Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger...

43
Universidade Federal Fluminense Centro de Estudos Gerais Instituto de F ´ ısica Gradua¸ c ˜ ao em F ´ ısica Douglas Montes de Souza F´ ermions de Majorana e a cadeia de Kitaev Niter´oi-RJ 2018

Transcript of Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger...

Page 1: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

Universidade Federal Fluminense

Centro de Estudos Gerais

Instituto de Fısica

Graduacao em Fısica

Douglas Montes de Souza

Fermions de Majorana e a cadeia de Kitaev

Niteroi-RJ

2018

Page 2: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

ii

DOUGLAS MONTES DE SOUZA

FERMIONS DE MAJORANA E A CADEIA DE KITAEV

Trabalho de Conclusao de Curso apresentado ao

Programa de Graduacao em Fısica do Instituto

de Fısica da Universidade Federal Fluminense,

como requisito parcial para obtencao do grau

de Bacharel em Fısica.

Orientador: Prof. Dr. MARCOS SERGIO FIGUEIRA DA SILVA

Niteroi-RJ

2018

Page 3: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

iii

Page 4: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

iv

Page 5: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

v

Agradecimentos

Se a quatro anos atras, ainda que por um instante eu pudesse me ver neste momento, as coisas que

aprendi, as pessoas incrıveis que conheci e o quanto amadureci durante este tempo, estou absolutamente

convencido de que nao acreditaria. Muitas pessoas participaram de minha trajetoria, algumas das quais

de maneira tao importante que chega a ser difıcil fazer justica a minha gratidao em algumas palavras,

mas aqui vai minha tentativa:

A meus pais, Patrıcia Montes de Souza e Everaldo Ferreira de Souza, cujo esforco para me fornecer

o estudo que nao puderam ter e a dedicacao que sempre demonstraram a mim, por vezes abrindo mao

de seus sonhos em detrimento dos meus sao os principais motivos para que eu pudesse conhecer e me

dedicar a Ciencia. Quanto mais velho fico, mais percebo de quantas formas eles se sacrificaram por mim,

sao por esses e muitos outros motivos que tem a minha eterna gratidao.

A Hadassa Moraes de Faria, uma das pessoas mais importantes em toda esta trajetoria, e que

ao longo dos quatro anos em que nos conhecemos assumiu tantos papeis diferentes em minha vida que ja

nao sei mais como me referir a ela. Nao foi facil dar conta das viagens diarias de duas ou tres horas, da

jornada de trabalho exaustiva “milagrosamente” conciliada com os estudos e as aulas e todos os momentos

estressantes que passamos. Tive muita sorte em ter ao meu lado alguem tao mais forte e determinada do

que eu jamais serei, cuja coragem frente a momentos de dificuldade me serviram de exemplo e motivacao

para que eu sempre desse o meu melhor em tudo, independentemente da situacao.

Ao professor Dr. Marcos Sergio Figueira da Silva pela orientacao neste trabalho e em diversos

aspectos da vida academica, por ter me apresentado uma area viva e competitiva da Fısica e estar sempre

presente e disposto a me ajudar em todos os momentos de minha graduacao.

Ao professor Dr. Marco Moriconi pelos incontaveis ensinamentos, conselhos, momentos engraca-

dos e por todo apoio ao longo da graduacao.

Ao professor Dr. Lucas Mauricio Sigaud por todos os ensinamentos e momentos hilarios nas

aulas de Fısica Experimental III e Laboratorio de Fısica Moderna II, bem como nos diversos encontros

de corredor.

Aos meus amigos Maron Anka, Gabriel Soares e Lucas Lima, por tornarem a jornada sempre

divertida e engracada.

Finalmente, a todos os professores do IF-UFF, por formarem um ambiente de excelencia em

ensino, no qual aprendi quase tudo o que sei. Espero corresponder a esta excelencia futuramente, pois o

exemplo que deixaram nao sera facil de alcancar.

Page 6: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

vi

Resumo

O objetivo deste trabalho e o estudo da realizacao de fermions de Majorana na Cadeia de Kitaev,

bem como dos desenvolvimentos que culminaram na proposicao de tais partıculas por Ettore Majorana

em 1937. Para isto, incluımos dois capıtulos que tratam de duas teorias de campo importantes para o

desenvolvimento da Mecanica Quantica Relativıstica, onde tratamos do conceito de antimateria, funda-

mental para o entendimento do trabalho de Majorana. Temos ainda uma analise da Cadeia de Kitaev,

um toy model para um supercondutor topologico unidimensional, sistema conhecido por conter fermions

de Majorana como estados de borda em sua fase topologica. Por fim, discutimos aspectos importantes

sobre a realizacao experimental dos fermions de Majorana.

Page 7: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

vii

Abstract

The goal of this work is the study of the realization of Majorana fermions in the Kitaev Chain,

as well as the developments that lead to their proposal by Ettore Majorana in 1937. For that reason, we

included two chapters that treat two important field theories that were relevant in the development of

Relativistic Quantum Mechanics, where we review the concept of antimatter, key to the understanding

of Majorana’s work. We also included an analysis of the Kitaev Chain model, a toy model of a 1D

topological superconductor, a very well known system for containing Majorana fermions as edges states

in it’s topological phase. Lastly, we discuss some important aspects on the experimental realization of

theses fermions on the lab.

Page 8: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

viii

Lista de Figuras

4.1 representacao da cadeia unidimensional de N=4 sıtios, cada ponto representa um modo de

Majorana, e um par de tais modos forma um estado fermionico comum [23]. . . . . . . . . 19

4.2 Ilustracao da interacao onsite para uma cadeia com N=4 sıtios. Note que todos os majo-

ranas estao acoplados a seus vizinhos [23]. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20

4.3 Ilustracao da interacao entre sıtios, note a presenca de modos de majorana desemparelhados

nas bordas da cadeia [23]. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20

4.4 Espectro de energia para uma cadeia com N=25 sıtios, nota-se a simetria em torno de

E=0, e que a degenerescencia deste nıvel se quebra apenas quando µ ≈ 2t [23]. . . . . . . 21

4.5 Esquema da estrutura de bandas 4.8 comecando na fase topologica e variando µ por valores

positivos. Observe o fechamento do gap ocorrendo nas extremidades da zona de Brillouin

quando µ = 2t [23]. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23

4.6 Esquema da estrutura de bandas 4.8 comecando na fase topologica e variando µ por valores

negativos. Observe o fechamento do gap ocorrendo no meio da zona de Brillouin quando

µ = −2t [23]. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23

4.7 Ilustracao da funcao de onda do modo de Majorana localizado na interface entre dois

domınios [23]. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25

4.8 Ilustracao do Majorana formado na interface entre os domınios topologico e trivial [23]. . 25

5.1 Em 5.1a temos o sistema no regime topologico em ausencia de campo magnetico. Conforme

B aumenta, vemos a separacao dos nıveis de energia devida ao efeito Zeeman (5.1b e 5.1c)

[23]. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28

5.2 Comportmento da estrutura de bandas com B. Note a degenerescencia quando B = 0

(figura 5.2a). A medida que B aumenta 5.2b e 5.2c o gap do bulk se fecha, mostrando que

nao e possıvel o aparecimento dos modos de Majorana [23]. . . . . . . . . . . . . . . . . . 29

5.3 Comportmento da estrutura de bandas com α. A medida que α aumenta, o gap do bulk

se abre [23]. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30

Page 9: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

Sumario

Agradecimentos v

Resumo vi

Abstract vii

Lista de Figuras viii

1 Introducao 1

2 A equacao de Klein-Gordon 2

2.1 Mecanica quantica relativıstica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 2

2.2 Problemas com a equacao de Klein-Gordon . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3

2.3 Quantizacao do campo de Klein-Gordon . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4

3 A equacao de Dirac 8

3.1 Introducao . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8

3.2 Densidade de Probabilidade e Corrente de Probabilidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10

3.3 Fermions de Majorana . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11

3.4 Solucoes de onda plana para a equacao de Dirac . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12

3.5 Quantizacao do campo de Dirac . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15

3.6 Predicao de anti materia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16

4 A Cadeia de Kitaev 18

4.1 Modos de Majorana desacoplados em supercondutores topologicos . . . . . . . . . . . . . 18

4.2 Cadeia de Kitaev . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19

4.3 O hamiltoniano de Kitaev . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20

4.4 Protecao topologica dos estados de borda . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21

4.5 Fases topologicas a partir do espectro do bulk . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22

4.6 Invariante topologico do bulk e a correspondencia bulk-edge . . . . . . . . . . . . . . . . . 24

5 A cadeia de Kitaev no mundo real 27

5.1 Desenvolvendo o modelo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27

Page 10: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

6 Conclusoes 31

Page 11: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

Capıtulo 1

Introducao

No campo da Fısica, o seculo XX foi marcado pelo surgimento da Mecanica Quantica e da

Teoria da Relatividade, duas teorias que revelam aspectos absolutamente fundamentais de nosso Universo.

Contudo, descobertas como a estrutura fina e hiperfina do atomo de hidrogenio evidenciaram a necessidade

de incorporar o conteudo de ambas as teorias em nossa descricao da materia, a busca por tais teorias, onde

tanto a natureza quantica quanto relativıstica da materia sao respeitadas, trouxeram um entendimento

da natureza do spin [1] e de outras propriedades fundamentais da materia, incluindo a existencia da

antimateria.

Neste trabalho discutimos duas instancias de teorias quanticas relativısticas da materia, a equacao

de Klein-Gordon (capıtulo 2) e a equacao de Dirac (capıtulo 3), responsavel pela predicao da existencia de

antimateria. Uma descoberta interessante, devida a Ettore Majorana(1937), revela que a equacao de Dirac

pode der manipulada de forma que forneca a descricao de fermions que seriam seus proprios antifermions,

ditos fermions de Majorana. Oitenta anos se passaram ate entao e nenhum fermion de Majorana foi

observado na natureza, embora haja a possibilidade de que o neutrino e ainda outras partıculas previstas

em teorias supersimetricas sejam fermions de Majorana [2].

Em um cenario bastante distinto do mencionado acima, fermions de Majorana existem ainda

como excitacoes coletivas em sistemas de Materia Condensada, associados a operadores de criacao e

aniquilacao γi, em termos dos quais escrevemos os operadores fermionicos de Dirac

c† =1

2(γ1 + iγ2), c =

1

2(γ1 − iγ2). (1.1)

Existem, porem, diversos fatores complicantes em sua deteccao. Os capıtulos 4 e 5 tratam dos

fermions de Majorana no contexto da Materia Condensada, mais especificamente em supercondutores

com pareamento nao convencional [3].

Page 12: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

Capıtulo 2

A equacao de Klein-Gordon

2.1 Mecanica quantica relativıstica

Em Mecanica Quantica a descricao do estado de uma partıcula e dada por uma funcao complexa

Ψ(r, t), cujo valor absoluto ao quadrado fornece a densidade de probabilidade de encontrarmos a partıcula

na posicao r no instante t. A informacao sobre o momento da partıcula e obtida atraves da transformada

de Fourier de Ψ. Desta forma, se conhecemos Ψ (a funcao de onda da partıcula) num instante t0 qualquer,

temos acesso ao estado daquela partıcula neste instante [4, 5]. Portanto, para que esteja determinado o

estado da partıcula num instante posterior t precisamos saber como se da a evolucao temporal da funcao

de onda, que, no regime nao relativıstico, se escreve

(− ~

2m∇2 + V

)Ψ = i~

∂Ψ

∂t. (2.1)

Esta e a conhecida equacao de Schrodinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna

claro quando lembramos que as energias cinetica e potencial sao dadas atraves dos operadores p2/2m e V,

respectivamente, onde p = −i~∇ e o momento linear da partıcula descrita pela equacao 2.1, e a energia

total E = i~∂/∂t. Isto significa que a equacao 2.1 representa o enunciado da conservacao da energia.

O fato de que a dinamica de partıculas nao relativısticas e dada atraves de um enunciado tao

fundamental quanto a conservacao da energia nos leva a questionar se existe conexao similar no caso re-

lativıstico. De fato, tal conexao e postulada por Gordon [6] e um procedimento para encontrar a equacao

de onda relativıstica para a partıcula unica e feito a seguir.

A partir de agora, adotaremos ate o fim do capıtulo seguinte unidades tais que ~ = c = 1,

de forma que E = i∂/∂t e p = −i∇. Comecamos o raciocınio lembrando que a energia de partıculas

relativısticas obedece a relacao de dispersao

E2 − p2 = m2. (2.2)

Promovendo os observaveis em 2.2 a operadores, obtemos

Page 13: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

3

(−∂2t +∇2

)φ = m2φ, (2.3)

que e conhecida como equacao de Klein-Gordon. Podemos escrever esta equacao numa forma covariante

se notarmos que o termo entre parenteses e o produto escalar entre operadores diferenciais −∂µ∂µ. A

equacao de Klein-Gordon toma a forma

(∂µ∂µ +m2)φ = 0, (2.4)

onde φ deve ser encarado como um campo escalar.

A equacao de Klein-Gordon tambem pode ser obtida a partir do princıpio variacional de Hamilton

aplicado a densidade lagrangiana

L =1

2φ2 − 1

2(∇φ)2 −m2φ2 =

1

2∂µφ∂

µφ− 1

2m2φ2, (2.5)

∂L∂φ

= −m2φ ∂µ

(∂L

∂(∂µφ)

)= φ−∇2φ = −∂µ∂µφ. (2.6)

Fica evidente que a aplicacao da equacao de Lagrange 2.7 recupera a equacao 2.4.

∂L∂φ− ∂µ

(∂L

∂(∂µφ)

)= 0. (2.7)

2.2 Problemas com a equacao de Klein-Gordon

Embora a equacao de Klein-Gordon forneca uma descricao relativıstica para partıculas quanticas,

o que era o objetivo desde o princıpio, ela apresenta problemas que discutiremos a seguir.

Suponha que φ seja solucao da equacao de Klein-Gordon 2.4, temos entao

∂µ∂µφ+m2φ = 0, (2.8)

multiplicando esta equacao por −iφ∗ obtemos

iφ∗∂2φ

∂t2− iφ∗∇2φ+ iφm2 = 0, (2.9)

multiplicando a equacao conjugada de Klein-Gordon (∂µ∂µφ∗ +m2φ∗ = 0) por −iφ obtemos

iφ∂2φ∗

∂t2− iφ∇2φ∗ + iφ∗m2 = 0, (2.10)

subtraindo 2.10 de 2.9 obtemos

∂t

[i

(φ∗∂φ

∂t− φ∂φ

∂t

)]+∇ · [−i(φ∗∇φ− φ∇φ∗)] = 0, (2.11)

Page 14: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

4

que tem a forma de uma equacao de continuidade ∂ρ/∂t + ∇j = 0, com a densidade de probabilidade

definida por

ρ = i

(φ∗∂φ

∂t− φ∂φ

∂t

), (2.12)

e a densidade de corrente definida por

j = i(φ∗∇φ− φ∇φ∗). (2.13)

Considere agora uma solucao de onda plana para a equacao de Klein-Gordon

φ = Ne−ipµxµ

, (2.14)

substituindo na equacao 2.12 obtemos

ρ = i(|N |2(−iE)− |N |2(iE)) = 2E|N |2, (2.15)

lembrando que pµxµ = Et− x · p.

O problema com a equacao 2.15 aparece quando calculamos a energia da partıcula atraves da

equacao de Klein-Gordon

∂2t φ−∇2φ+m2φ = 0 (2.16)

−NE2e−ipµxµ

− (−ip)2e−ipµxµ

+m2Ne−pµxµ

= 0 (2.17)

E = ±√p2 +m2. (2.18)

A equacao 2.18 mostra que existem solucoes com energia negativa para a equacao de Klein-

Gordon, mas como a densidade de probabilidade e proporcional a energia, obtemos solucoes com proba-

bilidade negativa, o que e um absurdo, portanto, a interpretacao desta teoria como a equacao de partıcula

unica com funcao de onda φ nao faz sentido e deve ser abandonada. A interpretacao correta e que a equa-

cao 2.5 representa uma teoria de campo, que, quando quantizada, descreve corretamente uma partıcula

relativıstica de massa m.

2.3 Quantizacao do campo de Klein-Gordon

Comecaremos notando que a equacao 2.4 toma uma forma conhecida se a escrevemos na repre-

sentacao de momento

(∂2

∂t2+ (p2 +m2)

)φ(p, t) = 0. (2.19)

Na equacao acima substituımos φ(x, t) por sua transformada de Fourier

Page 15: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

5

φ(x, t) =

∫d3p

(2π)3eip·xφ(p, t), (2.20)

o resultado e que para cada valor de p, ψ(p, t) satisfaz a equacao de um oscilador harmonico cuja

frequencia de oscilacao e dada por ωp ≡ (p2 + m2)1/2. Portanto, a quantizacao do campo escalar φ

consiste na quantizacao de infinitos osciladores harmonicos (um para cada momento p).

Sabemos, que a quantizacao do oscilador harmonico unidimensional de massa unitaria, cuja

Hamiltoniana e da forma

H =1

2p2 +

1

2ω2x2 (2.21)

e obtida atraves dos operadores de criacao e aniquilacao, respectivamente

a† =

√ω

2x− i√

2ωp a =

√ω

2x+

i√2ωp, (2.22)

cuja relacao de comutacao escreve-se [a, a†] = 1. Atraves das equacoes 2.22, obtemos as variaveis canonicas

em funcao dos operadores,

x =1√2ω

(a+ a†) p = −i√ω

2(a− a†). (2.23)

A substituicao de 2.23 em 2.21 fornece

H = ω

(a†a+

1

2

). (2.24)

Aplicando a quantizacao do oscilador harmonico ao campo escalar ψ obtemos

φ(x) =

∫d3p

(2π)31√2ωp

[apeip·x + ape

−ip·x] (2.25)

π(x) =

∫d3p

(2π)3(−i)

√ωp

2[ape

ip·x − ape−ip·x] (2.26)

Para obter a densidade hamiltoniana associada a lagrangiana 2.5 primeiro calculamos o momento

canonico conjugado a ψ (π = ∂L/∂φ) e depois realizamos a transformada de Legendre

H = (πφ− L)∣∣φ≡φ(π), (2.27)

da qual resulta

H =1

2π2 +

1

2(∇φ)2 +

1

2m2φ2. (2.28)

O hamiltoniano total e dado pela integral de 2.28 no espaco:

Page 16: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

6

H =1

2

∫d3p d3q d3x

(2π)6

[−√ωpωq

2(ape

ip·x − a†pe−ip·x)(aqeiq·x − a†qe−iq·x)

+1

2√ωpωq

(ipapeip·x − ipa†pe−ip·x) · (aqeiq·x − a†qe−iq·x)

+m2

2√ωpωBq

(apeip·x + ape

−ip·x)(aqeiq·x + aqe

−iq·x)

], (2.29)

a integracao em x fornece termos que envolvem as frequencias e operadores multiplicados por

(2π)3δ(3)(p± q),

de tal modo que a integracao em q “seleciona” q = ±p, resultando na integral em p

H =1

2

∫d3p

(2π)3

[ωp

2(−apa−p + apa

†p + a†pap − apa

†−p) +

p2

2ωp(apa−p + apa

†p + a†pap + apa

†−p)

+m2

2ωp(apa−p + apa

†p + a†pap + apa

†−p), (2.30)

mas, como p2 +m2 = ω2p, obtem-se

H =1

2

∫d3p

(2π)3ωp

2(2apa

†p + 2a†pap) =

1

2

∫d3p

(2π)3ωp(apa

†p + a†pap).

Agora, utilizando a relacao de comutacao [ap, a†q] = (2π)3δ(3)(p− q) conclui-se que

H =

∫d3p

(2π)3ωp

[a†pap +

1

2(2π)3δ(3)(0)

]. (2.31)

Nota-se que ha uma divergencia devida a distribuicao delta de Dirac avaliada na origem, se

analisamos o estado fundamental do campo, onde a unica contribuicao para a energia vem do segundo

termo, visto que ap |0〉 = 0, percebemos que esta divergencia vem do fato de que a integral em x foi

realizada em todo espaco. Para corrigir este problema devemos confinar a integracao a um certo volume

V e impor condicoes de contorno periodicas no campo, em outras palavras, a quantidade que realmente

faz sentido e a densidade de energia uE0 .

(2π)3δ(3)(0) = limL→∞

∫ L/2

−L/2d3xeip·x

∣∣p=0

= V

uE0=E0

V=

∫d3p

(2π)31

2ωp. (2.32)

A integral em 2.32 ainda diverge, pois ωp e crescente com p, e quanto maior a frequencia, menor o

comprimento de onda associado a φ, de forma que, ao realizar a integracao em 2.32 estamos considerando

que a teoria desenvolvida e valida para escalas arbitrariamente pequenas de comprimentos de onda. Para

corrigir este problema deverıamos truncar a integracao a partir de um certo valor de p. Felizmente, existe

uma maneira mais pratica de lidar com esta divergencia, que vem do fato de que tudo a que temos acesso

experimentalmente sao excitacoes do campo em relacao ao vacuo, portanto, estamos mais interessados

Page 17: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

7

na diferenca de energias entre os estados excitados e o estado fundamental. Desta forma, subtraımos de

2.31 o segundo termo da soma, obtendo

H =

∫d3p

(2π)3ωpa

†pap, (2.33)

que nao apresenta os problemas discutidos acima. De fato H |0〉 = 0, como era esperado. Alem disso,

[H, a†p] = ωpa†p e [H, ap] = −ωpap, de forma que estados excitados sao produzidos pela atuacao de a†p

e ap multiplas vezes. Por exemplo, o estado com momento p e obtido pela atuacao de a†p no estado

fundamental

|p〉 = a†p |0〉 . (2.34)

Este estado tem energia

H |p〉 = ωp, (2.35)

lembramos que ωp = p2 + m2, que reconhecemos como a relacao de dispersao de energia para uma

partıcula de massa m. O momento total classico e dado por.

P i =

∫d3x φ∂iφ, (2.36)

A quantizacao e obtida promovendo-se a expressao acima ao observavel

P = −∫d3x π∇φ =

∫d3p

(2π)3pa†pap. (2.37)

Nota-se que, de fato P |p〉 = p |p〉 . A atuacao do operador de momento angular revela que os

estados descritos por esta teoria nao possuem spin [7]. Alem disso, o fato de que [a†p, a†q] = 0 significa que

os estados |p, q〉 e |q,p〉 sao simetricos. Concluımos, portanto, que esta teoria descreve bosons de spin 0.

Page 18: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

Capıtulo 3

A equacao de Dirac

3.1 Introducao

Dirac desejava encontrar uma equacao que comportasse as informacoes sobre qualquer variavel

dinamica da partıcula (posicao, momento linear, momento angular, etc), e que possuısse a mesma inter-

pretacao da equacao de Schrodinger 2.1, para isso seria necessario uma equacao que tambem fosse linear

em derivadas temporais [8], assim como 2.1 e que fosse covariante sobre transformacoes de Lorentz, duas

caracterısticas muito difıceis de se conciliar.

Partiremos da relacao de dispersao relativıstica 2.2 e procuraremos uma forma de fatora-la alge-

bricamente. Mas para isso sera interessante trabalhar em notacao covariante pµ = (E,p):

E2 − p2 −m2 = 0→ pµpµ −m2 = 0. (3.1)

Fatorar a equacao 3.1 significa escrever

pµpµ −m2 = (βκpκ +m)(γλpλ −m) (3.2)

para certos βκ e γλ.

Da equacao 3.2 temos

pµpµ −m2 = βκγλpκpλ −mβκpκ +mγλpλ −m2, (3.3)

como o lado esquerdo nao possui termos lineares em p e m temos que βκ = γκ, de forma que

pµpµ −m2 = γκγλpκpλ −m2. (3.4)

Abrindo a equacao acima, temos

Page 19: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

9

p20 − p21 − p22 − p33 −m2 = (γ0)2p20 + (γ1)2p21 + (γ2)2p22 + (γ3)2p23+

(γ0γ1 + γ1γ0)p0p1 + (γ0γ2 + γ2γ0)p0p2+

(γ0γ3 + γ3γ0)p0p3 + (γ1γ2 + γ2γ1)p1p2+

(γ1γ3 + γ3γ1)p1p3 + (γ2γ3 + γ3γ2)p2p3 −m2, (3.5)

precisamos, portanto de objetos γµ tais que, para µ 6= ν {γµ, γν} = 0 e cujo quadrado e igual a unidade.

Ou, de forma geral, a partir da equacao 3.4 concluımos que

{γµ, γν} = 2ηµν . (3.6)

com

ηµν =

1 0 0 0

0 −1 0 0

0 0 −1 0

0 0 0 −1

Os objetos mais simples que satisfazem a esta algebra (conhecida como algebra de Clifford) sao

matrizes 4× 4. Portanto, escolhidos 4 representantes desta algebra, a equacao de Dirac e um dos fatores

de 3.2, normalmente se escolhe o segundo:

(γµpµ −m)ψ = 0, (3.7)

substituindo pµ por i∂µ, como sugerido por Gordon, a equacao de Dirac toma a forma:

(iγµ∂µ −m)ψ = 0. (3.8)

E comum escolher a seguinte representacao para a algebra de Clifford (que chamaremos apenas

de matrizes γ no restante do capıtulo):

γ0 =

0 1

1 0

(3.9)

γi =

0 σi

−σi 0

(3.10)

Onde 1 e 0 representam a matriz identidade e a matriz nula 2× 2 respectivamente. Alem disso,

σi, para i = 1, 2, 3 representam as matrizes de Pauli

σ1 =

0 1

1 0

(3.11)

σ2 =

0 −i

i 0

(3.12)

Page 20: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

10

σ3 =

1 0

0 −1

(3.13)

Desta forma temos:

γ0† = γ0, (3.14)

γi† = −γi = γ0γiγ0. (3.15)

Uma consequencia muito importante decorre do fato de que os representantes da algebra de

Clifford sao matrizes (neste caso 4 × 4), nao podemos mais tomar ψ como um campo escalar, mas sim

como um objeto com 4 componentes. Curiosamente ψ tambem nao se comporta como um quadrivetor,

mas sim como um espinor [1].

3.2 Densidade de Probabilidade e Corrente de Probabilidade

Vamos escrever a equacao de Dirac na forma de uma equacao de continuidade e calcular a

densidade de probabilidade e corrente de probabilidade associadas a equacao de Dirac.

Primeiramente precisamos da equacao adjunta de Dirac:

[(iγµ∂µ −m)ψ]† = [iγ0∂tψ + iγ1∂xψ + iγ2∂yψ + iγ3∂zψ −mψ]† = 0 (3.16)

[(iγµ∂µ −m)ψ]† = −i∂tψ†γ0† +−i∂xψ†γ1† +−i∂yψ†γ2† +−i∂zψ†γ3† −mψ† = 0, (3.17)

utilizando as relacoes 3.14 e 3.15,

[(iγµ∂µ −m)ψ]† = −i∂tψ†γ0 +−i∂xψ†(−γ1) +−i∂yψ†(−γ2) +−i∂zψ†(−γ3)−mψ† = 0, (3.18)

ha um problema com a equacao 3.18, ela deixou de ser covariante de Lorentz quando tomamos o adjunto

das matrizes γ, pois apareceu um sinal negativo em todas elas exceto na primeira. Para resolver esse

problema podemos multiplicar toda a equacao por γ0 pelo lado direito, posto que −γiγ0 = γ0γi,

−i∂tψ†γ0γ0 +−i∂xψ†(−γ1γ0) +−i∂yψ†(−γ2γ0) +−i∂zψ†(−γ3γ0)−mψ†γ0 = 0, (3.19)

−i∂tψ†γ0γ0 +−i∂xψ†(γ0γ1) +−i∂yψ†(γ0γ2) +−i∂zψ†(γ0γ3)−mψ†γ0 = 0, (3.20)

agora que recuperamos a covariancia, definimos o espinor adjunto de Dirac ψ = ψ†γ0, o que nos possibilita

escrever

ψ(i∂µγµ +m) = 0, (3.21)

Page 21: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

11

onde o operador diferencial atua pela esquerda.

Agora se multiplicamos a equacao de Dirac por ψ pela esquerda, obtemos

ψ(iγµ∂µ −m)ψ = 0, (3.22)

e, de forma semelhante, se multiplicamos a equacao adjunta de Dirac por ψ pela direita, obtemos

ψ(i∂µγµ +m)ψ = 0. (3.23)

Somando as equacoes 3.22 e 3.23 obtemos

ψ(γµ∂µψ) + (ψ∂µγµ)ψ = 0 (3.24)

que pode ser escrita como uma derivada total

∂µ(ψγµψ) = 0. (3.25)

3.25 tem a forma de uma equacao de continuidade, onde identificamos

jµ = ψγµψ. (3.26)

A densidade de carga associada e, portanto

j0 = ψγ0ψ = ψ†ψ, (3.27)

que, em termos das componentes ψi de ψ fica

j0 = |ψ1|2 + |ψ2|2 + |ψ3|2 + |ψ4|2. (3.28)

A equacao 3.28 mostra que j0 e positivo definido, e portanto pode ser interpretado como densidade

de probabilidade.

3.3 Fermions de Majorana

Em geral, o espinor ψ e a base da algebra de Clifford sao objetos complexos. Por isso, ainda que

encontrassemos algum ψ real que satisfizesse a equacao de Dirac, apos uma transformacao de Lorentz

esta solucao deixaria de ser real. Existe uma maneira de contornar este problema: se trabalhamos com

uma base puramente imaginaria para a algebra de Clifford

γ0 =

0 σ2

σ2 0

, γ1 =

iσ3 0

0 iσ3

, γ2 =

0 −σ2

σ2 0

, γ3 =

−iσ1 0

0 −iσ1

. (3.29)

Devido ao fato da base 3.29 ser puramente imaginaria, a representacao do grupo de Lorentz e real

[7], portanto, a imposicao ψ = ψ∗ nao e destruıda pela atuacao deste grupo. Espinores que satisfazem

Page 22: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

12

esta propriedade sao chamados de espinores de Majorana.

Podemos ainda trabalhar em uma base qualquer, desde que satisfaca (γ0)† = γ0 e (γi)† = −γi.

Definimos

ψ(c) = Cψ∗, (3.30)

onde C e uma matriz unitaria 4×4 que satizfaz C†γµC = −(γµ)∗. De fato, se ψ e uma solucao da equacao

de Dirac, 3.30 tambem e:

(iγµ∂µ −m)ψ = 0⇒

(−i(γµ)∗∂µ −m)ψ∗ = 0⇒

C(−i(γµ)∗∂µ −m)ψ∗ = 0⇒

(iγµ∂µ −m)ψ(c) = 0.

3.4 Solucoes de onda plana para a equacao de Dirac

Consideremos o seguinte ansatz para a equacao 3.8:

ψ = u(p)e−ip·x, (3.31)

onde u(p) e um espinor de quatro componentes a determinar, que nao depende das coordenadas do

espaco-tempo e p · x ≡ pµxµ. O termo iγµ∂µ = γµpµ em 3.8 e equivalente a

p0

0 1

1 0

−∑i

pi

0 σi

−σi 0

=

0 p0 − piσi

p0 + piσi 0

.

Definindo σµ ≡ (1, σi) e σµ ≡ (1,−σi), escrevemos p0−piσi = pµσµ ≡ p ·σ e p0 +piσ

i = pµσµ ≡

p · σ. Desta forma, a equacao de Dirac se escreve

(γµpµ −m)u(p) =

−m pµσµ

pµσµ −m

u(p) = 0. (3.32)

Escrevendo

u(p) =

u1

u2

,

onde u1 e u2 sao espinores de duas componentes, obtemos as equacoes

pµσµu2 = mu1,

pµσµu1 = mu2.

(3.33)

Page 23: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

13

Escolhendo o ansatz u1 = (p · σ)ξ′ e substituindo na segunda equacao em 3.33 obtemos mu2 =

(p · σ)(p · σ)ξ′, mas

(p · σ)(p · σ) = (p0 + piσi)(p0 − piσi) = p20 − pipjσiσj = p20 − pipjδij = p20 − pi2 = pµp

µ = m2.

Portanto u2 = mξ′ e

u(p) = A

(p · σ)ξ′

mξ′

.

Podemos escolher A = 1/m e ξ′ =√p · σξ de forma a obter uma forma mais simetrica para u(p) :

u(p) =

√p · σξ√p · σξ

. (3.34)

Procedendo de maneira analoga, encontramos mais solucoes da equacao de Dirac considerando o

ansatz

ψ = v(p)eip·x. (3.35)

O analogo da equacao 3.32 se torna

(γµpµ +m)v(p) =

m pµσµ

pµσµ m

v(p) = 0, (3.36)

cuja solucao e

v(p) =

√p · ση

−√p · ση

(3.37)

para algum espinor constante η de duas componentes, normalizado por η†η = 1.

Sera util introduzir uma base ξs e ηs, s = 1, 2 para os espinores de duas componentes, de tal

forma que

ξr†ξs = ηr†ηs = δrs, (3.38)

por exemplo

ξ1 =

1

0

e

0

1

.

us(p) =

√p · σξs√p · σξs

(3.39)

Page 24: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

14

Relacoes uteis

As seguintes relacoes serao utilizadas no processo de quantizacao da teoria:

ur†(p) · us(p) =(ξr†√p · σ ξr†

√p · σ

) √p · σξs√p · σξs

= ξr†p · σξs + ξr†p · σξs = 2ξr†p0ξs

⇒ ur†(p) · us(p) = 2p0δrs (3.40)

ur(p) · us(p) = ur†γ0 · us(p) =(ξr†√p · σ ξr†

√p · σ

) 0 1

1 0

√p · σξs√p · σξs

⇒ ur(p) · us(p) = 2mδrs. (3.41)

Semelhantemente, para v(p) encontramos:

vr†(p) · vs(p) = 2p0δrs (3.42)

vr(p) · vs(p) = −2mδrs (3.43)

Produtos entre u e v :

ur(p) · vs(p) =(ξr†√p · σ ξr†

√p · σ

) 0 1

1 0

√p · σηs

−√p · σηs

=

ξr†√

(p · σ)(p · σ)ηs − ξr†√

(p · σ)(p · σ)ηs

⇒ ur(p) · vs(p) = 0 (3.44)

ur†(p) · vs(−p) =(ξr†√p · σ ξr†

√p · σ

) √p′ · σηs

−√p′ · σηs

=

ξr†√

(p · σ)(p′ · σ)ηs − ξr†√

(p · σ)(p′ · σ)ηs

⇒ ur†(p) · vs(−p) = 0, (3.45)

onde definimos (p′)µ ≡ (p0,−p) e utilizamos (p · σ)(p′ · σ) = (p0 + piσi)(p0 − piσi) = m2 = (p · σ)(p′ · σ).

Page 25: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

15

3.5 Quantizacao do campo de Dirac

Primeiramente, apresentamos a notacao introduzida por Feynman para um objeto contraıdo com

as matrizes gama:

γµAµ ≡ /A.

A Lagrangiana que da origem a equacao de Dirac se escreve [7]

L = ψ(x)(i/∂ −m)ψ(x) = iψγµ∂µψ −mψψ. (3.46)

Desta forma, obtemos para o momento

π =∂L∂ψ

= iψγ0 = iψ†(γ0)2 ⇒

π = iψ†. (3.47)

Para quantizar 3.46 promovemos ψ e π a operadores:

ψ(x) =

2∑s=1

∫d3p

(2π)3[bspu

s(p)eip·x + cs†p vs(p)e−ip·x] (3.48)

ψ†(x) =

2∑s=1

∫d3p

(2π)3[bs†p u

s†(p)e−ip·x + cspvs†(p)eip·x], (3.49)

onde os operadores bs†p e cs†p criam partıculas associadas aos espinores us(p) e vsp, respectivamente.

Impomos, agora, as relacoes de anti-comutacao

{ψα(x), ψβ(y)} = {ψ†α(x), ψ†β(y)} = 0, (3.50)

{ψα(x), ψ†β(y)} = δαβδ(3)(x− y). (3.51)

Ou, em termos dos operadores de criacao e aniquilacao

{brp, bs†q } = (2π)3δrsδ(3)(p− q) (3.52)

{crp, cs†q } = (2π)3δrsδ(3)(p− q) (3.53)

O hamiltoniano da teoria

Utilizando 3.47 temos

H = πψ − L = iψγ0∂0ψ − (iψγµ∂µψ −mψψ)⇒

H = iψγ0∂0ψ − (iψγ0∂0ψ + iψγi∂iψ) +mψψ ⇒

H = −iψγi∂iψ +mψψ ⇒

Page 26: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

16

H = ψ(−iγi∂i +m)ψ. (3.54)

Queremos promover H a um operador, analisemos primeiro (−iγi∂i +m)ψ :

(−iγi∂i +m)ψ =

2∑s=1

∫d3p

(2π)31√2Ep

[bsp(−γipi +m)us(p)eip·x + cs†p (γipi +m)vs(p)e−ip·x].

Utilizando as equacoes 3.32 e 3.36 podemos escrever

(−γipi +m)us(p) = γ0p0us(p) e (γipi +m)vs(p) = −γ0p0vs(p).

Portanto

(−iγi∂i +m)ψ =

∫d3p

(2π)3

√Ep

2γ0[bspu

s(p)eip·x − cs†p vs(p)e−ip·x]. (3.55)

Finalmente, utilizamos 3.55 para calcular o hamiltoniano

H =

∫d3x ψ†γ0(−iγi∂i +m)ψ =

∫d3x d3p d3q

(2π)6

√Ep

4Eq[br†q u

r†(q)e−iq·x + crqvr†(q)eiq·x]·

[bspus(p)eip·x − cs†p vs(p)e−ip·x]

=

∫d3p

(2π)31

2[br†p b

sp[ur†(p) · us(p)]− crpcs†p [vr†(p) · vs(p)]− br†p c

s†−p[ur†(p) · vs(−p)]

+crpbs−p[vr†(p) · us(−p)]].

(3.56)

Utilizando as relacoes 3.40, 3.42 (continuar) obtemos

H =

∫d3p

(2π)3Ep(bs†p b

sp − cspcs†p )

⇒ H =

∫d3p

(2π)3Ep(bs†p b

sp + cs†p c

sp − (2π)3δ(3)(0)).

Ja vimos como lidar com o termo δ(3)(0), podemos abandona-lo, resultando no hamiltoniano

H =

∫d3p

(2π)3Ep(bs†p b

sp + cs†p c

sp). (3.57)

3.6 Predicao de anti materia

Dirac considerava sua equacao como a versao relativıstica da equacao de Schrodinger, escrevendo-

a da seguinte forma:

i∂tψ = −α ·∇ψ +mβψ, (3.58)

onde α = −γ0γ e β = γ0. A expressao H = −α ·∇ + mβ era interpretada como o hamiltoniano de

partıcula unica. Nesta linguagem, as solucoes 3.31 e 3.35 representam autoestados de H com energias

Page 27: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

17

Ep e − Ep, respectivamente. Isto significa que para cada estado com energia positiva existe outro com

energia negativa em mesmo valor absoluto e como, a princıpio, Ep e ilimitada, o espectro de H nao possui

limite inferior. A solucao de Dirac para este problema baseava-se na constatacao de que os eletrons sao

fermions, obedecendo, portanto, o princıpio de exclusao de Pauli. Com isto, Dirac postulou que todos

os estados de energia negativa estariam ocupados no vacuo absoluto, de forma que apenas aqueles com

energia negativa estariam acessıveis. Em princıpio, isto daria origem a uma quantidade infinita de carga

eletrica no vacuo, porem, Dirac argumenta que apenas diferencas entre cargas sao observaveis.

Outra importante constatacao de Dirac era de que estados de energia negativa poderiam ser ex-

citados para estados de energia positiva, deixando para tras um “buraco”, que teria todas as propriedades

do eletron, mas carga eletrica oposta. Inicialmente, Dirac imaginou que os buracos fossem protons, porem

mais tarte concluiu que correspondiam a outro tipo de partıcula, o positron, que foi observado em 1932.

Embora a interpretacao de que 3.58 represente a equacao de partıcula unica esteja equivocada,

Dirac previu corretamente a existencia de anti materia, um dos maiores feitos de toda a Fısica teorica.

Alem disso, a ideia de que estados de energia negativa estao ocupados e podem ser excitados para cima

do mar de Dirac assemelha-se muito ao que ocorre na estrutura de bandas de um material com gap finito.

Em materia condensada, as bandas ocupadas por eletrons sao determinadas pelo energia (ou nıvel) de

Fermi, quando o nıvel de Fermi se encontra no gap entre a banda de valencia e a banda de conducao,

eletrons da banda de valencia podem ser excitados a estados de conducao, com um custo energetico finito,

deixando na banda de valencia um buraco.

Page 28: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

Capıtulo 4

A Cadeia de Kitaev

4.1 Modos de Majorana desacoplados em supercondutores to-

pologicos

Em Fısica da materia condensada, modos de Majorana sao quasipartıculas que representam suas

proprias anti-quasipartıculas [9], o que significa que devem ser descritos por uma superposicao equivalente

de estados de eletrons e buracos. Este fato torna natural a procura destes modos em sistemas supercon-

dutores, onde as funcoes de onda das quasipartıculas de Bogoliubov possuem componentes de partıcula

e buraco como graus de liberdade igualmente relevantes. A forma mais comum de acoplamento em su-

percondutores e do tipo onda-s, onde os pares de Cooper sao formados de pares de eletrons num estado

singleto (projecoes de spin opostas). Desta forma, o operador de aniquilacao para uma quasipartıcula de

Bogoliubov e da forma b = uc†↑ + vc↓, onde σ =↑, ↓ representa as possıveis projecoes de spin do eletron.

Um modo de Majorana deve estar associado a um operador de aniquilacao da forma

γ = uc†σ + u∗cσ,

note que γ = γ†, o que e necessario para um fermion de Majorana, como consequencia, os operadores

fermionicos compondo os fermions de Majorana devem estar associados a mesma projecao de spin, em

contraste com o que ocorre em supercondutores de onda-s, isto faz com que modos de Majorana nao

sejam observados na maioria dos supercondutores conhecidos [9]. Contudo, modos de Majorana isolados

podem ser produzidos em superfıcies de supercondutores de onda-p, nos quais a funcao de onda possui

s = 1, o que significa que os pares de Cooper sao formados por eletrons num estado tripleto. Esta

forma de acoplamento foi prevista para o estado fundamental do supercondutor Sr2RuO4, [10] porem

e altamente sensıvel a desordem e, portanto, nunca foi observada experimentalmente [9]. Felizmente,

um trabalho devido a Fu e Kane [11] mostrou que o pareamento tipo px ± ipy pode ocorrer em estados

de borda em isolantes topologicos quando postos em contato com um supercondutor comum de onda-s,

dando origem ao fenomeno de supercondutividade induzida por efeito de proximidade. Algum tempo

depois, dois trabalhos [12, 13] sugeriram uma simplificacao do problema, utilizando fios semicondutores

unidimensionais. Cabe notar que existem tambem propostas de criacao de modos de Majorana em vortices

Page 29: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

19

de isolantes topologicos dopados [14] , na interface entre um ferromagneto e um supercondutor depositado

em um isolante topologico bidimensional [15, 16, 17] , em gases de atomos frios [18, 19], em nanotubos

de carbono [20, 21, 22] e ainda outros sistemas. Neste trabalho, contudo, trataremos do sistema proposto

por Kitaev.

4.2 Cadeia de Kitaev

Consideremos um modelo composto por uma cadeia unidimensional de N sıtios, cada um capaz

de comportar um estado fermionico c†n, ou, equivalentemente, dois modos de Majorana γ2n−1 e γ2n,

conforme ilustrado na figura 4.1.

Figura 4.1: representacao da cadeia unidimensional de N=4 sıtios, cada ponto representa um modo de

Majorana, e um par de tais modos forma um estado fermionico comum [23].

Podemos pensar em duas formas de acoplar os modos de Majorana: uma e atraves da interacao

entre majoranas que ocupam o mesmo sıtio (interacao onsite), a outra se da atraves da interacao de

majoranas pertencentes a sıtios vizinhos. Analisaremos os dois casos a seguir, comecando com o primeiro.

Interacao onsite

Atribuindo um custo de ocupacao µ para os estados fermionicos, o hamiltoneno da cadeia fica

H = µ

N∑n=1

c†ncn, (4.1)

ou, em termos dos operadores de Majorana (ver equacao 1.1):

H =i

N∑n=1

γ2n−1γ2n. (4.2)

Note que todas as excitacoes tem energia ± |µ|2 e todos os majoranas participam do hamiltoniano.

A interacao e ilustrada na figura 4.2.

Interacao entre sıtios

Se quisermos obter majoranas desacoplados nas bordas, precisamos de uma interacao que acople

modos de sıtios vizinhos. Como ilustra a figura 4.3.

Atribuindo uma diferenca de energia igual a 2t entre estados ocupados e desocupados para cada

par formado desta maneira, obtemos o hamiltoniano

Page 30: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

20

Figura 4.2: Ilustracao da interacao onsite para uma cadeia com N=4 sıtios. Note que todos os majoranas

estao acoplados a seus vizinhos [23].

H = it

N∑n=1

γ2nγ2n+1. (4.3)

Nota-se que o primeiro e o ultimo modo nao participam do hamiltoniano, esta cadeia possui dois

estados com energia zero localizados em suas bordas. Alem disso, estados do bulk possuem energia ±|t|.

Temos, entao, um sistema unidimensional com gap no bulk e estados de energia zero nas bordas.

Figura 4.3: Ilustracao da interacao entre sıtios, note a presenca de modos de majorana desemparelhados

nas bordas da cadeia [23].

4.3 O hamiltoniano de Kitaev

Os dois hamiltonianos expostos acima sao casos especiais do hamiltoniano de Kitaev

H = −µ∑n

c†ncn − t∑n

(c†n+1cn + h.c.) + ∆∑n

(cncn+1 + h.c.), (4.4)

que possui tres parametros reais: o potencial quımico µ, o hopping entre sıtios e o pareamento supercon-

dutor ∆. A partir do hamiltoniano 4.4, o regime com estados de borda e obtido quando ∆ = t e µ = 0,

enquanto o regime totalmente trivial composto apenas de fermions comuns e obtido quando ∆ = t = 0 e

µ 6= 0.

Conforme o discutido no inıcio deste capıtulo, toda a motivacao para a procura de modos de

Majorana em sistemas supercondutores se deve ao fato da existencia da simetria partıcula-buraco que estes

exibem. Portanto, com a intencao de explorar esta simetria, passaremos ao formalismo de Bogoliubov

de Gennes escrevendo 4.4 na forma H = 12C†HBdGC, onde C e um vetor coluna definido por C =

(c1, . . . , cN , c†1, . . . , c

†N )T . Portanto, HBdG e uma matriz 2N × 2N, elegantemente escrita utilizando-se as

matrizes de Pauli (τi, i = x, y, z) e definindo o vetor |n〉 = (0, . . . , 1, . . . , 0) correspondendo ao n-esimo

sıtio da cadeia. Com isto, podemos escrever C†τz |n〉 〈n|C = 2c†ncn, De forma que

Page 31: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

21

HBdG = −∑n

µτz |n〉 〈n| −∑n

[(tτz + i∆τy) |n〉 〈n+ 1|+ h.c.]. (4.5)

HBdG atua em estados do tipo |n〉 ⊗ |τ〉 , onde τ = ±1 correspondendo a estados de eletron e

buraco, respectivamente. A simetria partıcula-buraco e evidenciada por PHBdGP−1 = −HBdG, com

P = τxK.

4.4 Protecao topologica dos estados de borda

Nesta secao avaliaremos a persistencia dos modos de majorana frente a desvios das condicoes

iniciais. Lembre-se que a condicao para a existencia de estados de borda a partir do hamiltoniano de

Kitaev 4.4 era ∆ = t e µ = 0. Portanto seria natural questionar se os estados de borda persistem no

sistema quando comecamos no regime acima e mudamos gradualmente o potencial quımico, por exemplo.

A figura 4.4 contem o espectro de energia de 4.5 para uma cadeia com 25 sıtios, a primeira

caracterıstica notavel e a simetria do espectro, que nada mais e do que uma consequencia da simetria

partıcula-buraco exibida pelo sistema. Outra caracterıstica notavel e que a degenerescencia dos estados

de energia zero so e quebrada quando µ ≈ 2t, mostrando que os modos de majorana persistem ate este

ponto, que ocorre justamente quando o gap esta proximo de se fechar.

Figura 4.4: Espectro de energia para uma cadeia com N=25 sıtios, nota-se a simetria em torno de E=0,

e que a degenerescencia deste nıvel se quebra apenas quando µ ≈ 2t [23].

Para entender porque isto ocorre, recorremos a simetria partıcula-buraco, que proıbe que um

estado no nıvel zero se mova individualmente (ja que isso produziria um espectro assimetrico). A unica

Page 32: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

22

forma de quebrar a degenerescencia e acoplando os dois majoranas, o que e impossıvel devido a separacao

entre eles, de forma que apenas quando gap se fecha a quebra torna possıvel

Conclui-se que os estados de borda no sistema persistem enquanto o gap no bulk for finito, o que

e garantido pela simetria partıcula-buraco.

4.5 Fases topologicas a partir do espectro do bulk

Vamos agora nos preocupar em encontrar uma maneira de deduzir a existencia de modos de

majorana a partir do espectro de bulk da cadeia. Primeiramente, vamos eliminar as bordas do sistema e

impor condicoes de contorno periodicas, com isto, o sistema possui simetria translacional |n〉 → |n+ 1〉 ,

uma vez que os parametros t, µ e ∆ nao dependem dos sıtios. Agora e interessante escrever o hamiltoniano

no espaco de momentos

|k〉 = N−1/2N∑n=1

e−ikn |n〉 , (4.6)

onde |k〉 representa um estado com momento cristalino k.

Podemos escrever o hamiltoniano no espaco de momentos

H(k) ≡ 〈k|HBdG|k〉 = (−2t cos k − µ)τz + 2∆ sin k τy (4.7)

Diagonalizando este hamiltoniano, obtemos as relacoes de dispersao

E(k) = ±√

(2t cos k + µ)2 + 4∆2 sin2 k. (4.8)

Nota-se a presenca de um gap no espectro para todos os valores de k quando µ = 0 (ver figura

4.5a), isto ocorre pois retiramos as bordas da cadeia, de forma que nao existem mais os estados com

energia zero que tınhamos antes para este valor do potencial quımico. Contudo, e possıvel observar o

fechamento do gap ocorrendo para os valores de µ = +2t (figura 4.5c) e µ = −2t (figura 4.6c).

A primeira vista, a estrutura de bandas antes e depois do fechamento do gap parecem identicas.

De fato, olhando apenas para os graficos acima, nao fica claro que o fechamento do gap corresponde a

uma mudanca de fase do modelo. Nao obstante, seremos capazes de chegar a este resultado atraves do

estudo das propriedades de H(k) em mais detalhes.

Estudo da transicao de fase no bulk a partir de um hamiltoniano de Dirac efetivo

Vamos analisar em mais detalhes o que acontece com o pontos vizinhos de k = 0 quando o gap

se fecha para µ = −2t. Proximo deste ponto uma linearizacao do hamiltoniano fornece

H(k) ≈ mτz + 2∆kτy, (4.9)

com m = −µ− 2t. Diagonalizando 4.9 obtemos os espectros,

Page 33: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

23

(a) (b)

(c)

Figura 4.5: Esquema da estrutura de bandas 4.8 comecando na fase topologica e variando µ por valores

positivos. Observe o fechamento do gap ocorrendo nas extremidades da zona de Brillouin quando µ = 2t

[23].

(a) (b)

(c)

Figura 4.6: Esquema da estrutura de bandas 4.8 comecando na fase topologica e variando µ por valores

negativos. Observe o fechamento do gap ocorrendo no meio da zona de Brillouin quando µ = −2t [23].

E(k) = ±√m2 + 4∆2k2 (4.10)

O parametro m e importante para caracterizar o sistema, note seu sinal informa se µ e maior

Page 34: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

24

ou menor que −2t, o que essencialmente informa em que regime o sistema se encontra: se m < 0, entao

o sistema se encontra na fase topologica, isto e, naquele regime em que existem estados de borda, se

m > 0, dizemos que o sistema esta na fase trivial, o que corresponde ao regime sem estados de borda.

Quando m = 0, o hamiltoniano possui dois autoestados com energias E = ±2∆k, estes sao autoestados

tambem de τy, e portanto sao superposicoes de equivalentes de eletrons e buracos. De fato, estes estados

representam modos de majorana se movendo para a esquerda (E = −2∆k) e para a direita (E = 2∆k).

Estes estados estao livres para se propagarem, ja que o bulk nao possui gap agora. Em nosso modelo, a

velocidade desses modos e dada por v = 2∆.

Modos de majorana em fronteiras de domınios

Agora consideraremos o que ocorre quando o parametro m varia espacialmente, mudando de sinal

em algum ponto da cadeia, em outras palavras

m(x)→ ±m se x→∞ e m(x = 0) = 0.

Dizemos que o ponto x = 0 e uma fronteira de domınio, que demarca duas regioes do espaco com

sinais de m opostos. Escrevendo 4.9 no espaco real, obtemos

H = −vτyi∂x +m(x)τz. (4.11)

Ja sabemos que quando m = 0, 4.11 admite um modo de majorana com energia zero como

solucao. Para estudar este estado em mais detalhes precisamos resolver a equacao HΨ = 0, que pode ser

escrita como

∂xΨ(x) =1

vm(x)τxΨ(x), (4.12)

As solucoes sao da forma

Ψ(x) = exp

τx x∫0

m(x′)

vdx′

Ψ(0). (4.13)

Duas solucoes linearmente independentes sao dadas pelos autoestados de τx,

Ψ(x) = exp

± x∫0

m(x′)

vdx′

1

±1

. (4.14)

Apenas uma destas solucoes e normalizavel, ja que m(x) muda de sinal quando x = 0. Desta

forma, obtemos uma funcao de onda localizada em x = 0 (ver figura 4.7)

4.6 Invariante topologico do bulk e a correspondencia bulk-edge

Agora vamos generalizar o criterio discutido anteriormente para a existencia de modos de majo-

rana, encontrando um invariante topologico para o bulk a ser calculado diretamente de H(k).

Page 35: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

25

Figura 4.7: Ilustracao da funcao de onda do modo de Majorana localizado na interface entre dois domınios

[23].

Figura 4.8: Ilustracao do Majorana formado na interface entre os domınios topologico e trivial [23].

No que se segue, determinamos o invariante topologico associado a transicao de fase da Cadeia

de Kitaev, utilizaremos o fato de que podemos levar o hamiltoniano da cadeia nos extremos da primeira

zona de Brillouin a uma forma antissimetrica. Para matrizes antissimetricas, existe uma quantidade, o

Paffiano, que definimos a seguir:

Seja A uma matriz antissimetrica 2n× 2n, o Pfaffiano de A e definido por [24]:

pf(A) =1

2nn!

∑σ∈S2n

sign(σ)

n∏i=1

aσ(2i−1),σ(2i), (4.15)

onde S2n e o grupo simetrico de dimensao 2n e aij representa as entradas da matriz A.

O sinal do Pfaffiano 4.15, muda de sinal sempre que o gap no espectro do hamiltoniano se fecha

[23], o que nos indica que o sinal de 4.15 seja um invariante topologico para o nosso sistema. Por outro

lado, este e exatamente o comportamento do parametro de massa m do problema, o que sugere relacionar

m com um Pfaffiano.

O Pfaffiano pode mudar apenas quando algum autovalor de H(k) passa por zero. Mas por causa

da simetria partıcula-buraco, para cada autovalor E(k) existe outro em −E(−k). Portanto, se E(k) passa

por zero, seu parceiro tambem o faz. Alem disso, o espectro deve ser periodico na zona de Brillouin, o que

significa que fechamentos de gap ocorrem em pares, e portanto, nao podem mudar o Pfaffiano. As unicas

excecoes sao os pontos k = 0 e k = π, que sao mapeados em si mesmos pela simetria partıcula-buraco.

Para esses pontos temos

τxH∗(0)τx = −H(0)

τxH∗(π)τx = −H(π).

Page 36: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

26

Portanto, H(0) e H(π) podem sempre ser postos em forma antissimetrica individualmente e

podemos sempre calcular o Pfaffiano para estas matrizes facilmente. Nota-se, tambem, que estes sao

exatamente os pontos em que o gap de fecha, em k = 0 para µ = −2t e em k = 0π para µ = −2t. Por

estes motivos focaremos apenas em H(0) e H(π),

H(0) =1

2

1 1

i −i

−2t− µ 0

0 2t+ µ

1 1

i −i

= −i

0 −2t− µ

2t+ µ 0

, (4.16)

H(π) =1

2

1 1

i −i

2t− µ 0

0 2t+ µ

1 1

i −i

= −i

0 2t− µ

−2t+ µ 0

. (4.17)

Obtemos facilmente

Pf[iH(0)] = −2t− µ

Pf[iH(π)] = 2t− µ.

Observe que o Pfaffiano de H(0) muda de sinal quando µ = −2t e o de H(π) quando µ = 2t, em

concordancia com a estrutura de bandas.

Cada Pfaffiano calculado acima esta associado ao fechamento de um gap, de forma que o invariante

topologico do bulk como um todo (Q)e dado pelo produto

Q = sign(Pf[iH(0)]Pf[iH(π)]). (4.18)

Se Q = −1 significa que o bulk se encontra na fase topologica, de forma que se cortassemos o fio

em qualquer ponto, terıamos dois modos de Majorana desemparelhados nas bordas. Se Q = +1 significa

que o sistema esta na fase trivial.

Resta agora encontrar o significado fısico do invariante Q. Sabemos que o Pfaffiano de um hamil-

toniano de Bogoliubov de Gennes esta associado a paridade fermionica do estado fundamental do sistema

[23]. Ao tomarmos o produto 4.18 estamos de alguma forma comparando as paridades fermionicas dos

estados com k = 0 e k = π, e temos que que Q = −1 se e somente se as duas paridades sao diferentes.

Isto significa que se deformamos continuamente H(0) em H(π) sem quebrar a simetria eletron buraco,

devemos encontrar um cruzamento do nıvel de Fermi no espectro de energia, que corresponde a mudanca

de paridade fermionica (fermion parity switch), ou no nosso caso, a uma transicao de fase topologica.

Em resumo, descobrimos que a cadeia de Kitev e capaz de comportar modos de Majorana de-

sacoplados tanto como estados de borda, quanto em pontos de transicoes de domınio entre fases triviais

e topologicas. A existencia destes modos e protegida pela simetria eletron buraco e esta associada ao

invariante topologico 4.18, cuja interpretacao fısica e diferenca entre as paridades fermionicas dos estados

dos extremos da zona de Brillouin (k = 0 e k = π).

Page 37: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

Capıtulo 5

A cadeia de Kitaev no mundo real

Neste capıtulo, discutimos como construir a cadeia de Kitaev utilizando materiais e metodos

disponıveis em laboratorio.

5.1 Desenvolvendo o modelo

Conforme visto no capıtulo 4, a cadeia de Kitaev e um modelo bastante simples, porem, a neces-

sidade que os fermions de Majorana impoe sobre o acoplamento de spins e experimentalmente bastante

desafiadora. Tentaremos contornar cada um dos problemas discutidos na secao anterior, equipando o

modelo com elementos externos ate torna-lo fisicamente realizavel. Comecamos com a cadeia de Kitaev

pura e simples, cujo hamiltoneno no espaco de momentos se escreve

HKitaev = (−2t cos k − µ)τz + 2∆τy sin k. (5.1)

Primeiramente, queremos um sistema com parametros controlaveis, o que nos leva a utilizar um

semicondutor. Nestes sistemas o valor do potencial quımico pode ser variado por meio de dopagem ou

variando voltagens adequadamente. Mas ainda precisamos da supercondutividade, podemos contornar

este problema aproximando um supercondutor do sistema, formando uma estrutura hıbrida. Desta forma,

por efeito de proximidade, e possıvel fazer com que a supercondutividade seja induzida no semicondutor.

Chamamos de efeito de proximidade, o fenomeno que ocorre quando colocamos um supercondutor

em contato com um material comum (que nao e um supercondutor). Em sistemas como este e possıvel

observar uma supercondutividade fraca no material comum ao longo de uma certa espessura [25].

A proxima coisa que podemos considerar e que µ permanecera pequeno comparado a largura de

banda (µ � 2t). O mesmo vale para o pareamento supercondutor (∆ � t), pois a supercondutividade

e um efeito fraco comparado com a energia cinetica dos eletrons. Podemos, entao, expandir o termo em

cos k e trabalhar no limite contınuo da modelo de Kitaev

H =

(k2

2m− µ

)τz + 2∆τyk. (5.2)

Onde m e a massa efetiva do eletron, e contem os coeficientes da expansao.

Page 38: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

28

Spin eletronico

Algo de que precisamos tratar em nosso modelo 5.2 e o spin eletronico. O modelo precisa de uma

cadeia de fermions onde apenas uma projecao e permitida. Uma maneira de incorporar o spin eletronico

e expandir o espaco de Hilbert tomando o produto tensorial entre o espaco de momentos e o espaco de

spins. O problema com este procedimento e ele daria origem a uma degenerescencia dupla, que faria

com que dois modos de Majorana pudessem ocupar as bordas da cadeia, em outras palavras, um fermion

comum ocuparia os estados de borda.

A solucao consiste em tornar a cadeia de Kitaev para uma projecao de spin topologicamente

trivial e para a outra, nao trivial. Como µ e o parametro que controla o regime do sistema, digamos que

a projecao de spin ↑ corresponda a µ > 0 e spin ↓ corresponda a µ < 0. Isto pode ser feito adicionando

um acoplamento Zeeman entre o spin e um campo magnetico externo

H =

(k2

2m− µ−Bσz

)τz + 2∆τyk. (5.3)

Um campo magnetico B forte o suficiente e capaz de separar os spins, tornando possıvel fazer

com que uma projecao corresponda a µ > 0 e a outra a µ < 0 (ver figura 5.1)

(a) (b) (c)

Figura 5.1: Em 5.1a temos o sistema no regime topologico em ausencia de campo magnetico. Conforme

B aumenta, vemos a separacao dos nıveis de energia devida ao efeito Zeeman (5.1b e 5.1c) [23].

Pareamento supercondutor

Precisamos encontrar uma maneira de produzir um pareamento tipo p efetivo utilizando super-

condutores tipo s, dos quais dispomos. Supercondutores tipo s acoplam singletos

Hpar = ∆(c↑c↓ − c↓c↑) + h.c. (5.4)

O que significa que precisamos mudar o pareamento. Comecaremos com um mudanca de base em

HBdG : seja T = UK um operador de simetria de reversao temporal, podemos aplicar a transformacao

unitaria U aos buracos, de forma que na nova base, o hamiltoneno de Bogoliubov de Gennes fica

HBdG =

H ∆′

−∆∗ −H∗

, (5.5)

onde ∆′ = ∆U†. Com esta base e facil calcular o hailtoneano dos buracos, basta trocar os sinais de todos

os termos que respeitam a simetria de reversao temporal, deixando os termos que quebram a simetria

Page 39: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

29

intactos, por exemplo, termos contendo B. Resumidamente, se o eletrons possuem hamiltoniano H(B),

entao o dos buracos sera −H(−B). Finalmente, a simetria eletron-buraco se escreve P = σyτyK.

Como os termos em B trocam de sinal frente a simetria de reversao temporal, temos que o campo

Zeeman tem a mesma forma para eletrons e buracos na nova base, assim, o hamiltoniano fica

HBdG =

(k2

2m− µ

)τz +Bσz + ∆τx. (5.6)

Diagonalizando 5.6 para k = 0 obtemos quatro nıveis de energia

E = ±B ±√µ2 + ∆2. (5.7)

Sabemos que B=0 corresponde a fase trivial, devido a degenerescencia de spin. Assim, esperamos

que o sistema estara na fase topologica quando B2 > ∆2 + µ2.

Interacao spin-orbita

Vejamos o espectro de 5.6 para diferentes valores de k (figura 5.2a, 5.2b e 5.2c).

(a) (b) (c)

Figura 5.2: Comportmento da estrutura de bandas com B. Note a degenerescencia quando B = 0 (figura

5.2a). A medida que B aumenta 5.2b e 5.2c o gap do bulk se fecha, mostrando que nao e possıvel o

aparecimento dos modos de Majorana [23].

Note que o gap do sistema se fecha, o que proıbe a existencia dos modos de Majorana. Se

quisermos obte-los precisamos encontra uma maneira de abrir o gap. Para este fim, podemos adicionar

um acoplamento spin-orbita da forma

HSO = ασyk, (5.8)

que atua como um campo de Zeeman apontando na direcao y com intensidade proporcional ao momento

da partıcula. Este termo e invariante por reversao temporal, pois tanto σy quanto k trocam de sinal. O

hamiltoniano final fica

Hfio =

(k2

2m+ ασyk − µ

)τz +Bσz + ∆τx. (5.9)

Quando k = 0 o termo de acoplamento spin-orbita e nulo, portanto nao influencia a fase do

sistema (trivial ou topologica). Veja agora a estrutura de bandas (figura 5.3)

Page 40: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

30

(a) (b) (c)

Figura 5.3: Comportmento da estrutura de bandas com α. A medida que α aumenta, o gap do bulk se

abre [23].

Temos e presenca de um gap, o que significa que os modos de majorana podem ser obtidos

no sistema. Concluımos que e possıvel realizar a Cadeia de Kitaev utilizando elementos existentes no

laboratorio, incluindo um supercondutor de onda s no lugar de um supercondutor exotico que o modelo

exigia, se adicionarmos elementos externos ao modelo, como campo magnetico externo e acoplamento

spin-orbita.

Contudo, umas das principais dificuldades experimentais vem do fato de que o sistema exige pelo

menos quatro parametros controlaveis [23]: o potencial quımico µ, que determina a densidade eletronica

no fio; o gap supercondutor ∆, que e responsavel pela forma particular assumida pelo emparelhamento

supercondutor; a constante de acoplamento spin-orbita α, responsavel por quebrar a conservacao de spin

e o campo magnetico externo B, responsavel por quebrar a degenerescencia de Kramers.

Page 41: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

Capıtulo 6

Conclusoes

Neste trabalho estudamos duas teorias de campo importantes no desenvolvimento da Mecanica

Quantica Relativıstica, exploramos os problemas com a equacao de Klein-Gordon e de que maneira Dirac

os resolveu. Discutimos a ideia da existencia de antimateria e mostramos como os fermions de Majorana

surgem neste contexto.

Nos capıtulos 4 e 5 tratamos da realizacao dos modos de Majorana em sistemas de materia

condensada, foi feita uma apresentacao da Cadeia de Kitaev, onde mostramos que os fermions de Majorana

surgem tanto como estados de borda da cadeia quanto como pontos de transicao entre domınios.

Por fim, analisamos como realizar a Cadeia de Kitaev utilizando elementos dos quais dispoe-se

em laboratorio, vimos que e possıvel, sobretudo, eliminar a necessidade de um supercondutor de onda p

em favor de um supercondutor de onda s, que e o mais comum.

Page 42: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

Bibliografia

[1] Lewis H. Ryder. Quantum Field Theory. Cambridge University Press, 1985.

[2] Frank Wilczek. “Majorana Returns”. Em: Nature Physics 5, 614–618 (2009) (2009).

[3] A. Yu Kitaev. “Yu Kitaev 2001 Phys.-Usp. 44 131”. Em: Physics-Uspekhi (2013).

[4] Bernard Diu Claude Cohen-Tannoudji e Frank Laloe. Quantum Mechanics volume one. Wiley, 1977.

[5] David J. Griffiths. Introduction to Quantum Mechanics. Addison-Wesley Professional, 2004.

[6] Gordon. Em: Z. f. Physik, vol. 40, p. 117 (1926).

[7] David Tong. Quantum Field Theory. Cambridge University, 2007.

[8] P.A.M Dirac. “The Quantum Theory of the Electron”. Em: The Royal Society (1928).

[9] Martin Leijnse e Karsten Flensberg. “arXiv:1206.1736 [cond-mat.mes-hall]”. Em: Semicond. Sci.

Technol. 27, 124003 (2012) (2012).

[10] C. Nayak S. Das Sarma e S. Tewari. “Phys. Rev. B , 73:220502(R), 2006)”. Em: Physical Review B

(2006).

[11] Liang Fu e C. L. Kane. “Phys. Rev. Lett., 100:096407, 2008.” Em: Physical Review Letters (2008).

[12] Gil Refael Yuval Oreg e Felix von Oppen.“Phys. Rev. Lett., 105:177002, 2010”. Em: Physical Review

Letters (2010).

[13] J. D. Sau R. M. Lutchyn e S. Das Sarma.“Phys. Rev. Lett., 105:077001, 2010”. Em: Physical Review

Letters (2010).

[14] R. S. K. Mong P. Hosur P. Ghaemi e A. Vishwanath. “Phys. Rev. Lett., 107:097001, 2011”. Em:

Physical Review Letters (2011).

[15] A. R. Akhmerov J. Nilsson e C. W. J. Beenakker.“Phys. Rev. Lett., 101:120403, 2008”. Em: Physical

Review Letters (2008).

[16] L. Fu e C. L. Kane. “Phys. Rev. B , 79:161408(R), 2009”. Em: Physical Review B (2008).

[17] J. Linder et al. “Phys. Rev. Lett. , 104:067001, 2010”. Em: Physical Review Letters (2008).

[18] L. Radzihovsky V. Gurarie e A.V. Andreev. “Phys. Rev. Lett., 94:230403, 2005”. Em: Physical

Review Letters (2005).

[19] S. Tewari et al. “Phys. Rev. Lett., 98:010506, 2007”. Em: Physical Review Letters (2007).

[20] J. D. Sau e S. Tewari. “arXiv:1111.5622, 2011”. Em: arXiv (2011).

32

Page 43: Douglas Montes de Souza Montes de Souza.pdf · : (2.1) Esta e a conhecida equa˘cao de Schr odinger e um dos motivos pelo qual ela e interessante se torna claro quando lembramos que

33

[21] S. Gangadharaiah J. Klinovaja e D. Loss.“Phys. Rev. Lett., 108:196804, 2012”. Em: Physical Review

Letters (2012).

[22] R. Egger e K. Flensberg. “Phys. Rev. B , 85:235462, 2012”. Em: Physical Review B (2012).

[23] edX. Topology In Condensed Matter: Tying Quantum Knots. url: https://www.edx.org/course/

topology-condensed-matter-tying-quantum-delftx-topocmx-0.

[24] Arthur Cayley. “On the theory of permutants”. Em: Cambridge and Dublin Mathematical Journal

(1852).

[25] Holm R. e Messner W. “Superconductivity in contacts with interposed barriers”. Em: Phys. Rev.

(1960).