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DIVERSIDADE CULTURAL: O EXPATRIADO NO CONTEXTO DA DINÂMICA SOCIAL CORPORATIVA NUM MUNDO GLOBALIZADO Neide Lúcia de Oliveira Almeida Universidade Federal Fluminense Resumo A diversidade cultural é hoje uma questão crucial para os gestores das corporações que se internacionalizam, das que pretendem expandir seus mercados ou daquelas que, por diferentes motivos, mantém um estrangeiro em seu quadro funcional. Lançar um olhar sobre as múltiplas percepções dos expatriados nas suas novas relações sociais e analisar as características intrínsecas da diversidade cultural entre os atores nos ambientes corporativos, com o propósito de estimular a criatividade, promover a facilitação da comunicação e a interação entre esses profissionais são objeto deste artigo - um trabalho exploratório que servirá de referencial teórico para a dissertação desta autora. Palavras-chaves: Globalização, Diversidade Cultural, Dinâmica Social Corporativa 2, 3 e 4 de Julho de 2009 ISSN 1984-9354

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DIVERSIDADE CULTURAL: O

EXPATRIADO NO CONTEXTO DA

DINÂMICA SOCIAL CORPORATIVA

NUM MUNDO GLOBALIZADO

Neide Lúcia de Oliveira Almeida

Universidade Federal Fluminense

Resumo A diversidade cultural é hoje uma questão crucial para os gestores das

corporações que se internacionalizam, das que pretendem expandir

seus mercados ou daquelas que, por diferentes motivos, mantém um

estrangeiro em seu quadro funcional.

Lançar um olhar sobre as múltiplas percepções dos expatriados nas

suas novas relações sociais e analisar as características intrínsecas da

diversidade cultural entre os atores nos ambientes corporativos, com o

propósito de estimular a criatividade, promover a facilitação da

comunicação e a interação entre esses profissionais são objeto deste

artigo - um trabalho exploratório que servirá de referencial teórico

para a dissertação desta autora.

Palavras-chaves: Globalização, Diversidade Cultural, Dinâmica

Social Corporativa

2, 3 e 4 de Julho de 2009

ISSN 1984-9354

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1. INTRODUÇÃO

A globalização favoreceu não somente a introdução de novas tecnologias de produção

e de modelos de reestruturações gerenciais, como capilarizou a valorização das relações

sociais internas a partir das interações entre os atores e a cultura da empresa (KIRSCHNER,

1999). Assim, as organizações passaram a ser consideradas como um sistema aberto,

conjugando as noções de autonomia e dependência em relação aos ambientes em que estão

inseridas, ao invés de estarem centradas, unicamente, nas questões ligadas ao consumo ou

modo de vida.

Segundo a socióloga Ana Kirschner (1999), a função social da empresa pode ser

analisada a partir de dois eixos: o que privilegia a relação empresa/sociedade, estudando o

tipo de interação estabelecido com a dinâmica da sociedade, e o que enfatiza o que a empresa

faz de fato para assegurar a coesão e mobilização de seus funcionários.

Promover ações de melhoria das condições de trabalho passa a dar visibilidade à

empresa e começa a repercutir na imagem que a sociedade faz dela. Com a crescente

valorização da motivação e dos atributos pessoais que favorecem a cooperação, a

solidariedade, o respeito entre os gestores e seus subordinados, o mapeamento do sistema

social da empresa contribui para a identificação das disfunções porventura existentes e das

barreiras impeditivas de mudanças.

Um olhar socialmente responsável sobre a diversidade cultural corporativa, provocada

pela presença de expatriados no quadro funcional das empresas (que, no presente estudo, para

todos os efeitos, são considerados todos os trabalhadores estrangeiros que prestam serviço em

uma empresa, independentemente da natureza de seus contratos), vai permitir uma análise

sobre a natureza das relações estabelecidas por tais atores, sejam elas as relações de aliança,

negociação, oposição, negociação latente ou oposição latente. (SAINSAULIEU et all,1995,

p.199).

Esta análise permitirá conhecer a natureza da integração e dos conflitos. O

conhecimento do estado das relações de força existentes pode permitir o estabelecimento de

novas regras formais, desta feita, ancorado na situação presente (KIRSCHNER, 2006).

O referencial teórico do modelo da Sociologia – modelo SIC (figura 1) – é uma

ferramenta que permite conhecer a natureza das relações estabelecidas pelos atores nas

organizações, assim como os fatores que contribuem para a sua melhor adaptação. Por isso

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mesmo, para esta autora, é considerado um modelo de aplicabilidade significativa para a

análise comportamental dos expatriados, bem como para a análise dos conflitos e desafios a

que esses estão expostos.

Figura 1: A Regulação Social de Empresa

Fonte: Sainsaulieu (1995 – p: 33), em representação adaptada pela autora.

A metodologia utilizada para o presente artigo envolve uma pesquisa com dados

secundários, obtidos a partir da revisão bibliográfica. A pesquisa é orientada pela hipótese de

que o contato entre pessoas de culturas diferentes, possuidoras de sistemas de representações

distintos é deflagrador de uma mudança organizacional. Dependendo do nível de interação

entre o expatriado e os atores locais, maiores e mais profundas modificações serão

promovidas na cultura organizacional.

Abordar as principais diferenças da multiplicidade cultural no âmbito corporativo, sob

o viés da presença do expatriado, vem ao encontro dos interesses dos atores envolvidos, bem

como dos responsáveis pelas áreas de Recursos Humanos, dos ligados à de Responsabilidade

Social Corporativa, dos gestores e da alta liderança dessas organizações.

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2. DIVERSIDADE CULTURAL – TRADUZINDO MÚLTIPLAS

PERCEPÇÕES

Cada vez mais, os traços de certas culturas estrangeiras se contrapõem aos hábitos e

costumes da cultura local e, invariavelmente, problemas de comunicação se multiplicam. O

simples gesto de positivo (figura 2), feito com o polegar erguido, indicativo de que tudo está

bem, para a maioria das culturas mundiais, é tido como um gesto rude e ofensivo tanto na

Nigéria, quanto na Austrália. O tradicional gesto de “OK”, feito com os dedos pelos

americanos, significa “zero” para os franceses, “dinheiro” para os japoneses e “vou matar

você” na Tunísia (GIBSON, 2002 – p:28).

Figura 2: Ok gesture. (http://images.google.com/images?q=ok+gesture)

Os brasileiros, reconhecidos pelo seu jeito caloroso e amigável de ser, são

estigmatizados pela informalidade nas relações e pela falta de objetividade nas tomadas de

decisão. Ao mesmo tempo que podem cativar novos colegas e estabelecer relacionamentos

duradouros, podem assustar e agredir os estrangeiros mais desavisados e rígidos na

observância das regras de etiqueta corporativa.

O entendimento de que um dos efeitos da economia globalizada é a tendência à

homogeneização das culturas, também pressupõe a expectativa de que essa globalização

implique em conflitos de interesses e em assimetria de concepções e de modelos de gestão.

... contatos entre culturas com diferentes percepções e padrões sobre direitos

humanos, por exemplo, aumentam as expectativas das populações dos diversos

países, que passam a exigir das empresas um comportamento socialmente

responsável e que respeite as noções internacionais de direitos humanos, liberdade e

participação democrática (ASHLEY, 2005 – p:6).

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Aceitar a empresa como um ambiente de cultura própria, com uma forma de

“sociabilidade produzida, transmitida, partilhada e renovada” (KIRSCHNER, A. M. 2006 -

p:279) implica na observação mais aprofundada e cuidadosa, de suas lideranças, sobre as

formas de relações “conflitivas e consensuais, de substratos culturais das regulações

dominantes, das interdependências com as instituições e a sociedade em redor” (idem).

O próprio processo de globalização, tido como “uniforme, unilateral e

antidemocrático” (VELOSO, Letícia H. M. 2005 – p:15), é gerador de efeitos ambíguos, que

precisam ser redimensionados a fim de contribuir para que os efeitos da diversidade cultural

que introduz localmente não sejam sempre negados ou depreciados, mas valorizados como

uma potencial vantagem competitiva.

Atualmente, a economia brasileira está internacionalizada e esta internacionalização

tem dois movimentos: o da presença importante de empresas estrangeiras que se instalam no

Brasil, via aquisição de empresas nacionais ou via associações e/ou fusões, e o do movimento

mais recente de empresas brasileiras que se expandiram, passando a operar em diferentes

países.

Outro dado que merece destaque, no que se refere ao movimento exportador de

brasileiros para o mercado estrangeiro, é o crescente número de empresas nacionais

especializadas em programas de cursos no exterior, de intercâmbio estudantil e de trabalho e

estágio remunerados ou não em diferentes países da Europa, Ásia e América do Norte.

Os impactos provocados nos estrangeiros por essas experiências são, dentre outros, a

passagem por vários tipos de fase de choque cultural, oscilações de humor e sintomas de

doenças físicas ou emocionais (GIBSON, 2002 – p:16). Nos gráficos abaixo, figura 3 e figura

4, Hofstede (2005 – p:324) e Marx (1999 in GIBSON, 2002 – p:16), respectivamente,

demonstram as convergências das conclusões dessas observações.

Assim, se, por um lado, o estrangeirismo tem forte papel de segregação (MOTTA,

Fernandes; ALCADIPANI, Rafael e BRESLER, Ricardo, 2006 – p: 267), o entendimento de

que o estrangeiro é um ator que precisa sentir-se integrado e adaptado à nova realidade

cultural local, o quanto antes, é vital para se evitar a fragmentação dos grupos de trabalho e

para se promover a adequação das diferenças, a complementaridade de contribuições e trocas,

tornando a dimensão coletiva do ambiente social corporativo em relações muito mais

criativas, ricas e universais.

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Figura 3: The Acculturation Curve

Curva de Aculturação, segundo Hofstede

Fonte: HOFSTEDE, Geert e HOFSTEDE, Gert Jan, 2005, p.:324

Figura 4: Phases of Cultural Shock

Fases do Choque Cultural, segundo Marx

Fonte: Marx, 1999, in GIBSON, 2002, p.:16

Num momento onde as empresas carecem de novas fontes de sinergia para fazer frente

às exigências mundiais, de mudanças rápidas e de jogos estratégicos melhor definidos,

equipes multiculturais, com níveis elevados de interação e de poder de adaptação, podem

representar um propulsor organizacional. Por outro lado, se negligenciadas ou subestimadas,

essas mesmas equipes podem mergulhar no impasse, na insegurança e desorientação típicos

daqueles que vivenciam uma experiência dolorosa e negativa.

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3. O Comportamento Humano e a Dinâmica Social Corporativa

Multicultural

As pesquisas sobre o interculturalismo são relativamente recentes e são, em geral, de

caráter empírico. É na Europa, por força de sua tradição no cruzamento de fronteiras

geográficas e lingüísticas, que o tema tem sido objeto de estudo.

Os Estados Unidos contribuiram fortemente para o avanço das pesquisas e divulgação

dos principais conceitos sobre diversidade cultural devido aos desafios crescentes, pós II

Guerra, que as suas organizações enfrentavam no sentido de ajudar diferentes pessoas de

variadas nacionalidades a viverem e trabalharem juntas (GIBSON, 2002 – p:25). No Brasil, o

tema é praticamente desconhecido (FREITAS, 2006 – p:290) e dados de pesquisa são

praticamente ignorados pela literatura brasileira.

Edward Hall foi um dos primeiros estudiosos a tratar da diversidade cultural.

Antropólogo, tornou-se conhecido quando lançou o livro A Linguagem Silenciosa (The Silent

Language), em 1959, e A Dimensão Oculta (The Hidden Dimension), em 1966. Ambos os

livros são ainda populares, hoje em dia, devido à sua leitura fácil e didática.

Florence Kluckhohn e Fred Strodtbeck são outros dois antropólogos que, em 1961,

identificaram cinco orientações-chave sobre o que é importante para o ser-humano. São elas:

a natureza humana (sobre o homem ser ruim, ruim/bom ou bom), a relação do homem com a

natureza (a vida ser determinada por forças externas, o homem viver em harmonia com a

natureza, ou o homem poder dominar a natureza), noção de tempo (orientação para o passado,

para o presente ou para o futuro), atividade (é suficiente ser o que se é, é necessário o auto-

desenvolvimento ou as ações são orientadas para o trabalho por recompensas) e as relações

sociais (existem líderes e naturais seguidores para orientações para o coletivismo, o

individualismo e para a crença em direitos iguais).

O alemão Fons Trompenaars é outro pesquisador mundialmente conhecido que, em

1997, escreveu o livro Nas ondas da Cultura (Riding the Waves of Culture). Para o autor,

existem três dimensões culturais principais: o relacionamento entre as pessoas, as atitudes em

relação ao tempo e as atitudes em relação ao desenvolvimento.

Geert Hofstede, alemão formado em engenharia e psicologia social, é, no entanto, um

dos pesquisadores mais reconhecidos e mais citados sobre diversidade cultural. Seu trabalho

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de pesquisa, desenvolvido junto a mais de 116.000 funcionários da IBM, espalhados em mais

de 72 subsidiárias, falando mais de 20 línguas diferentes e ocupando pelo menos 38 diferentes

cargos (GIBSON, 2002 – p:27)., até hoje é referência sobre o tema. Com a tabulação das

respostas para aproximadamente 100 perguntas, Hofstede identificou 4 dimensões sobre as

questões ligadas à diversidade cultural: individualismo vs. coletivismo, mais forte ou mais

fraca aversão à incerteza (uncertainty avoidance), maior ou menor distância do poder (power

distance), masculinidade vs. feminilidade. Mais tarde, introduziu uma quinta dimensão:

orientação para o longo-prazo (long-term orientation).

No artigo A Cross-Cultural Comparison of Ethical Attitudes of Business Managers:

India, Korea and the United States (CHRISTIE, P. M. J et all, 2003), a hipótese de que existe

uma relação entre as quatro dimensões culturais de Hofstede e as atitudes éticas dos gestores

empresariais foi testada e comprovada.

Na opinião dos autores (idem, 2003 – p:268), um país com maior índice de

individualismo tende a ser mais permissivo com o nepotismo, com a pirataria, com a

informação privilegiada. Os relacionamentos entre as pessoas não são tidos como óbvios e

raramente as pessoas se envolvem com ações de voluntariado, diferentemente de pessoas de

países voltados para o coletivismo.

Hofstede (2005 – p: 78) publicou o resultado de sua pesquisa comparativa do nível de

individualismo (individualism) entre 74 países e afirma que quanto mais desenvolvidas,

melhor ranqueadas as nações em termos de orientações para o individualismo; quanto mais

pobres, mais voltadas para o coletivismo. O Brasil ocupa a 39ª. posição dentre as nações

pesquisadas.

Da mesma forma, gestores de países onde é grande a distância do poder (power

distance) acatam as ordens superiores (não importando se são éticas ou anti-éticas) mais

seriamente do que aqueles em que essa distância praticamente não existe. Na tabela de

Hofstede (2005 – p:43), o Brasil está ranqueado na 26ª. posição, numa tabela comparativa

entre 74 países.

Gestores em países onde é grande a intolerância à incerteza (uncertainty avoidance)

focam mais na legalidade do que na ética em relação às suas ações e decisões. Nessas nações,

os profissionais não toleram a ambigüidade e precisam de regras claras e formais para seguir.

Assim, preocupam-se em constatar se as práticas corporativas são legais (não importando se

são anti-éticas) ainda que a mesma atenção não seja dada, por exemplo, ao fato de

comercializarem produtos que prejudiquem a saúde dos seus concidadãos ou ao de demitirem

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pessoas idosas. Concordam com o lema de que “as regras da empresa não podem ser

quebradas” (HOFSTEDE, 2005). O Brasil figura na 31ª. posição dentre os 74 países

pesquisados sobre o nível de intolerância à incerteza, segundo Hofstede (idem).

Quanto maior a masculinidade (masculinity) de uma sociedade, menor serão as

percepções de problemas ligados à ética. O foco passa a ser o resultado material e a

assertividade. Quanto maior o nível de feminilidade (feminility), maiores os cuidados com a

qualidade de vida, com as ações que preservem o meio-ambiente, que evitem as propagandas

enganosas, etc. O Brasil ocupa o 37º. lugar no índice de masculinidade, dentre os países

pesquisados por Hofstede (idem).

Gestores de nações orientadas para o longo-prazo (long-term orientation) tratam do

futuro a partir do passado e do presente, respeitam as tradições e preservam as obrigações

sociais. Para indivíduos dessas nações o que é bom ou ruim depende das circunstâncias; há

uma satisfação pessoal com o que fazem pelos relacionamentos pessoais e pela mitigação da

justiça; a matéria e o espírito estão integrados; o senso comum é prioritário; os

desentendimentos não ferem e há o entendimento de que se uma parte está certa, a outra

também pode estar. As seis primeiras nações ranqueadas no índice de nações orientadas para

o longo-prazo são Asiáticas. O Brasil figura na 7ª posição e Hofstede sugere que o fato tenha

a ver com a presença da comunidade japonesa no país (idem).

Outros fatores que podem ser destacados como influenciadores de atitudes éticas das

pessoas, além das questões ligadas à cultura, são gênero, idade, religião e emprego/cargo.

O tamanho das organizações também influencia na conduta ética (empresas menores

tendem a sofrer menor pressão para assumirem um comportamento anti-ético, sob o risco de

comprometerem a sua competitividade), bem como o tipo de mercado em que estas se

inserem e da concorrência que sofrem.

4. Conclusão

A experiência vivida pelos expatriados é muito mais do que uma experiência

profissional, num país distante.

Ela mobiliza outras competências além das profissionais, transcendendo o universo

objetivo do indivíduo e de sua família. Assumir a expatriação é admitir a

possibilidade de viver outra vida, de romper laços afetivos, desestruturar certezas e

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costumes, participar de uma aventura definida no cotidiano (FREITAS, Maria E. de.

2006 – p:290).

A antevisão dos riscos do desemprego e o empenho no que se refere à capacitação e

atualização profissional, glorifica a figura do expatriado, devido à sua mobilidade e ao

entusiasmo pelo que julga ser uma missão especial. Diferentemente do turista, esse novo

personagem não pode aceitar ser um mero voyeur da nova dinâmica social em que está

inserido: ele tem o dever de observar as regras de bom comportamento, deve atentar para o

que pode ser considerado “inadequado, bizarro ou ofensivo” (FREITAS, 2006 – p: 293).

Desse modo, uma experiência protagonizada pelo estrangeiro, enquanto força

produtiva em sociedades de culturas díspares, principalmente na condição de agente de

interrelação entre as culturas do Primeiro Mundo e as dos países em desenvolvimento (ou

países emergentes), pode apresentar dilemas ou deflagrar uma inesgotável fonte de desafios,

tanto no aspecto pessoal, quanto familiar e social.

Gestores e líderes que lançarem um olhar sobre essa dinâmica social corporativa, que

entenderem as relatividades decorrentes das diferenças culturais, que observarem a

plasticidade dos valores morais e éticos (ambos dependentes das características e dimensões

culturais de cada povo) e que entenderem que os desafios globais requerem uma cooperação

inter-cultural são gestores comprometidos, socialmente responsáveis.

Estará ratificado o processo transformador do tipo transferencial, a partir do modelo

SIC, descrito por Sainsaulieu, simbolizado pela fórmula C (Cultural) S’(New Structure) I

(Interaction) S (Structure), uma vez que nesse caso, segundo o sociólogo, a mudança parte

“do contato entre duas culturas, dois sistemas de representações, dois modelos de

organização” (KIRSCHNER, 2006 – p.: 304).

Refletir sobre a multiplicidade de estilos e as diferenças culturais é tornar-se

consciente da importância do acolhimento, da adaptabilidade e da comunicação para o

Homem.

REFERÊNCIA

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