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DOSSI ABRASCO Um alerta sobre os impactos dos Agrotxicos na Sade Parte 1 - Agrotxicos, Segurana Alimentar e Sade

Associao Brasileira de Sade ColetivaGrupo Inter GTs de Dilogos e Convergncias da ABRASCO

Comisso Executiva do Dossi Rio de Janeiro, World Nutrition - Rio 2012

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Ficha Catalogrfica

Carneiro, F F; Pignati, W; Rigotto, R M; Augusto, L G S. Rizollo, A; Muller, N M; Alexandre, V P. Friedrich, K; Mello, M S C. Dossi ABRASCO Um alerta sobre os impactos dos agrotxicos na sade. ABRASCO, Rio de Janeiro, abril de 2012. 1 Parte. 98p.

Apoio na reviso do documento: Andr Campos Brigo EPJV-FIOCRUZ Lucas Resende ENEN, CANUT/UnB Cheila Bedor UFVS Foto da capa cedida por Prof. W. Pignati e Luz Tpia

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Lista de abreviaturas e siglasACTH Hormnio adrenocorticotrfico ANDA - Associao Nacional para Difuso de Adubos ANVISA Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria ABRASCO - Associao Brasileira de Sade Coletiva COGERH - Companhia de Gesto de Recursos Hdricos CONAMA - Conselho Nacional de Meio Ambiente CONSEA Conselho Nacional de Segurana Alimentar e Nutricional CNSAN - Conferncia Nacional de Segurana Alimentar e Nutricional CPqAM Centro de Pesquisa Aggeu Magalhes DNA cido desoxirribonucleico DDE Diclorodifenildicloroetano DDT - diclorodifeniltricloroetano DF Distrito Federal DL50 Dose letal 50% DVSAST - Departamento de Vigilncia em Sade Ambiental e Sade do Trabalhador EPIs Equipamento de Proteo Individual FAO Food and Agriculture Organization FIOCRUZ Fundao Oswaldo Cruz FSH Hormnio folculo estimulante GC-ECD Cromatografia Gasosa com detector de captura de eltrons GTs Grupos de Trabalho IA Ingrediente ativo IARC- Agncia Internacional para Investigao do Cncer IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovveis IgG Imunoglobulina G IDA - Ingesto Diria Aceitvel INCA Instituto Nacional do Cncer INCQS Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Sade INDEA-MT Instituto de Defesa Agropecuria do Mato Grosso

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HCH - Hexaclorociclohexano GH - Hormnio do crescimento LH Hormnio luteinizante LC-MS - Massas com Ionizao Electrospray LMR - Limite mximo de resduo HPT Eixo do hipotlamo, pituitria e tireide MAPA Ministrio da Agricultura, Pecuria e Abastecimento MMA - Ministrio do Meio Ambiente MS Ministrio da Sade MT Ministrio do Trabalho NA - Agrotxicos no autorizados MPS Ministrio da Previdncia Social NPK - Nitrognio, Fsforo, Potssio PARA - Programa de Anlise de Resduos de Agrotxicos em Alimentos PRL - Prolactina RDC Resoluo da Diretoria Colegiada SAA - Sistemas de Abastecimento de gua SAAE - Servio Autnomo de gua e Esgoto SCE Troca de cromtides irms SINDAG Sindicato Nacional da Indstria de Produtos para Defesa Agropecuria SISCOMEX - Sistema Integrado de Comrcio Exterior SISNAMA Sistema Nacional do Meio Ambiente SMS-BG Secretaria Municipal de Sade de Bento Gonalves SISAGUA - Sistema de Informao de vigilncia da qualidade da gua para consumo humano SVS- Sistema de Vigilncia em Sade UnB Universidade de Braslia UEP Universidade Estadual de Pernambuco UFC - Universidade Federal do Cear UFG Universidade Federal de Gois UFMG - Universidade Federal de Minas Gerais UFMT - Universidade Federal do Mato Grosso UFPEL Universidade Federal de Pelotas UNIRIO Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro

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TSH - Hormnio estimulante da tireide T3 - Triiodotironina T4 - Tiroxina

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SumrioLista de abreviaturas e siglas Lista de Quadros e Figuras Lista de Tabelas Apresentao Por que um Dossi? O processo de construo Parte 1 Agrotxicos, Segurana Alimentar e Sade 1.1 Produo de alimentos e o uso massivo de agrotxicos no Brasil 1.2 Evidncias cientficas relacionadas aos riscos para a sade humana da exposio aos agrotxicos por ingesto de alimentos 1.2.1 Resduos de agrotxicos em alimentos no Brasil 1.2.2 Resduos de agrotxicos em alimentos e agravos sade 25 23 25 03 08 10 11 12 13 15 15 23

1.2.3 Contaminao da gua de consumo humano e da chuva por 35 agrotxicos 1.2.4 Contaminao das guas por agrotxicos no Cear 1.2.5 Contaminao da gua e da chuva por agrotxicos no Mato Grosso 1.2.6 Contaminao de leite materno por agrotxicos 1.3 Desafios para a Cincia 1.3.1 Multiexposio, transgnicos e limites da cincia para proteger a sade; 1.3.2 Desafios para as polticas pblicas de controle, regulao de agrotxicos e para a promoo de processos produtivos saudveis 53 41 38

42 45 45

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1.3.3 Riscos do uso dos resduos txicos na produo de micronutrientes para a agricultura 1.3.4 A Agroecologia como estratgia de promoo da sade

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Consideraes finais e propostas Referncias Bibliogrficas Anexos Anexo 1 Documento GT Sade Ambiente da ABRASCORef. Posicionamento frente Resoluo CONAMA sobre micronutrientes

58 60 82

Anexo 2 Moes da ABRASCO relacionadas a agrotxicos I SIMPSIO BRASILEIRO DE SADE AMBIENTAL MOO CONTRA O USO DOS AGROTXICOS E PELA VIDA 44

V CONGRESSO BRASILEIRO DE CINCIAS HUMANAS E SOCIAIS EM SADE - MOO CONTRA O USO DOS AGROTXICOS E PELA VIDA

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Anexo 3 Moes e propostas da 4 Conferncia Nacional de Segurana Alimentar e Nutricional (CNSAN) relacionadas aos agrotxicos

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Lista de Quadros e Figuras

Quadro 01. Indicaes de associados para compor o grupo executivo de elaborao do Dossi sobre os Impactos dos Agrotxicos na Sade 13

Quadro 02. Produo agrcola brasileira de 2002 a 2011, em milhes de hectares 17 Quadro 03. Produo pecuria brasileira de 2002 a 2011, em milhes de cabeas 18 Quadro 04. Consumo de agrotxicos e fertilizantes qumicos nas lavouras do Brasil, de 2002 a 2011 18

Figura 01. Produo agrcola e consumo de agrotxicos e fertilizantes qumicos nas lavouras do Brasil, de 2002 a 2011 Figura 02. Utilizao de agrotxicos por municpios brasileiros em 2006 19 21

Figura 03. Distribuio das amostras segundo a presena ou a ausncia de resduos de agrotxicos. PARA, 2010 23

Quadro 05: Nmero de amostras analisadas por cultura e resultados insatisfatrios. PARA, 2010 24

Quadro 06. Classificao e efeitos e/ou sintomas agudos e crnicos dos agrotxicos 26 Quadro 07. Efeitos txicos dos ingredientes ativos de agrotxicos banidos ou em reavaliao com as respectivas restries ao uso no mundo 34

Figura 4. Municpios que relataram poluio por agrotxicos em gua, Brasil, 2011 36 Quadro 08. Resultados das anlises laboratoriais para identificao de resduos de agrotxicos na Chapada do Apodi, Cear, 2009. 40

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Figura 5. Tipos de agrotxicos detectados em amostras de leite materno em Lucas do Rio Verde-MT, em 2010 43

Quadro 09. Freqncia de deteco de agrotxicos analisados em leite de nutrizes de Lucas do Rio Verde-MT, em 2010 44

Quadro 10. Principais produtos usados nas propriedades em Bento Gonalves, RS, 2006, (n=235) 46

Anexo1: Quadro 1: Sinopse dos efeitos na sade humana associadas a resduos industriais perigosos que podero poluir micronutrientes utilizados na agricultura se utilizados em sua produo 83

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Lista de Tabelas

Tabela 1. Brasil projees de exportao 2010/11 a 2020/2021

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Tabela 02. Resultados das anlises de resduos de agrotxicos na gua da Bacia Potiguar, 2009 41

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ApresentaoEste Dossi um alerta da Associao Brasileira de Sade Coletiva ABRASCO sociedade e ao Estado brasileiro. Registra e difunde a preocupao de pesquisadores, professores e profissionais com a escalada ascendente de uso de agrotxicos no pas e a contaminao do ambiente e das pessoas dela resultante, com severos impactos sobre a sade pblica. Expressa, assim, o compromisso da ABRASCO com a sade da populao, no contexto de reprimarizao da economia, da expanso das fronteiras agrcolas para a exportao de commodities, da afirmao do modelo da modernizao agrcola conservadora e da monocultura qumico-dependente. Soja, cana-de-acar, algodo e eucalipto so exemplos de cultivos que vm ocupando cada vez mais terras agricultveis, para alimentar o ciclo dos agrocombustveis, da celulose ou do ferro-ao, e no as pessoas, ao tempo em que avanam sobre biomas como o cerrado e Amaznia, impondo limites ao modo de vida e produo camponesa de alimentos, e consomem cerca de metade dos mais de um bilho de litros de agrotxicos anualmente despejados em nossa Terra. A identificao de numerosos estudos que comprovam os graves e diversificados danos sade provocados por estes biocidas impulsiona esta iniciativa. Constatar a amplitude da populao qual o risco imposto sublinha a sua relevncia: trabalhadores das fbricas de agrotxicos, da agricultura, da sade pblica e outros setores; populao do entorno das fbricas e das reas agrcolas; alm dos consumidores de alimentos contaminados toda a populao, como evidenciam os dados oficiais. A iniciativa do Dossi nasce dos dilogos da ABRASCO com os desafios contemporneos, amadurecido em pesquisas, Congressos, Seminrios e nos Grupos de Trabalho, especialmente de Sade & Ambiente, Nutrio, Sade do Trabalhador e Promoo da Sade. Alimenta-se no intuito de contribuir para o efetivo exerccio do direito sade e para as polticas pblicas responsveis por esta garantia. Ao tempo em que nos instigou a um inovador trabalho interdisciplinar em busca de compreender as diversas e complexas facetas da questo dos agrotxicos, a elaborao do Dossi nos colocou diante da enormidade do problema e da tarefa de abord-lo adequadamente. Reconhecendo nossos limites, assumimos abrir mo de preparar um documento exaustivo e completo, para no postergar a urgente tarefa de trazer a pblico o problema. A expectativa mobilizar positivamente os diferentes atores sociais para a questo, prosseguindo na tarefa de descrev-la de forma cada vez mais completa, caracterizar sua determinao estrutural, identificar as lacunas de conhecimento e, muito especialmente, as lacunas de ao voltada para a promoo e a proteo da sade da populao e do planeta. Alerta! Luiz Augusto Facchini Presidente da ABRASCO

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Por que um Dossi?Nos ltimos trs anos o Brasil vem ocupando o lugar de maior consumidor de agrotxicos no mundo. Os impactos sade pblica so amplos porque atingem vastos territrios e envolvem diferentes grupos populacionais como trabalhadores em diversos ramos de atividades, moradores do entorno de fbricas e fazendas, alm de todos ns que consumimos alimentos contaminados. Tais impactos so associados ao nosso atual modelo de desenvolvimento, voltado prioritariamente para a produo de bens primrios para exportao. Nos recentes eventos da Associao Brasileira de Sade Coletiva (ABRASCO), como o I Simpsio Brasileiro de Sade Ambiental e o V Congresso Brasileiro de Cincias Sociais e Humanas em Sade, foram aprovadas moes sugerindo um maior envolvimento de nossa entidade com essas questes, principalmente as relacionadas aos agrotxicos. O GT de Sade e Ambiente da ABRASCO tem produzido vrias reflexes sobre esse tema e, em sua oficina realizada no VIII Congresso Brasileiro de Epidemiologia, decidiu contribuir com a iniciativa de construir, junto com os GTs, Comisses e associados da ABRASCO, um Dossi sobre os impactos dos Agrotxicos na Sade no Brasil. Esse Dossi visa alertar, por meio de evidncias cientficas, as autoridades pblicas nacionais, internacionais e a sociedade em geral para a construo de polticas pblicas que possam proteger e promover a sade humana e dos ecossistemas impactados pelos agrotxicos. O Dossi ser lanado durante os trs mais importantes eventos relacionados ao tema realizados em 2012: o World Nutrition Congress em abril, na Conferncia das Naes Unidas sobre Desenvolvimento Sustentvel (Rio+20) - Cpula dos Povos na Rio+20 por Justia Social e Ambiental, em junho, ambos no Rio de Janeiro, e no X Congresso Brasileiro de Sade Coletiva, da ABRASCO, em novembro, em Porto Alegre.

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O processo de construoA Direo da ABRASCO aprovou a composio de um grupo executivo composto por membros de Grupos de Trabalho (GTs) e Associados que manifestaram interesse em contribuir com a elaborao do Dossi, aps ampla convocatria da entidade. O quadro 01 informa a composio desse grupo executivo. Quadro 01. Indicaes de associados para compor o grupo executivo de elaborao do Dossi sobre os Impactos dos Agrotxicos na Sade GTs e Comisses Sade e Ambiente Nomes Fernando Carneiro Raquel Rigotto Lia Giraldo Instituies UnB UFC UEP e CPqAM FIOCRUZ

Sade Trabalhador Nutrio

do Wanderlei Pignati

UFMT

Anelise Rizollo Veruska Alexandre

UnB

Promoo da Sade

Prado UFG

Associada indicada Neice Muller Faria pela Diretoria Colaboradores: Karen Friedrich

SMSBG/UFPEL

INCQS/FIOCRUZ

Marcia

Sarpa

de INCA UNIRIO

Campos Mello

Aps a constituio do grupo e dos debates iniciais, decidiu-se pela organizao do documento em trs partes com focos distintos, de forma a possibilitar uma melhor

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apreciao de cada um, ao tempo em que amplia a divulgao no meio cientfico e para a sociedade:

Parte 1 - Agrotxicos, Segurana Alimentar e Sade lanado no World Nutrition Congress, em abril de 2012, Rio de Janeiro. Parte 2 Agrotxicos, Sade e Sustentabilidade lanado na Conferncia das Naes Unidas sobre Desenvolvimento Sustentvel (Rio+20) - Cpula dos Povos na Rio+20 por Justia Social e Ambiental, em junho de 2012, Rio de Janeiro. Parte 3 Agrotxicos, Conhecimento e Cidadania lanado no X Congresso Brasileiro de Sade Coletiva, em novembro de 2012, Porto Alegre.

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Parte 1 Agrotxicos, Segurana Alimentar e Sade

1.1 Produo de alimentos e o uso massivo de agrotxicos no BrasilO processo produtivo agrcola brasileiro est cada vez mais dependente dos agrotxicos e fertilizantes qumicos. A lei dos agrotxicos (Brasil 1989) e o decreto que regulamenta esta lei (Brasil 2002) definem que essas substncias so: os produtos e os agentes de processos fsicos, qumicos ou biolgicos, destinados ao uso nos setores de produo, no armazenamento e beneficiamento de produtos agrcolas, nas pastagens, na proteo de florestas, nativas ou implantadas, e de outros ecossistemas e tambm de ambientes urbanos, hdricos e industriais, cuja finalidade seja alterar a composio da flora ou da fauna, a fim de preserv-las da ao danosa de seres vivos considerados nocivos. Segundo dados da Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria (Anvisa) e do Observatrio da Industria dos Agrotxicos da UFPR, divulgados durante o 2 Seminrio sobre Mercado de Agrotxicos e Regulao, realizado em Braslia (DF), em abril de 2012, enquanto, nos ltimos dez anos, o mercado mundial de agrotxicos cresceu 93%, o mercado brasileiro cresceu 190%. Em 2008, o Brasil ultrapassou os Estados Unidos e assumiu o posto de maior mercado mundial de agrotxicos. Na ltima safra, que envolve o segundo semestre de 2010 e o primeiro semestre de 2011, o mercado nacional de venda de agrotxicos movimentou 936 mil toneladas de produtos, sendo 833 mil toneladas produzidas no Pas, e 246 mil toneladas importadas (ANVISA & UFPR, 2012). Em 2010, o mercado nacional movimentou cerca de US$ 7,3 bilhes e representou 19% do mercado global de agrotxicos. Em 2011 houve um aumento de 16,3% das vendas, alcanando US$ 8,5 bilhes, sendo que as lavouras de soja, milho, algodo e cana-de-aucar representam 80% do total das vendas do setor (SINDAG, 2012). J os Estados Unidos foram responsveis por 17% do mercado mundial, que girou em torno de US$ 51,2 bilhes (ANVISA & UFPR, 2012). De acordo com o estudo, existe uma concentrao do mercado de agrotxicos em determinadas categorias de produtos. Os herbicidas, por exemplo, representaram 45% do total de agrotxicos comercializados. Os fungicidas respondem por 14% do

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mercado nacional, os inseticidas 12% e as demais categorias de agrotxicos 29% (ANVISA & UFPR, 2012). Na safra de 2011 no Brasil, foram plantados 71 milhes de hectares de lavoura temporria (soja, milho, cana, algodo) e permanente (caf, ctricos, frutas, eucaliptos), o que corresponde a cerca de 853 milhes de litros (produtos formulados) de agrotxicos pulverizados nessas lavouras, principalmente de herbicidas, fungicidas e inseticidas, representando mdia de uso de 12 litros/hectare e exposio mdia ambiental/ocupacional/alimentar de 4,5 litros de agrotxicos por habitante

(IBGE/SIDRA, 2012; SINDAG, 2011). O quadro 02 abaixo, sobre a produo agropecuria brasileira nos anos 2002 a 2011, e mostra que alguns alimentos adotados no cotidiano de boa parte dos brasileiros (arroz, feijo e mandioca) continuaram com a mesma rea plantada no perodo, enquanto a soja, o milho, o sorgo e o algodo tiveram aumentos de rea plantada, expandindo a produo para exportao e/ou para alimentar animais em regime de monocultura e confinamento, como se pode ver no quadro 3. Alm disso, parte da cana-de-acar, que tambm teve aumento importante da rea plantada, ir se transformar em etanol e parte do leo de soja em biodiesel, implementando o ciclo de transformao dos alimentos em biocombustveis.

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Quadro 02. Produo agrcola brasileira de 2002 a 2011, em milhes de hectares.Brasil Algodo Arroz Borracha Caf Cana Feijo Mandioca Milho Soja Sorgo Trigo Citrus Outros Total 2002 0,8 3,2 0,1 2,4 5,2 4,3 1,7 12,3 16,4 0,5 2,2 0,9 4,5 54,5 2003 0,7 3,2 0,1 2,4 5,4 4,4 1,6 13,3 18,5 0,8 2,6 1 4,5 58,5 2004 1,2 3,8 0,1 2,4 5,6 4,3 1,8 12,9 21,6 0,9 2,8 0,9 4,7 63,0 2005 1,3 4,0 0,1 2,3 5,8 4,0 1,9 12,2 23,4 0,8 2,4 0,9 5,1 64,3 2006 0,9 3,0 0,1 2,3 6,4 4,2 2,0 13 22,1 0,7 1,8 0,9 5,1 62,6 2007 1,1 2,9 0,1 2,3 7,1 4,0 1,9 14 20,6 0,7 1,9 0,9 4,9 62,3 2008 1,1 2,9 0,1 2,3 8,2 4,0 2,0 14,7 21,1 0,8 2,4 0,9 4,8 65,3 2009 1,2 2,8 0,1 2,2 9,5 4,0 2,1 15,5 21,6 1,1 2,6 0,9 4,8 68,8 2010 1,4 2,9 0,2 2,1 10,0 4,3 1,8 13,6 22,2 0,8 2,4 0,9 6,4 69,0 2011 1,7 2,8 0,1 2,2 11,0 3,7 1,8 13,6 22,7 0,7 2,2 0,9 7,8 71,1

Fonte: IBGE/SIDRA, 2012; MAPA, 2010.

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Quadro 03. Produo pecuria brasileira de 2002 a 2011, em milhes de cabeas.Brasil Bovino Suno Frangos Galinhas Outros Total 2002 185,3 31,9 703,7 180,4 39,1 2003 195,6 32,3 737,5 183,8 40 2004 204,5 33,1 759,5 184,8 41,1 2005 207,2 34,1 812,5 186,6 42,6 2006 205,9 35,2 819,9 191,6 43,4 2007 199,8 35,9 930 197,6 42,8 2008 202,3 36,8 994,3 207,7 44,4 2009 204,9 37,7 1063 218,3 46 2010 209,5 39,0 2011 213,7 39,7

1028,2 1048,7 210,8 48,9 215,0 49,9

1140,5 1189,2 1223

1282,8 1296

1406,2 1485,5 1569,9 1536,3 1567

Fonte: IBGE/SIDRA, 2012; MAPA, 2010.

No quadro 04, mostra-se o crescente consumo de agrotxicos e fertilizantes qumicos pela agricultura brasileira, proporcional ao aumento das monoculturas, cada vez mais dependentes dos insumos qumicos. O uso de agrotxicos foi calculado a partir de dados de 2008 a 2010 divulgados pelo SINDAG (2009, 2011) e para 2002 a 2007 foi feita estimativa utilizando o consumo mdio em cada cultura por hectare a partir dos dados divulgados e da produo anual informada pelo IBGE (2012) e projeo elaborada pelo MAPA (2010). O uso de fertilizantes qumicos chama a ateno na soja (200kg/ha), no milho (100kg/ha) e no algodo (500 kg/ha), calculado atravs de dados divulgados pela ANDA (2011). Quadro 04. Consumo de agrotxicos e fertilizantes qumicos nas lavouras do Brasil, de 2002 a 2011.BRASIL Agrotxicos (Milhes de L) Fertilizantes (Milhes de Kg) 4910 5380 6210 6550 6170 6070 6240 6470 6497 6743 599,5 643,5 693,0 706,2 687,5 686,4 673,9 725,0 827,8 852,8 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011

Fonte: SINDAG, 2009 e 2011; ANDA, 2011; IBGE/SIDRA, 2012; MAPA, 2010.

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Na Figura 01, nota-se que o consumo mdio de agrotxicos vem aumentando em relao rea plantada, ou seja, passou-se de 10,5 litros por hectare (l/ha) em 2002, para 12,0 l/ha em 2011. Tal aumento est relacionado a vrios fatores, como a expanso do plantio da soja transgnica que amplia o consumo de glifosato, a crescente resistncia das ervas daninhas, dos fungos e dos insetos, demandando maior consumo de agrotxicos e/ou o aumento de doenas nas lavouras, como a ferrugem asitica na soja que aumenta o consumo de fungicidas. Importante estmulo ao consumo advm da diminuio dos preos e da absurda iseno de impostos dos agrotxicos, fazendo com que os agricultores utilizem maior quantidade por hectare (Pignati e Machado, 2011). Quanto aos fertilizantes qumicos, a mdia de consumo por hectare continuou no mesmo nvel no perodo. Figura 01. Produo agrcola e consumo de agrotxicos e fertilizantes qumicos nas lavouras do Brasil, de 2002 a 2011.

Fonte: SINDAG, 2009 e 2011; ANDA, 2011; IBGE/SIDRA, 2012; MAPA, 2010.

Esse volume de agrotxicos foi consumido por vrios tipos de culturas sendo que a soja utilizou 40% do volume total entre herbicidas, inseticidas, fungicidas, acaricidas e outros (adjuvantes, surfactantes e reguladores). Em seguida est o milho com 15%, a cana e o algodo com 10%, depois os ctricos com 7%, o caf (3%), o trigo (3%), o arroz (3%), o feijo (2%), a pastagem (1%), a batata (1%), o tomate (1%), a ma (0,5%), a banana (0,2%) e as demais culturas consumiram 3,3% do total de 852,8

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milhes de litros de agrotxicos pulverizados nessas lavouras em 2011, segundo o SINDAG (2009, 2011) e projeo do MAPA (2010). Para calcularmos a quantidade de agrotxicos utilizados por tipo de cultura, utilizamos a mdia nacional do quadro 02 (hectares de lavouras) e do quadro 04 (consumo de agrotxicos), mais os dados informados acima sobre o consumo/cultura, e pareados com os dados de consumo/cultura/hectare fornecidos pelo banco de dados do INDEA-MT (2011) e Moreira et al (2010). Essas informaes nos indicam que o consumo mdio de agrotxicos (herbicidas, inseticidas e fungicidas) por hectare de soja foi de 12 litros, o de milho 6 l/ha; de algodo 28 l/ha; de cana 4,8 l/ha; de ctricos: 23 l/ha; de caf: 10 l/ha; arroz 10 l/ha; trigo: 10 l/ha e feijo: 5 l/hectare. Cerca de 434 ingredientes ativos (IA) e 2.400 formulaes de agrotxicos esto registrados no MS, MAPA e MMA e so permitidos no Brasil de acordo com os critrios de uso e indicao estabelecidos em suas Monografias. Porm, dos 50 mais utilizados nas lavouras de nosso pas, 22 so proibidos na Unio Europia. Na ANVISA esto em processo de reviso, desde 2008, 14 agrotxicos: cinco deles j foram proibidos (acefato, cihexatina e tricloform), sendo que o metamidofs ser retirado do mercado a partir de junho de 2012, e o endossulfama partir de junho de 2013. O fosmet teve seu uso restringido, apesar dos estudos terem apontado pelo banimento. Outros dois j concluram a consulta pblica de reviso (forato e parationa-metlica) e os demais j tiveram suas notas tcnicas de reviso concludas: lactofem, furano, tiram, paraquat, glifosato, abamectina (ANVISA, 2008; ANVISA, 2012a; ANVISA 2012b). Com base nos dados do Censo Agropecurio Brasileiro (IBGE, 2006), Bombardi (2011) indica a intensidade do uso de agrotxicos por municpios no Brasil (Figura 02). Verifica-se que 27% das pequenas propriedades (0 10 hectares) usam agrotxicos, 36% das propriedades de 10 a 100 hectares, e nas maiores de 100 hectares 80% usam agrotxicos.

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Figura 02. Utilizao de agrotxicos por municpios brasileiros em 2006

Nota-se neste mapa que as maiores concentraes de utilizao de agrotxicos coincidem com as regies de maior intensidade de monoculturas de soja, milho, cana, ctricos, algodo e arroz. Mato Grosso o maior consumidor de agrotxicos, representando 18,9%, seguido de So Paulo (14,5%), Paran (14,3%), Rio Grande do Sul (10,8%), Gois (8,8%), Minas Gerais (9,0%), Bahia (6,5%), Mato Grosso do Sul (4,7%), Santa Catarina (2,1%). Os demais estados consumiram 10,4% do total do Brasil, segundo o IBGE (2006), SINDAG (2011) e Theisen (2012). Em relao s hortalias, com base em dados disponveis na literatura especializada (FAO, 2008), o consumo de fungicidas atingiu uma rea potencial de aproximadamente 800 mil hectares, contra 21 milhes de hectares somente na cultura da soja. Isso revela um quadro preocupante de concentrao no uso de ingrediente ativo de

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fungicida por rea plantada em hortalias no Brasil, podendo chegar entre 8 a 16 vezes mais agrotxico por hectare do que o utilizado na cultura da soja, por exemplo. Numa comparao simples, estima-se que a concentrao de uso de ingrediente ativo de fungicida em soja no Brasil, no ano de 2008, foi de 0,5 litro por hectare, bem inferior estimativa de quatro a oito litros por hectare em hortalias, em mdia. Pode-se constatar que cerca de 20% da comercializao de ingrediente ativo de fungicida no Brasil destinada ao uso em hortalias. Dessa maneira pode-se inferir que o uso de agrotxicos em hortalias, especialmente de fungicidas, expe de forma perigosa e frequente o consumidor, o ambiente e os trabalhadores contaminao qumica por uso de agrotxicos (Almeida et al, 2009). Se o cenrio atual j suficientemente preocupante, do ponto de vista da sade pblica, deve-se levar em conta que as perspectivas so de agravamento dos problemas nos prximos anos. De acordo com as projees do MAPA para 2020/2021, a produo de commodities para exportao deve aumentar em propores de 55% para a soja, 56,46% para o milho, 45,8% para o acar, entre outros (Tabela 1). Como so monocultivos qumico-dependentes, as tendncias atuais de contaminao devem ser aprofundadas e ampliadas. Tabela 1. Brasil projees de exportao 2010/11 a 2020/2021.

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1.2 Evidncias cientficas relacionadas aos riscos para a sade humana da exposio aos agrotxicos por ingesto de alimentos.1.2.1 Resduos de agrotxicos em alimentos no Brasil Um tero dos alimentos consumidos cotidianamente pelos brasileiros est contaminado pelos agrotxicos, segundo anlise de amostras coletadas em todas as 26 Unidades Federadas do Brasil, realizadas pelo Programa de Anlise de Resduos de Agrotxicos em Alimentos (PARA) da ANVISA (2011). A Figura 3 evidencia que 63% das amostras analisadas apresentaram contaminao por agrotxicos, sendo que 28% apresentaram ingredientes ativos no autorizados (NA) para aquele cultivo e/ou ultrapassaram os limites mximos de resduos (LMR) considerados aceitveis. Outros 35% apresentaram contaminao por agrotxicos, porm dentro destes limites. Se estes nmeros j delineiam um quadro muito preocupante do ponto de vista da sade pblica, eles podem no estar ainda refletindo adequadamente as dimenses do problema, seja porque h muita ignorncia e incerteza cientficas embutidas na definio destes limites, seja porque os 37% de amostras sem resduos referem-se aos ingredientes ativos pesquisados, 235 em 2010 o que no permite afirmar a ausncia dos demais (cerca de 400), inclusive do glifosato, largamente utilizado (40% das vendas) e no pesquisado no PARA. Figura 03. Distribuio das amostras segundo a presena ou a ausncia de resduos de agrotxicos. PARA, 2010.

Fonte: ANVISA, 2011

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Destaca-se tambm que o nvel mdio de contaminao das amostras dos 26 estados brasileiros est distribudo pelas culturas agrcolas da seguinte maneira: pimento (91,8%), morango (63,4%), pepino (57,4%), alface (54,2%), cenoura (49,6%), abacaxi (32,8%), beterraba (32,6%) e mamo (30,4%), alm de outras culturas analisadas e registradas com resduos de agrotxicos, conforme o quadro 05 (Quadro 5) (ANVISA, 2011). Quadro 05: Nmero de amostras analisadas por cultura e resultados insatisfatrios. PARA, 2010.Produto N de amostras Analisadas (2) N 16,4% 51,9% 7,4% 0,0% 30,6% 3,1% 48,9% 24,3% 5,2% 10,1% 5,5% 21,6% 4,0% 51,8% 55,9% 84,9% 6,3% 14,2% 24,3% NA > LMR N 8,2% 0,0% 0,0% 0,0% 1,4% 0,0% 0,0% 2,8% 1,3% 2,0% 3,4% 6,8% 0,0% 2,7% 1,5% 0,0% 0,0% 0,7% 1,7% >LMR e NA (3) % 8,2% 2,3% 0,0% 0,0% 0,7% 0,0% 0,7% 4,9% 0,0% 0,0% 0,0% 2,0% 0,0% 8,9% 0,0% 6,8% 0,0% 1,4% 1,9% Total de Insatisfatrios (2+3) % 32,8% 54,2% 7,4% 0,0% 32,6% 3,1% 49,6% 31,9% 6,5% 12,2% 8,9% 30,4% 4,0% 63,4% 57,4% 91,8% 6,3% 16,3% 27,9%

(1) N % 122 20 Abacaxi 131 68 Alface 148 11 Arroz 145 0 Batata 44 Beterraba 144 131 4 Cebola 141 69 Cenoura 144 35 Couve 153 8 Feijo 148 15 Laranja 146 8 Ma 148 32 Mamo 125 05 Manga 112 58 Morango 136 76 Pepino 146 124 Pimento 127 8 Repolho 141 20 Tomate Total 2488 605 Fonte: ANVISA, 2011

% 10 0 0 0 2 0 0 4 2 3 5 10 0 3 2 0 0 1 42

10 3 0 0 1 0 1 7 0 0 0 3 0 10 0 10 0 2 47

N 40 71 11 0 47 4 70 46 10 18 13 45 5 71 78 134 08 23 694

Do total de 2488 amostras analisadas e apresentadas no item 3 do quadro 05, 605 amostras apresentaram ingredientes ativos (IAs) de agrotxicos no autorizados (NA) para aquela cultura e 47 ultrapassaram os Limites Mximo de Resduos (LMR) estabelecidos pelas Normas brasileiras. Somados os itens 2 e 3, obtem-se 694 amostras insatisfatrias ou 27,9% do total analisado. Alm disso, 208 amostras ou 30% do total analisado apresentaram ingredientes ativos (IAs) que se encontram em processo de reavaliao toxicolgica pela ANVISA (2008) ou em etapa de venda descontinuada j programada. Entretanto, eles representam 70% do volume total de agrotxicos consumidos em nossas lavouras, onde esto includos o glifosato, endosulfan, metamidofs, 2.4D, paration-metlico e acefato. Isto

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confirmado pelos dados de fabricao nacional, segundo os relatrios de comercializao de agrotxicos fornecidos pelas empresas ANVISA (ANVISA & UFPR, 2012) ou importados e registrados no Sistema Integrado de Comrcio Exterior (SISCOMEX), onde se verifica que os ingredientes ativos em reavaliao continuam sendo importados em larga escala pelo Brasil. O uso de um ou mais agrotxicos em culturas para as quais eles no esto autorizados, sobretudo daqueles em fase de reavaliao ou de descontinuidade programada devido sua alta toxicidade, apresenta consequncias negativas na sade humana e ambiental. Uma delas o aumento da insegurana alimentar para os consumidores que ingerem o alimento contaminado com IAs, pois esse uso, por ser absolutamente irregular, no foi considerado no clculo da Ingesto Diria Aceitvel (IDA), sendo que esta insegurana se agrava medida que esse agrotxico encontrado em vrios alimentos consumidos em nossa dieta cotidiana. Segundo a ANVISA:so ingredientes ativos com elevado grau de toxicidade aguda comprovada e que causam problemas neurolgicos, reprodutivos, de desregularo hormonal e at cncer. Apesar de serem proibidos em vrios locais do mundo, como Unio Europia e Estados Unidos, h presses do setor agrcola para manter esses trs produtos (endosulfan, metamidofs e acefato) no Brasil, mesmo aps serem retirados de forma voluntria em outros pases. (ANVISA, 2010).

1.2.2 Resduos de agrotxicos em alimentos e agravos sade Mesmo que alguns dos ingredientes ativos possam ser classificados como medianamente ou pouco txicos baseado em seus efeitos agudos no se pode perder de vista os efeitos crnicos que podem ocorrer meses, anos ou at dcadas aps a exposio, manifestando-se em vrias doenas como cnceres, malformao congnita, distrbios endcrinos, neurolgicos e mentais. O Quadro 06 introduz os sintomas de intoxicao aguda e crnica dos principais grupos qumicos de agrotxicos.

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Quadro 06. Classificao e efeitos e/ou sintomas agudos e crnicos dos agrotxicos

Classificao quanto praga que controla Inseticidas

Classificao quanto ao grupo qumico

Sintomas intoxicao aguda

de

Sintomas Crnica

de

intoxicao

Organofosforados carbamatos

e

Fraqueza, abdominais,

clicas vmitos,

Efeitos retardados,

neurotxicos alteraes

espasmos musculares e convulses Organoclorados Nuseas, contraes involuntrias Piretrides Sintticos Irritaes conjuntivas, das espirros, vmitos, musculares

cromossomiais e dermatites de contato Leses hepticas, arritmias cardacas, leses renais e neuropatias perifricas Alergias, irritaes asma nas brnquica, mucosas,

excitao, convulses Fungicidas Ditiocarbamatos Tonteiras, tremores vmitos, musculares,

hipersensibilidade Alergias dermatites, respiratrias, Doena de

dor de cabea Fentalamidas Herbicidas Dinitroferis pentaciclorofenol Fenoxiacticos e Dificuldade respiratria, hipertermia, convulses Perda de apetite, enjo, vmitos, muscular Dipiridilos Sangramento fraqueza, conjuntivites Fonte: OPAS/OMS, (1996). nasal, desmaios, fasciculao

Parkinson, cnceres Teratogeneses Cnceres (PCP-formao de dioxinas), cloroacnes Induo da produo de

enzimas hepticas, cnceres, teratogeneses Leses hepticas, dermatites de contato, fibrose pulmonar

Os agrotxicos relacionados a seguir tm sido encontrados nos alimentos analisados pelo Programa de Anlise de Resduos de Agrotxicos em Alimentos (PARA) da ANVISA, seja em nveis acima dos limites mximos permitidos ou em culturas para as quais no so autorizados.

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Os agrotxicos do grupo piretride, usados na agricultura, no ambiente domstico e em campanhas de sade pblica como inseticida, esto associados a diversos efeitos graves sade. A cipermetrina (classe II) txica aos embries de ratos, incluindo a perda ps-implantao dos fetos e malformaes viscerais (ASSAYED et al, 2010). Efeitos semelhantes mortes neonatais e malformaes congnitas foram descritos em seres humanos plantadores de algodo (RUPA et al, 1991). O potencial mutagnico e genotxico da cipermetrina foi comprovado em diferentes estudos: aberraes cromossmicas, induo de microncleos, alteraes de espermatozides, mutaes letais dominantes, trocas de cromtides irms foram observados em camundongos (BHUNYA e PATI, 1988; SHUKLA e TANEJA, 2002; CHAUHAN, AGARWAL e SUNDARARAMAN, 1997). Em linfcitos humanos tratados com cipermetrina, tambm foram observadas aberraes cromossmicas e trocas de cromtides irms (KOCAMAN e TOPAKTAS, 2009). Alm disso, a cipermetrina induziu a promoo de tumores em camundongos (SHUKLA, YADAV e ARORA, 2002) e, quando tratados por via oral, verificaram-se alteraes nos nveis de testosterona com a conseqente diminuio do nmero de espermatozides (WANG et al, 2010), efeitos deletrios sobre os rgos reprodutivos (DAHAMNA et al, 2010) inclusive aps exposio na vida intrauterina (WANG et al, 2011) e tambm em ratos expostos por via oral (ELBETIEHA et al, 2001). Distrbios neurocomportamentais tambm foram observados em diferentes estudos (MCDANIEL e MOSER, 1993; SMITH e SODERLUND, 1998; WOLANSKY E HARRILL, 2008). O epoxiconazol, do grupo do triazol e de classe toxicolgica III, um agrotxico usado como fungicida em diversas lavouras, e interfere com a produo dos hormnios sexuais feminino e masculino, como mostrado em estudos utilizando sistemas in vitro de linhagens celulares humanas (KJAERSTAD et al, 2010) e in vivo (TAXVIG et al, 2007; MONOD et al, 2004). Em aves, ele tambm provocou a diminuio da produo de espermatozides e alteraes na morfologia de testculos (GROTE et al, 2008). Em outros estudos com ratos, a exposio ao epoxiconazol durante a gravidez levou a alterao do desenvolvimento reprodutivo e a perdas fetais (TAXVIG et al, 2007; TAXVIG et al, 2008).

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A fenopropatrina (classe II) provoca alteraes neuromotoras (WOLANSKY et al, 2006; WEINER et al, 2009). A permetrina (classe III), inseticida, est associada a mieloma mltiplo em seres humanos (RUSIECKI et al, 2009) e classificada como possvel carcingeno pela agncia de proteo ambiental norte- americana (US-EPA). Em ratos, esse ingrediente ativo causou dficits neurocomportamentais (ABDELRAHMAN et al, 2004). A lambda-cialotrina (Classe III), inseticida, est associada ao aparecimento de distrbios neuromotores (WOLANSKY et al, 2006). A betaciflutrina (Classe II), agrotxico inseticida, induziu a formao de microncleos em linfcitos humanos expostos in vitro e aberraes cromossmicas em ratos (ILA et al, 2008). Tambm foram observados outros efeitos deletrios, como malformaes fetais em camundongos (SYED et al, 2010), diminuio da funo reprodutiva masculina em ratos atravs do antagonismo do receptor de andrognio in vitro (ZHANG et al, 2008) e alteraes neurocomportamentais (WOLANSKY e HARRILL, 2008; WOLANSKY et al, 2006; CROFTON e REITER, 1988). Os organofosforados, grupo de agrotxicos inseticidas, causam numerosos efeitos sade humana. Para citar apenas alguns, o clorpirifs (classe II), inseticida, mostrou-se neurotxico conforme a reviso de Eaton e colaboradores (2008) e desregulou o eixo hormonal da tireide em camundongos quando a exposio ocorre na vida intrauterina (HAVILAND et al, 2010; DE ANGELIS et al, 2009). Alm disso, o clorpirifs tambm interferiu com o sistema reprodutivo masculino de ratos tratados por via oral, induziu alteraes histopatolgicas de testculos e levou diminuio da contagem de espermatozides e da fertilidade animal (JOSHI, MATHUR e GULATI, 2007). O diclorvs (Classe II), agrotxico inseticida, alterou a contagem de espermatozides e induziu alteraes histopatolgicas de ratos, efeitos que impactam na fertilidade animal (PEROBELLI et al, 2010; OKAMURA et al, 2009). O profenofs (classe II), agrotxico inseticida, induz dano gentico em cultura de linfcitos humanos (PRABHAVATHY et al, 2006) e aberraes cromossmicas em camundongos expostos por via oral (FAHMY e ABDALLA, 1998). Alterou tambm o sistema reprodutivo masculino de ratos tratados por via oral, onde evidenciaram-se alteraes histopatolgicas dos testculos e sntese de hormnio deficiente (MOUSTAFA et al, 2007).

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O carbendazim um benzimidazol (classe III), agrotxico fungicida, que causa aberraes cromossmicas (KIRSCH-VOLDERS et al, 2003; Mccarroll et al, 2002) e desregulao endcrina do sistema reprodutivo masculino de ratos (HESS; NAKAI, 2000; NAKAI et al, 2002; GRAY et al, 1989; GRAY et al, 1988). O carbendazim tambm foi responsvel pela contaminao de suco de laranja brasileiro devolvido pelo governo americano pois este agrotxico no possui registro naquele pas (FDA, 2012). O procloraz, uma imidazolilcarboxamida (classe I) um desregulador endcrino de diferentes eixos, diminuindo a produo e sntese de hormnios corticosterides e sexuais masculinos e femininos e prejudicando diversas funes fisiolgicas fundamentais vida, como a fertilidade masculina, o metabolismo de nutrientes e a regulao do sistema imunolgico (NORIEGA et al., 2005; KJAERSTAD et al, 2010; HIGLEY et al, 2010; OHLSSON et al, 2009; MULLER et al, 2009; LAIER et al., 2006; VINGGAARD et al., 2005). Outro efeito grave observado foi o aparecimento de malformaes fetais em ratos (NORIEGA et al, 2005). O clorotanolil, isoftalonitrila (agrotxico Classe III), um carcingeno nogenotxico (RAKITSKY et al, 2000) tambm causou a embriotoxicidade em camundongos expostos por via oral (FARAG et al, 2006; GREENLEE et al, 2004) e efeitos sobre o desenvolvimento de ratos (DE CASTRO et al, 2000). O tebuconazol, triazol (Classe IV), um agrotxico fungicida, e provoca alterao na funo reprodutiva de ratos, alterando outros parmetros como a sntese de hormnios e causando a feminilizao dos machos expostos durante a gestao e lactao (TAXVIG et al, 2007) e o desenvolvimento neuronal (MOSER et al, 2001). O -endossulfam e o -endossulfam, ismeros do endossulfam, so agrotxicos inseticidas e provocam efeitos genotxicos, pois induzem quebras na fita de DNA, troca entre cromtides irms e aumento na freqncia de microncleos (LU et al., 2000; Bajpayee et al, 2006), alm da inibio da apoptose (ANTHERIEU, et al, 2007). O endossulfam e seus ismeros e induziram a proliferao, in vitro, de clulas de cncer de mama humanas (MCF-7JE et al, 2005) e podem, dessa maneira, estar envolvidos no desenvolvimento de cncer de mama, provavelmente devido ao seu potencial estrognico (SOTO, CHUNG e SONNENSCHEIN, 1994).

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O endossulfam pode afetar o sistema endcrino e o metabolismo orgnico, atravs de sua atividade nas glndulas hipfise, tireide, supra-renais, mamas, ovrios e testculos, provocando efeitos no metabolismo do organismo, alterando a produo de hormnios, entre outros, do crescimento (GH), prolactina (PRL), adrenocorticotrfico (ACTH), estimulante da tireide (TSH), folculo estimulante (FSH), luteinizante (LH), triiodotironina (T3), tiroxina (T4), hormnios sexuais (BELDOMENICO et al, 2007) e outros componentes endcrinos (ARNOLD et al, 1996). Esse organoclorado tambm causa atrofia testicular, hiperplasia da paratireide, aumento de peso da glndula pituitria e do tero (ENVIRONMENTAL PROTECTION AGENCY, 2002), reduo da fertilidade feminina por endometriose (FOSTER e AGARWAL, 2002), reduo da fertilidade masculina com prejuzo da produo de espermatozides, a qualidade do smen e a motilidade dos espermatozides em roedores (DALSENTER et al, 1999). O endossulfam tambm imunossupressor em baixas doses, causando a diminuio na produo de anticorpos humorais, na resposta de imunidade celular: diminuio da funo dos macrfagos e decrscimo de nveis sricos de IgG (ATSDR, 2000; ABADIN et al, 2006; AGGARWAL et al, 2008) e induo da morte de clulas T natural killer, as quais atuam na supresso tumoral (KANNAN et al, 2000), de forma que o endossulfam agiria no desenvolvimento de tumores. O metamidofs um agrotxico inseticida e apresenta efeito genotxico, uma vez que induz a troca de cromtides irms in vitro e em roedores (Naturforsch, 1987) e aberraes cromossmicas na formao de microncleos em ratos Wistar. Foi positivo no teste de Ames nas cepas Salmonella typhimurium TA98 e TA100 (Karabay e Oguz, 2005). Ratos expostos ao metamidofs por via oral, apresentaram diminuio dos nveis de T3, T4 e TSH (SATAR et al, 2005) e alteraes ultraestruturais da tireide (SATAR et al, 2008), atuando diretamente no tecido tireoidiano ou na regulao do eixo HPT (SATAR et al, 2008). Alm desse importante eixo de regulao hormonal, o metamidofs tambm altera os nveis de ACTH, costicosterona e aldosterona (SPASSOVA, WHITE e SINGH, 2000). O metamidofs, inseticida que tambm apresenta pronunciado efeito imunosupressor, diminui ainda a proliferao dos linfcitos T do timo e a capacidade de formar anticorpos (TIEFENBACH e WICHNER, 1985; TIEFENBACH,

HENNINGHAUSEN e WICHNER, 1990).

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O triclorfom, agrotxico inseticida, tem efeitos sobre a reproduo e provoca a no disjuno cromossmica em diferentes tipos de clulas (CUKURCAM et al, 1994; YIN et al, 1998; TIAN, ISHIKAWA e YAMAUCH, 2000; DOHERTY, 1996), induzindo ainda aneuploidias em espermatcitos de ratos (SUN, 2000). Efeitos semelhantes foram observados em estudos epidemiolgicos humanos, como: a) anomalias congnitas e sndrome de Down em um vilarejo da Hungria onde as mulheres grvidas da regio foram expostas ao triclorfom atravs da alimentao com peixes contaminados (CZEIZEL et al. 1993); b) aumento da incidncia de quebra de cromossomos (BAO et al (1974 apud IPCS, 2000); c) aumento da incidncia de quebra de cromtides de linfcitos (KIRALY et al, 1979 apud IPCS, 2000). O triclorfom tambm considerado um desregulador endcrino pela agncia federal de meio-ambiente da Alemanha (UMWELTBUNDESAMT, 2001; HONG et al, 2007a) pois provoca vrios efeitos no sistema reprodutivo, como diminuio do nmero de espermatozides, do volume de lquido seminal, da motilidade e viabilidade de espermatozides (ENDS, 1999; HANNA et al, 1966; LEBRUN e CERF, 1960) e de perdas embrionrias, anormalidades fetais, diminuio do nmero de fetos vivos, taxas de gravidez, ausncia de folculos primrios (HALLENBECK e CUNNINGHAMBURNS, 1985; DOULL, 1962), alteraes estruturais na tireide e adrenais em ratos (NICOLAU, 1983). Diversos estudos mostram que o triclorfom tem elevada capacidade de causar efeitos neurotxicos como a sndrome colinrgica, a polineuropatia retardada, a esterase neuroptica e a sndrome intermediria em seres humanos (VASILESCU e FLORESCU, 1980; JOHNSON, 1981; SHIRAISHI et al, 1983; VASILESCU; ALEXIANU; DAN, 1984; AKIMOV e KOLESNICHENKO, 1985; CSIK, MOTIKA e MAROSI, 1986; ABOU-DONIA e LAPADULA, 1990; DE FREITAS et al, 1990; SHEETS et al, 1997; YASHIMITA et al, 1997; LOTTI e MORETTO, 2005) e tambm sobre animais de laboratrio ((BERGE et al., 1986; MEHL et al, 1994; HJELDE et al, 1998; MEHL et al, 2000; FONNUM; LOCK, 2000; MEHL et al, 2007; FLASKOS et al, 1999; HONORATO DE OLIVEIRA et al, 2002; ABDELSALAM, 1999; XIE et al, 1998; SHEETS et al, 1997; Hjelde et al 1998; Varsik et al 2005). O triclorfom tambm provocou imunosupresso em peixes (SIWICKI et al, 1990; DUNIER, SIWICKI e DEMAL, 1991; CHANG et al, 2006) e em clulas de

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camundongos (CASALE et al, 1993) e de coelhos (DESI, VARGA e FARKAS, 1972; DESI, VARGA e FARKAS, 1980). A parationa metlica um agrotxico inseticida que causa mutao nos testes de Ames e aberraes cromossmicas e quebras de DNA em amostras biolgicas de seres humanos expostos (HERBOLD, 1983; SUNIL KUMAR et. al. 1993; RASHID e MUMMA, 1984). Tambm provoca aberraes cromossmicas e induo de microncleos em roedores (MATHEW et al. 1992; VIJAYARAGHAVA e NAGARAJAN; 1994; GROVER e MAHLI, 1987; NARAYANA et al. 2005; GROVER E MALHI, 1985; VIJAYARAGHAVA e NAGARAJAN, 1994). A parationa metlica tambm um desregulador endcrino, uma vez que induz a hiperglicemia e hipoinsulinemia em ratos (LUKASZEWICZ-HUSSAIN et al, 1985) e aumento da atividade de aromatase, enzima responsvel pela converso dos hormnios andrgenos em estrgenos (LAVILLE et al, 2006) e efeito estrognico in vitro (CARVDI et al, 1996). Em aves, foi observada a diminuio dos nveis dos hormnios LH e testosterona, diminuio do peso dos testculos, do dimetro dos tbulos seminferos, do nmero de espermatozides normais e alteraes nas clulas germinativas (MAITRA et al, 2008). Em ratos, foram observadas alteraes na funo reprodutiva de fmeas com mudanas no ciclo estral (BUDREAU et al, 1973; SORTUR & KALIWAL, 1992; KALIWAL e RAO, 1983; KUMAR e UPPAL, 1986; DHONDUP; KALIWAL, 1997; ASMATHBANU e KALIWAL, 1997), na contagem e na morfologia de espermatozoides (NARAYANA et al, 2006; MATHEW et al, 1992; NARAYANA et al, 2005; SAXENA et al, 1980) com repercusses no sistema reprodutivo de machos (MAITRA & MITRA, 2008) e fmeas (RATTNER et al, 1982). A parationa metlica tambm causou a diminuio da proliferao de linfcitos T (PARK; LEE, 1978; LEE et al, 1979), inibio da quimiotaxia de neutrfilos humanos (LEE, 1979), diminuio de IL-2 (LIMA e VEGA, 2005) e diminuio da produo de anticorpos (INSTITRIS et al, 1992; CRITTENDEN et al, 1998). Intoxicaes agudas em seres humanos foram observadas em diversos estudos (Mccann et al, 2002; RUBIN et al, 2002a; RUBIN et al, 2002b; HILL JR. et al, 2002; WASLEY et al, 2002; REHNER et al, 2000). Efeitos neurotxicos em animais de laboratrio corroboram os efeitos encontrados em seres humanos (SUN et al, 2003)

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O forato, agrotxico inseticida, imunosupressor em camundongos em doses correspondentes exposio ocupacional humana (MOROWATI, 1998). O forato provoca aberraes cromossmicas in vivo em clulas da medula ssea de ratos, como troca entre cromtides, quebra e deleo (MALH e GROVER, 1987), clastogenicidade, aumento de recombinao (SCE) em clulas de linfcitos humanas SOBTI et al, 1982) e induo de microncleos (GROVER e MALHI, 1985). Em seres humanos, casos graves de intoxicao por forato foram registrados (MISSION, 2006; THANAL, 2001), mesmo diante da adoo de boas praticas de higiene e da utilizao de EPIs (KASHYAP et al, 1984). No quadro 07 relacionamos os problemas e/ou agravos sade causados pelos Ingredientes Ativos de agrotxicos em reavaliao/ou j banidos com as respectivas restries ao uso nos vrios pases do mundo.

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Quadro 07. Efeitos txicos dos ingredientes ativos de agrotxicos banidos ou em reavaliao com as respectivas restries ao uso no mundo. Agrotxicos Problemas relacionadosAbamectina

Proibido ou restrito

Toxicidade aguda e suspeita de toxicidade Comunidade Europia reprodutiva do IA e de seus metablitos proibido Neurotoxicidade, suspeita de carcinogenicidade e Comunidade de toxicidade reprodutiva e a necessidade de proibido revisar a Ingesto Diria Aceitvel. Europia-

Acefato

Carbofurano Alta toxicidade aguda, suspeita de desregulao endcrina Alta toxicidade aguda, suspeita de Cihexatina carcinogenicidade para seres humanos, toxicidade reprodutiva e neurotoxicidade

Endossulfam

Forato Fosmete Glifosato

Comunidade Europia, Estados Unidos- proibido Comunidade Europia, Japo, Estados Unidos, Canad- probido. Uso exclusivo para citrus no Brasil , 2010 Alta toxicidade aguda, suspeita de desregulao Comunidade Europiaendcrina e toxicidade reprodutiva. probido, ndia (autorizada s a produo) A ser proibido no Brasil a partir julho de 2013 Alta toxicidade aguda e neurotoxicidade Comunidade Europia, Estados Unidos- proibido Neurotoxicidade Comunidade Europiaproibido Casos de intoxicao, solicitao de reviso da Reviso da Ingesta Diria Ingesta Diria Aceitvel (IDA) por parte de Aceitvel (IDA) empresa registrante, necessidade de controle de impurezas presentes no produto tcnico e possveis efeitos toxicolgicos adversos Carcinognico para humanos

Comunidade Europiaproibido Comunidade Europia, Metamidofs Alta toxicidade aguda e neurotoxicidade. China, ndia- proibido. A ser proibido no Brasil a partir julho de 2012 Alta toxicidade aguda e toxicidade Comunidade EuropiaParaquate proibido Neurotoxicidade, suspeita de desregulao Com. Europia, ChinaParationa endcrina, mutagenicidade e carcinogenicidade proibido Metlica Lactofem Tiram Estudos demonstram mutagenicidade, toxicidade Estados Unidos- proibido reprodutiva e suspeita de desregulao endcrina Neurotoxicidade, potencial toxicidade reprodutiva carcinognico e Comunidade Europiaproibido. Proibido no Brasil a partir de 2010

Triclorfom

Fonte: ANVISA, 2008; ANVISA & UFPR, 2012.

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Embora brevemente aqui reunidas, as evidncias j disponveis de danos dos agrotxicos sade alertam para a gravidade da problemtica, na medida em que dialogam com os grupos de agravos prevalentes no perfil de morbi-mortalidade do pas. Entretanto, este conhecimento nos permite visualizar apenas a ponta do iceberg, tendo em vista que a massiva maioria dos estudos parte de anlises em animais ou in vitro, e que tais estudos analisam a exposio a um nico ingrediente ativo, situao rara no cotidiano das pessoas, que podem ingerir, num s alimento, dezenas de ingredientes ativos. Como se ver no item sobre os desafios ao conhecimento, muito pouco se sabe sobre os efeitos da exposio mltipla e a baixas doses. 1.2.3 Contaminao da gua de consumo humano e da chuva por agrotxicos A problemtica dos agrotxicos em gua para consumo humano no Brasil um tema pouco pesquisado e com escasso nmero de fontes oficiais de informaes acessveis para consulta. Segundo o Atlas de Saneamento e Sade do IBGE, lanado em 2011:Considerando os municpios que declararam poluio ou contaminao, juntos, o esgoto sanitrio, os resduos de agrotxicos e a destinao inadequada do lixo foram relatados como responsveis por 72% das incidncias de poluio na captao em mananciais superficiais, 54% em poos profundos e 60% em poos rasos.

Na Figura 4 se destacam os municpios que relataram poluio por agrotxicos em gua segundo o IBGE, 2011.

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Figura 4. Municpios que relataram poluio por agrotxicos em gua, Brasil, 2011.

Fonte: Atlas de Saneamento do IBGE, 2011.

Dados do Ministrio da Sade analisados por Neto (2010) reportam que da totalidade de Sistemas de Abastecimento de gua (SAA) cadastrados no SISAGUA (Sistema de Informao do Ministrio da Sade voltado para a vigilncia da qualidade da gua para consumo humano) em 2008, 24% apresentam informaes sobre o controle da qualidade da gua para os parmetros agrotxicos e apenas 0,5% apresenta informaes sobre a vigilncia da qualidade da gua para tais substncias (cuja responsabilidade do setor sade). [] Cabe destacar, ainda, que os dados apresentados referem-se s mdias de 16 Unidades da Federao, visto que 11 estados no realizaram tais anlises e/ou no alimentaram o referido sistema de informaes com dados de 2008 (NETO, 2010, p. 21). Ao analisarmos de forma retrospectiva as portarias que regulam os parmetros de potabilidade da gua brasileira, verificamos um aumento dos parmetros para serem monitorados. Na primeira norma de potabilidade da gua do Brasil, a portaria n 56/MS/1977, era permitida a presena de 12 tipos de agrotxicos, de 10 produtos

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qumicos inorgnicos (metais pesados), de nenhum produto qumico orgnico (solventes) e de nenhum produto qumico secundrio da desinfeco domiciliar. Na segunda norma de potabilidade da gua do Brasil, a portaria n 36/MS/1990, era permitida a presena de 13 tipos de agrotxicos, de 11 produtos qumicos inorgnicos (metais pesados), de 07 produtos qumicos orgnicos (solventes) e de 02 produtos qumicos secundrios da desinfeco domiciliar. Na terceira norma de potabilidade da gua do Brasil, a que esteve em recente reviso, a de n 518/MS/2004, era permitida a presena de 22 tipos de agrotxicos, de 13 produtos qumicos inorgnicos (metais pesados), de 13 produtos qumicos orgnicos (solventes) e de 06 produtos qumicos secundrios da desinfeco domiciliar. Nesta quarta e recente portaria de potabilidade da gua Brasileira, a de n 2.914/MS/2011, poderemos ter como permitidos a presena de 27 tipos de agrotxicos, de 15 produtos qumicos inorgnicos (metais pesados), de 15 produtos qumicos orgnicos (solventes), de 07 produtos qumicos secundrios da desinfeco domiciliar e a permisso para o uso de algicidas nos mananciais e estaes de tratamentos. A ampliao do nmero de substncias qumicas listadas na Portaria que define os critrios de qualidade da gua para o consumo humano reflete, ao longo do tempo, a crescente poluio do processo produtivo industrial que utiliza metais pesados e solventes, do processo agrcola que usa dezenas de agrotxicos e fertilizantes qumicos e da poluio residencial que utiliza muitos produtos na desinfeco domstica. Esta ampliao pode levar a uma cultura de naturalizao e consequente banalizao da contaminao, como se esta grave forma de poluio fosse legalizada. Por outro lado, porque monitorar menos de 10% dos ingredientes ativos oficialmente registrados no pas? Se seria invivel incluir na legislao o monitoramento de todos eles cerca de 600, razovel aprovar o registro destes biocidas, abrigados no paradigma do uso seguro? Mesmo aqueles que j deveriam ser objeto de monitoramento, de acordo com a legislao atual, tm sido precariamente acompanhados, dada a insuficincia da rede pblica de laboratrios de anlises toxicolgicas para atender ao uso massivo e crescente dos agrotxicos no pas, como se ver adiante. H ainda um quarto problema a considerar, que o estabelecimento de limites mximos de resduos aceitveis para cada um dos ingredientes ativos, sem estabelecer um nmero mximo de ingredientes por amostra, a soma de suas concentraes ou seus efeitos combinados.

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Em funo dessa relativa ausncia de informao, esse Dossi ir utilizar de estudos sobre a contaminao da gua potvel e chuva realizados em alguns estados brasileiros que utilizam os agrotxicos de forma massiva, como no estado do Cear e no Mato Grosso. 1.2.4 Contaminao das guas por agrotxicos no Cear A expanso da fronteira agrcola chega ao semi-rido do nordeste do Brasil com a implantao de empresas transnacionais e nacionais que, beneficiando-se do fcil acesso a terra e gua, se voltam especialmente para a fruticultura irrigada e o cultivo de camares para exportao. O modelo de produo do agro-hidronegcio caracteriza-se pelo monocultivo em extensas reas, antecedido pelo desmatamento e conseqente comprometimento da biodiversidade, e pela dependncia do consumo intensivo de fertilizantes e agrotxicos para atender s metas de produtividade. No estado do Cear, o Estudo epidemiolgico da populao da regio do Baixo Jaguaribe exposta contaminao ambiental em rea de uso de agrotxicos1 abordou dimenses da Sade dos Trabalhadores e de Sade Ambiental impactados pelo processo de desterritorializao induzido pela modernizao agrcola (Rigotto, 2011). Verificou-se que, a exemplo do que vem ocorrendo no pas, o consumo de agrotxicos no estado vem se intensificando: aumento das vendas em cerca de 100%, passando de 1.649 toneladas de produtos comerciais de todas as classes em 2005, para 3.284 toneladas em 2009. J em relao aos ingredientes ativos, o acrscimo no mesmo perodo de 963,3%, passando de 674 toneladas em 2005 para 6.493 toneladas em 2009 (MARINHO, 2010). No que diz respeito contaminao de alimentos, o estudo investigou a contaminao da gua para consumo humano, a partir das preocupaes manifestadas pelas comunidades da Chapada do Apodi, nos municpios de Limoeiro do Norte e Quixer. Estas so abastecidas pelo Servio Autnomo de gua e Esgoto - SAAE, que procede desinfeco da gua que percorre os canais do Permetro Irrigado JaguaribeApodi utilizando pastilhas de cloro. Esta gua pode ser contaminada pelos agrotxicos a partir das diferentes formas de pulverizao e de descarte de embalagens. Entre aquelas1

Pesquisa apoiada pelo Ministrio da Sade e CNPq, atravs do Edital MCT-CNPq/MS-SCTIEDECIT/CT-Sade N 24/2006.

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ressalta-se a pulverizao area, adotada no cultivo da banana, e realizada seis a oito vezes por ano, em reas de cerca de 2.950 hectares, utilizando fungicidas de classe toxicolgica 1 e 2 (extremamente txico e altamente txicos) e classe ambiental 2 (muito perigoso). Nestes canais, nas caixas dgua do SAAE e em poos profundos foram colhidas 24 amostras de gua (em triplicata), e analisadas pelo Laboratrio do Ncleo Interdisciplinar de Estudos Ambientais Avanados da UFMG, utilizando a tcnica de Cromatografia Lquida acoplada a Espectrometria de Massas com Ionizao Electrospray (LC-MS). O equipamento um Cromatgrafo ESI-MS modelo LCQFLEET da Thermo Scientific. Os resultados mostraram a presena de agrotxicos em todas as amostras, sendo importante destacar a presena de pelo menos trs e at dez ingredientes ativos diferentes em cada amostra, o que caracteriza a poli-exposio (Quadro 8).

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Quadro 08. Resultados das anlises laboratoriais para identificao de resduos de agrotxicos na Chapada do Apodi, Cear, 2009.DESCRIO DO LOCAL DA COLETA Torneira na localidade de Santa F gua na localidade de Santa Maria gua do canal que vai para Santa Maria gua (lodo) na casa de bomba 2 gua na casa de bomba 4 gua na casa de bomba 3 gua Reservatrio principal gua, na casa de bomba 1B gua, na casa de bomba 5B gua, na casa de bomba 5A gua, casa de bomba 6 gua, na casa de bomba 7A gua, na casa de bomba 7B gua, na casa de bomba 8B AGROTXICOS IDENTIFICADOS NAS AMOSTRAS Fosetil, Procimidona, Tepraloxidim, Flumioxacina, Carbaril Imidacloprido, Procimidona, Tepraloxydim, Carbaril, Azoxistrobina, Fenitrotiona Carbaril, Carbofurano, Procimidona, Fenitrotiona, Tebuconazol, Cletodin, Endossulfan, Abamectina Carbofurano, Procimidona, Fenitrotiona, Carbaril, Procloraz, Deltametrina, Clorpirifs Carbofurano, Procimidona, Fenitrotiona, Carbaril Procimidona, Difenoconazol, Carbaril, Fosetil, Carbofurano Carbofurano, Procimidona, Carbaril, Fenitrotiona Imidacloprido, Procimidona, Carbaril, Fenitrotiona Carbofurano, Procimidona, Carbaril Carbofurano, Procimidona, Tepraloxydim, Carbaril, Difenoconazol Carbofurano, Procimidona, Carbaril, Fenitrotiona Carbofurano, Procimidona, Fenitrotiona, Flumioxazina, Carbaril, Azoxistrobina Carbofurano, Procimidona, Fenitrotiona, Carbaril, Cletodim Fenitrotiona, Procimidona, Tepraloxidim, Tebuconazol, Carbaril, Endossulfan, Fosetil, Carbofurano

Carbofurano, Procimidona, Fenitrotiona, Tepraloxidym, Tebuconazol, Flumioxazina, Carbaril, Difeconazol, gua, na casa de bomba 8A Ciromazina, Cletodim Ciromazina, Glifosato, Carbofurano, Fenitrotiona,Procimidona, Fenitrotiona, Tepraloxidym, gua de poo, regio de Tome, propriedade Cletodim, Difenoconazol, Carbaril, Abamectina, Tebuconazol de Valdo de Cassia gua de poo, regio de Lagoa da Casca, Carbaril, Procimidona, Cletodim propriedade de Pedro gua de poo para abastecimento humano, Fosetil, Carbaril, Procimidona, Tebuconazol, Cletodim, Abamectina localidade Lagoa da Casca gua de poo para abastecimento humano, Carbofurano, Fenitrotiona, Procimidona, Tebuconazol, Carbaril localidade Lagoa da Casca Carbofurano, Procimidona, Fenitrotiona, gua de poo, regio Carnaba, propriedade Carbaril, Tepraloxidym, Epoxiconazol, Tebuconazol, Cletodim de Nonato de Jesom gua de poo, regio Carnaba, propriedade Glifosato, Ciromazina, Carbaril, Carbofurano, Fenitrotiona, Procimidona de Bracache Carbaril, Carbofurano, Procimidona, gua de poo, regio Carnaba, propriedade Glifosato, Fenitrotiona,Tebuconazol de Dagoberto Coleta de amostra de gua no Centro de Glifosato, Carbaril, Carbofurano, Procimidona, Epoxiconazol, abastecimento humano SAAE, regio Cabea Endossulfan, Abamectina Preta Fonte: MARINHO, 2010

Ressalte-se que vrios princpios ativos identificados nas amostras de gua foram ou esto sendo reavaliados neste momento pela Agncia Nacional de Vigilncia

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Sanitria ANVISA, do Ministrio da Sade, com vistas proibio ou restrio, como o Glifosato, Abamectina, Carbofurano, Endossulfam e Fosmete. Os dados do Relatrio Final do Plano de Gesto Participativa dos Aquferos da Bacia Potiguar, na poro relativa ao Estado do Cear, publicado pela Companhia de Gesto de Recursos Hdricos COGERH, corroboram a contaminao das guas subterrneas do Aqufero Jandara, j que das dez amostras analisadas, seis revelaram a presena de agrotxicos (Tabela 2). Tabela 02. Resultados das anlises de resduos de agrotxicos na gua da Bacia Potiguar, 2009.

Fonte: MARINHO 2010

1.2.5 Contaminao das guas e da chuva por agrotxicos no Mato Grosso Mato Grosso o maior produtor brasileiro de soja, milho, algodo e gado bovino e no ano de 2010 cultivou 9,6 milhes de hectares entre soja, milho, algodo e cana e pulverizou nessas lavouras cerca de 110 milhes de litros de agrotxicos (IBGE, 2011; INDEA, 2011; Pignati e Machado, 2011). Destaca-se, dentre os cinco maiores produtores, o municpio de Lucas do Rio Verde, com 37 mil habitantes, que produziu em 2010, cerca de 420 mil hectares entre soja, milho e algodo e consumiu 5,1 milhes de litros de agrotxicos nessas lavouras (IBGE, 2011 e INDEA, 2011). Pesquisadores da UFMT analisaram o acidente rural ampliado ou a chuva de agrotxicos que atingiu a zona urbana de Lucas do Rio Verde em 2006 quando os fazendeiros dessecavam soja transgnica para a colheita com paraquat em pulverizao area no entorno da cidade, ocasionando a queima de 180 canteiros de plantas

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medicinais no centro da cidade e de hortalias em 65 chcaras do entorno da cidade, e desencadeou um surto de intoxicaes agudas em crianas e idosos (PIGNATI et al., 2007; MACHADO, 2008). Durante os anos de 2007 a 2010 se realizou em Lucas Rio Verde uma pesquisa da UFMT e da FIOCRUZ, coordenada por Moreira et al. (2010) em conjunto com professores e alunos de 04 escolas, sendo uma escola no centro da cidade, outra na interface urbana/rural e duas escolas rurais, onde se avaliaram alguns componentes ambientais, humano, animal e epidemiolgico relacionados aos riscos dos agrotxicos. Os dados foram coletados, analisados e demonstraram: a) exposio ambiental/ocupacional/alimentar de 136 litros de agrotxicos por habitante durante o ano de 2010 (MOREIRA et al., 2010; IBGE, 2011; INDEA, 2011); b) as pulverizaes de agrotxicos por avio e trator eram realizadas a menos de 10 metros de fontes de gua potvel, crregos, de criao de animais, de residncias e periferia da cidade, desrespeitando o decreto/MT/2283/2009 que limita a 300 metros a pulverizao por trator ou pulverizador costal daquelas localidades e desrespeitaram-se a IN/MAPA/02/2008 que limita a 500 metros a pulverizao area de agrotxicos daquelas localidades (MOREIRA et al., 2010); c) contaminao com resduos de vrios tipos de agrotxicos em 83% dos 12 poos de gua potvel das escolas; em 56% das amostras de chuva (ptio das escolas) e em 25% das amostras de ar (ptio das escolas) monitoradas por 02 anos (MOREIRA et al., 2010); d) presena de resduos de vrios tipos de agrotxicos em sedimentos de duas lagoas, semelhantes aos tipos de resduos encontrados no sangue de sapos, sendo que a incidncia de malformao congnita nestes animais foi quatro vezes maior do que na lagoa controle (MOREIRA et al., 2010); 1.2.6 Contaminao de leite materno por agrotxicos Parte dos agrotxicos utilizados tem a capacidade de se dispersar no ambiente, e outra parte pode se acumular no organismo humano, inclusive no leite materno. O leite contaminado ao ser consumido pelos recm-nascidos pode provocar agravos a sade, pois os mesmos so mais vulnerveis exposio a agentes qumicos presentes no

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ambiente, por suas caractersticas fisiolgicas e por se alimentar, quase exclusivamente com o leite materno at os seis meses de idade. Foi realizada pesquisa da UFMT com o objetivo de determinar resduos de agrotxicos em leite de mes residentes em Lucas do Rio Verde MT (PALMA, 2011). Foram coletadas amostras de leite em sessenta e duas nutrizes (n=62) que se encontravam amamentando da segunda a oitava semana aps o parto, residentes em Lucas do Rio Verde. Dez substncias (trifluralina, -HCH, lindano, aldrim, -endossulfam, p,p- DDE, --endossulfam, p,p-DDT, cipermetrina e deltametrina) foram determinadas utilizando mtodo multirresduo com extrao por ultrassom e disperso em fase slida, celite, e identificao e quantificao (padronizao interna, heptacloro) por GC-ECD. Extraes sucessivas foram feitas com n-hexano: acetona, (1:1, v/v) e n-hexano: diclorometano (4:1, v/v). As anlises foram feitas em duplicata. A maioria das doadoras (95 %) tinha, em mdia, idade de 26 anos e 30% eram primiparas e residiam na zona urbana do municpio. Todas as amostras analisadas apresentaram pelo menos um tipo de agrotxico analisado, conforme observado na Figura 5. Observa-se que na maioria das amostras foram detectadas mais de um tipo de agrotxico. A frequncia de deteco de cada agrotxico apresentada no Quadro 09. Figura 5. Tipos de agrotxicos detectados em amostras de leite materno em Lucas do Rio Verde-MT, em 2010.

Fonte: PALMA, 2011

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Quadro 09. Freqncia de deteco de agrotxicos analisados em leite de 62 nutrizes de Lucas do Rio Verde-MT, em 2010. Substncia p,p- DDE -endossulfam Deltametrina Aldrim -endossulfam -HCH p,p- DDT Trifluralina Lindano CipermetrinaFonte: PALMA, 2011

% de deteco 100 44 37 32 32 18 13 11 6 0

Todas as amostras de leite materno de uma amostra de sessenta e duas nutrizes de Lucas do Rio Verde-MT apresentaram pelo menos um tipo de agrotxico analisado. Os resultados podem ser oriundos da exposio ocupacional, ambiental e alimentar do processo produtivo da agricultura que exps a populao a 136 litros de agrotxico por habitante na safra agrcola de 2010. Nessa exposio esto includas as gestantes e nutrizes, que podem ter sido contaminadas nesse ano ou em anos anteriores (PALMA, 2011; PIGNATI e MACHADO, 2007).

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1.3 Desafios para a Cincia1.3.1 Multiexposio, transgnicos e limites da cincia para proteger a sade. Existem muitas lacunas de conhecimento quando se trata de avaliar a multiexposio ou a exposio combinada de agrotxicos. A grande maioria dos modelos de avaliao de risco servem apenas para analisar a exposio a um princpio ativo ou produto formulado, enquanto que no mundo real as populaes esto expostas a mistura de produtos txicos cujos efeitos sinrgicos (ou de potencializao) so desconhecidos ou no so levados em considerao. Alm da exposio mista, as vias de penetrao no organismo tambm so variadas, podendo ser oral, inalatria e ou drmica simultneamente. Estas concomitncias no so consideradas nos estudos experimentais. Embora possam modificar a toxicocintica do agrotxico tornando-o ainda mais nocivo, o modelo experimental animal para verificar a toxicidade desenhado para uma nica via de exposio. Trata-se, pois de mais uma limitao dos mtodos experimentais e das extrapolaes de resultados para situaes

descontextualizadas frente a realidade das exposies humanas. Para avaliar a extenso desse desafio relacionamos um estudo realizando na Serra Gacha, no Rio Grande do Sul que aborda essa temtica. Em Bento Gonalves/RS, no ano 2006, foi realizado um estudo descritivo com 241 agricultores da fruticultura conduzido em duas etapas: no perodo de baixo e de intenso uso dos agrotxicos. Mediante um questionrio padronizado, foram coletados dados sobre: o tipo de propriedade rural (unidade produtiva), de exposio ocupacional aos agrotxicos, scio-demogrcos e de referncia a problemas de sade. Os agravos relacionados aos agrotxicos foram caracterizados em funo dos relatos de episdios de intoxicao, sinais / sintomas referidos e que so observados em situaes de intoxicao aguda ou crnica por agrotxicos e pelo resultado da anlise da colinesterase plasmtica. Todas as unidades produtivas usavam agrotxicos de vrios grupos e classes toxicolgicas. Em mdia, eram usados 12 tipos de agrotxicos (dp=4,8) variando de quatro a 30. Nos 20 dias que antecedem ao segundo perodo, em mdia, foram usados cerca de cinco diferentes produtos comerciais, chegando a 23. Ao todo, foram informadas 180 marcas comerciais diferentes, classificadas em 37 grupos qumicos. Desse total cerca de 30% estavam irregulares, sendo que trs (1,7%) eram

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produtos proibidos ou com registro cancelado; 32 (17,8%) no estavam includos no Sistema de Informaes sobre Agrotxicos-SIA; 17(9,4%) no foram identificados em nenhuma fonte de registro. O quadro 10 apresenta os principais produtos usados nas propriedades, com destaque para o herbicida Glifosato (98,3%) e os inseticidas Organofosforados-OF (97,4%). O uso de arsnico como formicida foi relatado em 20% das propriedades (FARIA, ROSA, & FACCHINI 2009).Quadro 10. Principais produtos usados nas propriedades em Bento Gonalves, RS, 2006, (n=235)

Grupo Qumico Glifosato e Glicinas (herbicidas) Organofosforados (inseticidas) Usa 3 ou mais tipos de Organofosforados Dicarboximidas (fungicidas captan, folpet, iprodione, outros) Ditiocarbamatos - total (fungicidas) Ditiocarbamatos associados com outros produtos Piretrinas ou piretrides (inseticidas) Fipronil (inseticidas, formicidas) Imidazlicos (fungicida benzimidazol e outros) Sulfato de cobre e compostos de cobre (fungicidas) Inorgnicos (sulfato de enxofre, zinco, cal, estanho e outros) Bipiridilos paraquat (herbicidas) Antraquinona (fungicidas) Triazois (fungicidas tebuconazol e outros) Arsenicais (inseticidas, formicidas) Alaninatos (fungicidas) Outros pesticidas agrcolas Reguladores de Crescimento (Cianamida e outros) Mistura de grupos qumicos Produto veterinrio Formicidas diversos Compostos de Uria Antibiticos Produto para controle biolgico Produto no identificado1- Os dados ignorados foram excludos do clculo 2- Triazinas, Dodine(guanidina), Fenoxicidos: 1 propriedade (0,4%) Fonte: Faria, NMX; Rosa, JAR; Facchini,LA, 2009.

n 231 229 136 207 204 61 130 120 113 101 87 78 68 67 46 32 30 15 14 14 10 5 3 3 3

% de prop 98,3% 97,4% 57,4% 88,8% 86,8% 26,0% 55,3% 51,1% 48,1% 43,0% 37,0% 33,2% 29,0% 28,5% 19,6% 13,6% 12,8% 6,4% 5,9% 5,9% 4,3% 2,1% 1,3% 1,3% 1,3%

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Augusto et al (2009) publicou uma anlise sobre essa questo, partir de um olhar crtico sobre o papel da pesquisa e da cincia frente aos impactos na sade dos agrotxicos que apresentamos a seguir. Em meados da dcada de 1970, quando ainda vivamos o perodo desenvolvimentista sob o estado de exceo (regime militar), o governo instalou o Plano Nacional de Defensivos Agrcolas, condicionando o crdito rural ao uso obrigatrio de agrotxicos. To forte foi essa medida, que rapidamente a maioria dos produtores rurais passou a s produzir com base nesses venenos. Tambm a academia, especialmente as escolas de formao de agronomia adotaram hegemonicamente esse modelo no ensino e na pesquisa. A criao da Embrapa tambm seguiu essa tendncia hegemnica. Assim, a poltica econmica foi harmonizada com a de desenvolvimento tcnico-cientfico e profissional. Para reforar o modelo qumico dependente, a academia tem recebido sempre grande incentivo para dar sustentao para o que insustentvel. Uma cincia subordinada, que ajuda a ocultar as nocividades, ao invs de valorizar as evidncias de danos que o mundo real mostra cotidianamente. A avaliao dos impactos dos agrotxicos na sade decorrente do consumo de alimentos produzidos com a utilizao de agrotxicos realizada fundamentalmente com base em estudos experimentais animais, nos quais o principal indicador a ingesto diria aceitvel - IDA. Parte-se da crena de que o organismo humano pode ingerir, inalar ou absorver certa quantidade diria, sem que isso tenha consequncia para sua sade. O IDA deriva de outro conceito a dose letal de 50% de morte de cobaias expostas (DL50). Trata-se de um indicador de toxicidade que significa que a metade da populao de cobaias no estudo morre ao ser submetido a uma determinada concentrao de agrotxico. Mediante uma abstrao matemtica, esse nmero extrapolado para os humanos. Assim se busca um valor aceitvel de exposio humana. Esses indicadores no tm sustentabilidade cientfica quando queremos tratar de proteo da sade. Trata-se na realidade de uma forma reducionista do uso da toxicologia para sustentar o uso de veneno, criando libis cientificistas para dificultar o entendimento da determinao das intoxicaes humanas especialmente as crnicas, decorrentes das exposies combinadas, por baixas doses e de longa durao.

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Como o objetivo do agrotxico matar determinados seres vivos incmodos para a agricultura (tem um objetivo biocida), a sua essncia , portanto, txica. A sntese qumica foi amplamente desenvolvida nas primeiras dcadas do sculo XX, especialmente no perodo das duas guerras mundiais, com o objetivo de produzir armas qumicas para dizimar o inimigo (seres humanos). O DDT, sintetizado em 1939, deu a largada dessa cadeia produtiva. Finda a segunda guerra mundial, a maioria das indstrias blicas buscou dar outras aplicao aos seus produtos: a eliminao de pragas da agricultura, da pecuria e de doenas endmicas transmitidas por vetores. A Sade Pblica ajudou a legitimar a introduo desses produtos txicos e a ocultar sua nocividade sob a alegao de combater esses vetores. Sabemos que a utilizao desses produtos em sistemas abertos (meio ambiente) impossibilita qualquer medida efetiva de controle, mas isto tambm no levado em considerao. No h como enclausurar essas fontes de contaminao e proteger os compartimentos ambientais (gua, solo, ar) e os ecossistemas. De forma difusa e indeterminada, os consumidores e os trabalhadores so expostos a esses venenos, uma vez que de modo geral esto presentes na alimentao da populao e no ambiente de trabalho do agricultor. Como vimos, embora seja corrente a utilizao de mistura de agrotxicos na prtica agrcola hegemonizada pelo mercado e pela poltica governamental, esta situao no contemplada na lei que regula o uso de agrotxicos. No h induo para a pesquisa sobre as interaes dessas misturas e a potencializao dos efeitos negativos na sade, no ambiente e na segurana alimentar e nutricional. Outra importante questo na avaliao da nocividade do modelo agrcola dependente de agrotxicos e de fertilizantes qumicos a desconsiderao dos contextos (em que os agrotxicos so aplicados), os quais so extremamente vulnerveis do ponto de vista social, poltico, ambiental, econmico, institucional e cientfico. H uma verdadeira chantagem global que impe o seu uso. Em nome da fome dos africanos, asiticos e latino-americanos engorda-se o gado que alimenta os europeus e norteamericanos, a custa das externalidades ambientais e sociais sofridas e pagas por esses povos, sem que seus problemas de direitos humanos de acesso a terra entre outros estejam resolvidos.

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Como os efeitos agudos sobre a sade humana so os mais visveis, as informaes obtidas sobre essas nocividades vm dos dados dos sistemas de informao sobre bitos, emergncias e internaes hospitalares de pessoas intoxicadas por esses produtos. A maioria dos casos identificados por exposio ocupacional ou por tentativas de suicdio. No temos os meios de avaliao direta dos efeitos da exposio decorrentes dos alimentos e das guas contaminadas, o que concorre para o ocultamento dessa nocividade. Seria necessrio utilizar modelos preditivos com base no princpio da precauo para se estimar as situaes de risco a que esto submetidas os grupos populacionais vulnerabilizados. Os servios e os profissionais de sade nunca foram e no esto devidamente capacitados para diagnosticar os efeitos relacionados com a exposio aos agrotxicos, tais como, as neuropatias, a imunotoxicidade, as alteraes endcrinas, os efeitos sobre o sistema reprodutor, sobre o desenvolvimento e crescimento e na produo de neoplasias, entre outros efeitos negativos. Sem esses diagnsticos, no se evidenciam as enfermidades vinculadas aos agrotxicos, e essas se ocultam, em favor dos interesses de mercado. Novamente buscam evidncias nos estudos experimentais animais. Uma forma complicada e complexa de proceder s evidncias de nocividades, restrita a poucos centros de pesquisa no mundo, onde geralmente esto as matrizes das indstrias dos princpios ativos. Normas arbitrrias, consideradas cientficas, orientam os sistemas de registro e de autorizao para sua comercializao no mundo. A proteo da sade pblica, com base em ampla segurana, est inibida pelos interesses do mercado, que, por sua vez, tem um arcabouo institucional que lhe d a blindagem necessria para manter o ciclo virtuoso de sua economia, e assim, o processo de ocultamento se fecha, em favor da utilizao desses produtos tcnicos com o apoio dos governos. As polticas baseadas em avaliao de risco determinam geralmente exposies ou pontos iniciais, virtualmente seguros, com os quais buscam medidas de proteo. Como vimos, essas no so tomadas, uma vez que o modelo de evidncias est baseado em uma cincia biolgica que se pretende suficiente para uma questo que a transcende, (por ser complexa e no-linear). Sabe-se que a exposio a baixas doses de agrotxicos induz a morte celular, citotoxicidade, reduo de viabilidade das clulas, efeitos que no so considerados.

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Na verdade, seriam indicadores de efeito, podendo ser ajustados num modelo de vigilncia da sade mais precaucionrio. Avaliando as escalas cotidianas de exposies, necessrio associ-las com sinais e sintomas subclnicos, no apenas com eventos de doenas graves ou de morte. O modelo de avaliao de risco supe relaes de linearidade entre exposio e efeito, mas adota limiares aceitveis de exposio que podem evidenciar apenas os efeitos mais grosseiros. As vulnerabilidades dos mtodos em cincia so utilizadas para a manuteno da situao de risco. Abaixo da dose aceitvel, os efeitos no se comportam de forma previsvel. Por isso, inventaram modos de anlise de risco que buscam a causa da causa, mas no as relaes entre os elementos que compe o processo de determinao do fenmeno e onde se encontram as possibilidades reais de transformao. A inverso do nus da prova no praticada pelas empresas, e os sistemas reguladores no exigem que o faam. No cabe s agncias regulatrias provar que um agrotxico txico; deveria caber s empresas demonstrar com o mesmo rigor que no so nocivos para a sade humana ou para o meio ambiente. Quando h dvida ou insuficincia de estudos, devemos levar em conta o princpio da precauo, que orienta a ao quando uma atividade, situao ou produto representa ameaas de danos sade humana ou ao meio-ambiente. As medidas precaucionrias devem ser tomadas, mesmo quando no possvel estabelecer plenamente as provas cientficas da relao entre causa e efeito. A no-linearidade entre exposio e efeito e os relacionamentos no monotnicos entre variveis independentes e dependentes so desconsiderados ou tratados como desvios. No entanto, as interaes que se observam so estadodependentes de mltiplos condicionantes, tais como: coexposies, idade, sexo, nutrio, situaes fisiolgicas, condies de trabalho, condies de vida etc. Os sistemas de resposta do organismo humano podem ter amplificadores biolgicos individuais, e isso deve ser considerado, pois o ser humano no se comporta como se fosse um homem mdio ou uma mquina.

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Eventos mltiplos esto envolvidos na vida real, com mltiplos valores-limites que ocorrem simultaneamente e que a cincia aplicada no capaz de medir, sequer de reconhecer como possibilidade. A despeito da Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria ANVISA buscar um processo de avaliao e de informao para atender os aspectos de proteo da sade pblica, ela no adequadamente apoiada pelo conjunto dos demais rgos governamentais, o que torna sua ao difcil para o efetivo controle dos efeitos nocivos do uso dos agrotxicos. Uma srie de questes que ns no compreendemos corretamente nos obriga a fazer novos questionamentos relacionados com os agrotxicos, e a mostrar como so frgeis as bases cientficas que do sustentao ao seu uso para fins agrcolas ou de sade pblica. Como se do as reaes com todas as protenas que interagem no organismo, como um sistema integrado? Como a inibio da enzima acetilcolinesterase pode prever outros efeitos no avaliados nos expostos? Est perfeitamente adequada a dosimetria utilizada aos fenmenos do metabolismo e da toxicocintica? As diferenas de suscetibilidade (idade e gentica) esto consideradas na avaliao dos efeitos dos agrotxicos? Esto includas todas as fontes de exposio (consumo de alimentos, de gua, por exemplo) no balano da exposio? A exposio mltipla e todos os agentes que atuam simultaneamente, potencializando a toxicidade, so considerados? Podemos concluir que as avaliaes feitas para inferir a nocividade dos agrotxicos determinam apenas as fontes de linearidade aparente. Na verdade, no se pesquisam as relaes no-lineares dos fenmenos biolgicos e dos contextos sociais que impem sobrecargas de trabalho e de exposio aos seres humanos e aos ecossistemas e nem os aspectos culturais relacionados a alimentao. Os eventos reconhecidos so aqueles que esto apenas na escala da doena e da morte, mas no da vida e da sade. A avaliao de risco praticada no est adaptada realidade em que se aplicam os agrotxicos. Diante de tantas lacunas de conhecimento e de tantas vulnerabilidades, devemos perguntar: lcito manter os agrotxicos em uso na agricultura nesse contexto? Por que no se exige das empresas a inverso do nus da prova? Qual o papel da universidade

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em desenvolver mtodos que de fato avaliem os impactos negativos das tecnologias mediante as condies realistas de seu uso na sociedade e das reais condies de proteo, bem como a partir de conceitos precaucionrios. Outra situao que deve merecer a ateno da sade pblica so as plantas transgnicas destinadas direta ou indiretamente para a alimentao humana, uma vez que no dispensam o uso de agrotxicos em sua produo. O discurso inicial de que a transgenia na agricultura seria uma tecnologia para inibir o uso de agrotxicos caiu em descrdito. No caso da soja Roundup Ready tolerante ao glifosato, por exemplo, isto no corresponde verdade, pois induz ao maior consumo desse herbicida. Somente o glifosato representa em torno de 40% do consumo de agrotxicos no Brasil. Tambm se oberva o fenmeno de resistncia a esse veneno das plantas adventcias no desejadas, exigindo maior quantidade de sua aplicao e de associao a outros agrotxicos. Alm disso, no processo de colheita dessa soja tansgnica se usa como dessecante/maturador, outros herbicidas extremamente txicos como o Paraquat, Diquate e 2,4 D. O aumento no consumo de herbicidas na produo de soja responsvel pela posio de destaque do Brasil como o maior comprador de agrotxicos do mercado mundial, ampliando a situao de nocividade para a segurana alimentar, para a sade e para o ambiente. Alm da questo dos agrotxicos associados, a tecnologia transgnica na produo de alimentos merece uma investigao profunda do ponto de vista da segurana alimentar e da sade, que no objeto especfico deste dossi.

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1.3.2 Desafios para as polticas pblicas de controle, regulao de agrotxicos e para a promoo de processos produtivos saudveis A ABRASCO, por meio de seus associados em seus grandes congressos, foi convocada a se posicionar frente a questo dos agrotxicos, de forma a cumprir sua misso de contribuir para o enfrentamento dos problemas de sade pblica da sociedade brasileira. Esse Dossi, apesar de no ser um documento exaustivo, j um passo nessa direo, pois contem evidncias cientficas suficientes para subsidiar a tomada de decises para que o Estado exera seu papel constitucional de proteger a sade e o ambiente. Esse compromisso pode ser verificado por meio da aprovao de duas moes, a primeira no I Simpsio Brasileiro de Sade Ambiental, realizado em Belm do Par, em dezembro de 2009 e a segunda no Congresso Brasileiro de Cincias Humanas e Sociais em Sade, realizado em So Paulo em abril de 2011(Anexo I) que apontaram a necessidade da ABRASCO desenvolver: pesquisas, tecnologias, formar quadros, prestar apoio aos rgos e instituies compromissadas com a promoo da sade da sociedade brasileira, e com os movimentos sociais no sentido de proteger a sade e o meio ambiente na promoo de territrios livres dos agrotxicos, e fomentar a transio agroecolgica para a produo e consumo saudvel e sustentvel;

E Que ABRASCO apie a Campanha Nacional Permanente Contra os Agrotxicos e Pela Vida, O CONSEA Conselho Nacional de Segurana Alimentar e Nutricional um espao de articulao entre governo e sociedade civil na proposio de diretrizes para as aes na rea da alimentao e nutrio. Na perspectiva de construo de polticas pblicas relacionadas ao tema de produo, abastecimento e consumo, organizou uma srie de Exposies de Motivos para a presidenta Dilma Rousseff tendo o combate ao uso de agrotxicos como tema recorrente. As Exposies de Motivos so instrumentos formais de comunicao entre o Conselho e a presidenta que relatam decises dos

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conselheiros sobre as plenrias. Em 2012 os temas que envolveram agrotxicos foram: feijo transgnico, biodiversidade, alimentao escolar e alimentao saudvel, agricultura familiar e transio agroecolgica, entre outros. Com a qualificao do debate do controle social sobre o tema, que antes era visto na perspectiva de fiscalizao e controle, foi se ampliando para a dimenso de banimento, suspenso de subsdios fiscais at alcanar o status de criao de polticas e alternativas ao seu uso com instituio de mecanismos de produo de alimentos agrosustentveis agroecologia e que dialogassem com o segmento da agricultura familiar e camponesa. Neste debate, um outro aspecto fundamental tambm foi a pactuao do conceito de alimentao adequada e saudvel que reestabeleceu a lgica de produo e consumo como partes de um todo e com princpios e prticas comuns , tendo a soberania alimentar como um valor agregador do processo. O CONSEA abrigou um Grupo de Trabalho multidisicplinar que construiu o conceito de alimentao adequada e saudvel como: a realizao de um direito humano bsico, com a garantia ao acesso permanente e regular, de forma socialmente justa, a uma prtica alimentar adequada aos aspectos biolgicos e sociais dos indivduos, de acordo com o ciclo de vida e as necessidades alimentares especiais, pautada no referencial tradicional local. Deve atender aos princpios da variedade, equilbrio, moderao, prazer (sabor), dimenses de gnero e etnia, e formas de produo ambientalmente sustentveis, livre de contaminantes fsicos, qumicos e biolgicos e organismos geneticamente modificados. Este conceito explicita a perspectiva de uma alimentao livre de alimentos com agrotxicos e transgnicos (BRASIL, 2007). Tambm foi pesquisado o relatrio da 4 Conferncia Nacional de Segurana Alimentar e Nutricional (CNSAN), realizada em 2011(Anexo III). Cabe ressaltar que as propostas e moo apresentadas tambm so subsdios para a formulao de polticas pblicas que esto amplamente apoiadas por evidncias cientficas como apontadas nos itens anteriores desse Dossi. 1.3.3 Riscos do uso dos resduos txicos na produo de micronutrientes para a agricultura

O uso de resduos industriais indicados como matria-prima para a fabricao de micronutrientes utilizados como insumos agrcolas, as definies e o tratamento a ser

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dado aos resduos perigosos neles presentes esto em discusso pela Cmara Tcnica de Qualidade Ambiental e Gesto de Resduos do Conselho Nacional de Meio Ambiente CONAMA, que apresentou uma proposta para aprovao se constitui mais uma legalizao txicoagrcola. Alm dos agrotxicos, dos fertilizantes qumicos e das plantas geneticamente engenheiradas pela transgenia que danam a vida em sua essncia, estamos s vsperas desse outro crime contra a natureza e a sade humana. A resoluo que pretende legalizar e regular a utilizao de resduos industriais na fabricao de micronutrientes de uso na agricultura, estabelecendo Limites Mximos Permitidos de contaminantes txicos, afetar irremediavelmente a qualidade dos solos. A permisso de utilizao de resduos perigosos provenientes dos setores de fundio e siderurgia na produo de micronutrientes para agricultura mais uma concesso do Governo Federal aos interesses empresariais e ampliar a atual situao de contaminao e insegurana alimentar, pois ser amplificada a possibilidade de contaminao dos solos por Chumbo, Cdmio, Mercrio, Arsnio, Mangans, Organoclorados, Dioxinas e Furanos, elementos desnecessrios s plantas e nocivos sade humana. O que est em jogo o solo, que fundamental para as presentes e futuras geraes. No possvel estabelecer-se limites mximos aceitveis para a exposio humana a esses contaminantes, pois diversos deles produzem efeitos irreversveis e que no so dose-dependentes, uma vez que a exposio crnica a baixas doses pode sim afetar negativamente a sade. Os trabalhadores da indstria e os rurais sero os primeiros e mais intensamente penalizados por essa resoluo. H total improcedncia e falta de sustentabilidade na proposta de resoluo CONAMA. A posio que tomamos no mbito do Grupo Inter GTs da Abrasco de Dilogos e Convergncias no I Congresso Mundial de Nutrio e Sade, Rio de Janeiro, abril de 2012 de que se probam as empresas de micronutrientes e de fertilizantes para a agricultura de utilizarem resduos industriais com poluentes e substncias txicas para a sade humana em qualquer concentrao (ver Anexo 1).

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1.3.4 A Agroecologia como uma estratgia de promoo da sade A proposio de um texto de alerta do debate a cerca dos agrotxicos fundamental para a garantia de direitos plenos estabelecidos aps grandes lutas pautadas por pesquisadores e pesquisadoras da sade coletiva que agora so chamados a des