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  • 7/23/2019 Dossier Felizmente Ha Luar

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    MDULO 11 TEXTOS DE TEATRO II

    PORTUGUS| prof. Ana Patrcia Vicente

    DOSSIER Felizmente H Luar!

    ESCOLA PROFISSIONAL DE RIO MAIOR

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    DOSSIER

    Felizmente H Luar!

    CONTEXTUALIZAO HISTRICO-SOCIAL DA OBRA

    Apesar de a aco da obra ter lugar em 1817, importa situar os acontecimentos queesto na sua origem:

    1- Com autoproclamao de Napoleo, em 1799, como 1. imperador dos franceses,a Europa atravessa um perodo conturbado. A situao poltica em Portugalreflecte, pois, decises estrangeiras

    2- Intimado por Napoleo a declarar guerra Inglaterra, em 1805, o GovernoPortugus tenta contemporizar, fechando os portos s mercadorias, mas nohostilizando os ingleses residentes.

    3- Forado a aderir ao bloqueio continental, em 1807, Portugal sequestra algunsbens ingleses, apesar de permitir a livre circulao dos produtos. A dubiez doGoverno desencadeia a ira de Napoleo, que, nesse mesmo ano, conclui umtratado com Espanha e exclui Portugal do mapa europeu. Para a execuo dotratado, o imperador francs envia Junot para o nosso pas. O prncipe regente, D.Joo, a conselho do Governo Ingls, abandona Portugal e refugia-se no Brasil.

    4- Aps as batalhas de Rolia e do Vimeiro, em 1808, Wellesley derrota as tropasfrancesas, as quais so autorizadas a sair do pas com todos os despojos deguerra. Um ano depois, em 1809, Soult invade, pela 2. vez, Portugal, enovamente Wellesley e Beresford rechaam o exrcito invasor. Massena ser oltimo representante napolenico a tentar conquistar Portugal.

    5- Em 1810, as tropas invasoras so derrotadas nas batalhas do Buaco e de Linhas

    de Torres. Com a rendio da guarnio francesa, o exrcito francs abandona,definitivamente, o pas.6- A corte estava ausente (o rei encontrava-se no Brasil) e a administrao do reino

    fora entregue a uma trade governativa (D. Jos Antnio de Meneses e SousaCoutinho, D. Miguel Pereira Forjaz e William Beresford).Mas o pas era palco de descontentamento, motivado no s pela ausncia dacorte, como tambm pelas dificuldades acrescidas advindas da guerra.A contestao ao governo fantoche liderado por Beresford e a pesada cargaonerosa para a manuteno da corte e do rei, entretanto aclamado (em 1816) emterras estrangeiras, geravam a desconfiana e o desagrado de um povo, que,mais uma vez, se sentia abandona sua triste sorte.

    7- A passividade e o clima de suspeio que se sentia propiciaram as ideias de

    conjura e a procura de um lder. Amado pelo povo, respeitado pelos amigos eodiado pela classe governativa, Gomes Freire escolhido como elementosacrificial, no pelas aces que comete, mas pelo perigo que representa.

    Estes so, no fundo, os antecedentes que explicam, em Felizmente h Luar, o TEMPODA H I S TR I A, que diferente do TEMPO DA ESCRI TA , embora entre ambos haja umparalelismo histrico, quer em relao ao estado do pas, quer em relao polticavigente. Vejamos como feita essa analogia na obra:

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    Felizmente h Luar!

    I Tempo da Histria_ A conspirao abortada de 1817 (anterior ao triunfo do liberalismo)

    _ sentimento de abandono dos portugueses face ao monarca (Brasil);_ sentimento de revolta perante a drenagem de dinheiro para o Brasil (rendas econtribuies);_ declnio comercial;_ influncia britnica no exrcito e na Regncia.

    1817 = priso de alguns indivduos por conspirarem contra a vida do MarechalBeresford, o governo e as instituies vigentes.= execuo de doze indivduos, incluindo o presumvel chefe da conspirao: otenente-general Gomes Freire de Andrade.

    Acto que no evita rebeldias, mas que as estimula devido tirania demonstradapelos governantes e impossibilidade do cidado comum alterar as suas condies devida.

    O rei e o governo, longe de Portugal, no se davam conta das tenses polticas eeconmicas existentes e a Regncia (para agradar aos governantes) ignoravacertos factos e escondia a sua gravidade.

    A Revolta de 1820

    Ausncia do rei e do governo (o rei estava no Brasil desde as invases francesas) Revolta do exrcito (Porto, Agosto de 1820)

    Formao de uma Junta Provisional do Governo Supremo do Reino sob apresidncia do brigadeiro-general Antnio da Silveira.

    OBJECTIVOS: tomar conta da Regncia e convocar as Cortes para adoptar umaConstituio.

    Em Lisboa h uma resistncia da Regncia atravs de denncias e condenao dosrevolucionrios como inimigos da Ptria.

    Em Setembro, h uma revoluo dos regentes e constituio de um governo

    provisrio sob a presidncia de Freire de Andrade (parente do tenente-general GomesFreire de Andrade).

    Em 28 de Setembro, Norte e Sul fundem-se numa nova Junta Provisional sob apresidncia doPrincipal Freire de Andrade e sob a vice-presidncia de Andrade da Silveira.

    1834 = Acordo de vora Monte e implantao definitiva desse regime contra oAntigo Regime absolutista.

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    RESPOSTA S ASPIRAES DO POVO

    desejo de uma constituio poltica assente sobre bases populares, uma limitaosevera s prerrogativas do rei, liberdade de religio, de impresso e de palavra,liberdade de comrcio e de indstria opostas ao despotismo.

    REFERENTE HISTRICO DA PEA

    Temtica: movimentos que tentaram implantar entre ns o regime liberal tendoGomes Freire de Andrade como crebro da conjura que, embora nuncaaparea, est sempre presente e condiciona toda a estrutura interna dapea.

    Gomes Freire de Andrade (1757- 1817)

    General portugus nascido em Viena de ustria, que seguiu a vida militar depois

    de ter vindo para Portugal aos 24 anos. Participou em vrias guerras at ser presopor ter sido acusado de ter participado na terceira invaso francesa. Contudo,mais tarde, foi reabilitado dessa acusao, mas obrigado a manter residncia fixaem Lisboa.

    Ligado aos ideais progressistas e membro da Maonaria, foi acusado de terparticipado na conspirao de 1817, que punha em causa a ausncia da corte deD. Joo VI no Brasil, a presena militar inglesa no pas e a grave situaoeconmica que ento se vivia. O general foi enforcado no forte de Julio da Barrae depois queimado. O fomento da revoluo estava lanado e iria dar os seusfrutos no dia 24 de Agosto de 1820, com a revoluo liberal.

    Surto de conscincia liberal entre o exrcito e a burocracia. (MATILDE)

    As classes dominantes (Conselho de Regncia) temem a ameaa de destruio daestrutura tradicional do Reino, supresso dos privilgios de que gozavam edestruio da hierarquizao das classes sociais. (D.MIGUEL FORJAZ / PRINCIPALSOUSA / BERESFORD)

    II Tempo da Escrita (1958-1962) Regime Salazarista

    Como surgiu o regime salazarista e que aspectos o caracterizam?

    Com a abolio da monarquia e a proclamao da 1. Repblica, a 5 de Outubrode 1910, Portugal encerrava um volume da sua histria, estando agora liberto dascadeias monrquicas. No entanto, a surpresa da liberdade pouco durou, pois, em1914, comeou a I Grande Guerra e o pas foi forado a participar enquanto aliadoda Inglaterra.

    A 5 de Dezembro de 1917, o general Sidnio Pais proclama-se chefe de Estado,aps um golpe militar bem sucedido, vindo a ser assassinado a 14 de Dezembrode 1918.

    A rendio da Alemanha e o armistcio (trguas) proporcionavam Europa umperodo de paz, aps 4 anos de guerra, todavia, em Portugal, as dificuldadesgovernativas eram cada vez maiores at que, a 28 de Maio de 1926, o generalGomes da Costa toma o poder na sequncia de um golpe de Estado; os seus

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    ideais polticos iro, gradualmente, dar forma a um novo sistema poltico oEstado Corporativo , o qual ser definido na nova Constituio Poltica.

    Eleito novo presidente da Repblica, a 25 de Dezembro de 1928, scar Carmonaconvida para Ministro das Finanas Antnio de Oliveira Salazar, que ascender aPresidente do Conselho de Ministros em 1932, cargo que desempenhar at 6 deSetembro de 1968, tendo sido afastado por doena (derrame cerebral).

    Os 40 anos em que Salazar dirigiu a Nao tornaram o pas num Estadoenraizadamente rural, moral e paternal. Para Salazar, a melhor forma de governarera disciplinar o povo atravs do silncio e da invisibilidade, ou seja, num EstadoCorporativo, a individualidade era o elemento desestabilizador que causava o caosna aparente harmonia e na moral hipcrita que condicionavam a existncia de umpovo e de um pas.

    Salazar instaura um sistema poltico baseado no medo, no ostracismo, nasuspeio e na denncia a que no sero alheios os princpios de conduo e decontrolo do inconsciente colectivo. Para manter a harmonia no pas, Salazar cria

    em 1933, a PVDE (Polcia de Vigilncia e de Defesa de Estado),

    transformada, posteriormente, em 1954, em PIDE (Polcia Internacional e deDefesa de Estado) e, por fim, em 1969, a DGS (Direco-Geral de Segurana). Asfunes deste rgo eram:

    a.

    interrogar;b.

    prender;c.

    torturar;

    O Estado Novo de Salazar nada tinha de novo: ao totalitarismo da monarquia do sculo XIX sucedia o totalitarismo de Estado; Inquisio do sculo XIX sucedia a PIDE.

    Enquanto isso, o povo continuava, na sua ingenuidade, a acreditar que a figurapaternal do rei, neste caso do Presidente do Conselho, se preocupava com o seu bem-estar e que, tal como antigamente, voltaria a ser dono de um imprio e grande na suahistria.

    Em 1958, o marasmo que se fazia sentir na poltica, em Portugal, vai ser sacudidopela agitao da candidatura do General Humberto Delgado (que ficou conhecidocomo o general sem medo) Presidncia da Repblica contra o candidatoinstitucional Amrico Toms.

    Todavia, a 8 de Junho de 1958, na corrida para as eleies presidenciais, AmricoToms declarado vencedor por maioria absoluta. E foi-o, de facto, mas atravsda fraude e da manipulao do acto de voto.

    Em 1960, Humberto Delgado, perante vrias presses, pede asilo Embaixadado Brasil e parte, em Abril, para esse pas.

    Aps algumas tentativas falhadas, Humberto Delgado assassinado, em 1965,por uma brigada da PIDE, chefiada pelo inspector Rosa Casaco.

    Concluso: A nvel governamental, notava-se, portanto: a proibio de todas as iniciativas pblicas oposicionistas; represso e prises de elementos ligados s ideias liberais e socialistas (Mrio

    Soares, Ramos da Costa) e ligados s juntas de aco patritica (Aquilino Ribeiro,

    Arlindo Vicente).

    d.

    Exilare.

    censurarf.

    assassinar

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    Entre 1958-1962, a GNR e polcia de choque manifestam represso violenta face aalgumas manifestaes pblicas: 5 de Outubro; 1. de Maio; greves estudantis.

    Este era, ento, o clima vivido devido ao regime isolado (regime Salazarista) e luta

    pela sobrevivncia at Revoluo de 25 de Abril (termo da ditadura)

    Lus de Sttau Monteiro recorre a um exemplo da histria portuguesa para denunciar aditadura, com a violncia , as perseguies e a opresso, dos anos sessenta do sculo XX poca da produo da obra.

    III Paralelismo HistricoEscrita em 1961, Felizmente h Luar! , portanto, uma pea, atravs da qual o seu autordenuncia o totalitarismo e a violncia do Estado, estabelecendo um paralelismo histricocom o perodo que antecede o Liberalismo. Com efeito, o discurso implcito, ao longo da

    pea, um discurso duro, de crtica e de anlise, sobre um pas isolado, ostracizado pelaclasse dirigente, miservel no ser e no sentir das suas gentes.

    Vejamos, ento, o seguinte esquema:

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    LUS DE STTAU MONTEIRO E BERTOLT BRECHT

    BERTOLT BRECHT- Dramaturgo alemo que nasceu a 10 de Fevereiro de 1898 e faleceu em 1956. A seguir I Guerra Mundial debruou-se sobre os princpios da dramaturgia e usou todos os

    meios visuais, auditivos e literrios.

    A Vida de Galileu (1933) / Me Coragem e seus Filhos (1938) obras de Brecht

    - Elaborou a teoria do teatro pico e dominou a evoluo do teatro contemporneopara satisfazer as necessidades de uma idade nova, revolucionria e cientfica.

    TEATRO = instrumento de construo e transformao social.

    - Brecht considerava que o teatro aristotlico criava terror e piedade no espectador,porque este se identificava com o heri e se esquecia de si prprio (caractersticahipntica). Assim, considerava tudo isto fisicamente repugnante e obsceno.

    TEATRO (segundo Brecht): mais do que um bem de consumo que se assimila, mas se esquece facilmente; deve fazer com que os espectadores pensem sem impor emoes.

    NB: Atravs da distanciao histrica, o espectador deveria ser capaz de reflectir sobreacontecimentos passados e ter uma percepo da complexidade da condio humanaperante as diferentes foras sociais, econmicas e histricas que afectam o seu dia- a-dia.

    MEIOS UTILIZADOS PARA ESTIMULAR AS FACULDADES CRTICAS(TEATRO PICO)1) a personagem emerge da funo social do indivduo;2) a histria desenrola-se numa srie de situaes separadas (cada uma acabada ecompleta em si mesmo);3) o efeito de conjunto da pea produzido pela justaposio e montagem deepisdios contrastantes;4) os elementos no literrios da representao (decorao, msica e coreografia) soindependentes e devem servir para destruir a iluso da realidade;5) as atitudes essenciais dos seres humanos so expressas pelos sinais exteriores(comportamento, entoaes, jogos de fisionomia);

    6) a luz essencial para criar a atmosfera e sugerir estados de alma, mas as suas fontesdevem ser visveis aos olhos do pblico de modo a no dar origem a iluses secretas;7) a mensagem de revolta contra o poder poltico e a convico que necessriomostrar ao mundo e o homem em mudana esto sempre presentes.

    defesa das capacidades do homem ( direito e dever de transformar o mundo) tentativa de mostrar a realidade para o espectador reagir criticamente e tomar

    uma posio.

    I Carcter pico da peaFelizmente H Luar! um drama narrativo, de carcter social, dentro dos princpios doteatro pico. Na linha do teatro de Bertolt Brecht (poeta e dramaturgo alemo), exprimea revolta contra o poder e a convico de que necessrio mostrar o mundo e o homem

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    em constante devir. Defende as capacidades do homem que tem o direito e o dever detransformar o mundo em que vive. Por isso, oferece-nos uma anlise crtica dasociedade, procurando mostrar a realidade em vez de a representar, para levar oespectador a reagir criticamente e a tomar posio.Como drama narrativo, pressupe uma aco apresentada ao espectador e compossibilidade de ser vivida por ele, mas, sobretudo, procura a sua conivncia ouparticipao testemunhal. O carcter narrativo sinnimo de pico, ao contardeterminados acontecimentos que devem ser interpretados, reflectidos e julgados peloespectador, enquanto elemento de uma sociedade. Ele deve, assim, analisar e julgar ohomem no seu devir histrico, na sua situao social, que pode modificar-se e modificaro rumo da Histria.Observando Felizmente H Luar!, verificamos que so estes os objectivos de Lus deSttau Monteiro, que evoca situaes e personagens do passado, usando-as comopretexto para falar do presente. Escrita em 1961, a pea surge como mscara para quese possa tirar exemplo no presente ditatorial. Mas mais do que fazer a ligao entre doismomentos o incio do sculo XIX e o sculo XX a sua intemporalidade remete-nospara a luta do ser humano contra a tirania, a opresso, a traio, a injustia e todas as

    formas de perseguio.

    Repare-se no seguinte dilogo entre Matilde (a esposa do General Gomes Freire deAndrade) e Beresford, o representante do domnio britnico:

    MATILDE Venho pedir-lhe que o liberte. -me indiferente que o faa por favor, porclemncia ou por qualquer outro motivo. s mulheres, senhor, pouco interessa a justia dascausas que levam os seus homens a afastar-se delas. A injustia e a tirania, s as sentequem anda na rua, que homem ou quer ser homem. (Pausa) [...]BERESFORD E porque pensa que devo fazer o que pede?MATILDE Porque o comandante do exrcito, governador do Reino e... porque sabe que

    ele no cometeu qualquer crime.BERESFORD A simples existncia de certos homens j um crime. (Comeam a ouvir-sesinos ao longe.)MATILDE (exaltada) Porque dizem a verdade? Porque vem para alm da cortina dahipocrisia com que os poderosos escondem a defesa dos seus interesses? (O rudo dos sinosaumenta de intensidade)BERESFORD(sorrindo) Porque... so incmodos, minha senhora!MATILDE(com amargura) incmodo todo aquele que no confunde a vontade de Deuscom a vontade do rei... (Pausa) Ou que v para alm das medalhas que usais no peito...(Pausa) Ou que olha para vs de frente, e sorri...BERESFORD (com ironia) Ou que, devendo, por nascimento e posio, defender certosinteresses, defende outros... o caso do general, minha senhora. (Ouve-se, fora do palco, o

    murmrio de vozes humanas.)MATILDE Que vo fazer dele, Sr. Marechal?BERESFORD (Abrindo os braos para exprimir a sua impossibilidade de responder pergunta) Julg-lo e... fazer justia!MATILDE (Com desespero e como quem pensa pela primeira vez na hiptese.) Queremmat-lo! Diga-me, Sr. Marechal, por amor de Deus, diga-me: querem mat-lo? (As vozesaproximam-se do palco. Ouve-se, nitidamente, falar latim.)BERESFORD Ningum lhe pode responder a essa pergunta. So os acontecimentos quegeram os acontecimentos e... (Entra no palco um padre seguido dum sacristo tocando umacampainha e de alguns populares. Comea a juntar-se gente sua volta.)MATILDE(Exaltadssima) No o matem, Sr. Marechal! Mandem-no para a guerra, deixem-no morrer como um homem, batendo-se com inimigos que possa reconhecer! [...]

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    Neste excerto, o conflito interior de Matilde exprime-se na prpria fora das suasconvices, para conseguir a libertao do marido, que vtima de injustia. H adestacar, sobretudo, nesta passagem, a afirmao de Beresford, para quem A simplesexistncia de certos homens j um crime porque so incmodos. O dramaturgo, atravsdas palavras, ou das informaes das didasclias, procura levar o pblico a entender, deforma clara, o sentido da mensagem. Neste fragmento da obra, o sarcasmo e a ironia,ou a amargura e o desespero, que opem estas duas personagens, tal como sucede comoutros comportamentos e sentimentos, so elementos fundamentais para a anlise dasituao e para que o espectador tome posio.

    Fe l i zm en t e H Lua r ! uma obra que:_ destaca a preocupao com o Homem e o seu destino;_ reala a luta contra a misria e a alienao;_ denuncia a ausncia de moral;_ alerta para a necessidade de uma superao com o surgimento de uma sociedade

    solidria que permita a verdadeira realizao do Homem.

    II Distanciao Histrica(tcnica realista; influncia de Brecht)

    Brecht, em Estudos sobre Teatro, fala do efeito de estranheza e de distanciao que orecurso Histria ou a um processo de construo de parbolas permite sobre umarealidade prxima. Brecht prope um afastamento entre o actor e a personagem e entreo espectador e a histria narrada, para que, de uma forma mais real e autntica, possam

    fazer juzos de valor sobre o que est a ser representado.Afirma Bertolt Brecht, em Estudos sobre Teatro:

    O espectador do teatro dramtico diz: Sim, eu j senti isso. Eu sou assim. Osofrimento deste homem comove-me, pois irremedivel. uma coisa natural. Sersempre assim. Isto que arte! Tudo ali evidente. Choro com os que choram e riocom os que riem.O espectador do teatro pico diz: Isso que eu nunca pensaria. No assim quese deve fazer. Que coisa extraordinria, quase inacreditvel. Isto tem de acabar. Osofrimento deste homem comove-me, porque seria remedivel. Isto que arte! Nadaali evidente. Rio de quem chora e choro com os que riem.

    O teatro pico proposto por Brecht contrape-se tragdia clssica para melhorconseguir o efeito social. Enquanto o teatro clssico conduz o pblico iluso e emoo,levando-o a confundir a arte com a vida real, no teatro pico a distanciao devepermitir o envolvimento do espectador no julgamento da sociedade. Por isso o teatropico implica um comprometimento, uma crtica contra o individualismo, aconsciencializao perante o sofrimento dos outros e a realidade social. Deve, na suatarefa pedaggica, instruir os espectadores e incit-los a actuar, alertando-os para a suacondio humana. O espectador deve ter um olhar crtico para se aperceber melhor detodas as formas de injustias e opresses.Em Fe l i zm en t e H Lua r ! , o tempo, o espao e as personagens so trabalhados demodo a que a distanciao se concretize, recorrendo, muitas vezes, a um historiar dosacontecimentos representados e ao acentuar da preciso do lugar cnico. o que seobserva, por exemplo, logo de incio:

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    O dramaturgo preocupa-se, de forma particular, com a distanciao. Isso mesmo podeser observado, quando na didasclia, nos informa que Todos os seus gestos soestudados. Sente-se que passou longas horas estudando os hbitos e os maneirismosdos membros da classe a que desejaria ter pertencido. Ao falar, faz gestos com as mos,gestos lentos, precisos, copiados de um fidalgo qualquer que teve ocasio de observar deperto.

    Ao dramaturgo interessa que o actor seja lcido e, sobretudo, que o espectador seconfronte e se esclarea, partindo da identificao inicial de dois tempos e dois mundosdiferentes.

    A Aco A obra recria, em dois actos, a tentativa frustrada de revolta liberal de Outubro de

    1817, reprimida pelo poder absolutista do regime de Beresford e Miguel Forjaz, como apoio da Igreja.

    Ao mesmo tempo

    Chama a ateno para as injustias, a represso e as perseguies polticas no tempo deSalazar, nos anos 60 do sculo XX tempo da escrita (paralelismo entre 2 pocas: osculo XIX 1817 tempo da histria; e o sculo XX 1961 tempo da escrita).

    A aco centra-se na figura do general Gomes Freire de Andrade e da suaexecuo:

    da priso fogueira, com descries dos governadores do Reino;

    da revolta desesperada e impotente da sua esposa e da resignao dopovo que a misria, o medo, a ignorncia dominam. Gomes Freire deAndrade est sempre presente embora nunca aparea (didasclia inicial) e,mesmo ausente, condiciona a estrutura interna da pea e o comportamentode todas as outras personagens.

    Na aco desta pea, h a destacar o seguinte:

    a defesa da liberdade e da justia, atitude de rebeldia, constitui a h y b r i s (desafio);

    como consequncia, a priso dos conspiradores provocar o sofrimento(p a t h o s ) das personagens e despertar a compaixo do espectador;

    o crescendo trgico, representado pelas diversas tentativas desesperadas paraobter o perdo, acabar, em cl m a x, com a execuo pblica do generalGomes Freire e dos restantes presos.

    este desfecho trgico conduz a uma reflexo purificadora (ca t h r s is) que osopressores pretendiam dissuasora, mas que despertou os oprimidos para osvalores da liberdade e da justia.

    As Personagens possvel aglutinar as personagens em grupos distintos, de acordo com a funo quedesempenham ao longo da aco. Assim temos:

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    1- Gomes Freire figura carismtica, que preocupa os poderosos, acredita na justia,luta pela liberdade e arrasta os pequenos. Considerado um estrangeirado, revela-se simpatizante das novas ideias liberais, tornando-se para os governantes umelemento subversivo e perigoso. O povo elege-o como smbolo da luta pelaliberdade, o que incmodo para os reis do Rossio. Da a deciso dos governantes

    pelo enforcamento, seguido da queima, para servir de exemplo a todos aqueles quetemem afrontar o poder poltico.

    2- D. Miguel Forjaz primo de Gomes Freire, prepotente, assustado comtransformaes que no deseja, corrompido pelo poder, vingativo, frio, desumano,calculista; nas palavras de Sousa Falco, D. Miguel a personificao damediocridade consciente e rancorosa.

    3- Principal Sousa fantico, corrompido pelo poder eclesistico, odeia os Franceses,porque transformaram esta terra de gente pobre mas feliz num antro derevoltados!; afirma, preocupado, que Por essas aldeias fora cada vez menor onmero dos que frequentam as igrejas e cada vez maior o nmero dos que s

    pensam em aprender a ler....

    4- Beresford poderoso, mercenrio, interesseiro, calculista, trocista, sarcstico; asua opinio sobre Portugal fica claramente expressa na afirmao Neste pas deintrigas e de traies, s se entendem uns com os outros para destruir um inimigocomum e eu posso transformar-me nesse inimigo comum, se no tiver cuidado.

    5- Vicente demagogo, sarcstico, falso humanitarista, movido pelo interesse darecompensa material, adulador no momento oportuno, hipcrita, despreza a suaorigem e o seu passado, mostra-se capaz de recorrer traio para ser promovidosocialmente... Autocaracteriza-se quando diz: S acredito em duas coisas: no

    dinheiro e na fora. O general no tem uma nem outra e (...) Os degraus da vida sologo esquecidos por quem sobe a escada... Pobre de quem lembre ao poderoso a suaorigem... Do alto do poder, tudo o que ficou para trs vago e nebuloso. (...) Nuncase fala de traio a quem sobe na vida....

    6- Manuel O mais consciente dos populares, andrajosamente vestido; assumealgum protagonismo por dar incio aos dois actos, com as mesmas indicaescnicas: a mesma posio em cena, como nica personagem intensamenteiluminada, os mesmos movimentos e a mesma frase Que posso eu fazer? Sim, queposso eu fazer?.

    Denuncia a opresso a que o povo tem estado sujeito (as InvasesFrancesas; a proteco britnica, aps a retirado do rei D. Joo VI para o Brasil) ea incapacidade de conseguir a libertao e sair da misria em que se encontra:

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    V-se a gente livre dos Franceses e zs!, cai nas mos dos Ingleses! E agora? Seacabarmos com os Ingleses, ficamos na mo dos reis do Rossio... Entre os trs odiabo que escolha ... (...) E enquanto eles andam para trs e para a frente, para aesquerda e para a direita, ns no passamos do mesmo stio!

    7- Sousa Falco o inseparvel amigo, sofre junto de Matilde perante a condenaodo general; assume as mesmas ideias de justia e de liberdade, mas no teve acoragem do general...

    8- Matilde de Melo a companheira de todas as horas de Gomes Freire, umamulher corajosa:

    exprime romanticamente o amor; reage violentamente perante o dio e asinjustias; afirma o valor da sinceridade; desmascara o interesse, a hipocrisia:Ensina-se-lhes que sejam valentes para um dia virem a ser julgados por covardes!Ensina-se-lhes que sejam leais, para que a lealdade, um dia, os leve forca!;

    ora desanima, ora se enfurece, ora se revolta, mas luta sempre: Enquantohouver vida... fora... voz para gritar... Baterei a todas as portas, clamarei, por toda

    a parte, mendigarei, se for preciso, a vida daquele a quem devo a minha!

    9- Populares representam uma classe oprimida, sobre a qual era exercida aviolncia; funcionam como uma espcie de coro (da tragdia). As suas falasdenunciam a pobreza e a ironia a sua arma: Algum aqui tem relgio? (...)Esqueceram-se dos relgios em casa....Por outro lado, permitem-nos, atravs das perguntas que colocam aos seusinterlocutores, situar-nos ao nvel do tempo histrico:

    Onde aprendeu vossemec isso?Em Campo dOurique j l vo dez anos (...)

    ouEm que guerra que vossemec andou?

    No segundo acto, as suas falas revestem o carcter de informao/comentriosobre os episdios ao nvel da aco dramtica: Passaram toda a noite a prendergente por essa cidade...; por pouco tempo, amigo, espera pelo claro dasfogueiras....

    EXERCI CI OS PARA TESTAR OS TEUS CON HECI MENTOS

    EXERCCIO 1FICHA DE TRABALHO (ESCOLHE A OPO CORRECTA)

    1- A pea Felizmente H Luar! marca posio, pelo contedo fortemente ideolgico, comodenncia da opresso que se vivia na poca em que foi escrita:

    a)

    (1961), sob a ditadura de Salazar

    b) (1861), sob a ditadura de Salazar

    c) (1761), sob a ditadura de Salazar

    2 - O recurso distanciao histrica e descrio das injustias praticadas no incio do

    sculo XIX em que decorre a aco permitiu-lhe, assim, colocar tambm em destaque as

    injustias do seu tempo e a necessidade de lutar pela liberdade.

    A) verdadeiroB) falso

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    3 - Felizmente H Luar!, de Sttau Monteiro, um:

    A) drama romntico, de carcter social, dentro dos princpios do teatro pico. Na linha do teatro de

    Bertolt Brecht, exprime a revolta contra o poder e a convico de que necessrio mostrar o

    mundo e o homem em constante devir.

    B) drama narrativo, de carcter social, dentro dos princpios do teatro pico. Na linha do teatro de

    Bertolt Brecht, exprime a revolta contra o poder e a convico de que necessrio mostrar o

    mundo e o homem em constante devir.

    4 - Recorrendo ao teatro pico, coloca em palco essas primeiras manifestaes sociais e

    polticas que levaram revoluo comunista, para que o espectador se posicione

    criticamente, mas estranho aco, como sucedia no teatro clssico, preocupado em

    despertar os sentimentos e as emoes no pblico.

    A) verdadeiro

    B) falso5 - O momento em que Vicente, um elemento do povo, tece comentrios desfavorveis

    acerca do general (estrangeirado e no aliado do povo) ocorre no:

    A) primeiro acto

    B) segundo acto

    6 - No primeiro acto Manuel interroga-se "Que posso eu fazer? Sim, que posso eu fazer?";

    atravs do seu monlogo, o espectador (ou o leitor) tem conhecimento da priso de Gomes

    Freire ocorrida na madrugada anterior.

    A) verdadeiro

    B) falso

    7 - Cada um dos actos apresenta uma estrutura paralela e, a partir dos dilogos entre os

    governadores e os delatores, os episdios do segundo acto surgem como uma consequncia

    daqueles que ocorrem no primeiro: o primeiro acto termina com a priso de populares que

    conspiravam contra o governo e com o apelo de "morte ao traidor Gomes Freire d'Andrade",

    feito por D. Miguel.

    A) verdadeiro

    B) falso

    8 - Em Felizmente H Luar!, Sttau Monteiro socorre-se da figura do general Gomes Freire

    de Andrade para debater a situao do povo que vive na misria e dependente das classes

    dominantes.

    A) verdadeiro

    B) falso

    9 - Gomes Freire de Andrade , sem dvida, a personagem central da pea, embora s

    aparea na ltima cena.

    A) verdadeiro

    B) falso

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    10 - O General Gomes Freire de Andrade :

    A) para os populares - um heri de grande coragem e justia

    B) para Matilde e Sousa Falco - uma ameaa ao poder absolutista

    C) para os governadores - um amigo, honesto, destemido, corajoso; aquele que luta pelos seus

    ideais, enfrentando o poder institudo

    11 - Na obra Felizmente H Luar! possvel aglutinar as personagens em grupos, de

    acordo com a funo que desempenham ao longo da aco. Assim temos o Povo, os Traidores

    do Povo e os Governantes. O Principal Sousa que representa a interferncia da Igreja no

    Estado, insere-se no terceiro. Fazem parte deste grupo:

    A) o Marechal Beresford e D. Miguel Forjaz

    B) o Vicente, o Andrade Corvo e o Morais Sarmento, um popular

    C) os populares: Manuel, Rita, Antigo Soldado, Primeiro Popular, Segundo Popular, Terceiro Popular,

    Uma Velha e Uma Voz

    12 - Beresford, poderoso, mercenrio, interesseiro, calculista, trocista, sarcstico, expressa a

    sua opinio sobre Portugal dizendo:

    A) "Neste pas de intrigas e de traies, s se entendem uns com os outros para destruir um inimigo

    comum e eu posso transformar-me nesse inimigo comum, se no tiver cuidado."

    B) "d esmola aos pobres e condena forca os que pretendem acabar com a pobreza"; "condena...

    em nome de Cristo e mente em nome do Estado".

    13 - D. Miguel Forjaz, representante da classe da nobreza, revela um carcter prepotente e

    corrupto.A) verdadeiro

    B) falso

    14 - Para os governadores o General Gomes Freire de Andrade uma ameaa ao poder:

    A) liberal

    B) absolutista

    15 - Matilde:

    A) exprime romanticamente o amor, reage violentamente perante o dio e as injustias, afirma o

    valor da sinceridade

    B) mesquinha e medocre, reveste-se de um falso humanismo e de solidariedade duvidosa, para

    fomentar a ira popular contra Gomes Freire

    16 - Manuel revela o desnimo, a impotncia e a passividade da massa popular perante a

    situao. Razes:

    A) denuncia a opresso a que o povo tem estado sujeito ((as Invases Francesas; a ''proteco''

    britnica, aps a retirada do rei D. Dinis para o Brasil) e a incapacidade de conseguir a libertao

    e de sair da misria em que se encontra

    B) denuncia a opresso a que o povo tem estado sujeito ((as Invases Francesas; a ''proteco''britnica, aps a retirada do rei D. Joo VI para o Brasil) e a incapacidade de conseguir a

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    libertao e de sair da misria em que se encontra

    C) denuncia a opresso a que o povo tem estado sujeito ((as Invases Francesas; a ''proteco''

    britnica, aps a retirada do rei D. Afonso IV para o Brasil) e a incapacidade de conseguir a

    libertao e de sair da misria em que se encontra

    17 - A aco decorre na cidade de Lisboa encontrando-se esta ligada quer opresso e

    violncia exercida pelos Senhores do Rossio, os governantes, quer ao descontentamento e

    misria do povo. Na verdade, encontramos referncias ao Cais do Sodr, ao Largo do Rato, ao

    caf Marrare, ao Campo de Sant'Ana, ao Forte de S. Julio da Barra e ao Rossio.

    A) verdadeiro

    B) falso

    18 - Matilde, na tentativa desesperada e derradeira de salvar o seu homem, assume uma voz

    de conscincia sobre a injustia humana. Daqui nasce a duplicidade do ttulo: ironia e

    crueldade, nas palavras de D. Miguel, para quem, porque "Felizmente h luar", a imagem daexecuo ficaria na memria dos lisboetas durante muito tempo, como exemplo do que

    espera os que tentam lutar pela liberdade; contraposta ao "Felizmente h luar" gritado por

    Matilde no final da pea, para quem a imagem da fogueira onde arde o general ser o claro

    que "h-de incendiar a terra e abrir as almas".

    A) verdadeira

    B) falsa

    19 - Ao escolher a saia verde para esperar o companheiro aps a morte, Matilde destaca a

    "alegria" do reencontro ("agora que se acabaram as batalhas, vem apertar-me contra o

    peito").

    A) verdadeiro

    B) falso

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    EXERCCIO 2FICHA DE TRABALHO (COLOCA VERDADEIRO OU FALSO)

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    EXERCCIO 3PUZZLE DE PALAVRAS OU EXPRESSES

    Faz corresponder as expresses da coluna da esquerda s da coluna da direitade forma a obter frases verdadeiras:

    Respostas:1.-________________________________7.-____________________________________2.-________________________________ 8.-____________________________________

    3.-________________________________ 9.-____________________________________4.-_______________________________ 10.-____________________________________5.-_______________________________ 11.-____________________________________6.-_______________________________ 12.-____________________________________