função do que uma série não sistematizada de pequenos diplomas legais, específicos de seus desdobramentos. A economia brasileira precisa de uma codificação que enuncie os princípios próprios do direito comercial, para que as relações entre empresários deixem de ser consideradas e julgadas à luz de princípios “sistemicamente alienígenas”, como são os do direito civil e do direito do consumidor. A convivência do Código Comercial com as leis próprias dos microssistemas de direito intelectual, falimentar e acionário, inclusive atende igualmente à preocupação manifestada por alguns advogados, relativamente à insegurança jurídica que poderia ser causada por mudanças profundas no direito positivo. Com certeza, introduzir, na disciplina jurídica das relações entre empresários, alterações radicais e repentinas geraria um ambiente de insegurança jurídica, pernicioso para a economia. Mas não é isto que pretende o Projeto de Lei n. 1.572/2011. No que diz respeito aos microssistemas acima referidos (propriedade industrial, falência e recuperação de empresas e sociedades anônimas), nenhuma mudança substancial decorrerá de sua aprovação (COELHO, Fábio Ulhoa. Princípios do direito comercial: com anotações ao projeto de código comercial. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 64-65).

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1.3. Do empresário

Como dito, o Código Civil (Lei nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002)

introduziu no direito brasileiro a Teoria da Empresa em seu Livro II - Do Direito de

Empresa, reflexo do Código Civil Italiano (Codice Civile - Regio Decreto nº. 262 - 16

marzo 1942) que trata da empresa em seu Livro Quinto – Do Trabalho (Libro Quinto

- Del Lavoro). Assim como consta no artigo 2.082 do Código Civil Italiano19, o artigo

966 do Código Civil20 brasileiro conceituou o empresário como o sujeito de direito

que exerce a empresa. E, em seguida, no artigo 2.555 do Código Civil Italiano21, o

legislador conceituou a azienda, tratada no direito nacional no artigo 1.14222, como

estabelecimento23:

Diante das disposições do recém-editado Codice Civile, Alberto

Asquini24 tratou a empresa como fenômeno econômico poliédrico que se decompõe

em quatro perfis jurídicos, os quais correspondem à noção de empresa como

empresário (perfil subjetivo), de empresa como atividade empresarial (perfil

funcional), de empresa como patrimônio aziendal ou estabelecimento (perfil

patrimonial e objetivo) e, por fim, de empresa como instituição (perfil corporativo).

Ocorre que, diferentemente do que se tem no direito italiano, no

brasileiro, o perfil corporativo ou institucional da empresa, como acima citado, não é

tratado pelo Direito Comercial, mas, sim, pelo Direito do Trabalho e, portanto, no

sistema pátrio, os perfis da empresa se resumem a 3 (três): o subjetivo, o funcional

e o objetivo25, fruto da conjunção dos artigos 966 e 1.142 do Código Civil, no qual o

19 Art. 2.082. (Imprenditore). E' imprenditore chi esercita professionalmente una attivita' economica organizzata al fine della produzione o dello scambio di beni o di servizi. 20 Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços. 21 Art. 2.555. (Nozione). L'azienda e' il complesso dei beni organizzati dall'imprenditore per l'esercizio dell'impresa. 22 Art. 1.142. Considera-se estabelecimento todo complexo de bens organizado, para exercício da empresa, por empresário, ou por sociedade empresária. 23 Por influência francesa e italiana o “estabelecimento” possui como sinônimas as expressões: estabelecimento comercial, estabelecimento empresarial, fundo de comércio, fundo de negócio, azienda, fazenda etc. 24 ASQUINI, Alberto. Perfis da empresa (Profili dell'impresa). Tradução de Fábio Konder Comparato. Revista de Direito Mercantil, Econômico e Financeiro, São Paulo, n. 104, p. 109-114 out./dez. 1996. A respeito da teoria de Asquini, vide também PRAGMÁCIO FILHO, Eduardo. Um breve diálogo entre a teoria da empresa e a sucessão trabalhista. In: ALMEIDA, Renato Rua de (Coord.). Aplicação da teoria do diálogo das fontes no direito do trabalho. São Paulo: LTr, 2015. 25 O professor Waldirio Bulgarelli, ao considerar o perfil corporativo, afastou-o da concepção empresarial italiana. Aqui, o mestre paulista se distância da teoria de Asquini para conceber não quatro, mas três aspectos jurídicos

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empresário é tratado como sujeito de direito (pessoa natural ou jurídica) que, por

meio de seu estabelecimento, explora profissionalmente atividade econômica,

organizada para produção ou circulação de bens ou de serviços26.

Em que pese a empresa ser um fenômeno econômico, a lei civil

buscou caracterizá-la como uma atividade econômica organizada para a produção

ou para a circulação de bens e de serviços27. Tal concepção encontra dificuldade de

compreensão pela própria evolução da empresa devido ao avanço tecnológico, ao

aumento do poder negocial, à produção em massa e às novas técnicas negociais

desenvolvidas que evidenciam a necessidade de criação de novos institutos

jurídicos.28

significativos de empresa: o empresário, o estabelecimento e a empresa: o primeiro corresponde ao perfil subjetivo; o segundo, ao objetivo ou patrimonial; e o terceiro, ao aspecto funcional, ou exercício da atividade empresarial. Relacionam-se o empresário, o estabelecimento e a empresa de forma íntima: o sujeito de direito exercita (empresário), por meio do objeto de direito (estabelecimento) e os fatos jurídicos decorrentes (empresa). A partir desses elementos, Waldirio Bulgarelli define empresa como “atividade econômica organizada de produção e circulação de bens e serviços para o mercado, exercida pelo empresário, em caráter profissional, através de um complexo de bens” (NEGRÃO, Ricardo, Manual de Direito Comercial e de Empresa. v. 1, 5. ed. ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 45-46). 26 Ao conceito básico de empresário se ligam as noções, também fundamentais, de empresa e de estabelecimento. São três noções distintas, mas que, na realidade, se acham estreitamente correlacionadas. O empresário, como vimos, é um sujeito de direito, e a empresa é a atividade por ele organizada e desenvolvida, através do instrumento adequado que é o estabelecimento. A figura do empresário é determinada pela natureza da atividade por ele organizada e dirigida; sob este aspecto, a noção de empresário é, logicamente, um corolário da noção de empresa. Por sua vez, o conceito de estabelecimento é correlativo ao conceito de empresa. O exercício da atividade econômica organizada pelo empresário pressupõe, necessariamente, uma base econômica, ou seja, um complexo de bens que constituem o instrumento e, de certo modo, o objeto de seu trabalho. Esse complexo de bens destinados pelo empresário ao exercício da empresa é a fazenda ou o estabelecimento. Nesse sentido, pode-se dizer que o estabelecimento representa a projeção patrimonial da empresa, ou, com precisão maior, o organismo técnico-econômico, por cujo intermédio se realiza a coordenação dos fatores de produção pela qual a empresa atua e se desenvolve (BARRETO FILHO, Oscar. Teoria do Estabelecimento Comercial. 2. ed. São Paulo, Saraiva, 1988, p. 115-116). 27 O que caracteriza, em termos pragmáticos, a empresa, não é a própria organização em si, mas a forma de produzir organizadamente, o que não é o mesmo que organização da atividade de produção. Em termos históricos, por exemplo, é incontestável que a perspectiva pela qual se deve ver a empresa é justamente a da evolução das técnicas de produção, portanto, forma de produzir que, de rudimentar familiar e artesanal, passou a ser mecanizada ou maquinizada, com mão de obra alheia e com maior grau de organização, já que esta última sempre existiu e existe em qualquer tipo de trabalho. A organização é termo abstrato significativo dos elementos organizados em que se concretiza. O que é importante para a Economia e a Sociologia não é a organização, mas a atividade organizacional, o produzir de forma organizada. Veja-se, por exemplo, em termos de organização técnica, que é a do estabelecimento, as discussões sobre a sua qualificação como tal, quando desativado, paralisado. Assim, também em relação à empresa, como organização: tudo é feito para que não fique estática, não se paralise, o que se justifica também, e principalmente, em relação aos trabalhadores. Ora, o aspecto dinâmico, destacado por Carnelutti e que Asquini chamou de conceito cinematográfico é o que efetivamente interessa ao Direito. E por essa perspectiva, o dinamismo da empresa significa no pleno jurídico a atividade desenvolvida (BULGARELLI, Waldírio. A Teoria Jurídica da Empresa: Análise jurídica da empresarialidade. 8. ed. São Paulo: RT, 1985, p. 149-150). 28 “La producción industrial en masa constituye efectivamente la característica dominante de la civilización moderna; civilización realmente sin antecedentes históricos, de la que es quizá su mejor característica, y hacia la que tendien aun cuando por caminos diversos, todos los paises. Por esto la producción industrial en masa es el punto de donde mejor se captan por un lado las transformaciones que caracterizan nuestra época y por otro los diálogos de la misma, que encuentran en ella una premisa común y cuyo incremento es por lo demás deseado por todos. Éste es también el punto de vista que permite captar mejor las peculiaridades del mundo moderno.

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A organização da atividade, centro do conceito da empresa, está

caracterizada no poder diretivo do empresário que coordena os fatores de produção

(capital, mão de obra, insumos e tecnologia) para produção ou circulação de bens

ou de serviços, buscando a obtenção de lucro.29 Dessa feita, a empresa, fenômeno

econômico conhecido pelo convívio em sociedade, passou a ser, com o Código

Civil, o eixo fundante do Direito Comercial e que, portanto, acarreta no objeto de

estudo desta disciplina.

Il requisito dell´organizzazione alla normale modalità di svolgimento dell´ attività da parte dell` imprenditore, il quale coordina e combina tra di loro i fattori della produzione impuegati (capitale finanziario, forza-lavoro, riore naturali o acquisite, macchinari), in vita del riultato produttivo finale. Usualmente, infatti, il´ imprenditore si avvale, nell´esercizio della sua attività, di un compleo apparato produttivo formato da lavoratori dispendenti e da

Los problemas que se plantean en el derecho moderno, son en realidad los que surgen de una producción industrial en masa y las dificultades nacen a menudo de la discordancia entre una realidad económica caracterizada por la producción industrial en masa y categorías jurídicas elaboradas con anterioridad. No sólo la elaboración tradicional del Derecho Romano y de la common law, sino también la elaboración de la codificación napoleónica y de la pandectistica son anteriores a la producción industrial en masa. En realidad, incluso, la elaboración de la codificación napoleónica y de la pandectística se refiere a una sociedade artesana y mercantil más que industrial; a la importancia predominante de las rentas de capital respecto de las rentas de trabajo y de actividad; a la sociedad que encontramos descrita en las novelas de Balzac y de Stendhal y que ignoraba todavía electricidad, automóviles, máquinas de escribir y los mismos ferrocarriles, cuyas redes sólo se difunden a mediados del siglo XX. Es el desarrollo de la indústria el que se traduce en una profunda transformación en toda nuestra estructura económica y social; en todas nuestras costumbres; en todas nuestras valoraciones, incluso en aquellas que podrían parecer más dependientes de factores naturales. Quizá la tarea más urgente de la doctrina jurídica (tarea que no puede realizar el legislador, que necesita, para procurarse un arsenal de instrumentos utilizables, la prévia elaboración de la doctrina) es el de laborar un arsenal conceptual apto para la valoración normativa de los problemas planteados por la producción industrial en masa y adecuado, precisamente, con aquella estructura económica y social propia de la misma. Esta tarea afecta naturalmente a todo el derecho, incluso en sus sectores más tradiconales, ya que todos los problemas se presentan diversos en el paso de una economía agrícola y meramente comercial a una economía industrializada. Frente a esta tarea el jurista es llamado a una más atenta consideración de la realidad y a una conciencia crítica de los própios instrumentos, precisamente porque la complejidad de uma economía industrial hace cada vez más dificil poder confiarse a la inmediata intuición de las situaciones sociales, que puede ser suficiente en el caso de estructuras sociales más simples”, advertindo ao final que: “La frecuente referencia a conceptos económicos o a consideracciones de substancia y no de forma, facilmente criticables ya que el derecho sólo puede actuar utilizando conceptos jurídicos esconde en realidad la exigência de una elaboración de conceptos jurídicos diversos de los recibidos del derecho tradicional y más adecuados a la disciplina jurídica de una vida que se ha venido transformando profundamente” (ASCARELLI, Tullio. Teoria de la Concurrencia y de los Bienes Inmateriales. Barcelona: Bosch, 1970, p. 17.). 29 O empresário assim organiza a sua atividade, coordenando os seus bens (capital) com o trabalho aliciado de outrem. Eis a organização. Mas essa organização, em si, o que é? Constitui apenas um complexo de bens e um conjunto de pessoal inativo. Esses elementos – bens e pessoal – não se juntam por si; é necessário que sobre eles, devidamente organizados, atue o empresário, dinamizando a organização, imprimindo-lhes atividade que levará à produção. Tanto o capital do empresário como o pessoal que irão trabalhar nada mais são isoladamente do que bens e pessoas. A empresa somente nasce quando se inicia a atividade sob a orientação do empresário. Dessa explicação surge nítida a ideia de que a empresa é essa organização dos fatores de produção exercida, posta a funcionar, pelo empresário. Desaparecendo o exercício da atividade organizada do empresário, desaparece, ipso facto, a empresa. Daí por que o conceito de empresa se firma na ideia de que é ela o exercício de atividade produtiva. E do exercício de uma atividade não se tem senão uma ideia abstrata. (REQUIÃO, Rubens, Curso de Direito Comercial. V. 1, 31. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 85-86).

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beni strumentali e ciò che contrad - distingue e giustifica tale sua qualifica è proprio l´ impiego coordinato di tali fattori produttivi30.

A empresa não existe isoladamente, é necessário que se formem

relações jurídicas entre empresas e terceiros31. Não se pode caracterizar empresa

e, portanto, empresário e estabelecimento, sem atividade voltada para o mercado.

Um empresário perde essa característica se cessarem suas atividades, se

extinguirem suas relações jurídico-econômicas com os demais agentes do mercado,

outros empresários e consumidores. O mesmo ocorre com o estabelecimento de

que, sem a empresa, perde seus atributos e, assim, a capacidade de gerar lucros32.

Empresas são estruturas mediante as quais são ordenados, providos ou conformados os fatores de produção de molde a facilitar a coordenação das atividades econômicas voltadas para mercados. Podem ser entendidas como instituição social que, em muitas circunstancias, prescindiriam de normas positivadas, uma espécie de hierarquia socialmente aceita33.

É com a empresa que se define o empresário e não o inverso. É a

empresa o núcleo do Direito Comercial na atualidade, onde se localiza o

empresário, que, pela titularidade da empresa, ganha destaque e submete-se a um

estatuto, a um regime jurídico especial.34

A atual versão do Código Comercial Projetado, diferentemente do

que fez o Código Civil, buscou conceituar a empresa (art. 2º 35) e, posteriormente de

30 O requisito da organização se relaciona com o modo exploração da atividade pelo empreendedor que coordena e combina, uns com os outros, os fatores de produção (capital financeira, força de trabalho, recursos naturais ou adquiridos, equipamentos), buscando como resultado o produto final. Normalmente, na verdade, o empreendedor utiliza, no exercício da sua atividade, de um complexo aparato produtivo formado por trabalhadores e bens de capital o que distingue e justifica sua qualidade é o emprego coordenado desses fatores de produção. – Tradução livre o autor. (COSTAGLIOLA, Anna. Compendio di Diritto commerciale: Riferimenti dottirnali e giuriprudenziali. Santarcangelo di Romagna: Maggiola Editore, 2016, p. 26). 31 Os embates jurídicos sobre a noção de empresa deixam entrever que, em muitas situações, ela transforma-se em centro de imputação de direito, deveres e obrigações, independentemente do empresário ou da sociedade empresária. A empresa interessa ao mundo jurídico, impactando-o independentemente de seus titulares. Há situações em que a mera existência da atividade gera a composição de suportes fáticos e produz consequências jurídicas. (FORGIONI, Paula Andrea, A evolução do direito comercial brasileiro: da mercancia ao mercado. 3. ed.. ver. atul. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, p. 91-92). 32 FORGIONI, Paula Andrea, A evolução do direito comercial brasileiro: da mercancia ao mercado. 3. ed.. ver. atul. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, p. 72-73 33 SZTAJN, Raquel. Teoria Jurídica da Empresa: atividade empresária e mercados. 2. ed.. São Paulo, Atlas, 2010, p. 52. 34 LEMOS JUNIOR, Eloy Pereira, Empresa & Função Social. Curitiba: Juriá, 2009, p. 120-121. 35 Art. 2º. Empresa é a atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens ou serviços.

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forma apartada, aqueles que seriam considerados empresários (art. 1236), porém

mantendo a mesma ideia existente com relação ao tema na legislação vigente37.

1.4. Dos não empresários – os profissionais intelectuais

Pela legislação aplicável, não são considerados empresários: (i)

aqueles que não se enquadram no conceito do artigo 966 do Código Civil38., (ii) os

profissionais intelectuais (ex. advogado, dentista, médico, engenheiro, músico, ator,

escritor etc.), exceto quando caracterizado elemento de empresa (artigo 966,

parágrafo único, CC); (iii) os empresários rurais não registrados na Junta Comercial

(artigo 971 do, CC)39; e (iv) as cooperativas (artigo 982, parágrafo único, CC)40.

36 Art. 12. Considera-se empresário: I – a pessoa natural que explora profissionalmente uma empresa; e II – a sociedade que adota qualquer um dos tipos regulados por este Código. § 1º. A pessoa natural que exerce atividade rural não é empresária, a menos que inscrita no Registro Público de Empresas. § 2º. A sociedade cooperativa não é empresária e rege-se exclusivamente pela legislação especial. § 3º. Empresário formal é o regularmente registrado no Registro Público de Empresas. § 4º. O registro de empresário individual pode ser, a pedido do interessado, convertido em registro de sociedade, e este naquele. 37 Diferentemente da atual versão do Projeto de Código Comercial que tramita pelo Congresso Nacional, a proposta inicial previa a adoção de um critério formal para identificação do empresário, exigindo a inscrição do empresário, pessoa física ou jurídica, no Registro Público de Empresas – “Art. 9º. Empresário é quem, sendo pessoa física ou sociedade, está inscrito como tal no Registro Público de Empresas”. 38 Inicialmente, não podem ser consideradas empresárias as pessoas que não exploram atividade econômica, como ocorre, por exemplo, com as pessoas assalariadas e as entidades sem fins lucrativos (associações, fundações, entidades religiosas, partidos políticos etc.). Nem toda atividade econômica é desenvolvida por empresários, existem pessoas que não se enquadram no artigo 966 do Código Civil, mas desenvolvem atividade econômica, como, por exemplo, uma pessoa que resolve vender o seu carro. No momento da compra e venda, ela estará praticando uma atividade econômica, porém lhe falta elemento essencial para ser considerada empresária, como o profissionalismo que não existe sem a habitualidade. O que pode ser definitivo para qualidade de empresário está no conceito legal que incorpora a finalidade de sua atividade, pois, em regra, obrigações civis não se relacionam a uma atividade econômica habitual, mas a um ato esporádico, acidental. Mais que isso, uma obrigação civil não é essencialmente realizada com a finalidade de obter lucro, que pode até acontecer, mas que é acidental. Na relação contratual de direito civil, o que importa é a realização do contrato em si, não a finalidade da obtenção de t lucro. Em outras palavras, pelo Direito Civil não interessa se o ato em questão se relaciona a uma atividade profissionalmente empreendida. Em termos econômicos, o empresário desenvolve atividade de produção de bens ou serviços, interessado no valor de troca desses mesmos bens ou serviços, que serão adquiridos por seus clientes, segundo seu valor de uso. A importância do bem ou serviço para o cliente é diferente da importância dada a ele pelo empresário. Para este, basta que o valor de troca permita cobrir os custos de produção e garantir-lhe retorno do investimento. Para aquele, o preço é secundário, pois o bem ou serviço é necessário para a satisfação de alguma necessidade. 39 O produtor rural, ou seja, aquele que explora a atividade rural de forma organizada, é o único que tem a opção de escolher entre ser empresário ou não, devendo sua escolha ser declarada pela inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis da respectiva sede a cargo das Juntas Comerciais, caso em que, depois de inscrito, ficará equiparado, para todos os efeitos, ao empresário sujeito a registro, conforme preceitua os artigos 971 e 984 , ambos do Código Civil. 40 As sociedades cooperativas, independentemente da forma de exploração de seu objeto social, serão consideradas sociedades simples (não empresárias), por força do disposto no parágrafo único do artigo 982 do Código Civil e da Lei nº 5.764, de 16 de dezembro de 1971.

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Como esta tese tem como ponto focal a sociedade profissional,

necessário explorar a posição dos profissionais intelectuais41 dentro da Teoria da

Empresa.

O profissional intelectual, também conhecido como autônomo ou

liberal, apesar de explorar profissionalmente atividade econômica organizada

voltada para o mercado, está excluído da caracterização de empresário, quando

explorar exclusivamente sua atividade profissional, segundo o disposto no parágrafo

único do artigo 966 do Código Civil42, mesmo que com o concurso de auxiliares ou

colaboradores.

[...] não obstante produzir serviços, como o fazem os chamados profissionais liberais, ou bens, como o fazem os artistas, o esforço criador que implanta na própria mente do autor, de onde resultam, exclusiva e diferentemente, o bem ou o serviço, sem interferência exterior de fatores de produção, cuja eventual ocorrência é, dada a natureza do objeto alcançado, meramente acidental43.

Considera-se profissional liberal ou autônomo aquele que exerce

sua atividade profissional, porém sem subordinação, afastando assim a incidência

das regras do Direito do Trabalho44. No caso do exercício de atividade econômica

por pessoa natural que explora profissão dita intelectual, cujo resultado de sua

41 A expressão “profissional intelectual” será utilizada ao longo deste trabalho por conta de seu uso no artigo 966, parágrafo único, do Código Civil. 42 Enunciado 193 do Conselho de Estudos Jurídicos do Conselho de Justiça federal. “ O exercício das atividades de natureza exclusivamente intelectual está excluído do conceito de empresa”. 43 BARRETO FILHO, Oscar. Teoria do Estabelecimento Comercial. 2. ed.. São Paulo: Saraiva, 1988, p. 112. 44 O trabalhador autônomo consiste, entre todas as figuras próximas à do empregado, naquela que tem maior generalidade, extensão e importância sociojurídica no mundo contemporâneo. Na verdade, as relações autônomas de trabalho consubstanciam leque bastante diversificado, guardando até mesmo razoável distinção entre si. Os diversificados vínculos de trabalho autônomo existentes afastam-se da figura técnico-jurídica da relação de emprego essencialmente pela falta do elemento fático-jurídico da subordinação. Contudo, podem se afastar ainda mais do tipo legal celetista, em decorrência da falta de um segundo elemento fático-jurídico, a pessoalidade. Noutras palavras, o trabalhador autônomo distingue-se do empregado, quer em face da ausência da subordinação ao tomador dos serviços no contexto da prestação do trabalho, quer em face de também, em acréscimo, poder faltar em seu vínculo com o tomador o elemento da pessoalidade. A subordinação, como se sabe, é aferida a partir de um critério objetivo, avaliando-se sua presença na atividade exercida, no modo de concretização do trabalho pactuado. Ela ocorre quando o poder de direção empresarial exerce-se com respeito à atividade desempenhada pelo trabalhador, no modus faciendi da prestação de trabalho. A intensidade de ordens no tocante à prestação de serviços é que tenderá a determinar, no caso concreto, qual sujeito da relação jurídica detém a direção da prestação dos serviços: sendo o próprio profissional, desponta como autônomo o vínculo concretizado; sendo o tomador de serviços, surge como subordinado o referido vínculo. [...] O trabalho autônomo pode, contudo, ser pactuado com cláusula de rígida pessoalidade – sem prejuízo da absoluta ausência de subordinação. É o que tende a ocorrer com a prestação de serviços contratada a profissionais de nível mais sofisticado de conhecimento ou habilidade, como médicos, advogados, artistas, etc. (DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 358-360).

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atividade advém de sua aptidão pessoal, como engenheiros, dentistas, médicos,

advogados, artistas, autores, artesões, escritores, psicólogos etc., a lei afasta a

caracterização de empresário e, portanto, o profissional liberal ou autônomo, ao

explorar exclusivamente sua atividade intelectual, não se sujeitaria, em regra, às

normas do Direito Comercial.

Em regra, pelo parágrafo único do art. 966 do Código Civil de 2002, quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, mesmo com o concurso de auxiliares, ou colaboradores, não é considerado empresário, apesar de produzir bens, como o artista, o escritor etc., ou prestar serviços, como o profissional liberal (médicos, dentista, advogado, enfermeiro, nutricionista, engenheiro, p. ex.), visto que lhe falta a organização empresarial para obtenção de lucro e, além disso, como diz Sylvio Marcondes, o esforço se implanta na própria mente do autor, de onde advém aquele bem ou serviço sem interferência exterior de fatores de produção (trabalho, tecnologia, insumo e capital), cuja eventual ocorrência é acidental45.

Os profissionais liberais ou autônomos não se sujeitam, desse

modo, a registro na Junta Comercial, porém algumas profissões possuem regulação

própria e, por conta de tratamento especial, há órgãos de classe que exigem

registro para o exercício regular da profissão46, como é o caso de médicos47,

engenheiros48, arquitetos49, advogados50, biólogos51 etc., entretanto esse registro

não os torna empresários.

Em leitura do Codice Civile de 1942, verifica-se que o legislador

italiano tratou do profissional autônomo (Del lavoro autonomo52) e do intelectual

(Delle professioni intellettuali53) como profissionais que não possuem vínculos ou

45 DINIZ, Maria Helena. Direito de empresa. In: Curso de direito civil brasileiro, 8.v.. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 35-36. 46 Art. 5º, XIII, CF - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer; 47 Lei nº. 3.268/1957 - Dispõe sobre os Conselho de Medicina, e dá outras providências 48 Lei nº. 5.194/1966 - Regula o exercício das profissões de Engenheiro, Arquiteto e Engenheiro-Agrônomo, e dá outras providências. 49 Lei nº 12.378/2010 - Regulamenta o exercício da Arquitetura e Urbanismo; cria o Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil - CAU/BR e os Conselhos de Arquitetura e Urbanismo dos Estados e do Distrito Federal - CAUs; e dá outras providências. 50 Lei nº. 8.906/1994 - Dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). 51 Lei nº 6.684, de 3 de setembro de 1979 - Regulamenta as profissões de Biólogo e de Biomédico, cria o Conselho Federal e os Conselhos Regionais de Biologia e Biomedicina, e da outras providências. 52 Art. 2.222. Contratto d'opera. Quando una persona si obbliga a compiere verso un corrispettivo un'opera o un servizio, con lavoro prevalentemente proprio e senza vincolo di subordinazione nei confronti del committente, si applicano le norme di questo capo, salvo che il rapporto abbia una disciplina particolare nel libro IV. 53 Art. 2.229. Esercizio delle professioni intellettuali.

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subordinação, que atuam individualmente no negócio, sem concurso de auxiliares

ou colaboradores, não lhes sendo, nessa situação, aplicadas as normas do direito

de empresa54. Contudo, se vislumbrados esses aspectos de vínculos ou

subordinação, a atividade deixaria de ser não empresária para ser empresária, com

a consequente aplicação das normas relativas à empresa55.

Il linea di principio, la legge esclude che possa essere qualificato come imprenditore il professionista intellettuale (es. architetto, ingegnere, medico) (argomentando a contrario ex art. 2233 c.c.). È tale colui il quale offre prestazioni che realizzano la cd. opera intellettuale che, in virtù delle sue peculiari caratteristiche, legittima l'applicazione di un regime differenziato per la stipula dei contratti rispetto a quello previsto per il prestatore d'opera manuale, lavorate autonomo al pari del primo (art. 2230 c.c.c). Le opere intellettuali, per essere eseguite, richiedono l'applicazione dell'intelletto alla soluzione di un problema di tipo tecnico, scientifico, giuridico, e dunque l'utilizzo di conoscenze particolarmente qualificate nei diveri ettori della scienza umana. Ciò non esclude, invero, che la prestazione intellettuale possa costituire il risultato di un'attività di impresa, attaverso l'impiego organizzato di un complesso di uomini e mezzi. Di contro, la legge, consente l'applicazione della diciplina inerente all'impresa solo quando l'esercizio della professione intellettuale costituisca elemento di una piú vasta attività organizzata in forma di impressa esercitata dallo tesso soggetto (art. 2238 c.c.). [...] La dottrina si è affannata nel tentativo di individuare la ratio che ha indotto il legislatore ad escludere dalla nozione di imprenditore i liberi professionisti, anche quando l'esercizio dell'attività professionale avvenga con l'impiego de mezzi materiali e di ausiliari56.

La legge determina le professioni intellettuali per l'esercizio delle quali è necessaria l'iscrizione in appositi albi o elenchi. L'accertamento dei requisiti per l'iscrizione negli albi o negli elenchi, la tenuta dei medesimi e il potere disciplinare sugli iscritti sono demandati [alle associazioni professionali] (1), sotto la vigilanza dello Stato, salvo che la legge disponga diversamente. Contro il rifiuto dell'iscrizione o la cancellazione dagli albi o elenchi, e contro i provvedimenti disciplinari che importano la perdita o la sospensione del diritto all'esercizio della professione è ammesso ricorso in via giurisdizionale nei modi e nei termini stabiliti dalle leggi speciali. 54 Art. 2238. Rinvio. Se l'esercizio della professione costituisce elemento di un'attività organizzata in forma di impresa, si applicano anche le disposizioni del titolo II. In ogni caso se l'esercente una professione intellettuale impiega sostituti o ausiliari, si applicano le disposizioni delle sezioni II, III, IV, del capo I del titolo II. 55 O direito italiano impõe-se aos exercentes de profissões intelectuais registro e, lendo-se o capítulo que disciplina essas profissões, é possível inferir que se trata de trabalho autônomo, sem vínculo, sem subordinação. Dessa forma, quando o art. 2.238 remete o exercício de tais profissões à matéria de empresa, quando a atividade for organizada sob a forma empresarial, fica a ideia de que o elemento diferenciador entre as atividades do profissional intelectual e do profissional empresário está ligado à organização dos meios necessários para atingir o resultado, os fins visados. Resulta, ainda, das normas do codice civile que, em qualquer caso, se o exercente de profissão intelectual empregar substitutos ou auxiliares, aplicam-se a essas relações as disposições que regem o trabalho subordinado. Talvez se pudesse concluir que atividade econômica intelectual não empresária é a exercida individualmente sem qualquer colaboração, atividade personalíssima, em que não se admite fungibilidade do devedor no adimplemento da prestação. Não é essa a ideia que se apreende da leitura do parágrafo único ao art. 966, já que o concurso tanto de colaboradores como o de auxiliadores, que poderia afastar a concepção de atividade personalíssima, não se aplica. Remanesce a dúvida sobre o que será elemento de empresa que leva à não exclusão dos exercentes de profissões na categoria de empresários. (SZTAJN, Raquel. Teoria Jurídica da Empresa: atividade empresária e mercados. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 83-84). 56 Em princípio, a lei excluí da qualidade de empreendedor os profissionais intelectuais (ex. Arquiteto, engenheiro, médico) (argumentando em contrário nos termos do art. 2233 do Código Civil). Tal é o único que o

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Aparentemente o legislador brasileiro traduziu de forma equivocada

o texto da norma italiana com relação ao profissional intelectual. No direito italiano, o

profissional intelectual não é empresário, pois não possui vínculos ou subordinação,

atuando individualmente no negócio, sem concurso de auxiliares ou colaboradores.

Entretanto, a partir do momento em que contrata auxiliares ou colaboradores, é

tratado como empresário. Diferente do que ocorre no direito italiano, no nacional o

profissional intelectual, mesmo atuando com auxiliares ou colaboradores, não é

considerado empresário (art. 966, p. único, CC).

Excluir atividades intelectuais da noção de empresa seria perfeito se a frase tivesse terminado na palavra “colaboradores”. No entanto, a última sentença inovou ao incluir, entre as atividades empresariais, aquelas atividades intelectuais em que esteja presente o “elemento de empresa” “Decifra-me ou te devoro”, dizia a Esfinge a quem pretendesse cruzar a estrada. O que torna um profissional intelectual empresário? A frase “se o exercício da profissão constituir elemento de empresa” gera confusão ao remeter ao elemento de empresa. O que é o “elemento de empresa” apto a tornar profissionais intelectuais empresários? Se produtores tivessem sido qualificados como comerciantes, empresários civis, incluindo profissionais intelectuais e rurais, conforme disciplinado no Código italiano, essa dúvida não existiria. Traduções ruins ou equivocadas, no entanto, levam a interpretações obscuras57.

Nessa linha, com vista a permitir que um profissional intelectual se

enquadre como empresário, o próprio parágrafo único do artigo 966 do Código Civil

ressalva que o citado profissional intelectual será considerado empresário “[...] se o

exercício da profissão constituir elemento de empresa”, ou seja, se a organização

empresarial for mais importante que a atividade profissional desenvolvida58.

desenvolvimento do trabalho ocorre no intelecto que, em virtude das suas características peculiares, legitima a aplicação de um regime diferenciado para a assinatura do contrato em relação ao previsto para um prestador de trabalho manual, trabalhador autônomo como o primeiro (art. 2230 c.c). O trabalhador intelectual, por esse motivo, exige o uso do intelecto para a solução de um problema técnico, científico, legal e, portanto, o uso do conhecimento especialmente qualificados da ciência humana. Isto não exclui, de fato, que o desempenho intelectual pode ser o resultado de uma atividade comercial, espalhados por todo o uso organizado de um complexo de pessoal e equipamento. Por outro lado, a lei permite a aplicação de disciplina inerente à empresa somente quando o exercício da profissão intelectual constitui uma parte de outras atividades organizadas na forma de empresa exercida pelo sujeito (art. 2.238 do Código Civil). [...] A doutrina tem trabalhado em uma tentativa de identificar a razão que levou o legislador a excluir o profissional liberal do conceito de empreendedor, mesmo quando o exercício da atividade profissional ocorre com o uso de meios materiais e auxiliares. (COSTAGLIOLA, Anna. Compendio di Diritto commerciale: Riferimenti dottirnali e giuriprudenziali. Santarcangelo di Romagna: Maggiola Editore, 2016, p. 29). 57 SZTAJN, Rachel. O que se perdeu na tradução. Revista de Direito Mercantil, Econômico e Financeiro, São Paulo, n.153-154, jan. 2010, p. 10-11. 58Enunciado 194 do Conselho de Estudos Jurídicos do Conselho de Justiça federal. “Os profissionais liberais não são considerados empresários, salvo se a organização dos fatores da produção for mais importante que a atividade pessoal desenvolvida”.

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Para que a organização empresarial seja mais importante que a

atividade intelectual desenvolvida, cujo resultado é a verificação do elemento de

empresa, é essencial o exame caso a caso, demandando análise econômica com o

fito de observar se houve a absorção da atividade pessoal de caráter intelectual, de

natureza científica, literária ou artística, como um dos fatores da organização

empresarial59.

Justamente por isso, o artigo 966 do Código Civil afasta da definição de empresário aquele que exerce atividades intelectual, científica, literária ou artística, ainda que com o concurso de auxiliares colaboradores. Não há empresa na atuação ainda que fortemente marcada pelo elemento pessoal, ainda que gozando do auxílio ou da colaboração de outros; não há intuito de empresa, não há prática de empresa, não há procedimento de empresa, não há patrimônio de empresa. Todavia, essa norma não traduz uma interdição de tais atividades para o Direito de Empresa; basta que se tenha uma inserção no Direito Empresarial. A atuação pessoal de um determinado cientista, ainda que havendo auxiliadores e colaboradores, não caracteriza empresa; mas lhe é lícito constituir uma empresa para a atividade científica, incluindo a sua atuação pessoal. A produção de esculturas por um artista, ainda que com a ajuda de assistentes, com a adoção de procedimentos específicos, com o emprego de bens materiais e imateriais para tanto, não caracteriza empresa; mas é lícito a um artista constituir uma empresa para negociar obras de arte, embora não seja correto afirmar que uma empresa possa criar obras de arte, já que o artigo 11 da Lei nº. 9.619/98, com adequação, afirma que “autor é a pessoa física criadora de obra literária, artística ou científica”.60

O elemento de empresa se torna mais evidente quando o

profissional intelectual se afasta da atividade, exercendo a figura de gestor da

empresa, organizando os fatores de produção, contratando outros profissionais,

investindo capital, coordenando os insumos e utilizando-se do conhecimento com

especialidade para organizá-la.

A essência do conceito buscado é a constatação de que a atividade

intelectual, de natureza científica, literária ou artística, deixou de ser o objeto da

atividade e tornou-se apenas mais um componente da organização empresarial, um

elemento da empresa61.

59 Enunciado 195 do Conselho de Estudos Jurídicos do Conselho de Justiça federal. “A expressão ‘elemento de empresa’ demanda interpretação econômica, devendo ser analisada sob a égide da absorção da atividade intelectual, de natureza científica, literária ou artística, como um dos fatores da organização empresarial”. 60 MAMEDE, Gladston, Direito empresarial brasileiro: empresa e atuação empresarial. v. 1, 3. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 34. 61 6. Do empresário.

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Exceção à regra é o profissional que explora a advocacia que, por

força da Lei nº. 8.906/1994 (Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil), não pode

ser exercida como empresa e, portanto, um advogado ou uma sociedade de

advogados nunca serão considerados empresários62.

A definição do empresário, dada em relação ao empresário pessoa física, é fundamental no sistema, porque é o conceito básico, para, depois, distinguir as sociedades, em sociedades empresárias e sociedades não empresárias. O conceito está no art. 1.003 do Projeto: "Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços". Esse conceito conjuga, ou nele se conjugam três elementos que formam a noção de empresário. Em primeiro lugar, trata-se de atividade econômica, isto é, atividade referente à criação de riquezas, bens ou serviços. A economicidade da atividade está na criação de riquezas, de modo que aquele que profissionalmente exerce qualquer atividade, que não seja econômica ou não seja atividade de produção de riquezas, não é empresário. Em segundo lugar, esta atividade deve ser organizada, isto é, atividade em que se coordenam e se organizam os fatores da produção: trabalho, natureza, capital. É a conjugação desses fatores, para produção de bens ou de serviços, que constitui a atividade considerada organizada, nos termos do preceito do Projeto. Finalmente, ela é uma atividade profissional: "Considera-se empresário quem exerce profissionalmente ... ", isto é, a habitualidade da prática da atividade, a sistemática dessa atividade e que, por ser profissional, tem implícito que é exercida em nome próprio e com ânimo de lucro. Essas duas ideias estão implícitas na profissionalidade do empresário. 7. Dos profissionais intelectuais. Há, porém, pessoas que exercem profissionalmente uma atividade criadora de bens ou de serviços, mas não devem e não podem ser consideradas empresários – referimo-nos às pessoas que exercem profissão intelectual – pela simples razão de que o profissional intelectual pode produzir bens, como o fazem os artistas; podem produzir serviços, como o fazem os chamados profissionais liberais. Mas, nessa atividade profissional, exercida por essas pessoas, falta aquele elemento de organização dos fatores da produção, porque, na prestação desse serviço ou na criação desse bem, os fatores de produção, ou a coordenação de fatores, é meramente acidental: o esforço criador se implanta na própria mente do autor, que cria o bem ou o serviço. Portanto, não podem, embora sejam profissionais e produzam bens ou serviços, ser considerados empresários. A não ser que, organizando-se em empresa, assumam a veste de empresários. Parece um exemplo bem claro a posição do médico, o qual, quando opera, ou faz diagnóstico, ou dá a terapêutica, está prestando um serviço resultante da sua atividade intelectual, e por isso não é empresário. Entretanto, se ele organiza fatores de produção, isto é, une capital, trabalho de outros médicos, enfermeiros, ajudantes etc., e se utiliza de imóvel e equipamentos para a instalação de um hospital, então o hospital é empresa e o dono ou titular desse hospital, seja pessoa física, seja pessoa jurídica, será considerado empresário, porque está, realmente, organizando os fatores da produção, para produzir serviços (MARCONDES, Sylvio. Questões de Direito Mercantil. São Paulo: Saraiva,1977, p. 10-11). 62 EXERCÍCIO PROFISSIONAL – MODELO ALEMÃO DENOMINADO DE “VEREIN” (SERVIÇOS REUNIDOS) – ASSOCIAÇÃO DE VÁRIOS PROFISSIONAIS DE DIVERSAS ÁREAS PRESTANDO CONSULTORIA MEDIANTE MENSALIDADE VARIÁVEL DE ACORDO COM A SITUAÇÃO ECONÔMICA DO ASSOCIADO – ASSESSORIA MEDIANTE MEIO TELEFÔNICO E OU ELETRÔNICO PARA TODO O PAÍS – PRETENSÃO DE CRIAÇÃO DE EMPRESA SEMELHANTE AO “VEREIN” NO BRASIL – IMPOSSIBILIDADE LEGAL E ÉTICA. Existem restrições éticas ao oferecimento de Planos de Assistência Jurídica, por qualquer forma nominada, por ensejar captação de clientes ou causas, por incutir no exercício da advocacia o caráter mercantilista associado a outras atividades mercantis, na forma pretendida de Verein. O artigo 5º do Código de Ética e Disciplina: "O exercício da advocacia é incompatível com qualquer procedimento de mercantilização" e os artigos 16 e 34, I do Estatuto da Advocacia (lei 8.906/1994) que impedem tal prática. O serviço profissional do advogado compreende o fato de que ele para ser procurado e, assim exercer a profissão, precisa ser conhecido devendo-se considerar, ainda, a falta de vínculo entre cliente e advogado, o que é comum nesses planos de atendimento. A advocacia não é uma atividade mercantil, e sua divulgação, por consequência, não deve possuir nenhum traço mercantilista. O desconhecimento do Estatuto da Ordem e dos Advogados do Brasil e do Código de Ética e Disciplina da OAB poderá atribuir aos que não militam na advocacia, ou mesmo para muitos advogados, a equivocada ideia de que a mercantilização da profissão seria uma saída para o êxito profissional, fazendo com que se lancem as mais variadas estratégias de marketing. A advocacia não contém os elementos caracterizadores contidos o art. 191 do nosso antigo Código Comercial. A advocacia não permite o comércio, como coisa colocada e exposta à venda. Considera-se ilegal e antiético qualquer plano de Assistência Jurídica, seja qual for a sua denominação, de uma maneira geral. A situação das instituições leigas tem agravante, porquanto, contando com quadro jurídico para prestação desse tipo de serviço, veicula a advocacia em conjunto com outras atividades que porventura prestem. É o caso da consulta. A forma como apresentada na consulta

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Por fim, o Projeto de Código Comercial também impede o

profissional intelectual, entendido como aquele que exerce profissão regulamentada,

de ser considerado empresário63, porém reafirma a aplicação da lei comercial

àquele que explorar tal atividade na forma de empresa (art. 1364)65.

1.5. Das formas de exploração da atividade econômica

Empresário é o sujeito de direito que exerce a empresa por meio de

seu estabelecimento. Sujeito de direito é expressão genérica que contempla a

pessoa natural ou física, a pessoa jurídica e a entidade despersonalizada.

A pessoa natural, que atua individualmente no exercício da

empresa, é conhecida pela doutrina como empresário individual, e para atuação

regular de sua atividade deve registrar-se na Junta Comercial de sua respectiva

sede, antes do início de sua atividade (arts. 966 e 967, CC). Desse conceito, como

visto anteriormente, exclui-se da condição de empresário a pessoa natural que não

se enquadra no conceito legal do artigo 966 do Código Civil, os profissionais

autônomos ou liberais (art. 966, parágrafo único, do CC) e o rural não inscrito na

Junta Comercial (art. 971, CC).

As pessoas jurídicas empresárias são as sociedades e as empresas

individuais de responsabilidade limitada (EIRELI) que têm por objeto a exploração

formulada requer, para admissão de associados, pagamento de taxa de inscrição e taxa mensal, dando direito à assistência profissional advocatícia, juntamente com outras de atividades comerciais, o que contraria o EAOAB por caracterizarem nítida captação de clientes, mercantilização da profissão e aviltamento de honorários, hipóteses estas facilmente ocorridas. O advogado que participa de empresa que oferece plano de assistência jurídica, seja como sócio, associado, empregado ou prestador de serviços fere o Código de Ética e o Estatuto da Advocacia. Ressalte-se que ao advogado não é dado o direito de desconhecer a própria legislação que rege a atividade. No caso da consulta, agrava o fato de estar associado a demais atividades mercantis. (OAB/SP - Proc. E-4.230/2013 - v.u., em 21/03/2013, do parecer e ementa do Rel. Dr. CLÁUDIO FELIPPE ZALAF - Rev. Dr. ZANON DE PAULA BARROS - Presidente Dr. CARLOS JOSÉ SANTOS DA SILVA.) 63 No mesmo sentido a proposta inicial do Projeto do Código Comercial: Art. 3º. Não se considera empresa a atividade de prestação de serviços própria de profissão liberal, assim entendida a regulamentada por lei para cujo exercício é exigida formação superior. 64 Art. 13. Sujeita-se à lei específica a pessoa, natural ou jurídica, dedicada a atividade de prestação de serviços típicos de profissão regulamentada. Parágrafo único. Nas omissões da lei específica: I – o profissional pode organizar sua atividade como empresa; e II – são aplicáveis as normas deste Código. 65 No mesmo sentido a versão inicial do Projeto de Lei - Art. 3º. Não se considera empresa a atividade de prestação de serviços própria de profissão liberal, assim entendida a regulamentada por lei para cujo exercício é exigida formação superior.

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de atividade empresarial ou optaram por adotar a forma de sociedade por ações

(art. 982, CC) e que foram devidamente registradas na Junta Comercial (art. 45,

CC)66.Por não possuírem finalidade lucrativa, as associações, as fundações, as

entidades religiosas, os partidos políticos têm caráter civil, não empresarial e,

portanto, excluídos das regras de Direito Comercial67.

A sociedade é a entidade formada por duas ou mais pessoas com o

objetivo de obter lucro por meio do exercício de alguma atividade econômica e

partilhar o resultado (art. 981, CC) que, dependendo de sua natureza, pode ou não

ser caracterizada como empresária (art. 982, CC). A empresa individual de

responsabilidade limitada (EIRELI) foi inserida no nosso sistema jurídico pela Lei nº.

12.441/2011, introduzindo no Código Civil o artigo 980-A, e é caracterizada como

uma espécie de pessoa jurídica de direito privado, formada por um único titular,

detentor de todo capital.

Nem toda sociedade é uma pessoa jurídica, pois esse status

somente é alcançado com o registro de seu ato constitutivo no órgão competente

(art. 985, CC68), sendo que, na falta desse expediente, está-se diante de uma

sociedade sem personalidade jurídica (art. 986 e 991, CC).

Por conta de este trabalho tratar de sociedade, especificadamente

da sociedade profissional, cabe analisar a partir deste ponto a estruturação dessa

66 O Projeto de Código Comercial não traz a EIRELI como espécie de pessoa jurídica para exploração de empresa, restando, portanto, a exploração por empresário individual ou sociedade (art. 12). 67 As pessoas jurídicas são divididas, primeiramente, em de direito público interno e de direito privado. As pessoas jurídicas de direito público são estabelecidas pelo Código Civil como sendo a União, os Estados e Distrito Federal, os Municípios, as autarquias, e demais entidades de caráter público criadas por lei (art. 41, CC). Já as pessoas jurídicas de direito privado resumem-se em associações, sociedades, fundações, organizações religiosas, partidos políticos e empresas individuais de responsabilidade limitada (art. 44, CC). Começa a existência legal das pessoas jurídicas de direito privado com a inscrição do ato constitutivo nos órgãos encarregados de dar publicidade à existência da entidade (art. 45, CC). As associações são entidades sem fins lucrativos, geralmente destinadas a trabalhos de ajuda social ou para benefício de seus próprios integrantes, enquanto as fundações são entidades criadas por um instituidor que transfere bens de seu patrimônio para o surgimento de uma fundação com finalidade específica e, desejando, declarando a maneira de administrá-la. As organizações religiosas são pessoas jurídicas constituídas que professam sua religião, sendo livres a criação, a organização, a estruturação interna e o funcionamento (art. 44, §1º, CC). Os partidos políticos destinam-se a assegurar, no interesse do regime democrático, a autenticidade do sistema representativo e a defender os direitos fundamentais definidos na Constituição Federal, com previsão própria na Lei nº. 9.096/1995. 68 Art. 985. A sociedade adquire personalidade jurídica com a inscrição, no registro próprio e na forma da lei, dos seus atos constitutivos (arts. 45 e 1.150).

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espécie de pessoa jurídica e como se dará o critério para considerar uma sociedade

como profissional.

1.6. As sociedades

O Código Civil não conceitua a sociedade, mas o contrato que a

caracteriza. Nos termos artigo 98169, celebram contrato de sociedade as pessoas

que, reciprocamente, se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o

exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados70.

Extraímos do dispositivo os seguintes requisitos para o contrato de

sociedade: o affectio societatis, a pluralidade de parte, as obrigações recíprocas, a

finalidade econômica e a partilha dos resultados.

A vontade de associação71 – affectio societatis72 –, garantida

constitucionalmente (art. 5º, XX, Constituição Federal), constitui elemento subjetivo

e volitivo dos sócios para se associarem, criando e impulsionando a sociedade,

mediante a convergência de seus interesses para alcançar o objeto definido no

contrato social. Enquanto pluralidade de sócios é exigência de que o ente seja

69 Art. 981. Celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados. Parágrafo único. A atividade pode restringir-se à realização de um ou mais negócios determinados. 70 No mesmo sentido o código projetado - Art. 106. Celebram sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilhar, entre si, os resultados. § 1º. Salvo disposição legal diversa, a sociedade deve ser constituída por dois ou mais sócios. §2º. O objeto social deve ser determinado e pode consistir em atividade restrita à realização de um ou mais empreendimentos ou negócios. § 3º. Apenas a sociedade profissional (artigos 214 a 224) pode ser constituída por contribuições em serviços. 71 [...]a affectio societatis não é pressuposto algum, nem mesmo para a manutenção da sociedade entre seus sócios ao longo de sua existência. Se o fosse, os sócios em maioria poderiam alijar os detentores da minoria do capital a qualquer tempo, impedindo-os de participar dos bons negócios que se descortinassem para o futuro [...]. O querer ou não querer ficar ou permanecer vinculado a um contrato não é uma particularidade própria do ajuste societário. Nos contratos de duração em geral (como de sociedade, locação, fornecimento), a vontade de manter o vínculo contratual é-lhes inerente, sendo autorizada a sua resolução unilateral, a qualquer tempo, quando celebrados por prazo indeterminado. (GONÇALVES NETO, Alfredo de Assis. Lições de Direito Societário. 2. ed., São Paulo: Juarez de Freitas, n. 24, 2004, p. 54). 72 A Affectio societatis é formada por dois elementos: fidelidade e confiança. A fidelidade está ligada ao respeito à palavra dada, à vontade expressada por ocasião da constituição da sociedade ainda que o quadro de membros desta se tenha modificado. Já a confiança diz respeito à ligação entre os sócios, os quais devem colaborar para a realização de um interesse comum. (PROENÇA, José Marcelo Martins. A exclusão de sócio nas sociedades limitadas. In: FINKELSTEIN. Maria Eugênia Reis; PROENÇA, José Marcelo Martins (Coord.). Direito Societário: tipos societários. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 188).

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coletivo, formado por duas ou mais pessoas.73 As obrigações recíprocas dos sócios

para formação do capital social, seja com bens ou serviços, preconizam que todos

são obrigados a contribuir para composição dos bens do patrimônio da sociedade. A

finalidade econômica é o que distingue a sociedade das demais pessoas jurídicas

de direito privado. O objetivo da reunião de pessoas em sociedade é o

partilhamento do lucro. Todos os membros se reúnem visando ao sucesso do

empreendimento para poder colher os frutos. Por fim, a partilha dos resultados é

consequência da finalidade econômica da sociedade. O sucesso ou insucesso do

empreendimento refletir-se-á nos frutos ou nas perdas que serão partilhados entre

os sócios de forma proporcional ou não à participação societária de cada um. Trata-

se da consequência do princípio da inerência do risco empresarial74.

Assim, se duas ou mais pessoas se reúnem para um objetivo

econômico comum com partilha dos resultados, estaremos diante de uma

sociedade. A principal finalidade da sociedade é o lucro75.

73 A doutrina aponta como exceções à pluralidade a participação societária: (a) a sociedade anônima subsidiária integral (art. 251, Lei 6.404/76), que é uma espécie de sociedade cujo único sócio é, necessariamente, uma outra sociedade que a controla; (b) a unipessoalidade incidental temporária, fato que ocorre com a concentração da participação societária (quotas ou ações) nas mãos de único sócio por fato superveniente (compra de todas as quotas ou ações por um sócio, com a morte, retirada ou exclusão de sócio etc.), mas que deve ser reconstituída a pluralidade no prazo de 180 (cento e oitenta) dias no caso de sociedades contratuais (art. 1033, IV, CC) ou até a próxima assembleia geral ordinária, no caso de sociedades por ações (art. 206, I,d), LSA), sob pena de dissolução e pleno direito da sociedade; (c) a empresa pública, cuja única sócia é a União (art. 5º, II, Decreto-Lei nº200/1967). 74 Por todos: COELHO, Fábio Ulhoa. A alocação de riscos e a segurança jurídica na proteção do investimento privado, Revista de Direito Brasileira, São Paulo, v. 16, n. 7, jan./abr. 2017, p. 291-304. 75 O contrato de sociedade é a convenção por via da qual duas ou mais pessoas se obrigam a conjugar seus esforços ou recursos a contribuir com bens ou serviços para a consecução de fim comum, mediante o exercício de atividade econômica, e a partilhar, entre si, os resultados (CC, art. 981). Nesse contrato há uma congregação de vontades paralelas ou convergentes, ou seja, dirigidas no mesmo sentido, para a obtenção de um objetivo comum, ao passo que, nos demais contratos, os interesses das partes colidem, por serem antagônicos, de maneira que a convenção surgirá exatamente para compor as divergências. O interesse dos sócios é idêntico; por isso todos, com capitais ou atividades, se unem para lograr uma finalidade, econômica ou não. Portanto, o contrato de sociedade é o meio pelo qual os sócios atingem o resultado almejado. Por haver uma confraternização de interesses dos sócios para alcançar certo fim, todos os lucros lhes deverão ser atribuídos, não se excluindo o quinhão social de qualquer deles da comparticipação nos prejuízos; assim, proibida estará qualquer cláusula contratual que beneficie um dos sócios, isentando-o, p. ex., dos riscos do empreendimento, repartindo os lucros apenas com ele, excluindo-o do pagamento das despesas ou da comparticipação dos prejuízos etc. (RT, 227:261). Há, portanto, uma manifestação de vontade para que se possa constituir pessoa jurídica, para cuja validade devem ser observados os requisitos de eficácia dos negócios jurídicos. Segundo o disposto no art. 104 do Código Civil, para que o ato jurídico seja perfeito é imprescindível: agente capaz (CC, arts. 3º e 5º); objeto lícito – de modo que seriam nulas as sociedades que tivessem por objeto a fabricação de moedas falsas –, possível, determinado ou determinável, e forma prescrita ou não defesa em lei, logo, devem ser contratadas por escrito e, se for o caso, obter prévia autorização governamental para funcionarem (DINIZ, Maria Helena. Direito de empresa. In: Curso de direito civil brasileiro, 8.v.. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 302-303).

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A doutrina ainda debate a natureza jurídica do contrato de

sociedade. Há aqueles que defendem a natureza anticontratual (teorias

anticontratualistas): teoria do ato coletivo; teoria do ato complexo; teoria do ato

corporativo e teoria da instituição; e outros que defendem sua natureza contratual

(teorias contratualistas): teoria do contrato bilateral e teoria do contrato plurilateral76.

Na doutrina nacional prevalece o entendimento, ao qual nos

filiamos, da teoria do contrato plurilateral, desenvolvida por Tullio Ascarelli77.

Tullio Ascarelli (945; 285-332) foi quem esclareceu, pioneiramente, e em magistral lição, a natureza do contrato de sociedade como plurilateral, levando em conta seus característicos formais. Diz ele que o contrato de sociedade é plurilateral por apresentar as seguintes características: (a) possibilidade de participação de mais de duas partes; (b) todas as partes contratantes são titulares de direitos e obrigações; (c) cada parte tem obrigações, não para com a outra, mas para com todas as outras; (d) os sócios têm interesses conflitantes, tanto no momento da constituição da sociedade, como também durante a vida da sociedade, mas têm interesses coincidentes no que diz respeito à realização da finalidade comum; (e) o elemento prazo é importante, pois o contrato plurilateral é sempre de execução continuada, sujeitando-se ao regramento próprio de tal categoria contratual; (f) o contrato impõe a realização de um fundo comum que possibilita a realização da finalidade comum; (g)o contrato plurilateral tem a natureza aberta, permitindo a adesão de novos contratantes ou a retirada dos sócios que ingressaram na relação anteriormente; (h) os vícios de constituição decorrentes da manifestação de vontade dos contratantes do contrato plurilateral não afetam todo o contrato – como ocorre na teoria geral dos contratos –, mas, diante da pluralidade de partes, afetam apenas as manifestações viciada de determinada parte, sem atingir a totalidade do contrato (por isso, é importante distinguir os vícios que atingem a totalidade do contrato e os chamados vícios de adesão)wE3; (i) a inexecução da obrigação contratual por uma das partes contratantes não afeta a totalidade do contrato, como ocorre com os contratos bilaterais, mas apenas pode acarretar a resolução do vínculo do sócio inadimplente, mantendo-se o contrato societário; (j) os contratos plurilaterais objetivam criar uma organização, na qual há possibilidade de se deliberar por maioria, o que não se admite nos outros contratos (k) a organização constituída com o contrato social pode ser interna ou externa, dela resultando a pessoa jurídica, dotada de personalidade jurídica e patrimônio separado78.

76 BOTREL, Sérgio, Ato constitutivo das sociedades. In: COELHO, Fábio Ulhoa (Org.). Tratado de Direito Comercial. Volume 1: introdução ao direito comercial e teoria geral das sociedades, São Paulo: Saraiva, 2015, p. 332-333. 77 ASCARELLI, Tulio, Problemas das sociedades anônimas e direito comparado. Campinas: Bookseller, 2001, p. 372-452. 78 CALÇAS, Manoel de Queiroz Pereira. Sociedade limitada no novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2003, p.42.

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1.6.1. Da personificação da sociedade

Presentes os elementos previstos no artigo 981 do Código Civil,

nasce a sociedade, porém ainda sem personalidade jurídica própria, pois, como já

anunciado, para a sociedade ser considerada pessoa jurídica é necessário o

registro do ato constitutivo no órgão competente (arts. 45, 1.150 e 985, CC), sendo

a inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis, o qual fica a cargo das

Juntas Comerciais, para as sociedades empresárias; e no Registro Civil das

Pessoas Jurídicas, para sociedade simples (art. 998, CC79), conforme o artigo 1.150

do Código Civil80, exceto a Cooperativa, cujo registro ocorre nas Juntas Comerciais

(art. 32, II, a, Lei nº. 8934/199481) e a sociedade de advogados e a sociedade

unipessoal de advocacia que adquirem personalidade jurídica com o registro

aprovado dos seus atos constitutivos no Conselho Seccional da OAB em cuja base

territorial tiver sede (art. 15, §1º, Lei nº. 8.906/1994 - Estatuto da Advocacia e a

Ordem dos Advogados do Brasil82).

Personalidade jurídica é a aptidão genérica, a capacidade de

adquirir direito e obrigações ou deveres na ordem civil. Para Clóvis Beviláqua é a

“aptidão, reconhecida pela ordem jurídica a alguém, para exercer direitos e contrair

obrigações”.83

79 Art. 998. Nos trinta dias subsequentes à sua constituição, a sociedade deverá requerer a inscrição do contrato social no Registro Civil das Pessoas Jurídicas do local de sua sede. § 1º O pedido de inscrição será acompanhado do instrumento autenticado do contrato, e, se algum sócio nele houver sido representado por procurador, o da respectiva procuração, bem como, se for o caso, da prova de autorização da autoridade competente. § 2º Com todas as indicações enumeradas no artigo antecedente, será a inscrição tomada por termo no livro de registro próprio, e obedecerá a número de ordem contínua para todas as sociedades inscritas. 80 Art. 1.150. O empresário e a sociedade empresária vinculam-se ao Registro Público de Empresas Mercantis a cargo das Juntas Comerciais, e a sociedade simples ao Registro Civil das Pessoas Jurídicas, o qual deverá obedecer às normas fixadas para aquele registro, se a sociedade simples adotar um dos tipos de sociedade empresária. 81 Art. 32. O registro compreende: II - O arquivamento: a) dos documentos relativos à constituição, alteração, dissolução e extinção de firmas mercantis individuais, sociedades mercantis e cooperativas; 82 Art. 15. Os advogados podem reunir-se em sociedade simples de prestação de serviços de advocacia ou constituir sociedade unipessoal de advocacia, na forma disciplinada nesta Lei e no regulamento geral. § 1º A sociedade de advogados e a sociedade unipessoal de advocacia adquirem personalidade jurídica com o registro aprovado dos seus atos constitutivos no Conselho Seccional da OAB em cuja base territorial tiver sede. 83 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Volume I: parte Geral, 7. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 70.

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A partir do registro, a sociedade conquistará personalidade jurídica

própria e será sujeito de direito autônomo em relação a seus sócios84, portanto,

passará a ter (i) titularidade negocial, podendo realizar negócios, assumir direitos e

obrigações; (ii) titularidade processual, podendo ser parte processual (ativa ou

passiva); (iii) responsabilidade patrimonial, com patrimônio próprio, inconfundível e

incomunicável, em regra85, com o patrimônio individual de cada um de seus sócios.86

Como já alertado, o registro não é requisito para caracterização da

sociedade e nem do empresário87, ou seja, mesmo que não haja registro daquele

que exerce a atividade econômica organizada para produção ou circulação de bens

ou de serviços (empresa), seja individual (empresário individual) ou coletivamente

(sociedade), será considerado empresário e responderá pelas consequências da

irregularidade (empresário irregular).

Ocorre que, na falta de registro da sociedade, seja empresária ou

simples, será ela considerada como uma entidade despersonalizada, denominada

pela lei como “sociedade em comum”88, que é aquela que não teve seu ato

constitutivo inscrito no órgão competente e que se rege pelas disposições

específicas dos artigos 986 a 990 do Código Civil. Se a sociedade não se registrou,

84 Segundo o Projeto de Código Comercial - Art. 107. A sociedade regularmente constituída é ente dotado de personalidade jurídica, capaz de direitos e obrigações para a persecução de seus fins, com patrimônio próprio e distinto dos de seus sócios. 85 Ressalva feita por conta da existência no ordenamento da Teoria da Desconsideração da Personalidade Jurídica, aplicada para responsabilizar diretamente os sócios, por meio da constrição de seus bens pessoais. 86 Entende-se por pessoa jurídica o ente incorpóreo que, como as pessoas físicas, pode ser sujeito de direitos. Não se confundem, assim, as pessoas jurídicas com as pessoas físicas que deram lugar ao seu nascimento; pelo contrário, delas se distanciam, adquirindo patrimônio autônomo e exercendo direitos em nome próprio. Por tal razão, as pessoas jurídicas têm nome particular, como as pessoas físicas, domicílio e nacionalidade; podem estar em juízo, como autoras ou como rés, sem que isso se reflita na pessoa daqueles que a constituíram. Finalmente, têm vida autônoma, muitas vezes superior às das pessoas que as formaram; em alguns casos, a mudança de estado dessas pessoas não se reflete na estrutura das pessoas jurídicas, podendo, assim, variar as pessoas físicas que lhe deram origem, sem que esse fato incida no seu organismo. É o que acontece com as sociedades institucionais ou de capitais, cujos sócios podem mudar de estado ou ser substituídos sem que se altere a estrutura social (REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. v. 1, 31. ed.. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 204). 87 Enunciado 198 da III Jornada de Direito Civil coordenada pelo Conselho da Justiça Federal. - A inscrição do empresário na Junta Comercial não é requisito para a sua caracterização, admitindo-se o exercício da empresa sem tal providência. O empresário irregular reúne os requisitos do art. 966, sujeitando-se às normas do Código Civil e da legislação comercial, salvo naquilo em que forem incompatíveis com a sua condição ou diante de expressa disposição em contrário. 88 A sociedade em comum também é conhecida por sociedade irregular ou sociedade de fato.

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não há que se falar em tipo societário para essa situação, descartando-se qualquer

benefício que os tipos societários concederiam a determinadas situações89.

Nesse sentido, mesmo que os sócios tenham a intenção de

constituir uma sociedade de responsabilidade limitada, inclusive elaborando um

contrato social com as disposições desse tipo societário, sem o registro não existirá

sociedade limitada, mas, sim, sociedade em comum, sujeita à aplicação de suas

regras específicas.

Para constituição eficaz de uma sociedade, é necessário que seu

ato constitutivo seja levado a registro no órgão competente (Junta Comercial, o

Cartório de Registro de Pessoas Jurídicas ou a Ordem dos Advogados). O ato

constitutivo das sociedades contratuais é denominado “contrato social”; e das

sociedades institucionais, “estatuto social”.

Como este trabalho buscará analisar apenas as sociedades

contratuais, simples ou empresárias, vamos nos ater apenas a elas e a seus tipos,

quais sejam, a sociedade simples pura, a sociedade em nome coletivo, a sociedade

em comandita simples e a sociedade por quotas de responsabilidade limitada.

O contrato social (art. 997, CC) não se confunde com o contrato de

sociedade (art. 981, CC). Enquanto o contrato de sociedade é caracterizado pela

reunião entre os sócios para o exercício de uma atividade econômica e partilha dos

resultados, o contrato social é o instrumento escrito necessário para o registro de

sociedade contratual no órgão competente. Nenhum órgão de registro, seja a Junta

Comercial, o Cartório de Registro de Pessoas Jurídicas ou a Ordem dos Advogados

do Brasil, chancelará a constituição da pessoa jurídica sem instrumento contratual

escrito apto a registro.

O contrato social segue a sistemática dos contratos em geral, com

preâmbulo e disposições contratuais. O preâmbulo é a oportunidade para a

identificação e a qualificação das partes, enquanto as disposições são as cláusulas 89 Por todos: FÉRES, Marcelo Andrade. Sociedade em comum: disciplina jurídica e institutos afins. São Paulo: Saraiva, 2011.

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que regerão a instituição. Segundo a Instrução Normativa nº. 38, de 02 de março de

201790 do Departamento de Registro Empresarial e Integração (DREI), que alterou

os Manuais de Registro de Empresário Individual, Sociedade Limitada, Empresa

Individual de Responsabilidade Limitada – EIRELI, Cooperativa e Sociedade

Anônima aprovados pela Instrução Normativa nº 10, de 5 de dezembro de 2013, o

contrato social deve conter, no mínimo, os seguintes elementos: título, preâmbulo,

corpo do contrato com as cláusulas obrigatórias e facultativas e o fecho. As

cláusulas obrigatórias também são chamadas de essenciais e são de caráter

indispensável para o registro da sociedade no órgão competente. As cláusulas

facultativas regulam as relações entre os sócios e podem não existir e, mesmo

assim, não obstar que o instrumento seja levado a registro.

Além dos requisitos citados, é essencial que os sócios observem o

princípio da boa-fé objetiva (art. 422, CC) e da função social (art. 421, CC) no

momento da contratação e durante todo período em que se mantiverem associados.

Sem se estender no tema, havia a boa-fé objetiva também no contrato de sociedade que vinha expresso no artigo 1.404 do Código Civil de 1916. A boa-fé nas sociedades comerciais (hoje sociedades empresárias) já mostrava sua relevância nas Ordenações, conforme apontado por Carvalho de Mendonça ao mencionar o Alvará de 16 de novembro de 1771, que prestigiava o princípio nesses contratos: Sem boa-fé não há sociedade ou comércio que possa subsistir. Cumpre assinalar que no dispositivo do Código Civil de 1916 já residia a preocupação na valorização da conduta dos sócios, como aspecto significativo no contrato, no sentido de que eles deveriam atuar conjuntamente no intuito de cooperar para o sucesso do empreendimento91.

As cláusulas contratuais essenciais – ou obrigatórias – são aquelas

descritas no artigo 997 do Código Civil: - nome, nacionalidade, estado civil,

profissão e residência dos sócios, se pessoas naturais, e a firma ou a denominação,

nacionalidade e sede dos sócios, se jurídicas; - denominação92, objeto, sede e prazo

da sociedade; - capital da sociedade, expresso em moeda corrente, podendo

compreender qualquer espécie de bens, suscetíveis de avaliação pecuniária; - quota

de cada sócio no capital social e o modo de integralizá-la; - prestações a que se 90 Disponível em: < http://drei.smpe.gov.br/documentos/instrucao-normativa-no-38-retificacao.pdf> Acesso em: 11 jun. 2017. 91 FRANZOLIN, Cláudio José. O princípio da boa-fé objetiva na relação jurídico-contratual. Dissertação (Mestrado) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2004, p. 75. 92 Em que pese a lei utilizar apenas “denominação”, a nome da sociedade poderá ser designado por “firma” ou “denominação”, dependendo do tipo societário.

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obriga o sócio, cuja contribuição consista em serviços; - pessoas naturais

incumbidas da administração da sociedade, e seus poderes e atribuições; -

participação de cada sócio nos lucros e nas perdas; e - responsabilidade ou não dos

sócios, subsidiariamente, pelas obrigações sociais.

Além das cláusulas previstas no artigo 997, dependendo do tipo

societário, surgem novas cláusulas essenciais e, portanto, o responsável pela

elaboração do instrumento contratual deve se atentar, quando da redação do

documento a ser levado a registro no órgão competente, às regras gerais e

específicas da sociedade.

As cláusulas facultativas podem ser diversas, sendo as mais

comuns - aquelas que disciplinam as reuniões entre os sócios; - a regência supletiva

da sociedade pelas normas das sociedades por ações; - a previsão de exclusão de

sócio por justa causa; - a autorização para pessoa não sócia ser administradora; - a

instituição de conselho fiscal; - a regulamentação de pró-labore; - a sobre o

falecimento de sócios e suas consequências; e - a relativa a critérios de apuração

de haveres e reembolso etc.

Preenchidos os requisitos legais e deferido o registro do contrato na

Junta Comercial, se sociedade empresária; ou no Cartório de Registro de Pessoas

Jurídicas, se sociedade simples, a sociedade passará a ter personalidade jurídica

própria, distinta de seus sócios.

Por isso, pode-se afirmar que o principal efeito do contrato social de sociedade é a constituição de um sujeito de direito, uma pessoa jurídica, totalmente distinta dos sócios que a criaram, com personalidade jurídica, autonomia patrimonial, nome empresarial e domicílio próprio93.

1.7. As espécies de sociedade – Sociedades Empresárias e Simples

Configurado o contrato de sociedade, há de se verificar qual a

espécie dela, conforme a legislação vigente. A lei civil a distribui em duas espécies

de sociedade: a empresária e a simples (art. 982, CC).

93 CALÇAS, Manoel de Queiroz Pereira. Sociedade limitada no novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2003, p. 43.

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Para uma sociedade ser considerada empresária é necessário que

seu objeto social seja explorado empresarialmente, na forma do artigo 966 do

Código Civil ou, então que adote a forma de sociedade por ações (art. 982, CC94). A

sociedade que explore atividade que, legalmente, não seja considerada empresária

ou que adote a forma de cooperativa, é considerada sociedade simples (S/S)95.96.

Como verificado anteriormente ao tratar daqueles que não são

considerados empresários, é possível concluir que são consideradas sociedades

simples: as que não se enquadram no conceito de empresário (art. 966, caput, CC);

as sociedades profissionais97 que exploram atividade intelectual sem elemento de

empresa (art. 966, p. único, CC)98; as sociedades que exploram atividade rural sem

registro na Junta Comercial99 (art. 971 e 984, CC) 100 ; e as cooperativas (art. 982, p.

único)101.

94 Art. 982. Salvo as exceções expressas, considera-se empresária a sociedade que tem por objeto o exercício de atividade própria de empresário sujeito a registro (art. 967); e, simples, as demais. Parágrafo único. Independentemente de seu objeto, considera-se empresária a sociedade por ações; e, simples, a cooperativa. 95 Usualmente na elaboração de Contrato Social de Sociedade Simples, a ser registrado nos Cartórios de Registro de Pessoas Jurídicas, se utiliza a abreviação S/S (Sociedade Simples). 96 Duas são as espécies de sociedade no direito brasileiro, a simples e a empresária. A sociedade simples explora atividades econômicas sem empresarialidade (um escritório dedicado à prestação de serviços de arquitetura, por exemplo) e a sua disciplina jurídica se aplica subsidiariamente à das sociedades empresárias contratuais e às cooperativas. A sociedade empresária, por sua vez, é a que explora empresa, ou seja, desenvolve atividade econômica de produção ou circulação de bens ou serviços, normalmente sob a forma de sociedade limitada ou anônima. A mesma atividade econômica pode ser desenvolvida de modo empresarial (isto é, com uso maciço de mão de obra, investimento de vultosos capitais, aquisição ou desenvolvimento de tecnologias especiais, emprego de quantidade considerável de insumos) ou sem empresarialidade. O comércio de pescados, por exemplo, é explorado por grandes redes nacionais de supermercados e por pequenos comerciantes nos mercados municipais de cidades praianas. Enquanto os primeiros são sociedades empresárias, os últimos (a menos que sejam empresários individuais), sociedades simples (COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. Volume 2: direito de empresa. 15. ed. – São Paulo: Saraiva, 2011, p. 31-32.) 97 O termo “sociedade profissional” é utilizado no Projeto de Código Comercial para designar aquela espécie de sociedade que explorar atividade própria dos profissionais intelectuais - Art. 214. Sociedade profissional é a constituída para proporcionar o exercício em comum de profissão intelectual ou regulamentada. 98 As sociedades profissionais que exploram atividades próprias de profissionais intelectuais como medicina, arquitetura, engenharia, artes, advocacia etc. são consideradas sociedades simples pelo critério legal do parágrafo único do artigo 966 do Código Civil. 99 As sociedades que exploram o agronegócio optam pelo regime jurídico da sociedade simples ou empresária, mediante o registro na Junta Comercial de sua sede, se optar pelo regime da sociedade empresária. 100 Art. 984. A sociedade que tenha por objeto o exercício de atividade própria de empresário rural e seja constituída, ou transformada, de acordo com um dos tipos de sociedade empresária, pode, com as formalidades do art. 968, requerer inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis da sua sede, caso em que, depois de inscrita, ficará equiparada, para todos os efeitos, à sociedade empresária. 101 A sociedade cooperativa será sempre sociedade simples, enquanto a sociedade por ações (sociedade anônima e comandita por ações) será sempre empresária, independentemente do objeto social explorado (art. 982, p. único, CC), tratando-se de exceções à regra de distinção pela análise da atividade explorada pela sociedade.

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Em suma, depois de destacar que a regra geral para a atividade

econômica privada é a empresarialidade, sendo excepcional a atividade econômica

simples, assegura Machioni102 serem as seguintes as atividades das sociedades

simples:

a) as atividade rurais, se não submetidas a registro na forma do artigo 984 e que não sejam agroindústrias; b) as atividades econômicas que não sejam de produção ou circulação de bens ou sérvios; c) as atividades econômicas eventuais, ou seja, não exercidas profissionalmente; d) as atividades intelectuais na forma do parágrafo único do artigo 966; e) a sociedade cooperativa.

Cada espécie de sociedade elencada como simples possui razões

distintas para serem assim consideradas. É essencial a compreensão distintiva das

razões, pois não há como incluir na vala comum a sociedade profissional e a

cooperativa, ou a sociedade rural não registrada na Junta Comercial. Os critérios

adotados pelo legislador são distintos, mas que acabou por incluir cada espécie no

gênero sociedade simples.

As sociedades que não se enquadram no conceito legal não são

empresárias pelo próprio fato em si, se não exercer atividade empresária. A

cooperativa é sociedade sem fim lucrativo (art. 3º, Lei nº. 5764/1971103) e, portanto,

também não pode ser considerada empresária. A sociedade rural pode desenvolver

tanto produção para a subsistência quanto para o agronegócio, mas o legislador

preferiu adotar um critério objetivo: o registro. E, por sim, a sociedade profissional

que foi considerada, em regra, como simples por critério legislativo, pois se trata de

uma pessoa jurídica que explora atividade econômica, organizada para produção ou

circulação de bens ou serviço.

A linha limítrofe entre as espécies de sociedades, empresária e

simples, encontra-se naquelas que exploram atividades próprias dos profissionais

liberais ou autônomos, as quais, por conta de critério legal, nos termos do artigo 982

102 MACHIONI, Jarbas Andrade. Aspectos jurídicos da sociedade limitada. In: DE ALMEIDA, Marcus Elidius Michelli. Aspectos jurídicos da sociedade limitada. São Paulo: Quartier Latin, 2004, p. 289. 103 Art. 3° Celebram contrato de sociedade cooperativa as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o exercício de uma atividade econômica, de proveito comum, sem objetivo de lucro.

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combinado com o artigo 966, parágrafo único, ambos do Código Civil, podem

constituir-se de uma ou de outra espécie, dependendo da verificação de ser, ou não,

a atividade profissional um “elemento de empresa”.

O referido elemento de empresa, tão discutido na doutrina e na

jurisprudência, é o fio que separa uma sociedade de ser considerada como simples

ou empresária, o que pode sacramentar o sucesso ou o insucesso do

empreendimento. Essa afirmação não serve apenas para atrair os olhares atentos

do leitor, pois tal fato é comprovado, em princípio, ao analisarmos as distinções

apontadas pela doutrina e, como veremos, terá relevância, no aspecto econômico,

quando da dissolução parcial da sociedade.

Por que a separação entre organizações empresárias e não empresárias, quando todas são destinadas ao exercício de atividades econômicas e partilha de resultados? Que benefício há em manter, e a repetição, conquanto enfadonha é necessária, a antiga distinção entre atividades comerciais e civis? Mais simples seria excluir a aplicação de certas normas às empresas civis, como, por exemplo, a falência, e unificar, acolhendo todas as atividades econômicas organizadas sob a égide da empresa. Com isso, a distinção entre sociedades (de fins econômicos) e associação (de finalidade não econômicas) que vier a exercer a empresa a adoção de um dos tipos previstos no Código Civil104.

1.8. Das distinções entre a sociedade empresária e a sociedade simples

Diante da dicotomia entre sociedade simples e sociedade

empresária, a doutrina traz como principais diferenças práticas: o órgão de registro

para obtenção da personalidade jurídica; a escrituração dos livros empresariais; e a

sujeição às normas da Lei de Falências e de Recuperação de Empresas105.

104 SZTAJN, Raquel. Teoria Jurídica da Empresa: atividade empresária e mercados. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 124. 105 SILVA, Fernando Cândido da. Sociedade Simples: da natureza jurídica ao tipo societário. São Paulo: LCTE Editora, 2009. MACHIONI, Jarbas Andrade. Aspectos jurídicos da sociedade limitada. In: DE ALMEIDA, Marcus Elidius Michelli. Aspectos jurídicos da sociedade limitada. São Paulo: Quartier Latin, 2004, p. 285-295. ROQUE, Sebastião José. Da sociedade simples. 1.ed. São Paulo: Ícone, 2011, p. 24-30.

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Tal distinção é destacada em parecer elaborado por Arnoldo Wald106

para o Instituto de Registro de Títulos e Documentos e de Pessoas Jurídicas do

Brasil:

Os elementos que mais destacam as diferenças decorrentes da natureza intrínseca dessas sociedades podem ser assim enunciados: a. a instituição de registros diferenciados para a inscrição dos atos constitutivos dessas sociedades – Registro Civil de Pessoas Jurídicas (arts. 998 e 1.000) para as sociedades simples, e Registro Público de Empresas Mercantis (arts. 967, 969, 985 e 1.150) para as sociedades empresárias, este último de trâmite bem mais complexo do que o primeiro; b. a aplicabilidade da lei de falências e concordatas somente a empresários e sociedades empresárias por eles instituídas, por força do artigo 2.037 do Código Civil, enquanto, por outro lado, as sociedades simples e seus sócios sujeitam-se às normas, mais brandas, da insolvência civil, e c. a obrigatoriedade de adoção, por empresários e sociedades empresárias, de um sistema de escrituração contábil (arts. 1.179 a 1.195) contendo regras bastante estritas que pelas repercussões fiscais que ensejam, representam induvidosos ônus para seus destinatários. Às sociedades simples não determina o Código a aplicação de tais regras, o que representa uma vantagem das sociedades simples frente ao sistema contábil imposto às sociedades empresárias. d. a possibilidade de adoção do tipo sociedade simples pela sociedade que seja simples em razão da sua natureza, o que a tornaria uma sociedade simples pura. Tipo este que contém inúmeras vantagens, arroladas no item “B” a seguir.

Dentre as distinções destacadas pela doutrina, tomamos a liberdade

de incluir, com relação especifica aos profissionais intelectuais, pessoa natural não

empresária, a negativa ao direito da ação renovatória, prevista na Lei de Locação

(Lei nº. 8245/1991)107.

Ao contrário do profissional intelectual (pessoa natural), a

sociedade simples (pessoa jurídica) que explora atividade dessa espécie, se

106 WALD, Arnaldo. Das sociedades simples e empresárias. Questões relacionadas ao regime jurídico da sociedade simples e seu registro. Disponível em: http://www.irtdpjbrasil.com.br/NEWSITE/ParecerWald.pdf - Acesso em: 25 jul. 2016. 107 RENOVATORIA DE LOCAÇÃO - Ação ajuizada por médico que exerce individualmente a profissão - O consultório médico não pode ser concebido como atividade comercial capaz de garantir o direito de renovação da locação com base na Lei nº 8.245/91 - Precedentes - Previsão contratual de alongamento da locação a depender do consenso entre as partes, sem caráter compulsório - Pedido de retomada do imóvel feito em sede de contestação - Incidência do artigo 74,da Lei 8.245/91, com a redação já alterada pela Lei Federal nº 12.112/09- Determinação para que o autor desocupe o imóvel no prazo de 30 dias - Apelação do autor não provida, provida a do réu (ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação Cível nº. 0044018-31.2007.8.26.0562, Relator: Sá Duarte, Data de Julgamento: 28/02/2011, 33ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 04/03/2011).

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preencher os requisitos legais, será beneficiária do direito da renovação compulsória

(art. 51, §4º, Lei de Locação108).109.

Ao revés, pela aplicação de norma própria aos profissionais

intelectuais, em detrimento do empresário individual e das sociedades, simples ou

empresária, temos a análise de culpa, quando da responsabilidade pelo fato do

serviço do profissional liberal nas relações de consumo (art. 14, §4º, CDC110).

1.9. Das Sociedades profissionais

Em princípio, no caso do exercício de atividade econômica por

pessoa natural que explora profissão dita intelectual, como engenheiros, arquitetos,

dentistas, médicos, advogados, artistas, atores, autores, artesões, escritores,

psicólogos etc., a lei afasta a sujeição desses profissionais autônomos às regras do

Direito Comercial.

Por isso, os profissionais intelectuais não se registram na Junta

Comercial, sendo exato, aliás, que algumas das atividades a que se dedicam

possuem regramento próprio e, por conta deste tratamento especial, há órgãos de

108 Art. 51. Nas locações de imóveis destinados ao comércio, o locatário terá direito a renovação do contrato, por igual prazo, desde que, cumulativamente: § 4º O direito a renovação do contrato estende - se às locações celebradas por indústrias e sociedades civis com fim lucrativo, regularmente constituídas, desde que ocorrentes os pressupostos previstos neste artigo. 109 APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO RENOVATÓRIA. CONTRATO DE LOCAÇÃO NÃO RESIDENCIAL. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DA RÉ. AGRAVO RETIDO CONHECIDO, E NO MÉRITO, NEGADO PROVIMENTO. OS DOCUMENTOS JUNTADOS AOS AUTOS EVIDENCIAM O PREENCHIMENTO DE TODOS OS REQUISITOS EXIGIDOS PELA LEI DE LOCAÇÕES, ARTIGOS 51 E 71 DA LEI N.º 8.245/91. DIREITO À RENOVAÇÃO DO CONTRATO POR SOCIEDADE CIVIL DE ADVOGADOS COM FINS LUCRATIVOS, REGULARMENTE CONSTITUÍDA. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 51, § 4º DA LEI Nº 8245/91. O PRÓPRIO RÉU EM SUAS CONTRARRAZÕES AFIRMA QUE NÃO SE OPÕE À RENOVAÇÃO DO CONTRATO, SE LIMITANDO A CONTROVÉRSIA AO VALOR DO ALUGUEL DO IMÓVEL. DESTA FORMA, NÃO HÁ QUE SE FALAR EM IMPROCEDÊNCIA DA DEMANDA, UMA VEZ QUE O OBJETIVO DA AÇÃO RENOVATÓRIA DE LOCAÇÃO É A PROTEÇÃO DO ESTABELECIMENTO. ALUGUEL QUE DEVE SER FIXADO EM R$ 29.000,00, CONFORME LAUDO PERICIAL. UTILIZAÇÃO DO MÉTODO DE RENTABILIDADE DE 12% ANO. CONSONÂNCIA COM ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL DE QUE O REFERIDO MÉTODO É MAIS ADEQUADO POR SER CAPAZ DE ESGOTAR A INDIVIDUALIDADE DE CADA IMÓVEL, EM CONTRAPOSIÇÃO ÀS DIFICULDADES EM SE OBTER AMOSTRAS COM CARACTERÍSTICAS E CONDIÇÕES SIMILARES DO IMÓVEL LOCADO QUE INDIQUEM A UTILIZAÇÃO DO MÉTODO COMPARATIVO. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. SENTENÇA REFORMADA. PRECEDENTES DO TJ/RJ. PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO (ESTADO DO RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, Apelação nº. 01948148720128190001, Relator: Des. Marco Aurélio Bezerra de Melo, data de julgamento: 04/08/2015, Décima sexta Câmara Cível, Data de Publicação: 07/08/201). 110 Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. § 4° A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa.

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classe que exigem registro para o exercício regular da profissão111, como no caso

de médicos112, engenheiros113, advogados114, biólogos115 etc. Esse registro, porém,

não os torna empresários.

A legislação, de qualquer forma, permite que os profissionais

intelectuais se reúnam em sociedade para exploração da atividade típica da

profissão (sociedade profissional), e essa é caracterizada como sociedade simples,

não empresária (art. 982 c.c. 966, p. único. CC). E como sociedade, para adquirir

personalidade jurídica, deve registrar-se no órgão competente (art. 985, CC), o qual,

por força de lei, é para as sociedades simples o Registro Civil das Pessoas

Jurídicas; e para as empresárias, a Junta Comercial (art. 1.150, CC). Excepciona-

se, contudo, as sociedades de advogados, cujo registro está exclusivamente a

cargo do Conselho Seccional da OAB em cuja base territorial tiver sede (art. 15, §1º,

Lei nº. 8.906/1994).

Se uma sociedade explora atividade própria de profissional

intelectual, sujeita-se igualmente aos regramentos da legislação especial que

regulamentam a correspondente, tendo de buscar registro no respectivo órgão de

classe. Assim, uma sociedade que explora atividade de profissional intelectual

legalmente regulamentada, salvo a de advogado, terá de se registrar tanto no órgão

de classe, quanto no Registro Civil das Pessoas Jurídicas.

Por exemplo, se uma sociedade pretende explorar atividade de

engenharia, haverá necessidade de registro prévio no respectivo Conselho Regional

para regularidade de sua atividade (art. 59, da Lei nº. 5194/1966)116 e, também, no

Registro Civil das Pessoas Jurídicas (art. 45 c.c. 1.150, CC).

111 Art. 5º, XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer; 112 Lei 3268/1957 - Dispõe sobre os Conselho de Medicina, e dá outras providências 113 Lei n.º 5194/1966 - Regula o exercício das profissões de Engenheiro, Arquiteto e Engenheiro-Agrônomo, e dá outras providências. 114 Lei n.º 8906/1994 - Dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). 115 Lei n.º 6.684, de 3 de setembro de 1979 - Regulamenta as profissões de Biólogo e de Biomédico, cria o Conselho Federal e os Conselhos Regionais de Biologia e Biomedicina, e da outras providências. 116 Art. 59. Lei nº. 5194/1966 - As firmas, sociedades, associações, companhias, cooperativas e empresas em geral, que se organizem para executar obras ou serviços relacionados na forma estabelecida nesta lei, só poderão iniciar suas atividades depois de promoverem o competente registro nos Conselhos Regionais, bem como o dos profissionais do seu quadro técnico.

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[...] a noção prospectada no contexto das sociedades simples evidencia, sem maiores dificuldades, traço característicos que a assemelha às organizações de conteúdo uni ou multiprofissional, com a percepção de natureza não empresarial, cuja submissão particulariza a força do contrato, dentro dos princípios da autonomia da vontade e congraçamento captando o núcleo status socci. [...] As sociedades profissionais banhadas pelo legislador com sede na força normativa podem se diversificar no ramo da medicina, engenharia, de advogados, arquitetos, publicidade, propaganda, enfim, um leque incomensurável de atividades próprias que se estabelece com dupla finalidade, a primeira, de atender a modalidade organizacional, a segunda, se coadunar com o elemento gerador de condições técnicas peculiares ao desenvolvimento econômico117.

O que define uma sociedade profissional como simples é a forma de

exploração de seu objeto social e não os membros que a compõem, pois é possível

verificar a constituição dessa espécie de sociedade simples sem que os sócios

sejam profissionais intelectuais.

Desse modo, diferentemente do que pensa Tércio Sampaio Ferraz

Júnior, para quem, “na sociedade de profissionais liberais, o engenheiro não

engenheiro porque é sócio, mas é sócio por que é engenheiro.118”, a sociedade que

explora engenharia pode, por autorização legal, ser formada por sócios que não

sejam engenheiros (art. 5º, da Lei nº. 5194/1966119). É evidente que, para a

regularidade da atividade e o registro no CREA, será necessário que a pessoa

jurídica possua profissional habilitado em engenharia como responsável técnico (art.

8º, da Lei 5194/1966120), mas não é condição sine qua non que todos os sócios

sejam engenheiros, como faz querer crer a afirmação citada.

Essa permissão, por exemplo, possibilita que uma sociedade que

careça de investimento tenha suprida a sua necessidade por pessoa não vinculada

117 ABRÃO, Carlos Henrique. Sociedade simples. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 78. 118 FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. Da inexistência de fundo de comércio nas sociedades de profissionais de engenharia. Revista de Direito Mercantil: industrial, econômico e financeiro, n. 111, São Paulo, jul./set. 1998, p. 51. 119 Art. 5º Só poderá ter em sua denominação as palavras engenharia, arquitetura ou agronomia a firma comercial ou industrial cuja diretoria fôr composta, em sua maioria, de profissionais registrados nos Conselhos Regionais. 120 Art. 8º As atividades e atribuições enunciadas nas alíneas a , b , c , d , e e f do artigo anterior são da competência de pessoas físicas, para tanto legalmente habilitadas. Parágrafo único. As pessoas jurídicas e organizações estatais só poderão exercer as atividades discriminadas nos Ed. extra 7º, com excessão das contidas na alínea " a ", com a participação efetiva e autoria declarada de profissional legalmente habilitado e registrado pelo Conselho Regional, assegurados os direitos que esta lei lhe confere. (sic).

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à profissão, capitalizando-se a pessoa jurídica, que terá em seu quadro social um

sócio investidor.

A atual versão do Código Comercial Projetado é mais esclarecedora

nesse sentido, ao argumentar no artigo 218121, § 2.º, que “é permitida a participação

de sócio investidor, sem a habilitação profissional correspondente ao objeto social. ”

Algumas profissões intelectuais, por conta de legislação própria, não

permitem a presença em seus quadros sociais de sócios que não explorem a

respectiva profissão como, por exemplo, a sociedade que explora prestação de

serviços de advocacia na qual somente são permitidos sócios devidamente inscritos

como advogados (art. 16, Lei nº. 8.906/1994122).

No direito italiano, a sociedade profissional é o empreendimento

formado exclusivamente para a operação conjunta por membros da profissão

(advogados, engenheiros, médicos etc.).123, diferentemente daquilo que estamos

abordando aqui, pois, nesse contexto, a sociedade profissional somente seria

possível entre membros da mesma profissão, o que nem sempre ocorre na prática.

Na Espanha, a matéria é prevista na Lei nº 2/2007 (“Ley de

Sociedades Profesionales - Ley 2/2007, de 15 de marzo, de sociedades

profesionales)124 que trata das sociedades profissionais, definida como aquela que

tem por objeto social o exercício em comum de uma atividade profissional, ou seja,

aquela cujo exercício dependa de titulação universitária e inscrição em órgão

121 Art. 218. Quando constituída a sociedade para o exercício em comum de profissão regulamentada, o sócio que exercer, por meio dela, a profissão compreendida pelo objeto social deve estar habilitado pelo respectivo órgão de controle e fiscalização profissional. § 1º. A maioria de votos nas deliberações sociais é privativa de sócios habilitados para o exercício da profissão regulamentada compreendida pelo objeto social. § 2º. É permitida a participação de sócio investidor, sem a habilitação profissional correspondente ao objeto social 122 Art. 16. Não são admitidas a registro nem podem funcionar todas as espécies de sociedades de advogados que apresentem forma ou características de sociedade empresária, que adotem denominação de fantasia, que realizem atividades estranhas à advocacia, que incluam como sócio ou titular de sociedade unipessoal de advocacia pessoa não inscrita como advogado ou totalmente proibida de advogar. 123 La società tra professionisti è la società costituita esclusivamente per l’esercizio in comune dell’attività professionale svolta dai soci (avvocati, ingegneri, medici etc.). Si tratta di una società senza impresa in quanto l’attività dei professionisti intellettuali, pur essendo attività economica, non è qualificata come attività di impresa. (MORETTI, A. Le Società in geneale. Compendio di Diritto Commerciale, 2012, p. 115-130. e p. 121.). 124 ESPANHA. Ley 2/2007, de 15 de marzo de 2007. Ley de sociedades profesionales. Disponível em: < https://www.boe.es/buscar/act.php?id=BOE-A-2007-5584> Acesso em: 10 jul. 2017.

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profissional (artigo 1)125. Novamente, a lei alienígena diverge da nacional no que

concerne à necessidade de os membros serem da mesma profissão.

Verificamos na exposição de motivos da lei de sociedades

profissionais espanholas que sua criação foi inspirada na evolução das formas de

atuação profissional em equipe, e que teve origem na difusão, escola e

complexidade dessas atividades e nas vantagens decorrentes da especialização e

divisão do trabalho126.

Neste ponto, portanto, importante definir com maior clareza o

conceito de sociedade profissional que será abordado neste trabalho. Para esse fim,

buscaremos auxílio na doutrina espanhola que, com propriedade, distingue a

sociedade profissional de outros agrupamentos entre profissionais.

A doutrina espanhola distingue as seguintes espécies de sociedade

profissional: (i) sociedade de meios (Las sociedades de medios); (ii) sociedade de

comunicação recíproca de resultados (Las sociedades de comunicación de

ganancias); (iii) sociedade de intermediação (Las sociedades de intermediación); e

(iv) sociedade profissional em sentido estrito (Las sociedades profesionales en

sentido estricto) 127.

Na sociedade entre profissionais, ou sociedade de meios (Las

sociedades de medios), os sócios se propõem a compartilhar os recursos materiais 125 Artículo 1 Definición de las sociedades profesionales 1. Las sociedades que tengan por objeto social el ejercicio en común de una actividad profesional deberán constituirse como sociedades profesionales en los términos de la presente Ley. A los efectos de esta Ley, es actividad profesional aquélla para cuyo desempeño se requiere titulación universitaria oficial, o titulación profesional para cuyo ejercicio sea necesario acreditar una titulación universitaria oficial, e inscripción en el correspondiente Colegio Profesional. A los efectos de esta Ley se entiende que hay ejercicio en común de una actividad profesional cuando los actos propios de la misma sean ejecutados directamente bajo la razón o denominación social y le sean atribuidos a la sociedad los derechos y obligaciones inherentes al ejercicio de la actividad profesional como titular de la relación jurídica establecida con el cliente. 2. Las sociedades profesionales podrán constituirse con arreglo a cualquiera de las formas societarias previstas en las leyes, cumplimentando los requisitos establecidos en esta Ley. 3. Las sociedades profesionales se regirán por lo dispuesto en la presente Ley y, supletoriamente, por las normas correspondientes a la forma social adoptada. 126 Disponível em < https://www.boe.es/buscar/act.php?id=BOE-A-2007-5584> Acesso em 10 jul. 2017. 127 Nesse sentido ver: ESTIVILL, Josep M. Fugardo. Actividad profesional y sociedades profesionales. Introducción. La Notaria – Boletim, Barcelona, n. 40, p. 11-58, abril 2007. PAZ-ARES, Cándido. Las sociedades profesionales (Principios y bases de la regulación proyectada). Revista Crítica de Derecho Inmobiliario, n. 653, p.1257-1999, jul./ago. 1999. VARGAS, Aurora Campins, La sociedade professional, Madri: S.L: Civitas Ediciones, 2000.

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e pessoais necessários para o exercício individual da profissional. O acordo dos

membros de sociedade entre profissionais não se estende à atividade, é uma

organização interna para facilitar o exercício individual da profissão. Nessa espécie

de sociedade, há uma comunhão para partilha das despesas e não do resultado,

cujo desempenho depende única e exclusivamente de cada profissional128.

As sociedades de comunicação recíproca de resultados (Las

sociedades de comunicación de ganancias) caracteriza a empresa dotada de

estrutura organizacional voltada para a repartição das perdas e dos ganhos

provenientes do exercício individual da profissão por cada sócio, permitindo aos

membros, reciprocamente, dividir os riscos e reduzir as variações dos ganhos

individuais129.

A sociedade de intermediação de serviços profissionais (Las

sociedades de intermediación) se distingue por ser aquela que faz o agenciamento,

cuja única responsabilidade consistiria em aproximar o cliente do profissional. Essas

sociedades se envolvem na relação entre o profissional e o cliente como um agente

mediador e coordenador da intermediação.

De forma distinta, a sociedade profissional em sentido estrito (Las

sociedades profesionales en sentido estricto) apresenta-se a terceiro como pessoa

jurídica própria, entidade organizacional externa, voltada ao mercado. A atividade é

exercida por seus sócios, auxiliares ou colaboradores, porém em nome da

sociedade profissional e não em nome individual e, assim, os direitos e as

obrigações decorrentes da atividade explorada são, reconhecidamente, ligados a 128 La primera manifestación relevante encuentra su paradigma en las denominadas sociedades de medios. Bajo esta expresión nos referimos a aquellos supuestos en que varios profisionales (abogados, médicos, arquitectos, etc.) acuerdan asociarse a fin de dotarse y compartir la infraestructura necesaria (inmuebles, equipos, personal auxiliar, etc.) para el desempeño individual de la profesión [ofrece un buen ejemplo, al respecto, el art. 35.b) del Estatuto General de la Abogacía de 24-7-82, actualmente vigente]. La caracterización societaria de estos supuestos no plantea problemas desde la perspectiva del concepto amplio de sociedad que hemos desarrollado en el capítulo 19. La falta de ánimo de lucro - obsérvese que el fin de la sociedad no es obtener ganancias, sino regular el uso de la infraestructura y distribuir sus costes- no impide la subsunción de la figura dentro de los fenómenos societarios. En la normalidad de los casos, la sociedad de medios será una sociedad meramente interna, para cuya regulación son más que suficientes las normas generales que ofrece el Código Civil. No hay que descartar, sin embargo, que la sociedad de medios se constituya como sociedad externa cuando, por la complejidad de la organización, sea precisa una presencia constante en el tráfico externo (contratación frecuente de personal, gestión de servicios comunes, proyectos conjuntos, etc.). (PAZ-ARES, Cándido. Las sociedades profesionales (Principios y bases de la regulación proyectada). Revista Crítica de Derecho Inmobiliario, n. 653, p.1257-1999, jul./ago. 1999). 129 VARGAS, Aurora Campins, La sociedade professional, Madri: S.L: Civitas Ediciones, 2000, p. 46.

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sociedade e não aos sócios. Em decorrência dessas características, a finalidade é a

obtenção do lucro social e a partilha do resultado entre os sócios, de acordo com a

participação societária130.

A exposição de motivos da “Ley de Sociedades Profesionales” deixa

claros essa distinção e o fato de a lei tratar da sociedade profissional em sentido

estrito, como aquela pessoa jurídica que, efetivamente, exerce atividade

profissional, apresentando-se a terceiros como personalidade jurídica própria,

distinta de seus sócios. Em suma, aquela que é centro de imputação, detendo

direito e contraindo obrigações, relacionando-se diretamente com seus clientes.

En el primer aspecto, la nueva Ley consagra expresamente la posibilidad de constituir sociedades profesionales stricto sensu. Esto es, sociedades externas para el ejercicio de las actividades profesionales a las que se imputa tal ejercicio realizado por su cuenta y bajo su razón o denominación social. En definitiva, la sociedad profesional objeto de esta Ley es aquélla que se constituye en centro subjetivo de imputación del negocio jurídico que se establece con el cliente o usuario, atribuyéndole los derechos y obligaciones que nacen del mismo, y, además, los actos propios de la actividad profesional de que se trate son ejecutados o desarrollados directamente bajo la razón o denominación social. Quedan, por tanto, fuera del ámbito de aplicación de la Ley las sociedades de medios, que tienen por objeto compartir infraestructura y distribuir sus costes; las sociedades de comunicación de ganancias; y las sociedades de intermediación, que sirven de canalización o comunicación entre el cliente, con quien mantienen la titularidad de la relación jurídica, y el profesional persona física que, vinculado a la sociedad por cualquier título (socio, asalariado, etc.), desarrolla efectivamente la actividad profesional. Se trata, en este último caso, de sociedades cuya finalidad es la de proveer y gestionar en común los medios necesarios para el ejercicio individual de la profesión, en el sentido no de proporcionar directamente al solicitante la prestación que desarrollará el profesional persona física, sino de servir no sólo de intermediaria para que sea éste último quien la realice, y también de coordinadora de las diferentes prestaciones específicas seguidas131.

130 Al lado de los tipos empíricos previamente mencionados se sitúa la sociedad profesional en sentido estricto (así llamada para distinguirla de las restantes, que simplemente serían «sociedades de profesionales»). Lo característico de esta modalidad del asociacionismo profesional es que la sociedad se constituye como sociedad externa dotada de personalidad jurídica (en esto se diferencia de las sociedades de medios y de comunicación de ganancias), que su objeto social es la prestación de servicios profesionales en el mercado (en esto se diferencia de las sociedades de intermediación, cuyo cometido no es prestar servicios profesionales, sino mediar en este campo) y que la actividad profesional realizada por sus socios y asociados - y los derechos y obligaciones que de ella se derivan se imputan directamente a la sociedad (y no -como sucedía en los casos anteriores - a los socios). En realidad, ésta es la verdadera sociedad profesional y la única que en rigor plantea problemas especiales que justifican su estudio separado. (PAZ-ARES, Cándido. Las sociedades profesionales (Principios y bases de la regulación proyectada). Revista Crítica de Derecho Inmobiliario, n. 653, p.1257-1999, jul./ago. 1999). 131 Em princípio, a nova lei prevê expressamente a possibilidade de constituir sociedades profissionais em sentido estrito. Isto é, sociedades que externam o exercício de atividades profissionais, imputando-lhes o exercício por conta própria e sob sua denominação social. Em suma, a sociedade profissional, objeto desta Lei, é aquela que constitui centro subjetivo de imputação do negócio jurídico que se estabelece com o cliente ou usuário, atribuindo os seus direitos e as suas obrigações decorrentes e, também, os atos próprios da atividade profissional, executados ou desenvolvidos diretamente sob a denominação social. Estão, portanto, fora do

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Diante dessa distinção, nos parece que a redação do artigo 214 do

Código Comercial Projetado, que define a sociedade profissional como aquela que

“[...] é a constituída para proporcionar o exercício em comum de profissão intelectual

ou regulamentada”, trata de uma definição de sociedade entre profissionais e não

sociedade profissional em sentido estrito.

Em que pese o atual Código Civil brasileiro não explicitar com tanta

clareza o que seja uma sociedade profissional, parece-nos que é possível

identificar, nos termos dos artigos 982 e 966 do Código Civil, as diversas espécies

tratadas pela doutrina espanhola, pois, em todos os casos, há atuação da sociedade

na exploração de atividade própria de profissão intelectual.

Assim, a sociedade profissional em sentido estrito pode ser definida

como aquela que (i) se apresenta ao mercado com personalidade jurídica própria

(sociedade externa); (ii) objetiva a atividade profissional regulamentada; (iii) tem sua

atividade desempenhada por seus sócios ou colaboradores; e (iv) visa obter lucro

para partilha dos resultados entre os sócios132.

1.9.1. Das Sociedades profissionais e o elemento de empresa.

A sociedade profissional, em decorrência do disposto na lei, é

considerada como uma espécie de sociedade simples. Ocorre que o artigo 966,

parágrafo único, do Código Civil, traz a possibilidade de a sociedade profissional ser

considerada sociedade empresária se exercer sua atividade com elemento de

empresa.

alcance da Lei, as sociedades de meio, criadas para partilhar os custos de infraestrutura e distribuição; sociedades de comunicação recíproca de resultados; e as sociedades de intermediação de serviços profissionais, que servem como canalização ou comunicação entre o cliente, que mantém a titularidade da relação jurídica, e o profissional pessoa física que, vinculado à sociedade por qualquer título (sócio, assalariados, etc.), desenvolve efetivamente a atividade profissional. Trata, essa última, de sociedade cuja finalidade é fornecer e gerir o conjunto de meios necessários para o exercício individual da profissão, ou seja, não proporcionar diretamente ao solicitando a prestação que seria desenvolvida por profissional pessoa física e, sim, servir somente de intermediadora para que seja esse último quem a realize, e também de coordenar diferentes prestações específicas seguidas. (Exposição de motivo da Ley 2/2007 - Disponível em: < https://www.boe.es/buscar/act.php?id=BOE-A-2007-5584> Acesso em: 10 jul. 2017). 132 LEITE JÚNIOR. Carlos Antônio Goulart. Affectio societatis: na sociedade civil e na sociedade simples. Rio de Janeiro Forense, 2006, p. 227.

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[...] seguindo a diretriz do art. 966, parágrafo único, do Código Civil, nos casos em que o exercício da profissão intelectual dos sócios das sociedades uniprofissionais (que compõem o seu objeto social) constituir elemento de empresa, ou seja, nos casos em que as sociedades uniprofissionais explorarem seu objeto social com empresalidade (organização dos fatores de produção), elas serão consideradas empresárias133.

Assim como ocorre na legislação italiana (artigo 2238134), o Código

Civil brasileiro não elabora o conceito de elemento de empresa, deixando à doutrina

os esforços para sua construção. A distinção, nesse ponto, entre a lei brasileira e a

italiana é que, na Itália, basta que o profissional intelectual contrate colaborador ou

auxiliar para ser considerado empresário135, enquanto, no Brasil, essa contratação

não caracteriza o profissional intelectual como empresário (art. 966, p. único, CC).

A essência do conceito buscado é a constatação de que a atividade

intelectual, de natureza científica, literária ou artística, deixou de ser o exclusivo

objeto da atividade explorada pela sociedade e tornou-se apenas mais um

componente da organização empresarial, um elemento da empresa.

Elemento de empresa significa que, quando o exercido da atividade intelectual vier a integrar, se torna parte da empresa, o sujeito que a exercita ganha natureza empresarial. Ou seja, nas situações em que a profissão de natureza intelectual se torna apenas uma parte de uma atividade econômica organizada, o explorador desta atividade será considerado empresário136.

À primeira vista, o elemento de empresa parece tratar-se de um

fator novo a ser adicionado à atividade que preenche os requisitos necessários para

qualificar-se como empresarial. Contudo, se devemos somar um elemento, o

133 RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Direito empresarial esquematizado. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2010, p. 89. 134 Art. 2238 Rinvio Lo statuto contenente le norme relative al funzionamento della societa', anche se forma oggetto di atto separato, si considera parte integrante dell'atto costitutivo e deve essere a questo allegato. 135 Diversa dalla società fra professionisti, nella quale vi è una società senza che sia svolta attività di impresa, è l’ipotesi cui fa riferimento l’art. 2238, che prevede l’applicabilità della disciplina dettata in materia di lavoro nell’impresa alle ipotesi in cui la professione intellettuale venga esercitata nell’ambito di una attività organizzata in forma di impresa. Si pensi al caso del medico che presta la propria attività lavorativa presso una casa di cura: in tale ipotesi, la disciplina dell’attività di impresa si cumula a quella propria della prestazione d’opera intellettuale. (SAGGEE, Francesco Laviano i PEPE, Iolanda. Del Lavoro. Codice Civile. Illustrato con dottrina, giurisprudenza, schemi, mappe e materiali, p. 1291-1758, 2010, p. 1371). 136 SILVA, Fernando Cândido da. Sociedade Simples: da natureza jurídica ao tipo societário. São Paulo: LCTE, 2009, p. 32.

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denominado “elemento de empresa”, às características da atividade empresarial,

não pode este elemento ter o mesmo conteúdo daquele ao qual deve ser somado137.

Nessa linha de raciocínio, uma sociedade que exercer atividade

típica de profissional intelectual será considerada simples, porém, se essa atividade

for apenas um dos elementos explorados pela pessoa jurídica, sendo sua

especificidade absorvida pelas demais atividades, a sociedade será considerada

como empresária138.

Pelo artigo 966, o trabalhador intelectual não é empresário, mas, logo em seguida, aponta uma exceção no parágrafo único: salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa. Isto significa que o trabalho exercido pelo profissional for um dos fatores de produção, fator esse que será combinado com os outros, para constituir a atividade empresarial. O trabalho intelectual é apenas um dos componentes do produto oferecido ao mercado pela empresa, mas não o produto ou serviço em si mesmo. O trabalho intelectual exercido por sócios de uma empresa não é o produto ou serviço dela, mas uma parcela, um fator de produção considerando-se produto da empresa e não de seus sócios139.

Uma sociedade simples apresentaria elemento de empresa quando,

por si só, seu objeto social fosse utilizado como fator de organização do trabalho de

terceiros, explorando atividade própria de profissional intelectual dentro de sua

atividade econômica numa clara organização dos meios de produção inerentes a

empresa.

Por exemplo: uma pessoa jurídica que se constituiu para o exercício

da atividade intelectual própria da medicina, mantendo uma clínica na qual atuam

seus sócios, médicos de diversas especialidades da área da saúde, com o auxílio

de colaboradores – enfermeiros, assistentes, secretárias, dentre outros –, fazendo

com que o seu negócio (a clínica médica) seja procurado precipuamente pela

137 LIPPERT, Marcia Mallmann. O ‘elemento de empresa’ como fator de reinclusão das atividades de natureza científica, literária ou artística na definição das atividades empresariais. Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul: Porto Alegre, 2009, p. 129. 138 Enunciado 194 da III Jornada de Direito Civil coordenada pelo Conselho da Justiça Federal. - Os profissionais liberais não são considerados empresários, salvo se a organização dos fatores da produção for mais importante que a atividade pessoal desenvolvida. Enunciado 195 da III Jornada de Direito Civil coordenada pelo Conselho da Justiça Federal. - A expressão “elemento de empresa” demanda interpretação econômica, devendo ser analisada sob a égide da absorção da atividade intelectual, de natureza científica, literária ou artística, como um dos fatores da organização empresarial. 139 ROQUE, Sebastião José. Da sociedade simples. 1. ed. São Paulo: Ícone, 2011, p. 52.

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atividade intelectual, será uma sociedade simples, e não empresária, por

desenvolver exclusivamente atividade intelectual própria do profissional de

medicina.

Todavia, se essa pessoa jurídica contrata inúmeros outros médicos

e profissionais de saúde, diversificando o seu objeto, que se sobrepõe ao aspecto

apenas intelectual, como ocorre em um hospital, estaremos diante de uma

sociedade empresária, por conta da atividade profissional ser absorvida e encarada

como um dos elementos da empresa.

O diferenciador entre a sociedade simples e a sociedade empresária

está na forma de exploração da atividade e não nos membros que a compõem

como sócios, pois o conceito de interesse é objetivo, e não personalíssimo. Tanto

que uma sociedade profissional de engenharia, mesmo que todos os seus sócios

sejam engenheiros, pode explorar atividade empresarial de construção civil,

considerada como empresarial, e assim ser considerada por conta do elemento de

empresa.

Nessa linha de entendimento é o artigo 221 do Projeto de Código

Comercial140 que dispõe acerca da necessidade da sociedade profissional ter por

objeto apenas aquele relacionado à referida profissão, exceto se permitido pelo

órgão a ela relacionado.

Por isso, filiamo-nos à conclusão de Marcia Mallmann Lippert:

Nesse contexto e após demorada reflexão sobre o assunto, não parece ser este o caso do artigo 966 do Código Civil Brasileiro. Isso porque, embora o caput contenha previsões com larga abrangência, não são todas indeterminadas necessariamente e, tampouco, de cunho valorativo. A seu turno, o parágrafo único estabelece uma exceção, uma verdadeira exclusão da previsão geral do caput e, ao mesmo tempo, com um vocábulo aparentemente geral, reinclui a situação imediatamente antes excetuada. Por outro lado, as características para ser empresário estão arroladas no caput do artigo 966, de forma que ‘elemento de empresa’ deveria significar algo diferente daquilo que já serviu para enquadrar alguém como empresário, de forma genérica. Por isso, alguns autores falaram em

140 Art. 221. O objeto da sociedade profissional não pode compreender outras atividades, além das relacionadas à profissão regulamentada a que se dedicam seus sócios, salvo se o permitir, e nos limites que estabelecer, o órgão de controle e fiscalização profissional.

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‘impessoalidade’ no exercício da atividade executada pelo profissional intelectual, como sinônimo de ‘elemento de empresa’; outros arrolaram a sub-contratação ou o exercício da atividade mediante o ‘concurso de auxiliares ou colaboradores’ como sinônimo de ‘elemento de empresa’. Porém, nenhuma dessas hipóteses se sustenta, seja porque pessoalidade ou impessoalidade é uma característica tênue, fugaz, uma qualidade do serviço que se encontra, ou não, em determinada atividade, seja porque contar ou não com auxiliares ou colaboradores é uma liberalidade da atividade empresarial que não a caracteriza ou descaracteriza, uma vez que o empresário individual pode exercer a atividade por si, ao passo que uma sociedade empresária pode contar com alguns ou muitos colaboradores. Contudo, uma vez afastadas essas possibilidades e concluído que ‘elemento de empresa’ quer dizer ‘elemento de uma outra atividade a qual é empresarial’, cuja definição já foi alcançada pela definição de sociedade empresária e de empresário, não parece adequado falar-se em cláusula geral141.

Escapa a esse figurino a sociedade de prestação de serviços de advocacia,

que norma legal expressamente qualifica como sociedade simples (art. 15º, Lei n.º

8.906/1994142), impedindo o registro e o funcionamento daquelas que apresentem

forma ou características de sociedade empresária (art. 16, Lei n.º 8906/1994143). A

proibição se estende a qualquer outra atividade além da de advocacia, pois deve

constar no pacto social, como objeto único, a prestação de serviços de advocacia,

conquanto “podendo especificar o ramo de direito a que a sociedade se dedicará”

(art. 2º, II, do Provimento n.º 112/2006 do Conselho Federal da Ordem dos

Advogados do Brasil144). Ora, se é vedada à sociedade prestar serviços de

advocacia, ou seja, explorar outra atividade que não seja essa, é evidente que

somente pode ser considerada como sociedade simples, pois não poderia haver,

nessa situação, elemento de empresa.

141 LIPPERT, Marcia Mallmann. O ‘elemento de empresa’ como fator de reinclusão das atividades de natureza científica, literária ou artística na definição das atividades empresariais. Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul: Porto Alegre, 2009, p. 135-136. 142 Art. 15. Os advogados podem reunir-se em sociedade simples de prestação de serviços de advocacia ou constituir sociedade unipessoal de advocacia, na forma disciplinada nesta Lei e no regulamento geral. 143 Art. 16. Não são admitidas a registro nem podem funcionar todas as espécies de sociedades de advogados que apresentem forma ou características de sociedade empresária, que adotem denominação de fantasia, que realizem atividades estranhas à advocacia, que incluam como sócio ou titular de sociedade unipessoal de advocacia pessoa não inscrita como advogado ou totalmente proibida de advogar. 144 Art. 2º O Contrato Social deve conter os elementos e atender aos requisitos e diretrizes indicados a seguir: II - o objeto social, que consistirá, exclusivamente, no exercício da advocacia, podendo especificar o ramo do direito a que a sociedade se dedicará;

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1.10. A reinclusão da sociedade profissional como empresária por constituir

elemento de empresa

Como vimos, a doutrina traz como principais distinções entre a

sociedade empresária e a sociedade simples: o órgão de registro, a escrituração e a

aplicação da Lei de Falências.

Com relação ao órgão de registro, quando verificado que, na

sociedade, se exerce atividade profissional intelectual como elemento de empresa,

deve providenciar-se a conversão da sociedade simples em sociedade empresarial,

mediante a alteração contratual pertinente, que, averbada no Registro Civil, será

arquivada, com a consolidação do contrato social, na Junta Comercial da sede (art.

28 da Instrução Normativa nº 35 de 02 de março de 2017 do Departamento de

Registro Empresarial e Integração - DREI145).

No caso da escrituração, de há muito não se verifica distinção

prática entre as sociedades simples e empresárias, pois os livros têm tratamento em

diversas legislações (trabalhista, previdenciárias, fiscal etc.), sem diferenciação

entre as espécies de sociedades, exceto quanto ao livro Diário, único efetivamente

obrigatório aos empresários (art. 1.179146 e 1.180147, do Código Civil), se não

qualificados como ME (Microempresa) ou EPP (Empresa de Pequeno Porte).

Nessa situação, bastaria que a sociedade simples convertida em

sociedade empresária passasse a escriturar o livro Diário para adequar-se à

legislação civil148.

145 Disponível em: http://drei.smpe.gov.br/documentos/35instrucaonormativadreino35operacoessocietarias.pdf Acesso em: 11 jun. 2017. 146 Art. 1.179. O empresário e a sociedade empresária são obrigados a seguir um sistema de contabilidade, mecanizado ou não, com base na escrituração uniforme de seus livros, em correspondência com a documentação respectiva, e a levantar anualmente o balanço patrimonial e o de resultado econômico. § 1o Salvo o disposto no art. 1.180, o número e a espécie de livros ficam a critério dos interessados. § 2o É dispensado das exigências deste artigo o pequeno empresário a que se refere o art. 970. 147 Art. 1.180. Além dos demais livros exigidos por lei, é indispensável o Diário, que pode ser substituído por fichas no caso de escrituração mecanizada ou eletrônica. Parágrafo único. A adoção de fichas não dispensa o uso de livro apropriado para o lançamento do balanço patrimonial e do de resultado econômico. 148 Ou seja, no que diz respeito à força probante dos documentos em geral, há muito nada havia de especial que protegesse os mercadores. A regalia antes concedida exclusivamente aos comerciantes sobre os livros mercantis esta abolida desde 1974, com o início da vigência do Código de Processo Civil (FORGIONI, Paula

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Assim, a consequência prática mais relevante da caracterização da

atividade de sociedade simples, que o exercício de profissão intelectual constituir

elemento de empresa, é, de certa forma, a aplicação dos benefícios da Lei de

Falência e Recuperação de Empresas (Lei nº 11.101/2005).

Requião destacara já que a principal especificidade da unificação do

Direito Privado seria a da aplicação da Lei de Falências aos demais agentes do

mercado, advertindo, todavia, que:

A unificação [...] se nos afigura, todavia, tímida. Tornar-se-á uma unificação ilusória. É feita, a exemplo de seu paradigma italiano, pela metade. Ficará o direito brasileiro, a prevalecer o sistema adotado pelo governo, no meio do caminho. E isso porque enquanto a Falência permanecer como instituto eminentemente comercialista, é impossível a unificação, em toda natural extensão da palavra149.

A vigente Lei de Falência e Recuperação de Empresas (Lei nº.

11.101/2005) é de aplicação exclusiva aos empresários e às sociedades

empresárias (art. 1º, LFRE150) e, portanto, de sua abrangência afastados estão o

profissional autônomo e as sociedades simples.

Nos casos de insolvência do profissional autônomo ou sociedade

profissional, não há a possibilidade da busca do benefício da recuperação de

empresas, nem seu o credor não pode iniciar execução concursal pela via

falimentar, devendo agir pelo procedimento da insolvência civil ainda regulado pelo

Código de Processo Civil de 1973 (art. 1.052, CPC151).152´153´154

Andrea. A evolução do direito comercial brasileiro: da mercancia ao mercado. 3.. ed. ver. atul. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, p. 83. 149 REQUIÃO, Rubens. Notas sobre o projeto do Código de Obrigações (Projeto nº. 3.264/65). Curitiba: Universidade do Paraná, 1966, p. 19. 150 Art. 1º Esta Lei disciplina a recuperação judicial, a recuperação extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária, doravante referidos simplesmente como devedor. 151 Art. 1.052. Até a edição de lei específica, as execuções contra devedor insolvente, em curso ou que venham a ser propostas, permanecem reguladas pelo Livro II, Título IV, da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973. 152 Estão sujeitos à falência, em princípio, os devedores exercentes de atividade econômica de forma empresarial, isto é, os empresários. A diferença entre os empresários e os demais exercentes de atividade econômica não reside no tipo de atividade explorada, mas na forma com que a exploram. Muitas atividades de produção ou circulação de bens ou serviços podem ser exploradas empresarialmente ou não. Tanto o peixeiro instalado em sua pequena banca na praia, onde trabalha com seus familiares, como a rede multinacional de supermercados, comercializam pescados. Aquele, porém, o faz sem empresarialidade, isto é, sem organizar a atividade por meio de investimento de considerável capital, contratação de expressiva mão de obra e emprego

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Todavia, ao constituir atividade de natureza intelectual um elemento

de empresa, o profissional autônomo ou sociedade profissional que a exercem

serão qualificados como empresários e, dessa maneira, eventualmente submetidos

ao regime falimentar155. Na mesma linha, há precedentes para o deferimento de

de tecnologia sofisticada; ele não é empresário. Já o supermercado explora o mesmo comércio por uma organização necessariamente empresarial. Para sujeitar-se à falência é necessário explorar atividade econômica de forma empresarial. Disso resulta que não se submetem à execução concursal, de um lado, quem não explora atividade econômica nenhuma e, de outro, quem o faz sem empresarialidade. Quem não produz nem faz circular bens ou serviços, assim, nunca terá sua falência decretada, nem poderá beneficiar-se de qualquer tipo de recuperação judicial ou extrajudicial. É o caso, por exemplo, da associação beneficente, fundação, funcionário público, aposentado, assalariado etc. Estes sujeitos de direito, mesmo que estejam com dificuldades para honrar suas dívidas, não se submetem à execução concursal falimentar. Quando insolventes, decreta-se sua insolvência civil. Também não terá nunca sua falência decretada o exercente de atividade econômica civil, não empresarial, como as sociedades simples, as cooperativas, o agricultor familiar cuja atividade rural não tenha cunho empresarial, o artesão e o prestador de serviços que exercem suas atividades preponderantemente com o trabalho próprio e de familiares, o profissional liberal e as sociedades de profissionais liberais. Nessas hipóteses, o devedor insolvente submete-se ao regime da insolvência civil, tal como ocorre com os não exercentes de atividade econômica. Não têm eles, assim, direito à recuperação judicial ou extrajudicial e devem, para ver extintas suas obrigações, quitar a totalidade do devido (COELHO, Fábio Ulhoa. Comentários à Lei de Falências e de recuperação de empresas. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 277). 153 COMERCIAL E PROCESSUAL CIVIL. PEDIDO DE FALÊNCIA. REVELIA. POSTERIOR APRESENTAÇÃO DOCUMENTAL DEMONSTRANDO CUIDAR-SE DE SOCIEDADE CIVIL. EXTINÇÃO DO PROCESSO POR IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO DE QUEBRA. CONDIÇÃO DA AÇÃO. MATÉRIA DE FATO. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULAS N. 5 E 7-STJ. I. A revelia não impede que o magistrado monocrático, ante a juntada, mesmo que tardia, de documentos demonstrando cuidar-se de sociedade civil, possa considerá-los para efeito de extinguir o processo em que é postulada a falência da recorrida, por impossibilidade jurídica do pedido. II. Ainda que viável, em certos casos, a decretação da quebra de sociedades civis, quando demonstrado o seu caráter essencialmente comercial, necessário que isso seja expressamente afirmado pela instância ordinária, soberana no exame fático, o que não aconteceu na espécie dos autos, em que a conclusão foi no sentido da inexistência de tal atividade, obstada a sua revisão pelo STJ, ao teor das Súmulas n. 5 e 7. III. Recurso especial não conhecido (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 244497 - PR. Relator: Aldir Passarinho Junior, Julgado em 20/06/2006, Quarta Turma, DJe 14/08/2006) 154 APELAÇÃO CÍVEL. PEDIDO DE AUTOFALÊNCIA. SOCIEDADE SIMPLES DE RESPONSABILIDADE LIMITADA. IMPOSSIBILIDADE. INAPLICABILIDADE DA LEI N.º 11.101/2005. Tratando-se de sociedade simples de responsabilidade limitada, resta afastada a possibilidade de decretação de autofalência, nos termos da legislação vigente (Lei 11.101/2005 e artigos 1033 e 1044, do CCB). Sentença confirmada. RECURSO DESPROVIDO. (ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Apelação nº. 70070972203 RS, Relator: Isabel Dias Almeida, Data de Julgamento: 28/09/2016, Quinta Câmara Cível, DJe 06/10/2016). 155 APELAÇAO CÍVEL. DIREITO COMERCIAL. AÇAO DE FALÊNCIA. SOCIEDADE CIVIL QUE TEM POR OBJETO INTERMEDIAÇAO DE FORNECIMENTO DE REFEIÇÕES. DÍVIDA INSTRUMENTALIZADA POR NOTA PROMISSÓRIA ORIUNDA DE CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE CAPITAL DE GIRO, DEVIDAMENTE PROTESTADA. NATUREZA COMERCIAL/EMPRESARIAL DA SOCIEDADE. IRRELEVÂNCIA DO REGISTRO NO CARTÓRIO CIVIL. IMPONTUALIDADE DEMONSTRADA. FALÊNCIA DECRETADA. RECURSO PROVIDO. I. O fato de a Apelada ter por objeto social a intermediação do fornecimento de refeições com intuito de lucro, exercendo tal atividade com habitualidade e profissionalidade, havendo a previsão, em seu ato constitutivo, da distribuição de lucros e perdas proporcionalmente às cotas sociais de cada sócio, tudo isso a transforma numa verdadeira sociedade comerciante/empresária. II. Não se caracteriza uma sociedade civil (ou sociedade simples na nomenclatura adotada pelo Código Civil atual) uma pessoa jurídica que contraia um empréstimo no valor de R$ 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil reais) para servir apenas à movimentação financeira do negócio objeto de seu contrato social. III. O simples fato de a Apelada ter se autodenominado de sociedade civil, com registro de seus atos constitutivos no Cartório de Registro Civil das Pessoas Naturais e das Pessoas Jurídicas, é indiferente à sua caracterização como sociedade comercial/empresária, pois o que importa é o seu objeto social. Enunciados n.ºs 198 e 199 da III Jornada de Direito Civil coordenada pelo Conselho da Justiça Federal. IV. uma vez caracterizada a impontualidade da Apelada, e não tendo sido alegada qualquer das matérias de defesa elencadas no art. 4.º da lei de regência, não resta outra alternativa a não ser decretar a sua falência (ESTADO DO ESPIRITO SANTO. Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo. Apelação nº.

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pedido de recuperação de empresas para a sociedade simples em que, no caso

concreto, se constatou presente o elemento de empresa156.

Mesmo não tendo sido identificada a presença do elemento de

empresa, houve já caso atípico, conformado por uma sociedade simples, cujo

pedido de recuperação judicial foi deferido e não impugnado pelos credores no

início do procedimento, tendo o E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

mantido o benefício, pelo princípio do fato consumado157.

1.11. Os tipos societários

Quando pessoas se unem para explorar uma atividade econômica

por meio de sociedade, devem escolher o tipo societário que será adotado pela

pessoa jurídica a ser criada mediante o registro de seu ato constitutivo no órgão

competente, um reflexo da regra da tipicidade societária.

O registro é essencial para a aquisição da personalidade jurídica, de

modo que, na sua falta, a sociedade será considerara como sociedade em comum

(art. 986, CC). Se a sociedade não se registrou, não há que se falar em tipo

societário, ficando, assim, descartado qualquer benefício que os tipos societários

concederiam a determinadas situações.

24990137887 - ES, Relator: Catharina Maria Novaes Barcellos, Data de Julgamento: 02/06/2009, Quarta Câmara Cível, DJe 04/08/2009). 156 RECUPERAÇÃO JUDICIAL. Decisão que a converteu em insolvência civil, sob o fundamento de que a requerente se trata de sociedade simples e não empresária. Grau de organização da sociedade que deve ser levado em conta para sua classificação. Caso concreto que demonstra que, a despeito da autodenominação como sociedade simples, a agravada se organiza como sociedade empresária. Existência de inúmeros credores e passivo elevado discussão. Complexidade estrutural que tem grande importância no procedimento de insolvência. Diante das peculiaridades presentes, mostra-se mais adequado o procedimento da recuperação judicial. Agravo provido (ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Agravo de Instrumento nº. 01709595320138260000 - SP, Relator: Francisco Loureiro, Data de Julgamento: 06/02/2014, 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, DJe 07/02/2014). 157 Recuperação judicial permitida a uma sociedade simples (de enfermagem) há quatro anos Pedido, agora, de um dos credores, no sentido de extinguir o que se fez em virtude de não ser possível aplicar o regime da Lei 11101/2005 à sociedade simples (Súmula 49, do Tribunal de Justiça) Incidência da teoria do fato consumado, mantendo o que se realizou, por ser mais produtivo em termos de desenvolvimento social. Não provimento (ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Agravo de Instrumento nº. 0087069-56.2012.8.26.0000 - SP, Relator: Enio Zuliani, Data de Julgamento: 26/06/2012, 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, DJe 29/06/2012).

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Destarte, por força do artigo 983 do Código Civil158, a sociedade

empresária deve constituir-se segundo um dos tipos societários regulados nos

artigos 1.039 a 1.092 do mesmo diploma ou na Lei n.º 6.404/1976 – Lei de

Sociedades Anônimas (LSA): (i) sociedade em nome coletivo; (ii) sociedade em

comandita simples; (iii) sociedade limitada; (iv) sociedade anônima ou (v) sociedade

em comandita por ações.

Já a sociedade simples, de forma diversa da sociedade empresária,

tem a opção de constituir-se segundo um dos tipos societários regulados nos artigos

1.039 a 1.092 do Código Civil, ou seja: sociedade do tipo: sociedade em nome

coletivo, sociedade em comandita simples ou sociedade limitada e, ainda, como

sociedade cooperativa (art. 1.093 a 1096, CC), não tendo sido feita a opção por

tipos societários, subordinar-se-á às normas que lhe são próprias (sociedade

simples pura ou stricto sensu) (art. 983, CC).

O direito societário brasileiro tem como espinha dorsal a sociedade

simples e os demais tipos societários utilizarão, em regra, suas normas de forma

supletiva. Ao tratar o tema dessa forma, temos que a sociedade simples pode ser

considera uma espécie de sociedade, quando analisada em confronto com a

sociedade empresária (art. 982, CC), ou como um tipo societário próprio, também

chamada de sociedade simples pura ou stricto sensu.

A opção de uma sociedade simples por um dos tipos societários

autorizados pelo artigo 983 do código Civil, não a descaracterizará dessa qualidade,

mas tão somente se verificado o elemento de empresa como analisado no item

anterior.

Da mesma forma, a sociedade profissional que ao optar por

qualquer dos tipos societários, não descaracterizará a sua natureza de sociedade

158 Art. 983. A sociedade empresária deve constituir-se segundo um dos tipos regulados nos arts. 1.039 a 1.092; a sociedade simples pode constituir-se de conformidade com um desses tipos, e, não o fazendo, subordina-se às normas que lhe são próprias. Parágrafo único. Ressalvam-se as disposições concernentes à sociedade em conta de participação e à cooperativa, bem como as constantes de leis especiais que, para o exercício de certas atividades, imponham a constituição da sociedade segundo determinado tipo.

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simples pois, como visto, o que diferencia a sociedade empresária da simples é a

forma de exploração de seu objeto social, e não o seu tipo societário159.

A sociedade profissional espanhola, como a sociedade simples

brasileira, é uma espécie e também um tipo societário. Uma espécie, pois se

distingue das demais e os sócios podem adotar um outro tipo societário, que não

aquele previsto na lei, mas que deve se adequar às suas especificidades de cada

tipo para poder adotá-lo.

Resulta preciso recordar que, conforme establece la Exposición de Motivos de la Ley 2/2007, de 15 de marzo, de Sociedades Profesionales (“LSP”), esta norma es flexible desde el punto de vista organizativo porque permite que las sociedades profesionales se acojan a cualquiera de los tipos sociales existentes en nuestro ordenamiento jurídico pero esta misma norma les impone la obligación de cumplir una serie de requisitos que, si no se reúnen, no será posible constituirlas y, si se incumplen de forma sobrevenida, la sociedad profesional afectada incurriría en causa legal de disolución160.

Também o Código Comercial Projetado esclarece a situação

declarando, em seu artigo 215161, a permissão da sociedade profissional adotar

qualquer tipo societário, exceto se houver vedação de lei especial ou regulamento

da profissão, como ocorre no artigo 16 da Lei n.º 8.906/1994, que interdita àquela

que explora a prestação de serviços advocatícios de adotar tipo societário (art. 16,

Lei n.º 8906/1994162).

159 A regra contida no art. 983 é bastante clara. Empreendimentos “comerciais” são empresas e devem, quando organizados como sociedades, adotar forma comercial, i.e., uma das tradicionais estruturas desenvolvidas para o tráfico comercial. Empreendimentos “não comerciais” podem adotar quaisquer das formas, mas isso não implica sua qualificação como empresa. A criação de sociedades de contadores (CPAs) sob a estrutura de uma sociedade de responsabilidade limitada não significa que o empreendimento será considerado empresarial. Nem a organização nem o tipo legal são suficientes, per se, para definir a empresa ou o empreendimento comercial. Conclusão: uma simples tradução, se feita de maneira inadequada, permite interpretações incorretas, criando externalidades e efeitos de segunda ordem. (SZTAJN, Rachel. O que se perdeu na tradução. Revista de Direito Mercantil, Econômico e Financeiro, São Paulo, n..153-154, jan.2010, p. 12.). 160 Recorde-se que, conforme indicado na exposição de motivos da Lei 2/2007 ,de 15 de março, Lei de Sociedades Profissionais ("LSP"), a norma é flexível do ponto de vista organizacional, pois permite que sociedades profissionais se beneficiem de qualquer um dos tipos societários existentes em nosso ordenamento jurídico, mas esta mesma regra impõe uma obrigação de cumprir uma série de requisitos que, se não forem cumpridos, não será possível configurá-la e se eles são violados, a sociedade profissional estará incorrendo em hipótese legal de dissolução (tradução livre). (CAMACHO, Ángel Ruiz. Ejercicio de derecho de separación que conlleva disolución de sociedad profesional. Comentarios a la STS de 14 de abril de 2014. Boletín Mercantil, n. 17, abr. 2014, p. 17-18). 161 Art. 215. Salvo quando expressamente não for permitida pela lei ou regulamento da profissão, a sociedade profissional adotará qualquer um dos tipos societários previstos no artigo 112. 162 Art. 16. Não são admitidas a registro nem podem funcionar todas as espécies de sociedades de advogados que apresentem forma ou características de sociedade empresária, que adotem denominação de fantasia, que

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CAPÍTULO II

DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADES CONTRATUAIS

2.1. Das sociedades contratuais

No capítulo anterior, tratamos das sociedades, distinguindo suas

espécies entre sociedades empresárias e sociedades simples e, posteriormente,

indicamos os tipos societários possíveis para cada espécie de sociedade.

Como o objetivo deste trabalho é analisar a dissolução parcial da

sociedade profissional, vale neste ponto lançar a diferença entre sociedades

contratuais e institucionais, classificação que leva em consideração o ato

constitutivo e o regime jurídico utilizado em caso de rompimento do vínculo

societário de um sócio com a pessoa jurídica.

Sociedades contratuais são aquelas cujo ato constitutivo é o

contrato social, estando as regras de sua dissolução no Código Civil . São dessa

espécie: a sociedade em nome coletivo, a sociedade em comandita simples, a

sociedade limitada e a sociedade simples pura (stricto sensu).

As sociedades institucionais são tratadas detalhadamente em leis

especiais, como a Lei de Sociedade Anônima (Lei nº. 6.404/1976) e a Lei da

Cooperativa (Lei nº. 5.764/1971), seu ato constitutivo é o estatuto social, possuindo

características próprias. A sociedade anônima, a sociedade em comandita por

ações e a sociedade cooperativa são institucionais, e as normas reguladoras de

constituição e dissolução estão contidas em suas respectivas leis especiais163.

realizem atividades estranhas à advocacia, que incluam como sócio ou titular de sociedade unipessoal de advocacia pessoa não inscrita como advogado ou totalmente proibida de advogar. 163 O segundo critério classificatório das sociedades empresárias diz respeito ao regime de constituição e dissolução do vínculo societário. Por ele, as sociedades podem ser contratuais ou institucionais. As sociedades contratuais são constituídas por um contrato entre os sócios. Isto é, nelas, o vínculo estabelecido entre os membros da pessoa jurídica tem natureza contratual e, em decorrência, os princípios do direito dos contratos explicam parte das relações entre os sócios. As institucionais também se constituem por um ato de manifestação de vontade dos sócios, mas não é este revestido de natureza contratual. Consequentemente, os postulados da teoria dos contratos não contribuem para a compreensão dos direitos e dos deveres dos membros da sociedade.

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Diante dessa classificação, passaremos a analisar as espécies de

dissolução parcial das sociedades contratuais prevista em nossa legislação.

2.2. Considerações iniciais da dissolução parcial de sociedade no Brasil

O Código Comercial de 1850 tratava da dissolução das sociedades

a partir de seu artigo 334, cuidando de sua liquidação. Ocorre que esse diploma

dizia respeito tão somente à dissolução total das sociedades, não fazendo menção

à parcial. Essa disposição é reflexo de seu tempo, fundada no pensamento jurídico

da doutrina individualista.

Posteriormente, o Decreto nº 3.708/1919, que regulava a sociedade

por quotas de responsabilidade limitada, remetia à dissolução desse tipo societário

ao Código Comercial, logo nada foi previsto com relação à dissolução parcial de

sociedades164.

O próximo diploma a tratar do tema foi o Código de Processo Civil

de 1939165 que, em seus artigos 655 a 674, tratou da dissolução e liquidação das

sociedades. Tratava-se de norma processual para dissolução total de sociedade, ou

São contratuais as sociedades em nome coletivo, em comandita simples e limitada; e institucionais, as sociedades anônimas e em comandita por ações. Um exemplo pode aclarar a diferença. Considere-se a seguinte questão: o herdeiro de uma participação societária está obrigado a integrar a sociedade? A resposta depende da classificação da sociedade. Sendo esta contratual, a constituição e a dissolução seguem regras próximas à do regime jurídico dos contratos. Assim, como ninguém é obrigado a contratar, em termos de princípio geral, o herdeiro das quotas de uma sociedade limitada, se quiser, pode deixar de ingressar nela, exigindo a apuração de haveres (opera-se, então, a dissolução parcial). Nessa hipótese, a sociedade lhe pagará o valor das quotas e prosseguirá com os outros sócios. Se a sociedade é institucional, a resposta à mesma questão é diferente. O herdeiro da ação necessariamente passa a integrar o quadro de acionistas. Se não o deseja, pode negociar suas ações, vendendo-as a interessados no investimento. Mas para isso ele precisa tornar-se, ainda que por pouco tempo, um membro da sociedade. Em outros termos, o vínculo societário não pode ser desfeito mediante o reembolso da participação societária, porque não tem a natureza de um contrato. Na limitada, o herdeiro pode exigir a liquidação da participação societária (passando a titularizar não mais direitos de sócio, mas um mero crédito pelo reembolso), mas na anônima, não. A razão da diferença é a natureza não contratual da relação societária estabelecida neste último tipo societário. O instrumento disciplinar das relações sociais, nas sociedades contratuais, é o “contrato social”, enquanto nas institucionais é o “estatuto”. Diverso também é o diploma jurídico aplicável na dissolução da sociedade: o Código Civil para as contratuais, e a Lei das Sociedades por Ações (Lei n. 6.404/76 — LSA) para as institucionais (COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. Direito de empresa, v. II, 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 43-45). 164 RESTIFFE, Paulo Sérgio. Dissolução de sociedades. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 40-41. 165 BRASIL. Decreto-lei Nº 1.608, de 18 de setembro de 1939.

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seja, sua extinção. O Código de Processo Civil de 1973166 não inovou a matéria,

mantendo em vigor aquilo que o código adjetivo anterior previa (art. 1.218, VII,

CPC/1973)167. Verdadeiro antagonismo da legislação em vigor, que não antevia a

dissolução parcial, com os princípios enraizados na teoria da empresa. Pela

legislação, em caso de conflito entre os sócios, a solução, então, era tão somente o

encerramento da sociedade.

Por ausência de legislação específica, coube, então, à doutrina e à

jurisprudência estabelecerem o nascimento e o desenvolvimento do instituto da

dissolução parcial de sociedades, surgido na década de 1960 e inspirado na teoria

da empresa do Código Civil Italiano de 1942.

A discussão inicial ocorreu quando foi debatida a validade da

inserção nos contratos sociais de cláusula impeditiva de dissolução da sociedade

por morte de sócio, ao contrário do previsto no artigo 335.4 do Código Comercial de

1850 e depois para os demais casos.

Os Tribunais, ao analisarem demandas de dissolução total

baseadas no artigo 335.5 do Código Comercial de 1850168, ao invés de proferirem

decisões determinando a extinção da sociedade, em consonância com os princípios

da preservação da empresa, da função social da empresa e da livre associação,

bem como da teoria do contrato plurilateral, decidiram pelo afastamento do sócio e o

seguimento da atividade pela pessoa jurídica169.

A espécie Dissolução Parcial decorre de construção pretoriana que, buscando amenizar a drástica previsão dissolutória posta no revogado art. 335, V, do Código Comercial de 1.850, passou a permitir o rompimento pontual e individualizado do contrato de sociedade, cm a saída tão somente daquele(s) sócio(s) que assim desejasse(m), sem que isso importasse no

166 BRASIL. Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973. 167 Art. 1.218. Continuam em vigor até serem incorporados nas leis especiais os procedimentos regulados pelo Decreto-lei nº 1.608, de 18 de setembro de 1939, concernentes Vll - à dissolução e liquidação das sociedades (arts. 655 a 674); 168 Art. 335 - As sociedades reputam-se dissolvidas: 5 - Por vontade de um dos sócios, sendo a sociedade celebrada por tempo indeterminado. 169 A jurisprudência, tendo em vista a natureza plurilateral do contrato de sociedade, que permite sua continuidade a despeito do desfazimento do vínculo societário com relação a um dos sócios, e o princípio essencial de preservação da empresa, passou a acolher a chamada dissolução parcial da sociedade quando da verificação de causas de dissolução relacionadas apenas à pessoa de um ou mais sócios que não prejudicassem a permanência da sociedade. (CARVALHOSA, Modesto. Comentários ao Código Civil. Parte Especial - Do Direito da Empresa (arts. 1.052 a 1.195), v. 13, São Paulo: Saraiva, 2005, p. 305).

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encerramento completo e compulsório da pessoa jurídica e, com isso, do próprio negócio170.

A linha mestra do instituto foi traçada pelo então Ministro do

Supremo Tribunal Federal, Dr. Cordeiro Guerra, no aplaudido Recurso

Extraordinário 89.646.

COMERCIAL. DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE LIMITADA. PEDIDA A DISSOLUÇÃO TOTAL POR SOCIO DISSIDENTE, NÃO E POSSIVEL, EM PRINCÍPIO, DECRETAR A DISSOLUÇÃO PARCIAL, COM SIMPLES APURAÇÃO CONTABIL DOS HAVERES DO AUTOR. ADMITIDA QUE SEJA A DISSOLUÇÃO PARCIAL EM ATENÇÃO A CONVENIENCIA DA PRESERVAÇÃO DO EMPREENDIMENTO, DAR-SE-A ELA MEDIANTE FORMA DE LIQUIDAÇÃO QUE A APROXIME DA DISSOLUÇÃO TOTAL. NESSE CASO, DEVE SER ASSEGURADA AO SOCIO RETIRANTE SITUAÇÃO DE IGUALDADE NA APURAÇÃO DE HAVERES, FAZENDO-SE ESTA COM A MAIOR AMPLITUDE POSSIVEL, COM A EXATA VERIFICAÇÃO, FÍSICA E CONTABIL, DOS VALORES DO ATIVO171.

O instituto somente foi previsto na legislação no Código Civil,

quando, ao tratar da dissolução parcial lato sensu, se utilizou a expressão “Da

Resolução da Sociedade em Relação a um Sócio” (art. 1.028 e ss).

E, atualmente, ganhou novos contornos com a vigência do Código

de Processo Civil de 2015172 que introduziu a ação de dissolução parcial de

sociedade compreendida nos artigos de 599 a 609.

2.2.1. A expressão dissolução parcial

A expressão dissolução parcial de sociedade sofreu duras críticas

da doutrina173, que sustentava que a palavra “dissolução” é empregada para o

procedimento de extinção da sociedade, ou seja, a “morte” da pessoa jurídica, logo

seria impróprio se utilizar “dissolução parcial”, pois, nesse caso, não há extinção da

170 BARBOSA, Henrique Cunha. Dissolução Parcial, Recesso e Exclusão de Sócio: Diálogos e Dissensos na Jurisprudência do STJ e nos Projetos de CPC e Código Comercial. In: AZEVEDO, Luís André N. de Moura; DE CASTRO, Rodrigo R. Monteiro. Sociedade Limitada Contemporânea1. ed., São Paulo: Ed. Quartier Latin, 2013, p. 355-356. 171 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº. 89.464. Relator: Min. Cordeiro Guerra, Data de Julgamento: 12/12/1978, Segunda Turma, Data de Publicação: DJe 04/05/1979. 172 BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. 173 AZEVEDO, Alberti Gomes da Rocha.Dissolução da sociedade mercantil. São Paulo: Resenha Universitária, 1975, p. 50. ESTRELLA, Hermani, Apuração de haveres de sócio. 5.edatual. por Roberto Papini. . Rio de Janeiro: Forense, 2010. BULGARELLI, Waldirio. O novo direito empresarial. Rio de Janeiro: Renovar, 1999.

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pessoa jurídica, mas, sim, o desligamento de um sócio da sociedade. O Ministro

Nilson Neves, em julgamento no qual era relator, assim se manifestou: “Quem diz

dissolução diz extinção – Ora, pessoa jurídica, ficção de direito à imagem da pessoa

natural, como esta, ou vive integralmente, ou morre como ela, mas morre no todo, e

não por partes” (STJ, REsp 45.343-7/SP. Rel. Min. Nilson Naves. 3ºT)174.

Iniciada regularmente a personalidade jurídica da sociedade

contratual com o registro perante o órgão competente, durante seu funcionamento

podem ocorrer diversos fenômenos que afetem a sua composição, especialmente

com relação aos vínculos dos sócios entre si e com a sociedade; com o rompimento

de um, de alguns ou de todos os vínculos sociais. Tem-se o que é comumente

chamado de dissolução em sentido estrito.

Dissolução é conceito que pode ser utilizado em dois sentidos diferentes: para compreender todo o processo de término da personalidade jurídica da sociedade comercial (sentido amplo) ou para individuar o ato específico que desencadeia este processo ou que importa na desvinculação de um dos sócios do quadro associativo (sentido estrito)175.

Com relação à dissolução em sentido estrito, a doutrina a classifica

em duas espécies: dissolução total e dissolução parcial.

Na dissolução total, há o rompimento de todos os vínculos sociais e,

consequentemente, a extinção da sociedade, ocorrendo nas seguintes hipóteses:

vontade dos sócios; decurso do prazo; unipessoalidade por mais de 180 (cento e

oitenta) dias; inexequibilidade do objeto social; exaurimento do objeto social;

falência ou causas contratuais.

Já na dissolução parcial, há o rompimento de apenas parte dos

vínculos sociais, mas a empresa se mantém preservada, pois não ocorreu a sua

extinção.

174 DE ALMEIDA, Marcus Elidius Michelli. Sociedade Limitada: causas de dissolução parcial e apuração de haveres. In: BRUSHI, Gilberto Gomes (Coord.). Direito Processual Empresarial: estudos em homenagem ao professor Manoel de Queiroz Pereira Calças. 1.ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012, p. 549-550. 175 COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial . Direito de Empresa. 25. ed. São Paulo: Saraiva 2013, p. 204.

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Já o instituto da dissolução parcial é uma criação da doutrina e da jurisprudência que tem por objetivo principal a preservação da empresa, uma vez que o Código Comercial nada previa acerca desse tipo de dissolução. Dissolução parcial significa, pois, que a dissolução se operará apenas em face do sócio que, por algum motivo, não mais fará parte da sociedade, entretanto, sem pôr fim a esta última176.

Além das críticas a respeito do termo “dissolução” na nomenclatura

utilizada, elas também se estendem ao fato de a expressão dissolução parcial ser

usada pelos Tribunais e pela doutrina ora como gênero das diversas espécies de

desligamento de sócio da sociedade (morte, recesso, liquidação de quotas etc.) ora

como uma espécie do gênero, surgindo assim uma diferença entre dissolução

parcial lato sensu (gênero) e a strito sensu (espécie).177

Buscando sanar as críticas, o Código Civil, ao tratar da dissolução

parcial lato sensu, utilizou a expressão “Da Resolução da Sociedade em Relação a

um Sócio” (art. 1.028 e ss), o que acabou também por gerar críticas uma vez que a

expressão “resolução” é forma de extinção do contrato pleiteada por conta de

176 DE ALMEIDA, Marcus Elidius Michelli. Sociedade Limitada: Causas de Dissolução Parcial e Apuração de Haveres. In: Sociedade Limitada: causas de dissolução parcial e apuração de haveres. In: BRUSHI, Gilberto Gomes (Coord.). Direito Processual Empresarial: estudos em homenagem ao professor Manoel de Queiroz Pereira Calças 1.ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012, p. 547. 177 Contudo, o maior inconveniente de sua adoção está – para nós – calcado em outra circunstância. A expressão dissolução parcial, como se explicou, pode ser empregada em toda e qualquer modalidade de extinção parcial do contrato de sociedade. Isso implica dizer que sempre que houver o afastamento – voluntário ou compulsório -, ou mesmo a morte do sócio, dar-se-á a ruptura do contrato social limitadamente ao que se desliga da sociedade, id est, a dissolução parcial deste. Este é, por conseguinte, o real significado da locução. Pois bem, a dissolução parcial tal concebida pelos tribunais – entenda por esta o direito de retirada que se confere ao quotista que tem o direito a dissolução total, com a apuração do valor de sua quota do mesmo modo como seria nesta liquidada – também configura modalidade de extinção parcial do vínculo societário e, por consequência, de dissolução parcial lato sensu. A crítica que se pode fazer à expressão não pode ser outra senão a de que a dissolução parcial, criação pretoriana, é espécie do gênero amplo dissolução parcial, compreensiva, portanto, de todas as circunstancias em que se verifique a ruptura limitada do contrato social, inclusive aquela. Daí porque poderá a expressão dar margem à utilização equivocada: a simples referência à dissolução parcial, com efeito, não elucida se a respectiva utilização se reporta ao gênero ou à espécie. Aliás, é de se perquirir se não estaria tal ingrata homonímia a origem da tendência jurisprudencial que confere a todas as formas de dissolução parcial lato senso – exclusão, retirada, morte etc. – o modo de apuração adotado para a também chamada dissolução parcial. Nesta, todavia, tal modo de liquidação da quota justifica-se porque o sócio que se retira tem direito, em princípio, à dissolução total. Esta, entretanto, apenas não é decretada para possibilitar a sobrevivência do organismo social dada inequívoca importância social e econômica por esta representada. Nas demais hipóteses de extinção parcial do vínculo social, contudo, não faz jus o sócio à dissolução total. Por qual razão, então, insistem nossos pretórios, nestes casos, em conceder a liquidação amplas da quota social? Apenas porque a exclusão, o direito de retirada do art. 15 do Decreto nº. 3.708 de 1919, ou mesmo a morte, seriam subespécie albergadas pelo gênero amplo “dissolução parcial” do contrato de sociedade? (FONSECA, Priscila M.P. Corrêa da. Dissolução parcial, retirada e exclusão de sócio no Novo Código Civil. 3. ed., São Paulo: Atlas, 2005, p. 74-75).

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inadimplemento contratual (art. 475, CC178), o que nem sempre é o caso da saída do

sócio da sociedade, o que pode ocorrer sem qualquer falta (morte, recesso etc.).

Em caminho oposto, o Código de Processo Civil (Lei nº 13.105, de

16 de março de 2015), inovou e consolidou o uso da expressão “dissolução parcial”

como gênero, ao tratar do tema como procedimento especial de caráter

contencioso, nominado de “Ação de Dissolução Parcial de Sociedade” (art. 599 e

ss., CPC).

Cabe destacar que, em que pese a existência da expressão

consolidada na doutrina e na jurisprudência e, agora, na lei, como gênero, ainda

persiste entendimento da existência da possibilidade da dissolução parcial strito

sensu como será visto ao longo deste trabalho.

Em nosso estudo, a expressão dissolução parcial, já consolidada

pela doutrina, pelos tribunais e, agora, pela legislação, será tratada como gênero e

significará, a partir deste ponto, como aquela que se opera apenas em face ao sócio

que, por algum motivo, não mais fará parte da sociedade, entretanto, sem que essa

seja encerrada;179.

2.3. Breves considerações sobre a dissolução parcial no Direito Comparado

A dissolução parcial de sociedade é um instituto previsto no Direito

Comparado, o que é compreensível devido à sua função de manter em marcha a

sociedade em que ocorre o afastamento de sócio, sem necessidade da extinção da

empresa, preservando-a.

Neste tópico, para apoio ao estudo em questão, buscaremos, de

forma sintética, sem buscar esgotar o tema, apresentar as principais hipóteses de

dissolução parcial das legislações argentina, italiana e espanhola.

178 Art. 475. A parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos. 179 DE ALMEIDA, Marcus Elidius Michelli. Sociedade Limitada: causas de dissolução parcial e apuração de haveres. In: BRUSCHI, Gilberto Gomes (Coord.). Direito Processual Empresarial: estudos em homenagem ao professor Manoel de Queiroz Pereira Calças. 1.ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012, p. 548.

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No Direito argentino, a dissolução parcial é prevista na “Ley de

Sociedade Comerciales” (Ley nº. 19.550, 30 de Marzo de 1984180), a qual foi

modificada recentemente pelo Código Civil y Comercial de la Nación (Ley nº.

26.994, 7 de octubre de 2014181)182.

Cabanellas de las Cuevas183 trata, ao longo de seu tratado das

formas de resolução parcial de sociedade, da Lei de Sociedades Comerciais

argentina que prevê as seguintes espécies de resolução parcial: a morte de sócio

(art. 90); a exclusão de sócio (art. 91 a 93); o recesso de sócio (arts. 78, 85, 88, inc.

1), 160 e 245) e outras causas contratuais (art. 89)184”.

Diferentemente do que ocorre no Direito brasileiro, a lei argentina

não trata, de forma geral, dos efeitos da resolução parcial de sociedade – tema a

ser abordado nos próximos capítulos dessa tese –, mas tão somente expressa os

efeitos na hipótese de exclusão de sócio (art. 92, Ley de Sociedade Comerciales), o

que levou a doutrina a estender esses efeitos de forma geral às outras espécies de

resolução parcial.185

No Direito espanhol, o tratamento do direito societário recebeu nova

roupagem, em 2010, com a “Ley de Sociedades de Capital (Real Decreto Legislativo

1/2010, de 2 de julio, por el que se aprueba el texto refundido de la Ley de

Sociedades de Capital)”186, que reuniu, em um único texto, as regras das

sociedades de capital. A previsão da dissolução parcial está contida no Título IX da

lei, ao tratar da “Separación y exclusión de socios”, que especifica o direito de

separação (recesso) (arts. 346 a 349) e de exclusão de sócios (arts. 350 a 352), 180 ARGENTINA. Ley 19.550, 30 de Marzo de 1984. Ley de Sociedade Comerciales.. Disponível em: <http://servicios.infoleg.gob.ar/infolegInternet/anexos/25000-29999/25553/texact.htm.> Acesso em: 12 jun. 2017. 181 ARGENTINA. Ley 26.994, 7 de octubre de 2014. Código Civil y Comercial de la Nación.. Disponível em: < http://data.triviasp.com.ar/files/parte4/l26994.html> Acesso em: 12. Jun. 2017. 182 CABANELLAS DE LAS CUEVAS, Guilhermo. Resoluciõn parcial y reducción de capital de sociedades: derecho societário 13. 1. ed. Buenos Aires: Heliasta, 2011, p.36. 183 CABANELLAS DE LAS CUEVAS, Guilhermo. Resoluciõn parcial y reducción de capital de sociedades: derecho societário 13. 1. ed. Buenos Aires: Heliasta, 2011, p.36. 184 PERCIAVALLE, Marcelo L.; YÓDICE, Alejandro. Ley de Sociedades Comerciales Comentada. 1. ed. Buenos Aires: Errepar, 2009. 185 CABANELLAS DE LAS CUEVAS, Guilhermo. Resoluciõn parcial y reducción de capital de sociedades: derecho societário 13. 1. ed. Buenos Aires: Heliasta, 2011, p.99. 186 ESPANHA. Real Decreto Legislativo 1/2010, de 2 de julio de 2010. Ley de Sociedades de Capital.. Disponível em: <https://www.boe.es/buscar/act.php?id=BOE-A-2010-10544#ddunica> Acesso em: 15 jul. 2017.

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seguindo para normas comuns desses institutos (arts. 353 a 359). A morte, nessas

espécies de sociedade, em regra, não causa a dissolução parcial, ocorrendo a

sucessão (arts. 110 e 124).

Com relação à valoração da participação societária do sócio

desligado da sociedade, a lei espanhola prevê a possibilidade de os sócios tratarem

do tema no contrato social e, se esse for omisso, será necessária a avaliação por

um especialista nomeado registrador da sede da sociedade (art. 353).

Especificadamente as sociedades profissionais, tema desta tese, a

Espanha possui regramento próprio – “Ley de Sociedades Profesionales (Ley

2/2007, de 15 de marzo, de sociedades profesionales)187” – que expressamente

declara, em sua exposição de motivos, tratar-se de regramento para sociedades

profissionais em sentido estrito, ou seja, aquela que se apresenta como pessoa

jurídica para seus clientes, centro de imputação de negócios, com direitos e

obrigações próprias, distinta de seus sócios, como já tratado no capítulo I deste

trabalho.

A Lei de Sociedades Profissionais espanhola trata das seguintes

espécies de dissolução parcial: a separação de sócio profissional (art. 13 -

Separación de socios profesionales)188; a exclusão (art. 14 - Exclusión de socios

profesionales) e a morte (Transmisiones forzosas y mortis causa)189.

Com relação aos efeitos da dissolução parcial, a Lei de Sociedades

Profissionais espanhola determina que o contrato social pode prever livremente o

método de avaliação e a forma de reembolso da participação societária do sócio

profissional que se desliga da sociedade (art. 16). Caso o contrato seja omisso, há

187 ESPANHA. Ley 2/2007, de 15 de marzo de 2007. Ley de sociedades profesionales. Disponível em: <https://www.boe.es/buscar/act.php?id=BOE-A-2007-5584> Acesso em: 15 jul. 2017. 188 CAMACHO. Ángel Ruiz. Ejercicio de derecho de separación que conlleva disolución de sociedad profesional. Comentarios a la STS de 14 de abril de 2014. Boletín Mercantil, n. 17, abr. 2014. Barcelona: CMS Albiñana & Suárez de Lezo. 2014. 189 RODRÍGUEZ. Ángela María Pérez. La exclusión de socios en las sociedades profesionales. In: Anales de la Academia Sevillana del Notariado. Tomo XX: Conferencias del Curso Académico 2008/2009. Sevilla: Academia Sevillana del Notariado. 2010.

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72

orientação é seguir o procedimento do artigo 353 da Ley de Sociedades de

Capital190.

Já o Direito italiano, base do Direito Comercial brasileiro, prevê com

certa amplitude a figura da dissolução parcial de sociedade, especialmente no Título

V, Capítulo II, Sessão V, Código Civil de 1942191 (Titolo V - Delle Societá, Capo II -

Della societa´ semlice, Sezione V - Dello scioglimento del rapporto sociale

limitatamente a un sócio).

A morte de sócio aparece no artigo 2284 (Morte del sócio), o qual

dispõe que, salvo estipulação contrária do contrato social, na hipótese de morte de

sócio, a participação societária do falecido deve ser liquidada para pagamento dos

herdeiros192.

O direito de recesso (Recesso del socio) é previsto no artigo 2.285,

“[...] è uma dichiarazione unilaterale di volontà, con la quale il socio dichiara di voler

sciogliere il rapporto contrattuale che lo lega ala società193”. A lei italiana prevê o

recesso na sociedade por prazo indeterminado, mediante notificação prévia dos

demais sócios com, pelo menos, três meses de antecedência; e na sociedade por

prazo determinado, quando há causas contratuais ou quando ocorrer justa causa.

Na sociedade limitada, ainda, é previsto o direito de recesso do sócio dissidente de

alteração do objeto social, transformação, fusão, cisão, revogação do estado de

liquidação, transferência da sede social para o exterior, retirada de um direito de

recesso previsto contratualmente, modificação relevante no objeto da empresa que

reflita em modificação de direito de sócio (Recesso del socio) (art. 2473). No caso

de sociedade limitada prevista por prazo indeterminado, o direito de recesso pode

190 Nesse sentido: Sentença nº 186/2014 de TS, Sala 1ª, de lo Civil, 14 de Abril de 2014 - Magistrado Responsável: IGNACIO SANCHO GARGALLO; Número de Recurso: 752/2012; Procedimento: Casación; Nº de resolução: 186/2014; Data da Resolução: 14 de Abril de 2014; Emissor: Tribunal Supremo - Sala Primera, de lo Civil. 191 ITÁLIA. Regio decreto-legge 16 marzo 1942, n.º 262. Codice Civile Italiano Del 1942. < http://www.normattiva.it/uri-res/N2Ls?urn:nir:stato:decreto.regio:1942-03-16;262!vig=> acesso em 09 abr. 2017. 192 BUONOCORE, Vincenzo. Manuale Di Diritto Commerciale. Torino: G. Giapichelli Editore.. 2016, p. 265. 193 [...] é uma declaração unilateral de vontade, com a qual o sócio deseja cancelar o vínculo contratual que o liga a sociedade. (BUONOCORE, Vincenzo. Manuale Di Diritto Commerciale. Torino: G. Giapichelli Editore, 2016., p. 266).

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ser exercido mediante notificação aos demais sócios com, pelo menos, 180 (cento e

oitenta) dias, no máximo, um ano194.

A exclusão de sócio está regulada nos artigos 2286 (Esclusione),

2287 (Procedimento di esclusione) e 2288 (Esclusione di diritto). O sócio pode ser

excluído por falta grave, decorrente de violação do contrato social ou da lei; por

interdição ou inabilitação do sócio; ou, ainda, por condenação que imponha pena de

incompatibilidade, mesmo que temporariamente, para cargo público. O sócio que

ingressa na sociedade por conta de seu trabalho ou por determinado bem, pode ser

excluído se perder a capacidade ou se a coisa se perder sem culpa imputável aos

administradores. Além disso, pode ser excluído o sócio que promete integralizar na

sociedade uma determinada coisa e essa se perdeu antes da transferência para a

sociedade (art. 2286).

Podem ser excluídos, de pleno direito, os sócios falidos ou aqueles

cujas quotas sofreram liquidação forçada por seus credores particulares, conforme o

artigo 2288 do Código Civil italiano.

O procedimento de exclusão, previsto no artigo 2287, permite que a

exclusão se opere extrajudicialmente por meio de deliberação da maioria dos

sócios, não computando o voto do sócio a ser excluído, sendo que a exclusão

entrará em vigor 30 (trinta) dias após a comunicação do sócio excluído. Nesse

período, o sócio poder opor a sua exclusão para o Tribunal, que poderá suspender a

decisão. No caso de sociedade com 2 (dois) sócios, a exclusão depende de decisão

judicial.

Com a dissolução parcial, as quotas do sócio desligado serão

liquidadas (art. 2289 - Liquidazione della quota del socio uscente) com base em

balanço patrimonial, especialmente levantado na data da resolução, e o valor deve

ser pago em até 6 (seis) meses, contados a partir da data da resolução.

194 COSTAGLIOLA, Anna. Compendio di Diritto commerciale: Riferimenti dottirnali e giuriprudenziali. Santarcangelo di Romagna: Maggiola Editore, 2016, p. 286-288.

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Lo scioglimento comporta il pagamento (entro sei mesi dal verificarsi dela causa) di uma somma di denaro che reppresenti il valore dela quota i base ala situazione patrimoniale dela società nel giorno in cui si verifica lo scioglimento. È ormai pacifico che il valore dela situazione patrimoniale dela società deve essere determinato sulla base dei valori effetivi dele attività e dele passività (e non in base ai critério dettati per la redazione del bilancio di esercizio), ragione per cui ocorre tener conto dela effettiva consistenza econômica dell’azienda sociale all’epoca dello scioglimento del rapporto, comprendendovi anche il fattore di redditività dell’azienda stessa e cioè l’avviamento195.

2.4. Os princípios aplicados à dissolução parcial

Princípio é o mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro

alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas,

compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e

inteligência exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo,

no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico196.

Os princípios são, assim como as regras, normas jurídicas. A distinção

entre ambos está numa questão qualitativa, no qual os princípios se apresentam com a

extensa proporção de seu âmbito de incidência, de modo a servirem de elementos

informadores da interpretação das demais normas jurídicas e a solução de lacunas197.

O ponto decisivo na distinção entre regras e princípios é que princípios são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível dentro das possibilidades jurídicas e fáticas existentes. Princípios são, por conseguinte, mandamentos de otimização, que são caracterizados por poderem ser satisfeitos em graus variados e pelo fato de que a medida devida de sua satisfação não depende somente das possibilidades fáticas, mas também das possibilidades jurídicas. O âmbito das possibilidades jurídicas é determinado pelos princípios e regras colidentes. Já as regras são normas que são sempre ou satisfeitas ou não satisfeitas. Se uma regra vale, então, deve se fazer exatamente aquilo que ela exige; nem mais, nem menos. Regras contêm, portanto, determinações no âmbito daquilo que é fática e juridicamente possível. Isso significa que a distinção entre regras e princípios é urna distinção qualitativa, e não urna distinção de grau. Toda norma é ou urna regra ou um princípio198.

195 VISENTINI. Gustavo; PALAZZOLO, Andrea. Manuale Di Diritto Commerciale. Roma: DIKE Giuridica Editrice, 2017, p. 78-79. 196 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 22. ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 922-923. 197 COELHO, Fabio Ulhoa. Princípios do direito comercial: com anotações ao projeto de código comercial. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 13. 198 ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 89-90.

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Como ramo autônomo, o Direito Comercial é norteado por princípios

próprios e que auxiliam sua compreensão pela dinâmica econômica que desenvolve

a empresa. Por isso é de suma importância trabalharmos brevemente os princípios

do Direito Comercial que norteiam o instituto da dissolução parcial de sociedade.

2.4.1. Princípio da preservação da empresa

Assumindo a empresa como o elemento central para realização da

função social na exploração da atividade econômica, essa deve ser preservada para

o bem geral da sociedade, independentemente do agente econômico que a

desenvolve. Isso não significa dizer afastar ou ignorar a importância do empresário,

mas tão somente declarar que a empresa está acima dos interesses individuais de

quem a explora. Com a diferenciação entre o agente explorador (empresário), os

bens usados para exploração (estabelecimento) e a atividade empresarial em si

(empresa), concluímos que é, na empresa, que está localizada a mais valia, onde se

desdobram os interesses públicos, econômicos e sociais.

A empresa é elemento produtor de riquezas, sua mantença

desdobra-se a favor dos consumidores, dos trabalhadores, do fisco, do meio

ambiente, da economia etc. Ocorre que, diferentemente dos princípios explorados

até o momento, o da preservação da empresa não está explícito no ordenamento

jurídico, mas sua presença salta aos olhos nos institutos como da dissolução parcial

da sociedade, da mantença provisória da atividade na falência, da recuperação de

empresas, da desconsideração da personalidade jurídica etc.

Assim, a construção do contrato plurilateral permite que se atenda também ao princípio da preservação da empresa, pelo qual, sempre que possível há que se manter a empresa como organismo econômico produtor de riquezas, tendo em vista os inúmeros interesses envolvidos, como dos trabalhadores, do fisco e dos consumidores. Ademais, há que se atentar para a função social que a sociedade desempenha, equacionando os interesses da sociedade, dos sócios que saem da sociedade, ou seus herdeiros, e dos sócios que permanecem199.

199 TOMAZETTE, Marlon. Curso de direito empresarial: teoria geral e direito societário. v.1, 3. ed. São Paulo: Atlas, 2011, p. 312-313.

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O princípio da preservação foi dogmatizado no artigo 47 da Lei de

Falências (Lei nº. 11.101/2005)200, e é neste princípio que se encontra o fundamento

para a dissolução parcial da sociedade. A sociedade deve ser parcialmente

dissolvida em face de um ou mais sócios, enquanto continua a existir com os

demais201.

2.4.2. Princípio da função social da empresa

A empresa é a atividade econômica organizada para a produção ou

circulação de bens ou de serviços pelo empresário. É o caráter dinâmico da Teoria

da Empresa.

O princípio da função social da empresa é extraído do princípio da

função social da propriedade, estampado nos artigos 5º, XXIII e 170, III, ambos da

Constituição Federal.

A propriedade privada dos meios de produção é inerente à atividade

explorada pelo empresário, todavia, pelo disposto na Carta Magna, esse direito

restou subordinado à sua função social, que consiste em uma forma de relativizar,

em prol dos interesses público, econômico e social, o direito de propriedade que,

anteriormente, era visto como absoluto, exclusivo e perpétuo. Há, assim, verdadeira

dicotomia existente entre o direito de propriedade e seu uso. No primeiro, sobressai

o aspecto individual e, no segundo, os interesses público, social e econômico202.

200 Art. 47. A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica. 201 FINKELSTEIN, Maria Eugênia. Manual de direito empresarial. 8. ed. rev., ampliada e reformulada. São Paulo: Atlas, 2016, p. 131. 202 A empresa, como atividade, também está pautada pela função social, havendo norma que o preceitua, embora isto não se evidencie em uma análise apenas superficial, já que falta dispositivo explícito. Inúmeros argumentos, porém, favorecem tal compreensão, inclusive em direção mais ampla do que simples função social da empresa. A primeira evidência decorre da presença da propriedade na esfera empresarial, pois a atividade de empresa, exercida por quem a organiza e controla, seja o empresário individual, seja a sociedade empresária, há de lidar com a propriedade em consonância com sua função social. Não bastasse isso, há também o claro comando de que a livre iniciativa, assim compreendido o desenvolvimento de atividade econômica por particulares, há de ter valor social. É imperioso, pois, retomar a ideia da socialidade da empresa, para melhor ajustá-la ao ordenamento jurídico brasileiro, bem como aos preceitos orientadores da Economia, máxime tendo-se em vista o princípio constitucional assegurador da livre iniciativa.

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Ao encontro à Constituição Cidadã, a empresa deixa de ser apenas

elemento econômico de obtenção de lucro para incorporar também interesses

públicos e sociais e, portanto, o instituto da dissolução parcial de sociedade passa

por importante reflexo do princípio da função parcial da empresa por manter a

sociedade atividade com a geração de empregados, recolhimento de impostos etc.

2.4.3. Princípio da livre associação

Como visto, a sociedade é espécie de pessoa jurídica de direito

privado, não estatal, constituída por duas ou mais pessoas que, reciprocamente, se

obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica

e a partilha, entre si, dos resultados.

Para constituição válida da sociedade contratual, é necessária a

presença de requisitos gerais e específicos, sendo gerais, nos termos do artigo 104

do Código Civil, (i) agente capaz, (ii) objeto possível e lícito, além da (iii) forma

prescrita e não defesa em lei; e, específicos: (i) ajuste de vontade, (ii) pluralidade de

pessoas, (iii) definição das obrigações recíprocas, (iv) finalidade econômica; e (v)

partilha dos resultados (art. 982, CC).

Dentre esses requisitos, destacamos o acordo de vontade entre os

contratantes para associar-se em sociedade, cuja dimensão se alastra em direito

constitucionalmente garantido (art. 5º, XX, Constituição Federal).

Cabe fazer menção, ainda, à affectio societatis como pressuposto de existência da sociedade empresária pluripessoal. Esse pressuposto diz

Claro é que atividades econômicas não se circunscrevem à esfera da empresa, sendo possível perseguir-se a obtenção de lucro sem a complexidade daquela. Prescinde igualmente de qualquer estatística a evidência de que, entre nós, inúmeros são os profissionais intelectuais, que atuam sem o amparo da estrutura empresarial. Decerto a Constituição Federal, afeiçoada a anseios sociais até então represados ao longo do regime pouco democrático que sobreviveu até a sua promulgação, não ignorou essa mencionada realidade. Qualquer atividade econômica, por mais singela que seja a estrutura em que se desenvolve, opera em ambiente coletivo, nele produzindo repercussões maiores ou menores, o que, por óbvio, impõe que se respeite a sua função social. Descortina-se, como comando jurídico incontornável, o do atendimento à função social da atividade econômica, e não apenas da empresa, porque é aquela muito mais ampla e ensejadora de enorme variedade de meio endereçados à conquista do lucro (HEINEMANN FILHO, André Nicolau. Impactos das cláusulas gerais sobre o Regime Jurídico Societário Brasileiro: boa fé e função social no Contrato de Sociedade, Dissertação (Mestrado).- PUC-SP, São Paulo, 2010, p. 126-127).

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respeito à disposição, que toda pessoa manifesta ao ingressar em uma sociedade empresária, de lucrar ou suportar prejuízos em decorrência do negócio comum. Esta disposição, este ânimo, é condição de fato da existência da sociedade pluripessoal, posto que, sem ela, não haverá a própria conjunção de esforços indispensável à criação e desenvolvimento do ente coletivo.203

Assumido o contrato de sociedade, inicialmente nos parece que a

vontade de se associar é elemento vital às partes, pois a vontade direcionada a

associar-se também se refletiria no direito de permanecer associado e no de

rompimento desses vínculos entre as partes. Assim, não bastaria analisar o caráter

volitivo apenas no momento da contratação, mas durante toda vida social e seu fim.

A liberdade de associação, para ser plena, deve não somente assegurar que pessoas interessadas em se unir em torno de objetivos comuns lícitos possam fazê-lo, sem encontrar óbices na ordem jurídica (inciso XVII), mas também vedar que alguém seja compelido a associar-se contra a vontade, ou que não consiga se dissociar, quando quer (inciso XX). Essa última faceta da liberdade de associação, no entanto, assume contornos específicos, quando diz respeito às sociedades empresárias204.

Tanto a constituição quanto os casos de dissolução parcial da

sociedade são temas que passam a interessar ao princípio constitucional da

liberdade de associação (art. 5º, XX, da Constituição da República).

2.5. Da dissolução parcial das sociedades contratuais

Como o trato do tema depende da análise da dissolução parcial das

sociedades contratuais, antes de versarmos sobre cada uma de suas espécies,

devemos, de forma breve, apurar cada uma das sociedades contratuais.

O direito societário brasileiro tem como espinha dorsal a sociedade

simples, e os demais tipos societários utilizarão, em regra, suas normas de forma

supletiva. Ao tratar o tema dessa forma, temos que a sociedade simples pode ser

considerada uma espécie de sociedade, quando analisada em confronto com a

203 COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial. Direito de Empresa, 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 162. 204 COELHO, Fábio Ulhoa. Princípios do direito comercial: com anotações ao projeto de código comercial. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 38.

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sociedade empresária (art. 982, CC), ou como um tipo societário próprio, também

chamado de sociedade simples pura ou stricto sensu.

As sociedades que não exploram empresarialmente seu objeto

social são consideradas simples e, nessa situação, os sócios podem optar em

escolher um dos tipos societários previstos na legislação civil ou, não o fazendo,

subordinar-se-á às normas que lhe são próprias (art. 983, CC).

Os tipos societários previstos na lei civil como próprios das

sociedades contratuais são: nome coletivo, comandita simples e limitada.

Disso temos que a sociedade simples pode ser contratada sem

escolha de um tipo societário (sociedade simples pura ou strito sensu) ou optar por

adotar o tipo nome coletivo, comandita simples ou limitada, sendo restrito a esses

tipos para sociedades empresárias, seguindo a orientação dos sócios que compõem

a sociedade.

A sociedade simples pura ou stricto sensu é aquela em que os

sócios não optaram por adotar nenhum tipo societário para regência especifica.

Nessa hipótese há maior liberdade na elaboração das cláusulas contratuais, pois o

contrato social deverá seguir apenas aquelas essenciais a ele.

A sociedade simples em sentido estrito subordina-se às normas que

lhe são próprias (art. 983, CC), constantes entre os artigos 997 e 1.038 do Código

Civil, que são as normas gerais as sociedades contratuais.

E é exatamente dentre as normas próprias da sociedade simples

que está inserida a maioria das hipóteses de dissolução parcial de sociedade: o

direito de retirada (art.1.029, CC205); a exclusão de sócio (arts. 1.004206 e 1.030207,

205 Art. 1.029. Além dos casos previstos na lei ou no contrato, qualquer sócio pode retirar-se da sociedade; se de prazo indeterminado, mediante notificação aos demais sócios, com antecedência mínima de sessenta dias; se de prazo determinado, provando judicialmente justa causa. Parágrafo único. Nos trinta dias subsequentes à notificação, podem os demais sócios optar pela dissolução da sociedade.

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CC); falência do sócio (art. 1.030, p. único, CC); liquidação de quotas (art. 1.030, p.

único208, CC) e a morte do sócio (art. 1.028, CC209).

Como, em regra, as sociedades contratuais utilizam as normas

gerais da sociedade simples de forma subsidiária, todas as hipóteses contidas entre

os artigos 997 e 1.038 do Código Civil são aplicáveis a elas, seja a sociedade

simples pura, a em nome coletivo (art. 1.040, CC210), a comandita simples (art.

1.046, CC211) ou a limitada que optar pela regência supletiva da sociedade simples

(art. 1.053, CC212).

Além dessas hipóteses gerais, são previstas, especificamente para

as sociedades que adotam o tipo limitada, outras formas de dissolução parcial: o

direito de recesso (art. 1.077, CC213) e a exclusão de sócio pela via extrajudicial (art.

1.085, CC214).

Podemos afirmar que o principal efeito do contrato de sociedade é a constituição de um sujeito de direitos doado de personalidade jurídica: a sociedade. Os contratantes, ao celebrarem o contrato de sociedade, com

206 Art. 1.004. Os sócios são obrigados, na forma e prazo previstos, às contribuições estabelecidas no contrato social, e aquele que deixar de fazê-lo, nos trinta dias seguintes ao da notificação pela sociedade, responderá perante esta pelo dano emergente da mora. Parágrafo único. Verificada a mora, poderá a maioria dos demais sócios preferir, à indenização, a exclusão do sócio remisso, ou reduzir-lhe a quota ao montante já realizado, aplicando-se, em ambos os casos, o disposto no § 1o do art. 1.031. 207 Art. 1.030. Ressalvado o disposto no art. 1.004 e seu parágrafo único, pode o sócio ser excluído judicialmente, mediante iniciativa da maioria dos demais sócios, por falta grave no cumprimento de suas obrigações, ou, ainda, por incapacidade superveniente. 208 Art. 1.030. Parágrafo único. Será de pleno direito excluído da sociedade o sócio declarado falido, ou aquele cuja quota tenha sido liquidada nos termos do parágrafo único do art. 1.026. 209 Art. 1.028. No caso de morte de sócio, liquidar-se-á sua quota, salvo: I - se o contrato dispuser diferentemente; II - se os sócios remanescentes optarem pela dissolução da sociedade; III - se, por acordo com os herdeiros, regular-se a substituição do sócio falecido. 210 Art. 1.040. A sociedade em nome coletivo se rege pelas normas deste Capítulo e, no que seja omisso, pelas do Capítulo antecedente. 211 Art. 1.046. Aplicam-se à sociedade em comandita simples as normas da sociedade em nome coletivo, no que forem compatíveis com as deste Capítulo. 212 Art. 1.053. A sociedade limitada rege-se, nas omissões deste Capítulo, pelas normas da sociedade simples. Parágrafo único. O contrato social poderá prever a regência supletiva da sociedade limitada pelas normas da sociedade anônima. 213 Art. 1.077. Quando houver modificação do contrato, fusão da sociedade, incorporação de outra, ou dela por outra, terá o sócio que dissentiu o direito de retirar-se da sociedade, nos trinta dias subsequentes à reunião, aplicando-se, no silêncio do contrato social antes vigente, o disposto no art. 1.031. 214 Art. 1.085. Ressalvado o disposto no art. 1.030, quando a maioria dos sócios, representativa de mais da metade do capital social, entender que um ou mais sócios estão pondo em risco a continuidade da empresa, em virtude de atos de inegável gravidade, poderá excluí-los da sociedade, mediante alteração do contrato social, desde que prevista neste a exclusão por justa causa. Parágrafo único. A exclusão somente poderá ser determinada em reunião ou assembleia especialmente convocada para esse fim, ciente o acusado em tempo hábil para permitir seu comparecimento e o exercício do direito de defesa.

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suas manifestações de vontade, têm o poder de criar uma pessoa jurídica que, ao mesmo tempo em que é criada pelos sócios, passa a ser a eles vinculada juridicamente e, em decorrência disso, titular de direitos e obrigações. Os sócios, tão logo celebram o contrato de sociedade, passam a ser devedores da principal obrigação de um sócio, isto é, a de integralizar suas quotas sociais, na forma contratada. A credora da integralização das quotas é a sociedade e, no caso de mora dos contratantes, a sociedade terá a pretensão de cobrança do valor das respectivas quotas, acrescido os juros e eventual multa contratual, podendo, alternativamente, excluir o remisso do quadro societário, conforme estabelecem os artigos 1.004 e 1.058 do novo Código Civil. A pessoa jurídica resultante do contrato social também tem obrigações em relação aos sócios, o que pode ser constatado, por exemplo, no caos de direito de recesso do quotista, hipótese em que a devedora do pagamento em dinheiro do valor da quota do dissidente é a sociedade (art. 1.077 e 1.031 do Código Civil de 2002)215.

2.6. Da dissolução parcial das sociedades limitadas e a regência supletiva das

normas da lei de sociedade anônima

Diferentemente do que ocorre nos demais tipos societários, a

sociedade limitada, seja ela simples ou empresária, pode alterar as normas de

regência supletiva mediante inclusão de cláusula expressa em seu contrato social

por conta da previsão do artigo 1.053 do Código Civil, que possibilita aos sócios

optar pelo uso da regência supletiva da sociedade anônima ao invés das regras da

sociedade simples.

Fabio Ulhoa Coelho entendeu pela existência de duas espécies de

sociedade limitada, dependendo se a regência supletiva fosse pelas normas da

sociedade simples ou da anônima. A primeira foi chamada de vínculo estável e a

segunda de vínculo instável, pois cada qual possuiria regras distintas com relação

ao direito de retirada em sociedade limitada de prazo indeterminado.216 Assim,

215 CALÇAS, Manoel de Queiroz Pereira. Sociedade limitada no novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2003, p. 43. 216 Existem, assim, duas limitadas; ou melhor, dois subtipos de sociedades limitadas. Um, o das sociedades limitadas sujeitas ao regime de regência supletiva das sociedades simples (subtipo I); outro, o das sujeitas ao regime de regência supletiva das sociedades anônimas (subtipo II). Às sociedades do primeiro subtipo, proponho chamar limitadas de vínculo instável; às do segundo, limitadas de vínculo estável. Isto em razão da implicação que reputo mais relevante entre as diferenças existentes entre os dois subtipos: o direito de retirada imotivada nas sociedades sem prazo. A existência deste direito nas limitadas de subtipo I faz com que o sócio possa, a qualquer momento e independente de motivação, requerer a apuração dos seus haveres. Isso torna o vínculo entre os sócios, neste subtipo societário, mais instável do que o do outro subtipo, em que a retirada imotivada não é cabível. As sociedades limitadas sujeitas à regência supletiva do Capítulo do CC sobre sociedades simples estabelecem entre os sócios um vínculo instável, que pode ser rompido com maior facilidade. Isso, em função das hipóteses em que é cabível a dissolução parcial (ou, no dizer do CC, a resolução da sociedade em relação a um sócio), que estudaremos no próximo capítulo. Nas sociedades do subtipo I, a dissolução parcial cabe em cinco casos: a) morte de sócio (CC, art. 1.028, caput); b) liquidação de quotas a pedido de credor de sócio (CC, art. 1.026); c) retirada motivada (CC, arts.

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dependendo da escolha dos sócios, se pelo uso supletivo da sociedade simples ou

da anônima, as regras de dissolução parcial mudariam.

Se o contrato social for omisso ou se houver cláusula expressa

dizendo que a regência supletiva da sociedade limitada será pelas normas da

sociedade simples, há irrestrita utilização das regras gerais de dissolução parcial

previstas: o direito de retirada (art.1.029, CC); o de recesso (art. 1.077, CC); a

exclusão de sócio (arts. 1.004, 1.030 e 1.085, CC); a falência do sócio (art. 1.030, p.

único, CC); a liquidação de quotas (art. 1.030, p. único, CC); a morte do sócio (art.

1.028, CC).

Ocorre que, no caso de os sócios optarem por constituir sociedade

limitada pela regência supletiva das normas da Lei de Sociedade Anônima (art.

1.053, p. único, CC), as hipóteses de dissolução parcial sofrerão restrição já que a

lei do anonimato possui previsão diversa sobre o tema, visto tratar-se de sociedade

institucional que, em regra, não possui normas para saída imotivada de sócio217.

Feita os sócios da sociedade limitada a escolha pela regência supletiva das regras

da Lei de Sociedade Anônima, a dissolução parcial seria restrita e somente teria

cabimento nas hipóteses especificas: direito de recesso do artigo 1.077 e exclusão.

Insta salientar que parte da doutrina entende que, mesmo que a

sociedade limitada utilize as regras supletivas da simples, por existir norma

específica de direito de recesso (art. 1.077, CC) no capítulo próprio que trata da

limitada, não haveria omissão sobre o tema e, por isso, seria inaplicável a regra

geral de retirada prevista para sociedade simples (art. 1.029, CC)218´219.

1.077 e 1.029, parte final); d) retirada imotivada (CC, art. 1.029, primeira parte); e) expulsão de sócio (CC, art. 1.085). Já na sociedade limitada de subtipo II, só cabe a dissolução parcial em duas hipóteses: retirada motivada e expulsão. Não cabe, assim, a dissolução parcial do subtipo estável de sociedade pela vontade unilateral do sócio (retirada imotivada), nem a pedido de credor deste (liquidação de quota) ou por falecimento de qualquer um deles. Nela, o vínculo entre os integrantes da sociedade é mais estável porque não pode ser desfeito com tanta facilidade. Aproxima-se a estabilidade do vínculo dos sócios de limitada de subtipo II da do vínculo entre acionistas da sociedade anônima, embora neste último tipo ele seja ainda mais estável (já que não existe a hipótese de expulsão de acionista minoritário (COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial. Direito de Empresa, 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 193-196. 217 NUNES, Márcio Tadeu Guimarães. Dissolução parcial, exclusão de sócio e apuração de haveres nas sociedades limitadas: Questões controvertidas e uma proposta de revisão dos institutos, 2. tiragem. São Paulo: Quartier Latin, 2015, p. 57-60. 218 BARBOSA, Henrique Cunha. Dissolução parcial, recesso e exclusão de sócio: diálogos e dissensos na Jurisprudência do STJ e nos Projetos de CPC e Código Comercial. In: AZEVEDO, Luís André N. de Moura; DE

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Alguns autores fazem uma leitura do dispositivo sob análise como sendo regra meramente complementar da do art. 1.029, aplicável às limitadas que não optam pela aplicação supletiva das disposições das sociedades por ações (Fábio Ulhoa Coelho, Curso de direito comercial, v.2., p. 434-435) o que, do ponto de vista hermenêutico, com o devido respeito, não me parece ter sustentação o que. Em verdade, as normas dos arts. 1.029 e 1.077 têm campo de aplicação distintos: há regra específica dispondo sobre o direito de retirada na sociedade limitada de modo diverso daquele enunciado no disciplinamento da sociedade simples, aplicável, apenas subsidiariamente, às sociedades que não contenham disposição diversa. E o art. 1.077 não faz distinção entre espécies de sociedade limitada para aplicar-se exclusivamente, a uma delas.220

Contudo, a maioria da doutrina entende aplicável a regra do artigo

1.029 do Código Civil, por compreender que a regra do artigo 1.077 possui campo

de aplicação distinto daquela, inclusive tal entendimento é recepcionado pelos

Tribunais221´222´223´224.

CASTRO, Rodrigo R. Monteiro. Sociedade Limitada Contemporânea. 1. ed., São Paulo: Quartier Latin, 2013, p. 357. 219 Parece, todavia, que o regime de responsabilidade próprio da sociedade limitada – diverso do das sociedades simples, pois nela a responsabilidade do sócio é ‘restrita ao valor de suas quotas’, embora todos respondam ‘solidariamente pela integralização do capital social’ (artigo 1.052) – não se coaduna com a aplicação do artigo 1.029, conclusão que encontra apoio em bons argumentos na lei. Por exemplo: o artigo 1.053 estabelece que a regência supletiva das limitadas pelas normas das sociedades simples, ‘nas omissões deste capítulo’ (artigo 1053), e o capítulo IV contém regra específica sobre o direito de retirada (artigo 1077), diferente da regra geral das sociedades simples; em matéria de resolução do contrato social, a remissão às regras da sociedade simples é feita de forma expressa, tal consta do artigo 1085; o legislador fez remissão no artigo 1077 apenas ao artigo 1031, sequer ressalvando a aplicação do artigo 1029, como o fez, por exemplo, no preceito antecedente (artigo 1076); nas limitadas é reiterado o princípio da soberania do contrato (artigo 1053, parágrafo único); o direito de retirada nas limitadas foi ampliado pelo artigo 1077, em relação ao direito anterior etc. Há mais argumentos, que não cabe aqui desfiar (PENTEADO, Mauro Rodrigues. Estudo introdutório. In: BARBI FILHO, Celso. Dissolução parcial de sociedades limitadas. Belo Horizonte: Mandamentos, 2004, p. 34). 220 GONÇALVES NETO, Alfredo de Assis. Direito de Empresa: comentários aos artigos 966 a 1.195 do Código Civil. 6. ed.. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, p. 446. 221 DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE - Ação procedente - Art. 1.077 do Código Civil autoriza o direito de recesso nas sociedades empresariais limitadas em razão de determinados fatos - Previsão complementada pelo art. 1.029 do mesmo diploma, que permite de modo bastante abrangente o direito de retirada nas sociedades simples, bastando para tanto a vontade do sócio - Fraude contra credores não configurada – Sócio retirante com participação societária apenas simbólica e desinteressada da apuração de haveres - Ausência de prejuízo aos credores - Dano moral configurado - Omissão do sócio remanescente, quanto à alteração do contrato social, que resultou na inclusão da sócia retirante no polo passivo de execução trabalhista e submissão de seu patrimônio a constrições judiciais - Ofensa a bem juridicamente tutelado, de caráter extrapatrimonial - Valor indenizatório adequado, que não comporta redução - Recurso não provido. (ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação nº. 0002299-59.2012.8.26.0153, Relator: Francisco Loureiro, Data de Julgamento: 14/10/2015, 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, Data de Publicação: 15/10/2015). 222 COMPETÊNCIA DEFINIDA POR PREVENÇÃO – ART. 102 DO REGIMENTO INTERNO - SÚMULA 98. PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE PASSIVA E CERCEAMENTO DE DEFESA AFASTADAS. SOCIEDADE LIMITADA – DIREITO DE RETIRADA IMOTIVADA – IMPOSSIBILIDADE – CONTRATO SOCIAL QUE ELEGE A REGÊNCIA SUPLETIVA DA LEI DE SOCIEDADES ANÔNIMAS (Lei 6.404/76). A competência das Câmaras Reservadas de Direito Empresarial abrange apenas os processos distribuídos após sua instalação, ressalvada a prevenção estabelecida no art. 102 do Regimento Interno. É de competência da sociedade, e não dos sócios remanescentes, a assembleia de exclusão de sócio que põe em risco a continuidade da empresa, em virtude de atos de inegável gravidade. Quando a prova documental apresentada é suficiente para o deslinde da lide, cabe ao magistrado, destinatário das provas, indeferir provas impertinentes ou inúteis e julgar o processo dentro de um prazo razoável, como previsto em norma constitucional. Preliminares rejeitadas. O Código Civil é omisso no capítulo relativo às Sociedades Limitadas, sobre o direito de retirada imotivada, de modo que, nos termos do art. 1.053, caput e § único, a sociedade pode ser regida tanto pelas regras da Sociedade Simples, quanto pelas

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regras que disciplinam as sociedades anônimas (Lei 6.404/76). O que determina a sujeição a um ou outro regime de regência supletiva é o contrato social que, in casu, elegeu a regência supletiva da Lei das S.A., razão pela qual é inaplicável o art. 1.029 do Código Civil, não tendo a notificação efetuada pelo apelado operado, portanto, os efeitos da exclusão, donde exsurge o interesse jurídico da apelante em promover a exclusão do apelado, com base no art. 1.085 do Código Civil, respeitado, porém, o direito de defesa, inobservado com relação à assembleia de 14/10/10, cuja convocação é nula. Sentença reformada para julgar parcialmente procedente ação (ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação nº. 0019809-31.2010.8.26.0032, Relator: Alexandre Coelho, Data de Julgamento: 28/10/2015, 8ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 29/10/2015). 223 AGRAVO INTERNO EM APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO EMPRESARIAL. PEDIDO DE DISSOLUÇÃO PARCIAL DA SOCIEDADE MOTIVADA POR ROMPIMENTO DA AFFECTIO SOCIETATIS. CONTRATO SOCIAL QUE NÃO DISPÕE A RESPEITO DA DISSOLUÇÃO PARCIAL OU DO EXERCÍCIO DE DIREITO DE RETIRADA. SOCIEDADE LIMITADA COM REGÊNCIA SUPLETIVA DA LEI DE SOCIEDADES ANÔNIMAS. INAPLICABILIDADE DO ART. 1.029 DO CÓDIGO CIVIL, REFERENTE ÀS SOCIEDADES SIMPLES. TERMO INICIAL DA APURAÇÃO DE HAVERES. RESISTÊNCIA AO PEDIDO. SUCUMBÊNCIA. 1) Ao eleger a regência supletiva pelas normas da sociedade anônima (art. 1.053 do Código Civil), o contrato social restringiu às hipóteses de direito de retirada àquelas previstas no art. 1.077 do Código Civil (modificação do contrato social, fusão ou incorporação), inserto no capítulo que trata da sociedade limitada. 2) O motivo invocado pela recorrente (quebra da affectio societatis) não se enquadra em quaisquer das hipóteses de direito de retirada previstas no art. 1.077 do Código Civil, de modo que as únicas vias possíveis para obter o seu desligamento do quadro societário seriam a alienação da participação societária ou a dissolução parcial, sendo esta última a eleita pela parte. 3) Diferentemente do desligamento da sociedade por ato unilateral (direito de retirada), a dissolução judicial tem efeitos constitutivos, porque somente a partir da decisão que a decreta haverá alteração da condição jurídica de uma das partes, que não ostentará mais o título de sócio da sociedade. 4) Consequentemente, a data base para apuração dos haveres não deve coincidir com a manifestação da vontade do sócio no sentido de desligar-se da sociedade, mas, sim, com a decisão judicial que a determina a dissolução. 5) Considerando que não houve divergência entre as partes no tocante ao pedido fundamental de dissolução da sociedade, e que tampouco fora formulado pela recorrente pedido de exclusão da sociedade previamente ao ajuizamento da ação, não se pode compreender que os recorridos deram causa ao ajuizamento da demanda ou opuseram resistência à pretensão, devendo, pois, ser mantida a distribuição dos ônus sucumbenciais estabelecida na sentença. 6) Manutenção da decisão monocrática recorrida. 7) Recurso ao qual se nega provimento (ESTADO DO RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Apelação nº. 0128904-16.2012.8.19.0001, Relator: Des. Heleno Ribeiro Pereira Nunes, DJe 07/10/2014). 224 DIREITO PROCESSUAL CIVIL E EMPRESARIAL. AGRAVO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. SOCIEDADE POR COTAS DE RESPONSABILIDADE LIMITADA. SÓCIO FALECIDO. DISSOLUÇÃO PARCIAL. APURAÇÃO DE HAVERES. IMPOSTO DE TRANSMISSÃO CAUSA MORTIS. HERDEIROS. CPC/39, ART. 668 RECEPCIONADO PELO ART. 1.218, VII DO CPC VIGENTE. AGRAVO IMPROVIDO. I. A Agravante manifesta seu inconformismo contra a decisão objurgada com base na alegação de que na inclusão das quotas no monte-mor foi levado em consideração somente o valor nominal histórico destas, ao invés de ter observado a participação do autor da herança no patrimônio líquido da empresa. II. O problema em análise se estende a relevantes implicações de natureza tributária, especialmente para quantificação da base de cálculo do imposto de transmissão causa mortis, assim como para determinação do valor pelo qual as quotas ou participações na empresa ingressarão no patrimônio dos herdeiros, para efeito do cálculo do dito imposto. III. In casu, é pacifico doutrinária e jurisprudencialmente, que, quando o contrato social da sociedade limitada adota a regulação supletiva pela lei das sociedades anônimas (CCB/2002, art. 1.053, parágrafo único), o art. 1.028 do CCB deixa de ser aplicável à esse tipo societário, competindo, portanto, apenas ao contrato social, regular a matéria de sucessão do sócio, na forma do artigo 668 do CPC/39 recepcionado pelo art. 1.218, VII do CPC vigente. IV. Ademais, essa é a hipótese nos autos no que respeita às sociedades em que o de cujus era sócio (fls. 217/218 e 228/230), posto que são do tipo limitada e os respectivos contratos sociais adotam regulação pela Lei das S.A. Portanto, a apuração e liquidação dos haveres do sócio pré morto, para pagamento aos herdeiros, e, para efeitos sucessórios, é a estabelecida nos contratos sociais das empresas em que o de cujus era sócio, devendo ser realizada na forma e modo ali estipulados, qual seja, mediante apuração dos haveres. V. Seguindo o raciocínio, e, detido em qual deva ser o valor da quota a se apurar para efeitos sucessórios, bem como, considerando ainda, que as sociedades onde participava o falecido são do tipo empresária limitada e tiveram seus haveres apurados por balanço especial que alcançou um valor do patrimônio real das empresas; a regra do artigo 1.031 do Código Civil, de que o valor da quota deve ser determinado pelo seu valor atualizado, com base na situação patrimonial real da sociedade, esclarece o acerto da decisão recorrida. Outra vez explico: VI. Para efeitos sucessórios, quando a sociedade limitada é dissolvida parcialmente, o que deve ser apurado é "o estado patrimonial da sociedade existente naquele momento que, deve ter seu valor determinado para a apuração do quantum da quota. Assim, tem-se que tanto a doutrina como a jurisprudência dominantes, entendem, no mesmo raciocínio da decisão atacada, de que, em termos sucessórios, na sociedade limitada, dissolvida parcialmente em razão de falecimento de sócio, a apuração e liquidação do seu patrimônio liquido é o proporcional à quota do capital do sócio pré morto. VI. Ainda, a Fazenda Pública, ora recorrente, não impugnou (fls.318v/319) os haveres alcançados pela pericia contábil oficial no balanço especial realizado e que serviu para a elaboração do demonstrativo de levantamento do monte-mor e para o cálculo dos valores devidos pelo espólio. VII. Diante do

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.

Enquanto vigorar a aplicabilidade às limitadas das normas relativas às sociedades simples, não se vislumbra razão que justifique a impossibilidade de incidência da faculdade contemplada no art. 1.029 às sociedades limitadas. O art. 1.077 cuida do direito de recesso, enquanto motivado por divergência em relação à alteração promovida no contrato social, fusão ou incorporação de uma sociedade ou desta por outra. O art. 1.029 faculta a chamada denúncia vazia, desmotivada, e que permite, por conseguinte, a retirada do sócio, na sociedade por prazo indeterminado, subordinada única e exclusivamente a sua vontade, enquanto nas sociedades de prazo determinado cumpre àquele que pretende se afastar da sociedade provar judicialmente justa causa para tanto.225

Portanto, acolhendo a maioria da doutrina e da jurisprudência, caso

a limitada adote como regra supletiva as da sociedade simples, haverá aplicação

ampla das hipóteses de dissolução parcial prevista no Código Civil, porém, se os

sócios optarem pelo uso de regra supletiva da Lei de Sociedade Anônima (Lei nº.

6.404/1976), haverá limitação das hipóteses e somente se aplicarão o de direito de

recesso (art. 1.077, CC) e a exclusão de sócios.

2.7. As espécies de dissolução parcial das sociedades contratuais

Como sustentamos até o momento, o instituto da dissolução parcial

das sociedades contratuais apresenta-se sob diversas formas no Código Civil e

ganhou novos contornos com o novo Código de Processo Civil, pois, nesse diploma

de recente vigência226, foram introduzidas normas que sanaram algumas dúvidas e

criaram outras que serão tratadas aqui caso a caso.

explicitado, perde o sentido a alegação da agravante de que o valor das quotas que serão transmitidas aos herdeiros do sócio pré morto deve ser o de mercado. VIII. Unanimemente, negou-se provimento ao Agravo (ESTADO DE PERNAMBUCO. Tribunal de Justiça do Estado do Pernambuco. Agravo de Instrumento nº. 3905995, Relator: Rafael Machado da Cunha Cavalcanti, DJe 26/02/2016). 225 FONSECA, Priscila M.P. Corrêa da. Dissolução parcial, retirada e exclusão de sócio no Novo Código Civil. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2005, p. 31. 226 O novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015) entrou em vigor em 18/03/2016 e inovou ao tratar da “Ação de Dissolução Parcial de Sociedade” (art. 599 e ss., CPC) e a prever disposições de direito material que acabou sanando algumas das omissões do Código Civil sobre o tema.

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2.7.1. Direito de retirada227

O direito de retirada está previsto nos artigos 1.029228 do Código

Civil e 605, II e IV229, do Código de Processo Civil e pode ser utilizado por sócio de

sociedade simples stritu sensu, nome coletivo, comandita simples ou limitada regida

supletivamente pelas normas da sociedade simples.

O direito de retirada é o direito potestativo conferido a qualquer

sócio de, por meio de declaração unilateral de natureza receptícia, extinguir a

relação jurídica existente entre o referido sócio, a sociedade e os demais sócios,

nas hipóteses autorizadas por lei ou pelo contrato230.

Trata-se de direito inerente à titularidade de quotas sociais, denominado também recesso ou dissidência. Define-se retirada como o direito de o sócio se desligar dos vínculos que o unem aos demais sócios e à sociedade, por ato unilateral de vontade. Nessa hipótese, não há negociação. O sócio impõe à pessoa jurídica, por sua exclusiva vontade, a obrigação de lhe reembolsar o valor da participação societária231.

O citado artigo 1.029 trata de duas espécies de direito de retirada a

depender do tempo de duração da sociedade, se indeterminado ou determinado.

Ninguém é obrigado a associar-se ou a manter-se associado (CF, art. 5º, XX). Assim, todo sócio tem o direito de se retirar da sociedade se for de seu interesse pessoal. Quando a sociedade for constituída por prazo indeterminado, o sócio pode retirar-se a qualquer tempo, bastando notificar os demais sócios, por escrito, com antecedência de sessenta dias. Se a sociedade for por prazo determinado, o sócio que pretender retirar-se tem de provar, por meio de ação judicial de dissolução de sociedade, a existência de justa causa motivadora para sua saída. Nesse caso, o juiz

227 A doutrina tem usado como sinônimos o direito de retirada e o de recesso, porém vamos diferenciar ambas as expressões pelo sentido dado pelo artigo 605 do Código de Processo Civil o qual distingue a retirada nas hipóteses do artigo 1.029 do Código Civil e o recesso pela do artigo 1.077 do Código Civil. 228 Art. 1.029. Além dos casos previstos na lei ou no contrato, qualquer sócio pode retirar-se da sociedade; se de prazo indeterminado, mediante notificação aos demais sócios, com antecedência mínima de sessenta dias; se de prazo determinado, provando judicialmente justa causa. Parágrafo único. Nos trinta dias subsequentes à notificação, podem os demais sócios optar pela dissolução da sociedade. 229 Art. 605. A data da resolução da sociedade será: II - na retirada imotivada, o sexagésimo dia seguinte ao do recebimento, pela sociedade, da notificação do sócio retirante; IV - na retirada por justa causa de sociedade por prazo determinado e na exclusão judicial de sócio, a do trânsito em julgado da decisão que dissolver a sociedade; e 230 MARQUES, Evy Cynthia. O direito de retirada de sócios de sociedade simples e sociedade limitada. Dissertação ( Mestrado)- Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, 2010, p. 121. 231 COELHO, Fábio Ulhoa, Curso de direito comercial, Volume 2: sociedades. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 469).

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apreciará as razões em que se funda a decisão de retirada antes do tempo previsto para a dissolução da sociedade. O parágrafo único deste dispositivo diz respeito, apenas, à hipótese de retirada do sócio nas sociedades por prazo indeterminado, quando os demais sócios poderão deliberar pela dissolução total da sociedade, e não apenas por sua dissolução parcial232.

Por existir distinção do direito de retirada, dependendo do tempo de

duração da sociedade, cabe separarmos a análise de cada instituto, como será feito

doravante.

2.7.1.1. Direito de retirada na sociedade por tempo indeterminado

Pelo disposto no artigo 1.029 do Código Civil, para as sociedades

contratadas por tempo indeterminado, qualquer sócio pode retirar-se da sociedade

mediante notificação aos demais sócios com antecedência mínima de 60 (sessenta)

dias.

Faculta-se ao sócio retirar-se espontaneamente da sociedade. No entanto, se de prazo indeterminado, cumpre que notifique os demais sócios, com a antecedência de sessenta dias. Se de prazo determinado, insta que se prove judicialmente a causa apta a autorizar o afastamento. Essas diretrizes promanam do art. 1.029. (art. 1.404 do Código revogado)233

Na retirada imotivada de sócio em sociedade por tempo

indeterminado, aquele, insatisfeito com sua participação societária, não mais deseja

estar associado, razão pela qual o sócio pede para se afastar do quadro social,

devendo serem apurados os valores a que tem direito a receber234. Na hipótese, não

há o que possa ser questionado, quanto ao seu mérito, pela sociedade, a qual se

obriga a ressarcir o dissidente para que ele deixe o quadro de sócios.

Frisemos, o pedido para se retirar, no caso de dissolução parcial da

sociedade por tempo indeterminado, parte do próprio sócio que quer se afastar da

pessoa jurídica, e não conduz à extinção da sociedade nem independe da

232 DA SILVA, Regina Beatriz Tavares. Código Civil comentado. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 928. 233 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de empresa: Lei n. 10.406, de 10.01.2002, 2 ed., rev. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 151. 234 Enunciado 480 da V Jornada de Direito Civil: Art. 1.029. Revogado o Enunciado n. 390 da III Jornada [“Em regra, é livre a retirada de sócio nas sociedades limitadas e anônimas fechadas, por prazo indeterminado, desde que tenham integralizado a respectiva parcela do capital, operando-se a denúncia (arts. 473 e 1.029)”].

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configuração de motivo justo necessário para retirada da sociedade por tempo

determinado.

Nessa linha, o novo diploma processual, artigo 605, II235, supriu

aparente omissão da norma substantiva, ao pontuar qual seria a data da resolução

da sociedade na retirada imotivada, decretando ser o sexagésimo dia seguinte ao

do recebimento, pela sociedade, da notificação do sócio retirante.

Pela importância de se determinar a data da resolução da sociedade

para os critérios de apuração de haveres, a norma processual acabou por tornar

objetivo o critério e pontuou que, na retirada imotivada, a data de resolução é a do

decurso do prazo de aviso prévio de 60 (sessenta) dias contados do recebimento,

pela sociedade, da notificação do sócio retirante236.

Esse critério posto na norma acabou por afastar o entendimento

majoritário de que a data de resolução na retirada imotivada na sociedade por

tempo indeterminado seria a da notificação aos demais sócios:

DIREITO SOCIETÁRIO. RECURSO ESPECIAL. DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE LIMITADA POR TEMPO INDETERMINADO. RETIRADA DO SÓCIO. APURAÇÃO DE HAVERES. MOMENTO. A data-base para apuração dos haveres coincide com o momento em que o sócio manifestar vontade de se retirar da sociedade limitada estabelecida por tempo indeterminado. Quando o sócio exerce o direito de retirada de sociedade limitada por tempo indeterminado, a sentença apenas declara a dissolução parcial, gerando, portanto, efeitos ex tunc. Recurso especial conhecido e provido237.

A data-base para apuração dos haveres coincide com o momento em que o sócio manifestar vontade de se retirar da sociedade limitada estabelecida por tempo indeterminado238.

235 Art. 605. A data da resolução da sociedade será: II - na retirada imotivada, o sexagésimo dia seguinte ao do recebimento, pela sociedade, da notificação do sócio retirante 236 Este autor, data máxima vênia, entende que foi infeliz a obrigação do sócio retirante manter-se associado pelo prazo de 60 (sessenta) dias como previsto no Código de Processo Civil, pois nesse período os demais sócios podem tomar atitudes que prejudiquem o direito do retirante na apuração de haveres, tomando decisões contrárias a este. O ideal seria manter o entendimento de que o vínculo do sócio encerra-se com o recebimento da notificação pela sociedade, e o prazo de 60 (sessenta) dias da lei material ser aquele para a sociedade alterar o contrato para refletir a saída do sócio. 237 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 646221⁄PR, Rel. Ministro Humberto Gomes De Barros, Rel. P⁄ Acórdão Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 19⁄04⁄2005, DJe 30⁄05⁄2005. 238 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1371843⁄SP, Terceira Turma, Rel. Ministro Paulo De Tarso Sanseverino, DJe 26⁄03⁄2014.

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Além da questão da data de resolução, a norma processual

apresentou aparente contradição com relação à lei civil no que tange aos

destinatários da notificação do direito de retirada: se os demais sócios, por força da

lei civil; ou se a sociedade, por conta da lei processual; ou se ambos, sócios e

sociedade.

Até a entrada em vigor do Código de Processo Civil em 18/03/2016,

o entendimento posto na doutrina e na jurisprudência era que os destinatários eram

os demais sócios por conta da redação do artigo 1.029 do Código Civil239.

Seja como for, decorrido o prazo de pré-aviso, o sócio retirante perde o status socii e torna-se credor da sociedade. Para além disso, a regra processual altera, em certa media (ou complementa, como querem outros), a regra contida no Código Civil: neste diploma material prescreve-se que a notificação de retirada deve ser encaminhada aos demais sócios (CC, art. 1.029); no CPC/2015, alude-se apenas à sociedade, que até mesmo em tese é realmente a destinatária primária da notificação240.

Existia entendimento que, pelo fato de a sociedade ser o centro da

relação existente entre os sócios, bastaria o recebimento pela sociedade para ter

início o prazo do pré-aviso de 60 (sessenta) dias para retirada do sócio que

pretendesse desvincular-se da associação, não sendo necessária a notificação dos

demais sócios.

Pelos princípios gerais do direito dos contratos, a resposta pertinente indica que a exteriorização da vontade do sócio, no sentido de se retirar da sociedade, é já suficiente para operar o desligamento, porque não está o ato sujeito a qualquer outra condição. A definição do montante a ser reembolsado é decorrência do fim do vínculo contratual, e, portanto, o pressupõe. Assim, no momento em que a sociedade recebe a declaração escrita do sócio de que está exercendo o seu direito de recesso, desfazem-se os vínculos societários que o envolviam 241.

E tal entendimento se sustenta pelo fato de que, em que pese a

norma do artigo 605, II estar contida no diploma processual, evidentemente trata de

matéria de direito substantivo e que, portanto, modificou o teor do disposto no artigo

239 FONSECA, Priscila M.P. Corrêa da. Dissolução parcial, retirada e exclusão de sócio no Novo Código Civil. 3. ed., São Paulo: Atlas, 2005, p. 26-37. 240 FRANÇA, Erasmo Valladão e Novaes; ADAMEK, Marcelo Vieira von. Da ação de dissolução parcial de sociedade: comentários breve ao CPC/2015. São Paulo: Malheiros, 2016, p. 64. 241 COELHO, Fábio Ulhoa. A Sociedade Limitada no Novo Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 103-104.

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1.029 do Código Civil, conforme o artigo 2º, §1º da Lei de Introdução às Normas do

Direito Brasileiro (Decreto Lei nº. 4.657/1942).242

Por outro lado, existe entendimento firmado no Superior Tribunal de

Justiça que a notificação prévia aos demais sócios constitui mera faculdade, e não é

pressuposto para o ingresso em juízo de ação de dissolução parcial de sociedade

(REsp nº. 1.365.175 – MG) e, nessa situação, em não tendo o sócio retirante

notificado os demais sócios acerca da sua vontade de se retirar da sociedade, tendo

havido o ajuizamento de ação judicial para tanto, que pese seja o ajuizamento o

momento em que o sócio manifesta sua vontade de sair da sociedade. O

entendimento anterior à entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil era de

que a citação seria o meio de suprir a notificação, devendo este ser considerado o

marco inicial da resolução da sociedade para apuração de haveres243.

Assim, para melhor solução desta aparente contradição de norma,

entendemos que a norma processual deve ser considerada como complementar à

material e, portanto, para evitar qualquer obstáculo ao direito de retirada, o sócio

que deseja se retirar deve notificar tantos os demais sócios quanto a sociedade.

Nos 30 (trinta) dias subsequentes à notificação, podem os demais

sócios optar pela dissolução da sociedade (art. 1.029, p. único, CC).

Em ambos os caso, o prazo se inicia quando do recebimento das

notificações por todos os consortes.

Não sendo a notificação de recesso simultaneamente efetivada aos demais consortes pelo retirante, conta-se o prazo de trinta dias da última realizada, porquanto a decisão pressupõe a ciência de todos os sócios. Nesse ponto, o prazo de sessenta dias exigido por lei como antecedência mínima também será computado da última notificação244.

242 Art. 2º Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue. § 1º A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior. 243 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Apelação nº. 70039050760, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Romeu Marques Ribeiro Filho, DJe 24/08/2011. 244 CAMPINHO, Sérgio. O direito de empresa à luz do novo Código Civil. 4. ed: ampliada e revisada. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 124.

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Recebidas as notificações e transcorrido o prazo do aviso prévio de

60 (sessenta) dias, o sócio que decidiu se retirar perderá seu status socii245 e

passará a ser credor da sociedade, porém, para tornar pública essa nova condição

e poder ser oposta a terceiro, deverá ser averbado, no registro competente, as

notificações ou a alteração contratual (art. 1.032, CC246).

2.7.1.2. Direito de retirada na sociedade por tempo determinado

Diferentemente do que ocorre na sociedade por tempo

indeterminado, na qual o sócio pode de forma imotivada desassociar-se por mera

interpelação, na de tempo determinado, é necessária a comprovação judicial de

justa causa.

Como o caso da retirada por justo motivo depende da análise pelo

órgão judicial, a lei processual estabeleceu que a data da resolução da sociedade

será a do trânsito em julgado da decisão que dissolver a sociedade (art. 605, IV,

CPC247), pois, somente após cognição exauriente, é que se terá apurada a

motivação do pedido do sócio que busca se desligar da sociedade.

Diante da disposição legal que determina que a data em que se

resolve a sociedade perante o sócio de sociedade por tempo determinado que

busca o desligamento por direito de retirada por justo motivo é a do trânsito em

julgado da decisão, é certo que o sócio retirante não perderá sua qualidade

245 Pela Instrução Normativa nº. 38 da DREI – Manual de Registro - Sociedade Limitada: 3.2.6.2 Retirada nos casos de prazo determinado ou indeterminado Além dos casos previstos na lei ou no contrato, qualquer sócio pode retirar-se da sociedade: a) Se de prazo indeterminado, mediante notificação aos demais sócios, com antecedência mínima de 60 (sessenta) dias, a contar da notificação do último sócio. Nesta hipótese, observar-se-á o seguinte: - Passado o prazo, deverá ser providenciado arquivamento da notificação, que poderá ser por qualquer forma que ateste a cientificação dos sócios; - A junta anotará no prontuário a retirada do sócio; - A sociedade deverá, na alteração contratual seguinte, regularizar o quadro societário; Disponível em: <http://drei.smpe.gov.br/legislacao/instrucoes-normativas/titulo-menu/pasta-instrucoes-normativas-em-vigor-03/anexo-ii-in-38-2017-manual-de-registro-ltda-alterado-pela-in-40-2017.pdf.> Acesso em: 12 jun. 2017. 246 Art. 1.032. A retirada, exclusão ou morte do sócio, não o exime, ou a seus herdeiros, da responsabilidade pelas obrigações sociais anteriores, até dois anos após averbada a resolução da sociedade; nem nos dois primeiros casos, pelas posteriores e em igual prazo, enquanto não se requerer a averbação. 247 Art. 605. A data da resolução da sociedade será: IV - na retirada por justa causa de sociedade por prazo determinado e na exclusão judicial de sócio, a do trânsito em julgado da decisão que dissolver a sociedade; e

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enquanto perdurar a demanda, cabendo-lhe todos os direitos e os deveres de sua

participação societária (art. 608, CC248).

A lei não traz em seu bojo qual seria a justa causa que poderia

motivar o pedido de retirada, assim como não o faz no caso de pedido de exclusão

judicial (art. 1.030, CC) ou extrajudicial (art. 1.085, CC), cabendo ao judiciário a

análise casuística para caracterizar o justo motivo, que permita ao sócio que

contratou sociedade por tempo determinado se desligar do vínculo social249.

2.7.2. Direito de recesso

O direito de recesso está previsto no artigo 1.077 do Código Civil e,

portanto, nas regras especificas da sociedade limitada. Diferentemente do que

ocorre com o direito de retirada, previsto no artigo 1.029 do Código Civil, o de

248 Art. 608. Até a data da resolução, integram o valor devido ao ex-sócio, ao espólio ou aos sucessores a participação nos lucros ou os juros sobre o capital próprio declarados pela sociedade e, se for o caso, a remuneração como administrador. Parágrafo único. Após a data da resolução, o ex-sócio, o espólio ou os sucessores terão direito apenas à correção monetária dos valores apurados e aos juros contratuais ou legais. 249 Assim como não se mostra adequada a balizar soluções em matéria de exclusão de sócio, a noção de affectio societatis também não se mostra útil subsídio em tema de retirada de sócio59 - o poder de autodesvinculação que assiste ao sócio nos casos previstos em lei (CC, arts. 1.029 e 1.077), abrangendo, numa acepção mais lata, também as hipóteses de dissolução parcial da sociedade. Na realidade, o que pode embasar o pedido de dissolução parcial da sociedade pelo sócio que deseja se retirar de sociedade não é propriamente a quebra da affectio societatis, mas a inviabilidade de o sócio nela continuar, por efeito de alguma justa causa assim considerada judicialmente (CC, art. 1.029, par. ún.); ou por efeito de descumprimento dos deveres de lealdade, boa-fé e colaboração pelos demais sócios; ou em razão de qualquer outra hipótese de dissolução total não impositiva, desejando os demais sócios prosseguir na exploração da atividade social. O que sucede, porém, é que, entre as situações de exclusão, de um lado; e de retirada ou de dissolução parcial, de outro, existem fundamentais diferenças em relação àquele sobre o qual repousa eventualmente a imputação de descumprimento de deveres sociais: na exclusão, recai sobre o sócio que os demais desejam afastar (hetero-desvinculação); na retirada, diversamente, o caráter punitivo desaparece (ou é, em muito, atenuado), concedendo-se apenas o poder de autodesvinculação do sócio que pleiteia a medida, porque, a tanto, não foi possível chegar amigavelmente, sem prejuízo, em todo caso, da continuidade da exploração da sociedade pelos remanescentes. Ainda assim, a persistência ou não da intenção, do desejo, do ânimo de associar-se ou se manter associado, é dado irrelevante para conceder ou não a dissolução parcial da sociedade (salvo, evidentemente, quando a lei expressamente conceda o direito de denúncia imotivada pelo sócio, hipótese em que, mesmo assim, o fator determinante da extinção do vínculo societário não será a intenção da parte, mas o efeito que a lei dá à manifestação unilateral e receptícia de vontade do agente). Não fosse assim e, portanto, tivesse a mera alegação de quebra de affectio societatis o poder de autorizar a retirada do sócio, ter-se-ia necessariamente que reconhecer a existência do direito de retirada ad nutum até mesmo em sociedades por prazo determinado, contra a letra expressa do art. 1.029 do Código Civil (o qual exige a prova em juízo da existência de justa causa), bastando, para tanto, que o interessado alegue não mais haver a afeição social. Verificamos, por esse modo, que os equívocos da construção do instituto da affectio societatis laboram não só contra o sócio excluendo, como acima demonstrado, mas, igualmente, contra a própria sociedade e os sócios remanescentes, nos casos de retirada, por vezes impedindo o próprio prosseguimento da atividade, em razão da liquidação da quota do retirante (FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes: ADAMEK, Marcelo Vieira von. Affectio societatis: um conceito jurídico superado no moderno direito societário pelo conceito de fim social. Revista de Direito Mercantil, Econômico e Financeiro, São Paulo, n. 149-150, jan. 2008, p. 126-127).

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recesso não se aplica a todos os tipos societários250, mas tão somente quando a

sociedade, empresária ou simples, adotar como tipo limitada251.

O recesso é o direito do sócio que não concordar com modificação

do contrato, fusão da sociedade, incorporação de outra, ou dela por outra, de retirar-

se da sociedade de forma extrajudicial, noticiando o exercício do seu direito nos 30

(trinta) dias subsequentes à assembleia ou reunião em que foi decida a matéria em

que ocorreu sua dissidência.

Assim, o sócio dissidente deverá notificar a sociedade de sua opção

por retirar-se, tendo em vista a não concordância com os rumos sociais deliberados

nos estritos termos do artigo 1.077 do Código Civil, sendo considerado, como data

da resolução do vínculo social do sócio dissidente, o dia do recebimento, pela

sociedade, da notificação nesse sentido (art. 605, III, CPC252).

Diferentemente do que ocorre no exercício do direito de retirada nas

sociedades por prazo indeterminado em que não há necessidade da ocorrência de

motivo para saída do sócio (art. 1.029, CC, primeira parte), no direito de recesso o

sócio deve apresentar sua dissidência para exercer o direito de retirada, como

espécie de justo motivo do próprio artigo 1.029 do Código Civil (segunda parte), mas

com justificativa mais restrita (alteração do contrato social, fusão da sociedade,

incorporação de outra, ou dela por outra), porém sem a necessidade de valer-se da

via judicial.

250 Excetuando a sociedade limitada que optou por uso das regras supletivas da sociedade anônima, como já analisamos nesse trabalho ao tratar do disposto no artigo 1.057 do Código Civil. 251 Enquanto vigorar a aplicabilidade às limitadas das normas relativas às sociedades simples, não se vislumbra razão que justifique a impossibilidade de incidência da faculdade contemplada no art. 1.029 às sociedades limitadas. O art. 1.077 cuida do direito de recesso, enquanto motivado por divergência em relação à alteração promovida no contrato social, fusão ou incorporação de uma sociedade ou desta por outra. O art. 1.029 faculta a chamada denúncia vazia, desmotivada, e que permite, por conseguinte, a retirada do sócio, na sociedade por prazo indeterminado, subordinada única e exclusivamente a sua vontade, enquanto nas sociedades de prazo determinado cumpre àquele que pretende se afastar da sociedade provar judicialmente justa causa para tanto. (FONSECA, Priscila M.P. Corrêa da. Dissolução parcial, retirada e exclusão de sócio no Novo Código Civil. 3. ed., São Paulo: Atlas, 2005, p. 31) 252 Art. 605. A data da resolução da sociedade será: III - no recesso, o dia do recebimento, pela sociedade, da notificação do sócio dissidente;

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2.7.3. Exclusão de sócio

A exclusão de sócio, assim como ocorre no direito de retirada,

possui espécies próprias que devem ser analisadas, separadamente, por conta de

suas especificidades.

A lei prevê para sociedades contratuais253 a possibilidade de

exclusão do sócio remisso (art. 1.004, CC); do sócio que cometeu falta grave,

comprovada judicialmente, ou por incapacidade superveniente (art. 1.030, CC); o

sócio declarado falido; ou aquele cuja quota tenha sido liquidada (art. 1.030, p.

único, CC) e, de forma específica à sociedade do tipo limitada, a exclusão de sócio

pela via extrajudicial (art. 1.085, CC).

Em linha de resumo, podemos, quanto à exclusão do sócio, ordenar a seguinte orientação: a) o sócio remisso, por iniciativa da maioria dos demais sócios, poderá ser excluído da sociedade, exclusão essa que se realizará de forma extrajudicial; b) os sócios declarados falidos ou civilmente insolventes, na forma das respectivas leis de regência, bem como o sócio cuja quota for liquidada nos termos do parágrafo único do artigo 1.026 do Código, será, de pleno direito, excluído da sociedade, exclusão essa que se grave no cumprimento de suas obrigações legais ou contratuais, ou, ainda, o declarado incapaz por fato superveniente, poderá ser excluído por decisão da maioria dos demais sócios, mas a exclusão far-se-á judicialmente254.

2.7.3.1. Exclusão judicial de sócio por falta grave

A exclusão constitui modalidade de extinção do vínculo societário do

sócio em relação à sociedade e aos demais sócios e, de acordo com a doutrina

majoritária, uma especial modalidade de resolução do contrato de sociedade por

fato imputável ao sócio. A exclusão de sócio é matéria excepcional decorrente do

direito dos sócios255 de afastar da sociedade aquele corpo que desrespeita regra de

253 Excetuando a sociedade limitada que optou por uso das regras supletivas da sociedade anônima, como já analisamos nesse trabalho, ao tratar do disposto no artigo 1.057 do Código Civil. 254 CAMPINHO, Sérgio. O direito de empresa à luz do novo Código Civil. 4. ed: ampliada e revisada. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 128. 255 O artigo 1.030 traz inovação no que diz respeito ao poder da minoria. Isto porque, de acordo com a redação do artigo, ‘pode o sócio ser excluído judicialmente, mediante iniciativa da maioria dos demais sócios’. Ou seja, a maioria será computada excluindo-se do cálculo o sócio que se pretende jubilar. Se o sócio a ser excluído detém a maioria do capital social da sociedade, a sua exclusão poderá, em tese, se dar por decisão dos sócios restantes, ou seja, por decisão dos sócios minoritários (WALD, Arnoldo. Comentários ao novo Código Civil, v. XIV, livro II, do direito de empresa. In: TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo (Coord.). Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 237)

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convívio social por falta considerada judicialmente como grave, conforme previsão

do artigo 1.030 do Código Civil256.

A busca da exclusão judicial depende da iniciativa da maioria dos

demais sócios (art. 1030, CC). Isso significa claramente que a minoria também teria

o direito de buscar excluir a maioria, se presentes os requisitos legais257, pois, no

cômputo do quórum para aprovação da deliberação que se pretende decidir a

exclusão, não deve ser incluída a manifestação daquele que se busca excluir.

Aprovada a deliberação, caberá à sociedade propor ação de dissolução parcial de

sociedade com pedido de exclusão258 perante o Poder Judiciário ou Arbitragem,

dependendo das regras de resolução de conflito contratada entre os sócios.

A lei, como no caso da retirada de sócio por justo motivo na

sociedade contratada por tempo determinado (art. 1.029, CC), não traz em seu

regramento a definição do que seria considerado falta grave para permitir a

exclusão do sócio259. A ideia de manter a norma aberta é permitir que o julgador

possa avaliar o caso concreto para decidir com base nas provas apresentadas a

existência ou não da falta grave.

A expressão falta grave é – e deve ser – ampla. Embora tenha sido estabelecida por meio de lei, seu plano é o do direito disciplinar, no qual não se fazem necessárias situações tipificadas, mas comportamentos que, não importa qual seja sua configuração, caracterizem grave desrespeito aos deveres que podem ser tidos como inerentes à manutenção de uma sociedade. [...] Para além das previsões estatutárias, um amplo leque de possibilidades se define, como atos que caracterizem desrespeito à affectio societatis (designadamente a concorrência desleal com a sociedade), prática – ou tentativa – de crimes dolosos que tenham a sociedade ou qualquer dos sócios como vítima, improbidade (mesmo sem caracterização de ato ilícito), etc260.

256 Art. 1.030. Ressalvado o disposto no art. 1.004 e seu parágrafo único, pode o sócio ser excluído judicialmente, mediante iniciativa da maioria dos demais sócios, por falta grave no cumprimento de suas obrigações, ou, ainda, por incapacidade superveniente. 257 FINKELSTEIN, Maria Eugênia. Manual de direito empresarial. 8. ed. rev., ampliada e reformulada. São Paulo: Atlas, 2016, p. 133. 258 Art. 600. A ação pode ser proposta: V - pela sociedade, nos casos em que a lei não autoriza a exclusão extrajudicial; ou 259 Nesse sentido, a “falta grave” prevista no artigo 1.030, que possibilita a exclusão de sócio, ainda não está bem definida pela doutrina. Paulo Checoli destaca: “não ficou definido o que é a falta grave prevista no art. 1.030 e, sendo assim, sugere que seja um ato que tem efeito danoso à sociedade, que podem levá-la ao estado de insolvência e descrédito". (ROVAI, Armando Luiz. Impacto do código civil de 2002 no registro de empresa na era da globalização. Tese (Doutorado) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2006, p. 73. Impacto do código civil de 2002 no registro de empresa na era da globalização. Tese de doutorado - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. 2006, p. 73) 260 MAMEDE, Gladston. Direito empresarial brasileiro: direito societário: sociedades simples e empresárias. v. 2, 4. ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 155-156.

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Rubens Requião, em sua tese apresentada para o concurso à

Cátedra de Direito Comercial da Faculdade de Direito da Universidade do Paraná,

esclarece que o motivo justo para exclusão decorre do inadimplemento das

obrigações sociais:

A inadimplência das obrigações sociais constitui causa, das mais evidentes, para a aplicação do princípio da exclusão do sócio. Pensamos que existe, em relação ao contrato de sociedade comercial, a condição resolutória tácita. O instituto da dissolução da sociedade não exclui essa condição implícita. Os sócios adimplentes podem, portanto, ou dissolver a sociedade em virtude da inadimplência da obrigação social por parte de um de seus companheiros, ou preferir sua exclusão, em proveito da permanência da sociedade entre êles261.

A dissolução parcial por exclusão de sócio que se opera pelo artigo

1.030 do Código Civil não diz respeito às meras divergências entre sócios, como a

perda do affectio societatis262, mas a existência concreta de fato que se configura

falta grave263.

261 REQUIÃO, Rubens. A preservação da sociedade comercial pela exclusão do sócio. Tese apresentada para o concurso à Cátedra de Direito Comercial da Faculdade de Direito da Universidade do Paraná, 1959, p. 269- 270. 262 O Enunciado n. 67, aprovado na Jornada de Direito Civil, promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, dispõe que, em razão da exigência de justo motivo, a quebra de affectio societatis não é causa suficiente para exclusão do sócio. 263 Pois bem. Com a entrada em vigor do atual Código Civil, que seguramente tornou mais estritas as possibilidades de exclusão de sócio, parte significativa da doutrina pátria mais moderna passou a sustentar, com razão que não mais basta a simples alegação de quebra da affectio societatis para legitimar o afastamento compulsório do sócio, e essa orientação já tem encontrado amparo em boas e corretas decisões de nossos tribunais, ainda quando as forças da tradição e da inércia façam reverberar o antigo entendimento. A nosso ver, a mera quebra da affectio societatis, enquanto tal, não pode autorizar a exclusão do sócio, e assim realmente deve ser, pois, a se admiti-la: (1º) estaria, de fato, instalada a possibilidade de exclusão de sócio por mera vontade ou capricho dos demais sócios, não obstante a doutrina sempre tenha, de maneira uníssona, verberado e tachado de ilegal a cláusula contratual que a facultasse; (2°) criar-se-ia, ademais, uma vera situação de subordinação e sujeição da minoria aos desígnios da maioria, em autêntica denegação da própria essência da relação societária, que não é de subordinação, e contra a própria lógica do sistema legal societário - o qual, não por mero acaso, regula, de forma minuciosa, o exercício do poder de controle no âmbito interno da sociedade, disciplina as hipóteses de conflito de interesses, prevê quóruns qualificados e minorias de bloqueio, e assegura os direitos de minoria e os direitos essenciais, e tantos outros institutos que só se justificam pela necessidade de regular as posições dos sócios e que, logicamente, poderiam ser postos de lado, se tudo estivesse então submetido ao jugo da pura e simples maioria (3º) a própria exclusão da maioria faltosa pela minoria, modernamente aceita sem contestações, constituiria autêntica contradictio in terminis; e (4º) a exclusão de sócio, por consequência, passaria a ser medida positivamente insindicável na via jurisdicional, visto que, diante da alegação feita pela maioria de que não há mais affectio societatis em relação a certo sócio, não teria o juiz quaisquer condições de averiguar a correção do ato, havendo, só por aí, ofensa ao princípio inscrito no art. 5º, XXV, da Constituição Federal, também aplicável às penalidades sociais, que não podem ser subtraídas do controle jurisdicional. Os arts. 1.030 e 1.085 do Código Civil exigem a presença de justa causa, caracterizada por falta grave no cumprimento das obrigações de sócio; atos de inegável gravidade que coloquem em risco a continuidade da empresa - atos esses que, não importa o exercício retórico utilizado, não englobam a hipótese de obscura quebra de affectio societatis. Na realidade, a quebra de affectio societatis jamais pode ser considerada causa de exclusão. Pelo contrário, a quebra de affectio societatis é, quando muito, consequência de determinado evento, e tal evento, sim, desde que configure quebra grave dos deveres sociais imputável ao excluendo poderá, como última ratio, fundamentar o pedido de exclusão de sócio. Em todo caso, será indispensável demonstrar o motivo desta quebra da affectio societatis, e não apenas alegar a consequência, sem demonstrar a sua origem e o inadimplemento de dever de sócio que aí possa estar.

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A evoluída jurisprudência264, seguindo a posição doutrinária sobre o

tema, entende que o desaparecimento da affectio societatis não implica, por si só, a

possibilidade de exclusão de sócio do quadro social, mas a demonstração de justa

causa, ou seja, dos motivos que ocasionaram essa quebra265. Ocorre que, em

estudo estatístico sobre o tema, foi verificado por Marcelo Guedes Nunes que o

affectio societatis é o fundamento mais utilizado pelos Tribunais para justificar a

dissolução parcial de sociedade, inclusive na exclusão266.

A quebra da affectio societatis, insistimos, não é causa de exclusão de sócio; o que pode eventualmente justificar a exclusão de sócios é a violação dos deveres de lealdade e de colaboração, deveres esses que, a depender do tipo societário e da sua exata conformação pelo metro do fim social, podem ser mais ou menos alargados. É preciso, pois, evitar o desvio de perspectiva (desvio esse que, muitas vezes, resulta do equívoco de dar ênfase à consequência e não à sua origem). A colocação do tema, dentro de sua correta perspectiva, constitui o primeiro passo necessário à construção de soluções jurídicas harmônicas e coerentes, desprovidas de um obscuro subjetivismo. O que tem gerado grande iniquidade em matéria de exclusão de sócios é justamente o desvio de perspectiva e a insistência, hodiernamente inexplicável, de querer fundamentar as soluções no requisito da affectio societatis, quando correto e técnico seria burilá-las à luz do conceito de fim comum - a partir do qual se estruturam os deveres de sócio, em cada caso. Assim tem sucedido em tantos outros países, que simplesmente desprezam a noção de affectio e onde, nem por isso, a exclusão de sócios deixou de existir ou de se estruturar, de forma muito mais equilibrada e racional do que aquela com que se apresenta entre nós. (FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes; ADAMEK, Marcelo Vieira von. Affectio societatis: um conceito jurídico superado no moderno direito societário pelo conceito de fim social. Revista de Direito Mercantil, Econômico e Financeiro, São Paulo, n. 149-150, jan. 2008, p. 121-126). 264 Sociedade limitada. Exclusão de sócios administradores. Fatos demonstrados que o justificam. Existência de mais que simples quebra da affectio societatis. Sentença mantida. Recurso desprovido. (ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação nº. 0063118-24.2012.8.26.0100, Relator: Claudio Godoy, Data de Julgamento: 24/06/2015, 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial. Dje 24/06/2015). Agravo regimental. Sociedade limitada. Exclusão de sócios que teriam constituído e exercido atividades em prol de sociedade empresária concorrente. Verossimilhança das alegações recursais. Aparente incontrovérsia quanto ao empreendimento concorrente e à quebra da affectio societatis. Risco à preservação da empresa na manutenção da administração social conjunta dos dois grupos de sócios, prestigiando-se, por ora, a situação dos sócios autores. Antecipação de tutela recursal concedida nos termos do art. 527, III, do CPC. Questão da legitimidade ativa a ser deliberada ainda na origem, de todo modo integrada a lide por todos os sócios e cogitando-se de litisconsórcio necessário. Juízo de admissibilidade do agravo que ainda não é definitivo, mas não se cogitando da falta senão de peças essências, por isso que pode ser suprida. Entendimento do STJ. Decisão monocrática mantida. Agravos regimentais desprovidos. (ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Agravo de Instrumento nº. 2048991-51.2015.8.26.0000, Relator: Claudio Godoy, Data de Julgamento: 29/04/2015, 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, Data de Publicação DJe: 01/05/2015.) Sociedade limitada Exclusão de sócio Prática de atos graves Incidentes no interior de estabelecimento - Constituição de sociedade concorrente Alteração de contrato social e apreensão de bens Exame do conjunto de provas Procedência Sentença mantida - Recurso desprovido. (ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação nº. 0113897-36.2005.8.26.0000, Relator: Fortes Barbosa, 8ª Câmara de Direito Privado, Data de Julgamento DJe: 05/10/2011). 265 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1129222/PR, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 28/06/2011, DJe 01/08/2011. 266 A segunda conclusão consiste na onipresença da perda de affectio societatis como fundamento de dissolução na esmagadora maioria dos casos. Essa constatação confronta com o posicionamento doutrinário que defende a superação do conceito de affectio societatis. Segundo essa posição, a ideia de affectio societatis seria desconhecida na doutrina internacional e, no Brasil, além de equívoca e superada, serviria para confundir a operação dos institutos da retirada e da expulsão. As críticas doutrinárias são, resumidamente, que o conceito de affectio societatis: (i) é equívoco, (ii) não é uma modalidade especial de consentimento, distinta da exigida para os demais contratos, (iii) não constitui elemento constitutivo do contrato de sociedade, (iv) não é elemento cujo desaparecimento possa determinar a extinção do contrato de sociedade e (v) não é elemento que determina a extensão dos deveres do sócio. (NUNES, Marcelo Guedes. Jurimetria aplicada ao direito societário: um estudo estatístico da dissolução de sociedade no Brasil. Tese (Doutorado) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2012, p. 333-334.)

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A análise dos casos mostra que, ao invocarem a perda de affectio societatis, juízes e advogados estão transmitindo uns aos outros um claro sinal de que o conflito em discussão atingiu um nível de desinteligência elevado o suficiente para desgovernar a sociedade e colocar em risco a continuidade de suas atividades. O fato de a affectio societatis servir de fundamento isolado para resolução de 73,4% do total de casos de dissolução (tabela 7 e gráfico 4, capítulo 7), incluindo 70,2% das exclusões (vide tabela 9, capítulo 7), demonstra que a preocupação dos juízes em superar a situação de crise política é um valor mais importante que o da aplicação estrita dos dispositivos legais que tratam da dissolução267. (grifo nosso).

A perda do affectio societatis tão utilizado na jurisprudência para

justificar a exclusão de sócio, em verdade, não dispensa a verificação causídica de

seu motivo, razão pela qual é a causa e não a consequência que revela a justa

causa268.

Armando Luiz Rovai269, buscando esclarecer o que seria a justa

causa posta na lei, faz interessante paralelo com o pensamento de Norberto Bobbio

sobre harmonia social. Conclui ele que a justa causa do Direito Societário estaria

caracterizada pela falta de tolerância entre os sócios e o surgimento do estado de

prepotência, consequentemente quando o estado de tolerância deixa de estar

presente, surge, entre os sócios, o estado de prepotência, acarretando, por si só, o

desajuste que gera o conflito.

A sociedade limitada, portanto, não é mais formada apenas por pessoas físicas que, por afeição mútua, resolvem associar-se para atingir seus objetivos comerciais. Hoje, de acordo com os princípios que norteiam o Direito de Empresa, o capital prepondera e as associações, mesmo entre

267 NUNES, Marcelo Guedes. Jurimetria aplicada ao direito societário: um estudo estatístico da dissolução de sociedade no Brasil. Tese (Doutorado) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2012, p. 336. 268 A Affectio societatis é formada por dois elementos: fidelidade e confiança. A fidelidade está ligada ao respeito à palavra dada, à vontade expressada por ocasião da constituição da sociedade ainda que o quadro de membros desta se tenha modificado. Já a confiança diz respeito à ligação entre os sócios, os quais devem colaborar para a realização de um interesse comum. Caso qualquer dos sócios falte com o seu dever de colaboração, de forma a impedir ou obstaculizar a sociedade de desenvolver a sua atividade, estará caracterizado o inadimplemento do contrato plurilateral, com a consequente quebra do affectio societatis. Havendo essa quebra do contrato, deverá ele ser resolvido, como ocorre em regra com os demais contratos, com sua extinção. No caso do contrato plurilateral, deverá ele ser resolvido com o sócio inadimplente. Assim, a justa causa é entendida como o inadimplemento do dever de colaboração do sócio que possa resultar em efetivo prejuízo da atividade social. Trata-se do rompimento do affectio societatis , ou, se não configurar diretamente, leva â mesma orientação[...] (PROENÇA, José Marcelo Martins. A exclusão de sócio nas sociedades limitadas. In: FINKELSTEIN. Maria Eugênia Reis; PROENÇA, José Marcelo Martins (Coord.). Direito Societário: tipos societários. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 188). 269 ROVAI, Armando Luiz. Impacto do código civil de 2002 no registro de empresa na era da globalização. Tese (Doutorado) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2006, p. 85-90.

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pessoas naturais, são frequentes, por conta das trocas que ocorrerão em decorrência da expertise e do know-how de cada um – trata-se da preponderância das relações econômicas, pautadas pelo fator capital, em detrimento das ligações afetivas entre pessoas que pactuam interesses em comum. Para se entender a intolerância em âmbito societário, há de se perquirir a natureza dos conflitos, muitas vezes ligada às estratégias empresariais e aos sistemas administrativos pretendidos, diferentemente, pelos sócios. A compreensão de que a ausência da affectio societatis não é mais suficiente para operacionalizar-se uma exclusão administrativa de sócios já é cediça entre os operadores do Direito. Agora, a questão está muito mais relacionada aos interesses díspares e muitas vezes conflitantes (sempre do ponto de vista empresarial) e à forma de lidar com eles, considerando sempre as relações pessoais e o escopo fundamental da empresa – a sua continuidade, a fim de proporcionar os agregados sociais que surgem consequentemente. Estão configuradas, portanto, as razões que podem levar à definição da JUSTA CAUSA societária, de modo a equacionar princípios atinentes à tecnologia da administração, da economia e, principalmente, da filosofia jurídica moderna aplicada ao Direito Societário, substancialmente modificado pelo CC de 2002270.

Caracterizada a exclusão judicial de sócio por falta grave, a data da

dissolução parcial será a do trânsito em julgado da decisão que a reconhecer (art.

605, IV, CPC271).

2.7.3.2. Exclusão judicial de sócio por incapacidade superveniente

O dispositivo do artigo 1.030 do Código Civil ainda prevê como justo

motivo para exclusão judicial de sócio a incapacidade superveniente. Cabe ao

Magistrado analisar, no caso concreto, a relevância do sócio para a consecução

finalidade social e, não, simplesmente o excluir automaticamente.

Apropriado também que se atente a distinguir, nas relações intra-societárias, a existência de dois tipos diferentes de sócios: os que são pessoalmente importantes para o empreendimento e que deverão trabalhar efetivamente para ser atingido o fim social, e os que se limitam a colaborar para a formação do capital social, sem qualquer envolvimento pessoal com a atividade economicamente explorada, chamados investidores.272

270 ROVAI, Armando Luiz. A caracterização da justa causa na exclusão de sócio na sociedade empresária do tipo limitada (Aplicação Do Art. 1.085 Do Código Civil), 2006. Disponível em: <http://www.egov.ufsc.br/portal/conteudo/caracteriza%C3%A7%C3%A3o-da-justa-causa-na-exclus%C3%A3o-de-s%C3%B3cio-na-sociedade-empres%C3%A1ria-do-tipo-limitada>. Acesso em: 18 jun. 2017. 271 Art. 605. A data da resolução da sociedade será: IV - na retirada por justa causa de sociedade por prazo determinado e na exclusão judicial de sócio, a do trânsito em julgado da decisão que dissolver a sociedade; e 272 CALÇAS, Manoel de Queiroz Pereira. Sociedade limitada no novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2003, p. 27.

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No caso, o julgador deve verificar se a inaptidão do sócio incapaz

afetará ou não o desenvolvimento das atividades sociais para poder decidir sobre

expulsão273.

Vários caminhos abrem-se aos consócios: a) o sócio que se torna incapaz é mero prestador de capital, e sua interdição em nada altera a vida social; b) sua moléstia mental põe em risco a continuidade da empresa, o que determina a sua exclusão pelos consócios; c) o sócio acometido de incapacidade é indispensável à continuidade da empresa, o que determina a dissolução e liquidação da sociedade274.

Como ocorre no caso de exclusão judicial de sócio por falta grave, a

por incapacidade superveniente também tem como data da dissolução parcial a do

trânsito em julgado da decisão que a reconhecer (art. 605, IV, CPC).

2.7.3.3. Exclusão de sócio por declaração de falência ou liquidação de

quotas275

Há ainda possibilidade de exclusão, de pleno direito, de sócio

declarado falido ou aquele cuja quota tenha sido liquidada em processo de

execução.

273 No mais, se o desaparecimento da affectio societatis fosse fonte do direito de auto- ou hetero-desvinculação de sócio, ter-se-ia que forçosamente admitir que: (i) a exclusão não dependeria de falta grave (CC, arts. 1.030 e 1.085) e poderia se dar pela simples vontade da maioria; e, inversamente, (ii) o direito de retirada não poderia ter quaisquer condicionantes (CC, arts. 1.029 e 1.077; e LSA, art. 137). Além disso, quer-nos parecer que, se a affectio societatis fosse elemento constitutivo da sociedade, seria uma contradictio in adjecto conceber a constituição de sociedade com sócio absolutamente incapaz (como assim tem sido admitido em sociedades anônimas ou nas limitadas, com capital totalmente integralizado e sem participação do incapaz na administração) ou, pela mesma razão, a manutenção, no quadro social, de sócio que se tornou incapaz. A bem da verdade, a própria participação de sócio pessoa jurídica seria construção artificiosa, por depender ou da admissão de um autêntico pass-through volitivo ou da aceitação de ânimo pela pessoa jurídica. (FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes; ADAMEK, Marcelo Vieira von. Affectio societatis: um conceito jurídico superado no moderno direito societário pelo conceito de fim social. Revista de Direito Mercantil, Econômico e Financeiro, São Paulo, n. 149-150, jan. 2008, p. 116). 274 LUCENA, Jose Waldecy, Das Sociedades Limitadas. 6. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 254. 275 Pela Instrução Normativa nº. 38 da DREI – Manual de Registro - Sociedade Limitada: 2.2.6.3 Sócio falido O sócio declarado falido será excluído de pleno direito da sociedade (parágrafo único do art. 1.030 do Código Civil). O capital social será reduzido se os demais sócios não suprirem o valor da quota respectiva (§ 1º do art. 1.031 do Código Civil). Serão arquivados, em processos distintos e simultaneamente, a certidão/cópia da ata da reunião ou assembleia e a alteração contratual mencionada. Embora a retirada do sócio falido da sociedade opere-se automaticamente (art. 1.030 do Código Civil), a alteração nos cadastros da empresa somente será realizada mediante o arquivamento de alteração contratual. 2.2.6.4 Sócio que tenha sua quota liquidada O sócio cuja quota tenha sido liquidada por iniciativa de credor será excluído da sociedade, procedendo-se à redução do capital se os sócios não suprirem o valor da quota (parágrafo 1º do art. 1.031 do Código Civil). Serão arquivados, em processos distintos e simultaneamente, a certidão/cópia da ata da reunião ou assembleia e a alteração contratual mencionada. Disponível em: <http://drei.smpe.gov.br/legislacao/instrucoes-normativas/titulo-menu/pasta-instrucoes-normativas-em-vigor-03/anexo-ii-in-38-2017-manual-de-registro-ltda-alterado-pela-in-40-2017.pdf.> Acesso em: 12 jun. 2017.

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Em ambas as hipóteses, a exclusão se dá pela via judicial, não por

falta grave dos deveres sociais, mas por conta de uma situação de inadimplemento

por dívida pessoal do sócio que acarretou em processo de execução individual ou

coletiva (falência).

No caso da execução particular, pode o credor particular de sócio,

na insuficiência de outros bens do devedor, fazer recair a execução sobre o que a

este couber nos lucros da sociedade, ou na parte que lhe tocar em liquidação (art.

1.026, CC). Ainda, pode requer, se a sociedade não estiver dissolvida, a liquidação

da quota do devedor276, cujo valor, apurado na forma do artigo 1.031, será

depositado em dinheiro, no juízo da execução, até noventa dias após aquela

liquidação (art. 1.026, p. único, CC), conforme o procedimento previsto no artigo 861

do Código de Processo Civil277.

A falência do sócio acarreta sua exclusão de pleno direito da

sociedade, sendo necessária a apuração de haveres na data da decretação de

quebra com o pagamento do reembolso à massa falida, nos termos da Lei nº.

11.101/2005.

276 Art. 835. A penhora observará, preferencialmente, a seguinte ordem: IX - ações e quotas de sociedades simples e empresárias; 277 Art. 861. Penhoradas as quotas ou as ações de sócio em sociedade simples ou empresária, o juiz assinará prazo razoável, não superior a 3 (três) meses, para que a sociedade: I - apresente balanço especial, na forma da lei; II - ofereça as quotas ou as ações aos demais sócios, observado o direito de preferência legal ou contratual; III - não havendo interesse dos sócios na aquisição das ações, proceda à liquidação das quotas ou das ações, depositando em juízo o valor apurado, em dinheiro. § 1o Para evitar a liquidação das quotas ou das ações, a sociedade poderá adquiri-las sem redução do capital social e com utilização de reservas, para manutenção em tesouraria. § 2o O disposto no caput e no § 1o não se aplica à sociedade anônima de capital aberto, cujas ações serão adjudicadas ao exequente ou alienadas em bolsa de valores, conforme o caso. § 3o Para os fins da liquidação de que trata o inciso III do caput, o juiz poderá, a requerimento do exequente ou da sociedade, nomear administrador, que deverá submeter à aprovação judicial a forma de liquidação. § 4o O prazo previsto no caput poderá ser ampliado pelo juiz, se o pagamento das quotas ou das ações liquidadas: I - superar o valor do saldo de lucros ou reservas, exceto a legal, e sem diminuição do capital social, ou por doação; ou II - colocar em risco a estabilidade financeira da sociedade simples ou empresária. § 5o Caso não haja interesse dos demais sócios no exercício de direito de preferência, não ocorra a aquisição das quotas ou das ações pela sociedade e a liquidação do inciso III do caput seja excessivamente onerosa para a sociedade, o juiz poderá determinar o leilão judicial das quotas ou das ações.

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2.7.3.4. Exclusão de sócio remisso

Dentre as obrigações dos sócios está sua contribuição para

formação do capital social. Trata-se de requisito específico do contrato de

sociedade, (art. 982, CC) explicitado também no caput do já citado artigo 1.004 do

Código Civil278. Ao contratar a sociedade, os sócios decidem qual forma (bens,

créditos, dinheiro ou serviços) e momento (à vista ou a prazo) que cada um

integralizará sua participação para formação do capital social, obrigando-se a

cumprir aquilo que ficar estabelecido quando da subscrição das quotas sociais.

Podemos afirmar que o principal efeito do contrato de sociedade é a constituição de um sujeito de direitos doado de personalidade jurídica: a sociedade. Os contratantes, ao celebrarem o contrato de sociedade, com suas manifestações de vontade, têm o poder de criar uma pessoa jurídica que, ao mesmo tempo que é criada pelos sócios, passa a ser a eles vinculada juridicamente e, em decorrência disso, titular de direitos e obrigações. Os sócios, tão logo celebram o contrato de sociedade, passam a ser devedores da principal obrigação de um sócio, isto é, a de integralizar suas quotas sociais, na forma contratada. A credora da integralização das quotas é a sociedade e, no caso de mora dos contratantes, a sociedade terá a pretensão de cobrança do valor das respectivas quotas, acrescido os juros e eventual multa contratual, podendo, alternativamente, excluir o remisso do quadro societário, conforme estabelecem os artigos 1.004 e 1.058 do novo Código Civil. A pessoa jurídica resultante do contrato social também tem obrigações em relação aos sócios, o que pode ser constatado, por exemplo, no caos de direito de recesso do quotista, hipótese em que a devedora do pagamento em dinheiro do valor da quota do dissidente é a sociedade (art. 1.077 e 1.031 do Código Civil de 2002) 279.

O sócio inadimplente perante a sociedade no dever de integralizar

sua parte no capital social é chamado de remisso, e deverá purgar a mora, nos 30

(trinta) dias seguintes ao da notificação pela sociedade, respondendo diante desta

pelo dano emergente da mora.

Caso o sócio remisso não purgue a mora no prazo estabelecido no

caput do artigo 1.004, os demais sócios deverão se reunir e deliberar, por maioria,

278 Art. 1.004. Os sócios são obrigados, na forma e prazo previstos, às contribuições estabelecidas no contrato social, e aquele que deixar de fazê-lo, nos trinta dias seguintes ao da notificação pela sociedade, responderá perante esta pelo dano emergente da mora. Parágrafo único. Verificada a mora, poderá a maioria dos demais sócios preferir, à indenização, a exclusão do sócio remisso, ou reduzir-lhe a quota ao montante já realizado, aplicando-se, em ambos os casos, o disposto no § 1o do art. 1.031. 279 CALÇAS, Manoel de Queiroz Pereira. Sociedade limitada no novo Código Civil. São Paulo: Atlas, 2003, p.43.

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se irão cobrar judicialmente o remisso, se irão excluí-lo ou se irão reduzir a

participação societária do sócio remisso ao montante já realizado.

Tomada a decisão, poderá a sociedade utilizar-se de ação de

execução de título extrajudicial para cobrar o sócio remisso. Nesse caso, não

haverá a redução do capital social e o sócio remisso continuará vinculado à

sociedade.

No caso dos demais sócios decidirem pela exclusão do sócio

remisso ou pela redução de sua quota ao montante já integralizado, deverão

elaborar uma alteração contratual que reflita a decisão tomada em assembleia ou

reunião, sendo arquivado no órgão competente em processos distintos e

simultaneamente, a ata da reunião ou assembleia e a alteração contratual

mencionada280.

Em ambos os casos, o capital social sofrerá a correspondente

redução, salvo se os demais sócios suprirem o valor da quota (parágrafo único do

art. 1.004 c.c. parágrafo único do art. 1.031 do CC). Poderão também os sócios,

excluindo o titular, tomar a quota para si ou transferi-la a terceiros (art. 1.058 do

CC).

Na hipótese de exclusão extrajudicial, a data de resolução parcial

será a da assembleia ou da reunião de sócios que a tiver deliberado (art. 605, V,

CPC).

280 Pela Instrução Normativa nº. 38 da DREI – Manual de Registro - Sociedade Limitada: 2.2.6.2 Sócio remisso Verificada a mora pela não realização, na forma e no prazo, da integralização da quota pelo sócio remisso, os demais sócios poderão preferir, à indenização, a exclusão do sócio remisso, ou reduzir-lhe a quota ao montante já realizado. Em ambos os casos, o capital social sofrerá a correspondente redução, salvo se os demais sócios suprirem o valor da quota (parágrafo único do art. 1.004, c/c parágrafo único do art. 1.031 do Código Civil). Poderão também os sócios, excluindo o titular, tomar a quota para si ou transferi-la a terceiros (art. 1.058 do Código Civil). Serão arquivados, concomitantemente e em processos separados, a certidão/cópia da ata da reunião ou assembleia e a alteração contratual mencionada. Disponível em: <http://drei.smpe.gov.br/legislacao/instrucoes-normativas/titulo-menu/pasta-instrucoes-normativas-em-vigor-03/anexo-ii-in-38-2017-manual-de-registro-ltda-alterado-pela-in-40-2017.pdf.> Acesso em 12/06/2017.

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2.7.3.5. Exclusão extrajudicial de sócio por falta grave de sócio minoritário

Em que pese a exclusão de sócio ser matéria excepcional, a lei

permite que, na sociedade que adota o tipo limitada, os sócios incluam no contrato

social permissivo a exclusão extrajudicial de minoritários em caso de falta grave,

conforme o artigo 1.085 do Código Civil281. Nessa hipótese, a solução somente

poderá ser verificada, se expressamente contratada cláusula nesse sentido. Se, em

caso de omissão do contrato social, a exclusão somente poderá ocorrer

judicialmente na forma do já analisado artigo 1.030282.

Trata-se de uma alternativa viável para os problemas relacionados a

conflitos societários na sociedade do tipo limitada com a finalidade de eliminar a

briga que desequilibra e emperra o andamento da sociedade283. Logicamente, esse

expediente somente poderá ser usado quando o sócio minoritário, em razão da

prática de atos graves, estiver colocando em risco o próprio desenvolvimento da

sociedade284.

A expressão “ato de inegável gravidade que esteja colocando em

risco a continuidade da empresa”, posta no artigo 1.085 do Código Civil,

281 Art. 1.085. Ressalvado o disposto no art. 1.030, quando a maioria dos sócios, representativa de mais da metade do capital social, entender que um ou mais sócios estão pondo em risco a continuidade da empresa, em virtude de atos de inegável gravidade, poderá excluí-los da sociedade, mediante alteração do contrato social, desde que prevista neste a exclusão por justa causa. Parágrafo único. A exclusão somente poderá ser determinada em reunião ou assembleia especialmente convocada para esse fim, ciente o acusado em tempo hábil para permitir seu comparecimento e o exercício do direito de defesa. 282 Pela Instrução Normativa nº. 38 da DREI – Manual de Registro - Sociedade Limitada: 2.2.6 EXCLUSÃO DE SÓCIO 2.2.6.1 Justa causa Ressalvado o disposto no art. 1.030 do Código Civil, quando a maioria dos sócios, representativa de mais da metade do capital social, entender que um ou mais sócios estão pondo em risco a continuidade da empresa, em virtude de atos de inegável gravidade, poderá excluí-los da sociedade, mediante alteração do contrato social, desde que neste haja previsão de exclusão por justa causa. A exclusão somente poderá ser determinada em reunião ou assembleia especialmente convocada para esse fim, ciente o acusado em tempo hábil para permitir seu comparecimento e o exercício do direito de defesa. A convocação deverá atender ao disposto no item 2.2.1 deste Capítulo, bem como ao que dispuser o contrato. Arquivados, em processos distintos e simultaneamente, a certidão/cópia da ata da reunião ou assembleia e a alteração contratual mencionada, proceder-se-á à redução do capital, se os demais sócios não suprirem o valor da quota (art. 1.086 e § 1º do art. 1.031 do Código Civil). Disponível em <http://drei.smpe.gov.br/legislacao/instrucoes-normativas/titulo-menu/pasta-instrucoes-normativas-em-vigor-03 /anexo-ii-in-38-2017-manual-de-registro-ltda-alterado-pela-in-40-2017.pdf.> Acesso em 12/06/2017. 283 ROVAI, Armando Luiz. Pontos polêmicos da exclusão extrajudicial e morte de sócio, hipóteses de resolução de sociedade em relação a um sócio. Revista Jurídica Luso Brasileira, ano 1, n. 5, p. 199-200, 2015. 284 DE ALMEIDA, Marcus Elidius Michelli de; ROVAI, Armando Luiz. Problemas societários e exclusão extrajudicial. Valor econômico. Legislação & Tributos/SP - E2. São Paulo, 09 jan.2015.

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corresponde à “justa causa” do artigo 1.030 do mesmo diploma, como sendo aquele

inadimplemento grave que gera a quebra do contrato plurilateral285.

Contratada a cláusula permitindo a exclusão de sócio minoritário de

forma extrajudicial, a decisão deverá ocorrer em assembleia ou reunião

especialmente convocada para esse fim. Por conta da seriedade da deliberação

social, o edital de convocação para exclusão deve constar expressamente, em

pauta única, o que será deliberado286.

Devem os sócios, portanto, convocar assembleia ou reunião - conforme o regime de deliberação colegiada por eles adotado – específica, na qual só se discutirá e votará uma única matéria: a eventual exclusão do sócio faltoso. Nada mais poderá ser discutido ou votado nessa assembleia ou reunião287.

O quórum deliberativo para a exclusão extrajudicial é de maioria do

capital social (art. 1.085, CC). Ocorre que, para a primeira convocação, a reunião ou

assembleia, somente se instalará com a presença de três quartos do capital social

(1.074, CC288), sendo necessária segunda convocação para instalação com

qualquer número, caso não instalada em primeira convocação. Essa

incompatibilidade entre o quórum de instalação (art. 1074, CC) com o deliberativo

para exclusão extrajudicial de sócios (art. 1.085, CC) se apresenta como oneração

desnecessária à sociedade289.

Da referida convocação, nos termos legais, o sócio que se busca

excluir deve ter ciência em tempo hábil para permitir seu comparecimento e o

exercício do direito de defesa. Como a lei é omissa com relação ao prazo mínimo

para convocação do ato deliberativo, a jurisprudência e a doutrina entendem ser

285 Nesse sentido ver: PROENÇA, José Marcelo Martins. A exclusão de sócio nas sociedades limitadas. In FINKELSTEIN. Maria Eugênia Reis; PROENÇA, José Marcelo Martins (Coord.). Direito Societário: tipos societários. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 191. 286 Aqui deve ser comentado o fato de que a lei não previu a necessidade de que o sócio deva ser informado acerca do motivo que ensejou a sua possível exclusão. Em outras palavras, qual foi o ato de inegável gravidade por si praticado, Parece-nos, claro, entretanto, que ele deva ser informado, uma vez que a finalidade deste dispositivo é possibilitar o direito de defesa deste sócio. (FINKELSTEIN, Maria Eugênia. Manual de direito empresarial. 8. ed. rev. , ampliada e reformulada. São Paulo: Atlas, 2016, p. 135). 287 RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Curso de direito empresarial: o novo regime jurídico-empresarial brasileiro 2. ed. Salvador: Juspodivm, 2008, p. 377. 288 Art. 1.074. A assembléia dos sócios instala-se com a presença, em primeira convocação, de titulares de no mínimo três quartos do capital social, e, em segunda, com qualquer número. 289 ROVAI, Armando Luiz. Pontos polêmicos da exclusão extrajudicial e morte de sócio, hipóteses de resolução de sociedade em relação a um sócio. Revista Jurídica Luso Brasileira, ano 1, n. 5, 2015, p. 200-201.

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razoável, se omisso o contrato social, aquele previsto na lei para o anúncio de

convocação (art. 1.152, §3º, CC290), ou seja, 8 (oito) dias de antecedência ao ato

deliberativo.

O parágrafo único do artigo 1.085 determina que as assembleias ou reuniões destinadas a apreciar a exclusão de um sócio devem ser especialmente convocadas para esse fim. Isso significa, em primeiro lugar, que não se aplica ao conclave de exclusão a possibilidade de dispensa de convocação, prevista pelo parágrafo 2º, do artigo 1.072. Se o contrato social não prever a deliberação por meio de reunião, não determinar regras de convocação simplificadas para esta última ou estabelecer restrição ao uso de tal regime de deliberação em relação à exclusão de sócio, a convocação deverá ser realizada pela publicação de editais, nos termos do parágrafo 3º, do artigo 1.152. Ao se referir a conclave especialmente convocado para o fim da exclusão, o parágrafo único do artigo 1.085 também determina que a ordem do dia da respectiva assembleia ou reunião não pode conter matérias estranhas à própria questão da expulsão do sócio. Devido à relevância de tal questão, o legislador optou por não permitir que outros argumentos e problemas disputassem a atenção dos sócios. A ordem do dia do conclave de exclusão deve tratar exclusivamente da expulsão do excluendo e de questões a ela diretamente relacionadas, tais como a destituição do cargo de administração do sócio, em caso de efetiva exclusão. A especialidade da ordem do dia no conclave de exclusão é um importante instrumento contra o uso da ameaça de exclusão como chantagem. Tal disposição tem o mérito de impedir que sócios incluam outras matérias de seu próprio interesse na ordem do dia ao lado da proposta de exclusão e, abertamente ou de forma implícita, condicionem a reprovação desta à aceitação daquelas por parte do excluindo291.

Convocada a reunião ou assembleia, após a apresentação de

defesa do sócio que foi acusado de pôr em risco a continuidade da empresa, em

virtude de atos de inegável gravidade, caberá à maioria dos sócios, representativa

de mais da metade do capital social, deliberar sobre a exclusão por ato de inegável

gravidade292.

290 Art. 1.152, § 3o O anúncio de convocação da assembleia de sócios será publicado por três vezes, ao menos, devendo mediar, entre a data da primeira inserção e a da realização da assembleia, o prazo mínimo de oito dias, para a primeira convocação, e de cinco dias, para as posteriores. 291 VIO, Daniel de Avila. A exclusão de sócios na sociedade limitada de acordo com o código civil de 2002. 230 fls., Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Direito da USP, 2008, p. 173. 291 ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação nº. 0163920-64.2011.8.26.0100, Relator: Tasso Duarte de Melo, Data de Julgamento: 19/05/2014, 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, Data de Publicação DJe 20/05/2014. 292 DECLARATÓRIA C.C. OBRIGAÇÃO DE FAZER E REPARAÇÃO DE DANOS. EXCLUSÃO DE SÓCIO MINORITÁRIO. Prática de falta grave pelo sócio minoritário e administrador, ora Apelante, que colocou em risco a continuidade da empresa. Requisitos do art. 1.085 do Código Civil atendidos: (i) previsão contratual de justa causa; (ii) prática de falta grave; e (iii) deliberação da maioria absoluta. Prévia convocação para assembleia especial, respeitado o devido processo legal. Sócia majoritária, ora Apelada, que comprovou a prática de atos graves pelo Apelante, em especial o fato deste impedir o seu ingresso no estabelecimento empresarial e o descumprimento de liminar de exibição de livros contábeis, o que acarretou a busca e apreensão dos mesmos. Sentença mantida na íntegra. Recurso não provido (ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação nº. 0163920-64.2011.8.26.0100, Relator: Tasso Duarte de Melo, Data de Julgamento: 19/05/2014, 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, Data de Publicação DJe 20/05/2014).

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A exclusão extrajudicial, destarte, apesar do excessivo rigor formal exigido, representa um instituto jurídico capaz de assegurar rapidez e agilidade para pôr fim às disputas instaladas pelo minoritário, oferecendo, principalmente, condições de preservar o fim social da empresa293.

Se a decisão for pela exclusão, será elaborada, como anexo da ata,

uma respectiva alteração do contrato social que reflita a deliberação tomada pelos

sócios para posterior registro no órgão competente, sendo considerada como data

da dissolução parcial por exclusão a da deliberação social (art. 605, IV, CPC294).

2.7.4. Morte do sócio

No caso de falecimento do sócio, há possibilidade de os herdeiros

ingressarem na sociedade e, assim, ser evitada a dissolução parcial. Trata-se de

hipótese que deve estar prevista no contrato social, pois, caso contrário, liquidar-se-

á a quota do sócio morto (art. 1.028, CC295).

Cumpre ressaltar que, mesmo com previsão contratual, os herdeiros

do sócio falecido não estão obrigados a ingressar na sociedade em cumprimento ao

princípio constitucional da livre associação (art. 5º, XX, CF). Diferentemente dos

sócios sobreviventes que, por conta da previsão contratual expressa, não podem se

opor ao ingresso dos herdeiros.

A dissolução parcial é a solução jurídica que busca compatibilizar os interesses conflitantes dos sucessores de sócio morto que não desejam ingressar na sociedade ou de sócio sobrevivente, em sociedade “de pessoa”, que veta o ingresso deles. Mas inexistindo o conflito de interesses, a sociedade deve permanecer, com a cota do de cujus transferida a quem o suceder. O falecimento de sócio é causa de dissolução judicial, se não houver concordância entre as partes quanto à ocorrência de causa dissolutória (por exemplo, os sócios supérstites recusarem‑se a proceder à apuração dos haveres), ou extrajudicial, quando houver essa concordância entre as partes296.

293 ROVAI, Armando Luiz. Pontos polêmicos da exclusão extrajudicial e morte de sócio, hipóteses de resolução de sociedade em relação a um sócio. Revista Jurídica Luso Brasileira, ano 1, n. 5, 2015, p. 200-201. 294 Art. 605. A data da resolução da sociedade será: V - na exclusão extrajudicial, a data da assembleia ou da reunião de sócios que a tiver deliberado. 295 Art. 1.028. No caso de morte de sócio, liquidar-se-á sua quota, salvo: I - se o contrato dispuser diferentemente; II - se os sócios remanescentes optarem pela dissolução da sociedade; III - se, por acordo com os herdeiros, regular-se a substituição do sócio falecido. 296 COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial. Direito de Empresa, 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 206.

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Contudo, caso não ocorra o ingresso dos herdeiros, seja por

ausência de previsão contratual nesse sentido ou por falta de vontade dos

herdeiros, as quotas do sócio falecido serão liquidadas com o pagamento dos

haveres aos herdeiros, cuja data de apuração será a do óbito (art. 605, I, CC297).

2.7.5. Outras causas de dissolução parcial

As hipóteses legais postas acima não esgotam todas possibilidades

de dissolução parcial e, portanto, passaremos a tratar de outras causas possíveis do

rompimento do vínculo de um sócio em relação a sociedade.

2.7.5.1. Vontade dos sócios

As causas relacionadas na legislação não exaurem as

possibilidades de dissolução parcial, haja vista a existência de outras que podem

ocorrer e que tenham como consequência a desvinculação de um sócio e a

continuidade da sociedade com o(s) remanescente(s).

Uma possibilidade é a comunhão de vontades dos sócios na saída

de um ou alguns com a liquidação das quotas e a mantença da pessoa jurídica

pelos demais. “Os sócios, de modo amigável, por mútuo consenso, podem

estabelecer a saída de um ou mais deles da sociedade, podendo ainda acertar o

valor de reembolso a ser pago”298.

2.7.5.2. Renúncia da qualidade de sócio

A renúncia da qualidade de sócio não se confunde com o direito de

retirada ou recesso, mas, como essas, é causa de dissolução parcial de sociedade.

297 Art. 605. A data da resolução da sociedade será: I - no caso de falecimento do sócio, a do óbito; 298 RESTIFFE, Paulo Sérgio, Buyout and Relase Agreement, - Antecipação de Eventos de Dissolução Societária e Seus Efeitos. In: BRUSCHI, Gilberto Gomes (Coord.). Direito Processual Empresarial: estudos em homenagem ao professor Manoel de Queiroz Pereira Calças. 1.ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012, p. 667.

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Além do direito de se retirar da sociedade na forma e pelo modo previsto na ei ou no contrato social, o sócio tem o direito de renunciar à sua qualidade de sócio e, com isso, desligar-se da sociedade. Na renúncia o sócio manifesta igualmente sua vontade de sair da sociedade, mas, diferentemente da retirada, não passa a ter, com tal ato, qualquer direito a receber a título de haveres. ”Na renúncia, o sócio abdica o status socii e suas quotas passam a pertencer a sociedade, sem que ocorra qualquer desembolso por parte dela, e, portanto, sem a redução do capital social”299.

Como ocorre na retirada imotivada, aquele que abdicou de seu

direito de sócio deve notificar a sociedade e os demais sócios desse fato e

apresentar ao órgão competente a comprovação da intimação para averbação com

a finalidade de dar publicidade do ato a terceiros.

O renunciante não se exime, contudo, das obrigações pessoais que assumiu durante o período em que permanecei como sócio (integralização do capital social, por exemplo), bem como por aquelas que nesse período foram contraídas pela sociedade. Na primeira hipótese, sua responsabilidade é direta, com prazo prescricional vinculado à natureza da obrigação; na última, é subsidiária e ilimitada, como se sócio ainda fosse (arts. 1.023 e 1.024), e até dois anos depois de formalizado o ato, contados da respectiva averbação à margem da inscrição da sociedade no Registro Civil de Pessoas Jurídicas (art. 1.032)300.

Por conta das consequências decorrentes do ato unilateral do sócio

em renunciar sua qualidade, deve ser analisada a questão pela ótica do princípio da

boa-fé objetiva essencial, como vimos, ao contrato de sociedade.

Portanto o rompimento abrupto, produzido pelo sócio de forma unilateral quando não mais queria integrar a sociedade, manifestado por meio da renúncia, deveria ser analisado dentro de outras circunstâncias que não se encerravam na manifestação de vontade. Maria Helena Diniz, ao comentar a renúncia do sócio neste contrato (art. 1.399, V), enaltece a boa-fé enquanto dever do sócio em responder pelas obrigações sociais assumidas, mesmo após a sua renúncia. A autora, ainda, explica que a má-fé decorria da conduta do sócio que procurava subverter o afectio societatis, ao frustrar os ganhos do outro sócio. Serpa Lopes, sobre a renúncia no contrato de sociedade, segundo o Código Civil de 1916, fundamenta que o sócio não pode ser compelido a manter-se vinculado indefinidamente. Embora o direito de renúncia do sócio seja qualificado como um direito potestativo, ele não era e não é um direito absoluto, pois ostenta limites, quais sejam: a) deve ser manifestado de boa-fé; b) deve ser feito em tempo oportuno; c) deve haver uma notificação prévia que in caso é de dois meses.

299 GONÇALVES NETO, Alfredo de Assis. Direito de Empresa: comentários aos artigos 966 a 1.195 do Código Civil. 6. ed.. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, p. 298. 300 GONÇALVES NETO, Alfredo de Assis. Direito de Empresa: comentários aos artigos 966 a 1.195 do Código Civil. 6. ed.. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, p. 299. .

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Conclui o autor, acerca da renúncia, que não bastaria o requisito do prazo de dois meses. Ela deveria, acima de tudo, ser legítima e válida, isto é, ser uma renúncia de boa-fé. É que haveria de sopesar a conduta do renunciante de boa-fé204. Em outras palavras, não basta a vontade para o exercício do direito de recesso. Não decorre de um estado anímico, psicológico, ou subjetivo. A boa-fé assume a função de avaliar a conduta do sócio renunciante. Vale dizer, o sócio, ao pretender a renúncia, não teria adotado seriedade e comportamento de cooperação. Afinal, teria frustrado os ganhos e os investimentos do outro sócio. A boa-fé, nesse contrato, atua como limitadora de um direito subjetivo; afinal deve conciliar o direito de renúncia ao direito de a sociedade permanecer íntegra, ante o comportamento de cooperação que se origina da expectativa legítima que permeava e permeia o contrato, a partir da união dos esforços comuns dos sócios301.

2.7.5.3. Dissolução parcial strito sensu

Vimos que o instituto da dissolução parcial teve como embrião a

hipótese de dissolução total da sociedade prevista no caso de denúncia de um sócio

nos termos do artigo 335.5, do Código Comercial de 1850, porém o Código Civil não

prevê nenhuma disposição que se assemelhe àquela que deu origem ao instituto302.

Contudo, o Código Civil, quando trata da dissolução da sociedade

contratual, prevê a possiblidade da maioria absoluta pôr fim à pessoa jurídica

contrata por tempo indeterminado (art. 1.033, III, CC303), o que permitiria ao

dissidente se opor à extinção para prosseguir com a empresa.

Outra hipótese ventilada seria no caso de se perseguir a dissolução

total, a requerimento de qualquer dos sócios, quando supostamente exaurido o fim

social, ou verificada a sua inexequibilidade (art. 1.034, II, CC304).305.

301 FRANZOLIN, Cláudio José. O princípio da boa-fé objetiva na relação jurídico-contratual. Dissertação (Mestrado)- Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2004, p. 75-77. 302 Devemos lembrar que o instituto da dissolução parcial teve origem jurisprudencial e doutrinária em hipótese de dissolução total prevista no Código Comercial de 1850 (art. 335.5) que, ao invés de proferirem decisão determinando a extinção da pessoa jurídica, em consonância com os princípios da função social da empresa, da preservação da empresa e da livre associação, bem como na teoria do contrato plurilateral, decidiram pelo afastamento do sócio retirante e o seguimento da atividade pela sociedade. 303 Art. 1.033. Dissolve-se a sociedade quando ocorrer: III - a deliberação dos sócios, por maioria absoluta, na sociedade de prazo indeterminado; 304 Art. 1.034. A sociedade pode ser dissolvida judicialmente, a requerimento de qualquer dos sócios, quando: II - exaurido o fim social, ou verificada a sua inexequibilidade. 305 No novo Código Civil não há, entre as causas dissolutórias de sociedade, nenhuma que se aproxime daquela contemplada no art. 335, n. 5, do Código Comercial de 1850. Consequentemente, a vontade do sócio, com a vigência do novo Código Civil, não mais poderá ensejar a dissolução da sociedade de que faça parte. O art. 1.033, III, do Código Civil permite que a maioria absoluta dos sócios, nas sociedades de prazo indeterminado, possa deliberar a dissolução total desta. Nada impede que, nestes casos, os sócios dissidentes

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CAPÍTULO III

APURAÇÃO DE HAVERES

3.1. Apuração de haveres

A apuração de haveres é, sem sombra de dúvidas, um dos temas

mais capciosos do direito comercial por tratar diretamente da análise jurídica e

econômica para quantificar o valor a ser reembolsado ao sócio que está saindo da

sociedade por conta de uma das causas de dissolução parcial.

Evidente que o sócio que está se desligando deseja que o valor a

ser apurado de suas quotas seja maior, enquanto os sócios remanescentes

desejam que o valor seja o menor possível, dando ao instituto caráter antagônico de

interesses.

Ao ingressar na sociedade, como visto anteriormente, o sócio tem a

obrigação de compor o capital social, transferindo à pessoa jurídica bens de seu

de tal deliberação possam pretender o prosseguimento da empresa. Neste caso, deve prevalecer o princípio da preservação da empresa, ou seja, a sociedade deve prosseguir com o afastamento daqueles que propugnaram por sua dissolução total. Ora, como tinham estes últimos direito a dar fim à sociedade, a eles deverá ser conferida a apuração de seus haveres como se a dissolução total tivesse prevalecido. Pode-se vislumbrar, nesta hipótese, uma forma de dissolução parcial, tal qual aquela que, com amparo no art. 335, n. 5, do Código Comercial de 1850, construíram nossos tribunais. É bem verdade que se cuida de ocorrência muito mais rara do que aquela que deu origem à concepção pretoriana da dissolução parcial. É muito mais provável, com efeito, que a sociedade possa prosseguir com o afastamento de um único sócio – dependendo, é evidente, do montante de sua participação no capital social – do que com a retirada de sócios que detenham mais da metade do capital social. O pagamento dos haveres destes pode assomar valor que venha a inviabilizar, definitivamente, a subsistência da empresa, a não ser, é óbvio, que os sócios remanescentes promovam os necessários aportes. Outra hipótese de dissolução parcial pode ser vislumbrada na previsão contida no art. 1.034, II, do Código Civil, que regula a possibilidade de o sócio requerer a dissolução da sociedade quando verificada sua inexequibilidade. Ora, tendo em vista que esta pode vir ditada v.g. pela falta de affectio societatis, nada impede que o juiz, ante a discordância dos demais sócios relativamente à dissolução da sociedade, decrete apenas a retirada do sócio insatisfeito, promovendo, assim, a dissolução parcial da sociedade. Como teria o sócio requerente, nesse caso, direito à dissolução total, a liquidação de sua cota dar-se-á como se aquela tivesse sido decretada. O mesmo poderá ocorrer no âmbito das sociedades anônimas, porquanto o art. 206, II, b, da Lei n. 6.404/76 contém disposição de semelhante teor, ao prever a dissolução da companhia quando provado que não possa mais preencher seu fim. São essas, a nosso ver, as únicas hipóteses que, a rigor, poderão ensejar a concessão, pelos tribunais, do pagamento dos haveres ao sócio retirante, da mesma forma como o receberia se de dissolução total se cuidasse. No entanto, como nossos pretórios já vinham conferindo essa forma ampla de apuração de haveres a todos os casos de dissolução parcial lato sensu – ou seja, de extinção limitada do vínculo societário, como, v. g., exclusão, retirada, morte e falência –, é bem possível que continue a ser esta a única modalidade de liquidação da cota a prevalecer (FONSECA, Priscila M.P. Corrêa da. Dissolução parcial, retirada e exclusão de sócio no Novo Código Civil. 3. ed., São Paulo: Atlas, 2005, p. 82-83).

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patrimônio, e, em contrapartida, passa a deter uma fração do capital social

proporcional ao valor de sua contribuição, identificado como quotas sociais.

Ao deter as quotas sociais, a pessoa passa a ser considerada

membro da pessoa jurídica e, consequentemente, a ter direitos e obrigações

inerentes à sua condição de sócio da sociedade. Um desses direitos é a expectativa

de crédito no caso da dissolução (extinção) da sociedade, cabendo a ele receber do

saldo remanescente o valor proporcional à sua participação societária no momento

da partilha (art. 1.108, CC).

Contudo, caso o sócio se desvincule da sociedade antes de seu

término, estaremos diante de uma hipótese de dissolução parcial e, portanto, a

realização da expectativa do direito de crédito do sócio deve ser antecipada para o

momento de sua saída, apurando-se seus haveres naquele momento de forma

proporcional à sua participação societária.

Hernani Estrella306, na clássica obra Apuração de Haveres de Sócio,

diz:

É visto, assim, que o objeto específico da instituição de que nos ocupamos é operar a transmutação do direito patrimonial e abstrato do sócio (enquanto jungido ao contrato), convertendo-o normalmente em prestação pecuniária exigível. É forma instrumental que dá corpo e objetividade exterior à situação jurídica preexistente, advinda da ruptura parcial do vínculo societário, possibilitando (conforme os seus resultados) a exigibilidade, por parte do sócio ou de quem o substitua, do crédito apurado.

Trazemos importante lição que sintetiza o conceito: “A apuração de

haveres importa na constituição de crédito, em favor do sócio desligado (retirante)

ou de seu sucessor, perante a sociedade307.”

Para se alcançar o valor de retirada da quota social, há de se

promover, extrajudicialmente ou judicialmente, a apuração de haveres que deve ser

306 ESTRELLA, Hernani. Apuração de haveres de sócio. 5.ed. atual. por Roberto Papini.. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 112. 307 DE ALMEIDA, Marcus Elidius Michelli de. Sociedade Limitada: causas de dissolução parcial e apuração de haveres. In: BRUSCHI, Gilberto Gomes (Coord.). Direito Processual Empresarial: estudos em homenagem ao professor Manoel de Queiroz Pereira Calças. 1.ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012, p. 549-550.

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pautada na convenção das partes ou na lei, conforme regra extraída dos artigos

1.031 do Código Civil308 e 606 do Código de Processo Civil 309.

3.2. Apuração de haveres extrajudicial

A apuração de haveres pode ser resolvida extrajudicialmente se as

partes contratantes concordarem com o valor de reembolso a ser pago ao sócio que

se desliga da sociedade ou ao sucessor do falecido sem necessidade de atuação do

Poder Judiciário ou da Arbitragem.

Como alhures exposto, o valor a ser reembolsado, muitas vezes,

encontra obstáculo nos interesses particulares do sócio que sai da sociedade e

daqueles que remanescem e, por isso, não é fácil encontrar um meio termo ideal de

reembolso.

Nessa linha, surgem as mais diversas possibilidades de apuração

dos haveres em verdadeira queda de braço na qual sai vitorioso aquele que

conseguir impor ao outro o valor de sua pretensão alcançado em autocomposição

capaz de satisfazer os interesses do retirante e do(s) remanescente(s).

3.3. Apuração de haveres judicial

Diferentemente do que ocorre na apuração de haveres extrajudicial,

na qual as partes chegam a um consenso quanto ao valor a ser pago ao sócio que

se desvinculou da sociedade ou aos herdeiros de sócio falecido, na judicial haverá

308 Art. 1.031. Nos casos em que a sociedade se resolver em relação a um sócio, o valor da sua quota, considerada pelo montante efetivamente realizado, liquidar-se-á, salvo disposição contratual em contrário, com base na situação patrimonial da sociedade, à data da resolução, verificada em balanço especialmente levantado. § 1o O capital social sofrerá a correspondente redução, salvo se os demais sócios suprirem o valor da quota. § 2o A quota liquidada será paga em dinheiro, no prazo de noventa dias, a partir da liquidação, salvo acordo, ou estipulação contratual em contrário. 309 Art. 606. Em caso de omissão do contrato social, o juiz definirá, como critério de apuração de haveres, o valor patrimonial apurado em balanço de determinação, tomando-se por referência a data da resolução e avaliando-se bens e direitos do ativo, tangíveis e intangíveis, a preço de saída, além do passivo também a ser apurado de igual forma. Parágrafo único. Em todos os casos em que seja necessária a realização de perícia, a nomeação do perito recairá preferencialmente sobre especialista em avaliação de sociedades.

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necessidade de o magistrado observar as normas legais para averiguar qual o valor

do reembolso.

O Código de Processo Civil de 2015 inovou, ao tratar da ação de

dissolução parcial de sociedade, procedimento inexistente nos códigos adjetivos

anteriores, incluindo neste procedimento especial também regra para ação de

apuração de haveres. Em que pese o uso atécnico da expressão dissolução parcial

no caput do artigo 599310 e do próprio capítulo que trata do referido procedimento

especial, vislumbramos que a norma adjetiva trata de duas espécies de ações: a de

dissolução parcial e a de apuração de haveres.

E se diz atécnica, a escolha legislativa pelo simples fato de a

dissolução parcial não se confundir com a apuração de haveres, enquanto aquela

tem por objeto o desligamento do sócio da pessoa jurídica pelas causas já

estudadas, esta persegue o quantum será devido àquele que se desligou da

sociedade ou aos herdeiros do sócio falecido.

A apuração de haveres pela via judicial não decorre,

necessariamente, de ação de dissolução parcial de sociedade, pois a causa de

saída pode ser resolvida extrajudicialmente como, por exemplo, na saída voluntária

ou no caso de exclusão extrajudicial. O inverso também pode ocorrer, ou seja, a

dissolução parcial da sociedade pela via judicial, porém sem a apuração de haveres

por essa via como, por exemplo, no caso de composição dos sócios extrajudicial

quanto ao valor do reembolso ou por renúncia do direito de crédito.

Com a apuração de haveres pela via judicial, o juiz deverá fixar a

data da resolução da sociedade e definir o critério de apuração dos haveres à vista

do disposto no contrato social (art. 604, CPC311) para que o perito nomeado possa

quantificar o valor do reembolso (art. 606, único, CC312).

310 Art. 599. A ação de dissolução parcial de sociedade pode ter por objeto: I - a resolução da sociedade empresária contratual ou simples em relação ao sócio falecido, excluído ou que exerceu o direito de retirada ou recesso; e II - a apuração dos haveres do sócio falecido, excluído ou que exerceu o direito de retirada ou recesso; ou III - somente a resolução ou a apuração de haveres. 311 Art. 604. Para apuração dos haveres, o juiz: I - fixará a data da resolução da sociedade;

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3.4. Data da resolução

Quando analisamos as diversas espécies de dissolução parcial das

sociedades contratuais, tivemos a oportunidade de tratar individualmente da data de

resolução, especialmente por conta da disposição do artigo 605 do Código de

Processo Civil e, portanto, aqui vamos apenas mudar o foco para a razão de existir

desse critério temporal.

A data da resolução é critério temporal a ser fixado pelo juiz para

determinar qual exato momento em que o sócio se desvincula da sociedade,

permitindo que o perito judicial nomeado possa elaborar o cálculo do reembolso,

tomando como data-base aquela apontada na decisão judicial, evitando

enriquecimento indevido de qualquer das partes, pois a apuração deve ter por base

para avaliação a situação patrimonial da data da dissolução parcial (art. 1.031, CC e

606, CPC)313.

A data de resolução é, também, o limite temporal para averiguar

outros diretos que integram o valor devido ao ex-sócio, ao espólio ou aos

sucessores, como a participação nos lucros ou os juros sobre o capital próprio

declarado pela sociedade e, se for o caso, a remuneração como administrador (art.

608, CPC), sendo que, após o rompimento do vínculo, será devido apenas o direito

à correção monetária dos valores apurados e aos juros contratuais ou legais.

Como a sociedade continua a existir, prosseguindo com suas

atividades, sendo previsível a alteração de seu patrimônio futuro, que poderá ser

valorizado ou esvaziado pelo comportamento exclusivo dos sócios remanescentes e

II - definirá o critério de apuração dos haveres à vista do disposto no contrato social; e III - nomeará o perito. § 1o O juiz determinará à sociedade ou aos sócios que nela permanecerem que depositem em juízo a parte incontroversa dos haveres devidos. § 2o O depósito poderá ser, desde logo, levantando pelo ex-sócio, pelo espólio ou pelos sucessores. § 3o Se o contrato social estabelecer o pagamento dos haveres, será observado o que nele se dispôs no depósito judicial da parte incontroversa. 312 Art. 606, Parágrafo único. Em todos os casos em que seja necessária a realização de perícia, a nomeação do perito recairá preferencialmente sobre especialista em avaliação de sociedades. 313 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1.360.221 - SP- Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJe 25.03.2014.

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da administração, não é admissível que o sócio que se desligou da pessoa jurídica,

que não mais participa ativamente da sociedade, seja beneficiado ou prejudicado no

recebimento de seus haveres314´315. A definição do momento implica que fatos

supervenientes que vierem a afetar a sociedade não podem ser considerados para

a apuração dos haveres.

O Código Civil, ao tratar das hipóteses de dissolução parcial, não

trouxe regra para pontuar o momento do desligamento do sócio, deixando a norma

aberta e, portanto, dando permissão para interpretações diversas.

Na exclusão, a perda do status socci opera-se com o arquivamento da alteração contratual respectiva, se realizada a expulsão extrajudicialmente, ou com o transito em julgado da sentença que exclui o dissidente, caso feita pela via judicial. Nos casos de recesso ou apuração de haveres por falência do sócio, esta condição extingue-se, conforme o caso, pela aceitação dos demais com a alteração contratual disso consequente, ou pelo transito em julgado da sentença judicial respectiva, ficando a apuração dos haveres como etapa ulterior. E, por fim, a morte do sócio retira-lhe, por óbvio, sua condição, que não se transmite automaticamente aos herdeiros, os quais, como antes demonstrado, têm como certo apenas o direito eventual ao recebimento dos haveres que lhe sejam apurados316.

O artigo 605 do atual Código de Processo Civil317, ao tratar da

apuração de haveres, diferentemente da norma material, fixou as datas de

resolução para cada espécie de dissolução parcial de sociedade:

Com critério objetivo para adoção da data da resolução da

sociedade, o legislador buscou afastar eventual discussão das partes, mas também

314 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº. 1.416.635 - SP- Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJe 22.04.2015. 315 Agravo interno em recurso especial. Direito societário. Dissolução parcial de sociedade. Momento da apuração dos haveres. Pretensão, da sócia remanescente, a que a perícia tome em consideração diversos furtos ocorridos no estabelecimento, após a saída do sócio retirante, que levaram o empreendimento à ruína. Impossibilidade. - A apuração dos haveres do sócio que se retira da sociedade não pode levar em consideração o sucesso ou o fracasso do empreendimento, por causas posteriores à sua retirada. Agravo a que se nega provimento (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 995474 - SP - SP- Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJe 17.03.2009). 316 BARBI FILHO, Celso. Dissolução parcial de sociedades limitadas. Belo Horizonte: Mandamentos, 2004, p. 393. 317 Art. 605. A data da resolução da sociedade será: I - no caso de falecimento do sócio, a do óbito; II - na retirada imotivada, o sexagésimo dia seguinte ao do recebimento, pela sociedade, da notificação do sócio retirante; III - no recesso, o dia do recebimento, pela sociedade, da notificação do sócio dissidente; IV - na retirada por justa causa de sociedade por prazo determinado e na exclusão judicial de sócio, a do trânsito em julgado da decisão que dissolver a sociedade; e V - na exclusão extrajudicial, a data da assembleia ou da reunião de sócios que a tiver deliberado.

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acabou por gerar a possibilidade de descompasso entre o caso concreto e a real

data de desligamento. Essa aparente injustiça, como se verá adiante, pode ser

revista pelo juiz a pedido da parte em momento processual ulterior (art. 607,

CPC)318.

3.5. Os critérios de apuração dos haveres

Além de o magistrado fixar a data do desligamento do sócio pelo

critério legal (art. 605. CPC), ele deve delimitar o critério a ser utilizado pelo perito

judicial para quantificar o valor do reembolso (art. 604, CPC).

Como já exposto anteriormente, a dissolução parcial strito surgiu a

partir da jurisprudência e da doutrina comercial, já que o Código Comercial de 1850

e o Decreto nº 3.708/1919, que tratava da sociedade por quotas de

responsabilidade limitada, não possuíam norma especifica para a saída de sócio por

direito de retirada, como ocorre atualmente pelo disposto no artigo 1.029 do Código

Civil.

E, com a criação do instituto, também foi necessário pensar em

como seria valorada a quota do sócio retirante, sendo que o Supremo Tribunal

Federal, ao adotar a dissolução parcial strito sensu, firmou entendimento no sentido

de que a apuração de haveres na dissolução parcial não seria feita na forma do art.

15 do Decreto nº 3.708/1919, mas, sim, na que “[...] que mais se aproxime, nos seus

efeitos, da dissolução total”319. Foi destacado, no mesmo voto divergente do Ministro

Décio Miranda (RE nº 89.464), que:

[...] há de prevalecer a apuração, em toda a sua amplitude, dos haveres do sócio dissidente, com exata verificação, física e contábil, dos bens e direitos

318 Por último, no conjunto da razão jurídica, costuma-se mencionar a equidade. Aristóteles é responsável por sua definição como a justiça do caso concreto. A solução de litígios por equidade é a que se obtém pela consideração harmônica das circunstâncias concretas, do que pode resultar um ajuste da norma à especificidade da situação a fim de que a solução seja justa. Pois, como diziam os romanos, summum jus summa injuria. Não se trata de um princípio que se oponha à justiça, mas que a completa, a torna plena. (FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do direito: técnica, decisão, dominação. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2003, p. 248). 319 BARROS, Eduardo Bastos de; RIBEIRO, Marcia Carla Pereira. Apontamentos sobre a inclusão do aviamento no cálculo da apuração de haveres. Revista de Direito Empresarial – RDEmp, Belo Horizonte, ano 10, n. 3, set./dez. 2013. Disponível em: <http://www.bidforum.com.br/bid/PDI0006.aspx?pdiCntd=99133>. Acesso em: 14 out. 2016.

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da sociedade, sem a restrição do art. 15 do Decreto 3.708. Este só se aplica ao dissidente que, sem poder opor-se à alteração resolvida pelos outros sócios em maioria de capital, manifeste o propósito de deixar a sociedade320.

A nova ordem posta pelo Código Civil, diferentemente das leis

anteriores, trouxe no artigo 1.031321 horizonte para o julgador poder nortear o perito

judicial no critério para apuração de haveres.

Ocorre que, na mesma linha de fixação da data de reembolso,

entendemos que o critério para apuração de haveres sofreu novos ares com o

Código de Processo Civil, pois, diferentemente do disposto no artigo 1.031 do

Código Civil que trazia norma aberta, permitindo que o julgador analisasse o caso

concreto para poder delimitar qual melhor forma de avaliação do valor da quota e,

consequentemente, o de reembolso, o disposto no artigo 606 do Código de

Processo Civil322, parece-nos, fixou de forma mais restrita o referido critério.

Independentemente da amplitude das normas que direcionam o

magistrado no momento da apuração de haveres, é certo que o critério a ser fixado

pode ser o convencional ou o legal. Será o convencional no caso de previsão no

contrato social; e o legal, no caso da omissão nele.

3.5.1. O critério convencional

O critério inicial a ser verificado pelo juiz no momento de fixar o

critério de apuração de haveres decorre do princípio contratual pacta sunt servanda,

ou seja, o que restou convencionado pelos sócios no contrato social323.

320 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº. 89.464, Relator: Min. Cordeiro Guerra, Data de Julgamento: 12/12/1978, Segunda Turma, Data de Publicação: DJe 04/05/1979. 321 Art. 1.031. Nos casos em que a sociedade se resolver em relação a um sócio, o valor da sua quota, considerada pelo montante efetivamente realizado, liquidar-se-á, salvo disposição contratual em contrário, com base na situação patrimonial da sociedade, à data da resolução, verificada em balanço especialmente levantado. 322 Art. 606. Em caso de omissão do contrato social, o juiz definirá, como critério de apuração de haveres, o valor patrimonial apurado em balanço de determinação, tomando-se por referência a data da resolução e avaliando-se bens e direitos do ativo, tangíveis e intangíveis, a preço de saída, além do passivo também a ser apurado de igual forma. 323 O pagamento fixado pela sentença somente pode ser admitido, quando não há cláusula contratual que fixa a forma de pagamento, ou quando as partes não se ajustem na forma de liquidá-lo, seja porque não consigam firmar um entendimento, seja porque, sendo incapazes, não possam firmar acordos ou compromissos. Na existência de cláusula que determine a forma do pagamento, terá ela prevalência para a solução do caso, logo que apurados os haveres do sócio. O contrato social impõe como a lex privata da sociedade, devendo, assim,

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Ao se constituir o direito contratual moderno, já não encontrou obstáculo o princípio do consensualismo. Os sistemas de direito positivo consignaram a preeminência da regra segundo a qual o contrato se forma segundo o consenso das partes. Retomou a velha parêmia, “pacta sunt servanda”, não apenas para dizer que os contratos devem ser cumpridos (princípio da força obrigatória), mas para generalizar que qualquer ajuste, como expressão do acordo de vontade das partes, tem igual força cogente324.

Desse modo, o juiz estaria limitado à aplicação daquilo que restou

pactuado entre os sócios e, portanto, deveria afastar toda e qualquer outra norma

para avaliação dos haveres do sócio que se desligasse da sociedade. Ocorre que

esse parece não ser o entendimento do Superior Tribunal de Justiça ao apreciar a

questão, pois há diversos entendimentos que afastam a cláusula negociada pelas

partes em detrimento ao critério legal, sustentando que o previsto no contrato social

somente seria aplicado em caso de consenso entre os sócios. Em caso de

dissenso, deveria ser aplicado o balanço de determinação325. Aparentemente

existem julgados que reforçam a força vinculante do contrato social, porém,

analisando suas razões, não se trata da análise do critério a ser adotado para

apuração de haveres, mas, sim, da forma de pagamento do reembolso326.

ser respeitada a condição que nele se firmou, mesmo que se trate de herdeiros incapazes. (DE PLÁCIDO, Silva. Comentários ao Código de Processo Civil, v. 4, 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1956, p. 149) 324 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil,v. III, 10. ed. Rio de Janeiro, Forense, p. 9, 2001.. 325 DIREITO EMPRESARIAL. DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE POR QUOTAS DE RESPONSABILIDADE LIMITADA. SÓCIO DISSIDENTE. CRITÉRIOS PARA APURAÇÃO DE HAVERES. BALANÇO DE DETERMINAÇÃO. FLUXO DE CAIXA. 1. Na dissolução parcial de sociedade por quotas de responsabilidade limitada, o critério previsto no contrato social para a apuração dos haveres do sócio retirante somente prevalecerá se houver consenso entre as partes quanto ao resultado alcançado. 2. Em caso de dissenso, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça está consolidada no sentido de que o balanço de determinação é o critério que melhor reflete o valor patrimonial da empresa. 3. O fluxo de caixa descontado, por representar a metodologia que melhor revela a situação econômica e a capacidade de geração de riqueza de uma empresa, pode ser aplicado juntamente com o balanço de determinação na apuração de haveres do sócio dissidente. 4. Recurso especial desprovido .(BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1335619 SP, Relator: Ministra Nancy Andrighi, Data de Julgamento: 03/03/2015, T3 - Terceira Turma, Data de Publicação: DJe 27/03/2015). 326 DIREITO EMPRESARIAL. RECURSO ESPECIAL. DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE.APURAÇÃO DE HAVERES. FORMA DE PAGAMENTO. 1. A apuração de haveres - levantamento dos valores referentes à participação do sócio que se retira ou que é excluído da sociedade -se processa da forma prevista no contrato social, uma vez que, nessa seara, prevalece o princípio da força obrigatória dos contratos, cujo fundamento é a autonomia da vontade, desde que observados os limites legais e os princípios gerais do direito. Precedentes. 2. No caso sob exame, o contrato social previu o pagamento dos haveres parcelados em 48 (quarenta e oito) prestações mensais e sucessivas, tendo o Tribunal estadual determinado o vencimento da primeira por ocasião do trânsito em julgado da decisão. 3. Em ação que versa sobre o inadimplemento dos haveres oriundos da retirada de sócio, a sociedade é constituída em mora com a citação válida, que passa então a ser considerada como termo inicial para o pagamento das parcelas, sendo certo que aquelas que venceram no curso do processo devem ser pagas de imediato, após o trânsito em julgado da sentença condenatória, enquanto as remanescentes serão adimplidas consoante determinado no contrato social. (Precedentes) 4. Recurso especial parcialmente provido. (STJ - REsp: 1239754 RS 2011/0045196-8, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 15/05/2012, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 22/05/2012).

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A previsão assentada neste dispositivo legal regulariza e regulamenta o modo pelo qual deve ser liquidada a participação do sócio retirante (seja a retirada voluntária ou por ocasião do falecimento do sócio) ou exclusão, exceto quando o contrato contiver disciplina expressa diversa da disposição legal. Tal permissivo para o afastamento da norma legal em benefício de dispositivo contratual pode acabar por prejudicar aquele que se retira da sociedade, no caso do contrato adotar como método que não inclua, no valor do reembolso, o cálculo do valor real da empresa. Valor real é o de mercado. Para avaliá-lo, devem ser computados da empresa o fundo de comércio, as marcas, assim como quaisquer outros bens incorpóreos, inerentes à atividade da sociedade, que não são incluídos, por exemplo, no valor contável da sociedade. Não obstante, apesar do contrato social poder dispor de forma diversa à letra da lei, a jurisprudência tem se firmado no sentido de não se admitir mero levantamento contábil para a apuração de haveres.327.

Pela jurisprudência, a regra do contrato social para apuração de

haveres somente será válida nos casos em que o sócio que se desliga da sociedade

ou os herdeiros do falecido concorde com o valor apurado do reembolso, sendo

que, se o caso for jurisdicionalizado, a apuração se fará pelo critério legal.

Tal afirmação confronta com a norma, seja do artigo 1.031 do

Código Civil, seja do 606 do Código de Processo Civil, pois, aparentemente, a lei

permite que os sócios tenham liberdade de contratar o critério que melhor atender

aos interesses das partes. E esse interesse deveria se sobrepor à intervenção

jurisdicional, independentemente se o valor alcançado nos termos do contrato social

fosse menor do que o apurado por outro método328.

Nas tratativas comerciais em que a segurança deve ser preservada

para melhor alocação dos riscos329, é plenamente aconselhável que os sócios criem

regras para a apuração de haveres e o reembolso da quota liquidada. A previsão

contratual visa a manter a empresa economicamente viável, com suas atividades

não afetadas em razão do ónus de reembolsar o sócio que se afasta da sociedade,

327 WALD, Arnoldo. Comentários ao novo Código Civil, v. XIV, livro II, do direito de empresa. In: TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo (Coord.). Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 219. 328 O Código Comercial projetado tem previsão nesse sentido: Art. 178. O critério de determinação do valor das quotas para fins de apuração de haveres e definição de seu pagamento, quando estabelecido no contrato social, deve ser observado, mesmo que se apresente inferior ao resultante de qualquer outro método de avaliação. 329 COELHO, Fábio Ulhoa. A alocação de riscos e a segurança jurídica na proteção do investimento privado. Revista de Direito Brasileira, São Paulo, v. 16, n. 7, jan./abr. 2017, p. 291-304.

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mesmo que a previsão contratual não corresponda à realidade no momento da

retirada do sócio dissidente330.

3.5.2. O critério legal

O critério legal deveria ser utilizado somente no caso de omissão do

contrato social e, portanto, na inexistência do convencional, mas os Tribunais e

parte da doutrina o adotam indiscriminadamente por considerá-lo o justo no

momento do reembolso331.

O critério para apuração de haveres, assim como o instituto da

dissolução parcial de sociedade, nasceu e evoluiu com a jurisprudência dos

Tribunais, ainda na vigência do Código Comercial de 1850, como se observa no já

citado Recurso Extraordinário 89.646:

COMERCIAL. DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE LIMITADA. PEDIDA A DISSOLUÇÃO TOTAL POR SOCIO DISSIDENTE, NÃO E POSSIVEL, EM PRINCÍPIO, DECRETAR A DISSOLUÇÃO PARCIAL, COM SIMPLES APURAÇÃO CONTABIL DOS HAVERES DO AUTOR. ADMITIDA QUE SEJA A DISSOLUÇÃO PARCIAL EM ATENÇÃO A CONVENIENCIA DA PRESERVAÇÃO DO EMPREENDIMENTO, DAR-SE-A ELA MEDIANTE FORMA DE LIQUIDAÇÃO QUE A APROXIME DA DISSOLUÇÃO TOTAL. NESSE CASO, DEVE SER ASSEGURADA AO SOCIO RETIRANTE SITUAÇÃO DE IGUALDADE NA APURAÇÃO DE HAVERES, FAZENDO-SE ESTA COM A MAIOR AMPLITUDE POSSIVEL, COM A EXATA VERIFICAÇÃO, FÍSICA E CONTABIL, DOS VALORES DO ATIVO332.

Como se verifica na ementa da decisão, a apuração de haveres na

dissolução parcial seria a simulação de uma dissolução total, como se os ativos

fossem realizados e os passivos pagos, logo, trazendo a avaliação para o valor

330 TROVO, Beatriz. Resolução da sociedade limitada em relação a um sócio no Código Civil de 2002. Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro, São Paulo, n. 139, jul.2015, p. 267. 331 Permita-se, porém, a previsão contratual em sentido contrário, como se depreende da leitura do caput do artigo 1.031. Em nossa opinião, a previsão contratualmente chancelada somente poderá validamente materializar-se para veicular outra forma de liquidação do valor da quota que garanta valor igual ou superior àquele apurado segundo a fórmula acima enunciada. Do contrário, a cláusula seria abusivamente estabelecida, em prejuízo do sócio retirante, excluído ou dos herdeiros, legatários ou cônjuge meeiro do falecido. Não se pode validar regra que conspire para o enriquecimento ilícito da sociedade em prejuízo do sócio. Interpretação contrária viria a representar uma involução na matéria, eis que a jurisprudência de há muito condena qualquer método de apuração de haveres que não se faça segundo balanço especial de determinação que reflita os valores reais e atualizados do ativo, sem qualquer sansão ao sócio ou seus sucessores ou cônjuge, com a inclusão de todos os bens corpóreos e incorpóreos da sociedade. (CAMPINHO, Sérgio. O direito de empresa à luz do novo Código Civil. 4. ed. ampliada e revisada. Rio de Janeiro: Forense, 2004., p. 129). 332 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº. 89464, Relator: Min. Cordeiro Guerra, Data de Julgamento: 12/12/1978, Segunda Turma, Data de Publicação: DJe 04/05/1979.

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presente, como se a sociedade fosse extinta, apurando-se eventual saldo para

reembolso do sócio.

A apuração de haveres, em outras palavras, é a simulação da dissolução total da sociedade. Por meio de levantamento contábil, que reavalia, a valor de mercado, os bens corpóreos e incorpóreos do patrimônio social, e da consideração do passivo da sociedade, projeta-se quanto seria o acervo remanescente caso a sociedade limitada fosse, naquele momento, dissolvida333.

Como não havia previsão legal da dissolução parcial e,

consequentemente, da apuração de haveres, o critério legal foi regulado somente

com a regulação do instituto pelo Código Civil, especificamente pelo artigo 1.031

que repetiu regra do artigo 2.289 do Código Civil Italiano334, decretando que a quota

a ser liquidada deve ser valorada com base na situação patrimonial da sociedade, à

data da resolução, verificada em balanço especialmente levantado.

Mais recentemente, a matéria, a nosso ver, ganhou novos ares com

o disposto no artigo 606 do Código de Processo Civil que determinou, como critério

de apuração de haveres, o valor patrimonial apurado em balanço de determinação,

tomando-se por referência a data da resolução e avaliando-se bens e direitos do

ativo, tangíveis e intangíveis, a preço de saída, além do passivo também a ser

apurado de igual forma.

O uso do balanço de determinação decorreu, assim como o instituto

da dissolução parcial, de evolução histórica. Inicialmente a apuração de haveres era

apurada por meio do último balanço, tomando essa peça contábil como expressão

do estado econômico da empresa. Percebeu-se que o referido balanço patrimonial

não refletia a realidade patrimonial da empresa e que, portanto, era necessária a

333 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. Direito de empresa, v. II, 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 467. 334 Art. 2.289. (Liquidazione della quota del socio uscente). Nei casi in cui il rapporto sociale si scioglie limitatamente a un socio, questi o i suoi eredi hanno diritto soltanto ad una somma di danaro che rappresenti il valore della quota. La liquidazione della quota e' fatta in base alla situazione patrimoniale della societa' nel giorno in cui si verifica lo scioglimento. Se vi sono operazioni in corso, il socio o i suoi eredi partecipano agli utili e alle perdite inerenti alle operazioni medesime. Salvo quanto e' disposto nell'art. 2270, il pagamento della quota spettante al socio deve essere fatto entro sei mesi dal giorno in cui si verifica lo scioglimento del rapporto.

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apuração de um balanço especialmente levantado para apuração do valor das

quotas do sócio afastado, o balanço de determinação335.

3.6. O balanço

Hogg336 afirma que o balanço é originário da palavra “balança”, que

tem por objeto demonstrar o equilíbrio do sistema, evidenciando de um lado as

aplicações (o direito); e do outro, as origens (o esquerdo). Trata-se de instrumento

com que se determina a massa ou o peso econômico da riqueza aziendal, por uma

equação de equilíbrio, equação patrimonial.

A equação patrimonial é demonstrada por meio de um balanço,

espécie de fotografia econômica do patrimônio e, portanto, estática, em

contraposição ao estado dinâmico em que se encontra o patrimônio ao servir a

empresa337.

O balanço tem a função de transmitir conhecimento de um estado

de coisas, uma expressão patrimonial de uma determinada empresa com a

finalidade de dar conhecimento de sua composição patrimonial por meio de um

processo técnico. Dependendo da destinação do balanço, haverá diferenças

peculiares, ensejando a clássica classificação: balanço de exercício, cessão,

liquidação e, mais restritamente, balanço de determinação338.

Num exercício de classificação, pode-se dizer que os balanços patrimoniais são ordinários ou extraordinários. O balanço ordinário é o levantado no término do exercício social, para atender à legislação comercial e, por vezes, também a tributária. Os balanços extraordinários são levantados durante o exercício social e se dividem em duas espécies: especial e de determinação. A diferença entre as espécies de balanços extraordinários está no seguinte: no balanço especial, preservam-se os mesmos critérios de avaliação dos bens do ativo e passivo adotados no

335 ESTRELLA, Hernani. Apuração de haveres de sócio, 5.ed. atual. por Roberto Papini Ed.. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 116-117. 336 HOOG, Wilson Alberto Zappa. Balanço especial para apuração de haveres e reembolso de ações. 3. ed. Curitiba: Juruá, 2014, p. 51. 337 RIBAS, Roberta de Oliveira e Corvo. Apuração de haveres na sociedade empresaria limitada. In: COELHO, Fabio Ulhoa (Coord.). Tratado de Direito Comercial, v. 2. Tipos societários, sociedade limitada e sociedade anônima. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 270. 338 ESTRELLA, Hernani. Apuração de haveres de sócio. 5.ed. atual. por Roberto Papini Ed.. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 118.

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balanço ordinário; no balanço de determinação, alteram-se esses critérios339.

O objetivo dos próximos tópicos não é esgotar o tema, mas tão

somente apresentar de forma sucinta as distinções conceituais sobre os balanços

existentes com fundamento na doutrina.

3.6.1. Balanço de exercício

O balanço de exercício, periódico ou ordinário, é aquele levantado

em atendimento ao artigo 1.179 do Código Civil340, de obrigatoriedade de todo

empresário pela legislação comercial e tributária, com exceção daqueles

enquadrados como Microempresas ou Empresas de Pequeno Porte que estão

dispensados dessa obrigação (art. 1.179, §2º, CC). O balanço ordinário leva em

consideração o término do exercício social, normalmente 31 de dezembro, por

coincidir com o exercício fiscal.

O balanço patrimonial deverá exprimir, com fidelidade e clareza, a

situação real da empresa e, atendidas as peculiaridades desta, bem como as

disposições das leis especiais, indicará, distintamente, o ativo e o passivo (art.

1.188, CC). O balanço de resultado econômico, ou demonstração da conta de lucros

e perdas, acompanhará o balanço patrimonial e dele constarão crédito e débito, na

forma da lei especial (art. 1.189, CC).

Em que pese a lei determinar que o balanço patrimonial levantado

no exercício deva exprimir a situação real da empresa, trata-se de uma realidade

contábil, já que o valor do patrimônio efetivo da empresa necessita de avaliação,

que não pode ser procedida pelo contabilista, mas por técnicos habilitados em

avaliação patrimoniais e de empresas, variando a especialização consoante as

especificidades de cada negócio341.

339 COELHO, Fábio Ulhoa. O valor patrimonial das quotas na sociedade limitada, São Paulo, Revista de Direito Mercantil, industrial, econômico e financeiro, n. 123, jul./set. 2001, p. 74. 340 Art. 1.179. O empresário e a sociedade empresária são obrigados a seguir um sistema de contabilidade, mecanizado ou não, com base na escrituração uniforme de seus livros, em correspondência com a documentação respectiva, e a levantar anualmente o balanço patrimonial e o de resultado econômico. 341 GONÇALVES NETO, Alfredo de Assis. Direito de Empresa: comentários aos artigos 966 a 1.195 do Código Civil. 6. ed.. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016.

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Por não ser o reflexo real do patrimônio da sociedade, o Supremo

Tribunal Federal afastou o uso do balanço de exercício da apuração de haveres e

editou a Súmula 165: Na “apuração de haveres não prevalece o balanço não

aprovado pelo sócio falecido, excluído ou que se retirou”.

3.6.2. Balanço de cessão

O balanço de cessão é uma espécie de balanço extraordinário, cuja

finalidade é verificar o valor da empresa ou de parte dela com o escopo de

alienação, seja do estabelecimento ou das quotas sociais. Os interesses envolvidos

para o negócio são do alienante e do adquirente e, portanto, devem estipular quais

são os direitos, os bens e as obrigações que serão relacionados para operação.

Neste caso, o grau de veracidade do balanço menos tem a ver com a segurança dos administradores e sócios de poder sacra lucros da empresa, mas muito mais com o interesse do comprador de adquirir o negócio por entender que ele valha o tanto quanto resultante do balanço de cessão, bem como o interesse do vendedor de aliená-lo pela maior expressão possível. Assim, o valor resultante será definido exclusivamente em decorrência do acordo de vontade entre as partes342.

3.6.3. Balanço de liquidação

O balanço de liquidação também é da espécie extraordinário e é

ferramenta do processo de liquidação da sociedade, no qual o liquidante nomeado

(art. 1.102, CC) terá como objetivo realizar os ativos para pagamento do passivo,

apurando-se o resultado para partilha entre os sócios (art. 1.103, IV, CC).

Pelo que respeita ao balanço de liquidação, entretanto as coisas se passam de modo assaz diferente. Os bens que aderem à empresa e, normalmente, só têm existência em função dela (nome comercial, sinais distintivos, desenhos modelo, concessões, despesas de instalação, aviamento, clientela e direito ao ponto ou local), são bens que com ela se extinguem e, por isso, não podem corretamente, ser considerados como valores realizáveis. Computam-se, no entanto, as reservas e fundos acumulados e, bem assim, as valorizações do ativo (até onde estas venham a concretizar-se pela venda dos bens respectivos, ou partilha destes em espécie). Desse

342 RIBAS, Roberta de Oliveira e Corvo. Apuração de haveres na sociedade empresaria limitada. In: COELHO, Fabio Ulhoa (Coord.). Tratado de Direito Comercial, v. 2. Tipos societários, sociedade limitada e sociedade anônima. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 274.

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jeito fixado o ativo liquidado, a sua avaliação é orientada com base no peço provável de venda. Esta, porque é de certo modo forçada, ou ao menos necessária, poderá não produzir o resultado esperado, sobretudo em se tratando de coisas e valores mobiliários que não encontram fácil colocação no mercado. Daí vem que, além de muitos outros prejuízos que se vão acumular no passivo, se deve contar com mais este343.

3.6.4. Balanço de determinação

Como se depreende da leitura do artigo 1.031 do Código Civil, após

a dissolução parcial da sociedade, deve ser levantado balanço especial para

apuração de haveres do sócio retirante, falecido ou excluído. O “balanço

especialmente levantado” para determinar a “situação patrimonial da sociedade” é o

de determinação, espécie de balanço patrimonial extraordinário, como explicitou o

artigo 606 do Código de Processo Civil344.

Tal levantamento consiste, basicamente, em verdadeiro balanço de todo o patrimônio da sociedade, devendo o perito, para ultimá-lo, proceder ao inventário dos bens integrantes do ativo da sociedade, a discriminação do passivo, assim como a avaliação a preço de mercado daqueles valores, procedendo, de igual modo, em relação aos bens intangíveis, conforme, aliás, já se revelou anteriormente. Tal procedimento é denominado, pela generalidade da doutrina e jurisprudência, “balanço de determinação”, “especial” ou de “liquidação”. Portanto, “o balanço de determinação é demonstração contábil especialmente elaborado para permitir a mensuração da participação societária do sócio dissidente, excluído ou pré-morto”. Este visa, em última análise, a apuração da “situação patrimonial efetiva, em que estejam presentes, verdadeiramente, todos os ativos e passivos, sem considerar de forma estanque a atividade, mas apreendendo-a em sua dinâmica. É evidente que, em razão do objetivo perseguido, a atividade do perito não poderá limitar-se ao exame da escrita contábil da sociedade, devendo ir mais além para abranger a avaliação, a preço de mercado, de todos os bens que integram o patrimônio social, ou seja, os corpóreos (móveis, imóveis, equipamentos, veículos etc.) e incorpóreos (fundo de comércio, marcas, patentes, ponto etc.). Por essa razão é que, muitas vezes conforme a natureza da atividade econômica explorada pela sociedade parcialmente dissolvenda -, impõe-se a presença, ao lado de um perito-contador, de outros experts na avaliação de diferentes ordens de bens. É, por conseguinte, do verdadeiro conteúdo econômico de tais bens que deverá resultar o montante do reembolso devido ao sócio que se desliga da sociedade. É que a dissolução parcial foi concebida à imagem e semelhança da dissolução total, motivo pelo qual, e embora não se liquide realmente o ativo e o passivo da sociedade, deve o perito proceder como se o estivesse

343 ESTRELLA, Hernani. Apuração de haveres de sócio. 5.ed. atual. por Roberto Papini Ed.. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 122. 344 Art. 606. Em caso de omissão do contrato social, o juiz definirá, como critério de apuração de haveres, o valor patrimonial apurado em balanço de determinação, tomando-se por referência a data da resolução e avaliando-se bens e direitos do ativo, tangíveis e intangíveis, a preço de saída, além do passivo também a ser apurado de igual forma.

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efetivamente fazendo daí por que, com frequência, aludir-se a tal procedimento como “liquidação ficta” - pois, tal como determinado pela Mais Alta Corte, impõe-se, na espécie, “exata verificação física e contábil dos valores do ativo.” Ou seja, “a apuração dos haveres do sócio que pretende o recesso não deve limitar-se à simples leitura contábil e fiscal do último balanço da empresa, operando-se a real pesquisa acerca do seu acervo patrimonial.”345.

Hernani Estrella346 afirma que a nomenclatura balanço de

determinação foi dada por Osmida Innocente, e o definiu como aquele levantado

especialmente para determinar a quota reembolsável ao sócio afastado347 e,

portanto, desempenha papel distinto dos demais balanços como visto acima348.

Na avaliação levantada em balanço de determinação, leva-se em

consideração o valor de mercado (preço de saída), em simulação a realização de

todos os bens e direitos do ativo, tangíveis e intangíveis, bem como a satisfação do

passivo social, na data da dissolução parcial, devendo “[...] ser assegurada ao sócio

retirante situação de igualdade na apuração de haveres, fazendo-se esta com a

maior amplitude possível, com a exata verificação, física e contábil, dos valores do

ativo.”349

[...] no balanço de determinação, além da atualização dos fatos contábeis verificados entre a data do encerramento do último exercício e a data do seu levantamento, alteram-se os critérios de avaliação e apropriação dos bens do ativo e passivo, de sorte a contabilizá-los a valor de saída ("valor de mercado"). Em suma, no balanço de determinação, é feita uma simulação da realização de todos os bens do ativo e da satisfação do passivo social, para

345 FONSECA, Priscila M.P. Corrêa da. Dissolução parcial, retirada e exclusão de sócio no Novo Código Civil. 3. ed., São Paulo: Atlas, 2005, p. 196-198. 346 ESTRELLA, Hernani. Apuração de haveres de sócio. 5.ed. atual. por Roberto Papini Ed.. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 124. 347 O balanço de determinação, denominação cunhada por Osmida Inoccente (jurista italiano), tem por finalidade determinar o valor das quotas a ser reembolsado ao sócio desligado ou aos herdeiros do sócio pré-morto. Pela elaboração dessa demonstração contábil, o perito em contabilidade busca a situação patrimonial da sociedade a valores de mercado em determinado momento da vida societária, caracterizado pela dissidência, exclusão ou morte de um dos sócios. (ORNELAS, Martinho Maurício Gomes de. Avaliação de sociedades. São Paulo: Atlas, 2001, p. 120). 348 Esse balanço, de acordo com os referidos precedentes, seria justamente o de determinação, que se contrapõe ao: (i) balanço periódico ou ordinário (reflete o valor patrimonial contábil, retratando a situação patrimonial da sociedade no encerramento do exercício social, sendo utilizado sobretudo para fins fiscais); (ii) balanço especial (reflete o valor patrimonial contábil em data presente, sendo utilizado para atualização do ativo e do passivo em virtude de fatos contábeis verificados ao longo do exercício social); (iii) balanço de cessão (reflete o valor patrimonial – econômico – de alienação da sociedade, sendo influenciado pelos interesses que envolvem a negociação entre comprador e vendedor); e (iv) balanço de liquidação (reflete o valor patrimonial real para fins de encerramento da sociedade, com exclusão de bens intangíveis, que só existem com a empresa em funcionamento. (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1.335.619 - SP. Relator: Ministra Nancy Andrighi. Data de Julgamento 03/03/2015, T4 - Quarta Turma, Data de Publicação: DJe 27/03/2015) 349 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº. 89464, Relator: Min. Cordeiro Guerra, Data de Julgamento: 12/12/1978, Segunda Turma, Data de Publicação: DJe 04/05/1979.

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mensurar quanto seria o acervo líquido da sociedade, caso ela fosse totalmente dissolvida e liquidada naquela data. A simulação da realização do ativo e da satisfação do passivo pressupõe afastar-se o princípio do "custo como base de valor", consagrado pelas boas técnicas de contabilidade, e reavaliarem-se os elementos do ativo para os apropriar pelo "valor de saída" (valor de mercado). O balanço de determinação é, bem vistas as coisas, um instrumento contábil desenvolvido exclusivamente para atender à jurisprudência dominante sobre apuração de haveres. Não tem outra serventia senão dar cumprimento às decisões judiciais que decretam a dissolução parcial de sociedade limitada, em que o contrato social é omisso relativamente ao cálculo do reembolso. A própria expressão - balanço de determinação - é criação da doutrina jurídica, e não da teoria da contabilidade350.

350 COELHO, Fábio Ulhoa. O valor patrimonial das quotas na sociedade limitada, São Paulo, Revista de Direito Mercantil, industrial, econômico e financeiro, n, 123, jul./ set. 2001, p. 75.

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CAPÍTULO IV

AVALIAÇÃO DO PATRÍMÔNIO LÍQUIDO NA DISSOLUÇÃO PARCIAL DE

SOCIEDADES CONTRATUAIS

4.1. O estabelecimento

Antes de averiguar quais são os bens e os direitos que deverão ser

incluídos na apuração de haveres das sociedades contratuais, mister se faz analisar

o elemento objetivo da empresa, o estabelecimento.

Pela norma posta, “considera-se estabelecimento todo complexo de

bens organizado, para exercício da empresa, por empresário, ou por sociedade

empresária” (art. 1.142, CC). O estabelecimento também é conhecido como fundo

de comércio (no direito francês – fonds de commerce) ou de empresa e, ainda,

como azienda (no direito italiano).

Como define Waldemar Ferreira, o estabelecimento é a “[...]

universalidade de bens constituintes do organismo por via do qual o comerciante

exercita a sua função medianeira entre a produção e o consumo351”.

O Código Civil trata dos bens no Livro II, sendo que, no Capítulo I,

distingue bens em imóveis (art. 79 a 81, CC) e móveis (art. 82 a 84, CC), após o que

aponta os bens fungíveis e consumíveis (arts. 85 e 86, CC), os bens divisíveis (art.

87 e 88, CC) e, por fim, os bens singulares e coletivos (art. 89 a 91, CC).

A sociedade, durante a exploração de sua atividade, adquire

inúmeros bens singulares para o exercício da empresa, como prédio para sua sede

(bem imóvel), maquinários e insumos para produção (bens móveis); desenvolve

produtos inovadores (invenções); apresenta-se aos seus consumidores com sinais

distintivos visualmente perceptíveis (marcas); é encontrada na rede mundial de

computadores por um sítio eletrônico (site ou domínio) etc., todos esses bens

351 FERREIRA, Waldemar. Instituições de Direito Comercial, v.2. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1947, p. 14.

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individuais não perdem a sua singularidade, mas, em conjunto, formam um todo, um

complexo de bens organizados, o estabelecimento.

O rol exemplificativo acima demonstra que cada um dos elementos

que formam o estabelecimento é tratado individualmente como bem singular, na

forma do artigo 89 do Código Civil: “São singulares os bens que, embora reunidos,

se consideram de per si, independentemente dos demais”.

Dentre os bens singulares que agrupados formam o

estabelecimento podemos vislumbrar tanto os materiais (imóveis, máquinas,

insumos etc.) quanto os imateriais (invenção, marca, ponto etc.)352.

A distinção entre bens materiais e imateriais não está na

tangibilidade, pois, como no caso do estabelecimento, apesar de ser considerado

um bem coletivo imaterial, seus elementos singulares são bens materiais e

imateriais:

Não é a tangibilidade, em si, que oferece o elemento diferenciador, pois há coisas corpóreas naturalmente intangíveis, e há coisas incorpóreas que abrangem bens tangíveis, como é o caso da herança ou do fundo de comércio, considerados em seu conjunto como bens incorpóreos, apesar de se poderem integrar de coisas corpóreas, como nota Enneccerus353.

Quando os bens singulares são agregados em um todo, estaremos

diante das coisas coletivas ou universais, mas consideradas com individualidades

próprias, distintas da de seus componentes, mantendo, assim, a sua própria

singularidade. Há universalidades de fato (art. 90, CC) e universalidades de direito

(art. 91, CC).

Coisas coletivas ou universais são as que, embora constituídas de duas ou mais coisas singulares, se consideram, todavia, agrupadas num único todo. Esse todo, que tem individualidade distinta das unidades que a compõem, é geralmente designado por um nome genérico354.

352 Os bens corpóreos são coisas que têm existência material, como uma casa, um terreno, uma joia, um livro. Ou melhor, é o objeto do direito. Os bens incorpóreos não têm existência tangível e são relativos aos direitos que as pessoas naturais ou jurídicas têm sobre as coisas, sobre os produtos de seu intelecto ou contra outra pessoa, apresentando valor econômico, tais como: os direitos reais, obrigacionais, autorais (DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. v. 1. Teoria Geral do Direito Civil. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 385). 353 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. v. I. 23 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 348. 354 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1963.

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Constitui universalidade de fato a pluralidade de bens singulares

que, pertinentes à mesma pessoa, tenham destinação unitária (art. 90, CC). Já

universalidade de direito é o complexo de relações jurídicas, de uma pessoa,

dotadas de valor econômico (art. 91, CC).

A doutrina diverge quanto à natureza jurídica do estabelecimento,

tanto que existem pelo menos nove teorias distintas sobre o instituto.

Existem nada menos que nove teorias diferentes sobre a natureza do estabelecimento, compondo um leque de visões que vão desde a personificação do complexo de bens até a negativa de sua relevância para o direito (cf. Barreto Filho, 1969:77/109; Correia, 1973:121/134; Ferrara, 1952:161/162). Da rica discussão, basta apenas destacar três pontos essenciais: 1º) o estabelecimento empresarial não é sujeito de direito; 2º) o estabelecimento empresarial é um bem; 3º) o estabelecimento empresarial integra o patrimônio da sociedade empresária. Esses tópicos são suficientes para a completa e adequada compreensão do instituto e dispensam maiores considerações sobre o infértil debate acerca da natureza do estabelecimento empresarial355.

Como o estabelecimento é tratado pela lei brasileira como um

complexo de bens organizados para a consecução de uma finalidade, considera-se

uma universalidade.

Maria Helena Diniz distingue as universalidades de fato e de direito,

incluindo o estabelecimento nesta última356, de forma diversa J.X. Carvalho de

355 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. Direito de empresa, v. I, 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 99. 356 Podem se apresentar como: 1) uma universalidade de fato (universitas rerum), por ser um conjunto de bens singulares, corpóreos e homogêneos, ligados entre si pela vontade humana para a consecução de um fim. P. ex.: uma biblioteca, um rebanho, uma galeria de quadros (RT, 390:226; 462:76). Pelo art. 90 e parágrafo único do Código Civil: "Constitui universalidade de fato a pluralidade de bens singulares que, pertinentes à mesma pessoa, tenham destinação unitária. Os bens que formam essa universalidade podem ser objeto de relações jurídicas próprias"; se tal titularidade não pertencer à mesma pessoa (natural ou jurídica), não se terá a universalidade de fato, porque a aglutinação daqueles bens foi ocasional e não tem a característica de um todo homogêneo. Os bens singulares, componentes da universalidade de fato, podem ser objeto de relações jurídicas próprias e independentes. O parágrafo único do art. 90 possibilita que os bens, apesar de integrados numa universalidade de fato, tenham sua individualidade. Nada obsta, ainda, que o livro de uma biblioteca particular possa ser doado ou vendido ou que em tomo de um ou de alguns exemplares daquela biblioteca surja algum ato negocial ou demanda judicial; ou 2) uma universalidade de direito (universitas iuris), constituída por bens singulares corpóreos heterogêneos ou incorpóreos, a que a norma jurídica, com o intuito de produzir certos efeitos, dá unidade, como, p. ex., o patrimônio, a massa falida, a herança ou o espólio, estabelecimento empresarial (CC, art. 1.143) e o fundo de negócio. Acrescenta o art. 91 do Código Civil que "constitui universalidade de direito o complexo de relações jurídicas, de uma pessoa, dotadas de valor econômico". O patrimônio e a herança (espólio) são considerados como um conjunto, ou seja, como uma universalidade. Embora se constituam ou não de bens materiais e de créditos, esses bens se unificam numa expressão econômica, que é o valor. O patrimônio é o complexo de relações jurídicas de uma pessoa, apreciáveis

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Mendonça considera o estabelecimento como universalidade de fato357, sendo essa

também a posição de Oscar Barreto Filho358.

Compactuamos com a posição que entende pela universalidade de

fato como a natureza jurídica do estabelecimento uma vez que, por seu conceito

legal, está inserido dentro do ativo patrimonial do empresário (art. 90, CC)359, não se

confundindo com o patrimônio deste, no qual se inclui passivo e ativo (art. 91, CC),

este, sim, uma universalidade de direito.

Não cabe repetir aqui os critérios diferençadores entre as universalidades de fato e as de direito, assunto de eu já nos ocupamos alhures. Recordamos apenas a conclusão a que chegamos, nas pegadas de Sylvio Marcondes, de que o traço distinto essencial entre as duas reside em que a universitas juris é um conjunto de direito (relações ativas e passivas), ao passo que a universitas facti é um conjunto de objetos de direito. À luz desse critério, definido o estabelecimento comercial como complexo de bens instrumentais, devemos colocá-lo entre as universitas facti. Corroboram a justeza dessa classificação as circunstancias, que servem de critérios distintos para outras teorias, a seguir enumeradas: 1º) o estabelecimento, como centro de organização da atividade produtora, tem existência real, e não meramente fictícia; 2º) o estabelecimento é criado pela vontade do homem, e só de modo mediato reconhecido pela lei como unidade; 3º) o estabelecimento é constituído unicamente de bens, materiais e imateriais, ou seja, elementos do ativo, não compreendendo, pois, indistintamente, as relações jurídicas ativas e passivas do titular.360

O estabelecimento é um conjunto de bens que integram o

patrimônio do empresário, porém são institutos que não se confundem. O patrimônio

como projeção econômica da personalidade é o complexo de relações jurídicas de

economicamente. Incluem-se no patrimônio: a posse, os direitos reais, as obrigações e as ações correspondentes a tais direitos. O patrimônio abrange direitos e deveres redutíveis a dinheiro, consequentemente nele não estão incluídos os direitos de personalidade, os direitos pessoais entre cônjuges, os direitos oriundos do poder familiar, os direitos políticos. Sem embargo desta nossa opinião, há quem ache que o patrimônio não constitui uma universalidade de direito, mas de fato, por enquadrar-se no art. 90, enquanto somente a herança enquadrar-se-ia no art. 91. Os bens dó espólio ou herança formam um todo ideal, uma universalidade, mesmo que não constem de objetos materiais, contendo apenas direitos e obrigações (coisas incorpóreas). Assim sendo, a herança, objeto da sucessão causa mortis, é o patrimônio do falecido, ou seja, o conjunto de direitos e deveres que se transmite aos herdeiros legítimos e testamentários (DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. v. 1. Teoria Geral do Direito Civil. São Paulo: Saraiva, p. 381-382, 2012.). 357 O estabelecimento comercial é simples universalidade de fato. Esse conjunto de coisas, criado, constituído e dirigido pela vontade do homem, apresenta o caráter próprio, distinto dos seus elementos componentes, ainda, que estes não se constituam de coisas materiais, podendo, como tal, ser objeto de atos jurídicos (MENDONÇA, José Xavier Carvalho de. Tratado de Direito Comercial Brasileiro. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, p. 19, 1955, ). 358 No estado atual da ciência jurídica, em nosso país, e naqueles cuja cultura jurídica mais se lhe avizinha, o estabelecimento comercial deve ser definido como uma universalidade de fato. (BARRETO FILHO, Oscar. Teoria do Estabelecimento Comercial. 2. ed. São Paulo, Saraiva, 1988, p. 109). 359 FINKELSTEIN, Maria Eugênia. Manual de direito empresarial. 8. ed. rev. , ampliada e reformulada. São Paulo: Atlas, 2016, p. 40. 360 BARRETO FILHO, Oscar. A natureza jurídica do estabelecimento comercial. In: COELHO, Fábio Ulhoa (Org.). Tratado de Direito Comercial, v. 8: Estabelecimento empresarial, propriedade industrial e direito da concorrência. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 35.

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uma pessoa dotadas de valor econômico (art. 91, CC), nele se encontram, créditos,

direitos, bens particulares, obrigações etc. Enquanto o estabelecimento reflete

apenas o complexo de bens organizados para o exercício da empresa (art. 1.142,

CC), logo, uma pluralidade de bens singulares que, pertinentes à mesma pessoa,

têm destinação unitária (art. 90, CC).

Como projeção econômica da pessoa, em regra, o direito brasileiro

segue a máxima de que para cada pessoa existe patrimônio único (art. 91, CC),

sendo que o devedor responde, para o cumprimento de suas obrigações, com todos

os seus bens presentes e futuros, salvo as restrições estabelecidas em lei (art. 789,

CPC361).

Logo para o estudo da responsabilidade do empresário pelas

obrigações contraídas, é necessário averiguar a projeção do patrimônio e do

estabelecimento em cada uma das espécies de empresário: empresário individual;

sociedade empresária; e empresa individual de responsabilidade limitada (EIRELI).

O empresário individual é detentor de patrimônio único nos qual

estão inseridos seus bens pessoais e os da empresa (inclusive o estabelecimento);

logo tanto os bens pessoais como os da empresa responderão pelas dívidas

contraídas no exercício da atividade ou em sua vida pessoal.

A sociedade é uma pessoa jurídica, com personalidade própria e

distinta de seus sócios, com registro de seu ato constitutivo no órgão próprio. Como

ente personificado passará a ser detentora de direitos e obrigações e, portanto,

haverá a sua projeção econômica, o seu patrimônio. Não há confusão entre sócios e

sociedade, são sujeitos distintos, com seus próprios direitos e deveres. O credor de

uma sociedade, em regra, não o é de seus sócios e vice-versa.

Por fim, a empresa individual de responsabilidade limitada (EIRELI)

como pessoa jurídica, segue a mesma lógica da sociedade do tipo limitada, com a

distinção evidente de que a EIRELI é constituída por um único titular.

361 Art. 789. O devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para o cumprimento de suas obrigações, salvo as restrições estabelecidas em lei.

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Embora a personalidade jurídica, por ser única, não pode ser

desdobrada, tal como patrimônio, isso não é o que acontece com o

estabelecimento. O empresário, por diversos fatores, pode descentralizar a

operação, constituindo uma ou mais filiais.

O estabelecimento, como vimos, é um complexo de bens

organizados e, por isso, não se confunde com o local onde a atividade empresarial é

explorada, porém é fato que o imóvel, próprio ou não, pode ser um dos elementos

do estabelecimento, na medida em que o ponto é um intangível relevante ao

empresário.

O estabelecimento principal, comumente chamado de matriz, é o

local de onde são emanadas as diretrizes do empresário, onde se localiza a sede de

seus negócios. Não basta o ato constitutivo de o empresário declarar um

determinado local como sendo a matriz, pois o conceito não é objetivo, mas

subjetivo, levando em consideração seu elemento econômico (art. 3º, LF)362.

Organizações empresariais existem que, pela sua dimensão, atuam com diversos estabelecimentos. Surge, então, o problema de se conceituar qual é o estabelecimento principal, ou matriz, em confronto com outros estabelecimentos da mesma estrutura empresarial. Em muitos casos, como se verá, o principal estabelecimento não coincide com a sede estatutária que é indicada no contrato ou estatutos, para certos efeitos jurídicos, sobretudo para determinar o domicílio. A anterior Lei de Falências, por exemplo, dispunha que "é competente para declarar a falência o juiz em cuja jurisdição o devedor tem o seu principal estabelecimento ou casa filial de outra situada fora do Brasil" (Dec.- lei n. 7.661, de 21-6-1945, art. 7°). A nova Lei de Falências, lei nº. 11.101/2005, no art. 3º, estabelece que “é competente para homologar o plano de recuperação extrajudicial, deferir a recuperação judicial ou decretar a falência o juízo do local do principal estabelecimento do devedor ou da filial de empresa que tenha sede fora do Brasil”. O critério para se determinar o principal estabelecimento integrante de uma empresa não leva em conta a dimensão física dos seus diversos estabelecimentos. Conceitua-se o principal estabelecimento tendo em vista aquele em que se situa a chefia da empresa, onde efetivamente atua o empresário no governo ou no comando de seus negócios, de onde emanam as suas ordens e instruções, em que se procedem as operações comerciais e financeiras de maior vulto e em massa. Nesse estabelecimento, por ser o centro das decisões da empresa, contabilizam-

362 Art. 3o É competente para homologar o plano de recuperação extrajudicial, deferir a recuperação judicial ou decretar a falência o juízo do local do principal estabelecimento do devedor ou da filial de empresa que tenha sede fora do Brasil.

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se as suas contas e, por isso, aí se encontram os livros comerciais, sobretudo os livros obrigatórios e os livros fiscais363.

Filial, agência e sucursal são expressões sinônimas, inexistindo no

direito qualquer distinção, porém cada expressão é usada por determinados ramos

de atuação (ex. uso da expressão agência para identificar as filiais de instituições

financeiras). O estabelecimento filial representa a descentralização do

estabelecimento como quando, por exemplo, um determinado empresário que

explora o comércio de pneumáticos (borracharia) pretende ampliar sua atuação

abrindo outras lojas.

Pela legislação vigente, o empresário que pretende constituir

estabelecimento secundário deverá averbar sua filial na Junta Comercial da

respectiva sede. Se a filial, agência ou sucursal for constituída em lugar sujeito à

jurisdição de outra Junta Comercial, nesta deverá também inscrevê-la, com a prova

da inscrição originária (arts. 969 e 1.000, CC).

E, por fim, o estabelecimento pode ser objeto unitário de direitos e

de negócios jurídicos, translativos ou constitutivos, que sejam compatíveis com a

sua natureza (art. 1.143, CC), como sua alienação, arrendamento e o usufruto (art.

1.144, CC) e, em decorrência de sua importância para atividade empresarial e,

principalmente, como meio de garantia das obrigações do empresário perante seus

credores, a legislação tratou de estipular regras de validade do negócio jurídico

(arts. 1.144 e 1.145, CC), de responsabilidade entre os estipulantes (art. 1.146, CC)

e do não reestabelecimento (art. 1.147, CC).

4.2. Os elementos e os atributos do estabelecimento

Como um complexo organizado de bens, o universo formado pelo

estabelecimento é preenchido por bens singulares, considerados em si mesmo.

Dentre esses elementos estão os bens materiais e imateriais. Os bens materiais são

os que possuem existência física, são bens móveis e imóveis, como o prédio

industrial, os equipamentos, os maquinários, os utensílios, as mercadorias, as

363 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. v. 1, 31. ed., São Paulo: Saraiva, 2012, p. 342-343.

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matérias primas, as materiais de escritório, de informática etc. Os bens imateriais

são aqueles concebidos mental ou juridicamente, um processo de abstração, que

possuem valores econômicos próprios, como a patente de invenção, a marca, o

título do estabelecimento, o ponto etc.

Tais bens, em determinadas circunstâncias, ultrapassam, em valor econômico, os bens materiais, o que não é difícil constatar em inúmeros estabelecimentos em que os bens materiais são do valor exíguo – um balcão frigorífico, prateleiras, reduzida quantidade de mercadorias, que cada dia se renova -, mas localizados em excelentes pontos empresariais para os quais aflui intensa freguesia364. (destaque do original).

Além dos elementos mencionados, também são perceptíveis os

chamados atributos do estabelecimento, aqueles não classificados como bens

imateriais, mas como bens juridicamente protegidos, como o aviamento e a

clientela.

Tanto o aviamento, – consequência da organização dos bens que

formam o estabelecimento –, quanto a clientela, – conjunto de pessoas que

procuram o empresário por seus produtos ou serviços – não são propriamente bens

imateriais, mas bens juridicamente protegidos, como a honra, a dignidade etc. e, por

isso, não são tratados como elementos do estabelecimento, mas como atributos

indissociáveis deste.

O aviamento e a clientela são emanações e desdobramentos da

atuação empresarial. Isso significa dizer que, com o fim da empresa (atividade), eles

se extinguirão por via de consequência.

O dinamismo dos elementos que compõem o estabelecimento não

lhe retira a unidade, ou seja, quando um empresário adquire matéria-prima para a

produção dos bens a que se dedica, tal matéria-prima incorpora-se a seu

estabelecimento. Dessa forma, a venda do produto final evidentemente retira-o do

estabelecimento, o estabelecimento, porém, não se descaracteriza, pois é

exatamente tal dinamismo que caracteriza o complexo organizado de bens do

empresário. Essa organização é a principal característica que se sobressai nos 364 PEREIRA, Ademar; ALMEIDA, Amador Paes de. Manual do estabelecimento comercial. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 42.

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conceitos de perfis de empresa e que está também presente no conceito da

natureza do estabelecimento.

A organização dos elementos do estabelecimento atribui um

sobrevalor ao complexo de bens que o integram, uma vez que está a serviço da

produção e do lucro, ou seja, há uma agregação de valor àquele complexo de bens,

de tal forma que o valor do estabelecimento é superior à soma dos valores dos bens

unitários que o compõem365.

Conclui-se, do exposto, que, sendo o aviamento atributo que em certo sentido identifica o estabelecimento como seu característico modo de ser, não existe estabelecimento sem aviamento, o que pode variar é unicamente sua medida, de modo a falar-se de estabelecimento mais ou menos aviado (supra, n. 130). Em todo estabelecimento, por conseguinte, será preciso proteger este sobre-valor, que surge com a criação da casa comercial e perdura até a sua extinção. Mas a tutela do aviamento não é sancionada diretamente pela lei; decorre, indiretamente, da proteção conferida aos seus fatores (ponto de negócio, relações de trabalho, marcas, patentes de invenção etc.). É preciso ter em mente esse fato, porque, se o sobre-valor do aviamento é uma função dos seus fatores, qualquer dano sofrido por este repercute necessariamente naquele366.

O aviamento ou goodwill não é o estabelecimento, nem o seu valor,

mas um sobrevalor que se atribui ao estabelecimento pela organização do complexo

de bens singulares que o compõem. É a capacidade do estabelecimento de gerar

lucro. O valor do estabelecimento é formado por todos os elementos que o integram,

por seus bens materiais e imateriais, mas seu valor agregado está presente na

organização desses bens para alcançar o lucro (aviamento).

Vitalizando e impulsionando o capital e o trabalho, o elemento organização é o principal fator de eficiência de um estabelecimento. Bens e serviços devem ser intimamente combinados e organizados, dependendo a eficiência do estabelecimento não apenas, como já foi visto, de uma adequada proporção entre os seus diversos elementos, como de seu funcionamento equilibrado e harmônico. Não basta que um estabelecimento seja bem instalado em ótimo ponto. Não é suficiente que sejam as melhores as mercadorias em estoque. Nem é bastante que seu pessoal seja competente e honesto. É indispensável, além disto, que o estabelecimento tenha boa organização para que seja eficiente e dê lucros que o proprietário tem em vista. Daí resultar que, uma vez adquirida pela

365 De forma simples, temos que o aviamento constitui a capacidade do estabelecimento empresarial em gerar lucros (FINKELSTEIN, Maria Eugênia. Manual de direito empresarial. 8. ed. rev., ampliada e reformulada. São Paulo: Atlas, 2016, p. 41). 366 BARRETO FILHO, Oscar. Teoria do Estabelecimento Comercial. 2. ed. São Paulo, Saraiva, 1988, p. 178.

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organização um certo grau de eficiência, o valor econômico do estabelecimento, como um todo organizado, é superior ao da soma dos elementos em que se desdobrem o capital e o trabalho nele empregados367.

A doutrina costuma diferenciar duas espécies de aviamento: o

objetivo, que seria a aptidão de produzir lucros em razão de fatores relacionados

com o próprio estabelecimento; e o subjetivo, relacionado à pessoa de seu titular.

A distinção entre aviamento objetivo e aviamento subjetivo tem consequências práticas relevantes, não só no que diz respeito à doutrina da concorrência desleal e às limitações convencionais da concorrência, como também no que concerne aos negócios jurídicos que têm por objeto o estabelecimento. Com efeito, somente se pode considerar como inerente ao estabelecimento, independentemente do titular, o aviamento objetivo, que, sendo uma qualidade ou atributo do objeto do direito, com ele se transmite ao novo titular. Ao contrário, o aviamento subjetivo, que é imanente, à pessoa do comerciante, não se transmite diretamente ao novo titular. Isto não obsta a que, de modo, indireto, se possa beneficiar o novo titular com o aviamento pessoal de seu criador, através da estipulação da cláusula de não restabelecimento do alienante [....]368.

Para Fábio Ulhoa Coelho:

Quando se negocia o estabelecimento empresarial, a definição do preço a ser pago pelo adquirente se baseia fundamentalmente no aviamento, isto é, nas perspectivas de lucratividade que a empresa explorada no local pode gerar. Isto não significa que se trate de elemento integrante do complexo de bens a ser transacionado. Significa unicamente que a articulação desses bens, na exploração de uma atividade econômica, agregou-lhes um valor que o mercado conhece369.

Já a clientela está intimamente relacionada ao estabelecimento, pois

é o conjunto das pessoas que procuram o empresário para consumir os produtos ou

serviços por ele oferecidos, formando parte do intangível de seu patrimônio e

possuindo valor agregado por ser uma manifestação do aviamento.

A clientela, por sua vez, é uma decorrência natural do aviamento, sendo que não se pode falar em um direito à clientela, uma vez que é justamente o aviamento, que decorre da organização empresarial, que torna o

367 BORGES, João Eunápio. Curso de direito comercial terrestre. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1971, p. 182. 368 BARRETO FILHO, Oscar. Teoria do Estabelecimento Comercial. 2. ed. São Paulo, Saraiva, 1988, p. 176. 369 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. Direito de empresa, v. I, 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 101.

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estabelecimento um objeto atraente para o negócio jurídico que se denomina trespasse370.

Por isso que a clientela, assim como o aviamento, não se considera

um bem imaterial, não se caracteriza como um elemento do estabelecimento, mas,

sim, como um seu atributo. É certo que, se eventualmente a carteira de clientes de

um empresário caísse nas mãos de um concorrente, esse se beneficiaria e aquele

sofreria perda de sua competitividade, pois poderia ocorrer o desvio da clientela e,

consequentemente, advirem prejuízos ao empresário.

Quando o estabelecimento é explorado, forma-se uma clientela atual; quando não o é, existe a possibilidade de uma clientela potencial. Por isso a interrupção na exploração do estabelecimento provoca o desvio da clientela e, por consequência, a diminuição do aviamento. O negócio que permanece com as portas cerradas, pouco a pouco se vai apagando na lembrança do público, e, mesmo quando é reaberto levará algum tempo até que a antiga clientela volte a procurá-lo371.

Dada a importância da clientela para o empresário, a lei a considera

como um bem juridicamente protegido e, por isso, na Lei de Propriedade Industrial

(Lei n.º 9279/1996) comete crime de concorrência desleal quem “emprega meio

fraudulento, para desviar, em proveito próprio ou alheio, clientela de outrem” (art.

195, III, LPI372).

4.3. Os principais elementos na apuração de haveres

No capítulo anterior, analisamos em linhas gerais a apuração de

haveres, a ser realizada após ocorrer uma das hipóteses de dissolução parcial das

sociedades contratuais, necessária para verificar qual valor será devido a título de

reembolso ao sócio em decorrência de seu afastamento da sociedade e concluímos

que, no caso de os sócios não chegarem a um consenso, necessário se faz buscar

a via judicial. Cabe ao magistrado pontuar quais critérios serão utilizados na

apuração de haveres, consoante os artigos 1.031 do Código Civil e 606 do Código

de Processo Civil.

370 FINKELSTEIN, Maria Eugênia. Manual de direito empresarial. 8. ed. rev., ampliada e reformulada. São Paulo: Atlas, 2016, p. 41. 371 BARRETO FILHO, Oscar. Teoria do Estabelecimento Comercial. 2. ed. São Paulo, Saraiva, 1988, p. 183. 372 Art. 195. Comete crime de concorrência desleal quem: III - emprega meio fraudulento, para desviar, em proveito próprio ou alheio, clientela de outrem;

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Por conta dos referidos dispositivos legais, a apuração de haveres

deve respeitar o disposto no contrato social ou na lei, sendo que a doutrina e a

jurisprudência têm entendido que o critério convencional somente deve ser utilizado

caso seu resultado seja igual ou superior ao do critério legal.

O critério legal aponta para o balanço de determinação, que deverá

levantar o valor patrimonial da sociedade, tomando como base a data de resolução

determinada pelo juiz à luz dos artigos 605 e 607 do Código de Processo Civil. Para

chegar a esse valor patrimonial, é necessário que o perito avalie os bens e os

direitos do ativo, tangíveis e intangíveis, a preço de saída, além do passivo também

a ser apurado de igual forma (art. 606, CPC). Para que o perito nomeado pelo juiz

possa fazer a avaliação do patrimônio líquido por meio do balanço de determinação,

é necessário que o magistrado indique quais elementos devem ser considerados

para apuração de haveres e por qual critério esses elementos devem ser avaliados.

O procedimento para determinação dos haveres é de cunho jurídico, pois é o Direito que deverá dizer quais são os elementos que deverão ser considerados e sob quais critérios deverão ser avaliados. A resolução do contrato social em relação a um determinado sócio é o fato jurídico que neste caso está levando a uma específica consequência, que é a apuração de haveres. As implicações decorrentes deste fato só ao Direito cabe determinar, principalmente porque se deve ter claro que, para se determinar quais os elementos a avaliar, e sob qual critério serão, há primeiro que se dizer quais são os direito do sócio afastado. Nesse sentido que se pode concluir ser a apuração de haveres instituto próprio do Direito. Os princípios aplicáveis a este procedimento são decorrentes de sua causa: a dissolução parcial. Repita-se: não obstante o nome se assemelhe (por puro hábito doutrinário e jurisprudencial), em absolutamente nada pode tal instituto ser confundido com a dissolução total e sua consequente liquidação.373

Não há dúvidas de que o principal ativo do empresário são os bens

integrantes de seu estabelecimento, pois é nele que se encontra a maioria, quiçá a

totalidade, dos bens materiais e imateriais de seu patrimônio.

A sociedade empresária pode também adquirir bens que não são

utilizados no exercício da empresa e, assim, não seriam considerados com

373 RIBAS, Roberta de Oliveira e Corvo. Apuração de haveres na sociedade empresaria limitada. In: COELHO, Fabio Ulhoa (Coord.). Tratado de Direito Comercial, v. 2. Tipos societários, sociedade limitada e sociedade anônima. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 268.

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integrantes do estabelecimento. Esses bens, assim como aqueles que guarnecem o

estabelecimento, devem ser apurados no balanço de determinação para o cômputo

do valor a ser reembolsado ao sócio desligado.

São inúmeros os bens que integram o patrimônio da sociedade,

sendo descabido, neste trabalho, o exame contábil das peculiaridades de todos.

Como regra, os haveres são um conjunto de valores, composto pela contribuição original do sócio para formação do capital social, que se reduzirá com seu desligamento, e pelo quinhão do ex-sócio nos lucros, reservas voluntárias, créditos em conta disponível, bens móveis e imóveis, estoques, maquinários, patentes, softwares, etc. Desse conjunto de valores, serão deduzidas as dívidas, os tributos devidos e as demais contas passivas da sociedade, liquidando-se os haveres374.

A doutrina e a jurisprudência têm divergido sobre quais elementos

devem ser utilizados para apuração de haveres, especialmente os chamados bens

intangíveis ou imateriais.

4.3.1. A inclusão dos bens imateriais e do aviamento na apuração de haveres

Parte da doutrina375 e da jurisprudência376´377 aproxima o balanço de

determinação a uma simulação do que seria a liquidação da sociedade,

considerando o preço de saída como aquele que se teria no caso da extinção da

pessoa jurídica, porém sem considerar os bens imateriais como o ponto, a clientela,

o aviamento etc.

Os bens imateriais ou incorpóreos, tais como o direito ao ponto, a clientela, o aviamento, entre outros, mão devem integrar o patrimônio liquida social

374 BARBI FILHO, Celso. Dissolução parcial de sociedades limitadas. Belo Horizonte: Mandamentos, 2004, p. 482. 375 ESTRELLA, Hermani. Apuração de haveres de sócio. 5.ed. atual. por Roberto Papini Ed.. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 125-127. BARBI FILHO, Celso. Dissolução parcial de sociedades limitadas. Belo Horizonte: Mandamentos, 2004, p. 482. COELHO, Fábio Ulhoa. O valor patrimonial das quotas na sociedade limitada, São Paulo, Revista de Direito Mercantil, industrial, econômico e financeiro, n. 123, jul./set. 2001, p. 74. 376 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 453476 GO, Relator: Ministro Antônio De Pádua Ribeiro, Data de Julgamento: 01/09/2005, T3 - Terceira Turma, Data de Publicação: DJe 12/12/2005. 377 SOCIEDADE POR COTAS DE RESPONSABILIDADE LIMITADA. DISSOLUÇÃO PARCIAL. LEGITIMIDADE PASSIVA. APURAÇÃO DE HAVERES. BALANÇO ESPECIAL. - A ação de dissolução parcial deve ser promovida pelo sócio retirante contra a sociedade e os sócios remanescentes, em litisconsórcio necessário. Precedentes. - Na dissolução de sociedade por cotas de responsabilidade limitada, a apuração de haveres do sócio retirante deve ter em conta o real valor de sua participação societária, como se de dissolução total se tratasse. Precedentes. Recursos não conhecidos (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 105667 SC, Relator: Ministro Barros Monteiro, Data de Julgamento: 26/09/2000, T4 - Quarta Turma, Data de Publicação: DJe 06/11/2000).

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para apuração de haveres porque fatalmente acarretariam a dissolução total da sociedade diante da provável ausência de liquidez para composição de tais valores em benefício do sócio que se retirar. Ademais, se na dissolução total não se leva em conta tais elementos para realização do ativo liquidando, por que deveria o sócio retirante beneficiar-se desses elementos na dissolução parcial? Se o fim da dissolução parcial é a permanência da entidade empresarial, não há sentido o sacrifício total desta em benefício exclusivo do sócio que se afasta, porquanto, os bens imateriais da empresa só têm razão de ser enquanto esta exista.378

A justificativa para a exclusão dos bens intangíveis do cálculo da

apuração de haveres reside no fato de que esses ativos só existem na empresa em

funcionamento; logo, se há uma simulação de liquidação da sociedade, com

cessação da atividade, não haveria de se falar de ativos imateriais379.

Nessa linha, por entender tratar-se de uma encenação de dissolução total, considera-se que o valor referente ao fundo de comércios não de ser computado uma vez que se dissolução total fosse, não seria realizável aos sócios em partilha. Ou seja, caso se decidisse pela dissolução total, ao se levantar o balanço para esse fim, não se consideraria a totalidade dos ativos intangíveis, visto que estes não podem ser objeto de alienação isolados do negócio como um todo. Seguindo o raciocínio de confundir apuração de haveres com liquidação, também não poderia o fundo de comércio ser considerado para fins de dissolução parcial. No mesmo compasso, calcula-se o valor do passivo como se exigível fosse imediatamente, incluindo no cômputo até mesmo o que seria débito trabalhista. Essa estimativa faz sentido para aqueles que entendem ser a dissolução parcial uma subespécie da total, de tal forma que o sócio afastado deva receber exatamente o que qualquer sócio receberia caso a sociedade fosse devidamente liquidada.380

Bulgarelli381 também se filia ao mesmo argumento quanto à

necessidade de preservação da sociedade para negar a inclusão do aviamento no

cálculo dos haveres, já que poderia prejudicar o prosseguimento da atividade

empresarial, cuja existência e exercício são vitais para a economia. Entende que a

inclusão de valores a título de aviamento no cálculo dos haveres poderia, inclusive,

378 JUNIOR PERIN, Écio. A dissolução da sociedade limitada de acordo com o novo código civil. In: DE ALMEIDA, Marcus Elidius Michelli (Coord.). Aspectos jurídicos da sociedade limitada. São Paulo: Quartier Latin, 2004, p. 336. BARBOSA, Henrique Cunha. Dissolução parcial, recesso e exclusão de sócio: diálogos e dissensos na Jurisprudência do STJ e nos Projetos de CPC e Código Comercial. In: AZEVEDO, Luís André N. de Moura; DE CASTRO, Rodrigo R. Monteiro. Sociedade Limitada Contemporânea. 1. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2013, p. 385-389. 379 ESTRELLA, Hermani. Apuração de haveres de sócio. 5.ed. atual. por Roberto Papini. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 126. 380 RIBAS, Roberta de Oliveira e Corvo. Apuração de haveres na sociedade empresaria limitada. In: COELHO, Fabio Ulhoa (Coord.). Tratado de Direito Comercial, v. 2. Tipos societários, sociedade limitada e sociedade anônima. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 277. 381 BULGARELLI, Waldírio. O novo direito empresarial. Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 178.

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produzir resultados contrários à finalidade para a qual a dissolução parcial foi

concebida, qual seja, a preservação da empresa.

Parte da doutrina entende que, na apuração de haveres, os bens

imateriais devem ser analisados isoladamente, sendo apurados aqueles que podem

ser valorados individualmente, isto é, aqueles que poderiam ser alienados

separadamente. Nessa posição, o aviamento não entraria no cômputo, pois é

decorrência do conjunto dos bens do estabelecimento, só aparecendo com sua

existência e durante o funcionamento da empresa, o que não comportaria valoração

isolada382.

De forma resumida, Priscila M.P. Corrêa da Fonseca relaciona as

premissas daqueles que negam a inclusão do fundo de comércio na apuração de

haveres:

1. O Supremo Tribunal Federal, ao fixar os limites da liquidação dos haveres do sócio que se despediu da sociedade, prescreveu que a liquidação deveria ser feita com a maior amplitude possível, com plena verificação física e contábil dos valores do ativo. O nome, o ponto etc. não são elementos que se encontrem inseridos no ativo de uma sociedade, denotando-se, por isso, insuscetível de avaliação. 2. O objetivo da dissolução parcial, na forma idealizada por nossos pretórios, é assegurar, tanto quanto possível, resultado próximo ao da dissolução total. Ora, se os bens incorpóreos não se convertem em moeda e, por via de efeito, não integram a liquidação derradeira da sociedade,

382 Penso que a solução da polêmica não permite olvidar-se a dissolução parcial strito sensu, como figura estribada nos arts. 335, n. 5, ou 336, do Código Comercial, aplicáveis com exegese que lhes dá a jurisprudência, quando inexiste cláusula contratual sobre retirada ou esta é comprovadamente lesiva ao sócio. Nesses casos, os bens do ativo serão avaliados física e contabilmente, a preços de mercado, como se dissolução total fosse haver, incluindo-se aí aqueles imateriais ou incorpóreos passíveis de alienação isolada. Ora, se é criada uma ficção contábil, de que o procedimento de liquidação parcial seria o mesmo da total os elementos do ativo, a preço de mercado, essa ficção há de ser também aplicada em seu outro efeito, qual seja: o de que o dissidente não pode se beneficiar de intangíveis, só existentes com a sociedade em funcionamento e inalienáveis isoladamente. Com efeito, procedendo-se na verificação do ativo como se dissolução total fosse haver, descabido seria computarem-se intangíveis que só têm valor com a continuação da empresa. Inexiste fundo de comércio em empresa liquidada, mas fundo de negócio. Caso contrário, o preceito consolidado pelo STF teria dois pesos e duas medidas. O sócio retirante beneficiar-se-ia dos efeitos fictos de uma apuração de haveres, como se dissolução total fosse haver, mas não suportaria as consequências de um procedimento que pressupõe esse estado imaginário de liquidação total e encerramento da empresa. De outro lado, nos casos de apuração de haveres por retirada contratual, recesso, exclusão, morte ou falência de sócio, hipóteses em que, até por norma legal, a empresa continua em funcionamento após a retirada, também não se pode cogitar de avaliação e pagamento do intangível resultante do uso do conjunto do fundo de comércio, pois, “capitalizar o aviamento com base exclusiva na esperança de lucros é jogar no futuro”. Assim, os haveres são apurados na forma do contrato ou pelo último balanço aprovado, sendo inconcebível adicionar-se o valor do fundo de comércio, que continuará em atividade e terá, inclusive, menor valor após o pagamento dos haveres do retirante (BULGARELLI, Waldírio. O novo direito empresarial. Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 493-495).

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nada justifica a inclusão do respectivo valor no rol daqueles devido ao sócio que se afasta da sociedade. 3. O pagamento do valor relativo aos bens imateriais implica necessariamente a venda de bens integrantes do ativo. A falta destes pode acabar por impedir ou prejudicar sobremaneira o prosseguimento da empresa, produzindo resultado diverso daquele para o qual a dissolução parcial foi concebida. 4. Para os partidários da posição ora examinada, a exclusão da verba relativa ao fundo de comércio do cômputo dos haveres do retirante, ainda que viesse a ensejar enriquecimento da sociedade e dos sócios que nela remanescem, nada teria de injurídico. Tendo em vista que o objetivo da dissolução parcial é a conservação da empresa em sua integralidade, o interesse particular do sócio não pode preponderar sobre o da sociedade pois este, muitas vezes, sobrepaira, até mesmo, acima da soma dos interesses dos sócios. Recorde-se, a título de meramente exemplificativo, que o direito de voto deve ser proferido sempre no interesse da sociedade (Lei nº. 6.404/76, art. 115) ou ainda que malgrado o balanço da sociedade possa apontar a existência de lucros, nem por isto deverão ser estes necessariamente distribuídos (Lei nº. 6.404/76, art. 196). 5. Inexiste norma legal que determine a avaliação de tais bens, por ocasião da retirada do sócio. 6. Os bens intangíveis – em razão da respectiva função instrumental na vida da empresa – a esta de tal modo aderem, que não podem ser transferidos ou cedidos isoladamente. Independentemente da empresa – não seria exagerado afirmar – muitos de tais elementos sequer têm existência própria ou autônoma383.

Doutra parte, há a doutrina e a recente posição jurisprudencial da

Superior Tribunal de Justiça384, que defendem pela inclusão na apuração de haveres

tanto dos bens imateriais, quanto o aviamento, sob pena de enriquecimento

indevido dos sócios remanescentes. Essa posição se orienta pelo fato de eles

serem parte do patrimônio da sociedade e, portanto, indissociável desta385.

383 FONSECA, Priscila M.P. Corrêa da. Dissolução parcial, retirada e exclusão de sócio no Novo Código Civil. 3. ed., São Paulo: Atlas, 2005, p. 228-230. 384 DIREITO SOCIETÁRIO. DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE. APURAÇÃO DEHAVERES. INCLUSÃO DO FUNDO DE COMÉRCIO. 1. De acordo com a jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça, o fundo de comércio (hoje denominado pelo Código Civil de estabelecimento empresarial - art. 1.142) deve ser levado em conta na aferição dos valores eventualmente devidos a sócio excluído da sociedade. 2. O fato de a sociedade ter apresentado resultados negativos nos anos anteriores à exclusão do sócio não significa que ela não tenha fundo de comércio. 3. Recurso especial conhecido e provido (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 907014 - MS, Relator: Ministro Antônio Carlos Ferreira, Data de Julgamento: 11/10/2011, T4 - Quarta Turma, Data de Publicação: DJe 19/10/2011). COMERCIAL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE APURAÇÃO DE HAVERES. COISA JULGADA NÃO IDENTIFICADA. PREQUESTIONAMENTO DEFICIENTE. CRITÉRIO DE LEVANTAMENTO PATRIMONIAL. DECRETO N. 3.708/1919, ART. 15. EXEGESE. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO CARACTERIZADA. I. Não se configura coisa julgada se na ação anterior o sócio excluído buscava a anulação do ato que o excluiu, apenas apreciando-se tal tema desfavoravelmente ao mesmo, e na presente demanda, tornado irreversível o seu afastamento da sociedade, discute-se o critério de apuração dos seus haveres. II. Deficiência de prequestionamento a impedir o exame do especial em toda a sua extensão. III. Afastado o sócio minoritário por desavenças com os demais, admite-se que a apuração dos haveres se faça pelo levantamento concreto do patrimônio empresarial, incluído o fundo de comércio, e não, exclusivamente, com base no último balanço patrimonial aprovado antes da ruptura social. IV. Dissídio não configurado. V. Recurso especial não conhecido (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 130617 - AM, Relator: Ministro Aldir Passarinho Junior, Data de Julgamento: 18/10/2005, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 14.11.2005). 385 Entretanto, persiste questão de fundo, qual seja, como proceder à avaliação como se dissolução total se tratasse, quando a jurisprudência determina a inclusão do goodwill ou aviamento? Dissolução total é liquidação;

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O critério acima mencionado merece críticas, pois trabalha com uma situação irreal, isto é, como se a sociedade, do dia para a noite, estivesse encerrando as suas atividades. Ora, no nosso humilde entender, não é possível querer avaliar uma sociedade que está em pleno funcionamento como se estivesse sendo liquidada, pois nos parece óbvio que o valor de uma sociedade, que gera riquezas e está ativa no mercado, é bem diferente daquela que está sendo liquidada, vendendo o seu patrimônio e não o seu negócio. Apenas para elucidar o nosso pensamento, basta imaginar uma sociedade que tenha por objeto o ramo de restaurantes. O ativo dessa sociedade será as mesas, cadeiras, fogão, geladeira, computador, pratos, talheres, copos etc. Todos usados no decorrer do tempo de existência do restaurante. Pois bem, valendo-se do critério de apuração de haveres como se dissolução total fosse, o ativo seria avaliado a preço de venda real de mercado, nas condições em que se encontram (usados!). Perguntamos, então, qual valor poderia ser obtido na avaliação desse patrimônio? A avaliação seria diferente se tomasse por base não os bens isoladamente, mas o negócio que representa essa sociedade. É claro que o valor apurado para os bens será completamente diferente se tomado por base a venda das mesas e cadeiras ou se considerado o restaurante em pleno funcionamento. É inegável que a empresa possui um valor de mercado deveras superior ao que consegue obter numa simples análise contábil como se dissolução total fosse386.

Também na linha da inclusão do fundo de comércio na apuração de

haveres, Priscila M.P. Corrêa da Fonseca tratou de arrolar os principais argumentos:

1. Deixar de concedê-la ao sócio que se despede da sociedade significa referendar o enriquecimento da empresa e dos sócios que nela permanecem, às custas do empobrecimento daquele que também contribuiu com a sua quota e participação social para a formação do fundo. 2. Os valores correspondentes aos bens intangíveis e ao aviamento, além de apresentarem, em muitos casos, significativa expressão pecuniária, em outros tantos constituem a verdadeira essência do negócio, sendo que, não raro, nessas hipóteses, de quase nada valem os demais bens materiais. 3. O valor relativo ao fundo de comércio deve ser obrigatoriamente objeto de avaliação, dado que o mesmo faz parte integrante do patrimônio da sociedade.387

em procedimentos de liquidação, não há que se falar em goodwill ou aviamento. O fundo de comércio, enquanto universalidade dos bens corpóreos e incorpóreos, extingue-se. A sinergia dessa universalidade esvai-se, restando tão somente aqueles ativos tangíveis ou corpóreos e mesmo alguns intangíveis passíveis de realização monetária, como, por exemplo, ponto comercial e marca. O comando se dissolução total fosse encaminha o perito em contabilidade para os procedimentos de elaboração do balanço de liquidação, ou seja, os componentes patrimoniais são avaliados por seus valores prováveis de realização. Não há futuro a ser considerado e, consequentemente, não haveria goodwill ou aviamento a ser mensurado. Entretanto, não é esse o sentido do comando jurisprudencial, já que determina a inclusão do goodwill ou aviamento (ORNELAS, Martinho Maurício Gomes de. Avaliação de sociedades. São Paulo: Atlas, 2001, p. 108). 386 DE ALMEIDA, Marcus Elidius Michelli. Sociedade Limitada: causas de dissolução parcial e apuração de haveres. In: BRUSHI, Gilberto Gomes (Coord.). Direito Processual Empresarial: estudos em homenagem ao professor Manoel de Queiroz Pereira Calças. 1.ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012. p. 551. 387 FONSECA, Priscila M.P. Corrêa da. Dissolução parcial, retirada e exclusão de sócio no Novo Código Civil. 3. ed., São Paulo: Atlas, 2005, p. 231.

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Não há como negar que essa celeuma sobre a inserção ou não da

verba concernente aos bens imateriais e ao aviamento (goodwill) no valor a ser

verificado a título de apuração de haveres é, a nosso ver, superada com a entrada

em vigor do Código de Processo Civil, pois o artigo 606388 explicitou ser necessária

a avaliação dos bens e direitos do ativo, tangíveis e intangíveis, a preço de saída,

além do passivo também a ser apurado de igual forma.

Assim, a redação da norma adjetiva afastou a distinção feita na

doutrina de Celso Barbi Filho389 que buscava diferenciar os bens imateriais ou

incorpóreos dos intangíveis, em que estariam inseridos o aviamento e a clientela,

justificando que apenas os primeiros estariam inseridos na apuração de haveres.

Dessa forma, podendo-se avaliar individualmente na dissolução parcial os bens imateriais, ou incorpóreos, passíveis de alienação destacada do restante da empresa, deve-se assim proceder, computando-se-lhes no valor do ativo da apuração de haveres do dissidente. É o que ocorre, por exemplo, com o ponto, as concessões comerciais ou públicas, as marcas e patentes, o software, o know-how, o direito à renovação locatícia e o próprio título do estabelecimento. Diferente é a situação dos chamados bens intangíveis, que são os valores resultantes do uso do conjunto de todo o patrimônio da sociedade para a consecução de seu objeto social, como se passa a verificar390.

Ocorre que essa distinção não se reflete na forma de apuração de

haveres, instituída pelo artigo 606 do Código de Processo Civil, que, de modo geral,

impõe a necessária avaliação dos todos os bens e direitos da sociedade, sejam

tangíveis ou intangíveis, acolhendo a atual interpretação do Superior Tribunal de

Justiça.

388 Art. 606. Em caso de omissão do contrato social, o juiz definirá, como critério de apuração de haveres, o valor patrimonial apurado em balanço de determinação, tomando-se por referência a data da resolução e avaliando-se bens e direitos do ativo, tangíveis e intangíveis, a preço de saída, além do passivo também a ser apurado de igual forma. Parágrafo único. Em todos os casos em que seja necessária a realização de perícia, a nomeação do perito recairá preferencialmente sobre especialista em avaliação de sociedades. 389 BARBI FILHO, Celso. Dissolução parcial de sociedades limitadas. Belo Horizonte: Mandamentos, 2004, p. 485-494. 390 BARBI FILHO, Celso. Dissolução parcial de sociedades limitadas. Belo Horizonte: Mandamentos, 2004, p. 488.

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4.3.2. Os lucros, reversas, fundos e o pro labore

A nova norma adjetiva determina que, até a data da resolução,

integram o valor devido ao ex-sócio, ao espólio ou aos sucessores a participação

nos lucros ou os juros sobre o capital próprio declarados pela sociedade e, se for o

caso, a remuneração como administrador (pro labore) (art. 608, CPC). Após a data

da resolução, o ex-sócio, o espólio ou os sucessores terão direito apenas à correção

monetária dos valores apurados e aos juros contratuais ou legais (art. 608, p. único,

CPC).

Ocorre que a nova lei processual foi silente com relação às reservas

e aos fundos. As reservas391 são partes do lucro que destinam à sociedade, podem

decorrer de lei, do contrato ou da vontade dos sócios. As reservas obrigatórias,

decorrentes de lei ou do contrato social, são pertencentes à sociedade e, portanto,

não devem entrar na apuração de haveres do ex-sócio, enquanto aquelas não

exigidas pela lei, instituídas pela vontade dos sócios, devem ser consideradas no

balanço especial392.

Os fundos são destinados para depreciação, desvalorização e

amortizações, buscam reajustar valores do ativo e traduzem perdas efetivas, que 391 FONSECA, Priscila M.P. Corrêa da. Dissolução parcial, retirada e exclusão de sócio no Novo Código Civil. 3. ed., São Paulo: Atlas, 2005, p. 239-240. 392 DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE. APURAÇÃO DE HAVERES. FUNDAMENTAÇÃOSUFICIENTE DO ACÓRDÃO. JULGAMENTO EXTRA PETITA. INOCORRÊNCIA.INCLUSÃO DOS FUNDOS DE COMÉRCIO E DE RESERVA E DOS DIVIDENDOS DENTREOS HAVERES. INTERESSE DE AGIR. SÓCIO RETIRANTE. EXISTÊNCIA AINDA QUEA SOCIEDADE E O SÓCIO REMANESCENTE CONCORDEM COM A DISSOLUÇÃO.OFENSA AO CONTRATO SOCIAL. INVIABILIDADE DE EXAME NO RECURSOESPECIAL. ENUNCIADO Nº 5 DA SÚMULA/STJ. JUROS MORATÓRIOS.INCIDÊNCIA. CARACTERIZAÇÃO DA MORA. HONORÁRIOS DE ADVOGADO.SUCUMBÊNCIA PARCIAL. ARTS. 20, 21, 131, 165, 293, 458-II, 460, CPC,668, CPC/1939, 955, 960, 963, CC. RECURSO DESACOLHIDO. I – A fundamentação sucinta, que exponha os motivos que ensejaram a conclusão alcançada, não inquina a decisão de nulidade, ao contrário do que sucede com a decisão desmotivada. II O fundo de comércio e o fundo de reserva instituído pela vontade dos sócios integram o patrimônio da sociedade e, por isso, devem ser considerados na apuração dos haveres, por ocasião da dissolução, sem que a sua inclusão caracterize julgamento extra petita. III – A inclusão, entre os haveres, dos dividendos porventura não pagos ao sócio retirante, ainda que não pedida expressamente, tem por objetivo evitar o enriquecimento indevido do sócio remanescente, não configurando julgamento extra petita. IV – O sócio que pretenda desvincular–se da sociedade tem interesse de agir, ainda que tenha havido concordância do outro sócio sobre a dissolução, uma vez que não se trata de mera alteração contratual, mas de levantamento dos valores patrimoniais devidos a quem pretende retirar–se, mostrando–se útil o ajuizamento da ação para esse fim. V – O exame de possível violação das cláusulas do contrato social da empresa, quanto à base de cálculo para o caso de retirada, refoge à competência desta Corte, a teor do verbete sumular nº 5/STJ. VI – Decorrido o prazo previsto no contrato social, após a notificação do sócio retirante ao remanescente sobre a dissolução, incorrem este e a sociedade em mora, tornando devidos, desde então, os juros moratórios. (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 271930 SP 2000/0080731-1, Relator: Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, Data de Julgamento: 19/04/2001, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJ 25/03/2002)

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afetam componentes do ativo e, portanto, pertencem à sociedade393, não cabendo

incluí-los na apuração dos haveres do sócio desligado394.

4.3.3. O passivo

O artigo 606 do Código de Processo Civil395, ao tratar do balanço de

determinação, se preocupa em declarar que o passivo deve ser tratado como o

ativo. Assim, o passivo deve ser levado a valor presente à data da resolução.

Evidente que o passivo não precisa ser efetivamente pago pela sociedade, mas

393 EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. EFEITO MODIFICATIVO. OITIVA DA PARTE EMBARGADA. SOCIEDADE POR QUOTAS DE RESPONSABILIDADE LIMITADA. CESSÃO DE COTAS ENTRE CÔNJUGES. FALECIMENTO DE SÓCIO E INGRESSO DE HERDEIROS NA SOCIEDADE. APURAÇÃO DE HAVERES: CRITÉRIOS. 1. Temas atinentes às condições da ação devem ser conhecidos e resolvidos em qualquer tempo e grau de jurisdição, o que abrange embargos declaratórios. Neste caso evidente que os embargos de declaração podem ter efeitos modificativo ou infringente. 2. O fato de um sócio, na sociedade por quotas de responsabilidade limitada, ter transferido suas cotas a esposa não impede venha ele também propor ação de dissolução da sociedade ou exclusão de sócio, se continua na condição de sócio perante a pessoa jurídica. Assunto que não foi versado no aresto embargado porque já solucionado em primeira instância, de forma correta, não tendo havido nenhuma manifestação das partes a respeito em apelação e contra-razões. 3. Falecimento de um sócio, mas com herdeiros devidamente habilitados, sem impugnação dos demais sócios, além do que o sócio majoritário expressamente concorda com o ingresso dos ditos herdeiros, ao contra-arrazoar o apelo destes, faz com que os herdeiros sejam tidos como sócios e possam prosseguir na demanda que visa dissolver a sociedade ou excluir o sócio. Tema que, além de não discutido pelas partes em nenhum instante, ainda contou com a já noticiada anuência explícita do sócio majoritário para com o ingresso dos sócios como herdeiros, o que levou o acórdão embargado, naturalmente, a não enfocá-lo, descabendo aqui também os embargos de declaração. Mais estranho seja o aludido sócio majoritário quem agora embarga. 4. A apuração de haveres deve ficar desde logo determinada, no que se mostram dignos de provimento os embargos de declaração nesta parte. Fatores que pareciam indicar devessem os critérios de apuração de haveres ficar para liquidação, mas que, com melhor reflexão, não prevalecem. Influências das causas da dissolução ou de exclusão de sócio nos critérios de apuração de haveres. Caso concreto em que o sócio excluído deve receber em plena e ampla verificação, física e contábil, dos valores do ativo e atualizados até a data do pagamento. Quanto aos elementos que compõem os haveres a serem recebidos pelo sócio afastado, tem-se que: a) devem ser apurados em balanço de determinação (Hernani Estrella), mas com base em plena verificação física e contábil dos bens do ativo, a serem corrigidos monetariamente até a data do pagamento (serão tomados os valores reais e não os contábeis); b) o ativo realizável a longo prazo será levado em conta, na proporcionalidade do tempo transcorrido até o momento do balanço de determinação; c) como o ativo a ser pago tem a ver com produto líquido, para este fim é considerado o passivo circulante, e, quanto ao passivo exigível a longo prazo, é levado em conta na proporção do tempo já transcorrido; d) dever ser considerados os eventuais bens imateriais, a serem apurados em liquidação; e) os lucros serão aqueles obtidos até o momento em que se tiver como afastado o sócio; f) devem ficar com a sociedade as reservas legais, Mao não as estatutária ou facultativas; no entanto, os fundos para depreciações, desvalorizações e amortizações ou assemelhados, estes também pertencem à pessoa jurídica; quanto às provisões e previsões, que se destinem a fazer face a eventualidades futuras, também serão proporcionalmente entregues ao sócio que se afasta;g) o sócio excluído deve ser tido como afastado no instante que o julgado pode ser executado, mesmo que provisoriamente, h) o pagamento dos haveres apurados deve ser feito de uma só vez, pois no caso concreto não se verifica a hipótese prevista no contrato social. (ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Embargos de Declaração nº 593127897, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sérgio Gischkow Pereira, Julgado em 07/12/1993) 394 BARBI FILHO, Celso. Dissolução parcial de sociedades limitadas. Belo Horizonte: Mandamentos, 2004, p. 500. 395 Art. 606. Em caso de omissão do contrato social, o juiz definirá, como critério de apuração de haveres, o valor patrimonial apurado em balanço de determinação, tomando-se por referência a data da resolução e avaliando-se bens e direitos do ativo, tangíveis e intangíveis, a preço de saída, além do passivo também a ser apurado de igual forma.

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devem ser somadas todas as obrigações sociais, passadas, presentes e futuras,

integrais ou parceladas para o cômputo da apuração de haveres.

O levantamento do passivo não acarreta significativas indagações, já que não reclama o exame de questões que apresentem maior grau de complexidade. Para obtê-lo, cumpre ao expert nomeado pelo juiz apurar as dívidas da sociedade (fiscais, trabalhistas, bancárias, judiciais, provisão para devedores duvidosos, fornecedores, perdas julgadas prováveis etc.) existentes ao ensejo do momento em que se verifica o desligamento do sócio396.

396 FONSECA, Priscila M.P. Corrêa da. Dissolução parcial, retirada e exclusão de sócio no Novo Código Civil. 3. ed., São Paulo: Atlas, 2005, p. 222-223.

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CAPÍTULO V

APURAÇÃO DE HAVERES DE SOCIEDADE PROFISSIONAL

5.1. Da dissolução parcial da sociedade profissional

O jogo concertado nos artigos 966, parágrafo único, e 982, ambos

do Código Civil, qualifica a sociedade profissional como uma espécie de sociedade

simples (não empresária)397.

Por conta dessa caracterização, a sociedade profissional, salvo

disposição contrária em lei especial, pode adotar qualquer tipo societário, autorizado

pelo artigo 983 do Código Civil398, ou seja, a sociedade profissional pode adotar o

tipo nome coletivo, o tipo comandita simples ou o tipo limitada e, caso não opte por

nenhum desses tipos, será considerada sociedade simples “pura” (stricto sensu). A

adoção de tipo societário, no entanto, não descaracteriza a sociedade simples.

Independentemente do tipo societário escolhido pela sociedade

profissional, as regras concernentes à dissolução parcial lhe serão aplicadas,

inclusive, aquela específica ao direito de retirada na sociedade limitada com

regência supletiva da Lei de Sociedade Anônima estabelecida em contrato social

(art. 1.053, CC)399, pois as regras de dissolução parcial estão contidas em capítulo

próprio, destinado à sociedade do tipo simples pura, sendo aplicáveis de forma

subsidiária aos demais tipos de sociedade contratual.

Desse modo, com relação ao instituto da dissolução parcial,

caracterizada como gênero dos modos de saída de sócio sem a extinção da pessoa 397 Nova exceção ocorreria se os sócios da sociedade que explorar atividade intelectual optarem por adotar um dos tipos societários das Sociedades por Ações (Sociedade Anônima ou Sociedade em Comandita por Ações), que são consideradas empresárias ou Cooperativa, que são sempre simples, independentemente do objeto social explorado – art. 982, p. único, CC. 398 Art. 983. A sociedade empresária deve constituir-se segundo um dos tipos regulados nos arts. 1.039 a 1.092; a sociedade simples pode constituir-se de conformidade com um desses tipos, e, não o fazendo, subordina-se às normas que lhe são próprias. Parágrafo único. Ressalvam-se as disposições concernentes à sociedade em conta de participação e à cooperativa, bem como as constantes de leis especiais que, para o exercício de certas atividades, imponham a constituição da sociedade segundo determinado tipo. 399 Verificar no Capítulo II item 2.5. - Da dissolução parcial das sociedades limitadas e a regência supletiva das normas da lei de sociedade anônima.

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jurídica (dissolução total), não há distinções daquelas regras estudadas no Capítulo

II deste trabalho, cabendo uma análise mais profunda com relação à apuração de

haveres, pois, neste ponto, há grande controvérsia na doutrina e na jurisprudência.

5.2. Da apuração de haveres na sociedade profissional e a atual posição do

Superior Tribunal de Justiça

Como visto, a apuração de haveres é objeto do direito que toca ao

sócio desligado ou a seus sucessores perante a sociedade em que ocorreu o evento

de dissolução parcial400. Assim como a dissolução parcial, também a apuração de

haveres concerne igualmente à sociedade profissional.

Com a ruptura do vínculo societário em relação ao sócio retirante, renunciante, excluído, falido, ou incapaz, ele deixa de ser sócio e se torna credor (o mesmo ocorrendo com os herdeiros do sócio falecido) do direito de exigir a apuração de seus haveres na sociedade, em contrapartida, a correlata obrigação de realizar essa prestação, mediante a determinação e a liquidação do correspondente quinhão para sua conversão em dinheiro. A apuração de haveres, portanto, tem por fim transformar o direito patrimonial abstrato de sócio em prestação pecuniária exigível401.

Em que pese a unificação do direito privado, que aboliu a distinção

entre sociedades civis e sociedades comerciais e programou a aplicação das regras

do direito societário às sociedades empresária e às sociedades simples, inevitável

reflexo do abandono da teoria dos atos do comércio e da adoção da teoria da

empresa, doutrina e jurisprudência mantêm relativizando o alcance das regras do

direito societário referente à apuração de haveres quando em causas que envolvem

a sociedade profissional.

Referida relativização, manifesta-se na perspectiva da inclusão, ou

não, dos bens imateriais e do aviamento no cômputo dos haveres apuráveis na

sociedade profissional402.

400 A questão da apuração de haveres foi tratada nos Capítulos III e IV deste trabalho. 401 GONÇALVES NETO, Alfredo de Assis. Sociedade de Advogados. 3. ed. São Paulo: Lex, 2005, p. 151. 402 No Capítulo IV, tratamos da controversa da inclusão dos bens imateriais e do aviamento na apuração de haveres de forma geral, concluindo que no atual estágio da evolução do instituto, especialmente a legislativa, a inclusão é reconhecida.

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A principal questão em discussão é determinar quais bens do ativo,

tangível e intangível, formam o patrimônio de uma sociedade profissional e devem

ser considerados em sua apuração de haveres.

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do

Recurso Especial n.º 958.116, discutindo a inclusão dos bens imateriais e do

aviamento na apuração de haveres de uma sociedade profissional de engenharia,

decidiu, por maioria de votos, por sua exclusão desse cômputo:

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE APURAÇÃO DE HAVERES. RESOLUÇÃO DA SOCIEDADE EM RELAÇÃO A UM SÓCIO. SOCIEDADE NÃO EMPRESÁRIA. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS INTELECTUAIS NA ÁREA DE ENGENHARIA. FUNDO DE COMÉRCIO. NÃO CARACTERIZAÇÃO. EXCLUSÃO DOS BENS INCORPÓREOS DO CÁLCULO DOS HAVERES. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.403

Referida decisão foi procedida de acalorada discussão sobre o tema

e resultou na vitória da tese apresentada no voto do Ministro Relator, João Otávio

de Noronha, que, naquele caso sob análise, decidiu por excluir os bens incorpóreos

do cálculo dos haveres do sócio retirante de sociedade profissional de engenharia.

Apesar de essa decisão ter sido tomada por maioria, a mesma

questão foi novamente debatida pela Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça,

no julgamento do Recurso Especial n.º 1.227.240, com relação a uma sociedade

profissional que prestava serviços na área de advocacia e, por votação unânime,

chegou-se ao mesmo resultado:

RECURSO ESPECIAL. SOCIEDADES EMPRESÁRIAS E SIMPLES. SOCIEDADES DE ADVOGADOS. ATIVIDADE ECONÔMICA NÃO EMPRESARIAL. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS INTELECTUAIS. IMPOSSIBILIDADE DE ASSUMIREM CARÁTER EMPRESARIAL. LEI N. 8.906/1994. ESTATUTO DA OAB. ALEGAÇÃO DE OMISSÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO AFASTADA. IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS. SÚMULAS 5 E 7 DO STJ. 1. Não há falar em omissão ou contradição no acórdão recorrido quando embora rejeitados os embargos de declaração, a matéria em exame tiver sido devidamente enfrentada pelo Tribunal de origem, com pronunciamento

403 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 958.116/PR, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Rel. p/ Acórdão Ministro Raul Araújo, Data de Julgamento 22/05/2012, T4 - Quarta Turma, Data de Publicação: DJe 06/03/2013.

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fundamentado, ainda que em sentido contrário à pretensão da parte recorrente. 2. De acordo com o Código Civil, as sociedades podem ser de duas categorias: simples e empresárias. Ambas exploram atividade econômica e objetivam o lucro. A diferença entre elas reside no fato de a sociedade simples explorar atividade não empresarial, tais como as atividades intelectuais, enquanto a sociedade empresária explora atividade econômica empresarial, marcada pela organização dos fatores de produção (art. 982, CC). 3. A sociedade simples é formada por pessoas que exercem profissão do gênero intelectual, tendo como espécie a natureza científica, literária ou artística, e mesmo que conte com a colaboração de auxiliares, o exercício da profissão não constituirá elemento de empresa (III Jornada de Direito Civil, Enunciados n. 193, 194 e 195). 4. As sociedades de advogados são sociedades simples marcadas pela inexistência de organização dos fatores de produção para o desenvolvimento da atividade a que se propõem. Os sócios, advogados, ainda que objetivem lucro, utilizem-se de estrutura complexa e contem com colaboradores nunca revestirão caráter empresarial, tendo em vista a existência de expressa vedação legal (arts. 15 a 17, Lei n. 8.906/1994). 5. Impossível que sejam levados em consideração, em processo de dissolução de sociedade simples, elementos típicos de sociedade empresária, tais como bens incorpóreos, como a clientela e seu respectivo valor econômico e a estrutura do escritório. 6. Sempre que necessário o revolvimento das provas acostadas aos autos e a interpretação de cláusulas contratuais para alterar o julgamento proferido pelo Tribunal a quo, o provimento do recurso especial será obstado, ante a incidência dos enunciados das Súmulas 5 e 7 do STJ. 7. Recurso especial a que se nega provimento404.

Interessante verificar, nos referidos julgados da Quarta Turma do

Superior Tribunal de Justiça, os votos proferidos pelo Ministro Luís Felipe Salomão,

que, no Recurso Especial n.º 958.116, julgado em sessão de 22.05.2012,

apresentou voto divergente do vencedor, entendendo que o aviamento haveria de

incluir-se no cálculo da apuração de haveres em sociedade profissional, e, no

Recurso Especial n.º 1.227.240, julgado em sessão de 26.05.2015, apresentou,

então na qualidade de relator da matéria, tese contrária à sua posição anterior,

concluindo pela impossibilidade de incluir os bens imateriais e o aviamento na

apuração de haveres.

A posição do Ministro Luís Felipe Salomão no Recurso Especial n.º

958.166, no qual foi voto vencido, era pela possibilidade casuística da inclusão do

fundo de comércio e dos bens imateriais no cômputo da apuração de haveres em

sociedade profissional:

404 BRASIL. Superior Tribunal De Justiça. Recurso Especial Nº 1227240 - SP, Relator: Ministro Luís Felipe Salomão, Data de Julgamento: 26/05/2015, T4 - Quarta Turma, Data de Publicação: DJe 18/06/2015.

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Com efeito, a análise acerca da existência ou não de fundo de comércio, em se tratando de sociedade não empresária, deve ser casuística, haja vista que a sua atuação no mercado pode assumir inúmeras formas. [...] Destarte, no caso em apreço, a verificação acerca de o fundo de comércio integrar ou não o valor patrimonial da recorrente, não pode se pautar única e exclusivamente pelo exame de seus atos constitutivos, mas sim na realidade dos fatos. Na hipótese em julgamento, é mister enfatizar que a recorrente ostenta condição bem mais elaborada que um mero "escritório de engenharia", em que a relação de confiança - que permite a interação social com clientes - decorre da competência profissional de cada um de seus sócios. Em verdade, não há meios de comparação entre um engenheiro, escultor ou advogado, que produzem de acordo com sua aptidão, inspiração e disposição pessoais, com uma sociedade cujo nome é sinônimo de garantia do seu produto. Com efeito, no mercado, os profissionais liberais de renome notório atraem os clientes de maneira pessoal, ainda que atuando em sociedade, mas quando há um conjunto de bons profissionais em atividade junto à mesma instituição, a sociedade ou "empresa" passa a ter um significado diferente. Assim, o fato de o acórdão recorrido, com base no teor do laudo pericial, ter concluído pela existência de fundo de comércio no caso em tela, é razão suficiente para atrair a incidência da Súmula 7 do STJ. Ademais, há que se consignar que o estabelecimento comercial e o fundo de comércio não são realidades vinculadas tão somente às sociedades empresárias, uma vez que, a depender de seu porte e da forma como atuam no mercado, podem necessitar de um estabelecimento para desempenhar suas atividades, o qual agregue elementos como o aviamento, a clientela, dentre outros. [...] Destarte, é o exame de cada caso concreto, à luz das provas produzidas, que irá revelar se há "elemento de empresa" para indicar, na atividade da sociedade, se estão preenchidos os requisitos para ensejar o fundo de comércio, ou se, ao contrário, os valores da organização são fundamentalmente de cunho personalíssimo. Penso, pois, que não se pode afastar o fundo de comércio em relação a uma sociedade de profissionais liberais, pelo só fato de não desempenhar atividade empresarial em sentido estrito. Como dito, no caso vertente não há como ultrapassar a moldura fática desenhada pelo Tribunal de origem, que considerou a atividade profissional como elemento da empresa, ao menos para entender cabível a avaliação do fundo de comércio. Desse modo, observada sempre a máxima vênia, divirjo do eminente Relator quanto a este particular, para manter o acórdão recorrido quanto à consideração do fundo de comércio na realidade patrimonial da recorrente.

Entretanto, no voto proferido no Recurso Especial nº 1.227.240, o

Ministro Luís Felipe Salomão, na qualidade de relator, sustentou tese contrária, na

qual defendeu a impossibilidade de incluir no computo da apuração de haveres de

sociedade profissional os bens imateriais e o aviamento, única e exclusivamente por

se tratar de sociedade simples:

Assim, pode-se concluir que, ainda que um escritório de advocacia apresente estrutura complexa, organização de grande porte, conte com a

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colaboração de auxiliares e com considerável volume de trabalho, prestado, inclusive, de forma impessoal, a sociedade existente não deixará de ser simples, por expressa determinação legal. Dessa forma, no caso dos autos, o pleito dos recorrentes não encontra guarida no ordenamento jurídico, sendo, portanto, inadmissível a consideração da clientela e sua expressão econômica e do bem incorpóreo a que os pretendentes chamaram de "estrutura do escritório", elementos típicos de sociedade empresária. De fato, a clientela é elemento íntima e necessariamente ligado ao Estabelecimento Empresarial, mais especificamente ao Ponto de Negócio, que, em síntese, nada mais é que o local onde o empresário exerce sua atividade e se encontra com sua clientela. A clientela não é elemento do estabelecimento, mas qualidade ou atributo dele. Na conceituação de André Luiz Santa Cruz Ramos, clientela é a "manifestação externa do Aviamento, significando todo conjunto de pessoas que se relacionam constantemente com o empresário" (RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Direito empresarial esquematizado. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, p. 89, 2010) . O aviamento, por sua vez, é a aptidão que determinado estabelecimento possui para gerar lucros ao exercente da empresa. É atributo do estabelecimento diretamente responsável por sua valoração econômica. Não pode, pois, ser levado em conta para a avaliação e partilha, no caso de um escritório de advocacia. No REsp n. 958.116/PR, cuja relatoria do acórdão ficou a cargo do em. Ministro Raul Araújo, esta Quarta Turma analisou hipótese assemelhada.

Os trechos, acima destacados, revelam a complexidade do tema,

tanto que o Ministro Luís Felipe Salomão se posicionou, aparentemente, de forma

contraditória quando da análise no caso de sociedade de advogados, sendo exato

que, em ambos os seus votos, foi apresentada farta justificativa teórica lastreada em

doutrina. No final, contudo, o Ministro Luiz Felipe Salomão sujeitou-se àqueles

argumentos postos nos votos vencedores do julgamento do Recurso Especial n.º

958.166, sendo essa, hoje, a posição que prevalece no entendimento jurisprudencial

e doutrinário, qual seja, pela impossibilidade de inclusão dos bens imateriais e do

aviamento no cômputo dos haveres das sociedades profissionais.

No capítulo anterior, analisamos a avaliação do patrimônio líquido

na dissolução parcial de sociedades contratuais e destacamos a importância de

estudar o estabelecimento como forma de compreender os bens e os direitos do

ativo que serão incluídos na apuração de haveres, especialmente com relação aos

bens imateriais e o aviamento.

Por esse estudo, concluímos que, no atual estágio de evolução dos

institutos da dissolução parcial e da apuração de haveres, os obstáculos postos

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pelos defensores da exclusão da verba concernente aos bens imateriais e ao

aviamento (goodwill) perderam força e, dada máxima vênia, foram superados,

tornando legal a avaliação plena dos bens do ativo para o cálculo da apuração de

haveres.

Após aquela proposição geral, deparamo-nos com o

questionamento especifico com relação à sociedade profissional, uma vez que a

posição atual do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de afastar os bens

imateriais e o aviamento na apuração de haveres dessa espécie de sociedade.

Cabe agora a análise dos fundamentos utilizados pela doutrina e

pela jurisprudência para sustento da referida posição.

5.3. Questão de ordem

Antes de adentrarmos na visão crítica dos principais argumentos

discutidos sobre o tema, devemos pontuar que será analisada a questão somente

com relação à sociedade profissional em que o respectivo exercício não chegou a

constituir-se “elemento de empresa” (artigo 966, parágrafo único, CC)405.

Essa ressalva é importante, pois a qualificação do exercício

profissional como “elemento de empresa” não pode servir de bengala para sustentar

a tese da inclusão dos bens imateriais e do aviamento no cômputo da apuração de

haveres na sociedade profissional, descaracterizando-a de sociedade simples para

sociedade empresária e, assim, fugir da discussão com relação à sociedade

profissional verdadeiramente simples406´407.

405 Sobre o tema, vide Capítulo I. 406 APURAÇÃO DE HAVERES. Inclusão do valor do fundo de comércio. Sociedade constituída por médicos, prestadores de serviços, mas que atua com organização e empreendimento próprio de sociedade empresária e, portanto, deve ser assim considerada, sendo de rigor reconhecer a existência de fundo de comércio. Não se trata de sociedade simples. Sentença mantida. Recurso não provido (ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação nº.: 0122177-84.2005.8.26.0100, Relator: Enio Zuliani, Data de Julgamento: 07/11/2013, 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, Data de Publicação: 12/11/2013). 407 AGRAVO DE INSTRUMENTO. DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE. SOCIEDADE FORMADA POR PROFISSIONAIS MÉDICOS. PRELIMINAR. INCISO I DO ARTIGO 525 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. FALTA DA DECISÃO DE JULGAMENTO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. REJEIÇÃO. PRELIMINAR DE INOVAÇÃO RECURSAL. ARTIGO 517 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. MERA APRESENTAÇÃO DE NOVA TESE JURÍDICA. AUSÊNCIA DE INOVAÇÃO. PRELIMINAR REJEITADA. APURAÇÃO DE HAVERES EM DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE DE MÉDICOS. CONFIGURAÇÃO DE ARTICULAÇÃO DE

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Ocorre que essa fuga acaba prejudicando uma específica atividade

profissional que é a da advocacia, pois, como vimos anteriormente, nessa espécie

de sociedade profissional, por conta do Estatuto da Advocacia e da Ordem dos

Advogados (EAOAB), Lei nº. 8.906/1994, há impedimento legal de caracterizar-se

como empresária408.

Importante frisar que concordamos com essa disposição legal, pois,

como a sociedade de advogados deve ser constituída única e exclusivamente para

prestação de serviços de natureza intelectual específica de advocacia

(uniprofissional), não caberia caracterizá-la como empresária por meio da

identificação do exercício profissional como “elemento de empresa”, já que esse

exercício teria de ser absorvido por atividade profissional tipicamente de natureza

empresária. Ao mesmo resultado, aliás, não se poderia igualmente chegar nem

mesmo pela adoção de um dos tipos societários de sociedades por ações, pois

ambos são vetados por disposição legal.

FATORES DE PRODUÇÃO. FORMA EMPRESARIAL DE ATUAÇÃO. INCLUSÃO DO FUNDO DE COMÉRCIO NA APURAÇÃO DE HAVERES. 1.ENCONTRA-SE ATENDIDO O PRESSUPOSTO PREVISTO NO INCISO I DO ARTIGO 525 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL QUANDO, EMBORA NÃO COMPOSTO O INSTRUMENTO PELA CERTIDÃO DE PUBLICAÇÃO DE DECISÃO INTEGRATIVA DA DECISÃO ATACADA PELO AGRAVO, RESULTANTE DE JULGAMENTO DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO, INEXISTE PREJUÍZO PARA AFERIÇÃO DA TEMPESTIVIDADE DO AGRAVO DE INSTRUMENTO E A DECISÃO INTEGRATIVA EM NADA ALTERA A MATÉRIA IMPUGNADA NO RECURSO. PRELIMINAR REJEITADA. 2.A INOVAÇÃO VEDADA NO ARTIGO 517 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, FUNDADA NA NECESSIDADE DE OBEDIÊNCIA AO DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO, CONCERNE ÀS QUESTÕES FÁTICAS, NÃO HAVENDO VEDAÇÃO QUANTO À APRESENTAÇÃO DE NOVAS TESES JURÍDICAS EM GRAU RECURSAL, POIS, QUANTO AO NOVO FUNDAMENTO JURÍDICO, A PARTE RECORRIDA TEM OPORTUNIDADE DE SE MANIFESTAR EM CONTRARRAZÕES. PRELIMINAR REJEITADA. 3.OS PROFISSIONAIS LIBERAIS E AS SOCIEDADES SIMPLES, A RIGOR, NÃO SE SUBMETEM AO REGRAMENTO DAS SOCIEDADES EMPRESÁRIAS, MAS QUANDO O PROFISSIONAL LIBERAL UTILIZA SUA ATIVIDADE COMO ELEMENTO DE EMPRESA, ISTO É, COMO UM DOS INSTRUMENTOS DE TODA UMA ARTICULAÇÃO DE FATORES DE PRODUÇÃO, SURGE A FORMA EMPRESARIAL DE ATUAÇÃO. 4.NA ANÁLISE DO RECURSO ESPECIAL Nº 958.116, CONCLUIU O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA QUE DEVE SER REALIZADA ANÁLISE CASUÍSTICA PARA VERIFICAR, POR OCASIÃO DA APURAÇÃO DE HAVERES EM DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE FORMADA POR PROFISSIONAIS LIBERAIS, SE HÁ VERDADEIRO FUNDO DE COMÉRCIO OU SE A PESSOA JURÍDICA CONSISTE TÃO SOMENTE EM MEIO PARA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS PELOS PROFISSIONAIS QUE A COMPÕEM. 5.VERIFICADO EM DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE DE MÉDICOS QUE O EXERCÍCIO DA ATIVIDADE DO SÓCIO RETIRANTE ESTAVA INSERIDO EM VERDADEIRA CONJUGAÇÃO DE FATORES DE PRODUÇÃO, DENTRE OS QUAIS SE INCLUÍAM INSUMOS, MÃO DE OBRA, CAPITAL DE UMA PESSOA JURÍDICA PRÓPRIA, PONTO COMERCIAL, É DE SE CONCLUIR PELA EXISTÊNCIA DE VERDADEIRO COMPLEXO DE BENS APTO A CARACTERIZAR O ESTABELECIMENTO COMERCIAL A SER INCLUÍDO NA APURAÇÃO DE HAVERES. 6. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO E IMPROVIDO (ESTADO DE SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina. Agravo e Instrumento nº. 0011810-49.2013.8.07.0000, Relator: Simone Lucindo, Data de Julgamento: 31/07/2013, 1ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJe 07/08/2013). 408 Art. 16. Não são admitidas a registro nem podem funcionar todas as espécies de sociedades de advogados que apresentem forma ou características de sociedade empresária, que adotem denominação de fantasia, que realizem atividades estranhas à advocacia, que incluam como sócio ou titular de sociedade unipessoal de advocacia pessoa não inscrita como advogado ou totalmente proibida de advogar.

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Outra peculiaridade, que é a decorrência da anterior, está em que a sociedade de advogados não pode ter outro objeto, senão o de proporcionar o exercício profissional da advocacia aos seus sócios e advogados agregados. Nenhuma outra atividade pode ser por ela perseguida (art. 16, caput, do EAOAB). Nessa linha adotada pela lei nacional, as chamadas sociedades multidisciplinares (de consultoria, engenharia, auditoria etc.), ao contrário do que ocorre em outros países não filiados ao sistema europeu-continental, não tem permissão para abranger a área da advocacia (art. 16, §3º)409.

A afirmação de Alfredo de Assis Gonçalves Neto demonstra, em

conjunto com os estudos feitos até o momento, que a sociedade de advogados é sui

generis com relação às demais sociedades profissionais, pois, nessas, as

legislações reguladoras permitem acrescer à atividade profissional outras atividades

que são empresárias, enquanto que, naquela, a lei veda expressamente essa

possibilidade, afastando a caracterização do elemento de empresa necessário para

transformar a sociedade de advogados de simples em empresária.

Feita a ressalva essencial para filtrar as discussões que serão

travadas nesse momento do trabalho, necessário se faz analisar as justificativas

postas pela doutrina e pela jurisprudência sobre o tema.

5.4. A existência de organização empresarial, de estabelecimento e de

aviamento na sociedade profissional

Para afastar os bens imateriais e o aviamento do cômputo da

apuração de haveres de sociedade profissional, o Superior Tribunal de Justiça

concluiu que ela não organiza os fatores de produção para o desenvolvimento da

atividade a que se propõe e que, por esse fato, seria impossível serem levados em

consideração, no processo de dissolução de sociedade simples, elementos típicos

de sociedade empresária, tais como bens incorpóreos, como a clientela e seu

respectivo valor econômico, e a estrutura do escritório.

Da análise realizada no capítulo antecedente, demonstramos que o

estabelecimento é caracterizado como um complexo organizado de bens pelo 409 GONÇALVES NETO, Alfredo de Assis. Direito de Empresa: comentários aos artigos 966 a 1.195 do Código Civil. 6. ed.., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, p. 446.

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empresário (gênero) para o exercício da empresa (art. 1.142, CC), com natureza

jurídica de universalidade de fato (art. 90, CC).

Doutrina410 e jurisprudência411 têm negado a existência de

estabelecimento na sociedade simples, pois esse estaria intimamente ligado à figura

do empresário, conforme a redação dada pelo artigo 1.142 do Código Civil412.

Por fim, merece, ainda, estudo a parte final do artigo ora sob exame, onde disciplina que o estabelecimento tem por objetivo o exercício da empresa por empresário ou sociedade empresária. Percebe-se que existe uma imposição que o estabelecimento, nos termos estudados, seja necessariamente para o exercício da empresa explorada pelo empresário de forma individual ou por sociedade empresária. Desta feita, não há o que se falar em estabelecimento empresarial, quando não presentes tais limitadores que implica na impossibilidade da figura do estabelecimento frente às sociedade simples prevista no art. 997 e seguintes do Código Civil.413

Tércio Sampaio Ferraz Jr.414 também sustentou a inexistência de

fundo de comércio nas sociedades de profissionais de engenharia em artigo

publicado na Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro,

levando em consideração a pessoalidade da atividade explorada.

Ferraz inicia sua exposição, que trata do papel institucional das

pessoas (naturais e jurídicas), afirmando que a pessoa jurídica constituída

410 2.6.4.1. Sociedades do gênero simples São aquelas sociedades que não possuem o elemento de empresa, o estabelecimento comercial, podendo apresentar universalidade de bens e de direitos, nos termos dos arts. 90 e 91 do CC/2002, e, por via de regra, apresentam um fundo social desprovido de aviamento (HOOG, Wilson Alberto Zappa. Resolução de sociedade & avaliação do patrimônio na apuração de haveres. 3. ed., Curitiba: Juruá, 2008, p. 132-133). 411 Indenizatória - Fundo de comércio de imóvel desapropriado sociedade civil dedicada ao ensino que em razão dessa natureza civil não se caracteriza como empresa mercantil e não possui fundo de comércio indenização descabida sentença reformada recurso provido. (ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação nº. 0204315-15.2008.8.26.0000, Relator: Ferraz de Arruda, Data de Julgamento: 27/07/2011, 13ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 29/07/2011). 412 [...] tem-se entendido que, em casos de sociedades e que o caráter (e contribuição) pessoal de cada sócio é altamente relevante (muito comum nas sociedades simples, e menos nas empresárias), a aferição de valor de goodwill para aquele que se retira da sociedade leva a sério equívoco, visto que a performance social não será a mesma sem a presença específica daquele sócio que se está retirando. Portanto, avaliar o valor dessa empresa no momento não é o mesmo que projetar um faturamento futuro sem sua presença. Nesse caso, o enriquecimento seria do sócio afastado, em detrimento da sociedade. (RIBAS, Roberta de Oliveira e Corvo. Apuração de haveres na sociedade empresaria limitada. In: COELHO, Fabio Ulhoa (Coord.). Tratado de Direito Comercial, v. 2. Tipos societários, sociedade limitada e sociedade anônima. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 280). 413 ALMEIDA, Marcus Elidius Michelli de. Comentários aos artigos 1.088 a 1.195 do Código Civil. In: ALVIM, Arruda; ALVIM, Thereza. (Org.). Comentários ao Código Civil Brasileiro. V. X, 1. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 255-418. 414 FERRAZ JUNIOR. Tércio Sampaio. Da inexistência de fundo de comércio nas sociedades de profissionais de engenharia. Revista de Direito Mercantil: industrial, econômico e financeiro, n. 111, São Paulo, jul./set. 1998, p. 45-51.

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neutraliza/desconsidera a pessoa física, pois é o ente que exerceria a atividade e

não as pessoas que a compõem. Cita em seu texto que essa situação seria

superada em casos excepcionais, como quando ocorresse fraude ou simulação, em

que se aplicaria o princípio do disregard (desconsideração da personalidade

jurídica).415

Em seguida, trata do fundo de comércio (estabelecimento) como

bem imaterial que não se confunde com os bens materiais e imateriais que o

compõem, concluindo pela natureza de universalidade de fato, ideia que também

sustentamos neste trabalho. Para o autor, é a organização (ação) que constitui o

fundo de comércio e que, com certo grau de eficiência (aviamento), é capaz de

efetivar-se numa clientela.416

A organização, verdadeira base do fundo de comércio, é elemento típico de neutralização de papéis, próprio da pessoa jurídica. Ou seja, sociedades constituídas como pessoas jurídicas, cujo centro aglutinados é o papel organizador, produzem um sistema orgânico que envolve, qualifica e delimita todos os demais elementos, que passam a ter sentido por ela e apenas cm função dela. Por isso, em pessoas jurídicas com base na organização é possível falar se num bem que não se confunde com a soma das partes, o fundo de comércio. 417.

A partir dessa introdução, o autor busca tratar da sociedade

prestadora de serviços de profissionais liberais (sociedade profissional), afirmando

que, nessa espécie de sociedade, há um sistema social em que o papel

organizador, se não está ausente, não é incorporado à atividade correspondente

como elemento-chave. A afirmação se sustentaria pelo fato de o profissional liberal

não se apresentar como um órgão definido estatutariamente (gerência, diretoria),

mas, sim, como pessoa física418.

415 FERRAZ JUNIOR. Tércio Sampaio. Da inexistência de fundo de comércio nas sociedades de profissionais de engenharia. Revista de Direito Mercantil: industrial, econômico e financeiro, n. 111, São Paulo, jul./set. 1998, p. 46. 416 FERRAZ JUNIOR. Tércio Sampaio. Da inexistência de fundo de comércio nas sociedades de profissionais de engenharia. Revista de Direito Mercantil: industrial, econômico e financeiro, n. 111, São Paulo, jul./set. 1998, p. 47. 417 FERRAZ JUNIOR. Tércio Sampaio. Da inexistência de fundo de comércio nas sociedades de profissionais de engenharia. Revista de Direito Mercantil: industrial, econômico e financeiro, n. 111, São Paulo, jul./set. 1998, p. 47-48. 418 FERRAZ JUNIOR. Tércio Sampaio. Da inexistência de fundo de comércio nas sociedades de profissionais de engenharia. Revista de Direito Mercantil: industrial, econômico e financeiro, n. 111, São Paulo, jul./set. 1998, p. 48.

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Do mesmo modo, o engenheiro exige, na sua qualificação, a conjugação aberta de vários papéis sociais. Da atividade de um escritório de engenharia, a relação de confiança que permite a interação social (com clientes) não decorre de organização, mas, de um conjunto que qualifica a chamada competência profissional. Um escritório, nesse sentido, não tem um fundo de comércio, mas um centro de competência que resulta da atividade de cada profissional. Nesse sentido W. Ferreira diz que a clientela exprime patrocínio, proteção ao cliente e não freguesia enquanto conjunto de pessoas, que frequentam o estabelecimento e nele fazem, habitualmente, suas compras (cit. § 1.554)419.

Nesse ponto, Ferraz recorda ensinamento de Waldemar Ferreira, ao

diferenciar clientela e freguesia. Enquanto aquela se vincula à pessoalidade do

profissional, esta é representada por aqueles que frequentam o estabelecimento e

nele fazem, habitualmente, suas compras. Por conta dessa pessoalidade, a

capacidade técnica do profissional é algo que lhe pertence, não se enquadrando

como ativo social e, portanto, o sócio de uma sociedade profissional não tem direito

a uma parte indivisa de um proprietário único, o fundo de comércio da pessoa

jurídica420.

Ferraz não afasta os casos em que a atividade profissional só possa

ser praticada de forma coletiva, em sociedade, inclusive sendo possível manter a

clientela mesmo com a retirada ou a substituição de um profissional, mas que esse

fato não retira a pessoalidade, pois a sociedade profissional exerce atividade que é

própria, ontológica e juridicamente das pessoas físicas421.

O que se deve ter em conta, nesse particular, é a distinção entre o papel social do empresário, que surge como advento do capitalista e que se refere a uma função criativa de riqueza, cuja base está na organização do que, do como, do deve e do quanto produzir e o papel social dos profissionais intelectuais (cf. Francesco Galgano, L'impreditori, Bologna 1975. pp. 2 e ss.. 6 e 13), cuja atividade não constitui uma empresa naquele sentido. A atividade destes últimos não promana essencialmente do elemento organização, mas da esfera pessoal, que oferece e realiza serviços, cujo resultado é independente da forma de organização do estabelecimento. Destarte, o exercício comuta de atividades profissionais liberais tem na sociedade respectiva apenas um fator exterior, que não se

419 FERRAZ JUNIOR. Tércio Sampaio. Da inexistência de fundo de comércio nas sociedades de profissionais de engenharia. Revista de Direito Mercantil: industrial, econômico e financeiro, n. 111, São Paulo, jul./set. 1998, p. 48. 420 FERRAZ JUNIOR. Tércio Sampaio. Da inexistência de fundo de comércio nas sociedades de profissionais de engenharia. Revista de Direito Mercantil: industrial, econômico e financeiro, n. 111, São Paulo, jul./set. 1998, p. 48 421 FERRAZ JUNIOR. Tércio Sampaio. Da inexistência de fundo de comércio nas sociedades de profissionais de engenharia. Revista de Direito Mercantil: industrial, econômico e financeiro, n. 111, São Paulo, jul./set. 1998, p. 49.

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passa a execução individual do serviço (cf. Enrico Zanelli, La Nozione di Oggetto Sociale. Milano, 1962. p. 158)422.

Posteriormente, trata da questão sob a ótica do Direito Tributário

(ISSQN) e do Direito Administrativo (Licitação), para afirmar que, na sociedade

profissional, não haveria a organização empresarial e, portanto, fundo de comércio,

em função da confiança pessoal, retomando a questão do ponto da estrutura

funcional do sistema social da sociedade (ou com base na organizacional ou com

base personalíssima) para concluir pela inexistência do fundo de comércio nas

sociedades profissionais423.

Em suma, como se observou anteriormente, se, particularmente no Brasil, o fundo de comércio é tido como universalidade de fato cujo fundamento é a atividade organizatória, o que permitiria atribuir a essa organização um valor superior ao da soma dos elementos em que se desdobra, o capital e o trabalho, no caso das sociedades de profissionais liberais, cujo centro aglutinador é a excelência profissional personalíssima, não há corno ir-se além daqueles elementos, não se podendo falar em fundo de Comércio. Destarte, uma universalidade de fato, em que todas as atividades das pessoas (físicas) só alcançam relevância no todo e por causa do todo, não chega a ocorrer. Na sociedade de profissionais liberais, o engenheiro não é engenheiro porque é sócio, mas é sócio por que é engenheiro424.

Assim, a base da doutrina que nega a existência de estabelecimento

(fundo de comércio) na sociedade profissional está fundada na falta de organização

dos fatores de produção e na pessoalidade da exploração da atividade profissional,

bem como na própria estrutura da norma posta no artigo 1.142 do Código Civil.

Nas sociedades que têm por objeto o exercício de profissões regulamentadas, o fundo de comércio é uma grandeza difícil de determinar, já que, normalmente, prevalece o vínculo pessoal entre o sócio e o cliente. Tércio Sampaio Ferraz Júnior teve oportunidade de abordar o tema, na análise de um caso concreto: 'um escritório, nesse sentido, não tem um fundo de comércio, mas um centro de competência que resulta da atividade de cada profissional' (Da inexistência de fundo de comércio nas sociedades de profissionais de engenharia, RDM, v. 111, p. 45-51)425.

422 FERRAZ JUNIOR. Tércio Sampaio. Da inexistência de fundo de comércio nas sociedades de profissionais de engenharia. Revista de Direito Mercantil: industrial, econômico e financeiro, n. 111, São Paulo, jul./set. 1998, p. 49. 423 FERRAZ JUNIOR. Tércio Sampaio. Da inexistência de fundo de comércio nas sociedades de profissionais de engenharia. Revista de Direito Mercantil: industrial, econômico e financeiro, n. 111, São Paulo, jul./set. 1998, p. 50-51. 424 FERRAZ JUNIOR. Tércio Sampaio. Da inexistência de fundo de comércio nas sociedades de profissionais de engenharia. Revista de Direito Mercantil: industrial, econômico e financeiro, n. 111, São Paulo, jul./set. 1998, p. 51. 425 GONÇALVES NETO, Alfredo de Assis. Direito de Empresa: comentários aos artigos 966 a 1.195 do Código Civil. 6. ed.. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, p. 155-156.

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5.4.1. Da organização da sociedade profissional

Fato é que tanto o artigo 966, caput, quanto o 1.142, ambos do

Código Civil, os quais tratam da caracterização do empresário e do

estabelecimento, utilizam ambos a expressão organização, entendida como referida

à organização dos fatores de produção pelo empresário, por meio do

estabelecimento e para o exercício da empresa.426 Por atividade econômica

organizada, entende-se aquela que congrega os fatores de produção: natureza,

capital, trabalho e tecnologia427.

Rachel Sztajin busca esclarecer a organização sob uma ótica

econômica voltada para o mercado:

Organizações são estruturas que reduzem custos de transação; qualquer profissional que pretenda participar do mercado, de forma competitiva, cria uma organização apenas para reduzir custos de transação. Qualquer atividade, até mesmo as esportivas, de lazer e intelectuais, passa por processo de organização. Mas isso ainda não permite separar atividades empresariais das não empresariais exercidas em e para mercados, tal como se fazia quando da vigência dos dois Códigos de direito privado428.

Assim, o núcleo da empresa seria essa organização dos fatores de

produção e, portanto, o profissional intelectual e a sociedade profissional, por não

serem considerados empresários, não organizariam os fatores de produção.

A ausência dessa organização seria um dos motivos usados para

distanciar a sociedade profissional do conceito de empresário, bem como para

justificar a inexistência do estabelecimento para essa entidade.

No caso concreto, a sociedade em dissolução é uma sociedade de advogados, que explora atividade econômica intelectual, típica das sociedades simples.

426 No Capítulo I trouxemos diversos autores que reproduzem a ideia de que a empresa é essa organização dos fatores de produção exercida, posta a funcionar, pelo empresário. 427 VENOSA. Silvio de Salvo; RODRIGUES, Cláudia. Direito Civil. Direito Empresarial. São Paulo: Atlas, 2010, p. 19. 428 SZTAJN, Rachel. O que se perdeu na tradução. Revista de Direito Mercantil, Econômico e Financeiro, São Paulo, n..153-154, jan. 2010, p. 9-10.

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De fato, as sociedades de advogados seguem a regra consistente na inexistência de organização dos fatores de produção para o desenvolvimento da atividade a que se propõem. [...] Nesse ponto, cabe asseverar que as sociedades simples, genericamente consideradas, ainda que adotem um dos tipos previstos para as sociedades empresárias, continuam sendo sociedades simples. Isso porque, como exaustivamente afirmado, o que define como empresária determinada sociedade é a atividade por ela desenvolvida, que deve ter caráter empresarial. Nesses termos, o Enunciado n. 57 aprovado na Jornada de Direito Civil pela Comissão de Direito de Empresa: 57 – Art. 983: A opção pelo tipo empresarial não afasta a natureza simples da sociedade. Dessa forma, a interpretação a contrário sensu sinaliza que a sociedade simples, mas que exerce atividade empresarial, com organização dos fatores de produção, será, de fato, empresária429. (destacamos)

Ocorre que, como visto, não é a ausência da organização dos

fatores de produção que descaracteriza a sociedade profissional como empresária,

mas, sim, a excludente legal do parágrafo único do artigo 966 do Código Civil, que

destaca o objeto social explorado pela sociedade como elemento identificador.

Em primeira conclusão, portanto, não é empresário quem exerce atividade intelectual por qualquer meio, organizadamente ou não, sob forma empresarial ou não, em caráter profissional ou não, qualquer que seja o volume, intensidade ou quantidade de sua produção. Foi o que concluiu, aliás, a Comissão de Direito de Empresa na III Jornada promovida pelo Conselho da Justiça Federal: 'o exercício das atividades de natureza intelectual está excluído do conceito de empresa' (Enunciado n. 193, III Jornada de Direito Civil, p. 61)430.

Explorar uma atividade econômica de forma organizada não é

condição única e suficiente para se caracterizar a empresa, pois há atividades que

consistem na produção de bens ou serviços, exercidas profissionalmente, não

dando lugar, porém, a uma empresa, como ocorre com a sociedade profissional.

A estrutura organizacional (hierarquização do trabalho, plano de

carreira para seus funcionários, grande número de funcionários contratados,

existência de filiais em outros municípios) não é o que diferencia a sociedade

empresária da simples, mas, sim, a atividade explorada (objeto social). O que se

429 STJ - REsp: 1227240 SP 2010/0230258-0, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 26/05/2015, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 18/06/2015 430 GONÇALVES NETO, Alfredo de Assis. Direito de Empresa: comentários aos artigos 966 a 1.195 do Código Civil. 6. ed.. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, p. 76.

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pode concluir é que não se deve identificar a atividade pela organização, mas, sim,

por sua natureza.

Pelo enunciado, basta ter por fim exercício de atividade própria de empresário para que a sociedade seja empresária. Aí não contam os fatores quantidade, intensidade de exercício e organização, porquanto a sociedade define seu objeto antes de atuar e não se tem como aferir, em tal momento, como será desenvolvida a atividade que orientou sua criação. Por isso, a sociedade que nasce para exercer atividade própria de empresário, ainda que não a exerça ou que a exerça esporadicamente, desorganizadamente, é empresária e se sujeita ao direito de empresa431.

Em parecer elaborado e publicado na Revista de Direito Mercantil,

Industrial, Econômico e Financeiro, n. 157, de janeiro de 2011, Erasmo Valladão

Azevedo e Novaes França também concluiu que a organização não é o que

diferencia a sociedade empresária da sociedade simples, mas, tão somente o objeto

social explorado pela sociedade432, conforme se conclui pela resposta dada ao

quesito 4 do referido parecer:

4. A quantidade de sócios e colaboradores da Consulente, sua estrutura, tamanho, forma de organização departamentalizada, volume de negócios, número de filiais ou o alto faturamento retira a pessoalidade da prestação de serviços e a transforma em uma sociedade com caráter empresarial? R.: Definitivamente, não. O que distingue uma sociedade simples de uma sociedade empresária é o objeto social, nos claríssimos termos do art. 982 do Código Civil433.

Retomando a ideia de a sociedade de advogados ser sempre

considerada simples, por conta de imposição legal, não há de se negar que a

correspondente atividade possa ser explorada com organização dos fatores de

produção (empresa): natureza, capital, trabalho e tecnologia.

[...] grandes escritórios de Advocacia assumem uma organização tecnicamente empresarial. São dotados de departamentos de recursos humanos, de contabilidade, de cobrança, de compras etc. Mas, segundo o estatuto legal da classe, no Brasil eles não atuam, e nem podem atuar,

431 GONÇALVES NETO, Alfredo de Assis. Direito de Empresa: comentários aos artigos 966 a 1.195 do Código Civil. 6. ed.. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, p. 155-156. 432 FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes. Sociedade que tem por objeto a prestação de serviços de natureza intelectual é de natureza simples, qualquer que seja a forma de sua organização. Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro, n. 157, jan. 2011, p. 241-258. 433 FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes. Sociedade que tem por objeto a prestação de serviços de natureza intelectual é de natureza simples, qualquer que seja a forma de sua organização. Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro, n. 157, jan. 2011, p. 257.

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para o mercado, remanescendo sua atividade plenamente no campo intelectual, não podendo ser caracterizada como elemento de empresa434.

Verçosa435 trata desta questão com propriedade, destacando que

cada vez mais as sociedades profissionais estão buscando meios de agregar

clientela, oferecendo ao mercado alternativas capazes de potencializar seus lucros,

sem desnaturar a sua qualidade de sociedade simples.

Rachel Sztajn destaca que, na Itália, berço da distinção entre

sociedade empresária e sociedade simples, a sociedade de advogados está

inserida entre as empresárias. Certo que as demais atividades intelectuais tendem a

ser caracterizadas dessa forma por conta da organização empresarial que lhes são

características436.

Paula Andrea Forgioni, ao tratar da evolução do Direito Comercial

na Europa, afirma que, com o passar do tempo, os profissionais liberais passaram a

ser incluídos no conceito de empresa.

Com o correr do tempo, a ideia de empresa assumiu contornos cada vez mais amplos, passando a incluir a atividade de profissionais liberais, de

434 VERÇOSA, Haroldo Malheiros Dulclerc. Curso de Direto Comercial: Teoria Geral do Direito Comercial e das Atividades Empresariais Mercantis. Introdução à Teoria Geral da Concorrência e dos Bens Imateriais. 2. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2008, p. 154. 435 VERÇOSA, Haroldo Malheiros Dulclerc.. Curso de Direto Comercial: Teoria Geral do Direito Comercial e das Atividades Empresariais Mercantis. Introdução à Teoria Geral da Concorrência e dos Bens Imateriais. 2. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2008, p. 20-21. 436 Diferença importante entre o direito brasileiro e o italiano quanto ao exercício empresarial de atividade intelectual, ponto de fratura na legislação, derivado de diretiva comunitária, desde 1999, nos termos da Lei nº. 526, de 29 de dezembro, advogados e sociedade de advogados foram incluídos entre pessoas exercentes de atividades empresariais. [...] Além da sociedade de advogados, outras atividades intelectuais exercidas por profissionais liberais levam a doutrina a inclinar-se por incluí-las na categoria de sociedade empresárias quando organizadas; conquanto sejam qualificadas sociedades empresárias, são de natureza não mercantil, são sociedade civis na terminologia anterior, e não estão sujeitas a inscrição no Registro de Empresas Comerciais. A tendências, portanto, vai no sentido de tipificar como empresárias atividades organizadas voltadas para mercados, mercantis ou não, ampliando-se, com isso, as hipóteses de enquadramento de prestação de serviços ainda quando não preencham os requisitos de auxiliares de atividades empresariais comerciais. Buonocore entende que, ao se reconhecer a natureza empresarial a atividades exercidas por profissionais liberas quando organizados em sociedades, desaparecem os motivos para que não se estenda essa mesma qualificação ao exercente daquela atividade quando o faça em caráter individual. O que interessa, diz, é que se encontre a plataforma organizacional típica da empresa mesmo que tais empresários não se apliquem todas as regras deduzidas para o exercício da empresa mercantil, notadamente as normas do direito falimentar. (SZTAJN, Rachel. Teoria Jurídica da Empresa: atividade empresária e mercados. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 88).

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ordens de profissionais, federações esportistas, sociedades cooperativas, fundações e empresas públicas437.

Assim, o argumento da inexistência de organização dos fatores de

produção na sociedade profissional não se sustenta, seja por conta da norma seja

por conta do fato. O artigo 982, combinado com o 966, ambos do Código Civil, em

nenhum momento declara que a sociedade simples não organiza os fatores de

produção. Pelo contrário, o parágrafo único do artigo 966 enfatiza que o profissional

intelectual não se caracterizará como empresário, mesmo que exerça sua profissão

com o concurso de auxiliares ou colaboradores, diferentemente do que ocorre na

Itália, onde o profissional intelectual é considerado empresário, ao contratar

auxiliares ou colaboradores.

No campo fático, como visto, não se nega a existência de

organização na sociedade profissional, mesmo na que explora atividade de natureza

científica, literária ou artística, resultando a sua qualificação como sociedade

simples de mera conveniência legislativa.

Enfatiza-se o exercício organizado de atividades intelectuais por conta da rápida transformação da economia que, ao entender de muitos, se encaminha para uma era pós-industrial, isto é, quando o setor terciário (serviços) tende a suplantar a indústria, e naquela, a produção intelectual é mais perceptível438.

Com a certeza de que o núcleo diferenciador da sociedade simples

da sociedade empresária não é o fator organização, mas a atividade exercida pela

sociedade, devemos passar a verificar a possibilidade ou não da sociedade

profissional ser titular de estabelecimento ou de outro bem imaterial que agregue um

complexo de bens para o exercício de sua atividade.

5.4.2. Da existência de estabelecimento na sociedade profissional

O artigo 1.142 do Código Civil conceitua o estabelecimento,

vinculando-o ao exercício de empresa, por empresário ou sociedade empresária, de

437 FORGIONI, Paula Andrea. A evolução do direito comercial brasileiro: da mercancia ao mercado. 3. ed.. ver. atul. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, p. 64. 438 SZTAJN, Rachel. O que se perdeu na tradução. Revista de Direito Mercantil, Econômico e Financeiro, São Paulo, n.153-154, jan. 2010, p. 15.

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modo a deixá-lo fora da órbita de atividade de quem assim não se qualifique, como

o profissional intelectual e a sociedade profissional.

Ocorre que, antes da entrada em vigor do Código Civil de 2002, a lei

não previa regras com relação ao estabelecimento, mas nem por isso era negada a

sua existência aos exercentes de atividade comercial.439 “O artigo apresenta

definição legal antes inexistente, tanto no Código Civil como no Código Comercial,

referente ao estabelecimento comercial, hoje denominado estabelecimento

empresarial”. 440

O estabelecimento existe no mundo fático e deve ser visto a partir

do mundo jurídico como fato e não como direito. Por ser constituído pela comunhão

organizada de bens materiais ou imateriais para o exercício de uma atividade, o

estabelecimento tem existência empírica, independentemente de qualquer norma

jurídica.

Não queremos aqui afirmar que o profissional intelectual ou a

sociedade simples possuem estabelecimento como referido no artigo 1.142 do

Código Civil, mas não há como negar que, se verificada a organização da respectiva

atividade, haverá de se afirmar a existência de uma universalidade de fato nos

termos do artigo 90 do Código Civil.

Apesar da norma aparentemente afastar do não empresário a

adequação do conceito de estabelecimento (art. 1.142, CC), – fato caracterizado

como um complexo de bens organizado, para exercício da empresa, por

empresário, ou por sociedade empresária – a possibilidade de o profissional

intelectual ou a sociedade simples podem explorar empresa, sem serem

considerados empresários, parece-nos razoável sustentar a existência do

estabelecimento desses que exploram atividade dita intelectual (art. 966, p. único,

CC).

439 Com propriedade o estudo feito por BARRETO FILHO, Oscar.In: Teoria do Estabelecimento Comercial, 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1988. 440 DE ALMEIDA, Marcus Elidius Michelli. Comentários aos artigos 1.088 a 1.195 do Código Civil. In: ALVIM, Arruda; ALVIM Thereza. (Org.). Comentários ao Código Civil Brasileiro. 1ªed. Rio de Janeiro: Forense, v. Vol.X, 2006, p. 255.

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Alfredo De Assis Gonçalves Neto defende posição similar à nossa,

da existência de estabelecimento em sociedade simples, especialmente pela

unificação do direito privado no Código Civil, ao tratar das atividades negociais,

afirmando que os agentes econômicos não caracterizados como empresários

também precisam de um estabelecimento para o desempenho de suas respectivas

atividades econômicas441.

Do mesmo modo é fato que as regras relacionadas ao

estabelecimento – artigo 1.142 a 1.149 do Código Civil – tratam das relações do

empresário ou da sociedade empresária com terceiros, a propósito de negócios a

ele relacionados. Em sua maioria, pois, são normas destinadas à proteção dos

credores de seu titular.

No Código Civil, o artigo 1.142 conceitua o estabelecimento na linha

do artigo 90; o artigo 1.143 cuida da possibilidade de sua negociação, também

como já era previsto pelo parágrafo único do artigo 90442; o artigo 1.144 regulamenta

os requisitos necessários para validade dos contratos, cujo objeto seja o

441 A noção de estabelecimento sempre esteve ligada à figura do comerciante ou empresário, sendo assim tratada pelo direito comercial; mostrou-se pouco desenvolvida noutras áreas do direito, embora seja utilizada para a determinação dos direitos do trabalhador, para a definição de hipóteses de incidência de tributos, para efeito de emancipação etc. Na proposta unificadora do Código Civil de 2002 o estabelecimento perdeu o qualificativo "comercial", mas continuou vinculado à figura do empresário sem que algum de seus dispositivos procurasse dar-lhe amplitude mais abrangente. Ora, no sistema do referido Código há pessoas que exercem atividade econômica e que não são consideradas empresárias (designadamente para os fins de se sujeitarem às disposições do direito de empresa), como se dá com os que têm profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística (CC, art. 966, parágrafo único, primeira parte), com os "empresários" rurais e com as sociedades simples (CC, art. 982). Quais as disposições a que se subordinam os estabelecimentos que elas possam ter, sabendo-se que as dos arts. 1.142 a 1.149 do Código Civil pertencem ao regime jurídico próprio do empresário sujeito a registro? No meu modo de ver, nesse particular, o regime jurídico é um só. O fato de se tratar de um conjunto de bens não destinado a propiciar o exercício de atividade em área que a lei reputa própria de empresário, não influi na necessidade prática de, dada a ampla liberdade de contratar, receber esse conjunto de bens o tratamento peculiar que foi atribuído ao estabelecimento do empresário. O agente econômico não empresário, a igual do que ocorre com o empresário, normalmente precisa, como este, de um estabelecimento para o desempenho das atividades econômicas a que se propõe. Refiro-me ao estabelecimento da sociedade simples, onde se inclui a cooperativa, ao do empresário rural e ao daquele que exerce profissão intelectual. Qualquer desses estabelecimentos, à semelhança do que ocorre com o estabelecimento do empresário, pode ser objeto unitário de direitos, caso em que, na falta de outras disposições normativas, lhe são aplicáveis, por analogia, as regras dos preceitos legais atinentes ao estabelecimento do empresário (mercantil). Com essa observação, sempre que o texto se referir a estabelecimento de empresário, ou a estabelecimento empresarial, está a abranger os estabelecimentos de quem quer que exerça atividade econômica, mesmo daquele excluído do conceito de empresário sujeito à inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis. (GONÇALVES NETO, Alfredo de Assis. Direito de Empresa: comentários aos artigos 966 a 1.195 do Código Civil. 6. ed.. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, p. 574-575.). 442 Art. 90. Parágrafo único. Os bens que formam essa universalidade podem ser objeto de relações jurídicas próprias.

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estabelecimento; o artigo 1.145 versa sobre a eficácia dos contratos de alienação de

bens, remetendo implicitamente à possibilidade de serem considerados atos

falimentares, segundo o art. 94, III, c, LF443); o artigo 1.146 alude à sucessão das

dívidas do alienante pelo adquirente do estabelecimento; o artigo 1.147 dispõe

sobre cláusula de não concorrência; o artigo 1.148 disciplina a transferência dos

contratos do alienante para o adquirente; e, por fim, o artigo 1.149 foca a cessão

dos créditos do alienante para o adquirente.

A lei permite que a pluralidade de bens singulares reunidos por uma

pessoa para uma destinação unitária (universalidade de fato) possa ser objeto de

relações jurídicas próprias (art. 90, p. único, CC). Considerando que a sociedade

profissional pode ser detentora de uma universalidade de fato por meio de sua

organização empresarial, ela estará autorizada por lei a negociar essa

universalidade constituída por seus bens, materiais e imateriais, utilizados para a

exploração de sua atividade (consultório, escritório, clínica etc.).

Assim, em que pese a doutrina declarar que a sociedade

profissional, dita simples, não é dotada de estabelecimento na forma posta no

Código Civil, a própria legislação civil reconhece a unidade da pluralidade de bens,

materiais e imateriais, daquele que não é caracterizado como empresário (art. 90,

CC).

Não reconhecer a aplicação analógica das regras sobre o

estabelecimento ao conjunto de bens da sociedade profissional é tratar de forma

desigual os credores de sociedade empresária e os da sociedade simples, pois

estes não teriam a proteção legal acima lembrada. Não só as regras do Direito Civil

relativas ao estabelecimento seriam subjugadas, mas também aquelas relativas à

concorrência desleal, aos credores trabalhistas, aos créditos tributários etc.

Percebe-se que se pode ampliar o leque da concorrência desleal em situações envolvendo outros que não são necessariamente os comerciantes ou empresários.

443 Art. 94. Será decretada a falência do devedor que: III – pratica qualquer dos seguintes atos, exceto se fizer parte de plano de recuperação judicial: c) transfere estabelecimento a terceiro, credor ou não, sem o consentimento de todos os credores e sem ficar com bens suficientes para solver seu passivo;

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Esse é o nosso pensamento, uma vez que entendemos que a concorrência desleal, não deve limitar-se às questões dos empresários. Estes os mais atingidos sem dúvida, porém não são os únicos444.

5.4.3. O aviamento e a clientela na sociedade profissional

Independentemente da terminologia adotada, se estabelecimento ou

simplesmente universalidade de fato, por aqueles que negam esse instituto à

sociedade simples, não há como ignorar a existência de um bem coletivo intangível,

caracterizado pela organização dos bens singulares e formado para o exercício da

atividade da sociedade profissional (art. 90, CC).

Ocorre que, para apuração de haveres de sociedade profissional, a

discussão que se deve levantar é se essa universalidade de fato (ou

estabelecimento) é organizada a tal ponto de gerar um sobrevalor, um aviamento.

O aviamento, como visto, não é considerado um bem imaterial, mas

um atributo ou qualidade do estabelecimento. Ele existe devido à organização do

complexo de bens singulares a qual tem como consequência a capacidade de gerar

lucro ao seu titular. Não existe aviamento sem essa organização dos bens que

caracteriza o bem coletivo intangível (estabelecimento).

E do aviamento resulta a clientela, que é atraída para contratar com

a sociedade para aquisição de bens ou serviços.

Existe uma ligação íntima entre o aviamento e a clientela, uma vez que esta nada mais é do que o resultado do aviamento. Se o aviamento é a aptidão, a qualidade de gerar lucros, esses lucros somente advirão com a existência de um conjunto de pessoas que são atraídas ao estabelecimento à procura de bens e serviços. Quanto mais aviado o estabelecimento, maior sua clientela. A clientela, assim, é um dos fatores do aviamento. A clientela é resultante do aviamento, e este existe graças a ela – um é decorrente do outro. Existe entre eles o que a doutrina chama de “interação mútua” desses atributos do estabelecimento. Nem o aviamento nem a clientela são elementos do estabelecimento, não fazem parte do patrimônio empresarial, mas, sim, são o resultado da aplicação, pelo empresário, dos diversos bens que compõem o estabelecimento445.

444 DE ALMEIDA, Marcus Elidius Michelli. Abuso do Direito e Concorrência Desleal – atualizado com o Novo Código Civil. 1. ed. São Paulo: Quartier Latin, 2004, p. 134. 445 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Marcia Carla Pereira. Curso avançado de Direito Comercial. 4. ed. atual. e rev. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 104.

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Como no momento da apuração de haveres será avaliado cada bem

singular, corpóreo ou incorpóreo, que compõe o estabelecimento, não haveria

distinção se esses bens singularmente considerados são de titularidade de uma

sociedade empresária ou simples, pois, na avaliação individual, isso não fará

diferença nenhuma.

A diferença se apresenta na negativa de reconhecer o

estabelecimento na sociedade simples como forma de afastar o eventual sobrevalor

do aviamento e da clientela na verba do sócio que se retira da sociedade

profissional. Assim, é de interesse do(s) sócio(s) remanescente(s) negar a

existência do estabelecimento na sociedade profissional, porque disso decorre se

excluir o aviamento do cômputo da apuração de haveres. Ao contrário, é do

interesse do sócio que saí da sociedade profissional afirmar a sua existência, para

auferir maior valor no momento de sua saída.

Tal reflexão liga-se àquilo que foi tratado em tópico anterior, quando

reproduzimos sustentação de Tércio Sampaio Ferraz Jr., ao concluir pela

inexistência do estabelecimento em sociedades de profissionais liberais de

engenharia por essa possuir característica personalíssima.

Ao negar-se a existência de estabelecimento naquela espécie de

sociedade profissional, consequentemente, negou-se a existência de aviamento e

clientela, que são qualidades do estabelecimento. E foi exatamente isso o que fez o

Superior Tribunal de Justiça nos Recursos Especiais invocados pelo autor desta

tese.

Ocorre que, como analisado no capítulo anterior, a doutrina costuma

diferenciar duas espécies de aviamento: o objetivo, que seria a aptidão de produzir

lucros em razão de fatores relacionados com o próprio estabelecimento e o

subjetivo, relacionado à pessoa de seu titular446.

446 A doutrina nacional e a alienígena costumam diferenciar duas espécies de aviamento: o objetivo e o subjetivo. O primeiro seria a aptidão de produzir lucros em razão de fatores relacionados com o próprio estabelecimento: os elementos, a organização desses elementos. O segundo é aquele relacionado à pessoa de

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Em síntese, o aviamento objetivo representa a forma como ficam

organizados os bens para o exercício da atividade, sua disposição na loja, a espécie

ou a qualidade das mercadorias, ou produtos que são comercializados; enquanto o

aviamento subjetivo se refere às qualidades pessoais do próprio empreendedor,

seus empregados e o trato com a clientela447.

O aviamento mensurável economicamente seria aquele tido como

objetivo que decorre da organização dos bens singulares, já que não há como

mensurar algo que é pessoal (aviamento subjetivo) por estar atrelado à pessoa

natural448, como bem ponderado por Tércio Sampaio Ferraz Jr.

seu titular. A primeira deriva da qualidade da azienda e, o segundo, de atributos pessoais do organizador da azienda. Interessante perceber que o já estudado parágrafo único do art. 1.164 do Código Civil tem por objetivo garantir ao adquirente do estabelecimento a manutenção do aviamento subjetivo. Explicando, quando o legislador permitiu que o adquirente do estabelecimento pudesse usar o nome do alienante, desde que previsto no contrato de trespasse, teve por desígnio garantir a transferência do aviamento subjetivo. Logo, se a sociedade limitada, denominada Farmácia Esmeralda Ltda., alienar o seu estabelecimento para a Farmácia Nova Droga Ltda., havendo cláusula neste pacto, a adquirente poderia ser assim designada: Farmácia Nova Droga Ltda. Sucessora da Farmácia Esmeralda Ltda. Em outras palavras, o adquirente deseja com isso assegurar a clientela conquistada pelo alienante, em virtude de seu prestígio pessoal, e, por conseguinte, manter o aviamento já consolidado pelo organizador da casa comercial. Ademais, a cláusula de não restabelecimento, prevista no art. 1.147 do Código Civil, é também outro dispositivo que tem por finalidade consolidar o aviamento subjetivo do alienante nas mãos do adquirente. Na verdade, quando, nos sobreditos dispositivos, dissemos que eles têm por objetivo consolidar o aviamento subjetivo nas mãos do adquirente. Isto deve ser recebido com cautela pelo leitor, pois sendo o aviamento uma qualidade pessoal do titular da azienda, este não se transmite diretamente ao adquirente. Na verdade, busca-se, com os mencionados dispositivos, a proteção indireta do aviamento subjetivo (IACOMINI, Marcello Pietro. Estabelecimento empresarial.- Negócios jurídicos pertinentes. Dissertação (Mestrado) – PUC-SP, São Paulo, 2010, p. 55-56). 447 XAVIER, José Tadeu Neves. O estabelecimento empresarial no direito brasileiro. Revista de Direito Mercantil, Econômico e Financeiro, São Paulo, n. 159-160, jul. 2011, p. 107. 448 O estabelecimento, enquanto articulado para o exercício da atividade empresarial, possui um sobrevalor em relação à soma dos valores individuais dos bens que o compõem, relacionado à expectativa de lucros futuros, à capacidade de trazer proveitos. Essa mais valia do conjunto é que se denomina aviamento. O aviamento pode decorrer das causas mais variadas. Pode ser subjetivo, quando ligado às qualidades pessoais do empresário, ou objetivo, quando ligado aos bens componentes do estabelecimento na sua organização. Em qualquer acepção, o aviamento deve ser entendido como “o sobrevalor em relação à simples soma dos valores dos bens singulares que integram o estabelecimento e resumem a capacidade do estabelecimento, por meio dos nexos organizativos entre os seus componentes singulares, de oferecer prestações de empresa e de atrair clientela”. Em outras palavras, o aviamento é a aptidão da empresa para produzir lucros, decorrente da qualidade de sua organização. Esse aviamento tem valor próprio reconhecido pelo Código Civil no artigo 1.187, III, que representa acréscimo em relação aos elementos componentes do estabelecimento. Assim, a soma dos bens singulares que compõem o estabelecimento é menor do que o valor do estabelecimento em si. O valor do estabelecimento não é dado somente pela soma dos valores singulares dos elementos que o compõem, mas também pela soma dos valores dos elementos e do aviamento. SOMA DOS COMPONENTES = a +b + c + ... = X VALOR DO ESTABELECIMENTO = X + Y → Valor do aviamento Apesar de ter valor próprio, para a maioria da doutrina, o aviamento não é considerado bem de propriedade do empresário, mas apenas o valor econômico do conjunto; é, antes de ser uma qualidade, um elemento. “Não é

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A caracterização do aviamento na sociedade profissional deve ser

vista não sob a negativa de sua existência do estabelecimento, mas, sim, na

existência ou não de aviamento objetivo, pois o sobrevalor, a ser identificado na

apuração de haveres, deve restringir-se a ele, desconsiderando-se o aviamento

subjetivo, de que não se apropria a pessoa jurídica.

Tanto é assim que Fabio Ulhoa Coelho449, para melhor esclarecer o

conceito de aviamento, busca didaticamente a sua compreensão por meio de

analogia a uma biblioteca:

Para se entender a natureza desse instituto jurídico é útil socorrer‑se de uma analogia com outro conjunto de bens: a biblioteca. Nela, não há apenas livros agrupados ao acaso, mas um conjunto de livros sistematicamente reunidos, dispostos organizadamente, com vistas a um fim – possibilitar o acesso racional a determinado tipo de informação. Uma biblioteca tem o valor comercial superior ao da simples soma dos preços dos livros que a compõem, justamente em razão desse plus, dessa organização racional das informações contidas nos livros nela reunidos.

Ora, se uma biblioteca, mantida por uma sociedade não empresária,

tem um sobrevalor caracterizado pela organização dos bens individuais que a

compõem, qual o motivo de se desconsiderar esse plus na sociedade profissional?

Como sustentado alhures, é possível averiguar a existência de

organização (empresa) em sociedade profissional, pois não é a espécie de

sociedade simples que torna ou não a existência fática do estabelecimento ou

universalidade de fato e, consequentemente, o sobrevalor caracterizado pela

organização dos bens, tangíveis e intangíveis, que o compõem.

um elemento isolado, mas um modo de ser resultante do estabelecimento enquanto organizado, que não tem existência independente e separada do estabelecimento”. Fran Martins, afirmando o valor próprio do aviamento, atribui-lhe a condição de elemento do estabelecimento, asseverando sua importância para o exercício da atividade empresarial. Ousamos discordar dessa opinião, porquanto não vislumbramos a condição de elemento integrante do estabelecimento. O aviamento não pode ser objeto de tratamento separado e não pode ser considerado objeto de direito, pois não há como conceber a transferência apenas do aviamento. Assim, não se pode considerar o aviamento como bem no sentido jurídico, consequentemente, não se pode incluí-lo no estabelecimento, pois não o integra. Porém, é certo que o aviamento é importante e goza de proteção jurídica, como, por exemplo, na indenização devida ao locatário no caso de não-renovação do contrato de locação não-residencial (TOMAZETTE, Marlon. Estabelecimento empresarial. Revista do Programa de Mestrado em Direito do UniCEUB, Brasília, v. 2, n. 1, p. 301-333, jan./jun. 2005 p. 318-319.). 449 COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial.Direito de Empresa, 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 77.

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Ser contrário à posição acima é reconhecer que uma prestadora de

serviços de plano de saúde, por exemplo, que adota a forma de sociedade anônima

(sociedade empresária), tenha fundo de comércio, enquanto aquela que adotar o

tipo de cooperativa (sociedade simples) não o tenha (art. 982, p. único, CC). É

também admitir que a sociedade voltada para o agronegócio, que não se registrou

na Junta Comercial (sociedade simples), passe a ter, de um dia para o outro,

estabelecimento, pelo simples fato de optar por registro na Junta Comercial,

passando a considerar-se sociedade empresária (art. 984, CC).

Por esses exemplos, torna-se fácil perceber que não é a espécie de

sociedade ou o tipo societário que determinam a existência ou não de

estabelecimento e, consequentemente, a do aviamento (positivo ou negativo), mas,

tão somente, a organização dada aos bens singulares que formam a universalidade

de fato do respectivo titular.

Não cabe mais, na evolução do Direito Comercial, pensar na

distinção entre atividade comercial e civil trazida pela Teoria dos Atos do Comércio,

inserindo nessa última a atividade explorada pelas sociedades prestadoras de

serviços, dentre elas as profissionais450. Nessa visão, devemos considerar, para

análise no momento da apuração de haveres de sociedade profissional, a existência

450 É injustificável, por igual, a posição daqueles que, malgrado assegurarem o valor em exame aos sócios participantes de sociedades comerciais, o negam àqueles integrantes de sociedade civis, argumentando que, nestas, inexistiria o chamado fundo de comércio. Não são raras as decisões pretorianas que afastam, da importância devida ao retirante, aquele sobrevalor, sob o pífio fundamento de que o mesmo inexistiria nas empresas que exercem atividade diversa da comercial. Nada menos procedente. Aqueles que assim sustentam ignoram que a distinção entre o ato de comércio e ato civil trata-se de matéria há muito superada pela doutrina, substituída que foi pelo conceito de atividade empresarial. Decorre, daí, o acerto daqueles que preferem a utilização da locação fundo empresarial à equivocada expressão fundo de comércio. Não se nega, entretanto, que, em determinadas empresas – independentemente da natureza da atividade aí desenvolvida -, os bens imateriais, ou alguns deles, podem não representar qualquer significado econômico, da mesma forma, aliás, como em algumas sociedades, certos bens materiais podem até inexistir ou não representar qualquer expressão pecuniária. Desse modo, assim como o ponto comercial pode, em certas empresas, não representar qualquer valor, o próprio aviamento, quando consequência exclusiva das qualidades personalíssimas de algum dos sócios, não deve integrar os haveres do dissidente, sob pena de locupletamento ilícito deste às custas da eficiência ou capacidade daquele. É o caso de certas empresas prestadoras de serviços nas quais o elemento primordial e mais significativo reside na confiança que a clientela deposita no sócio. Nestas, os demais bens integrantes do ativo, e mesmo os intangíveis (marca, ponto etc.), pouco ou nenhum valor apresentam se comparados com as qualidades do sócio prestador dos serviços. A rentabilidade, em tais espécies de atividades, encontra-se, assim, diretamente ligada à pessoa do sócio que executa e desenvolve os serviços. (FONSECA, Priscila M.P. Corrêa da. Dissolução parcial, retirada e exclusão de sócio no Novo Código Civil. 3. ed., São Paulo: Atlas, 2005, p. 233-234).

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ou não de um sobrevalor (aviamento) e se esse decorre da pessoalidade dos sócios

na exploração da atividade desenvolvida por meio da pessoa jurídica.

Na evolução do Direito Comercial, as relações jurídicas voltadas

para o mercado, como é o caso da atividade profissional, devem ser reinseridas na

disciplina, sob pena de afastar importante fração de atividade negocial de análise

crítica como feita neste trabalho.

Em trabalho de mestrado, no qual buscou tratar da apuração de

haveres na sociedade limitada sob uma análise crítica da jurisprudência, André Luiz

Cardozo Santos451 apresentou os julgados do Superior Tribunal de Justiça, citados

acima, e outros do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, concluindo que a

jurisprudência é, em regra, avessa à inclusão dos bens imateriais no cômputo da

apuração de haveres. Porém, também apresentou arestos do tribunal paulista com

posição contrária, levando em consideração a presença da pessoalidade ou não no

exercício do objeto social452.

451 SANTOS, André Luiz Cardozo. Apuração de haveres na sociedade limitada sob uma análise crítica da jurisprudência. Dissertação (Mestrado) - Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas, 2015, p. 24-25. 452 Destarte, o que se constata nos julgados seguintes é que os bens incorpóreos, destacadamente o fundo de comércio, estão presentes em sociedades atuantes em todos os setores, inclusive nas antigas sociedades civis, excetuadas apenas as sociedades prestadoras de serviços profissionais personalíssimos, ou que destes se aproximam. Entre os julgados analisados, foram encontrados apenas dois casos em que o fundo de comércio não compôs o ativo da sociedade para fim de apuração de haveres, quais sejam: REsp. 958.116 PR e Ap. 0256753-43.2007.8.26.0100. Em ambos os casos, as sociedades são simples e não empresárias. Não parece possível concluir, entretanto, que, nas sociedades simples, o fundo de comércio inexiste. Ao contrário, a verificação se fará no caso concreto. Na Apelação 0006464-76.2004.8.26.0268, em que era parte uma sociedade simples na área de informática, o Tribunal Paulista determinou a inclusão do fundo de comércio nos haveres do retirante. O tribunal adotou posicionamento semelhante para uma sociedade médica na Apelação 9110737-78.2004.8.26.0000. Nesse especial, sustentou a empresa que “[...] não pode, nos termos do parágrafo único 966 do Código Civil, ser

considerada sociedade empresária. Assim, não há falar em avaliação do fundo de comércio para apuração de haveres, uma vez que inexiste atividade empresarial” (BRASIL: 2012b). Tal entendimento foi acatado pelo tribunal, expurgando, o fundo de comércio, em acórdão assim ementado: 3. Nada obstante o tratamento dispensado pelo Código Civil de 2002 às sociedades civis, elevando-as à condição de empresárias, certo é que algumas não exercem atividade exploratória, sendo, por isso, meras organizações formadas para o desempenho de atividades técnicas de seus sócios, embora economicamente relevantes. Verificando-se, no caso concreto, que a sociedade empresária assim formada não tem fundo de comércio agregado a valores incorpóreos, pois subjetivos e agregados à pessoa dos sócios (tal como habitualmente acontece nos escritórios de advocacia), esse valor não poderá ser computado na apuração de haveres, já que não se indeniza uma pessoa pela honorabilidade de outra (BRASIL, 2012d). O outro caso, julgado pela Corte Paulista, é justamente de um escritório de advocacia. Trata-se de ação de apuração de haveres de sócio retirante de renomada banca de advogados, a qual, em razão da sua dimensão, não permitiria ao público uma imediata identificação dos profissionais que a integram, sugerindo, por conseguinte, a existência de uma marca, atrelada a um fundo de comércio, como instrumento de captação de clientela. Entendeu, contudo, o Tribunal Paulista que, dada a característica personalíssima da atividade, bem como a existência de cláusula contratual excluindo o fundo de comércio, indevido seria o seu cômputo aos haveres do sócio retirante. No caso em questão, diferentemente da lide anterior e de grande parte do debate

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5.4.4. Apuração de haveres na sociedade profissional

A doutrina busca classificar as sociedades em sociedade de

pessoas ou sociedade de capitais, levando em conta a natureza da contribuição dos

sócios para o exercício da atividade social. Enquanto as primeiras se constituem

intuitu personae; as segundas, intuitu pecuniae.

As sociedades de pessoas são constituídas em função da qualidade pessoal dos sócios, predominando a consideração pessoal de seus integrantes – o intuitu personae. [...] nas sociedades de capitais é mais importante o valor da contribuição dos sócios ao capital social do que suas características pessoais.453´ 454.

jurisprudencial, o fundo de comércio foi constatado e avaliado pelo perito judicial, mas entendeu o tribunal que esse ativo é do sócio, e não da sociedade, de modo que, quando desta se retira, leva consigo esse bem intangível. Vejamos as razões de decidir. Quando elaborado laudo pelo perito oficial, foram apurados dois valores de avaliação diversos (fls.456 e 463), somando-se, no segundo caso, o do “fundo de comércio contábil”, correspondente a “bens intangíveis” da sociedade aferidos a partir do potencial de lucros futuros (fls.452). Desconsiderados tais “bens intangíveis”, o valor dos haveres da requerente é o estabelecido na sentença, de R$ 62.504,90 (sessenta e dois mil quinhentos e quatro reais e noventa centavos), referenciados ao mês de setembro de 2010, enquanto que, feita sua inclusão, o valor dos haveres sofre um aumento substancial, para R$ 563.882,20 (quinhentos e sessenta e três oitocentos e oitenta e dois reais e vinte centavos), observada a mesma referência. O segundo dos critério não pode, no entanto, vingar, pois contraria regra estabelecida na cláusula contratual acima referida, a qual determina seja a apuração dos haveres limitada ao valor patrimonial da quota (STJ, REsp 83.031-RS, 3ª T., rel. Min. Ari Pargendler, j. 13.11.1999), bem como desconsidera as características específicas de uma sociedade de advogados. O valor estabelecido na sentença recorrida decorreu de apuração contábil, realizada por perito oficial nomeado e, na fundamentação foi reproduzida grande parcela de voto proferido pelo Desembargador Ênio Zuliani quando do julgamento da Apelação 600.040-4/1-00 (TJSP, 4ª Câm. D. Priv., j. 29.10.2009), reconhecida, frente ao conteúdo da atividade profissional estatuída como objeto social, a inviabilidade da afirmação de um “fundo de comércio” e a necessidade de reembolso do simples valor patrimonial das quotas sociais. Não se nega a necessidade de apuração o mais ampla possível na liquidação dos haveres do sócio que se despediu da sociedade (STJ, REsp 4068/PR, Rel. MIN. ANTÔNIO TORREÃO BRAZ, QUARTA TURMA, julgado em 10/04/1995, DJ 15/05/1995, p. 13406), mas, repita-se, não é possível deixar de lado as regras negociais concretas e a natureza da sociedade enfocada. Numa sociedade de profissionais, voltada para a simples organização do exercício da prestação de serviços de natureza intelectual, não há como identificar a formação de um complexo de bens organizado e destinado ao exercício da atividade, conjugando, como universalidade, um aviamento e uma clientela (Waldemar Martins Ferreira, Instituições de Direito Comercial, 4ª ed., Max Limonad, São Paulo, 1956, Vol. II, pp.12-4). Deriva da capacidade profissional de cada sócio, como advogado, isto é, de uma qualidade personalíssima, o sucesso da atividade empreendida a partir da pessoa jurídica (sociedade-corporação), constituída na forma do artigo 15 da Lei 8.904/94, a qual não dispõe de ponto, marca ou freguesia, como o já afirmado por este Tribunal de Justiça no julgado referenciado na sentença recorrida e, mesmo muito antes, quando do julgamento da Apelação 132.391-2 (14ª Câmara Cível, rel. Des. Marcus Vinicius, j. 16.8.1988). (SANTOS, André Luiz Cardozo. Apuração de haveres na sociedade limitada sob uma análise crítica da jurisprudência. Dissertação (Mestrado) - Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas, 2015, p. 24-25). 453 FINKELSTEIN, Maria Eugênia. Manual de direito empresarial. 8. ed. rev., ampliada e reformulada. São Paulo: Atlas, 2016, p. 91. 454Tomando-se em consideração a influência que a pessoa do sócio possui nas sociedades empresárias, estas podem ser classificadas em sociedades de pessoas e sociedades de capitais. Sociedades de pessoas são aquelas em que a pessoa do sócio tem papel preponderante, não apenas na constituição como durante a vida da pessoa jurídica. Assim, constituindo-se uma dessas sociedades, ficará, na sua existência, subordinada à pessoa do sócio: a morte ou incapacidade de um refletirá na pessoa jurídica provocando a sua dissolução. Como sociedades de pessoas temos, no Direito pátrio, as sociedades em nome coletivo, comanditas simples e a sociedade limitada. Faz-se a abstração da sociedade em conta de participação por ser esse um tipo especial

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Ao tratar da característica das sociedades de pessoas, Vera Helena

de Mello Franco afirma que essa é

[...] traduzida no intuitu personae (relevo à pessoa do sócio e consequente estabilidade do quadro societário) e na affectio societatis, entendida como o dever de colaboração entre os sócios de atuarem de boa-fé, uns perante os outros, para atingirem o fim comum455.

Devido à citada característica, a doutrina tem incluído no rol das

sociedades de pessoas a do tipo simples pura, a em nome coletivo e a em

comandita simples. Quanto à sociedade limitada, alguns defendem que essa é

sociedade de pessoas, e outros, que é mista, por conta da possibilidade de

modificação dessa característica no contrato social456.

Ocorre que essa característica relacionada às sociedades de

pessoas (intuitu personae) não se relaciona, exclusivamente, à sociedade

profissional, pois a doutrina admite a possibilidade de uma Sociedade Anônima ser

assim caracterizada.

[...] nas sociedades de pessoas, prevaleceria a celebração de contrato de sociedade intuitu personae, em consideração às qualidades pessoais dos sócios, de modo que os deveres de colaboração e lealdade entre estes seriam mais estritos e marcantes do que nas sociedades ditas de capitais, onde, de regra, sobrelevaria o intuitus pecuniae e, portanto, o fenômeno associativo não encontraria nos atributos pessoais dos sócios a sua explicação. Assim, se numa dada sociedade anônima fechada, observa-se a prevalência dos atributos pessoais dos sócios e a presença de regras de reforço das relações entre os sócios, estar-se-ia diante de uma sociedade

que existe apenas entre os sócios, aparecendo, diante de terceiro, somente um, que age como se fosse um empresário individual ou sociedade empresária. Sociedades de capitais são as em que a pessoa do sócio não é levada em consideração para seu funcionamento, não sofrendo, assim, nenhuma alteração a pessoa jurídica com a mudança ou incapacidade dos sócios. Para essas sociedades a importância principal está na contribuição do sócio para o capital; a sociedade não indaga quem é o possuidor dessa contribuição, que pode ser pessoa física ou jurídica, menor ou maior, incapaz ou capaz. Existindo o capital social regularmente, tais sociedades podem funcionar mesmo sem a colaboração individual dos sócios. A sua administração poderá ser confiada a terceiros, bem como a fiscalização dessa administração, vigorando a lei da maioria do capital: as decisões sociais serão tomadas, não pelo maior número de sócios, mas pelo maior número de ações, ainda que essa maioria pertença a apenas uma pessoa. (MARTINS, Fran. Curso de direito comercial: empresa comercial, empresários individuais microempresas, sociedades empresárias, fundo de comércio. 35. ed. ver. atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, p. 171, 2012 ). 455 FRANCO, Vera Helena de Mello. As sociedades de pessoas na atualidade. Uma visão comparativa crítica. Revista de Direito Mercantil, Econômico e Financeiro, São Paulo, n. 157, jan. 2011, p. 95. 456 COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial. Direito de Empresa, 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 162.

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anônima "de pessoas" e, por efeito, poder-se-ia excepcionalmente aplicar a ela regras próprias de sociedades de pessoas457.

Comparato segue o mesmo raciocínio, ao identificar a possibilidade

de a Sociedade Anônima ser tratada como de pessoas, quando verificadas

características próprias, como limitação na circulação de ações, quóruns

deliberativos mais elevados, distribuição equitativa de cargos na administração:

[...] ser possível falar, escusado o neologismo jurídico, em 'sociedades anônimas de pessoas', sublinhando-se, pela contradição da primeira das expressões, a importância do intuitus personae como pressuposto integrativo do pacto societário [...]. A sociedade anônima de pessoas' apresenta, assim algumas características peculiares, que a distinguem das demais companhias, tanto abertas quanto fechadas. São elas, comumente: 1) a limitação à circulação das ações, seja no estatuto, seja em acordo de acionistas; 2) quórum deliberativo mais elevado do que o legal, para certas e determinadas questões, tanto na assembleia geral, quanto no conselho de administração, o que equivale à atribuição de um poder de veto à minoria; 3) a distribuição equitativa dos cargos administrativos entre os grupos associados; 4) a solução arbitral dos litígios societários. Por isso mesmo, já se pôs em dúvida que tais sociedades ainda possam ser consideradas, propriamente, anônimas458.

A sociedade profissional, por ser sociedade contratual, de natureza

simples e, especialmente, por ser voltada à prestação de serviços de natureza

intelectual, tem sido classificada pela doutrina como sociedade de pessoas.

Todavia, uma sociedade empresária do tipo contratual, qualquer que seja o ramo de

atividade (prestação de serviços, comercio, indústria etc.), é também classificada

como de pessoas. Acontece que, a partir do momento em que a sociedade, seja ela

simples ou empresária, adota o tipo limitada, a doutrina busca encaixá-la como

“híbrida”, com características de sociedade de pessoas e de capital.

[...] o que se pretende aqui abordar é o caráter híbrido – capital/pessoa – que a sociedade empresária do tipo limitada hoje possui. Há até quem considere que a sociedade limitada, por conta deste aludida “hibridismo”, esteja muito semelhante, na sua operacionalização, à sociedade anônima. Ademais, pelo que já foi consignado por Véronique Magnier, tal fenômeno também ocorre na França: La société à responsabilitée est d´une nature juridique mixte. Par soncaractère fermé, elle se presente pluôt comme une société de personnes et les règles qu’ils président à as constituition et à as dissolution

457 FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes; ADAMEK, Marcelo Vieira von. Affectio societatis: um conceito jurídico superado no moderno direito societário pelo conceito de fim social. Revista de Direito Mercantil, Econômico e Financeiro, São Paulo, n. 149-150, jan. 2008, p. 127. 458 COMPARATO, Fábio Konder. Restrições à circulação de ações em companhia fechada: nova et vetera. Novos Ensaios e Pareceres de Direito Empresarial, Rio de Janeiro: Forense, 1981, p. 30-35.

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en témoignet. En revanche, la loi de 1966 et les rapprochment avec la société anonyme, notamment pour ce qui est des régles d´organisation et fonctionnement de la société459. Portanto, a sociedade limitada não é mais formada, apenas, por pessoas físicas que, por afeição mútua, resolvem associar-se para atingir seus objetivos comerciais. Hoje, de acordo com os princípios que norteiam o Direito de Empresa, o capital prepondera e as associações, mesmo entre pessoas naturais, são frequentes, por conta das trocas que ocorrerão em decorrência da expertise e do know-how de cada um – trata-se da preponderância das relações econômicas, pautadas pelo fator capital, em detrimento das ligações afetivas entre pessoas que pactuam de interesses em comum460.

A simples caracterização da sociedade como de profissionais não

impõe a conclusão lógica de tratar-se de uma sociedade de pessoas, pois, apesar

de essa característica ser inerente às sociedades contratuais e, portanto, à de

profissionais, a pessoalidade dependerá do funcionamento de cada pessoa jurídica.

Não há uma sociedade, seja empresária ou simples, exclusivamente

de pessoas, com exclusão de característica de sociedade de capital, pois ambas as

características são importantes para o desenvolvimento do negócio. Uma sociedade

pode ser considerada “mais de pessoas” e “menos de capital”, ou vice-versa, cabe

ao operador do direito verificar a situação em cada caso concreto.

Há sociedades em que os atributos individuais do sócio interferem com a realização do objeto social e há sociedades em que não ocorre esta interferência. Em algumas a circunstância de ser o sócio competente, honesto ou diligente tem relevância para o sucesso ou fracasso da empresa, ao passo que em outras, tais características subjetivas decididamente não influem no desenvolvimento do objeto social [...]É claro que não existe sociedade composta exclusivamente por “pessoas” ou exclusivamente por “capital”. Toda sociedade surge da conjugação desses dois elementos, ambos imprescindíveis. O que faz uma sociedade ser “de pessoas” ou “de capital” é, na verdade, o direito de o sócio impedir o ingresso de terceiro não sócio no quadro associativo existente nas de perfil personalístico e ausente nas de perfil capitalístico.461.

Apesar de Tércio Sampaio Ferraz Jr. sustentar que as sociedades

formadas para o exercício de atividades de profissionais liberais, em função da

459 MAGNIER, Véronique. Droit des sociétés. Paris: Dalloz, p. 155, 2002: “A sociedade limitada é de uma natureza jurídica mista. Por seu caráter fechado, ela se apresenta quase sempre como uma sociedade de pessoas com regras que presidem a sua constituição e a sua dissolução. A Lei de 1966 trouxe uma aproximação com as regras da sociedade anônima, principalmente quanto às regras de organização e funcionamento dessa sociedade. ” 460 ROVAI, Armando Luiz. Impacto do código civil de 2002 no registro de empresa na era da globalização. Tese (Doutorado) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2006, p. 89. 461 COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial. Direito de Empresa, 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 147-149.

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confiança pessoal, não têm fundo de comércio propriamente dito, na realidade essa

afirmação pode ser afastada, em alguns casos, na verificação de características de

sociedade de capital que influenciariam no negócio.

[...] as sociedades simples constituem-se com o fim precípuo de dar suporte ao exercício de determinada profissão intelectual. O patrimônio intelectual daqueles que compõem a sociedade possui papel de extrema relevância em relação aos investimentos materiais. Há evidente destaque dos esforços pessoais, quando comparados ao capital. É certo que na maioria das situações, a sociedade profissional seria predominantemente de pessoas, pois a atividade intelectual explorada depende dos membros que compõe a pessoa jurídica462.

Uma sociedade profissional tem como seu principal “patrimônio” os

profissionais que a compõem. São os sócios, profissionais intelectuais que exercem,

em regra, a atividade explorada pela pessoa jurídica. Por exemplo, no escritório de

advocacia, são os advogados que elaboram peças processuais, pareceres,

comparecem em audiência, reuniões, respondem às consultas etc: no de

engenharia, são os engenheiros que elaboram estudos, projetos, análises,

avaliações, vistorias, perícias, pareceres e divulgação técnica (art. 7º, c, Lei n.º

5.194/1966); no de biologia, cabe ao biólogo formular e elaborar estudo, projeto ou

pesquisa científica básica e aplicada, nos vários setores da Biologia ou a ela

ligados, bem como os que se relacionem à preservação, ao saneamento e ao

melhoramento do meio ambiente, executando direta ou indiretamente as atividades

resultantes desses trabalhos (art. 2º, I, Lei n.º 6.684/1979).

Cada sociedade profissional tem em seu quadro pessoas que são

consideradas essenciais para a atividade, porém essas não são, necessariamente,

sócias. Em algumas sociedades profissionais, a prestação de serviços pode ser

prestada por profissionais contratados para esse fim (auxiliares ou colaboradores),

com atuação direta ou não dos sócios na execução dos serviços. Pode uma

sociedade profissional contratar profissionais habilitados para executar os serviços

postos no mercado, sem que os sócios se envolvam na operação e, isso, não

descaracteriza a sociedade profissional como simples. Ainda, pode a sociedade

462 BRASIL. Superior Tribunal De Justiça. Recurso Especial Nº 1227240 - SP, Relator: Ministro Luís Felipe Salomão, Data de Julgamento: 26/05/2015, T4 - Quarta Turma, Data de Publicação: DJe 18/06/2015.

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profissional ter como sócio uma outra pessoa jurídica, sem qualquer atuação

“pessoal” no exercício da atividade.

Imaginemos uma sociedade profissional para prestação de serviços

de enfermagem, portanto uma sociedade simples, constituída por dois enfermeiros

que buscam prestar seus serviços para cuidar de idosos. Inicialmente somente os

sócios e administradores atuam para o exercício do objeto social. O sucesso do

empreendimento é tamanho que é necessária a contratação de outros profissionais,

não só enfermeiros, mas também uma secretária para auxiliar no agendamento dos

serviços. Após algum tempo, os sócios não mais atuam em campo, preferindo

administrar a sociedade e contratar outros colaboradores para o atendimento aos

clientes. Como em nenhum momento o objeto social foi alterado, mas tão somente a

estrutura organizacional, a sociedade manteve-se como simples, não empresária,

mas o fator pessoalidade, inicialmente presente, deixou de ser preponderante para

a atividade.

Outras atividades desenvolvidas por sociedades profissionais,

caracterizadas como simples pelo disposto na lei material, também podem ser

desenvolvidas sem pessoalidade e, mesmo assim, atrair clientela capaz de majorar

o valor do conjunto organizado de bens e direitos necessários para exploração da

atividade.

Existe caso de uma clínica médica com finalidade de assessorar

casais para terem filhos (reprodução humana), logo uma sociedade profissional,

cujos sócios são pessoas jurídicas (holdings e investidora), e as pessoas que atuam

na atividade não têm nenhuma relação com os sócios.

Ainda na medicina, é cada vez mais comum o uso da tecnologia

para realização de cirurgia463, sendo que as clínicas e hospitais estão aderindo a

essa tendência, a fim de aprimorar suas atividades464.

463 As cirurgias cardíacas, retiradas de tumores de cabeça e pescoço e, principalmente, a extração total ou parcial da próstata (prostatectomia) são as cirurgias mais frequentes que utilizam robôs no Brasil. A Cirurgia Robótica disponível para o tratamento de diversas patologias, pode beneficiar pacientes na diminuição da dor e do desconforto no pós-operatório, na diminuição de perdas sanguíneas durante o

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Na advocacia, por exemplo, também é possível verificar escritórios

que exercem sua atividade sem predominância da pessoalidade dos sócios, o que

não descaracteriza essas espécies de sociedade de advogados como profissionais.

Esses escritórios se utilizam de uma organização dos fatores de produção de forma

diferenciada para a exploração de sua atividade sem, no entanto, infringir as

disposições do Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil

(EAOAB) e seu Código de Ética profissional.

A revista Análise Advocacia 500 - Edição 2016 465 publicou diversos

relatórios sobre os escritórios de advocacia mais admirados do País, sendo que,

dentre esses, foi constatada a existência de sociedades de advogados compostas

por mais de 1.400 (mil e quatrocentos) advogados dentre sócios, associados e

advogados contratados, sem considerar eventuais auxiliares (não advogados),

essenciais para o desenvolvimento de atividade dessa envergadura. Esses dados

podem ser vistos no Quadro 1.

Quadro 1- Ranking dos escritórios de advocacia, por número de

advogados

Rank Nome da sociedade, sede e fundação Sócios Não sócios Total

1 Nelson Willians & Advogados Associados, São

Paulo, 1999

www.nwadv.com.br

60 1428 1488

2 Siqueira Castro Advogados, São Paulo, 1948

www.siqueiracastro.com.br

73 780 853

procedimento, no menor tempo de permanência no hospital e ainda oferece a oportunidade de retorno mais rápido às suas atividades diárias. Disponível em: <http://www.healthchess.com.br/robotica-a-servico-da-medicina/> Acesso em: 19 jun. 2017. 464 Avanços tecnológicos assim têm mudado radicalmente o papel do médico. Robôs superprecisos e minimamente invasivos se colocam entre o cirurgião e o paciente. Equipes internacionais tomam decisões em teleconferências. Atendimentos online dispensam a visita ao consultório. Casas recebem equipamentos que transformam o quarto numa enfermaria. E dúvidas corriqueiras são resolvidas – ou pioradas – no Google. • 73 mil das 85 mil cirurgias de câncer de próstata nos EUA em 2009 foram feitas com a assistência de robô. • 136 mil procedimentos cirúrgicos foram realizados com o sistema robotizado DaVinci no mundo em 2009. Isso dá um aumento de 60% em seu uso nos últimos dois anos. • 94 sistemas DaVinci já estão instalados no mundo. Já seu concorrente, o Zeus, tem 50 unidades instaladas. Disponível em: <http://super.abril.com.br/saude/robos-roubarao-o-lugar-de-medicos-nas-salas-de-operacao/> Acesso em: 19 jun. 2017. 465Análise Advocacia 500: Os escritórios e os advogados mais admirados do Brasil. 44. ed.. São Paulo: Revista Análise, p. 232, out. 2016.

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184

3 Tozzinifreire Advogados, São Paulo, 1976

www.tozzinifreire.com.br

80 470 550

4 Décio Ferire & Associados, Rio de Janeiro, 1992

www.deciofreire.com.br

9 493 502

5 Sette Câmara, Côrrea e Bastos Advogados

Associados, Belo Horizonte, 1990.

www.scbadvogados.avd.br

9 493 502

6 Mattos Filho, Veiga Filho, Marrey Jr. e Quiroga

Advogados, São Paulo, 1992

www.mattosfilho.com.br

72 352 424

7 Le, Brock, Camargo Advogados, São Paulo, 2013

www.lbca.com.br

80 332 412

8 Pinheiro Neto Advogados, São Paulo, 1942

www.pinheironeto.com.br

86 321 407

9 Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados, São

Paulo, 1972

www.machadomeyer.com.br

53 290 343

10 Azevedo Sette Advogados, São Paulo, 1967

www.azevedosette.com.br

33 285 318

Fonte: Revista Análise Advocacia 500 - Edição 2016.

Na pesquisa apresentada, é possível constatar que o maior

escritório do Brasil, em números de profissionais, possui 1.488 (mil quatrocentos e

oitenta e oito) advogados, dentre os quais 60 (sessenta) são sócios e 1.428 (mil

quatrocentos e vinte e oito), não sócios, sem mencionar as demais pessoas que

atuam como auxiliares ou colaboradores. Será possível admitir, com base nesses

números, que referida sociedade profissional é personalíssima e sem qualquer

sobrevalor por sua organização?

Pela constatação dos números de profissionais que atuam nos

referidos escritórios de advocacia, parece-nos razoável crer que o caráter

“pessoalidade”, esperado dessa espécie de sociedade profissional, não é fator

preponderante, o que justificaria a existência do aviamento objetivo no

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estabelecimento explorado pela pessoa jurídica criada por esses profissionais

intelectuais (advogados)466.

No caso de um escritório de advocacia em que a função dos sócios

é administrar a sociedade profissional e atuar em situações ou clientes

considerados estratégicos (elaboração de pareceres, reuniões estratégicas etc.),

costuma-se deixar para advogados contratados (não sócios) outras funções

(peticionamento, comparecimento em audiência, resposta de consultas, reuniões

466 Por sua vez, a organização interna dos hospitais toma a feição de verdadeiras franquias, quando os seus serviços especializados são cedidos a equipes fechadas de médicos de renome e que dão confiabilidade ao sistema. A este respeito, verifica--se que a busca por profissionais de competência reconhecida (e capazes de agregarem nova clientela), se transforma em uma briga no mercado, fazendo-se a sua captação pelo oferecimento de melhores condições de trabalho e de remuneração, tal como acontece na atividade comercial, industrial e financeira. Em algumas outras profissões (como engenharia e arquitetura) o caráter empresarial não se encontra ainda tão desenvolvido, mas nelas tem sido adotado o mesmo sistema operacional da empresa. Talvez o setor que, depois da medicina, mais tenha se aproximado da figura da empresa mercantil na sua forma operacional seja o da advocacia. Grandes e até mesmo macro escritórios têm marcado a sua presença no mercado, especialmente nas grandes cidades, dividindo sua presença entre a matriz e diversas filiais que se espalham por locais considerados estratégicos. Em sua organização interna existem os mesmos departamentos e facilidades das empresas tradicionais; são instituídos quadros de carreira, dotados de hierarquia e com planos de saúde e de previdência; adota-se sistema de gerenciamento profissional e de auditorias interna e externa; a morte do fundador não caracteriza necessariamente a extinção do estabelecimento, que continua com os demais participantes. Ressalte-se que deste fato avulta um sentido institucional presente nesta e em outras atividades tradicionalmente liberais. Isto porque a empresa em geral busca auferir lucros em caráter duradouro, pensando e agindo em vista do longo prazo, do que decorre a necessidade de se demonstrar aos clientes que ela estará ali no futuro próximo ou mais distante, para lhe dar segurança quanto a problemas que possam surgir (o recall de automóveis é um exemplo frisante). Há um enorme custo na atualidade na prestação liberal de serviços (direto e indireto) este outro fator que as predispõe para a empresarialidade. Os exemplos são inúmeros: a disponibilidade de equipamentos hospitalares e dos necessários à realização de exames clínicos em larga escala pela adoção de modernas tecnologias; a instalação de redes de informatização da atividade e a compra dos programas para sua utilização; a manutenção de uma infraestrutura de pessoas e de materiais destinados à realização da atividade-fim; os seguros cuja contratação se torna imprescindível; eventuais contratos de licença a serem celebrados; a abertura de filiais objetivando racionalizar os serviços no plano horizontal; a necessidade de se dar aos prestadores de serviços um treinamento contínuo e de qualidade; etc. A clientela é disputada no mercado por meio da participação em tomadas de preço que fazem os clientes junto a tais escritórios, considerados por aqueles em um mesmo patamar quanto à qualidade dos seus serviços, ou seja, surgindo o reconhecimento de uma fungibilidade relativa na prestação dos seus serviços. Do seu lado, tais escritórios procuram criar algum tipo diferencial de qualidade diante do mercado, que sirva para ganhar e manter clientes. Por exemplo, o atendimento pessoal pelos sócios seniors, especialidade, prontidão, rapidez na solução dos casos, etc. são alguns dos ingredientes apresentados como fatores de qualidade diferenciada. Fusões, aquisições e cisões (em termos) têm sido costumeiras em tais empresas, que procuram melhorar o seu staff, adquirindo junto com eles boas carteiras de clientes. De outro lado, como se disse acima, a morte do sócio fundador que, em vida, levou o escritório a uma posição de destaque no cenário de sua atividade não mais caracteriza uma fuga geral de clientes. Estes se sentem seguros em continuar sendo atendidos pela mesma organização, considerada a sua estabilidade. A própria denominação do escritório torna-se uma marca importante no mercado, tanto que se procura mantê-la sem alterações, malgrado a mudança dos sócios que a formaram originalmente. Proibidos de fazerem publicidade direta, nem por isto a busca pela clientela deixa de ser feita por outros meios, tais como o patrocínio de seminários e a publicação de obras jurídicas, a publicação de trabalhos pelos sócios e advogados dos escritórios na mídia especializada, etc., todos com o objetivo de destacar a qualidade daquela empresa no nicho do mercado que se encontra explorando. A este respeito, são encontrados escritórios de massa, outros atuando em certas especialidades e outros que apresentam a característica de boutique, com atendimento personalizado aos seus clientes. (VERÇOSA, Haroldo Malheiros Dulclerc. O futuro do direito comercial no Brasil. Revista de Direito Mercantil, Econômico e Financeiro, São Paulo, n. 153-154, jan. 2010, p. 20-21.).

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etc). Esses escritórios, para uma administração mais eficiente, investem em

software de gestão, acompanhamento processual mecanizado (push),

coordenadores de equipe formados em outras especialidades (administradores,

economistas, contabilistas etc.), paralegais para auxiliar em funções burocráticas

(geração de relatório, planilhas etc.), departamento pessoal (RH), financeiro,

coaching, criação de plano de carreira etc. Atualmente existem até mesmo

escritórios que investem em “robôs”, capazes de analisar contratos467 e petições em

demandas repetidas “de massa”468.

Em que pese Ruy Barbosa469 declarar aos formandos da turma de

1920 da faculdade de Direito do Largo de São Francisco: “Não fazer da banca

balcão”, na realidade vemos inúmeros escritórios de advocacia, além de outras

espécies de sociedades profissionais, explorando a sua atividade voltada ao

mercado, organizando-a de forma empresarial, sem, contudo, convertê-la em

elemento de empresa (por vedação legal) ou infringir as normas éticas da categoria

profissional.

Tal conclusão, inclusive, se extrai da leitura da íntegra do voto

vencedor do Ministro João Otávio de Noronha, proferido no Recurso Especial n.º

958.116/PR, o qual, apesar de decidir, no caso em análise, pela não inclusão dos

valores do estabelecimento no computo da apuração de haveres da sociedade

profissional de engenharia objeto da lide, ponderou que:

[...] não se pode descurar que, mesmo que o Código Civil tenha incluído a antiga sociedade comercial e a civil no mesmo conceito, há sociedades cujos integrantes se reúnem com o fim de exercer atividades intelectuais, sendo os respectivos patrimônios constituídos mais de talentos pessoais do que de bens materiais, que não ultrapassam alguns bens móveis. Nessa linha de raciocínio, sendo apurados valores como se a sociedade fosse dissolvida, após levantamentos de débitos e créditos, não haveria a computação do fundo de comércio ou goodwill, como alguns denominam. [...] Os exemplos mencionados indicam o que habitualmente acontece em se tratando de sociedades formadas para o desenvolvimento das atividades técnicas de seus sócios.

467 O programa, chamado COIN (Contract Intelligence), interpreta acordos de empréstimo comercial, atividade que normalmente consumia 360 mil horas de advogados por ano. O software revê os documentos em segundos, é menos propenso a erros e nunca pede férias. Disponível em: < https://conteudo.startse.com.br/mundo/lucas-bicudo/software-do-jpmorgan/> Acesso em: 19 jun. 2017. 468 Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2016-mar-05/robos-escritorio-atua-360-mil-processos-420-advogados> Acesso em: 19 jun. 2017. 469 BARBOSA, Ruy. Oração aos moços. Edição popular anotada por Adriano da Gama Kury. 5. ed. Rio de Janeiro: Edições Casa de Rui Barbosa, 2009, p. 47.

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Evidentemente, há exceções, pois, ainda com base nos exemplos dados, é certo que existem escritórios de advocacia que falam por seus próprios nomes, bem como há sociedades formadas por engenheiros que constituem verdadeiras sociedades empresárias de geração e circulação de riquezas, o que leva à conclusão de que a uniformização do entendimento sobre a questão de o fundo de comércio compor ou não a avaliação para retirada de um sócio certamente levará a hipóteses de práticas injustas. Cada caso deve ser mensurado particularmente, no sentido de se aferir se, realmente, existe o goodwill ou se os valores incorpóreos acompanham as pessoas dos sócios470.

Não se nega que a sociedade profissional é, em regra, a sociedade

entre profissionais cuja finalidade é permitir o exercício da profissão intelectual de

forma coletiva, possibilitando a divisão de custos e tarefas entre os sócios, dando

maior competitividade à atividade no mercado. Todavia, a massificação das

relações de consumo permite o desenvolvimento de sociedades profissionais em

sentido estrito (impessoais), como ocorre na medicina, na qual o consumidor

(paciente) pode procurar um profissional no meio de um catálogo do plano de saúde

que o assiste. O mesmo ocorre com outras profissões neste mercado em que o

preço, muitas vezes, é mais importante do que a qualidade profissional, sem

embargo das críticas que essa afirmação possa gerar.

Essa constatação, como vimos, pode ser também ampliada às

tantas outras sociedades profissionais que, para o avanço da economia e do

mercado, buscam na organização formas de angariar clientela com consequente

sobrevalor ao estabelecimento, seja pela pessoalidade (aviamento subjetivo) ou por

outros meios impessoais (aviamento objetivo). É necessária análise casuística para

aferir se há ou não aviamento ou se a pessoa jurídica consiste tão somente em

meio para prestação de serviços pelos profissionais que compõem a sociedade.

Sem análise do caso concreto, não é possível concluir que o

aviamento referente à prestação de serviços do sócio retirante ou daquele que se

mantém na sociedade foi conquistado unicamente em razão de suas respectivas

qualidades pessoais, uma vez que, atuando por meio de empreendimento coletivo,

é verossímil que a clientela também tenha sido atraída pela exploração da atividade

por meio de sociedade profissional471. Não se trata, aqui, apenas de desconsiderar o

470 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 958.116 - PR, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Rel. p/ Acórdão Ministro Raul Araújo, Data de Julgamento 22/05/2012, T4 - Quarta Turma, Data de Publicação: DJe 06/03/2013. 471 DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE COM APURAÇÃO DE HAVERES. Insurgência que se circunscreve à indenização do fundo de comércio em sociedade empresária de médicos. O fundo empresarial

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renome dos profissionais que atuam na sociedade profissional, mas de valorar a

projeção da empresa no segmento econômico em que atua.

Em análise de um caso de sociedade profissional que explorava

atividade médica, o tribunal paulista concluiu pela existência de aviamento pelo fato

de a sociedade estar constituída há mais de vinte anos e, portanto, ter construído

sólida reputação e fiel clientela, especialmente de planos de saúde que respondem

por expressiva parcela do movimento e chamariz da clientela. No caso, a sociedade

era altamente rentável e, segundo apontou o laudo pericial, contou com o trabalho

dos sócios, além de empregados e auxiliares contratados a prestar serviços no

local472.

Noutro caso, em que se analisou a retirada de um sócio de um salão

de cabelereiro, o tribunal paulista manteve o referido posicionamento, verificando a

existência de aviamento em sociedade profissional. No voto do referido acórdão, é

possível verificar que foi levada em consideração a reputação profissional de cada

um dos sócios na valorização do aviamento e que a retirada de um deles provocaria

a perda parcial da clientela, porém, por outro lado, Seria inegável que o expressivo

faturamento mensal da sociedade foi indicativo de que a clientela não repousava

somente nas pessoas dos sócios, mas também nos demais profissionais que

atuavam no estabelecimento e em seu nome consolidado por anos de atividade473.

(goodwill) normalmente deve compor o valor dos haveres do sócio, pois constitui ativo intangível, mas economicamente mensurável. Nas sociedades que têm por objeto o exercício de profissões regulamentadas, contudo, deve ser aferida caso a caso a existência de aviamento. Sociedade de médicos prestadores de serviços reunidos em clínica tradicional, estabelecida há vinte anos em bom ponto, com sólida clientela, inclusive de planos de saúde. Existência de aviamento que se traduz pelo atrativo à clientela decorrente do bom nome, da tradição e dos contratos de plano de saúde. Abatimento de parte do aviamento, em razão da clientela que acompanhará o sócio excluído. Recurso provido em parte. (ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Agravo de Instrumento nº. 2045721-19.2015.8.26.0000, Relator: Francisco Loureiro, Data de Julgamento: 20/10/2015, 1ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 21/10/2015) 472 DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIO. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios - AGI: 0011810-49.2013.8.07.0000, Relator: SIMONE LUCINDO, Data de Julgamento: 31/07/2013, 1ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJe 07/08/2013. 473 DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE COM APURAÇÃO DE HAVERES Insurgência que se circunscreve à indenização do fundo de comércio em sociedade empresária de cabelereiro O fundo empresarial (goodwill) normalmente deve compor o valor dos haveres do sócio retirante, pois constitui ativo intangível, mas economicamente mensurável Nas sociedades que têm por objeto o exercício de profissões regulamentadas, contudo, deve ser aferido caso a caso a existência de aviamento. Existência de aviamento indenizável de salão de cabelereiro com mais de 20 anos de funcionamento e sólida carteira de clientes Impossibilidade de considerar valores indevidamente desviados no cálculo do goodwill e no cálculo dos valores dos haveres, pois presume-se que o sócio retirante participou da movimentação financeira ou ao menos dela teve ciência, conforme cláusula quinta do estatuto social que estabelece a necessidade da assinatura de pelo menos dois sócios para movimentar a conta da sociedade. Provimento do recurso do autor, para condenar os réus ao pagamento dos haveres do sócio retirante. (ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São

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Noutro caso, foi negada a existência do aviamento em sociedades

de consultoria em que se verificou que o desempenho resultava de atividade

personalíssima dos sócios, seu carisma, sua competência profissional, sua

capacidade de atrair novos clientes (intuitu personae) – uma sociedade entre

profissionais, portanto. No voto, foi destacado que não se descarta a possibilidade

da existência de aviamento em sociedade profissional, à vista e mediante o exame

das circunstâncias do caso concreto, porém, naquele caso, o autor não teria

comprovado que sociedade gozava por si de valor intrínseco resultante da

consolidação de seu nome na área de atuação, tempo de atividade, confiança no

mercado e clientela, caracterizadores do goodwill474.

A análise de como são distribuídos os lucros na sociedade

profissional pode ser, por exemplo, indício da existência de aviamento. Nesse

sentido, se a remuneração dos sócios não for baseada em suas respectivas

carteiras de clientes, mas for paga por distribuição de lucros em cálculo baseado no

lucro total da sociedade e proporcional às cotas, há demonstração lógica que

justifica a existência de aviamento objetivo e, consequentemente, sua inclusão nos

haveres do sócio retirante da sociedade profissional. Em contrapartida, se a

distribuição ocorrer de forma a respeitar a carteira individualizada de cada sócio no

desempenho de sua atividade profissional, seria observado apenas o aviamento

subjetivo, indivisível e que não deve ser considerado na apuração de haveres

(sociedade profissional da espécie entre profissionais)475.

Paulo. Apelação nº. 9195265-40.2007.8.26.0000, Relator: Francisco Loureiro, Data de Julgamento: 13/09/2012, 6ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 27/09/2012). 474 DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE C/C APURAÇÃO DE HAVERES. Empresa de consultoria empresarial. Inexistência de haveres em favor do sócio retirante. Ausência de prova de crédito oriundo de honorários por horas trabalhadas. Autor que era sócio, e não prestador autônomo de serviços. Mensagens eletrônicas insuficientes para demonstração do crédito. Recebimento de sua parte do fundo de comércio. Impossibilidade. Empresa de pequeno porte de consultoria empresarial, destituída de aviamento. Performance social fundada nos atributos pessoais dos sócios. Reembolso de despesas. Crédito já contabilizado na perícia. Pretensão à limitação de sua responsabilidade pelos passivos fiscais anteriores a seu ingresso na sociedade. Impossibilidade. Ausência de previsão contratual. Retirada do autor efetivada somente em junho de 2.010, não em fevereiro, como constou da perícia. Necessidade de complementação da perícia. Recurso parcialmente provido. (ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação nº. 0031059-54.2010.8.26.0002, Relator: Francisco Loureiro, Data de Julgamento: 21/09/2016, 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, Data de Publicação: 22/09/2016) 475 APELAÇÕES CÍVEIS. AGRAVO RETIDO. AUSÊNCIA DE REITERAÇÃO NAS RAZÕES. INADMISSIBILIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA. SUPERAÇÃO, NOS TERMOS DO ART. 249, § 2º, DO CPC. SOBREPARTILHA. COTAS SOCIAIS. SOCIEDADE DE ADVOCACIA. DESCABIMENTO. 1. Não se conhece de agravo retido cuja apreciação pela Corte não reiterada expressamente nas razões recursais. 2. Nos termos do art. 249, § 2º, do CPC, é possível afastar a preliminar de nulidade da sentença quando o mérito

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A verificação de aviamento objetivo ocorrerá quando houver a

consolidação do nome e da reputação da sociedade profissional no mercado em

que atua, e a fidelização de seus clientes for dissociável da pessoa de seus sócios

(sociedade profissional em sentido estrito)476. Nos casos em que, mesmo com a

retirada de um dos sócios, a preservação da empresa representa a impessoalidade

da atividade e permite concluir pela necessidade de divisão do fundo de comércio

nas sociedades, ainda que objeto social seja a prestação de atividade intelectual.

Evidentemente o sócio retirante pode se reestabelecer em outra

sociedade profissional ou explorar individualmente sua atividade intelectual, porém,

não apagará a clientela leal que deixou e que continua a procurar a sociedade em

que foi sócio. Esta sociedade profissional da qual se retirou preservará a empresa,

continuando suas atividades, fiada em recomendações, em boas experiências

anteriores, na localização, enfim, naquilo que a doutrina chama de aviamento,

elemento integrante do fundo de comércio, com valor econômico apreciável e que

deve compor os haveres do sócio retirante477.

favorece a quem aproveitaria a nulidade. 3. Não são partilháveis as cotas da sociedade de advogados, personalistas de prestação de serviços profissionais, identificadas no Código Civil como sociedades simples, dedicada ao exercício da profissão de seus integrantes, e que não se enquadram como ente empresarial. 4. Consequentemente, invertidos os ônus sucumbenciais, não pode ser acolhido o pleito de sua majoração formulado pela autora. AGRAVO RETIDO NÃO CONHECIDO. APELO DO RÉU PROVIDO. APELAÇÃO DA AUTORA DESPROVIDA. (ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Apelação Cível Nº 70058902198, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ricardo Moreira Lins Pastl, Julgado em 05/06/2014) 476 APELAÇÃO. AÇÃO ORDINÁRIA DE COBRANÇA. HAVERES SOCIAIS. DISSOLUÇÃO PARCIAL DA SOCIEDADE. MORTE DE UM DOS SÓCIOS. ACOLHIMENTO DA PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA E EXCLUSÃO DE ALGUMAS DAS ACIONADAS. NEGATIVA DO DIREITO POSTULADO QUANTO AO FUNDO DE COMÉRCIO. PROCEDÊNCIA PARCIAL. INSURGÊNCIA. PRELIMINAR DE LEGITIMIDADE ATIVA. NÃO CONHECIMENTO, ANTE A FALTA DE CONTROVÉRSIA A RESPEITO. PRELIMINAR DE LEGITIMIDADE PASSIVA DAS RÉS EXCLUÍDAS NA SENTENÇA. ILEGITIMIDADE QUE ORA SE CONFIRMA, PORQUE INCOMPROVADA A RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA INVOCADA PELOS APELANTES. REJEIÇÃO DA PREFACIAL. SOCIEDADE DE RESPONSABILIDADE LIMITADA. HAVERES SOCIAIS QUE TAMBÉM DEVEM CONSIDERAR O FUNDO DE COMÉRCIO CONSTITUÍDO AO LONGO DA DURADOURA EXISTÊNCIA DA CLÍNICA ENVOLVIDA. NATUREZA EMPRESÁRIA INDISCUTÍVEL, DIANTE DAS PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO, A EXEMPLO DO GRANDE CONCEITO DA EMPRESA E SUA SÓLIDA CARTEIRA DE CLIENTES NA ÁREA DE SAÚDE, CUJO RAMO DE ATUAÇÃO NÃO DESVIRTUA A SUA NATUREZA COMERCIAL. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS. LAUDOS PERICIAIS QUE DEVEM SOPESAR NA APURAÇÃO DOS VALORES RECLAMADOS. SUCUMBÊNCIA DEFINIDA COM BASE NO ART. 21, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC, RESTANDO FIXADA A VERBA HONORÁRIA EM 10% SOBRE O VALOR DA CONDENAÇÃO, COM OS JUROS DE MORA E A ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA DEVIDA, QUE TAMBÉM SE APLICA AOS APELANTES, EM PROL DAS RÉS EXCLUÍDAS DA LIDE. REFORMA DA SENTENÇA. PROVIMENTO DO APELO. (ESTADO DA BAHIA. Tribunal de Justiça do Estado da Bahia. Apelação nº. 01509515220048050001 BA 0150951-52.2004.8.05.0001, Relator: Emílio Salomão Pinto Resedá, Data de Julgamento: 03/12/2013, Quarta Câmara Cível, Data de Publicação: 05/12/2013) 477 Nesse sentido: ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Agravo de Instrumento nº. 2045721-19.2015.8.26.0000, Relator: Francisco Loureiro, Data de Julgamento: 20/10/2015, 1ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 21/10/2015.

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E, assim, verificada a existência do aviamento objetivo, cujo bem

intangível não adere aos sócios, mas pertence à sociedade devido à forma de

exploração atividade, há de se considerar, no cômputo da apuração de haveres, os

bens imateriais e, consequentemente, o sobrevalor alcançado pela organização.

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CAPÍTULO VI

MÉTODOS DE AVALIAÇÃO NA APURAÇÃO DE HAVERES

6.1. Métodos de avaliação

Há imensa divergência sobre qual método deve ser utilizado na

apuração do valor de uma empresa. Existem diversos modelos de avaliação de

empresas, sobretudo os modelos econômicos e contábeis, porém, eles envolvem

certo grau de julgamento, de modo que os ajustes ficam ao arbítrio dos avaliadores,

que, normalmente, se baseiam em observações de cada caso concreto478. Por isso

ser essencial, em processo judicial ou arbitral, a nomeação de perito especializado

em avaliação de empresas para apuração de haveres (art. 606, p. único, CPC479)

A questão dos critérios da apuração de haveres é de histórica controvérsia, pela variedade de quesitos a serem analisados. Em linhas gerais, o objetivo é avaliar (=apurar o valor) a empresa, como se fosse disponibilizada à venda; depois, dividir o valor da empresa pela participação societária do sócio que deixa a sociedade, ou de seus sucessores; por fim, a apuração de haveres leva em conta créditos e débitos, de diversas naturezas, entre as partes envolvidas. Não há um mínimo de uniformidade nos entendimentos acerca dos critérios para avaliação da empresa, matéria de enorme complexidade. Há critérios que levam em conta a simples soma do valor de mercado dos bens individualmente considerados; outros, que consideram a previsão de contratos futuros (1 ano, 3 anos, 5 anos...) de acordo com o ramo de atuação, e assim por diante480.

Eliseu Martins pondera que, para se avaliar corretamente uma

empresa, é necessário levar em consideração dois pressupostos: sua

descontinuidade (liquidação) ou sua continuidade (marcha). No primeiro caso,

avalia-se o preço de venda dos seus ativos, diminuídos dos gastos para se efetuar

essa venda (comissão, impostos, transportes etc.), e o valor para saldar os passivos 478 SCHMIDT, Paulo, DOS SANTOS, José Luiz; DOS SANTOS, Alexandre Alberto W. Avaliação de empresas com foco na apuração dos haveres do sócio retirante, em face da jurisprudência dos tribunais pátrios. Ciências Sociais Aplicadas em Revista - UNIOESTE/MCR,- v.16, n. 30, p. 198-224, 1. sem. 2016. 479 Art. 606, Parágrafo único. Em todos os casos em que seja necessária a realização de perícia, a nomeação do perito recairá preferencialmente sobre especialista em avaliação de sociedades. 480 BARROS NETO, Geraldo Fonseca de. Ação de dissolução parcial de sociedade. In: ARMANI, Wagner José Penereiro Armani (Org.). Os procedimentos especiais no novo código de processo civil: Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015, Florianópolis: Empório do Direito, 2017, p. 107.

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com terceiros. No segundo caso, avalia-se o seu valor em funcionamento, que

depende basicamente dos futuros benefícios econômicos que a empresa é capaz

de produzir. No confronto dos valores obtidos, deve ser utilizado o maior, pois

ninguém venderia uma empresa em funcionamento por menos do que se obteria se

a fechasse; e ninguém cerraria as portas de uma empresa se ela pudesse ser

vendida por valor melhor em pleno funcionamento481.

Como o patrimônio de uma sociedade é composto por inúmeros

elementos, os quais, possuindo valor econômico, devem estar espelhados nos

haveres a serem pagos ao sócio que sai da sociedade, de modo que este receba

uma contrapartida justa por suas cotas liquidadas, é necessário que o perito

nomeado faça uma imersão na sociedade profissional, objeto da controvérsia,

possibilitando averiguar qual melhor método a ser utilizado no caso concreto,

tomando as especificidades da atividade negocial482.

Desse modo, passaremos a tratar, de forma abreviada, os principais

métodos de avaliação elencados na doutrina especializada, sem a intenção, todavia,

de esgotar o tema, mas tão somente para vislumbrar distinções necessárias para

melhor compreensão do trabalho.

6.1.1. Métodos patrimoniais

Os chamados métodos patrimoniais partem do suposto de que o

custo de aquisição dos ativos é a base para avaliar a empresa. Esses métodos

pressupõem que a empresa pode ser avaliada: pelo valor do patrimônio líquido

contábil, pelo valor de liquidação ou pelo valor de reposição ou do patrimônio líquido

ajustado483.

481 MARTINS, Eliseu. Avaliação de empresas: da mensuração contábil à econômica. São Paulo: Atlas, 2001, p. 264. 482 Assim sendo, antes de se determinar os métodos de avaliação que serão aplicados, é fundamental a elaboração preliminar de um diagnóstico preciso da empresa avaliada, o contexto macroeconômico no qual ela está inserida, seu setor de atuação, seu mercado consumidor, seu desempenho passado e atual, seus aspectos econômicos e financeiros, sociais, jurídicos, fiscais, comerciais, tecnológicos e técnicos. A profundidade dessas análises depende das peculiaridades de cada caso, do tamanho do negócio avaliado e da disponibilidade de informações (PEREZ, Marcelo Monteiro; FAMÁ, Rubens. Métodos de avaliação de empresas e o balanço de determinação. Administração em Diálogo, São Paulo, n. 6, 2004, p. 101-112). 483 MARTELANC, Roy; PASIN, Rodrigo; CAVALCANTE, Francisco. Avaliação de empresas: um guia para fusões & aquisições e gestão de valor. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2008, p. 171.

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Martelanc, Pasin e Cavalcante afirmam que os métodos patrimoniais

ignoram os bens imateriais do estabelecimento (nome empresarial, marcas,

patentes, ponto, aviamento, clientela etc.) e são normalmente utilizados para

compradores que possuem interesse no ativo material e, não, no potencial de

geração de lucros da empresa.484

6.1.1.1. Método de avaliação patrimonial contábil

O método de avaliação patrimonial contábil utiliza as demonstrações

financeiras da empresa refletidas nos seus números contábeis, sendo que seu valor

seria resultante do patrimônio líquido. É também chamado de valor patrimonial da

empresa ou Book Value485 e pode ser facilmente verificado no balanço patrimonial

da sociedade. Sua equação seria a seguinte486:

Valor da empresa = ativos contábeis – passivos exigíveis contábeis = patrimônio liquido

Para Eliseu Martins, esse modelo é muito restrito e seria usado por

empresas, cujos ativos mensurados pelos princípios contábeis não divergem muito

de seus valores de mercado e que não possuem um goodwill significativo487.

6.1.1.2. Método de liquidação

O valor de liquidação é o valor que a sociedade teria se fosse

liquidada e, portanto, seria o valor mínimo obtido para um negócio, pois não haveria

484 MARTELANC, Roy; PASIN, Rodrigo; CAVALCANTE, Francisco. Avaliação de empresas: um guia para fusões & aquisições e gestão de valor. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2008, p. 171. 485 PEREZ, Marcelo Monteiro; FAMÁ, Rubens. Métodos de avaliação de empresas e o balanço de determinação. Administração em Diálogo, São Paulo, n. 6, 2004, p. 101-112. 486 MARTINS Eliseu. Avaliação de empresas: da mensuração contábil à econômica. São Paulo: Atlas, 2001, p. 269. 487 MARTINS Eliseu. Avaliação de empresas: da mensuração contábil à econômica. São Paulo: Atlas, 2001, p. 269.

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motivo de vendê-la por um valor inferior ao que pode ser apurado com seu

fechamento488.

6.1.1.3. Método de avaliação patrimonial pelo mercado

Por esse modelo, também conhecido como valor de reposição, é

verificado o conjunto de ativos e passivos exigíveis com base no valor de mercado

de seus itens específicos. Em termos de equação:

Valor da empresa = ativos ajustados – passivos exigíveis ajustados

Nessa espécie de avaliação, o importante é trabalhar com balanços

auditados, ajustando os valores históricos pelos de mercado dos ativos e dos

passivos e identificando os passivos contingenciais não reconhecidos

contabilmente489.

Esse método de avaliação patrimonial pelo mercado não considera

os benefícios líquidos futuros que o conjunto de ativos e passivos exigíveis seria

capaz de gerar, sendo que tem fundamento, quando ele é superior ao valor da

empresa em marcha490.

6.1.2. Métodos econômicos

Os métodos econômicos levam em consideração a empresa em

marcha, avaliam o negócio. O valor do empreendimento não se refere única e

488 MARTELANC, Roy; PASIN, Rodrigo; CAVALCANTE, Francisco. Avaliação de empresas: um guia para fusões & aquisições e gestão de valor. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2008, p. 173. 489 MARTELANC, Roy; PASIN, Rodrigo; CAVALCANTE, Francisco. Avaliação de empresas: um guia para fusões & aquisições e gestão de valor. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2008, p. 176. 490 MARTINS Eliseu. Avaliação de empresas: da mensuração contábil à econômica. São Paulo: Atlas, 2001, p. 269.

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exclusivamente aos seus ativos, subtraídos os passivos, mas à sua capacidade

econômica de gerar lucro491.

6.1.2.1. Avaliação com base em empresas similares

O modelo de múltiplo é aplicável para avaliar empresas

comparando-as com outras do mesmo segmento de negócio. “Com isso, pode-se

avaliar uma empresa achando outra empresa idêntica, ou pelo menos comparável,

que tenha sido negociada entre um comprador e um vendedor razoavelmente bem

informados”492.

A relação entre o preço e o lucro por ação (P/L) dessas outras

entidades seria multiplicada pelo lucro da avaliada, produzindo o suposto valor do

negócio493.

Verificação do fator do múltiplo (K) Valor da empresa

P/L = K P = L x K

6.1.2.2. Múltiplos de faturamento

Nesse método, o lucro contábil é substituído pelo faturamento da

empresa, tornando irrelevantes as informações sobre os demais itens do resultado

do exercício. Esse modelo pode surtir efeitos naqueles empreendimentos que não

possuem um sistema contábil ou que nele não é possível confiar494.

491 BERTONCINI, Rodrigo Junqueira; SCHMITZ, Leonard Ziesemer, A ação de dissolução parcial de sociedades no CPC/2015: aspectos destacados de direito material. Revista de Direito Privado, v. 70, p. 211-236, out. 2016. 492 PEREZ, Marcelo Monteiro; FAMÁ, Rubens. Métodos de avaliação de empresas e o balanço de determinação. Administração em Diálogo, São Paulo, n. 6, 2004, p. 101-112. 493 MARTINS Eliseu. Avaliação de empresas: da mensuração contábil à econômica. São Paulo: Atlas, 2001, p. 270. 494 MARTINS Eliseu. Avaliação de empresas: da mensuração contábil à econômica. São Paulo: Atlas, 2001, p. 271.

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197

6.1.2.3. Múltiplos de fluxo de caixa operacional

O fluxo de caixa operacional é calculado com base no EBITDA

(Earnings Before Interest, Taxes, Depreciation and Amortization) – Lucros antes dos

juros, impostos sobre o lucro, depreciação, amortização e exaustão – determinado e

combinado com os multiplicadores, resultando num valor estimado para a

empresa495.

O EBITDA é considerado o melhor indicador de geração de caixa operacional da empresa, pois desconsidera despesas operacionais que não afetam o caixa, como a depreciação e a amortização, torna sem efeito os impactos da forma de financiamento da empresa, pois exclui as despesas financeiras, e exclui os efeitos da tributação nos resultados auferidos496.

Os indicadores operacionais, como o EBITDA497, só são passiveis

de uso antes dos efeitos das dívidas.

O multiplicador a ser utilizado na operação deve levar em

consideração o retorno do investimento (payback) e deve ser avaliado em setores

econômicos homogêneos.

Segue exemplo simplificado, apresentado por Eliseu Martins para o

uso do EBITDA498:

Demonstrativo do resultado do exercício (em $)

Vendas

Custo das vendas

Despesas operacionais (que afetam o caixa)

1.200

(400)

(200)

EBITDA 600

495 MARTINS Eliseu. Avaliação de empresas: da mensuração contábil à econômica. São Paulo: Atlas, 2001, p. 272. 496 PEREZ, Marcelo Monteiro: FAMÁ, Rubens. Métodos de avaliação de empresas e o balanço de determinação. Administração em Diálogo, São Paulo, n. 6, 2004, p. 101-112. 497 Seguem outros indicadores operacionais pela doutrina financeira: ativos, receita, Ebit, Nopat e fluxo de caixa para a empresa - ver MARTELANC, Roy; PASIN, Rodrigo; CAVALCANTE, Francisco. Avaliação de empresas: um guia para fusões & aquisições e gestão de valor. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2008, p. 187-188. 498 MARTINS Eliseu. Avaliação de empresas: da mensuração contábil à econômica. São Paulo: Atlas, 2001, p. 273.

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Depreciação, amortização e exaustão

Resultado financeiro

(300)

(100)

Lucros antes dos tributos sobre o lucro

IR + Contribuição Social

200

(70)

Lucro Líquido 130

Considerando que a empresa possui R$ 50 em aplicações

financeiras e R$ 600 em dívidas, o valor da empresa seria:

Itens Valor

EBITDA

Multiplicador

R$ 600

3

Subtotal

Aplicações financeiras

Dívidas

R$ 1.800

R$ 50

(R$ 600)

Valor da empresa R$ 1.250

6.1.3. Avaliação com base no Economic Value Added (EVA)

Este método baseia-se no conceito de Economic Valeu Added

(EVA), desenvolvido pela empresa Stern Stewart & CO. e, segundo ele, é possível

obter o valor de uma empresa com base no seu lucro econômico, apurado por meio

da seguinte fórmula499:

Valor de mercado = valor presente dos EVA futuros + capital empregado

499 PEREZ, Marcelo Monteiro; FAMÁ, Rubens. Métodos de avaliação de empresas e o balanço de determinação. Administração em Diálogo, São Paulo, n. 6, 2004, p. 101-112.

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O lucro econômico seria o lucro da empresa após o pagamento dos

custos, das despesas e dos tributos necessários à sua operação, mas também

depois considerado o custo de capital utilizado500.

O EVA é uma medida de desempenho que considera todos os tipos

de operação, e é resultado operacional depois dos impostos da empresa, menos os

encargos pelo uso do capital de terceiros e de sócios, e mede quanto foi gerado a

mais em relação ao retorno mínimo requerido pelos fornecedores de capital da

sociedade501.

6.1.4. Método de avaliação com base no fluxo de caixa descontado

A doutrina especializada502 tem considerado o fluxo de caixa

descontado o método que melhor atende ao rigor da teoria de finanças, levando em

consideração a capacidade de geração de riquezas de uma empresa.503

O referido critério é, sem dúvida, um critério de avaliação contábil, atendendo assim à regra legal instituída pelo Código Civil, tendo em vista o teor da Resolução nº 1.121/08 do Conselho Federal de Contabilidade que estabelece, de forma expressa, que para a elaboração de demonstrações contábeis, podem ser utilizados modelos e conceitos que permitam demonstrar, de forma mais próxima, a realidade econômica e financeira da empresa504.

A justificativa para o uso do fluxo de caixa descontado como

principal método para a avaliação da empresa é que ele leva em consideração o

caráter dinâmico e não estático da empresa505 e, portanto, somente “[...]a

capacidade de gerar fluxo de caixa no futuro lhes confere valor506”.

500 MARTELANC, Roy; PASIN, Rodrigo; CAVALCANTE, Francisco. Avaliação de empresas: um guia para fusões & aquisições e gestão de valor. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2008, p. 237. 501 MARTELANC, Roy; PASIN, Rodrigo; CAVALCANTE, Francisco. Avaliação de empresas: um guia para fusões & aquisições e gestão de valor. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2008, p. 238. 502 Entre os modelos apresentados, o fluxo de caixa é tido como aquele que melhor revela a efetiva capacidade de geração de riqueza de determinado empreendimento. (MARTINS Eliseu. Avaliação de empresas: da mensuração contábil à econômica. São Paulo: Atlas, 2001, p. 275). 503 PEREZ, Marcelo Monteiro; FAMÁ, Rubens. Métodos de avaliação de empresas e o balanço de determinação. Administração em Diálogo, São Paulo, n. 6, 2004, p. 101-112. 504 DE ALMEIDA, Marcus Elidius Michelli. Sociedade Limitada: causas de dissolução parcial e apuração de haveres. In: BRUSHI, Gilberto Gomes (Coord.). Direito Processual Empresarial: estudos em homenagem ao professor Manoel de Queiroz Pereira Calças 1.ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012, p. 552. 505 Os administradores que usam a técnica do Fluxo de Caixa Descontado para avaliar suas empresas, priorizando o aumento do fluxo de caixa de longo prazo, em última análise, serão recompensados com os preços mais altos de suas ações. As evidências do mercado são conclusivas. Uma abordagem simplista do lucro

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Essa metodologia, assim, estima o valor econômico da sociedade

mediante a projeção do fluxo de caixa da empresa, ao qual se aplica uma taxa de

desconto que traz a projeção a valor presente, considerando o risco que existe de

não atingimento da meta projetada.

Segundo a doutrina especializada, há dois caminhos para se

mensurar o fluxo de caixa descontado, um para obter o Fluxo de Caixa Livre para o

Sócio (Free Cash Flow to Equity - FCFE), outro para obter o Fluxo de Caixa Livre

para a Empresa (Free Cash Flow For The Firm - FCFF). Em ambos os casos, não

se apuram os valores das dívidas de funcionamento (fornecedores, contas, salários,

impostos e outras dívidas operacionais a pagar), pois os valores já estão

computados no caixa das operações507.

Para fins de avaliação, é utilizado o fluxo de caixa livre, que é

gerado pela sociedade após as deduções dos impostos, investimentos permanentes

e variações esperadas no capital circulante liquido e que deve ser apurado antes do

pagamento das dívidas508.

Exemplo de demonstração de cálculos do fluxo de caixa livre: Receitas Operacionais Líquidas (-) Custo do Produto Vendido (-) Outras Despesas Operacionais = EBIT (ou Lucro Operacional) (+) Despesas Operacionais que não Afetam o Caixa (Ex. Depreciação) = EBITDA (-) Imposto de Renda e Contribuição Social sobre o Lucro = Geração de Caixa Operacional (+/-) Variação nos Investimentos Permanentes e no Capital Circulante Líquido = Fluxo de Caixa Livre (FCL)509

contábil levará a decisões que destruirão valor. (COPELAND, Tom; KOLLER, Tim; MURRIN, Jack. Avaliação de empresas: valuation. São Paulo: Makron Books, 2000, p. 85.) 506 MARTELANC, Roy; PASIN, Rodrigo; CAVALCANTE, Francisco. Avaliação de empresas: um guia para fusões & aquisições e gestão de valor. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2008, p. 12. 507 MARTINS Eliseu. Avaliação de empresas: da mensuração contábil à econômica. São Paulo: Atlas, 2001, p. 276. 508 MARTINS Eliseu. Avaliação de empresas: da mensuração contábil à econômica. São Paulo: Atlas, 2001, p. 280. 509 PEREZ, Marcelo Monteiro; FAMÁ, Rubens. Métodos de avaliação de empresas e o balanço de determinação. Administração em Diálogo, São Paulo, n. 6, 2004, p. 101-112.

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201

O resultado do fluxo de caixa livre seria o valor total do

empreendimento, desconsiderando apenas os aspectos relacionados com seu

financiamento.

Após, é necessário apurar o período de projeção que compreende a

quantidade de intervalos de tempo (anos, trimestres, meses etc.) sobre os quais

podemos projetar os fluxos de caixa, sendo que, na prática, esses períodos variam

entre cinco a dez anos510, bem como o valor de perpetuidade – aquele que o

negócio possuirá após o período de projeção511.

E, por fim, a taxa de desconto. O fluxo de caixa livre e o valor de

perpetuidade são apresentados a valor presente, mediante uma taxa de desconto

que funcione como o custo de oportunidade512.

Valor econômico da empresa = valor presente dos fluxos de caixa + valor residual ou valor da

perpetuidade + valor de mercado dos ativos não operacionais

Assim, podemos concluir que o método do fluxo de caixa

descontado consiste em projetar para o futuro os fluxos de caixa livres da empresa,

considerando perpetuidade, ou seja, a continuidade da empresa ao longo do

tempo513.

6.2. Do método de avaliação na apuração de haveres

A redação da norma processual (art. 606, CPC), em comparação a

de material (art. 1.031, CC), sofreu críticas por parte da doutrina que entendeu por

510 PEREZ, Marcelo Monteiro FAMÁ, Rubens. Métodos de avaliação de empresas e o balanço de determinação. Administração em Diálogo, São Paulo, n. 6, 2004, p. 101-112. 511 MARTINS Eliseu. Avaliação de empresas: da mensuração contábil à econômica. São Paulo: Atlas, 2001, p. 283. 512 MARTINS Eliseu. Avaliação de empresas: da mensuração contábil à econômica. São Paulo: Atlas, 2001, p. 284. 513 NAKAMURA, Wilson Toshiro. Fusões, aquisições e avaliação de empresas. In: SHENG, Hsia Hua (Coord.). Introdução às finanças empresariais. Série GVLaw. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 310.

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tornar rígido o método a ser usado na avaliação da empresa514, sem margem para

aplicação de outros métodos, já que o balanço de determinação posta na lei trata de

método patrimonial, distinto dos métodos econômicos de avaliação515.

Fabio Ulhoa Coelho516 defende que, para a dissolução parcial de

sociedade, os métodos econômicos não podem ser utilizados, pois causariam

distorções irremediáveis nos fundamentos econômicos da própria figura do

investimento em atividade econômica.

Explico. Como o valor econômico tenta captar o quanto os sócios lucrarão com a sociedade no futuro, fixado determinado prazo para o cálculo, o pagamento do reembolso a partir desse critério implicaria a estranha noção de alguém que lucra com determinada empresa sem correr risco nenhum. Se a sociedade fica obrigada a pagar àquele que a deixa o mesmo valor que receberia caso não a deixasse, o lucro em investimento empresarial passa a não depender mais do risco, e isto é uma distorção profunda no conceito. Se lucro é o retorno da disposição de alguém em assumir certo risco, ele não pode desvincular-se dos reveses que o risco empresarial embute. E tal desvinculação é inevitável se à sociedade for imposta a

514 A nova regra dispositiva introduzida pelo CPC/2015, diversamente, impõe autoritariamente um critério supletivo único de avaliação, olvidando que, a depender da atividade desenvolvida pela sociedade, poderá o mesmo mostrar-se totalmente iníquo: uma sociedade de prestação de serviços intelectuais, uma siderúrgica e uma panificadora, para aqui ficar em poucos exemplos, não devem ser avaliadas a partir de uma mesma fórmula, ou por uma só régua. Daí, pois, a primeira crítica ao critério dispositivo consagrado na lei processual, que bem vistas as coisas nem deveria se ocupar de um tema eminentemente de direito material( FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes; ADAMEK, Marcelo Vieira von. Da ação de dissolução parcial de sociedade: comentários breve ao CPC/2015. São Paulo: Malheiros, 2016, p. 70-71.). 515 Para além disso, porém, o próprio critério é de difícil apreensão, e aqui segue a nossa segunda crítica: a leitura da regra processual sugere ter o legislador acatado o valor patrimonial real (e, neste particular, pelo menos afastando de cogitação um descabido valor patrimonial contábil, dissociado da realidade de mercado em razão da incidência de elementos de amortização e cômputo a partir de valores históricos), mas, na sequência dessa nova regra, acrescentou que o valor patrimonial, a ser refletido em balanço de determinação, deve tomar por base o valor dos bens sociais tangíveis e intangíveis na data de resolução do vínculo societário “a preço de saída” (expressão essa que também não esclarece se compreende valores a custo de reposição ou de mercado). Além disso, se a avaliação de bens tangíveis já é de per si matéria repleta de sutilezas técnicas, a de intangíveis é, então, das mais controvertidas e, sobretudo quando realizada de forma isolada, é missão das mais delicadas e suscetíveis de imensas variações, não sendo por outra razão que, na praxe de foro e da própria ciência da avaliação de empresas, o critério de fluxo de caixa descontado vinha sendo o mais utilizado para empresas em andamento com perspectiva de continuidade das suas atividades: o fluxo de caixa avalia indiretamente todos os ativos, inclusive os intangíveis, desde que sejam operacionais (e, se não o forem, devem apenas estes ser tratados separadamente pelo avaliador), justamente na medida em que os ativos operacionais influem ou repercutem na capacidade que a empresa tem de gerar fluxos de caixa positivos. Ademais, quando se cogita de ativos intangíveis, a primeira ideia que vem à mente é a marca; mas há outros vários elementos intangíveis, tão ou mais difíceis de avaliação isolada – como a capacidade gerencial dos administradores, o treinamento e o know-how acumulado pelos funcionários, mercê de gastos por vezes intensos em treinamento etc. – que dificilmente são mensuráveis de forma segregada, Por tudo isso, e por estarmos convictos de que critério de avaliação não deveria ser arbitrariamente estipulado unitariamente pelo legislador para toda e qualquer sociedade, mesmo por meio de regra dispositiva, parece-nos infeliz a nova regra, muito inferior à – agora revogada – congênere do Código Civil. Resta saber se os tribunais serão rígidos na aplicação do preceito legal ou se encontrarão no art. 607 do CPC a justificativa para deixar de fazê-lo; se o juiz ode rever no curso da liquidação (e, se é para rever, só pode ser para afastar o critério dispositivo), poderia fazê-lo antes disso? (FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes; ADAMEK, Marcelo Vieira von. Da ação de dissolução parcial de sociedade: comentários breve ao CPC/2015. São Paulo: Malheiros, 2016, p. 71-72.). 516 COELHO, Fábio Ulhoa. A ação de dissolução parcial de sociedade. Revista de Informação Legislativa, Brasília, ano 48, n. 190, p. 141- 155, abr./jun. 2011.

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obrigação de pagar o que ela tende a gerar de lucro a quem, por não fazer mais parte dela, encontra-se a salvo de qualquer prejuízo derivado dos riscos empresariais. O valor patrimonial, assim, e não o econômico, é o critério mais ajustado à avaliação das quotas da sociedade limitada, quando se trata de apurar haveres de sócio retirante, excluído ou dos sucessores do falecido.517

O texto do artigo 606 do Código de Processo Civil, ao não

reproduzir a norma aberta do artigo 1.031 do Código Civil, optou pelo “valor

patrimonial” na apuração do balanço de determinação e, assim, aparentemente

restringiu os métodos de avaliação àqueles ditos patrimoniais, em dissonância com

o atual posicionamento do Superior Tribunal de Justiça518 que buscou harmonizar o

entendimento pela possibilidade de calcular o balanço de determinação por método

econômico, como o fluxo de caixa descontado519, sem excluir os demais métodos de

avaliação520.

517 COELHO, Fábio Ulhoa. A ação de dissolução parcial de sociedade. Revista de Informação Legislativa, Brasília, ano 48, n. 190, p. 141- 155, abr./jun. 2011. 518 DIREITO EMPRESARIAL. DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE POR QUOTAS DE RESPONSABILIDADE LIMITADA. SÓCIO DISSIDENTE. CRITÉRIOS PARA APURAÇÃO DE HAVERES. BALANÇO DE DETERMINAÇÃO. FLUXO DE CAIXA. 1. Na dissolução parcial de sociedade por quotas de responsabilidade limitada, o critério previsto no contrato social para a apuração dos haveres do sócio retirante somente prevalecerá se houver consenso entre as partes quanto ao resultado alcançado. 2. Em caso de dissenso, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça está consolidada no sentido de que o balanço de determinação é o critério que melhor reflete o valor patrimonial da empresa. 3. O fluxo de caixa descontado, por representar a metodologia que melhor revela a situação econômica e a capacidade de geração de riqueza de uma empresa, pode ser aplicado juntamente com o balanço de determinação na apuração de haveres do sócio dissidente. 4. Recurso especial desprovido .(BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1335619 SP, Relator: Ministra Nancy Andrighi, Data de Julgamento: 03/03/2015, T3 - Terceira Turma, Data de Publicação: DJe 27/03/2015). 519 BERTONCINI, Rodrigo Junqueira; SCHMITZ, Leonard Ziesemer, A ação de dissolução parcial de sociedades no CPC/2015: aspectos destacados de direito material, Revista de Direito Privado, v. 70, p. 211-236, out. 2016. 520 CIVIL E EMPRESARIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE. RETIRADA DE SÓCIO. LAUDO PERICIAL. CÁLCULO DE GOODWILL. MÉTODO DE APURAÇÃO DOS HAVERESA SER DEFINIDO POR EXPERT. DECISÃO MANTIDA. 1. Agravo de instrumento contra decisão que determinou o cálculo do goodwill pelo método do fluxo de caixa descontado ou outro método que o expert entender conveniente, proferida em ação de dissolução parcial de sociedade. 2. Leciona a doutrina que: O art. 1.031 do CC e o art. 606 do CPC de 2015 estabelecem que, na hipótese de omissão do contrato social, e obviamente não existindo acordo entre as partes, caberá ao juiz definir como critério de apuração dos haveres o valor patrimonial a ser apurado em balanço de determinação que nada mais é senão uma atualização das contas do balaço contábil da empresa. Por esse balanço de determinação serão reavaliados os ativos e passivos com o objetivo de se buscar o justo e real valor da sociedade, incluído aí bens tangíveis e intangíveis que compõem o chamado fundo de comércio. Entre os ativos e passivos, no momento em que é realizado o balanço de determinação, caberá incluir itens que não constam originalmente do balanço contábil da empresa, como pode ser o caso de bens intangíveis (p.ex. marcas, patentes, know-how, e demais propriedades intelectuais por ventura existentes, além do chamado goodwill que é a capacidade que o estabelecimento tem de atração da clientela mediante a reunião organizada dos bens de produção), ou até mesmo passivos até então não reconhecidos no balanço e que devem ser contingenciados. (BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Márcia Carla Pereira. Curso avançado de direito comercial [livro eletrônico] - 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. 3. Mostra-se viável a apuração de eventual goodwill, sendo certo que, embora o magistrado tenha indicado o método de fluxo de caixa descontado, deixou a critério do expert a utilização do meio mais adequado para apuração dos haveres. 4. Agravo improvido.(DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIO. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios – Apelação nº. 0043184-78.2016.8.07.0000, Relator: JOÃO EGMONT, Data de Julgamento: 01/02/2017, 2ª TURMA CÍVEL, Data de Publicação: Publicado no DJE : 08/02/2017.)

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De fato, o método patrimonial de avaliação, como visto, nem sempre

será o melhor para apuração dos haveres, pois tudo dependerá da atividade

explorada pela sociedade e, portanto, a norma aberta do artigo 1.031 do Código

Civil possibilitava a aplicação do melhor método ao caso concreto, permitindo se

alcançar um valor real e justo da sociedade.

Marcus Elidius Michelli de Almeida, de forma acertada, traz

importante lição ao afirmar que o fluxo de caixa descontado é um critério de

avaliação contábil, atendendo assim à regra legal instituída pelo Código de

Processo Civil, tendo em vista o teor da Resolução nº 1.121/08 do Conselho Federal

de Contabilidade que estabelece, de forma expressa, que para a elaboração de

demonstrações contábeis, podem ser utilizados modelos e conceitos que permitam

demonstrar, de forma mais próxima, a realidade econômica e financeira da

empresa521.

A mesma Resolução do Conselho Federal de Contabilidade

determina, nos itens 53 a 56, que o ativo da empresa deve ser reconhecido pelo

valor que possui de geração de benefícios futuros (fluxo de caixa), demonstrando,

assim, a perfeita utilização do método do fluxo de caixa com as mais modernas

regras da contabilidade.

No nosso entender, é necessário que o aplicador da Lei, seja ele juiz, advogado, árbitro ou perito, volte os olhos para outros critérios de avaliação que representem o valor REAL e JUSTO da sociedade, que muitas vezes pode ser apurado pelo critério de avaliação de empresa com base no Fluxo de Caixa Descontado trazido a valor presente. [...] Desta feita podemos concluir que o critério para a apuração dos haveres do sócio retirante, depende do negócio que a sociedade atua, sendo certo que em alguns casos o critério de que como dissolução total se tratasse se aplica corretamente (ninguém venderia uma empresa em funcionamento por menos que obteria se a fechasse) e em outros casos o critério do Fluxo de Caixa será o que melhor avaliará a sociedade (ninguém cerraria as portas de uma empresa se ela pudesse ser vendida por valor melhor em pleno funcionamento)522.

521 DE ALMEIDA, Marcus Elidius Michelli. Sociedade Limitada: causas de dissolução parcial e apuração de haveres. In: BRUSHI, Gilberto Gomes (Coord.). Direito Processual Empresarial: estudos em homenagem ao professor Manoel de Queiroz Pereira Calças. 1.ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012, p. 552-553. 522 DE ALMEIDA, Marcus Elidius Michelli. Sociedade Limitada: causas de dissolução parcial e apuração de haveres. In: BRUSHI, Gilberto Gomes (Coord.). Direito Processual Empresarial: estudos em homenagem ao professor Manoel de Queiroz Pereira Calças. 1.ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012, p. 552-553.

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205

Diante da redação da atual norma, será necessário verificar se o

posicionamento do Superior Tribunal de Justiça será mantido, permitindo o uso de

outros métodos na apuração de haveres. Talvez, a saída para permitir maior

amplitude no método de avaliação dos haveres do sócio afastado seja a aplicação

da revisão do artigo 607 do Código de Processo Civil.

6.3. A revisão dos critérios de apuração de haveres

Em que pese a norma adjetiva ter tornado certos a data-base e os

critérios para apuração de haveres, ela também permitiu ao magistrado revê-los em

análise casuística, adequando-os após manifestação das partes e antes de iniciada

a prova pericial (art. 607 CC523).

Referida disposição legal é verdadeira régua de Lesbos, capaz de

adaptar a forma mais justa ao caso concreto, pois, em determinados casos, pode

ocorrer que a efetiva data de desligamento do sócio da sociedade tenha ocorrido em

momento diverso daquele predeterminado na lei ou que o critério contratual ou legal

não seja adequado para determinada espécie de sociedade.

Louvável a intenção do legislador em permitir a aplicação da

equidade524, com a ressalva da necessidade de requerimento da parte interessada

para que o juiz possa adequar a norma adjetiva ao caso. Parece-nos que o juiz, ao

fixar os critérios de apuração de haveres, deve aplicar a regra do artigo 605 do

Código de Processo Civil, e, somente depois de pedido expresso da parte, é que

pode revê-los para ajustar a norma à especificidade da situação a fim de que a

solução seja justa. Em uma palavra, logo não pode agir ex officio.

Regra das mais infelizes – e de constitucionalidade até mesmo duvidosa, por minar o alcance do próprio instituto da coisa julgada – é a que permite que a data da resolução e o critério de apuração de haveres, que hoje são

523 Art. 607. A data da resolução e o critério de apuração de haveres podem ser revistos pelo juiz, a pedido da parte, a qualquer tempo antes do início da perícia. 524 “Por último, no conjunto da razão jurídica, costuma-se mencionar a equidade. Aristóteles é responsável por sua definição como a justiça do caso concreto. A solução de litígios por equidade é a que se obtém pela consideração harmônica das circunstâncias concretas, do que pode resultar um ajuste da norma à especificidade da situação a fim de que a solução seja justa. Pois, como diziam os romanos, summum jus summa injuria. Não se trata de um princípio que se oponha à justiça, mas que a completa, a torna plena.” (FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio, Introdução ao estudo do direito: técnica, decisão, dominação, 4. ed. São Paulo: Atlas, 2003, p. 248).

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elementos essenciais da sentença que julga procedente a ação de dissolução parcial (CPC, art. 604, I e II), possam ser revistos pelo juiz, a qualquer tempo antes do início da perícia, que se processa na fase de liquidação de sentença (CPC, art. 605), a pedido de qualquer das partes. Com isso, o legislador afastou tais elementos do campo de incidência da eficácia preclusiva da coisa julgada material e, ao mesmo tempo, contribuiu para a proliferação de incidentes processuais subsequentes à sentença. Seja como for, essa revisão, ao menos de acordo com a letra da lei, não poderá se dar de ofício; depende de provocação dos interessados525.

A decisão que cuida desse assunto deve trazer em seu bojo a

fixação da data da resolução da sociedade, a definição do critério de apuração dos

haveres à vista do disposto no contrato social e a nomeação do perito (art. 604,

CPC)526. Aparentemente, pela redação da norma processual, o magistrado, neste

momento, deve adotar os critérios objetivos postos nos artigos 605 e 606, ambos do

Código de Processo Civil, sem qualquer ressalva do caso concerto e, somente após

manifestação da parte, antes de iniciada a perícia, é que poderá rever os critérios

legais ou contratuais para adequação. Assim, a provocação da parte e a mudança

dos critérios de apuração de haveres, em momento ulterior à decisão do juiz

calcada no artigo 605 do Código de Processo Civil, podem causar insegurança

jurídica e criar incidente capaz de prejudicar a marcha do processo.

Como a decisão que determina a apuração de haveres é ilíquida,

sendo necessária a fase processual de liquidação por meio de prova pericial para

sua quantificação (art. 604, CPC527), esta fase se equipara, com suas

peculiaridades, ao procedimento de liquidação de sentença por arbitramento (art.

509 e 510, CPC). Mais acertado, assim, seria que o juiz pudesse de ofício adequar

a norma ao caso concreto, determinando em sua decisão quais seriam os

525 FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes; ADAMEK, Marcelo Vieira von, Da ação de dissolução parcial de sociedade: comentários breve ao CPC/2015. São Paulo: Malheiros. 2016, p. 77. 526 Art. 604. Para apuração dos haveres, o juiz: I - fixará a data da resolução da sociedade; II - definirá o critério de apuração dos haveres à vista do disposto no contrato social; e III - nomeará o perito. § 1o O juiz determinará à sociedade ou aos sócios que nela permanecerem que depositem em juízo a parte incontroversa dos haveres devidos. § 2o O depósito poderá ser, desde logo, levantando pelo ex-sócio, pelo espólio ou pelos sucessores. § 3o Se o contrato social estabelecer o pagamento dos haveres, será observado o que nele se dispôs no depósito judicial da parte incontroversa. 527 Art. 603. Havendo manifestação expressa e unânime pela concordância da dissolução, o juiz a decretará, passando-se imediatamente à fase de liquidação. § 1º Na hipótese prevista no caput, não haverá condenação em honorários advocatícios de nenhuma das partes, e as custas serão rateadas segundo a participação das partes no capital social. § 2º Havendo contestação, observar-se-á o procedimento comum, mas a liquidação da sentença seguirá o disposto neste Capítulo.

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parâmetros precisos para o perito adotar no momento da avaliação da prova, como

verdadeira decisão saneadora com permissão para as partes buscarem adequá-la

por meio de manifestação (art. 357, CPC) ou por meio de recursal (art. 1.015, p.

único, CPC).

Infelizmente, esse não foi o caminho adotado pelo Código de

Processo Civil e, assim, o magistrado estará restrito à aplicação do critério objetivo

posto na lei (art. 604, CPC) e, somente após eventual manifestação dos

interessados, modificar e adequar os critérios de apuração de haveres ao caso

concreto.

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CAPÍTULO VII

PAGAMENTO

7.1. Forma de pagamento

Uma vez apurados, os haveres do sócio retirante serão pagos

conforme disciplinar o contrato social e, no silêncio deste, nos termos do § 2º do

artigo 1.031 do Código Civil (art. 609, CPC) que determinado que a quota liquidada

será paga em dinheiro, no prazo de 90 (noventa) dias, a partir da liquidação (art.

1.031, §2º, CC).

O sócio se torna credor da sociedade de um crédito pecuniário. O

reembolso, desse modo, deve ser pago em dinheiro pela sociedade ao sócio

desligado e, portanto, não é admitida outra forma de pagamento, exceto se houver

consenso entre as partes.

As normas de direito material e processual permitiram aos sócios

modificar o critério legal quanto ao prazo de pagamento dos haveres do sócio

afastado da sociedade – 90 (noventa) dias após o término da liquidação –,

possibilitando que o pacto social indique outro prazo razoável que melhor se adéque

à realidade daquela organização.

O Superior Tribunal de Justiça528 tem sustentado a validade da

cláusula que modifica o critério legal do prazo de pagamento, porém há

528 DISSOLUÇÃO PARCIAL. SOCIEDADE POR COTAS DE RESPONSABILIDADE LIMITADA. RECONVENÇÃO. PAGAMENTO DOS HAVERES. PREVISÃO CONTRATUAL. PRECEDENTES DA CORTE. 1. A ausência de intimação para oferecer contestação à reconvenção não ensejou qualquer prejuízo ao autor reconvindo, isto porque o pedido formulado na reconvenção foi atendido na própria ação de dissolução proposta pelo reconvindo, decretada a dissolução, apenas, parcial da sociedade. Não há, portanto, ofensa ao artigo 316 do Código de Processo Civil. 3. Conforme jurisprudência desta Corte, a regra geral é a de que os haveres do sócio que se retira da sociedade devem ser pagos na forma prevista no contrato, salvo se existente alguma peculiaridade com força para afastar este entendimento, o que não ocorre no presente caso. 4. Os paradigmas que servem de apoio ao dissídio devem estar no especial, apresentados de forma regular, não servindo, para tanto, paradigma posteriormente juntado. 5. Recurso especial não conhecido. (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 450.129⁄MG, Rel. Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, TERCEIRA TURMA, julgado em 08⁄10⁄2002, DJ 16⁄12⁄2002)

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entendimento de que esse prazo somente teria validade se o pagamento ocorresse

neste prazo, contado do início da demanda judicial529.

Inclusive, o contrato poderá estipular prazos maiores ou menores daquele previsto no Código Civil. Porém, a jurisprudência tem entendido que se o prazo da demanda for superior ao prazo estabelecido no contrato, o pagamento deverá ser feito em uma única vez. Ou seja, caso o contrato determine um prazo de 12(doze) parcelas mensais, mas a ação judicial tenha demorado tempo superior ao prazo estabelecido, não haveria mais a

529 RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE CUMULADA COM INDENIZATÓRIA. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. INEXISTÊNCIA. APELAÇÃO. EFEITO DEVOLUTIVO. CONHECIMENTO DA MATÉRIA IMPUGNADA. PRODUÇÃO DE PROVAS. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. POSSIBILIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO OCORRÊNCIA. REVISÃO. SÚMULA 7/STJ. DATA BASE PARA APURAÇÃO DE HAVERES. TÉRMINO DO AFFECTIO SOCIETATIS. PAGAMENTO DE HAVERES. PARCELA ÚNICA. POSSIBILIDADE. NULIDADE DO LAUDO PERICIAL. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N.º 7/STJ. APURAÇÃO DE HAVERES. LEGITIMIDADE PASSIVA. EXISTÊNCIA. PRODUÇÃO DE PROVAS. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. POSSIBILIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO OCORRÊNCIA. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. SOLIDARIEDADE. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. DISPOSITIVOS LEGAIS NÃO INDICADOS. DEFICIENTE FUNDAMENTAÇÃO. SÚMULA 284/STJ. 1. Ação de dissolução parcial de sociedade cumulada com apuração de haveres ajuizada por sócio minoritário contra a sociedade limitada e o sócio majoritário. 2. Inocorrência de maltrato ao art. 535 do CPC, quando o acórdão recorrido, ainda que de forma sucinta, aprecia com clareza as questões essenciais ao julgamento da lide. Ademais, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos deduzidos pelas partes. 3. Nos termos do artigo 515, §§ 1º e 2º, do CPC, o recurso de apelação devolve ao Tribunal o conhecimento da matéria impugnada, ainda que não resolvida pela sentença. Precedentes do STJ. 4. A apuração da suficiência dos elementos probatórios que justificaram o julgamento antecipado da lide e/ou o indeferimento de prova pericial demanda reexame provas. 5. A data-base para apuração dos haveres coincide com o momento em que o sócio manifestar vontade de se retirar da sociedade limitada estabelecida por tempo indeterminado. 6. O prazo contratual previsto para o pagamento dos haveres do sócio que se retira da sociedade supõe quantum incontroverso; se houver divergência a respeito, e só for dirimida em ação judicial, cuja tramitação tenha esgotado o aludido prazo, o pagamento dos haveres é exigível de imediato. 7. O reconhecimento da nulidade do laudo pericial esbarra no óbice previsto na Súmula 7/STJ. 8. O valor fixado pelas instâncias ordinárias, a título de honorários advocatícios, somente pode ser alterado se for excessivo ou irrisório, sob pena de incidência da Súmula 7/STJ. 9. Consoante jurisprudência desta Corte, a retirada de sócio de sociedade por quotas de responsabilidade limitada dá-se pela ação de dissolução parcial, com apuração de haveres, para qual têm de ser citados não só os demais sócios, mas também a sociedade. 10. A apuração da suficiência dos elementos probatórios que justificaram o julgamento antecipado da lide e/ou o indeferimento de prova pericial demanda reexame provas. Incidência da Súmula 7/STJ. 11. Carece do necessário prequestionamento a matéria não debatida pelo Tribunal de origem, ainda que opostos embargos de declaração. Incidência da súmula 211 do Superior Tribunal de Justiça. 12. Não indicado o dispositivo tido por violado, defeituosa se mostra a fundamentação, obstando a abertura da via especial, diante da incidência, por analogia, da Súmula 284/STF. 13. RECURSOS ESPECIAIS A QUE SE NEGA PROVIMENTO. (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1371843⁄SP, Terceira Turma, Rel. Ministro Paulo De Tarso Sanseverino, DJe 26⁄03⁄2014). No mesmo sentido: DIREITO EMPRESARIAL. RECURSO ESPECIAL. DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE.APURAÇÃO DE HAVERES. FORMA DE PAGAMENTO. 1. A apuração de haveres - levantamento dos valores referentes à participação do sócio que se retira ou que é excluído da sociedade -se processa da forma prevista no contrato social, uma vez que, nessa seara, prevalece o princípio da força obrigatória dos contratos, cujo fundamento é a autonomia da vontade, desde que observados os limites legais e os princípios gerais do direito. Precedentes. 2. No caso sob exame, o contrato social previu o pagamento dos haveres parcelados em 48 (quarenta e oito) prestações mensais e sucessivas, tendo o Tribunal estadual determinado o vencimento da primeira por ocasião do trânsito em julgado da decisão. 3. Em ação que versa sobre o inadimplemento dos haveres oriundos da retirada de sócio, a sociedade é constituída em mora com a citação válida, que passa então a ser considerada como termo inicial para o pagamento das parcelas, sendo certo que aquelas que venceram no curso do processo devem ser pagas de imediato, após o trânsito em julgado da sentença condenatória, enquanto as remanescentes serão adimplidas consoante determinado no contrato social. (Precedentes) 4. Recurso especial parcialmente provido. (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1239754 RS, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 15/05/2012, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 22/05/2012).

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necessidade do sócio retirante ter de aguardar por mais 12 meses, devendo o seu pagamento ser realizado à vista530.

A cláusula que modificar o critério legal deve trazer situação real,

evitando-se pactuar cláusula vaga, sem aplicação prática, com a intenção apenas

de dificultar o recebimento pelo sócio desligado, e cuja conclusão é a nulidade

dessa parte do pacto social531.

Ainda no que tange ao momento do pagamento, é importante lembrar que alguns contratos estabelecem cláusula vaga para o pagamento ao sócio retirante, como por exemplo: “será pago na medida do possível” ou “o pagamento será feito dentro das possibilidades da sociedade” ou ainda “o pagamento se dará tão logo a empresa tenha condições de saldar o débito”. No nosso entender, tais cláusulas têm como única finalidade dificultar o recebimento por parte do sócio retirante, sendo verdadeiras cláusulas abusivas e, portanto, são cláusulas que devem ser afastadas, impondo-se o pagamento nos termos do Código Civil, ou seja, em dinheiro, no prazo de 90 (noventa) dias532.

Assim, concluída a fase de liquidação de sentença, se não houver

outro prazo estipulado no contrato social, a sociedade terá 90 (noventa) dias para

efetuar o pagamento do valor devido ao sócio desligado. Transcorrido esse prazo

sem pagamento, caberá ao ex-sócio iniciar a fase de cumprimento de sentença que

reconhece a exigibilidade de obrigação de pagar quantia certa (art. 523 e ss., CPC).

Liquidados os haveres do sócio retirante, mediante decisão judicial que declarará o respectivo quantum, caberá à sociedade pagá-los, na forma prevista no contrato social (NCPC, art. 609) ou, na sua falta, na forma

530 DE ALMEIDA, Marcus Elidius Michelli. Sociedade Limitada: causas de dissolução parcial e apuração de haveres. In: BRUSHI, Gilberto Gomes (Coord.). Direito Processual Empresarial: estudos em homenagem ao professor Manoel de Queiroz Pereira Calças. 1.ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012, p. 554. 531 DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE E PEDIDO DE APURAÇÃO E PAGAMENTO DE HAVERES - Pretensão dos sócios remanescentes de ver excluído o retirante com pagamento menor do que o valor da cota parte na data da saída - Descabimento - Ausência de demonstração de atos lesivos significantes ou de concorrência desleal, mormente porque a nova empresa foi constituída pelos familiares do autor e não por ele - As vedações legais não se estendem aos familiares do sócio - Não demonstrada a alegada captação de clientes da sociedade apelante à empresa dos familiares do recorrido - Sociedade que continuou apresentando balanço positivo e faturamento maior do que antes, mesmo com o afastamento do sócio dissidente - Retirada admitida e imposição do pagamento do valor encontrado na perícia contábil para a cota parte do recorrido no prazo de 90 (noventa dias) conforme art. 1031, parágrafo 2º, do Código Civil - Nulidade da cláusula que prevê pagamento segundo disponibilidade de recursos reconhecida - Recurso provido em parte para determinar o afastamento definitivo do sócio retirante independentemente do pagamento de haveres e para fixar o prazo para pagamento do prazo para de tais verbas em 90 (noventa) dias, nos termos do art. 1.031, parágrafo 2º do Código Civil. (ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. – Apelação nº. 0117847-44.2005.8.26.0100, Relator: Mendes Pereira, Data de Julgamento: 13/03/2013, 7ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 24/04/2013) 532 DE ALMEIDA, Marcus Elidius Michelli. Sociedade Limitada: causas de dissolução parcial e apuração de haveres. In: BRUSHI, Gilberto Gomes (Coord.). Direito Processual Empresarial: estudos em homenagem ao professor Manoel de Queiroz Pereira Calças. 1.ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012, p. 554.

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determinada no art. 1.031, §2º, do Código Civil, ou seja, o pagamento será feito em dinheiro, no prazo de 90 dias após a respectiva liquidação. Incorrendo o pagamento voluntário, caberá o procedimento de cumprimento de sentenças relativas às obrigações de quantia certa (NCPC, arts. 523 e ss.)533.

Iniciada a fase de cumprimento de sentença, a sociedade será

intimada por seu advogado habilitado no processo ou pessoalmente, caso não

tenha advogado, para pagar em 15 (quinze) dias o valor devido ao sócio desligado.

Não ocorrendo pagamento voluntário no prazo legal, o débito será acrescido de

multa de dez por cento e, também, de dez por cento dos honorários de advogado

(art. 523, §1º, CPC).

Por fim, cabe destacar a novidade do procedimento especial em

determinar que o valor incontroverso devido ao sócio seja depositado em juízo de

imediato, ou na forma do contrato social, podendo o valor depositado ser, desde

logo, levantado pelo ex-sócio, pelo espólio ou pelos sucessores (art. 604, CPC534).

7.2. Juros e correção monetária

Como a liquidação do valor devido a título de reembolso é apurado

no curso do processo judicial, a doutrina de Priscila M. P. Fonseca conduz a

conclusão de que os juros são computados a partir da citação, segundo o texto da

Súmula 163 do Supremo Tribunal Federal535. Já a correção monetária deve incidir

entre a data do levantamento do balanço de determinação e do efetivo

pagamento536.

533 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. v. II. 50. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 236. 534 Art. 604. Para apuração dos haveres, o juiz: § 1o O juiz determinará à sociedade ou aos sócios que nela permanecerem que depositem em juízo a parte incontroversa dos haveres devidos. § 2o O depósito poderá ser, desde logo, levantando pelo ex-sócio, pelo espólio ou pelos sucessores. § 3o Se o contrato social estabelecer o pagamento dos haveres, será observado o que nele se dispôs no depósito judicial da parte incontroversa. 535 FONSECA, Priscila M.P. Corrêa da. Dissolução parcial, retirada e exclusão de sócio no Novo Código Civil. 3. ed., São Paulo: Atlas, 2005, p. 248. 536 FONSECA, Priscila M.P. Dissolução parcial, retirada e exclusão de sócio no Novo Código Civil. 3. ed., São Paulo: Atlas, 2005, p. 249.

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A orientação do Superior Tribunal de Justiça537 é que de que os

juros e a correção sejam computados após o transcurso do prazo de pagamento do

reembolso (art. 1031, CC).

Ocorre que não nos parece ser nenhuma dessas duas posições a

que seguirá com a redação do novo artigo 608, parágrafo único, do Código de

Processo Civil, pois, segundo a norma, “após a data da resolução, o ex-sócio, o 537 RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE. 1. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 535 E 538 DO CPC⁄1973. INEXISTÊNCIA. INDICAÇÃO DE TEMA PARA PREQUESTIONAMENTO. AUSENTE. ENUNCIADO N. 98⁄STJ. INAPLICABILIDADE. 2. EXERCÍCIO DO DIREITO DE RETIRADA. DIREITO POTESTATIVO. NOTIFICAÇÃO PRÉVIA E ATENDIMENTO DE PRAZO LEGAL. ART. 1.029 DO CC. DATA-BASE PARA APURAÇÃO DE HAVERES. 3. PAGAMENTO DE HAVERES. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. PRAZO NONGESIMAL PARA PAGAMENTO. 1.031. 4. RECURSO ESPECIAL DA EMPRESA PARCIALMENTE PROVIDO. RECURSO ESPECIAL DA SÓCIA RETIRANTE IMPROVIDO. 1. Ação de dissolução parcial de sociedade ajuizada por sócio retirante contra a sociedade limitada e os demais sócios, a fim de obter a apuração dos haveres devidos. 2. Ausentes os vícios do art. 535 do CPC⁄1973, porque fundamentado de forma expressa e coerente, a rejeição dos embargos de declaração não implica em violação de dispositivo legal. 3. Do mesmo modo, não há violação do art. 538 do CPC⁄1973 quando os embargos de declaração opostos não deduzem questão cujo prequestionamento se faria necessário, não se aplicando, por consequência, o afastamento da multa na forma do enunciado n. 98 da Súmula do STJ. 2. O direito de retirada de sociedade constituída por tempo indeterminado, a partir do Código Civil de 2002, é direito potestativo que pode ser exercido mediante a simples notificação com antecedência mínima de sessenta dias (art. 1.209), dispensando a propositura de ação de dissolução parcial para tal finalidade. 3. Após o decurso do prazo, o contrato societário fica resolvido, de pleno direito, em relação ao sócio retirante, devendo serem apurados haveres e pagos os valores devidos na forma do art. 1.031 do CC, considerando-se, pois, termo final daquele prazo como a data-base para apuração dos haveres. 4. Inexistindo acordo e propondo-se ação de dissolução parcial com fins de apuração de haveres, os juros de mora serão devidos após o transcurso do prazo nonagesimal contado desde a liquidação da quota devida (art. 1.031, § 2º, do CC). Precedentes. 5. Recurso especial da empresa parcialmente dissolvida parcialmente provido. Recurso especial da sócia retirante improvido. (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1602240 - MG, Relator: Ministro Marco Aurélio Bellizze: Terceira Turma, Data do Julgamento: DJe 15/12/2016). DIREITO SOCIETÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADES. EXCLUSÃO DE SÓCIO. JUSTA CAUSA. APURAÇÃO DE HAVERES. DATA-BASE. EFETIVO DESLIGAMENTO. FORMA DE PAGAMENTO. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. PRAZO NONGESIMAL PARA PAGAMENTO. ARTS. ANALISADOS: 1.030, 1.031, 1.044 E 1.085 DO CC⁄02. 4. A apuração dos haveres tem por objetivo liquidar o valor real e atual do patrimônio empresarial, a fim de se identificar o valor relativo à quota dos sócios retirante. 5. Para que não haja enriquecimento indevido de qualquer das partes, a apuração deve ter por base para avaliação a situação patrimonial da data da retirada (art. 1.031, CC⁄02), a qual, na hipótese dos autos, foi objeto de transação entre as partes ao longo da demanda. 6. A retirada do sócio por dissolução parcial da empresa não se confunde com o direito de recesso, que possui hipóteses de incidência restrita e forma de apuração de haveres distinta. 7. A existência de cláusula contratual específica para pagamento de haveres na hipótese de exercício do direito de recesso não pode ser aplicada por analogia, para os fins de afastar a incidência do art. 1.031, § 2º, do CC⁄02 na situação concreta de retirada do sócio. 8. Os juros de mora eventualmente devidos em razão do pagamento dos haveres devidos em decorrência da retirada do sócio, no novo contexto legal do art. 1.031, § 2º, do CC⁄02, terão por termo inicial o vencimento do prazo legal nonagesimal, contado desde a liquidação dos haveres. 9. Em face da alteração da proporcionalidade da sucumbência, devem ser redistribuídos o respectivo ônus. 10. Recursos especiais parcialmente providos. (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1.286.708⁄PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJe 5⁄6⁄2014). DIREITO SOCIETÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADES. EXCLUSÃO DE SÓCIO. APURAÇÃO DE HAVERES. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. PRAZO NONAGESIMAL PARA PAGAMENTO. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. Decorrido o prazo legal nonagesimal (art. 1.031, § 2º, do CC⁄02) para pagamento de quota social, contado de sua efetiva liquidação, são devidos juros de mora. Precedentes. 2. Na hipótese dos autos, após transação parcial, a lide teve seguimento quanto à apuração de haveres, devendo considerar-se concluída e liquidados os haveres com a decisão recorrida em especial, momento a partir do qual passam a ser devidos os juros moratórios. 3. Agravo regimental não provido. (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. AgRg no REsp n. 1.474.873⁄PR, de minha relatoria, Terceira Turma, DJe 19⁄2⁄2016)

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espólio ou os sucessores terão direito apenas à correção monetária dos valores

apurados e aos juros contratuais ou legais”.

Os haveres comtemplarão, até a data atribuída para a dissolução parcial, a participação nos lucros, os juros sobre capital próprio declarados pela sociedade e, se for o caso, a remuneração como administrador. A partir da aludida data, serão considerados apenas os juros contratuais ou legais e a correção monetária. Depois de apurados, os haveres serão pagos na forma determinada pelo contrato social, ou, no silêncio deste, de acordo com disposição do artigo 1.031 do Código Civil538.

Pelo dispositivo supra, parece-nos que tanto os juros quanto a

correção monetária são devidos a partir da data da resolução.

538 FINKELSTEIN, Maria Eugênia. Manual de direito empresarial. 8. ed. rev. , ampliada e reformulada. São Paulo: Atlas, 2016, p. 79.

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CAPÍTULO VIII

RESPONSABILIDADE DO SÓCIO APÓS SEU DESLIGAMENTO DA SOCIEDADE

8.1. A responsabilidade do sócio após seu desligamento da sociedade

Uma vez extinto o status socii por conta de uma das causas de

dissolução parcial, conforme os critérios temporais trazidos no artigo 605 do Código

de Processo Civil, o Código Civil, artigo 1.032539 declara que esse fato não exime o

sócio desligado ou os herdeiros do sócio falecido, “[...] da responsabilidade pelas

obrigações sociais anteriores, até dois anos após averbada a resolução da

sociedade; nem nos dois primeiros casos, pelas posteriores e em igual prazo,

enquanto não se requerer a averbação”.

No caso, há de se averiguar o tipo societário adotado pela

sociedade profissional, pois, em certos tipos, como na sociedade em nome coletivo

(art. 1.039, CC), na sociedade em comandita simples (art. 1.045, CC) e na

sociedade simples em sentido estrito (arts. 1.203 e 1.024, CC), todos ou alguns

sócios respondem solidária e ilimitadamente pelas dívidas sociais.

Já no tipo limitada, em regra, os sócios respondem no limite do

capital subscrito e não integralizado (art. 1.1052, CC). Ocorrendo a

responsabilização por capital não integralizado, vige a regra da responsabilidade

subsidiária do sócio por dívidas da pessoa jurídica (art. 1.024, CC), eis que,

enquanto existirem bens no patrimônio social, os bens dos sócios não poderão ser

alcançados. Assim, os sócios só deverão arcar com a obrigação do sócio remisso

quando a sociedade limitada não puder mais fazê-lo, inclusive o sócio desligado no

prazo estabelecido na lei.

539 Art. 1.032. A retirada, exclusão ou morte do sócio, não o exime, ou a seus herdeiros, da responsabilidade pelas obrigações sociais anteriores, até dois anos após averbada a resolução da sociedade; nem nos dois primeiros casos, pelas posteriores e em igual prazo, enquanto não se requerer a averbação.

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Priscila M. P. Corrêa da Fonseca destaca que, no caso da

sociedade limitada, só se aplicaria a regra do artigo 1.032, do Código Civil, no caso

de exclusão extrajudicial de sócio, por conta da redação do artigo 1.085, sendo que

não há previsão semelhante para as demais hipóteses de dissolução parcial540.

Entendemos de forma diversa, pois as regras gerais da sociedade simples, dentre

elas a do artigo 1.032 do Código Civil, se aplicam à sociedade do tipo limitada, por

força do artigo 1.053 do mesmo diploma legal.

Alfredo de Assis Gonçalves Neto541 afirma que o artigo 1.032 do

Código Civil se aplica somente para sociedade simples ou para aquelas que todos

ou alguns sócios possuem responsabilidade pelas dívidas sociais, logo, não se

aplicaria a sociedade limitada. Ocorre que, como visto, os sócios da sociedade

limitada podem responder por dívidas sociais, como no caso do capital social não

integralizado (art. 1.052, CC) ou de desconsideração da personalidade jurídica.

Verifica-se a preocupação do legislador com a descapitalização da sociedade em virtude da retirada do sócio e seu impacto em relação ao direito dos credores. Sem embargo da isenção pelas obrigações posteriores ao arquivamento, o sócio continuará responsável durante dois anos pelas dívidas sociais, a contar da data da averbação da alteração no contrato da sociedade. Observa-se, portanto, que o legislador se refere às obrigações contraídas pela sociedade enquanto o ex-sócio ainda integrava a sociedade. Não se vincula o ex-sócio a obrigações adquiridas pela sociedade após a sua retirada. Todavia, caso não se proceda à averbação, permanecerá obrigado não apenas pelas dívidas anteriores, mas também por aquelas contraídas depois da sua saída e antes da averbação, também pelo prazo de dois anos, nos casos de retirada e exclusão. Avulta, assim, a importância para o ex-sócio e seus herdeiros, do registro da alteração contratual, sem o qual não poderão alegar, pelo simples decurso de dois anos após a assinatura do ato, a cessação de suas responsabilidades perante terceiros que desconheciam o fato542.

Nos casos envolvendo sociedade limitada, ganham relevância os

casos de desconsideração da personalidade jurídica, hipótese legal na qual os

sócios respondem pôr dívidas da sociedade. A teoria da desconsideração da

personalidade jurídica surgiu com objetivo de coibir a utilização temerária,

540 FONSECA, Priscila M.P. Corrêa da. Dissolução Parcial, Retirada e Exclusão de Sócio no Novo Código Civil, 3º Ed., São Paulo: Editora Atlas, 2005, p. 254-258. 541 GONÇALVES NETO, Alfredo de Assis. Direito de Empresa: comentários aos artigos 966 a 1.195 do Código Civil. 6. ed., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, p. 318 – 320. 542 TEPEDINO, Gustavo. BARBOZA, Heloisa Helena. DE MORAES, Maria Celina Bodin. Código Civil Interpretado Conforme a Constituição da República, volume III, Direito de Empresa, Rio de Janeiro: Renovar, 2011, p. 121.

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fraudulenta e abusiva da autonomia patrimonial existente entre a pessoa jurídica e

seus membros ou administradores543.

Por essa teoria, permite-se que o credor invada o patrimônio

pessoal dos membros ou administradores que se utilizaram maliciosamente da

pessoa jurídica com o objetivo claro de prejudicar terceiros. Assinala-se que, com a

aplicação dessa teoria, não se pretende anular a personalidade jurídica, mas, tão

somente, afastá-la em situações-limite, onde seja comprovada a sua utilização em

desconformidade com o ordenamento jurídico e mediante fraude544.

Assim, relevante a interpretação do artigo 1.032 do Código Civil, o

qual permite que, no prazo legal, o sócio desligado da sociedade possa a vir

responder por obrigações da pessoa jurídica que pelo instituto da desconsideração

da personalidade jurídica instaurado por meio de incidente processual previsto no

Código de Processo Civil.

AGRAVO DE INSTRUMENTO – Interposição contra decisão que deferiu pedido de desconsideração de personalidade jurídica, e incluiu ex-sócios no polo passivo da ação. Retirada da sociedade da empresa. Responsabilidade dos sócios quanto às obrigações que persiste por dois anos, da época do desligamento da empresa até o ajuizamento da ação. Aplicação do artigo 1.032 do Código Civil. Decisão mantida545.

543 REQUIÃO, Rubens. Abuso de direito e fraude através da personalidade jurídica (disregard doctrine). Revista dos Tribunais, São Paulo: RT, v. 410, 1969, p. 12-24. 544 BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Marcia Carla Pereira. Curso avançado de Direito Comercial. 4. ed. atual. e rev. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 150. 545 ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Agravo de Instrumento nº. 2197102-74.2015.8.26.0000, Relator: Mario A. Silveira, Data de Julgamento: 14/03/2016, 33ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: Dje 14/03/2016.

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217

CONCLUSÂO

Nossa tese é a de que a legislação processual e a jurisprudência

têm evoluído ao permitir o cômputo dos bens imateriais, dentre eles o fundo de

comércio, na apuração de haveres decorrente da dissolução parcial de sociedades

contratuais. A recente introdução da ação de dissolução parcial de sociedade no

Código de Processo Civil tornou ainda mais impositivo tal pensamento, ao expressar

a introdução dos referidos bens no critério legal para a apuração de haveres.

Ocorre que, mesmo a jurisprudência e a doutrina que reconhecem

essa especificidade têm, em regra, têm afastado do cômputo da apuração de

haveres de sociedades profissionais os bens imateriais, sob a justificativa de serem

sociedades simples, nas quais falta organização empresarial. Ainda, se justificaria a

exclusão por conta das características pessoais dos sócios que neutralizam a

pessoa jurídica e, portanto, inexiste estabelecimento

Nessa linha, foi demonstrado que a sociedade simples não se

caracteriza pela falta de organização, que pode ou não existir, mas, sim, pelo objeto

social explorado ou pela adoção da forma de cooperativa. Por via de consequência,

a sociedade profissional é caracterizada como sociedade simples por conta da

exceção legal e não da não exploração de empresa.

Superada a etapa da organização, foi verificada que a expressão

sociedade profissional é gênero, pois podem ser verificadas espécies próprias e

distintas entre si desse gênero societário como: a sociedade entre profissionais ou

sociedade de meios; a sociedade de comunicação recíproca de resultados; a

sociedade de intermediação e, enfim, a sociedade profissional em sentido estrito.

Por conseguinte, a análise superficial do tema, recebe novos

contornos na análise da realidade fática da sociedade profissional, na qual para se

concluir pela existência de um bem coletivo intangível – universalidade de fato – na

exploração da atividade da sociedade profissional. Universalidade de fato essa que,

na sociedade empresária, é chamada de estabelecimento. Devido à redação do

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artigo 1.142 do Código Civil, há aparente contradição em chamar tal universalidade

de fato de estabelecimento, quando em foco a sociedade simples, pois nos parece

que o legislador quis enumerar regras apenas para a sociedade empresária, sem

considerar a possibilidade de a sociedade simples também poder realizar operações

com seu estabelecimento.

Entretanto, independentemente da nomenclatura, não há como

negar que, para o exercício de empresa por sociedade profissional, é essencial a

organização de bens, materiais e imateriais, que formam uma universalidade de

fato, cujo valor agregado pela organização supera aquele considerado pela

somatória dos bens individuais que a compõem.

Portanto, essa comunhão de bens resulta numa perspectiva de

lucratividade, angariando clientela capaz de gerar um sobrevalor, que seria

valoração dessa universalidade de fato com a exclusão dos valores individuais dos

bens que a compõem, denominado aviamento.

Esse aviamento, entendido como atributo do estabelecimento, como

visto, pode ser caracterizado como subjetivo ou objetivo. O primeiro decorre da

atuação pessoal dos sócios e sua respeitabilidade, enquanto o segundo se

apresenta com a organização dos bens para o exercício da atividade.

Como o aviamento subjetivo está relacionado à atuação

personalíssima (intuitu personae), essencial a qualquer prestação de serviços, é

certo que essa característica se destaca na sociedade profissional, constituída com

a finalidade de explorar atividade intelectual.

Ocorre que a mera preponderância do elemento subjetivo não pode

servir como argumento para neutralizar o elemento objetivo (intuitu pecuniae) que,

também, pode se apresentar na sociedade profissional. Quanto mais eficiente a

organização dos seus elementos, mais aviado será o estabelecimento.

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219

Tal conclusão se revitaliza com a redação do artigo 606 do Código

de Processo Civil que especificou com maiores detalhes a inclusão dos bens e

direitos, tangíveis e intangíveis, no critério de apuração de haveres e, dentre eles, a

universidade de fato (estabelecimento) reconhecida como um bem coletivo,

intangível, pertencente às sociedades profissionais e, portanto, avaliável

economicamente.

Assim, dependendo da forma de desenvolvimento de cada

sociedade profissional, pode haver elementos objetivos que valorizam o negócio,

independente do aspecto subjetivo dos sócios profissionais que compõem a pessoa

jurídica. Não se trata, aqui, apenas de desconsiderar o renome dos profissionais

que atuam na sociedade profissional, mas de valorar a projeção da empresa no

segmento econômico em que atua.

Essa questão é evidenciada na sociedade profissional em sentido

estrito que é aquela que externa o exercício da atividade profissional, exercendo-a

por contra própria, sendo o centro de imputação do negócio jurídico estabelecido

com os clientes, atribuindo-lhe direitos e obrigações decorrentes da atividade.

A verificação de aviamento objetivo ocorrerá quando da

consolidação do nome e da reputação da sociedade profissional no mercado em

que atua e a fidelização de seus clientes for dissociável da pessoa de seus sócios

(sociedade profissional em sentido estrito). Nos casos em que, mesmo com a

retirada de um dos sócios, a preservação da empresa representa a impessoalidade

da atividade e permite concluir pela necessidade de divisão do fundo de comércio

nas sociedades profissionais.

A verificação de caso a caso é medida que se impõe, pois apenas a

analise causídica poderá evidenciar a existência dos bens imateriais na sociedade

profissional, de evidência de um trabalho gradualmente capitalizado, com elemento

patrimonial negociável, inexistindo qualquer impedimento legal para excluir os bens

imateriais da apuração de haveres de dissolução parcial de sociedades

profissionais.

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Publicação: DJe 04/05/1979.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 105667 - SC, Relator:

Ministro Barros Monteiro, Data de Julgamento: 26/09/2000, T4 - Quarta Turma, Data

de Publicação: DJe 06/11/2000.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 646221⁄PR, Rel. Ministro

Humberto Gomes De Barros, Rel. P⁄ Acórdão Ministra Nancy Andrighi, Terceira

Turma, julgado em 19⁄04⁄2005, DJe 30⁄05⁄2005.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 130617 - AM, Relator:

Ministro Aldir Passarinho Junior, Data de Julgamento: 18/10/2005, T4 - Quarta

Turma, Data de Publicação: DJe 14/11/2005.

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BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 453476 - GO, Relator:

Ministro Antônio De Pádua Ribeiro, Data de Julgamento: 01/09/2005, T3 - Terceira

Turma, Data de Publicação: DJe 12/12/2005.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 244497 - PR. Relator:

Aldir Passarinho Junior, Julgado em 20/06/2006, Quarta Turma, DJe 14/08/2006.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 995474 - SP - Min.

Nancy Andrighi, T3 - Terceira Turma, Data de Publicação: DJe 17/03/2009.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1129222/PR, Rel.

Ministra Nancy Andrighi, Data de Julgamento: 28/06/2011, T3 - Terceira Turma,

Data de Publicação: DJe 01/08/2011

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 907014 - MS, Relator:

Ministro Antônio Carlos Ferreira, Data de Julgamento: 11/10/2011, T4 - Quarta

Turma, Data de Publicação: DJe 19/10/2011.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1239754 - RS, Relator:

Ministro Luis Felipe Salomão, Data De Julgamento: 15/05/2012, T4 - Quarta Turma,

Data De Publicação: DJe 22/05/2012

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 958.116 - PR, Rel.

Ministro João Otávio de Noronha, Rel. p/ Acórdão Ministro Raul Araújo, Data de

Julgamento 22/05/2012, T4 - Quarta Turma, Data de Publicação: DJe 06/03/2013.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1371843⁄SP, Terceira

Turma, Rel. Ministro Paulo De Tarso Sanseverino, DJe 26⁄03⁄2014.

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Publicação: DJe 03/06/2014.

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236

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1.335.619 - SP. Relator:

Ministra Nancy Andrighi. Data de Julgamento 03/03/2015, T4 - Quarta Turma, Data

de Publicação: DJe 27/03/2015.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº. 1.416.635 - SP- Min.

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Publicação: DJe 22/04/2015.

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Ministro Luís Felipe Salomão, Data de Julgamento: 26/05/2015, T4 - Quarta Turma,

Data de Publicação: DJe 18/06/2015.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 450.129⁄MG, Rel.

Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, Terceira Turma, Data do Julgamento

08⁄10⁄2002, Data de Publicação: DJe 16⁄12⁄2002.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 271930 SP

2000/0080731-1, Relator: Ministro Sálvio De Figueiredo Teixeira, Data De

Julgamento: 19/04/2001, T4 - QUARTA TURMA, Data De Publicação: DJ

25/03/2002

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1602240 - MG, Relator:

Ministro Marco Aurélio Bellizze: Terceira Turma, Data do Julgamento: DJe

15/12/2016.

DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIO. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e

Territórios - Agravo de Instrumento nº. 0011810-49.2013.8.07.0000, Relator:

SIMONE LUCINDO, Data de Julgamento: 31/07/2013, 1ª Turma Cível, Data de

Publicação: Publicado no DJe 07/08/2013

DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIO. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e

Territórios – Apelação nº. 0043184-78.2016.8.07.0000, Relator: JOÃO EGMONT,

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237

Data de Julgamento: 01/02/2017, 2ª TURMA CÍVEL, Data de Publicação: Publicado

no DJE : 08/02/2017.

ESTADO DA BAHIA. Tribunal de Justiça do Estado da Bahia. Apelação nº.

01509515220048050001 BA 0150951-52.2004.8.05.0001, Relator: Emílio Salomão

Pinto Resedá, Data de Julgamento: 03/12/2013, Quarta Câmara Cível, Data de

Publicação: 05/12/2013

ESTADO DO ESPIRITO SANTO. Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo.

Apelação nº. 24990137887 - ES, Relator: Catharina Maria Novaes Barcellos, Data

de Julgamento: 02/06/2009, Quarta Câmara Cível, DJe 04/08/2009.

ESTADO DE PERNAMBUCO. Tribunal de Justiça do Estado do Pernambuco.

Agravo de Instrumento nº. 3905995, Relator: Rafael Machado da Cunha Cavalcanti,

DJe 26/02/2016.

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande

do Sul. Embargos de Declaração nº 593127897, Sexta Câmara Cível, Tribunal de

Justiça do RS, Relator: Sérgio Gischkow Pereira, Julgado em 07/12/1993.

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande

do Sul. Apelação nº. 70039050760, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do

RS, Relator: Romeu Marques Ribeiro Filho, DJe 24/08/2011.

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande

do Sul. Apelação Cível Nº 70058902198, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça

do RS, Relator: Ricardo Moreira Lins Pastl, Julgado em 05/06/2014

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande

do Sul. Apelação nº. 70070972203 RS, Relator: Isabel Dias Almeida, Data de

Julgamento: 28/09/2016, Quinta Câmara Cível, DJe 06/10/2016.

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238

ESTADO DO RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro,

Apelação nº. 0128904-16.2012.8.19.0001, Relator: Des. Heleno Ribeiro Pereira

Nunes, DJe 07/10/2014.

ESTADO DO RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro,

Apelação nº. 01948148720128190001, Relator: Des. Marco Aurélio Bezerra de

Melo, data de julgamento: 04/08/2015, Décima sexta Câmara Cível, Data de

Publicação: 07/08/2015.

ESTADO DE SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina.

Agravo e Instrumento nº. 0011810-49.2013.8.07.0000, Relator: Simone Lucindo,

Data de Julgamento: 31/07/2013, 1ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no

DJe 07/08/2013.

ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação

nº.: 0122177-84.2005.8.26.0100, Relator: Enio Zuliani, Data de Julgamento:

07/11/2013, 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, Data de Publicação:

12/11/2013.

ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação

nº.: 0256753-43.2007.8.26.0100, Relator: Fortes Barbosa, Data de Julgamento:

12/09/2013, 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, Data de Publicação:

24/09/2013

ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação

nº. 0204315-15.2008.8.26.0000, Relator: Ferraz de Arruda, Data de Julgamento:

27/07/2011, 13ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 29/07/2011

ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação

nº. 0063118-24.2012.8.26.0100, Relator: Claudio Godoy, Data de Julgamento:

24/06/2015, 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial. Dje 24/06/2015.

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239

ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Agravo de

Instrumento nº. 2048991-51.2015.8.26.0000, Relator: Claudio Godoy, Data de

Julgamento: 29/04/2015, 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, Data de

Publicação DJe: 01/05/2015.

ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação

nº. 0113897-36.2005.8.26.0000, Relator: Fortes Barbosa, 8ª Câmara de Direito

Privado, Data de Julgamento DJe: 05/10/2011.

ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação

nº. 0163920-64.2011.8.26.0100, Relator: Tasso Duarte de Melo, Data de

Julgamento: 19/05/2014, 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, Data de

Publicação DJe 20/05/2014.

ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação

nº. 0163920-64.2011.8.26.0100, Relator: Tasso Duarte de Melo, Data de

Julgamento: 19/05/2014, 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, Data de

Publicação DJe: 20/05/2014.

ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Agravo de

Instrumento nº. 01709595320138260000 - SP, Relator: Francisco Loureiro, Data de

Julgamento: 06/02/2014, 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, DJe

07/02/2014.

ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Agravo de

Instrumento nº. 0087069-56.2012.8.26.0000 - SP, Relator: Enio Zuliani, Data de

Julgamento: 26/06/2012, 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, DJe

29/06/2012.

ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação

nº. 0044018-31.2007.8.26.0562, Relator: Sá Duarte, Data de Julgamento:

28/02/2011, 33ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 04/03/2011.

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240

ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação

nº. 0002299-59.2012.8.26.0153, Relator: Francisco Loureiro, Data de Julgamento:

14/10/2015, 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, Data de Publicação:

15/10/2015.

ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação

nº. 0019809-31.2010.8.26.0032, Relator: Alexandre Coelho, Data de Julgamento:

28/10/2015, 8ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 29/10/2015.

ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Agravo de

Instrumento nº. 2045721-19.2015.8.26.0000, Relator: Francisco Loureiro, Data de

Julgamento: 20/10/2015, 1ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação:

21/10/2015.

ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação

nº. 0031059-54.2010.8.26.0002, Relator: Francisco Loureiro, Data de Julgamento:

21/09/2016, 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, Data de Publicação:

22/09/2016.

ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação

nº. 0117847-44.2005.8.26.0100, Relator: Mendes Pereira, Data de Julgamento:

13/03/2013, 7ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 24/04/2013.

ESTADO DE SÃO PAULO. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Agravo de

Instrumento nº. 2197102-74.2015.8.26.0000, Relator: Mario A. Silveira, Data de

Julgamento: 14/03/2016, 33ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: Dje

14/03/2016.

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Nación.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

BRASIL. Decreto n.º 737, de 25 de novembro de 1850.

BRASIL. Decreto nº. 3.708, de 10 de janeiro de 1919.

BRASIL. Decreto-lei nº 200, de 25 de fevereiro de 1967.

BRASIL. Decreto-lei nº 1.608, de 18 de setembro de 1939.

BRASIL. Lei nº. 556, de 25 de junho de 1850.

BRASIL. Lei nº. 3.071, de 1 de janeiro de 1916.

BRASIL. Lei nº 3.268, de 30 de setembro de 1957.

BRASIL. Lei nº 5.194, de 24 de dezembro de 1966.

BRASIL. Lei nº 5.764, de 16 de dezembro de 1971.

BRASIL. Lei 5869, de 11 de janeiro de 1973.

BRASIL. Lei n° 6.404, de 15 de dezembro de 1976.

BRASIL. Lei nº 6,684, de 3 de setembro de 1979.

BRASIL. Lei nº 8.245, de 18 de Outubro de 1991.

BRASIL. Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994.

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BRASIL. Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002.

BRASIL. Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005.

BRASIL. Lei nº 12.378, de 31 de dezembro de 2010.

BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015.

BRASIL. Projeto de Lei nº 1572, de 14 de junho de 2011.

ESPANHA. Ley 2/2007, de 15 de marzo de 2007. Ley de sociedades profesionales.

ESPANHA. Real Decreto Legislativo 1/2010, de 2 de julio de 2010. Ley de

Sociedades de Capital.

ITÁLIA. Regio decreto-legge n.º 262, 16 marzo 1942. Codice Civile Italiano Del

1942.

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ANEXO I

Quadro 1- Ranking dos escritórios de advocacia, por número de advogados546

546 REVISTA ANÁLISE. Análise Advocacia 500: Os escritórios e os advogados mais admirados do Brasil. 44. ed., p.232, São Paulo: Revista Análise. Outubro de 2016.