DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL perguntas, das observações, das pesquisas, das...
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
O MARAVILHOSO UNIVERSO DOS CONTOS NO PROCESSO
DE ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO
Por: Patrícia Gomes do Nascimento Ramos
Orientador
Prof. Edla Trocoli
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Rio de Janeiro
2014
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
O MARAVILHOSO UNIVERSO DOS CONTOS NO PROCESSO
DE ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO
Apresentação de monografia à AVM Faculdade
Integrada como requisito parcial para obtenção do
grau de especialista em Educação Infantil e
Desenvolvimento.
Por: Patrícia Gomes do Nascimento Ramos
3
AGRADECIMENTOS
...à Deus, a minha amiga Aline da
Silva, aos meus familiares e a minha
orientadora professora Edla Trocoli
pois sempre foi atenciosa em minhas
solicitações...
4
DEDICATÓRIA
.....dedica-se ao pai, mãe, cônjuge e
filhos.......
5
RESUMO
Este trabalho monográfico de conclusão de curso de pós graduação
Educação Infantil e Desenvolvimento tem por objetivo realizar estudo sobre a
formação da criança leitora através dos contos e utilizações de recursos
diversos neste processo na educação infantil, a partir de interlocução com
autores da área, e o relato de experiências vividas na escola. O presente
estudo foi estruturado em três momentos, assim determinado: Literatura infantil
como prazer cotidiano; uma iniciação à leitura promovendo envolvimento e
encantamento. O leitor que queremos formar; aborda o principal sentido da
leitura e não apenas decodificação do código linguístico, mas a descoberta do
mundo pelas crianças, como seres críticos. Literatura como processo de arte
produtiva; proporciona o contato com as diversas literaturas utilizando-se das
multiplicidades de caminho através da arte. Os caminhos percorridos foram das
perguntas, das observações, das pesquisas, das respostas e das intervenções
para a realização de todo um processo de formação da criança-leitora.
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METODOLOGIA
Este trabalho monográfico dá-se a partir de como leitura de livros,
jornais, revistas, após coleta de dados, pesquisa bibliográfica, pesquisa de
campo, observação do objeto de estudo e algumas etapas vividas no ambiente
escolar mais especificamente na Educação Infantil. A Primeira etapa vem das
observações de como os livros foram utilizado em sala de aula por professores
de Educação Infantil. Tendo em vista essas observações na segunda etapa
procurou-se intensificar leituras, e por indicações de professoresdo curso
Normal Superior, com experiência em alfabetização e letramento, orientaram
as leituras de autores conceituados e maravilhosos como: Fanny Abramovich,
Nelly Novaes Coelho, Regina Zilberman, Marisa Lajolo, Magda Soares, Emilia
Ferreiro, Paulo Freira dentre outros.
E por fim a terceira etapa partiu-se de um curso de extensão oferecido
pela UFF (PROALE), que tratava-se da possibilidade de Alfabetização e
Letramento na Educação Infantil através do ouvir histórias. Depois
aconteceram participações em muitos outros cursos relacionados a este
assunto. Bem esses três aspectos transformados em observações, leituras e
ações abriram caminhos pelos quais foram percorridos: perguntas, respostas e
intervenções. O elemento alavancador que é a contação de histórias, pode sim
inserir a criança da Educação Infantil no mundo das letras.
Iniciaram-se as práticas através dos conhecimentos adquirido pelas
leituras e cursos de extensão, em uma creche comunitária subsidiada pela
Prefeitura de São Gonçalo. Foram experiências ricas e motivadoras, pois
comprovaram que de fato o interesse pelo objeto livro e pelo seu conteúdo
pode e deve sim começar na Educação Infantil como processo de
Alfabetização e Letramento. Aconteceram naqueles momentos alegria,
participação, entusiasmo quase que total das turmas envolvidas, é claro
respeitando o tempo de concentração de cada faixa etária. A contação de
histórias vinha trazendo com ela como recurso no processo da aprendizagem
música, dança, representação teatral, fantoches, dedoches, enfim, o lúdico
presente onde a linguagem oral era enriquecida e a curiosidade pala linguagem
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escrita era aguçada. Nesta pesquisa monográfica falar sobre a importância de
desenvolver na criança a vontade natural pela leitura. Como aquela que se tem
quando se ganha um presente embrulhado em um lindo papel e envolto em um
suntuoso laço de fitas.
Não existe um curso para crianças ensinando-as a ficarem felizes após
receber um presente, isso acontece naturalmente. Portanto assim deve ser
com os livros; dar a eles o formato de leitura-prazer. Leitura fonte inesgotável
de boas experiências numa relação cativante entre livro e leitor. E isso
dependerá de um conjunto de acontecimentos, passando pela família e tendo
continuidade na escola com critério e bom senso. Ambiente favorável para a
leitura, escolha de bons e interessantes livros e o respeito ao pequeno leitor em
todos os aspectos: físicos, emocionais e sociais.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 9
CAPÍTULO I - Literatura Infantil como Prazer Cotidiano 11
CAPÍTULO II - O Leitor que queremos Formar 20
CAPÍTULO III – Leitura como Processo de Arte Produtiva 31
CONCLUSÃO 40
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 42
INDICE 46
9
INTRODUÇÃO
Hoje se procurarmos as definições de criança e infância em qualquer
dicionário encontraremos seus significados, coisa que não acontecia se
olharmos para outros tempos, já que a infância como categoria etária nem
existia. “O historiador francês Phillipe Ariès, em sua obra clássica História
social da criança e da família” (Manuel Pinto, 1981), nos diz que na Idade
Média e no início da Idade Moderna não podemos falar ainda em uma
particularização da criança na sociedade europeia. São as mudanças sociais,
econômicas, religiosas, e políticas ocorridas no final do século XVII que
começam a criar um sentimento de infância que traz à tona e consolida-se
junto a sociedade burguesa.
A literatura infantil solidifica-se como gênero no final do século XVII e
durante o século XVIII. Antes disso as crianças não eram valorizadas como tal.
Não eram vista de forma diferenciada do adulto, com características e
necessidades próprias. Vem surgindo na mesma época, um novo conceito na
concepção de família: na valorização do núcleo familiar; pai, mãe e filhos
facilitando assim uma atenção maior ao desenvolvimento infantil, tanto nos
aspectos físicos, quanto nos emocionais.
Segundo Lajolo e Zilberman “durante o classicismo francês, iniciou-se a
valorização das histórias para crianças”. Foram escritas fábulas, tendo na
época a obra de Perruault grande destaque na literatura infantil. (Lajolo e
Zilberman, 1987) Não à toa é considerado pioneiro na arte de escrever para
crianças.
Outros autores também se destacaram na Europa entre os séculos XVIII
e XIX como Daniel Defoe, Jonathan Swift, Jacob e Wilhelm Grimm, Hans
Christian Andersen, Lewis Carroll, Collodi e James Barrie.
A burguesia se solidifica economicamente em cifrões, não mais em
aquisição de terras, reclama poder político, motiva as instituições a trabalharem
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a seu favor e incentiva um modelo familiar: pai provedor, mãe administradora
doméstica e as crianças com sua infância preservada e valorizada.
A criança passa a deter um novo papel na sociedade, motivando o
aparecimento de objetos industrializados (o brinquedo) e culturais (o livro) ou
novos ramos da ciência (a psicologia infantil, a pedagogia ou a psiquiatria) de
que ela é destinatária. Todavia, a função que lhe cabe desempenhar é apenas
de natureza simbólica, pois se trata antes de assumir uma imagem perante a
sociedade, a de alvo da atenção e interesse dos adultos, que de exercer uma
atividade econômica ou comunitariamente produtiva, da qual adviesse alguma
importância política e reivindicatória. Como decorrência, se a faixa etária
equivalente a infância e o indivíduo que a atravessa recebe uma série de
atributos que o promovem coletivamente, são esses mesmos fatores que o
qualificam de modo negativo, pois ressaltam, em primeiro lugar, virtudes como
a fragilidade, a desproteção e a dependência. (LAJOLO e ZILBERMAN, 1987)
A outra instituição alvo da burguesia foi a escola, que serviu de
mediadora entre família, escola e sociedade, com objetivo de encaminhar a
criança para enfrentamento do mundo. A burguesia é beneficiada e todos os
segmentos da sociedade, pois a escola passou a ser por lei obrigatória às
crianças de todas às classes:
Entretanto, a escola incorpora ainda outros papéis, que contribuem para
reforçar sua importância, colocando-a, a partir de então, imprescindível no
quadro da vida social. E quando por força de dispositivo legais, ela passa a ser
obrigatória para crianças de todos os segmentos da sociedade, e não apenas
para as da burguesia. (LAJOLO e ZILBERMAN, 1987).
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CATITÚLO I
LITERATURA INFANTIL COMO PRAZER COTIDIANO
Contar histórias é uma das práticas mais antigas que os seres humanos
utilizam para interagir. Nos velhos tempos, havia um costume de sentar-se ao
redor do fogo para momentos de conversas e contos de casos. Por meio da
linguagem oral se transmite histórias desde os primórdios. Sejam elas verídicas
ou não. Tais momentos levam-nos a outras culturas, povos e crenças
permitindo-nos assimilar novos conhecimentos e descobertas, estimula nossa
imaginação e nos faz adquirir valores morais. Por meio de histórias adultos e
crianças compartilham de momentos importantes em suas vidas, estreitam os
laços e promovem instantes de conversas sobre os mais diversos assuntos;
mortes, triunfos, religião... Toda essa ação oral de contar histórias, com o
passar dos anos, acabou sendo registrada na forma escrita. Em uma
sociedade crescente tanto industrialmente quanto tecnologicamente, como era
a Europa no século VXIII, a produção e a expansão de livros através da
comercialização é responsável pela disseminação da leitura e coloca o livro em
condição de mercadoria. Nesse momento, a literatura infantil que depende da
leitura da criança se junta à escola, que por sua vez é responsável em tornar a
criança leitora e consequentemente consumidora de livros.
No século VXIII destacaram-se: os contos de fadas Perrault, Robson
Crusoé (1719) de Daniel Defoe, e as viagens de Gulliver (1726) de Jonathan
Swift. No século XIX os irmãos Grimm, também com contos de fadas, fizeram
grande sucesso. Outros autores também reconhecidos foram: Hans Christian
Andersen com seus contos de fadas (1833), Lewis Carroll, em Alice no país
das maravilhas (1863), Collodi, em Pinóquio (1883) e James Barrie, em Peter
Pan (1988).
Em 1808, com a chegada de D. João VI ao país implantou-se a
Imprensa Régia e junto com ela a literatura e a publicação de livros infantis,
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está com produções pobres e irregulares para crianças. Transcorre muito
tempo até que o livro torne-se um objeto mais comum, pelo menos nos centros
urbanos. Entre 1890 e 1920 houve desenvolvimento nas cidades, aumento da
população, desenvolvimento das classes sociais intermediárias e por sua vez
maior acesso a literatura. A literatura infantil brasileira começa com destaque
para Monteiro Lobato que rompeu com dogmas literários de sua época e com
padrões pré-fixados. Seu espirito crítico e inconformidade com a situação da
sociedade brasileira apareceram em seu estilo literário. Monteiro Lobato deu
vida a cultura brasileira, valorizou o folclore nacional e deu ênfase ao homem
do campo. Podemos observar esses aspectos no Sitio do Pica-Pau Amarelo.
Havia na época por parte de Lobato uma preocupação com as questões
sociais e uma realidade crítica colocada em sua obra. Ele abre caminhos e
direciona as inovações no ramo da literatura infantil para que o Modernismo,
que já alcançava a literatura adulta chegasse também às crianças. Monteiro
Lobato desvencilha-se de regras preestabelecidas de sua época. Seus livros
infantis trouxeram à tona um mundo irreal, mas que fala e se antecipa aos
preconceitos e conceitos que eram vivenciados pela sociedade de seu tempo.
“Monteiro Lobato cria, entre nós, uma estética de literatura infantil, sua obra constituindo-se no grande padrão do texto literário destinado à criança. Sua obra estimula o leitor a ver a realidade através de conceitos próprios. Apresenta uma interpretação da realidade nacional nos seus aspectos social, político, econômico, cultural, mas deixa, sempre espaço para a interlocução com o destinatário. A discordância e prevista. (CADEMARTORI, 1986.p.51)
Lobato também adaptou contos de Perrault, dos irmãos Grimm, de
Andersen e de outros autores, mas suas obras mais conhecidas e que
ganharam destaque foram: A menina do nariz arrebitado, Reinações de
Narizinho, Emília no país da gramática, Memória de Emília, Jeca Tatuzinho,
entre outras. Quantas tantas crianças já não se divertiram, riram e se
emocionaram ouvido as história de Lobato. São histórias de caráter atemporal.
Ontem e hoje; não perderam o seu valor de encanto e nem o valor critico no
que diz respeito às questões sociais atuais.
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Em algum momento de nossa trajetória humana, infelizmente, a mídia e
o acesso a tantas tecnologias estão substituindo cada vez mais o convívio
familiar e momentos agradáveis de conversas e diálogos. Daí resgatar essa
pratica do ouvir, ler, contar ou inventar histórias é tão importante. É oportunizar
a criança vivencias do dia-a-dia e o compartilhar de novas experiências
Conforme diz Abramovich:
“O primeiro contato da criança com um texto é feito oralmente, através da voz da mãe, do pai ou dos avós, contando contos de fadas, trechos da Bíblia, histórias inventadas (tendo a criança ou os pais como personagens), livros atuais e curtinhos, poemas sonoros e outros mais... contados durante o dia _ numa tarde de chuva, ou estando todos soltos na grama, num feriado ou domingo _ ou num momento de aconchego, à noite, antes de dormir, a criança se preparando para um sono gostoso e reparador, e para um sonho rico embalado por uma voz amada. Ler histórias para crianças, sempre, sempre, sempre... É poder sorrir, rir, gargalhar com as situações vividas pelas personagens, com a ideia do conto ou com o jeito de escrever dum autor e, então, poder ser um pouco cúmplice desse momento de humor, de brincadeira, de divertimento...” (ABRAMOVICH, 2005, p.16-17)
1.1– Universo dos contos
Quem não se lembra das histórias contadas na infância? Bons
momentos no âmbito familiar que nos faziam rir, sentir compaixão, medo,
alegria, raiva do vilão, uma doce contemplação com as princesas e seus
príncipes encantados, reinos e lugares mágicos. Criar um clima de
envolvimento nas histórias contidas nos contos, nas fábulas ou em qualquer
gênero literário, é permitir que os pequeno ouvintes usem seus imaginários;
permitir que criem monstro, sintam o vento forte da tempestade que este se
formando, sintam arrepio com a mansão mal assombrada, gritem de pavor,
gargalhem do engraçado e brinquem com as palavras de uma gostosa poesia
que acabara de ser contada. Muitas coisas podem nascer de um texto lido para
as crianças; além do divertimento, questões internas que podem ser
externadas através de indagações sobre por exemplo por que abandonar duas
crianças indefesas na floresta escura e fria. Divertir-se com o inventar de novas
palavras para os objetos como faz o menino Marcelo Marmelo Martelo (Rute
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Rocha) ou teatralizar uma história de piratas. Contar histórias é uma prática
que requer dinamismo e persistência, pois tudo deve ser realizado com
dedicação, sensibilidade e criatividade, entendendo a essência da criança,
olhando para a literatura infantil como um momento de diálogo entre o interior e
o exterior, propiciando um relacionamento entre leitura e vida.
1.1.2 – A prática do ouvir
Uma prática deliciosa experimentada antes mesmo do ingresso no
universo escolar. O livro sendo apresentado como uma caixa de surpresas
onde o conto e reconto deixa de ser um repertório enfadonho. As histórias não
derivam apenas de palavras, mas de imagens, sons e plásticas. Não basta
alimentar o corpo é preciso alimentar a alma. As crianças tem sede de
aprender, quando estimuladas, querem saber mais e mais. Querem participar,
interagir, realizar, e sem perceber constroem conhecimentos que as tornam
participativas no meio em que vivem.
O ouvir histórias oportuniza às crianças um leque de experiências
interiorizadas, levando-as a construir uma interação com o mundo e aos
poucos fazendo-as detentoras de uma consciência crítica que gradativamente
as retiram de suas zonas de conforto. Elas adentram nas histórias e se
colocam no lugar das personagens e vivem seus conflitos e situações diversas
de confrontos, perigos, sustos, mortes, encontros, desencontros e decisões
difíceis a serem tomadas. As história abordam problematizações que
contribuem para o desenvolvimento da criatividade e trabalham no emocional
da criança.
“É uma possibilidade de descobrir o mundo imenso dos conflitos, dos impasses, das soluções que todos vivemos e atravessamos_ dum jeito ou de outro_ através dos problemas que vão sendo defrontados, enfrentados (ou não), resolvidos (ou não) pelas personagens de cada história (cada uma a seu modo)..” (ABRAMOVICH, 2005,p.17)
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Se prestarmos atenção, notaremos que é do exercício de ouvir e contar
histórias, que surge nas crianças uma relação com a leitura e a literatura.
Portanto essa prática precisa ser diária, tanto junto a família quanto nas
escolas visando o aprimoramento e contribuindo assim, para formar leitores
que gostem de ler.
Para progredirmos em uma prática inalterável de leitura é importante
observar a qualidade dos textos. Para não cair na infeliz possibilidade de
oferecer para a criança textos pobres é preciso uma análise prévia levando em
consideração vários aspectos: faixa etária, boas tramas, dinamismo ... Não
importa se curtas ou longas, o importante nas histórias narradas é aproveitar
esses momentos agradáveis e transformá-los em pura diversão e tornar
possível o acesso ao desenvolvimento das diferentes linguagens.
Utilizar as diferentes linguagens (corporal, musical, plástica, oral e escrita) ajustadas às diferentes intenções e situações de comunicação, de forma a compreender e ser compreendido, expressar suas ideias, sentimentos, necessidades e desejos e avançar no seu processo de construção de significados enriquecendo cada vez mais sua capacidade expressiva. (KRAMER, 1997, p. 26)
1.2 – Direcionar caminhos
O caminho da literatura no ambiente escolar marcará com certeza novos
rumos. É claro que dependerá do desejo do professor e da escola em inserir a
criança da Educação Infantil no contexto do prazer de ler. As dinâmicas podem
ser das mais variadas, desde o flanelógrafo ao computador. Dos mais simples
ao mais modernos. O professor assumirá o papel de contador de histórias.
Contos de fadas, poesias, gibis, notícias de jornais, tudo é claro, dentro do
interesse das crianças. O importante é envolve-los. A leitura é desafiadora para
a criança e ler por prazer é o motivo desse desafio, portanto não faz sentido
exigir tarefas que anulem o prazer da leitura.
Boas doses diárias de leitura agradável suscita na criança uma certa
cumplicidade com o livro. Ela vai se interessar por ele, vai querer pegar,
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folhear, observar as gravuras, as formas a escrita, podendo leva-lo ao interesse
pela literatura e seus mais variados gêneros. Tornando-o um leitor fluente e
permitindo que a narrativa atinja a sensibilidade do leitor com uma gradativa
consciência crítica do mundo.
1.3 - As várias faces da literatura para crianças
Trabalhar com várias faces de gêneros literários objetiva principalmente o
desenvolvimento de habilidades e competências de leitura. As crianças
apropriam-se da linguagem, e através dos textos trabalham a diversidade de
gêneros literários viabilizando assim o acesso ao mundo letrado e o
entendimento da língua escrita. Textos ficcionais, contos de fadas, narrativas
de suspenses, lendas populares, mitos, poesias, gibis, histórias engraçadas,
dramas, histórias não verbais que falam através de gravuras, enfim, envolver a
criança numa trama literária de tirar o fôlego e despertar a aprendizagem por
um caminho de possibilidades diversas de emoções que são afloradas pela
leitura. Não existe impedimento quanto à leitura de diversos tipos de textos. A
literatura infantil é rica em livros, estilos e histórias. Existem produções
belíssimas e bem feitas. A obra literária é um objeto social, é uma porta para o
mundo da arte de inventar, sonhar, explorar... É fundamental apresentar às
crianças todos os gêneros literários desde a Educação Infantil e cabe ao
professor ser mediador nesta tarefa.
Para envolver e encantar à criança que ouve a história alguns aspectos são
relevantes: o ritmo como canção para os ouvidos, a brincadeira com as
palavras, o tom de voz, ora baixinho, ora com empolgação, usar a expressão
facial: alegria, espanto, tristeza, medo... Emocionar o ouvinte transmitindo
confiança, admiração, motivação e atenção.
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1.3.1- O poder da palavra
A contação de histórias, apreende o poder da palavra, do som de suas
variadas formas, ligada ao gestual simbólico do narrador. O contar histórias é
uma prosa que modifica-se conforme a plateia, lugar, momento. Um contador
utiliza-se das várias figuras de linguagem como metáforas, pleonasmos,
hipérboles, etc. Desta forma a narração de uma história, de um conto, lenda ou
mito torna-se capaz de hipnotizar, e assim transformar a fantasia em realidade.
E a criança habituada em ouvir histórias desenvolve e estimula a imaginação e
o gosto pela leitura.
A história deve servir para ampliar o mundo da criança, é claro que de
forma natural sem a obrigatoriedade de atividades complementares chatas e
entediosas. Desde a Educação Infantil o espírito crítico da criança deve ser
estimulado. Afinal porque as princesas, as fadas e mocinhas são sempre
esbeltas, loiras, olhos azuis... Os príncipes e heróis sempre corpulentos,
impecavelmente vestidos e seus cavalos são brancos. E o negro quando
aparece é sempre marginal ou serviçal. O protótipo de família pai e mãe
perfeitos, filhos obedientes, vovô e vovó velhos, bem velhos. Vovô de pijamas
lendo jornal, e a vovó sempre fazendo guloseimas. O resultado visual de toda
essa estética pode servir como pano de fundo para conversas bem promissora
sobre a sociedade em que vivemos. É claro respeitando sempre as faixas
etárias. Afinal compartilhar informações e uma possibilidade de educar.
“O “homem melhor” chegará a ser sujeito por meio de uma consciência e de uma reflexão sobre sua situação, sobre seu meio concreto, engajado, presentes a intervir no mundo real para o transformar. Tal critério tem por meta desenvolver autonomia intelectual e emocional, procurando uma tomada de consciência por meio das atitudes críticas sobre as quais o homem escolherá livremente, decidirá e deliberará, no lugar de submeter-se, vivendo assim em cooperação de forma autônoma e responsável.” (SALTINI, 2008, p.38)
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A expressão verbal é de suma importância no espaço escolar. Um espaço
que deve ser de libertação, orientação e acessibilidade ao mundo da cultura. A
escola precisa abranger essas qualidades para descaracterizar um sistema
tradicional e rígido no que diz respeito à leitura. Os questionamentos que
possam surgir através das história, as opiniões e sugestões dos alunos, sobre
o que foi contado ou sobre que tipo de histórias gostariam de ouvir. Valorizar o
que ele têm a dizer, pois o diálogo é fundamental para a formação de uma
nova mentalidade que se dá através de boas leituras, sejam elas lidas ou
ouvidas.
Um mundo de encantamento e divertimento se abre para a criança através
das histórias. A relação entre lúdico e prazer com a obra literária viabiliza a
formação do leitor. É na exploração da fantasia e do imaginário, que se cria e
se fortalece na interação entre texto e leitor. A troca das crianças com a obra
literária está na qualidade dos aspectos formativos nelas apresentadas de
maneira fantástica, lúdica e simbólica. A continuidade dessa interação,
direciona à criança a uma maior compreensão do texto.
A literatura infantil se constrói em um mundo de imaginação, sonhos e
fantasias. A criança que desde cedo tem contato com obras literárias terá uma
visão de mundo ampliada, capaz de compreender a sociedade com um olhar
mais crítico, diversificando suas percepções. Enquanto diverte a criança, o
conto de fadas a esclarece sobre si mesma, e favorece o desenvolvimento de
sua personalidade. Oferece significados em níveis diferentes e enriquece a
existência da criança de tantos modos que nenhum livro pode fazer justiça a
multidão de diversidade de contribuição que esses contos dão a vida da
mesma.
“Para que uma estória realmente prenda a atenção da criança, deve entretê-la e despertar sua curiosidade. Mas para enriquecer sua vida, deve estimular-lhe a imaginação: ajudá-la a desenvolver seu intelecto e a tornar clara suas emoções; estar harmonizada com suas ansiedades e aspirações; reconhecer plenamente suas dificuldades e ao mesmo tempo sugerir soluções para os problemas que a perturbam.” (BETTELHEIM, 1996, p.13)
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A interação ao mesmo tempo receptiva e criadora se traduz em palavras e
isso não é mero reflexo da mente. Essa interação se processa através da
mediação da linguagem verbal, escrita ou falada. Infelizmente as crianças
brasileiras ainda não tem o habito de ler. Poucas tem contato com a literatura
antes de chegar à escola. E quando chegam, encontram um professor que não
está preparado para trabalhar com a literatura infantil. Fazem desse momento
uma obrigação tirando da criança a oportunidade de ver na literatura um
instante de prazer, pois ao inseri-la no contexto escolar dão um tom de
obrigatoriedade. Muitas vezes os livros são escolhidos sem critério, o que
impossibilita sua compreensão e seu interesse pelos textos.
“... não se contrata um instrutor de natação que não sabe nadar, no entanto, as salas de aula brasileira estão repleta de pessoas que apesar de não ler, tentam ensinar.” (MACHADO, 2001, p.45)
Uma boa história é carregada de caminhos que levam a aprendizagem, que
poderão ser objeto de diálogos com às crianças estabelecendo assim relação
entre personagens e cotidiano. A literatura infantil trabalhada em sala de aula
que alcança bons resultados, são aquelas que a criança interage com os mais
diversos textos, trazendo entendimento do mundo em que está contextualizada
e constrói seu próprio conhecimento gradativamente. O professor precisa
trabalhar a obra literária objetivando alcançar um ensino de qualidade,
desenvolvendo recursos capazes de intensificar a relação de formação do leitor
com a leitura.
O Referencial Curricular evidencia, referente ao trabalho com a linguagem,
amplos objetivos: a Literatura, suas múltiplas linguagens e as possibilidades de
ações pedagógicas desenvolvidas com a criança, que dentre elas, destacam-
se:
• Ler, contar e ouvir histórias, poesias, parlendas e outros diferentes
tipos de textos;
• Cantar antes, durante e depois dos textos;
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• Imitar gestos, dramatizar personagens;
• Criar novas histórias ou modificar outras conhecidas;
• Ater-se aos fatos da vida ou da imaginação;
• Aprecias diferentes ilustrações: cores, formas, figuras – fundo;
• Modelar, recortar, pintar, colar e etc;
• Expressar sentimentos, dúvidas e/ou as associações de ideias e
palavras.
A oralidade, a leitura e a escrita precisam ser aplicadas de forma integrada
e complementar, fortalecendo os diferentes aspectos que cada uma dessas
linguagens apresenta-se na criança. Ao levar a literatura infantil para sala de
aula, o professor estabelece uma relação dialógica com o aluno, livro, cultura e
realidade. Além de contar e ler histórias, o professor deve dar espaço para a
criança trabalhar posições, pontos de vista, defender ou não atitudes dos
personagens, suscitar situações diversas através das quais, a própria criança
construa uma nova história.
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CAPÍTULO II
O LEITOR QUE QUEREMOS FORMAR
Nos últimos tempos a necessidade em dominar a leitura e a escrita, em
uma sociedade grafocentrica como a nossa, se faz cada vez maior. Quando
abrimos as páginas dos jornais nos classificados percebemos as exigências
feitas pelo empregador. Cobra-se do candidato às mais variadas funções que
indiquem o domínio da língua portuguesa, que seja bom ouvinte, que tenha
uma boa articulação verbal, que redija bem e que tenha facilidade em entender
textos. É uma demanda mundial o domínio da língua escrita e oral.
A leitura proporciona ao indivíduo o acesso as mais variadas
informações, desde uma receita de bolo a um artigo científico. No entanto não
é apenas para o âmbito profissional que esse conhecimento é importante. Para
o crescimento deste indivíduo como um sujeito participante socialmente, crítico
das realidades que o cerca e com condições para exercer efetivamente sua
cidadania. Ser um sujeito que disfrute competentemente da língua escrita para
a prática da cidadania.
A revista Época de 16 de Dezembro de 2013 traz uma reportagem sobre
a avaliação feita pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE). Esta pesquisa constata que o Brasil desde o ano 2000
não teve avanços significativos em relação ao desenvolvimento dos alunos nos
conhecimentos de leitura, matemática e ciências. O Brasil ocupa no ranking
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entre sessenta e cinco países o 58° lugar. Ficamos atrás na América Latina do
Chile e do México e ainda, alunos pobres avançam menos que os ricos. A
Fundação Lemann, ONG especializada em educação, afirma através de
pesquisas realizadas que em mais de cinco mil municípios mapeados, apenas
23% dos alunos do 5° ano sabem o que deveriam respectivamente nas
disciplinas matemática e português. No 9° ano a situação piora, esse número
cai para 8%. Segundo o coordenador da ONG, Ernesto Farias ser um gênio em
exatas ou em humanas não dá ao aluno possibilidade maior de escolhas de
seu futuro profissional, pelo contrário, apenas limita-o e restringe suas
oportunidades.
Toda e qualquer área de atuação profissional sejam elas exatas ou
humanas passam pelo crivo da leitura. Segundo Rafael Luchesi, diretor de
Educação da Confederação Nacional da Indústria: “Os profissionais
qualificados para trabalhar na indústria precisam saber ler um manual e
escrever um relatório”. Ou seja o fato de muitos hoje não gostarem de ler,
como apontam alguns teóricos da área, sucede do lugar cada vez mais restrito
que a leitura ocupa no cotidiano dos alunos, das maneiras que são abordadas
e na própria formação precária do professor. Essa mesma reportagem aponta
soluções práticas para melhora no desempenho usando o exemplo da Escola
Estadual Oscar Batista, na zona rural do Rio de Janeiro no município de
Cambuci. A escola fez mutirão para pegar alunos em casa, envolveu as
famílias e criou programa de leitura para professores que consequentemente
estimularam o hábito de leitura entre seus alunos. Medidas práticas e eficazes
mudaram a história de alunos e professores da escola Oscar Batista. Hoje
existem grupos de estudos entre os alunos. Antes, menos de 20% dos alunos
tinham interesse em cursar uma universidade hoje mais de 80% optam pela
universidade.
2.1- Leitura de mundo
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Um cidadão consciente e profissional competente forma-se lá atrás
começando na família e passando pela escola. A criança já chega na escola
com sua leitura de mundo e a escola é o lugar privilegiado de práticas
relacionadas a leitura e a escrita, e não apenas decodificação mecânica do
código linguístico. Percebemos a oralidade da criança que ainda não sabe ler
nem escrever, mas pode ser considerada letrada, pois demonstra
características orais adquiridas nas práticas orais cotidianas com outras
crianças e com adultos com quem convivem. Olhando por esse aspecto:
“letrado é o indivíduo que participa de forma significativa de eventos de letramento e não apenas aquele que faz uso formal da escrita” (MARCUSCHI, 2001, p25).
As escolas de Educação Infantil são instituições primeiras no contexto
escolar na vida de uma criança. Ao ingressar na Educação Infantil a criança
precisa se sentir cuidada, socializada por meio de brincadeiras, músicas,
literatura infantil, emoções e sobre tudo ser estimulada a fala oral. A criança já
chega à escola com sua vivência cotidiana e o professor precisa ouvi-la e
estimula-la para tornar a prática pedagógica mais significativa a partir do que
ela fala. As várias história que surgem dos mais diversos temas podem e
devem estabelecer elos entre vivências e observações do meio à sua volta.
Práticas de cidadania com a criança se percebendo como eu no mundo e até
mesmo conversas sobre assuntos difíceis como: doenças, morte e violência,
dependendo das situações vividas pela criança. Cada uma em seu contexto
familiar. Cada história de vida é uma única vivida por cada um. E todas tem que
ser valorizadas. Estabelecer um diálogo com a criança é muito importante para
uma relação ativa entre falante e língua, pois a criança vivencia o mundo e
ouve a língua antes mesmo de ler e escrever.
“Aquele quintal foi a minha imediata objetividade. Foi o meu primeiro não-eu geográfico pois os meus nãos-eus pessoais foram meus pais, minha irmã, meus irmãos, minha avó, minhas tias e Dadá, uma bem-amada mãe negra que menina ainda se juntara a família nos fins do século passado. Foi com esses diferentes nãos-eus que me construí
24
como eu. Eu fazedor de coisas, eu pensante, eu falante.” (FREIRE, 2006 p:24)
2.1.2- Vivencias cotidianas
Desde a infância o homem é um ser em constante construção e está em
processo permanente de aprendizagem. A criança ainda pequena narra
situações e vivencias cotidianas, é grande observadora e leitora do mundo.
Nas brincadeiras podemos perceber como ela enxerga o mundo. Demonstra
entender as relações de poder (mãe coloca o filho de castigo, polícia prende
bandido); perigo (medo de cachorro, dar a mão para atravessar a rua);
fenômenos da natureza (sol que aquece, chuva que cai, a borboleta que pousa
nas flores) e tantas outras experiências vividas que são expressadas por
palavras que produzem sentidos, cria realidades que a coloca no mundo como
ser atuante de suas vivencias. Ela constrói conhecimento prévio, valores, forma
opiniões e dialoga direta e indiretamente com o mundo através de interlocução
com outras pessoas ou pelas diversas mídias: televisão, computador, livros...
As histórias narradas vivenciadas em diferentes contextos e situações formam
diálogo e interação entre criança e professor e a partir daí fazer da escola um
lugar privilegiado, onde se promove a prática discursiva relacionadas à leitura e
a escrita.
“... no sentido amplo das relações que o sujeito e seus discursos estabelecem na sociedade com a multiplicidade dos seres humanos, marcados cultural e historicamente, com os quais interagem de muitas maneiras, não somente face a face” (GOULART, 2007, p.95).
2.2 – Escola consciente
O ambiente escolar precisa tornar-se um espaço de inclusão, de vitórias
e legitimamente democrático. Portanto, precisamos estar consciente de seu
papel e rejeitarmos o estigma do fracasso presente nas escolas, que muitas
25
vezes contribuem para valorização da cultura da classe privilegiada em
detrimento da cultura das classes populares. Como destaca Magda Soares,
são constituídas teorias da patologização da pobreza, da crença da deficiência
linguística e da ideologia de deficiência cultural. (SOARES, 1995, p.19)
Segundo esta premissa, as professoras Maria José Palo a Maria da
Rosa de Oliveira realizaram uma pesquisa sobre o preconceito no dia-a-dia da
escola, onde o fracasso escolar dentro da teoria da deficiência linguística
significa a ausência de saberes que a escola legitima e que os grupos menos
favorecidos economicamente não dominam.
“Assim, os alunos passam a ser vistos como “deficientes”, “carentes”, do conhecimento e habilidades que não possuem.” (PALO e OLIVEIRA, 1998 p.49)
Dividindo este pensamento, Magda Soares define aquilo que chamamos
de Educação Compensatória, que teria como objetivo de suprir uma suposta
deficiência oriunda do meio sócio-cultural e familiar do aluno. Desta maneira, a
escola se desobrigaria da sua incumbência social e concederia aos pais a
culpa pelo desajuste, responsabilizando-os por suas condições sociais e, assim
sendo, o fracasso escolar do aluno.
“A escola deve respeitar a linguagem oral, que pode não ser apresentada de modo uniforme por todos os falantes, mas será sempre legítima, uma vez que cumpre sua função primordial: a comunicação.” (SOARES, 1995 p.23 e 61)
2.2.1 – A escrita e a leitura
A verdade é que decifrar código escrito não basta. É preciso
correlacionar a realidade e conferir-lhe sentido. O dever da educação e intervir
positivamente no processo de alienação a que é submetido diariamente o aluno
26
em suas relações no meio em que vive. Os textos infantis escrito por adultos
idealizam e constroem aspectos diversos que podem ser internalizados pelas
crianças de forma positiva ou negativa. Portanto dar voz e vez a criança
oportuniza o exercício de um olhar crítico que impulsiona a construção do
atribuir sentido às palavras; inserindo a criança no mundo entendida como
sujeito ativo, produtor de conhecimento, criadora de cultura.
Eni Pucinelli Orlandi sinaliza que, quanto mais distanciada estiver o oral
da criança da língua padrão, mais afastadas serão suas hipóteses em relação
à escrita padronizada. Por isso e preocupante para os professores a respeito
das crianças que leem, mas não se apropriam do sentido dos textos, isto é,
apenas decodificam palavras. (ORLANDI, 1987 p.9)
A leitura é um processo que se inicia naturalmente, anterior a entrada da
criança na Educação Infantil. Incoerentemente, a escola torna-se a responsável
pelo acanhamento da criança-leitor, mediante suas práticas desanimadoras. A
esta criança é exigida seguir regras como, pronuncia correta, leitura perfeita,
ortografia sem erros, treino de caligrafia e etc... Deste modo, o professor usa
destes recursos para justificar o aprimoramento no desempenho oral e escrito
da criança, sem a preocupação com o entendimento do que está sendo lido e
fazendo da leitura um momento descontextualizado e mecânico de técnicas
artificiais, que só levam a frustração do aluno e do professor. Deste porque não
consegue os resultados esperados, pois não permite à criança que invente e
crie enquanto lê, daquele porque não encontra sentido nem prazer no ato da
leitura.
“A leitura não é linear como a escrita e, portanto, se constitui em processo diferente que deve ser analisada por suas especificidades. A construção da escrita é um trabalho de composição de um todo, por sua incompletude. Já na leitura o aluno tem que atribuir sentido a um texto pronto e as letra devido ao seu caráter arbitrário que não facilita a compreensão.” (GERALDI, 1991 p.43)
A leitura é um momento de pensar sobre o que se ler, apropriar-se das
ideias e informações recebidas. A criança quando bem estimulada a passear
27
por diferentes textos, adquire habilidades básicas para perceber criticamente o
que está escrito nas linhas e entrelinhas do texto.
“Chega mais perto e contempla as palavras. Cada uma tem mil faces secretas sob a face neutra e te pergunta, sem interesse pela resposta, pobre ou terrível, que lhe deres: Trouxestes a chave?” Carlos Drummond de Andrade”
2.3- Alfabetização e letramento: Origem do termo
O letramento é uma palavra que ainda não está relacionada nos
dicionários, mas já faz parte do vocabulário no ambiente educacional desde
meados dos anos 80. Originada da palavra inglesa literacy, que indica condição
de ser literate, ou seja, aquele que vive em estado ou condição de saber ler e
escrever. No Brasil, o termo foi usado pela primeira vez por Mary Kato, em
1986, na obra “No mundo da escrita: uma perspectiva psicolinguística”. Dois
anos depois, passou a representar um referencial no discurso da educação, ao
ser definido por Tfouni em “Adultos não alfabetizados: o avesso do avesso.” Na
obra de Mary Kato destacam-se aspectos de ordem psicolinguísticas que
envolvem a aprendizagem da linguagem escolar da criança. O termo
letramento está ligada à formação do cidadão funcionalmente letrado, capaz de
se perceber, através da linguagem escrita, como cidadão com necessidades
individuais e do ponto de vista cognitivo entender a demanda social da
sociedade.
“A função da escola, na área da linguagem, e introduzir a criança no mundo da escrita, tornando-a um cidadão funcionalmente letrado, isto é, um sujeito capaz de fazer uso da linguagem escrita para sua necessidade individual de crescer cognitivamente e para atender às várias demandas de uma sociedade que prestigia esse tipo de linguagem como um dos instrumento de comunicação. Acredito ainda que a chamada norma padrão, ou língua falada culta é consequência do letramento, motivo por que indiretamente, é função da escola
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desenvolver no aluno o domínio da linguagem falada institucionalmente aceita.” (KATO, 1986 p7)
Na obra de Leda V. Tfouni, ela sinaliza o termo alfabetização como
situação individual e destaca o termo letramento como prática social e histórica
que promove mudanças sociais através do cidadão que se torna letrado.
“A alfabetização refere-se à aquisição da escrita enquanto a aprendizagem de habilidades para leitura, escrita e as chamadas práticas de linguagem. Isto é levado à efeito, em geral, através do processo de escolarização, e, portanto, da instrução formal. A alfabetização pertence, assim ao âmbito individual. O letramento, por sua vez, focaliza os aspectos sócio-históricos da aquisição da escrita. [...] tem por objetivo investigar não somente quem é alfabetizado, mas também quem não é alfabetizado, e, neste sentido, desliga-se de verificar o individual e centralizar-se no social mais amplo.” (Tfouni, 1988 p9)
Para Emília Ferreiro o termo letramento não tem designação especifica,
ela considera algo que deveria estar naturalmente inserido na alfabetização.
Suas pesquisas estão direcionadas mais para o cognitivo no processo de
aprendizagem da língua e divide esse processo em cinco fases até finalmente
o estágio da escrita alfabética ser atingida. Através de suas pesquisas e
publicações, coloca-nos diante de uma concepção radical do sujeito aprendiz, e
de suas relações com este objeto de aprendizagem que é a leitura e a escrita.
A língua deve ser um lugar de criação e não uma obrigatoriedade, uma
imposição. As crianças estão prontas para aprender sempre que tiverem
interesse de descobrir, explorar... o universo letrado.
” Ninguém é um leitor perfeito, e todos continuamos a aprender, cada vez que lemos.” (FRANCO, 1997, p.16)
Em entrevista à Revista Nova Escola, Regina Scarpa nos fala da
polêmica em torno do assunto. Alguns educadores rejeitam esta prática por
acreditar que o lúdico nesta fase da vida da criança ficaria prejudicada pela
antecipação de práticas pedagógicas tradicionais. O que não é verdade pois a
29
prática do ensino da língua, na educação infantil, não precisa ser uma prática
tradicional.
“Como se a escrita entrasse por uma porta e as atividades com outras linguagens (música, brincadeira, desenho etc.) saíssem por outra. Por outro lado, há quem valorize a presença da cultura escrita na Educação Infantil por entender que para o processo de alfabetização é importante a criança ter familiaridade com o mundo dos textos. (SCARPA, 2006, p.1)
Jean Foucambert nos atenta para o processo de Alfabetização e
Leiturização que reflete sobre o que seja a leitura, dialogando saber-decifrar e
saber-ler. “Ler é ser questionado pelo mundo e sobre si mesmo”. Ler e
questionar a escrita seja de qualquer natureza o seu conteúdo textual: um
jornal, um poema, uma história absorvendo diferentes respostas.
Para Soares letramento vai além da alfabetização. Saber ler e escrever
não é suficiente para vivenciar de modo pleno a cultura escrita e responder às
demandas da sociedade atual, é preciso inserir-se nas práticas sociais que
circulam em nossa sociedade. Isto nos propõe que letramento confirma ao
indivíduo um estado de inserção no mundo que vai além da simples prática de
decodificar códigos.
“Indivíduos ou grupos sociais que dominam o uso da leitura e da escrita e, portanto, têm habilidades e atitudes necessárias para uma prática viva e competente em situações em que a prática de leitura e/ou escrita tem uma função essencial, mantêm com os outros e com o mundo que os cerca formas de interação, atitudes, competências discursivas e cognitivas que lhes conferem um determinado e diferenciado estado ou condição em uma sociedade letrada.” (SOARES, 2002, p.143)
Segundo Magda Soares (2009), alfabetização e letramento na Educação
Infantil é uma prática de suma importância. A criança nesta fase escolar
precisa conhecer o sistema alfabético e suas práticas, ler e escrever, a
30
alfabetização, como também o seu uso social a partir da leitura e da escrita, o
letramento.
Na educação infantil podemos trabalhar de forma divertida, pois é uma
fase de muito lúdico no processo de aprendizagem. Comumente na educação
infantil são realizadas atividades como rabiscos, jogos, músicas, que não são
necessariamente alfabetizadoras, mas já visa este processo. “ A fase inicial da
aprendizagem e da linguagem escrita, constituindo, segundo Vygotsky, a pré-
história da linguagem escrita: quando atribui a rabiscos e desenhos ou a
objetos a função de signos, a criança está descobrindo sistemas de
representação, precursores e facilitadores da compreensão do sistema de
representação que é a língua escrita. (SOARES, 2009, p.1)
A leitura frequente para a criança é uma das atividades principais para
inserção do letramento no mundo infantil. Sempre que ouvem histórias os
pequenos são levados a adentrar no mundo da escrita. Pois haverá por parte
da criança o desejo de pegar, folear e conhecer aquele objeto de onde saem
tantas histórias legais, divertida... O desejo de descobrir faz com que a criança
perceba no mundo da leitura, uma janela aberta por onde passam bons ventos,
que trazem contos e encantos advindos de um trabalho realizado e que atinge
uma dimensão universal que a leitura criativa oferece.
Segundo o Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil (1998,
p. 117) a educação infantil, ao promover experiências significativas de
aprendizagem da língua, por meio de um trabalho com a linguagem oral e
escrita, se constitui em um dos espaços de ampliação das capacidades de
comunicação e expressão e de acesso ao mundo letrado, pela criança.
Magda Soares (2009) destaca alguns aspectos importantes que
compõem um sentido maior ao acesso ao mundo da escrita que não apenas
decodificar códigos e grafar palavras, mas o uso possível e eficaz no meio em
que se vive. São eles:
• compreender o que é lido e escrever de forma que os outros
compreendam o que se escreve;
31
• conhecer diferentes gêneros e diferentes portadores de textos e fazer o
uso deles para ler e escrever;
• participar adequadamente dos eventos de várias naturezas de que
fazem arte a leitura e a escrita;
• construir familiaridade com o mundo da escrita e adquirir competências
básicas de uso da leitura e da escrita;
• desenvolver atitudes positivas em relação à importância e ao valor da
escrita a vida social e individual.
Estamos diante de uma nova realidade: aprender fazendo e fazer para
aprender. Atualmente o processo de aprendizagem passa por várias
dimensões e diversas áreas de conhecimento (Psicologia, Linguística,
Pedagogia). Leva-se também em consideração o contexto sociocultural do
aluno, formação profissional do professor, que nem sempre e adequada,
material didático mal feito, principalmente para crianças menos favorecidas
economicamente e finalmente o processo complexo em si que é a
alfabetização. A alfabetização não pode ser um processo precário de aquisição
da linguagem e da escrita, não pode ser um instrumento de exclusão. A
alfabetização tem que contribuir para um processo de cidadania; dar condição
a uma formação consciente dos indivíduos mostrando-lhes seus direitos e
deveres e não apenas formar simples indivíduos construtores do sistema, mas
cidadãos que se apropriem de sua cultura e construam solidamente uma
identidade política. Portanto, cabe a escola e professores a missão de
disseminar estradas e trilhas que favoreçam uma tomada de consciência da
sociedade fazendo-a entender a importância do letramento através da
alfabetização.
“Quem foi que te disse, rei, que já não há ilhas desconhecidas, Estão todas nos mapas, Nos mapas só estão as ilhas conhecidas, E que ilha desconhecida é essa de que queres ir à procura, Se eu to pudesse dizer, então não seria desconhecida a quem ouviste tu falar dela, perguntou o rei, agora mais sério, A ninguém, Nesse caso, por que teima em dizer que ela existe, Simplesmente é impossível que não exista uma ilha desconhecida.” (SARAMAGO, 2003, p.17)
32
CAPÍTULO III
LEITURA: UM PROCESSO DE ARTE PRODUTIVA
Segundo definição da Wikipédia, a enciclopédia livre, arte é tratada como
atividade humana ligada à manifestações de ordem estética ou comunicativa,
realizada a partir da percepção, das emoções e das ideias. Porém não está
fechada aí a definição de arte, pois passa por uma construção social e cultural
e com significados variados, dependendo da cultura a qual essa arte pertence.
Alguns aspectos de uma visão simplificada da arte:
• manifestação de algumas habilidades especiais;
• criação artificial de algo pelo homem;
• a expressão da realidade interior do criador;
• a comunicação de algo sob a forma de uma linguagem especial;
• a excitação da imaginação e da fantasia;
33
• coisas que deem uma resposta a um determinado problema.
A literatura infantil pode ser compreendida como uma forma de
manifestação da arte, como entendimento da realidade em que vivemos.
Trabalhar diversos tipos de textos literários, de várias maneiros e com
diversidade de materiais é uma porta que se abre para o mundo da arte de
sonhar, inventar, explorar, gerar sentimentos que dinamizem e motivem o
processo de aprendizagem.
“Quase sempre, quando se fala em alfabetização, os educadores estão se referindo à capacidade da criança se expressar pela escrita, como se alfabetização só pudesse acontecer no código linguístico. Contrariamente, ao trazer a leitura de um ponto de vista abrangente, a escola alfabetiza seus alunos em cores, sons, imagens, formas, movimentos e tantas linguagens quantas estivessem postas em seu mundo.” (GOMES e ALVARENGA, 2008, p. 179)
3.1- Um pouco de poesia
“Comecemos por lembrar que a essência da poesia arraiga em certo modo de ver as coisas. Uma visão que vai além do visível ou do aparente, para captar algo que nele não se mostra de imediato, mas que lhe é essencial.” (COELHO, 2002, p.221)
Magia da palavra que varia com a percepção da sensibilidade de cada
um. O significado das palavras na poesia ou nos poemas vai além do
dicionário. Invade o espirito humano a atribui sentidos diversos para leitores ou
ouvintes. Nem precisa dizer que antes de tudo a poesia tem que ser muito boa
e bem escrita. Não importa o tamanho, se grande ou pequena, e sim sua
sonoridade. Como qualquer tipo de literatura tem que provocar sentimentos,
gosto pelo imaginar, pelo brincar com as palavras, com os ritmos e com as
rimas. A poesia vai além das palavras ela também se traduz em imagens e
34
sons. O cuidado do professor com a escolha da poesia e de suma importância,
pois os pequenos precisam ser provocados por sensações num jogo lúdico que
lhes desperte interesse pelo gênero.
Por exemplo no poema de Mario Quintana “Pé de pilão” tem um alguns
versos dedicados a Fada mascarada:
“(...) Lá na Floresta Encantada
Mora a Fada Mascarada.
Ninguém direito a conhece,
Pois sempre outra parece.
Conforme lhe dá no gosto,
Cada dia usa um rosto. (...)”
Combinar palavras para obter um efeito criativo e abundante em
qualidade é o aspecto lúdico da poesia. As parlendas folclóricas e trava línguas
também é um ótimo recurso para envolver a criança em uma gostosa
brincadeira com as palavras. Tecer o fortalecimento do leitor com a poesia é
primordial a medida em que um responde aos anseios do outro, leitor-leitura.
Esse pequeno trecho do poema pode muito bem ser usado para
confecções de máscaras variadas de diferentes cores e caras, incentivando a
criança no processo de criação plástica. Ela poderá sentir a textura e trabalhar
os mais diversos tipos de materiais.
“O jogo poético, além de estimular o “olhar de descoberta” nas crianças, atua sobre todos os seus sentidos, despertando um sem-número de sensações: visuais (imagens plásticas, coloridas, acromáticas, etc); auditivas (sonoridade, música ruídos...); gustativa (paladar); olfativas (perfumes, cheiros) tácteis (maciez, aspereza, relevo, textura...); de pressão (sensações de peso ou de leveza); termais (temperatura, calor ou frio); comportamento (dinâmica, estáticas...). É obvio que, num só poema, dificilmente todas essas sensações são provocadas ao mesmo tempo... pois cada uma delas apresenta determinados tipos de transfiguração imagística, que tem
35
seu modo peculiar de atuar no pequeno leitor ou ouvinte. (COELHO, 2002, p.222)
“Há poetas que brincam com as palavras dum modo gostosíssimo de a criança ouvir e ler. Lidam com toda uma ludicidade verbal, sonora, às vezes musical, às vezes engraçadas, no jeito como vão juntando palavras fazendo com que se movam pela página quase como uma cantiga, e ao mesmo tempo jogando com os significados diferentes que uma mesma palavra possui” (ABRAMOVICH, 2005, p.67)
3.2 - Histórias sem textos
As imagens falam tanto quanto as palavras. Como álbum de fotografias,
que conta a história de alguém desde seu nascimento até onde bem entender.
Se posicionadas em ordem cronológica e bem organizadas, certamente haverá
entendimento sem precisar de uma só palavra escrita ou falada. Os contextos
vivenciados através das fotografias no álbum falaram por si só. Os primeiros
dias de vida, primeiro dia de aula, as comemorações e datas festivas, viagens
e momentos diversos. Destacando-se assim um conjunto de circunstâncias não
verbal. Percebe-se através de expressões faciais; caras e caretas e situações
vividas o desenrolar dos acontecimentos daquele instante, ou seja somos
montadores e leitores de imagens.
O francês Paul Faucher foi o pioneiro nos anos 20 da narrativa visual.
Sua obra “Albuns do Père Castor” (Álbuns do Pai Castor) fez grande sucesso
entre as crianças e eficaz na relação da descoberta do mundo das formas dos
seres e das coisas que as cercam. No Brasil, Juarez Machado, foi um dos
pioneiros na arte de fazer livros infantis sem palavras. Lançou os livros:
Domingo de manhã e ida e volta. Livros muito bem produzidos e inteligentes.
(COELHO, 2002, p. 186 e 187).
Os livros de histórias sem textos tem que ser muito bem elaborados. A
narrativa visual, precisa atrair o olhar infantil e fazê-lo sem uma só palavra, o
entendimento de seu conteúdo. Toda estrutura do objeto livro como: formato,
36
colorido e textura precisa servir de movimento para o pequeno leitor. Figuras
que se movam pela página, portas e portões que se abram mostrando algo
surpreendente, casinhas e castelos que surgem montados ao abrir de uma
página... Além de todo talento gráfico é extremamente necessário o cuidado
com a narrativa sequencial coerente sem palavra alguma. É pra fazer rir, tocar,
sentir, divertir, perceber, construir, desconstruir, imaginar.
“O exercício dos diferentes relacionamentos não se pode ser programado. Seria de todo impossível pois esses relacionamentos surgem na percepção como um desdobramento espontâneo por que o homem vive e configura sua experiência” (OSTROWER, 2012, p.82)
3.2.1 -A literatura que faz descobrir o mundo
A literatura infantil indaga os critério de interpretação apresentando
novos panoramas, pois adquirindo o hábito da leitura, a criança desenvolve a
escrita, dispõe de um conjunto de conhecimentos mais amplo de informações
que constituem em um meio que emancipa além de escola e da família, devido
à amostra de novas possibilidades. Através da leitura podemos ir além do que
está às nossas vistas.
A história criativa tem como particularidade fundamental a surpresa
causada pelas relações que criam no nível de composição e de sentido. Em
lugar de verdades absolutas e suficiente, a literatura infantil deve encorajar a
reflexão que delimita as novas regulamentações de mudanças de
funcionamentos na estrutura social.
A fantasia desmitifica o real e apresentando novas ordens. Possibilitar a
interlocução do conhecimento de forma lúdica e crítica através da arte se faz
uma ferramenta de trabalho poderosa, podendo ser usados dentro desse
contexto, o teatro, a música, a plástica, os pincéis e a dança visando imergir a
criança no mundo da literatura de forma prazerosa. A arte sendo uma ponte
que liga saberes oportunizando o trabalho com as negatividades e
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positividades; satisfação do acerto e frustração do erro, o bom, o mau, o
engraçado, o triste, o bonito, o feio... fazendo aflorar o ponto de vista de cada
um. Tecendo construção de conhecimentos nem perfeitos, nem definitivos,
nem únicos, apenas permitindo reflexões para uma prática pedagógica onde o
objetivo principal é aprimorar e melhorar o processo continuo da aprendizagem.
“As crianças são encorajadas a explorar o ambiente e a expressar-se usando diversas formas de linguagem e modos de expressão, incluindo palavras, movimentos, desenho, pintura, modelagem, colagem, jogo dramático e música. (...) Elas devem ser capazes de apresentar observações, ideias, memórias, sentimentos e novos conhecimentos, numa variedade de formas que vai desde o jogo ao desenho. (LINO 1996, p.101)
Enxergar que trabalhar com o mundo imaginário infantil é prazeroso para
o professor que atua neste espaço. A literatura infantil é uma arte que abraça e
pode liderar projetos interdisciplinares na educação infantil. Ela é excelente na
tarefa pedagógica de fazer interagir conhecimentos e desenvolver
capacidades. As possibilidades de utilização da linguagem simbólica, das
imagens, da formação da própria consciência, da expansão informativa da
criança são ganhos oferecidos pela literatura, que permite o desprendimento de
todo um projeto de trabalho com a criança.
Os educadores que atuam na educação infantil precisam articular a teoria
universitária com a prática docente. Contar histórias, dramatizar, cantar, dançar
e tudo mais que a criatividade e a arte permitem, constituindo assim um espaço
intermediário entre leitura e a criança. As crianças inicialmente sentem-se
atraídas pelas ilustrações grandes e coloridas. Querem pegar o livro folheá-lo e
observar as gravuras sem muita preocupação com a escrita, que está
mesclada com os desenhos. Muitos já conseguem identificar sobre do que se
trata a história, e são capazes de realizar uma pseudoleitura do texto apoiando-
se nas ilustrações. O professor precisa cultivar esse clima de liberdade de
expressão como um elemento importante nesse longo processo de tornar os
pequenos leitores em cidadãos- leitores.
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“Brincar com o outro, cantar com o outro (...) O objetivo era desestabilizar o estabelecido, desacomodar, esgarçar o tecido necrosado pelas mesmices e abrir novos canais, sempre mais e mais.” (OSTETTO E LEITE, 2012, p.15)
É sempre bom descobrir o mundo lá fora e o mundo aqui bem pertinho,
bem dentro da gente. Através de tantas histórias maravilhosas podemos fazer
conhecer o mundo às crianças. Relacionamentos familiares, amor, separação,
sexualidade, crescimento pessoal, morte, diferenças... Todos esses tipos de
leituras englobam propostas cotidianas de experiências pessoais, que
envolvem a criança num objetivo de crescimento, onde o conflito do outro pode
ser identificado como o seu. Histórias delicadas, emocionantes, que fazem
pensar e chorar, histórias que mexem e fazem mudar e trocam informações
cotidianas sobre descobertas.
Enfim, aproximar as crianças de todas as belezas e mazelas de nossa
sociedade e de nós mesmos, enquanto seres humanos formadores e
deformadores que somos afim de criarmos e recriarmos, aplaudirmos ou
vaiarmos, de opinarmos e de ouvirmos opiniões, de questionar e deixar ser
questionado. E é esse caminho que nos deixa dar passos para a formação de
um leitor crítico consciente e convicto de suas necessidades e demandas; tanto
suas quanto dos outros.
A arte de escrever uma literatura de ótima qualidade sem deixar o
divertimento e a alegria se faz por muitos autores. Por exemplo: Ziraldo, em O
Menino Maluquinho, conta a vida de um menino, esperto, em constante
movimento, brincalhão e que adorava futebol, mas também chorava e se
isolava, era inteligente e o melhor de tudo era amado, muito amado! Frank
Baum em o Mágico de Oz, conta-nos sobre uma menina que depois de ter sido
transportada para o reino de Oz por um ciclone percorre muitos caminhos e
situações até conseguir voltar para casa. Durante sua aventura em OZ,
Dorothy, encontra três amigos, o Espantalho, o Homem de Lata e o Leão
Covarde, que também anseiam solucionar suas dificuldades. O Espantalho
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deseja ganhar um cérebro, o Leão coragem e o Homem de Lata um coração,
essas conquistas lhes permitirão destaque em seu mundo.
Bem todos com seus conflitos a serem resolvidos e isso pode trazer à
tona sentimentos e momentos vividos pelas crianças, fazendo-as refletir sobre
conflitos e desejos que surgem nas entrelinhas de seus mundos particulares.
Era uma vez... Há muito tempo atrás... Num lugar bem longe daqui... Em geral
assim começam os contas de fadas, num tempo e local imprecisos. O leitor não
pode dizer com exatidão como e onde, no passado, a história aconteceu. Tudo
abarca o imaginário, as florestas encantadas, os bosques assombrados, os
reinos, as cavernas, enfim nenhum desses lugares são identificados por
nomes, geograficamente falando, mas quem se importa com isso? O
importante é o entusiasmo que a arte de contar essas histórias proporcionam a
quem as ouve. Elementos emocionais como alegria e satisfação devem ser
compartilhados com as outra facetas dos contos de fadas, a angustia e a
ansiedade sem suavizações ou alterações, retirando assim os significados
essenciais dos conflitos neles inseridos.
Quem conta um conto de fadas tem que estar preparado para fazê-lo de
modo a respeitar sua integridade, depois pode sim brincar de quem conta um
conto aumenta um ponto. Os contos de fadas tem sido usados por estudiosos
da psicologia, antropologia e outros para falar de conflitos, comportamentos,
fantasia e realidade, soluções ou não de seus medos. Portanto os contos
afloram os mais diversos sentimentos em um processo pessoal impar na
compreensão de si próprio.
“... - da ópera e do drama ao cinema e à publicidade -, os contos de fadas tornaram-se uma parte vital de nosso capital cultural. O que os mantém vivos e pulsando com vitalidade e variedade é exatamente o que mantém a vida vibrando: angustia, medos, desejos, romances, paixão e amor. (...) Para nós, também, as histórias são irresistíveis, pois oferecem oportunidades para falar, debater, deliberar, tagarelar e conversar fiado interminavelmente, como faziam as velhas comadres de quem, ao que se diz, essas histórias vieram. E a partir do emaranhado dessas conversas e tagarelices, começamos a definir nossos próprios valores, desejos, apetites e aspirações, criando
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identidades que nos permitirão produzir finais para sempre felizes para nós e para nossos filhos.” (TATAR, 2004, p.15)
CONCLUSÃO
Uma multiplicidade de caminhos existem para a formação da criança
leitora. Lidar com esta questão e promover a sensibilidade e criatividade no
processo de encantamento pela leitura. Apesar das dificuldades que a
educação enfrenta, e não é de hoje, educadores que somos necessitamos para
que o maravilhoso contido nos livros seja descoberto pelas crianças
oferecendo-lhes a oportunidade de qualidade em perceber o mundo ao seu
redor, provocando nelas um espirito crítico.
E isso requer de nós, pesquisas, leituras variadas e continuas,
investigações que nos possibilitará uma bagagem cultural fundamentada e
estruturada para apresentar às crianças o maravilhoso mundo da leitura. A
leitura precisa despertar as emoções. Por isso o cuidado em transformar esses
momentos em prazer. Prazer em conhecer, prazer em saber. E o que é saber
afinal? A palavra saber tem a mesma etimologia que a palavra saborear. Como
sentir o sabor de uma fruta sem experimenta-la? Isso é intransferível. É preciso
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passar pela experiência do experimentar, de sentir o bom sabor do exercício
diário da leitura; e cabe a nós disseminar em cada criança as infinitas
possibilidades de leituras e mostra-lhes os mais diversos caminhos a serem
percorridos.
A cada termino de história, conto, poesia, trava língua ... logo surgirá o
desejo por outra e outra. Trabalhar maneiras de ler brincando, buscar novos
horizontes e desafios, promover expectativas do ouvir, impulsionar um maior
contato com os livros, fortalecer e possibilitar diferentes áreas de
conhecimento.
Não se trata de seguir regras, mas de aprender a ler pensando,
descobrindo, organizando de dentro para fora questões ínfimas ou complexas.
Para formar leitores é preciso amar a leitura e então oferecer à criança um
trabalho qualitativo e contínuo intermediado pela família e intensificado pela
escola, onde o leitor constrói sua autonomia na medida em que a leitura é
incorporada à sua vida sem mecanicismos. O imprescindível em todo esse
processo é priorizar um espaço de diálogo entre o exterior e o interior de cada
um fazendo um convite para ajustar leitura e vida.
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ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 2
AGRADECIMENTO 3
DEDICATÓRIA 4
RESUMO 5
METODOLOGIA 6
SUMÁRIO 8
INTRODUÇÃO 9
CAPÍTULO I
LEITURA INFANTIL COMO PRAZER COTIDIANO 11
1.1 – Universo dos contos 13
1.1.2- A pratica do ouvir 14
1.2- Direcionar caminhos 15
1.3- As várias faces da literatura para crianças 15
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1.3.1 – O poder da palavra 16
CAPÍTULO II 20
O LEITOR QUE QUEREMOS FORMAR
2.1 – Leitura de mundo 21
2.1.2- Vivencias cotidianas 22
2.2 – Escola consciente 23
2.2.1 – A escrita e a leitura 24
2.3- Alfabetização e letramento: Origem do termo 25
CAPÍTULO III 31
LEITURA: UM PROCESSO DE ARTE PRODUTIVA
3.1 – Um pouco de poesia 32
3.2 – Histórias sem textos 33
3.2.1 – A literatura que faz descobrir o mundo 34
CONCLUSÃO 40
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 42
ÍNDICE 46