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UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE FARMÁCIA DOENÇAS AUTOIMUNES DO SISTEMA NERVOSO MESTRADO EM ANÁLISES CLÍNICAS Catarina Esteves Vasques de Carvalho Marinho Crespo Marques LISBOA, 2011

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UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE FARMÁCIA

DOENÇAS AUTOIMUNES DO SISTEMA NERVOSO

MESTRADO EM ANÁLISES CLÍNICAS

Catarina Esteves Vasques de Carvalho Marinho Crespo Marques

LISBOA, 2011

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Catarina Marinho Marques – Mestrado em Análises Clínicas 2

ÍNDICE GERAL

ÍNDICE DE TABELAS ................................................................................................... 5

ÍNDICE DE FIGURAS .................................................................................................... 5

ÍNDICE DE ABREVIATURAS ...................................................................................... 7

RESUMO ....................................................................................................................... 10

ABSTRACT ................................................................................................................... 10

DOENÇAS AUTOIMUNES .......................................................................................... 11

DOENÇAS AUTOIMUNES DO SISTEMA NERVOSO ............................................. 14

MIASTENIA GRAVIS .................................................................................................. 18

Epidemiologia ............................................................................................................. 18

Patogénese .................................................................................................................. 18

Manifestações Clínicas ............................................................................................... 19

Diagnóstico ................................................................................................................. 20

Tratamento .................................................................................................................. 24

Prognóstico ................................................................................................................. 25

SÍNDROME DE LAMBERT-EATON .......................................................................... 26

Epidemiologia ............................................................................................................. 26

Patogénese .................................................................................................................. 26

Manifestações Clínicas ............................................................................................... 27

Diagnóstico ................................................................................................................. 28

Tratamento .................................................................................................................. 30

Prognóstico ................................................................................................................. 30

SÍNDROME DE GUILLAIN-BARRÉ .......................................................................... 32

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Epidemiologia ............................................................................................................. 32

Patogénese .................................................................................................................. 32

Manifestações Clínicas ............................................................................................... 33

Diagnóstico ................................................................................................................. 33

Tratamento .................................................................................................................. 36

Prognóstico ................................................................................................................. 36

ESCLEROSE MÚLTIPLA ............................................................................................ 37

Epidemiologia ............................................................................................................. 37

Patogénese .................................................................................................................. 37

Manifestações Clínicas ............................................................................................... 38

Diagnóstico ................................................................................................................. 39

Tratamento .................................................................................................................. 42

Prognóstico ................................................................................................................. 43

ENCEFALITE LÍMBICA .............................................................................................. 45

Epidemiologia ............................................................................................................. 45

Patogénese .................................................................................................................. 45

Manifestações Clínicas ............................................................................................... 45

Diagnóstico ................................................................................................................. 46

Tratamento .................................................................................................................. 47

Prognóstico ................................................................................................................. 48

NEUROMIELITE ÓPTICA ........................................................................................... 49

Epidemiologia ............................................................................................................. 49

Patogénese .................................................................................................................. 49

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Manifestações Clínicas ............................................................................................... 50

Diagnóstico ................................................................................................................. 50

Tratamento .................................................................................................................. 51

Prognóstico ................................................................................................................. 52

SÍNDROME DE STIFFMAN ........................................................................................ 53

Epidemiologia ............................................................................................................. 53

Patogénese .................................................................................................................. 53

Manifestações Clínicas ............................................................................................... 53

Diagnóstico ................................................................................................................. 53

Tratamento .................................................................................................................. 55

Prognóstico ................................................................................................................. 55

SÍNDROMES PARANEOPLÁSICOS .......................................................................... 56

Epidemiologia ............................................................................................................. 56

Patogénese .................................................................................................................. 57

Manifestações Clínicas ............................................................................................... 57

Diagnóstico ................................................................................................................. 57

Tratamento .................................................................................................................. 59

Prognóstico ................................................................................................................. 59

CONCLUSÃO ................................................................................................................ 61

BIBLIOGRAFIA ............................................................................................................ 63

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ÍNDICE DE TABELAS

Tabela 1 – Métodos de detecção de AAc ...................................................................... 12

Tabela 2 – Doença autoimune e respectivo SN afectado ............................................... 17

Tabela 3 – Prevalência dos sintomas iniciais da MG [1] ............................................... 19

Tabela 4 - Classificação clínica da MG segundo Osserman [1] ..................................... 19

Tabela 5 – Ocorrência de MG com e sem timoma associado [6] ................................... 21

Tabela 6 - Testes de diagnóstico na MG [1] ................................................................... 23

Tabela 7 - Critérios de diagnóstico da MG segundo Gorshtein and Levy [1] ................ 24

Tabela 8 – Autoanticorpos detectados no LEMS [1] ..................................................... 29

Tabela 9 – Patogénese, Distribuição e Anticorpos associados aos subtipos de GBS ..... 34

Tabela 10 – Sintomas iniciais e crónicos da MS. Adaptado de Shoenfeld et al [1] ....... 39

Tabela 11 – Heterogeneidade da patologia da MS. Adaptado de Shoenfeld et al [1] .... 40

Tabela 12 – Síndromes Paraneoplásicos [1] ................................................................... 56

Tabela 13 – Anticorpos onconeuronais e PNS associado [1] [18] ................................. 58

Tabela 14 – Principais aspectos de cada patologia abordada. ........................................ 62

ÍNDICE DE FIGURAS

Figura 1 - Causas de doenças autoimunes [3] ................................................................ 12

Figura 2 – O Sistema Nervoso [8] .................................................................................. 14

Figura 3 – Nervo danificado pela MS [42] ..................................................................... 15

Figura 4 – Transmissão neuromuscular [13] .................................................................. 16

Figura 5 – Ac anti-músculo estriado Método: IFI Substrato: Músculo esquelético de

macaco [6] ...................................................................................................................... 21

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Figura 6 – Transmissão neuromuscular [41] .................................................................. 27

Figura 7 – Ac anti-AGNA Método: IFI Substrato: Cerebelo [12] ................................. 28

Figura 8 – Mecanismo de mimetismo molecular envolvido na resposta autoimune após

infecção por C. jejuni [49] .............................................................................................. 33

Figura 9 – Semelhança entre o gangliosídeo humano GM1 e o epitopo GM1-like no

C.jejuni [49] .................................................................................................................... 34

Figura 10 - Immunoblot com Ag relevantes para o diagnóstico de patologias do SN [43]

........................................................................................................................................ 35

Figura 11 – Critérios clínicos para o diagnóstico do GBS [1]........................................ 36

Figura 12 – Padrões de evolução da MS [51] ................................................................. 39

Figura 13 – Presença de bandas oligoclonais em LCR de doentes com MS [50] .......... 40

Figura 14 – Ac anti-MBP Método: IFI Substrato: Cerebelo e Secção de um nervo [12]

........................................................................................................................................ 41

Figura 15 – Critérios de diagnóstico da MS segundo McDonald [1] ............................. 42

Figura 16 – Receptor do Glutamato (tipo NMDA) [43] ................................................. 46

Figura 17 – Ac anti-NMDAr. Método: IFI Substratos: Hipocampo e cerebelo de rato

[43] ................................................................................................................................. 47

Figura 18 – Monitorização dos Ac anti-NMDAr [43] .................................................... 48

Figura 19 - Corte transversal do encéfalo humano [43] ................................................. 49

Figura 20 – Ac anti-Aquaporina 4. Método: IFI Substrato: cerebelo de macaco [6] ..... 51

Figura 21 – Ac anti-anfifisina. Método: IFI Substrato: cerebelo [12] ............................ 54

Figura 22 – Ac anti-GAD. Método: IFI Substrato: cerebelo e pâncreas [12] ................ 55

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ÍNDICE DE ABREVIATURAS

AAc – Autoanticorpo/s

AAg – Autoantigénio/s

Ac – Anticorpo/s

ACh - Acetilcolina

AChR – Receptor da Acetilcolina

Ag – Antigénio/s

AGNA – Anticorpo anti-nuclear glial

AIDP - Polineuropatia Desmielinizante Inflamatória Aguda

AMAN - Neuropatia Axonal Motora Aguda

AMPA - α-amino-3-hydroxy-5-methyl-4-isoxazolepropionic acid

AMSAN - Neuropatia Axonal Sensorial Motora Aguda

CE - Corticoesteróides

DAI – Doenças Autoimunes

EBV – vírus Epstein-Barr

EIA – Enzyme Immuno Assay

ELISA – Enzyme Linked Immuno Sorbent Assay

EUA – Estados Unidos da América

GABA - Ácido gama-aminobutírico

GAD – Descarboxilase do Ácido Glutâmico

GBS – síndrome de Guillain Barré

GM - Gangliosídeo

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HLA – Human Leucocyte Antigen

IB - Immunoblot

IF - Imunofluorescência

IFD – Imunofluorescência directa

IFI - Imunofluorescência indirecta

IgG/IgM/IgA – Imunoglobulina de classe G/M/A

IS - Imunossupressores

IVIg - Imunoglobulinas intravenosas

LCR – Líquido cefalorraquidiano

LE – Encefalite límbica

LEMS – Síndrome de Lambert-Eaton

MBP – Proteína Básica da Mielina

MFS – Síndrome de Miller-Fisher

MG – Miastenia Gravis

MOG – Glucoproteína Mielínica Oligodendrocitária

MS – Esclerose Múltipla

MuSK – Muscle-specific tyrosine kinase

NMDA - N-Methyl-D-aspartate

NMDAr – receptor do N-Methyl-D-aspartate

NMO – Neuromielite óptica

NPC – Neural Progenior Cells

PE – Plasmaferese

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PET – Tomografia de emissão de Positrões

PNS – Síndrome paraneoplásico

PP-MS – Esclerose Múltipla Primária Progressiva

RIA – Radio Imuno Assay

RM – Ressonância Magnética

ROI - Intermediários Reactivos do Oxigénio

RR-MS – Esclerose Múltipla Recaída Remissão

SCLC – Cancro de pequenas células do pulmão

SI – Sistema Imunitário

SN – Sistema Nervoso

SNC - Sistema Nervoso Central

SNP - Sistema Nervoso Periférico

SP-MS - Esclerose Múltipla Secundária Progressiva

SS – Sindrome de Stiffman

TAC – Tomografia Axial Computorizada

UV – Ultra-violeta

VGCC – Canal de cálcio dependente da voltagem

VGKC – Canal de potássio dependente da voltagem

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RESUMO

As doenças autoimunes surgem devido a falhas nos mecanismos de tolerância

imunológica do indivíduo, conduzindo à produção de autoanticorpos que atacam o

próprio. As doenças autoimunes podem ser classificadas em sistémicas e específicas de

orgão.

Na década de 60 foram associadas causas autoimunes para certas patologias do sistema

nervoso. As patologias autoimunes do sistema nervoso são um grupo de doenças

específicas de orgão, que podem afectar o sistema nervoso central, o sistema nervoso

periférico e as junções neuromusculares.

Dentro deste grupo de doenças autoimunes, existe um subgrupo no qual a neoplasia

aparece associada a doença autoimune, passando a ser chamada síndrome

paraneoplásico.

O objectivo deste trabalho foi falar das doenças do sistema nervoso mais prevalentes no

âmbito laboratorial e compará-las quanto à sua epidemiologia, patogénese,

manifestações clínicas, diagnóstico, tratamento e prognóstico.

Palavras-chave: doenças autoimunes, sistema nervoso, autoanticorpos, síndrome

paraneoplásico, neoplasia, imunofluorescência, plasmaferese, corticosteróides,

imunoglobulinas intravenosas

ABSTRACT

Autoimmune diseases appear due to a failure in the mechanisms of self immune

tolerance, which can lead to the production of autoantibodies that attack the individual.

Autoimmune diseases can be classified into systemic and organ specific. In the 60s,

causes were linked to certain autoimmune diseases of the nervous system.

The autoimmune diseases of the nervous system are a group of organ specific diseases

that can affect the central nervous system, peripheral nervous system and the

neuromuscular junctions.

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Within this group of autoimmune diseases, there is a subgroup in which cancer appears

linked to autoimmune disease, being called paraneoplastic syndrome.

The goal was to address the more prevailing nervous system diseases in the laboratorial

context and compare them in terms of their epidemiology, pathogenesis, clinical

manifestations, diagnosis, treatment and prognosis.

Keywords: autoimmune diseases, nervous system, autoantibodies, paraneoplastic

syndrome, neoplasia, immunofluorescence, plasmapheresis, corticosteroids, intravenous

immunoglobulins

DOENÇAS AUTOIMUNES

A autoimunidade consiste na resposta contra antigénios do próprio onde ocorrem dois

tipos de resposta – humoral, com formação de autoanticorpos (AAc) e celular, com

formação de células sensibilizadas.[29] A autoimunidade pode ser um fenómeno

fisiológico, como é o caso dos fenómenos de restrição MHC (Major Histocompatibility

Complex), nos humanos HLA (Human Leukocyte Antigen) e selecção tímica, ou um

fenómeno patológico no qual pode haver perda de tolerância, desenvolvimento de uma

resposta contra o próprio, e o desencadear de uma doença autoimune (DAI).[30] A sua

prevalência é de cerca de 3% em toda a população dos EUA [31], e pensa-se que a sua

etiologia seja multifactorial. A figura 1 ilustra as causas de DAI, que dependem

essencialmente de factores:

Genéticos: os alelos HLA estão associados a algumas DAI, como por exemplo,

Miastenia Gravis, Síndrome de Lambert-Eaton, Esclerose Múltipla.

Hormonais: as mulheres são, regra geral, mais afectadas.

Ambientais: radiações UV, o uso de certos medicamentos.

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Figura 1 - Causas de doenças autoimunes [3]

Actualmente, as DAI classificam-se em específicas de orgão, quando a lesão se dá num

orgão, e sistémicas quando há afecção de vários orgãos. [30]

As DAI são diagnosticadas através das manifestações clínicas, características

bioquímicas, histológicas, genéticas e serológicas na qual se inclui a pesquisa de AAc.

Na tabela seguinte enumeram-se os métodos mais utilizados na detecção de AAc,

respectivo elemento marcador, tipo de ensaio qualitativo ou quantitativo.

Técnica Elemento marcador Tipo de ensaio

Imunofluorescência (IF) Fluorocromo Quantitativo

Ensaio Imuno Enzimático (EIA) Enzima Quantitativo

Radio-Imuno-Ensaio (RIA) Isótopo radioactivo Quantitativo

Western Blot Enzima Qualitativo

Tabela 1 – Métodos de detecção de AAc

O método de IF é o método de referência usado, onde marcadores fluorescentes são

conjugados com Ac, e usados para identificar antigénios na superfície celular, no caso

da IFD, ou para detectar AAc ou Ac contra agentes infecciosos, no caso da IFI. Dada a

sua sensibilidade, é um método de screening, devendo depois ser confirmado por um

método mais sensível, como um ELISA, ou um método mais específico como um

Western blot (também chamado Immunoblot de proteínas ou simplesmente

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Immunoblot). São ambos ensaios imunoenzimáticos, mas o ELISA é um método

quantitativo que utiliza uma enzima em vez do fluorocromo, e o Immunoblot permite a

detecção qualitativa de Ac utilizando Ag altamente purificados.

O método de RIA continua a ser uma técnica muito útil dada a elevada sensibilidade e

especificidade, mas requer muitos cuidados devido ao uso de elementos radioactivos, e

é também uma técnica bastante dispendiosa, sendo sobretudo usada na detecção de Ag e

Ac infecciosos, ou quando a técnica de ELISA não serve como alternativa.[33]

O método de IF utiliza diferentes substratos que podem ser células ou tecidos de

animais em cultura. No caso dos Ac anti-neuronais, dado que os Ag se localizam

preferencialmente nos tecidos nervosos, os tecidos usados para a detecção dos AAc,

serão sobretudo cerebelo, nervo periférico, espinal medula, músculo esquelético, entre

outros.

O tratamento das DAI varia entre uma terapêutica mais leve e uma mais drástica,

consoante a gravidade e a patologia. Regra geral passa pelo restabelecimento da função

do orgão lesionado, pela imunossupressão e pelo tratamento dos sintomas

secundários.[3] O mais frequente é o uso de drogas antimitóticas e anti-inflamatórios,

sobretudo corticoesteróides. A administração de imunoglobulinas intravenosas (IVIg) e

a plasmaferese (PE) são tratamentos cada vez mais utilizados, dado o seu sucesso

terapêutico em inúmeras patologias.

As imunoglobulinas intravenosas são proteínas presentes no plasma humano,

responsáveis pela imunidade humoral, e são obtidas a partir do fraccionamento

industrial do plasma, com métodos de inactivação e eliminação de vírus. São sobretudo

de classe IgG, contendo pequenas quantidades de IgM e de IgA. Foram originalmente

desenvolvidas para reposição de anticorpos em imunodeficiências, mas graças aos seus

efeitos antinflamatórios e imunomoduladores, tornaram-se numa alternativa terapêutica

para doenças sem tratamento estabelecido.

A plasmaferese é um processo de remoção de elementos do plasma sanguíneo que

possam ser responsáveis por algumas doenças. A indicação mais comum é para

remoção de anticorpos e complexos autoimunes.

Alternativamente também se faz controlo metabólico, transplante de tecidos ou orgãos e

terapêuticas biológicas com citocinas.[29]

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DOENÇAS AUTOIMUNES DO SISTEMA NERVOSO

A associação autoimunidade – doença foi feita na década de 50, sendo na década de 60

que foram associadas causas autoimunes para certas patologias do sistema nervoso.[1]

As DAI do sistema nervoso são doenças específicas de orgão que podem ocorrer

isoladamente como uma patologia autoimune, ou estarem associadas a situações de

neoplasia, conhecidas como síndromes paraneoplásicos (PNS).

O SN é o conjunto de nervos, gânglios e centros nervosos que asseguram o comando e a

coordenação das funções vitais. É dividido em SNC e SNP.

O SNC contém o encéfalo e a espinal medula. O SNP subdivide-se em duas partes, o

sistema nervoso somático e o sistema nervoso autónomo e este por sua vez divide-se em

sistema nervoso simpático e sistema nervoso parassimpático.

A unidade básica do sistema nervoso é o neurónio. O neurónio conduz o impulso

nervoso e é composto por dendrites, corpo celular e axónio. As dendrites trazem o

impulso nervoso para o corpo celular, enquanto o axónio leva o impulso para fora do

corpo celular.

Figura 2 – O Sistema Nervoso [8]

Na presença de uma DAI, há uma resposta imune que leva à produção de AAc, que

podem ser específicos de orgão ou não específicos de orgão. No âmbito das DAI do SN

são focados os Ac específicos de orgão, já que são mais relevantes para o diagnóstico

das patologias referidas.

A resposta imune pode ser dirigida contra componentes tecidulares específicos, por

exemplo contra a mielina, no caso da Esclerose Múltipla (MS). A mielina é uma

substância lipídica que está presente na chamada bainha de mielina. A bainha de mielina

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é formada pelos oligodendrócitos no SNC e pelas células de Schwann no SNP, e rodeia

algumas fibras nervosas, fazendo com que tenham uma condução de impulsos nervosos

mais rápida.[7] [8]

A figura 3 ilustra a falta de “isolamento eléctrico” devido à desmielinização, que está na

origem das queixas de fraqueza, paralisia ou cegueira temporárias.[3]

Figura 3 – Nervo danificado pela MS [42]

Noutros casos, a resposta imune pode dirigir-se contra as junções neuromusculares,

como é o caso da Miastenia Gravis (MG). As junções neuromusculares são zonas de

ligação entre a parte terminal de um axónio motor com uma placa motora, que é a

região da membrana plasmática de uma fibra muscular onde se dá o encontro entre o

nervo e o músculo, permitindo desencadear a contracção muscular. Na junção

neuromuscular o neurotransmissor predominante é a acetilcolina. Portanto, na MG a

afecção das junções neuromusculares com a produção de Ac contra os receptores da

acetilcolina, dá origem a um defeito na transmissão do impulso nervoso e

consequentemente, à fraqueza muscular. Na figura 4 pode ver-se a transmissão

neuromuscular, que envolve o neurotransmissor acetilcolina, o seu receptor e os canais

de cálcio e potássio dependentes da voltagem (VGCC e VGKC), que estarão implicados

nalgumas patologias abordadas.

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Figura 4 – Transmissão neuromuscular [13]

O SNC tem como objectivo o processamento e integração da informação. É o local onde

ocorre a tomada de decisões e o envio de ordens (frio, luz, som, odor, quente, sabor e

vibrações). O SNP carrega informações dos orgãos sensoriais para o SNC e deste para

os orgãos efectores (músculos e glândulas).

O SNP somático é responsável pelo controlo da musculatura esquelética e pela

transmissão de informação dos orgãos sensoriais. Engloba vários nervos que se

ramificam a partir do SNC: sensoriais ou aferentes (recolhem da periferia as excitações

que conduzem ao SNC, traduzindo-se depois em sensação táctil e térmica) e motores ou

eferentes (conduzem o estimulo do SNC que vai fazer contrair os músculos, segregar as

glândulas, orientando deste modo diversos comportamentos como o andar, o escrever e

o chorar). Os nervos de conexão permitem estabelecer a relação entre nervos sensoriais

e nervos motores. O SNP autónomo controla as diversas estruturas viscerais

responsáveis pelos processos vitais básicos, como o coração, os vasos sanguíneos, o

sistema digestivo, os orgãos sexuais, entre outros, e funciona de um modo automático.

O SN simpático é formado por dois grupos de neurónios, os pré-ganglionares, situados

na medula espinal, e os pós-ganglionares situados junto à coluna vertebral. O SN

simpático estimula acções que permitem ao organismo responder a situações de stress,

como a aceleração dos batimentos cardíacos, o aumento da pressão arterial, o aumento

da adrenalina, a concentração de açúcar no sangue e a activação do metabolismo geral

do corpo. O SN parassimpático é a parte do SN autónomo cujos neurónios se localizam

no tronco cerebral. É o responsável por estimular acções que permitem ao organismo

responder a situações de calma, como desaceleração dos batimentos cardíacos,

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diminuição da pressão arterial, diminuição da adrenalina e diminuição do açúcar no

sangue.[8] Algumas DAI do SN estão limitadas ao SNC, outras ao SNP, e outras

afectam ambos, como é o caso dos PNS.

Os PNS estão presentes exclusivamente ou com elevada frequência em doentes com

cancro. Por definição, os PNS não são explicados por infiltração local, regional ou

metastática, disfunção metabólica ou infecção, efeitos secundários da terapêutica

oncológica ou coagulopatia relacionada com o cancro. Pensa-se sim, que são DAI

caracterizadas por terem uma resposta imune contra um Ag que se expressa, tanto nas

células tumorais como nos neurónios.

Como DAI que são, levam à produção de AAc, que adoptam o nome de AAc

onconeuronais. Quando presentes exclusivamente nos doentes com cancro chamam-se

PNS clássicos. São PNS a Miastenia Gravis, o síndrome de Lambert-Eaton, o síndrome

de Stiffman e a Encefalite Límbica. Destes, apenas o síndrome de Lambert-Eaton e a

Encefalite Límbica são PNS clássicos. A Esclerose Múltipla, o síndrome de Guillain

Barré e a Neuromielite Óptica não têm neoplasia associada.[1]

Existem muitas DAI do SN, mas optou-se por abordar as mais prevalentes no âmbito do

diagnóstico laboratorial. O objectivo deste trabalho é comparar os diferentes aspectos de

cada patologia autoimune do SN, focando em cada uma: Epidemiologia, Patogénese,

Manifestações Clínicas, Diagnóstico, Tratamento e Prognóstico.

Na tabela seguinte são enumeradas as DAI abordadas neste trabalho:

Doença Autoimune Sistema nervoso afectado Síndrome

Paraneoplásico

Miastenia gravis SNP Sim

Síndrome de Lambert-Eaton SNP Sim

Síndrome de Guillain Barré SNP Não

Esclerose múltipla SNC Não

Encefalite Límbica SNC Sim

Neuromielite óptica SNC Não

Síndrome de Stiffman SNC Sim

Tabela 2 – Doença autoimune e respectivo SN afectado

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MIASTENIA GRAVIS

A MG, que em grego significa fraqueza muscular severa, é a DAI do foro neurológico

mais bem conhecida. É uma doença crónica que afecta a transmissão neuromuscular. A

existência de anticorpos contra os receptores da acetilcolina provoca a diminuição

destes mesmos receptores e consequentemente a fadiga e debilidade dos músculos

esqueléticos.[1] [4] [5] [34]

Epidemiologia

Tal como a maior parte das DAI, é mais prevalente na mulher do que no homem

ocorrendo numa relação de 2:1, sendo que o pico de incidência da MG nas mulheres

ocorre na 3ª década de vida e nos homens na 3ª e 6ª décadas de vida. Curiosamente, a

incidência de MG, tem vindo a aumentar nos homens idosos. Por cada 100.000

habitantes julga-se que afecta cerca de 20 a 40 pessoas. Entre 10% a 13% dos doentes

com MG apresentam um timoma associado, dando-se o início da doença nestes doentes,

entre a 4ª e 5ª década de vida. A MG ocorre indiferentemente em todas as raças.[1] [6]

Patogénese

O receptor da acetilcolina (AChR) é uma proteína transmembranar de tipo canal iónico.

A acetilcolina libertada no terminal nervoso liga-se a duas subunidades α no AChR e

abre o canal, permitindo a passagem de catiões, o que cria um potencial de acção. É a

perda de AChR que ocorre na MG que conduz à fraqueza muscular.[4]

Há três factores envolvidos na patogenecidade:

1. Os Ac fixam o complemento e causam lise da membrana pós-sináptica com

perda de AChR e libertação de complexos AChr-Ac-complemento na fenda

sináptica;

2. Os Ac podem modular AChR;

3. Uma pequena quantidade de Ac ligam-se directamente ao sítio de ligação,

provocando o bloqueio.

A resposta autoimune é desencadeada pelos linfócitos T helper CD4+ e mediada

primariamente por Ac contra os AChR, sobretudo de classe IgG.[4] A existência destes

AAc tem um grande impacto tanto na transmissão do impulso nervoso como na

fraqueza neuromuscular levando ao bloqueio dos receptores, aumento da sua

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degradação e destruição da fenda pós-sináptica mediada pelo complemento. Pensa-se

que o timo está envolvido na patogénese da MG já que costuma estar alterado na

maioria dos doentes com esta doença.

Manifestações Clínicas

A MG provoca fraqueza e dores musculares sobretudo após esforço físico. Os reflexos

sensoriais dos tendões e funções cerebelares não são afectados. Os sinais e sintomas

iniciais incluem: pálpebra descaída, diplopia, envolvimento dos músculos faciais e

bulbares, afectando a fala, as expressões faciais, a mastigação e a disfagia. Na tabela

seguinte é apresentada a prevalência dos sintomas iniciais da MG.

Tabela 3 – Prevalência dos sintomas iniciais da MG [1]

Pode ocorrer ainda fraqueza dos músculos respiratórios dificultando a respiração, termo

designado por crise miasténica. A crise miasténica, que pode colocar o doente em risco

de vida, ocorre usualmente no início da doença sendo frequentemente provocada por

uma infecção intercorrente. A tabela seguinte apresenta a escala com que Osserman

define a gravidade clínica da MG.[1]

I Sinais e sintomas oculares

II Miastenia generalizada

IIa Doença média

IIb Doença moderada

III Doença generalizada severa

IV Crise miasténica

Tabela 4 - Classificação clínica da MG segundo Osserman [1]

O curso clínico da MG é bastante variável: nalguns doentes a fraqueza fica confinada a

um único grupo muscular por muito tempo, regra geral os músculos da pálpebra ou

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extraoculares, enquanto em 85% pode progredir para fraqueza generalizada. Podem

ocorrer flutuações na severidade da doença durante os primeiros anos.

Os sintomas podem agravar-se pelo esforço físico, exposição ao calor, alterações

emocionais (stress e ansiedade), estados infecciosos e pelo uso de alguns medicamentos,

como por exemplo, alguns tranquilizantes e antibióticos.[1]

Diagnóstico

Em 80-90% dos doentes com MG o timo apresenta alterações histológicas, ocorrendo

hiperplasia tímica (sobretudo nos doentes mais novos), que se caracteriza por folículos

linfóides com centros germinativos activos. Em 10-13% dos doentes verifica-se a

existência de timomas. Por microscopia electrónica observa-se uma diminuição

significativa de receptores de acetilcolina na zona das junções neuromusculares, uma

redução da complexidade das fendas pós-sinápticas e depósitos de IgG e complemento.

Existem 3 tipos de AAc que podemos encontrar na MG:

1. Anticorpos contra os receptores da acetilcolina (Ac anti-AChR)

Estes AAc são detectados em cerca de 85% doentes com MG (MG

seropositiva): em 90% dos indivíduos com doença generalizada e em cerca de

50% com doença ocular. A presença dos anticorpos não se correlaciona com a

severidade da doença, mas tem carácter diagnóstico.[5] [6] Estes AAc são

muito específicos, não aparecendo em indivíduos saudáveis nem noutras

doenças do foro neurológico. São habitualmente detectados por

imunoprecipitação, por EIA ou por IFI. Surgem na MG, associados a timomas,

e em raros casos na doença de Hodgkin.[1] [5] [18]

2. Anticorpos contra a cinase específica do músculo (Ac anti-MuSK)

Os Ac anti-MuSK são específicos da MG seronegativa. A cinase específica do

músculo é uma proteína de membrana que na vida adulta está restrita à junção

neuromuscular.[4] A prevalência de Ac anti-MuSK na MG seronegativa

depende da população à qual nos referimos: 4% nos chineses, 22% nos

holandeses e 40-70% nos norte-americanos e europeus. Os Ac anti-MuSK são

detectados sobretudo em mulheres jovens com envolvimento facial e bulbar e a

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sua presença correlaciona-se com a gravidade da doença. A detecção de Ac

anti-MuSK é feita por EIA e por RIA.[6]

3. Anticorpos anti-músculo estriado

Estes Ac reagem contra elementos contrácteis do músculo estriado. O alvo dos

Ac anti- músculo estriado são as proteínas sarcoméricas do músculo estriado –

titina, miosina e actina. A titina é uma proteína gigante que aumenta o

comprimento do sarcómero e que tem uma região mais imunogénica, chamada

MGT-30.[6] Os Ac anti-actina e anti-miosina não se correlacionam e não

causam MG.[14] Os Ac anti- músculo estriado são detectados em cerca de 80%

dos doentes com MG com timoma associado. A sua precisão é semelhante à

precisão da TAC, no prognóstico dos timomas. A associação de MG e timoma

deve-se provavelmente a anomalias no timo que levam à produção de Ac contra

as fibras do músculo estriado, que então se ligam aos músculos motores. Na

tabela 5 é evidenciada a ocorrência de MG associada ou não, a neoplasia. Pode

ser observado que na maioria das vezes esta patologia ocorre associada a cancro

e sobretudo em pessoas idosas.

MG associado a timoma 90%

MG sem timoma > 60 anos 55%

MG sem timoma < 40 anos 6%

MG sem timoma < 20 anos raro

Tabela 5 – Ocorrência de MG com e sem timoma associado [6]

A detecção de Ac anti-músculo estriado é feita por IFI.

Figura 5 – Ac anti-músculo estriado Método: IFI Substrato: Músculo esquelético de macaco [6]

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O diagnóstico da MG é feito pela combinação de factores clínicos, electrofisiológicos e

laboratoriais.[34] É importante que se faça um diagnóstico diferencial de MG: distingui-

la de MG induzida por drogas, a síndrome de Lambert-Eaton, o botulismo, lesões

intracranianas, oftalmoplegia externa progressiva, entre outros. As lesões orbitais e

intracranianas devem ser excluídas por imagiologia. Na tabela seguinte referenciam-se

vantagens e desvantagens dos testes actualmente usados no diagnóstico da MG, a sua

sensibilidade, especificidade e correlação clínica dos AAc detectados nos doentes de

MG. Nenhum teste é suficientemente preciso para ser usado isoladamente no

diagnóstico da doença. O teste com edrofónio é especialmente útil nos casos de MG

ocular mas não é específico de MG, e esta droga pode causar efeitos secundários

colinérgicos. Testes electrodiagnósticos (estimulação repetitiva do nervo e

electromiografia de fibra única) são sensíveis mas não específicos e dependem do

operador. A determinação de Ac é de utilidade variável dado que a sua sensibilidade é

baixa nos doentes com MG ocular. A nível histológico a detecção de uma massa no

mediastino anterior sugestiva de timoma pode suportar o diagnóstico de MG.[5]

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Teste Vantagens dos

testes serológicos Desvantagens Sensibilidade Especificidade

Edrofónio Bom para MG ocular No caso de

glaucoma agudo

e obstrução

urinária e

intestinal.

Efeitos

secundários

colinérgicos.

85% na MG

ocular

60% na MG

generalizada

É de curta duração para

a avaliação dos vários

grupos de músculos (é

preferível usar

neostigmina)

Falsos positivos na

esclerose lateral

amiotrófica, tumores

intracranianos, paralisia

supranuclear

Ac anti-

AChR

Não há correlação com

a actividade da doença

Mau para MG

ocular

40-60% na MG

ocular

80-90% na MG

generalizada

Específico para MG

Resultado negativo não

exclui MG

Ac anti-

músculo

estriado

Mais prevalente nos

doentes mais idosos

Associação com

timoma

Correlação com a

severidade da doença

Falta de

informação

quanto ao papel

patogénico

10-30% na MG

generalizada

60-85% na MG

com timoma

Não específico

Valor preditivo de

timoma

Ac anti-

MuSK

Sobretudo na mulher,

quando o início da

doença se dá na idade

jovem e

predominantemente na

fraqueza bulbar

Correlação com a

actividade da doença

Grande

variabilidade

geográfica na

prevalência

4-70% dos

doentes com MG

seronegativa

Muito específico para a

MG seronegativa

Estimulaçã

o repetitiva

do nervo

Pode ser combinado

com o teste do

edrofónio

Desagradável

para o doente

Depende do

operador

50-60% na MG

ocular

70-80% na MG

generalizada

Até 90% quando

são testados os

músculos

proximais

Não específico

Electromio

grafia de

fibra única

Muito sensível Demorado

Depende da

colaboração do

doente e da

habilidade do

operador

90-99% para MG

ocular e

generalizada

Não específico

Tabela 6 - Testes de diagnóstico na MG [1]

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A fraqueza clínica e a resposta a drogas anticolinérgicas devem ser medidas por um

instrumento objectivo, como um score quantitativo para a MG que meça a severidade da

doença. Já que os Ac anti-MuSK são específicos para a MG seronegativa, devem ser

testados somente em doentes seronegativos para Ac anti-AChR. Deve-se estabelecer um

critério clínico e serológico ou clínico, farmacológico e electrofisiológico para um

diagnóstico definitivo. Na tabela 7, Gorshtein e Levy [1] apresentam critérios de

diagnóstico a serem usados em pessoas com idade superior a 2 anos. Para um

diagnóstico provável bastará um critério clínico e farmacológico ou clínico e

electrofisiológico.

1. Critério clínico – fraqueza muscular e fadiga sem prejuízo das funções sensoriais, reflexos e

cerebelares

2. Critério farmacológico – melhoramento da fraqueza muscular após administração de uma

medicação anticolinérgica

3. Critério serológico – presença de anticorpos anti-receptores da acetilcolina e anti-MuSK

4. Critério electrofisiológico – evidência de um defeito na transmissão neuromuscular

Tabela 7 - Critérios de diagnóstico da MG segundo Gorshtein and Levy [1]

Em relação à susceptibilidade genética, existe, na MG, uma forte correlação entre os

doentes com Ac anti-AChR e os antigénios HLA B8 e DR3.[5]

Tratamento

As terapêuticas usadas hoje em dia para o tratamento da MG incluem moduladores da

transmissão neuromuscular, imunosupressores e imunomoduladores. As drogas

anticolinesterase melhoram a fraqueza miasténica pelo melhoramento provisório da

transmissão neuromuscular na maioria dos doentes com MG, mas raramente tratam por

completo a doença. A sobredosagem destas drogas pode causar aumento da fraqueza e

efeitos secundários muscarínicos. As drogas imunosupressoras incluem

corticoesteróides, azatioprina, micofenolato mofetil, ciclofosfamida, ciclosporina e

tacrolimus. O rituximab é um fármaco intravenoso que pertence à classe dos anticorpos

monoclonais, dirigido contra a proteína de superfície celular CD20, encontrada em

linfócitos B. É usado no tratamento da artrite reumatóide, no linfoma não Hodgkin a

células B e na MG com anticorpos anti-MuSK. Perante doentes de MG com timoma

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sujeitos a timectomia usa-se terapia imunomoduladora. Nos restantes doentes de MG

esta forma de tratamento não tem mais-valias.

Não há dados suficientes que suportem o sucesso terapêutico da IVIg, a não ser em

casos muito exacerbados de fraqueza muscular.

Na doença severa, não existe vantagem em usar IVIg e PE, mas dada a natureza de cada

tratamento, a primeira é escolhida. Alguns doentes de MG dependentes de CE podem

beneficiar de etanercepte. O etanercepte é um fármaco proteico que actua como inibidor

competitivo da ligação do TNF aos seus receptores da superfície celular, inibindo deste

modo a actividade biológica do TNF.[46]

Prognóstico

O prognóstico é menos favorável:

Em idosos e em doentes que não podem fazer uma timectomia: 40% não

sobreviverão aos primeiros 5 anos após o diagnóstico;

Se coexistirem os AAc AChR e AAc MuSK.

O facto de os Ac anti-músculo estriado serem mais prevalentes na população idosa e nos

casos de doença mais grave, faz com que sejam marcadores importantes no prognóstico

da MG.

Com tratamento, a maioria dos doentes tem uma qualidade de vida quase normal, sem

problemas significativos. Alguns casos de MG podem entrar em remissão temporária e

a fraqueza muscular pode desaparecer totalmente, de modo que a medicação pode ser

descontinuada. Remissões completas, estáveis e duradouras são o objectivo final da

timectomia.

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SÍNDROME DE LAMBERT-EATON

O síndrome de Lambert-Eaton (LEMS) é uma DAI do sistema nervoso periférico que se

caracteriza por fraqueza muscular e disfunções do sistema nervoso autónomo como

xerostomia, visão turva e obstipação.

Começou por ser descrito por Lambert et al que descreveram o doente como

apresentando uma doença Miastenia-like e um carcinoma dos brônquios associado. Por

esta razão ainda se refere a este síndrome como Síndrome Miasténico de Lambert-

Eaton. Estudos electrofisiológicos demonstraram que esta patologia é diferente da MG,

já que o envolvimento respiratório, músculos ocular e bulbar é reduzido.

Cerca de 60% dos doentes com LEMS apresentam carcinoma das pequenas células do

pulmão (SCLC), um cancro agressivo que quase sempre se relaciona com hábitos

tabágicos. O SCLC representa cerca de 20-25% de todos os cancros do pulmão e é um

tumor de origem neuroendócrina que expressa canais de cálcio dependentes da

voltagem (VGCC) à sua superfície.

Cerca de 90% dos doentes com o LEMS apresentam Ac anti-VGCC. Estes AAc, que

são produzidos como resposta a epitopos nas células tumorais, podem reagir com os

VGCC presentes nos terminais nervosos dando origem a disfunções neurológicas.[1]

[13]

Epidemiologia

Na generalidade da população a incidência é de cerca de 1 por cada 100.000 habitantes;

no entanto, a prevalência de LEMS em todos os doentes com SCLC é cerca de 3%.

A idade de início da doença varia entre os 17 e os 79 anos sendo menor em doentes com

neoplasia associada.

Patogénese

Existem duas formas da doença:

LEMS associado a Cancro

Cerca de 60% dos doentes com LEMS têm cancro associado, na maioria das vezes

SCLC, normalmente evidente 2 anos após o início da doença. A quase totalidade destes

doentes tem hábitos tabágicos. Os homens são cerca de duas vezes mais afectados do

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que as mulheres, o que pode estar relacionado com o facto de existirem mais homens

fumadores do que mulheres. A maioria dos doentes deste grupo apresenta problemas

neurológicos, meses a anos antes da detecção do tumor e curiosamente o tempo de

sobrevivência é superior ao do grupo LEMS sem Cancro associado (LEMS idiopática).

LEMS sem carcinoma associado (Idiopática)

Os restantes 40% nunca desenvolvem tumor. O início da doença é mais precoce e a

LEMS idiopática predomina nas mulheres. Há uma maior incidência de outras DAI

neste grupo: muitos doentes apresentam DAI específicas de orgão como tiroidite,

doença celíaca, miastenia ou vitiligo.

A figura 6 ilustra a transmissão neuromuscular e seus intervenientes.

Figura 6 – Transmissão neuromuscular [41]

Manifestações Clínicas

Na LEMS ocorre fraqueza dos músculos proximais e disfunções autonómicas como

hipersudorese, xerostomia, hipotensão postural e impotência nos indivíduos do sexo

masculino. Os reflexos nos tendões estão diminuídos ou mesmo ausentes; muitos

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doentes afirmam ter mais força quando principiam um exercício mas quando param,

perdem a força.[1] [13]

Diagnóstico

O diagnóstico é feito por métodos electrofisiológicos e por métodos laboratoriais.

As características clínicas e electrofisiológicas são semelhantes na LEMS seropositiva e

seronegativa.[6] [44] É recomendado fazer uma TAC e uma RM ao tórax. A detecção

de Ac é útil nos casos em que a disfunção cerebelar mascara os sintomas da LEMS.

O diagnóstico laboratorial passa pela detecção de Ac anti-VGCC, Ac anti-nuclear glial

(AGNA) e Ac anti-SOX1. Os Ac anti-AGNA são detectados por IFI e a sua utilidade no

diagnóstico, deve-se ao facto de aparecem em cerca de 11% dos doentes com SCLC e

cerca de 43% dos doentes com LEMS associado a cancro. A detecção de Ac anti-

AGNA faz-se no cerebelo de rato na camada das células de Purkinje, mais propriamente

no núcleo de células da glia.

Figura 7 – Ac anti-AGNA Método: IFI Substrato: Cerebelo [12]

Na LEMS estão também descritos Ac contra subtipos dos VGCC.

Na LEMS associada a cancro, pode ocorrer reacção cruzada entre os Ac anti-VGCC da

superfície das células do SCLC e os canais de cálcio dependentes da voltagem presentes

no sistema nervoso.[1] [13]

Os VGCC são uma família multimérica de proteínas que se dividem em subtipos

funcionais de acordo com as suas propriedades electrofisiológicas, farmacológicas e

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bioquímicas. São formados como um complexo de diferentes subunidades: α1, α2δ, β1-4

e γ. As subunidades α1 dos VGCC são transmembranares e constituem o sensor de

voltagem e o poro selectivo para o ião cálcio. Apresentam uma vasta distribuição,

consoante os subtipos de subunidades consideradas. No âmbito deste trabalho foco

apenas alguns tipos desta subunidade α1:

α1A

(tipo P/Q) que controlam a libertação de neurotransmissores nas junções

neuromusculares periféricas. Os VGCC tipo P/Q encontram-se no cerebelo e na

superfície das células do SCLC. Aparecem em 85-90% dos doentes;

α1B (tipo N): encontram-se nos sistemas nervoso central e periférico. Detectados

em 40% dos doentes;

α1C (tipo L) encontram-se no coração, fibroblastos, pulmão, músculo liso;

α1D (tipo L) encontram-se no cérebro e pâncreas. Os VGCC do tipo L, surgem em

25% dos doentes.[1] [27]

Os canais de cálcio dependentes da voltagem do tipo P/Q e N, são os antigénios contra

quais são dirigidos os Ac.[18]

Regra geral, os Ac anti-VGCC dos tipos N e L só se encontram em conjunto com o tipo

P/Q, o que significa que 10-15% dos doentes são seronegativos para qualquer tipo de

Ac contra os VGCC. A detecção dos Ac anti-VGCC faz-se por imunoprecipitação. O

título de anticorpo anti-VGCC tipo P/Q não se correlaciona com a gravidade da doença.

Ac detectado LEMS todos os

tipos

LEMS associado a

cancro

LEMS idiopática

Todos tipos VGCC 85-90 90-100 76-91

Tipo P/Q 85-90 90-100 76-91

Tipo N 40-50 40 22

Tipo L 25 0 25

Ac anti-VGCC - Positivo Negativo

Tabela 8 – Autoanticorpos detectados no LEMS [1]

A microscopia electrónica evidencia a desorganização e redução dos VGCC. Os VGCC

encontram-se no nervo terminal motor e controlam a libertação de ACh. A existência de

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Ac anti-VGCC prejudica a função dos terminais nervosos pré-sinápticos, existindo

falhas na formação de potenciais de acção.[1] [28]

O SOX1 é um antigénio tumoral altamente imunogénico presente nas células do SCLC.

Os Ac anti-SOX1 são importantes na medida em que ajudam ao diagnóstico diferencial

entre LEMS associada a cancro e LEMS idiopática. Estão presentes em 64% dos

doentes com LEMS associada a cancro e ausentes na LEMS idiopática. [55]

Estudos HLA mostram uma sobre expressão de HLA B8, um haplotipo que se julga

estar associado a outras DAI como a MG. A associação de HLA B8 e a predominância

nas mulheres levam a crer que a LEMS idiopática tenha causa autoimune.[1] [6]

Tratamento

A administração de amifampridina é eficaz e actua pelo bloqueio dos canais de potássio

dependentes da voltagem, prolongando assim a despolarização da membrana celular

pré-sináptica. O prolongamento do potencial de acção melhora o transporte de cálcio

para o interior das terminações nervosas. O consequente aumento das concentrações de

cálcio intracelular facilita a exocitose de vesículas que contêm acetilcolina, o que por

sua vez melhora a transmissão neuromuscular.

A acção da amifampridina melhora a força muscular e a amplitude do potencial de

acção muscular composto em repouso.[47]

As terapias que provocam imunossupressão, como a azatioprina e a prednisolona, são

usadas como adjuvantes. Nos casos de doença severa, exacerbada ou intolerância aos

esteróides, recorre-se à PE ou IVIg, com bons resultados.[1] [6]

Na LEMS associada a cancro a quimioterapia é a primeira escolha, podendo ainda ser

feita radioterapia. Após o tratamento, regista-se um aumento de força muscular nestes

doentes.

Prognóstico

Doentes com SCLC têm um mau prognóstico (taxas de sobrevivência entre 5-10% após

5 anos), mas doentes que têm SCLC associada a LEMS com Ac anti-VGCC positivos

apresentam um aumento na taxa de sobrevivência média comparativamente a doentes

Ac anti-VGCC negativos.

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Nos doentes com LEMS associada a cancro, o tumor torna-se detectável nos 2 primeiros

anos após o diagnóstico de LEMS.

Em doentes com LEMS que apresentam sinais neurológicos há mais de 5 anos, há um

baixo risco de desenvolverem um tumor. Na LEMS idiopática, a terapia

imunossupressora é eficaz, indicando um bom prognóstico.[1] [6]

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SÍNDROME DE GUILLAIN-BARRÉ

O síndrome de Guillain-Barré (GBS) é uma neuropatia autoimune aguda que afecta o

SNP. Pertence a um conjunto de neuropatias autoimunes na qual estão envolvidos AAc

conta vários epitopos neuronais. As manifestações clínicas incluem fraqueza dos

membros, sendo a GBS considerada a causa mais comum de paralisia aguda

generalizada.

Existem 4 subtipos de GBS que diferem quanto à fisiopatologia, perfil imunológico e

distribuição mundial: polineuropatia desmielinizante inflamatória aguda (AIDP),

neuropatia axonal motora aguda (AMAN), neuropatia axonal sensorial motora aguda

(AMSAN) e o síndrome de Miller Fisher (MFS).

Epidemiologia

O GBS ocorre por todo o mundo em crianças e adultos, homens e mulheres numa

proporção de 1,5:1 (ao contrário da maioria das DAI). A sua incidência é de 1,3 casos

por cada 100.000 habitantes.

Patogénese

A GBS é uma patologia mediada por processos imunitários. A patogénese dos

diferentes subtipos de GBS varia e é sumariamente descrita na Tabela 9, na página 34.

Verifica-se um risco aumentado de desenvolver GBS após vacinação, sobretudo com a

vacina do vírus Influenza.

Seis semanas antes do diagnóstico, calcula-se que cerca de dois terços dos doentes

tenham uma infecção, regra geral, uma gripe ou gastroenterite. Os microrganismos

normalmente associados a estas infecções são: Campylobacter jejuni, citomegalovírus,

Mycoplasma pneumoniae e o EBV, por esta ordem de incidência.

Julga-se que esteja envolvido na patogénese da doença, um mecanismo de mimetismo

molecular, no qual a semelhança entre sequências de péptidos do self e péptidos

estranhos, é suficiente para resultar numa activação cruzada, por parte dos péptidos

estranhos, de células T autoreactivas ou células B. Pensa-se que este fenómeno de

mimetismo molecular ocorra com o microrganismo Campylobacter jejuni (ver figura

seguinte).

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Figura 8 – Mecanismo de mimetismo molecular envolvido na resposta autoimune após infecção por C.

jejuni [49]

Manifestações Clínicas

Os sintomas mais precoces são parestesias e entropecimento nos dedos dos pés e das

mãos. A fraqueza generalizada atinge o seu pico por volta das 4 semanas após o início

dos sintomas. Os sintomas progridem com um padrão ascendente, dos membros

inferiores para os superiores. Há envolvimento dos músculos faciais (normalmente os

músculos oculares não são afectados), sendo que, em metade dos doentes surge paralisia

facial.[5] Em cerca de 25% dos doentes, a fraqueza dos músculos respiratórios é muito

acentuada levando à necessidade de respiração assistida. Cerca de 50% dos doentes

afirmam sentir dor e desconforto nas ancas, costas e coxas. O envolvimento do SN

autónomo pode levar a retenção da urina, obstipação, taquicardia, hipertensão, arritmia

cardíaca e hipotensão postural. Esta patologia é muitas vezes precedida de infecções no

tracto gastrointestinal ou respiratório.[1] [18]

Diagnóstico

O diagnóstico baseia-se em primeiro lugar no exame clínico, juntamente com o perfil

electrofisiológico, seguido do estudo dos AAc. Se necessário, faz-se a análise do LCR e

biópsia do nervo.

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Na GBS encontram-se Ac contra os gangliosídeos (GM). Os gangliosídeos são

esfingolípidos que se encontram em grande quantidade nas células ganglionares do

SNC, especialmente nas terminações nervosas, onde funcionam como receptores de

membrana. Os Ac anti-gangliosídeos estão implicados na patogénese desta doença.

Pensa-se que têm a sua origem em pools de células B estimuladas por Ag presentes nos

carbohidratos de certos microrganismos. Como exemplo, temos o C.jejuni que apresenta

estruturas gangliosídeos-like na sua parede celular, promovendo assim uma resposta

imunitária segundo o mecanismo de mimetismo molecular.[4]

Figura 9 – Semelhança entre o gangliosídeo humano GM1 e o epitopo GM1-like no C.jejuni [49]

Existem diferentes tipos de Ac anti-gangliosídeos consoante o subtipo de GBS.

Subtipo de GBS Patogénese

Distribuição

mundial: % nos

países ocidentais

Anticorpo

Polineuropatia

Desmielinizante

Inflamatória Aguda

(AIDP)

Lesão na bainha

de mielina

cerca de 90 desconhecido

Neuropatia Axonal

Motora Aguda (AMAN)

Lesão nos axónios cerca de 10 GM1, GM1b,

GD1a, GalNac-

GD1a

Neuropatia Axonal

Sensorial Motora Aguda

(AMSAN)

Lesão nos axónios residuais GM1, GM1b,

GD1a, GD1a

Síndrome de Miller Fisher

(MFS)

Desconhecida residuais GQ1b, GT1a

Tabela 9 – Patogénese, Distribuição e Anticorpos associados aos subtipos de GBS

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Catarina Marinho Marques – Mestrado em Análises Clínicas 35

A nomenclatura dos ganglósidos é a seguinte: o prefixo G refere-se ao início da palavra

gangliosídeos – ganglio. A letra seguinte, M, D, T e Q, refere-se ao número de

moléculas de ácido siálico presentes, a numeração refere-se à ordem com que os

gangliosídeos migram nos cromatogramas.[4]

A detecção de Ac anti-gangliosídeos é feita por EIA e IB.

Figura 10 - Immunoblot com Ag relevantes para o diagnóstico de patologias do SN [43]

O exame electrofisiológico é importante para distinguir AIDP (lesão na bainha de

mielina, forma desmielinizante) de AMAN/AMSAN (lesão nos axónios, formas

axonais). O LCR apresenta poucos leucócitos e um aumento de proteínas que atinge o

pico entre a 2ª e a 4ª semana.[5]

Existem critérios clínicos, descritos por Asbury e Cornblaths, (ver figura seguinte) e

critérios electrofisiológicos, mas para estes últimos não há consenso.

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Figura 11 – Critérios clínicos para o diagnóstico do GBS [1]

Como a resposta dos Ac aos carbohidratos é independente da célula T, pensa-se que não

hajam associações HLA.

Tratamento

Tal como a maioria das neuropatias imunes, recorre-se à PE e à IVIg, sendo este último

menos propenso a complicações subsequentes. O uso de CE, usados noutras DAI do

SN, não parece ser eficaz no tratamento da GBS.[1]

Prognóstico

Existe uma elevada taxa de recuperação destes doentes (entre 4 e 15% morrem), apesar

de cerca de 20% apresentarem sequelas ao nível do SNP permanentes. No entanto, nos

doentes que recuperam, as forças voltam lentamente e em primeiro lugar nos membros

proximais, e depois nos distais.

A existência de o anticorpo anti-GM1 de classe IgG1 sugere um pior prognóstico, face

ao Ac anti-GM1 de classe IgG3, que indica melhor prognóstico.[5]

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ESCLEROSE MÚLTIPLA

A Esclerose Múltipla (MS) é a doença inflamatória do SNC mais comum. É uma

doença crónica que se caracteriza por infiltrados perivasculares de células inflamatórias

mononucleadas, desmielinização e perda de axónios, com formação de múltiplas placas

no cérebro e espinal medula; daí ser também chamada esclerose em placas. O percurso

clínico e a fisiopatologia são variáveis, já que na MS surgem remissões e recaídas, o que

torna esta doença muito heterogénea. O diagnóstico baseia-se sobretudo na clínica e na

exclusão de outras doenças.[1] [5] [34]

Epidemiologia

Surgem cerca de 60 casos por cada 100.000 habitantes na Europa e EUA. A incidência é

de cerca de 3-4,5 casos em cada 100.000 habitantes por ano. Surge sobretudo no adulto

jovem, por volta dos 20-40 anos, ocorrendo o pico de incidência por volta dos 30 anos.

A MS afecta três vezes mais as mulheres do que os homens.[1] [5]

Patogénese

A MS é uma doença multifactorial que resulta da interacção entre genes de

susceptibilidade, factores ambientais e factores imunológicos.

Julga-se que seja mediada por linfócitos Th1 autoreactivos, que proliferam, secretam

mediadores pró-inflamatórios e metaloproteinases. Activam e interagem com a barreira

hematoencefálica, penetrando depois no cérebro, onde são reactivados por

autoantigénios locais. Estes AAg são apresentados por moléculas de MHCII e expressos

à superfície de células da microglia, astrócitos e macrófagos. A partir daqui inicia-se

uma cascata de acontecimentos que culmina na activação de componentes do SI e no

ataque à bainha de mielina, axónios e glia. Destes acontecimentos resultam edema,

desmielinização, transecção axonal, perda de oligodendrócitos e activação de astrócitos,

que contribui para a disfunção neurológica, formação de placas e gliose.[1]

Em 2003 foram descobertas as células Th17. Pensa-se que as células Th17 tenham um

papel no tratamento da MS. Estas células produzem IL-17, uma citocina envolvida no

desenvolvimento de várias doenças inflamatórias. As células Th17 têm um papel

importante como mediadores autoimunes da neuroinflamação, à semelhança das células

Th1. Dados recentes sugerem que, tanto as células Th1 como as células Th17 são

capazes de induzir e promover a doença. Assim, será necessária mais informação para

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perceber a função destas células na patogénese da MS, já que algumas moléculas

relacionadas com as Th17 surgem como bons alvos para futuras estratégias

terapêuticas.[57]

Pensa-se que a exposição a agentes infecciosos, como o EBV possa estar associada ao

aparecimento da MS. O EBV infecta células B em repouso que são activadas e

proliferam, sendo depois eliminadas por linfócitos citotóxicos T CD8+. Persistem então

células B de memória. O EBV tem um pentapéptido antigénico nuclear que é homólogo

do epitopo da proteína básica da mielina (MBP). Para além disso o EBV também induz

a expressão, à superfície da célula B, de um AAg que é invulgarmente expresso no

cérebro de doentes com MS. Estes factos explicam como o EBV pode estimular a

geração de células T autoreactivas específicas da mielina, na MS. Assim sendo, o risco

de desenvolver MS aumenta muito com a infecção do vírus Epstein-Barr.[34]

Manifestações Clínicas

O doente de MS é geralmente um adulto jovem que apresente manifestações

neurológicas atribuíveis a lesões da substância branca. Os sintomas incluem debilidade

muscular, parestesias, lesão cerebelosa (ataxia e vertigo), diplopia, visão turva e

desconforto na bexiga.

A MS pode evoluir de maneiras diferentes (ver figura 11, abaixo). No início da doença

pode ter uma evolução do tipo recaída-remissão (RR-MS), o que ocorre em 85% dos

casos, ou do tipo primária progressiva (PP-MS), que ocorre em 15% dos casos. Os

sintomas das recaídas desenvolvem-se normalmente dentro de horas e persistem por

dias ou semanas. A evolução do tipo PP-MS consiste numa mielopatia progressiva,

sendo mais comum em homens com idade superior a 40 anos. Na Tabela 10 estão

registados os sintomas iniciais da MS. Com o passar do tempo, os doentes vão

convertendo a fase RR-MS numa esclerose múltipla do tipo secundária progressiva (SP-

MS). Esta mudança ocorre em cerca de 50% dos doentes, 10 anos após o início da

doença. Na fase SP-MS as recaídas diminuem ou cessam, e o grau de deficiência

aumenta. Um pequeno grupo de doentes com MS (cerca de 5%), apresenta ainda uma

fase progressiva-recaída, que é uma fase crónica da doença, que se caracteriza por

surtos. Nesta fase a severidade dos sintomas, a taxa de recaídas e a progressão do grau

de deficiência varia de indivíduo para indivíduo[5]. Os sintomas e prevalência da fase

crónica da doença estão enumerados na Tabela 10.

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Sintomas Iniciais Prevalência

(%) Sintomas Crónicos

Prevalência

(%)

Sintomas sensoriais 35-40 Distúrbios visuais, Fadiga 90

Fraqueza em um ou mais

membros 25-40

Ataxia, Crises paroxísticas,

Declínio Cognitivo 50-75

Perda da visão 17-29 Depressão -

Diplopia 12 Disfunção sexual -

Alteração do balanço e da

marcha 18

Sintomas intestinais e

incontinência -

Vertigo 5 Disfagia -

Sintomas intestinais e

incontinência 5 Perturbações no sono -

Tabela 10 – Sintomas iniciais e crónicos da MS. Adaptado de Shoenfeld et al [1]

Figura 12 – Padrões de evolução da MS [51]

Diagnóstico

A MS surge na substância branca do SNC com infiltrados de células inflamatórias

(linfócitos T, monócitos/macrófagos, células B e plasmócitos), desmielinização,

redução do número de oligodendrócitos, axónios transectados e proliferação de

astrócitos, resultando em gliose.

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Estão definidos 4 padrões da doença com base na localização e extensão das placas,

mecanismos imunopatológicos, activação do complemento e padrões de destruição dos

oligodendrócitos. Como podemos ver pela Tabela 11, na maior parte das vezes temos

um padrão de desmielinização com produção de Ac.

Tabela 11 – Heterogeneidade da patologia da MS. Adaptado de Shoenfeld et al [1]

O diagnóstico é feito por: (1) dados clínicos, pela anamnese e pela exclusão de outras

doenças; (2) dados laboratoriais, pelo estudo do LCR; (3) dados imagiológicos, através

da RM.

O estudo do LCR poderá apresentar uma ligeira pleocitose leucocitária, proteínas

normais ou ligeiramente aumentadas, aumento de imunoglobulinas e a presença de

bandas de IgG oligoclonal, o que indica síntese intratecal de imunoglobulinas e

patologia inflamatória. Estas situações ocorrem em cerca de 90% dos doentes, o que

torna a análise do LCR bastante útil para o diagnóstico da MS.[1] [5]

Figura 13 – Presença de bandas oligoclonais em LCR de doentes com MS [50]

No LCR podem ainda ser detectados dois tipos de AAc, que surgem sobretudo no início

da doença:

Padrão I Padrão II Padrão III Padrão IV

Incidência

(%)

12 53 30 4

Possíveis

mediadores

Desmielinização

mediada por

macrófagos e

linfócitos

citolíticos

Desmielinização

mediada por Ac

anti-MOG

Oligodendropatia

distal e apoptose

Isquémia,

toxicidade

induzida por

vírus

Degeneração

oligodendroglia

primária

Defeitos

metabólicos

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1. O anticorpo anti-proteína básica da mielina (Ac anti-MBP)

A determinação de Ac anti-MBP é sobretudo de classe IgM e são detectados por

IF e ELISA. [17]

Figura 14 – Ac anti-MBP Método: IFI Substrato: Cerebelo e Secção de um nervo [12]

2. O anticorpo anti-glucoproteína mielínica oligodendrocitária (Ac anti-MOG),

pode ser detectado por ELISA ou immunoblot. A MOG localiza-se na superfície

externa da mielina.

Outros dados laboratoriais, para além da detecção de AAc, são úteis para excluir outras

doenças.[1] [4] [5] [45]

O estudo imagiológico evidencia a desmielinização característica da MS: tempos de

condução motora prolongados e latência atrasada dos potenciais visuais,

somatosensoriais e auditivos. A RM é o teste mais sensível para demonstrar as lesões da

MS. Ela permite avaliar a carga da lesão, medir a atrofia do cérebro, fazer o seguimento

da doença, ajudar no prognóstico e auxiliar ensaios clínicos.[33]

Já existiam critérios para o diagnóstico clínico, com base na lesão da substância branca

do SNC, antes de a RM ser usada para auxílio do diagnóstico. No entanto, em 2005, os

critérios de diagnóstico foram revistos. Criaram-se os Critérios de Mcdonald, também

eles revistos mais tarde, juntando os dados imagiológicos, tudo com o objectivo de um

diagnóstico mais precoce e de um seguimento da doença.[1]

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Figura 15 – Critérios de diagnóstico da MS segundo McDonald [1]

A MS é uma doença multifactorial com uma base genética muito complexa. Pensa-se

que os genes que codificam para moléculas de HLA e citocinas, estejam envolvidos no

desenvolvimento e patogénese da MS. A associação genética mais bem estabelecida

com a MS reside no locus HLA DRB1. Apesar desta associação HLA não ser única, é a

mais frequente.[33] [34]

Tratamento

O tratamento usado depende do estadio da doença.

Para situações agudas o tratamento com CE está indicado, excepto se se tratar de um

ataque severo ao SNC. Nesse caso, recorre-se à PE.

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Para a manutenção da actividade da doença são usados três interferões β, que atrasam o

desenvolvimento de MS definitiva, o acetato de glatirámero, um fármaco que ilude o SI,

e o natalizumab, um anticorpo monoclonal.

Como tratamento complementar da MS, recorre-se à fisioterapia, dieta específica e a

intervenções sociais e psicológicas, de forma a aliviar os sintomas desta doença.

Menos frequentemente mas também usado no caso dos outros métodos não resultarem,

recorre-se a: IVIg, transplante de células estaminais e administração de citocinas, que

alteram o SI de um estado defeituoso para um estado normal.[1] [3]

No que se refere a esta doença, a medicina tem evoluído no sentido de tratar o doente,

em vez de tratar a doença, pela criação de um tratamento personalizado, atento ao perfil

genético, subtipo e actividade da doença.[1]

Estudos recentes indicam que a utilização das NPC(Neural Progenitor Cells) poderá ter

sucesso no tratamento da MS. As NPC são células multipotentes que existem no SNC

de indivíduos adultos e que têm a capacidade de migrar, proliferar e diferenciar-se em

neurónios e células da glia. Reduzem a inflamação e promovem a remielinização, pela

libertação de factores neurotróficos e citocinas imunoreguladoras em locais lesionados.

No entanto, o seu benefício é limitado na inflamação crónica do SNC devido à

deficiente neurogénese. Apesar dos benefícios, continuam a existir dúvidas de que as

NPC se diferenciem em células neuronais e ajudem à regeneração do tecido nervoso in

vivo. Este facto poderá dever-se ao microambiente inflamatório do SNC estabelecido

pelos linfócitos T CD4+ e CD8+ específicos da mielina, que inibem a neurogénese das

NPC. Assim, para que estas células sejam reconhecidas como uma opção terapêutica, é

preciso que superem o microambiente desfavorável e conduzam à regeneração dos

tecidos nervosos. [56]

Prognóstico

A doença progride mais rápido nos indivíduos que apresentam períodos de RR-MS

(recaída-remissão).[35]

A observação, o diagnóstico precoce e o tratamento médico apropriado evitam

complicações, como por exemplo as infecções de alguns orgãos. Mesmo assim, a

esperança de vida dos doentes é aumentada apenas moderadamente.

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A idade em que os sintomas tiveram início é o principal factor de prognóstico: quanto

mais precocemente aparece a doença, mais rápida será a sua progressão.

A ordem do aparecimento das manifestações clínicas também é importante na predição

da doença: se em primeiro lugar surgem dificuldades visuais haverá um melhor

prognóstico do que se surgirem inicialmente problemas de coordenação motora dos

membros.

Apesar das terapias que visam melhorar a qualidade de vida do doente, ainda não existe

cura para a MS.

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ENCEFALITE LÍMBICA

A Encefalite Límbica (LE) é uma encefalopatia autoimune na qual o síndrome

paraneoplásico ocorre secundariamente a uma reacção autoimune, não havendo

participação directa da neoplasia. Caracteriza-se por manifestações neurológicas

atribuídas ao lobo temporal mediano - zona límbica: perda de memória a curto prazo,

depressão, irritabilidade, alterações na personalidade. Na maioria das vezes, as

manifestações clínicas ocorrem antes do diagnóstico do tumor.[28]

Epidemiologia

A LE é uma doença rara, que ao contrário da maior parte das DAI, surge mais nos

homens.

A idade de início da doença é por volta dos 55 anos.

Patogénese

A LE é uma DAI que pode ter ou não origem paraneoplásica. Quando paraneoplásica

aparece associada ao SCLC, a cancro da mama e cancro testicular. Os primeiros estudos

evidenciavam que a doença surgia apenas em mulheres que apresentavam um teratoma.

Mais tarde percebeu-se que afecta igualmente mulheres sem teratoma, homens e

crianças. Em cerca de metade dos casos a LE está associada a neoplasia, e na outra

metade está associada a um processo autoimune.[13] [21] [22]

A LE é uma DAI cuja clínica pode anteceder o diagnóstico da neoplasia até 6 anos. Em

cerca de 50% dos doentes com LE, não se detecta a localização da neoplasia primária

num primeiro diagnóstico.

O tumor localiza-se fora do SNC e apresenta proteínas de superfície específicas do

SNC, que são reconhecidas como Ag. Os Ac produzidos como resposta a estes Ag,

atravessam a barreira hemato-encefálica e reagem com células específicas do SNC ou

SNP.[1] [13]

Manifestações Clínicas

O doente com LE apresenta um quadro inicial com sintomas semelhantes a depressão,

ansiedade, acentuado desinteresse social e apatia.

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Posteriormente, o doente apresenta défice de memória, perda progressiva de

consciência, agitação psicomotora, associação com sintomas psiquiátricos (psicose,

delírio), crises epilépticas e demência de progressão rápida.[13] [36]

Diagnóstico

O diagnóstico de LE é clínico, imagiológico e laboratorial.

No diagnóstico imagiológico, a RM mostra um sinal intenso em ambos os lobos

temporais, em cerca de 50% dos casos.[1]

A análise laboratorial pode ser feita no soro ou LCR. O LCR está alterado em cerca de

60% dos casos, revelando uma moderada pleocitose, aumento de proteínas e presença

de bandas oligoclonais.[1]

Em 40% dos doentes os AAc são negativos. Nos restantes 60% podem aparecer:

Anticorpos contra Ag paraneoplásicos clássicos: Hu, Ma2, CV2, anfifisina. O

Ag Hu está associado aos casos de SCLC, aparecendo em 90% dos doentes com

LE e neoplasia associada. O Ag Ma2 está associado ao cancro testicular, surge

em 90% dos doentes que apresentam esta neoplasia.[1] [13]

Anticorpos contra Ag da membrana celular: receptores do glutamato (do tipo

NMDA e do tipo AMPA), canais de potássio dependentes da voltagem (VGKC).

Os Ac anti- receptor do glutamato tipo NMDA (NMDAr) aparecem em

indivíduos jovens e estão associados a cancro do ovário.

Figura 16 – Receptor do Glutamato (tipo NMDA) [43]

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A detecção de Ac anti-NMDAr, quer no soro quer no LCR, é muito útil, já que

aparecem em 59% dos doentes com LE e tumor associado. Os Ac anti-NMDAr são

detectados por IFI no hipocampo de rato. O padrão é característico, mas não é

específico.[22] [28], [43]

Rat Hippocampus Rat Cerebellum

Figura 17 – Ac anti-NMDAr. Método: IFI Substratos: Hipocampo e cerebelo de rato [43]

Os Ac anti-VGKC são detectados em cerca de 50% dos doentes com LE.[13]

Os critérios de diagnóstico sugeridos são:

Síndrome demencial com sintomas límbicos;

Quadro de progressão subaguda;

Confusão mental, alterações dos níveis de consciência, sintomas psiquiátricos;

Um ou mais, dos seguintes: RM compatível, PET compatível, pleocitose com

hiperproteinorraquia ou bandas oligoclonais, anticorpos positivos;

A PET está indicada para o diagnóstico do tumor.

A LE é uma doença subdiagnosticada, sendo muitas vezes tomada por “encefalite de

origem desconhecida”, “psicose induzida por drogas” e “início de epilepsia”.[43]

Tratamento

Após o tratamento da neoplasia de base, os sintomas podem desaparecer por completo.

O tratamento com IVIg e PE parece ser eficaz. A existência de Ac anti-Ma2 necessita de

imunoterapia após o tratamento oncológico.[1]

Na figura 17 é possível ver como a cirurgia e a PE, levam à diminuição do título de Ac.

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Figura 18 – Monitorização dos Ac anti-NMDAr [43]

Prognóstico

A doença é agressiva, mas potencialmente reversível e tratável. O importante é que seja

feito um diagnóstico precoce, o tratamento adequado e remoção do tumor.

Neoplasias que se manifestem com síndromes paraneoplásicos apresentam melhor

prognóstico e evolução para tratamento definitivo. Mesmo assim, a existência de Ac

anti-Hu, anti-CV2, anti-anfifisina, sugerem um pior prognóstico apesar das terapêuticas

oncológicas e da imunoterapia.

A existência de Ac anti-NMDAr é de bom prognóstico, já que há uma boa resposta à

terapêutica em mais de 90% dos casos.[1] [22] [36]

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NEUROMIELITE ÓPTICA

A neuromielite óptica (NMO), tendo sido primeiramente descrita por Eugène Devic, é

também conhecida como síndrome de Devic. É uma patologia inflamatória recorrente

que leva à destruição da bainha de mielina, provocando lesões nos nervos ópticos e

espinal medula. Durante muitos anos pensou-se que pertenceria à MS, mas com

critérios laboratoriais, clínicos e imagiológicos, chegou-se à conclusão que é por si só,

uma doença.[1] [28]

Figura 19 - Corte transversal do encéfalo humano [43]

Epidemiologia

A NMO é rara na população caucasiana, representando menos de 1% das doenças

desmielinizantes do SNC. Apresenta alta incidência na população Asiática, Africana e

Sul-americana.

É três a cinco vezes mais frequente no sexo feminino, com início, em média, aos

40 anos de idade.[52]

Patogénese

O quadro clínico, caracteriza-se pela associação simultânea ou sequencial de mielite

transversa, extensa longitudinalmente, e neurite óptica uni ou bilateral.

A doença apresenta duas formas: recorrente e monofásica. As formas recorrentes

apresentam-se com síndromes medulares parciais, e disfunções motoras e sensitivas

leves a moderadas, e sem alterações esfincterianas. No entanto, ao longo da doença

ocorrem eventos de mielites completas em quase a metade dos casos.

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Catarina Marinho Marques – Mestrado em Análises Clínicas 50

A forma monofásica caracteriza-se por disfunção motora e esfincteriana, mais grave na

fase aguda da mielite inicial e com mais sequelas. Nesta forma ocorre um único

episódio de mielite transversa e neurite óptica de instalação simultânea ou espaçada por

dias.

Na maioria dos casos, em número superior a 80%, a doença assume a forma recorrente.

Manifestações Clínicas

A NMO causa cegueira, mobilidade condicionada e perda de controlo da bexiga e

intestino. Em tempos foi controverso se a NMO seria por si só uma doença ou se

representaria uma variação da MS. No entanto, hoje é vista como uma patologia isolada,

já que foram encontrados factos que, não se verificam ou raramente se verificam, na

MS:

Envolvimento do nervo óptico;

Zonas necrosadas muito extensas;

Lesões extensivas na espinal medula;

Ligação de Ac Anti-NMO de classe IgG aos vasos sanguíneos no cérebro;

Existência de um autoantigénio nas junções astrócitos-endotélio da barreira

hemato-encefálica – Aquaporina-4.

Diagnóstico

Tal como outras DAI, o diagnóstico é clínico, imagiológico e laboratorial.

Há critérios de diagnóstico para a NMO:

A existência de neurite óptica;

A existência de mielite, e pelo menos 2 dos 3 seguintes:

Evidência, na RM, de uma lesão na espinal medula em 3 ou mais segmentos;

RM demonstra que não é MS;

Existência de Ac anti-NMO IgG.

A mielite é uma reacção autoimune na espinal medula, que pode estar associada a

infecções virais, DAI sistémicas e sarcoidose.

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Catarina Marinho Marques – Mestrado em Análises Clínicas 51

A imagiologia, demonstra lesões na espinal medula e uma evolução aguda. A presença

de lesões na RM cerebral, inicialmente considerada como critério diagnóstico de

exclusão, verifica-se em até 60% dos doentes, apesar da maioria não ter tradução

clínica.[52]

A análise do LCR evidencia pleocitose e aumento de proteínas, mas geralmente sem

bandas oligoclonais, contrariamente ao que ocorre na MS.

Os Ac anti-NMO de classe IgG e Ac anti-Aquaporina-4 são marcadores serológicos

muito sensíveis da NMO. O Ac anti-NMO IgG é um anticorpo monoclonal de células B

envolvido na activação da cascata do complemento e recrutamento das células

inflamatórias. A sensibilidade dos Ac anti-NMO IgG ronda os 73% e a especificidade

os 91%.

Os Ac anti-Aquaporina-4 surgem no início da doença e são mais específicos e sensíveis

do que os Ac anti-NMO-IgG, sobretudo quando determinados por IF. A importância

dos Ac anti-Aquaporina-4 reside no facto de ajudarem à distinção entre MS e NMO.[37]

[40] [52]

Figura 20 – Ac anti-Aquaporina 4. Método: IFI Substrato: cerebelo de macaco [6]

Tratamento

O tratamento da NMO é feito essencialmente com terapêuticas imunossupressoras e por

PE.

Como tratamento inicial da fase aguda recorre-se a terapêutica com CE. Em segunda

linha, a PE é utilizada.[1]

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Catarina Marinho Marques – Mestrado em Análises Clínicas 52

Para a prevenção de recaídas, os imunossupressores usados são: azatioprina, o

micofenolato de mofetil, a mitoxantrona e o rituximab.[52]

Prognóstico

O prognóstico é reservado, com grave repercussão funcional. A sobrevida após cinco

anos é cerca de 68% para as formas recorrentes, e de 90% para as formas monofásicas,

sendo a principal causa de morte o compromisso respiratório que ocorre na lesão

medular grave.[52]

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SÍNDROME DE STIFFMAN

O síndrome de Stiffman (SS) foi inicialmente descrito por Moersch e Woltmann em

1956. Moersch e Woltmann identificaram o SS em doentes que apresentavam rigidez

progressiva lenta envolvendo os músculos esqueléticos e espasmos axiais. Os doentes

apresentam fracturas e deformidades.[14]

Epidemiologia

O SS é uma patologia tão rara, que não é possível estabelecer uma prevalência exacta,

embora se calcule que surge em menos de 1 em cada milhão de pessoas.[54]

Afecta sobretudo mulheres, numa proporção de 2:1.

Embora a maioria dos casos estejam descritos em adultos, existem casos descritos em

crianças.[53]

Patogénese

O SS é um PNS que pode surgir associado ao cancro da mama e ao SCLC.

Pode ainda aparecer em conjunto com outras doenças: em 30% dos casos com a

diabetes insulino-dependente, e em 40% dos casos com DAI, como a tiroidite de

Hashimoto, doença de Graves, MG e anemia perniciosa.

Manifestações Clínicas

As manifestações clínicas incluem rigidez muscular progressiva e espasmos,

envolvendo primeiro os músculos axiais e expandindo-se para os músculos proximais.

O doente desenvolve uma hiperlordose, marcha incerta e quedas frequentes. Os

músculos são rígidos à apalpação. Em 10% dos casos verifica-se epilepsia generalizada.

O comprometimento do sistema GABAérgico inibitório pode causar rigidez muscular e

estar implicado na prevalência de epilepsia, instabilidade autonómica, na qual ocorre

taquicardia, pressão arterial lábil e sudorese, e no aparecimento de sintomas

psiquiátricos.[1] [14]

Diagnóstico

O diagnóstico é essencialmente laboratorial. A análise do LCR não apresenta alterações,

embora possam surgir bandas oligoclonais. São detectados dois tipos de AAc:

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1. Anticorpo anti-anfifisina.

A anfifisina é uma proteína sináptica, expressa nos neurónios, células da retina e

espermatócitos. O Ac anti-anfifisina é detectável por IFI e IB.

Figura 21 – Ac anti-anfifisina. Método: IFI Substrato: cerebelo [12]

2. Anticorpo anti-descarboxilase do ácido glutâmico 67 (Ac anti-GAD67).

O Ac anti-GAD67 surge em cerca de 60% dos doentes com SS. A sua detecção é

possível por EIA, RIA ou IFI.

A descarboxilase do ácido glutâmico é uma proteína que aparece no SNC e SNP,

nos ilhéus pancreáticos, testículos, ovários, timo e estômago. A sua função é a de

catalisar a descarboxilação do ácido glutâmico em ácido gama amino butírico

(GABA). Por sua vez, as funções do GABA, como neurotransmissor inibitório do

cérebro, incluem o controlo e libertação das vesículas de insulina. O GABA tem

duas isoformas, GAD65 e GAD67, que partilham 68% de homologia. O GAD65 é

encontrado nas células β dos ilhéus pancreáticos, e o GAD67 nas células α. Assim

sendo, os Ac anti-GAD65 estão associados com a diabetes, enquanto que os Ac-

anti-GAD67 aparecem no SS.[6]

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Figura 22 – Ac anti-GAD. Método: IFI Substrato: cerebelo e pâncreas [12]

O exame imagiológico não apresenta alterações, pelo que não se revela muito útil para o

diagnóstico.

Tratamento

Para além dos habituais tratamentos: IVIg, uso de drogas imunossupressoras e PE, são

ainda utilizados:

Benzodiazepínicos, como o diazepam, para cessar a actividade motora;

Baclofeno, que é um relaxante muscular que actua nos receptores GABA, a nível

medular, deprimindo o SNC por meio de uma diminuição dos

neurotransmissores glutamato e aspartato;

Bloqueio dos nervos periféricos;

Anestesia geral;

Sono induzido.

Prognóstico

Os estímulos externos têm um efeito negativo nas melhoras do doente, e alternativas

como anestesia geral e sono induzido, têm um bom prognóstico. A terapêutica

imunossupressora e a PE, também apresentam bons resultados nas melhoras do doente.

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SÍNDROMES PARANEOPLÁSICOS

Os síndromes paraneoplásicos são complicações provenientes de doenças tumorais, que

não advêm do tumor, nem das suas metástases, nem têm causas infecciosas,

metabólicas, vasculares ou terapêuticas. Os PNS têm uma base autoimune que se

caracteriza pela resposta a Ag onconeuronais que são expressos nas células tumorais e

nas células neuronais. As manifestações clínicas dependem da região do SN afectado.

Um diagnóstico precoce é crucial para o sucesso terapêutico.

Os PNS abrangem muitas patologias, algumas confinadas ao SNC, outras ao SNP, e

outras às junções neuromusculares e músculos. Na tabela seguinte enumeram-se todos

aqueles que são considerados síndromes neurológicos paraneoplásicos.

Síndromes do SNC Síndromes do SNP

Síndromes das junções

neuromusculares e

músculos

Encefalomielite

Encefalite Límbica

Encefalite do tronco

encefálico

Degeneração cerebelar

subaguda

Opsoclonus-mioclonus

Síndrome de Stiffman

Mielopatia Necrosante

Doença neuronal motora

Neuropatia sensorial

subaguda

Neuropatia sensorio-

motora

Neuropatia com vasculite

Neuropatia autonómica

Pseudoobstrução

gastrointestinal crónica

Pandisautonomia aguda

Miastenia Gravis

Síndrome de Lambert-

Eaton

Neuromiotonia aguda

Dermatomiosite

Miopatia necrotizante

aguda

Tabela 12 – Síndromes Paraneoplásicos [1]

Epidemiologia

Os PNS são síndromes raros que afectam menos de 1% de todos os doentes com cancro.

Os cancros mais frequentes são o cancro do pulmão, mama e ovário, timoma e doença

de Hodgkin. A idade a que surge a doença ronda os 55 anos. Regra geral, afectam mais

as mulheres do que os homens numa proporção de 2:1.

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Patogénese

A doença deve-se mais a uma resposta imune celular, do que a uma acção directa dos

Ac. Pensa-se que os PNS tenham origem na expressão ectópica, de Ag onconeuronais

em células tumorais. Estes Ag são idênticos aos que existem no cérebro. Uma resposta

imune mediada por células B e T citotóxicas resulta em infiltrados de células

inflamatórias, no SN e tecido tumoral, que levam ao aparecimento de Ac anti-neuronais

no soro e LCR. O ataque imunitário começa por ser dirigido contra o tumor, e mais

tarde indevidamente contra os tecidos neuronais, o que dá origem às manifestações

clínicas de acordo com o SN afectado. As células tumorais expressam Ag, que só

existem nos neurónios; são onconeuroproteínas. Estes Ag levam ao aparecimento de Ac

e de células T citotóxicas, ambos envolvidos na degradação dos neurónios.[10] [17]

Manifestações Clínicas

Nos PNS as manifestações clínicas são sobretudo neurológicas e aparecem antes do

diagnóstico do tumor.

Habitualmente os doentes desenvolvem um síndrome subagudo que causa lesões

severas e irreversíveis, na maior parte dos casos.

Um importante indício clínico é que o PNS pode apresentar-se como uma doença

multifocal que envolve zonas distantes e não relacionadas do SN.

Diagnóstico

O diagnóstico é imagiológico e laboratorial.

Os Ac contra Ag neuronais podem ser induzidos pela presença de um tumor. A

identificação de Ac anti-neuronais permite o diagnóstico da doença neurológica e a

localização do tumor. A detecção de Ac é bastante útil, já que estes podem surgir até 5

anos antes do aparecimento do tumor. Estes Ac são de classe IgG, e são detectados por

IF e confirmados por IB. A sua especificidade é elevada e apenas alguns doentes

seropositivos não têm cancro. A sensibilidade varia com os Ac. Embora sejam úteis

para o diagnóstico, é importante referir que não são exclusivos dos PNS, podendo ser

encontrados noutras doenças ou mesmo em indivíduos saudáveis.[1] [5] [17] [18], [28]

Na tabela seguinte evidenciam-se os Ac onconeuronais clássicos e respectivo tumor. Na

presença de qualquer um destes Ac, a probabilidade de existir tumor é superior a

95%.[38]

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Tabela 13 – Anticorpos onconeuronais e PNS associado [1] [18]

Para a determinação dos Ac é importante seguir uma estratégia de detecção

(sensibilidade) e confirmação (especificidade). Para que tal aconteça, deve combinar-se

tecidos (imunohistoquímica) com o uso de Ag isolados. Os Ac são assim detectados por

IF e posteriormente confirmados por IB. A técnica de IF usa como substrato, tecidos

(cerebelo, testículos, espinal medula, músculo cardíaco, músculo esquelético) de

macaco ou rato.[17] [18]

Posner sugeriu critérios de relevância destes AAc:

1. Um determinado Ac deve estar presente em um ou mais doentes com distúrbios

neurológicos e tumores correspondentes semelhantes, e deve ser raro o

aparecimento de falsos positivos ou de falsos negativos quando se testar o Ac.

2. A concentração de Ac no soro deve ser elevada.

3. Um título superior no LCR comparativamente ao título no soro, deve sugerir

síntese intratecal e assim evidenciar a relevância do Ac.

4. Os Ac devem reagir com a parte sintomática do SN e a natureza do Ag deve ser

identificada por imunohistoquímica e pela técnica de Western blot.

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O diagnóstico deve basear-se em (1) presença de cancro, (2) no síndrome clínico e (3)

na existência de Ac onconeuronais detectados laboratorialmente, sem suscitar dúvidas.

Os PNS são subdivididos em “definitivos” ou “possíveis”. É mandatório excluir outras

causas para os sintomas neurológicos antes de estabelecer o diagnóstico de PNS. [1]

Critérios de diagnóstico para PNS definitivo:

1. Um síndrome não clássico que melhora após tratamento do cancro sem

imunoterapia simultânea, desde que o síndrome não seja susceptível a remissão

espontânea.

2. Um síndrome não clássico com Ac onconeuronais (bem caracterizados ou não) e

cancro que se desenvolve dentro de 5 anos após o diagnóstico da doença

neurológica.

3. Um síndrome neurológico (clássico ou não) com Ac onconeuronais bem

caracterizados (anti-Hu, Yo, CV2, Ri, Ma2, ou anfifisina), e sem a presença de

cancro.

Critérios de diagnóstico para PNS possível:

1. Um síndrome clássico, sem Ac onconeuronais, sem cancro, mas com elevado

risco de ter um cancro subjacente.

2. Um síndrome neurológico (clássico ou não) com Ac onconeuronais parcialmente

caracterizados, e sem cancro.

3. Um síndrome não clássico, sem Ac onconeuronais, e com a presença de cancro

dentro de 2 anos após o diagnóstico. [1]

Tratamento

O tratamento passa em primeiro lugar, pela remoção do tumor.

As opções de tratamento usadas incluem o uso de CE, a administração de IVIg e a PE,

mas o seu sucesso é indeterminado já que o número de doentes tratados é baixo. [1]

Prognóstico

O importante para um bom prognóstico, é um diagnóstico precoce.

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Quando se trata um PNS, há que ter em conta o tipo de PNS: na LEMS, por exemplo, o

tratamento é feito com CE mas a resposta passa pelo sucesso do tratamento do tumor.

Noutros PNS, há um grau variável de efeitos neurológicos irreversíveis, portanto o

objectivo de qualquer tratamento deverá passar por estabilizar o doente em vez de

melhorar os sintomas neurológicos. No entanto, em certos casos é possível conseguir

melhoras: verificou-se que doentes com LE, cancro testicular e Ac anti-Ma2 apresentam

melhor prognóstico do que aqueles que, apresentado a mesma patologia, tenham Ac

anti-Hu.[1] [10]

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Catarina Marinho Marques – Mestrado em Análises Clínicas 61

CONCLUSÃO

As DAI do SN podem surgir associadas a situações de neoplasia (PNS), ou

isoladamente como patologias autoimunes. Geralmente são pouco prevalentes e surgem

mais associadas ao sexo feminino. O diagnóstico é imagiológico, laboratorial e clínico,

e o prognóstico é na maioria das vezes positivo. São doenças tratáveis ou nas quais é

possível aliviar a sintomatologia e melhorar a qualidade de vida do doente. O tratamento

passa pela remoção do tumor, no caso de neoplasia associada, administração de

imunoglobulinas intravenosas, plasmaferese e toma de medicamentos adequados à

patologia, na maioria das vezes, corticosteróides.

De seguida é apresentado um quadro conclusivo, onde são apresentadas as patologias

abordadas, o respectivo SN afectado, autoanticorpos detectados, principais

manifestações clínicas e tratamento proposto.

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Catarina Marinho Marques – Mestrado em Análises Clínicas 62

Patologia SN

afectado

Autoanticorpo

associado

Principais

manifestações

clínicas

Tratamento

Miastenia

Gravis

SNP Ac anti-AChR

Ac anti-MuSK

Ac anti-Músculo

Estriado

Fraqueza, dores

musculares

CE, azatioprina

Síndrome de

Lambert-Eaton

SNP Ac anti-VGCC

Ac anti-AGNA

Fraqueza, xerostomia amifampridina, CE,

azatioprina, PE

Síndrome de

Guillain Barré

SNP Ac anti-

Gangliosídeos

Fraqueza, parestesias,

entropecimento,

IVIg, PE

Esclerose

Múltipla

SNC Ac anti-MBP

Ac anti-MOG

Debilidade muscular,

parestesias, lesão

cerebelosa, diplopia,

visão turva e

desconforto na bexiga

IVIg, CE, PE, IS,

transplante,

fisioterapia,

intervenções

psicológicas

Encefalite

Límbica

SNC Ac anti-NMDAr

Ac anti-neuronais

(Hu, Ma2)

Ac anti-VGKC

Depressão, amnésia,

alucinações

IVIg, PE

Neuromielite

Óptica

SNC Ac anti-

Aquaporina 4

Cegueira, mobilidade

condicionada, perda de

controlo da bexiga e

intestino

PE, CE, IS

Síndrome de

Stiffman

SNC Ac anti-GAD67

Ac anti-ICA

Ac anti-Anfifisina

Rigidez lenta

progressive,

instabilidade

autonómica

IVIg, CE, IS,

Diazepam,

Baclofeno

Sono induzido

Anestesia geral

Bloqueio dos

nervos periféricos

Síndromes

Para-

neoplásicos

SNC ou

SNP

Ac anti-neuronais

(Hu, Ri, Ma2)

Ac anti-células de

Purkinje (Yo)

Ac anti-Anfisina

Ac anti-CV2

Neuropatias,

degeneração cerebelar

IVIg, PE, CE

Tabela 14 – Principais aspectos de cada patologia abordada.

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Catarina Marinho Marques – Mestrado em Análises Clínicas 63

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