Divulgação do passivo: um enfoque sobre o passivo contingente no ...

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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE ECONOMIA, ADMINISTRAÇÃO E CONTABILIDADE DEPARTAMENTO DE CONTABILIDADE E ATUÁRIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS CONTÁBEIS DIVULGAÇÃO DO PASSIVO: UM ENFOQUE SOBRE O PASSIVO CONTINGENTE NO SETOR QUÍMICO E PETROQUÍMICO BRASILEIRO Manoel Raimundo Santana Farias Orientadora: Profa. Dra. Maisa de Souza Ribeiro São Paulo 2004

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  • UNIVERSIDADE DE SO PAULO

    FACULDADE DE ECONOMIA, ADMINISTRAO E CONTABILIDADE

    DEPARTAMENTO DE CONTABILIDADE E ATURIA

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM CINCIAS CONTBEIS

    DIVULGAO DO PASSIVO: UM ENFOQUE SOBRE O PASSIVO

    CONTINGENTE NO SETOR QUMICO E PETROQUMICO BRASILEIRO

    Manoel Raimundo Santana Farias

    Orientadora: Profa. Dra. Maisa de Souza Ribeiro

    So Paulo 2004

  • Prof. Dr. Adolfo Jos Melfi Reitor da Universidade de So Paulo

    Profa. Dra. Maria Tereza Leme Fleury Diretora da Faculdade de Economia, Administrao e Contabilidade

    Prof. Dr. Reinaldo Guerreiro Chefe do Departamento de Contabilidade e Aturia

    Prof. Dr. Fbio Frezatti Coordenador do Programa de Ps-Graduao em Cincias Contbeis

  • MANOEL RAIMUNDO SANTANA FARIAS

    DIVULGAO DO PASSIVO: UM ENFOQUE SOBRE O PASSIVO

    CONTINGENTE NO SETOR QUMICO E PETROQUMICO BRASILEIRO

    Dissertao apresentada ao Departamento de Contabilidade e Aturia da Faculdade de Economia, Administrao e Contabilidade da Universidade de So Paulo como requisito para obteno do ttulo de Mestre em Cincias Contbeis.

    Orientadora: Profa. Dra. Maisa de Souza Ribeiro

    So Paulo 2004

  • FICHA CATALOGRFICA Elaborada pela Seo de Publicaes e Divulgao do SBD/FEA/USP

    Farias, Manoel Raimundo Santana

    Divulgao do passivo: um enfoque sobre o passivo contin- gente no setor qumico e petroqumico / Manoel Raimundo Santana Farias. -- So Paulo : FEA/USP, 2004. 140 f. Dissertao (Mestrado)

    Universidade de So Paulo, 2004 Bibliografia.

    1. Contabilidade financeira 2. Passivo 3. Indstria petroqu- mica I. Faculdade de Economia, Administrao e Contabilidade da USP II. Ttulo. CDD 657.48

    Dissertao defendida e aprovada no Departamento de Contabilidade e Atuaria da Faculdade de Economia, Administrao e Contabilidade da Universidade de So Paulo Programa de Ps-Graduao em Cincias Contbeis, pela seguinte banca examinadora:

    Prof Dra. Maisa de Souza Ribeiro (Presidente)

    Prof. Dr. Luis Nelson Guedes de Carvalho (Titular)

    Prof. Dr. lvaro Augusto Ricardino Filho (Titular)

  • II

    Dedico este trabalho minha esposa

    Kelly, aos meus filhos Renato e

    Maria Eduarda, minha me Marta

    e a meu pai Manoel (em memria) e

    aos meus irmos Mrcia, Miguel,

    Moacir, Marina e Naia.

  • III

    Aqueles que se enamoram da prtica sem a

    Cincia, so como o navegador que entra no

    navio sem timo ou bssola, que jamais tem

    certeza de onde se vai. Sempre a prtica deve

    ser edificada sobre a boa teoria.

    Leonardo da Vinci

  • IV

    AGRADECIMENTOS

    minha esposa Kelly e a meus filhos Renato e Maria Eduarda pela

    compreenso da minha ausncia e pelo estmulo para continuar a jornada at a

    concluso deste trabalho.

    Aos meus pais Manoel (em memria) e Marta pelos ensinamentos que tm sido

    fundamentais em todos os desafios que tenho enfrentado na vida e por sempre

    acreditarem no meu potencial.

    minha sogra professora Luzia que, desde o processo de seleo para este

    curso, incentivou-me a encarar o desafio.

    professora Doutora Maisa de Souza Ribeiro por suas orientaes durante a

    realizao desta pesquisa, as quais no se limitaram aos aspectos tcnicos.

    Ao professor Doutor L. Nelson Carvalho, por sua contribuio na concepo

    deste estudo e na banca examinadora.

    Ao professor Doutor lvaro Ricardino pelas sugestes feitas no exame de

    qualificao.

    Aos colegas do mestrado da turma de Belm do Par e a todos os colegas de

    outros Estados com os quais convivemos, durante os estudos que realizamos no

    Departamento de Contabilidade da USP.

    Aos professores que se deslocaram de So Paulo para ministrar aulas na cidade

    de Belm.

    Ao professor Doutor Ariovaldo dos Santos e equipe da Revista Exame

    Melhores e Maiores que permitiram a utilizao das demonstraes contbeis,

    sem o que esta pesquisa no teria sido realizada.

  • V

    Ao Departamento de Contabilidade e Atuaria da Faculdade de Economia,

    Administrao e Contabilidade da Universidade de So Paulo, principalmente,

    ao Professor Doutor Diogo Toledo do Nascimento e a Maria Lcia (Malu), por

    todo o apoio e bons servios prestados.

    Ao Centro Universitrio do Par

    CESUPA, pelo apoio e compreenso durante

    as minhas viagens.

    E, principalmente, Faculdade de Estudos Avanados do Par

    FEAPA, pela

    oportunidade e incentivo que tenho recebido.

  • VI

    SUMRIO

    LISTA DE TABELAS ..................................................................... VIII

    LISTA DE FIGURAS ...................................................................... IX

    RESUMO........................................................................................... X

    ABSTRACT....................................................................................... XI

    1. INTRODUO ..............................................................................12 1.1. ANTECEDENTES DO TEMA............................................................................12 1.2. PROBLEMA E HIPTESE................................................................................15 1.3. JUSTIFICATIVA.............................................................................................17 1.4. OBJETIVOS DO ESTUDO................................................................................18 1.5. METODOLOGIA DA PESQUISA.......................................................................19

    1.5.1. Delimitao do estudo............................................................................19 1.5.2. Estrutura do trabalho.............................................................................20

    2. PASSIVO.........................................................................................21 2.1 PASSIVO E PATRIMNIO LQUIDO ................................................................21 2.2. DEFINIES, CARACTERSTICAS E TIPOS DE PASSIVOS .................................24

    2.2.1. Definies ...............................................................................................24 2.2.2. Caractersticas .......................................................................................28 2.2.3. Tipos .......................................................................................................30 2.2.4. Obrigaes Legais, Justas e Construtivas .............................................32

    2.3. CLASSIFICAO...........................................................................................46 2.3.1 Objetivos da Classificao.....................................................................47 2.3.2 Passivo de Funcionamento.....................................................................50 2.3.3 Passivo de Financiamento......................................................................53

    2.4. RECONHECIMENTO ......................................................................................54 2.4.1. Regime de Competncia .........................................................................54 2.4.2. Reconhecimento e registro .....................................................................56

    2.5. MENSURAO .............................................................................................61 2.6. DIVULGAO ..............................................................................................66

    2.6.1. Aspectos gerais e formas de divulgao ................................................66 2.6.2. Divulgao transparente ........................................................................73

    2.7. CASOS PARTICULARES DE PASSIVOS ............................................................76

  • VII

    3. PASSIVO CONTINGENTE..........................................................80 3.1. CONSIDERAES INICIAIS............................................................................80 3.2. ABORDAGEM CONCEITUAL ..........................................................................81

    3.2.1. Conceitos do Fasb ..................................................................................81 3.2.2. Conceitos do Iasb ...................................................................................82 3.2.3. Conceitos utilizados no Brasil................................................................84

    3.3. RECONHECIMENTO E REGISTRO ...................................................................89 3.4. MENSURAO .............................................................................................90 3.5. DIVULGAO ..............................................................................................93

    4. ESTUDO EMPRICO DO PASSIVO ..........................................96

    4.1. TCNICA DE COLETA DOS DADOS.................................................................96 4.2. ANLISE DOS DADOS ...................................................................................98

    4.2.1. Informaes Iniciais ...............................................................................98 4.2.2. Anlise geral do passivo.......................................................................100 4.2.3. Anlise das informaes nas notas explicativas ..................................111 4.2.4. Anlise do passivo contingente ............................................................113 4.2.5. Analise do contedo das notas explicativas sobre contingncias ........121

    4.3. RESULTADOS OBTIDOS ..............................................................................123

    5. CONCLUSES.............................................................................127

    BIBLIOGRAFIA .................................................................................134

    ANEXO................................................................................................140

  • VIII

    LISTA DE TABELAS

    Tabela 1 - Os nmeros do setor no contexto das 500 maiores empresas do pas..

    100

    Tabela 2 - Relao do passivo com o patrimnio lquido..................................... 101

    Tabela 3 - Relao entre o passivo circulante e o passivo de longo prazo........... 103

    Tabela 4 - Classificao das obrigaes em passivo de funcionamento e de

    financiamento................................................................................. 107

    Tabela 5 - As formas de divulgao do passivo, encontradas nas demons-

    traes .................................................................................................

    108

    Tabela 6 - Anlise das informaes nas notas explicativas sobre o passivo.........

    111

    Tabela 7 - Empresas que reconheceram e os tipos de passivos contingentes........

    114

    Tabela 8 - Participao do passivo contingente em relao ao exigvel total....... 116

    Tabela 9 - Participao das provises em relao ao passivo total....................... 119

    Tabela 10 - Contedo das notas explicativas sobre passivos contingentes...........

    121

  • IX

    LISTA DE FIGURAS

    Figura 1 - Diferenas entre o Passivo e o Patrimnio Lquido........................... 23

    Figura 2 - Principais diferenas entre proviso para contingncias passivas e

    reservas para contingncias.............................................................. 29

    Figura 3 - Tipos de passivos............................................................................... 32

    Figura 4 - Obrigaes justa e construtiva: evoluo conceitual e exemplos.........

    45

    Figura 5 Processo Contbil............................................................................... 57

    Figura 6 - Tipos de passivos contingentes e tratamento contbil....................... 85

    Figura 7 - Comparao entre os principais conceitos sobre passivos contin-

    gentes, segundo o Iasb, o Fasb e a CVM.................................... 88

    Figura 8 - As 50 Melhores e Maiores empresas do setor qumico e petro-

    qumico no Brasil............................................................................. 99

  • X

    RESUMO

    Este trabalho trata do passivo com enfoque no passivo contingente e tem como objetivo contribuir com os estudos sobre a sua divulgao nas Demonstraes Contbeis visando ao aprimoramento das informaes contbeis geradas pelas empresas. O estudo inicia-se com uma reviso da literatura para identificar as principais recomendaes dos rgos normativos nacionais e internacionais de Contabilidade. Nesse sentido, alguns importantes conceitos foram discutidos, como os tipos de passivos: normal e contingente, oneroso e no-oneroso, monetrio e no-monetrio. O fato gerador dos passivos foi amplamente tratado, a natureza das obrigaes: legais e construtivas; os critrios de reconhecimento, mensurao e divulgao das obrigaes. Em seguida, desenvolve-se uma pesquisa nos balanos publicados no perodo de 1999 a 2001 para verificar se as empresas do setor Qumico e Petroqumico sediadas no Brasil esto divulgando aquilo que as normas recomendam. A pesquisa foi feita com base nas 50 empresas mais bem classificadas no ranking anual realizado pela revista Exame Melhores e Maiores, que publicaram suas demonstraes contbeis. Os resultados indicam o seguinte: grande o nmero de empresas que reconheceram o passivo contingente nos seus balanos; as contingncias mais encontradas decorreram de questes trabalhistas e tributrias e as menos encontradas foram as decorrentes de questes ambientais; em algumas empresas o passivo contingente foi expressivo, representando entre 10% a 28% do total das obrigaes; nem todas as empresas elaboraram nota explicativa sobre o passivo contingente; muitas notas explicativas no informaram sobre vrios aspectos recomendados, como os critrios de avaliao das contingncias, sua natureza, a probabilidade de ocorrncia, o valor contbil no incio e no final do perodo, as provises feitas e o valor baixado ou revertido no exerccio. Ressalte-se que tais concluses se referem, exclusivamente, s empresas pesquisadas e no perodo indicado anteriormente.

  • XI

    ABSTRACT

    This study deals with liabilities, focusing on contingent liabilities and aims to contribute to studies about Financial Statement disclosure with a view to improving companies accounting information. First, a literature review was carried out in order to identify the main recommendations by national and international regulatory accounting bodies. In this sense, some important concepts were discussed, such as liability types: normal and contingent, onerous or not, monetary and non-monetary. The events that give rise to liabilities were broadly discussed: legal and constructive; liability recognition, measuring and disclosure criteria. Next, we examined the balance sheets published from 1999 to 2001, to verify whether Brazilian Chemical and Petrochemical companies are disclosing what is recommended by regulations. This research was carried out on the basis of the 50 companies with the best ranking in the annual classification published by the magazine Exame Melhores e Maiores, which published their financial statements. Results demonstrate that: a large number of companies recognized contingent liabilities in their balance sheets; the most frequent contingencies resulted from labor and tax issues, while the least frequent issues were environmental; significant contingent liabilities were found in some companies, representing between 10% and 28% of total liabilities; not all companies elaborated an explanatory note about the contingent liabilities; many explanatory notes did not inform on various aspects recommended in the standards, such as contingency valuation criteria, kind, probability of occurrence, accounting value at the beginning and end of the period, accrual made and values written-off or reverted during the year. We emphasize that these conclusions strictly apply to the companies that were analyzed in the above mentioned period.

  • 12

    1. INTRODUO

    1.1. Antecedentes do tema

    Este trabalho se insere nos estudos do Balano Patrimonial como uma

    das demonstraes contbeis divulgadas pelas empresas, utilizadas para fornecer aos

    usurios da Contabilidade informaes econmicas e financeiras, que lhes sejam

    teis nas suas tomadas de decises.

    Entre seus elementos h o passivo, conceituado como a obrigao atual

    da entidade, decorrente de eventos passados, que exigir sacrifcios futuros provveis

    por meio da entrega de ativos ou prestao de servios a uma ou mais entidades.

    As obrigaes das empresas para com terceiros esto ganhando

    importncia cada vez maior nas pesquisas contbeis, bem como ateno por parte dos

    rgos normativos nacionais, principalmente a Comisso de Valores Mobilirios

    (CVM) e o Instituto dos Auditores Independentes do Brasil (Ibracon), e

    internacionais como o International Accounting Standards Board (Iasb), antigo

    International Accounting Standards Committee (Iasc) e o Financial Accounting

    Standards Board (Fasb).

    Esse fato est ocorrendo porque os diferentes usurios da Contabilidade,

    fornecedores, banqueiros, funcionrios, consumidores e a sociedade em geral, tm

    demonstrado interesse e preocupao no somente com a posio financeira, mas

    tambm com a continuidade e com a responsabilidade da empresa perante o seu

    ambiente de atuao, o que tem levado a legislaes mais severas relacionadas

    defesa dos consumidores, proteo ambiental, dentre outras.

  • 13

    Alm disso, independente das exigncias legais, h, tambm, a

    necessidade de as entidades zelarem pela sua imagem, assumindo as obrigaes por

    danos causados aos seus funcionrios, a outras pessoas em geral e ao meio ambiente,

    para que continuem tendo seus produtos ou servios aceitos no mercado. Sobre esse

    aspecto, Ribeiro (2000) afirma que Atualmente, a sociedade em geral que d a

    permisso para a continuidade da empresa, a qual no mais se restringe aos rgos

    governamentais.

    Dentro desse contexto, uma questo importante o que se deve incluir ou

    excluir no grupo do passivo de uma empresa. A esse respeito, Iudcibus, afirma o

    seguinte:

    O que deveria ser includo (ou excludo) das exigibilidades outra questo. [...] Segundo a interpretao mais restritiva, apenas as dvidas efetivas deveriam ser includas. [...] Assim, apenas os valores a pagar decorrentes de algumas transaes passadas (j realizadas), com vencimento em um momento especfico de tempo no futuro, deveriam ser contemplados. Outros autores incluiriam nas exigibilidades valores devidos, se falharmos no cumprimento de algum ato futuro (lucros diferidos ou passivos contingentes).(IUDCIBUS, 2000, P. 146)

    A incluso apenas das dvidas efetivas restringe o reconhecimento dos

    passivos e deixa de fora muitas obrigaes que existem, mas a Contabilidade tem

    dificuldade em definir o valor e o momento em que elas sero requeridas.

    No caso do Passivo Contingente, o seu fato gerador est ligado a alguma

    transao ou evento passado, porm a definio da data e do valor a ser exigido

    depende de eventos futuros, sobre os quais a empresa no tem nenhum controle ou

    influncia. Sua incluso nas Demonstraes Contbeis determinada por organismos

    internacionais como Iasb, por meio da NIC (Norma Internacional de Contabilidade),

    IAS n 37 (International Accounting Standard) e pelo Fasb Sfas n 5 (Statement of

    Financial Accounting Standards), bem como pelas normas contbeis do Brasil.

    As obrigaes contingentes decorrem, principalmente, de questes

    trabalhistas, tributrias, cveis e ambientais, conforme exemplificado adiante.

    Processos trabalhistas so bastante comuns no cotidiano das

    organizaes, porm seu tratamento no dos mais simples, porque nem sempre o

  • 14

    que reclamado ocorreu de fato ou na proporo alegada, assim como poder existir

    acordo entre as partes, o que torna difcil definir qual ser o valor exigido.

    A complexidade do sistema tributrio brasileiro leva a um grande nmero

    de aes, questionando alquotas de impostos, o perodo em que se deve iniciar sua

    cobrana, o enquadramento das empresas nessa ou naquela legislao, dentre outros,

    o que gera dvidas do tipo: o imposto devido? Qual valor ser determinado pela

    Justia? Haver juros e correes? Quais sero os ndices? Quando sair a deciso?

    Outras situaes, relacionadas com garantias prestadas por dvidas de

    terceiros, garantias para cobrir produtos com defeito e outros, podero envolver a

    empresa em processos cveis, por no haver acordo sobre o mrito da questo e/ou o

    valor que devido.

    Os riscos envolvendo questes ambientais tendem a crescer em funo da

    presso dos movimentos sociais, exigindo a preservao do meio ambiente, o que

    tem levado as autoridades governamentais a aprovarem legislaes mais rigorosas.

    A conscincia verde irreversvel e tende a influenciar o

    comportamento organizacional, que j est demandando estudos sobre gesto

    ambiental, envolvendo o uso de tecnologias antipoluentes, materiais reciclados,

    reflorestamento e outros. Nesse contexto, surge um ramo contbil chamado de

    Contabilidade Ecolgica ou Ambiental, com o objetivo de identificar, mensurar e

    divulgar informaes sobre as aes das empresas que afetam o meio ambiente.

    No Brasil, destacam-se, entre outros, os trabalhos desenvolvidos por

    Ribeiro e Lisboa em (2000) e por Nossa em (2002) sobre os impactos ambientais

    provocados pela atuao das empresas, visando identificar qual a responsabilidade de

    cada uma delas nos danos causados ao meio ambiente e se podem gerar obrigaes

    (passivos ambientais) s mesmas.

    De acordo com Ribeiro e Lisboa (2000), o termo passivo ambiental

    ganhou destaque nas trs ltimas dcadas, principalmente, a partir dos danos

    provocados pelo vazamento de gs na vila Soc em Cubato, So Paulo, em 1984,

    pelos resduos de materiais nucleares em Chernobil, na Rssia, em 1986, pelo

  • 15

    petroleiro Exxon-Valdez no Alaska, em 1989, pelo vazamento de 1,2 milhes de

    litros de leo na Baa da Guanabara, no Rio de Janeiro, em 17 de janeiro de 2000.

    O passivo ambiental uma obrigao atual relacionada com a

    preservao, recuperao e proteo do meio ambiente, que exigir sacrifcios

    futuros provveis por meio da entrega de ativos ou prestao de servios para uma ou

    mais entidades.

    Esse tipo de obrigao pode gerar dificuldades porque nem sempre

    perfeitamente reconhecida e mensurada ou ainda por envolver contingncias que

    sero resolvidas por um ou mais eventos futuros fora do controle da entidade, tais

    como: emisso de laudos ambientais ou decises judiciais que forneam elementos

    definidores do montante da exigibilidade da empresa e a data de vencimento.

    1.2. Problema e hiptese

    Os elementos que compem as obrigaes das empresas junto a terceiros,

    devem refletir, de forma transparente, os compromissos financeiros existentes, para

    que os credores tenham informaes que indiquem a situao econmico-financeira

    da entidade.

    O processo contbil, relativo apreenso de todos os passivos de uma

    entidade, exige o conhecimento do ramo de negcios, no qual atua para identificar os

    riscos das suas aes e as contingncias, que provoquem o surgimento de obrigaes,

    que devero ser reconhecidas, mensuradas, registradas e divulgadas no momento da

    sua ocorrncia.

    Os passivos podem ser decorrentes da aquisio de ativos a prazo, da

    ocorrncia de despesas, ou ainda de perdas geradas, principalmente, por fatos que

    causaram danos a terceiros, pela no observncia de legislaes, tais como: Cdigo

    de Defesa do Consumidor, leis ambientais, trabalhistas, fiscais e outras.

    Entre essas possibilidades h casos em que se tem dvida quanto ao

    momento de ocorrncia da obrigao, ao valor do sacrifcio futuro em termos

  • 16

    financeiros, e, como e/ou quais informaes devem ser divulgadas para atender s

    necessidades dos usurios externos, que precisem avaliar a capacidade de pagamento

    dos seus devedores, ou ainda, dos que estejam interessados em investir na

    organizao.

    Nesse contexto, o trabalho procura responder ao seguinte problema:

    as maiores empresas, por faturamento, do Setor Qumico e Petroqumico,

    sediadas no Brasil1, de acordo com a Revista Exame, Melhores e Maiores,

    edio anual de 2002, esto divulgando, em suas demonstraes contbeis, as

    informaes mnimas recomendadas pelos rgos normativos nacionais e

    internacionais, para o Passivo Contingente?

    Dentre as 50 Melhores e Maiores do setor sero analisadas somente as

    Sociedades Annimas, portanto, eliminando-se as Sociedades Limitadas que no

    publicam seus balanos e que esto classificadas entre as 50 companhias.

    Hiptese

    As hipteses esto relacionadas com a busca de solues para o problema

    formulado, isto , o pesquisador estuda o objeto e tenta explic-lo baseado em

    conceitos j existentes sobre o assunto, pois o mesmo:

    Observa os fatos e busca explicar sua ocorrncia, baseado em determinadas teorias. Uma funo importante das hipteses a determinao da adequao dessas teorias como fundamentos explicativos. (RICHARDSON, 1999, P. 104).

    Segundo Richardson (1999, p. 27), uma hiptese uma resposta

    possvel de ser testada e fundamentada para uma pergunta feita relativa ao fenmeno

    escolhido .

    As hipteses so afirmativas que iro guiar a pesquisa ou suas

    concluses, de maneira objetiva, isto , parte da opinio subjetiva do pesquisador,

    porque capacitam o homem a testar aspectos da realidade com um mnimo de

    distoro causada por suas predilees (KERLINGER, 1980, p. 39).

    1 Publicada em julho de 2002.

  • 17

    Segundo Kerlinger (1980, p. 39), para serem cientificamente teis, as

    hipteses precisam ser testveis, ou no mnimo, conter implicaes para teste, para

    que seja aceita ou rejeitada. Isto implica em se terem condies de test-la ou

    comprov-la. Neste trabalho, ser estudada como provvel a seguinte hiptese:

    H1. O grau de divulgao do passivo contingente nas demonstraes

    contbeis pesquisadas est abaixo do recomendado pelos rgos

    normativos nacionais e internacionais.

    Sero analisadas as contas expostas no Balano Patrimonial e o contedo

    das notas explicativas a partir das exigncias e orientaes normativas, por meio de

    tabelas, comparando-se os itens que deveriam ter sido divulgados com os que

    efetivamente o foram, isso significa que a anlise no incluir testes estatsticos. A

    comprovao se far por meio de evidncias comparativas entre as variveis que

    permitam a aceitao ou a rejeio da hiptese de pesquisa.

    Segundo Kerlinger (1979, p. 41), depois de identificar as implicaes em

    forma de variveis, preciso ter um meio operacional de manipular ou medir as

    variveis para poder estudar as relaes entre elas . Dessa forma, sero listadas, em

    tabelas, as variveis referentes aos principais itens que deveriam ter sido divulgados,

    seguidos do nmero de empresas que efetivamente divulgaram tais itens nas suas

    demonstraes contbeis, obtendo-se, assim, o grau de divulgao, em termos

    absoluto e relativo.

    1.3. Justificativa

    A divulgao de todas as obrigaes das empresas, por meio do Balano

    Patrimonial, acompanhado de quadros complementares e notas explicativas, que

    esclaream os critrios utilizados para mensur-las e reconhec-las fundamental

    para dar credibilidade s informaes geradas pela Contabilidade.

    Alm disso, essas informaes devem atender s necessidades dos

    usurios externos, como credores, fornecedores, investidores e outros, que dependem

  • 18

    dos relatrios contbeis para tomarem decises sobre concesso de emprstimos,

    investimentos e outros.

    A omisso de obrigaes, bem como sua subavaliao ou superavaliao,

    afeta o lucro do perodo, que por sua vez influencia na distribuio de dividendos, no

    pagamento de impostos e no valor do patrimnio lquido pertencente entidade.

    1.4. Objetivos do estudo

    Objetivo Geral

    Contribuir com os estudos sobre os Passivos, nos aspectos relacionados

    divulgao nas Demonstraes Contbeis, com enfoque nos Passivos Contingentes,

    visando ao aprimoramento das informaes contbeis geradas pelas empresas.

    Objetivos Especficos

    Diferenciar o passivo do patrimnio lquido;

    Apresentar as bases conceituais para o reconhecimento, mensurao e divulgao

    do passivo;

    Conceituar e caracterizar o Passivo Contingente, bem como discorrer sobre o seu

    tratamento contbil;

    Demonstrar a participao do passivo no financiamento das atividades das

    empresas analisadas;

    Analisar as Notas Explicativas e os quadros demonstrativos complementares,

    referentes ao passivo contingente, considerando: 1) as exigncias da Lei das

    Sociedades Annimas, n 6.404/76; 2) as instrues da CVM; 3) as Normas

    Internacionais de Contabilidade do Iasb;

    Identificar, entre as empresas investigadas, o seguinte: 1) quais delas divulgaram

    passivos contingentes; 2) quais os tipos de contingncias que aparecem; e, 3) se

    so evidenciadas as informaes mnimas recomendadas pelos rgos normativos.

  • 19

    1.5. Metodologia da pesquisa

    O trabalho teve incio com uma pesquisa bibliogrfica com o objetivo de

    esclarecer conceitos importantes sobre o assunto, bem como de formar um

    referencial terico para o estudo, tendo em vista que, a pesquisa bibliogrfica

    procura explicar e discutir um tema ou um problema com base em referncias

    tericas publicadas em livros, revistas, peridicos, etc. (MARTINS, 2000, p. 19)

    O mtodo utilizado o terico emprico porque envolver uma

    fundamentao terica dos elementos envolvidos no estudo e em seguida ser

    realizada uma pesquisa emprica, utilizando-se dos Balanos publicados pelas

    maiores empresas, por faturamento, do Setor Qumico e Petroqumico, sediadas no

    Brasil, de acordo com a Revista Exame, Melhores e Maiores, edio anual de 2002.

    1.5.1. Delimitao do estudo

    Considerando os objetivos deste trabalho, faz-se necessrio uma

    delimitao do estudo, uma vez que:

    A seleo de aspectos mais relevantes e a determinao do recorte , pois, crucial para atingirmos os propsitos do estudo e chegarmos a uma compreenso mais completa sobre a situao estudada (MARTINS, 2000, P. 37).

    O presente estudo est assim delimitado:

    1) No aspecto conceitual, trata sobre os passivos, com enfoque nos

    passivos contingentes, levando-se em considerao a Teoria da Contabilidade, as

    normas constantes na Lei 6.404/76 e as emanadas da CVM e, ainda, as Normas

    Internacionais de Contabilidade;

    2) Nos aspectos setorial e geogrfico, abrange as Maiores Empresas do

    Setor Qumico e Petroqumico sediadas no Brasil, que publicaram suas

    demonstraes contbeis; e,

  • 20

    3) No aspecto temporal, sero analisados os Balanos publicados no

    perodo de trs anos, entre 1999 e 2001.

    1.5.2. Estrutura do trabalho

    A estrutura do trabalho a seguinte: no primeiro captulo, so

    apresentados os antecedentes do tema, o problema, as hipteses da pesquisa, a

    justificativa, os objetivos gerais e especficos a serem alcanados e a metodologia

    utilizada. No segundo e terceiro captulos, feito um levantamento da literatura

    existente sobre o assunto, para verificar o estado em que se encontra o conhecimento,

    o qual servir de base pesquisa documental e s concluses do trabalho.

    Em seguida, no quarto captulo, apresentada, a pesquisa emprica

    realizada, descrevendo-se os mtodos de coleta de dados e os materiais utilizados,

    bem como a exposio e discusso dos resultados, comparando-os com os j

    existentes sobre o assunto na literatura citada, as possveis implicaes, significados

    e razes para concordncia ou discordncia com outros autores.

    Finalmente, no quinto captulo so expostas as concluses obtidas no

    estudo, visando ao cumprimento dos objetivos propostos e a confirmao ou no das

    hipteses previamente estabelecidas. O trabalho encerra-se com a apresentao dos

    anexos, da bibliografia consultada e referenciada e do apndice.

  • 21

    2. PASSIVO

    2.1 Passivo e Patrimnio Lquido

    Pode-se atribuir ao passivo um sentido de origem de recursos globais,

    isto , todas as fontes de capital de uma dada entidade, considerando-o como um

    gnero2. Procedendo-se, assim, estaro sendo tratadas, como passivo, todas as contas

    com saldo credor, constantes no lado direito do Balano Patrimonial, sendo que,

    nesse caso, ter-se-ia a seguinte equao: ativo = passivo.

    Uma outra forma seria os passivos serem entendidos em um sentido mais

    restrito, incluindo apenas os direitos dos credores, deixando de fora o direito dos

    proprietrios de aes ou quotas de capital; este seria tratado como patrimnio

    lquido e nesse caso, ambos estariam sendo situados na categoria de espcie3. Como

    conseqncia dessa abordagem a equao seria: ativo = passivo + patrimnio lquido.

    primeira vista, pode-se achar que se trata apenas de uma questo

    semntica. Ocorre que h diferenas importantes entre as formas de avaliao do

    capital que originado de scios, proprietrios ou acionistas, daquele oriundo de

    credores e financiadores externos organizao.

    Por esse motivo, deve-se distinguir essas fontes de capital, uma vez que

    se podem avaliar as obrigaes, ou os direitos dos credores de forma separada ou no

    2 Conceito geral que engloba todas as propriedades comuns que caracterizam um dado grupo ou classe de seres ou de objetos, ou ainda, que possuem a mesma origem e se acham ligados pela similitude de uma ou mais particularidades.

    3 Na linguagem corrente vista como qualquer classe de indivduos com propriedades em comum, considerada uma subdiviso de uma classe ainda mais ampla, o gnero.

  • 22

    vinculada a outras avaliaes, se a empresa estiver em condies de saldar suas

    dvidas, enquanto os direitos dos que adquirem quotas ou aes da empresa so

    mensurados a partir dos ativos, inicialmente, investidos, somando-se os lucros

    reinvestidos e as reavaliaes ocorridas nos ativos (IUDCIBUS, 2000, p. 171).

    As diferenas existentes entre os direitos dos acionistas e os direitos dos

    credores esto relacionados com os seguintes aspectos:

    1) A existncia de direitos de preferncia por parte de portadores de ttulos. 2) O grau de certeza na determinao dos valores a serem recebidos pelos portadores de ttulos. 3) As datas de vencimento dos pagamentos finais. (HENDRIKSEN e VAN BREDA, 1999: p. 466)

    Os aspectos identificados acima pelos referidos autores servem de base

    caracterizao de um passivo entendido como uma obrigao com credores, ou seja,

    os exigveis.

    No primeiro item, ressaltado o fato de que, pelo menos em condies

    normais, procura-se honrar os compromissos primeiro com os credores, havendo,

    inclusive, casos em que isso est previsto em contratos ou legislaes especficas.

    O segundo item diz respeito ao fato de que em uma obrigao,

    geralmente so conhecidos os seus valores, assim como o terceiro item ressalta que a

    data em que sero requeridas, normalmente, previamente estabelecida, o mesmo

    no ocorrendo com os direitos dos acionistas.

    Os direitos dos detentores de capital no so exigveis a qualquer

    momento, porque dependem da ocorrncia de lucro e mais ainda da deliberao em

    distribu-lo, ressalvados os casos dos acionistas que tm direito a dividendos

    obrigatrios que, no momento adequado, so considerados como obrigaes de fato

    e, portanto, passam a serem tratados como passivos exigveis pelos beneficirios.

  • 23

    Figura 1 - Diferenas entre o Passivo e o Patrimnio Lquido

    Passivo Patrimnio Lquido

    Normalmente, os credores tm prioridade em receber os seus direitos.

    Normalmente os direitos dos acionistas so residuais aos dos credores.

    Os valores a serem recebidos pelos beneficirios so determinados com

    maior grau de certeza

    Os valores a serem recebidos pelos beneficirios so determinados com

    menor grau de certeza.

    Os valores a serem pagos aos credores so definidos no ato do fornecimento do recurso. H a obrigao de faz-lo (so

    exigveis)

    No h obrigao de pagamento de valores (no so exigveis), salvo nos casos dos dividendos obrigatrios ou

    retirada de scio da sociedade.

    A data de vencimento da obrigao geralmente fixa e determinvel. No h uma data determinvel.

    Fonte: Baseado em Iudcibus (2000, Cap. 10, p. 169 e 170).

    O fato de se determinar o valor do passivo com maior grau de certeza do

    que o valor do patrimnio lquido no significa que no haja obrigaes, para as

    quais se tenha dvida quanto aos valores a serem pagos. As provises para

    contingncias, por exemplo, so feitas por meio de estimativas que normalmente

    envolvem incertezas. Outro aspecto diz respeito data de vencimento do passivo,

    que pode ser fixa ou determinvel, mas h casos em que, no se conhece o momento

    que as obrigaes sero exigidas. O Decreto Lei 2.627 de 1940, que regulamentava

    anteriormente as Sociedades Annimas, em seu captulo XIII, artigo 135, classificava

    os passivos em exigveis e no exigveis, sendo que, nesse ltimo grupo, classificava

    as contas atualmente conhecidas como elementos do patrimnio lquido, portanto,

    reconhecendo como obrigao das empresas os direitos dos acionistas. A seguir, o

    referido texto:

    Balano, amortizaes, reservas e dividendos. Art. 135. O balano dever exprimir, com clareza, a situao real da sociedade, e, atendidas as peculiaridades do gnero da industria e do comrcio explorado pela sociedade, nele se observaro as seguintes regras: [...] b) o passivo ser dividido em passivo exigvel, a longo e curto prazo, e passivo no exigvel, neste compreendidos o capital e as reservas legais e estatutrias, e compreender tambm as contas de resultado pendente e as contas de compensao. (BRASIL, DECRETO LEI N 2.627 de 26 de setembro de 1940).

  • 24

    A Lei n 6.404/76 das Sociedades Annimas alterou a referida

    classificao, passando a denominar o passivo no exigvel de Patrimnio Lquido,

    [...] denominao muito mais indicativa e correta. (IUDCIBUS, 2000, p. 290).

    No obstante a opinio do ilustre autor, o fato que a Lei 6.404/76

    continua tratando o patrimnio lquido como um grupo do passivo quando diz que:

    No passivo as contas sero classificadas nos seguintes grupos: 1. passivo circulante 2. passivo exigvel a longo prazo; 3. resultado de exerccios futuros; 4. patrimnio lquido [...] (BRASIL, LEI N 6.404/76, art. 178, 2,

    grifo nosso).

    O objetivo deste estudo no discutir a adequao ou no do uso do

    termo Passivo no Exigvel ou Patrimnio Lquido (PL), mas distinguir este do

    Passivo (conforme Figura 1).

    Depois de terem sido feitas as devidas consideraes sobre o enfoque que

    poderia ser dado, hora de esclarecer que, neste trabalho, quando for utilizado o

    termo passivo, se estar tratando dos passivos exigveis, a no ser que haja

    esclarecimento contrrio.

    2.2. Definies, caractersticas e tipos de passivos

    2.2.1. Definies

    Sero apresentadas as definies de alguns dos principais autores da

    Teoria da Contabilidade, seguidas dos comentrios pertinentes.

    Um passivo um servio, com valor monetrio, que um proprietrio

    (titular de ativos) obrigado legalmente (ou justamente) a prestar a uma segunda

    pessoa (ou grupo de pessoas)4.

    (CANNING, 1929, p. 55-6, traduo nossa)

    4 A liability is a service, valuable in money, which a proprietor is under an existing legal (or equitable) duty to render to a second person (or set of persons).

  • 25

    Uma limitao encontrada nessa definio quanto ao fato de se referir

    ao passivo apenas como um servio a ser prestado, quando, na verdade, o mesmo

    pode est ligado entrega de um ativo.

    O mrito que o autor, alm das obrigaes legais, trata das obrigaes

    justas, dando um carter abrangente definio, apesar de que, naquela poca

    (1929), talvez o mesmo no tivesse a plena conscincia de tal abrangncia, porque

    no existiam as preocupaes que se tem hoje em relao aos inmeros tipos de

    passivos surgidos de contingncias fiscais, trabalhistas, ambientais, entre outras. A

    partir da dcada de 80, com a condenao de Instituies Financeiras como co-

    responsveis em acidentes ambientais, houve uma elevao na conscincia, inclusive

    dos legisladores, refletindo-se num maior rigor das legislaes ambientais com

    conseqentes punies diretas aos administradores e proprietrios de empresas que

    agridam o meio ambiente (CARVALHO e RIBEIRO, 2000). E ainda, aumento na

    reclamao de direitos trabalhistas, inmeros processos fiscais, diante de

    significativos e freqentes aumentos da carga tributria sobre as empresas.

    Os passivos so [...] obrigaes que exigem a entrega de ativos ou

    prestao de servios em um momento futuro, em decorrncia de transaes passadas

    ou presentes5. (SPROUSE e MOONITZ, 1962, p. 54, traduo nossa).

    A definio mencionada representa os principais elementos que

    caracterizam um passivo, entretanto, a mesma conduz idia de que os passivos

    esto relacionados apenas ocorrncia de transaes .

    Na realidade, podem ocorrer sem que a organizao tenha realizado

    qualquer transao6 com outras entidades. Ocorrem, por exemplo, de outros eventos,

    os quais podem ser exemplificados pelos danos causados ao meio ambiente, por

    autuaes decorrentes do no cumprimento de legislaes fiscais ou trabalhistas,

    entre outras.

    5 obligations to convey assets or perform services, obligations resulting from past or current transactions and requiring settlement in the future.

    6 Entendida como a troca de recursos entre entidades distintas.

  • 26

    Iudcibus (1987, p. 120-21) apresenta as definies do passivo

    relacionando-as com:

    1) a teoria da propriedade pela qual as exigibilidades representam

    subtraendos dos ativos, ou ativos negativos . Por essa teoria, seria apresentado o

    ativo subtrado dos passivos e no lado direito do Balano estariam contidas as contas

    representando a propriedade; tal abordagem surgiu quando predominavam as firmas

    individuais, nas quais o interesse do proprietrio era o fato preponderante;

    2) a teoria dos fundos que considera as obrigaes como reservas ou

    restries aos ativos, derivantes de consideraes legais, eqitativas, econmicas ou

    gerenciais , ou seja, os ativos e os passivos esto relacionados a fundos especficos

    como se cada fundo se constitusse em uma unidade operacional.

    Segundo Iudcibus (2000, p. 172-73), nos Estados Unidos se utiliza

    bastante esse enfoque na Contabilidade de entidades governamentais e no

    lucrativas, j no Brasil pode-se encontr-lo em Universidades, algumas entidades do

    3 setor, e outras semelhantes, nas quais os fundos so ligados a ativos especficos.

    Outro aspecto que o lucro no o ponto mais importante da

    Contabilidade; h uma descrio das operaes dos fundos com muito detalhe e

    clareza e, por isso, a elaborao da Demonstrao do Resultado ser um

    detalhamento da movimentao de fundos das operaes (IUDCIBUS, 2000, P.

    173).

    3) a teoria da entidade que considera as exigibilidades como reclamos

    contra a entidade ou mais especificamente, contra os ativos da entidade . De acordo

    com essa viso, o passivo considerado como gnero de recursos globais, e que, a

    entidade tem um funcionamento distinto dos interesses dos detentores de capital.

    Por isso, todas as fontes de recursos so consideradas como passivo,

    havendo apenas diferenas quanto ao momento e forma com que os reclamos

    contra os ativos se concretizaro. Por exemplo, o lucro auferido pela entidade,

    pertence a mesma, pois somente ser considerado um direito do acionista quando os

    dividendos forem declarados.

  • 27

    Para o Fasb, Sfac n 67 (1985), o passivo definido como:

    [...] provveis sacrifcios futuros de benefcios econmicos decorrentes de obrigaes presentes de uma dada entidade, quanto transferncia de ativos ou prestao de servios a outras entidades no futuro, em conseqncia de transaes ou eventos passados.8 (FASB, 1989/90, p. 170, traduo nossa)

    Essa uma definio adequada, porque, apesar de alguns passivos se

    configurarem como tal a partir de eventos presentes, ou dependerem de decises

    futuras, como o caso dos passivos contingentes, o fato gerador dos mesmos j

    ocorreu, as obrigaes contingentes esto relacionadas, de alguma maneira, pelo

    menos em parte, a alguma transao ou evento passado.

    Tambm, ressalta que um passivo pode ser liquidado pela transferncia

    de ativos ou pela prestao de servio, sendo, portanto, mais abrangente do que a

    definio [...] um servio com valor monetrio [...] .(CANNING 1929, p. 55-56)

    Alm disso, essa definio no limita a natureza do passivo apenas

    ocorrncia de transaes, como o fizeram Sprouse e Moonitz (1962), mas admite

    outros eventos como causadores de obrigaes.

    Segundo o Iasb/IAS n 37 Um passivo uma obrigao atual da

    entidade que se origina de eventos passados, cuja liquidao se espera resulte em

    uma sada de recursos da entidade contendo benefcios econmicos9.

    (traduo do

    IBRACON). Essencialmente, a definio do Iasb no difere tanto daquela

    apresentada pelo Fasb. Os pontos convergentes so que a obrigao deve existir no

    presente (obrigao atual), tendo se originado no passado.

    Dessa forma, o que o Fasb chama de transferncia de ativos ou prestao

    de servios, o Iasb chama de sada de recursos da entidade. Por outro lado, observa-

    7 Statement of Financial Accounting Concepts n 6

    Elements of Financial Statements. Issued: December 1985, IN: FASB

    Financial Accounting Statements Board. Accounting Standards

    Statements of Financial Accounting Concepts . Illinois: FASB edio 1989/90, p. 170.

    8 probable future sacrifices of economic benefits arising from present obligations of a particular entity to transfer assets or provide services o other entities in the future as a result of past transactions or events.

    9 A liability is a present obligation of the enterprise arising from past events, the settlement of which is expected to result in an outflow from the enterprise of resources embodying economic benefits.

  • 28

    se que a definio do Iasb exclui a palavra transao, considerando, portanto,

    suficiente apenas o termo evento, por incluir em si as transaes.

    Assim, considerando os mritos e as limitaes de cada uma das

    definies, conclui-se que o passivo uma obrigao atual da entidade decorrente de

    eventos passados que exigir provveis sacrifcios futuros por meio da entrega de

    ativos ou prestao de servios a uma ou mais entidades.

    2.2.2. Caractersticas

    A caracterizao dos passivos importante para que seja possvel

    identific-los adequadamente, quando da sua ocorrncia, como um evento econmico

    que afeta a estrutura patrimonial e, ento, obter atributos que possam ser medidos

    objetivamente.

    Assim, tendo em vista que no basta apenas ser definido um elemento,

    mas, tambm, identificar suas caractersticas, que ser realizada uma reviso das

    principais obras sobre o assunto, procurando ressaltar pontos convergentes e

    divergentes entre si, assim como tecer as crticas que se fizerem necessrias. Um

    passivo possui trs caractersticas, quais sejam10:

    a) contm uma obrigao presente com uma ou mais entidades, indicando liquidao pela transferncia ou utilizao provvel de ativos em uma data futura, por meio de um evento especfico, ou pela sua exigncia;

    b) a obrigao compromete a entidade, de tal forma que no haja liberdade para evitar o sacrifcio futuro; e,

    c) a transao ou evento que obriga a entidade j ocorreu. (SFAC n 6, 1989/90, traduo nossa)

    A primeira caracterstica significa que o passivo ser liquidado com os

    ativos da entidade, que sero utilizados ou transferidos no momento em que a

    exigibilidade for requerida e, ainda, que no devero ser consideradas como

    obrigaes as despesas ou as perdas no incorridas, mesmo que seja certo que

    10 (a) it embodies a present duty or responsibility to one or more other entities that entails settlement by probable future transfer or use o assets at a specified or determinable date, on occurrence of a specified event, or on demand; (b) the duty or responsibility obligates a particular entity, leaving it little or no discretion to avoid the future sacrifice, and; (c) the transacion or other event obligating the entity has already happened.

  • 29

    ocorrero. Como exemplo tm-se os direitos trabalhistas, os quais, apesar de certa

    sua ocorrncia futura, somente sero reconhecidos como uma obrigao, quando

    houver a efetiva prestao do servio pelo empregado.

    A segunda caracterstica indica que o passivo um compromisso da

    entidade, a qual no poder por sua prpria vontade deixar de liquid-lo, evitando o

    sacrifcio de ativos, porque envolve o interesse de outras entidades. A terceira

    caracterstica evidencia que uma obrigao se origina aps a ocorrncia de algum

    fato gerador, o que significa que, ao mesmo tempo que se reconhece a exigibilidade,

    deve-se, tambm, reconhecer o fato que a originou. Se o evento ainda no tiver

    ocorrido no h uma obrigao presente.

    Observando-se tais caractersticas, evita-se, por exemplo, as confuses

    feitas entre provises e reservas. As provises para contingncias esto relacionadas

    a perdas j ocorridas, cujo reconhecimento e registro afetam o resultado do perodo,

    enquanto as reservas para contingncias so constitudas para fazer frente s perdas

    que podero acontecer, mas que ainda no ocorreram e por isso no afetam o

    resultado da empresa. As principais diferenas entre elas esto na figura 2.

    Figura 2 - Principais diferenas entre proviso para contingncias passivas e reservas para contingncias

    PROVISO P/ CONTINGNCIA PASSIVA RESERVA PARA CONTINGNCIA O fato gerador11 contbil j ocorreu (a despesa

    ou a perda j aconteceu). O fato gerador contbil ainda no ocorreu (a despesa ou a perda ainda poder acontecer).

    Reduz o resultado atual da entidade. No reduz o resultado atual, representa uma

    destinao de parte dele para cobrir futuras perdas.

    Provoca uma reduo no patrimnio lquido. No diminui o patrimnio lquido, trata-se de uma permuta entre as contas lucro acumulado e reserva

    para contingncia. Por afetar o resultado, sua constituio no

    depende da existncia de lucro. Sua constituio depende da existncia de lucro.

    Sua constituio obrigatria, tecnicamente e tambm exigida por rgos normativos.

    Sua constituio opcional e ser feita para evitar distribuio de lucros sem considerar perdas

    futuras, julgadas provveis.

    Fonte: Baseado no boletim IOB n 24 de 2002.

    11 o fato que d origem s variaes patrimoniais no ativo, passivo, patrimnio lquido, receita, despesa, perda ou ganho.

  • 30

    2.2.3. Tipos

    A seguir, sero expostos os principais tipos de passivos encontrados na

    literatura pesquisada, visando ao aprofundamento do conhecimento, para que a

    Contabilidade proceda ao reconhecimento e mensurao dos mesmos.

    Hendriksen e Van Breda (1999, p. 286-89) tratam o passivo como normal

    ou contingente. Esse uma obrigao cuja liquidao depende de eventos futuros

    com alguma probabilidade de ocorrncia, aqueles so obrigaes cuja liquidao,

    ainda que ocorra no futuro, no depende de eventos futuros.

    Outros tipos que podem ser encontrados so: o passivo monetrio e o

    passivo no monetrio, apesar de o passivo ser normalmente monetrio, como se

    observa no texto a seguir:

    O passivo essencialmente formado por passivos monetrios que representam todas as exigibilidades da empresa para com terceiros, oriundos do fornecimento de bens, servios e de emprstimos e financiamentos. Tais passivos monetrios tambm tm seus valores ou bases de pagamentos j definidos, estando tambm integralmente expostos aos efeitos da inflao. (IUDCIBUS et all (1981, p. 245).

    Segundo Iudcibus (2000, p. 244), os passivos monetrios so definidos

    como [...] obrigaes de pagar montantes fixos de reais em alguma data futura, sem

    considerar as flutuaes do poder aquisitivo mdio da moeda [...] , enquanto que, os

    passivos no monetrios so obrigaes [...] de pagar [...] valores iguais a certa

    quantidade fixa de poder aquisitivo (e no de reais) .

    De acordo com Hendriksen e Van Breda (1999, p. 413 e 415), os

    Passivos Monetrios so obrigaes denominadas em termos nominais [...]

    tipicamente envolvem o pagamento de quantias predeterminadas.

    Os Passivos no

    monetrios so aquelas obrigaes de fornecimento de bens ou servios de

    quantidade e qualidade predeterminadas.

    Em sntese, o passivo monetrio uma obrigao cujo valor

    determinado em termos nominais e no acompanha o poder aquisitivo da moeda,

    causando uma perda monetria ao credor e um ganho monetrio para o devedor,

  • 31

    sempre que h inflao, enquanto o passivo no monetrio uma obrigao cujo

    valor determinado pela quantidade e qualidade de recursos a serem entregues.

    Outros tipos encontrados so os Passivos Onerosos que [...] so aqueles

    que esto custando empresa, mensalmente, juros e correes monetrias [...]

    e os

    Passivos No-onerosos que [...] so aqueles sobre os quais a empresa no paga

    encargos financeiros explicitamente [...] (IUDCIBUS et. all, 1981, p. 119).

    Segundo Braga (1995, p. 214), o custo do passivo oneroso corresponde

    taxa global de custo dos recursos obtidos por meio de emprstimos e

    financiamentos durante o perodo considerado. Ainda de acordo com o autor, para

    se obter o custo em termos percentuais utiliza-se a seguinte frmula:

    Custo do passivo oneroso =

    Despesa Financeira lquida do Imp de Renda

    Passivo Oneroso Ajustado

    Braga (1995, p. 82) diz que os passivos no onerosos em geral so fontes

    oriundas do funcionamento da empresa em que os recursos so gerados

    espontaneamente pelas atividades operacionais, enquanto os passivos onerosos so

    decorrentes de financiamentos envolvendo encargos financeiros. O autor apresenta o

    caso das duplicatas a pagar que embora sejam geralmente classificadas como

    passivos de funcionamento no oneroso [...] constituem um elemento hbrido, por

    apresentarem caractersticas de passivo de financiamento, isso porque, quando os

    fornecedores concedem prazo para pagamento das mercadorias costumam embutir

    encargos financeiros, por outro lado se o prazo de reposio dos estoques for inferior

    aos concedidos pelo fornecedor, ocorrer um financiamento parcial das duplicatas a

    receber emitidas pela empresa (BRAGA, 1995, p. 82). Ento, o tratamento adequado

    seria:

    [...] considerar como preo bsico aquele fixado para as transaes a prazo e como receitas financeiras os descontos obtidos nas compras a vista. Como os fornecedores computam nas suas tabelas de preos os juros e a inflao projetada para os prazos usuais de faturamento, a diferena entre os preos a prazo e os preos a vista constitui, na verdade, um encargo financeiro. (BRAGA, 1995, p. 82).

    Os vrios tipos de passivos encontrados refletem aspectos relacionados

    com a mensurao e com a amplitude de interesses, que as obrigaes representam

    enquanto grupo componente do Balano Patrimonial.

  • 32

    A Contabilidade, para cumprir com seu objetivo de fornecer, aos diversos

    grupos de usurios, informaes de natureza econmica, financeira, de produtividade

    e social, deve divulgar uma grande massa de dados classificados a partir de critrios

    lgicos, que mostrem no apenas a composio do passivo como tambm seu

    comportamento futuro.

    Em sntese, como demonstra a figura 3, foram apresentados os seguintes

    tipos de passivos:

    Figura 3 - Tipos de Passivos

    TIPOS DE PASSIVOS DEFINIO Quanto Ocorrncia Normais Obrigaes cujos aspectos de tempo e valor, no dependem de

    eventos futuros Contingentes Obrigaes cuja liquidao depende de eventos futuros com alguma

    probabilidade de ocorrncia Quanto Liquidao Monetrios uma obrigao cujo valor determinado em termos nominais e no

    acompanha o poder aquisitivo da moeda. No-monetrios uma obrigao cujo valor determinado pela quantidade e

    qualidade de produtos ou servios a serem entregues. Quanto Evoluo Onerosos Obrigaes cujos valores esto sendo acrescidos de juros e correes

    monetrias. No-onerosos Obrigaes nas quais a organizao no paga juros nem correes

    monetrias decorrentes do tempo.

    2.2.4. Obrigaes Legais, Justas e Construtivas

    A distino das obrigaes em legais e justas apareceu na literatura

    contbil internacional por meio da definio de passivo feita por Canning em 1929

    (obra j citada)12. Dcadas depois, em 1985, por meio do Sfac n 6, denominado

    Elements of Financial Statement

    (Elementos das Demonstraes Financeiras), o

    Fasb esclareceu em nota de rodap13 que obrigao presente constante na definio

    de passivo, vai alm de uma obrigao legal, podendo se referir, tambm, a uma

    12 De acordo com Hendriksen e Van Breda (1999, p. 283), o professor John Canning, de Stanford, foi um dos primeiros a tentar dar definies abrangentes dos elementos dos balanos.

    13 Obligations in the definition is broader than legal obligations. It is used with its usual general meaning to refer to duties imposed legally or socially; to that which one is bound to do by contact, promise, moral responsibility, and so forth (Webster`s New World Dictionary, p. 981). It includes equitable and constructive obligations as well as legal obligations (pars. 37-40).

  • 33

    obrigao social, o que inclui obrigaes justas, obrigaes construtivas, assim como

    as obrigaes legais.

    Hendriksen e Van Breda, em sua obra Teoria da Contabilidade, 5 edio,

    publicada nos Estados Unidos, no ano de 1992 e cuja traduo para o portugus foi

    editada no Brasil em 1999, ampliaram a discusso, fazendo uma interpretao das

    dificuldades que os Contadores teriam para caracterizar objetivamente as obrigaes

    justas e construtivas seguindo a orientao do Fasb.

    As obrigaes legais, justas e construtivas, tambm foram discutidas por

    um grupo de trabalho intergovernamental da Unctad - United Nations Conference on

    Trade and Development (Conferncia das Naes Unidas para o Desenvolvimento),

    sobre Normas Internacionais de Contabilidade intitulado Report of the

    Intergovernmental Working Group of Experts on Internacional Standards of

    Accounting and Reporting. no ano de 1998.

    O Iasb trata das obrigaes legais e construtivas por meio da Norma

    Internacional de Contabilidade IAS 37: Provisions, Contingent Liabilities and

    Contingent Assets

    (Proviso, Passivos Contingentes e Ativos Contingentes),

    aprovada em julho de 1998.

    A seguir, sero apresentadas as principais consideraes feitas pelos

    autores e rgos normativos, na seqncia retro descrita, com o objetivo de descobrir

    em qual estgio se encontram as discusses.

    Canning (1929, p. 55-6), ao definir o passivo, o fez usando os termos

    legalmente ou justamente , indicando a existncia de certas obrigaes que no

    surgem de instrumentos legais como legislaes, contratos ou estatutos das empresas,

    mas podem levar a sacrifcios futuros. Porm, o autor no especificou quais

    obrigaes seriam tratadas como justas (equitable), conforme se observa no texto

    seguinte:

    A definio de Canning, por outro lado, especificamente inclui as obrigaes justas. Entretanto, Canning no forneceu exemplos de dbitos justos que deveriam ser includos. Presume-se que ele incluiria montantes que se tenciona pagar por danos sofridos ou servios recebidos quando no h obrigao legal de efetuar tal pagamento. Provavelmente, tambm

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    incluiria valores a serem pagos para manter a confiana na empresa, tais como devolues por mercadorias danificadas ou rejeitadas, quando no h obrigao de carter legal de fazer tais devolues. (HENDRIKSEN e VAN BREDA, 1999, p. 287).

    De acordo com Hendriksen e Van Breda (1999, p. 287), apesar do fato de

    o passivo ter como uma das suas principais caractersticas a de que no haja

    nenhuma liberdade ao devedor a no ser liquid-lo, no significa que a empresa seja

    legalmente obrigada a pagar, ou seja, podem existir obrigaes cuja liquidao no

    esteja prevista em lei. Os autores alegam que [...] o Fasb especificamente incluiu

    obrigaes justas e obrigaes construtivas como passivos em potencial e as tratou

    com as seguintes conceituaes e exemplos:

    1) Obrigaes justas, [...] so s vezes chamadas de obrigaes morais.

    Resultam de limitaes ticas ou morais e no de restries legais , como por

    exemplo uma empresa poderia sentir-se eticamente obrigada a completar

    satisfatoriamente os reparos no automvel de um cliente, muito embora a obrigao

    legal restrinja-se somente devoluo de dinheiro ao cliente .

    2) Obrigaes construtivas, decorrem de costumes [...] se uma empresa

    tipicamente der frias remuneradas a seus empregados uma vez por ano, poderia ser

    inferido que esta prtica representa uma obrigao da empresa.

    Pode-se perceber que, diferente de Canning, o Fasb se preocupou em

    apresentar exemplos que caracterizassem melhor as obrigaes justas e construtivas,

    entretanto, sua determinao continua sendo um problema, pelo seguinte:

    As obrigaes justas e construtivas resultam de sanes sociais ou morais, ou do costume. Em geral apropriado e, freqentemente, mais conservador, seguir os costumes e as prticas negociais tradicionais; entretanto, difcil determinar a legalidade de tais obrigaes em muitos casos e isso pode at exigir uma deciso judicial. As obrigaes sociais e morais, particularmente quando as empresas operam em outros pases, tambm so de difcil determinao. Sua incluso pode deixar o Contador, portanto, na insustentvel posio de ser forado a fazer julgamentos morais. (HENDRIKSEN e VAN BREDA, 1999, p. 287)

    Tal alerta d a entender que as obrigaes construtivas teriam maior

    objetividade na sua caracterizao por decorrerem dos costumes e das prticas

    negociais tradicionais, enquanto as obrigaes justas por surgirem de questes ticas

  • 35

    e morais apresentam maior dificuldade porque dependero do julgamento de quem as

    determina.

    Ao tratar sobre os tipos de passivos, por meio de um grupo de trabalho

    intergovernamental, a ONU (apud Ribeiro, 1998:75), identificou os mesmos trs

    tipos de obrigaes, quais sejam:

    Obrigaes Legais: que decorrem de instrumentos legais, tais como:

    legislaes sociais, tributrias ou quaisquer outras penalidades impostas por lei;

    Obrigaes Construtivas: so aquelas a que a empresa se prope,

    espontaneamente, a cumprir e que no se restringem s exigncias legais, extrapolam

    estas. Ocorrem nos casos em que a empresa, consciente de sua responsabilidade

    social, esteja disposta a usar todos os meios necessrios e disponveis para

    proporcionar o bem-estar da comunidade em que a mesma atua. Ou, ento, para

    manter sua reputao perante a comunidade externa em geral.

    Obrigaes Justas: estas as que a empresa se acha na obrigao de

    cumpri-las por fatores ticos e morais, independentemente de lei. Nesse caso, tem-se

    claramente definida a questo da conscincia de responsabilidade social, ou

    preocupao com a reputao da empresa.

    Por exemplo, se no houver instrumento legal que obrigue uma determinada empresa a restaurar uma rea contaminada por suas atividades, mas se tratando de fato relevante e se for do conhecimento pblico ou afetar interesses e direitos de terceiros, a empresa ser compelida a reparar o erro cometido. (RIBEIRO e LISBOA, 2000).

    Percebe-se uma visvel semelhana nos conceitos de obrigaes

    construtivas e obrigaes justas, principalmente no que se refere questo da

    responsabilidade social da empresa. Inclusive, no grupo de trabalho da ONU, houve

    um debate sobre a distino entre os vrios tipos de obrigaes, tendo havido um

    claro entendimento sobre a obrigao legal, mas a polmica se situou nas obrigaes

    justas e construtivas, como se observa a seguir:

    Houve um considervel debate sobre a diferena entre os vrios tipos de obrigaes. Entendeu-se claramente o que seria uma obrigao legal mas, na opinio de muitos oradores era necessrio ir alm desse tipo de obrigao particularmente se fosse considerada a essncia sobre a forma. O debate teve

  • 36

    como foco os termos obrigaes construtivas` e obrigaes justas` se seriam diferentes ou semelhantes. As obrigaes construtivas surgem do tipo de negcio ou de uma poltica comercial. Alguns especialistas sentiram que as obrigaes justas poderiam ser omitidas porque seriam difceis de serem determinadas e poderiam ser consideradas como uma subdiviso das obrigaes construtivas baseadas em consideraes ticas ou morais. Outros especialistas insistiram que nem todas as obrigaes justas so construtivas. Citou-se como exemplo o caso das empresas multinacionais que muitas vezes contabilizam seus passivos ambientais decorrentes de obrigaes legais nos pases desenvolvidos e omitem seus passivos oriundos dos pases em desenvolvimento onde no existe legislao a respeito. Do ponto de vista de alguns especialistas as obrigaes justas fecharia a sada no sentido de que atualmente muitas companhias s informam seus passivos quando no tem possibilidade de no report-los. O conceito de obrigaes precisava se expandir alm das obrigaes legais, particularmente quando observado em um contexto ambiental. Foi apontado que a estrutura conceitual corrente da Contabilidade menciona as obrigaes justas. O grupo concordou que o termo obrigaes justas deveria continuar no documento como uma nota de rodap do termo obrigaes construtivas14. (UNCTAD, 1998, p. 17 - traduo nossa)

    O debate demonstra a inquietao dos especialistas com as obrigaes

    no previstas em legislaes ou outros instrumentos que a caracterizem como

    obrigao legal. Evidencia, tambm, uma preocupao em considerar a literatura

    contbil existente sobre o assunto. Vale ressaltar, que o contexto da discusso a

    Contabilidade Ambiental, sendo que a questo ambiental tem levado a sociedade a

    exigir uma postura mais responsvel, o que significa que as obrigaes das empresas

    vo alm do previsto em lei, atingindo questes ticas e morais.

    A opinio prevalecente foi de tratar as obrigaes justas como parte das

    obrigaes construtivas, o que significa que o grupo entendeu que existem dois tipos

    de obrigaes, as legais e as construtivas, isto , ao serem tratadas, as obrigaes

    14 There was considerable debate on the description of and distinctions between various types of obligations. There was a clear understanding of a legal obligation, but in the opinion of many speakers it was necessary to go beyond them, particularly if one considered substance over form. The debate focused on the terms constructive obligations and equitable obligations, whether they were distinct or overlapped. Constructive obligations arose out a business-type obligation or a business policy. Some experts felt that equitable obligations could be omitted because they were difficult to determine and could constitute a subset of constructive obligations based on ethical or moral considerations. However, other experts insisted that not all equitable obligations were constructive. An example was given of TNCs which often accounted for and reported on their environmental liabilities arising from legal obligations in developing countries where there was no legislation. In the view of some experts the term equitable obligation would close a loophole in that most companies now reported liabilities only when they had no discretion not to report them. The concept of obligations needed to be expanded beyond legal obligations, which were too narrow, particularly when viewed in an environmental context. It was pointed out that the current conceptual accounting frameworks mentioned equitable obligations. The group agreed that the term equitable obligation should remain in the document as a footnote to the term constructive obligation . (destaque nosso)

  • 37

    justas, em nota de rodap das obrigaes construtivas leva ao entendimento de que as

    obrigaes justas esto contidas nas obrigaes construtivas.

    No mesmo ano do trabalho da Unctad, o Iasb aprovou a Norma

    Internacional de Contabilidade, IAS 37, sobre ativos e passivos contingentes,

    segundo a qual existem dois tipos de obrigaes: a obrigao legal (legal obligation)

    e a obrigao construtiva (constructive obligation), as quais so definidas da seguinte

    forma:

    Uma obrigao legal

    uma obrigao que deriva de: a) Um contrato (por meio de termos explcitos ou implcitos); b) Legislao; ou c) Outro instrumento legal.

    Uma obrigao construtiva

    uma obrigao que deriva de condutas de uma entidade onde: a) Por uma prtica padronizada estabelecida no passado, polticas

    divulgadas, uma declarao atual suficientemente especfica, a entidade indicou s outras partes que aceitar determinadas responsabilidades; e

    b) Como conseqncia, a entidade criou uma expectativa vlida nestas outras partes de que cumprir com tais responsabilidades15. (IAS 37, 1998, Par. 10 traduo e grifo nossos)

    Uma primeira observao a ser feita que o Iasb no menciona as

    obrigaes justas, indicando, talvez, que as obrigaes construtivas incluem todas as

    obrigaes que no estejam enquadradas como obrigaes legais, sejam elas

    decorrentes de restries morais, ticas ou dos costumes, o que importa identificar

    se a obrigao existe ou no existe.

    Outra questo que o ponto central da definio da obrigao construtiva

    a postura da empresa, ou seja, cabe prpria entidade a determinao da existncia

    ou no de tal obrigao, por meio de prticas passadas ou por uma poltica atual em

    que se assume o compromisso com terceiros, criando assim, uma expectativa vlida

    de que a obrigao ser liquidada.

    15 A legal obligation is an obligation that derives from: a) A contract (through its explicit or implicit terms); b) Legislation; or c) Other operation of law. A constructive obligation is an obligation that derives from an enterprise`s actions where: a) By and established pattern of past practice, published policies or a sufficiently specific current statement, the enterprise has indicated to other parties that it will accept certain responsibilities; and b) As a result, the enterprise has created a valid expectation on the part of those other parties that it will discharge those responsibilities. (IAS 37, 1998, PAR. 10)

  • 38

    Nesse aspecto, o Iasb parece ter solucionado o problema, anteriormente

    alertado por Hendriksen e Van Breda de que o Contador poderia ficar na

    insustentvel posio de fazer julgamentos morais para decidir pela incluso ou no

    de uma obrigao nas demonstraes contbeis. Essa parece ser uma soluo

    coerente com a natureza das obrigaes construtivas, ou seja, pelo fato de no serem

    exigidas por instrumentos legais, pelo menos antes que a empresa declare seu

    compromisso.

    Talvez seja oportuna a indagao: existe alguma empresa que consciente

    de sua responsabilidade social e que queira manter uma boa imagem perante seus

    clientes e a sociedade em geral no cumpra com uma poltica padronizada de atuao

    ou publicamente assumida, caso em que a obrigao deixaria de existir?

    Provavelmente, uma atitude dessas, dependendo das razes que a motivaram, no

    contribuiria com a boa reputao que a entidade deseja.

    Por outro lado, a legislao no consegue prever todas as situaes nas

    quais uma entidade estaria obrigada a reparar um dano causado a terceiros, porm

    uma pessoa fsica ou jurdica, ao se sentir prejudicada, poder requerer,

    judicialmente, seus direitos. Por exemplo, as leis ambientais brasileiras no prevem

    que certas empresas destinem parte de seus recursos para recuperar o ar poludo pela

    emisso de gases txicos na atmosfera, entretanto, se algum conseguir provar que

    contraiu uma doena respiratria causada por substancia emitida pela nica indstria

    existente no municpio, provavelmente ter direito pelo menos ao tratamento.

    Nesse caso, para evitar aes judiciais que desgastem a sua imagem

    perante a comunidade, a empresa poder ter uma postura proativa, investindo

    recursos no controle da emisso de substncias poluidoras e na avaliao dos riscos

    de contaminao dos moradores do local e implementao de medidas preventivas

    (algumas medidas semelhantes j so previstas em lei). Se a empresa declarar que

    assumir determinadas situaes, motivada por sua responsabilidade social, que

    extrapolem as exigncias legais, ento ocorrer uma obrigao construtiva.

    O cenrio atual bastante propcio ao surgimento de obrigaes

    construtivas, ou seja, provavelmente muitas companhias estaro dispostas a ir alm

  • 39

    do que exige a legislao para conquistar a confiana dos seus clientes,

    principalmente os que despertam para uma conscincia de preservao ambiental,

    visando a um diferencial competitivo para se manter no mercado.

    O acirramento da concorrncia torna as regras que regem o mercado mais severas e restritivas. Atualmente, algumas das exportaes realizadas pelos segmentos considerados potencialmente poluidores, para os pases onde h uma maior preocupao ecolgica, esto condicionadas ao certificado de qualidade ambiental. Obter tal certificado exige investimentos em equipamentos e tecnologias antipoluentes, assim como a utilizao de matrias-primas e insumos em geral com padres de qualidade ambiental satisfatrios. Isto exige o envolvimento do fornecedor, criando-se assim, a proteo ao meio ambiente em cadeia. (MARTINS e RIBEIRO (1998, p. 3)

    Uma empresa para garantir sua continuidade precisa ser aceita pela

    sociedade como um todo. Segundo Martins e Ribeiro (1995, p. 31), a partir da

    constatao dos crescentes danos causados ao meio ambiente, as empresas,

    espontaneamente ou pressionadas pela sociedade civil, autoridades governamentais,

    clientes e fornecedores, passaram a incorporar aos seus objetivos de lucro a

    responsabilidade social que abrange o bem-estar integral da populao.

    Ainda de acordo com Martins e Ribeiro (1995, p. 31), para garantir o

    bem-estar da populao, as empresas devem empenhar-se principalmente na:

    - Manuteno de condies saudveis de trabalho, segurana, treinamento e lazer para seus funcionrios e familiares;

    - Conteno e/ou eliminao dos nveis de resduos txicos decorrentes de seu processo produtivo e do uso ou consumo de seus produtos de forma a no agredir o meio ambiente de forma geral;

    - Elaborao e entrega de produtos ou servios de acordo com as condies de qualidade e segurana desejadas pelos consumidores.

    Assim, se a responsabilidade social passou a ser um objetivo de muitas

    empresas, pode-se esperar que essas entidades mudem suas polticas, o que

    repercutir no seu planejamento estratgico e na distribuio dos resultados obtidos,

    uma vez que o lucro do exerccio estar sendo afetado pela constituio de proviso

    para obrigaes que a empresa assume motivada por um tipo de exigncia que no

    proveniente de um instrumento legal e sim dos entes que compem o ambiente social

    de sua atuao.

    Evidentemente, para existir uma obrigao necessrio que exista um

    beneficirio e que no haja liberdade para o devedor deixar de liquid-la. O que se

    discute, porm, que tal obrigatoriedade pode ser imposta legalmente (obrigao

  • 40

    legal) ou imposta socialmente (obrigao construtiva). Significa que se uma entidade

    no assumir as obrigaes que a sociedade entende como sua, pode no haver uma

    multa (como ocorre com as obrigaes legais), mas haver outro tipo de punio,

    como, por exemplo, restrio de acesso a financiamentos.

    Um caso que reflete tais restries um acordo entre instituies

    financeiras e governamentais, chamado de protocolo verde assinado pelo Instituto

    Brasileiro do Meio Ambiente e de Recursos Naturais Renovveis - Ibama, o Banco

    Nacional de Desenvolvimento Econmico e Social - Bndes, o Banco Central do

    Brasil, o Banco do Brasil, a Caixa Econmica Federal, o Banco do Nordeste do

    Brasil e o Banco da Amaznia.

    Segundo tal acordo, as empresas que desejarem obter financiamento nas referidas instituies devem apresentar o EIA e o Rima, que devem estar em consonncia com o desenvolvimento sustentvel, ou seja, produzir e contribuir para o desenvolvimento econmico, sem prejuzo dos direitos e oportunidades das geraes futuras.. (CARVALHO e RIBEIRO, 2000)

    Os financiamentos de que trata o acordo esto relacionados com crditos

    para aquisio de tecnologias antipoluentes. O EIA o Estudo de Impacto Ambiental

    e o Rima o Relatrio de Impacto ao Meio Ambiente.

    Isso posto, uma Obrigao Construtiva aquela que a empresa se prope

    a cumprir para demonstrar sua responsabilidade social com o bem-estar da

    sociedade, tendo em vista a aceitao de seus produtos e servios e a manuteno de

    uma boa imagem perante a sociedade. importante ressaltar que, apesar da atitude

    em assumir a obrigao partir da entidade, a mesma o faz motivada por uma

    presso social que tem ocorrido em funo de uma crescente mudana cultural das

    pessoas que provocou entre outras coisas o surgimento de Organizaes No

    Governamentais (Ong`s) com influncia mundial, como, por exemplo, o Greenpeace

    que milita na defesa do meio ambiente.

    Esse novo cenrio mundial levou a ONU-Unctad (1998), a reconhecer

    que:

    Para se reconhecer a existncia de um passivo ambiental no necessrio que exista uma obrigao legal. Pode haver casos em que uma empresa tenha uma obrigao construtiva, no exista uma obrigao legal ou se amplie a obrigao legal vigente. Por exemplo, pode ser que a empresa aplique uma poltica de eliminar a contaminao reduzindo-a para nveis

  • 41

    inferiores aos exigidos pela legislao, porque sua reputao seria afetada em caso de no cumprimento do compromisso ou porque a empresa tenha o propsito de cobrir o custo ambiental por consider-lo correto e adequado16.. (ONU-Unctad, 1998, traduo nossa)

    Foi um exemplo surgido da questo ambiental, entretanto, h outro caso,

    apresentado pelo Iasb, em que podem surgir obrigaes construtivas. Trata-se da

    reestruturao de empresas, que normalmente ocorre a partir de um plano de

    reestruturao, envolvendo a desmontagem de uma fbrica, a venda dos ativos ou

    pelo anncio pblico das principais caractersticas do plano, o qual se constituir em

    uma obrigao construtiva, desde que haja detalhes suficientes que originem

    expectativas vlidas de outras partes interessadas, tais como: clientes, fornecedores e

    funcionrios (ou seus representantes), de que a entidade realizar a reestruturao.

    (IAS 37, par. 73)17

    De acordo com a IAS 37 (1998, par. 70), os exemplos de eventos que se

    enquadram na definio de reestruturao so:

    a) venda ou extino de uma linha de negcios; b) o fechamento de entidades em um pas ou regio ou a alocao das

    atividades de negcios de um pas ou regio para outro; c) mudanas na estrutura da administrao por exemplo, eliminao de um

    nvel de gerncia; e d) reorganizaes fundamentais que tm um efeito relevante na natureza e

    foco das operaes da entidade.

    A Norma Internacional (IAS 37) estabelece no pargrafo 72 os pr-

    requisitos para que considere o surgimento de uma obrigao construtiva decorrente

    da reestruturao, so eles:

    Uma obrigao construtiva para reestruturao surge somente quando uma entidade:

    16 An obligation does not have to be legally enforceable for an environmental liability to be recognized. There may be cases where an enterprise has a constructive obligation, where there is no legal obligation or where there is an expansion on the legal obligation. For example, it may be the enterprise`s established policy to clean up contamination to a higher standard than that required by law, because its business reputation would be affected if it did not live up to this commitment, or because it is the right and proper thing to do.

    17 Evidence that an enterprise has started to implement a restructuring plan woul be provided, for example, by dismantling plant or selling assets or by the public announcement of the plan. A public announcement of a detailed plan to restructure constitutes a constructive obligation to restructure only if it is made in such a way and in sufficient detail (i. e. setting out the main features of the plan) that it gives rise to valid expectations in other parties such as customers, suppliers and employees (or their representatives) that the enterprise will carry out the restructuring.

  • 42

    a) Tiver um plano formal detalhado para a reestruturao, identificando pelo menos: I) o negcio ou parte do negcio em questo; II) os principais locais afetados; III) o local, funes e nmero aproximado de funcionrios que sero incentivados financeiramente ao se demitirem; IV) os desembolsos que sero efetuados; e V) quando o plano ser implantado; e

    b) Tiver criado uma expectativa vlida naqueles que sero afetados de que ela realizar a reestruturao comeando pela implantao daquele plano ou pelo anncio de suas principais caractersticas para aqueles por ela afetados. (IAS 37, PAR. 72, traduo nossa)18

    Um aspecto ressaltado o prazo de realizao da reestruturao, que

    dever ser curto e o processo dever ser iniciado o mais rpido possvel, para

    diminuir a possibilidade de ocorrerem mudanas significativas. Inclusive, se houver

    a expectativa de um grande atraso para o incio de sua implementao, improvvel

    que o plano crie uma expectativa vlida da parte de outros de que a empresa est

    comprometida com a reestruturao, porque o perodo de execuo d oportunidade

    para a entidade mudar seus planos. (IAS 37, par. 74)

    Segundo a IAS 37 (1998, par. 75), a deciso sobre uma reestruturao

    pode ser tomada antes da data do Balano ou depois do seu encerramento. No

    primeiro caso, somente surgir uma obrigao construtiva se a entidade tiver, antes

    disso:

    a) comeado a implantar o plano de reestruturao; ou b) anunciado as principais caractersticas do plano de reestruturao para

    aqueles afetados por ele, de uma maneira suficientemente especfica, criando neles uma expectativa vlida de que a entidade far a reestruturao 19. (IAS 37, par. 75, itens A e B, traduo nossa)

    18 A constructive obligation to restructure arises only when an enterprise: a) has a detailed formal plan for the restructuring identifying at least: i) the business or part of a business concerned; ii) the principal locations affected;

    iii) the location, function, and approximate number of employees who will be compensated for terminating their services;

    iv) the expenditures that will be undertaken; and v) when the plan will be implemented; and

    b) has raised a valid expectation in those affected that it will carry out the restructuring by starting to implement that plan or announcing its main features to those affected by it.

    19 A management or boar decision to restructure taken before the balance sheet date does not give rise to a constructive obligation at the balance sheet date unless the enterprise has, before the balance sheet date: a) started to implement the restructuring plan; or b) announced the main features of the restructuring plan to those affected by it in a sufficiently specific manner to raise a valid expectation in them that the enterprise will carry out the restructuring.

  • 43

    No segundo caso, no qual a entidade comea a implantar um plano de

    reestruturao, ou anuncia suas principais caractersticas somente depois da data do

    Balano, a divulgao pode ser exigida se a reestruturao for de tal importncia que

    sua no divulgao afetaria a possibilidade de os usurios das demonstraes

    contbeis fazerem avaliaes e tomarem decises adequadas (IAS 37, 1998, par. 75).

    H casos, ainda, segundo a Norma, em que a obrigao pode resultar de

    outros eventos anteriores juntamente com a deciso da diretoria.

    Por exemplo, negociaes com representantes de empregados para pagamentos de demisses ou com compradores para a venda de uma operao, podem ter sido concludas, sujeitas apenas aprovao da diretoria. Uma vez obtida a aprovao e comunicada s outras partes interessadas, a entidade tem uma obrigao implcita de reestruturar, se as condies do pargrafo 72 forem cumpridas.20 (IAS 37, 1998, par. 76, traduo nossa)

    Uma vez caracterizada a obrigao construtiva, dever ser constituda

    uma proviso para reestruturao, cujas regras constam no pargrafo 80 da IAS 37, o

    qual determina que sejam includas somente as despesas diretas provenientes da

    reestruturao, desde que: a) tenham sido ocasionadas pela reestruturao, b) no

    sejam associadas s atividades em andamento da entidade.

    De acordo com o IAS 37 (1998, par. 81)21, uma proviso para

    reestruturao no inclui custos decorrentes de:

    a) novo treinamento ou remanejamento da equipe permanente;

    b) marketing; ou

    c) investimento em novos sistemas e redes de distribuio.

    20 For example, negotiations with employee representatives for termination payments, or with purchasers for the sale of an operation, may have been concluded subject only to board approval. Once that approval has been obtained and communicated to the other parties, the enterprise has a constructive obligation to restructure, if the conditions of paragraph 72 are met.

    21 A restructuring provision does not include such costs as: a) Retraining or relocating continuing staff; b) Marketing; or c) Investment in new systems and distribution networks.

    These expenditures relate to the future conduct of the business and