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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” AVM FACULDADE INTEGRADA AS CONTRIBUIÇÕES DA PSICOPEDAGOGIA PARA O MELHOR DESENVOLVIMENTO DE ALUNOS ESPECTRO AUTISTA. Por: KELLY PEREIRA COSTA Orientador: Profª Fabiane Muniz Rio de Janeiro 2014 UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” AVM FACULDADE INTEGRADA AS CONTRIBUIÇÕES DA PSICOPEDAGOGIA PARA O MELHOR DESENVOLVIMENTO DE ALUNOS COM ESPECTRO AUTISTA DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

AS CONTRIBUIÇÕES DA PSICOPEDAGOGIA PARA O MELHOR

DESENVOLVIMENTO DE ALUNOS ESPECTRO AUTISTA.

Por: KELLY PEREIRA COSTA

Orientador:

Profª Fabiane Muniz

Rio de Janeiro

2014

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

AS CONTRIBUIÇÕES DA PSICOPEDAGOGIA PARA O MELHOR

DESENVOLVIMENTO DE ALUNOS COM ESPECTRO AUTISTA

DOCUMENTO PROTEGID

O PELA

LEI D

E DIR

EITO AUTORAL

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Apresentação de monografia à AVM Faculdade Integrada

como requisito parcial para obtenção do grau de

especialista em Psicopedagogia.

Por: Kelly Pereira Costa

AGRADECIMENTOS

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Agradeço a Deus por me proporcionar a possibilidade de

realizar este Curso e ao meu amado esposo Wilcimar que

me apoiou e me auxiliou durante a elaboração deste

trabalho.

RESUMO

O trabalho com autistas tem sido pouco explorado na sociedade e

carece de informações para o auxílio dos professores em âmbito escolar. Os autistas

fazem parte do grupo de pessoas portadoras de deficiências, exigindo assim uma

educação especial e inclusiva para a promoção de seu desenvolvimento.

Sabe-se que atualmente, os autistas não têm recebido a atenção

necessária e devida e por isso, o seu desenvolvimento e inserção na sociedade se

mostram tão longe do ideal e esperado. Tendo em vista tais aspectos, o enfoque

principal deste trabalho é proporcionar informações claras e objetivas acerca do

autismo, visando também, por meio da pesquisa investigativa, reconhecer o nível de

conhecimento dos professores, vistos como educadores, em relação ao tema e suas

capacitações para permearem tal educação. Para isso, foram enviados

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questionários para professores de dezenove escolas, das séries iniciais do ensino

fundamental, retornando trinta e oito questionários respondidos.

Mediante os resultados, observa-se que a maioria dos professores

não possui conhecimento suficiente e adequado para lidar com autistas em sala de

aula, não tendo base para desenvolver um trabalho eficaz com esses alunos.

Também nos parece claro que é de competência do professor e dos órgãos

responsáveis pela educação a busca e a oferta por cursos de formação continuada

em serviço, uma vez que ainda em quantidade pequena, estes alunos já se fazem

presentes nas salas de aula.

METODOLOGIA

Para a realização desta pesquisa foram feitas leituras que auxiliaram

no desenvolvimento da monografia. Foi feita pesquisa de campo na escola, com o

intuito de descobrir como lidar com o autista, entrevistas com professoras,

psicólogas, psicopedagogas com o propósito de descobrir o ponto-de-vista de cada

um. Quanto ao tema, foram buscadas novas fontes para trabalhar com o autismo na

educação infantil.

Através da pesquisa de campo e na sala de aula, até mesmo na rua e

em casa, aprendemos a lidar com crianças autistas e estabelecer comunicação,

relacionar e conviver com tal deficiência.

As entrevistas realizadas com funcionários foram feitas pessoalmente,

objetivando saber como cada um vê e lida com o indivíduo e como trabalham o

desenvolvimento de cada criança com esta deficiência.

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Aprendemos qual a melhor maneira de se trabalhar a inclusão de um

autista em sala de aula.

SUMÁRIO

Introdução............................................................................................................... 7

I – Autismo e Educação escolar.............................................................................. 9

1.1 - Autismo :um olhar pedagógico ...................................................................... 9

1.2 – Marcos históricos da educação inclusiva ..................................................... 11

1.3-Formação e saberes para o trabalho docente................................................. 12

II –Ideias e atividades pedagógicas....................................................................... 18

2.1 – O primeiro passo do professor :conhecer seu aluno.................................... 19

2.2 – Autismo e práticas pedagógicas.................................................................... 24

2.3 – Autismo e processos de aprendizagem......................................................... 35

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III – A Afetividade no processo da aprendizagem................................................... 43

3.1 – A afetividade segundo Wallon..........................................................................43

3.2 – A importância da afetividade em sala de aula..................................................48

3.3 – O auxilio afetivo para o desenvolvimento das habilidades de

portadores de Espectro Autista.................................................................................50

Considerações finais..................................................................................................51

Referências Bibliográficas..........................................................................................52

ÍNDICE ......................................................................................................................53

FOLHA DE AVALIAÇÃO ...........................................................................................54

INTRODUÇÃO

Durante todo o seu desenvolvimento, o ser humano é submetido a

diversos tipos de aprendizagens, sejam estas para andar, falar, correr e etc. A

aprendizagem é um processo que estimula a mudança de comportamento em todo

ser. Esta por sua vez, ocorre a partir das experiências construídas por todos, pois se

constrói relações de ordem emocional, afetivas e principalmente com o mundo

exterior, ou seja, aprender é o resultado da interação entre estruturas mentais e o

meio em que se vive.

Muito se fala no termo dificuldades de aprendizagem ou transtornos

de aprendizagem, termo esse que nos deixa, enquanto educadores, preocupados

quando recebemos em nossas salas de aula alunos com estas bagagens.

Vários profissionais da área de educação estão focados em situações

que envolvam aprendizagem, entre eles: psicopedagogos, fonoaudiólogos,

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neurologistas infantis, pediatras, mas o que mais teme em lidar são os professores.

Pois cabe a eles, o papel primordial e fundamental, que é de fazer com que estes

alunos venham aprender. Daí surgem as dúvidas e os questionamentos, do porquê

boa parte da turma aprende e aquele sujeito, aquele ali, que muitas vezes é assíduo

nas aulas, demonstra interesse, não consegue acompanhar o restante do grupo.

O professor busca exercer um papel de mediador das construções de

aprendizagens, mas muitas vezes, ele não compreende tal dificuldade, o que

dificulta tornar o processo mais amplo, que caminhe. E é nesse momento, de

extrema importância, que aparece o papel do psicopedagogo institucional, que

juntamente com este professor irá pesquisar as causas destas dificuldades, a fim de

proporcionar uma possível solução e encaminhar para o profissional adequado que

realizará um possível tratamento.

Cada criança tem o processo de desenvolvimento diferente, algumas

aprendem com maior facilidade enquanto outras aprendem mais devagar. E nesse

momento que é de fundamental importância que o professor analise individualmente

cada criança para poder adequar os conteúdos conforme a necessidade de cada

um. As mudanças de estratégias de ensino podem contribuir para que todos

aprendam. Em alguns casos, as estratégias de ensino não estão de acordo com a

realidade do aluno.

A prática do professor em sala de aula é decisiva no processo de

desenvolvimento dos educandos.

O psicopedagogo tem um papel relevante na abordagem e solução dos

problemas de aprendizagem, pois ele não busca culpados e sim procura avaliar a

situação da forma mais eficiente e proveitosa. A fim de se criar estratégias que

auxiliem o professor a melhor trabalhar com seus alunos que apresentarem alguma

dificuldade de aprendizagem. Dessa forma o psicopedagogo institucional passa a se

tornar uma ferramenta poderosa no auxílio da aprendizagem.

O psicopedagogo é extremamente importante na

instituição escolar, pois este profissional estimula o desenvolvimento de relações

interpessoais, o estabelecimento de vínculos, a utilização de métodos de ensino

compatíveis com as mais recentes concepções a respeito desse processo. Procura

envolver a equipe escolar, ajudando-a a ampliar o olhar em torno do aluno e das

circunstâncias de produção do conhecimento, ajudando o aluno a superar os

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obstáculos que se interpõem ao pleno domínio das ferramentas necessárias a leitura

do mundo. Portanto, o profissional da Psicopedagogia propõe e

auxilia no desenvolvimento de projetos favoráveis às mudanças educacionais,

visando à descoberta e o desenvolvimento das capacidades da criança, bem como

pode contribuir para que os alunos sejam capazes de olhar esse mundo em que vive

de saber interpretá-lo e de nele ter condições de interferir com segurança e

competência.

O presente estudo pretende demonstrar como o olhar psicopedagógico

dentro de uma instituição escolar, pode favorecer e prevenir causas que acabam se

transformando em dificuldades ou transtornos de aprendizagem.

Segundo Bossa (2000, p. 14), o processo de aprendizagem precisa ser

prazeroso para os alunos, se não ocorre assim, se torna turbulento. Caracterizando

em resultados negativos e desastrosos ao longo do ano.

O objetivo principal deste estudo é demonstrar a importância que o

profissional de psicopedagogia exerce dentro do ambiente escolar. Como sua

atuação poderá facilitar e orientar toda a equipe escolar, com estratégias que

favoreçam o sucesso dos alunos dentro das salas de aula.

Capitulo I

Autismo e Educação Escolar

No Brasil, o diagnóstico do autismo foi atualmente organizado pelo

CID-10, código internacional de doenças, décima edição. No entanto, é importante

saber que o diagnóstico do Autismo e de outros quadros do espectro são obtidos

através de observação clínica e pela história referida pelos pais ou responsáveis.

Sendo assim, não existem marcadores biológicos que definam o quadro, porém

alguns exames laboratoriais podem permitir a compreensão de fatores associados a

ele, mas ainda assim o diagnóstico do autismo é clínico. Além da CID-10, outros

manuais procuraram organizar o entendimento das doenças. Entre eles, tem sido

bastante utilizado o Manual de Classificação de Doenças Mentais da Associação

Americana de Psiquiatria, DSM, que é relativamente parecido com o CID-10. Sua

nova edição, lançada em 2013, prevê muitas modificações na organização

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do diagnóstico do autismo A presença, via observação clínica e relatos do(s)

cuidador(es), de uma história de interesses fixos, rotinas ou rituais e

comportamentos repetitivos, aumenta consideravelmente a estabilidade do espectro

do autismo ao longo do tempo, e reforça a diferenciação os outros transtornos.

1.1. Autismo: um olhar pedagógico

Segundo a leitura do livro “ Autismo na escola. Um jeito diferente de

aprender. Um jeito diferente de ensinar.”, do autor Eugenio Cunha. Que narra a

história de um menino com transtorno do espectro autista, onde o chamam de Léo,

aprende em uma escola inclusiva. Anteriormente, fora uma criança não verbal, com

momentos de autoagressão e com pouquíssima interação social. Alguns diziam que

seu autismo era severo e que jamais poderia estudar em uma escola regular. Mas,

seus pais não viam assim, nem seus professores que estavam sempre pontuando

as suas características. "Educação escolar, terapêutica e alimentar": foi o que

disseram e fizeram. O quadro severo passou a fazer parte do passado. Léo

começou a frequentar uma sala do ensino regular, aprendendo com os demais da

sua idade. Hoje, sua interação em sala de aula é tão natural que faz esquecer o

transtorno.

Pode-se ver a história de Léo como "autismo com sintomas revertidos";

amplamente revertidos. Sabe- se que não é sempre assim . Há casos cuja

severidade luta contra a esperança e capacidade. Mas, ainda assim, o trabalho

poderá suscitar ganhos, e todo ganho será sempre um progresso. Não se deve

acreditar em educação infértil e sim em uma educação que seja realista, não

conformada, mas ousada e possível, capaz de mudar com muito esforço e

dedicação.

Segundo Cunha (2008), alunos autistas respondem bem aos sistemas organizados. Por isso, o professor deve organizar a sala de aula para efetivamente conseguir ensinar estes alunos.

E ainda de acordo com o autor, outro fator determinante para se obter

sucesso, é a parceria da escola com a família. Este é um ponto importante em toda

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a educação. Muitos trabalhos não chegam a bom termo porque não há uma

participação ativa desses dois núcleos ou, em muitos casos, ocorre o rompimento

dessa unidade durante o processo de inclusão escolar.

É pertinente relatar um aspecto peculiar no aprendizado de Léo:

inicialmente, havia uma resistência para escrever não queria nem segurar o lápis.

Pouco escrevia. Crianças que, nos primeiros anos, aprenderam mecanicamente por

estímulo e reforço podem nutrir nos anos subsequentes aversão à escola, até ao

ponto de desistirem de estudar. Era o que acontecia ao menino: não queria

escrever, não queria aprender a escrever, não queria pegar o lápis sem motivação

nenhuma. Brincava com bonecos e interagia com os personagens que eles

representavam. Foi quando a professora lhe propôs que escrevesse uma carta para

um daqueles personagens que ele tanto gostava: tratava-se do cow-boy Woody, do

desenho "Toy Story”. Foi o que ele fez com dedicação e assinatura, porque

escrever, naquele momento, passou a ser significativo passou a ser uma coisa

importante pra ele.

Não há necessidade de esquemas complexos ou mirabolantes para

aplicar ideias pedagógicas. O cotidiano de um professor é feito de coisas simples.

Quanto mais associarmos a prática escolar a conteúdos significantes, mais

tornaremos a experiência do aprendizado significativa. A aprendizagem significante

não somente generaliza o aprendizado, mas faz igualmente o aluno generalizar a

experiência escolar.

A leitura de mundo, como afirma Freire (2002), precede a leitura da

palavra. Isso ocorre na educação especial ou na educação regular. Na verdade,

pode-se dizer que não podemos incluir sem trazer para a sala de aula a leitura de

mundo do aprendente.

Muitos alunos com autismo carecem de uma aprendizagem

significativa e repetitiva, onde até que o indivíduo tenha o pleno domínio do

aprendizado. Entretanto, tal procedimento deve prover o controle do educando sobre

o seu comportamento, não do professor sobre o aluno, trazendo-lhe segurança e

instrumentando a sua inclusão escolar e social. Mas, como lidar com o autismo na

escola? Essa é a primeira questão a abordar.

1.2. Marcos históricos da educação inclusiva

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O transtorno do espectro autista compreende um conjunto de

comportamentos agrupados em uma tríade principal, segundo Cunha (2008):

1- comprometimentos na comunicação;

2- dificuldades na interação social; e

3- atividades restritas e repetitivas (uma forma rígida de pensar e estereotipar).

Os sintomas variam muito de indivíduo para indivíduo. Em alguns

quadros, há o acometimento de convulsões, já que o transtorno pode vir associado a

diversos problemas neurológicos e neuroquímicos.

Aparece desde o nascimento ou nos primeiros anos de vida,

proveniente de causas ainda desconhecidas, mas com grande contribuição de

fatores genéticos. Trata-se de uma síndrome tão complexa que pode haver

diagnósticos médicos abarcando quadros comportamentais diferentes. Isto porque o

autismo varia em grau de intensidade e de incidência dos sintomas. Tal

heterogeneidade tem levado a revisão das diretrizes para o seu diagnóstico,

inclusive com a mudança da nomenclatura para "Transtorno do Espectro Autista”.

O diagnóstico precoce é o primeiro grande instrumento da educação.

O que torna o papel docente fundamental, pois é na idade escolar, quando se

intensifica a interação social das crianças, que é possível perceber com maior

clareza singularidades comportamentais por isso o professor tem de estar com um

olhar bem amplo para aquela criança. Será sempre pertinente o professor ou a

professora observar atentamente seu aluno, quando este apresentar algumas das

seguintes características comportamentais:

• Retrair-se e isolar-se das outras pessoas;

• Não manter contato visual

• Desligar-se do ambiente externo;

• Resistir ao contato físico;

• Inadequação a metodologias de ensino;

• Não demonstrar medo diante de perigos;

• Não responder quando for chamado;

• Birras;

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• Não aceitar mudança de rotina;

• Usar as pessoas para pegar objetos;

• Hiperatividade física;

• Agitação desordenada;

• Calma excessiva;

• Apego e manuseio não apropriado de objetos;

• Movimentos circulares no corpo;

• Sensibilidade a barulhos;

• Estereotipias;

• Ecolalias;

• Ter dificuldades para simbolizar ou para compreender a linguagem simbólica;

• Ser excessivamente literal, com dificuldades para compreender sentimentos e

aspectos subjetivos de uma conversa.

1.3-Formação e saberes para o trabalho docente

A formação do educador e o seu conhecimento científico a respeito do

assunto tornam-se essenciais para a identificação da síndrome. Da mesma sorte,

sua capacitação pedagógica no exercício docente possibilitará uma educação

adequada. Apesar de níveis de comprometimentos dissimilares, é comum o aluno

com autismo apresentar algumas características mais marcantes que inicialmente

poderão interferir na sua aprendizagem: o déficit de atenção, a hiperatividade, as

estereotipias e os comportamentos disruptivos.

O que fazer diante delas? O primeiro passo a ser dado pelo professor,

será o de conhecer seu aluno, seus afetos, seus interesses. Isso possibilitará a

instituição de exercícios, atividades e afazeres que ajudarão a canalizar a sua

atenção. Com efeito, a partir do princípio afetivo da atividade pedagógica, o

professor encontrará recursos para a superação do quadro de hiperatividade e de

déficit de atenção. Não se trata de uma regra, mas de um caminho, pois o afeto traz

o interesse para os movimentos de ensino e aprendizagem. Quais atividades o aluno

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gosta de fazer? Como utilizá-las para desenvolver sua atenção? São perguntas que

irão ser respondidas nesse percurso.

Outro sistema de instrução com base visual é o programa educacional

TEACCH (Treatment and Education of Autistic and Related Communication

Handicapped Children). É um programa altamente estruturado que combina

diferentes materiais visuais para aperfeiçoar a linguagem, o aprendizado e reduzir

comportamentos inapropriados. Áreas e recipientes de cores diferentes são

utilizados para instruir as crianças sobre, por exemplo, o lugar apropriado para elas

estarem em certo momento e qual a correspondente sequência de atividades,

durante o dia, na escola. Os componentes básicos são adaptados para servirem às

necessidades individuais e ao perfil de desenvolvimento da criança, avaliados pelo

PEP-R (Psychoeducational Profile-Revised).

Em alguns casos, dois minutos de atenção será um grande passo.

Não importa tanto o espaço de tempo, importa mais o desenvolvimento da

capacidade de concentração. Trabalhos artísticos estimulam o foco de atenção de

qualquer aprendente, pois demandam a concentração, servindo como mediação

pedagógica. Na pintura, no desenho, nas atividades com massa ou na música, os

canais sensoriais são os melhores receptores da aprendizagem.

E quanto às estereotipias? Elas podem expressar alegria, emoções,

ansiedades, frustrações e momentos de excitação. Por outro lado, em razão delas, o

indivíduo priva-se de experiências motoras maturativas, ocasionando a regressão e

o bloqueio de habilidades. Diante disso, a observação das estereotipias deve ser

feito com todo o cuidado e sensibilidade. Evitando-se o cerceamento e a irritação, é

primordial inibir a constante recorrência aos movimentos estereotipados,

substituindo-os por movimentos adequados, de cunho simbólico e social, que

produzirão progressos na área cognitiva, motora e comunicativa.

Se o estudante demonstra sua alegria com flaps compulsivos, ele

poderá aprender a expressá-la com palmas, por exemplo. Trata-se de uma

expressão social. As estereotipias são regressivas. Há casos em que elas foram

substituídas totalmente.

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No que tange aos comportamentos disruptivos, pode-se pensar que

será extremamente difícil - em um contexto de sala de aula repleta de alunos - um

docente conduzir todo o processo pedagógico solitariamente. Por isso, é tão

importante uma formação profissional, capacitação humana e de políticas públicas

que dêem condições práticas às escolas no exercício da educação inclusiva.

Porém o docente ainda terá algumas alternativas pedagógicas que poderão ajudá-lo:

• Não se alterar e não valorizar as reações excessivas;

• Redirecionar a atenção e a ação do aluno;

• Falar baixo, manter o mesmo tom de voz e o contato visual;

• Corrigir ensinando, não reprimindo;

• Disciplinar a atividade e não imobilizar o aluno; ele precisa confiar no seu professor.

Sendo assim, será preciso investigar as atitudes disruptivas a fim de se

descobrirem suas causas. Quanto mais tempo elas durarem, mais difícil será lidar

com elas. Muitos são os fatores que as motivam, dentre os quais, o barulho, a

mudança de rotina e as frustrações. Será preciso incansável perseverança para

redirecionar as atitudes e ensinar uma maneira social de expressar sentimentos e

desejos. A percepção sensorial poderá ser um caminho para tal fim.

O prejuízo na interação é um fator persistente, o aprendente com

autismo cria formas próprias de relacionamento com o mundo social. Em

consequência do convívio, todos nós adquirimos uma mente social. Chegamos a um

local e percebemos de modo global o ambiente, porque aprendemos a ver as coisas

não isoladamente, mas conectadas, em um contexto de relações.

Todavia, na conduta autística, nem sempre isso ocorre. É comum

fixação em detalhes específicos, percebidos menos em razão do conhecimento

social e mais por causa do estímulo que o indivíduo recebe de determinado objeto

ou situação. Isto provoca comportamentos peculiares. Assim, a pessoa com autismo

passa a ter uma relação singular com tudo que é externo. Fixa-se em rotinas que

trazem segurança, não interage normalmente com as pessoas, inclusive com os

pais, nem manuseia objetos adequadamente, gerando problemas na cognição, com

reflexos na fala, na escrita e em outras áreas. Aprende de forma singular. Há uma

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relação diferente entre o cérebro e os sentidos, e as informações nem sempre

geram conhecimento.

Os objetos podem exercer atração não em razão da sua função, mas

em razão do estímulo que promovem. Surge daí o manuseio estereotipado, por

causa do contato sensorial de pouca ingerência cognitiva. Percebe-se uma

fragmentação dos sentidos, em que as sensações sobrepõem à razão, causando a

compulsão e a repetição.

Pode- se concluir que esse quadro de comprometimento pedagógico

requer práticas específicas, direcionadas à aquisição de habilidades necessárias

para a inclusão familiar social e escolar do indivíduo. O aluno carece de uma

educação individualizada, com ênfase na mudança de alguns comportamentos e

aprendizado de outros. Por causa das dificuldades comunicativas, um dos fatores

que mais impede o seu aprendizado é o déficit de atenção à fala de alguém ou aos

processos de ensino.

Em muitos casos, não há autonomia para realizar coisas simples e

cotidianas, como escovar os dentes ou vestir-se. A vida social passa, então, a ter

grande valor pedagógico. A aprendizagem dos usos e costumes torna-se crucial. No

entanto, cada dificuldade poderá servir para inspirar o trabalho na escola, pois cada

dificuldade poderá ser uma habilidade a ser desenvolvida, uma conquista no campo

educacional.

De sorte que a tendência de se fixar em rotinas poderá ser usada,

também, para benefício do aprendente na organização do seu dia, estabelecendo-se

horários de café, almoço, jantar e banho. Ensinar rotinas e regras na família contribui

para orientar a inclusão em distintos espaços sociais. Isto porque cada espaço social

possui regras e normas próprias.

Todavia, as rotinas precisam ser quebradas quando fomentam atitudes

prejudiciais. É tão importantes mantê-las, como também mudá-las, pois as

mudanças fazem parte da vida cotidiana.

Segundo Cunha (2008):

Ao trabalhar em um projeto de atendimento a crianças de família de baixa renda, com poucos recursos. Conhecemos um menino de 10 anos assíduo e profundamente interessado no trabalho que era realizado naquele espaço. Normalmente dócil, o menino não verbalizava adequadamente, gesticulava e apontava na maioria das vezes para estabelecer comunicação. Pelo relato da mãe, descobriu-se que jamais recebera uma educação escolar a contento. Recusado por diferentes escolas, o mais das vezes, era atendido

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por instituições especializadas, sem muitos recursos. Não aprendeu a ler, escrever e falar corretamente. É um quadro muito comum, principalmente na população mais carente. A mãe o trazia sempre no início das atividades. Eram os primeiros a chegar. Todo dia, o garoto entrava, abraçava os educadores e começava a trabalhar. Na verdade, para ele, não era trabalho, era brincadeira. Certa feita, por causa de diversos imprevistos, todos nós que atendíamos naquele espaço nos atrasamos e não havia nenhuma pessoa para abrir a sala. O menino chegou com a mãe, viu a porta fechada e, por não conseguir entrar, sentiu grande aflição. A mudança e a frustração o levou a ter uma reação jamais vista até então: chutou a porta, gritou, correu pela rua, mordeu-se, chegando ao extremo de profunda tristeza e incontrolável choro. Quando ali chegamos, foi possível controlar a situação e restabelecer o exercício pedagógico, porém ficou evidente que a porta aberta significava ao mesmo tempo uma segurança para aquele aluno e a necessidade de mudança de um quadro que não poderia se perpetuar.

Essas situações, com menores ou maiores proporções, são

corriqueiras no espaço escolar. Como educadores, necesita-se preparados para

elas; o aluno com autismo precisa aprender a lidar com elas.Há estudantes que são

tendentes a outros comportamentos e até positivos.

Segundo Cunha (2008), em seu livro narra à experiência vivida com um

aluno do ensino médio, ao qual chamaram de Filipe. Ele sempre gostou de ler sobre

diversos assuntos, principalmente História Geral. Independentemente de estímulos

exteriores, desde mais novo lia tudo que lhe vinha às mãos. Na escola, porém, Filipe

jamais se interessou em realizar as leituras sugeridas nas aulas de História. Não

tinha nada contra as aulas, apenas não via sentido naquilo. Era reticente quando o

professor ou a professora estabelecia os textos da disciplina. Porém, ainda assim,

mesmo não lendo ou lendo pouco, conseguia tirar boas notas nas provas. Um dia,

ele explicou aos colegas o que fazia: por ter um conhecimento prévio sobre diversos

assuntos ligados à matéria, em decorrência do seu cabedal de leitura, Filipe

estabelecia relações com os textos sugeridos em aula. Então, por exemplo, quando

o professor sugeria uma leitura a respeito da Revolução de 1930, o garoto

selecionava as frases mais importantes no texto e as relacionava com seu

conhecimento prévio. Seu saber era ratificado pelas descobertas anteriores, sem

precisar, contudo, ler todo texto. Assim, sobrava-lhe tempo para ler as coisas que

mais gostava que, para ele, tinha alguma função ou sentido e que certamente,

seriam arroladas com muitos conteúdos que ainda iria aprender na escola.

Essas histórias pertencem a inúmeras experiências que ocorrem

cotidianamente. São características da diversidade que aporta no ensino de alunos

com necessidades educacionais especiais. Tais estudantes têm suscitado novas

práticas pedagógicas, necessárias ao movimento de inclusão.

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Apesar de todos os avanços para uma educação mais justa e

universal, os professores ainda vivem sob contradições, com maior ou menor

intensidade, diante da imperiosa situação de educar para a diversidade, mas com as

consequências e os desdobramentos deste ato, em razão da complexidade da

sociedade contemporânea e das carências da sua formação e do seu espaço de

trabalho.

No entanto, o que se refere ao ensino dos educandos com transtorno

do espectro autista, o quadro não se altera. Permanece trazendo dúvidas e

insegurança ao professor, podendo ainda interferir em sua prática. De certo a

educação desses alunos não tem sido efetivada sem conflitos e dificuldades.

Mas, de onde vêm as práticas escolares? Como surgiu o repertório de

conhecimento que hoje é aplicado no ensino do aluno com espectro autista? Ele tem

sido suficiente? Podemos melhorá-lo? E a formação docente? São questionamentos

que acompanham cada educador que busca vencer os desafios encontrados em

suas salas de aulas.

CAPÍTULO II

Ideias e atividades pedagógicas

Quando começamos a trabalhar essas ideias, lecionávamos para

crianças com autismo. Alunos que tinham extrema dificuldade para estabelecer

comunicação, com visível déficit de atenção, hiperativos, alguns com atraso

cognitivo e motor. Eram clássicos, todavia, não deixavam de ser aprendentes e

receptivos ao afeto. Nutriam curiosidades, às vezes, com interesses peculiares.

Então perguntamos: por que não observá-los atentamente e buscar

instâncias que poderão servir de elementos comunicantes? Por que não tentar

descobrir canais sensoriais e afetivos? Afinal, tudo começa pelo afeto. Decerto, no

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contexto do autismo, a qualidade do trabalho em sala de aula iniciar-se-á pela

descoberta do aluno: o que ele faz, deseja e como ele aprende. Portanto, haverá

momentos em que a melhor coisa que o professor poderá fazer será observar seu

aluno, atentar para as suas ações.

Nesse contexto, lembramo-nos de determinado aluno que desejava

descobrir o que aconteceria se deixasse escorrer um pouco de água entre as frestas

do revestimento cerâmico do piso da escola. Como aquele filete de água percorreria

os espaços entre as lajotas? Então, deixamos que ele o fizesse. Atentamente, ele

deixou seus pequenos dedos sentirem a água, olhou ao redor e sorriu. Certamente

foi um comportamento infantil, comum a qualquer criança, mas sem dúvida, tratava-

se de uma curiosidade científica: descobrir os movimentos das coisas. Alguém já

disse e com muita propriedade que o conhecimento nasce da experimentação, da

confrontação, das incertezas, das descobertas. Antes de impedir que o aluno fizesse

tal coisa, seria importante perscrutar o porquê da ação e os seus resultados.

Observar, avaliar e depois mediar as suas reações foi o início do exercício

pedagógico. São etapas concomitantes em nosso trabalho, porém, para as

entendermos melhor, devemos separá-las didaticamente. Segundo Maria

Montessori:

Descobrimos assim que a educação não é aquilo que o professor dá, mas um processo natural que se desenvolve espontaneamente no individuo humano , que não se adquire ouvindo palavras , mas em virtude de experiências efetuadas no ambiente

2.1- O primeiro passo do professor: conhecer seu aluno.

Como pautar a nossa prática pedagógica diante da realidade do aluno

com autismo?

O que é importante descobrir para poder atuar?

Como atuar diante das descobertas?

Para tentar responder a essas perguntas, falaremos com mais detalhes

das três etapas que percorremos em nosso trabalho: a observação, a avaliação e a

mediação.

Observação:

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Imaginemos a execução de uma obra musical. Parece intangível aos

ouvidos comuns a sua beleza e precisão; a clareza e harmonia dos acordes. Para os

ouvidos comuns, cada movimento particular representa a sublimação de um

momento que não se pode alcançar, que não se pode realizar, e que transmuta os

pensamentos e os desejos para os movimentos do instrumentista. Para os ouvidos

comuns, o encantamento é mais fácil, assim como os enganos. Isto porque a

maioria das pessoas não possui uma sensibilidade musical apurada, forjada por

anos de estudos, pelo conhecimento de obras musicais e técnicas de execução

instrumental.

Por esta razão, nem sempre é possível perceber deslizes ou

imperfeições nas performances musicais. Fato que dificilmente ocorre com um

músico de formação. Ninguém conhece melhor as qualidades de uma obra musical

ou as qualidades de sua execução do que um bom músico. Ninguém conhece

melhor as qualidades de um aluno ou as qualidades do seu trabalho do que um bom

professor.

O exercício de um bom professor começa pela observação. E, para

observar, é preciso saber o que observar. E, para saber o que observar, é preciso

formação. Como a percepção de um bom músico, será a percepção de um bom

professor, capaz de identificar detalhes comumente não notados.

A observação advém da necessidade de se conhecer o discente.

Conhecer a criança, conhecer o adolescente. Não raro, o professor é quem identifica

primeiramente o transtorno, quem primeiro dá o sinal de alerta com respeito ao

comportamento do educando. O olhar mais cuidoso pode levar ao encaminhamento

e diagnóstico precoce. Se o diagnóstico precoce torna-se fundamental, devemos

considerar ainda as possibilidades pedagógicas que se abrem por meio de uma

“avaliação precoce”. Já falamos da importância da formação do professor. Sua

preparação é fundamental para identificar algum aspecto peculiar no comportamento

do aluno. Isto poderá fazer toda a diferença, permitindo, o quanto antes, maior

independência e qualidade de vida em qualquer grau de autismo. O espaço escolar

é fundamental, pois se trata de um ambiente extremamente favorável à observação.

A observação faz do professor um pesquisador, pois ele pode registrar

o que vê, com a isenção de preconceitos. Certamente, a observação o levará a

conhecer o educando, suas qualidades e, também, suas limitações. Inicia-se já na

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primeira entrevista com os pais ou com o próprio estudante. Todavia, não são as

dificuldades que irão possuir maior peso, mas as virtudes e possibilidades sobre as

quais virá o trabalho pedagógico. Poderá haver o registro (é bom que haja) para que

os dados não se percam.

Trata-se de uma atividade de pesquisa, onde os elementos são

catalogados e organizados para serem analisados. Fornece subsídios para melhor

compreensão do educando. Seus gostos, interesses, desejos, sonhos,

movimentação em sala, características pessoais e sociais; o que é mais pertinente

aprender. A turma, a equipe pedagógica, a escola, o espaço de aprendizagem, a

família e os diferentes ambientes que freqüenta. Todo esse cabedal pode significar

um rico patrimônio de informações. É necessário ressaltar que sempre o

comportamento é uma forma de expressão, tendo significados que não podem ficar

esquecidos.

Faz-se pertinente ainda perquirir a forma do aprendente com autismo

pensar e como ela interfere nas suas relações com o ambiente externo. Ele é

comumente afetado em suas sensações. Assim, os vínculos com os diversos

ambientes, que são comumente geridos por experiências sensoriais, poderão

contribuir para a construção da sua interioridade afetiva e social. Com efeito, torna-

se decisivo conhecer aspectos do seu pensamento para melhor entendimento do

seu comportamento.

Os sintomas relacionados à vida sensorial são conseqüências também

do isolamento, da dificuldade de interagir com os outros e de manter a atenção em

determinada atividade. Nasce, então, o interesse ou foco excessivo em uma única

ação ou objeto que não despertaria interesse em outros indivíduos da mesma idade.

O nosso cérebro recebe informações, de imediato. Grupos de

neurônios importantes para os conteúdos emocionais reagem a esse impulsos,

levando as informações ao córtex cerebral, que pode equilibrar as reações ou não.

Falando de forma mais simples, seria a razão equacionando as emoções.

Assim, a pessoa com autismo, ao adquirir experiências peculiares no

mundo social, pode apresentar comportamentos estereotipados, singulares e até

estranhos para nós, pois o ambiente pode gerar estímulos diversos, traduzindo-se

em reações cuja gênese se dá mais pelos impulsos e menos pela gerência da razão.

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Por que é preciso conhecer nosso aluno? Porque assim podemos

estabelecer prioridades. Um repertório de atividades escolares para ele inicia-se

pela avaliação para saber quais habilidades ele possui e quais necessita conquistar.

A princípio, dependendo do grau de comprometimentos, desenvolver-se-ão aptidões

básicas, motoras e acadêmicas. O mais das vezes, alguns detalhes nem sempre se

avaliam, como o contato ocular, interação espontânea, respostas a estímulos

afetivos. Na incidência do autismo, habilidades naturais precisam ser priorizadas.

O professor reconhece as habilidades que o estudante possui e as que

devem ser adquiridas. O estudante aprende a aprender. É preciso, para tanto,

cativa-lo, provocando o seu desejo. Em alguns casos, estabelecer o contato visual

será o início desse movimento. Trata-se de um movimento afetivo.

Sabemos que uma experiência emocional libera inúmeras conexões

que marcam a memória. Dependendo da intensidade, ela pode marcar

profundamente e de tal forma que surgem traumas, mágoas, rancor, ódio ou

profundo amor. A qualidade dessas emoções vai influenciar grandemente a

qualidade da nossa vida. Quanto maior e mais intensas forem as experiências,

maiores serão as possibilidades de afetarem nossa lembrança. Cargas de

adrenalina são liberadas intensamente em situações de muita emoção, para o nosso

bem ou para o nosso mal. Certamente, não é a qualidade das experiências, mas o

nosso olhar para elas é que nos fará mais felizes ou mais bem preparados para a

vida.

A questão é que uma pessoa com autismo tem menor controle sobre seus

impulsos diante de estímulos exteriores, quando estes o afetam grandemente. É

preciso sempre propiciar oportunidades para que ela descubra propriedades (que

efetivamente há) para a superação desses desafios. E para encontrar as

oportunidades e revelar essas propriedades, será preciso observação. Segundo

Assencio Ferreira (2005, p. 102) “várias crianças com autismo e não eram

diagnosticadas, agora com o maior numero de profissionais lidando com a saúde

infantil e com melhores informações á respeito, propiciou – se maior possibilidade de

diagnostico”.

Avaliação

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Antes de ser apenas uma atribuição de valor, avaliar é uma ação

objetiva para compreender o comportamento do aprendente diante dos instrumentos

de ensino e aprendizagem. Torna-se, portanto, uma ação projetiva, um cálculo

antecipado de uma situação futura, com base em dados de caráter mediador e

formativo. Na prática, é a verificação do desempenho discente diante do trabalho

pedagógico, para se planejar o que se fará a seguir. A avaliação é início desse

planejamento.

Despida de preconceitos, a avaliação direcionará os passos do

professor no caminho que se deve construir em parceria com o aluno. Trata-se de

uma ação mediadora. Com base nos escritos de Vygotsky, seria verificar como se

comporta o educando na zona de desenvolvimento proximal, diante da

aprendizagem potencial.

De fato, uma avaliação com esses atributos torna-se um mecanismo de

melhoria nas decisões que virão a seguir, pois tem como mote os objetivos e os

passos que serão dados. Existem instrumentos eficazes para essa verificação, que

vão desde a entrevista com os pais ou a anamnese aos recursos pedagógicos que

muitos professores conhecem muito bem.

É pertinente, todavia, que o professor avalie a si mesmo e os recursos

que possui, pois nem sempre o que se pressupõe ser instrumento de ensino é

recurso pedagógico. Os recursos utilizados no ambiente de aprendizagem precisam

estar vinculados às possibilidades do aprendente e não às características docentes.

Além dos quefazeres inerentes ao currículo escolar, que sempre são

instrumentos avaliativos, o professor poderá estabelecer outros, conforme a seguir:

Jogos

ü verificar as relações cognitivas do educando mediante os desafios que a atividade oferece;

ü possibilitar uma leitura de aspectos relacionados à função simbólica;

ü verificar conteúdos afetivos e emocionais, bem como habilidades para a aprendizagem.

Desenhos

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verificar vínculos afetivos e interesses do aprendente relacionados ao espaço escolar e familiar;

ü verificar maturidade emocional, aspectos motores e cognitivos por meio da produção gráfica;

ü investigar aspectos ligados à subjetividade.

Pareamentos:

ü investigar modelos de aprendizagem interiorizados;

ü investigar esquemas lógicos de raciocínio;

ü investigar lateralidade e coordenação visório-motora.

ü trabalhar discriminação visual e gestalt.

O processo avaliativo poderá responder a muitas perguntas, dentre

elas: Quais exercícios podem ser utilizados para o desenvolvimento sensorial,

cognitivo ou motor? Quais atividades o aluno apresenta maior dificuldade ou

facilidade? Quais temas ou assuntos despertam maior interesse? Quais são suas

maiores habilidades e dificuldades?

Ressalta-se, porém, que o aluno não deverá ser avaliado com base no

desenvolvimento de outro colega, mas com base no seu próprio desenvolvimento: o

que ela fazia, o que ele faz e o que ele poderá fazer.

Mediação

Mediar e servir de elo entre um estímulo e uma resposta, é provocar o

estímulo a fim de se obter a resposta. O mediador deve estar ativamente engajado

nesse elo. A mediação é o processo de intervenção na relação do aluno com o

conhecimento. É toda intervenção pedagógica que possibilita essa interação. A

mediação é conseqüência da observação e da avaliação. Mediar é transformar a

intenção de ensinar em prática docente e a intenção de aprender em aprendizagem.

A ação do mediador não é a de facilitar¹, porque mediar processos de

aprendizagem é, sem sombras de dúvidas, provocar, trazer desafios, motivar quem

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aprende. Um dos principais escopos da mediação é criar vínculos entre o educando,

o professor e o espaço escolar.

Na mediação, o professor utiliza as atividades que permitirão o melhor

desenvolvimento do aprendente, o que mais se afina ao seu perfil, atentando para

as qualidades, as dificuldades, as carências e os desafios. A mediação terá caráter

avaliativo, pois uma tarefa superada requer uma nova. Novas avaliações para novos

objetivos a serem conquistados.

A mediação é um movimento pedagógico que requer observação e

avaliação. Decerto, a prática pedagógica no ensino do aprendente com autismo

revelará um movimento conjunto dessas três ações.

2.2-Autismo e práticas pedagógicas

Como podemos conhecer o nosso aluno?

O que devemos observar?

Como avaliar e mediar o processo de ensino e aprendizagem?

Para responder a essas perguntas, listaremos alguns aspectos ou questões no processo de ensino e aprendizagem que poderão ajudar:

• Motivação para o trabalho escolar: Qual a motivação do aluno? Por que

está motivado ou por que não está? Quais seus pontos de interesse em sala

de aula?

• Sugestões para o professor: descobrir o que o aluno gosta de fazer. A partir

daí, traçar estratégias de ensino. Há sempre canais comunicantes que podem

ser conectados para colorir o trabalho pedagógico. Será sempre bem-vindo o

incentivo após o término das tarefas, inclusive estabelecendo atividades em

que já haja domínio para o permanente foco de interesse em toda a

experiência escolar.

• Perseverança na finalização das atividades: O aluno termina o que

começa? Quando termina? Quando não termina? O que se pode aprender

com as respostas?

• Sugestões para o professor: primeiramente, é preciso salientar que as

atividades não poderão ser muito longas se o aprendem-te tem dificuldades

para manter o foco de atenção. Sugerimos que, aos poucos, o professor

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estabeleça um tempo maior dentro das possibilidades, sempre buscando

aumentar a capacidade de concentração.

Quando o aprendente gosta do que faz e está motivado, o foco da

mente torna-se mais fácil, mesmo diante das dificuldades da tarefa. Quando

conseguimos atrair a sua atenção, ele cria oportunidades e ganhos no seu

aprendizado. A atenção é extremamente relevante na aprendizagem escolar. Os

pensamentos não estão separados das experiências exteriores, mas se conectam a

elas e atuam em nosso desenvolvimento cognitivo à medida que experienciamos

situações cotidianas. Essas situações, então, podem servir para criar o foco de

atenção, principalmente aquelas que tragam sentido ao trabalho escolar.

A concentração evita a desordem das informações e os pensamentos

aleatórios; organiza as elaborações cognitivas e auxilia a memória. O incentivo e o

retorno positivo do professor após a realização das atividades nutrem o interesse do

aluno.

Uma interessante sugestão para o professor é trabalhar com os erros e

não ignorá-los. Errar faz parte do mundo social, faz parte da vida. Quem aprende a

conviver com eles desenvolve a capacidade de auto avaliar-se. Desenvolve o

pensamento reflexivo e crítico. Um dos grandes problemas da educação é a

insistência em punir o erro e não transformá-lo em mudanças, descobrimentos e

saberes.

Há casos de alunos com o transtorno que se frustram grandemente

quando não conseguem fazer algo com correção. As reações são diversas: de um

simples desapontamento a ações disruptivas. Ensinar a lidar com essas situações é

ensinar o cotidiano, é ensinar a estar mais bem preparado para a vida.

Quais são as atividades com menor ou maior nível de concentração?

Por quê? O que fazer para aumentar a capacidade de atenção? A atenção orienta o

aluno a ter respostas rápidas aos estímulos ambientais. Existem algumas atividades

que poderão ser usadas para esse fim.

Trabalhos artísticos estimulam o foco de atenção de qualquer

aprendente, pois demandam proficuamente a concentração, servindo como

mediação pedagógica. Pintura, desenho ou atividades com massa podem ser

receptores sensoriais que os ajudarão no ensino e na aprendizagem. Por eles, de

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forma lúdica, o aprendente poderá desenvolver sua capacidade de concentração,

necessária para a aprendizagem em outras áreas, como a Matemática.

A música desenvolve habilidades que estão relacionadas à memória, à

representação geométrica e à leitura. Ademais, a música traz para o campo das

atividades escolares a expressão da subjetividade e a instrumentalização sensorial.

Por conta disso, a cognição e os movimentos no uso do instrumento musical

fomentam constante articulação psicomotora, além de os ajudarem no

desenvolvimento da linguagem. O uso de violão, flauta ou percussão, por exemplo,

por enfatizarem tempo, espaço, ritmo e postura corporal, ajuda-os na escrita, no

andar, na respiração e em outros aspectos importantes que se somam ao processo

de aprendizagem que estarão presente na assimilação de outros conteúdos

escolares.

Onde o aluno gosta de estar? Qual ambiente? Quando gosta de estar?

O que o faz procurar o grupo? O que o impede de procurar o grupo? Quais

características comportamentais são mais comuns nos ambientes que ele

frequenta?

Atividades em que o estudante possa fazer com que os demais alunos

favoreçam o seu interesse e permanência no grupo. Em muitos casos, ele necessita

descobrir primeiramente as regras dos grupos sociais. Acreditamos nas

possibilidades de socialização que a instrução escolar permite a qualquer aluno. Na

família, inicia-se o desenvolvimento do seu equilíbrio emocional e a construção dos

seus valores sociais e afetivos, que trazem o respeito, a solidariedade e a disciplina

para a convivência.

Após isso, o espaço adequado de aprendizagem é, sem dúvida, a

instituição escolar. É na família que a criança aprende a reconhecer o papel do

professor e a considerar seus pares, porque reconhece a autoridade dos pais e os

valores da convivência que, indubitavelmente, começam a ser aprendidos no seio

familiar.

Na escola, os jogos são propícios para a descoberta de limites e de

valores sociais. Estimulam a linguagem pela interação, nos momentos descontraídos

e até nos momentos quando discentes discutem regras para brincadeiras. Vemos

isso nos textos de Vygotsky. O brincar da criança projeta as atividades adultas da

sua cultura que pressupõem seus futuros papéis e valores. O brinquedo e a

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instrução escolar criam, por meio da interação, o desenvolvimento de funções

sociais ainda não amadurecidas, mas que estão em processo de maturação,

podendo ser chamadas de “brotos” ou “flores” do desenvolvimento.

O educando tem autonomia na vida prática? No campo pedagógico?

Qual a área mais carente? Como sua autonomia pode ajudar o trabalho

pedagógico? Ainda precisa de um mediador?

Ainda que seja inevitável a presença de um mediador, é conveniente

que se busque a autonomia do aprendente, propiciando-lhe condições para que

sempre o seu desenvolvimento individual apareça. A autonomia inicia-se quando o

estudante já sabe o que fazer. Reconhece o ambiente escolar, os materiais

pedagógicos, os brinquedos e as atividades que deverá realizar. Posteriormente,

falaremos um pouco mais sobre a autonomia.

Como é o seu repertório verbal? Como o aluno estabelece comunicação? Dirige-se a um colega para iniciar um contato? Utiliza-se de gestos em lugar de palavras?

Em todos os níveis de incidência, a comunicação precisa possuir

caráter afetivo e ser provida de expressões claras e objetivas. Estabelecer o contato

visual com o aluno, chamá-lo pelo nome, identificar-se, nomear objetos, ajudá-lo a

entender sentimentos, desejos, vontades e necessidades são ações que sempre

produzem bons resultados. É fundamental para o funcionamento social da

linguagem que o significado da palavra seja percebido antes do seu uso,

afetivamente. Isto favorece a compreensão simbólica da língua.

Toda a postura do professor é relevante na estruturação das

habilidades linguísticas. Falar de maneira suave, sem pressa e claramente permite o

aprendizado natural e descortina os caminhos da comunicação com o mundo

exterior. Existe uma diferença crucial entre comunicar e transmitir. A transmissão é

passível de interrupções ou ruídos. A comunicação pressupõe uma proposição

acabada, uma ação intransitiva, que não precisa de complemento, pois se presume

que atingiu o seu fim. Por isso, transmitir não é o mesmo que comunicar.

O primeiro passo na comunicação com aluno será dado pelo professor

em conhece-lo. Conhecê-lo para saber comunicar-se com ele. Comunicar uma ação

pedagógica, onde estarão entrelaçados os conhecimentos discentes e docentes. A

comunicação abarca efetivamente o mundo dos significados e afetos do aluno.

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É necessário entender como o educando compreende a nossa fala. A

partir daí, poderemos criar exercícios, atividades, provocar situações estimulantes

para a sua socialização. No autismo, é comum indivíduos com extremas limitações

na linguagem. Será preciso criar mecanismos que facilitem a comunicação com eles.

Existem procedimentos pedagógicos que podem ser utilizados nesses casos:

cartões com imagens ou figuras, música, contatos sensoriais poderão ser de grande

valia.

A linguagem na comunicação social demanda, em sua essência, a

abstração e a codificação. Por isso, haverá momentos em que ela deverá ser

extremamente simples, desprovida de muitos símbolos. Existem pessoas que têm

dificuldades para dar sentido a elaborações linguísticas mais complexas. É

imprescindível observar como falamos e se somos compreendidos.

Por outro lado, o desenvolvimento da linguagem está estreitamente

ligado à capacidade simbólica e à representação do objeto ausente. Por conta disso,

a partir do conhecimento do educando, surgem mecanismos para estimular o uso de

expressões mais elaboradas, propiciando condições para a construção de novos

significados.

Fizemos um trabalho com uma criança de oito anos. Ela pouco

verbalizava e, quando o fazia, não havia clareza nos fonemas, bem como as frases

eram extremamente simples. Começamos a trabalhar com fotos da sua vida familiar,

passeios ambientes de sua casa e pessoas ligadas a ela. A partir do seu mundo

afetivo, planejamos trabalhos relacionados à sua vida cotidiana, como, por exemplo,

a formação da frase “o carro anda na rua”, pois ela sempre falava do carro do seu

pai. A partir daí, tornou-se possível o surgimento de mecanismos para estimular o

uso de expressões mais elaboradas, propiciando condições para a construção de

novos significados.

Ações precedidas por palavras e palavras precedidas por ações

colaboram para a comunicação e oralidade. O estabelecimento da comunicação e

da compreensão da linguagem é um trabalho que requer sempre uma continuidade

sistemática.

No concernente aos vínculos afetivos, vale observar se o aluno

constitui amizades em sala. Qual sua relação com a família, os educadores e os

colegas de turma?

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É interessante propor atividades que estejam articuladas com as

dinâmicas sociais, com as dinâmicas dos grupos de pertença do aluno, com sua

cultura social, que reflitam seu cotidiano, seu vínculo familiar, fazendo conexões

ainda não experienciadas por ele em seus atributos afetivos, sociais e intelectuais.

Estabelecer atividades para serem realizadas pelos demais alunos da sala de aula.

Para onde se dirige seus afetos? Do que gosta? O que o atrai? Quais os canais de sua vida afetiva que poderão ser utilizados como propulsores da aprendizagem? De que forma o seu desejo poderá ser provocado para o trabalho pedagógico?

Os interesses do aluno estão no campo dos afetos. Em muitos casos,

a afetividade é o único caminho para se estabelecer contato com o aluno.

Certa vez, um aluno do ensino médio, desinteressado pelo trabalho

escolar, despertou-se pela proposta do seu professor: escrever um texto sobre

capitais brasileiras, suas características econômicas, históricas e culturais. O

professor sabia que seu aluno seria capaz de se interessar, pois conhecia detalhes

de todas as capitais brasileiras por causa do seu fascínio por futebol: ele fazia a

relação do time de futebol com a cidade de origem. A pesquisa foi feita e

transformou-se em aula.

É claro que o objetivo não era conhecer o futebol brasileiro, mas por

meio da paixão do adolescente por esse esporte, adquirir os conhecimentos que, por

estarem sendo construídos em razão do interesse, poderiam ser guardados para

sempre. Uma prática simples, sem complicações e teorias, mas verdadeira, proveu o

aprendizado. Isto é legítimo em qualquer nível e modalidade de ensino, idade ou

nível social, em qualquer circunstância na educação.

Em relação ao desenvolvimento emocional, é importante avaliar como

educar as emoções do aluno com o espectro autista. Quais aspectos poderiam ser

utilizados para o trabalho pedagógico?

A vida emocional é um campo com o qual podemos lidar como outros

campos do saber humano, com maior ou menor habilidade, exigindo, igualmente,

um conjunto específico de habilidades. Decerto, os predicados dessas habilidades

tornam-se fundamentais para sermos felizes, obtermos sucessos e prosperarmos,

não só em nossa vida afetiva mas, do mesmo modo, em nossas relações sociais e

atividades profissionais. As nossas emoções são educáveis.

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As nossas ações, condutas e pensamentos recebem permanente

ingerência do nosso ser emocional, isso porque não é possível utilizarmos razão e

corpo sem estarmos impregnados de propriedades afetivas.

Crianças e adolescentes com autismo nem sempre adquirem

maturidade necessária para que os mecanismos mentais controlem as emoções.

São propensos ao desequilíbrio por motivos aparentemente para nós insignificantes.

É normal a criança ou o adolescente sentir-se desconfortável e intimidado em um

ambiente novo, como o da escola. É normal buscar apoio nas coisas ou nos

movimentos que lhe trazem conforto emocional. É normal a reação diante da

contrariedade. São normais o medo e a raiva ganharem proporções significativas.

Toda a equipe pedagógica da escola, bem como funcionários e outros

profissionais precisam saber lidar com os aspectos emocionais do espectro. É

frequente crianças e adolescentes passarem mais tempo no ambiente escolar do

que efetivamente com os pais. Por essa razão, a educação emocional não pode

estar dissociada da ação pedagógica, a fim de se tornar uma habilidade a mais para

o aprendente; de propiciar maiores condições para a desenvoltura nos

conhecimentos acadêmicos.

A nossa cognição possui trânsito melhor quando aliada à aptidão

emocional. As emoções podem ser trabalháveis, tornando-se aparatos

imprescindíveis para o aprendizado. Por elas, percebemos melhor os mecanismos

das dimensões pessoais indispensáveis à vida em sociedade, como a tolerância, a

compaixão, o compartir, dentre tantos outros que fogem ao escopo racional. O aluno

com o espectro autista pode desenvolver essas propriedades na escola. Para tal, o

amor é fundamental. Nada inclui melhor o aluno do que a ação educativa do amor.

Ao mesmo tempo em que ele traz pertencimento afetivo, traz pertencimento social.

Na comunicação da ação pedagógica, busca-se também alcançar o amor do aluno.

Em relação às habilidades motoras, faz-se extremamente necessário

avaliar como são os movimentos, o equilíbrio e noção de lateralidade, e ainda se o

aluno apresenta estereotipias e em quais e em que situações.

Nos exercícios físicos na escola, ficarão evidentes muitas

características motoras. Dificuldades espaciais, de equilíbrio de coordenação,

dificuldades para avaliar distâncias e outras mais. Todavia, ainda que sejam

desafiadores, programas especiais podem permitir que muitas dificuldades sejam

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superadas. Já mencionado por nós, o trabalho com música e artes explorando

disposição postural, lateralidade, respiração, ritmo, coordenação motora e

reversibilidade certamente trarão bons resultados.

No que se refere ao desenvolvimento cognitivo, mister se faz verificar

se o aluno apresenta déficit cognitivo. Quais são suas maiores habilidades e

dificuldades? Qual a sua relação com a linguagem? Como é a elaboração do seu

pensamento, se este é muito literal e se consegue simbolizar.

Segundo Nunes (2006), os cognitivistas entendem a mente como um

conjunto de mecanismos de processamento de informação. Nossos sentidos são

responsáveis pela captação dessa informação, introduzindo-a no sistema cognitivo,

envolvendo a atenção, a memória, as emoções e a linguagem. Nunes apresenta os

subsistemas cognitivos envolvidos no tratamento da informação, que podem ser

assim descritos:

• linguagem: responsável pela transmissão da informação;

• percepção: responsável pela captação da informação;

• memória: responsável por retenção, codificação e armazenamento da informação;

• pensamento: responsável pelo processamento e pela transformação da informação em conhecimento;

• inteligência: responsável pelo uso do conhecimento na resolução de tarefas;

• aprendizagem: responsável pela modificação do organismo diante da informação captada.

Em situações cotidianas, faz-se necessária a articulação desses

subsistemas. Quanto mais complexas for a situação maior será o grau de

sofisticação das articulações cognitivas. Decerto, aspectos motivacionais e

emocionais trarão novos matizes organizacionais para o pensamento.

A esquematização didática apresentada acima poderá fornecer pistas

ao professor no que tange ao desenvolvimento cognitivo do seu aluno. Por exemplo,

se o aluno tem dificuldades cognitivas, poder-se-ão elaborar atividades para

estimular as áreas que apresentam maiores comprometimentos. Assim, para

problemas na conservação das informações, atividades que estimulem a memória

seriam adequadas.

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É preciso ressaltar a estreita ligação que há entre cognição e

linguagem. A linguagem é essencial para haver elaborações cognitivas mais

complexas. Uma elaboração não mediatizada pela linguagem ou por outro sistema

de signos viabiliza apenas a comunicação mais primitiva e limitada. Então, quanto

mais a comunicação é permeada de signos, sofisticada em recursos da linguagem,

superior ela será. Diante disso, podemos afirmar que quanto maior for o repertório

linguístico do aluno, maiores serão as suas possibilidades cognitivas. Da mesma

forma, quanto mais complexas forem as suas articulações cognitivas, maiores serão

as suas possibilidades linguísticas.

Com efeito, cada palavra torna-se uma ação verbal do pensamento,

uma ação cada vez mais lógica a fim de detectar símbolos incutidos nas conversas,

nas interações sociais. Uma ação articulada com a nossa cultura e subjetividade, no

uso profícuo da generalização da palavra, e a palavra pressupõe a ação, o verbo.

O estímulo à leitura ou ao contato com o livro pode ser uma atividade

profícua para o desenvolvimento das habilidades cognitivas e da linguagem. O livro,

porque nos conecta a temas tão diversos, é uma excelente ferramenta para a

generalização da palavra. O ensino na escola precisa ser conectado com o todo,

levando à amplitude do conhecimento e não promovendo o isolamento entre os

saberes.

Ao planejar atividades para o desenvolvimento cognitivo, será

pertinente o professor observar os seguintes aspectos:

• propor atividades que façam sentido para o aluno;

• propor atividades que estimulem a classificação, a associação e a

generalização da palavra e a generalização da palavra;

• propor tarefas que explorem ações verbais e cognitivas;

• estimular o aluno a pensar a palavra antes de dizê-la ou escrevê-la;

• privilegiar trabalhos curtos, realizando uma tarefa por vez;

• oferecer sempre ao aluno o retorno positivo sobre seu desempenho, para mantê-lo focado na atividade escolar;

• estimular a comunicação;

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• cooperar nas suas atividades;

• trabalhar em consonância com a família;

• permitir que o aluno dê sugestões;

• utilizar tecnologias que despertem o interesse e medeiem a comunicação;

• evitar tarefas monótonas e repetitivas;

• evitar tarefas extremamente longas;

• compartilhar tarefas e estimular trabalhos em grupo.

Outro âmbito de suma importância a ser avaliado é o que diz respeito

ao raciocínio lógico e matemático, daí perceber se o aluno reconhece as operações

matemáticas e os numerais. Ainda se consegue sequenciá-los ou mesmo realizar

operações mentais complexas ou simples e se para isso utiliza-se de material

concreto.

A Matemática é uma habilidade básica do cérebro humano, pois os

números básica do cérebro humano, pois os números aparecem naturalmente em

nosso cotidiano, fazendo parte de nossa vida. Nossas relações com os números

intensificam-se a cada momento, localizando-nos no tempo e no espaço. Crianças e

adolescentes convivem constantemente com essa realidade numérica exigida

numérica exigida na escola e em outros ambientes sociais.

Numerais, sequenciamentos, pareamentos, adições e subtrações são

mais bem aprendente com autismo. Tanto na Linguagem como na Matemática, ele

aprende a generalizar, classificar, organizar e sequenciar. Desta forma, é possível

ainda trabalhar com blocos lógicos, caixa de cores, barras coloridas que indiquem

unidades numéricas e encaixes geométricos, dentre outros materiais, para o

desenvolvimento do pensamento lógico-matemático.

Fazer sequências numéricas sem relacionar o ato de sequenciar ao

mundo afetivo e cotidiano poderá ser inócuo. O educando poderá não ver sentido

em contar os números:

1,2,3,4,5...

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Mas, poderá encontrar sentido em contar estrelas, carros, brinquedos e

tantas outras coisas materiais e simbólicas, que estão em suas dimensões afetivas:

O professor poderá observar e avaliar melhor seu educando quanto ao

nível de desenvolvimento matemático verificando se ele é capaz de:

ü fazer pareamentos simples ou complexos;

ü visualizar objetos dentro de um conjunto maior;

ü conservar a quantidade e as relações de valor;

ü sequenciar números;

ü compreender sinais;

ü montar operações; ü compreender medidas;

ü lembrar sequências para realização de operações matemáticas;

ü contar sequencialmente.

A seguir o professor poderá estabelecer atividades, observando os seguintes critérios:

ü propor atividades baseadas no interesse do aluno;

ü usar linguagem objetiva;

ü utilizar o concreto e o lúdico, mesmo nos anos finais do ensino escolar; ü utilizar abordagens sensoriais (estímulo visual, auditivo e cinestésico); ü explorar o cotidiano; ü utilizar jogos; ü propor atividades que estimulem o pensamento lógico; ü evitar atividades muito longas; ü propor tarefas pequenas, mesmo que sejam diversas; ü adaptar currículo, provas e avaliações; ü incentivar sempre o aluno; ü privilegiar os vínculos afetivos;

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ü privilegiar as habilidades.

Por fim, em relação à área que envolve o desenvolvimento da leitura e

da escrita vale ressaltar a necessidade em observar quais são as características da

coordenação motora fina do estudante, pois sua dificuldade na escrita pode advir de

aspectos motores ou cognitivos. Dado isto, é importante avaliar em que estágios

encontram-se a sua leitura e escrita.

Os processos de aprendizagem da leitura e da escrita de alunos com o

espectro autista são semelhantes ao de qualquer aluno em muitos aspectos, tais

como: no letramento, na dimensão desejante, nas expectativas do grupo social e

familiar, no ensino e nas interações escolares.

2.3-Autismo e processos de aprendizagem.

A aprendizagem da leitura e da escrita como um conjunto de práticas

sociais em contextos simbólicos ligados ao sujeito é o que podemos chamar de

letramento. É a maneira como as pessoas utilizam a língua escrita e as práticas

sociais de leitura e de escrita nos diferentes ambientes de convivência. O letramento

traduz uma condição do sujeito: é o estado ou a condição do sujeito: é o estado ou a

condição que assume aquele que aprende a ler e escrever. (BRASIL,2007b)

Esse conceito traduz a ideia de que a leitura e a escrita resultam de

experiência social, cultura, cognitivas e linguísticas. A escola é, sem dúvida, um

espaço essencial para o letramento. Essa ideia ganha bastante relevância no ensino

do aprendente com autismo, independentemente do nível do comprometimento.

Porém, é preciso salientar que a ênfase dessa prática não pode estar centrada

somente no processo de aquisição de códigos alfabéticos e numéricos mas também,

acima de tudo, nas experiências e vivências socioculturais, familiar e escolar. Trata-

se da aprendizagem da leitura do mundo, como diz Freire.

O que o aluno deseja ler? O que deseja escrever? Quais são as suas

experiências pessoais que o impelem ao movimento da escrita e da leitura? O seu

processo de letramento desenvolver-se-á a partir do seu mundo afetivo. É preciso,

então, contextualizar o trabalho pedagógico com base nessa verificação.

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Evidentemente, haverá uma série de condições prévias, tanto

cognitivas quanto motoras, para o letramento. As condições cognitivas estão ligadas

à atenção, à memória e à linguagem, que falamos anteriormente. Quanto às

condições motoras necessárias para a escrita, devem ser observados possíveis

comprometimentos ou imaturidade na organização dos movimentos do estudante. A

pega do lápis e outros movimentos motores finos podem ser estimulados e refinados

por meio de exercícios específicos.

Com base em “Atendimento educacional especializado” (BRASIL,

2007b), podemos dizer que o desenvolvimento da escrita percorre as seguintes

etapas:

Nível 1: o aluno busca reproduzir os traços típicos da escrita que vê. A sua intenção

subjetiva conta mais que as diferenças objetivas do resultado, isto é, o professor

precisa descobrir o que o aluno deseja escrever e não o que efetivamente escreveu.

Aparecem tentativas de correspondência entre a escrita e o objeto referido;

desenhar pode ser encarado como uma tentativa de escrever. As grafias são

variadas, e a quantidade de grafias é constante; a leitura do escrito é sempre global.

Nível 2: o aluno entende que, para poder ler as coisas diferentes, deverá haver uma

diferença objetiva nas escritas, como quantidade mínima e variação de caracteres.

Ele descobre duas ordens diferentes dos mesmos elementos podem dar lugar a

duas totalidades diferentes, isto é, na tentativa de escrever uma palavra composta,

por exemplo, ele coloca no papel dois elementos gráficos diferentes. A

correspondência entre a escrita e o nome ainda é global, pois cada grafia vale como

uma parte e como um todo. No entanto, poderá haver um bloqueio (“não posso, pois

não sei o modelo”) e a utilização de modelos adquiridos para prever outras escritas;

adquirem-se certas formas fixas e estáveis.

Nível 3: o aluno procura dar um valor sonoro a cada uma das letras que compõe. Já

é superada a etapa de correspondência global; as exigências de variedade e

quantidade mínima de caracteres podem desaparecer momentaneamente. A

hipótese silábica se caracteriza pela noção de que cada sílaba corresponde a uma

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letra. Essa noção pode acontecer com ou sem valor. Na escrita de uma frase, ele

utiliza uma letra para cada palavra.

Nível 4: passagem da hipótese silábica para a alfabética. Esse é um momento de

conflito, pois é preciso negar a lógica da hipótese silábica. Nesse momento, o valor

sonoro torna-se imperioso, o aprendente começa a acrescentar letras especialmente

na primeira sílaba da palavra. Para ajudá-lo na passagem para o nível alfabético, é

pertinente o professor organizar atividades que o auxiliem a observar a escrita e a

refletir sobre a lógica do sistema alfabético.

Nível 5: o estudante compreende a organização do sistema alfabético. Demonstra

conhecer o valor sonoro convencional das letras. Distingue letra, sílaba, palavra e

frase. Podem ocorrer problemas na segmentação entre as unidades linguísticas que

formam uma frase e erros naturais decorrentes do processo de aprendizagem.

Para avaliar a evolução escrita do seu aluno, o professor pode utilizar

diversas proposições, tais como: escrita livre de palavras e frases, reescrita de

atividades vivenciais, reescrita de histórias lidas, produção com base em imagens.

Os registros dos aprendentes expressam o nível de evolução em que eles se

encontram, desde a escrita sem valor representativo até a escrita alfabética, com

valor representativo.

Avaliar o nível da escrita do aluno bem como compreender o seu esquema de

comunicação oral tornam-se indispensáveis para a proposição de atividades. A

linguagem é percepção, relação e classificação. Toda criança aprende a nomear,

categorizar e conceituar. Normalmente, a sua linguagem oral inicia-se com

predominância dos gestos. Posteriormente ocorrer um desenvolvimento contínuo da

oralização. O esquema abaixo procura ilustrar o que falamos:

O ato pedagógico, portanto deveria deixar de ser uma decorrência do processo diagnostico passando a integrar um movimento de investigação. Nesse sentido, pretendemos que a busca de valorização da historia da educação especial possa ser elucidativa, fortalecendo uma ampla discussão relativa ao atendimento dos sujeitos em situações de handicap, particularmente os sujeitos com autismo.

(BATISTA, BOSSA E COLS,2002)

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1. linguagem gestual;

2. linguagem falada monossilábica: (comer = “mê”);

3. linguagem falada polissilábica com ênfase nas sílabas tônicas: (cavalo=”valo”)

4. linguagem polissilábica com ênfase nas sílabas tônicas, mas com

reconhecimento das sílabas átonas e/ou subtônicas: (cavalo = cavalo).

Cada etapa conquistada da deve representar um estímulo para a

próxima. Todo indivíduo elabora a sua fala mediante a sua subjetividade e interação

com as pessoas. É comum a criança nos primeiros contatos com a linguagem criar

nomeações próprias para pessoas ou objetos. São classificações que ela faz pela

mediação da sua subjetividade, com pouca inferência externa. Trata-se de uma

linguagem interior a partir do seu universo de significados. Nos esquemas cognitivos

e linguísticos do autismo, isso poderá ganhar grandes proporções. Por isso, será

essencial incentivar a interação com os demais alunos da escola, mais contato

social, maiores possibilidades de desenvolvimento verbal oral e escrito, que incidirão

na comunicação social.

Deve-se observar a organização do aluno em relação ao seu material,

seu trabalho, seu dia a dia, seu comportamento e se há indícios de hiperatividade

ou déficit de atenção.

Descobrir como o aprendente se organiza no ambiente social pode dar

algumas pistas preciosas quanto ao seu comportamento e afetos. De certo modo, o

ambiente externo pode ser desorganizador para quem tem autismo. De sorte que,

no contato com esse ambiente, a sua aparente desorganização poderá ser uma

tentativa de organizá-lo para que o espaço não seja invasivo, ameaçador ou

estranho. O professor poderá organizar o espaço para ele, assim como poderá

desorganizá-lo com intuito de que o aprendente descubra novas formas de

organização. Poderá, ainda, explorar a própria predisposição organizadora que

muitas crianças e adolescentes com autismo têm para estimular trabalhos

pedagógicos.

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Outro fator importante a ser observado pelo professor é a autonomia

para desempenhar papeis cotidianos e qual é o nível de independência do aluno no

âmbito familiar e social.

A educação no autismo requer um trabalho multidisciplinar com

especialistas de diversas áreas atuando junto com a escola. É bom ressaltar que a

aprendizagem transcende o campo escolar, porque os mesmos mecanismos que

estão presentes no cotidiano. Então, por que não recriar na escola situações que

representem o dia a dia?

É papel do professor educar para a vida e não somente para testes ou

avaliações pontuais. Isso se torna mais indelével quando se educa aprendentes com

necessidades especiais, uma vez que eles carecem de uma aprendizagem

integradora, relacionada à vida social.

O trabalho realizado no ambiente escolar ganha substancial qualidade

quando comporta objetivos diretos e indiretos, abrangendo a família. Com efeito,

projeta condições para a constituição e o desenvolvimento de distintas habilidades

no que concerne à autonomia e à vida cotidiana.

Um exemplo do que falamos encontra-se em algumas peças

montessorianas para o desenvolvimento da linguagem e vida prática, que são jarros

e copos de vidros contendo líquido colorido para serem manuseados como recursos

pedagógicos para diversas áreas do desenvolvimento motor e cognitivo. Elas visam

trabalhar a percepção da leitura, da escrita, o esquema corporal, o treinamento da

lateralidade, da direção e da noção espacial e temporal. Essas peças são

intencionalmente de vidro e não de plástico para desenvolver no estudante o

cuidado, a responsabilidade e o servir, não somente na escola, mas também na vida

familiar e social.

Além do que já foi exposto, o professor poderá estimular a

independência e autonomia diária do aluno, por meio de atividades, jogou ou

brinquedos que representem e exercitem os seguintes aspectos da vida cotidiana:

• arrumação e manutenção da vida familiar;

• atitudes e responsabilidades;

• cuidados pessoais, autonomia e segurança;

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• cuidados com objetos, animais, plantas;

• atividade típicas do lar;

• independência e autonomia nas refeições;

• autonomia na resolução dos deveres de casa oriundos da escola;

• interação social e participação na comunidade onde o aluno reside.

Além disso, as práticas de ensino poderão:

• relacionar-se com artes, esportes, jogos coletivos e individuais;

• estimular a coordenação ampla e fina, a lateralidade, o esquema corporal, o espaço e tempo, os canais sensoriais, a comunicação oral e escrita, o vocabulário, as formas gramaticais e a linguagem gestual;

• trabalhar a compreensão matemática, a contagem, os sequenciamentos, a medição, as comparações, os pareamentos e promover o contato sensorial com distintos materiais e formas.

Com base nessas sugestões, o professor poderá planejar ações que promovam habilidades ou áreas da aprendizagem. Poderá fazer um plano de ensino, coletando informações e avaliando o seu aluno.

Sintetizando, temos as seguintes orientações para o exercício docente em cada atividade proposta:

• penetrar nos afetos do aprendente;

• concentrar-se no contato visual;

• trazer sempre o olhar do aluno para as atividades que ele está fazendo;

• entreter-se com as suas brincadeiras;

• procurar sempre enriquecer a comunicação;

• mostrar a cada palavra uma ação e cada ação uma palavra;

• tornar hábitos cotidianos agradáveis;

• fazer tudo com serenidade, mas com voz clara e firme;

• executar uma atividade de cada vez;

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• trabalhar a função simbólica por meio de livros, contação de histórias, música, artes

e outros canais sensoriais;

• privilegiar os vínculos afetivos;

• corrigir ensinando e não reprimindo;

• disciplinar a atividade e não imobilizar o estudante;

• estimular uma boa alimentação;

• não se alterar diante de comportamentos disruptivos, mas redirecionar a atenção e a

ação do aluno; falar baixo, manter o mesmo tom de voz e o contato visual.

É bom ressalvar que tão importante quanto propiciar as atividades é

observar como o aluno se comporta diante delas. Ademais, as tarefas em sala

poderão trazer conceitos subjetivos e objetivos para que o aluno aprenda de forma

direta e indireta, desenvolvendo distintas áreas da sua aprendizagem escolar, tais

como:

• memória, concentração e equilíbrio: em atividades que estimulem a organização do material de trabalho;

• socialização, direitos e deveres: em exercícios que trabalhem limites e vida prática;

• organização do pensamento e da linguagem: na ordem de execução das atividades;

• aprendizagem global: em atividades que tragam objetivos pedagógicos diretos e indiretos;

• a internalização do papel de aprendente no aluno: em atividades que valorizam a escola e os seus atores;

• socialização, alteridade, afetividade e inclusão: em atividades com a participação do grupo discente, em atividades de vida prática e durante as refeições com demais alunos.

Como exemplo do que falamos e com base no que vimos até aqui,

resumidamente, podemos planejar nosso trabalho, conforme a seguir:

• atividades para a comunicação, cognição e linguagem: livros, jogos coletivos,

pareamento do concreto com o simbólico, música, desenho, pintura, jogos e

atividades que utilizem novas tecnologias digitais e estimulem o raciocino lógico;

• atividades para desenvolvimento matemático: blocos lógicos, pareamento do

concreto com o simbólico, encaixes geométricos, jogos e atividades que utilizem

novas tecnologias digitais, atividades, atividades com temas do cotidiano e que

estimulem o raciocínio lógico-matemáticos.

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• atividades para desenvolvimento motor: exercícios que trabalhem a funções

motoras e sensoriais, encaixes diversos, colagem, recorte, atividades físicas,

atividades com música e de vida prática.

• atividades para a socialização: atividades esportivas individuais e coletivas;

atividades pedagógicas em que o aluno possa compartilhar com a turma o seu

saber; atividades que possam ser realizadas por todos os alunos;

• atividades para o desenvolvimento do foco de atenção: atividades e pesquisas

em distintas áreas do conhecimento sobre temas que o educando tem interesse;

atividades com novas tecnologias digitais, recortes diversos com tesouras, música,

artes, desenho, pintura e vida prática.

CAPÍTULO III

A Afetividade no processo da aprendizagem

A relação afetiva entre aluno/professor que é de extrema importância

para o desenvolvimento de aprendizagem saudável entre os educandos, e

adaptação dos mesmos ao meio físico e social. O desenvolvimento do aluno tem um

valor imprescindível para o processo de construção de conhecimentos e da

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realidade em que ele vive. Percebe-se que o afeto é um grande laço que liga o

professor e aluno, é um conjunto onde estão relacionados á autoestima, amor,

sentimentos e valores, são essas relações entre educador e educando que faz uma

aprendizagem agradável e sadia. A afetividade é a mistura do todo, de todos esses

sentimentos, que ensina aprender e cuidar adequadamente de todas essas

emoções é que vai proporcionar ao sujeito uma vida emocional plena e equilibrada.

3.1-A afetividade segundo Wallon

Henri Wallon nasceu em Paris em 13 de junho de 1879, numa família

republicana Além de acadêmico foi um homem político, sua vida foi marcada mais

por sua dedicação como pesquisador, do que pelos cargos políticos que chegou a

assumir. Seus estudos têm como principal objetivo decifrar o homem, isto é,

desvelar como um recém-nascido, com toda a sua imperícia, transforma-se em

adulto.

Com essa preocupação, atribui um papel básico a emoção e sobre ela

elaborou uma teoria psicogenética que ocupa lugar central fundamental em toda a

sua obra. Wallon defendia uma educação integral, ou seja, capaz de possibilitar a

formação do caráter orientação profissional.

Dedicou-se a fazer da Psicologia uma ciência do homem. Entre os

mais variados temas de investigação que sua teoria psicogenética desenvolveu,

destacam-se: emoção, inteligência, consciência, atenção, imitação etc.

Segundo Wallon, afetividade ocupa lugar central no processo de

desenvolvimento da personalidade dos sujeitos e se constitui pelo domínio funcional,

que depende de dois fatores: orgânico e social, numa relação recíproca que “impede

qualquer tipo de determinismo no desenvolvimento humano” (ALMEIDA, 1999, p.

20).

Não somos seres condicionados apenas pela nossa constituição

biológica, uma vez que o social pode superar as condições biológicas. Isso significa

dizer que a afetividade, de ordem basicamente orgânica, recebe influências do meio

social, e dependendo de uma evolução da afetividade que se afasta da base

orgânica e se torna cada vez mais relacionada ao social.

Segundo Wallon (1995, p. 32):

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Recusando-se a selecionar o único aspecto do ser humano e isolá-lo do conjunto, Wallon propõe o estudo integrado do desenvolvimento, ou seja, que este abarque os vários campos funcionais, nos quais se distribui a atividade infantil (afetividade, motricidade, inteligência). Vendo o desenvolvimento do homem, ser “geneticamente social”, como processo em estreita dependência das condições concretas em que ocorre, propõe o estudo da criança contextualizada, isto é, nas suas relações com o meio.

É preciso pensar na educação da criança, vê-la como um ser completo,

prepara-la para a vida em todos os seus contextos e não somente nos contextos e

disciplinas.

Wallon (1992) afirma que desde as primeiras fases da infância, as

relações afetivas estabelecidas, tanto no meio familiar quanto no contexto

pedagógico, são determinantes na construção da identidade e do caráter da criança.

Os vários estágios de desenvolvimento da criança, caracterizados por

Wallon, desde o início da infância, até a vida adulta, tem como característica central

a predominância alternada dos aspectos afetivos e cognitivos que no decorrer do

desenvolvimento humano, a história da construção da pessoa será constituída por

uma sucessão pendular de momentos dominantes afetivos ou momentos

dominantes cognitivos. De acordo com Wallon (1992, p. 90):

O ser humano foi, logo que saiu da vida puramente orgânica, um ser afetivo. Da afetividade diferenciou-se, lentamente a vida racional. Portanto no início da vida, afetividade e inteligência estão sincreticamente misturadas, com predominância da primeira. A sua diferenciação logo se inicia, mas a reciprocidade entre os dois desenvolvimentos se mantém de tal forma que as aquisições de cada um a repercutem sobre a outra permanentemente. Ao longo do trajeto, elas alternam preponderâncias, e a afetividade reflui para dar espaço à intensa atividade cognitiva.

Podemos destacar então que, de acordo com Wallon, no início da vida

predomina o aspecto afetivo e que no desenvolver do sujeito, os aspectos afetivos e

cognitivos se entrelaçam em suas perpétuas interações recíprocas.

Ele analisou que no início da vida, a afetividade predomina e orienta as

primeiras manifestações do bebê, desencadeadas pela fome ou saciedade, sendo

esta as bases das relações afetivas. Manifestações estas que garantem a

sobrevivência no período de total de dependência pela capacidade de mobilizar o

ambiente, a fim de atender nossas necessidades básicas, criando vínculos imediatos

com o meio social.

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Segundo Gonçalves (2003.p.14-15):

O recém-nascido não tem ainda outras formas de se comunicar com o outro, que não via emoção [...] Cada movimento, cada expressão corporal dessa criança, acaba por receber um significado, atribuído pelo outro, significado esse do qual ela se apropria. Uma criança que chora porque seu estômago dói de fome, não chora inicialmente para alguém vir alimentá-la, mas chora porque causa dor. Ao receber a atenção que necessita, vai construindo os significados de cada ação sua.

Dessa forma o recém-nascido estabelece o seu primeiro vínculo afetivo

com o outro e a partir daí vai amadurecendo e atribuindo significados e construindo

suas relações.

Wallon ressalta ainda a importância da afetividade, alertando para o

fato de que para evoluir, ela depende de conquistas realizadas no plano da

inteligência e vice-versa. A afetividade seria tão importante quanto à inteligência,

uma vez que se constituem num par inseparável na evolução do indivíduo, já que “à

medida que o indivíduo se desenvolve, as necessidades afetivas se tornam

cognitivas”. (ALMEIDA, 1999, p. 23).

O autor ressalta que o aspecto afetivo e cognitivo, são dependentes um

do outro e que no desenvolver da consciência um dará lugar ao outro, mas sempre

haverá uma reciprocidade.

A afetividade está vinculada às sensibilidades internas e orientada para

o mundo social, para a construção da pessoa, e a representação de ordem

intelectual está vinculada às sensibilidades externas, orientadas para o mundo físico.

Ou seja, a afetividade é fundamental para o desenvolvimento humano, tendo o papel

de determinar os interesses e necessidades individuais do sujeito, antecedendo o

que Wallon chama de inteligência.

Para Wallon (1995, p. 97):

Tendo por objetivo a psicogênese da pessoa concreta, a teoria Walloniana, se utilizada como instrumento para a reflexão pedagógica, suscita uma prática que atenda às necessidades da criança nos planos afetivo, cognitivo e motor, que promova o seu desenvolvimento em todos esses níveis.

Para o autor não é possível pensar a inteligência de forma isolada, ela

é um conjunto de fatores que devem ser levados em conta, pensando o ser humano

por completo.

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A origem da conduta emocional é orgânica, sendo expressa

involuntariamente e incontrolavelmente, tornando-se suscetível de controle

voluntário. No adulto, esse comportamento aparece apenas nos momentos difíceis,

em situações novas com poucos recursos.

Daí a questão levantada por Dantas (1992) que sugere a educação da

emoção, o que pressupõe o conhecimento do modo como esta funciona, uma vez

que essa explosão orgânica provocada pela emoção diminui a percepção exterior

dificultando as atividades nas relações interpessoais.

Wallon (1995, p. 67) ressalta ainda que:

No bebê, os estados afetivos são invariavelmente vividos como sensações corporais, e expressos sob a forma de emoções. Com a aquisição da linguagem diversificam-se e ampliam-se os motivos dos estados afetivos, bem como os recursos para sua expressão...Ao longo do desenvolvimento, a afetividade vai adquirindo relativa dependência dos fatores corporais. O recurso a fala e a representação mental fazem com que variações nas disposições afetivas passam a ser provocadas por situações abstratas e ideias, e possam ser expressas por palavras.

À medida que o ser humano vai se desenvolvendo vão aparecendo

outras formas de manifestações afetivas, a criança chora, berra e quando começa a

amadurecer começa a ter reações diferentes.

Nesse contexto, Wallon cria uma teoria de desenvolvimento da

personalidade, que privilegia a relação entre o domínio afetivo e cognitivo, num

movimento dialético, sugerindo assim como nos estudos sobre o desenvolvimento

cognitivo, etapas para o desenvolvimento afetivo, e pontua três momentos principais

das fases do desenvolvimento afetivo: a fase da afetividade emocional, onde as

trocas afetivas dependem inteiramente da presença do parceiro, necessitando da

presença da comunicação, nessa fase está em primeiro plano a construção do

sujeito.

A segunda é a afetividade simbólica, onde a inteligência constitui a

função simbólica, sendo incorporada pela linguagem (oral e depois escrita) e a

terceira, e última, a afetividade categoria marcada pela puberdade, exigindo

racionalidade às relações afetivas.

Segundo Wallon appud Galvão, (1999, p. 44-45):

Assim temos, no primeiro estágio da psicogênese, uma afetividade emocional, que se nutre pelo olhar, pelo contato físico e se expressa em

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gestos, mímicas e posturas. A afetividade simbólica que se exprime por palavras e idéias e que por esta via pode ser nutrida. Integrando-se os processos intelectuais realizados no estágio categorial a afetividade torna-se mais racionalizada- os sentimentos são elaborados no plano mental.

Sendo assim podemos destacar que para ocorrer o desenvolvimento

do sujeito, através da afetividade, há a interação com o meio, que faz com que haja

a apropriação dos códigos de comunicação, desenvolvendo a cognição.

Dessa forma, Wallon afirma que a elaboração do conhecimento

depende da constituição do sujeito, sendo este um processo não linear. A

construção do sujeito se dá principalmente através da diferenciação do eu e do

outro. É através da negação do outro que se configura o eu, sendo este um

processo de construção inacabado. Esse processo de construção do eu inicia um

drama manifestado inicialmente pela rebeldia e negação, seguido pela sedução do

outro e depois pela imitação, precisando da admiração do outro para “findar” sua

construção.

Segundo Wallon apudd Galvão (1995 p. 53-54):

A criança opõe-se sistematicamente ao que distingue como sendo diferente dela, o não-eu: combate qualquer ordem, convite ou sugestão que venha do outro, buscando, confronto, testar a independência de sua personalidade recém desdobrada, expulsar do eu o não-eu. No momento seguinte predomina a atividade de imitação. A criança imita as pessoas que lhe atraem, incorporando suas atitudes e também o seu papel social, num momento de reaproximação ao outro que tinha sido negado.

Sendo assim essa negação e logo em seguida a aceitação do outro é

necessário no processo de enriquecimento, de desenvolvimento da criança.

Segundo Dantas(1992,p.95), “esta realização poderá então ser

transposta para o plano da inteligência e permitir a gradual superação do sincretismo

do pensamento”, assim o progresso da inteligência pressupõe certo nível de

evolução da pessoa, que depende tanto do orgânico quanto dos estímulos sociais,

não apenas com a interação, mas também com “a transmissão dos conteúdos

através do veículo linguístico” (DANTAS,1992,p.96) o que possibilitará o refinamento

conceitual, criando aos poucos a diferenciação entre inteligência e afetividade.

Dessa forma Wallon afirma que nós, como seres sociais, não

passaríamos por uma fase pré-social, uma vez que “o vínculo afetivo supre a

insuficiência da inteligência no início” (DANTAS, 1992, p. 97). O fato de nos

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contagiarmos afetivamente é que cria os elos necessários à vida coletiva,

caracterizando-se por um recurso humano para associar-se aos seus semelhantes.

Como podemos perceber, entre afetividade e inteligência existe uma

relação estreita de complementaridade, quando uma se desenvolve a outra

acompanha seus passos.

3.2- A importância da afetividade em sala de aula.

A palavra emoção é derivada da palavra latina e significa ato de

deslocar, perturbação e agitação. Nos livros de psicologia, em geral, ela é defendida

como “afetos e reações “desordenadas que se manifestam em nós quando em

nosso ambiente se espera alguma transformação radical e repentina a qual não nos

podemos adaptar imediatamente.

As emoções para Wallon, tem papel importante no desenvolvimento da

pessoa. É por meio delas que o aluno exterioriza seus desejos e suas vontades. Em

geral são manifestações que expressam um universo importante e perceptível, mas

pouco estimulado pelos modelos tradicionais de ensino. Segundo Heloísa Dantas,

estudiosa da obra de Wallon há 20 anos, a raiva, a alegria, o medo, a tristeza, a

alegria e os sentimentos mais profundos ganham função relevante na relação da

criança com o meio. A emoção causa impacto no outro e tende a se propagar no

meio social.

Wallon considera a pessoa como um todo. Afetividade, emoções,

movimento e espaço físico se encontra num mesmo plano. Wallon

Na escola, humanizar a inteligência. Nesse sentido a teoria do

desenvolvimento cognitivo de Wallon é centrada na psicogênese da pessoa

completa.

Diferentemente dos métodos tradicionais ,que priorizam a inteligência e

o desempenho em sala de aula, a proposta Wallon poe o desenvolvimento

intelectual dentro de uma cultura mais humanizada. A abordagem é sempre a de

considerar a pessoa como um todo. Elementos como afetividade, emoções,

movimentos e espaços físico se encontrarem num mesmo plano. As atividades

pedagógicas e os objetivos, assim devem ser trabalhados de formas variadas.

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As interações que ocorrem no contexto escolar também são marcadas

pelas afetividades em todas as suas dimensões. Segundo Alves(1993), o prazer

disciplina. Indisciplinados são os que não tem paixão por alguma coisa. A ação

pedagógica deve estar voltada para um procedimento denominado por

Ferández(1990) como erotização do conhecimento, num sentido da sedução dos

alunos para a abuscar e construção eficaz do referido conhecimento.

O afeto influencia a estrutura cognitiva, mas também interfere na

velocidade com que se constrói o conhecimento, constituindo-se como um fator de

grandes importâncias na determinação da natureza das relações que se

estabelecem entre o sujeito e o conhecimento.

Os desenvolvimentos emocionais e afetivos são absolutamente

necessários para uma vida de qualidade em todos os âmbitos inclusive com base ao

desenvolvimento cognitivo.

Segundo Maturana (2002 pág. 55), o conhecimento não leva ao

controle. Se o conhecimento leva a alguma parte, e ao entendimento, a

compreensão e isto leva a uma ação harmônica e ajustada com os outros e o meio.

Segundo Dantas(1992),Wallon concede a intensa atividade cognitiva

relacionada à construção do real, já a função afetiva está voltada para nós mesmo.

O vínculo afetivo que o professor estabelece com a turma deve ter um

caráter libertador que possibilite a expressão de questões pessoais e que conduza a

autonomia do professor e do aluno, abrindo espaço para questionamentos,

derrubando preconceitos e rótulos comuns na área educacional.

Serrão (1999), enfatiza ainda que o importante na construção do

vínculo afetivo e a função do professor, possibilita a afloração dos sentimentos e as

opiniões dos alunos, utilizando diversas técnicas e linguagem.

As emoções para Wallon tem papel preponderante no desenvolvimento

da pessoa. E por meio delas que o aluno exteoriza seus desejos e suas vontades.

Conforme a ideias de Wallon, a escola infelizmente insiste em

imobilizar a criança numa cadeira limitando justamente a fluidez das emoções e do

pensamento, tão necessária para o desenvolvimento completo da pessoa.

O método adotado por Wallon é o da observação pura. Considera que

essa metodologia permite conhecer a criança em seu contexto. Portanto, o professor

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deve aprender a lidar com o estado emotivo da criança para melhor poder estimular

seu crescimento individual.

3.3- O auxílio afetivo para o desenvolvimento das habilidades de portadores de

Espectro Autista.

Leo Kamer psiquiatra infantil, foi o primeiro a definir a síndrome do

autismo. Em 1943, publicou o artigo “autistic disturbances of affectives contact,

traduzindo como os distúrbios autísticos do contato afetivo, onde descreveu casos

clínicos de onze crianças que tinham em comum um isolamento extremo desde o

início de vida e um desejo obsessivo pela preservação da rotina, denominando-as

de autistas.

Uma das características que mais chamou a atenção do psiquiatra foi

a incapacidade que essas crianças demonstravam e se relacionar afetivamente e

socialmente com as outras pessoas. Hobson (2002) acredita que as crianças

diagnosticadas com autismo apresentavam dificuldade em reconhecerem e serem

responsivas as emoções dos outros. Eles teriam falham em demonstrar reações

empáticas ás expressões e ações afetivas das outras pessoas devido à falta de

sensibilidade social. Além dessas inabilidades de estabelecer conexões sócio-

afetivas e da resistência excessiva a mudança do meio ambiente, os autistas

observado por Kanner também apresentava severas dificuldades em utilizar a

linguagem com objetivo de se comunicarem.

Tendo em vista que a afetividade é passo essencial para a

aprendizagem, pode-se afirmar que ela é ferramenta fundamental para o convívio e

o melhor desenvolvimento das propostas pedagógicas voltadas para os autistas.

A afetividade permeará em todo o momento, a relação aluno-professor,

possibilitando meios de socialização, segurança e inteiração da criança no meio em

que está inserida, dessa forma, faz- se necessário que o profissional utilize-se desse

artifício para a construção de uma metodologia adequada e eficaz para seu aluno

portador de autismo.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao término da elaboração deste trabalho, pode-se constatar o

quanto foi interessante esta pesquisa. A escolha de tal tema deu-se em função do

grande número de alunos com autismo. Daí o interesse e a importância de

buscarmos conhecimentos sobre este assunto tão abordado nos últimos tempos.

Ao nos informarmos e pesquisarmos, obtemos maiores

esclarecimentos sobre o Transtorno de Espectro Autista – TEA, o que

consequentemente nos proporcionou meios mais eficazes para lidar com crianças

acometidas de tal transtorno.

O papel do professor é fundamental para o desenvolvimento de

uma criança com TEA e a Psicopedagogia o auxiliará bastante durante esse

processo, tendo em vista que dispõe de inúmeros métodos e estratégias capazes de

melhor orientar professor e escola.

Concluímos que quando há uma união entre família e escola,

focada num objetivo comum, haverá o progresso do aluno portador de TEA.

Qualquer criança em fase de desenvolvimento escolar, seja ela portadora de algum

transtorno ou não, irá desenvolver-se plenamente se estiver acolhida por um

ambiente onde haja a afetividade, a solidariedade e o respeito.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

CUNHA, Eugênio. Práticas Pedagógicas para Inclusão e Diversidade. 3ª edição. Rio

de Janeiro: WAK Editora, 2013.

OLIVIER, Lou de. Distúrbios de Aprendizagem e de Comportamento. 6ª edição. Rio

de Janeiro: WAK Editora, 2011.

PIAGET, Jean. A Formação do Símbolo na Criança: imitação, jogo e sonho, imagem

e representação. Rio de Janeiro: LTC, 1990.

VYGOTSKY, L. S. Psicologia Pedagógica. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2004.

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n Revista Brasileira de Psiquiatria – 2002;22 (Supl II).

n Revista Brasileira de Psiquiatria – Vol. 28, Supl I, maio/2006

Baptista,C.R.;Bosa,C. Autismo e Educação. Ed. Artes Médicas. Porto Alegre, 2002

http://www.autismspeaks.org

ÍNDICE

Agradecimentos ..................................................................................................... 3

Resumo .................................................................................................................. 4

Metodologia ..............................................................................................................5

Sumário ....................................................................................................................6

Introdução............................................................................................................... 7

I – Autismo e Educação escolar.............................................................................. 9

1.3 - Autismo :um olhar pedagógico ...................................................................... 9

1.4 – Marcos históricos da educação inclusiva ..................................................... 11

1.3-Formação e saberes para o trabalho docente................................................. 12

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II –Ideias e atividades pedagógicas....................................................................... 18

2.1 – O primeiro passo do professor :conhecer seu aluno.................................... 19

2.2 – Autismo e práticas pedagógicas.................................................................... 24

2.3 – Autismo e processos de aprendizagem......................................................... 35

III – A Afetividade no processo da aprendizagem................................................... 43

3.1 – A afetividade segundo Wallon..........................................................................43

3.2 – A importância da afetividade em sala de aula..................................................48

3.3 – O auxilio afetivo para o desenvolvimento das habilidades de

portadores de Espectro Autista.................................................................................50

Considerações finais.................................................................................................51

Referências Bibliográficas.........................................................................................52

ÍNDICE ......................................................................................................................53

FOLHA DE AVALIAÇÃO ...........................................................................................54

FOLHA DE AVALIAÇÃO