Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º...

102
Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino Secundário Aquisição de vocabulário em língua estrangeira: aprendizagem e ensino 2012 Orientador: Professora Doutora Maria de Fátima de Sousa Basto Vieira Classificação: Ciclo de estudos: Dissertação/relatório/ Projeto/IPP: Versão definitiva

Transcript of Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º...

Page 1: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira

2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino Secundário

Aquisição de vocabulário em língua estrangeira: aprendizagem e ensino

2012

Orientador: Professora Doutora Maria de Fátima de Sousa Basto Vieira

Classificação: Ciclo de estudos:

Dissertação/relatório/ Projeto/IPP:

Versão definitiva

Page 2: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

2

AGRADECIMENTOS À Professora Doutora Fátima Vieira por toda a sua disponibilidade e orientação. À minha família e amigos pelo seu apoio e por pacientemente terem prescindido da minha companhia. Aos meus colegas que sempre me incentivaram. A todos os professores que cruzaram a minha vida e às minhas orientadoras de estágio por tudo o que me ensinaram. Aos meus alunos por tudo o que, sem saberem, me ensinam.

Page 3: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

3

RESUMO

A finalidade máxima da aprendizagem de uma língua estrangeira é a

comunicação. Para comunicarmos com as outras pessoas e transmitirmos a maioria das

mensagens, estamos dependentes do uso de vocabulário. Deste modo, a competência

lexical assume um papel central na aprendizagem de uma língua, pelo que deve ser alvo

de um trabalho intencional e planeado por parte do professor.

Este Relatório, que pretende ser reflexo da minha experiência profissional, centra-

se na temática da aquisição de vocabulário, perspetivando a ótica do aprendente

(aprendizagem) e do professor (ensino). Neste sentido, são abordadas questões relativas à

organização, armazenamento e esquecimento do conhecimento lexical e indicadas

estratégias para a aprendizagem autónoma de vocabulário. São também objeto de

consideração os princípios que devem reger o processo de seleção lexical, as fontes de

vocabulário em sala de aula, os aspetos a ter em conta no seu ensino e as formas de o

apresentar e explicar. É ainda objetivo deste trabalho perceber os aspetos que facilitam a

memorização de vocabulário e as formas que o professor pode utilizar para promover a

sua prática e reciclagem.

Para melhor perceber o modo como se aprende e, consequentemente, o modo

como se deve ensinar, fiz uma pesquisa sobre o funcionamento do cérebro e a sua relação

com a aprendizagem. Dediquei também parte do trabalho a uma visão geral das mais

influentes teorias da aprendizagem e dos fatores que a influenciam numa língua

estrangeira.

Palavras-chave: vocabulário, língua estrangeira, aprendizagem, ensino

Page 4: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

4

ABSTRACT

Communication is the ultimate purpose of learning a foreign language. In order to

communicate with other people and convey most messages we have to make use of

vocabulary. Since the lexical competence plays a key role in foreign language learning, it

should be the target of intentional and planned work by the teacher.

This report, which intends to reflect my professional experience, focuses on

vocabulary acquisition and approaches it in the learner’s and the teacher’s view. Thus,

the organisation and storage of vocabulary, as well as the reasons why it is forgotten are

mentioned in this work. There is an indication of the strategies learners can use to learn

vocabulary autonomously and of the principles that should guide the process of lexical

selection. Classroom sources of words and the aspects that should be taken into account

in the teaching of lexis are considered in this report, which is also intended to show ways

of presenting and explaining vocabulary and of promoting its practice and recycling.

For a better understanding of how we learn and, consequently, of how we should

teach, research was conducted about the way the brain works and its implications for

learning. Part of this report is also devoted to a general overview of the most influential

learning theories and of the factors which affect foreign language learning.

Keywords: vocabulary, foreign language, learning, teaching

Page 5: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

5

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO 7

2. O FUNCIONAMENTO DO CÉREBRO E A APRENDIZAGEM 12

2.1. A estrutura do cérebro 13

2.2. Os vários tipos de memória 17 2.2.1. A memória sensorial 18 2.2.2. A memória de funcionamento 22 2.2.3. A memória a longo prazo 24

2.3. O desenvolvimento do cérebro 26 2.3.1. O cérebro da criança 26 2.3.2. O cérebro do adolescente 28 2.3.3. O cérebro do adulto 30

2.4. Períodos sensíveis 31

3. TEORIAS DA APRENDIZAGEM 34

3.1. O Behaviorismo 34

3.2. O Construtivismo 39

3.3. O Construtivismo Social 43

3.4. Inteligências Múltiplas 46

4. FATORES QUE INFLUENCIAM A APRENDIZAGEM DE UMA LÍNGUA ESTRANGEIRA 52

5. A AQUISIÇÃO DE VOCABULÁRIO 65

5.1. A aprendizagem de vocabulário 65 5.1.1. O léxico mental 66 5.1.2. O esquecimento de vocabulário 67 5.1.3. Tipos e dimensão de vocabulário 68 5.1.4. Estratégias para a aprendizagem autónoma de vocabulário 70

Page 6: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

6

5.2. O ensino de vocabulário 74 5.2.1. A seleção de vocabulário 75 5.2.2. Fontes de vocabulário em contexto de sala de aula 77 5.2.3. Aspetos a ter em conta no ensino de vocabulário 81 5.2.4. Apresentação e explicação de vocabulário 85 5.2.5. Aspetos que facilitam a memorização de vocabulário 89 5.2.6. Formas de promover a prática e a reciclagem de vocabulário 93

6. CONCLUSÃO 97

REFERÊNCIAS BIBLOGRÁFICAS 99

Page 7: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

7

1. INTRODUÇÃO

O presente Relatório, realizado ao abrigo da recomendação do Conselho de

Reitores das Universidades Portuguesas de janeiro de 2011, pretende ser o reflexo da

minha experiência profissional e de um trabalho de investigação no domínio do ensino de

inglês e alemão como línguas estrangeiras. Deste modo, considero importante começar

por fazer uma breve apresentação do meu percurso profissional até ao momento.

Após ter concluído a licenciatura em Línguas e Literaturas Modernas variante de

estudos ingleses e alemães – ramo educacional, a minha primeira experiência de trabalho

(excetuando o estágio pedagógico integrado) foi com crianças, no âmbito das Atividades

de Enriquecimento Curricular. Depois de ter dado aulas a adolescentes, durante o estágio,

e de ter obtido formação para o trabalho com alunos desta faixa etária, tive a necessidade

de me adaptar ao ensino de crianças e de procurar informação nesta área. Deste modo,

ingressei no curso Ensino de Inglês no 1º Ciclo do Ensino Básico organizado pelo

Departamento de Estudos Anglo-Americanos da Faculdade de Letras da Universidade do

Porto. Considero que esta formação foi de grande importância para a minha prática

profissional, uma vez que me possibilitou uma reflexão sobre o que deve ser o ensino

precoce de uma língua estrangeira, me deu acesso a um vastíssimo conjunto de materiais

adequados a crianças e me permitiu perceber algumas das especificidades do trabalho

com alunos desta idade. Depois de frequentar este curso, por estar em posse de

informação muito relevante respeitante a esta vertente do ensino de inglês, tornei-me

mais confiante no exercício das minhas funções, dentro e fora da sala de aula. Este curso

despertou ainda em mim a curiosidade e o desejo de aprender mais sobre o ensino

precoce de inglês, pelo que, mais tarde, decidi inscrever-me noutras ações de formação

relacionadas com o tema, das quais destaco o Curso de Gestão Curricular do Inglês no 1º

Ciclo do Ensino Básico, 3º e 4º anos e a ação Oxford Teacher’s Academy Principles and

Practices in Teaching Young Learners. Enquanto participante no projeto S.T.E.P.S. - UP

(Support for Teaching English in Primary Schools – Universidade do Porto) integrei um

Page 8: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

8

grupo de trabalho responsável pela determinação de critérios para a avaliação dos alunos

e pela construção de grelhas de observação e de avaliação, entre outras tarefas.

Paralelamente ao exercício das funções de professora de inglês a alunos do ensino

primário, fui exercendo as de formadora de inglês a adultos. Comecei por dar formações

em empresas e, mais tarde, abracei projetos de formação financiada, sob a forma de

cursos de Ensino e Formação de Adultos (EFA), unidades de formação de curta duração

(UFCDs) e processos de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências

(RVCC). O ensino a adultos obrigou a que, mais uma vez, tivesse de me adaptar a uma

faixa etária diferente da contemplada na minha formação de raiz. Neste caso, não

ingressei em qualquer ação de formação orientada para o ensino de adultos, fazendo

apenas uso do bom senso, das minhas experiências até então e dos conhecimentos que

adquiri durante o meu curso. Curiosamente, pude verificar que várias técnicas e

estratégias que aprendi para trabalhar com crianças e adolescentes eram perfeitamente

adaptáveis ao ensino de adultos.

Ciente de que é responsabilidade de qualquer professor manter-se atualizado,

desde que concluí a minha licenciatura, tenho procurado participar em ações de

formação, fóruns e congressos, nomeadamente nos organizados pela Associação

Portuguesa de Professores de Inglês. Para além disso, fruto da atribuição de uma Bolsa

Comenius, tive a oportunidade de participar no curso Drama Techniques for the English

Classroom, em Exeter, no Reino Unido. Esta experiência foi muito positiva do ponto de

vista linguístico, pedagógico e cultural, pois possibilitou o contacto e a partilha de

experiências com professores de várias nacionalidades e culturas. Esta curta estada no

Reino Unido fez-me ainda perceber que o ensino de inglês em Portugal não só está ao

nível da maioria dos outros países europeus, como, em alguns aspetos, é até superior.

Muito do que aprendi neste curso foi útil para o meu trabalho com adultos e com

adolescentes. Atualmente, são várias as exigências que se colocam a um professor de

língua estrangeira, nomeadamente no que diz respeito ao uso da língua para fins

específicos. Assim, para poder lecionar módulos de inglês comercial, senti a necessidade

de investir no estudo autónomo de Business English e de certificar esse conhecimento,

tendo-me submetido a um exame da Universidade de Cambridge e obtido o certificado

Business English Certificate Higher.

Page 9: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

9

Em 2009 voltei a lecionar inglês no 3º Ciclo do Ensino Básico e no Ensino

Secundário, numa escola pública, onde tive oportunidade de aplicar os conhecimentos

que adquiri na faculdade, bem como os que fui aprendendo pela experiência e nas várias

formações que frequentei. Trabalhei com alunos do 7.º ao 12.º anos de escolaridade,

inscritos no ensino regular, ensino profissional e Cursos de Educação e Formação (CEF)

e desempenhei ainda as funções de diretora de turma e tutora.

Tal como se pode constatar, a minha atividade profissional tem-se centrado

sobretudo no ensino de inglês. Infelizmente, não têm surgido muitas oportunidades para

lecionar alemão, pelo que a minha experiência no ensino desta língua se resume ao ano

de estágio e à preparação, a título particular, de uma aluna para exame.

A escolha do tema deste Relatório foi motivada não só pela consciência do papel

relevante do vocabulário para a comunicação em língua estrangeira, mas também pela

minha experiência profissional. A aprendizagem de uma língua tem como finalidade

máxima a comunicação. As palavras constituem o instrumento mais poderoso que temos

para comunicar com as outras pessoas, sendo essenciais à transmissão da maioria das

mensagens. Mais do que a gramática, é o vocabulário que nos permite verbalizar os

nossos pensamentos. Quando uma frase tem conteúdo, ainda que não esteja

gramaticalmente correta, a mensagem principal é, na maioria dos casos, compreensível.

Como afirma Wilkins, “Sem gramática muito pouco pode ser transmitido, sem

vocabulário nada pode ser transmitido.” (qtd. in Thornbury 13). 1 Deste modo, a

competência lexical assume um papel central no paradigma comunicativista. Ao longo da

prática docente, tenho-me deparado com alunos que revelam pouca propriedade lexical e

verificado que o vocabulário reduzido condiciona a progressão na língua. Textos de

relativa facilidade são considerados inacessíveis, pois os alunos têm muita dificuldade em

descodificar e produzir mensagens orais e escritas. Como poderão compreender um texto,

ou até mesmo utilizar estratégias que auxiliem a sua compreensão, quando a maioria das

palavras representa um obstáculo? Como refere Celce-Murcia, “... a não ser que uma

elevada percentagem de palavras numa página seja conhecida, é muito difícil inferir o

significado de novas palavras através do contexto.” (289).

1 Todas as traduções das citações feitas neste relatório são minhas, à exceção das relativas às obras de Bernardo, Feinstein, Piaget, Sternberg, Wolfe e Zenhas, que já se encontravam em português.

Page 10: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

10

Sempre tive a noção de que o vocabulário era importante, mas foi durante um

congresso de professores de inglês, ao ouvir a frase “Stop teaching reading and start

teaching vocabulary.”, proferida por Scott Thornbury, que mais fiquei convicta da

necessidade de atribuir um maior enfoque ao ensino do vocabulário. 2 Ainda que o todo

(o texto) seja mais do que a soma das partes (as palavras), apercebi-me de que não vale a

pena investir longas horas a treinar os alunos em estratégias para a interpretação de textos

que estão acima das suas capacidades, quando na realidade eles não sabem o mais

elementar – as palavras.

Tendo por base a minha experiência profissional com crianças, adolescentes e

adultos, na tentativa de melhorar a minha prática letiva coloquei a mim própria as

seguintes perguntas:

• Como aprendemos?

• Como aprendemos uma língua estrangeira? Quais os fatores que nos

influenciam?

• Como aprendemos vocabulário?

• Como devemos ensinar vocabulário? Quais as técnicas mais adequadas

para o ensino a crianças? Quais as mais apropriadas para adolescentes?

Quais as indicadas para adultos?

Este Relatório, que pretende dar respostas a estas questões, está dividido em

quatro capítulos. O primeiro capítulo é dedicado ao funcionamento do cérebro. Tem por

objetivo identificar as partes constituintes do cérebro e descrever as suas funções,

caracterizar de forma sucinta o cérebro da criança, do adolescente e do adulto e fazer uma

breve descrição dos vários tipos de memória, no sentido de perceber as implicações que

têm para a aprendizagem. São objeto de consideração no segundo capítulo as teorias da

aprendizagem que mais marcaram o ensino no último século, nomeadamente o

behaviorismo, o construtivismo, o construtivismo social e a teoria das inteligências

múltiplas. Farei um resumo dos princípios básicos que dão estrutura a cada uma destas

teorias e incluirei uma leitura pessoal sobre as mesmas. No terceiro capítulo, são

2 Esta frase, que poderá ser traduzida por “Parem de ensinar leitura e comecem a ensinar vocabulário”, foi proferida por Scott Thornbury a 1 de maio de 2010, durante a palestra Six things beginning with R no 24.º Congresso da Associação Portuguesa de Professores de Inglês.

Page 11: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

11

abordados os fatores que influenciam a aquisição de uma língua estrangeira. As

condições de aprendizagem são variáveis e determinadas por cada contexto específico,

pelo que, neste ponto, pretendo centrar-me sobretudo nas características dos aprendentes,

que mais influem na aprendizagem. Por último, o quarto capítulo foca a questão da

aquisição de vocabulário em língua estrangeira, do ponto de vista do aprendente e do

professor, dividindo-se por sua vez em dois subcapítulos. No primeiro, dedicado à

aprendizagem de vocabulário, lançarei um olhar sobre a forma como o nosso

conhecimento das palavras é organizado, armazenado e esquecido e indicarei estratégias

que o aprendente pode utilizar para adquirir vocabulário, de forma autónoma. No

segundo subcapítulo, que incide sobre o ensino de vocabulário, farei referência aos

critérios que o professor deve utilizar na seleção do mesmo, bem como às fontes a que

poderá recorrer em contexto de sala de aula. Indicarei ainda os aspetos relacionados com

a forma e o significado a ter em conta no ensino de vocabulário, e as maneiras de o

apresentar e explicar. Por fim, farei menção aos aspetos que facilitam a memorização de

vocabulário e às formas que o professor pode utilizar para promover a prática e a

reciclagem lexicais.

Ao longo do trabalho, vou refletindo sobre a minha experiência, indicando o que

considero mais relevante, sugerindo alterações a determinadas atividades, comentando as

implicações práticas de alguns aspetos que a teoria apresenta e perspetivando uma

melhoria da minha prática letiva. De modo a facilitar a leitura deste Relatório, optei por

destacar graficamente as minhas considerações pessoais, através da sua inserção em

caixas de texto sombreadas.

Page 12: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

12

2. O FUNCIONAMENTO DO CÉREBRO E A APRENDIZAGEM

Não será exagerado afirmar que aprendemos através de todo o nosso corpo, que

estabelecemos uma relação com o mundo através dos nossos sentidos. Estes são os canais

de entrada para toda a informação que nos rodeia. Há, no entanto, um órgão do corpo

humano que funciona como aglutinador das sensações que vamos experienciando, que

filtra os milhares de estímulos a que estamos constantemente sujeitos, que grava as

experiências relevantes, que comanda os nossos sentidos e que, desde sempre, despertou

grande curiosidade no Homem – o cérebro.

Sendo o cérebro o repositório do nosso conhecimento, perceber o seu

funcionamento pode trazer grandes contributos para as investigações em

ensino/aprendizagem. As recentes técnicas de neuroimagiologia funcional, tais como a

tomografia por emissão de positrões (positron emission tomography - PET) e a

ressonância magnética funcional (functional magnetic resonance imaging - fMRI), que

permitem perceber quais as áreas do cérebro que ficam ativas durante a execução de

tarefas, possibilitaram amplos desenvolvimentos no campo da Neurociência. Estes

avanços motivaram o aparecimento de uma nova área de estudo – a Neurociência

cognitiva – que pretende compreender o modo como o cérebro processa, armazena e

recupera informações e de que forma esses mecanismos têm influência no nosso

comportamento.

Não é objetivo deste capítulo aprofundar as questões da Neurociência, mas antes

descrever de forma sucinta a estrutura do cérebro e as funções associadas a cada uma das

suas partes, bem como os vários tipos de memória e suas implicações no processo de

ensino-aprendizagem. Haverá ainda lugar a uma breve caracterização do cérebro da

criança, do adolescente e do adulto.

Page 13: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

13

2.1. A estrutura do cérebro

O cérebro é o centro do sistema nervoso central, que é constituído por dois tipos

de células: neurónios e células gliais.3

São cerca de cem mil milhões os neurónios presentes no nosso cérebro e medula

espinal. Há diferentes tipos de neurónios e estes podem assumir formas diferentes,

podendo parecer-se com uma pirâmide ou com um coral gigante. Os neurónios têm a

capacidade de transmitir informação, “comunicando” uns com os outros e formando

redes por meio de sinais elétricos e químicos (Wolfe 22).

Conforme se pode verificar pela observação da figura 1, estas células são

constituídas por um corpo celular, núcleo, axónio e dendrites. O axónio é revestido por

uma substância denominada mielina, que favorece a transmissão dos impulsos. As

dendrites, por sua vez, contêm botões sinápticos (também conhecidos como terminais

3 As células gliais transportam nutrientes e regulam o sistema imunitário, entre outras funções (Politano & Paquin 11).

Figura 1 – A estrutura de um neurónio [Fonte: Feinstein 23]

Page 14: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

14

sinápticos). Como “comunicam”, então, os neurónios entre si? Blakemore e Frith

resumem de forma bastante clara o processo.

Tal como todas as outras células no corpo, os neurónios atuam como pequenas baterias.

Há uma diferença de voltagem (de cerca de um décimo de volt) entre o interior e o

exterior da célula, sendo o interior mais negativo. Quando um neurónio é ativado, dispara

um impulso, chamado potencial de ação. Neste momento, os iões de sódio entram através

dos poros na sua membrana, momentaneamente invertendo a voltagem da membrana. Isto

provoca a libertação de químicos (neurotransmissores) no terminal do axónio de um

neurónio. Estes químicos atravessam a fenda sináptica e são recebidos por recetores nas

dendrites de outro neurónio. (Blakemore & Frith 11-2)

A comunicação entre os neurónios envolve processos elétricos e químicos, sendo

estes últimos fruto da ação dos neurotransmissores. Existem três tipos de

neurotransmissores: os aminoácidos (glutamato, glicocola, aspartato e ácido

gamabutírico), as aminas (adrenalina, noradrenalina, dopamina, serotonina e acetilcolina)

e os péptidos (endorfinas, substância P, vasopressina e cortisona) (Wolfe 60).

Depois de muito sucintamente ter mostrado a constituição do neurónio e a forma

como os vários neurónios comunicam entre si, passarei agora a uma breve explicação da

estrutura do cérebro.

Figura 2 – A estrutura do cérebro

[Fonte: Feinstein 23]

Page 15: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

15

Como se pode perceber pela interpretação da figura, o cérebro está dividido em

quatro lobos: frontal, parietal, temporal e occipital. Na base do cérebro existe o cerebelo e

o tronco cerebral.

O cerebelo é responsável pela coordenação da função muscular, pelo equilíbrio e

pela postura do corpo. A capacidade que temos de praticar algumas atividades sem

esforço consciente, tais como escrever ou conduzir um carro, deve-se a esta parte do

cérebro. O tronco cerebral, também conhecido por cérebro reptiliano, controla as funções

autónomas, tais como a respiração e o ritmo cardíaco, que não estão sob controlo

consciente.

Por cima do tronco cerebral existem duas estruturas que não são visíveis na figura

atrás representada: o tálamo e o hipotálamo. O tálamo regula as funções vitais do corpo e

a perceção, funcionando como um agente intermédio que dirige o fluxo de informação

entre os órgãos dos sentidos (exceto a informação relativa ao olfato) e o córtex cerebral.

O hipotálamo controla as funções necessárias à homeostasia (capacidade de manter

constantes as condições fisiológicas) e os estímulos que induzem a fome e a sede. É

igualmente responsável pelas reações de resposta à tensão.

Próximo do tálamo e hipotálamo fica ainda a amígdala, não visível na imagem.

De acordo com Politano e Paquin, esta é a área do cérebro mais implicada no controlo da

emoção (20). A amígdala está também envolvida nas reações de resposta à tensão através

do mecanismo de “luta ou fuga”. Junto a esta estrutura, encontra-se o hipocampo, que

tem a função de assegurar a memória do passado imediato e de enviá-la para o córtex

cerebral, onde ficará armazenada na memória a longo prazo (Wolfe 28-34). Esta parte do

cérebro é ainda essencial para a memória espacial, ajudando-nos a recordar onde as

coisas estão ou a encontrar o caminho de casa (Blakemore & Frith 124).

O córtex cerebral, também chamado “massa cinzenta”, está dividido em quatro

lobos: lobos frontais, parietais, temporais e occipitais.

Os lobos frontais são responsáveis pelo processamento sensório-motor e também

por processos cognitivos, como por exemplo a tomada de decisões, o planeamento, a

reflexão e a resolução de problemas. É nesta parte do cérebro que fica a área de Broca.

Esta área fica situada perto do córtex motor, responsável pelo controlo da boca e dos

lábios, e possibilita a produção de linguagem. É aqui que ficam armazenados o

Page 16: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

16

vocabulário e a gramática. Em cerca de 95% da população esta área do cérebro está

situada no hemisfério esquerdo. Ligada à área de Broca por um feixe de fibras nervosas

está a área de Wernicke, que é igualmente importante no que diz respeito à linguagem.

Esta área está situada nos lobos temporais junto do córtex auditivo e é responsável pela

receção da linguagem e pela análise do significado das palavras (Feinstein 125; Wolfe

41-6; Blakemore & Frith 77-8). Estas duas estruturas do cérebro complementam-se, uma

vez que “... o cérebro tem primeiramente de juntar as palavras apropriadas na área de

Wernicke e libertá-las depois para a área de Broca, a fim de se fazer o seu transbordo

para o córtex motor que controla a produção de discurso.” (Feinstein 125).4

Os lobos parietais agregam o córtex somato-sensorial, que é “... a região primária

responsável por receber estímulos sensoriais.”, e controlam não só a consciência espacial

e a orientação, mas também a manutenção da concentração ou atenção espacial (Wolfe

42).

A principal função dos lobos temporais é fazer o processamento dos estímulos

auditivos, embora também estejam associados à linguagem e a alguns aspetos da

memória, sobretudo os relacionados com a memória auditiva.

Já os lobos occipitais têm a seu cargo o processamento dos estímulos visuais.

Quanto mais se estuda o cérebro, mais se percebe que, apesar de serem atribuídas funções

específicas a determinadas áreas do cérebro, estas nunca atuam sozinhas e dependem de

outras. Assim, no que diz respeito à visão há que ter em conta que

[p]rimeiro, a área de percepção visual permite a percepção do objecto actual. O córtex

visual comunica então com outros sistemas cerebrais para determinar que tipo de

informação visual armazenada anteriormente existe. Os estímulos visuais não se tornam

significativos até que as percepções sensoriais sejam relacionadas com associações

cognitivas previamente armazenadas. (Wolfe 39)

O cérebro humano está ainda dividido em dois hemisférios (esquerdo e direito),

que estão ligados pelo corpo caloso. 5 Tradicionalmente, são atribuídas funções

4 Curiosamente, segundo Slavkin, quando uma área é danificada a outra assume as suas funções (25). 5 O corpo caloso, que é composto por cerca de 250 milhões de axónios, permite a troca de informação entre os dois hemisférios (Politano & Paquin 8).

Page 17: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

17

específicas a cada um dos hemisférios cerebrais. Assim, o hemisfério esquerdo, que

comanda o lado direito do corpo, processa o texto e as informações mais positivas e

optimistas. Dá estrutura e ordem aos pensamentos e processa a sequenciação lógica e as

interpretações literais (Politano & Paquin 7). Por sua vez, o hemisfério direito, que

comanda o lado esquerdo do corpo, fornece o contexto e processa as emoções mais

positivas. No entanto, é importante referir que os dois hemisférios trabalham em

conjunto. Para percebermos uma mensagem precisamos do texto, fornecido pelo

hemisfério esquerdo, bem como do contexto, que nos é dado pelo hemisfério direito. É

contudo interessante observar, como nos explica Wolfe, que “[a]s especializações de cada

hemisfério desenvolvem-se ao máximo, quando informadas pelo hemisfério oposto” (51).

Tal afirmação permite corroborar a ideia de que, em contexto de sala de aula, as

atividades devem ser bastante diversificadas, a fim de potenciarmos todas as capacidades

dos alunos. No caso particular das línguas, mas não só, perceber o funcionamento dos

dois hemisférios cerebrais reitera a necessidade de se fornecer sempre um contexto àquilo

que se está a ensinar.

2.2. Os vários tipos de memória

É impossível falar de aprendizagem, sem se falar em memória. Sabemos que

aprendemos algo, quando podemos recuperar essa informação da memória. Sabemos

também que há memórias que têm uma duração reduzida e outras que parecem ser

permanentes. Memorizamos toda a informação da mesma forma? O que nos leva a

memorizar facilmente algumas informações e a reter outras com dificuldade? Neste

subcapítulo tratarei destas questões, fazendo uma breve descrição dos vários tipos de

memória e dos fatores que influenciam a nossa atenção.

A figura abaixo apresentada representa um modelo de processamento de

informação que pretende, de forma simplificada, esquematizar os vários tipos de

memória e a relação entre eles. Por ser uma esquema simplificado, pode ficar-se com a

ideia de que os vários tipos de memória são sistemas autónomos e separados, pelo que

Page 18: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

18

convém salientar que as “várias memórias” estão relacionadas entre si e dependem umas

das outras.

2.2.1. A memória sensorial

O nosso contacto com o mundo estabelece-se, em primeiro lugar, através dos

sentidos: são eles a nossa porta aberta para a realidade. Somos constantemente

“bombardeados” por milhares de estímulos que são captados pelos nossos sentidos, mas o

que acontece depois de percecionarmos um estímulo?

Após a perceção, esse estímulo fica armazenado na memória sensorial por uma

fração de segundo até que se decida se o descartamos ou se focamos a nossa atenção nele.

A memória sensorial funciona como um armazém temporário de perceções, mas também

Audição

Visão

Olfacto

Paladar

Tacto

Memória sensorial

Memória de

funcionamento

Memória de

Longo prazo

Repetição

Processamento inicial

Retenção

Elaboração e

organização

Declarativa Processual

Não transferida para o estágio seguinte e portanto esquecida

receptores

Figura 3 – Modelo de processamento da informação [Fonte: Wolfe 75]

Page 19: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

19

como um filtro que rejeita aquelas às quais não se atribui significado. Sem um filtro deste

tipo viveríamos constantemente sob uma esgotante tempestade de estímulos.

Mas por que é que alguns estímulos são rejeitados e outros não? O que dita este

processo de seleção?

Quando percecionamos algo, o nosso cérebro cruza a informação obtida por essa

perceção com informação pré-existente, ou seja, confirma “... se a informação nova é

algo que ativa uma rede neuronal previamente armazenada.” (Wolfe 79). Este processo é

denominado reconhecimento-padrão. Enquanto agentes no processo de ensino-

aprendizagem é de extrema importância que percebamos este processo e, sobretudo, que

reconheçamos a necessidade de haver uma relação entre a informação nova e o pré-

conhecimento dos alunos. É fundamental que as informações transmitidas aos alunos

possam encontrar um ponto de ancoragem nas suas redes neuronais já entretanto criadas.

Deste modo, facilmente se reconhece o interesse em ativar os pré-conhecimentos dos

alunos antes de iniciar um tema, seja através de brainstorming ou de outras técnicas, pois

ao fazê-lo aumentamos as hipóteses de a nova informação ser apreendida.

Segundo Wolfe, o reconhecimento-padrão é um aspeto que influencia a atenção,

bem como a intensidade do estímulo, o movimento e a novidade (79-81).

Quanto mais intenso for o estímulo, mais capta a nossa atenção. Não é por acaso

que nos intervalos de programas televisivos, durante o período reservado à publicidade,

notamos que o volume aumenta. Não há nada de errado com os nossos televisores, é

apenas uma estratégia a que o marketing recorre para captar a nossa atenção. Assim, em

contexto de sala de aula, aumentar o volume da voz, de quando em vez, pode servir para

direcionar a atenção do aluno para o discurso do professor. Dependendo do propósito da

atividade, utilizar materiais que contemplem um jogo de cores pode ser uma forma de

convocar a atenção dos alunos.

O movimento é outro fator que tem influência sobre a atenção, e os publicitários

sabem bem disso. Não é por acaso que utilizam placards publicitários eletrónicos que

permitem a inclusão de imagens em movimento ou que os reclames luminosos

normalmente têm luzes que piscam. Atitudes muito simples como circular pela sala de

aula e não assumir sempre a mesma posição, utilizar mímica para explicar vocábulos,

Page 20: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

20

usar apresentações PowerPoint que contenham animações e mostrar vídeos podem

contribuir de forma positiva para a atenção dos alunos.

A novidade é igualmente importante. Prestamos atenção ao que é novo, invulgar

ou inesperado. Se passamos diariamente por um quadro de notas, onde se afixam sempre

papéis brancos, deixamos de prestar atenção a esses papéis, mas se, por algum motivo, lá

for colocado um papel verde, esse facto captará a nossa atenção, porque é um elemento

de novidade. No entanto, se passarem a ser afixados papéis verdes com regularidade, com

o tempo, deixaremos de lhes prestar atenção. Isto deve-se à tendência que o cérebro tem

para a habituação: quando se habitua muito a um estímulo, acaba por ignorá-lo. A

novidade pode ser um elemento muito enriquecedor de uma aula.

Uma atividade de pré-leitura do género de The Surprise Package*,

por ser inesperada, invulgar e suscitar curiosidade, pode ser muito

motivadora e despertar a atenção dos alunos.

O professor deverá escolher um objeto que esteja relacionado com o

texto a trabalhar, embrulhá-lo, levá-lo para a aula e fazer de conta que

alguém deixou o pacote para si na sala dos professores. À medida que o

pacote é desembrulhado, o professor deverá ir mostrando surpresa e fazendo

com que os alunos tentem adivinhar o que é. Depois de revelado o objeto,

os alunos deverão ir especulando sobre ele e, por fim, o professor deverá

relacioná-lo com o texto a trabalhar. Esta atividade pode, de facto, criar um

grande impacto e concentrar a atenção dos alunos.

Já utilizei uma versão adaptada desta atividade sugerida por Natalie

Hess, não com o objetivo de preparar a leitura de um texto, mas sim para

explicar o significado de duas expressões: melting pot e salad bowl.

Coloquei numa caixa uma saladeira e uma panela antiga em ferro,

embrulhei-a e pedi a uma funcionária que fosse levá-la à sala, dizendo que

alguém tinha deixado aquele pacote para mim na receção. Os alunos

ficaram muito curiosos e envolveram-se na situação. Depois de perceberem

a função de cada um dos objetos, não foi difícil estabelecerem um paralelo

com dois tipos diferentes de sociedade e assimilar os conceitos. O elemento

novidade direcionou a atenção dos alunos e foi determinante na

concretização do principal objetivo da aula.

A atividade descrita resultou porque foi utilizada apenas uma vez.

Page 21: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

21

Até aqui têm sido abordadas as formas de influenciar a apresentação inicial de

estímulos aos recetores sensoriais, mas, segundo Wolfe, existem dois fatores que têm não

só influência na capacidade de o cérebro prestar atenção à informação que chega através

dos sentidos, mas também de a manter: o significado e a emoção (81).

Para que consigamos manter a nossa atenção em determinada informação é

necessário que esta, de alguma maneira, tenha algum significado para nós e se relacione

com conhecimentos que já temos. É necessário que circuitos neuronais já existentes

possam ser reativados. Dar significado à informação faz com que esta seja mais

facilmente aprendida. Feinstein diz mesmo que “[a] busca de significado é inata: o

cérebro floresce na presença de significado e antipatiza com o que é fortuito.” (165). O

nosso cérebro constrói significado através de padrões, relevância e emoções. A

relevância, por sua vez, é construída através do estabelecimento de conexões entre as

experiências e as redes neuronais previamente formadas (Politano & Paquin 21).

Que sentido atribuirá um aluno a um texto no qual a maioria das palavras

representam um obstáculo? Que significado tem uma explicação sobre a formação da voz

a função de cada um dos objetos, não foi difícil estabelecerem um paralelo

com dois tipos diferentes de sociedade e assimilar os conceitos. O elemento

novidade direcionou a atenção dos alunos e foi determinante na concretização

do principal objetivo da aula.

A atividade descrita resultou porque foi utilizada apenas uma vez. Se

voltasse a usar a mesma estratégia com a mesma turma, já não teria o mesmo

impacto, pois, conforme já foi referido anteriormente, o cérebro tende para a

habituação. Introduzir elementos de novidade de forma constante nas aulas

pode ser uma sobrecarga para o professor.

_________________________

* Atividade sugerida no livro Headstarts: one hundred original pre-text activities de Natalie

Hess (pág. 26).

Page 22: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

22

passiva para alguém que não conhece as mais elementares funções sintáticas? Não será a

incapacidade de estabelecer uma relação com o que está a ser lecionado um dos motivos

para o desinteresse dos alunos?

Quando percecionamos um estímulo, a informação é enviada para o tálamo e

daqui para o córtex e para a amígdala. A amígdala, como já vimos, controla a emoção e o

mecanismo de “luta ou fuga”. Segundo Joseph LeDoux, a via tálamo-córtex é mais longa

do que a via tálamo-amígdala (Wolfe 85). Isto explica a razão por que muitas vezes a

reação emocional antecede a razão e a importância da emoção para a atenção. Se a

emoção causada for negativa, o indivíduo “luta ou foge”. Se, pelo contrário, a emoção for

positiva, o sujeito persevera no estímulo e mantém a sua atenção. Há ainda a registar o

facto de que as emoções ativam a ação de químicos que podem favorecer ou inibir a

comunicação entre células (Politano & Paquin 20).

2.2.2. A memória de funcionamento

A memória de funcionamento (também conhecida como memória de trabalho ou

memória de curto prazo) “... permite a integração de informação perceptual nova com o

conhecimento armazenado, permitindo também manipular a informação consciente

(pensar num assunto, falar sobre ele e repetir estas acções), de modo a assegurar o

armazenamento da informação em memória de longo prazo.” (Wolfe 89). Alguma da

informação que recebemos nunca transita para a memória de longo prazo, porque é

necessária apenas temporariamente, num curto espaço de tempo. Por exemplo,

frequentemente memorizamos um número de telefone apenas o tempo suficiente para

pegarmos num telefone e o marcarmos.

A capacidade deste tipo de memória é limitada, uma vez que só consegue

processar sete pedaços de informação de cada vez, ficando estes armazenados de 15 a 20

segundos (Blakemore & Frith 152). O número de itens que conseguimos memorizar varia

de acordo com a idade. Uma criança de sete anos, por exemplo, lembra-se, em média, de

três itens. A capacidade normal adulta (sete itens) só é alcançada por volta dos quinze

Page 23: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

23

anos (Wolfe 95). Assim sendo, enquanto professores temos de adaptar as nossas

exigências de memorização à idade dos alunos com que trabalhamos. No caso do ensino

de vocabulário há que ter em conta o número de palavras que pretendemos trabalhar com

os alunos.6

Uma das formas de ultrapassarmos as limitações deste tipo de memória é através

da organização da informação em unidades significativas. Pensemos no caso dos números

de telefone: não memorizamos um a um cada um dos nove dígitos. Agrupamo-los em

unidades significativas de três ou dois algarismos (Wolfe 96).

A limitação relativa à duração da informação na memória de funcionamento pode

também ser ultrapassada através da repetição. Wolfe faz referência a dois processos de

repetição: a repetição rotineira e a repetição elaborativa (98, 99).

A repetição rotineira consiste em repetir muitas vezes a informação ou ação.

Quando, por exemplo, nos pedem para memorizarmos uma matrícula, repetimo-la várias

vezes até encontrarmos forma de a anotar. Conseguimos escrever no computador sem

olhar para o teclado ou tocar uma canção sem olhar para o piano porque repetimos a ação

6 Ver subcapítulo “O ensino de vocabulário”.

Em língua inglesa, ao ensinar a ordem dos adjetivos na frase, somos

demasiado ambiciosos se esperamos que os nossos alunos memorizem pela ordem

certa as categorias opinion, size, age, shape, colour, origin, material e purpose.

Porém, se lhes explicarmos o acrónimo OSASCOMP a tarefa será muito mais

simples. Do mesmo modo, em alemão, a memorização da ordem dos adverbiais na

frase é mais fácil, quando se faz uso da mnemónica TeKaMoLo (temporal, kausal,

modal, lokal). Dar vários exemplos de associações em unidades significativas e

fazer com que os alunos percebam a sua utilidade pode motivar neles o desejo de

começarem a estabelecer as suas próprias unidades significativas, que serão muito

mais eficazes do que quaisquer outras que lhes possamos fornecer.

Page 24: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

24

muitas vezes. Este tipo de repetição é especialmente eficaz para a aprendizagem de um

procedimento. No ensino das línguas a repetição rotineira corresponde ao rote learning.

A repetição elaborativa contempla uma variedade de estratégias que “...

encorajam o aluno a elaborar a informação de modo a aumentar o entendimento e a

retenção daquela informação.” (Wolfe 99). Repetir uma lista de palavras pode servir

alguns propósitos, mas na maioria das vezes revela-se uma atividade estéril, pois o

significado pode ficar comprometido. No entanto, se pegarmos nas palavras que

queremos memorizar e as inserirmos em frases que as contextualizem, ao repetirmos as

frases temos um duplo benefício: memorizamos as palavras e assimilamos o seu

significado.

Quando associamos emoção a um evento que gravamos na memória, este é

recordado com mais vivacidade, como referem Politano & Paquin “[q]uanto mais forte

for a emoção associada a uma experiência, mais forte será a memória dessa experiência”,

pelo que os professores não podem descurar a dimensão da emoção nas suas aulas (20).

Wolfe sugere atividades como simulações e dramatizações, resolução de problemas da

vida real e visitas de estudo, uma vez que estas envolvem mais os alunos, aumentando as

conexões emocionais e o significado dos conteúdos.

2.2.3. A memória a longo prazo

A memória a longo prazo divide-se em duas subcategorias: memória processual

(ou não declarativa) e memória declarativa.

A memória processual, também designada “... memória muscular, memória

corporal, memória motora ou memória cinestésica. (...) armazena os processos que o

corpo executa e recorda de forma involuntária e automática.” (Feinstein 323). Depois de

treinarmos muito e repetirmos várias vezes estas ações, conduzimos um carro ou

andamos de bicicleta de forma automática, sem estarmos conscientemente a pensar no

processo. Falamos, portanto, de capacidades, no modo de fazer as coisas.

Page 25: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

25

A memória declarativa, ou consciente, constitui a capacidade que temos para

armazenar e recordar informação que pode ser declarada, ou seja, que pode ser expressa

através da escrita ou da fala. Este tipo de memória subdivide-se em memória episódica e

memória semântica.

A memória episódica, ou memória de localização, “... armazena informações

espaciais e temporais que categorizam alturas e locais particulares em que ocorreram os

acontecimentos.” (Feinstein 320). A quem não acontece a experiência de ouvir uma

canção e recordar de imediato a situação e o local onde a ouviu pela primeira vez? É

como se, através de um processo de visualização, fossemos transportados para a situação

e o local onde esta decorreu.

A educação pode tirar partido da memória episódica através da criação de

ambientes de sala de aula atrativos. É óbvio que tal está dependente das condições que

cada escola oferece.

A memória semântica processa palavras, factos, imagens, histórias e texto. Trata,

portanto, do tipo de conhecimento que, por norma, a escola privilegia.

De acordo com a minha experiência profissional, criar ambientes de

sala de aula atrativos com recurso ao uso de cartazes e outros materiais é mais

fácil nas escolas do primeiro ciclo, porque os alunos têm todas as aulas na

mesma sala ou, então, porque têm todos as aulas de inglês na mesma sala. Os

materiais afixados podem inclusivamente ser da autoria dos alunos ou serem

realizados com a sua participação, intensificando-se deste modo o sentimento

de pertença, que é tão importante na aprendizagem. Numa escola secundária

esta tarefa é mais complicada, uma vez que os alunos não têm aulas sempre na

mesma sala. No caso do ensino de adultos também não é fácil decorar as salas,

porque também não estão sempre no mesmo local e porque, quando a

formação é ministrada em empresas, normalmente as aulas são em salas de

reunião, onde o professor não pode afixar materiais.

Page 26: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

26

É necessário ter em conta que, mesmo depois de determinada informação ter sido

memorizada, tem de passar algum tempo, de forma a que o traçado da memória fique

completamente estabelecido ou organizado no cérebro. Este tempo de definição de forma

ou de reconhecimento chama-se período de consolidação (Wolfe 121). Se, depois de ter

sido ensinado determinado assunto, se passar imediatamente para outro, o processo de

consolidação vai ser interrompido. É necessário que se reflita sobre isto, pois, às vezes,

com a preocupação de cumprirem o programa, os professores acabam por lecionar vários

temas seguidos sem grande intervalo entre eles. Não há dados que nos permitam dizer

quanto tempo dura o período de consolidação, mas sabe-se que este pode ser

intensificado através da repetição. Isto é particularmente relevante no que diz respeito ao

ensino de vocabulário. Para que possamos auxiliar os alunos no processo de consolidação

de determinados itens lexicais, temos de criar condições para que possam

recorrentemente encontrar essas palavras.

2.3. O desenvolvimento do cérebro

As estruturas que constituem o nosso cérebro não se desenvolvem todas ao

mesmo tempo. O cérebro de uma criança não é igual ao de um adulto.

No presente subcapítulo farei uma breve caracterização do cérebro da criança, do

adolescente e do adulto, no sentido de se perceber as implicações que cada fase de

desenvolvimento poderá ter para o processo de ensino-aprendizagem.

2.3.1. O cérebro da criança

Antes de iniciar a abordagem deste assunto é importante referir que as

investigações cerebrais em crianças, sobretudo na segunda infância, são escassas, pelo

que não se encontra muita informação disponível. Centrar-me-ei no desenvolvimento do

Page 27: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

27

cérebro da criança durante a segunda infância (período que tem início aos 3 anos e se

prolonga até aos 8), pelo facto de coincidir com a altura em que normalmente as crianças

começam a aprender uma segunda língua. Durante este período, há um grande

desenvolvimento das conexões neuronais e os processos de mielinização e poda

intensificam-se nas estruturas corticais, o que contribui para um raciocínio mais rápido

(Feinstein 413).

Depois dos três anos as crianças lembram-se melhor de episódios ou

acontecimentos específicos e da forma como ocorreram (Blakemore & Frith 147). Assim,

enquanto educadores podemos começar a tirar partido da sua memória episódica. Uma

forma de o fazermos é através da criação de ambientes de sala de aula apelativos e de

situações de aprendizagem variadas que impliquem emoções agradáveis. Os jogos, as

histórias e as canções são exemplos de atividades que podem cumprir este objetivo.

Apesar de o tamanho do corpo caloso aumentar, nesta altura há ainda uma grande

plasticidade cerebral, pelo que, para terem a oportunidade de treinar todas as suas

capacidades, deve ser proporcionada às crianças a interação com experiências ambientais

ricas e variadas. O ambiente parece ser um fator preponderante no desenvolvimento do

cérebro, chegando mesmo Blakemore e Frith a afirmar que “Uma característica

fundamental do desenvolvimento cerebral é que as experiências ambientais são tão

importantes quanto os programas genéticos” (32).7

O córtex motor que controla a motricidade fina, a coordenação mão-dedo, só está

completamente desenvolvido por volta dos 5 anos e é preciso ter em conta que este

desenvolvimento normalmente é mais lento nos rapazes do que nas raparigas (Blakemore

& Frith 22-3). Enquanto professores de alunos desta faixa etária e até mais novos,

devemos estar conscientes das limitações que a fisiologia impõe e ser cautelosos com as

nossas exigências, pois podemos estar a exigir mais à criança do que aquilo que ela é

capaz no momento e isso pode criar sentimentos de frustração, que podem condicionar as

aprendizagens futuras. Não nos devemos esquecer de que, na maior parte dos casos,

somos o primeiro contacto que a criança tem com a língua inglesa ou alemã. Um bom

7 Segundo Slavkin, o cérebro modifica-se à medida que o sujeito interage com o ambiente, podendo as alterações ser inclusivamente ao nível da estrutura física do cérebro (17).

Page 28: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

28

começo pode ditar atitudes positivas perante a língua, enquanto o inverso também pode

ser verdadeiro.

Por volta dos 6 ou 7 anos, as crianças já têm um melhor controlo sobre o foco da

sua atenção, o que significa que já podem ser confrontadas com atividades de atenção

concentrada, o que não é possível com crianças mais novas. Não é de estranhar que seja

esta a idade em que o ensino primário começa. É ainda durante a segunda infância que

“... as crianças adquirem a capacidade de compreenderem que as outras pessoas podem

pensar de forma diferente delas.” (Feinstein 413), ainda que não consigam assumir

diferentes perspetivas.

2.3.2. O cérebro do adolescente

A adolescência é caracterizada por grandes mudanças, o corpo transforma-se de

forma intensa e o cérebro não é exceção. Durante este período ocorrem grandes

alterações físicas no cérebro, sobretudo nos lobos frontais, que são os últimos a

desenvolver-se. Esta área do cérebro é responsável pela ação voluntária, pelo pensamento

abstrato, pela capacidade de planear, fazer duas coisas ao mesmo tempo e inibir

comportamentos inadequados, pela possibilidade de considerar visões diferentes e

antecipar consequências. A insensatez que, por vezes, caracteriza a adolescência pode

dever-se ao facto de os lobos frontais ainda não estarem suficientemente maduros, pelo

que o adolescente é levado a agir baseado na emoção, não sofrendo a moderação da razão

(Feinstein 173; Blakemore & Frith 113).

Como já foi referido anteriormente, a emoção é fortemente controlada pela

amígdala, pelo que é interessante constatar que “... o cérebro adolescente tem níveis de

atividade duas vezes superiores aos do adulto em todas as regiões e ainda maiores na

amígdala.” (Feinstein 181). Assim sendo, não é de estranhar que os adolescentes reajam

de forma mais emocional e impulsiva.

Por volta dos 11/12 anos, no início da adolescência, há uma grande produção de

dendrites e sinapses, ou seja, de substância cinzenta. Depois da puberdade verifica-se um

Page 29: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

29

aumento na massa branca (white matter) no córtex frontal, que se deve ao processo de

mielinização.8 Depois do período pubertário há também uma diminuição da densidade

sináptica no córtex frontal, que resulta da poda sináptica que continuará durante a

adolescência. Isto leva-nos a crer que o aperfeiçoamento dos processos cognitivos nos

lobos frontais só acontece na adolescência. (Blakemore & Firth 113-4).

O cérebro humano rege-se pelo princípio use it or lose it! Assim, as ligações

neuronais ativas persistem, as outras perdem-se. Aquilo que os adolescentes

experienciam tem um papel muito importante na determinação de quais as conexões

neuronais que sobrevivem (Crawford 12). Se tivermos este aspeto em mente, percebemos

de forma ainda mais clara a grande responsabilidade que, enquanto educadores, temos na

formação dos jovens. Os professores, no âmbito da sua prática letiva, ao escolherem a

frequência com que abordam determinados assuntos, podem influenciar a ativação de

ligações neuronais. Isto é particularmente relevante no que diz respeito ao ensino de

vocabulário. Devemos proporcionar aos nossos alunos várias oportunidades para

contactarem com os vocábulos, de forma a que as ligações neuronais responsáveis pela

retenção desse léxico se mantenham ativas, caso contrário elas poderão perder-se.

A partir dos 15/16 anos a ação dos centros emocionais passa a sofrer a influência

moderadora dos lobos frontais. Por volta desta idade os adolescentes começam a reagir

fazendo uso da razão, deixando gradualmente de lado as reações viscerais ditadas pela

amígdala. Passam a ser capazes de controlar os impulsos e de adiar a gratificação.

(Feinstein 173; Blakemore & Frith 113). De facto, nota-se uma grande diferença entre os

alunos desta faixa etária que normalmente frequentam o 10.º ou o 11.º ano e os alunos

mais novos dos 7.º e 8.º anos. O comportamento dos alunos mais velhos é geralmente

mais moderado, pois estes são capazes de inibir algumas reações, fazendo uma avaliação

racional das consequências que estas possam acarretar. Para além disso, os adolescentes

desta faixa etária já são capazes de fazer o exercício de assumirem perspetivas diferentes

sobre um mesmo assunto. Os professores podem tirar partido desta capacidade, trazendo

debates para as suas aulas. O debate obriga o aluno a argumentar e contra-argumentar e

8 A mielina é uma substância gorda de aparência esbranquiçada que aumenta a velocidade de transmissão de impulsos elétricos entre neurónios, isto é, torna a transferência de informação mais eficiente.

Page 30: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

30

esta tarefa é facilitada pelo centro de controlo executivo que se está a desenvolver neste

período – o córtex frontal.

2.3.3. O cérebro do adulto

É só no fim da adolescência, princípio da idade adulta, que os lobos frontais

atingem o seu estádio final de desenvolvimento. A maturação desta área do cérebro faz

com que a pessoa seja capaz de refletir, tomar decisões, resolver problemas e direcionar a

atenção (Wolfe 43). Não é apenas o cérebro da criança que é maleável, o cérebro adulto

também o é. A plasticidade do cérebro consiste na “... capacidade de se adaptar a

circunstâncias variáveis e adquirir nova informação.” (Blakemore & Frith 123). Na

verdade, o cérebro adulto é capaz de se reorganizar quando é exposto a novos ambientes

de aprendizagem (Feinstein 388). A capacidade de se adaptar continuamente às

circunstâncias geralmente só diminui em idades avançadas.

Ao contrário do que se acreditou durante muito tempo, novas células podem

crescer e dividir-se no cérebro adulto (Blakemore & Frith 134). Segundo Feinstein, o

cérebro desenvolve-se mais quanto mais novidade e desafio estiverem presentes na

estimulação e quanto mais o cérebro se empenhar ativamente nas aprendizagens (388).

Para que os adultos se possam empenhar na aprendizagem, devemos escolher atividades

que despertem o seu interesse e atenção e que permitam o estabelecimento de pontos de

diálogo com as suas experiências pessoais.

Apesar de novas células poderem crescer no cérebro adulto, este sofre algumas

alterações físicas com a idade. Há um declínio da memória a curto prazo à medida que o

adulto envelhece. A partir dos 40 anos o peso cerebral começa a diminuir e as áreas do

cérebro que são mais afetadas estão relacionadas com a memória. Por volta dos 50 anos a

memória (especialmente a auditiva e a visual) continua a ser afetada e as pessoas têm

mais dificuldade em realizar duas tarefas em simultâneo. Aos 60 anos a capacidade de o

adulto se concentrar e memorizar novos factos encontra-se afetada. Por volta dos 70 anos

a amígdala e o hipocampo, responsáveis pelo armazenamento de memórias de curto

Page 31: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

31

prazo, terão encolhido 25% (Feinstein 390-1). Quem convive com pessoas idosas está

habituado a que estas relatem situações de infância com grande detalhe e clareza, mas

que sejam frequentemente incapazes de responder a perguntas simples como “O que foi o

almoço?”. Estas situações demonstram como a memória a curto prazo é mais afetada pela

idade do que a memória a longo prazo. A bainha de mielina nas regiões que constituem o

sistema límbico (amígdala, hipocampo e tálamo, entre outros) vai diminuindo, o que,

consequentemente, leva a um decréscimo na velocidade de transmissão de impulsos entre

os neurónios, ou seja, leva a um decréscimo no processamento de informação (Feinstein

391).

Sabendo, porém, que o cérebro adulto também é plástico e, portanto, capaz de se

adaptar às novas experiências, quem trabalha no ensino de adultos não deve ignorar as

limitações que advêm com a idade. Estar consciente disto permite ao professor/formador

adequar de forma mais eficaz o ritmo de ensino.

2.4. Períodos sensíveis

A questão dos períodos sensíveis tem gerado muita investigação e entusiasmado

os interessados em educação. Perceber qual a altura ideal para se ensinar determinados

Ao longo da minha experiência no trabalho com adultos, pude ir

constatando que estes são normalmente alunos muito motivados e empenhados,

mas que facilmente desmotivam quando se sentem frustrados. Muitas vezes a

frustração resulta de um desequilíbrio entre o ritmo de ensino e o ritmo de

aprendizagem. Sentir-se que não se é capaz de acompanhar o ritmo pode

também ser gerador de stress. O stress, por sua vez, provoca a libertação de

cortisol que, em níveis excessivos, interfere com a função dos

neurotransmissores e, por conseguinte, com a velocidade sináptica (Feinstein

390).

Page 32: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

32

conceitos ou determinadas competências seria encontrar a galinha dos ovos de ouro na

educação.

Os períodos sensíveis constituem períodos durante os quais o cérebro necessita de

determinados estímulos ambientais para que se possa desenvolver normalmente. Estão

relacionados com a especialização e aperfeiçoamento das várias regiões do cérebro e são

intrínsecos ao processo de estruturação do cérebro.

Quando contactamos com literatura da especialidade somos frequentemente

confrontados com o termo período crítico. Apesar de Blakemore e Frith nos explicarem

que, nos nossos dias, a maioria dos neurocientistas prefere o termo período sensível a

período crítico, porque estes períodos não são rígidos e inflexíveis mas antes alturas que

se caracterizam por “... mudanças subtis na capacidade do cérebro ser moldado e

modificado pelas experiências que ocorrem durante a vida”, há autores que fazem

distinções entre os dois conceitos (26).9

À parte os preciosismos terminológicos, o que é evidente é que, de facto, existem

períodos sensíveis no desenvolvimento do cérebro. Um dos estudos mais famosos nesta

área foi o realizado por Wiesel e Hubel na década de 60. Estes investigadores

coordenaram uma experiência com gatos recém-nascidos que provou a existência de um

período sensível para o desenvolvimento do córtex visual. Os gatos que ficaram privados

de visão num dos olhos, por este ter sido tapado, ficaram com as conexões neuronais

fortemente deterioradas nas áreas do cérebro responsáveis pela visão, e chegaram,

inclusivamente, a cegar. A mesma experiência foi feita com gatos crescidos, tendo-se

verificado que os efeitos foram muito menos gravosos do que nos recém nascidos e que a

capacidade de usarem o olho que havia sido tapado não ficou comprometida (Blakemore

& Frith 25). No entanto, outros estudos demonstraram que mesmo que um sujeito seja

privado de determinados estímulos durante um período considerado sensível, é possível

que “... estimulação e treino de remediação numa idade mais tardia possam conduzir a

um certo nível de recuperação na área do cérebro correspondente”, ainda que as

9 Para Knudsen, o termo período sensível é um termo lato que se aplica aos momentos em que “... os efeitos da experiência no cérebro são extraordinariamente fortes durante um período limitado do desenvolvimento”, enquanto que os períodos críticos são uma espécie de subclasse dos períodos sensíveis e podem resultar em mudanças irreversíveis no funcionamento do cérebro (1412).

Page 33: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

33

competências adquiridas após o período sensível possam ser ligeiramente diferentes

(Blakemore & Frith 26).

No âmbito da temática relativa aos períodos sensíveis importa reter o seguinte: 1)

existem períodos sensíveis no desenvolvimento do cérebro; 2) a privação durante os

períodos sensíveis tem consequências negativas; 3) o desenvolvimento e a aprendizagem

(a recuperação) são possíveis depois do período sensível; 4) a aprendizagem feita após o

período sensível pode basear-se em estratégias diferentes das utilizadas durante a

aprendizagem que ocorre dentro de um período sensível.

Page 34: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

34

3. TEORIAS DA APRENDIZAGEM

O desejo de perceber a forma como se aprende tem estado na origem de várias

teorias da aprendizagem.

No presente capítulo pretendo fazer um resumo dos princípios que subjazem às

correntes que mais influenciaram o ensino e fazer uma leitura pessoal de cada uma delas,

refletindo sobre a influência que exercem na minha prática profissional.

3.1. O Behaviorismo

O behaviorismo, ou comportamentalismo, como também ficou conhecido, surgiu

como uma reação à psicologia introspectiva dos finais do século XIX, princípios do

século XX. Behavioristas como Watson e Skinner consideravam os métodos

introspectivos subjetivos e difíceis de quantificar e acreditavam que as teorias científicas

deviam usar indicadores observáveis. Sendo impossível perceber ao certo o que se

passava na mente humana, os psicólogos deviam observar os comportamentos resultantes

de estados mentais (Arthur 47-8).

Para os behavioristas, o conhecimento é um reportório de comportamentos, um

conjunto de respostas mecânicas a estímulos ambientais. Skinner afirma mesmo que “...

conhecimento é ação, ou pelo menos regras para a ação...” (qtd. in Arthur 48). Partindo

deste princípio poder-se-ia dizer que se conhece algo quando isso processa um reportório

adequado de comportamentos. Neste sentido, o propósito da educação é oferecer ao

aprendente um reportório de respostas comportamentais adequado a estímulos

específicos.

O reforço positivo tem um papel preponderante, uma vez que torna a experiência

agradável. As experiências agradáveis fazem com que o aprendente associe estímulos

específicos a repostas adequadas. Comportamentos que não recebem feedback positivo

Page 35: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

35

acabam por desaparecer (Arthur 49). De acordo com esta teoria, a motivação é, portanto,

extrínseca, uma vez que assenta na questão do reforço.

Os métodos de ensino baseados no comportamentalismo recaíam muito em

exercícios do tipo skill and drill e em sequências de pergunta e resposta com um grau de

dificuldade gradativo. Havia ainda um grande recurso ao reforço positivo, que podia

consistir em elogio verbal, boas notas e prémios.

No caso das línguas estrangeiras o behaviorismo resultou no Audiolingualismo.

Segundo esta abordagem, uma língua era um conjunto de hábitos, pelo que a sua

aprendizagem resultava, sobretudo, da imitação, prática, reforço positivo e formação de

hábitos. Esta visão era muito redutora, pois tal como Lighbrown e Spada referem, “A

imitação e a prática, por si só, não conseguem explicar algumas das formas criadas pelas

crianças.” (Lightbrown & Spada 15).

Em meu entender, todas as teorias e métodos têm algo importante a

nos oferecer, quanto mais não seja porque nos fazem refletir de forma mais

aturada sobre determinados aspetos. Relativamente ao behaviorismo,

enquanto estudante de um curso com a vertente educacional, o que mais me

marcou foi a questão do reforço positivo e perceber que este tipo de

feedback pode ser extremamente produtivo. Uma vez que todos gostamos de

reconhecimento e de ser bem sucedidos, o elogio pode levar-nos a continuar

a trabalhar em determinada área.

Na minha experiência profissional tenho constatado que o reforço

positivo é muito importante, qualquer que seja o público-alvo. Com

crianças, para além dos elogios verbais, resultam muito bem os carimbos

com smileys ou expressões como Excellent! e os award stickers, tão

populares no Reino Unido (e que qualquer professor pode fazer no

computador).

No caso dos adolescentes, os reforços do tipo “Good!”, “Well

done!”, “Sehr gut!” ou “Super!” são importantes, mas não tão eficazes

como “Sabia que conseguias!” ou “Estou muito contente com a tua

evolução!”. O primeiro tipo de elogio pode ser proferido por qualquer

pessoa, dirigido a qualquer um e aplicado a situações variadas. O seu uso é,

por vezes, tão rotineiro e indiscriminado que deixa de ter verdadeiro

significado. Já o segundo tipo de reforço positivo parece traduzir uma

relação entre o emissor e o destinatário e denotar verdadeiro interesse por

Page 36: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

36

evolução!”. O primeiro tipo de elogio pode ser proferido por qualquer

pessoa, dirigido a qualquer um e aplicado a situações variadas. O seu uso é,

por vezes, tão rotineiro e indiscriminado que deixa de ter verdadeiro

significado. Já o segundo tipo de reforço positivo parece traduzir uma

relação entre o emissor e o destinatário e denotar verdadeiro interesse por

parte daquele. Todas as pessoas, mas os adolescentes em especial, gostam

de saber que alguém está atento e se preocupa com eles. Carimbos e

autocolantes, dependendo do uso que lhe damos, podem também funcionar.

Quando se opta por esta via, deve-se primeiro fazer uma avaliação dos

alunos com quem trabalhamos e perceber se um instrumento deste tipo vai

ser bem aceite ou ridicularizado.

No meu trabalho com adultos também me apercebi de que um

comentário positivo pode fazer toda a diferença. No entanto, com este

público-alvo devemos ser cuidadosos com os reforços que emitimos.

Elogios como “Muito bem!” podem ser encarados como uma infantilização

do ensino e serem tidos como algo que o professor/formador diz apenas

para ser simpático. A minha experiência tem-me mostrado que comentários

que façam o formando refletir sobre o seu processo de aprendizagem são

muito mais eficazes. “Veja só o que já consegue dizer!”, “Há um mês só

percebia textos de 5 linhas e agora já lê textos deste tamanho!” são

exemplos de reforços positivos que podem funcionar muito bem.

Dependendo do aluno/formando que tiver à minha frente, não hesito em

usar a língua materna para lhe fornecer feedback positivo, uma vez que o

meu objetivo nestas situações não é linguístico.

Relativamente à aplicação do behaviorismo ao ensino de línguas,

julgo ser importante reter a questão do drilling. Todas as teorias que vêm

suplantar outras já existentes acabam por eleger um elemento como alvo de

crítica e discute-se tanto em torno dele, e são arranjados tantos argumentos

para o refutar, que a determinada altura é como se esse aspeto fosse alguma

“força do Mal” e toda a gente se interrogasse: “Como era possível fazer-se

aquilo?”. Penso que isto foi um pouco o que aconteceu com os drills. Mas

será que os drills não têm lugar no ensino de línguas? Creio vivamente que

sim, mas obviamente que dependerá da sua forma, frequência e duração.

No seu blog An A-Z of ELT*, Scott Thornbury relança a discussão

sobre os drills, e é interessante observar, através dos vários comentários

Page 37: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

37

aquilo?”. Penso que isto foi um pouco o que aconteceu com os drills. Mas

será que os drills não têm lugar no ensino de línguas? Creio vivamente que

sim, mas obviamente que dependerá da sua forma, frequência e duração.

No seu blog An A-Z of ELT*, Scott Thornbury relança a discussão

sobre os drills, e é interessante observar, através dos vários comentários

motivados pelo post do autor, que esta técnica está ainda muito presente no

ensino do inglês como língua estrangeira.

Utilizado em aulas de nível intermédio ou avançado, o chorus

drilling fará pouco sentido, pois, tal como refere Scott Thornbury, este tipo

de atividade parece infantilizar a aula. No entanto, fruto da minha

experiência, sou levada a concluir que com turmas de young ou very young

learners pode ser muito útil. Quando ensinamos vocabulário a esta faixa

etária é muito comum a utilização de exercícios de audição e repetição

(listen and repeat exercises) de que os alunos tanto gostam. Aprender uma

palavra é também aprender a forma como esta se pronuncia e a infância é a

altura ideal para o fazer. Estudos como o de Mark Patkowski demonstram

que se pode aprender uma língua em qualquer idade, mas que quando a sua

aprendizagem ocorre na infância as hipóteses de os alunos se tornarem

proficientes aumentam (Lightbrown & Spada 69). Pedir a um aluno que

repita sozinho determinada palavra ou expressão pode ser muito

constrangedor para ele. O chorus drilling dá aos alunos uma oportunidade

segura de repetirem os vocábulos que estão a ser estudados. Contudo, é

preciso ter em atenção a frequência e a duração do exercício. Se este

exercício for muito longo ou implementado em todas as aulas, passará a ser

aborrecido e os alunos deixarão de ter interesse em realizá-lo.

Com alunos mais velhos faz mais sentido o uso de outro tipo de

drills. Durante a frequência do curso Drama Techniques for the English

Language Classroom, em Exeter, aprendi um drill que tenho usado com

frequência nas minhas aulas. Todos os professores de inglês sabem que,

regra geral, os alunos têm muita dificuldade em formular perguntas no

passado.

Com este drill, de forma divertida, os alunos repetem e ouvem

várias vezes uma pergunta no passado. Esta pergunta, que é várias vezes

repetida, pode servir-lhes de modelo para a elaboração de questões no

passado. O drill, que combina a repetição da estrutura, com jogo, humor e

Page 38: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

38

passado.

Com este drill, de forma divertida, os alunos repetem e ouvem

várias vezes uma pergunta no passado. Esta pergunta, que é várias vezes

repetida, pode servir-lhes de modelo para a elaboração de questões no

passado. O drill, que combina a repetição da estrutura, com jogo, humor e

mímica, baseia-se no seguinte diálogo:

Student A – Do you know Mrs Jones?

Student B – Yes.

Student A – She’s dead!

Student B – Oh! How did she die?

Student A – Like this...

A seguir à expressão “Like this...”, o aluno faz uso da mímica para

explicar a forma como Mrs Jones morreu. Posteriormente, aquele que era o

aluno B passa a ser o aluno A e o aluno B passará a ser outro elemento da

turma (normalmente é alguém próximo do novo aluno A) e assim

sucessivamente. De cada vez que um aluno diz a expressão “Like this...”

deverá, sequencialmente, representar por gestos as várias formas como Mrs

Jones morreu e depois acrescentar uma nova forma.

Dependendo do enquadramento que lhe é dado, esta atividade pode

resultar muito bem, quer com jovens, quer com adultos, e permite várias

atividades de follow-up. Daqui poderá partir-se para um alargamento de

vocabulário relacionado com os instrumentos utilizados pela Mrs Jones, a

forma e o ambiente em que ocorreu a sua morte. Apelando à criatividade,

poder-se-á também pedir aos alunos que redijam uma história para a qual

tenham como ponto de partida a questão Why did Mrs Jones die? ou, então,

poder-se-á simplesmente passar para um exercício de audição e

interpretação da canção Me and Mrs Jones, de Michael Bublé.

Nas minhas aulas, de vez em quando, uso ainda uma espécie de

mingle drill, que consiste no seguinte: primeiro, atribui-se a cada aluno uma

frase (ou deixa-se que cada aluno escolha a frase com que quer trabalhar;

convém que seja uma frase que o aluno tenha dificuldade em proferir) e

ensaia-se juntamente com ele a pronúncia e

Page 39: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

39

3.2. O Construtivismo

Como reação ao behaviorismo surgiu uma nova abordagem à aprendizagem que

se focava mais nos processos mentais e menos nos comportamentos observáveis – o

construtivismo. Tal como foi anteriormente referido, a imitação e prática advogadas pelo

behaviorismo não conseguiam explicar algumas formas construídas pelas crianças. Na

perspetiva construtivista, o conhecimento é visto como algo ativamente construído pelos

aprendentes com base nas suas estruturas cognitivas. A aprendizagem consiste na

assimilação e acomodação de informação nas estruturas cognitivas existentes (Arthur 50).

Aprendemos ao relacionar os novos conhecimentos com aqueles que já possuímos.

O pensador que mais contribuiu para o construtivismo foi o psicólogo suíço Jean

Piaget. Para Piaget a aprendizagem era “... um processo dinâmico que inclui estádios

sucessivos de adaptação à realidade, durante os quais os aprendentes constroem

ativamente o conhecimento ao criarem e testarem as suas próprias teorias sobre o

mundo.” (Arthur 51). O princípio basilar da teoria deste psicólogo era o da equilibração,

frase (ou deixa-se que cada aluno escolha a frase com que quer trabalhar;

convém que seja uma frase que o aluno tenha dificuldade em proferir) e

ensaia-se juntamente com ele a pronúncia e entoação corretas; depois, pede-se

aos alunos que se levantem e deambulem pela sala, repetindo a sua frase cada

vez que se deparam com um colega.** Utilizei esta atividade com turmas do

ensino profissional antes da dramatização de diálogos num restaurante e

resultou muito bem. Na altura da dramatização, poucos foram os alunos que

tiveram dificuldade em dizer aquela frase que inicialmente era um problema.

_______________________ * http://scottthornbury.wordpress.com/ ** Aprendi esta atividade no segundo ano da faculdade na disciplina de Alemão II. Na altura

o objetivo era treinar os verbos preposicionais e ainda hoje me lembro da frase que me coube:

“Über solche Witze kann man nicht lachen!”

Page 40: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

40

segundo o qual o indivíduo possui um mecanismo contínuo de reajustamento, um

processo de adaptação cognitiva ao ambiente. A pessoa trabalha constantemente para

manter um estado de equilíbrio cognitivo, mesmo diante de nova informação. O

equilíbrio é possível através de dois processos: assimilação e acomodação. A assimilação

ocorre quando incorporamos nova informação nas estruturas cognitivas que já possuímos

e desta forma restauramos o equilíbrio cognitivo. Segundo Piaget qualquer ação responde

a uma necessidade e uma necessidade é resultante de um desequilíbrio. Neste sentido “...

toda a necessidade tende, primeiro, a incorporar as pessoas e as coisas na actividade

própria do sujeito, portanto a «assimilar» o mundo exterior às estruturas já construídas...”

(1990: 17). A acomodação ocorre quando há uma modificação das estruturas cognitivas

existentes, a fim de se poder considerar a nova informação.

Piaget propôs ainda o conceito de estádio cognitivo. Um estádio representa um

sistema de estruturas mentais que o indivíduo usa para dar significado à experiência.

Existe uma relação observável entre o estádio e o comportamento humano, pelo que é

possível perceber em que estádio uma criança se encontra através da observação do seu

comportamento. De acordo com a teoria piagetiana existem quatro estádios cognitivos:

estádio sensório-motor, estádio pré-operatório, estádio das operações concretas e estádio

das operações formais. A ordem de sucessão dos estádios é constante e não há “saltos” na

transição entre eles.

O estádio sensório-motor, que vai normalmente desde o nascimento até aos dois

anos de idade, consiste “... numa conquista, através das percepções e dos movimentos, de

todo o universo prático que rodeia a criança.” (Piaget, 1990: 18-9). Durante este período

a perceção é a atividade dominante e encontra-se orientada para a ação. As manifestações

da criança vão desde a atividade reflexa à atividade recreativa, podendo já representar

objetos mentalmente, sob a forma de imagens. Este estádio caracteriza-se ainda pelo

egocentrismo intelectual da criança, ou seja, a criança só percebe aquilo que lhe é dado a

conhecer, para a criança só existe aquilo que ela vê.

No estádio pré-operatório, que ocorre aproximadamente entre os dois e os sete

anos, já existe a função simbólica ou semiótica, que permite a distinção entre o

significado e o significante. Convém não esquecer que é normalmente durante este

estádio que aparece a linguagem, o que traz consequências para o desenvolvimento

Page 41: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

41

mental. A criança passa a ser capaz de criar imagens mentais e fazer desenhos, evocações

verbais, jogos simbólicos e imitações diferidas. Esta fase é caracterizada pelo animismo

infantil, que é a tendência para conceber as coisas como entidades vivas e dotadas de

intenção e consciência, e pelo artificialismo, ou seja, a ideia de que “... não há acaso na

natureza, porque tudo é «feito para» os homens e as crianças, segundo um plano

estabelecido e sábio, do qual o ser humano constitui o centro.” (Piaget, 1990: 41). É

importante também não esquecer que a criança se foca apenas num aspeto especialmente

observável de um objeto ou de uma situação, o que corresponde ao conceito de centração.

Entre os sete e os onze/doze anos ocorre o estádio das operações concretas,

durante o qual a criança se começa a libertar do seu egocentrismo intelectual e social,

passando a cooperar com os outros. A criança começa a ter a capacidade de reter uma

ideia em mente enquanto se procede à realização de um problema. Existe a capacidade de

reversibilidade mental, a capacidade de regressar ao ponto de partida de determinada

atividade. A criança começa a adquirir um maior número de competências, tais como a

transitividade, a seriação e a numeração. As operações neste estádio são concretas, na

medida em que os elementos devem estar presentes fisicamente.

Desde os onze/doze anos até aproximadamente aos dezasseis tem lugar o estádio

das operações formais, durante o qual as operações lógicas começam a ser transpostas do

plano da manipulação concreta para o plano das proposições. Para além do pensamento

formal, surge também o pensamento hipotético-dedutivo, que se traduz na capacidade de

“... deduzir as conclusões a tirar de puras hipóteses, e não apenas de uma observação

real.” (Piaget, 1990: 92). A metacognição torna-se possível e o indivíduo começa a

compreender de forma complexa a realidade interpessoal.

A teoria de Piaget e, em geral, o construtivismo tiveram grande influência no

campo da educação. A pedagogia decorrente desta teoria assenta sobretudo nos métodos

ativos que privilegiam a atividade do sujeito (o aluno deve agir por sua própria iniciativa

e deve estar ativamente implicado no processo de aprendizagem) e o trabalho em equipa.

Na perspetiva construtivista a tarefa do professor é, sobretudo, ajudar os alunos a

construírem as suas redes de conhecimentos, o seu papel é o de facilitador da descoberta

através da disponibilização dos recursos necessários e através da sua orientação. O

professor deve atuar mais como um especialista do processo de ensino-aprendizagem do

Page 42: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

42

que como um especialista de conteúdos. Deve estimular a curiosidade, a cooperação e a

pesquisa por parte do aluno, em vez de fornecer soluções já acabadas. É muito importante

que o aluno tenha espaço para construir o seu próprio conhecimento. Piaget diz mesmo

que “[é] preciso que o aluno faça pesquisas por ele próprio, possa experimentar, ler e

discutir com uma quota-parte de iniciativa suficiente e não atue simplesmente por

comando.” (Piaget, 1999: 146). O aluno deve procurar por si mesmo, experimentar e

criticar livremente. A motivação para a aprendizagem é intrínseca, já que o aluno deve

criar os seus próprios objetivos.

Piaget coloca ainda uma grande tónica na questão da autonomia, que, nas suas

palavras, é “...a submissão do indivíduo a uma disciplina que ele próprio escolhe e na

constituição da qual ele colabora com toda a sua personalidade.” (Piaget, 1999: 68) e só

se desenvolve numa atmosfera de cooperação. Neste contexto, refere o método do self-

government, que consiste na atribuição aos alunos de responsabilidade na organização da

disciplina, e o método do trabalho em equipa.

Refletindo sobre a minha atividade profissional, chego à conclusão de

que a autonomia não tem sido uma prioridade para mim. Preocupada com

tantas questões como certificar-me que os alunos apreendem os conteúdos,

assegurar a disciplina, cumprir programas, controlar comunicações com os

encarregados de educação, verificar os trabalhos de casa, entre tantas outras

coisas, não tenho dedicado energia suficiente ao fomento da autonomia. Julgo,

na verdade, que devia delegar mais responsabilidades nos alunos. Devo por

isso rever a minha postura quanto a este aspeto. A autonomia é essencial na

formação de cidadãos livres e responsáveis, que deve ser o mais importante

objetivo da escola.

Quanto ao trabalho em equipa, procuro incutir nos alunos o gosto e o

hábito de se ajudarem uns aos outros e de trabalharem juntos para um mesmo

objetivo, sobretudo através do trabalho de pares.

Page 43: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

43

3.3. O Construtivismo Social

Se o construtivismo já apontava para a importância da cooperação, o

construtivismo social vem colocar a tónica na natureza colaborativa da aprendizagem.

Esta teoria foi desenvolvida pelo psicólogo soviético Lev Vygostky, que foi um crítico de

Piaget.

Segundo Vygotsky, as funções cognitivas têm origem nas interações sociais e

devem ser explicadas como produtos dessas interações. A aprendizagem não é apenas a

assimilação e acomodação de novo conhecimento, mas um processo pelo qual os alunos

são integrados numa comunidade de conhecimento, um processo colaborativo (Arthur

54-5).

Vygotsky defendia que qualquer ação humana é sempre mediada por instrumentos

e símbolos e que a linguagem desempenha um papel de relevo nessa mediação. Para além

disso, argumentava que qualquer função mental aparece sempre em dois planos:

primeiro, o interpessoal; posteriormente, o intrapessoal.

Vygostky retira a ênfase da herança biológica e coloca-a na cultura. O ambiente

determina amplamente o que a criança internaliza, na medida em que grande parte da sua

aprendizagem ocorre pelas interações que ela estabelece nesse ambiente. A internalização

consiste na absorção do conhecimento proveniente do contexto. Neste sentido, poderá

dizer-se que o desenvolvimento procede de fora para dentro e que as pessoas que fazem

parte do contexto da criança podem, através da forma como interagem com ela, alargar o

seu conhecimento e facilitar a sua aprendizagem. A incorporação das atividades

exteriores e sociais na estrutura mental da criança acontece em três fases: 1) assistência

por outras pessoas mais capazes; 2) assistência oriunda da própria criança; 3)

interiorização do conceito. Na perspetiva vygotskyana a motivação para a aprendizagem

é simultaneamente extrínseca e intrínseca.

Vygotsky propôs o conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP). A

ZDP corresponde à amplitude de capacidade entre o nível de capacidade observável de

uma criança e a sua capacidade latente, que não é diretamente detetada.

Fundamentalmente, a ZDP representa a diferença entre o que a criança é capaz de fazer

Page 44: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

44

individualmente e aquilo que é capaz de atingir com a ajuda de pessoas mais

experimentadas.

Sobretudo através do conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal, Vygotsky

incentivou uma investigação que vá para além do desempenho observado de uma criança,

com o objetivo de melhor se compreender o que está para além das respostas observáveis.

Incentivou ainda à investigação no campo da avaliação dinâmica. Num ambiente de

avaliação dinâmico, quando um aluno responde erradamente a uma questão “... o

examinador dá-lhe uma sequência gradual de sugestões dirigidas, a fim de facilitar a

resolução do problema” (Sternberg 386). Neste tipo de avaliação, o examinador acaba por

ter um papel ativo e o enfoque é colocado na capacidade da criança para usar as

sugestões.

Na perspetiva do construtivismo social, o ensino deveria utilizar métodos de

ensino colaborativo. Se a criança aprende sobretudo através das interações sociais, o seu

relacionamento com os restantes colegas da turma não pode ser esquecido. Vygotsky

sugeria a utilização de uma criança mais desenvolvida para ajudar outra com menos

capacidades. Ao ensinar o colega, a criança mais desenvolvida consolida os seus próprios

conhecimentos, uma vez que o ensino obriga a um esforço de sintetização. Este trabalho

conjunto entre elementos da turma deveria, obviamente, ser guiado e mediado pelo

professor. Para além disso, o professor tem também a função de interferir no processo de

aprendizagem, fazendo com que os alunos progridam no sentido de atingir o seu

potencial. Tal é possível através da interferência na Zona de Desenvolvimento Proximal.

Relativamente à teoria vygotskyana, o que mais me marcou foi a apreensão

do conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal. Na sociedade atual, na

sociedade “do usa e deita fora”, julgo que é cada vez mais importante que a escola

não forneça aos alunos produtos acabados. Enquanto professores, ao intervirmos na

ZDP, estamos apenas a fornecer ao aluno um ingrediente para que ele próprio

construa o seu produto.

A participação do aluno nesta construção acarreta vários benefícios. Por um

lado, favorece a sua autoestima, pois o aluno sente que, usando as suas capacidades,

é capaz de resolver o problema ou atingir o objetivo, o que lhe traz uma satisfação

enorme. Por outro lado, o facto de o aluno ser ativo na construção do seu próprio

conhecimento torna a aprendizagem muito mais significativa; de facto, é como se

houvesse uma personalização da aprendizagem. O aluno construiu a sua própria

rede neuronal, fazendo uso dos seus conhecimentos prévios para construir

Page 45: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

45

enorme. Por outro lado, o facto de o aluno ser ativo na construção do seu

próprio conhecimento torna a aprendizagem muito mais significativa; de facto,

é como se houvesse uma personalização da aprendizagem. O aluno construiu a

sua própria rede neuronal, fazendo uso dos seus conhecimentos prévios para

construir conhecimento novo.

Quantas vezes a colocação de uma questão na altura certa não leva a

que a criança, o jovem ou o adulto consigam atingir o seu potencial! No caso

da aprendizagem de vocabulário isso acontece muitas vezes. Tomemos como

exemplo a palavra anteater. Quando um aluno nos pergunta o seu significado

temos duas hipóteses: fornecer de imediato o significado (a que chamo fast

feeding) ou ajudar o aluno a encontrá-lo (que seria uma espécie de slow

cooking). Optando pela segunda hipótese, o professor poderia colocar uma

série de perguntas - tais como Can you divide the word into units? What do you

recognise in this word? What does “ant” mean? What does “eat” mean? Can

you find a parallel with the Portuguese language? - que poderiam conduzir o

aluno até ao significado. Note-se que a sequência de perguntas deve ser

gradual. O uso desta técnica é muito importante no caso do ensino do alemão,

uma vez que esta língua possui um elevado número de palavras compostas.

Outro aspeto que penso ser muito importante e que procuro

implementar na minha prática letiva é o ensino colaborativo ou peer teaching.

Devemos fazer uso de todos os recursos que temos e os alunos também são um

recurso! Opto muitas vezes por utilizar o ensino colaborativo, não tanto sob a

forma de trabalho de grupo mas sob a forma de trabalho de pares. Esta forma

de trabalho é mais fácil e mais rápida de operacionalizar e não dá tanto azo a

brincadeira e barulho. Como já foi referido anteriormente, este tipo de

estratégia não é apenas vantajosa para o aluno com mais dificuldades, mas

também para o mais desenvolvido. Na minha opinião, para que este tipo de

prática resulte é necessário fazer um trabalho contínuo com as turmas

(qualquer que seja o seu nível) de estímulo a uma verdadeira cooperação, a

uma cooperação responsável. Muitas vezes, sobretudo com adolescentes e

adultos, a cooperação é confundida com porreirismo. É necessário que os

alunos entendam que ajudar um colega não é dar-lhe a resposta certa, mas antes

levá-lo até ela. Para além disso, sem um sentimento verdadeiro de cooperação

as tarefas que envolvem peer teaching podem ser vistas como um castigo para

os bons alunos e como uma humilhação para os fracos.

Page 46: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

46

3.4. Inteligências Múltiplas

Na década de 80, no seu livro Frames of Mind: The Theory of Multiple

Intelligences, Howard Gardner propõe a teoria das inteligências múltiplas. Gardner

recusa a ideia de uma inteligência única que todos os indivíduos têm em maior ou menor

grau, bem como a mensurabilidade da inteligência através de testes de QI. Para este

psicólogo da Universidade de Harvard “[u]ma inteligência é a capacidade de resolver

problemas, ou criar produtos, que são valorizados dentro de um ou mais contextos

culturais....” (Gardner x). Neste sentido, sugere um conjunto de sete inteligências:

linguística, lógico-matemática, espacial, quinestésica, musical, interpessoal e

alunos entendam que ajudar um colega não é dar-lhe a resposta certa, mas antes

levá-lo até ela. Para além disso, sem um sentimento verdadeiro de cooperação as

tarefas que envolvem peer teaching podem ser vistas como um castigo para os

bons alunos e como uma humilhação para os fracos.

Ao enfatizar a questão da cultura e das interações sociais Vygotsky

motiva uma reflexão sobre o contexto em que vivem os nossos alunos. Se grande

parte da aprendizagem é fruto das interações sociais, devemos perceber que tipo

de interações é que os nossos alunos têm. Sem fazer juízos de valor, podemos

constatar que o tipo de interações sociais que tem um jovem, filho de modestos

agricultores, que vive na aldeia e que tem de ir tratar do gado quando chega a

casa depois da escola é diferente do tipo de interações que tem um jovem

citadino, filho de pais ricos, que vai para o café depois das aulas. Ambos

precisam de ser ensinados! A escola tem de dar resposta aos dois! Para evitar

que a escola seja o espaço de reprodução social de que falam Bourdieu e

Passeron, temos de fazer um esforço para compreendermos o contexto em que os

nossos alunos vivem.

Page 47: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

47

intrapessoal. Mais tarde, Gardner acrescenta um oitavo tipo – a inteligência naturalista –

e coloca a hipótese da existência de uma inteligência espiritual.

Não há pessoas com um único tipo de inteligência, mas com diferentes graus de

desenvolvimento de cada uma das inteligências. Estas inteligências não são imutáveis: se

em dado momento temos uma determinada inteligência mais desenvolvida, o mesmo

pode não se verificar em outros períodos da nossa vida. Para além disso, é importante

percebermos que as inteligências não são estanques e podem ser mobilizadas por vários

domínios. Segundo Gardner, “... quase todos os domínios requerem proficiência num

conjunto de inteligências; e qualquer inteligência pode ser mobilizada para ser usada

numa grande variedade de domínios culturalmente disponíveis.” (xvii). O domínio da

música é um bom exemplo: ser capaz de interpretar uma peça musical requer outras

inteligências para além da musical, e a inteligência musical pode ser mobilizada para

outros domínios que não o da música (Gardner xvi, xvii).

Indivíduos que possuem uma inteligência linguística desenvolvida tendem a

pensar com palavras e a utilizá-las com facilidade. Normalmente gostam de ler, escrever

e contar histórias. Aprendentes lógico-matemáticos gostam de ter explicação para tudo e

apoiam-se no raciocínio lógico-dedutivo. De uma forma geral, gostam de colocar

questões, realizar atividades de experimentação, trabalhar com números e explorar

padrões e relações. Quando se tem uma inteligência espacial desenvolvida pensa-se

através de imagens e relações espaciais e tem-se uma grande capacidade de visualização;

prefere-se atividades como o desenho, o visionamento de filmes e o trabalho com

imagens. Aqueles que possuem uma inteligência quinestésica acentuada aprendem

fazendo e aprendem melhor relacionando a informação com o seu próprio corpo, pelo que

se inclinam para atividades físicas ou que impliquem movimento. Quem pensa através do

ritmo e da melodia e memoriza canções facilmente diz-se que tem uma inteligência

musical apurada. Este tipo de indivíduos habitualmente gosta de ouvir música, cantar e

expressar-se através da música. A inteligência interpessoal caracteriza-se pela facilidade

que uma pessoa tem em relacionar-se com outros e aprender e pensar através da troca de

ideias com os outros. Quem tem este tipo de inteligência desenvolvida gosta de conversar

e estar em grupo. Por último, a inteligência intrapessoal diz respeito à capacidade do

indivíduo para relacionar a informação com as suas vivências e interesses. Pessoas com

Page 48: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

48

uma inteligência intrapessoal acentuada tendem a gostar de trabalhar sozinhos, meditar,

planear e traçar objetivos próprios. (Harmer, 2001b: 46-7; Zenhas 9, 10)

A teoria das inteligências múltiplas veio dar um enquadramento teórico àquilo

que todos os professores já tinham percebido, que todas as pessoas têm mais apetência

para umas áreas do que para outras; assim se explica o sucesso que esta nova abordagem

teve no campo da educação.

Ao aceitarmos a possibilidade das inteligências múltiplas, aceitamos a ideia de

que não aprendemos todos da mesma forma e de que, portanto, existem diferentes estilos

de aprendizagem. Enquanto professores, devemos dar resposta aos vários estilos de

aprendizagem, pelo que não podemos basear o nosso ensino apenas em atividades

linguísticas ou lógico-matemáticas, que historicamente têm sido as mais utilizadas. Como

diz Marcia L. Tate, “... se as pessoas não aprenderem da forma como lhes ensinamos,

temos de ensiná-las das muitas formas em que elas aprendem” (Feinstein 243).

Para podermos chegar a todos os alunos, temos de incluir variedade nas nossas

aulas. No entanto, em primeiro lugar, devemos perceber e aceitar que somos

condicionados pelas nossas inteligências dominantes, pelos nossos gostos e preferências e

que, assim sendo, e parafraseando Jim Wingate, a forma como naturalmente ensinamos

pode não ser a forma como os nossos alunos naturalmente aprendem (1997: 29). Se

estivermos conscientes desta condicionante, mais facilmente poderemos conseguir um

equilíbrio na planificação das nossas aulas.

Quanto mais diversificadas forem as atividades, mais hipóteses teremos de chegar

a todos os alunos. Rosie Tanner sugere vários exemplos de atividades linguísticas que

contemplam os vários tipos de inteligência e os vários domínios de aprendizagem de uma

língua: listening (compreensão oral), reading (compreensão escrita), writing (produção

escrita), speaking (produção oral), grammar (gramática), vocabulary (vocabulário),

literature (literatura) (41). Relativamente ao trabalho com vocabulário, para os alunos

com uma inteligência fortemente musical, propõe que estes decidam quais as novas

palavras da letra de uma canção pop que gostariam de aprender.

Page 49: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

49

Segundo Tanner, alunos com uma inteligência intrapessoal dominante podem

fazer o seu próprio livrinho de vocabulário com palavras que julguem importantes

aprender. Sujeitos com uma inteligência interpessoal acentuada podem testar o

vocabulário uns dos outros.

Pessoalmente, acho mais interessante pedir aos alunos que escolham um

conjunto de palavras e que com elas criem uma canção. Esta atividade permite-lhes

exercitar a sua criatividade através da escolha de palavras, rimas e ritmo. Eles podem

criar uma melodia nova ou fazer uso de uma já existente. Para além disso, ao darmos

aos alunos a hipótese de escolherem as palavras, tornamos a atividade mais

significativa e, como já vimos anteriormente, a atribuição de significado é um

grande auxílio para a memória.

Embora considere a primeira atividade interessante, no caso da segunda

procederia de outra forma: pediria aos alunos que explicassem uns aos outros um

conjunto de palavras ou então que, em trabalho de pares, fornecessem pistas para

o preenchimento de palavras cruzadas, tal como sugere Peter Watcyn-Jones na

atividade Half a Crossword*.

______________________ * Nesta atividade proposta no livro Vocabulary Games and Ativities for Teachers é fornecido a

cada elemento uma folha com palavras cruzadas incompletas. A informação da folha A

complementa a da folha B e vice-versa. Cada um dos alunos está apenas em posse de metade da

informação necessária para completar a tarefa. Para realizar a atividade o aluno A deverá perguntar

ao aluno B as palavras que lhe faltam para concluir a folha A. O aluno B está proibido de dizer as

palavras de imediato, mas dá ao colega informação (sob a forma de definição ou pistas soltas) para

que este as descubra. Depois, dá-se o processo inverso, passando o aluno B a fazer as perguntas e o

A a indicar as pistas.

Page 50: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

50

Cortar uma imagem de uma revista e legendá-la é a sugestão de Tanner para

alunos com uma forte inteligência visual. Julgo que pode ser uma atividade aliciante,

sobretudo para crianças. A adolescentes ou adultos, talvez sugerisse que criassem mind

maps com vocabulário relativo a determinado tema, pois este tipo de atividade conjuga o

aspeto visual com a criação de unidades significativas.10

Estes são alguns exemplos da multiplicidade de atividades que podem enriquecer

as nossas aulas. Numa única aula pode não ser fácil cobrir todos os tipos de inteligência,

mas ir variando as atividades ao longo das aulas não será difícil.

Qual será a forma como os nossos alunos naturalmente aprendem? Será que eles

próprios sabem? Creio que tão importante quanto incluir variedade nas aulas, é alertar os

alunos para os vários estilos de aprendizagem, fazê-los perceber que não aprendemos

todos da mesma maneira e que o que resulta com uma pessoa pode não resultar com

outra.

10 Ver subcapítulo “Estratégias para a aprendizagem autónoma de vocabulário” para mais informação sobre mind maps.

Nas minhas aulas, procuro recorrentemente fazer este trabalho de

elucidação e vou fornecendo sugestões de possíveis maneiras de estudar

determinado assunto. Incentivo-os a irem experimentando várias formas para

compreenderem a que resulta consigo, pois tal como afirma Armanda Zenhas

“[s]aber estudar . . . implica autoconhecimento da forma como se aprende”

(Zenhas 9). Wingate sugere um questionário que poderemos adaptar e fornecer

aos alunos para que descubram quais as suas inteligências dominantes

(1996:29). Nunca utilizei este questionário, mas fá-lo-ei numa próxima

oportunidade, pois pode ser um bom instrumento apara ajudar os alunos a

perceberem como aprendem melhor. Na minha opinião, este questionário é

adequado para adolescentes e adultos, mas não para young learners, uma vez

que a linguagem utilizada é demasiado complexa para esta faixa etária e

algumas situações colocadas poderão ser de difícil compreensão. No caso dos

alunos mais velhos, dependendo do seu nível de proficiência na língua, optaria

por traduzir o questionário para português. O objetivo desta atividade vai para

além da questão linguística.

Page 51: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

51

alunos mais velhos, dependendo do seu nível de proficiência na língua, optaria por

traduzir o questionário para português. O objetivo desta atividade vai para além da

questão linguística.

Page 52: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

52

4. FATORES QUE INFLUENCIAM A APRENDIZAGEM DE UMA LÍNGUA ESTRANGEIRA

Não aprendemos uma língua estrangeira da mesma forma que aprendemos a nossa

língua materna. Desde bebés ouvimos a nossa língua materna ser falada por todos aqueles

nos rodeiam, contactamos direta e intensamente com ela em todos os aspetos da vida,

consciente ou inconscientemente. O mesmo não acontece com uma segunda língua ou

com uma língua estrangeira. Estes termos são recorrentemente utilizados de forma

indiscriminada, mas Stern propõe uma distinção. Segunda língua diz respeito a uma

língua não nativa que é aprendida num país onde é falada. Uma língua estrangeira

consiste numa língua não nativa que é aprendida num país onde não é falada (16). Em

termos genéricos, poder-se-ia dizer que para um suíço do cantão francês, o alemão é a

segunda língua, enquanto que para um português residente em Portugal o alemão é uma

língua estrangeira.

A aprendizagem de uma língua estrangeira, pelo facto de ocorrer fora do seio de

uma sociedade que a utiliza como principal meio de comunicação, requer “... instrução

mais formal e outras medidas que compensem a falta de apoio do ambiente”, enquanto

que uma segunda língua pode ser aprendida de forma mais informal, pois é amplamente

utilizada no ambiente em que o sujeito se insere (Stern 16). Muitas considerações feitas

sobre uma segunda língua podem ser aplicadas a uma língua estrangeira, na medida em

que ambas se distinguem da língua materna.

Este capítulo não tem como objetivo fazer uma resenha das várias abordagens à

aprendizagem de uma língua estrangeira, mas antes analisar os fatores que a podem

influenciar.

No seu livro How Languages are Learned, Lightbrown e Spada apresentam vários

fatores que podem afetar a aprendizagem de uma segunda língua: inteligência, aptidão,

estilos de aprendizagem, personalidade, motivação e atitudes, identidade e ligação a um

grupo étnico, crenças do aprendente e idade de aquisição (Lightbrown & Spada 57-75).

Analisando cada um destes aspetos, tentarei perceber se podem ser aplicados à

Page 53: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

53

aprendizagem de uma língua estrangeira e se, por si só, são suficientes para explicar as

condicionantes deste tipo de aprendizagem.

Inteligência. Como vimos no capítulo anterior, a ideia de que existe uma única

inteligência que pode ser medida através de testes de QI foi refutada e deu origem à teoria

das Inteligências Múltiplas. Assim, a velha ideia de que as pessoas mais inteligentes

aprendem línguas melhor cai por terra. A que tipo de inteligência nos estamos a referir

quando caracterizamos alguém como sendo muito inteligente?

Atualmente, à luz da teoria de Gardner, o que se poderá dizer é que os indivíduos

que têm uma inteligência linguística mais desenvolvida terão, à partida, mais facilidade

na aprendizagem de uma língua, apesar de o domínio da língua não mobilizar apenas este

tipo de inteligência.

Aptidão. A aptidão refere-se à capacidade para aprender rapidamente. Nas

décadas de 50 e 60 foram criados testes de aptidão linguística que tinham como objetivo

prever o progresso futuro de determinada pessoa na aprendizagem de uma língua. Estes

testes mostraram-se redutores, uma vez que favoreciam os alunos do tipo analítico,

deixando de fora os outros tipos de aprendentes (Lightbrown & Spada 57-8; Harmer,

2001b: 41) Creio não ser errado estabelecer uma correlação entre aptidão e inteligência

dominante. Aprendemos mais depressa o que se encaixa nos moldes da inteligência que

temos mais desenvolvida.

Estilos de aprendizagem. Os estilos de aprendizagem dizem respeito à

predisposição para adotar uma estratégia de aprendizagem, independentemente das

exigências específicas de uma tarefa. Estão, portanto, intimamente relacionados com os

tipos de inteligência dominantes.11

Personalidade. Durante muito tempo achou-se que a extroversão estava ligada ao

sucesso na aprendizagem de uma língua; no entanto, verificou-se que muitas pessoas

introvertidas eram igualmente bem-sucedidas. De acordo com Lightbrown e Spada, a

investigação disponível não mostra uma relação clara e bem definida entre personalidade

e a aprendizagem de uma segunda língua.

11 Ver subcapítulo “Inteligências Múltiplas”

Page 54: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

54

A ansiedade tem sido vista como um fator negativo. Considerava-se a ansiedade

como um estado permanente, mas estudos mais recentes indicam que a ansiedade pode

ser temporária e específica de determinados contextos (Lightbrown & Spada 57-8). Uma

pessoa pode ter um enorme à-vontade na leitura e na escrita e sentir-se ansiosa apenas

quando tem de falar, pois se sente mais exposta à crítica dos outros.

Rebecca Oxford considera duas formas de ansiedade: situational or state anxiety

(a que decorre da reação a uma situação particular) e trait anxiety (neste caso é uma

característica permanente das pessoas predispostas a terem medo de várias coisas)

(Oxford 34-5). Esta distinção é importante na avaliação que o professor faz dos seus

alunos, no sentido de os conhecer melhor. Muito interessante é também a distinção entre

facilitating anxiety e debilitating anxiety. A primeira constitui o tipo de ansiedade que

mantém os alunos alerta, sendo, portanto, um “bom” tipo de ansiedade, que os pode

favorecer. Já a segunda prejudica os alunos indiretamente, através da preocupação e da

falta de confiança, e diretamente através da participação reduzida e da vontade de evitar a

língua (Oxford 35).

Contudo, a minha experiência leva-me a concluir que há, de facto,

determinadas características, determinados traços de personalidade, como a

disposição para correr riscos, a perseverança e a ansiedade, que podem influenciar

este tipo de aprendizagem.

Errar é um elemento inevitável do processo de aprendizagem. Pessoas que

estão dispostas a correr riscos tendem a experimentar mais com a língua. A

capacidade de perseverar é também um aspeto importante. Não fazemos tudo certo

à primeira, e se tivermos a capacidade de não desistir imediatamente perante a

adversidade aumentaremos as hipóteses de progredirmos na aprendizagem da

língua.

Page 55: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

55

Motivação e atitudes. O que nos leva a estudar uma língua? Fazemo-lo porque

somos obrigados ou porque decidimos fazê-lo? O grau de motivação não será igual nas

duas situações. A motivação pode ser de duas ordens: integrative motivation ou

instrumental motivation. A primeira diz respeito ao desejo do indivíduo de aprender uma

língua para se integrar na cultura alvo e para o seu enriquecimento cultural. A segunda

relaciona-se com a vontade de aprender a língua para conseguir atingir objetivos práticos,

tais como um emprego melhor (Oxford 33; Lightbrown & Spada 64). Harmer faz a

distinção entre motivação intrínseca, uma motivação que vem do próprio aprendente e

que pode resultar, por exemplo, de uma necessidade de realização pessoal, e motivação

extrínseca, que é causada por fatores externos ao aprendente, tais como a necessidade de

aprender a língua para progredir na carreira (Harmer, 2001b: 51).

De acordo com Zoltan Dörnyei, reconhecido investigador nesta área, a motivação

é visível nas atitudes e comportamentos que o indivíduo assume nas diferentes situações

em que está envolvido. Dörnyei relaciona motivação com sucesso na aprendizagem de

línguas estrangeiras. A motivação é o que distingue os alunos bem sucedidos dos alunos

sem sucesso. Um aprendente motivado é um aprendente entusiasmado, dedicado e

perseverante. É tarefa do professor motivar os alunos através do desenvolvimento de um

processo motivacional, que pode ser dividido em quatro fases (que estão interligadas): 1)

criar condições motivacionais básicas; 2) gerar a motivação inicial; 3) manter e proteger a

motivação; 4) encorajar uma autoavaliação retrospetiva de carácter positivo. No

desenvolvimento deste processo deverão ser usadas estratégias motivacionais, ou seja,

Apesar de haver instrumentos criados para medir/diagnosticar os níveis de

ansiedade na sala de aula, pessoalmente, acredito que a melhor forma é através da

observação que o professor faz do seu contexto de sala de aula e através de uma

relação de conhecimento mútuo que se vai estabelecendo com os alunos. Esta relação

é, obviamente, facilitada pela continuidade pedagógica. Quando se tem turmas

diferentes todos os anos, é mais complicado estabelecer essa relação.

Page 56: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

56

técnicas que promovem o comportamento do indivíduo face ao objetivo a atingir. No

livro Motivational Strategies in the Language Classroom, Dörnyei propõe várias

estratégias que poderão guiar o professor na condução deste processo (Dörnyei 137-144).

Identidade e ligação a um grupo étnico. Segundo Lightbrown e Spada, as

dinâmicas sociais e relações de poder entre as línguas podem ser um ser fator importante.

Membros de uma minoria que aprendem a língua do grupo dominante podem ter atitudes

diferentes de membros do grupo dominante que aprendem a língua de uma minoria

(Lightbrown & Spada 65-6). Este problema coloca-se mais na aprendizagem de uma

segunda língua do que na aprendizagem de uma língua estrangeira.

Crenças do aprendente. Os aprendentes têm ideias pré-concebidas sobre o

processo de ensino-aprendizagem, que normalmente são ditadas por experiências

anteriores. Acreditam muitas vezes que o processo de ensino deve ser conduzido de

determinada forma, pois assim aprenderão melhor (Lightbrown & Spada 66-7).

Idade de aquisição. Haverá uma idade ideal para aprender uma língua

estrangeira? Esta pergunta relaciona-se com a questão dos períodos críticos/sensíveis

abordada no primeiro capítulo.

Investigação realizada por Patricia Kuhl na década de 80 sugere a existência de

um período sensível para a discriminação de sons. Os japoneses não conseguem

distinguir entre R e L; no entanto, os bebés japoneses conseguem fazer essa distinção. De

acordo com Blakemore e Firth “[p]or altura do final do primeiro ano de vida os bebés

perdem a capacidade de distinguir sons aos quais não são expostos” (39). Esta capacidade

para discriminar sons deixa de existir quando não é apoiada pela experiência.

Extrapolar esta questão para o domínio da aprendizagem de uma língua

estrangeira parece-me ser forçado, pois com esta idade as crianças não aprendem línguas

Ao longo da minha experiência profissional pude observar que isto acontece

mais com adultos do que com crianças e jovens, e ainda assim em pequena escala.

Regra geral, os adultos sentem uma grande mudança no ensino, mas adaptam-se

facilmente às práticas atuais e fazem uma leitura positiva das mesmas.

Page 57: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

57

estrangeiras. Podem, quando muito, estar inseridas numa situação de early bilingualism

(cf. Lightbrown & Spada 25).

Se por um lado há estudos, como o de Mark Patkowski, que parecem sugerir a

existência de um período crítico na aprendizagem de uma de uma segunda língua, outros,

como o de Snow e Hoefnagel Höhle, parecem indicar o contrário. Relativamente a esta

questão, importa salientar que não há estudos conclusivos, mas a experiência leva-nos a

crer que a capacidade de adquirir um native-like accent é maior quando se começa cedo a

aprender a língua.

A realidade é que aprendentes de diferentes faixas etárias têm características

diferentes que, obviamente, influem no seu processo de aprendizagem.

As crianças evidenciam normalmente entusiasmo e curiosidade na aprendizagem,

mas se não estiverem verdadeiramente envolvidas na atividade facilmente se aborrecem e

perdem o interesse (Harmer, 2001b: 38). Têm um instinto natural para o jogo e a diversão

e, normalmente, têm uma grande capacidade de imaginar e fantasiar (Halliwell 3-7).

Aprendem de forma holística sem prestarem atenção a formas linguísticas abstratas

(Pinter 18). Reagem ao significado mesmo sem perceberem palavras individuais e

normalmente aprendem mais indireta do que diretamente, isto é, vão aprendendo mais

através daquilo que vai acontecendo à sua volta do que através do momento específico

em que determinado assunto está a ser tratado na aula (Halliwell 3; Harmer, 2001b: 38;

Phillips 5).

A possibilidade de experiências anteriores de aprendizagem influenciarem

negativamente as crianças não se coloca tanto como nos adultos, pois, as crianças em

virtude da sua tenra idade, não possuem muitas experiências de aprendizagem formal. O

cérebro da crianças está ainda em desenvolvimento, pelo que as suas capacidades de

abstração e reflexão são ainda reduzidas. Precisam de contextos concretos e,

normalmente, não estão conscientes do seu estilo de aprendizagem.

Os adolescentes já são capazes de fazer exercícios de abstração, ainda que não

demasiado profundos, e de perspetivar diferentes pontos de vista. A adolescência é um

período que coloca muitos desafios ao indivíduo que, não só muda fisicamente, como se

vê envolvido num processo intenso de busca de identidade. A aprovação pelos pares é

muito importante (mais do que a aprovação do professor), bem como a pertença a um

Page 58: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

58

grupo, pelo que podem ser relutantes a participar em atividades que os exponham perante

os outros, a não ser que saibam de antemão que se vão sair bem. Querem chamar a

atenção e ser reconhecidos pelos seus colegas, mas nem sempre escolhem o melhor

caminho.

Os casos de indisciplina não são raros entre os adolescentes. Eles tendem a reagir

emocionalmente às situações e sentem uma grande necessidade de se afirmarem, optando

muitas vezes pelo confronto e pela medição de forças para o fazer.12 No entanto, quando

se sentem verdadeiramente envolvidos numa atividade, os adolescentes demonstram

grande criatividade e capacidade de compromisso (Harmer, 2001b: 39).

No caso dos adolescentes, as experiências de aprendizagem anteriores são muito

importantes. Tal como refere Harmer “[c]ada fracasso predispõe-nos para mais fracasso,

cada sucesso dá origem à esperança de mais sucesso” (Harmer, 2001a: 11). Insucessos

anteriores podem levar ao desânimo aprendido (learned helplessness) que, infelizmente, é

bem mais comum do que o que seria desejável.

12 Ver subcapítulo “O cérebro do adolescente”.

São muito frequentes comentários como Não percebo nada de Inglês!

Nunca percebi, não é agora que vou perceber. Se fossem apenas ditos irrefletidos,

nada haveria de grave neles, mas o problema é que espelham uma atitude de

resignação perante a dificuldade, total desmotivação e resistência à aprendizagem.

Não é fácil para o professor conseguir arrancar as raízes do desânimo aprendido.

Na escola onde lecionei nos últimos três anos, o grau de aproveitamento

dos alunos a inglês não é muito elevado e o desânimo aprendido é bem patente. No

meu contacto com os encarregados de educação fui-me apercebendo de que, talvez

inconscientemente, alguns pais reforçam este desânimo ao fazerem à frente dos

filhos comentários como os seguintes: Ele nunca foi grande coisa! Já o irmão

mais velho não percebia nada de inglês! É como se houvesse uma resignação

generalizada.

Page 59: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

59

Os adultos possuem características únicas, muitas delas originadas pelas suas

experiências de vida. Quando um adulto entra numa sala de aula leva consigo toda a sua

bagagem experiencial. Ao ser dono de um leque alargado de experiências, as chances de

poder relacionar a informação a aprender com a já existente aumentam. O professor deve

fazer uso destas experiências para que a aprendizagem se possa tornar mais significativa

para o adulto.

As experiências dos adultos, o seu conhecimento do mundo e de diferentes

contextos podem ainda ser utilizados para conjeturarem sobre palavras e expressões

desconhecidas (Pinter 17-8).

Como já vimos, as experiências de aprendizagem anteriores podem condicionar o

adulto relativamente ao que acha serem os métodos adequados para o processo de ensino-

aprendizagem. Estes podem ter ideias já concebidas sobre a forma como devem ser

ensinados e podem ser críticos relativamente aos métodos de ensino utilizados (Harmer,

Como formadora de adultos fui-me apercebendo da importância de lhes

dar espaço para contarem as suas experiências e peripécias. Ainda que, por vezes,

possa parecer desperdício de tempo útil de aula, não o é, pois os benefícios

ultrapassam largamente os possíveis prejuízos. Ao ter a possibilidade de relatar as

suas experiências, o adulto sente que também tem algo de importante a dar, o que

favorece a sua autoestima e sentimento de pertença. Estes momentos são para o

professor uma “janela de entrada” no mundo daquela pessoa: começamos a

conhecer melhor o seu contexto e a perceber como abordar os vários temas de

forma a que se tornem relevantes para o adulto. Por outro lado, servem também

para estreitar laços entre os vários elementos da turma e criar um ambiente de

cooperação. No entanto, cabe ao professor estar atento a estes momentos e atuar

como moderador, pois há pessoas que, por uma questão de temperamento ou de

carência afetiva, tendem a manipular estas ocasiões e a impor as suas

experiências.

Page 60: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

60

2001b: 40). Pelo que pude constatar no trabalho que desenvolvi com adultos,

normalmente isso não é um obstáculo.

O stress, porém, funciona como um obstáculo ao funcionamento do cérebro e,

consequentemente, à aprendizagem.13 No caso dos adultos, o stress é normalmente

causado pela pressão de ter de conciliar a vida familiar com a profissional e com o

estudo. Encontrar um equilíbrio entre estes três vetores nem sempre é fácil.

13 Ver subcapítulo “O cérebro do adulto”.

A maior parte das formações que dei a adultos foram em horário pós-

laboral, o que implica que, na maior parte das vezes, as pessoas deixam de

estar com as suas famílias para poderem assistir às sessões de formação. Deste

modo, o tempo que passam nas aulas tem mesmo de valer a pena, ou seja, as

pessoas têm de sentir que, de facto, estão a aprender e também têm de se sentir

bem no ambiente de sala de aula. Mesmo para quem tem objetivos bem

definidos, a escolha entre um ambiente de tensão e o conforto do lar não é

difícil.

No caso deste tipo de formações o ambiente de sala de aula é crucial.

Não nos podemos esquecer de que as pessoas estão lá depois de um dia de

trabalho, pelo que deveremos saber estabelecer um equilíbrio entre momentos

de trabalho mais intenso e momentos de maior descontração.

Na realidade estamos a lidar com as perceções que as pessoas têm do

que é trabalho e do que é descontração, porque o trabalho está sempre presente.

Ler e interpretar um texto ou ouvir e interpretar uma canção são ambas tarefas

de grande valia no ensino de uma língua estrangeira, assim como fazer um

exercício de gramática ou um jogo de mímica para rever vocabulário. No

entanto, a ideia que as pessoas têm relativamente a estas tarefas é que umas são

trabalho duro e outras momentos de descontração. Mais uma vez, o segredo

parece ser a diversificação de atividades: é uma win-win situation, na qual

todos os participantes beneficiam.

Page 61: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

61

Apesar de a dificuldade de conjugar os seus vários papéis (pai/mãe,

marido/esposa, profissional, aprendente) ser frequentemente a maior fonte de stress para

o adulto, este também pode advir de elevados níveis de ansiedade causados pela

exposição a outros ou por situações anteriores de fracasso.

Conforme refere Harmer, os adultos têm expectativas relativamente ao processo

de aprendizagem (2001b: 40). Na minha perspetiva, a questão das expectativas é das mais

sensíveis, mais importantes e mais complicadas no ensino de adultos. Expectativas

frustradas são um grande fator de desmotivação.

No trabalho com adultos pude ir constatando que estes trazem

normalmente expectativas demasiado elevadas e desajustadas da realidade.

Na maioria das vezes esperam mais de um curso do que este pode oferecer,

pensando que depois de frequentarem um curso de trinta ou cinquenta horas

passarão a falar fluentemente a língua estrangeira.

No ensino de adultos uma das mais importantes tarefas do professor

é a de gestor de expectativas. Se, por um lado, não podemos matar os

sonhos às pessoas, por outro, temos de as trazer à realidade. É por isso que

fui aprendendo que a primeira aula é crucial, e agora começo sempre por

um levantamento das expectativas da turma - o que esperam aprender, o que

esperam ser capazes de conseguir fazer no final do curso - e confronto-a

com o plano do curso. Havendo essa possibilidade, negoceio um ou outro

tema com a turma, fazendo um pouco uso do método de self-government a

que Piaget se referia. Depois deste confronto, procuro deixar bem claro que

o nível a que poderão chegar será, em grande parte, determinado pela sua

vontade e empenho. Tento desta forma estabelecer um equilíbrio entre as

expectativas dos adultos e aquilo que o curso tem para oferecer. Este foi um

caminho que aos poucos fui descobrindo, mas não duvido de que com o

decorrer dos anos possa encontrar outros.

Page 62: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

62

Os adultos tendem a ser mais disciplinados e a estar mais preparados para

perseverar (Harmer, 2001b: 40). Isto pode dever-se ao facto de normalmente terem bem

definidos os objetivos pelos quais estão a aprender uma língua, sejam eles intrínsecos ou

extrínsecos.

Os adultos são capazes do pensamento abstrato, uma vez que, como vimos

anteriormente, os seus lobos frontais já estão totalmente desenvolvidos. Isto significa que

são capazes de participar em atividades mais complexas e que sabem adiar a recompensa,

pelo que lidam melhor com objetivos a longo-prazo do que as crianças e os adolescentes.

Esta capacidade permite-lhes analisar a linguagem de forma abstrata e colocar

deliberadamente hipóteses sobre as características de outra língua, tal como refere

Annamaria Pinter. Podem comparar padrões e formas linguísticas semelhantes ou

diferentes dos da sua língua materna (17-8).

Com grupos de adultos não costuma haver problemas de disciplina, mas estes

também podem ser perturbadores e cansativos, sobretudo porque podem ser muito

conversadores ou porque chegam tarde às aulas (Harmer, 2001a: 11). Os atrasos podem,

efetivamente, ser um elemento perturbador, bem como as faltas.

Na idade adulta todas as áreas do cérebro já estão desenvolvidas. Assim, os

adultos são capazes de mais facilmente refletir sobre o seu processo de aprendizagem e

perceber quais as estratégias que melhor se adequam a si próprios, embora nem sempre

estejam conscientes da importância da metacognição.

Lightbrown e Spada fazem também referência a alguns aspetos relacionados com

o contexto de aprendizagem: freedom to be silent, ample time, corrective feedback,

modified input. Na minha opinião, estas questões (à exceção da relacionada com o tempo)

têm a ver com o contexto específico de cada sala de aula e com a prática específica de

Curiosamente, ao longo do tempo pude ir verificando que os problemas de

pontualidade e assiduidade são mais frequentes nas formações in-company. Apesar de

acontecer em menor escala do que com adolescentes, também existem algumas

situações em que o professor tem de atuar como gestor de conflitos.

Page 63: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

63

cada professor. Julgo que seria mais interessante analisar fatores relacionados com um

âmbito mais alargado.

Que importância tem determinada língua numa sociedade ou comunidade

específica? Se a globalidade da população considerar uma língua importante, maiores

serão as hipóteses de o próprio aprendente a achar importante. Tomemos o caso do

alemão em Portugal. Na maioria dos casos, este idioma tem para as pessoas um grau de

importância reduzido, o que pode, em parte, explicar a fraca adesão a esta disciplina. No

entanto, em comunidades com forte tradição de emigração para a Alemanha ou a Suíça o

grau de relevância dado a esta língua é maior. É preciso ter obviamente em conta que,

nesta situação, o objetivo de aprendizagem da língua se torna, geralmente, muito mais

concreto. Aprende-se o idioma para se falar com os familiares que entretanto nasceram

no país de acolhimento ou para, mais tarde, ir para lá trabalhar.

O tempo de exposição à língua é um fator muito importante. Não me

refiro ao contexto de sala de aula, mas sim ao tempo que os sistemas educativos

contemplam para o ensino da língua. Ter uma aula de língua estrangeira uma ou

duas vezes por semana é bem diferente de ter aulas todos os dias. É necessário

que haja uma adequação entre aquilo que é esperado dos alunos e as condições

que lhes são dadas para atingir esse objetivo. Quando o domínio do inglês é visto

como um instrumento essencial de trabalho e como um fator de competitividade,

é difícil perceber como uma aula semanal de noventa minutos pode ser suficiente

para uma turma de 9.º ano. Lightbrown e Spada afirmam mesmo que “[u]ma ou

duas horas por semana – mesmo durante sete ou oito anos – não produzirá

falantes muito avançados de uma segunda língua” (187). Esta exposição reduzida

acaba por causar um sentimento de frustração nos alunos que pensam e chegam

inclusivamente a verbalizar o seguinte: “Tanto tempo a estudar uma língua e não

sei dizer nada.”

Page 64: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

64

Para além do tempo do previsto nas matrizes curriculares, é também preciso

considerar as oportunidades de exposição à língua fora do contexto de sala de aula. O

acesso a bens culturais como livros, filmes, discos e canais estrangeiros tem também

influência na aprendizagem de uma língua, pois é não só uma forma indireta de

aprendizagem, como aumenta o tempo de exposição à língua. Uma sociedade que

disponibiliza na televisão e no cinema filmes não dobrados aumenta o contacto dos seus

cidadãos com determinada língua. Um aluno de inglês está à partida muito mais exposto

à língua que estuda do que um aluno de alemão.

Page 65: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

65

5. A AQUISIÇÃO DE VOCABULÁRIO

Aquisição e aprendizagem são termos frequentemente utilizados para a expressão

de um mesmo conceito, mas Stephen Krashen fez uma clara distinção entre os dois. De

acordo com este autor a aquisição (acquisition) descreve um processo de aprendizagem

da segunda língua idêntico ao utilizado na aprendizagem da língua materna (8). Este

processo do qual o sujeito raramente está consciente é correspondente à forma natural de

se aprender, não havendo uma preocupação com as questões da forma linguística (Stern

20). Pelo contrário, a aprendizagem (learning) diz respeito a um processo consciente, que

se relaciona fortemente com as regras de uma língua e com a aprendizagem formal da

mesma (Krashen 8; Stern 20). Porém, como refere Stern, esta distinção traz alguns

problemas, uma vez que não coincide com a terminologia utilizada na Psicologia e

provoca uma restrição ao uso do termo aprendizagem, que passa a designar apenas a

aprendizagem escolarizada (20).

A palavra “aquisição”, utilizada neste capítulo, não deve ser encarada no sentido

estrito que Krashen lhe atribui. Refiro-me a aquisição de uma forma geral, pretendendo

englobar a aprendizagem que não é consciente, mas também a que é; a aprendizagem que

surge naturalmente e a que é fruto de um processo formal.

Este capítulo está dividido em duas partes: a primeira pretende perspetivar a

aquisição de vocabulário do ponto de vista do aprendente; a segunda, intitulada O ensino

de vocabulário, assume o ponto de vista do professor, naquilo que este deve saber e fazer

para auxiliar o aluno a melhorar o seu léxico.

5.1. A aprendizagem de vocabulário

Quando pensamos em vocabulário, pensamos imediatamente em palavras. Mas o

que é uma palavra? Como dizem John Morgan e Mario Rinvolucri, cada palavra é um

mundo (10). É na verdade, um mundo com forma e conteúdo, que estabelece relações

com outros mundos.

Page 66: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

66

Existem dois tipos de palavras: gramatical words (palavras como preposições,

conjunções, determinantes, etc) e content words (palavras que transportam uma grande

carga de informação, palavras com significado lexical). O primeiro tipo constitui um

grupo fechado, enquanto o segundo é um grupo aberto, uma vez que não há limite para o

número de novas palavras que podem ser adicionadas (Thornbury 4).

Aprender uma palavra, qualquer que seja o seu tipo, implica, de uma forma muito

geral, aprender o seu significado e a sua forma. É importante referir que aprender

vocabulário não significa unicamente aprender palavras isoladas, mas também language

chunks, que, segundo Harmer, são “unidades pré-fabricadas” (Harmer, 2001b: 21). São

expressões formadas por um grupo de palavras, que são armazenadas na nossa memória e

recuperadas como conjuntos. Podem ser, por exemplo, expressões idiomáticas, phrasal

verbs ou expressões fixas.

5.1.1. O léxico mental

A linguagem que vamos adquirindo, sob a forma de palavra isolada ou de

language chunks, vai ficando armazenada numa “estrutura” em permanente construção –

o léxico mental. De acordo com Ana Bernardo [o] léxico mental designa aquela parte da memória semântica (onde se

armazenam os conceitos) que processa, de forma interactiva e paralela, a informação

fornecida por cada palavra (ao nível gráfico, fonológico, morfológico, sintáctico e

semântico), durante a recepção e a produção linguística, articulando conceito e

significado da palavra aos diferentes níveis, consoante a natureza cognitiva da tarefa que

está a realizar num determinado momento.” (Bernardo 29)

Para Thornbury, o léxico mental é “... é um sistema sobreposto, no qual as

palavras são armazenadas como ‘entradas duplas’ – uma contendo informação sobre o

significado e a outra sobre a forma” (17). Este sistema é como se fosse uma rede de

associações composta por duas macrocomponentes: a forma e o significado. É com base

nestas duas componentes que o nosso conhecimento das palavras é organizado. Palavras

Page 67: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

67

com uma forma semelhante parecem estar interligadas, mas o mesmo acontece com

vocábulos que se relacionam em termos de significado (Thornbury 16-7).

Se as palavras são armazenadas com base na forma e no significado, quererá isso

dizer que lhes podemos aceder através de ambas as vias? Tudo parece indicar que sim,

mas há estudos que sugerem que a via do significado é mais utilizada.

Partindo do princípio de que a rapidez da resposta reflete o sistema lexical,

Freedman e Loftus testaram a teoria pedindo a um grupo de pessoas que realizassem duas

tarefas diferentes: 1) indicar um fruto começado pela letra p; 2) indicar uma palavra

começada por p que fosse um fruto. A resposta à primeira tarefa foi mais rápida que a

segunda. Apesar de ambas as tarefas incluírem aspetos relacionados com o significado e

com a forma, na primeira o enfoque é o significado e na segunda a forma (Gairns &

Redman 88). Os resultados sugerem que o cérebro está mais predisposto para procurar

informação com base no significado do que com base na forma.

Um aprendente não é uma tabula rasa, e antes de iniciar a aprendizagem de uma

língua estrangeira já possui um léxico mental. Mas como se enquadra, então, a

aprendizagem do vocabulário em língua estrangeira? Será que este é incorporado no

léxico mental já existente? Ou será que se cria um léxico mental independente para a

língua estrangeira? Ao afirmar que “[a]prender uma segunda língua implica aprender um

novo sistema conceptual e construir uma nova rede de vocabulário – um segundo léxico

mental”, Thornbury parte do princípio de que a aprendizagem de uma segunda língua

implica a criação de um novo léxico mental (18).

5.1.2. O esquecimento de vocabulário

Se é certo que memorizamos palavras e as integramos no léxico mental, também é

certo que as esquecemos. Segundo Feinstein, de uma forma geral, o esquecimento

manifesta-se através de um processo de eliminação de informações recentes e através da

deterioração das memórias já armazenadas (Feinstein 231), o mesmo se aplicando ao

vocabulário.

Page 68: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

68

Segundo Thornbury os fatores que levam ao esquecimento das palavras são a

ausência de oportunidades para as usar, a interferência de outras aprendizagens e a

reciclagem insuficiente (26). Conforme foi referido no primeiro capítulo, o nosso cérebro

rege-se pelo princípio use it or lose it. O vocabulário não é exceção. Se não usarmos as

palavras, acabamos por as esquecer. Para que isso não aconteça, devemos proporcionar

aos nossos alunos várias oportunidades para usarem o vocabulário aprendido. Estas

atividades não têm de assumir a forma de exercícios de vocabulário, podendo ser

atividades de escrita ou de produção oral, por exemplo.

Note-se, contudo, que a aprendizagem de uma palavra nova, que seja muito

semelhante a outra já aprendida, pode levar ao esquecimento do vocábulo aprendido

anteriormente. Tal como refere Thornbury, “[a]s novas palavras têm o efeito de

‘sobrescrever’ o material previamente aprendido” (26).

Quando se aprende mais do que uma língua estrangeira ao mesmo tempo, há

ainda outra situação interessante a verificar: a interferência provocada pela aprendizagem

de outra língua. De facto, não são raros os casos de alunos que, a meio de uma

composição em inglês, incluem algumas palavras francesas ou palavras inglesas num

texto em alemão. Sempre que aprendizagens prévias interferem com novas

aprendizagens, está-se perante um processo de interferência proativa. O processo inverso,

ou seja, a interferência de novas aprendizagens com aprendizagens antigas, designa-se

por interferência retroativa (Feinstein 232).

5.1.3. Tipos e dimensão de vocabulário

Quem estuda uma língua estrangeira, qualquer que seja, sabe bem que

aprendizagem de vocabulário é um processo contínuo que nunca está concluído. Sabe

também que essa aprendizagem é feita dentro e fora da sala de aula. Está ainda ciente de

que algumas palavras são aprendidas autonomamente e outras com ajuda. E, ainda que

não saiba os termos técnicos para explicar a situação, sabe que há palavras que não é

capaz de usar, mas que é capaz de compreender quando estão em contexto.

Page 69: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

69

A aprendizagem de uma língua pode ser formal, quando se faz em contexto

escolar, ou informal, quando essa aprendizagem é adquirida por contacto com os mass

media, a vizinhança e a família, entre outras situações. Muitas vezes, é da combinação

destas duas formas que resulta a aprendizagem de uma língua estrangeira. Um bom

exemplo disso é o caso da maioria dos alunos portugueses. Há alguns anos, o contacto

com a língua estrangeira resumia-se quase exclusivamente à sala de aula. Atualmente,

com a massificação dos meios de comunicação e a proliferação das novas tecnologias, há

mais oportunidades para a aprendizagem informal (sobretudo no que diz respeito ao

inglês), o que pode interferir de forma positiva na aprendizagem de vocabulário, visto

que os alunos estão mais expostos à língua.

Dentro do contexto formal de aprendizagem de uma língua pode ocorrer a

aprendizagem incidental de vocabulário. A aprendizagem incidental acontece quando

aprendemos vocabulário, apesar do foco da atenção estar numa atividade não designada

para o efeito. É como se fosse um produto colateral de uma atividade diferente.

O nosso conhecimento das palavras pode ser recetivo ou produtivo. O

vocabulário recetivo (ou passivo) diz respeito a itens vocabulares que só reconhecemos e

compreendemos em contexto, enquanto que o vocabulário produtivo (ou ativo) inclui

palavras que conseguimos recordar e usar adequadamente (Gairns & Redman 64-5). Tal

como Scott Thornbury refere, o nosso conhecimento recetivo de vocabulário excede o

produtivo e, normalmente, precede-o. Somos capazes de compreender mais palavras do

que as que proferimos e antes de utilizarmos as palavras, percebemo-las (15).

Sendo certo que o nosso vocabulário recetivo é mais alargado que o produtivo,

podemos refletir um pouco sobre a questão da extensão do vocabulário. No caso do

inglês, Thornbury indica as 2000 – 3000 palavras como um número condizente com um

core vocabulary, ou seja, vocabulário básico (20, 21). De acordo com Murcia “... um

vocabulário básico de cerca de duas mil palavras é responsável por aproximadamente 80

por cento do que ouvimos e vemos” (287). As palavras que integram o core vocabulary

são normalmente hiperónimos, palavras utilizadas para definir outras e palavras com

várias coocorrências (Thornbury 34-5).

A meu ver, do ponto de vista do aprendente, a quantificação não é um aspeto

muito relevante. Se pensarmos em termos práticos, ninguém se põe a contar o número de

Page 70: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

70

palavras que sabe e, no limite, o que conseguiria fazer seria quantificar o seu vocabulário

produtivo. Mas e o vocabulário recetivo?

A dimensão do vocabulário que cada pessoa deve aprender está obviamente

dependente dos seus objetivos e das suas necessidades, que variam com o tempo e com as

situações.

5.1.4. Estratégias para a aprendizagem autónoma de vocabulário

Se é verdade que aprendemos determinadas palavras sozinhos, talvez seja

pertinente questionarmo-nos sobre as estratégias, que de forma autónoma, cada pessoa

pode utilizar para aprender vocabulário. Como é óbvio, não nos referimos à

aprendizagem incidental, mas a uma aprendizagem consciente e deliberada. Gairns e

Redman apresentam três estratégias (76 – 85):

• perguntar a outros – perguntar o significado parece ser a atitude mais

natural quando nos deparamos com uma palavra que não compreendemos.

Se pensarmos numa situação de diálogo, perguntar o que significa

determinada palavra é passível de acontecer quando somos o recetor da

mensagem. No entanto, quando assumimos o papel de emissores, esse

cenário já não se coloca. O mais comum neste caso é a pessoa tentar,

através de uma clarificação do contexto, eliciar o vocábulo. Para clarificar

o contexto a pessoa pode recorrer a gestos e mímica, mas pode também

fazê-lo verbalmente. No entanto, conforme referem Gairns e Redman, os

professores devem fornecer aos alunos meios linguísticos que lhes

permitam utilizar esta estratégia (por exemplo, It’s the thing you use for...

(beating eggs), It’s the place where you... (wait for the doctor)). Se há

pessoas que usam esta estratégia instintivamente, outras precisam de

treinar este mecanismo.

• utilizar o dicionário – a utilização do dicionário permite a aprendizagem

autónoma de vocabulário dentro e fora da sala de aula. Este é um

Page 71: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

71

instrumento valioso que nos pode dar muita informação, quando bem

utilizado; torna-se pois necessário treinar os alunos no seu uso. Tal como

diz Virginia Allen, os dicionários são passaportes para a independência

(83).

Para crianças recomenda-se o uso de picture dictionaries.

• inferir o significado através do contexto – deduzir o significado de uma

palavra através do contexto ou mesmo através da própria palavra

(decompondo-a em unidades menores, identificando afixos...) é uma

estratégia óbvia para determinadas pessoas, mas não para outras. Segundo

Celce-Murcia, “[f]azer a transição para uma aprendizagem independente

pode ser mais fácil e mais eficaz se os professores ajudarem os alunos a

aprender a reconhecer pistas para a inferência do significado de palavras

através do contexto” (290). Assim sendo, o professor deve promover

atividades que permitam aos alunos ir treinando este trabalho dedutivo.

De acordo com Gairns e Redman, uma forma de o fazer é através da

substituição de um item em particular por uma nonsense word, para que os

alunos se possam focar nos elementos que o contexto fornece e descobrir

qual a palavra em falta.

T

a

b

e

l

a

2

0

Quando faço este tipo de atividade com os meus alunos,

costumo escolher a palavra banana/Banane para nonsense word.

Todos os alunos conhecem a palavra e estranham imediatamente a

sua ocorrência no texto (como é óbvio, não a utilizo em textos

relacionados com a alimentação.)

Outra hipótese é assinalar determinada palavra num texto e

fornecer ao aluno várias alternativas, sendo apenas uma delas

correspondente ao verdadeiro significado. Verifica-se que este tipo

de atividade é cada vez mais sugerido nos manuais e aparece

recorrentemente nos testes intermédios de inglês.

Page 72: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

72

Para trabalhar a inferência de vocabulário com young learners, Sarah

Phillips apresenta uma sugestão interessante: os alunos leem um texto

maioritariamente na sua língua materna, mas com algumas palavras da

língua estrangeira à mistura. Posteriormente, sozinhos ou com a ajuda do

professor, deverão inferir o significado das palavras em língua estrangeira

(71).

Os alunos podem ainda manter cadernos de vocabulário que vão completando

com as palavras que vão aprendendo formal e informalmente. O caderno pode estar

organizado em forma de lista ou conter elementos com maior impacto visual. Listar

vocabulário acompanhado do equivalente na língua materna é a forma mais tradicional de

elaborar um caderno de vocabulário, mas não necessariamente a mais eficaz, pois como

se verá mais à frente a tradução tem várias limitações. Mais aconselhável seria, como

sugerem Gairns e Redman, colocar a palavra acompanhada de informação gramatical

(quando relevante), de uma breve explicação e de uma frase-exemplo clara e ilustrativa

do significado da palavra em questão. A listagem de vocabulário pode ser feita por temas

ou por ordem alfabética. O caderno de vocabulário pode também ser uma coleção de

mind maps, de diagramas do tipo spidergram ou de outros tipos e ainda em forma de

árvore.

Apesar de este ser um trabalho que o aprendente pode autonomamente fazer, o

professor deve mostrar aos alunos as várias formas de construir um caderno de

vocabulário. Pode, por exemplo, utilizar mind maps nas aulas e explicar aos alunos como

podem criar os seus.

Os mind maps são ótimos instrumentos de trabalho. Têm muita cor e criam um

impacto visual forte, o que só por si chama a atenção, além do que assentam numa rede

de associação de ideias, um pouco à semelhança das redes neuronais que o nosso cérebro

constrói. É curioso notar que o aspeto de um mind map se parece muito com o da

estrutura de um neurónio.

Ao elaborarmos um mind map, devemos escrever no centro o assunto principal e,

preferencialmente, associar-lhe uma imagem. A partir do centro saem ramos onde são

registadas informações importantes. Estes ramos ainda se dividem em ramificações mais

finas destinadas à informação menos relevante. Os mind maps podem constituir um

Page 73: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

73

instrumento de trabalho privilegiado para sujeitos com uma forte inteligência visual. Vejo

esta ferramenta como mais adequada para adolescentes e adultos, mas pode também ser

utilizada por young learners quando reduzida a um nível elementar.

Para young learners, a elaboração de picture dictionaries pode ser uma alternativa

ao uso de cadernos de vocabulário, uma vez que grande parte do léxico que aprendem é

concreto. Estes dicionários por imagens devem preferencialmente ser construídos pelos

alunos de forma autónoma, mas até que eles sejam capazes o fazer será necessária

orientação do professor. À semelhança dos cadernos de vocabulário, os glossários podem

tornar-se valiosos instrumentos de aprendizagem.

Normalmente uso mind maps quando pretendo introduzir um tema novo

através de brainstorming. À medida que as ideias dos alunos vão surgindo, vou

criando no quadro o mind map com as palavras-chave que as traduzem. No entanto,

também já utilizei esta técnica para construir um resumo da matéria lecionada.

Quando ensinava um módulo técnico de inglês comercial a uma turma de

adultos, pensei que seria uma boa ideia propor-lhes a elaboração de um

glossário. No final de cada aula, depois de discutirmos quais as entradas do

glossário para aquele dia, reservava algum tempo para a elaboração da tarefa. No

fim do módulo, todos os formandos concordaram que o glossário havia sido uma

mais-valia. Baseando-me nesse feedback, quando lecionei o mesmo módulo a

jovens, resolvi adotar a mesma estratégia, que mais uma vez se revelou muito

positiva. No módulo seguinte, com a mesma turma, não exigi a elaboração de

um glossário, mas, para minha surpresa e satisfação, deparei-me com alguns

alunos a criarem o seu próprio glossário. Quantas mais estratégias dermos a

conhecer aos alunos, mais preparados eles estarão para selecionarem aquelas que

se adaptam ao seu estilo de aprendizagem.

Page 74: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

74

Os alunos podem igualmente utilizar word cards, que consistem em cartões que

de um lado têm a palavra em língua estrangeira e do outro o correspondente em língua

materna. Podem também ter de um lado a palavra e do outro a ilustração ou, então, de um

lado a palavra e do outro informações gramaticais (como, por exemplo, no caso dos

verbos irregulares, de um lado está o infinitivo e do outro o passado e o particípio

passado). Os word cards podem ser feitos pelos alunos ou fornecidos pelo professor e

utilizados por aprendentes de qualquer faixa etária.

5.2. O ensino de vocabulário

Em contexto escolar, como o tempo de exposição à língua é limitado e existem

outros tipos de constrangimentos (como por exemplo o cumprimento das exigências dos

programas), não podemos deixar o vocabulário ao acaso e partir do princípio de que os

alunos o aprenderão somente de forma incidental (Gairns & Redman 1). É tarefa do

professor fazer um trabalho prévio de seleção de vocabulário e de planificação de

atividades para utilização do mesmo. Não obstante a importância da aprendizagem

Pessoalmente, acho que esta é uma estratégia interessante, ainda que lhe

reconheça uma grande limitação – a descontextualização. Enquanto aluna,

utilizei-a pela primeira vez para aprender os verbos irregulares em alemão. Dessa

vez os word cards não foram feitos por mim, mas antes fornecidos pelo professor.

Já cheguei a levar a minha caixinha dos verbos irregulares para a aula, no sentido

de motivar os alunos a tentarem esta estratégia, mas não funcionou. Pensando

bem, se o meu professor de alemão não tivesse fornecido os cartões, talvez nunca

tivesse experimentado esta estratégia, o que me leva a concluir que, de futuro, o

melhor será disponibilizar aos alunos os word cards.

Page 75: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

75

incidental, o professor deve agir deliberadamente no que diz respeito ao vocabulário, não

descurando a liberdade do aluno de escolher as palavras que quer ou precisa de aprender.

5.2.1. A seleção de vocabulário

Mas, então, que vocabulário devemos ensinar? Que parâmetros deveremos ter em

conta aquando da sua seleção? O critério geral utilizado na seleção de vocabulário é a sua

utilidade. O conceito de utilidade é muito subjetivo e variável, o que é útil para uns não é

para outros. Como operacionalizar este critério geral? John Potts indica dois aspetos

importantes a considerar (38):

• a frequência (frequency) – palavras que são utilizadas mais

frequentemente que outras serão, à partida, mais úteis. Dicionários como o

Duden online já fornecem informação sobre a frequência das palavras. É

óbvio que a questão da frequência de determinada palavra tem de ser

articulada com o propósito do ensino da língua estrangeira. A palavra

alemã Kompresse (compressa) é assinalada no referido dicionário como

sendo de baixa frequência; no entanto, em contexto médico, é muito

comum. Num curso de alemão para fins específicos, vocacionado para a

área da medicina, seria fundamental selecionar esta palavra.

No caso do sistema português de ensino público, no qual a carga horária

atribuída ao inglês e ao alemão é manifestamente reduzida, considero de

primordial importância o trabalho do professor na planificação do ensino do

vocabulário. Regra geral, do 1.º ao 11.º anos de escolaridade, os alunos têm apenas

duas aulas de língua estrangeira por semana e, em alguns casos, apenas uma. Em

virtude desta situação, devemos tirar o máximo partido do tempo que temos

disponível e ser altamente intencionais no nosso trabalho, o que não significa que

não haja espaço para a aprendizagem incidental.

Page 76: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

76

• e o espetro de utilização (range) – há palavras que têm um espetro de

utilização mais alargado e que, portanto, são mais úteis. A palavra thin

serve mais propósitos do que slender.

Gairns e Redman fazem referência a outros aspetos merecedores da nossa atenção

(59-64):

• fatores culturais (cultural factors) – há palavras que são muito relevantes

em determinadas culturas, mas não em outras. Por exemplo, as nove

palavras diferentes que os esquimós usam para designar “neve” e “gelo”

não têm grande valor para quem vive nos trópicos.

• necessidade e nível (need and level) – uma pessoa que está a aprender

alemão porque vai emigrar para a Alemanha para trabalhar como

enfermeira/o tem necessidade de aprender vocabulário diferente de alguém

que quer aprender a língua porque vai fazer turismo. O tipo de vocabulário

a selecionar deve ser ajustado ao nível dos alunos. Alunos de iniciação

precisam de vocabulário elementar, mas à medida que vão progredindo na

aprendizagem da língua, vai sendo necessário o ensino de léxico mais

complexo.

• conveniência (expediency) – a aprendizagem de determinados itens

lexicais é muito conveniente para o próprio desenrolar da aula; um

exemplo disso é a terminologia gramatical e o vocabulário relativo às

instruções.

Em algumas formações que dei a adultos era totalmente responsável pela

escolha de conteúdos temáticos, pelo que grande parte da seleção de vocabulário

era feita por mim. Refletindo sobre as decisões que tomei, chego à conclusão de

que nem sempre foram as melhores, pois não respeitei todos os aspetos acima

referidos. Por vezes, seguimos a tendência natural de ensinar o que nos foi

ensinado e da forma como nos foi ensinado. Atualmente, seria mais criteriosa, já

que estou mais consciente dos aspetos que devem reger a escolha de vocabulário.

Page 77: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

77

No ensino regular, parte da seleção de vocabulário é feita pelos autores dos

manuais. Segundo Scott Thornbury, esta seleção é normalmente feita de acordo com os

seguintes fatores: usefulness (utilidade), frequency (frequência), learnability (facilidade

em ser aprendido) e teachability (facilidade em ser ensinado) (34). Uma vez que os dois

primeiros itens já foram analisados, centrar-me-ei agora nos últimos dois.

Há palavras, que pela sua semelhança com a língua materna, são muito fáceis de

aprender, como por exemplo hospital. Mas haverá necessidade de palavras desta natureza

serem alvo de uma seleção? Não serão elas aprendidas pelos alunos de forma incidental?

Será a learnability um critério verdadeiramente relevante?

Teachability consiste na facilidade de ensinar uma palavra. Uma palavra é mais

fácil de ensinar quando é possível demonstrá-la ou ilustrá-la. Julgo que só faz sentido

considerar este critério quando a palavra satisfaz outros requisitos como frequência,

espetro de utilização, necessidade e nível. Na minha perspetiva, teachability por si só não

é um parâmetro suficientemente relevante. Qual a vantagem de selecionar uma palavra

pelo facto de ser fácil de ensinar, se esta não se revela necessária para os alunos?

Grande parte da seleção de vocabulário é feita pelos autores dos manuais, mas

estes são alheios à especificidade de cada meio escolar, pelo que cabe ao professor fazer

uso da máxima adapt, don’t adopt. Não se pode viver uma “ditadura do manual”.

Depois de feita a seleção do vocabulário, o professor deve ainda decidir

relativamente aos itens lexicais que deverão fazer parte do conhecimento produtivo e aos

que ficarão apenas como conhecimento recetivo (Gairns &Redman 54-65). Como é claro,

nada pode garantir que haja uma correspondência entre a decisão que o professor faz e o

que, de facto, acontece. Esta decisão é importante para o professor planear o seu trabalho.

Os itens selecionados para integrar o vocabulário produtivo dos alunos serão alvo de um

trabalho mais intenso, de forma a que os alunos os possam utilizar frequentemente.

5.2.2. Fontes de vocabulário em contexto de sala de aula

Numa sala de aula, a que materiais se pode recorrer para alargar o vocabulário?

Scott Thornbury menciona os manuais, o professor, os alunos, os livros de vocabulário,

Page 78: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

78

as listas de vocabulário, textos curtos, livros de histórias, dicionários e corpora como

possíveis fontes de vocabulário (32-74).

Os manuais, o professor e os alunos são fontes evidentes de vocabulário numa

aula. Os livros de vocabulário não são usualmente utilizados na aula, mas podem

constituir um ótimo instrumento de trabalho autónomo e um recurso que o professor

utiliza na elaboração de fichas de trabalho. English Vocabulary in Use e English

Vocabulary Organiser são bons exemplos de livros deste género em língua inglesa.

As listas de vocabulário como um material de trabalho fornecido pelo professor

aos alunos caíram um pouco em desuso. Uma das desvantagens das listas é que o

vocabulário não está contextualizado. Normalmente consistem em duas colunas, uma

com as palavras na língua estrangeira e outra com os equivalentes na língua materna. Ora,

este tipo de lista não requer qualquer trabalho por parte do aluno, a não ser a

memorização. O aluno não tem de tomar nenhuma decisão quanto ao significado das

palavras e, quanto mais este tiver de pensar sobre o significado da palavra, maior será a

probabilidade de esta ficar gravada na sua memória. Contudo, o uso de listas de

vocabulário também tem as suas vantagens, pois permite aos alunos testarem-se a si

próprios e adquirirem muitas palavras num curto espaço de tempo. “Alguns

investigadores estimam que possam ser aprendidas deste modo até trinta palavras por

hora.” (Thornbury 33).

Eu já experimentei a utilização de listas de vocabulário. Tinha uma turma de

11.º ano com fraco aproveitamento à disciplina de inglês. Antes de iniciar a unidade

relativa ao tema “Ambiente”, resolvi dar aos alunos uma lista de vocabulário.

Percorri a unidade no manual e fiz um levantamento de palavras importantes

relacionadas com o tema. Para além das palavras que recolhi do manual, decidi

incluir outras que considerava relevantes. Elaborei, então, uma lista de vocabulário

com duas colunas, uma em inglês e outra em português, mas sem correspondência

direta. Em trabalho de pares, foi tarefa dos alunos fazer corresponder as expressões

portuguesas às inglesas. Posteriormente foi feita a correção do exercício. Esta

atividade tinha um duplo objetivo: 1) ensinar vocabulário relevante que apareceria

nos textos a trabalhar na unidade, de maneira a simplificar um pouco as atividades de

leitura (de que os alunos não gostavam e nas quais tinham muitas dificuldades); 2)

fornecer aos alunos uma compilação de vocabulário, de fácil consulta, a que

pudessem recorrer em caso de dúvida.

O balanço global da atividade não foi muito positivo, pois verifiquei que esta

Page 79: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

79

Os textos curtos são fontes privilegiadas de vocabulário. O facto de as palavras

estarem em contexto e de o seu tamanho permitir um trabalho mais pormenorizado são os

seus maiores benefícios. Para além dos textos presentes no manual, o professor pode

selecionar outros que considere importantes. Tal como refere Thornbury, os textos podem

ser escritos ou orais, ser mais ou menos formais e de vários géneros (desde artigos de

revistas a textos literários) (54-6).

Os livros de histórias, sejam eles autênticos ou adaptados (readers), também

proporcionam o contacto com palavras em contexto. Ao longo de um livro, o leitor vai

deparar-se várias vezes com as mesmas palavras. Não há forma mais natural de repetição.

nos textos a trabalhar na unidade, de maneira a simplificar um pouco as atividades de

leitura (de que os alunos não gostavam e nas quais tinham muitas dificuldades); 2)

fornecer aos alunos uma compilação de vocabulário, de fácil consulta, a que pudessem

recorrer em caso de dúvida.

O balanço global da atividade não foi muito positivo, pois verifiquei que esta

resultou apenas com os bons alunos, com os quais outras atividades teriam tido o

mesmo tipo de efeito. Os alunos com fraco aproveitamento, que eram a minha maior

preocupação no momento, não beneficiaram muito da lista de vocabulário. A

experiência que tenho como aluna de línguas e enquanto professora (através do que

observo) leva-me a concluir que as listas de vocabulário funcionam bem como

instrumento de estudo, especialmente quando são feitas pelos alunos.

Durante o período de estágio criei com as minhas três colegas e a Orientadora

de Inglês uma Biblioteca de Turma para o 7.º ano. Com dinheiro que o núcleo de

estágio anterior e o nosso haviam angariado, comprámos livros suficientes para que

todos os alunos pudessem ler um. A experiência foi muito interessante. Verificámos

que a maioria dos alunos lia de facto os livros e que gostava de o fazer. Trocavam

inclusivamente impressões uns com os outros, recomendando os livros de que

tinham gostado aos colegas mais próximos. É difícil avaliar o vocabulário que

aprenderam com as suas leituras, mas a verdade é que no momento de trabalhar a

leitura extensiva, não tiveram grandes dificuldades.

Page 80: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

80

Os dicionários podem ser uma fonte muito rica de vocabulário, mas é necessário

que os alunos estejam treinados no seu uso. Alunos de níveis mais elementares poderão

usar dicionários bilingues, enquanto alunos de níveis mais avançados deverão trabalhar

com dicionários unilingues. Sendo possível, devemos dar preferência ao trabalho com

dicionários unilingues, pois tal como Scott Thornbury observa, “[a]o sugerirem uma

correspondência de um para um entre palavras na L1 e na L2, eles [os dicionários]

normalmente simplificam as questões” (61).

aprenderam com as suas leituras, mas a verdade é que no momento de trabalhar a

leitura extensiva, não tiveram grandes dificuldades.

A utilização de dicionários, monolingues e bilingues, era amplamente

trabalhada na extinta disciplina de Técnicas de Tradução de Inglês (T.T.I.).

Atualmente, no caso do inglês, é sobretudo nos manuais escolares do 10.º ano

que a utilização de dicionários monolingues é contemplada e não de forma

muito aprofundada.

O programa de 10.º ano da disciplina é demasiado extenso e, muitas

vezes, esta questão é vista en passant. Futuramente, não hesitarei em dedicar

uma aula inteira ao uso do dicionário, pois a sua correta utilização não só dá aos

alunos um elevado grau de autonomia como também possibilita economizar

tempo em determinadas atividades.

No caso do alemão é importante que, desde cedo, se ensine os alunos a

trabalhar com o dicionário, pois poderão recorrer a este instrumento para

consultar o género e o plural das palavras.

Page 81: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

81

Os corpora, que se tornaram mais acessíveis graças às novas tecnologias,

permitem-nos perceber se um vocábulo é muito ou pouco frequente, quais as suas

coocorrências mais comuns e fornecem exemplos da sua utilização em contexto. Nunca

trabalhei com corpora, mas será uma hipótese a explorar com turmas mais avançadas.

Na sua enumeração das fontes de vocabulário em sala de aula, o autor não

considera outros materiais, como jogos ou cartazes, que podem constituir um manancial

interessante de vocabulário.

Quando pensamos em ensinar vocabulário, não temos de recorrer imediatamente à

palavra escrita. Uma canção pode servir como fonte de novo vocabulário, bem como

qualquer outro tipo de texto oral. O vídeo, quer seja sob a forma de cinema ou de

documentário, pode ser um ótimo recurso. Na sociedade em que vivemos não podemos

esquecer ainda o contributo das novas tecnologias. Quando devidamente utilizada, a

Internet pode constituir uma fonte riquíssima de vocabulário. De simples jogos de

legendagem ou de procura de pares a webquests sobre determinados temas, há um mundo

de possibilidades ao nosso dispor. Com young learners uma atividade tão simples como

pesquisar um animal para cada letra do alfabeto pode ser um ótimo exercício para

melhorar não só o seu vocabulário, mas também o seu conhecimento do mundo.

5.2.3. Aspetos a ter em conta no ensino de vocabulário

Depois de selecionado o vocabulário há uma questão que se impõe: Quantas

palavras devemos ensinar numa aula? Do ponto de vista do professor, considero

importante a quantificação, pois esta serve como um guia orientador do seu trabalho e

auxilia na delineação de um objetivo.

Gairns e Redman sugerem que numa aula de 60 minutos sejam, em média,

apresentados 8 a 12 itens vocabulares a integrarem o conhecimento produtivo. A

variabilidade no número de itens lexicais é condicionada por fatores como a facilidade de

ilustrar o seu significado, a semelhança da palavra com o equivalente na língua materna,

Page 82: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

82

o contexto de aprendizagem (o tipo de curso, a hora em que decorre a aula...), o objetivo

do professor para a aula e o tempo disponível para treinar o vocabulário (66-8).

A quantidade de palavras a ensinar não precisa de ser sempre igual, até porque as

aulas não têm sempre a mesma duração e os alunos vão evoluindo. É importante que o

professor vá testando o número de palavras que cada turma consegue absorver, não se

ficando pelas primeiras impressões.

Cada palavra agrega uma multiplicidade de aspetos, que se prendem com a forma

e o conteúdo. O que implica, então, o ensino de uma palavra? Que aspetos devem ser

ensinados?

De acordo com Penny Ur (60-3), devemos ensinar

• a pronúncia e a ortografia – o aluno deve aprender a pronunciar e escrever

corretamente a palavra. Relativamente à pronúncia é necessário ter em

conta não só os sons que constituem a palavra, mas também o acento

tónico. Segundo Lynne Cameron, os alunos devem “... ouvir uma palavra

de forma isolada, bem como integrada no contexto de discurso para que se

possam aperceber dos sons no início e no final, do acento tónico da

palavra e das sílabas que compõem a palavra” (86).

A que devemos expor o aluno primeiro? À forma escrita ou à forma oral

da palavra? Como aponta Thornbury, tradicionalmente crê-se que os

alunos devem contactar com a forma oral primeiro, pois uma exposição

prematura à forma escrita pode condicionar a pronúncia correta da

Para adolescentes e adultos considero o limite mínimo proposto por estes

autores razoável, mas o limite máximo parece-me um pouco excessivo. Tratando-

se de crianças, acho as 8 palavras um número elevado, dado que a capacidade da

memória de funcionamento de uma criança é mais reduzida do que a de um adulto.

Quando trabalhava com crianças optava normalmente por cinco palavras e ia

depois avaliando a reação dos alunos para perceber se devia aumentar ou reduzir

este número.

Page 83: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

83

palavra. No entanto, há quem argumente que, uma vez que o contacto com

a forma escrita é inevitável, o melhor é fazê-lo logo de uma vez. Acresce

ainda o facto de a forma escrita poder fornecer pistas sobre o significado

do vocábulo, que a forma oral poderá não oferecer (86-7).

No caso dos young learners entendo que os alunos devem ser primeiro

expostos à forma oral, pois em muitos casos estão ainda a aprender a ler e

a escrever na sua língua materna e tenderão a pronunciar as palavras de

acordo com as regras que aprenderam para ler a sua língua. Quanto aos

adultos e aos adolescentes, estando eles já seguros do seu próprio código

linguístico, creio que ambas as possibilidades fazem sentido, desde que

surjam naturalmente do contexto de sala de aula.

• a gramática – devemos alertar os alunos para a gramática de uma palavra

quando esta não é óbvia ou regular (como é o caso do passado e particípio

passados dos verbos irregulares, plurais irregulares, etc) e também para a

possibilidade de algumas palavras integrarem classes gramaticais

diferentes (a palavra photograph pode ser um nome ou um verbo). No

caso do alemão, o género da palavra deve ser fornecido aquando da

explicação da mesma.

• as coocorrências (collocations) – a coocorrência diz respeito à

possibilidade de unidades linguísticas ocorrerem em combinação umas

com as outras. Quando ensinamos um item lexical novo, podemos chamar

a atenção dos alunos para as situações de coocorrência mais frequentes

dessa palavra.

• os aspetos do significado – relativamente a este ponto, há que considerar a

denotação, a conotação e a adequação (appropriateness). Devemos tornar

claro o significado literal e primário de uma palavra (denotação), mas

também as associações ou sentimentos, positivos ou negativos, que essa

palavra evoca (conotação) (Ur 61). A adequação de uma palavra está

relacionada com o seu grau de formalidade, com o registo em que é

utilizada e com a variedade (British English ou American English) (Potts,

jan. 2011: 38).

Page 84: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

84

Relações de significado como a sinonímia, a antonímia, a hiponímia, a

hiperonímia e a tradução podem ser úteis no ensino de uma palavra, pois

como refere Harmer “[o] que uma palavra significa é frequentemente

definido pela relação que esta estabelece com outras palavras” (2001b:

18).

• a formação da palavra – no caso de alguns itens lexicais, explicar a sua

formação pode ser um grande contributo para a clarificação do seu

significado e simplificar a apreensão da sua ortografia. No caso do ensino

da língua alemã, que tem tantas palavras compostas, este aspeto assume

grande importância. Tomemos como exemplo a palavra der

Haustürschlüssel: se explicarmos aos alunos que esta palavra pode ser

subdividida em outras três Haus (casa) + Tür (porta) + Schlüssel (chave), a

sua compreensão e pronúncia tornam-se mais fáceis. Estando ciente da

forma como a palavra é composta e sabendo escrever corretamente cada

uma das três unidades que a compõem, o aluno não terá dificuldades com

a sua ortografia.

No seu artigo Preparing to teach... Vocabulary 1, John Potts faz ainda referência

a outro aspeto a ter em conta no ensino de uma palavra: a atualidade (currency) (38). Na

verdade, palavras outrora comuns são hoje consideradas antiquadas.

Nem tudo aquilo que foi mencionado é relevante no ensino de todas as palavras.

Por exemplo, não há nada de significativo a dizer sobre a gramática ou formação da

palavra apple. Julgo que, na maioria das vezes, não faz sentido explicar todos os aspetos

de um item lexical de uma vez só. Se o fizéssemos sempre, passaríamos aulas inteiras

apenas a explicar vocabulário.

Como em tudo na prática letiva, o bom senso e a razoabilidade devem ser os guias

do professor. Este deve refletir continuamente sobre o seu trabalho com alunos, para

poder tomar as decisões mais adequadas. Assim, perante uma turma, e no que diz respeito

à explicação de vocabulário, não pode esquecer-se de perguntar a si mesmo: Que tipo de

alunos tenho perante mim? Compreenderão todos os pontos da explicação? Em que

contexto surgiu a palavra? Posso fazer uma “pausa” para uma explicação mais

Page 85: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

85

detalhada ou vou quebrar o ritmo da aula? A palavra é assim tão importante que

justifique despender tempo numa explicação mais pormenorizada?

Quando ensinamos crianças devemos concentrar-nos especialmente na pronúncia

e significado denotativo. Dependendo da idade e grau de escolaridade dos alunos,

podemos também centrar-nos na questão da ortografia. Aspetos como a gramática e a

conotação da palavra fazem sentido apenas para crianças mais velhas. A questão da

formação das palavras pode ser abordada, mas sem entrar em terminologia específica,

pois, em muitos casos, ainda não a terão aprendido na língua materna. Qualquer decisão

está, naturalmente, dependente da avaliação que o professor faz relativamente à idade,

grau de escolaridade e maturidade dos alunos. No trabalho com adolescentes e adultos

qualquer um dos aspetos poderá ser abordado.

5.2.4. Apresentação e explicação de vocabulário

Como apresentar o vocabulário e explicar o seu significado? Esta é a pergunta que

se impõe depois de se saber quais as palavras a ensinar e quais os aspetos de forma e

conteúdo a realçar.

Uma forma sistematizada de apresentar vocabulário aos alunos é através de

grupos de itens lexicais, que se relacionam entre si. A relação pode ser semântica,

fonológica ou gramatical. Gairns e Redman sugerem várias formas de agrupar itens

lexicais (69-72):

• itens relacionados por tópico ou por atividade ou processo;

• itens com significado semelhante;

• itens que formam pares;

• itens ordenados numa escala;

• itens agrupados por famílias de palavras;

• itens agrupados por semelhança gramatical ou nocional;

• itens organizadores de discurso;

• itens idiomáticos;

Page 86: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

86

• itens agrupados por dificuldade fonológica ou de ortografia;

• itens agrupados por estilo;

• itens difíceis para alunos de determinada nacionalidade;

• exploração de um item através dos seus vários significados.

Utilizar isoladamente as formas de apresentação acima referidas pode levar o professor a

incorrer no erro da atomização da linguagem. A existência de um contexto é fundamental

para a aprendizagem de vocabulário, pois ativa as redes neuronais existentes, criando

uma plataforma para a acomodação da nova informação.

Para conhecer uma palavra é essencial compreender o seu significado, o que os

alunos nem sempre conseguem de forma autónoma. Penny Ur apresenta a definição, a

descrição detalhada, a utilização de exemplos, a ilustração, a demonstração, o contexto, a

sinonímia, a antonímia e a tradução como formas de apresentar o significado de novos

itens (63).

A técnica da definição verbal é mais adequada ao trabalho com adolescentes e

adultos. Dependendo do nível em que os alunos se encontram, esta técnica deverá ser

utilizada de forma cautelosa. Alunos de um nível elementar poderão ainda não possuir

conhecimento linguístico suficiente que lhes permita entender uma definição em língua

estrangeira. Ao definir uma palavra ou expressão, o professor deverá ter o cuidado de

usar linguagem que os alunos consigam entender. Scott Thornbury faz referência a um

subtipo de definição verbal, através da qual o professor, de forma segmentada, vai

utilizando frases curtas com a palavra em questão. Esta técnica, denominada layered

definition (definição por estratos), permite aos alunos irem gradualmente construindo o

significado enquanto vão repetidamente ouvindo a palavra (83).

Quando possibilitamos à criança ver ou sentir o objeto a que uma palavra se refere

estamos perante uma definição ostensiva. Esta técnica é frequente com young learners,

porque com estas idades se trabalha sobretudo vocabulário concreto. Porém, como refere

Cameron, o tipo de palavras que as crianças conseguem aprender vai mudando. As

crianças mais novas precisam de vocabulário muito concreto, que se relacione com

objetos que eles podem manipular ou ver, enquanto que as crianças mais velhas já são

capazes de lidar com conceitos mais abstratos (Cameron 81).

Page 87: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

87

A utilização de exemplos é muito eficaz quando o professor recorre a situações

conhecidas dos alunos ou a frases exemplificativas de fácil compreensão. Esta técnica

pode ser utilizada com alunos de qualquer grupo etário.

A ilustração do significado de uma palavra através de imagens permite uma

grande economia de tempo, porque com uma intervenção reduzida do professor o sentido

da palavra é de imediato apreendido.

O mesmo acontece com a demonstração através de gestos e mímica. No caso da

apresentação de vocabulário relativo a ações, a utilização deste tipo de técnica é, muitas

vezes, a melhor opção, pois é uma forma rápida e bastante esclarecedora de explicar um

significado. É importante referir que a utilização de gestos e mímica ativa dois tipos de

inteligência: a visual (a mímica gera imagens com impacto visual) e a quinestésica

(quando vemos um movimento, ainda que não o façamos, o nosso cérebro já se preparou

para o copiar (Blakemore & Frith 161)).

Embora as duas últimas técnicas (ilustração e demonstração) possam ser usadas

com qualquer faixa etária, regra geral adequam-se mais a classes de níveis elementares,

pois a linguagem alvo de estudo é mais concreta e, portanto, mais fácil de ilustrar ou

demonstrar.

Ao inserirmos uma palavra num contexto claro e definido, o seu sentido torna-se

evidente. O uso do contexto para clarificar o significado é possível com crianças,

adolescentes e adultos. Esta prática obriga os aprendentes a um esforço mental, uma vez

que os alunos têm de compreender o contexto e estabelecer associações para chegarem à

palavra pretendida. Tal como sublinha Cameron, “[a] quantidade de trabalho mental

exercido pelo aprendente afeta a forma como a palavra é gravada na memória: quanto

mais os aprendentes têm de pensar sobre a palavra e o seu significado, mais provável será

estes lembrarem-se dela” (85).

A utilização de sinónimos para explicitar o significado de palavras novas tem a

vantagem de evitar a utilização da língua materna, ser rápida e reativar vocábulos já

conhecidos dos alunos. Deve-se, no entanto, alertar os alunos para o facto de que não

existem sinónimos totalmente coincidentes. Por exemplo, as palavras lift e elevator têm o

mesmo referente, mas a primeira faz parte do inglês britânico e a segunda do inglês

americano.

Page 88: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

88

A explicação de uma palavra através do seu antónimo traz os mesmos benefícios

que a sua explicação através de um sinónimo. O professor poderá recorrer à utilização de

antónimos complementares (como por exemplo dead e alive, já que a afirmação de um

implica a negação do outro,), graduais (a relação de oposição é estabelecida através de

uma escala de valores) ou conversos (a relação de oposição é construída a partir de dois

pontos de vista diferentes, por exemplo Vater (pai) e Sohn (filho)).

O recurso à sinonímia e à antonímia é apropriado para qualquer aluno (criança,

adulto ou adolescente). A condicionante desta prática não se relaciona com a idade dos

alunos, mas com o seu nível, dado que podem não possuir o vocabulário necessário para

compreender a explicação do professor.

A tradução é talvez a técnica mais rápida para tornar claro o significado de uma

palavra. Quando o professor dispõe de pouco tempo, o recurso à tradução pode ser uma

boa escolha. Porém, esta técnica deve ser utilizada com algum cuidado, porque pode

conduzir a um uso excessivo da língua materna e, também, porque não havendo

equivalências exatas, a tradução nem sempre é precisa (facto para o qual os alunos devem

ser alertados). Quando um professor usa a tradução, retira ao aluno a possibilidade de

fazer um esforço mental para chegar ao significado da palavra. Para além disso, a

utilização frequente da tradução pode impedir que os alunos criem um léxico mental

independente para a língua estrangeira, acedendo às palavras dos seus equivalentes na

língua materna, em vez de o fazerem diretamente (Thornbury 77).14

Outra forma de os alunos compreenderem o significado de uma palavra é através

da eliciação (elicitation) e também do peer teaching, conforme aponta Thornbury (87-9).

Na primeira técnica, o professor leva os alunos ao significado da palavra-alvo através de

uma série guiada de perguntas; na segunda, os alunos explicam os significados uns aos

outros dentro do contexto de uma atividade. O jogo Forbidden Word pode ser uma forma

interessante de desenvolver peer teaching.15 Atividades do género de Half-a-Crossword

14 No livro Teaching Languages to Young Learners, Cameron faz uma observação pertinente: por vezes, os professores têm o hábito de explicar o significado de uma palavra através de imagens ou outras técnicas, mas logo em seguida traduzem a palavra para a língua materna. Os alunos acabam por se aperceber deste hábito e deixam de prestar atenção à explicação inicial, pois sabem que a seguir vem a tradução (que dá muito menos trabalho!) (86). 15 O jogo Forbidden Word (Palavra Proibida) é normalmente jogado em equipas. Um elemento da equipa recebe um cartão com uma palavra, que os restantes elementos terão de adivinhar. Para auxiliar os colegas

Page 89: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

89

proposta por Peter Watcyn-Jones, que assentam numa lacuna de informação (information

gap) prestam-se bem a este fim.

Todas estas técnicas podem ser desenvolvidas isoladamente ou de forma

conjugada, reforçando-se umas às outras. É possível utilizar-se ao mesmo tempo um

exemplo e um objeto real ou associar imagens a uma definição verbal.

Não nos podemos esquecer de que aprender uma palavra implica aprender o seu

conteúdo e a sua forma. Para realçar a maneira correta de pronunciar uma palavra, o

professor pode recorrer a drills e a explicações no quadro. Pode utilizar-se listening

drills, que levam a que o aluno ouça várias vezes a mesma unidade lexical, e também

oral drills, que podem ser individuais ou em coro. Há ainda a hipótese de os alunos

repetirem a palavra sem verdadeiramente a vocalizarem – mumble drill –, o que parece

ser uma técnica utilizada por alunos bem sucedidos. Em cada repetição, o professor pode

ir chamando a atenção para as sílabas que constituem a palavra, nomeadamente para a

sílaba tónica. Outra forma de o fazer é no quadro, através da divisão silábica e do recurso

a símbolos para marcar a tónica (Thornbury 85).

5.2.5. Aspetos que facilitam a memorização de vocabulário

O objetivo de qualquer professor é que os alunos armazenem na memória de

longo prazo as palavras que vão aprendendo. Mas o que podemos, então, fazer para

ajudar os alunos a “gravarem” o vocabulário na memória de longo prazo?

Scott Thornbury indica alguns princípios a ser seguidos (24-26):

• repetition (repetição) – para que determinada informação seja armazenada

na memória a longo prazo, esta tem de passar primeiro pela memória de

trabalho.16 A repetição é uma forma de ultrapassar a limitação desta

memória. O rote learning através dos drills em silêncio ou em voz alta ou

mesmo através da escrita repetida de palavras é uma técnica que pode ser

utilizada no ensino de vocabulário; no entanto pode ser um pouco estéril, o jogador deverá definir a palavra, dar exemplos, fazer uso da associação de ideias, desde que nunca mencione a palavra em questão ou palavras da mesma família. 16 Ver subcapítulo “A memória de funcionamento”

Page 90: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

90

uma vez que assenta sobretudo na forma. Mais eficaz do que a repetição

rotineira, parece ser a repetição elaborativa, uma repetição sobre a qual o

aluno constrói algo. Se um aluno construir uma frase que contextualize

determinada palavra que aprendeu, estará não só a repetir a sua forma, mas

também a consolidar o seu significado.

• retrieval (recuperação) – quanto mais vezes recuperarmos uma informação

da nossa memória, mais fácil se tornará a tarefa da recordação.

• spacing (espaçamento) – o ensino deve ser espaçado, não se deve ensinar

muita coisa ao mesmo tempo. Como refere Thornbury, “[é] melhor

distribuir o trabalho de memória por um período de tempo do que

acumulá-lo num único bloco” (24). As recordações são como

reconstruções de circuitos neuronais. Ao ativarmos várias vezes um

circuito neuronal, este torna-se mais forte.

• pacing (ritmo) – os alunos não aprendem todos ao mesmo ritmo, pelo que

é importante que lhes seja concedido algum tempo para poderem organizar

a informação.

• use (uso) – como já foi várias vezes referido, o nosso cérebro rege-se pelo

princípio use or lose it; se não usarmos a informação, esquecemo-la.

Temos de dar oportunidades e criar a necessidade de os alunos utilizarem

o vocabulário que vão aprendendo.

• cognitive depth (profundidade cognitiva) – quantas mais decisões tivermos

de fazer relativamente ao significado de uma palavra e quanto mais

pensarmos sobre ela, mais hipóteses esta terá de se tornar memorável.

• personal organising (organização pessoal) – quanto mais personalizarmos

uma informação, mais chances teremos de a recordar, pois aumentamos a

possibilidade de ancorar essa informação em experiências já gravadas na

memória. O nosso cérebro precisa de atribuir sentido às coisas, a

informação significativa é mais facilmente armazenada.

• imaging (visualização) – tal como explica Wolfe “[o]s nossos olhos têm

70% dos receptores sensoriais do corpo e enviam milhões de sinais a cada

segundo ao longo dos nervos ópticos para os centros de processamento

Page 91: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

91

visual do cérebro” (145). Não admira, portanto, que as imagens sejam tão

importantes para o ser humano. Muitas vezes pensamos por imagens e

incorporámo-las facilmente na memória. Veja-se o caso da memória

episódica, que é recuperada através da visualização.17 Palavras facilmente

visualizadas são mais memoráveis do que as palavras que não ativam

qualquer imagem (Thornbury 25). Deste modo, o professor deverá dar a

conhecer aos alunos técnicas de memorização com base na visualização de

imagens.

Como já foi anteriormente referido, quando se aprende uma palavra nova

em alemão deve aprender-se o seu género. Esta tarefa nem sempre é muito

fácil porque o que é masculino em alemão, nem sempre o é em português.

Para além disso, há ainda o género neutro.

Uma forma de auxiliar os alunos na aprendizagem do género é pedir-lhes

que pensem em três palavras que conheçam, sendo uma de cada género.

Estas palavras ditas de referência devem possuir a característica de serem

facilmente visualizadas. Tomemos como exemplo a palavra Frau (die

Frau – a mulher) para o género feminino, Mann (der Mann – o homem)

para o masculino e Feuer (das Feuer – o fogo) para o género neutro.

Posteriormente, sempre que o aluno aprender uma palavra feminina deverá

associá-la à imagem de uma mulher, uma palavra masculina à imagem de

um homem e uma palavra neutra à imagem de fogo. Por exemplo, ao

aprender a palavra Stadium (estádio), que é neutra, poderá imaginar um

estádio de futebol em chamas.

A memorização tem sido negligenciada no ensino nos últimos tempos.

Passou-se de um sistema de ensino fortemente assente na memorização de

conhecimentos para um que quase despreza a memória. Como afirma

Thornbury “... aprender é lembrar” (23). Só há lembrança se houver

memória.

Se há pessoas que facilmente memorizam informação, outras há que têm

de se esforçar mais. Se aprendermos técnicas de memorização, com o

17 Ver subcapítulo “A memória a longo prazo”

Page 92: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

92

tempo o esforço será cada vez menor. Julgo que os alunos só têm a

beneficiar se lhes dermos a conhecer técnicas deste tipo, como a do

Palácio da Memória usada desde a Antiguidade Clássica, uma vez que

poderão auxiliá-los não só no estudo da língua estrangeira, como também

em outras áreas de conhecimento.18 Estratégias como estas são adequadas

para adultos e adolescentes, mas não tanto para crianças, pois exigem um

certo grau de abstração.

• mnemonics (mnemónicas) – Como já foi descrito no primeiro capítulo, o

cérebro tem a necessidade de ancorar a nova informação em informação já

existente. As mnemónicas fornecem uma estrutura na qual é possível fazer

a ancoragem do novo conhecimento. Os mais conhecidos tipos de

mnemónicas são as de palavra-chave e de loci. A mnemónicas de palavra-

chave (keyword mnemonic) implicam a associação da palavra em língua

estrangeira a uma palavra com uma pronúncia ou ortografia semelhantes

na língua materna (Gairns & Redman 92). As mnemónicas de loci

assentam fortemente na visualização e consistem na associação de

palavras a locais físicos que já fazem parte da nossa memória. Um

exemplo deste tipo de mnemónica é o Palácio da Memória, referido no

ponto anterior. De acordo com vários estudos, o uso de estratégias

mnemónicas não só auxilia a memorização de informação, como também

melhora a capacidade de os alunos a aplicarem (Wolfe 169).

As mnemónicas podem ser utilizadas por alunos de qualquer faixa etária.

Todos nos lembramos de, em criança, termos aprendido quantos dias tem

cada mês através da utilização dos nós dos dedos e dos espaços entre eles.

Mais importante do que os professores fornecerem mnemónicas, é serem

os próprios alunos a criar as suas. No entanto, para que os alunos possam

18 De acordo com Joshua Foer, no seu livro Um passeio na Lua com Einstein, esta técnica consiste em “... converter algo nada memorável, como uma sequência de números ... ou uma lista de compras ... numa série de imagens visuais cativantes...”. Para tal é necessário “... dispô-las mentalmente num espaço imaginado...”. Acrescenta ainda que este lugar imaginado deverá ser “... um lugar que conheçamos bem e possamos visualizar facilmente...”, para que depois o possamos povoar com o que queremos recordar (106-8).

Page 93: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

93

fazê-lo têm primeiro de perceber como funciona a técnica, através de

exemplos.

• motivation (motivação) – a motivação não está diretamente relacionada

com a memória; no entanto, alunos motivados querem mais ser capazes de

memorizar vocabulário, pelo que se esforçam mais para o fazer.

• attention/arousal (atenção) – quando prestamos atenção a algo e

mantemos a nossa atenção, perseveramos num estímulo um tempo

suficiente longo para compreendê-lo (Feinstein 63). Quando

compreendemos algo, atribuímos-lhe significado, que é um aspeto

essencial para a memorização.

• affective depth (profundidade emocional) – a emoção tem um papel

importante na forma como memorizamos e lembramos as palavras. A

emoção constitui a forma como primariamente reagimos aos estímulos e

influencia grandemente a nossa atenção. Palavras que carregam uma forte

carga emocional são mais facilmente memorizadas e recordadas.

5.2.6. Formas de promover a prática e a reciclagem de vocabulário

Sabe-se que quanto mais contactarmos com uma palavra, seja sob forma escrita

ou oral, mais hipóteses teremos de a memorizar. Deste modo, para evitar o esquecimento

devemos ensinar o vocabulário de forma espaçada, fazer revisões intervaladas e fazer de

diversas formas uma reciclagem das palavras (Thornbury 26-7)

Como podemos criar condições para a prática e reciclagem de vocabulário? Como

podemos ajudar os alunos a reter o vocabulário?

Thornbury propõe que se incluam nas aulas tarefas que impliquem a tomada de

decisões e tarefas produtivas (93-101). Dentro do primeiro tipo incluem-se as tarefas de:

• identificação (identifying) – estas tarefas podem ser tão simples quanto

sublinhar num texto vocábulos com determinadas características, contar o

número de vezes que uma palavra aparece num texto, procurar palavras

Page 94: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

94

numa sopa de letras, ordenar letras para formar palavras ou prestar atenção

a determinadas palavras num texto oral.

• seleção (selecting) – escolher x vocábulos de um texto e defini-los ou

explicar a relação entre eles são exemplos de tarefas de seleção, bem como

descobrir num grupo de palavras o elemento que não faz sentido (odd one

out).

• correspondência (matching) – a correspondência implica o reconhecimento

de uma relação lógica entre duas partes que pode ser de similitude ou de

oposição. Assim, podemos ter matching de palavras ou expressões com

imagens, definições, traduções, sinónimos ou antónimos.

• classificação (sorting) – atividades deste género implicam que os alunos

agrupem palavras por classes, que podem ser temáticas ou formais (por

exemplo, por classe gramatical).

• ordenação (ranking) e sequenciação (sequencing) – ordenar e sequenciar

exige que os alunos coloquem palavras ou expressões numa determinada

ordem. Podemos, por exemplo, pedir-lhes que coloquem um conjunto de

palavras por ordem de preferência. Ao fazerem isto, estão a personalizar o

Quando dava aulas de inglês no primeiro ciclo, no final de

cada unidade costumava pedir aos alunos que selecionassem as

palavras que pensavam dever ser incluídas no picture dictionary. Ia

recolhendo as várias sugestões, que ia anotando no quadro para depois

a turma fazer a seleção final. Esta atividade obrigava-os a rever o

vocabulário trabalhado, a refletir sobre o seu significado e sobre a

forma como se relacionava com o tema da unidade. Para além destes

objetivos, havia a intenção de lhes incutir o gosto por este instrumento

de estudo, para que pudessem mais tarde passar a criar sozinhos os

seus picture dictionaries.

Page 95: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

95

vocabulário, pois estão a atribuir-lhe um significado que relacionam com o

seu contexto pessoal. Podemos também sugerir que ordenem determinados

passos cronologicamente.

Todas estas tarefas podem ser realizadas por qualquer aluno, independentemente

da sua faixa etária ou nível de conhecimento da língua, desde que se proceda a uma

adequação do grau de dificuldade.

É conveniente que se varie o tipo de atividades, sobretudo quando trabalhamos

com crianças, pois à medida que as vão executando estão não só a melhorar o seu

conhecimento linguístico, mas também o seu conhecimento do mundo.

As tarefas de produção podem consistir na completação ou criação de frases ou de

textos, orais ou escritos (Thornbury 100-1).

Uma ótima tarefa de produção é o role-playing. Neste tipo de atividade os alunos

representam um papel que lhes é atribuído, não se limitando apenas a ler um guião,

sendo, assim, forçados a aceder ao seu léxico mental. Durante uma atividade deste género

os alunos não estão concentrados no treino da linguagem, mas no seu papel e na

mensagem que querem transmitir, pelo que o vocabulário acaba por surgir como algo

natural e necessário. O role-playing é mais indicado para adolescentes e adultos do que

para crianças, uma vez que estas ainda não possuem um nível linguístico suficientemente

desenvolvido que lhes permita representarem um papel sem terem um guião. Para young

learners a dramatização de um texto é uma tarefa mais apropriada, pois neste caso os

alunos não têm de produzir o texto, mas sim reproduzi-lo.

À semelhança do role-playing, os debates também têm um efeito positivo na

consolidação do léxico. Depois de algumas aulas a trabalhar textos e a fazer exercícios de

vocabulário relacionados com determinado tema, o debate vem criar uma oportunidade

diferente para os alunos usarem as palavras e expressões que foram aprendendo.

O debate é uma atividade que pode ser implementada em turmas de adolescentes

e de adultos, mas não é muito adequada para o trabalho com crianças. O grau de

conhecimento do mundo de alunos desta faixa etária, bem como a sua própria estrutura

cerebral, tornam difícil a participação em atividades deste género. Só durante a

adolescência, especialmente a partir dos 15/16 anos, é que os lobos frontais começam a

Page 96: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

96

amadurecer. 19 Esta parte do cérebro é responsável pela capacidade de considerar

perspetivas diferentes.

Tanto os debates como o role-playing constituem atividades que normalmente

implicam uma carga emocional elevada. Sobretudo no caso dos debates, o professor deve

estar atento ao modo como são conduzidos pelos alunos, pois em algumas ocasiões

acabam por originar pequenas situações de confronto verbal aberto com a equipa oposta.

Os drills são outra forma de praticar vocabulário, mas não obrigam à tomada de

decisões nem a grande esforço por parte do aluno e, por isso, o seu uso não deverá ser

privilegiado.

Alguns jogos são atividades interessantes para reciclar e praticar vocabulário. Ao

contrário do que se possa pensar, os jogos não são apenas indicados para crianças.

Adolescentes e adultos também gostam de jogar, embora para eles não constitua apenas

uma atividade lúdica. Estão conscientes de que, à medida que vão jogando, vão

melhorando o seu conhecimento da língua. O professor deverá conhecer bem os alunos

para selecionar adequadamente o jogo a utilizar.

19 Ver subcapítulo “O cérebro do adolescente”

Page 97: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

97

6. CONCLUSÃO

A aprendizagem é um ato voluntário, que inclui variáveis que os professores não

podem controlar. Não obstante todo o seu trabalho, um professor nunca pode garantir a

aprendizagem dos seus alunos. No entanto, perceber melhor a forma como se aprende

permite-lhe tomar decisões mais acertadas e adequar as suas intervenções.

Como afirma Lynne Cameron, “... o ensino nunca pode garantir a aprendizagem;

tudo o que pode fazer é construir oportunidades para se aprender e ajudar os aprendentes

a tirarem vantagem delas” (242). Em contexto formal, as oportunidades de aprendizagem

de vocabulário podem surgir de modo incidental, mas é conveniente que também partam

de um ato deliberado e planeado do professor. O ensino de léxico não pode ser deixado

ao acaso. Antes de uma aula, cabe ao professor o importante trabalho de selecionar quais

e quantas as palavras a trabalhar, ainda que deva dar alguma liberdade aos alunos para

escolherem o vocabulário que querem aprender.

A aprendizagem de vocabulário é um processo complexo, cíclico e demorado.

Saber uma palavra requer a assimilação de muitos aspetos da forma e do significado. O

conhecimento lexical vai sendo construído com o tempo e implica que o sujeito contacte

repetidas vezes com as mesmas palavras, preferencialmente em contextos diversificados

e significativos. Se um professor não criar oportunidades para que os alunos se

familiarizem com as palavras e não provocar a necessidade de as usarem, o mais certo é

que as redes neuronais a elas associadas se deteriorem e que estas caiam no

esquecimento. O nosso cérebro é regido pelo princípio use it or lose it; o que não usamos,

esquecemos, pelo que a reciclagem de vocabulário é imperiosa. Tanto a apresentação

como a reciclagem de vocabulário devem ser feitas de uma forma contextualizada, que

permita aos alunos estabelecer relações com os conhecimentos que já possuem e que, ao

mesmo tempo, lhes dê oportunidade de construir, trabalhar e personalizar o significado

das palavras. A conjugação destes aspetos facilita a construção das redes neuronais e,

consequentemente, a criação de um léxico mental em língua estrangeira.

Para que os alunos possam tirar proveito das situações de aprendizagem, estas

devem ser o mais variadas possível. Introduzir variedade nas aulas é uma forma de

Page 98: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

98

abranger todos os tipos de inteligência, dar espaço à novidade e mostrar aos alunos várias

técnicas e estratégias, de modo a que estes possam escolher as que mais resultam consigo

e melhor se adaptam aos seus estilos de aprendizagem.

No início deste trabalho, propus-me descobrir quais as técnicas de ensino de

vocabulário mais adequadas a crianças, adolescentes e adultos. Finda a investigação, sou

levada a concluir que a maior parte das técnicas pode ser usada com qualquer faixa etária,

desde que se vá fazendo uma correta avaliação da turma e que se vá adequando o grau de

dificuldade. No entanto, é preciso ter em conta que algumas atividades (como por

exemplo os debates) são condicionadas pela maturidade cognitiva dos alunos.

Este trabalho fez-me aprofundar os meus conhecimentos, levou-me a refletir

sobre a minha experiência e tornou-me mais consciente dos vários fatores que exercem

influência na aprendizagem e no ensino de vocabulário, pelo que estou certa que

contribuirá para uma melhoria da minha prática letiva. Doravante, serei mais criteriosa na

seleção de vocabulário, tentando, de forma mais sistemática e informada, perceber se as

minhas escolhas estão de acordo com os princípios que devem reger este processo.

Procurarei ainda criar mais oportunidades para a reciclagem de vocabulário, de forma a

garantir que os alunos não o esquecem, pois estou ciente que os caminhos não

percorridos são mais facilmente apagados da memória.

Sabendo agora que somos amplamente condicionados pelas nossas emoções e

reconhecendo a importância que estas têm para a atenção e retenção de informação,

futuramente, gostaria de explorar o papel da emoção no ensino de uma língua estrangeira.

Page 99: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

99

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Allen, Virginia French. Techniques in teaching vocabulary. New York: Oxford

University Press, 1983.

Arthur, James. Learning to Teach in the Primary School. London: Routledge, 2006.

Bernardo, Ana. “O léxico mental no ensino e aprendizagem de vocabulário na L2

(Alemão).” Revista de Estudos Linguísticos da Universidade do Porto. Vol. 5 (2010): 27-

40.

Blakemore, Sarah-Jayne & Frith, Uta. The Learning Brain. UK: Blackwell Publishing,

2005.

Cameron, Lynne. Teaching Languages to Young Learners. Cambridge: Cambridge

University Press, 2001.

Celce-Murcia, Marianne, ed. Teaching English as a Second or Foreign Language. 3rd ed.

Boston: Heinle & Heinle Thomson Learning, 2001.

Crawford, Glenda Beamon. Brain-based teaching with adolescent learning in mind. 2nd

ed. Thousand Oaks: Corwin Press, 2007.

Dörnyei, Zoltán. Motivational Strategies in the Language Classroom. Cambridge:

Cambridge University Press, 2001.

Feinstein, Sheryl. A Aprendizagem e o Cérebro. Lisboa: Instituto Piaget, 2006.

Foer, Joshua. Um passeio na Lua com Einstein. Alfragide: Livros d’Hoje, Publicações D.

Quixote, 2011.

Page 100: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

100

Gairns, Ruth & Redman, Stuart. Working with words: a guide to teaching and learning

vocabulary. Cambridge: Cambridge University Press, 1986.

Gardner, Howard. Frames of Mind: The Theory of Multiple Intelligences. 10th

Anniversary Edition. New York: Basic Books, 1983

Halliwell, Susan. Teaching English in the primary classroom. Harlow: Longman, 2004.

Harmer, Jeremy. How to Teach English: an introduction to the practice of English

language teaching. Harlow: Pearson Education Limited, 2001

---. The Practice of English Language Teaching. Essex: Longman, 2001.

Hess, Natalie. Headstarts: one hundred original pre-text activities. Essex: Longman,

1991.

Knudsen, Eric I. “Sensitive Periods in the Development of the Brain and Behavior.”

Journal of Cognitive Neuroscience Volume 16, Number 8 (2004): 1412-1425

Krashen, Stephen. Language acquisition and language education: extensions and

applications. New York: Prentice Hall International, 1989.

Lightbrown, Patsy & Spada, Nina. How Languages are Learned. 3rd Edition. Oxford:

Oxford University Press, 2006.

Morgan, John & Rinvolucri, Mario. Vocabulary. Oxford: Oxford University Press, 1991.

Oxford, Rebecca. “Who Are Our Students?: A Synthesis of Foreign and Second

Language Research on Individual Differences with Implications for Instructional

Practice.” TESL Canada Journal, vol. 9, no. 2 (1992): 30-49.

Page 101: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

101

Phillips, Sarah. Young Learners. Oxford: Oxford University Press, 2003.

Piaget, Jean. Seis estudos de psicologia. 10ª edição. Lisboa: D. Quixote, 1990.

---. Pedagogia. Lisboa: Instituto Piaget, 1999.

Pinter, Annamaria. Teaching Young Language Learners. USA: Oxford University Press,

2009.

Politano, Colleen & Paquin, Joy. Brain-Based Learning With Class. Winnipeg: Portage

& Main Press, 2000.

Potts, John. “Preparing to teach... Vocabulary 1.” English Teaching Professional Issue 72

(2011): 38-9.

Slavkin, Michael. Authentic Learning. Maryland: Scarecrow Education, 2004.

Stern, H.. Fundamental Concepts of Language Teaching. Oxford: Oxford University

Press, 1983.

Sternberg, Robert J.. Psicologia Cognitiva. Porto Alegre: Artes Médicas, 2000.

Tanner, Rosie. “Teaching Intelligently.” English Teaching Professional Issue 20

(2001):40-1.

Thornbury, Scott. How to Teach Vocabulary. Harlow: Pearson Education Limited, 2004.

Ur, Penny. A Course in Language Teaching. Cambridge: Cambridge University Press,

1996

Page 102: Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de …...Dora Alice da Rocha Carvalho Moreira 2º Ciclo de Estudos em Ensino de Inglês e Alemão no 3.º Ciclo do Ensino Básico e Ensino

102

Watcyn-Jones, Peter. Vocabulary Games and Ativities for Teachers. England: Penguin

Books, 1993.

Wingate, Jim. “Multiple intelligences.” English Teaching Professional (1996): 28-31.

---. “Multiple intelligences and lesson planning.” English Teaching Professional

(1997):28-30.

Wolfe, Patricia. Compreender o funcionamento do cérebro. Porto: Porto Editora, 2007.

Zenhas, Armanda. “Desenvolver Study Skills, construir bases sólidas para a

aprendizagem.” APPI Newsletter Ano 15, Nº 1 (2000): 8 – 14.