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Anais 5º Simpósio de Geotecnologias no Pantanal, Campo Grande, MS, 22 a 26 de novembro 2014 Embrapa Informática Agropecuária/INPE, p. 720 720 -730 Distribuição e classificação da intensidade do fenômeno de dequada no Pantanal Distribution and classification of the intensity of dequada fish kill events in the Pantanal wetland Hudson de Azevedo Macedo 1 José Cândido Stevaux 1 Aguinaldo Silva 2 Eder Renato Merino 1 Fabiano do Nascimento Pupim 1 Ivan Bergier Tavares de Lima 3 1 Universidade Estadual Paulista – UNESP Campus de Rio Claro –Programa de Pós-Graduação em Geociências e Meio Ambiente Av. 24A, 1515, Bela Vista Cep13506-900 – Rio Claro-SP, Brasil. [email protected] {ermerino82, fabianopupim}@yahoo.com.br [email protected] 2 Universidade Federal do Mato Grosso do Sul – UFMS Campus Pantanal –Geografia Av. Rio Branco, 1270, Vila Mamona. Caixa Postal 252 Cep79.304-902 – Corumbá – MS, Brasil. [email protected] 3 Embrapa Pantanal Rua 21 de Setembro, 1880, N. Sra de Fátima. Caixa Postal 109 Cep 79.320-900 – Corumbá – MS, Brasil. [email protected] Resumo.O fenômeno de mortandade de peixes no Pantanal é conhecido popularmente como dequada. O fenômeno é originado pela deterioração da qualidade da água dos rios e lagos, sendo a diminuição do oxigênio dissolvido (OD) o principal fator. Estudos mostram que a dequada ocorre quando o OD atinge valores inferiores a 3 mg/L. Além disso, o tempo de permanência desses valores também é um fator responsável pela intensidade do fenômeno. Desta forma, o presente trabalho visa apresentar uma proposta de classificação da dequada, utilizando-se dados de qualidade da água dos rios do Pantanal, registrados pela Agência Nacional de Águas (ANA). O método proposto tem base quali-quantitativa e utiliza o valor médio de OD e o tempo de permanência desses valores, dentro de uma série histórica. Os resultados obtidos são comparados a outros estudos já realizados sobre o assunto, mostrando que o método é eficiente para determinar os locais com maior probabilidade de ocorrência do fenômeno, sendo o rio Paraguai o principal corpo d’água a sofrer dequada com grande intensidade. Os rios com planície de inundação estreita, como o Itiquira, não apresentam ocorrência do fenômeno ou a intensidade é fraca. O fenômeno mostrou- se intimamente ligado às condições hidrológicas da bacia. Palavras chaves: Qualidade da água, depleção do oxigênio, limnologia, classificação quali-quantitativa.

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Distribuição e classificação da intensidade do fenômeno de dequada no Pantanal

Distribution and classification of the intensity of dequada fish kill events in the Pantanal wetland

Hudson de Azevedo Macedo1

José Cândido Stevaux1

Aguinaldo Silva2

Eder Renato Merino1

Fabiano do Nascimento Pupim1

Ivan Bergier Tavares de Lima3

1Universidade Estadual Paulista – UNESPCampus de Rio Claro –Programa de Pós-Graduação em Geociências e Meio Ambiente

Av. 24A, 1515, Bela VistaCep13506-900 – Rio Claro-SP, Brasil.

[email protected] {ermerino82, fabianopupim}@yahoo.com.br

[email protected]

2Universidade Federal do Mato Grosso do Sul – UFMSCampus Pantanal –Geografia

Av. Rio Branco, 1270, Vila Mamona. Caixa Postal 252Cep79.304-902 – Corumbá – MS, Brasil.

[email protected]

3Embrapa PantanalRua 21 de Setembro, 1880, N. Sra de Fátima. Caixa Postal 109

Cep 79.320-900 – Corumbá – MS, [email protected]

Resumo.O fenômeno de mortandade de peixes no Pantanal é conhecido popularmente como dequada. O fenômeno é originado pela deterioração da qualidade da água dos rios e lagos, sendo a diminuição do oxigênio dissolvido (OD) o principal fator. Estudos mostram que a dequada ocorre quando o OD atinge valores inferiores a 3 mg/L. Além disso, o tempo de permanência desses valores também é um fator responsável pela intensidade do fenômeno. Desta forma, o presente trabalho visa apresentar uma proposta de classificação da dequada, utilizando-se dados de qualidade da água dos rios do Pantanal, registrados pela Agência Nacional de Águas (ANA). O método proposto tem base quali-quantitativa e utiliza o valor médio de OD e o tempo de permanência desses valores, dentro de uma série histórica. Os resultados obtidos são comparados a outros estudos já realizados sobre o assunto, mostrando que o método é eficiente para determinar os locais com maior probabilidade de ocorrência do fenômeno, sendo o rio Paraguai o principal corpo d’água a sofrer dequada com grande intensidade. Os rios com planície de inundação estreita, como o Itiquira, não apresentam ocorrência do fenômeno ou a intensidade é fraca. O fenômeno mostrou-se intimamente ligado às condições hidrológicas da bacia.

Palavras chaves: Qualidade da água, depleção do oxigênio, limnologia, classificação quali-quantitativa.

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Abstract.Extensive fish kill occur occasionallyin the Pantanal wetlandand the phenomenon is called dequadaby local inhabitants.The phenomenon originates by deteriorationwater quality in rivers and lakes, and the depletion of dissolved oxygen (DO) is the major indicator. Researches have shown that a dequadaoccurs when DO reaches values lower than 3 mg/L. Also, the duration of these low DO values determines the intensity offish kill. Thus, this paper presents a proposed classification of dequadaevent, using water quality data for Pantanal rivers surveyed by National Agency of Water (ANA). The proposed method has qualitative and quantitative bases and utilizes mean DO value and duration, based on historical series of DO measurements. The results arecompared to other studie-sof thedequadaphenomenon, showing that the method is efficient to determine locales with higher probability of dequada.The Paraguay River has displayed highestdequadaintensity. The rivers with narrower floodplains, such asItiquira River, do not have dequada or the intensity is lower. The phenomenon is shownto be linked to basin hydrological conditions.

Key-words: Water quality, oxygen depletion, limnology, qualitative and quantitative classification.

Introdução

Limnologia é a ciência que estuda as características químicas, físicas e biológicas de corpos d’água continentais. Embora a limnologia tenha sido originalmente desenvolvida para estudar corpos d’água lênticos (lagos e lagoas), os ambientes estudados abrangem todos os tipos de águas interiores: lagoas, represas, rios, açudes, brejos, planícies inundáveis e águas subter-râneas.

Os estudos limnológicos visam obter uma compreensão abrangente do funcionamento e da forma de organização de cada ambiente aquático sob estudo, descrevendo sua dinâmica e as inter-relações com a biota, para, em última instância, embasar ações de manejo, tanto dos recursos hídricos, quanto dos pesqueiros (Calheiros e Ferreira, 1996).

Poucos foram os estudos a respeito das características limnológicasdo Pantanal, sendo em sua maioriarelatórios técnicos e resumosde eventos (Calheiros et al, 1991; Calheiros et al, 1996; Calheiros e Hamilton, 1998; Da Silva, 1984;Ferraz de Lima e Conceição, 1977).Contudo, al-terações limnológicas podem causar no Pantanal fenômeno de mortandade de peixes, cuja du-ração e intensidade estãorelacionados às características hidrológicas da bacia do Alto Paraguai (BAP), o que torna esse tipo de estudo um conhecimento primordial para embasar ações de manejo dos recursos hídricos e pesqueiros no Pantanal.

O fenômeno de mortandade registrado nos rios e lagos, relativamente próximos do rio Para-guai, é conhecido popularmente como “dequada” ou “diquada”, ou ainda “decoada”, sendo um fenômeno limnológico extremamente complexo, ainda pouco estudado em todas as suas impli-cações biológicas e ecológicas. Os estudos existentes a esse respeito mostram que a compreen-são desse fenômeno além de trazer maior entendimento dos processos hidro-bio-geoquímicos da BAP, também fornecem subsídios para avaliação de impactos ambientais (Calheiros e Fer-reira, 1996; Oliveiraet al, 2013).

A variação do nível das águas no sistema e o tempo de residência dessas águas nas planícies causauma série de transformações nas características limnológicas dos corpos d’água, geradas pela interação entre ambientes aquáticos e terrestres. Dentre as transformações encontram-se o aumento ou diminuição da transparência da água, do potencial hidrogeniônico (pH), da con-dutividade elétrica, da concentração de gases dissolvidos (principalmente do oxigênio e CO2), de nutrientes e materiais em suspenção. Todas essas alterações promovem o fenômeno natural de deterioração da qualidade da água (“dequada”), o que provoca a mortandade de peixes de acordo com a magnitude do fenômeno (Calheiros e Ferreira, 1996).

Importante destacar que tal fenômeno é reconhecidamente provocado por fatores naturais de sistemas canal-planície, onde as águas que transbordam para a planície irão causar a morte da vegetação terrestre que ao se decompor disponibilizará CO2para as águas, retornandopara

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os rios na fase de vazante. As águas com depleção do oxigênio dissolvido (OD) e aumento de gás carbônico causamestresse respiratório na ictiofauna, o que pode levar a morte desses organ-ismos. Todavia, vale lembrar que o fenômeno de dequada pode agir como fator regulador da estrutura dinâmica das comunidades aquáticas (Calheiros e Ferreira, 1996), sendo assim uma forma de seleção natural destes sistemas.

Objetivo

Propor método de classificação de dequada com uso de dados de qualidade de água disponíveis pela Agência Nacional de Águas (ANA).

Materiais e Métodos

Neste trabalho, abordaremos considerações básicas quanto aos aspectoslimnológicos do Panta-nal, a partir da análise de dados de qualidade das águas dos rios que compõe o Pantanal. Para tanto, foram utilizados os dados disponíveis na ANA (Figura 1 a 5 e Tabela 1), obtidos na base de dados Hidroweb-ANA. Dados das estações situadas no Pantanal foram reunidos em uma planilha Excel, com as coordenadas geográficas e os valores de OD. As estações foram então plotadas em um SIG, juntamente com os principais rios formadores do Pantanal, os quais foram traçados a partir de imagens Geocover(Figura 1). Dados encontrados na literatura foram uti-lizados para a avaliação da classificação proposta. Imagens GeocoverSircas 2000 foram utiliza-das para identificar as áreas de maior inundação auxiliando assim na definição dos trechos de rios classificados. Conhecimentos prévios sobre os fluxos de água no Pantanal também foram usados nessa definição.

Em estudo realizado pela Embrapa Pantanal (Oliveira et al, 2013) foi contatado que o fenô-meno de dequada está relacionado às alterações nas características físico-químicas da água, sendo a depleção do OD (<3 mg/L) e o aumento do CO2 livre (>100 mg/L) os principais fa-tores responsáveis pela deterioração da qualidade da água. Estudos anteriores mostram que a concentração média de OD no rio Paraguai, fora do período de cheia, fica acima de 5,0 mg/L, contudo, nos meses de cheia esse parâmetro atinge valores abaixo de 3,0 mg/L (Oliveira et al, 2013). Nesse mesmo período os valores de CO2 dissolvido, aumentam de 6,0 mg/L para va-lores acima de 100,0 mg/L. O pH também apresenta significativas alterações, de 6,5 a 7,0 para 5,0. Conforme demonstrado nos estudos de Oliveira et al (2013)e Calheiros e Ferreira (1996) a duração ou permanência da água com valores baixos de OD (<3 mg/L) também constitui uma condição para o desenvolvimento de dequada. Dessa forma, é possível determinar a intensidade do fenômeno utilizando-se esses dois parâmetros. Quanto maior o tempo em que as água per-manecem com valores de OD abaixo de 3 mg/L, e quanto menor os valores de OD, maior será a intensidade do fenômeno. Assim podemos entender que a intensidade do fenômeno é direta-mente proporcional a sua duração e inversamente proporcional ao OD. A avaliação da intensi-dade do fenômeno de dequada foi então pautada na duração do fenômeno expressa em meses, e pela média do OD nos meses com valores abaixo de 3 mg/L. Os posto que apresentaram valores acima disso foram considerado como sem ocorrência do fenômeno.

Para expressar a intensidade da dequada, dois métodos quali-quantitativos foram testados, sendo o primeiro expresso pela equação: [Eq. 1]; onde I é a intensidade do fenômeno; D é a duração em meses; e OD* é a média do oxigênio dissolvido com valores abaixo de 3 mg/L. Os valores de OD* e da duração do fenômeno foram agrupadosTabela 1. Cálculo da intensidade da dequada considerando-se a duração e o valor de oxigênio dissolvido. Duração em meses; OD* é a média dos valor* dados insuficientes, excluído do mapa de intensidade. na Tabela 1, bem como o valor de intensidade do fenômeno que foi calculado pela equação 1. A intensidade

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do fenômeno foi classificada em fraca, média e forte de acordo com o valor de intensidade cal-culado para cada posto, sendo visualizado na Figura 5.

No segundo método foi realizada a classificação para o OD e outra para a duração, sendo a classificação final a somatória dessas duas classificações. Para a classificação do OD e da duração foram atribuídos pesos de acordo com seus respectivos valores. Os pesos variaram de 1 a 3, o que indica intensidade fraca, média e forte. Para valores de 0<OD< 1 foi atribuído peso 3; para valores de 1<OD<2 peso 2; e para valores de 2<OD<3 peso 1. O mesmo critério foi utilizado para a duração, que variou de 1 a 6 meses. Dessa forma, foi atribuído peso 1 para durações de 1 a 2 meses; peso 2 para 3 a 4 meses; e peso 3 para durações de 5 a 6 meses. Este método apresentou resultados muito divergentes dos esperados (Oliveira et al, 2013; Calheiros e Ferreira, 1996), e desta forma, entendemos que o primeiro método é o mais adequado para a análise aqui proposta, e sendo assim, apenas o primeiro método será apresentado.

Resultados e Discussão

Os eventos de dequada foram observados no rio Paraguai desde Cáceres até Porto Murtinho, sendo os de alta intensidade mais comuns nas proximidades da confluência do rio Cuiabá, nas mediações da morraria do Amolar. Já no rio Cuiabá o fenômeno apresenta intensidade média a alta. (Oliveira et al, 2013; Calheiros e Ferreira, 1996).

A análise dos valores de OD no rio Paraguai mostra que o fenômeno acompanha o pul-so de cheia do Pantanal, em que os valores abaixo de 3,0 mg/L são registrados de janeiro a março, na porção norte do Pantanal, e em abril-maio no PantanalFigura 4. Média dos va-lores de oxigênio dissolvido (2003-2012) no rio Paraguai. sul (Figura 4). No rio Cuiabá, o fenômeno de dequada pode ser reconhecido na região próxima a confluência com o rio São LouFigura 1. Estações de coleta de dados de qualidade de água. 1)66070010; 2)66090000; 3)66120000; 4)66751000; 5) 66801000; 6) 66810000; 7) 66810500; 8)66811000; 9) 66821000; 10) 66894000; 11) 66895000; 12)66921000; 13) 66971000; 14) 66270000; 15) 66296000; 16) 66341000; 17)66660000/66665000; 18)66750001; 19)66449000; 20)66527000; 21)66481500; 22)66945800; 23)66886500; 24)66886800; 25)66891000; 26) 66911000; 27)66920500. Imagem GEOCOVER SIRCAS 2000.renço (Figura 1 – ponto 17), onde o fenômeno apresenta grande duração (de janeiro aFigura 3. Média dos valores de oxigênio dissolvido (2003-2012) no rio Cuiabá maio - Figura 3). As águas depletadas nessa região melhoram sua qualidade logo após a confluência com o rio IFigura 2. Estações de qualidade de água que mostram o aumento do oxigênio dissolvido (OD) no rio Cuiabá após receber as águas do rio Itiquira (Figura 1). Ima-gem GEOCOVER SIRCAS 2000.tiquira (FFigura 3. Média dos valores de oxigênio dissolvi-do (2003-2012) no rio Cuiabáigura 2 e 3), devido a esse afluente possuir água com valores al-tos de OD, o que também pode ser observado a jusante do rio Cuiabá na estação Retiro Fazenda Recreio (Figura 1. Estações de coleta de dados de qualidade de água. 1)66070010; 2)66090000; 3)66120000; 4)66751000; 5) 66801000; 6) 66810000; 7) 66810500; 8)66811000; 9) 66821000; 10) 66894000; 11) 66895000; 12)66921000; 13) 66971000; 14) 66270000; 15) 66296000; 16) 66341000; 17)66660000/66665000; 18)66750001; 19)66449000; 20)66527000; 21)66481500; 22)66945800; 23)66886500; 24)66886800; 25)66891000; 26) 66911000; 27)66920500. Imagem GEOCOVER SIRCAS 2000.ponto 18 - Figura 1).

Nos dez anos analisados (2003-2012) foi constatado que o fenômeno ocorre com maior intensidade geralmente em anos de fortes cheias, precedidos por anos secos. Esse fato pode ser comprovado ao se observar que o ano de 2011, reconhecidamente um ano de forte cheia, apresentou os menores valores de OD em boa parte dos locais de medição, e que este ano foi precedido por anos secos (2009-2010).

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Os resultados mostram que a probabilidade de ocorrência do fenômeno está fortemente ligada às condições de inundação. As estações situadas próximas ao planalto não possuem pos-sibilidade de ocorrência do fenômeno, o que pode ser comprovado pelos trabalhos de Oliveira et al (2013)e Calheiros e Ferreira (1996). Percebe-se que a dequada ocorre preferencialmente em rios com ampla planície de inundação, e que os trechos de rios com planície confinada não apresentam probabilidade de ocorrência do fenômeno (rios Correntes, Piquiri, Itiquira e São Lourenço).

Um ponto relativo ao rio Cuiabá apresenta um local com forte intensidade de dequada Figura 1. Estações de coleta de dados de qualidade de água. 1)66070010; 2)66090000; 3)66120000; 4)66751000; 5) 66801000; 6) 66810000; 7) 66810500; 8)66811000; 9) 66821000; 10) 66894000; 11) 66895000; 12)66921000; 13) 66971000; 14) 66270000; 15) 66296000; 16) 66341000; 17)66660000/66665000; 18)66750001; 19)66449000; 20)66527000; 21)66481500; 22)66945800; 23)66886500; 24)66886800; 25)66891000; 26) 66911000; 27)66920500. Imagem GEOCOVER SIRCAS 2000.(Ponto 17 - Figura 1). Esse local é a região de con-fluência com o rio São Lourenço, uma região do lobo deposicional atual do megaleque do São Lourenço. Essa região do rio São Lourenço é marcada por uma intrincada rede de canais anas-tomosados que formam uma área de inundação a montante do pFigura 2. Estações de qualidade de água que mostram o aumento do oxigênio dissolvido (OD) no rio Cuiabá após receber as águas do rio Itiquira (Figura 1). Imagem GEOCOVER SIRCAS 2000.onto medido (Figura 2). Logo após esse ponto a qualidade da água do rio Cuiabá aumenta consideravelmente, conforme demonstrado anteriormente, devido à entrada das águas do rio Itiquira, que não apresentam de-terioração de sua qualidade. As águas do rio Itiquira seriam, então, o responsável pela melhora da qualidade na água do rio Cuiabá na estação Retiro Fazenda Recreio a jusante da confluência do rio Cuiabá com o Itiquira, mostrada na Figura 5. Isto ocorre devido ao rio Itiquira possuir uma, relativamente, pequena planície de inundação, confinada entre os leques do Taquari e São Lourenço. Além disso, esse trecho do rio Cuiabá não apresenta grandes inundações.

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Figura 1. Estações de coleta de dados de qualidade de água. 1)66070010; 2)66090000; 3)66120000; 4)66751000; 5) 66801000; 6) 66810000; 7) 66810500; 8)66811000; 9) 66821000; 10) 66894000; 11) 66895000; 12)66921000; 13) 66971000; 14) 66270000; 15) 66296000; 16) 66341000; 17)66660000/66665000; 18)66750001; 19)66449000; 20)66527000; 21)66481500; 22)66945800; 23)66886500; 24)66886800; 25)66891000; 26) 66911000; 27)66920500. Imagem GEOCOVER SIRCAS 2000.

Outro ponto que merece atenção é a estação Jusante Marinha, situada na cidade de Ladário-MS. Esse ponto apresentou, pela classificação realizada aqui, intensidade média de dequada, o que pode parecer estranho, haja vista que essa região apresenta inundações consideráveis. O que explica a intensidade calculada neste ponto é o fato de nesta região o rio Paraguai perder água para a planície a montante deste ponto (na estação São Francisco), e esta água retorna para o rio apenas a jusante de Ladário, na confluência com o rio Paraguai-Mirim conforme demon-strado por Macedo(2013). Como boa parte da água que extravasa para planície não retorna para o rio Paraguai neste ponto, o fenômeno de dequada é amenizado. O último ponto ao qual teceremos alguns comentários é o ponto na foz do rio Miranda (66921000). Esse ponto foi clas-sificado como sendo de fraca intensidade de dequada, apesar de a montante desse, o ponto na foz do rio Taquari apresentar intensidade forte. A classificação do ponto na foz do rio Miranda

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pode ser explicada quando observamos que neste ponto o rio Paraguai recebe as águas do rio Miranda, o qual não possui deterioração da qualidade de sua água. Além disso, é importante destacar que o rio Paraguai neste ponto já recebeu as águas do rio Negro, que apresenta inten-sidade fraca de dequada.

Figura 2. Estações de qualidade de água que mostram o aumento do oxigênio dissolvido (OD) no rio Cuiabá após receber as águas do rio Itiquira (Figura 1). Imagem GEOCOVER SIRCAS 2000.

Figura 3. Média dos valores de oxigênio dissolvido (2003-2012) no rio Cuiabá

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Figura 4. Média dos valores de oxigênio dissolvido (2003-2012) no rio Paraguai.

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Tabela 1. Cálculo da intensidade da dequada considerando-se a duração e o valor de oxigênio dissolvido. Duração em meses; OD* é a média dos valor

Estação OD* Duração Intensidade66070010–Jusante de Cáceres 3 1 0.33

66090000–Descalvados* 0 0 066120000–Porto Conceição 1.1 3 2.73

66270000–SantoAntôniodo Leverger 0 0 066296000–Jus. deBarãode Melgaço 0 0 0

66341000–Porto Cercado 2.89 1 0.3566449000–Mont. Conf. comRio São Lourenço 0 0 0

66481500–MontanteFozRio Correntes 0 0 066527000–MontanteFozRioPiquiri 0 0 066660000–MontanteFozRioItiquira 1.35 5 3.766665000–Jusante Foz Rio Itiquira 2.52 3 1.1966750001–Retiro Fazenda Recreio 2.93 3 1.02

66751000–Montante Foz Rio São Lourenço 1.4 3 2.1466801000–Pesqueiro Serra Negra (Amolar) 1.21 3 2.48

66810000–São Francisco* 1.92 1 0.5266821000–Jusante Marinha 1.79 3 1.68

66886500–Jusante Foz Rio Taboco 1.9 1 0.5366886800–Ponte Rodovia MS-170 1.7 1 0.59

66891000–Fazenda Tupaceretã 1.9 1 0.5366894000–Rio Taquari-Foz 1.62 6 3.7066895000–Porto da Manga* 2.84 1 0.35

66911000–Ponte Rodovia BR-262 – Miranda/Bodoquena 0 0 066920500–Mont. Foz Rio Aquidauana 0 0 0

66921000–Rio Miranda-Foz 2.27 2 0.8866945800–Foz Córrego Agogô 0 0 0

66971000–Jusante Forte Coimbra 0.28 1 3.5766810500–Foz 2.07 3 1.45

66811000–Montante Captação d’água Corumbá 1.91 2 1.05* dados insuficientes, excluído do mapa de intensidade.

Conclusões e Sugestões

O fenômeno conhecido pelo nome de dequada é oriundo da deterioração natural da qualidade físico-química dos corpos d’água do Pantanal. Neste trabalho foi possível determinar os locais onde a intensidade do fenômeno seria fraca, média ou forte, de acordo com método quali-quantitativo proposto, que tem com parâmetro básico os níveis de OD. O mapa proposto define os trechos de rios que possuem a maior probabilidade de ocorrência do fenômeno de acordo com a intensidade. O rio Paraguai é o corpo d’água mais suscetível a ocorrência de dequada, que é pautada pela intensidade da cheia, sendo que a intensidade da dequada é maior quando o ano com cheia mais intensa foi precedido por um ano mais seco. Além de tudo, fica claro que a escassez de dados dificulta a análise mais apurada do fenômeno. Desta forma, a princi-pal orientação que deixamos nesse trabalho é para que se aumentem e melhorem os dados de qualidade das águas dos rios e lagos do Pantanal, condição que permitiria uma melhor análise do fenômeno.

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Anais 5º Simpósio de Geotecnologias no Pantanal, Campo Grande, MS, 22 a 26 de novembro 2014Embrapa Informática Agropecuária/INPE, p. 729 -730

Figura 5. Classificação de intensidade da dequada de acordo com o conceito criado neste es-tudo, em que a intensidade do fenômeno é função do OD e da duração, conforme com a Eq. 1. Imagem GEOCOVER SIRCAS 2000

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Agradecimentos

Os autores agradecem àEcologia em Ação–ECOA pela autorização do uso dos dados refer-entes ao relatório de “Caracterização Hidrológica do Pantanal” do projeto “Mapeamento de eventos climáticos extremos no Pantanal, análise de seus efeitos sobre populações vulneráveis, capacitação local e elaboração de propostas mitigatórias.”; a FUNDECT/CNPq (processo 23/200.628/2012) pelo valioso apoio às nossas pesquisas no Pantanal; e ao Programa de Pós-Graduação em Geociências e Meio Ambiente da UNESP-Rio Claro em conjunto com a CAPES pela concessão das bolsas de doutorado para o primeiroe quartoautores; ao CNPq pela con-cessão da bolsa de doutorado ao quinto autor.

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