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O presente trabalho visa compreender as relações estabelecias por Phillipe Dubois entre a fotografia e os mitos de Narciso e Medusa. Em seguida, serão apresentados dois fotógrafos (Joel-Peter Witkin e Asger Carlsen, respectivamente) cujo trabalho dialoga com essas duas mitologias, mas em épocas e de maneiras diferentes. O intuito do artigo é problematizar a fotografia em nossos dias, mas situando-a numa linhagem estética e de pensamento.

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Dois olhares:

VI Congresso de Estudantes de Ps-graduao em Comunicao UERJ | UFF | UFRJ | PUC-RIO | Fiocruz

Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro. 23 a 25 de outubro de 2013.

Dois olhares:

Horror e encantamento no ato fotogrficoFilipe Feij

Resumo

O presente trabalho visa compreender as relaes estabelecias por Phillipe Dubois entre a fotografia e os mitos de Narciso e Medusa. Em seguida, sero apresentados dois fotgrafos (Joel-Peter Witkin e Asger Carlsen, respectivamente) cujo trabalho dialoga com essas duas mitologias, mas em pocas e de maneiras diferentes. O intuito do artigo problematizar a fotografia em nossos dias, mas situando-a numa linhagem esttica e de pensamento.

Palavras-chave

fotografia; Mitologia; esttica; pensamentoO espelho, so muitos

Guimares Rosa

O terrvel doppelgnger

Ao olharmos no espelho, cremos que estamos vendo a ns mesmos. Se nos afirmassem que a outro que vemos, sentiramos horror pela identidade e no pela forma desconhecida. Quem esse que vejo, ento, seno eu mesmo? Como Pode ser outro este que me acostumei a crer que era eu? Esse novo eu, esse outro, tem qualquer coisa de inerte, vazio, como um corpo sem vida ou uma esttua de cera do Museu Tusseau.

Como lidar com o outro quando o outro sou eu? J est um autre (eu um outro), disse Rimbaud adiantando-se. Mas nem todos se sentiriam to vontade para exprimir tamanha ousadia no campo da alteridade. Notemos que a histria da literatura e do cinema oferece fartos exemplos desse estranhamento causado pela duplicata humana, e no apenas a duplicata do espelho. No William Wilson de Edgar Allan Poe, um sujeito, o tal William Wilson, perseguido em vrios momentos da vida por um ssia homnimo que, porventura, acabou nascendo no mesmo dia do protagonista. Num duelo de espadas Wilson tira a vida do mascarado ssia e, contemplando-o agora sem mascara e percebendo-o absolutamente igual, entende que, ao mat-lo, condenara a si mesmo morte. No filme O estudante de praga (1913), precursor do expressionismo alemo, o jovem Balduin faz um pacto de contornos fusticos com o mago Scapinelli, no intuito de obter poder para conquistar sua amada, a condessa Margit. Entretanto, o que o rapaz no sabia que o preo da empreitada era seu prprio reflexo. Este, acaba por sair do espelho e, sendo idntico Balduin, causa-lhe problemas sem que o mesmo sequer estivesse l. Novamente o desfecho da histria trgico; o estudante acerta um tiro no duplo, que agora est no espelho, mas a bala endereada ao outro o atinge no peito.

Inmeros so os exemplos desse duplo, desse doppelgnger (literalmente duplo ambulante em alemo) que atormenta sua figura original. A questo aqui tentar compreender as inmeras narrativas em que determinado ser, ao entrar em contato com sua cpia, sua estranha e petrificante figura duplicada, sela tragicamente seu destino tal como a Medusa ao defrontar-se com seu reflexo.

Dois olhares; horror e encantamento no ato fotogrfico

Se no so efetivamente as primeiras, as narrativas mitolgicas apresentadas por Philippe Dubois em O ato fotogrfico certamente so seminais. O que fica patente nesses mitos a marca poderosa que o duplo, nesse caso o reflexo, deixa em quem o contempla.

Antes de apresentar as mitologias com espelhos; Narciso e Medusa, respectivamente, o autor faz uma observao. Ele argumenta, junto com Vasari, que a histria de uma impossibilidade figurativa a prpria origem da pintura, e quando o faz, refere-se a impossibilidade da correta apresentao da sombra no auto-retrato, j que o pintor no pode pintar sua prpria sombra enquanto pinta-se. A nica forma de captar a sombra daquele que se retrata de uma vez s. Num nico gesto. Sabemos que essa instantaneidade impossvel tanto para o desenho quanto para a pintura. Entretanto, a fotografia pode contornar essa ferida narcsica, j que se d toda de uma s vez. E exatamente assim que Narciso apaixona-se por sua prpria imagem. Instantaneamente.

A palavra Narciso tem origem na palavra grega narke, que significa entorpecido. Da o termo narctico. Narciso contempla-se na lagoa de Eco at definhar, deixando em seu lugar a flor homnima. Dubois nos apresenta um texto de Filstrato, que alis o nico que evoca a histria de Narciso por intermdio da pintura, em que este o admoesta pela prpria maneira como est aprisionado; Quanto a ti, jovem, no uma pintura que causa tua iluso, no so as cores, nem uma cera enganadora que te mantm acorrentado; tu no vez que a gua te reproduz tal como tu te contemplas; no percebes o artifcio dessa fonte e, contudo, isso bastaria para inclinar-te, passar de uma expresso a outra, agitar a mo, mudar de atitude...(DUBOIS, 1984, pg. 47)

Filostrato cai na armadilha da representao, pois dirige-se diretamente Narciso como se este no fosse fico. Da mesma forma, Narciso revolve-se sobre si mesmo, encantado, como se a imagem no espelho das guas fosse outrem de carne e osso. A imobilidade do personagem diante da lagoa nos remete nossa prpria imobilidade enquanto observadores de um quadro. Nosso olhar narcsico enxerga eu mesmo onde aparentemente no h eu e essa fonte cujo artifcio confunde a representao, que tambm capaz de encantar e imobilizar.

No obstante, o horror tambm paralisa. Talvez o horror inicial na histria de Medusa seja o da ciumenta Atena, que ao ver o seduzido Poseidon violar a bela jovem (que ainda no havia sido amaldioada, evidentemente) no templo de Minerva, desviou o rosto e cobriu os olhos, mortificada. A maldio de Atena recaiu justamente no mais belo atributo de Medusa, a vasta cabeleira, e os mesmos olhos que seduziram o poderoso Deus, transformariam em pedra qualquer um que a olhasse diretamente. Portanto, o dilema do heri Perseu, encarregado de liquidar com um dos mais poderosos monstros da antiguidade, est no olhar. Ele utiliza seu escudo ultra polido para apresentar Medusa a si mesma ou, em ltima instncia, represent-la. Ao ver-se representada seu destino a autopetrificao, mas antes que isso ocorra, Perseu deve agir rapidamente para atingir-lhe o pescoo com sua espada extremamente afiada, antes que a carne se transforme completamente em pedra. O heri deve agir no instante absolutamente preciso para que a misso funcione, e assim o . A operao se d com sucesso e toda de uma vez s, como no instante em que o fotgrafo consegue produzir seu auto-retrato com sombra. A cabea cortada inscreve-se para sempre no escudo e o espelho, tal como o papel fotogrfico, deixou que a imagem ficasse impressa justamente pela fora do olhar petrificante.

Em ambos os casos, ou mitos, assistimos a extremos ligados s propriedades reflexivas do espelhamento. Talvez esses extremos sejam as duas faces de uma mesma moeda que Freud cunha com o termo Unheimlich.

Uma estranha palavra

Em Das Unheimliche, geralmente traduzido como O Estranho, Sigmund Freud mergulha na dimenso plural de sentidos abarcada por essa palavra. A princpio, heimlich pode ser traduzido por familiar, domstico, domesticado, ntimo, amistoso, confortvel, tranquilo, seguro, aconchegante. Porm, num dado momento, as definies comeam a transmutar para escondido, oculto, reticente, malicioso, ardiloso, misterioso e, finalmente, estranho. Antes mesmo do negativo un aparecer, a palavra heimlich j d conta de certa negatividade presente em seu carter polissmico, algo deveras estranho. Na verdade, Freud tenta dar conta, atravs do sentido, de certa atmosfera de desconfiana naquilo que familiar e, ao mesmo tempo, uma familiaridade que reside no seio da estranheza. Logo, depreende-se que esses termos esto imbricados de tal forma na idia do estranho que fica difcil estabelecer os limites entre um e outro. Apesar do tom inconclusivo do texto, a noo de indiscernibilidade juntamente com a definio de Schelling; tudo o que deveria ter permanecido secreto e oculto, mas veio luz, nos do pistas interessantes acerca da natureza do tema abordado.

Indiscernvel, ambguo, ambivalente, incerto, o estranho parece estar a meio caminho dos extremos. Podemos colocar numa dessas extremidades a placidez, o encantamento, a delicadeza e o deleite que residem na imagem refletida de Narciso, pela qual ele se apaixonou. Na outra extremidade, depositamos o horror, o monstruoso, o brutal e medonho reflexo da Medusa, capaz de petrificar. Mas ser que o estranho essa estranha mediatriz, esse estranho eixo em que Narciso e Medusa coabitam? Ser possvel, numa ordem que abarca, mas ao mesmo tempo tangencia o encantamento e o horror, ir alm da petrificante representao? Erigir um movimento, uma fora motriz que produza variados afetos e pensamentos?

O paradoxo Witkin

Podemos afirmar que uma das caractersticas mais marcantes de ns, seres humanos, sermos um conjunto de retenes e expectativas. Na repetio dos instantes contramos hbitos, ou seja, relaes tornadas constantes atravs da durao, e na medida em que captamos impresses na experincia, esperamos que essas impresses se repitam. Hbitos s existem porque existe um reconhecimento imediato. O mesmo serve para estmulos levados saturao. Atravs de uma memria de dispositivos motores esse reconhecimento feito e h um prolongamento motor da imagem percebida, uma fora motriz que dela se depreende. Perceber, distinguir e agir. Este o campo da recognio, do reconhecimento, da representao. Nele so exercidas as atividades interesseiras regidas pela finalidade. Diante da necessidade de agir no mundo concreto, tem-se que, de sada, discernir o que se imagina daquilo que se v. Somos seres voltados para a ao, centros de ao e, portanto, o que importa a o reconhecimento do objeto para que a ao se torne eficaz. Em nossa atitude interessada, sabemos que precisamos guardar o imaginrio para resguardar a realidade.

No entanto, a ao motora poder encontrar-se, em determinados casos, suspensa pela impossibilidade de reconhecer um objeto automaticamente. Entramos em contato com alguma coisa que foi alm das expectativas. Logo, no estaremos preparados para dar uma resposta imediata a aquilo que percebemos ao penetrarmos nesta zona de indiscernibilidade. A indiscernibilidade algo com que, geralmente, a conscincia no quer lidar e justamente por isso se esfora o tempo inteiro para distinguir. Avariado, o aparelho sensrio-motor sofre uma espcie de breakdown; h uma quebra no sistema de expectativas. Cremos romper-se o fio condutor perceptivo ao sermos introduzidos neste caos e nossa mente, sentindo-se comprometida sob seu domnio, tenta livrar-nos dessa percepo desorganizada, dessa confuso provocada nos sentidos. Entra em cena uma luta contra o caos, que uma luta em que foras ordenadoras desejam conter sua apario. manifestao caide, ento, ope-se um ordenamento vindo de fora, posto que esta, nesse caso, vista como noo negativa, como algo que no pode conter-se em si e por si. Desorganizao, confuso e desordem so alguns dos termos com os quais podemos indicar a pejorativa concepo que dessa idia fazemos, e desde seus primrdios o pensamento ocidental corroborou com as noes supracitadas, alertando-nos para seus eminentes perigos. O feio, o assimtrico, o indistinto, o desproporcional; elementos dessemelhantes que subvertem a ordem e que, portanto, so vistos como indesejveis. Caractersticas que operam fora da medida. Quando nos deparamos com algo estranho estamos impedidos, mesmo que momentaneamente, de reconhecer, de atribuir a isso uma identidade fixa e, seja encarando o indistinto como uma espcie de monstruosidade, ou o prprio monstro como portador, por excelncia, da indistino, ainda no samos de uma noo usual. Talvez a lgica do aberrante no tenha se esgotado. Talvez haja ainda muito a investigar, no intuito de criar desdobramentos.

No entanto, o senso comum apresenta-nos uma proliferao sem precedentes de seres designados como anormais. Livros, jornais, cinema, desenhos animados, todas as mdias a que normalmente temos acesso os mostram em profuso e numa incrvel diversidade de aspectos e manifestaes. Pode-se at falar numa banalizao, dado que a inquietao que provocam, sua vertiginosa materialidade aplacada por esse tipo de repetio. Perde-se o poder de afetar e com isso, tambm, algo de uma sensao especfica. De uma singularidade. Enfim, eles parecem, aps essa enxurrada de estmulos que sempre retornam iguais, terem-se tornado familiares, ou at mesmo simpticos. Talvez uma familiaridade existente em tudo o que estranho tenha sido realada. O elemento radical do aberrante, sua diferena, se no suprimida, pelo menos recebe certa dose de apaziguamento. Ao domesticar a estranheza, possvel debruarmo-nos mais calmamente sobre esta para depositar nosso olhar outrora desviante. Podemos at rir do monstro, de seus gestos e feies grotescas. Caso nos sintamos culpados, derramaremos lgrimas no movimento catrtico conduzido pelo drama. E se o gnero for o horror, tentaremos a todo custo eliminar esse outro, estrangeiro nascido em nossa prpria ptria, para que asseguremos a crena na forma homem. De qualquer modo, a maneira como o apresentam est evidentemente vinculada a um tipo de impotncia, ou pelo menos, a algo que est separado daquilo que ele pode. Devero estar reservados a este ser apenas o riso, a pena e o asco? No seria possvel falar em uma potncia advinda da estranheza?

Para comear a responder essa questo, sugerimos o trabalho do fotgrafo americano Joel-Peter Witkin que, junto com artistas como Diane Arbus e Roger Ballen, revolucionou aquilo que costumamos chamar de fotografia. Nascido no Brooklyn em fins da dcada de trinta, testemunhou desde cedo, at antes mesmo de tornar-se fotgrafo, uma srie de eventos que iriam marc-lo e influenci-lo profundamente no processo criativo. Num relato de infncia destacado o dia em que a caminho da igreja, acompanhado da me e do irmo gmeo Jerome, um enorme estrondo chamou-lhe a ateno. O barulho veio misturado com gritos de socorro e o menino, correndo em direo ao evento, descobre rapidamente que se tratava de um acidente de carro. Ao perceber que alguma coisa rolava de dentro do veculo que havia capotado, no hesita em aproximar-se, constatando que era a cabea de uma menina pequena. No ltimo instante algum o carrega, impedindo-o de toc-la. Ainda adolescente, ele consegue um emprego que possibilita o aprendizado das primeiras tcnicas fotogrficas. O uso delas ser feito alguns anos depois no exrcito, documentando acidentes e baixas de guerra, algo que o aproximou ainda mais de sua peculiar morbidez. Mas uma das ocorrncias centrais, talvez a mais importante de sua juventude, ocorre num circo de horrores em Coney Island, na dcada de 50. Especula-se que fotografando um hermafrodita, a fascinao teria sido tamanha que, ali mesmo, teria ocorrido sua primeira experincia sexual.

Independentemente da completa veracidade desses eventos, o que se quer examinar so determinadas qualidades secretadas pela imagem. A relevncia ou potncia da obra est expressa nas formas plasmadas sobre o papel, nas composies propostas pelo artista e em cada um de seus elementos constituintes. Se algum tipo de histria quer-se fazer contar, sem dvida no a dele em particular, mas daqueles que constantemente deseja mostrar. E tambm essa no composta de suas individualidades, mas daquilo que foi desprezado pela historiografia tradicional e, conseqentemente, daquilo que foi descartado. Suas imagens recusam-se a fazer parte da lgica do capital. Mesmo como descartados eles insistem num retorno e ultrapassam aquela medida limtrofe em que ainda so amistosos para mergulhar-nos numa fissura. Aqui, a histria que se quer contar a histria dos vencidos. Daqueles que voltam como derrotados para, assim, vencer determinadas barreiras culturais. Retornar aps o descarte escapar cronologia habitualmente concebida e adotada nos livros de histria com os quais fomos educados. habitar um mundo hbrido entre a vida e a morte, o atual e o virtual, o tempo e o no tempo. Territrio de equivocidade temporal, no qual inclusive o instante fotogrfico forjado, j que grande parte de sua produo feita em estdio. Joel-Peter Witkin, em diversas fotografias, nos introduz um universo cuja cronologia e a vida so, em ltima instncia, inapreensveis. Referncias histricas e artsticas se misturam numa estranha mescla. Perodo Helenstico, saomasoquismo, tableaux vivants, cultura pop, feiras de aberraes. Picasso, Velsquez, Magritte, Hopper. No sabemos se algumas de suas figuras esto vivas ou mortas e, quando supostamente mortas, se so de fato humanas ou esculturas. So universos de indiscernibilidade potencializados por uma complexa formulao imagtica. Deformaes temporais, lgicas, estticas. Nem a superfcie dos negativos fica imune. Tal como os pictorialistas na virada do sculo XIX/XX, Witkin altera o material que ir gerar a foto raspando-o, envelhecendo-o, alterando a cor e o brilho original das imagens para transfigurar e afirmar sua prpria qualidade hbrida

Esculturas digitais

O fotgrafo Asger Carlsen, nascido em 1973, no apresenta a condio de estrangeiro to somente por ser um dinamarqus radicado em Nova York. Operando numa ordem similar a de Joel-Peter Witkin, ele sublinha, atravs de seu trabalho, pontos importantes da obra do americano e introduz problemticas especficas de seu tempo e modus operandi.

Em seu website www.asgercarlsen.com nos deparamos, num primeiro momento, com formas que, possivelmente, ainda no tnhamos sido capazes de imaginar. A srie Wrong, por exemplo, intriga. Como absorver, pelo menos num primeiro momento, monturos tumorecentes que se espalham pela paisagem? Pessoas que se equilibram sabe-se l como, visto que a parte inferior de seus corpos de madeira? Homens com duas cabeas em uma? Lobisomens urbanos e perfeitamente integrados? primeira vista, esse desconcertante desfile de criaturas surpreendentes nos confunde por inmeras razes. O que concreto e o que montagem? Como ele desenvolve suas idias? O que lhe serve como inspirao?

Pouco a pouco, sentimos que algumas perguntas so desnecessrias e outras se resolvem quase didaticamente. Um exemplo disso a desfigurao de um de seus modelos em Sebastian Magazine, mostrada de diferentes modos. Ora, uma pessoa pode ser desfigurada, mas no de diferentes maneiras a cada momento. A utilizao ostensiva da manipulao da imagem o aproxima de Witkin, bem como a utilizao pouco convencional de modelos, o uso apropriado do preto e branco, uma indiscernibilidade relativa s formas e aos meios de produo. S que a manipulao, o indiscernvel em Carlsen tem a cara do sculo XXI. E o corpo tambm. A minuciosa adulterao da imagem no programa Photoshop no serve aqui para corrigir celulites e manchas, mas para problematizar o corpo. Pensar a potncia dessas figuras que, na obra de ambos os criadores e esttica, e redefinir padres.

Na srie Hester, o fotgrafo extrapola o bom senso e avana na direo de compsitos corpreos que, se considerados mais atentamente, aludem, numa releitura ainda mais delirante ao principal personagem de Mary Shelley. Esses Frankensteins contemporneos oscilam, em termos de concepo, entre a fotografia e as artes plsticas. Verdadeiras esculturas digitais, ao contrrio dos hologramas, no precisam do tempo para evidenciar suas naturezas cibernticas. Alis, precisam sim. Do tempo do registro, para que como graciosas Medusas encantem e perturbem o olhar.

BIBLIOGRAFIA

BORHAN, Pierre. Joel-Peter Witkin-Disciple, matre. Paris: Marval, 2000.

DUBBOIS, Phillipe. O ato fotogrfico. So Paulo: Papirus, 1993.

FREUD, Sigmund. O estranho, 1919. In: ______. Histria de uma neurose infantil.

Rio de Janeiro: Imago, 1996. p. 233-270. (Edio standard brasileira das obras

psicolgicas completas de Sigmund Freud, 17).

Trabalho apresentado no GT (inserir aqui nmero e ttulo do Grupo de Trabalho) do VI Congresso de Estudantes de Ps-Graduao em Comunicao, na categoria ps-graduao. UERJ, Rio de Janeiro, outubro de 2013.

Doutorando em Tecnologias de Comunicao e Cultura na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (PPGCOM/UERJ). Mestre em Comunicao Social pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro em 2008, na linha de pesquisa Tecnologias da Comunicao e Cultura. O tema desenvolvido na dissertao versa em torno das relaes entre novas formas de narrativa cinematogrfica e tecnologia; Bacharel em Desenho Industrial pela Univercidade em 2001- Comunicao Visual. Atualmente sou professor da ps-graduao em Design Digital da Escola Superior de Design Digital do instituto Infnet, onde leciono as disciplinas de Conceitos de Fotografia e Cinema e Roteiro.

E.T.A. Hoffman aborda largamente a questo do duplo, especialmente nas obras O reflexo perdido, O elixir do diabo e O homem de areia, que conta com a apario da boneca Olmpia. Tambm Dostoivski com O duplo, Oscar Wilde (O retrato de Dorian Grey) e O outro, de Jorge Luis Borges so alguns clebres exemplos dentre tantas outras e mais ou menos similares variaes do tema.

Flvio Filstrato ou Filstrato, o Ateniense, foi um filsofo sofista no perodo dos imperadores romanos

Curiosamente o mesmo pintor, Michelangelo Caravaggio, retratou as duas cenas. Alguns especialistas afirmam que a Medusa seria uma reproduo de seu prprio rosto quando jovem, o que multiplica o sentido do espelhamento.

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