DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL · exemplos é o dano pela perda do tempo útil...

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1 UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” AVM FACULDADE INTEGRADA A RESPONSABILIDADE CIVIL E A USURPAÇÃO DO TEMPO ÚTIL DO CONSUMIDOR COMO GARANTIA DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS PARA UMA SOCIEDADE JUSTA Por: Isabel Cristina Mendonça Farias Oliveira Orientador Profº William Rocha Rio de Janeiro 2014 DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

A RESPONSABILIDADE CIVIL E A USURPAÇÃO DO TEMPO ÚTIL DO CONSUMIDOR COMO GARANTIA DOS PRINCÍPIOS

CONSTITUCIONAIS PARA UMA SOCIEDADE JUSTA

Por: Isabel Cristina Mendonça Farias Oliveira

Orientador Profº William Rocha

Rio de Janeiro

2014

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O PELA

LEI D

E DIR

EITO AUTORAL

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

A RESPONSABILIDADE CIVIL E A USURPAÇÃO DO TEMPO ÚTIL DO CONSUMIDOR COMO GARANTIA DOS PRINCÍPIOS

CONSTITUCIONAIS PARA UMA SOCIEDADE JUSTA

Apresentação de monografia à AVM Faculdade Integrada como requisito parcial para obtenção do grau de especialista em Direito do Consumidor e Responsabilidade Civil. Por: Isabel Cristina Mendonça Farias Oliveira

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AGRADECIMENTOS

Aos professores e colegas de turma

pelo troca de experiências ...

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DEDICATÓRIA

Dedico a meus pais por serem o

início ...

À minha filha, que materializou o

sentido da vida ...

Ao meu marido e amigo sempre

presente ...

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O Tempo

... Quando se vê, já são seis horas!

Quando de vê, já é sexta-feira!

Quando se vê, já é natal...

Quando se vê, já terminou o ano...

Quando se vê perdemos o amor da nossa vida.

Quando se vê passaram 50 anos!

... A única falta que terá será a desse tempo que,

infelizmente nunca mais voltará.

Mário Quintana

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RESUMO

O trabalho aqui apresentado objetiva o reconhecimento de um dano

temporal, conhecido como ‘perda do tempo útil’ mediante a análise do

reconhecimento da possibilidade jurídica e necessidade do reconhecimento

desse dano, também conhecido como desvio produtivo do consumidor¹ . Ao

analisarmos os princípios constitucionais alcançaremos a compreensão de

vulnerabilidade do consumidor na relação de consumo. O Código de Defesa

do Consumidor norteado pelo direito fundamental mencionado no art.5º, XXXII,

e pelo princípio orientador da ordem descrito no art.170, V ambos da CRFB/88

proporcionou aos consumidores remédio jurídico próprio, ampliando a relação

dos princípios norteadores bem como dos direitos assegurados ao consumidor,

incluindo, expressamente, o dano moral e material (art.6º, VI, CDC). O instituto

da responsabilidade civil vem se transformando ao deixar de se preocupar com

a análise do grau de culpabilidade do ofensor para se concentrar no

ressarcimento dos prejuízos acarretados às vítimas, proporcionando-lhes,

assim, mais proteção às vítimas de dano. O nosso ordenamento jurídico não

menciona um rol taxativo de bens tuteláveis, permitindo o surgimento de novos

bens jurídicos protegidos acarretando, assim, o dever de indenizar. Um dos

exemplos é o dano pela perda do tempo útil cujo bem jurídico, inegavelmente,

é o tempo (dano temporal), de valoração tanto pessoal quanto social,

expressão da própria vida humana. O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro –

reconhece o dano temporal como dano ressarcível, adotando jurisprudência

minoritária, pois não considera a perda de tempo do consumidor um mero

dissabor, um contratempo, não reparável. Portanto, diante dos direitos e

princípios que regem o CDC é inaceitável o desrespeito a esta nova categoria

de dano, em que não se tutela esse bem chamado tempo.

¹ Termo cunhado pelo autor Marcos Dessaune na obra Desvio Produtivo do Consumidor: o

prejuízo do tempo desperdiçado, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.

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METODOLOGIA

A metodologia utilizada para a elaboração deste trabalho foi a

acadêmica mediante o estudo doutrinário e jurisprudencial utilizando artigos de

sites, livros e julgados.

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SUMÁRIO

Introdução....................................................................................... 9

Capítulo I O Tempo Útil do Consumidor....................... 11

Capítulo II O Código De Defesa Do Consumidor.......... 16

Capítulo III Princípios Gerais e

Finalidades da Ordem Econômica............... 19

Capítulo IV Dos Fundamentos Infraconstitucionais....... 22

Capítulo V Práticas Abusivas.......................................... 24

Capítulo VI O Dano............................................................ 26

Capítulo VII A Responsabilidade Civil

no C.D.C.......................................................... 30

Capítulo VIII A Perda do Tempo útil do Consumidor:

Dano Temporal............................................... 32

Conclusão....................................................................................... 36

Bibliografia..................................................................................... 38

Anexos............................................................................................ 40

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INTRODUÇÃO

(Parafraseando Cazuza “o tempo não pára”)

Rizzato Nunes em seu artigo “A Sociedade Contemporânea é Ladra

de Tempo; é Ladra de Vida” publicado no site www.migalhas,com,br

demonstra a importância do tempo na vida dos homens classificando de tempo

“profano” o tempo do dia a dia, da vida social e política, privado de significação

religiosa. Uma vez vivido não volta mais. É o tempo de relógio, é a

quantificação de passado, presente e futuro. A experiência vivida não volta. É o

tempo que pode ser medido e perdido.

A duração desse tempo tem seu valor. Para o trabalhador

corresponde ao seu trabalho, ao seu salário, convertido em custo para o

empregador. Se a produtividade do trabalhador aumenta em relação ao tempo

dispendido, menos custo para o empregador.

Esse mesmo tempo para o consumidor tem valor objetivo é a “troca

do valor de seu próprio tempo, pois enquanto consome ou o gasta para

consumir, perde-o para exercer outras atividades que não de consumo”.

Também possui valor subjetivo, pois o que ele, consumidor, quer fazer de seu

tempo cabe somente a ele decidir. “É direito pessoal, privado e da esfera de

sua intimidade; é uma prerrogativa que lhe pertence”.

De acordo com o artigo, na sociedade atual percebe-se claramente

que o capitalismo é um “ladrão de tempo”, “ladrão de vida”. Especificamente

nas cidades grandes a ineficiência dos transportes públicos, por exemplo,

rouba-nos precioso tempo nos congestionamentos. Tempo esse classificado

de “sagrado” que poderia ser utilizado para o lazer, ocasionando perda

irrecuperável. O que chamamos de consumismo bloqueia a consciência da

perda do tempo, “o consumo como prazer”.

Para a antropóloga Alexandra Morais Pereira, “na sociedade

contemporânea, o ritmo de vida alterou-se” pois há uma necessidade de prazer

ligada ao consumismo. A imposição de “consumo veloz” coloca o consumidor

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em uma espécie de prisão onde o consumo alimenta sua vida

satisfatoriamente, tudo em uma velocidade acelerada.

Mas eis que surge a percepção de tempo perdido “por culpa dos

terceiros e do funcionamento da sociedade como um todo”. Tal insatisfação

chega aos tribunais através de ações pleiteando indenização por danos.

Juridicamente, na esfera do direito do consumidor, “há muitas situações de

perda efetiva de tempo em matéria de relações jurídicas de consumo”.

Como material de estudos, a doutrina é representada por Pablo

Stolzer em “Responsabilidade Civil pela perda de tempo” e Marcos Dessaune

em “Desvio Produtivo do Consumidor – O prejuízo do tempo desperdiçado”,

entre outros. A jurisprudência tem se manifestado através de Acórdãos como,

por exemplo, os do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro relacionados no

Anexo deste trabalho.

“A questão, portanto, não é a perda do tempo em si, mas seu

“roubo” por terceiros”.

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CAPÍTULO I

O TEMPO ÚTIL DO CONSUMIDOR

O advogado Vitor Guglinski, Pós-graduado com especialização em

Direito do Consumidor, conteudista do site Atualidades do Direito discorre

sobre a Teoria da Perda do Tempo Útil do Consumidor:

Há alguns anos, um novo estágio da massificação do consumo inaugurou-se em nossa sociedade. Massificado o consumo, massificaram-se as respectivas demandas, fazendo com que milhares de consumidores passassem a lidar com uma série de infortúnios junto aos fornecedores para tentar solucionar os problemas decorrentes das relações travadas entre esses dois sujeitos.

É certo que as diversas questões que cercam nosso cotidiano

demandam algum tempo para ser solucionadas, o que nos leva a afirmar que

é perfeitamente normal “perder” ou “investir” nosso tempo para tratar das

questões do dia-a-dia, inclusive aquelas relacionadas ao consumo, uma vez

que essa atividade é por todos realizada ao longo das 24 horas do dia.

Guglinski questiona:

quais são os efeitos que sofremos quando a solução de simples demandas de consumo requer tempo considerável, extravasando os limites da razoabilidade? Como vem ocorrendo, é razoável exigir do consumidor que perca um tempo precioso para solucionar questões dessa natureza, quando ao mesmo tempo há outros afazeres e problemas mais sérios a solucionar no decorrer do dia?

O Juiz de Direito do TJPE – Luiz Mário Moutinho, em mensagem

postada em uma rede social, teceu os seguintes comentários

A sensação do tempo é algo que varia com o tempo. Veja o exemplo dos computadores. Temos um equipamento que têm um processador com certa velocidade, e depois compramos outra máquina mais rápida alguns milésimos de segundos, e logo achamos que o PC antigo é lento demais. Da mesma forma as pessoas mais velhas viveram num tempo onde passavam horas nas filas dos bancos para descontar um cheque ou esperavam dias para que um cheque depositado fosse compensado.

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Hoje a realidade da compensação dos cheques é outra, muito mais rápida, 24 ou 48 horas. Porém, permanecer horas na fila de um banco não corresponde à legitima expectativa do consumidor do século XXI, quando um milésimo de segundo é uma eternidade. O tempo é hoje um bem jurídico e só o seu titular pode dele dispor. Quem, injustificadamente, se apropria deste bem, causa lesão que, dependendo das circunstâncias pode causar dano que vai além do simples aborrecimento do cotidiano, ou seja, dano moral.

A importância do tempo, no entanto, não se limita à ideia que cada

um de nós tem sobre suas implicações, isto é, à subjetividade que envolve a

análise de sua influência em nosso cotidiano. Na seara jurídica, o tempo é

parâmetro objetivo utilizado para criar e extinguir direitos. No direito pátrio,

encontra-se presente na própria Constituição Federal, como direito

fundamental implícito na norma que assegura a razoável duração do

processo e os meios que garantem a celeridade de sua tramitação, tanto no

âmbito judicial quanto no administrativo (art. 5º, LXXVIII). Foi com vistas

nesse direito fundamental que o CNJ criou a campanha chamada “Meta 2:

bater recordes é garantir direitos”, cujo objetivo é o de “assegurar o direito

constitucional à ‘razoável duração do processo judicial’, o fortalecimento da

democracia, além de eliminar os estoques de processos responsáveis pelas

altas taxas de congestionamento”

(http://www.cnj.jus.br/gestaoeplanejamento/metas/metas-de-nivelamento-

2009/meta-2).

No âmbito legislativo, o tempo e o modo como o consumidor deve

ser atendido é disciplinado pelo Decreto nº 6.523/08 (Lei do SAC), que

regulamenta o Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90). O aludido

decreto dispõe, especificamente, sobre: seu âmbito de aplicação;

acessibilidade do consumidor ao serviço; qualidade do atendimento;

acompanhamento das demandas pelo consumidor; procedimento para

resolução das demandas; pedido de cancelamento do serviço. O que nos

permite constatar é que a celeridade no atendimento ao consumidor é uma

de suas tônicas. Contudo, desnecessário tecer maiores detalhes sobre a “Lei

do SAC”, pois, claramente, no dia a dia constatamos que várias empresas

simplesmente ignoram-na, pois, se fosse devidamente observada,

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certamente o Judiciário não estaria, neste exato momento, analisando

milhares de ações envolvendo danos morais pelo tempo útil perdido.

A ocorrência sucessiva e acintosa de mau atendimento ao

consumidor, gerando a perda de tempo útil, tem levado a jurisprudência a dar

seus primeiros passos para solucionar os dissabores experimentados por

milhares de consumidores, passando a admitir a reparação civil pela perda

do tempo livre. Sobre o tema, LEONARDO DE MEDEIROS GARCIA leciona:

Outra forma interessante de indenização por dano moral que tem sido admitida pela jurisprudência é a indenização pela perda do tempo livre do consumidor. Muitas situações do cotidiano nos trazem a sensação de perda de tempo: o tempo em que ficamos “presos” no trânsito; o tempo para cancelar a contratação que não mais nos interessa; o tempo para cancelar a cobrança indevida do cartão de crédito; a espera de atendimento em consultórios médicos etc. A maioria dessas situações, desde que não cause outros danos, deve ser tolerada, uma vez que faz parte da vida em sociedade. Ao contrário, a indenização pela perda do tempo livre trata de situações intoleráveis, em que há desídia e desrespeito aos consumidores, que muitas vezes se veem compelidos a sair de sua rotina e perder o tempo livre para soluciona problemas causados por atos ilícitos ou condutas abusivas dos fornecedores. Tais situações fogem do que usualmente se aceita como “normal”, em se tratando de espera por parte do consumidor. São aqueles famosos casos de call center e em que se espera durante 30 minutos ou mais, sendo transferido de um atendente para o outro. Nesses casos, percebe-se claramente o desrespeito ao consumidor, que é prontamente atendido quando da contratação, mas, quando busca o atendimento para resolver qualquer impasse, é obrigado, injustificadamente, a perder seu tempo livre.

Adverte o Des. Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro que “no plano dos direitos não patrimoniais, porém, ainda há grande resistência em admitir que a perda o tempo em si possa caracterizar dano moral. Esquece-se, entretanto, que o tempo, pela sua escassez, é um bem precioso para o indivíduo, tendo um valor que extrapola sua dimensão econômica. A menor fração de tempo perdido em nossas vidas constitui um bem irrecuperável. Por isso, afigura-se razoável que a perda desse bem, ainda que não implique prejuízo econômico ou material, dá ensejo a uma indenização. A ampliação do conceito de dano moral, para englobar situações nas quais um contratante se vê obrigado a perder seu tempo livre em razão da conduta abusiva do outro, não deve ser vista como

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um sinal de uma sociedade que não está disposta a suportar abusos.

Dentre os tribunais que mais têm acatado a tese da perda do

tempo útil está o TJRJ, podendo-se, encontrar aproximadamente 40

acórdãos sobre o tema no site desse tribunal, alguns da relatoria do insigne

processualista Alexandre Câmara, o que sinaliza no sentido do

fortalecimento, e consequente afirmação da teoria.

Por ocasião do seminário Liberdade de Imprensa, organizado pelo

Instituto Internacional de Ciências Sociais (IICS), realizado em São Paulo, nos

dias 03 de 04/05/2012 (http://www.conjur.com.br/2012-mai-07/judicializacao-

conflitos-cria-sociedade-nao-dialoga-nalini), o Desembargador José Renato

Nalini defendeu a tese de que a judicialização cria uma sociedade que não

dialoga. A nosso juízo, a tese estaria inteiramente correta, não fosse essa

tormentosa situação pela qual passam milhares de consumidores.

Na doutrina civilista é corrente a afirmação no sentido de que

vivemos na era dos contratos. Com efeito, o Código de Defesa do

Consumidor passou a disciplinar quase todo o direito obrigacional, que acabou

sendo deslocado do Código Civil para aquele microssistema, pois a maioria

dos contratos hoje em dia são contratos de consumo, submetidos à disciplina

do código consumerista, e assim são porque as relações entre nós,

consumidores, são travadas junto a fornecedores, os quais massificaram a

informatização para (tentar) atender as demandas de consumo.

Quando o consumidor necessita solucionar demanda dessa

natureza, quase sempre é obrigado a falar com um atendente virtual ou, na

melhor das hipóteses, com atendentes de Call Center`s e SAC`s que,

entendemos ser totalmente despreparados (de propósito) para solucionar

essas demandas, restando ao consumidor queixar-se ao juiz.

E a situação se torna pior quando, por exemplo, o serviço prestado é

fornecido em regime de monopólio, como o fornecimento de água e coleta de

esgoto, energia elétrica etc., aos quais o consumidor simplesmente é forçado a

aderir, pois são essenciais.

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Cabe lembrar, ainda, que os fornecedores atuam no mercado de

consumo assumindo os riscos do empreendimento, tese inspiradora da teoria

da responsabilidade civil objetiva do fornecedor. Sendo assim, se este decide

explorar empresa, deve arcar com os danos eventualmente decorrentes de sua

atuação, inclusive o dano extrapatrimonial causado ao consumidor por despojá-

lo de seu tempo útil. Para o empreendedor, tempo é dinheiro; para o

consumidor, tempo é vida.

Conforme entendimento do ilustríssimo doutrinador e Juiz de Direito

do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, PABLO STOLZE GAGLIANO,

quanto ao tempo, a falta dele e a interferência de terceiros, se pode extrair que

(Jornal Carta Forense – abril/2013):

E, se por um lado, esta falta de tempo para viver bem é algo trágico em nossa sociedade – e que merece uma autorreflexão crítica – por outro, é forçoso convir que as circunstâncias do nosso cotidiano impõem um aproveitamento adequado do tempo de que dispomos, sob pena de experimentarmos prejuízos de variada ordem, quer seja nas próprias relações pessoais, quer seja nos âmbitos profissional e financeiro. Vale dizer, uma indevida interferência de terceiro, que resulte no desperdício intolerável do nosso tempo livre, é situação geradora de potencial dano, na perspectiva do princípio da função social. Quando a interferência de terceiro for tamanha a ponto de por em prejuízo todas as demais atribuições e obrigações do indivíduo, ela é prejudicial e causadora de dano à pessoa... ... Muitos destes consumidores, sujeitos de direito, antes mesmo de procurarem o auxílio destes órgãos, dispuseram de horas e horas do seu precioso tempo em ligações para centrais de atendimento ineficazes ou tiveram que ausentar-se do trabalho para dirigem-se até o estabelecimento da prestadora ou fornecedora para terem seus infortúnios resolvidos ..... O tempo é o único bem inerente à todos os seres humanos. É único, insubstituível e inalienável. Uma vez passado, não poderá ser reavido, não sendo justo, portanto, que seja desperdiçado por conveniência de um terceiro. A perda do tempo utilizado para o trabalho, para o estudo, e até mesmo para o convívio em família, mercê da forma como as empresas prestadoras e fornecedoras tem se portado perante seus consumidores no que tange ao atendimento, ultrapassa o limite do mero aborrecimento, ingressando no patamar indenizável do dano, não apenas compensatório, como também punitivo e disciplinar de acordo com os ditames da responsabilidade civil...

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CAPÍTULO II

O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

O Estatuto do Consumidor surgiu para atuar em defesa do

contraente vulnerável, técnica e/ou economicamente, quando da consumação

da relação de consumo. O referido diploma foi criado para amparar o

consumidor de modo amplo e efetivo, possuindo suas normas caráter de ordem

pública e de interesse social, nos termos cunhados pelo seu artigo 1º do

diploma.

Necessário se faz definir conceitos de consumidor e fornecedor a fim

de que se estabeleça o âmbito de atuação das regras de consumo, para a

posterior análise da amplitude da proteção conferida pelo Estatuto. Assim, nos

termos do art. 2º, caput, consumidor é “toda a pessoa física ou jurídica que

adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”.

Entende-se, ainda, que se o adquirente for um intermediário na

cadeia produtiva e o bem obtido for tipicamente um bem de produção (e não de

consumo), destinados à satisfação do consumidor, que os adquire na qualidade

de destinatário final utilizado para a complementação do ciclo produtivo, não se

enquadrará no conceito de consumidor, sendo-lhe aplicáveis as disposições

contidas no direito comum.

O conceito padrão e individual é complementado por figuras

extensivas – que tratam do consumidor em sua dimensão coletiva e

indeterminada – previsto no parágrafo único do art. 2º, bem como nos artigos

17 e 29 do mesmo diploma, ampliando a tutela de suas normas a outros

intervenientes na relação de consumo.

O caput do art. 3º do C.D.C. define fornecedor como “toda pessoa

física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os

entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção,

montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação,

distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços”.

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O desrespeito ao consumidor é traduzido em muitas práticas

comerciais corriqueiras como as famosas vendas casadas, a limitação

quantitativa da compra de produtos em estabelecimentos comerciais, bem

como a publicidade que visa mascarar informações que não condizem com a

realidade, qual seja, as qualidades e características dos produtos ou serviços

comercializados.

Notadamente diante de tantos atos desrespeitosos a qualidade do

atendimento ao consumidor não podia ser diferente, ou seja, os atuais

prestadores de serviço atendem mau ao consumidor, gerando o que

entendemos como a perda de tempo útil ou, como Marcos Dessaune chama:

desvio produtivo do consumidor.

O tempo despendido pelo consumidor no desenrolar dos conflitos

com o fornecedor apresenta-se, por vezes, abusivo e intolerável. No entanto,

ainda se discute se a perda de tempo imposta à parte frágil desta relação

constitui prática que deve ser vedada pelo atual ordenamento jurídico ou mero

dissabor, que deve ser tolerado no âmbito das relações consumeristas. Tal

situação gera a possibilidade de tutela desse novo dano temporal que se

apresenta.

A Constituição da República em seu art. 5º, inciso XXXII estabelece

como obrigação estatal a promoção da defesa do consumidor e no art. 48 do

Ato das Disposições Constitucionais Transitórias deixa claro que a proteção

dessa nova categoria alcançou um novo patamar na ordem vigente. Ao se

referir especificamente a elaboração de um Código, que se encontra

especialmente voltado à defesa do consumidor, não visa apenas regular,

objetivamente, o contrato de consumo. O Estatuto destina-se claramente à

proteção especial de uma das partes, qual seja, o consumidor (vulnerável),

pressupondo que este sim, precisa ser defendido pelo Estado, protegido ante a

situação de desigualdade existente na relação de consumo entre este e o

fornecedor.

O C.D.C., em seu art. 6º, inciso VI, garante a efetiva prevenção e

reparação dos danos patrimoniais e morais acarretados ao consumidor, sejam

estes individuais, coletivos e difusos. Na mesma linha, o inciso VII assegura ao

consumidor o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à

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prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais [...] assegurada a

proteção Jurídica, administrativa e técnica aos necessitados.

Novamente, o diploma mostra seu caráter protetivo ao garantir uma

reparação integral de quaisquer danos que venham a ser impostos ao

consumidor. Vê-se, ainda, que ademais da função ressarcitória, busca

estimular a prevenção de tais danos, tal como expressamente previsto no

dispositivo acima referido. A efetividade da tutela do patrimônio e dos atributos

inerentes à personalidade do consumidor está diretamente relacionada à

responsabilização civil. A partir do momento em que há uma violação desses

bens protegidos, surge ao agente causador do dano o dever de repará-lo. O

poder judiciário exerce importante papel na efetivação da tutela jurídica,

impondo ao violador o dever de ressarcir o lesado.

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CAPÍTULO III

OS PRINCÍPIOS GERAIS E FINALIDADE DA ORDEM

ECONÔMICA

A defesa do consumidor foi alçada a princípio da ordem econômica,

também a livre iniciativa e tem como fim assegurar a todos existência digna,

conforme os ditames da justiça social (art. 170, inciso V, da CRFB/88).

Esta liberdade de iniciativa econômica assume novos contornos na

sociedade atual. “A evolução das relações de produção e a necessidade de

propiciar melhores condições de vida aos trabalhadores [...] fizeram surgir

mecanismos de condicionamento da iniciativa privada, em busca da realização

de justiça social”. Deve, portanto, se submeter às limitações postas pelo poder

público, sendo, ainda, ilegítima, quando, segundo José Afonso da Silva, ser

“exercida com objetivo de puro lucro e realização pessoal do empresário”.

Portanto, o regime constitucional, não se opõe ao poder econômico e à livre

iniciativa.

Mas condena-os na medida em que se mostrem prejudiciais ao bem-

estar coletivo. O art. 170 e incisos da CRFB/88 esclarece que esta liberdade

deve ser interpretada em conformidade com os valores da função social da

propriedade e defesa do consumidor, em busca da justiça social para o bem

comum.

Rizzato Nunes elucida:

Ao estipular como princípios a livre concorrência e a defesa do consumidor, o legislador constituinte está dizendo que nenhuma exploração poderá atingir os consumidores nos direitos a eles outorgados bem como designando que o empreendedor tem de oferecer o melhor de sua exploração, independentemente de atingir ou não os direitos do consumidor. A garantia dos direitos do consumidor é o mínimo. A regra constitucional exige mais.

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Ao fornecedor, explorador e beneficiário da atividade econômica

desenvolvida, caberá arcar com o risco e possíveis prejuízos advindos de sua

livre iniciativa.

O fundamento da responsabilização do fornecedor nas relações

consumeristas segundo Sérgio Cavalieri Filho:

Todo aquele que se disponha a exercer alguma atividade no mercado de consumo tem o dever de responder pelos eventuais vícios ou defeitos dos bens e serviços fornecidos, independentemente de culpa [...] A responsabilidade decorre do simples fato de dispor-se alguém a realizar atividade de produzir, estocar, distribuir e comercializar produtos ou executar serviços que oferece no mercado de consumo, respondendo pela qualidade e segurança dos mesmos. O consumidor não pode assumir os riscos da relação de consumo, não pode arcar sozinho com os prejuízos...

Para José Afonso toda a iniciativa privada é condicionada ao

sistema constitucional de direitos e garantias, estando subordinada à função

social de sua própria atividade, devendo restar assegurada a existência digna

de todos, estando incluídos neste rol os consumidores.

Fábio Konder esclarece que o rol de direitos assegurado aos

consumidores não deve ser interpretado como um mero benefício concedido

pelo Estado, mas como um freio ao poder econômico dos fornecedores, uma

forma de evitar que estes desempenhem sua atividade de modo prejudicial à

sociedade como um todo, e aos consumidores em especial.

E Eros Grau afirmar que a defesa do consumidor não deve ser

interpretada apenas como um princípio limitador da autonomia privada, mas

como um princípio e direito conformador da ordem econômica.

A imposição de ônus aos fornecedores como a adoção de cautelas

no exercício de sua atividade e a possível diminuição da margem de lucro não

é valor justificante para afastar a tutela do consumidor.

A liberdade de iniciativa difere da ausência de imposição de limites

pelo Estado, traduzindo-se em liberdade para atuar dentro dos parâmetros por

estes impostos.

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Não resta dúvida que o texto constitucional é claro ao dispor que a

ordem econômica tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os

ditames da justiça social. A atividade do fornecedor deve ser desenvolvida

orientada por tais fins.

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CAPÍTULO IV

DOS FUNDAMENTOS INFRACONSTITUCIONAIS

Como dito, o Código de Defesa do Consumidor fora uma

determinação imposta pelo constituinte, com vista a detalhar a proteção por

este conferida no diploma maior, otimizando sua tutela por meio de uma

normativa organizada, com princípios próprios. A base principiológica deste

código possui vasta importância na interpretação e aplicação de suas normas.

Tal base expressamente prevista não exclui outros princípios que venham a ser

reconhecidos, tomando-se por base a diretriz de proteção do consumidor

vulnerável.

Dentre os princípios informadores desta política, encontram-se

estatuídos o reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de

consumo, e a consequente adoção de uma ação governamental no sentido de

proteger efetivamente o consumidor, bem como a harmonização dos interesses

dos participantes das relações de consumo e a coibição e repressão eficientes

de todos os abusos praticados no mercado de consumo que possam causar

prejuízos aos consumidores, além do estudo constante das modificações do

mercado de consumo.

O Código de Defesa do Consumidor fora criado para de fato

proteger a parte vulnerável nas trocas comerciais marcadas pelo desequilíbrio

técnico e, na maioria das vezes, também econômico. De nada adiantaria uma

política nacional que não acompanhasse as mutações no mercado, incluindo o

advento de novas práticas prejudiciais ao consumidor.

A contínua transformação impõe ao legislador a tarefa de interpretar

os novos fatos sociais e modificar a normativa vigente para a adequada

regulação das relações de consumo. Quando inexistente ou insuficiente – ou

sempre que se mostrar necessário –, ao aplicador do direito caberá a tarefa de

interpretar as normas e suprir as lacunas existentes para a efetivação dos

direitos constitucionais e legais assegurados ao consumidor.

O próprio Código de Defesa do Consumidor traz consigo uma

estrutura de princípios (art. 4º) e direitos básicos (art. 6º) que já confeririam

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uma ampla proteção ao consumidor, em diferentes circunstâncias, sendo este

capaz de abarcar mudanças sociais que interfiram nas relações de consumo e

causem possíveis prejuízos ao consumidor. Diz-se até que “se a Lei n.

8.078/90 se tivesse limitado a seus primeiros sete artigos, ainda assim o

consumidor poderia receber uma ampla proteção, pois eles refletem

concretamente os princípios constitucionais de proteção ao consumidor e

bastaria ao intérprete compreender seus significados”.

24

CAPÍTULO V

PRÁTICAS ABUSIVAS

A incidência do princípio da boa fé vem ganhando cada vez mais

relevo no âmbito do ordenamento nacional, sendo considerada baliza de

interpretação contratual, fonte geradora de deveres anexos e norma geral

proibitiva do abuso de direito por parte do fornecedor.

A vedação às práticas abusivas relaciona-se à imposição de

observância da boa fé objetiva nos contratos de consumo, na medida que se

constitui em expressão da norma geral proibitiva de abuso e direito.

Nas palavras de Marcos Dessaune:

Prática abusiva é o comportamento desleal de um fornecedor no mercado de consumo, ou seja, é qualquer atividade empresarial que ocorra antes, durante ou depois de uma contratação, garantindo alguma vantagem exagerada para o fornecedor ou desrespeitando a confiança e a lealdade exigidas em suas relações com o consumidor. Para ser abusiva, portanto, a prática deve estar carente de boa-fé ou induzir ao desequilíbrio da relação do fornecedor com o consumidor, podendo lhe causar prejuízo.

Dessaune destaca que, para além dos vícios e defeitos de serviços

e produtos, haveria esta terceira espécie de fonte de responsabilização,

decorrente da perpetração de práticas abusivas, no mercado de consumo,

previstas em rol exemplificativo no art. 39 do CDC. Outras práticas podem ser

reconhecidas, tais como: qualquer atuação do fornecedor que caracterize o

desrespeito a padrões de conduta reclamados e que esteja em

desconformidade com a legítima expectativa e confiança dos consumidores. A

posição dominante exercida pelo fornecedor, somada à condição de

vulnerabilidade do consumidor e a contrariedade dos preceitos de confiança e

boa-fé impõe a vedação a tais práticas.

A proibição de tais práticas, para Cavalieri Filho, está relacionada à

vedação ao abuso de direito, assim considerado aquele cujo exercício

extrapola os limites da normalidade e causa dano a outrem.

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Entende o autor que o uso abusivo de um direito constitui uma

afronta aos fins perseguidos pela legislação. O ato, formalmente legal, não se

mostra materialmente legítimo. O titular do direito utiliza-o com finalidade

distinta daquela a que a norma se destina, oprimindo. Quando a finalidade do

direito colide com a atuação do seu titular no caso concreto, caracterizar-se-á o

abuso. O abuso de direito é analisado de modo objetivo para a violação dos

limites da boa-fé e dos fins sociais e econômicos basta a configuração do

abuso.

Os fins econômicos, segundo Sérgio Cavalieri, constituem-se “no

proveito material ou vantagem que o exercício do direito trará para o seu

titular”, servindo para satisfazer um interesse legítimo e amparado pelo

ordenamento. Já os fins sociais – previstos no Código Civil, em seu art. 421, na

figura da função social dos contratos – constituem-se nos objetivos buscados

pela sociedade, sendo o direito o instrumento utilizado para alcançar tais

desígnios. Um bom exemplo é a prática da concorrência desleal: esta é

abusiva porque foge da finalidade social buscada pela garantia à livre

concorrência, qual seja conferir ao consumidor produtos de melhor qualidade e

a um menor custo.

O objetivo do Código de Defesa do Consumidor é assegurar a

confiança no mercado de consumo, coibindo práticas que repercutam não

somente na esfera individual de um consumidor, mas que interfiram no

interesse geral da categoria tutelada.

Principalmente, porque a nossa sociedade é marcada pela

especialização de áreas, globalização do conhecimento e massificação das

relações de consumo, onde os contratos são considerados “menos como

expressão de liberdade contratual, e mais como realização de uma

necessidade de consumir.”

Ao consumidor resta apenas optar dentre os produtos e serviços

oferecidos no mercado de consumo, e nos moldes determinados pelo

fornecedor.

26

CAPÍTULO VI

O DANO

Dano é prejuízo imposto a alguém, podendo abarcar tanto a sua

esfera material (patrimonial) quanto imaterial (extrapatrimonial). Para além dos

danos material e moral, são tutelados também, no âmbito das relações de

consumo, o dano estético e o dano à imagem (por vezes enquadrados dentro

do próprio conceito de dano moral), em que pese a ausência de suas previsões

legais expressas no CDC.

Segundo Sergio Cavalieri Filho “pode haver responsabilidade sem

culpa, mas não pode haver responsabilidade sem dano”. O dano é elemento

preponderante, fato constitutivo e determinante do dever de indenizar. No

entanto, é necessária uma consequência concreta, lesiva ao patrimônio

econômico e moral. Caso contrário não haverá o que reparar ainda que a

conduta tenha sido culposa ou dolosa.

O ato ilícito nunca será o que os penalistas denominam de crime de

mera conduta. Mas sempre um delito material com resultado de dano. Sem

dano pode haver responsabilidade penal, mas não haverá responsabilidade

civil. Indenização sem dano equivale a enriquecimento ilícito, sem causa para

quem a recebesse e pena para quem a pagasse por que o objetivo da

indenização é reparar o prejuízo sofrido pela vítima.

Inicialmente, dano significava, tão somente, a diminuição do

patrimônio da vítima, pois que ainda não se admitia o ressarcimento do dano

moral. Atualmente, dano é conceituado como a subtração ou diminuição de um

bem jurídico, qualquer que seja sua natureza, ou seja, tanto patrimonial como

moral.

O Código Civil descreve o dano moral em seu art. 186, mas é a

CRFB/88, em seu art.5º, incisos V e X, que admite expressamente a reparação

do dano moral, assim como o CDC em seu art.6º, VI e VII, tornando indiscutível

a cumulabilidade do dano moral com o material, reconhecido, ainda, pela

Súmula 37 do STJ que diz: “São cumuláveis as indenizações por dano material

e dano moral, oriundos do mesmo fato.”

27

É certo que o novo caráter da responsabilidade civil com a

ampliação dos interesses tuteláveis e com a busca pela maior proteção à

vítima, originou o reconhecimento progressivo de novos danos, tendo em vista

que o nosso ordenamento jurídico brasileiro é considerado atípico ou aberto

diferentemente dos ordenamentos típicos ou fechados. Ao contrário destes, o

ordenamento nacional não indica taxativamente os interesses tuteláveis e as

violações que ensejam um dano ressarcível. Nas palavras de Anderson

Schreiber:

nos ordenamentos típicos, o legislador limita o dano ressarcível a certos interesses previamente indicados, restringindo a atuação judicial a um campo determinado. Nos ordenamentos atípicos, ao contrário, o legislador prevê tão somente cláusulas gerais, que deixam ao Poder Judiciário ampla margem de avaliação no que tange ao merecimento de tutela do interesse alegadamente lesado. Nesta esteira, diz-se típico, originariamente, o ordenamento alemão, em que o ressarcimento de danos vem assegurado apenas em face da lesão a interesses tipificados em lei, como a vida, a integridade física, a saúde, a liberdade e a propriedade. É atípico, por outro lado, o ordenamento brasileiro, em que o legislador não indica o interesse cuja violação origina um dano ressarcível, limitando-se a prever uma cláusula geral de ressarcimento pelos danos materiais ou morais.

Em que pese existirem interesses previstos na Constituição Federal

e nos microssistemas infraconstitucionais (assim como no Estatuto do

Consumidor), a ausência de previsão de um determinado interesse social não

indica a impossibilidade de seu reconhecimento. A seleção dos interesses

merecedores de tutela nos sistemas abertos não cabe somente ao legislador.

O julgador, no caso em concreto, deverá verificar se não se trata de um novo

interesse tutelável, sem previsão legal, mas decorrente da análise sistêmica do

ordenamento que orienta sua atuação. Daí a importância do estudo dos

princípios e normas que informam um determinado microssistema.

Anderson Schreiber esclarece, ainda, que “a limitação da

ressarcibilidade dos danos à violação de um direito subjetivo ou a qualquer

outra situação jurídica subjetiva previamente especificada em lei mostra-se

absolutamente incompatível com a realidade jurídica contemporânea” em razão

28

“da multiplicação desconcertante de novas situações e expectativas que

caracteriza a sociedade atual”.

Nas relações de consumo, antes do advento do Código de Defesa

do Consumidor, este enfrentava o quase intransponível obstáculo da prova da

culpa do fornecedor, agravado pela ausência de normas específicas. Após,

adveio a dificuldade de efetivar as normas consumeristas relacionadas à

qualidade e quantidade dos produtos e serviços prestados.

Hoje, o desafio enfrentado pelos novos consumidores concerne ao

tempo despendido por estes na solução dos impasses acarretados pela má

prestação de serviços. Este tempo desperdiçado não encontra guarida

expressa no ordenamento, mas decorre da interpretação constitucional e legal

dos princípios e das próprias normas gerais que regem a tutela do consumidor.

Atualmente, a técnica legislativa se utiliza fortemente das chamadas

cláusulas gerais, que são conceitos amplamente utilizados tais como a boa fé

objetiva, o estado de necessidade, exercício regular de direito; há também os

chamados conceitos jurídicos indeterminados, como os conhecidos termos:

necessidade pública e interesse social e, ainda, da aplicação direta dos

princípios constitucionais para a solução dos casos em concreto, conferindo

maior discricionariedade ao julgador. A necessidade se impõe diante da

“evolução dinâmica dos fatos sociais” e da dificuldade em se “estabelecer

disciplina legislativa para todas as possíveis situações jurídicas de que seja a

pessoa humana titular”.

Diante do exposto, resulta a possibilidade de reconhecimento de

novos danos, para além dos expressamente previstos no ordenamento

nacional, outras espécies de lesões a bens jurídicos passíveis de tutela a partir

da leitura constitucional e legal dos princípios que informam as relações de

consumo, bem como se o instituto da responsabilidade civil possuiria estrutura

para sustentar a tutela desse novo dano.

Novos danos têm sido erigidos pela doutrina e, com um pouco mais

de resistência, pela jurisprudência. Por muito tempo, não se buscou tutelar

danos como a chamada perda de uma chance, o dano pelo abandono sócio

afetivo, o dano morte, o dano moral coletivo, e o dano moral punitivo por se

entender que não se tratavam de bens, direitos ou interesses juridicamente

29

tuteláveis. Por não se enquadrarem no conceito de dano patrimonial

convencional (dano emergente e lucro cessante), nem se identificarem com os

danos morais concedidos tradicionalmente pela jurisprudência.

E por não estarem expressamente previstos no ordenamento

jurídico, vê-se, gradativamente, ocorrer uma mudança jurisprudencial e

doutrinária nesse sentido. A justificativa para o reconhecimento desses novos

danos seria a necessidade de tutelar com maior amplitude os verdadeiros

beneficiários da responsabilidade civil, ou seja, as vítimas. A ampliação do rol

de espécies de dano moral reconhecidas pela jurisprudência deve-se, em

parte, ao desenvolvimento significativo dos direitos da personalidade.

Anderson Schreiber, esclarece que, aos poucos, novos interesses passam a

ser reconhecidos pela doutrina e jurisprudência como merecedores de tutela,

ensejando o surgimento de novos danos ressarcíveis:

... essa flexibilização indica uma alteração gradativa e eminentemente jurisprudencial na estrutura da responsabilidade civil, a refletir a valorização de sua função compensatória e a crescente necessidade de assistir à vítima em uma realidade social marcada pela insuficiência das políticas públicas na administração e reparação dos danos.

À jurisprudência cabe a tarefa de determinar os interesses

merecedores de tutela ante a ausência de uma definição legal de dano,

somada à atipicidade dos interesses tuteláveis no ordenamento nacional.

30

CAPÍTULO VII

A RESPONSABILIDADE CIVIL NO CDC

O Código de Defesa do Consumidor disciplina a responsabilidade

pelos vícios de segurança, sob o título “Responsabilidade pelo Fato do Produto

e do Serviço” (artigos 12 à 14, 17 e 27) e a responsabilidade pelos vícios de

adequação, sob o título “Responsabilidade por Vício do Produto e do Serviço”.

A Responsabilidade por Fato do Produto ou do Serviço ocorre

quando o mesmo gera danos ao consumidor ou a terceiros (vítimas by

stander), o que se chama de acidente de consumo ou defeito de consumo,

prescrevendo em cinco anos o prazo para a reparação do dano.

O Vício do Produto ou do Serviço por sua vez, é a quebra da

expectativa gerada pelo consumidor quando da utilização ou fruição, afetando,

assim, a prestabilidade, tornando-os inadequados (Teoria da Qualidade). Na

ocorrência de vícios aparentes ou de fácil constatação a parte tem o direito de

reclamar em trinta dias tratando-se de fornecimento de serviço e de produto

não durável e noventa dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de

produto durável. Na ocorrência de um vício oculto, o prazo decadencial inicia-

se no momento em que ficar evidenciado o defeito aplica-se aqui a Teoria da

Vida útil do Produto.

A forma objetiva, ou seja, independente de culpa é a regra no

presente Código, excetuando-se a do profissional liberal que será verificada

mediante a comprovação de culpa. Também se pode afirmar que a regra no

CDC é a da responsabilidade solidária entre os participantes da cadeia de

consumo, excetuando-se a do comerciante na responsabilidade pelo Fato do

Produto, que será condicionada a certas circunstâncias. Diante de tais

circunstâncias a doutrina majoritária entende que o comerciante responde

subsidiariamente pelos danos ocorridos, por outro lado alguns doutrinadores

entendem ser a responsabilidade solidária.

Acertadamente afasta-se o caráter punitivo da responsabilidade civil,

principalmente no que concerne à seara da responsabilidade objetiva,

predominante no âmbito do Código de Defesa do Consumidor. A tutela,

31

expressa ou implícita, deve se voltar à proteção dos bens jurídicos sejam

materiais e os morais, seja um novo dano temporal. O intuito é garantir uma

efetiva proteção dos consumidores independente do grau de reprovabilidade da

conduta do fornecedor do produto ou serviço. O fato é que houve uma lesão ao

bem jurídico deste, havendo a imposição da reparabilidade desse dano, sem

adentrar nas razões pelas quais o fornecedor procedeu ou deixou de proceder

nos moldes que deveria.

O Código de Defesa do Consumidor em seu art. 4º, inciso I, d e

inciso V, exige qualidade do produto ou serviço prestado independente da

presença ou não da culpa na imposição de responsabilidade quando o produto

ou serviço não contiver as características que dele se espera. Antes, caberia

ao consumidor o ônus de arcar com o prejuízo apesar de não ter participado de

qualquer etapa ao longo do ciclo de produção. Ao fornecedor, caberia o bônus

advindo da venda do produto ou prestação do serviço, sem sofrer com o ônus

advindo de uma falha não culposa na cadeia produtiva.

Neste sentido, In CAVALIERI FILHO, 2010, p. 484:

Pela teoria do risco do empreendimento, todo aquele que se disponha a exercer alguma atividade no mercado de consumo tem o dever de responder pelos eventuais vícios ou defeitos dos bens e serviços fornecidos, independentemente de culpa. [...] O fornecedor passa a ser o garante dos produtos e serviços que oferece no mercado de consumo, respondendo pela qualidade e segurança dos mesmos.

32

CAPÍTULO VIII

A PERDA DE TEMPO ÚTIL DO CONSUMIDOR:

DANO TEMPORAL

O tempo, ainda, não possui valor jurídico próprio reconhecido de

modo expresso. Provavelmente por não haver sequer o reconhecimento de seu

valor pessoal, transcorrendo mesmo despercebido pelo homem: os seus

próprios titulares. Mais do que um elemento integrante da vida humana, o

tempo é a própria expressão dessa vida, que transcorre através daquele.

O decurso do tempo, em horas, dias ou semanas, não representa

somente uma unidade de medida de tempo, mas a representação do passar do

tempo, ou seja, da própria vida. Portanto, quando se dedica tempo à

determinada atividade, significa dizer que se está dedicando uma parcela da

própria existência à essa atividade. Da mesma forma, quando se despende

tempo com algo, significa, igualmente, que se esta despendendo uma parcela

dessa existência.

A perda de tempo provocada pelo próprio individuo já constitui

motivo de insatisfação. No entanto, é escolha pessoal e é quase inevitável que

isso aconteça. Posteriormente, quando se dá conta percebe como seu precioso

tempo foi mal utilizado. Mas essa é uma escolha privativa do próprio indivíduo,

de mais ninguém.

O problema é quando essa decisão, que cabe somente ao indivíduo,

é arrancada da sua esfera de poder, e exercida por outrem, que furta o seu

tempo – bem como a possibilidade de escolher em que perdê-lo – sem sua

permissão.

Aos que entendem ser mero dissabor, enganam-se. Perceberão o

equívoco no dia em que alguém, de modo intruso e desrespeitoso, roubar o

seu tempo, inestimável e irrecuperável, que não pode ser devolvido. Não se

devolve o tempo de vida que já transcorreu. Talvez uma compensação, em

uma tentativa tímida de reparar o mal infligido a outrem, mas jamais o retorno

ao status quo ante.

33

Assim, não há que se dizer que o tempo perdido é menos

importante, incômodo social aceitável, ou, como preferem os juristas, um mero

dissabor que não implica em ressarcimento. Esse tempo, que representa a

própria vida, foi tirado de quem detinha o direito de escolher como perdê-lo,

como investi-lo, ou como utilizá-lo. O importante é que a escolha de como

utilizá-lo caiba somente ao seu titular.

Apesar de não ser reconhecido de modo expresso como direito

subjetivo, o tempo desempenha papel essencial no atual ordenamento como

elemento essencial dos institutos da prescrição e decadência, conforme consta

dos artigos 26 e 27 do CDC, bem como nas demais áreas do direito. Encontra-

se também presente no art. 5º, inciso LXXVIII, dispositivo por meio do qual se

busca assegurar a todos, no âmbito judicial e administrativo, a “razoável

duração do processo”.

Do mesmo modo, conhecidos são os juros de mora (art. 52, § 1º,

CDC e artigos 249, 394, 407, dentre outros do CC), o tempo máximo para a

caracterização da posse de força nova (um ano e um dia da turbação ou do

esbulho, conforme art. 924 do CPC), e o prazo máximo para impetrar mandado

de segurança (120 dias contados da ciência, pelo interessado, do ato

impugnado, consoante art. 23 da Lei n.º 12.016/2009).

Ao consumidor impõe-se o respeito aos prazos estipulados sob pena

de decair seu direito de reclamar de vícios ou prescrever sua pretensão

ressarcitória aos danos. E ao fornecedor são impostos limites de prazo para a

solução dos vícios que seus produtos ou serviços apresentarem (art. 18, §1º do

CDC), motivo pelo qual concluímos que o tempo desempenha papel

fundamental na criação, extinção e modificação das relações jurídicas.

É por tal razão que Marcos Dessaune afirma que a missão de

qualquer fornecedor, hoje, é “contribuir para a existência digna”, “promover o

bem-estar” e “possibilitar a realização humana do seu consumidor”, sujeito em

função do qual existe. No entanto, os fornecedores têm tomado a posição

oposta à sua incumbência de proporcionar meios para a promoção do bem

estar dos consumidores e, estes, imersos na busca pela solução dos mais

diversos empecilhos tem perdido parcela considerável de seu tempo com

34

obstáculos ocasionados pelo próprio fornecedor, seja por “despreparo,

desatenção, descaso ou má-fé”.

Tal perda de tempo é responsável pelo que Marcos Dessaune

denomina desvio produtivo do consumidor, pois “para desempenhar qualquer

atividade, a pessoa humana necessita dispor de tempo e de competências

[conhecimentos, habilidades e atitudes], que constituem seus recursos

produtivos”.

Quando o fornecedor não cumpre o seu papel e ocasiona a perda de

tempo do consumidor, acarreta-lhe um desvio produtivo de suas atividades, as

quais passam a se direcionar para a solução dos impasses a que não dera

causa, tomando o tempo que deveria ser despendido com atividades de seu

interesse e de sua escolha. O consumidor tem parcela de seu tempo absorvida

pela tentativa de solucionar um problema decorrente da má prestação desse

serviço ou da falha no produto adquirido.

Tais situações são exemplos de mau atendimento, definido por

Marcos Dessaune nos termos expostos: Mau atendimento é a situação que se

evidencia, especialmente, quando a empresa, descumprindo sua missão

independentemente de culpa, fornece um produto final defeituoso, exerce uma

prática abusiva no mercado ou comete outros atos ilícitos, gerando algum tipo

de risco ou prejuízo para o consumidor, individual ou coletivamente.

Esse desvio produtivo é, segundo o autor, um novo dano,

responsável pela lesão de um dos recursos mais preciosos e, paradoxalmente,

mais banalizados que o ser humano possui: o tempo.

Bodil Jönsson afirma que o tempo é o verdadeiro capital pessoal do

homem (e não o dinheiro), sendo injusto que este seja transformado em um

bem sempre em falta. Busca-se ganhar tempo comprando algo que nos facilite

a vida, que nos faça economizar o tempo que sempre se esvai. E afirma que o

tempo que se possui é a verdadeira moeda de troca, “passível de ser

convertido em dinheiro [trabalho], em relações humanas, em interação com o

meio ambiente, em conhecimento, em aprofundamento de sentimentos”.

35

O tempo, “capital inestimável” e “recurso produtivo limitado,

inacumulável e irrecuperável”, é, sem dúvida, um bem social que merece

reconhecimento como bem jurídico.

Limitado porque é finito e, mais que isso, escasso, existindo sempre

em quantidade inferior ao que realmente se desejaria possuir. Inacumulável

porque não é tangível e passível de ser armazenado ou retido. Irreversível

porque uma vez transcorrido, não retorna mais.

Vê-se que quando o tempo, que o homem consumidor deveria

dedicar ao lazer, estudo e trabalho (valores esse assegurados

constitucionalmente), é tomado pelos percalços das relações jurídicas

estabelecidas entre consumidor e fornecedor, impede-se o usufruto daquilo que

se busca no momento do consumo: o prazer que este proporciona.

O homem busca, por meio de trocas no mercado de consumo,

satisfazer necessidades ou desejos. As novas tecnologias e serviços deveriam

facilitar essa busca, mas desempenham hoje exatamente o papel inverso, na

medida em que impõem ao consumidor a perda do seu tempo na busca – por

vezes infrutífera – de soluções aos problemas ocasionados pelos próprios

fornecedores.

O autor afirma que o reconhecimento desse novo dano temporal se

impõe ante as sucessivas ocorrências de mau atendimento aos consumidores.

Aduz, no entanto, que deve haver prévia disposição legal ou constitucional

tutelando este novo dano, em respeito ao princípio da legalidade (art. 5º, inciso

II, da CRFB/1988).

36

CONCLUSÃO

As relações jurídicas estabelecidas entre o sujeito consumidor e

fornecedor foram revolucionadas com princípios orientadores próprios e a

instituição de um novo rol de direitos, tutelando uma categoria que até então

não tinha um regramento jurídico adequado perante o mercado de consumo.

O novo diploma, resultado da imposição contida no art. 48 do Ato

das Disposições Constitucionais Transitórias, buscou a defesa do consumidor.

Apesar de toda a estrutura construída com a finalidade de tutelar o

sujeito vulnerável da relação de consumo, certas práticas perpetradas no

mercado são consideradas pela doutrina e jurisprudência majoritárias como um

mero dissabor, um contratempo, ou um simples aborrecimento, não passíveis

de reparação.

Ao analisarmos as questões decorrentes das relações de consumo

atuais, nos deparamos com a denominada perda de tempo útil, em que o

consumidor se vê obrigado a desperdiçar parcela de seu tempo, desviando-se

de seus recursos produtivos (como bem diz Marcos Dessaune), para solucionar

falha causada pelo fornecedor. Muitas das vezes opta por sofrer os prejuízos

pecuniários a sacrificar o escasso tempo que dispõe tentando resolver o

impasse a fim de garantir um direito que lhe é assegurado pelo Código de

Defesa do Consumidor. Essa perda de tempo, na maioria das vezes, não tem

sido considerada como merecedora de tutela.

Neste trabalho buscamos demonstrar o equívoco de tal

posicionamento ao analisarmos os princípios constitucionais – da dignidade da

pessoa humana, da liberdade, da isonomia e da defesa do consumidor –, bem

como dos princípios legais – da vulnerabilidade, da harmonia, da boa-fé, da

intervenção estatal, do protecionismo, do equilíbrio e da efetividade – que

regem a matéria.

O posicionamento jurisprudencial majoritário nega as diretrizes

norteadoras de todo o ordenamento nacional, na medida em que considera

tolerável a violação ao bem jurídico tempo do consumidor. Bem este que

representa um recurso limitado, inacumulável e irrecuperável (DESSAUNE,

2011, p.106).

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Quando o Estado-juiz ignora a existência de normas especialmente

voltadas ao consumidor impede sua tutela contra os possíveis prejuízos

advindos da atividade econômica desenvolvida pelo fornecedor.

O dever de responsabilizar nas relações de consumo surge quando

se constata a presença de uma conduta antijurídica e o seu correspondente

dano gerando. O dever de indenizar a vítima é caracterizado pelo desrespeito

aos deveres impostos pelo Código de Defesa do Consumidor.

A aceitação de um novo bem e, consequentemente, um novo dano é

feita com base na orientação dada pelos princípios e normas do sistema

jurídico que busca, além da garantia à tutela do consumidor, a efetivação da

dignidade da pessoa humana e a concretização da justiça social.

A doutrina, através da obra de Marcos Dessaune (Desvio Produtivo

do Consumidor: o prejuízo do tempo desperdiçado, São Paulo: Revista dos

Tribunais) e parte da jurisprudência nacional, notadamente pelo Tribunal de

Justiça do Rio de Janeiro, vêm reconhecendo na perda de tempo útil do

consumidor uma nova categoria de bem, cuja violação é passível de

ressarcimento.

A aceitação desse novo dano assegurará a aplicação da justiça, que

pressupõe a interpretação dos princípios que regem matéria, perante a

realidade brasileira no que tange às relações de consumo. Atualmente, uma

das mais corriqueiras práticas no mercado, a imposição dessa perda de tempo

ao consumidor deve ser reconhecida pela doutrina e combatida pelos tribunais

pátrios.

O ônus dessa perda de tempo, não pode ser imposto ao consumidor

visto que não foi este que prestou de modo inadequado o serviço, ou

comercializou um produto que não atende às qualificações que dele se exige,

bem como não lucrou com a atividade desenvolvida no mercado de consumo.

Portanto, não deve ser este a arcar com o ônus da demora na solução do

impasse, oriundo de uma conduta antijurídica perpetrada pelo fornecedor.

Por todos os motivos expostos neste trabalho constatamos ser

imperativa a necessidade de reconhecimento do dano temporal, para a tutela

efetiva dos consumidores.

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BIBLIOGRAFIA

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