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DOR TORÁCICA AGUDA / PROTOCOLO PS - HUOP Erwin Soliva Junior Diego Henrique Andrade de Oliveira Fernando Spencer Netto - A queixa de dor torácica na sala de emergência representa um grande desafio para o médico plantonista. Além de ser um sintoma frequente no pronto atendimento, compreende uma variedade de causas, com implicações clínicas diversas (tabela 1). Neste contexto, é importante o rápido reconhecimento e manejo de situações potencialmente graves e fatais, tais como síndromes coronarianas agudas, dissecção aguda de aorta, embolia pulmonar, etc. - Avaliação clínica inicial: Todo paciente com dor torácica aguda deve ser prontamente atendido. A avaliação inicial inclui história clínica, exame físico e realização do eletrocardiograma. Neste momento é muito importante identificar se estamos diante de uma provável ou possível síndrome coronariana aguda (SCA). Logo, uma boa anamnese permite classificar a dor quanto a probabilidade de dor isquêmica ou anginosa: Definitivamente Anginosa: Dor em aperto ou queimação, em repouso, ou desencadeada pelo esforço ou estresse, com irradiação para o ombro, mandíbula ou face interna do braço, aliviada pelo repouso ou nitrato. Provavelmente Anginosa: Características da dor fazem da insuficiência coronária (Ico) a principal hipótese, porém são necessários exames complementares para a definição diagnóstica. Possivelmente Anginosa: Dor torácica cujas características não fazem da ICo (atípica) a principal hipótese, porém são necessários exames complementares para excluí-la. Definitivamente Não-anginosa: Dor atípica, cujas características não incluem a ICo aguda no diagnóstico diferencial. Tabela 1. Principais causas de dor torácica aguda identificadas no Pronto Socorro. Causas Musculoesqueléticas Causas gastroesofágicas e abdominais Lesões em costelas Refluxo gastroesofágico Nervos sensitivos (Herpes-zóster) Espasmo esofagiano Costocondrite Ulcera péptica/Gastrite Fibromialgia Síndromes radiculares Dores musculares inespecíficas Ruptura esofágica (Boerhaave) Pancreatite / Colecistite Abscesso subfrênico Causas Cardíacas Causas Pulmonares Síndromes coronarianas agudas Pneumotórax

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DOR TORÁCICA AGUDA / PROTOCOLO PS - HUOP

Erwin Soliva Junior

Diego Henrique Andrade de Oliveira

Fernando Spencer Netto

- A queixa de dor torácica na sala de emergência representa um grande desafio para o médico

plantonista. Além de ser um sintoma frequente no pronto atendimento, compreende uma

variedade de causas, com implicações clínicas diversas (tabela 1). Neste contexto, é

importante o rápido reconhecimento e manejo de situações potencialmente graves e fatais,

tais como síndromes coronarianas agudas, dissecção aguda de aorta, embolia pulmonar, etc.

- Avaliação clínica inicial: Todo paciente com dor torácica aguda deve ser prontamente

atendido. A avaliação inicial inclui história clínica, exame físico e realização do

eletrocardiograma. Neste momento é muito importante identificar se estamos diante de uma

provável ou possível síndrome coronariana aguda (SCA). Logo, uma boa anamnese permite

classificar a dor quanto a probabilidade de dor isquêmica ou anginosa:

Definitivamente Anginosa: Dor em aperto ou queimação, em repouso, ou

desencadeada pelo esforço ou estresse, com irradiação para o ombro, mandíbula ou

face interna do braço, aliviada pelo repouso ou nitrato.

Provavelmente Anginosa: Características da dor fazem da insuficiência coronária (Ico)

a principal hipótese, porém são necessários exames complementares para a definição

diagnóstica.

Possivelmente Anginosa: Dor torácica cujas características não fazem da ICo (atípica) a

principal hipótese, porém são necessários exames complementares para excluí-la.

Definitivamente Não-anginosa: Dor atípica, cujas características não incluem a ICo

aguda no diagnóstico diferencial.

Tabela 1. Principais causas de dor torácica aguda identificadas no Pronto Socorro.

Causas Musculoesqueléticas Causas gastroesofágicas e abdominais

Lesões em costelas Refluxo gastroesofágico

Nervos sensitivos (Herpes-zóster) Espasmo esofagiano

Costocondrite Ulcera péptica/Gastrite

Fibromialgia

Síndromes radiculares

Dores musculares inespecíficas

Ruptura esofágica (Boerhaave)

Pancreatite / Colecistite

Abscesso subfrênico

Causas Cardíacas Causas Pulmonares

Síndromes coronarianas agudas Pneumotórax

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Dissecção aguda de aorta Embolia Pulmonar

Pericardite Pleurite

Estenose aórtica Hipertensão Pulmonar

Cardiomiopatia hipertrófica

Causas Vasculares Transtornos Psiquiátricos

Dissecção de aorta Transtorno do Pânico

Aneurisma de aorta Transtorno de Ansiedade Generalizada

Depressão

Transtornos somáticos

- Exame físico: Na maioria das vezes o exame físico dos pacientes com SCA é normal ou inespecífico, mas é muito útil no diagnóstico diferencial da dor torácica aguda no pronto atendimento. Alguns dos achados “alterados” e sua correlação diagnóstica estão resumidos na tabela 2.

Tabela 2. Achados do exame físico e sua correlação diagnóstica.

Achado do exame físico Hipótese diagnóstica / Comentário

Hipotensão Embolia pulmonar (EP), pneumotórax

hipertensivo, tamponamento cardíaco,

dissecção de aorta, SCA

Pulsos assimétricos Dissecção de aorta

Sopro diastólico em foco aórtico Insuficiência aórtica/dissecção de aorta

Enfisema subcutâneo

Crepitações pulmonares, edema, B3

Desbobramento B2, com hiperfonese

Pneumotórax, ruptura de esôfago

Insuficiência cardíaca

Hipertensão pulmonar / EP

Melhora da dor com posição sentada Pericardite

- Exames complementares: Após a suspeita diagnóstica com base na história clínica e exames físico podemos lançar mão dos exames complementares para confirmação diagnóstica e/ou estratificação do risco cardiovascular:

- Eletrocardiograma (ECG): O ECG é sem dúvida o exame mais importante na investigação de

dor torácica no pronto atendimento. O ECG deve ser realizado e avaliado em até 10 minutos

da admissão. Recomenda-se repeti-lo em até 4 horas ou conforme a necessidade. A presença

do supradesnivelamento do segmento ST maior ou igual a 1mm em derivações contíguas, com

exceção às derivações precordiais direitas (V2, V3), onde o supradesnivelamento deve ser

maior ou igual a 2mm faz o diagnóstico de Infarto agudo do miocárdio com supra de ST

(IAMCSST) e implica em tratamento específico (vide adiante). A presença do bloqueio de ramo

esquerdo (BRE) “novo” ou “presumivelmente novo” na presença de sintomas típicos também

deve interpretada como corrente de lesão miocárdica ou IAMCSST. Dentro ainda do contexto

de síndrome coronariana aguda, o ECG pode mostrar alterações isquêmicas, como o

infradenivelamento dinâmico do segmento ST e/ou inversão da onda T, que implicariam em

risco aumentado de complicações cardiovasculares.

Ademais, o ECG pode ser útil no diagnóstico diferencial das causas cardíacas de dor

torácica, como o achado de supradesnivelamento difuso do segmento ST na pericardite, baixa

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voltagem no derrame pericárdico e a taquicardia sinusal e sinais de sobrecarga ventricular

direita do tromboembolismo pulmonar. Deve-se ressaltar que um ECG normal não descarta a

possibilidade de etiologia cardiogênica da dor torácica, como síndrome coronariana aguda por

exemplo, situação em que o quadro clínico deve sempre prevalecer.

- Marcadores de necrose do miocárdio: As troponinas T e I são os marcadores laboratoriais

mais sensíveis e específicos de lesão miocárdica. Em média, a troponina T tem sensibilidade

de 96,9% e especificidade de 94,5% para o diagnóstico de infarto agudo do miocárdio (IAM). A

CK-MB massa pode ser uma alternativa às troponinas quando da não disponibilidade destas ou

para o diagnóstico de reinfarto, devido sua normalização mais precoce (Tabela 3). Esses

marcadores devem ser prontamente solicitados em todos os pacientes com suspeita de SCA e

repetidos entre 6 e 12 horas. A elevação de tais marcadores não é exclusiva dos casos de IAM,

mas também pode estar presente nas situações que cursam com lesão miocárdica de outra

natureza, tais como taquiarritmias, miocardite, insuficiência cardíaca, pós desfibrilação ou

reanimação cardíaca, trauma torácico, embolia pulmonar, hipertensão pulmonar, etc.

Tabela 3. Cinética dos marcadores de necrose miocárdica.

Marcadores Elevação inicial Pico Normalização

CKMB 3 - 12 horas 20 – 24 horas 48 – 72 horas

Troponina T 3 – 12 horas 24 – 48 horas 7 – 14 dias

- Radiografia de tórax: tem sua maior utilidade no diagnóstico diferencial de dor torácica não

isquêmica, como pneumonia, pneumotórax, derrame pleural, etc. Pode sugerir ainda: derrame

pericárdico, embolia pulmonar, hipertensão pulmonar, etc.

- TC de tórax: exame mais sensível e mais específico que a radiografia de tórax para

diagnóstico de doenças pleurais, do parênquima e vasculatura pulmonar, com maior utilidade

nos diagnósticos de embolia pulmonar e dissecção aguda de aorta (angio TC de tórax).

- Ecocardiograma: Exame com boa indicação nos pacientes com suspeita de derrame

pericárdico, valvopatias, cardiomiopatia hipertrófica, dissecção de aorta, embolia pulmonar e

hipertensão pulmonar. Tem pouca validade na emergência nos pacientes com síndrome

coronariana aguda, exceto em situações em que o ECG é interpretável (bloqueio de ramo

esquerdo ou ritmo de marcapasso), quando a alteração da mobilidade segmentar miocárdica

“nova” pode sugerir IAM atual.

- Teste ergométrico ou teste de esforço (TE): O TE pode ser realizado nos pacientes com dor

torácica possivelmente anginosa, ou mesmo nos pacientes com SCA estratificados inicialmente

como de baixo risco, cujo resultado normal confere um risco muito baixo de eventos

cardiovasculares em 1 ano. Entretanto, para a sua realização devem ser afastadas as situações

de risco moderado a alto, doenças agudas da aorta, tromboembolismo pulmonar, miocardite e

pericardite. Entre as condições necessárias para a realização do exame incluem: ausência de

sintomas e alterações eletrocardiográficas sugestivos de isquemia miocárdica nas últimas 24

horas, presença de ao menos duas amostras seriadas de marcadores de necrose miocárdica

negativas.

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Algoritmo de Atendimento 1

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Cap. 6 Dissecção da aorta 7

deve ser imediata com o objetivo de evitar a ruptura e morte por tamponamento

cardíaco, corrigir a regurgitação aórtica quando presente, excluir o local de lace-

ração da íntima e redirecionar o fl uxo de sangue para dentro da luz verdadeira aos

ramos supra-aórticos e à aorta descendente.8-10

Ao contrário, nas dissecções do Tipo B, a evolução é bem mais favorável com

o tratamento clínico, com mortalidade de 10% em trinta dias, enquanto nos pa-

cientes operados a mortalidade é maior (31%), com risco de paraplegia varian-

do de 3 a 18% na cirurgia convencional.11 Uma vez feito o diagnóstico o pacien-

te deve ser transferido para uma unidade de terapia intensiva (UTI) para

monitorização da frequência cardíaca e da pressão arterial. Tratamento com -

bloqueadores e nitroprussiato de sódio deve ser iniciado imediatamente, assim

como analgesia.7

Resultados preliminares apontam que o emprego de endopróteses para trata-

mento das dissecções Tipo B complicadas resultam em riscos menores quando re-

alizados via artéria femoral em relação ao implante destas pelo arco aórtico em

parada circulatória e do que com a cirurgia convencional.12-14 Considera-se com-

plicação a ruptura, insufi ciência renal, oclusão arterial aguda e extensão da dissec-

ção demonstrada por método de imagem apesar de tratamento clínico adequado.

Pode-se considerar que com os adventos dos procedimentos endovasculares per-

cutâneos houve uma verdadeira revolução no tratamento das doenças da aorta to-

rácica descendente (Figuras 6, 7 e 8).14 O papel do tratamento endovascular no

tratamento das dissecções do Tipo B não complicadas ainda não está defi nido.

No Algoritmo 1 está representado o manejo atual das dissecções agudas de

aorta.

O hematoma intramural de aorta deve seguir o mesmo protocolo de investi-

gação e manejo da dissecção clássica, já que os hematomas que envolvem a aorta

Algoritmo 1. Manejo da dissecção aguda da aorta.

Tipo A Tipo B não complicado

Tratamento clínico

Tipo B complicado e

anatomia favorável

Endoprótese

Tipo B complicado e

anatomia desfavorável

Cirurgia Cap 06.indd 7 7/6/10 2:46:32 PM

- An coagulação:

- Enoxaparina1mg/KgSC12/12horasou

- HeparinaNão-fracionada:Bolusde80mg/KgEV(máxde4000UI),seguidode18U/Kg/hembombadeinfusãocon nua(manterTTPAentre1,5e2,5vezesocontrole),ou

- Rivoraxabana15mgvo12/12horaspor3senanas,seguidode20mgvo/dia

- Trombólise:

- Reservadoaospacientesdealtorisco,cominstabilidadehemodinâmica

- Estreptoquinase:1.500.000UEVem2horasourTPA:100mgEVem2horas

- Janelaterapêu cadeaté14dias,combene ciomaiornasprimeiras72horas

EMBOLIAPULMONAR

DISSECÇÃOAGUDADEAORTA