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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS INSTITUTO “A VEZ DO MESTRE” A (IN) DISCIPLINA ESCOLAR: UMA REALIDADE QUE INCOMODA MARIA DOS ANJOS FERREIRA DE SOUZA ORIENTADOR: PROFª. MARIA DA CONCEIÇÃO MAGGIONI POPPE SALVADOR 2008 DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO

DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS

INSTITUTO “A VEZ DO MESTRE”

A (IN) DISCIPLINA ESCOLAR: UMA REALIDADE QUE INCOMODA

MARIA DOS ANJOS FERREIRA DE SOUZA

ORIENTADOR:

PROFª. MARIA DA CONCEIÇÃO MAGGIONI POPPE

SALVADOR

2008

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO

DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS

INSTITUTO “A VEZ DO MESTRE”

A (IN) DISCIPLINA ESCOLAR: UMA REALIDADE QUE INCOMODA

Trabalho monográfico apresentado como

requisito parcial para a obtenção do Grau de

Especialista em Psicopedagogia Institucional,

sob a orientação da profª. Maria da Conceição

Maggioni Poppe.

SALVADOR

2008

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Agradeço a Deus, pelo dom da vida e do saber.

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Dedico este trabalho monográfico a todos que

contribuíram, direta e indiretamente, para

concretização deste estudo.

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“(...) Hoje eu vou mudar. Por na balança a

coragem, me entregar no que acredito pra

ser o que sou sem medo (...)”.

Vanusa Nadolny

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 08

CAPÍTULO I – O SENTIDO DA DISCIPLINA / (IN) DISCIPLINA ........................... 10

1.1 O QUE SE ENTENDE POR DISCIPLINA ............................................... 10

1.2 POSSÍVEIS CAUSAS DA (IN) DISCIPLINA NA SALA DE AULA E NA

ESCOLA ................................................................................................................... 14

CAPÍTULO II – INDISCIPLINA NA ESCOLA .......................................................... 21

CAPÍTULO III – RELAÇÃO ESCOLA–INDISCIPLINA ........................................... 35

3.1 INDISCIPLINA NA SALA DE AULA ........................................................ 37

3.2 COMO CONSTRUIR A AUTORIDADE ................................................... 39

3.3 ESCOLA E FAMÍLA: UMA GRANDE PARCERIA ................................... 40

3.4 BUSCANDO-SE FORMAS DE ENFRENTAR A INDISCIPLINA NA SALA

DE AULA .................................................................................................................. 41

CAPÍTULO IV – INDISCIPLINA ESCOLAR E O PAPEL DO PSICOPEDAGOGO

................................................................................................................................... 50

CONCLUSÃO .......................................................................................................... 53

BIBLIOGRAFIA ....................................................................................................... 57

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RESUMO

Este trabalho busca apresentar algumas reflexões em relação a questão da indisciplina em sala de aula, a influência de aspectos como conteúdo das aulas, metodologia empregada para trabalhar tais conteúdos e tipo de relações interpessoais presentes em uma sala de aula, no comportamento julgado indisciplinado. A pesquisa apoia-se em um quadro teórico composto por estudos de diversos autores que discutem a questão da indisciplina na escola, nas mais diversas concepções e teorias, buscando apresentar alguns caminhos para se refletir sobre o tema abordado. Palavras-chave: Disciplina/Indisciplina; Psicopedagogia; Prática Educativa; Aprendizagem.

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METODOLOGIA

A metodologia utilizada foi baseada em vários pensadores da área de

educação que refletem sobre os aspectos psicopedagógicos no contexto da

indisciplina escolar. Entre eles estão: Içami Tiba, Nádia Bossa, Júlio Groppa Aquino,

Yves De La Taille, dentre outros, que embasaram teoricamente o desenvolvimento

da pesquisa.

Procuramos desenvolver a pesquisa através de uma abordagem qualitativa,

através da pesquisa bibliográfica e documental, constituída de livros, artigos

científicos e matérias veiculadas em publicações, cujo objetivo será subsidiar as

análises e reflexões, compreendendo as construções teóricas sobre o assunto.

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INTRODUÇÃO

Esta pesquisa tem como objetivo refletir e contribuir sobre o que se acredita ser

um grande problema nas escolas: a (in)disciplina. Para um melhor entendimento da

questão, serão abordados neste estudo temas como: o sentido da disciplina/(in)

disciplina, indisciplina na escola, o pensamento de alguns pesquisadores, a relação

escola-indisciplina e a atuação do psicopedagogo na instituição escolar.

Acredita-se que é fundamental que a escola estabeleça regras e

regulamentos para que o trabalho educativo seja realizado de forma organizada e

coerente. Entretanto, o que preocupa é como regras são elaboradas e aplicadas,

pois observa-se que as regras quase sempre partem da instituição escolar, sem a

participação dos alunos e muito menos, sem levar em conta a realidade sóciocultural

que está inserida. Propõe-se que a escola promova discussões, deixando que os

alunos expressem-se com liberdade, discordando, avaliando, criticando e criando

suas próprias regras, assim, estará contribuindo para que estes cidadãos em

formação construam uma sociedade baseada na autonomia.

Há muito tempo, os distúrbios disciplinares deixaram de ser um evento

exporádico e particular no cotidiano das escolas brasilerias para se tornarem, talvez,

um dos maiores obstáculos pedagógicos dos dias atuais.

Diante das encruzilhadas do trabalho diário, todos parecem, em alguma

medida, marcados por uma cisão fundamental: de um lado, a autoridade e o controle

absoluto de outrora foram substituídos por uma crescente perplexidade e,

conseqüentemente, um certo desconforto pedagógico; mas, de outro lado, a linha

divisória entre a indisciplina e a violência pode se tornar muito tênue. É possível

constatar, que a indisciplina em geral é tratada de maneira imediatista, sem o

circunstanciamento conceitual necessário.

Com isso, surgem muitas discussões nas famílias, por causa da indisciplina,

dificultanto bastante a convivência. Muitos alunos não respeitam seus professores, e

essa indisciplina prejudica o ensino e a aprendizagem. Professores e orientadores

têm dificuldades em estabelecer limites na sala de aula e não sabem até que ponto

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intervir nos comportamentos dotados nos pátios escolares sendo necessária a

intervenção do psicopedagogo como mediador dessa relação.

Portanto, as intensas mudanças vividas, de maneira muito rápida, pela

segunda geração tiveram um custo na educação alto, ainda não se pode estimar.

Acredita-se que os jovens ficaram sem nocão de padrões de comportamentos e

limites. O professor também perdeu a autoridade inerente à sua função.

Diante do desse contexto o trabalho foi estruturado em quatro capítulos. O

primeiro capítulo reflete sobre o significado da disciplina e as possíveis causas da

indisciplina em sala de aula. O segundo capítulo apresenta reflexões de pensadores

na área de educação que discutem sobre a questão da indisciplina na escola. Já o

terceiro capítulo aborda sobre a relação escola e indisciplina além da importância da

parceria junto a família no enfrentamento dessa problemática. E o quarto capítulo

reflete sobre o papel do psicopedagogo diante do contexto da indisciplina escolar.

Por fim, apresentam-se algumas considerações finais sobre as questões abordadas inicialmente. Ressalta-se que não é pretensão nem seria possível esgotar o estudo, constituindo-se apenas numa tentativa de sistematizar algumas reflexões, acerca de tão relevante assunto. CAPÍTULO I – O SENTIDO DA DISCIPLINA / (IN) DISCIPLINA

A forma tradicional de perceber a disciplina é vê-la como forma de manter a

ordem, não há permissão para conflitos e questionamento. Em contra partida, a

disciplina é percebida como caos e desordem.

Uma segunda concepção mais profunda é aquela que tenta ampliar os

conceitos disciplina/indisciplina, onde o aluno seja aquele que se organiza a partir de

sua realidade, buscando atender suas necessidades. É preciso mostrar ao aluno

que ele deve resolver os problemas.

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O conflito não é indisciplina, mas faz parte da realidade, do dia-a-dia.

Segundo Guimarães (1988, p.28), as disciplinas são métodos que permitem o

controle das operações do corpo, que realizam a sujeição constante de suas forças

e lhes impõe uma reação de docilidade.

O aluno é um ser em pleno período evolutivo e as normas de conduta têm

importância fundamental nesse processo de transformação gradual e “progressiva”

para a conduta desejável. Portanto, o conjunto dessas normas de comportamento,

estímulos e recursos que se põe em jogo, para contribuir na evolução do aluno e do

seu justamente social.

A disciplina pode ser entendida diferentemente segundo a tarefa do mestre. É

considerada de puro ensino ou educação.

Para a maioria dos educadores a disciplina é entendida como a adequação do

comportamento do aluno da forma que o professor deseja, ou uma submissão do

aluno ao registro da escola.

1.1 O QUE SE ENTENDE POR DISCIPLINA

Para a maioria dos educadores, disciplina é entendida como a descrita acima,

ou seja, é entendida como adequação do comportamento do aluno àquilo que o

professor deseja. Considera-se ainda que, disciplina é o comportamento do aluno

previamente esperado pelo professor.

“Disciplina remete a regras. Com efeito, a pessoa disciplinada segue

determinadas regras de conduta. Logo, disciplina corresponde ao

que chamamos de moral: o respeito por certas leis consideradas

obrigatórias. Portanto, a pessoa indisciplinada transgride as leis que

deveria seguir. [...] a indisciploina pode, às vezes, vir em decorrência

de bons motivos éticos. Se as regras não fazem sentido (e há muitas

na escola) e se derivam de valores suspeitos (como a subserviência

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cega à autoridade), a indisciplina pode se justificar eticamente. [...] há

indisciplinas eticamente válidas, desobediências legítmas, graças às

quais, aliás, a sociedade acaba por evoluir. Mas pensemos agora

nas formas de indisciplina que ferem as leis morais, estas definidas

como garatias de respeito a direitos legítimos. Transgressões desse

tipo também podem acontecer nas salas de aula. Por exemplo, o

insulto, a agressão física, o tratar o professor como se fosse um

objeto, não ouvi-lo, fingindo que não está presente, que não existe”

(AQUINO apud LA TAILLE, 2001, p. 90-91).

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Freqüentemente o desejo do professor é que o aluno fique quieto, ouça as

explicações que tem para dar, faça corretamente os exercícios e pronto. Se as

atividades acontecerem, o professor vai sentir-se realizado. Porém, entende-se que

o caminho não é este, uma vez que desta forma, se estará definindo uma disciplina

centrada fora do sujeito e não a partir do sujeito.

“Está muito difícil conseguir a disciplina na escola. Vemos muito

professores perplexos, angustiados e pensando até mesmo em

desistir da profissão, pois além dos baixos salários, do desprestígio

social, ainda tem que agüentar desaforos e desrespeitos dos alunos

em sala de aula, “que não querem nada com nada”. Nas séries

iniciais o problema parece menor, mas isto pode ser, de fato, só

aparência, pois, por um lado, aí justamente por estar gestado, só não

tendo manifestado ainda em função da pouca idade; por outro lado,

paulatinamente, temos ouvido cada vez mais queixas também destes

professores. Se há alguns anos o grande problema de disciplina era,

por exemplo, da 5ª série em diante, atualmente já existe reclamação

de professores de 1ª ou 2ª série, sem contar alguns casos

alarmantes de reclamação de professores de pré-escolar [...]”

(VASCONCELOS, 1995, p. 21).

Refletindo sobre a temática no contexto escolar, pensa-se que o trabalho na

escola não pode ser efetivado sem esforço, dedicação e principalmente disciplina.

Considera-se que a disciplina na escola, não poderia ser entendida como se

tivesse uma finalidade educativa em si mesma, não pode ser puramente exterior,

baseado num conjunto de regras e condutas, normas hierárquicas e rígidas.

“A disciplina escolar não é obtida por meio de regulamento e muito

menos a partir de ameaças de punições, retaliações, banimento. Ao

contrário, ela é resultado tão somente de acordo entre partes-

acordos pautados numa espécie de compromisso tácito entre elas.

“Um acordo de cavalheiros”, costuma-se dizer” (AQUINO, 2003, p.

66).

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O professor possui autoridade, e não deve usá-la de forma abusiva, mas por

ela, apresentar suas idéias, conhecimentos e experiências, sem desrespeitar o

conhecimento do grupo, sempre encorajando-os à participação, encarando-os como

sujeitos conscientes e responsáveis pelo seu próprio processo de aprendizagem.

O educador deve procurar organizar o ensino a partir de desafios que

solicitam a ação dos alunos e as trocas interindividuais com vista à reflexão, à

discussão e à busca das soluções conjuntas. O professor favorece o

desenvolvimento da iniciativa e da autonomia do educando na medida em que

problematiza, orienta e questiona as situações-problemas, estimulando-o para a

participação do processo de decisão. Ao mesmo tempo, ele favorece as vivências de

atitudes de cooperação entre alunos promovendo o desenvolvimento do senso de

justiça em substituição à norma de obediência. Promove, portanto, o fortalecimento

da vivência de relações democráticas asseguradas pela participação responsável e

comprometidas do grupo e pelo desenvolvimento do respeito mútuo entre alunos,

educador e o grupo que coordena.

“A disciplina é um fenômeno essencialmente escolar, tão antigo

como a própria escola. A manutenção da disciplina constitui com

afeto uma preocupação de todas as épocas como já foi

testemunhado em vários textos de Platão com o Protágoras ou as

Leis. E se lemos as confissões de Santo Agostinho, constatamos

como sua vida de professor era amargurada pela indisciplina dos

jovens que perturbavam a ordem” (ESTRELA apud AQUINO, 2003 p.

46).

Diante dessa realidade as instituições de ensino, os educadores e os pais

devem interagir para a realização de uma prática pedagógica voltada para a

integração do aluno e também os educadores devem repensar a cerca das

habilidades e competências fundamentais que estes irão aprimorar para a melhor

compreensão do aluno.

Nessa perspectiva considera-se ainda, que o conhecimento não pode ser

considerado definitivo, visto que ele ainda está inserido num contexto de mudanças

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constantes. Desse modo, entende-se que a questão da (in)disciplina deverá ser

sempre revista à luz dos novos paradigmas da educação.

“A disciplina não é efeito de certas medidas “disciplinares”, mas sim

de todo o sistema de educação, de todas as circunstâncias da vida,

de todas as influências a que as crianças estão sujeitas. Nesse

sentido, a disciplina não é a causa, não é o método, não é o meio de

uma boa educação, mas o seu resultado” (XAVIER 2002, p. 28 apud

MAKARENKO, 1987, p. 12).

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Vasconcellos (1995, p. 41) cita Freire: “Ninguém disciplina ninguém. Ninguém

se disciplina sozinho. Os homens se disciplinam em comunhão, mediados pela

realidade”.

O educador, num primeiro momento, pode assumir a responsabilidade pela

disciplina, enquanto articulador da proposta, levando, no entanto, a classe a assumi-

la progressivamente. Tem como parâmetro não a sua pessoa, mas as necessárias

condições para o trabalho coletivo em sala de aula.

Segundo Vasconcellos (1995), a disciplina consciente e interativa, portanto,

pode ser entendida como processo de construção da auto-regulação do sujeito e/ou

grupo, que se dá na interação social e pela tensão dialética adaptação-

transformação, tendo em vista atingir conscientemente um objetivo.

Entende-se, portanto, que para definir disciplina na escola, é necessário

considerar uma série de questões sociais atuais e rever o comportamento de muitos

profissionais da educação.

Por fim, tenta-se aqui dar uma definição à disciplina, como o acontecimento

da aprendizagem em sua plenitude, dentro de uma dinâmica organizada e orientada

pelo professor, cujo desenvolvimento não depende de um padrão pré-estabelecido.

Ao contrário da indisciplina, que é percebida como um estado gerado pela

ociosidade dos e alunos e seu desencanto na escola.

1.2 POSSÍVEIS CAUSAS DA (IN) DISCIPLINA NA SALA DE AULA E NA ESCOLA

Não é fácil relacionar as causas da indisciplina nas escolas. O seu número não pára de

aumentar. As mudanças estão acontecendo rapidamente, quer na família, educação, tecnologia,

exigindo que as pessoas nesse contexto busquem novas formas de compreender este novo paradigma. Com isso os alunos fora da escola estão envolvidos em estímulos muito mais atraentes em relação com o que é oferecido no mundo escolar. O aluno é afetado e modifica sua forma de ver de sentir e agir no mundo.

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Acredita-se que um dos aspectos que mais influencia na aprendizagem dos alunos é o comportamento disciplinar na sala de aula e na escola. Portanto, se faz mister um breve estudo a respeito das possíveis causas e os porquês da (in)disciplina no âmbito escolar, em especial nas séries iniciais do ensino fundamental.

No passado o contributivo dado pelas escolas para a indisciplina assentava na questão

da seleção que operavam. As escolas eram acusadas de discriminarem os alunos à entrada e na constituição das turmas. Ao fazê-lo, criavam focos de revolta por parte daqueles que legitimamente se sentiam marginalizados. A questão ainda é colocada, mas não com acuidade que antes conheceu. Os contributos da escola para a indisciplina são agora outros.

“Um dos grandes impasses que se coloca para a escola hoje é a definição de sua efetiva função social. Diante da crise de identidade, é fundamental que a comunidade educativa procure recuperar o sentido da escola, do estudo, elaborando e explicitando sua proposta educacional. O aluno deve ser um sentido na escola” (VASCONELOS, 1995, p. 57).

Há muito tempo que a escola deixou de ter um papel integrador dos alunos. Embora

seja um espaço onde estes passam grande parte do seu tempo, nem sempre nela chegam a perceber quais são os seus valores e regras de funcionamento. Na verdade as escolas não estão preparadas para enfrentar a complexidade dos problemas atuais, nomeadamente os que se prendem com a gestão das suas tensões internas. A crescente participação de alunos, pais, entidades públicas e privadas nas decisões tomadas nas escolas tornou-se uma fonte de conflitos, que não raro acabam por gerar climas propícios à irrupção de fenômenos de indisciplina.

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Atualmente o que mais se ouve por parte dos professores, sobre o

comportamento dos alunos em sala de aula, é: “Os alunos hoje não têm limites”.

Observando o cotidiano escolar, pode-se perceber que os profissionais destacam a

questão disciplinar como uma das dificuldades fundamentais para o bom

desenvolvimento do trabalho escolar. Para alguns educadores, o ensino tem como

um de seus obstáculos centrais a conduta desordenada dos alunos, como: bagunça,

tumulto, falta de limites, mau comportamento, desrespeito.

Realmente, conquistar a disciplina em sala de aula e na escola tornou-se um

verdadeiro desafio para o ensino atual, tanto nas instituições de âmbito público como

privado e merece uma séria reflexão.

Muitas pessoas atribuem a culpa pelo comportamento indisciplinado do aluno

à educação recebida na família, assim como à dissolução do modelo do núcleo

familiar. Muitas crianças têm uma criação familiar totalmente autoritária, estão

acostumadas a serem surradas e a receberem severos castigos, por esta razão não

conseguem viver em ambiente democrático.

Muitos pais acabam dando liberdade excessiva a seus filhos, criando filhos

indisciplinados, cheio de mimos, que não conseguem conviver com obrigações

rotineiras e sentem-se frustrados quando não são o centro das atenções. Acredita-se

que a maior parte dos alunos vem de lares desestruturados, são filhos de pais

separados, acredita que devido a isso apresentam um comportamento tão agressivo.

“A familia pode ajudar a disciplina na escola através de algumas

práticas como: readiquirir a prática do diálogo, ajudar o filho a ter

postura crítica diante dos meios de comunicação, ajudá-los a

pensarem sobre o sentido da vida, não acobertar erros, acreditar no

filho, estabelecer e fazer cumprir limites, valorizar a escola e os

estudos, acompanhar a vida escolar do filho, apoiar nas mudanças

da escola, procurar a escola ou o professor sempre que for

necessário, e outros” (VASCONELOS, 1995, p. 101).

Pensa-se ainda que o problema da indisciplina também está associado à

desvalorização da escola por parte dos pais, que dificilmente aparecem na escola,

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muito menos nas reuniões, além de não acompanhar as lições dos filhos e tomar

conhecimento de seus comportamentos na escola.

“Há pais que, por manter seus filhos na escola, acham que esta é

responsável pela educação dos mesmos. Quando a escola reclama

de maus comportamentos ou das indisciplinas dos alunos, os pais

jogam a responsabilidade sobre a escola” (TIBA, 1996, p. 169).

Objetivamente, a família não está cumprindo sua tarefa de fazer iniciação

civilizatória, estabelecer limites e desenvolver hábitos básicos.

Outras pessoas atribuem a culpa da indisciplina dos alunos à escola, ao

professor. Realmente, na prática, o que se ver é uma escola que não proporciona

alegria, satisfação e tampouco aprendizagem consistente, estando desta maneira

muito distante de suas aspirações e necessidades dos alunos.

De acordo com Tiba (1996, p. 125), “O professor tem um papel essencial

como fonte emissora de informação que os alunos vão transformar em

conhecimento. Alguns estudantes adoram ou detestam determinadas matérias,

justamente por causa do professor”.

Alguns alunos comentam que os professores quase que em geral são

autoritários e não permitem uma participação mais ativa do aluno em sala de aula,

não preparam aulas, chegam atrasados, lidam com aluno padrão ideal e não com o

aluno passivo à indisciplina. Transmitem conhecimentos abstratos na medida em

que não relacionam os conhecimentos transmitidos à prática dos homens, não

dominam competentemente os conteúdos, ministram aulas monótonas, repetitivas e

aborrecidas. Uma escola chata sem atrativos. Os alunos não aprendem, repetem,

evadem e são submetidos a esquemas precários de recuperação e com isso se

sentem incapazes para as atividades intelectuais, além de não sentirem nenhuma

felicidade de sentar nos bancos escolares.

“Percebemos hoje uma necessidade básica do professor assumir sua

realidade, seu trabalho. Encontramos professores que estão na sala

de aula, mas numa ilusória situação de transição, ‘logo vou sair

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dessa’. Não se comprometem, não se envolvem, justificam seu

fracasso em cima da responsabilidade de outros. Ou seja, o

professor se recusa a fazer uma autocrítica; acha que o problema

está no aluno, na família, na escola, no sistema, etc. Fala do aluno

como um ser já deformado, apático, dispersivo, sem controle das

emoções” (VASCONCELLOS, 1995, p. 67).

Há a necessidade de desalienar a relação pedagógica: entender que estes

alunos são problema seu. O professor tem que ser sujeito da história pedagógica de

sua classe e de sua escola, não pode ficar sonhando com alunos ideais. Primeiro

aceitar o que tem depois tentar mudar.

A maior arma de persuasão que o professor tem é sua habilidade de tornar o

conteúdo interessante, a ponto de converter a distração, que normalmente se torna

um ato de indisciplina, em atenção e aprendizagem.

Tiba (1996, p. 125), diz que haverá interesse do aluno pelo conteúdo do

programa escolar sempre que houver uma correlação entre este e o dia-a-dia do

estudante. O professor sábio estabelece tal correlação.

“O aluno tem que fazer uma aprendizagem fundamental da

convivência democrática: não abrir mão de forma alguma de sua

dignidade, de seu valor, mas, ao mesmo tempo, não passar por cima

da dignidade do outro. Há que se descobrir que sua afirmação são

significa necessariamente a negação do outro, mas que, pelo

contrario, convivência com o outro o leva a potencializar e

desenvolver-se” (VASCONCELLOS, 1995, p. 97).

Vários estudiosos apontam como grande causa para a indisciplina o fato da

escola ter parado no tempo. A escola ainda não incorporou no seu cotidiano a

tecnologia a que os educandos da classe média têm acesso. Os colégios atuais,

ainda se baseiam no modelo giz e quadro-negro.

Os alunos querem aulas dinâmicas e criativas, com o uso de desenhos, de

novidades.

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Os profissionais da educação deveriam ser mais atuantes na escola, mas não

estão bem preparados para atuar na escola pública, não sabem o que fazer na

escola. Brigam entre si e com os professores. Esses especialistas pouco têm trazido

de positivo para a melhoria do ensino e da aprendizagem.

A situação dos professores é preocupante, salários indignos e formação

profissional precária, fatores incompatíveis com qualquer trabalho sério que se

pretenda. O aluno, no entanto, tem sido a maior vítima dessa situação toda. A luta

pela melhoria salarial deve corresponder à luta por procedimentos pedagógicos

compatíveis com aprendizagem do aluno. Entre outras melhorias, deveriam lutar

para encontrar métodos mais adequados de alfabetização, material didático

apropriado, trabalhar de maneira mais integrada, enfim, deve-se lutar diariamente

para ao menos diminuir a indisciplina na escola.

“O aluno que é deixado de lado, ocupado com tarefas que não lhe

interessa, pode tender para duas atitudes extremas: ou se torna

apático e se sente diminuído e alheio aos trabalhos escolares, ou se

torna revoltado, chamando atenção de todos, agredindo para ser

ouvido. No primeiro caso, é ignorado, pois não incomoda ninguém.

No segundo, é punido e repudiado por todos. Em ambos os casos, o

resultado é um só: a exclusão da escola, engrossando as estatísticas

da evasão escolar” (D’ANTOLA, 1989, p. 86).

A escola, mesmo dentro dos parâmetros da sociedade estará contribuindo

para a transformação social e estaria ajudando para a melhoria da qualidade de

ensino e para a socialização do saber. Na medida em que a escola cumprir o seu

papel, a disciplina deixará de ser a principal questão.

A sociedade é outro fator que influência na indisciplina dos alunos. Percebe-

se na sociedade brasileira, mudanças profundas, tais como: aceleração do processo

da industrialização, a expansão das telecomunicações, crise ética, desemprego,

subemprego, gastos elevadíssimos, falta qualidade da propaganda nos meios de

comunicações.

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A concentração de renda no país e a ânsia de consumo são dois fatos que

influenciam a dinâmica familiar, tendo como resultados: o homem trabalha mais; a

mulher vai para o mercado de trabalho; a preocupação maior é o desemprego.

No entanto, os responsáveis pelas famílias de classe pobre acabam tendo

que trabalhar para garantir a sobrevivência. Os de famílias de classe média alta, de

um modo geral, trabalham para o consumo.

“A sociedade em geral pode colaborar com a disciplina na escola, na

medida em que se comprometem em: democratizar a política e

economia, a justiça social e melhores condições de vida para a

população; desenvolver uma nova ética social, onde se resgate o

valor do bem comum, da verdade, do compromisso, da

solidariedade, do trabalho; valorização da educação e dos

profissionais que nela atuam; desenvolver uma nova política para os

meios de comunicação e outras” (VASCONCELLOS, 1995, p. 107).

O caminho deveria partir de um trabalho em conjunto entre escola, família, e

sociedade para sanar os problemas disciplinares.

É indispensável uma participação coletiva dos elementos que fazem parte da

escola, na construção de regras gerais que a escola tenha e deva ter para um bom

desempenho dos membros pertencentes à escola, inclusive os pais e a sociedade

em geral.

Sem dúvidas, é um processo longo e difícil, mas se essas regras forem bem

elaboradas, discutidas e colocadas em prática, acredita-se que, aí sim, poderá se

colher bons resultados.

CAPÍTULO II – INDISCIPLINA NA ESCOLA

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Aquino (1996), em seu livro Indisciplina na escola: alternativas teóricas e

práticas, faz uma importante referência sobre o tema a ser abordado neste estudo.

Tal importância se dá pelo fato da obra possuir dez diferentes abordagens teóricas

sobre o tema indisciplina, o que denota também, de uma certa forma, a

complexidade de compreensão da temática.

Iniciando-se agora com o que pensam estudiosos a respeito do tema

indisciplina, Carvalho (1996, p. 130), em seu texto, parte para uma reflexão a

respeito do uso dos termos disciplina e indisciplina, em seus distintos contextos e

utilizações corrente, procurando esclarecer possíveis confusões lingüísticas

provenientes do fato de que tais expressões, como tantas outras, utilizadas no meio

educacional, têm profundas raízes históricas e múltiplos usos igualmente legítimos.

O autor busca, com isso, esclarecer certas noções expressas no discurso, de

um modo geral, e suas relações com o ensino e a aprendizagem, sob a perspectiva

de tornar as idéias e os argumentos nelas implicados, mais claras e validadas.

Para Carvalho (1996), a distinção da idéia e dos pressupostos que guiam a

disciplina escolar não está no fato de que no contexto escolar não hajam prescrições

e regras, e sim no fato de que, tanto em um contexto da vida militar quanto na

eclesiástica, a disciplina requer um controle sobre o comportamento como um valor,

em que “a rigidez do hábito invariável centra-se em um único objetivo para cada

instituição: ter uma força armada pronta para o conflito ou atingir a beatitude”. Já na

escola, a utilização do termo disciplina está menos fundamentada em uma ordem

fixa e imutável de procedimentos comportamentais e mais relacionada ao

aprendizado das ciências ou demais áreas da cultura.

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Entretanto, no momento em que a escola passa a empregar concepções de

disciplina de ordem militar e eclesiástica, demonstra necessitar de uma ordem fixa e

imutável de procedimentos comportamentais. Nesse sentido, pode-se dizer que o

objetivo do processo educacional estaria ligado à fixação de certos comportamentos

e não na transmissão e assimilação de determinados conhecimentos, habilidades ou

atitudes, que possam exigir certos comportamentos e procedimentos como meios.

Desta forma, Carvalho (1996) nos diz que,

“A trajetória para entendermos os problemas da disciplina e da indisciplina escolar consiste na explicitação do vínculo entre a noção de disciplina como área do conhecimento e a de disciplina como comportamentos/procedimentos, vínculo que é próprio e específico da relação escolar” (CARVALHO, 1996, p. 132).

O autor diz, ainda, que um recorte como esse pressupõe uma renúncia à

tentação de imaginar que há uma verdadeira disciplina. Atentar para o fato de que

existe apenas um tipo de comportamento chamado comumente de disciplinado, uma

crença, responsável por várias das aflições tidas em relação à suposta indisciplina

dos alunos.

Carvalho considera insuficiente reconhecer que a disciplina ou a indisciplina

possa se referir a um conjunto fixo de modalidades de comportamento, mas sim a

uma série de atitudes que variam conforme os diferentes contextos lingüísticos e

sociais em que o indivíduo se encontra em determinado momento. Por exemplo,

quando se está numa igreja, é fundamental que se mantenha o silêncio; ao contrário

de quando se está em um jogo de futebol onde se tem muito barulho e gritaria.

O autor coloca que se deixe de lado as questões de respeito ou imposição

para se concentrar nas concepções de regras e métodos e as questões da disciplina

escolar.

Segundo Carvalho (1996), em ambos os casos, não é possível buscar uma

definição da lógica do uso desses termos, os quais considera ambíguos e de difícil

clarificação. No entanto, há necessidade de esclarecer alguns equívocos. O primeiro

desses equívocos, “seria procurar nas regras e métodos uma substância única ou

abstrata, que os descontextualizasse das experiências concretas onde se

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manifestam, como fenômenos práticos ou entidades lingüísticas”, isso valeria

também para o caso da disciplina.

Quando o professor aponta uma atividade a ser executada por seus alunos,

ele deixa claro o objetivo que se deseja alcançar e a maneira pela qual tal atividade

deve ser realizada: se em meio ao silêncio para que haja concentração, ou se em

meio à troca de idéias. Nesse sentido, o trabalho do professor, quando deixa claros

os meios e os objetivos a serem alcançados, acontece de forma disciplinada.

Assim, o professor não pode, em hipótese alguma, fazer a atividade pelo

aluno, mas pode apontar caminhos, a fim de evitar que este possa cair em erros

banais, possibilitando-lhe uma maneira de trabalhar que não garante mas permite a

criação. Sob esta perspectiva, as regras e disciplinas, segundo Carvalho (1996, p.

136), “não são só reguladoras mas também constitutivas, no sentido de que a sua

existência é que possibilita a criação.”

Dessa forma, o professor, ao oferecer maneiras organizadas de se realizar

um trabalho, está transmitindo um método de trabalho, e isso é disciplina e não um

estoque de soluções. Assim, a disciplina é construída no interior do processo de

aprendizagem.

A questão da disciplina ou indisciplina na escola não se restringe em obter um

tipo padronizado de comportamento, mais do que isso, ela envolve o como ensinar

certas maneiras de se trabalhar. A criatividade do professor é um dado bastante

significativo para lidar com questões disciplinares. O professor deve criar uma

maneira própria de trabalhar, sempre com vistas nos objetivos e características que

deseja alcançar, disciplinas e métodos de ação e pensamento considerados de

valor.

França (1996) acredita que se a indisciplina tornou-se um sintoma do

comportamento individual, um desvio, isso se deve a retirada do homem para o

mundo privado. O homem é reduzido a um modelo de conduta que abrange todas as

dimensões da existência, e a política passa a ocupar-se essencialmente com a

manutenção da vida.

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Segundo a autora,

“Sujeitar o ato indisciplinado a códigos interpretativos acreditando que a veracidade da ação não está no que ela inscreve, mas no que oculta (como os motivos e os sentimentos) é tomar a indisciplina como explicitação da vontade de UM, e não como um fenômeno político que imprime uma direção nas relações entre os homens. O que acontece quando ocorre esta privatização do espaço público? A sala de aula passa a ser um espaço em que se explicita a vontade de cada um, dando motivos à diluição do campo político que lhe é vital, explica a autora” (FRANÇA, 1996, p. 143).

Dessa forma, a autora coloca, ainda, que a educação deixa de se firmar como

esfera humana política e social, passando a subordinar-se à interioridade e cada

homem, reduzindo-se ao arbítrio entre fins estabelecidos por interesses privados,

sendo vista como uma mercadoria em que cada indivíduo visa intensificar valores e

interesses privados, tornando-se algo descartável.

De acordo com França (1996, p. 143), “a sala de aula não pode ser lugar de

passagem, mas instante de cristalização de toda uma existência, campo político de

conexão do homem com o mundo e seu futuro”.

Para a autora, se o campo de relação do homem consigo mesmo, e que tem

por fim criar ininterruptamente um eu próprio é a ética, o ato indisciplinado deve ser

considerado matéria do exercício ético.

“Se diariamente nós, professores, nos queixamos que as normas e regras de conduta presentes na sala de aula se fizeram opacas, quando não diluídas completamente, e também lamentamos que a relação professor-aluno e a hierarquia nela implicada ora se apresentam sob a forma de submissão incoteste levando ao conformismo e apatia, ora materializam-se em atos de negligência para com o material de estudo ou atos de violência radicais, é justamente por termos perdido de vista as dimensões ética e política que fundam o processo educacional” (FRANÇA, 1996. p. 146).

Neste sentido, a sala de aula deve se firmar como espaço público, capaz de

(re)produzir realizações coletivas e exercício permanente de si próprio, local onde o

contato com os outros se estabelece. Além, também, de poder constituir-se como

lugar onde o pensamento se demora por um instante para ser deglutido, ruminado e

encorajar-se para abandonar experiências já vividas, criando novas configurações

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humanas. Assim, o ato indisciplinado é algo que precisa ser trabalhado para se

saber a que veio.

Guirado (1996) utilizou o referencial teórico de Michel Foucault para refletir

sobre a indisciplina. Para isso, utilizou-se do conceito de poder enquanto disciplina,

trabalhado por Foucault.

Segundo a autora, entender o que Foucault define como poder é muito

importante, porque é esta a principal idéia de sua obra. Para Foucault, poder é

verbo, ação, relação de forças, não é uma coisa, ou algo que se tem em detrimento

de outro. Poder enquanto relação de forças significa uma dimensão constitutiva de

qualquer relação social ou discursiva.

Conforme a compreensão estabelecida por Foucault, o poder está além e

aquém do Estado, não é uma coisa de leis e da Constituição de um país ou estado.

“Poder é exercício regional de forças, sempre móveis e mutáveis, do interior das relações que se estabelecem, e não algo que acontece de cima para baixo, por vigência de lei, de regimento ou de cargo. É tensão constante no dia-a-dia, e não emanações de “grupos no poder”, como ouvimos dizer com freqüência” (GUIRADO, 1996, p.60).

A autora coloca a relação existente entre a trilogia poder/dispositivo/saber,

palavras muito presentes no pensamento foucaultiano, da seguinte maneira: “poder

é exercício que se faz sempre nas práticas sociais (dispositivos) sendo ocasião da

constituição de um saber ou de saberes específicos que, por sua vez, atribuem um

caráter de naturalidade aos dispositivos do poder” (Guirado, 1996, p. 60).

Para Guirado (1996), Foucault define política como jogo de forças, como

dimensão constitutiva de qualquer relação, como regional, e não global ou estatal,

encontra na estratégia disciplinar sua mais completa tradução.

O poder disciplinar é caracterizado pela vigilância, pela sanção normalizadora

e pela combinação das duas através do exame. Ou seja, não há necessidade de

força bruta, nem de castigos, os comportamentos são registrados ou observados,

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todos ficam sob o controle do olhar, tanto observados, quanto observadores. A

vigilância acontece constante e ininterruptamente e exerce por si só, o efeito

normalizador da ação.

Na sala de aula, devido a disposição espacial dos corpos, o professor tem

lugar de destaque em relação aos alunos. Todos podem vê-lo e acompanhar sua

trajetória, e este, por sua vez, tem uma visão geral, dos alunos e de pequenos

movimentos que estes venham a fazer, basta apenas ficar atento.

A fonte do controle se faz poder por toda parte, em todas as relações, o que

se tem também visíveis efeitos repressivos. As penalizações acontecem sob

diversos aspectos: do tempo (atrasos, ausências, interrupções de tarefa), da

atividade (desatenção, negligência, falta de zelo), da maneira de ser (desobediência,

grosseria), do discurso (tagarelice, insolência), do corpo (atitudes incorretas, gestos,

sujeira), da sexualidade (indecência, imodéstia).

Segundo Guirado (1996, p. 65), “a disciplinarização é da ordem do próprio

exercício, do próprio fazer; mais especificamente de sua repetição à exaustão”, daí o

quanto os conteúdos são ensinados por repetição nas escolas. Com isso, o controle

é tão excessivo que passa a existir o autocontrole, ou seja, aquele que vê também é

visível. A vigilância acontece para todos e por toda parte, como efeito da rede de

relações disciplinares. Nesse sentido, pode-se dizer que a relação entre poder e

indisciplina justifica-se pelo fato de a indisciplina fazer parte da própria estratégia de

poder.

Ela é gerada pelos mesmos mecanismos que visam ao seu controle. Assim

também, é possível considerar a indisciplina como um dos efeitos de uma relação de

poder. O poder, em sua forma modelarmente disciplinar, gera a indisciplina, já que a

rede de controle e vigilância, olhar hierárquico, o sistema contínuo de previsões de

condutas certas ou erradas com as devidas punições, entre outros dispositivos, vão

incitar e colocar no discurso, exatamente, o que visa abrandar. A rede de relações

disciplinares faculta a indisciplina.

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Segundo a psicanálise, o indivíduo está implicado em todo ato. Assim, ela tem

como preocupação criar condições para que o sujeito reflita sobre as causas dos

atos de indisciplina que tanto o incomodam.

Ele acredita que a pretensão de alguns educadores, de vir a saber sobre a

singularidade subjetiva do agir de um aluno, está destinada ao fracasso, já que

apenas ele mesmo poderia valer-se “utilmente” de “seu” saber a produzir. Com isso,

acaba ainda por cooperar com a psicologização do cotidiano escolar. Para o autor, o

fato de pensar que haveria uma essência psicológica da chamada indisciplina

escolar, bem como que seria possível usufruir institucionalmente de um saber a seu

respeito, faz surgir uma série de instâncias de avaliação preventiva, diagnóstica e/ou

tratamento escolar ou paraescolar, nas quais hoje em dia cifra-se, paradoxalmente,

o destino da empresa pedagógica.

Dessa forma, o autor vai dizer que,

“Interrogar-se sobre o que justifica o agir disciplinar docente de todos os dias seria, precisamente, desestabilizá-lo, uma vez que se acabaria por assinalar seu caráter quase sempre caprichoso, embora “justificado” psicologicamente. Em outras palavras, revelar-se-ia que no cotidiano escolar não imperam verdadeiras leis, mas, hegemonicamente, quase leis, ou, se preferirmos, apenas regras ou normas morais” (AQUINO, 2003, p. 30).

Enquanto a lei expressa a vontade geral de renunciar a alguma coisa, a regra

é o princípio constitutivo de hábitos morais. Em outras palavras, a lei diz “não faça

isso, porém faça outra coisa”; já a regra formula o imperativo de fazer como todos,

ou não fazer nada. A lei é solidária à ética, e a regra, à moral.

Nesse sentido, se o cotidiano da escola se estrutura com o objetivo de

fabricar uma criança afetivo-cognitiva ideal, não deverá ser surpresa que o

surgimento do imprevisto seja considerado um desvio em relação a uma norma.

Assim, o aluno disciplinado, para o autor, é aquele que se adequa ao molde de uma

criança ideal, e o indisciplinado, aquele cuja imagem surge institucionalmente fora de

foco.

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Uma análise realizada por Carvalho (1996) sobre a indisciplina e o cotidiano

escolar defende o fortalecimento da aprendizagem e da relação que ela pode gerar

com o saber.

Desta forma, a autora compreende que o ato pedagógico, quando tomado

como um momento de construção de conhecimento, não necessita ser silenciado,

nem o professor ser reduzido à condição única daquele que ensina e faz o aluno não

exceder sua condição de sujeito que aprende. Diferente do que se imagina, o ato

pedagógico é o momento de emergir das falas, do movimento, da rebeldia, da

oposição, da ânsia de descobrir e construir juntos, professores e alunos.

No entanto, a maioria das instituições insiste em expressar uma obsessão

pela manutenção da ordem, fazendo com que as relações entre autoridade e

hierarquia, em que os alunos são inseridos nas escolas, vão criando uma educação

para a docilidade, desenvolvendo nos indivíduos uma dependência que os impede

de crescer como sujeitos auto-suficientes e automotivados.

“A pedagogia crítica pretende repensar como as nossas escolas podem se constituir em espaços onde a cultura e as experiências dos alunos e dos professores (seus modos de sentir e ver o mundo, seus sonhos, desejos, valores e necessidades) sejam os pontos basilares para a efetivação de uma educação que concretize um projeto de emancipação dos indivíduos” (REBELO, 2002, p.12).

A percepção de outras realidades, trazidas pelos alunos na escola, poderá

permitir que os modos de ensinar e aprender sejam determinados pelas relações

que acontecem na sala de aula.

De acordo com a autora, isso tem ligação com a questão da indisciplina, já

que não se tem a possibilidade de isolá-la daquilo que aparenta ser um sintoma do

que a escola mesma produziu, tanto em termos do significado dos seus conteúdos,

das estratégias de trabalho na sala de aula, quanto pela maneira de encarar os

alunos e partilhar com eles os espaços, as vozes, o tempo.

Para a autora, uma maneira de avançar no entendimento de questões ligadas

à indisciplina na escola seria através da percepção do contexto das práticas que

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constituem o dia-a-dia das escolas. A prática pedagógica está estruturada a partir

dos quadros de referências ideológicas, morais e sociais de todos os envolvidos na

instituição escolar e que se cruzam com todo o universo simbólico cultural, como

valores, crenças, representações, que dão sentido a suas atitudes e

comportamentos.

Este cruzamento estrutura as práticas docentes. Desta forma, as

representações interiorizadas pelos professores, suas concepções de saber, poder e

ensino, precisam ser analisadas conforme surjam questões disciplinares

compreendidas no conjunto das práticas cotidianas da escola.

Rego (1996) diz que, o fenômeno da indisciplina, no cotidiano escolar, tem

deixado os educadores assombrados e perplexos. Com isso, tentam buscar, ainda

que sem muito aprofundamento, explicações para a existência de tal manifestação.

Com freqüência vêem este fenômeno com um certo saudosismo por práticas

escolares e sociais de épocas passadas, em que não havia lugar para

desobediência e inquietação por parte das crianças e adolescentes. Isso revela,

entre outros aspectos, uma grande dificuldade de atualizar o projeto pedagógico

frente às demandas apresentadas pela sociedade atual.

Alguns educadores costumam atribuir a culpa pelo “comportamento

indisciplinado” do aluno, exclusivamente, à educação recebida na família,

desobrigando-se dessa responsabilidade e deslocando o problema para fora do seu

domínio.

Outros acreditam que a manifestação da indisciplina no cotidiano escolar está

ligada aos traços de personalidade de cada aluno, atribuindo assim, a

responsabilidade ao próprio aluno, demonstrando-se tratar de uma concepção de

desenvolvimento inatista. Ou melhor, acreditam que os traços de comportamento de

cada aluno já vêm definido desde o nascimento, por isso não poderão ser

modificados.

Já os diretores, coordenadores e muitos pais, acreditam que as possíveis

causas do comportamento de indisciplina nas escolas são de responsabilidade do

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professor e relacionam a origem da indisciplina à falta de autoridade do professor, de

seu poder de controle e aplicação de sanções.

Segundo Rego (1996), as teses de Vygotsky permite uma análise do

fenômeno da (in)disciplina sob uma visão mais ampla e menos fracionada do que

normalmente se vê nos meios educacionais, pelo fato de inspirar maior abrangência,

integração e dialética dos diferentes fatores que atuam na formação do

comportamento e desenvolvimento individual.

A indisciplina é complexa não porque não se consegue explicá-la. Sua

complexidade se justifica por existir uma infinidade de variáveis que interferem nas

relações e nos comportamentos humanos.

Taille (1996) também apresenta uma análise bastante interessante sobre a

indisciplina em sala de aula. Nesta análise ele procura estabelecer uma relação

entre a indisciplina, a moralidade e o sentimento de vergonha. Ele cita como um dos

fatores, que levam à indisciplina a acontecer em sala de aula, “o enfraquecimento do

vínculo entre moralidade e sentimento de vergonha” (TAILLE, 1996, p.11). Ele

explica que a origem do sentimento de vergonha está associada à questão da

pessoa se colocar como objeto do olhar, da escuta, do pensamento dos outros. A

vergonha, neste caso, reflete internamente o julgamento que não é nosso. Uma

afirmação como essa, causa descontentamento em relação ao que normalmente se

tem como verdade, que o sentimento de vergonha acontece devido a um julgamento

negativo advindo de uma outra pessoa; para muitas pessoas o sentimento de

vergonha pode estar vinculado ao sentimento de inferioridade.

Por um lado, uma pessoa pode sentir-se envergonhada ao ser chamada de

feia; ou em sala de aula, ao ser considerada a pior da classe por ter obtido a menor

nota em uma prova. No entanto, por outro lado, uma pessoa pode também se sentir

envergonhada ao receber um elogio em público, o que seria, neste caso,

considerado um julgamento positivo. De uma forma ou de outra, a vergonha pode

estar vinculada ao fato de você sentir-se um objeto do olhar alheio.

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Ao abordar a questão da indisciplina pela dimensão da moralidade concorda-

se Taille (1996), quando ele diz que não condena moralmente falando a indisciplina,

nem que o aluno que segue as normas escolares de comportamento seja um

amante das virtudes, pode ser que o medo de castigos e punições influencie a esses

alunos.

Vários atos de indisciplina traduzem-se pelo desrespeito, ou do colega, ou do

professor, ou ainda da própria instituição escolar. Este desrespeito de certos

comportamentos de alunos é, na maioria das vezes, o que mais incomoda e

preocupa os educadores.

No cotidiano escolar, ou o professor se impõe pessoalmente por suas

próprias características, ou nada acontece, já que sua função é desprezada pelos

alunos. Existem casos de escolas particulares que personalizam tanto seu ensino, a

ponto de tratar o aluno como um “cliente” a quem ela negocia o seu produto.

Quem passa a sentir minorizado, envergonhado, é a escola e seus

professores. Chega-se a ponto do professor ouvir do aluno que quem paga o salário

dele é o aluno e por isso, não admite que lhe dê ordens ou lhe repreenda. E os

professores, por sentirem-se privados de autoridade, desistem de disciplinar e

assumem a tarefa de motivar o aluno para que este permaneça na escola.

No âmbito familiar, a família, que antes se organizava em função do adulto,

atualmente, passa a si organizar em função da criança. Daí a atual queixa pela falta

de limites nas crianças. Tanto os pais, quanto os professores têm medo de impô-lo,

por considerar uma imposição do registro adulto, no qual não acreditam mais. Assim,

os pais engatinham na frente de seus filhos, brincam de negar as diferenças, fingem

que são apenas amigos, mascaram seus valores por medo de contaminá-los,

concordam com seus desejos para não frustrá-los. E este mesmo fato acaba se

repetindo no âmbito escolar, onde o professor passa a fazer uso de negociações ao

invés de ordens.

A indisciplina em sala de aula não se deve essencialmente a falhas

psicopedagógicas, pois está em jogo o lugar que a escola e a moral ocupam na

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sociedade. Os educadores precisam preocupar-se seriamente com a qualidade o

trabalho que está sendo oferecida às crianças, a linguagem, as relações

estabelecidas, as atividades propostas. A humilhação, longe de prevenir os delitos,

os promove. De acordo com De La Taille (1996, p.23) a solução encontrada seria a

de reforçar no aluno, o sentimento de sua dignidade como ser moral.

Aquino (2000), acredita que uma nova geração se formou a partir da

crescente democratização política do país e, em tese, com a desmilitarização das

relações sociais. O que temos hoje em dia em nossas escolas é um outro aluno, um

novo sujeito histórico, mas que ainda sofre as conseqüências de um modelo

pedagógico que prioriza a imagem de um aluno submisso e temeroso. Tanto

professor, quanto aluno, tinham papéis definidos, enquanto o primeiro era

considerado um general de papel; o segundo, era tido como um soldadinho de

chumbo.

Outro dado problematizador, colocado por Aquino, refere-se a conquista

social recente na história do país do direito à escola para todos de oito anos,

mínimos e obrigatórios. Quando o que se tinha antigamente era uma escola elitista e

conservadora, em que poucos tinham acesso.

O autor coloca alguns significados que podem ser abstraídos de fenômenos

que assolam esse novo cenário escolar, inclusive a indisciplina. Como primeiro

significado, Aquino (2000) diz que, a indisciplina pode estar sinalizando o impacto do

ingresso de um novo sujeito histórico, com outros valores, hábitos e demandas numa

estrutura anacrônica e imatura para absorvê-lo plenamente.

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CAPÍTULO III – RELAÇÃO ESCOLA–INDISCIPLINA

Quando a criança vai para a escola, ela irá conviver com outras regras,

normas que também são importantes para uma convivência democrática entre as

pessoas e se, estas normas disciplinares estabelecidas pelos professores não são

respeitadas a indisciplina acontece e atua como fator desequilibrador entre

professor-aluno e aluno-aluno.

Portanto, disciplinar é criar regras e normas adequadas e equilibradas de vida

e selar pelo seu cumprimento. Assim tem-se uma disciplina marcada pela

participação, pelo respeito e pela responsabilidade.

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Ao dispor de uma análise de professores e alunos e de seus papéis no

contexto escolar depara-se com representação de práticas escolares que

ultrapassam a mera transmissão e aquisição de conhecimentos teóricos e técnicos.

Acredita-se que estas práticas são produtoras de subjetividade nos seus

protagonistas.

Segundo Aquino (1996, p. 78),

“A produção da subjetividade remete fundamentalmente ao plano imaginário das relações instituintes/instituídas da escolarização. Portanto, de acordo com este autor, os vínculos possíveis entre professores e alunos forjam um contrato que é imaginário e os entrelaça no interior da instituição que é a escola” (AQUINO, 1996, p. 78).

Existe um confronto entre saberes e a prática instituída por gerações que

antecederam e as práticas e saberes instituintes que surgem nas relações

pedagógicas.

Muitas vezes o aluno age conforme a expectativa do professor, como forma

de sobrevivência escolar, tentando não ser excluído do processo. Independente da

tendência político-filosófica adotada pelo professor, a sua figura é invariavelmente

aquela que imprime força e sentido à relação.

Nesse sentido, vale um questionamento: Como os educadores em geral,

vêem o problema da indisciplina dentro da escola?

A partir dos dados obtidos com a observação e na aplicação da entrevista,

percebe-se que os professores concordam que a indisciplina é um problema que

influencia na aprendizagem tanto do aluno indisciplinado como de outros colegas

que querem aprender e também configura como um elemento perturbador para o

professor que está orientando os alunos a cerca do conhecimento.

Pode-se perceber ainda que a indisciplina é atualmente uma preocupação,

uma das dificuldades de relevância no cotidiano escolar.

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Rego (1996) afirma que,

“[...] um aluno indisciplinado não é entendido como aquele que questiona, pergunta, se inquieta e se movimenta na sala, mas sim como aquele que não tem limites, que não respeita opinião e sentimentos alheios, que não consegue compartilhar [...]” (REGO, 1996, p. 86-87).

Realmente um aluno indisciplinado é aquele que não tem limites, perdendo

sua razão diante do professor e dos colegas. Mas, mesmo assim quando o professor

expulsa o aluno indisciplinado da sala de aula, ele está infringindo o direito básico do

aluno assistir à aula.

Talvez a solução seria formar uma espécie de conselho tutelar escolar, com

participação de professores, pedagogos, alunos, direção e até mesmo pais, para

estabelecer acordos.

De acordo com as observações feitas os professores encontram grandes

dificuldades em manter a disciplina em suas aulas. Os alunos observados mexem

sem parar, arrastam as carteiras no piso e procuram tirar a atenção do colega ao

lado.

O professor na sala de aula desempenha um papel ambíguo, pois, de um

lado, ele tem a função de estabelecer os limites da disciplina e das normas; de outro,

ele desencadeia novos dispositivos para que o aluno tenha acesso aos conteúdos,

tenha autonomia sobre o seu próprio aprendizado e sobre sua própria vida.

O professor pode propiciar um método de trabalho que exigirá uma disciplina,

embora com procedimentos diferentes para cada conteúdo curricular, possibilitando

ao aluno o desenvolvimento de sua forma de trabalho, que implica também a posse

de uma disciplina.

Entendendo-se assim, a indisciplina não expressa apenas ódio, raiva,

vingança, mas também uma forma de interromper as pretensões do controle

impostas pela escola, afinal o desafio é trabalhar com a diversidade dos alunos.

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3.1 INDISCIPLINA NA SALA DE AULA

Carvalho (1996, p. 134) afirma que as regras não procedem necessariamente

de forma discursiva no trabalho escolar, mas concretizam-se nele. Indicam assim, a

clareza dos objetivos e procedimentos verbais, de regras e de comportamentos.

O autor ainda acrescenta:

“[...] as regras que formam as disciplinas escolares não têm uma função exclusiva ou preponderantemente reguladora (da boa ordem), mas constitutiva, posto que possibilitam uma forma de trabalho, de ver o mundo na perspectiva da história, da arte, da física, etc” (CARVALHO, 1996, p.134).

Tentando explicitar uma concepção para termo indisciplina, inicialmente

recorre-se ao dicionário e as definições encontradas dentre outras são: normas,

aquilo que a lei ou o uso determina etc. Assim, conclui-se que regras neste contexto,

seriam as normas que todo ser humano deve aprender para ter uma boa convivência

em sociedade. Estas regras deveriam envolver as crianças desde bem pequenas no

âmbito familiar, onde se espera que estas sejam aprendidas.

Em tempo, precisa-se atentar para uma nova perspectiva para a visão da

indisciplina onde as regras são necessárias para a convivência democrática entre as

pessoas. Essa perspectiva reitera que a disciplina deve ser vivenciada na escola, em

um pequeno espaço de convivência, visando com esse trabalho encaminhar os

alunos para ocuparem com responsabilidade de cidadãos seus lugares na

sociedade.

Acredita-se que a dificuldade situa-se no como fazer um trabalho pedagógico,

em consonância com a família, que vise à construção da autonomia moral. Esse é o

ponto que se acredita ser crucial nesse processo, pois sem autonomia moral os

alunos agem de forma heterônoma, ou melhor, tornam-se indisciplinados.

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Há uma tendência de ver a indisciplina como ações isoladas na família, na

escola ou na sociedade. Contudo, entende-se que estes elementos estão

entrelaçados e que a disciplina é uma construção coletiva, sendo preciso o

envolvimento de todos no processo.

Pensa-se que os educadores devem primeiro tentar compreender o

comportamento inadequado da criança, já que, para ele, isso diminui a ansiedade

“agressiva” do indisciplinado.

Com isso, perde-se o caráter de condenação precipitada, oportunizando ao

professor aproximar-se do seu aluno e investigar os porquês dos atos

indisciplinados.

Disciplinar é criar coletivamente regras adequadas e equilibradas de vida e

zelar pelo seu cumprimento. Ao caminhar nesse sentido, o termo disciplina se

ressignifica, passando a ser entendido como processo de construção da autonomia

moral.

Portanto, busca-se construir uma nova disciplina que deixe de ser a

expressão das relações sociais alienadas. Basicamente, pode-se dizer que o

objetivo é conseguir o autogoverno dos sujeitos participantes do processo educativo

e, dessa forma, as necessárias condições para o trabalho coletivo em sala de aula e

na escola, onde haja o desenvolvimento da autonomia e da solidariedade, ou seja,

as condições para uma aprendizagem significativa, crítica, criativa e duradoura.

Almeja-se uma disciplina consciente e interativa, marcada pela participação, pelo

respeito e responsabilidade, pela construção do conhecimento e pela formação do

caráter e da cidadania.

3.2 COMO CONSTRUIR A AUTORIDADE

É impossível falar de indisciplina sem pensar em autoridade. E é impossível

falar de autoridade sem fazer uma ressalva: ela não é dada de mão beijada, mas é

algo que se constrói. Ou seja, ter autoridade é muito diferente de ser autoritário.

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Dizer “não faça isso”, ameaçar e castigar são atitudes inúteis. O estudante precisa

aprender a noção de limite – e isso só ocorre quando ele percebe que há direitos e

deveres para todos, sem exceção.

Certo dia uma professora encontrou sua classe em pé de guerra por causa de

uma discussão entre os meninos. Um deles desafiou-a a “botar moral”. Calmamente,

ela pediu que todos se sentassem e deu início a uma conversa sobre o sentido de

“moral” (ordem). Os alunos não esperavam esse encaminhamento e o debate serviu

para que eles podessem pensar sobre os limites de seus atos.

Um dos obstáculos mais frequentes na hora de usar o mau comportamento a

favor da aprendizagem é uma atitude comum a muitos professores: encarar a

indisciplina como agressão pessoal. Pensa-se que o educador não pode se colocar

na mesma posição do aluno. Quando a desordem se instala, é fundamental agir com

firmeza. Não há fórmulas prontas para isso, mas um bom caminho é discutir o caso

com os envolvidos e aplicar sanções relacionadas ao ato em questão.

O professor precisa desempenhar seu papel – o que inclui disposição para

dialogar sobre objetivos e limitações e para mostrar ao aluno o que a escola e a

sociedade esperam dele. Só quem tem certeza da importância do que está

ensinando e domina várias metodologias consegue desatar esses nós.

3.3 ESCOLA E FAMÍLIA, UMA GRANDE PARCERIA

A Educação escolar é considerada a primeira etapa para o desenvolvimento

intelectual dos seres humanos. É claro que para um indivíduo desenvolver-se é

necessário à participação tanto dos próprios alunos, quanto dos professores e dos

pais.

O desenvolvimento de um indivíduo no contexto família e escola é uma fase

muito importante. É importante que a família se mobilize, fazendo um intercâmbio de

idéias com a escola e colocá-las a par das propostas de atendimento aos seus

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filhos, a partir daí fazer uma avaliação das informações contidas, tanto pelos pais

como também pela escola, para então fazer um perfil específico de cada indivíduo.

Pais, alunos e professores devem trabalhar em parceria, trocando

experiências, discutindo soluções. Através disto com certeza o desenvolvimento do

indivíduo será altamente positivo.

A família tem a função psicosocial de proteger os seus membros e de

favorecer a sua adaptação á altura a qual pertencem. Assim, reconhece-se que

existe no mínimo quatro funções ou responsabilidades relacionadas com as

crianças, são elas: a família tem a obrigação de cuidar e proteger as crianças

garantindo condições dignas, essas funções jamais podem ser descumpridas, pois

existem serviços de suporte e de assistência social, para que caso não seja

cumprida a família acaba perdendo a custódia dos seus filhos; a família deve

contribuir para socialização dos seus filhos, consideradas por autores, sociólogos e

psicólogos funções básicas; a família é responsável em dois suportes na evolução

da criança, no processo escolar e uma função que ajuda na socialização da criança;

a família é responsável no suporte que proporciona a criança a ser pessoas

emocionalmente equilibrada, capaz de ter vínculos afetivos e respeitosos com os

outros e com a própria identidade, relação baseadas no respeito mútuo e no objeto.

3.4 BUSCANDO-SE FORMAS DE ENFRENTAR A INDISCIPLINA NA SALA DE

AULA

Como uma forma de enfrentar a questão da indisciplina na sala de aula,

parte-se agora para algumas idéias de Araújo (2001). O referido autor acredita que

tratar do tema da indisciplina no âmbito escolar passa por uma reflexão sobre a

moralidade humana, a autonomia, a liberdade e a opressão moral e intelectual.

Desta forma, o autor pretende neste trabalho, além de buscar discutir as relações

existentes entre esses aspectos, mais que tudo, apresentar experiências concretas

aos profissionais da educação que querem entender a questão da indisciplina e

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buscar caminhos democráticos para a construção de novas relações dentro das

escolas.

Araújo (2001), assim como outros autores, também acredita que os distúrbios

disciplinares constituem um dos problemas pedagógicos e morais da atualidade e

que acaba por comprometer a busca de uma maior qualidade de ensino.

De acordo com o autor, a indisciplina relaciona-se com o não cumprimento

das leis, normas e regras da sociedade ou de grupos organizados para

determinados fins, como a escola”. Para ele, ao referir-se a escola, a indisciplina

pode estar relacionada ao “desrespeito às regras estabelecidas.

Nesse sentido, tanto quanto se fala de indisciplina, quanto de moralidade,

encontra-se inserido nas discussões, o papel desempenhado pelas regras e pelas

leis, demonstrando, desta forma, a presença de uma relação íntima entre moralidade

e indisciplina.

Só que essa relação não é direta, nesse caso, alerta o autor: deve-se tomar

cuidado. Embora a moralidade esteja relacionada às regras, nem todas as regras

têm vínculos com a moralidade. É preciso levar em consideração sob quais

princípios foi estabelecida a regra transgredida pelo sujeito para entender se o ato

de indisciplina foi imoral ou não. Outro aspecto também importante que deve ser

observado é a maneira através da qual a regra foi determinada, se através de meios

coercivos ou baseada em princípios democráticos. Para Araújo, quando uma regra é

imposta ao aluno de maneira autoritária, este aluno pode não se sentir obrigado a

cumpri-la e a manifestação através da indisciplina pode ser interpretada como um

protesto em relação à autoridade. Nesse caso, ao invés do aluno ser considerado

imoral, quem poderá ser considerado imoral é o professor, por impor regras injustas

ou em benefício próprio e esperar que os outros simplesmente as obedeçam.

O autor ressalta o quanto o tema é complexo e por isso, sem a intenção de

encontrar fórmulas mágicas ou soluções para a indisciplina, busca apontar alguns

caminhos para seu enfrentamento no cotidiano escolar.

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Ele diz que, através de propostas simples e imediatistas, a escola não

conseguirá resolver nada, nem muito menos buscando culpados. Para o autor, tal

complexidade demanda uma transformação da escola como um todo, a fim de torná-

la compatível com a realidade e com os interesses da sociedade pósmoderna em

construção, o que irá demandar também uma democratização real da instituição

escolar e uma busca por trabalhos que levem em conta a construção de valores

universalmente desejáveis.

Diante disso, o autor apresenta alternativas educacionais que possibilitam aos

professores o enfrentamento dos problemas de indisciplina na escola.

Araújo (2001) vem desenvolvendo, nos últimos anos, trabalhos com

professores de escolas brasileiras, em cursos de formação, que busca

instrumentalizá-los para atuar na transformação e democratização da realidade

escolar. Esse trabalho tem demonstrado resultados significativos no sentido de

diminuir as ações de indisciplina e violência nas salas de aula.

Esses projetos priorizam como objeto principal da educação, a construção de

personalidades morais autônomas e críticas, e tem como embasamento os

princípios democráticos da justiça, da igualdade e da eqüidade.

Partindo dessa concepção, o papel da escola pressupõe um trabalho que leve

em conta a complexidade e a diversidade dos interesses da sociedade e de seus

membros.

Na verdade, este tipo de trabalho não quer de forma alguma apresentar uma

receita pronta e acabada de uma “escola idealizada”. No entanto, o autor entende

que a construção de uma escola democrática passa pela reorganização do espaço,

dos conteúdos e das relações interpessoais dentro da escola.

É nesse sentido que o autor propõe que a escola, ao organizar seu projeto

pedagógico, esteja disposta a reestruturar e trabalhar com sete diferentes aspectos

que se interelacionam.

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Para Araújo (2001), os conteúdos escolares, aparece como um dos grandes

problemas enfrentados pela educação, nos dias atuais, devido a sua inadequação

nas diversas disciplinas curriculares. Nota-se que, tais conteúdos são oferecidos

sem muita relação com a realidade e com o cotidiano dos alunos, despertando,

muitas vezes, a falta de interesse, uma das grandes fontes para se chegar à

indisciplina, tão questionada nas escolas ultimamente. De acordo com o autor, com

a implementação de um processo de democratização da escola, “inicia-se uma

cobrança para que esta, e os conteúdos por ela trabalhados, sejam mais

interessantes e próximos do cotidiano e da realidade dos alunos”.

No entanto, para que essa democratização aconteça de fato, é preciso

coragem e desejo político de reorganizar a estrutura curricular da escola.

Araújo (2001) propõe como uma saída para se adequar os conteúdos ao

cotidiano dos alunos, um trabalho com os “temas transversais” na educação, como:

a saúde, a ética, o meio ambiente, o respeito às diferenças, os direitos do

consumidor, as relações capital-trabalho, a igualdade de oportunidades, as drogas e

a educação de sentimentos. O que não significa com isso, acrescentar novas

disciplinas, mas sim, aproximar os conteúdos escolares à realidade cotidiana dos

alunos, e dessa forma obter maior interesse por parte dos alunos apáticos em

relação à educação. Para isso, tais conteúdos devem ser trabalhados interdisciplinar

e transversalmente aos conteúdos já existentes, considerados tradicionais, com

vistas à construção de personalidades morais autônomas e críticas.

Segundo Araújo (2001), a partir de uma outra perspectiva, entende-se que os

conteúdos escolares têm importante função na constituição da dimensão

sóciocultural dos sujeitos psicológicos. Assim, sua reorganização irá permitir que os

alunos construam personalidades fundamentadas em conteúdos eticamente mais

significativos.

Assim, deve-se pensar em um trabalho que privilegie o desenvolvimento da

competência dialógica e reflexiva dos educandos, e ao mesmo tempo trabalhar com

estratégias que priorizem a tomada de consciência dos alunos quanto aos seus

próprios sentimentos e emoções.

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As atividades práticas experienciais permitem a construção de conhecimentos

e valores a partir das próprias experiências sociais. Estudos do meio são propostas

que se aproximam deste tipo de experiência. Por exemplo, quando os próprios

alunos investigam causas, conseqüências e possíveis maneiras de atuar

socialmente na resolução de um problema que está envolvendo sua comunidade, ao

mesmo tempo em que utilizam a experiência para conhecer as informações

científicas e sociais relativas a tal problema.

De acordo com Araújo (2001), as diferentes maneiras metodológicas de se

trabalhar os conteúdos escolares se complementam quando as vemos

articuladamente e não de forma fragmentada. Assim, a metodologia das aulas

juntamente com a reorganização curricular da escola, assumem um importante papel

na diminuição dos casos de indisciplina escolar. Aulas dinâmicas, dialógicas, a partir

de experiências concretas dos alunos diminuem a probabilidade de incidência de

comportamentos julgados indisciplinados.

Em uma relação fundamentada pelo respeito mútuo, o sentimento que

prevalece é o amor. O amor ou a afetividade existente nas relações interpessoais

permite que o medo presente na relação não seja o da punição, e sim o de decair

diante dos olhos do sujeito respeitado. Medo este, característico do sujeito

autônomo, capaz de regular suas relações na reciprocidade e na consideração por

outras pessoas.

Numa sala de aula, onde não seja necessário utilizar-se de punições e

ameaças autoritárias, é esse o tipo de respeito que pauta as relações interpessoais,

estabelecendo assim, relações mais harmônicas. Nesta sala de aula, não há lugar

para atos de indisciplina, pois o respeito ao próximo prevalece nas relações

interpessoais.

Araújo (2001), coloca ainda, que existe um outro elemento comum encontrado

na origem entre o amor e o temor sentidos por quem respeita o próximo, que é a

admiração. Este sentimento é condição para o respeito. Pode-se admirar tanto quem

se ama, quanto quem nos maltrata, e segundo o autor, é este sentimento que serve

de elo entre o amor e o medo presentes no sentimento de respeito.

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Desde o nascimento, o sujeito realiza trocas interpessoais e a

intelectualização dos sentimentos, organizando-se assim, cognitivamente, os

valores, a partir dos julgamentos de valor que este sujeito realiza. Tais valorações se

organizam em escalas normativas de valores que fazem, muitas vezes, com que o

sujeito passe a agir de acordo com eles. Nesse sentido, cada um constrói seu

sistema próprio de valores, os quais podem “posicionar-se” mais centrais ou mais

periféricos na identidade. Segundo Araújo, são os valores centrais que influenciam a

conduta de cada um.

Dessa forma, uma escola consciente de seu papel formativo e instrutivo, que

se propõe a desenvolver uma educação voltada à cidadania tem como

responsabilidade: “propiciar a oportunidade para que seus alunos interajam

reflexivamente e na prática sobre valores e virtudes vinculados à justiça, ao

altruísmo, à cidadania e à busca virtuosa da felicidade”.

Tais valores são definidos como valores universalmente desejáveis. Aqui, o

autor defende a idéia de que os princípios e valores referidos na Declaração

Universal dos Direitos Humanos, por exemplo, embora não devesse ser imposto a

qualquer cultura, eles devessem ser desejáveis no sentido da sua universalização

no contexto social. Para o autor, os princípios contidos nesta declaração pode ser

um guia de referência para a elaboração de projetos educativos que almejem uma

educação direcionada à cidadania e à construção de personalidades morais

autônomas e críticas.

Alunos que constroem tais valores provavelmente tenderão a agir no mundo

respeitando os colegas, a escola e a sociedade. Poderão, assim, evitar os

comportamentos anti-sociais, julgados indisciplinados.

Araújo (2001) coloca que a auto-estima pode ser mais negativa ou positiva,

sem padrões definidos, com conseqüências visíveis sobre as interações do sujeito

com o mundo e consigo mesmo.

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Assim, uma forma colocada pelo autor, de se trabalhar tal realidade, mais

uma vez é, através da democratização das relações escolares, excluindo o

autoritarismo. Os educadores, em suas salas de aula, podem aproveitar aquilo que

os alunos trazem de positivo, valorizando suas experiências e interesses do mundo

não-escolar, tentando direcionar a energia desses alunos para projetos socialmente

relevantes. Com isso, o autor tem obtido ótimos resultados com alunos agressivos e

indisciplinados que, ao sentirem-se valorizados pelo professor, mudam seu

comportamento e ainda, passam a valorizar o espaço escolar.

A união de todos os aspectos, citados até aqui, juntamente com o resgate e a

valorização dos aspectos positivos que são encontrados na personalidade de cada

um, pode, com segurança, reforçar a auto-estima das pessoas. Com isso, a escola

passará a ser mais prazerosa, terá maior significado para alunos e professores,

podendo alcançar seu objetivo maior, a construção de personalidades morais

autônomas e críticas, através do resgate e da valorização da cidadania, reduzindo

sensivelmente os atos de indisciplina dentro das salas de aula. Objetivo, do qual irá

suscitar como necessidade o surgimento de mais um aspecto a ser levantado, o

sexto aspecto que será comentado a seguir: o autoconhecimento.

Segundo Araújo (2001, p. 157), “a construção de consciências autônomas

passa pela construção de processos de auto-regulação que permitem ao sujeito

dirigir a própria conduta por si mesmo”. Além disso, o sujeito é capaz de perceber

com maior sensibilidade seus próprios sentimentos e emoções.

De acordo com o autor, cabe à escola desenvolver um trabalho com

metodologias e conteúdos de aula que explorem a reflexão, o diálogo, a percepção e

a regulação dos próprios sentimentos e emoções, a fim de desempenhar um papel

importante nesse processo de construção do autoconhecimento, de construção de

valores morais universalmente desejáveis e de auto-respeito, aspectos importantes

para o exercício competente da cidadania, bem como para o enfrentamento dos

distúrbios de indisciplina, tão freqüente nos últimos tempos, no cotidiano escolar.

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Como vimos até aqui, uma escola direcionada ao autoritarismo não contribui

para a formação de personalidades morais autônomas e críticas, nem muito menos

leva à construção da cidadania.

Desta forma, envolve-se a participação de todos nos processos decisórios, ao

passo que democratiza a convivência do grupo e as relações interpessoais. De

acordo com Araújo (2001), a implementação de tais procedimentos promoverá a

mudança nas relações de poder e a conseqüente construção da cidadania.

Um caminho para se enfrentar a indisciplina seria através do reconhecimento

dos alunos como possíveis parceiros de uma jornada política que tem como meta a

construção de uma sociedade mais justa. Assim, diz o autor:

“As relações na escola devem ser de respeito mútuo, a diversidade

dos interesses pessoais e coletivos deve ser valorizada, e a escola

deve buscar construir uma realidade que atenda aos interesses da

sociedade e de cada um de seus membros” (ARAÚJO, 2001, p.158).

Enfim, uma análise multidimensional da realidade escolar e dos fenômenos

de indisciplina, a partir do referencial da Teoria da Complexidade, permite-nos

compreender que tais teorias, se vistas como complementares e interrelacionadas,

auxiliam na compreensão das razões subjacentes aos comportamentos descritos

nas cenas relatadas. Cada explicação, por si só, é uma verdade parcial, que

apresenta uma leitura possível do quadro tecido de eventos, ações, interações,

retroações, determinações e acasos que permeavam aquela sala de aula.

Tal verdade associada às demais verdades parciais ajudam a compor um

quadro de totalidade com significado complexo que vai além da soma das partes

que o compõem. Enxergar a totalidade do quadro, porém, não significa

desconsiderar a importância das análises sobre os aspectos parciais presentes e

perceber que a visão do todo influencia a leitura dos elementos parciais. Esta é a

unidade complexa que este paradigma permite vislumbrar: a idéia de que as partes

estão no todo e o todo está nas partes.

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Para compreender as relações de indisciplina naquela sala de aula podemos

buscar explicações pontuais a partir de referenciais que ajudam na explicação de

determinados aspectos, o que não está equivocado em uma perspectiva de

simplificação. Pode-se, porém, articulá-los. Se esta leitura perturba àqueles que

gostariam de encontrar explicações simples, ou soluções simplistas para a questão

das indisciplinas escolares, ela é coerente com a idéia do pensamento complexo. A

complexidade, na verdade, aponta problemas e não soluções. Ela está atrelada a

confusões, incertezas e desordens. Entender o cotidiano de uma sala de aula e os

comportamentos disciplinados e indisciplinados ali presentes, remete-se

necessariamente à busca de referenciais como esse e deve nos afastar de buscas

simplistas que mutilam e cegam a realidade.

CAPÍTULO IV – INDISCIPLINA ESCOLAR E O PAPEL DO PSICOPEDAGOGO

Alguns fatores dificultam o processo e progresso da aprendizagem de

educandos na escola, fato esse o não entendimento de onde provem tal natureza do

conhecimento e o que aprendem na escola. A falta de aulas significativas e de

interesse dos educandos contribui para a indisciplina crescendo considerável dentro

das instituições escolares, se soubéssemos usar das varias maneiras que a criança

tem na comunicação poderíamos compreender melhor nossos educandos. Com

certeza as aulas poderiam ser mais agradáveis se solicitássemos de nossos próprios

educandos e pais em saber quais assuntos poderiam estar no planejamento escolar.

O trabalho psicopedagógico atua não só no interior do aluno ao sensibilizar

para construção do conhecimento, levando em consideração os desejos do aluno,

mas requer também uma transformação interna do professor. Para que o professor

se torne um elemento facilitador que leve o educando ao desenvolvimento da

autopercepção, percepção do mundo e do outro, integrando as três dimensões, deve

estar aberto e atento para lidar com questões referentes ao respeito mútuo, relações

de poder, limites e autoridade. Quando se fala da profissão professor, não se pode

deixar de enfatizar a “Influência do Professor e do ambiente escolar” na vivência dos

alunos.

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A seriedade profissional do professor se manifesta quando compreende o seu

papel de instrumentalizar dos alunos para a conquista dos conhecimentos e sua

aplicação na vida prática; incute-lhes a importância do estudo na superação das

suas condições de vida; mostra-lhes a importância do conhecimento das lutas dos

trabalhadores, orienta-os positivamente para as tarefas da vida adulta. Tais

propósitos devem ser concretizados na prática, através de aulas planejadas nas

quais se evidenciem a segurança nos conteúdos e nos métodos de ensino; a

constância e firmeza no cumprimento das exigências escolares pelos alunos; o

respeito no relacionamento com os alunos.

Temos o paradigma de que o professor ao mesmo tempo em que não deve

contemporizar com a negligência e com o descumprimento dos deveres, deve estar

atento para o bem relacionamento humano com os alunos. O respeito se manifesta,

pois, no senso de justiça, no verdadeiro interesse pelo crescimento do aluno, no uso

de uma linguagem compreensível, no apoio às suas dificuldades, nas atitudes firmes

e serenas.

O ambiente escolar pode exercer também um efeito estimulador para o

estudo ativo dos alunos. Os professores precisam procurar unir-se a direção da

escola e aos pais para tornar a escola um lugar agradável e acolhedor.

Quando os professores de uma unidade escolar sentam-se com seus alunos

e desconstróem e sabem reconstruir a plenitude da significação e dos tipos de

disciplina, não apenas a aula corre mais facilmente e a aprendizagem se concretiza

de maneira mais saborosa como estudantes e mestres descobrem que,

reconhecendo a disciplina como ferramenta essencial às relações interpessoais,

aprendem autonomia, exercitam a firmeza e conseguem, com mais dignidade,

construir o caráter.

Todos nós, professores, já estudamos as tendências pedagógicas da

educação brasileira e sabemos que, em cada período da história, o professor, o

aluno e a direção da escola se comportam de uma maneira diferente. Da mesma

forma, os métodos de ensino, os conteúdos que ensinamos não são os mesmos.

Isso acontece porque a Educação está inserida num contexto muito mais amplo que

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é a sociedade e, é claro, ao mesmo tempo em que sofre influências desta, também

ratifica ou colabora para a transformação de algumas práticas sociais. Em suma,

para cada tempo, novos desafios. O problema da indisciplina pode não estar no

aluno nem no professor, mas na relação que os une, que é o conhecimento. Sendo

assim, a prática psicopedagógica deve apoiar-se em bases teóricas sólidas, mas

deve também adotar um pensamento dialético e contextualizado.

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CONCLUSÃO

Como conclusão deste trabalho, que não pretende uma proposta de solução

para a indisciplina na sala de aula, mas busca-se apresentar alguns caminhos para

refletir sobre ela, alguns pontos podem ser levantados: em primeiro lugar a presença

dos chamados alunos-problema; em segundo a necessidade de se reinventar o

trabalho pedagógico a cada dia e o papel do professor nesta reinvenção assim como

seu compromisso com seus alunos.

Finalmente se coloca a complexidade do problema indisciplina na sala de aula

bem como a teia imbricada de relações que o ocasionam e sobre as quais vale

refletir.

Na condição de pesquisadora, todo o tempo, em que se esteve

desenvolvendo essa investigação, procurou-se manter a neutralidade, não se

deixando influenciar por comentários advindos dos professores da turma, em que

seriam realizadas as observações. Tais comentários, de uma forma ou de outra,

acabavam por rotular determinado aluno da turma como “impossível, sem conserto,

indisciplinado, que contaminava os membros da classe, sem limites”, ou seja, um

aluno com problemas que acabava por desencadear a indisciplina em sala de aula.

Segundo alguns professores, um aluno com problemas que chega a

desencadear indisciplina em toda uma turma, em sala de aula, constitui dos

principais obstáculos para o trabalho docente. Esses profissionais, por sua vez,

acabam tomando-o como um impeditivo de seu trabalho em sala de aula, quando,

na verdade, poderia ser tomado como foco do trabalho pedagógico, um desafio,

para se descobrir formas prazerosas de desenvolver um bom trabalho com as

turmas em que tais alunos estão presentes. A sala de aula pode ser o lugar onde o

pensamento se demora por um instante a fim de deglutir, ruminar e tomar coragem

para rasgar experiências repetidas.

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É necessário fazer de tudo isso um campo de experimentação e explicitação

da humanidade que nos habita, e levá-la ao seu limite máximo, criando novas

configurações humanas.

Desse modo, poder-se-ia afirmar que a questão mais urgente da educação,

nos dias atuais, não seria somente a de garantir o acesso a toda e qualquer criança

em idade escolar a uma sala de aula, e sim, fazer com que as que lá se encontram,

lá permaneçam.

Nesse sentido, cabe à ação docente a compreensão do aluno que é tomado

como problema, como um porta-voz de relações ambíguas, bem como a

permeabilidade à mudança e à experimentação de novas estratégias que

potencializem o binômio competência/prazer como um tipo de dever do dia-a-dia.

É preciso reinventar continuamente os conteúdos, as metodologias, as

relações, o cotidiano. Dessa forma, para que o aluno possa acompanhar as

mudanças que hoje se fazem presentes, far-se-á necessário adequar-se a um outro

tipo de disciplina, que não mais será a do silenciamento, da obediência e da

resignação, mas sim uma disciplina que evoque afinco, vontade de conhecer,

persistência, em que a chamada “indisciplina” possa ser tomada como um

movimento organizado, e o barulho, a agitação e a movimentação, que antes eram

considerados “vilões”, passam a ser catalisadores do ato de conhecer.

Isso vai exigir do educador, uma conduta dialógica, uma maior flexibilização

das funções institucionais e das relações. A negociação entre educador e aluno se

fará permanente, o que não significa que o professor tenha que ceder a tudo que o

aluno desejar, pois isso seria um posicionamento completamente permissivo.

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Nesse sentido, faz-se necessário valorizar os conhecimentos vivenciados no

cotidiano e trazidos à escola pelos alunos, a partir de sua história de vida e de seus

interesses pessoais, colocando-os no centro da contextualização dos conteúdos

trabalhados em sala de aula. Assim, tais conhecimentos darão maior significado à

aprendizagem dos alunos e poderão fazer com que a intensidade dos

comportamentos indisciplinados em sala de aula diminua.

Este trabalho procurou trazer para o centro do debate que a indisciplina não é

de responsabilidade somente de alunos e alunas.

A partir das idéias da complexidade que se discutiu, e do fato de que muitos

fenômenos são percebidos como multidimensionais, não tendo causas únicas ou

simples, é importante a escola assumir seu papel nesse processo. Os

comportamentos sociais inadequados, geralmente definidos como de indisciplina e

que foram bem caracterizados nas cenas do cotidiano observado, não podem ser

analisados de forma reduzida ou disjuntiva. Culpabilizar ora o aluno, ora a família,

não permitirá encontrar caminhos viáveis para seu enfrentamento. É importante

perceber que essa escola “tradicional” que se conhece, não contribui para que

alunos e alunas tenham prazer de ali estar e se envolverem com seu próprio

aprendizado e desenvolvimento.

Com base no que foi estudado até o momento, tratando da questão da

indisciplina na escola, podemos concluir, que realmente trata-se de um tema de

enorme complexidade. Tal complexidade se justifica, também, pelo fato de envolver

um grande número de interações organizadoras entre as unidades elementares que

o constitui.

Pensar a indisciplina sob a ótica do pensamento complexo, corresponde

integrar, o máximo possível, os modos simplificadores de pensar e aspirar ao

conhecimento multidimensional. Significa também pensar em um fenômeno que

possui uma quantidade extrema de interações e interferências estabelecidas entre

um grande número de unidades, que envolvem incertezas, indeterminações e

fenômenos aleatórios.

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Nesse sentido, a indisciplina, que é complexa por essência, influi e é

influenciada pelas partes e aspectos que a definem e a constituem. Sendo assim é

urgente repensá-la, a partir de uma visão de totalidade, que a torne envolvida com

as partes e os recortes, mas sempre considerando-se as partes e um todo uno,

múltiplo e complexo, ao mesmo tempo, bem como a rede de relações existentes em

uma sala de aula. O psicopedagogo ajuda a promover mudanças, intervindo diante

das dificuldades que a escola nos coloca, trabalhando com os

equilíbrios/desequilíbrios e resgatando o desejo de aprender.

BIBLIOGRAFIA

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