DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

54
Pós -Graduação DIREITO PROCESSUAL PENAL Palavra Digital Sistemas de Investigação preliminar: a atuação inquisitiva e defensiva no inquérito

description

DPP Sistemas de Investigacao Preliminar. Direito Penal

Transcript of DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

Page 1: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

Pós -Graduação

DIREITO PROCESSUAL PENAL

Palavra DigitalSistemas de Investigação preliminar: a atuação inquisitiva e defensiva no inquérito

Page 2: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

2

Palavra DigitalDireito Processual Penal

Disciplina Sistemas de Investigação preliminar:

a atuação inquisitiva e defensiva no inquérito

Coordenação do CursoNestor Távora

AutorDiogo Lemos Aguiar

FICHA TÉCNICA

Equipe de Gestão Editorial Flávia Mello Magrini

Análise de ProcessosJuliana Cristina e Silva Flávia Lopes

Revisão Textual Alexia Galvão Alves Giovana Valente Ferreira Ingrid Favoretto Julio Camillo Luana Mercúrio

DiagramaçãoGerência de Design Educacional

Page 3: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

3

Como citar esse documento:AGUIAR, Diogo Lemos. Direito Processual Penal. Valinhos: Anhanguera Educacional, p. 1-52, 2014. Disponível em: <http://anhanguera.com>. Acesso em: 3 fev. 2014.

Chanceler Ana Maria Costa de Sousa

Reitora Leocádia Aglaé Petry Leme

Pró-Reitor Administrativo Antonio Fonseca de Carvalho

Pró-Reitor de Graduação Eduardo de Oliveira Elias

Pró-Reitor de Extensão Ivo Arcangêlo Vedrúsculo Busato

Pró-Reitora de Pesquisa e PósGraduação Luciana Paes de Andrade

Realização:

Diretoria de Extensão e Pós-Graduação Pedro Regazzo Vanessa Pancioni Claudia Benedetti Mario Nunes Alves

Gerência de Design EducacionalRodolfo PinelliGabriel Araújo

© 2014 Anhanguera Educacional

Proibida a reprodução final ou parcial por qualquer meio de impressão, em forma idêntica, resumida ou modificada em língua portuguesa ou qualquer outro idioma.

Page 4: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

4

Page 5: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

5

Índice ÍNDICE

Tema 01: FUNDAMENTOS DA EXISTÊNCIA DO PROCESSO PENAL 08

Tema 02: ÓRGÃO ENCARREGADO: INVESTIGAÇÃO POLICIAL, JUIZ INSTRUTOR OU PROMOTOR INVESTIGADOR

20

Tema 03: ATOS DO INQUÉRITO POLICIAL 32

Tema 04: DILIGÊNCIAS E CONCLUSÃO DO INQUÉRITO POLICIAL 42

Page 6: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

6

Page 7: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

7

APRESENTAÇÃO DA DISCIPLINABusca-se na presente disciplina uma análise crítica dos fundamentos do processo penal,

com a devida base principiológica, dentro de uma leitura constitucional. Diante dessa sólida

base, é possível adentrar propriamente na investigação preliminar, analisando-se dentro

das nuances procedimentais a figura do juiz inquisidor e do promotor investigador.

É preciso questionar e debater o valor probatório da investigação preliminar, a possível

contaminação do julgador e, ainda, a exclusão física dos autos da investigação como uma

das propostas para um processo penal garantista.

Page 8: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

Aula

8

01

FUNDAMENTOS DA EXISTÊNCIA DO PROCESSO PENAL

Objetivos

Apresentar ao aluno os fundamentos da existência de um processo penal, tomando por

base a leitura processual penal constitucional, com sua profunda carga principiológica, que

alicerça a matéria. Toda esta base é elaborada para sustentar a própria investigação preliminar,

possibilitando a análise crítica do tema.

1. FUNDAMENTOS DA EXISTÊNCIA DO PROCESSO PENAL

Os fundamentos da existência do processo penal passam, necessariamente, pelo estudo

da evolução histórica da pena de prisão, posto que, o processo penal será o instrumento

necessário para aplicá-la.

Até o fim do século XVIII, não existia a atual noção de pena privativa de liberdade como uma

espécie de pena a ser aplicada. A privação da liberdade era utilizada como forma de custodiar

o acusado até que fosse prolatada a sentença, que se exauria com a morte do acusado ou

com as penas corporais e infamantes (BITENCOURT, 1997, p. 14).

Ao longo da Idade Média essa perspectiva não foi alterada, entretanto surge um tipo de sanção

que apresentava características da pena privativa de liberdade, como a prisão Eclesiástica,

também denominada de prisão canônica, que era destinada aos clérigos, utilizada em casos

excepcionais, e se fundava no arrependimento, na capacidade da pena em tornar o indivíduo

melhor e contribuiu para o atual entendimento da referida pena.

Quanto ao tema, ressalta Bitencourt (1997, p. 22) que “recolhiam os infratores em uma ala

dos mosteiros para que, por meio de penitência e oração, se arrependessem do mal causado

e obtivessem a correção ou emenda”.

Page 9: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

9

Aula 01 | Fundamentos da Existência do Processo Penal

As penas corporais e, principalmente, a pena capital continuavam a dominar as sanções

aplicadas. Apesar disso, a criminalidade continuava a crescer, logo se passou a questionar a

efetividade deste tipo de sanção.

A criminalidade aumentava, pois a Europa nos séculos XVI e XVII fora marcada pelo

crescimento da pobreza, a tal ponto que no ano de 1556 os pobres representavam a quarta

parte da sociedade (LOPES JÚNIOR, 2013, p. 30).

Tendo em vista tais circunstâncias, bem como o crescimento do capitalismo, a Europa, na

segunda metade do Século XVII, inicia um processo de mudança quanto a pena privativa de

liberdade, que passa a se basear no trabalho e na disciplina rígida para corrigir o condenado

e, principalmente, para aproveitar sua mão de obra (LOPES JÚNIOR, 2013, p. 42).

No século XVIII, surge definitivamente a pena privativa de liberdade, que se tornar uma das

principais penas no século XIX, substituindo, gradativamente, as penas corporais.

Ademais, inicialmente a pena era privada, tendo em vista a autotutela, cuja qual fora afastada

quando o Estado tomou para si o poder punitivo, tornando a pena pública. Dessa forma, a fim

de garantir e proteger direitos dos cidadãos, bem como afastar decisões arbitrárias do Estado,

cria-se um conjunto de regras para que seja possível a aplicação de uma pena ao infrator da

norma, surgindo assim, o processo penal, que representa o meio, sendo a pena o fim.

O processo penal deverá ser fundado, interpretado e aplicado segundo as normas

constitucionais, visando maximizar e assegurar os direitos fundamentais.

Nestes termos, dispõe Lopes Júnior (2013, p. 46), que:

Somente a partir da consciência de que a Constituição deve efetivamente cons-tituir (logo, consciência de que ela constitui a ação), é que se pode compreender que o fundamento legitimante da existência do processo penal democrático se dá através da sua instrumentalidade constitucional. Significa dizer que o proces-so penal contemporâneo somente se legitima à medida que se democratizar e for devidamente constituído a partir da Constituição.

A atualidade apresenta uma inversão de valores, de forma que, a liberdade precisa ser

justificada e fundamentada, tornando-a cada vez mais provisória e a pretensão punitiva

isentada de tal necessidade, apresentando a custódia como regra.

Page 10: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

10

Além disso, é possível destacar uma crise da teoria

das fontes, na qual uma lei ordinária, ou de outro

escalão, é capaz de sobrepor e negar normas

constitucionais.

O processo penal deve ser interpretado à luz

da constituição, seguindo os seus elementos

garantistas e democráticos eleitos.

1.1 Princípio da Necessidade

Ao afastar a possibilidade autotutela, o Estado

tomou para si o poder punitivo e, por consequência,

o direito e o dever de proteger a sociedade e o réu,

solucionando de forma satisfatória e legal os conflitos que surgem na sociedade.

Justamente por isto, declara a Constituição Federal, artigo 5º, inciso XXXV, que “a lei não

excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de lesão a direito”.

Ao infligir um tipo penal, avoca-se a tutela jurisdicional a fim de compor o conflito, protegendo

o bem jurídico eleito. Assim, o Estado vale-se, necessariamente, do processo penal, que por

meio de um terceiro imparcial estabelecido constitucionalmente, apurará a existência do delito

e, conforme as provas apresentadas aplicará uma sanção (LOPES JÚNIOR, 2013, p. 55).

Desse modo, não existe delito, nem a possibilidade de aplicação de pena, sem o devido

processo penal, conforme o brocado em latim nulla poena et nulla culpa sine judicio. O

processo é o caminho necessário para legitimação do poder punitivo.

1.2. Separação da Teoria Geral do Processo

O processo penal sempre teve grande influência do processo civil. Alguns autores buscaram adaptar o processo civil ao processo penal. Entretanto, cumpre destacar a singularidade e especificação da matéria, posto que possui seus próprios institutos.

Aula 01 | Fundamentos da Existência do Processo Penal

LinkA privação da liberdade é o último recurso a ser adotado pelo Estado, conforme o princípio da ultima ratio. Entretanto, percebe-se a preferência pela aplicação de medidas cautelares segregam o indivíduo, em face das medidas cautelares alternativas, assim como a aplicação da pena privativa de liberdade, em face das penas restritivas de direito. Fonte:<http://www.conjur.com.br/2014-jan-11/leonardo-yarochewsky-prisoes-temporarias-transformaram-regra>

Page 11: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

11

Enquanto no processo civil prevalece a liberdade e a igualdade entre as partes, no processo penal o mesmo não ocorre, posto que existe um poder instituído pelo Estado para averiguação da existência de um delito e sua autoria, bem como a punição do respectivo autor (SANTOS, 2008, p. 655). Além disso, o processo penal lida com a possibilidade de restrição da liberdade do acusado, enquanto que o processo civil com a propriedade etc.

2. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO PROCESSO PENAL

A existência de um processo penal legítimo necessita de uma leitura e interpretação

constitucional de seus institutos, a fim de assegurar e maximizar garantias e direitos

constitucionais dispostos. Para nortear essa instrumentalidade constitucional, o processo

penal se valerá, também, dos princípios constitucionais.

Os princípios constitucionais orientam todo o sistema de normas, permitindo a interpretação,

conhecimento, integração e aplicação do direito positivo (SILVA, 2012, p. 85). Para Norberto

Bobbio, os princípios possuem eficácia de norma, posto que são extraídos de um procedimento

de generalização sucessiva. Logo, se extraio o princípio geral de uma norma, outra coisa não

será, senão também norma. Além disso, possuem a mesma função desta, pois são utilizadas

para regular uma determinada situação (TOURINHO FILHO, 2012, p. 77).

2.1 A JURISDICIONALIDADE

O Brasil constitui-se em um Estado Democrático de Direito, no qual assegura garantias

fundamentais da pessoa humana, entre elas a garantia de que todo cidadão terá direito a um

julgamento imparcial e justo.

O princípio da jurisdicionalidade corresponde a uma importante diretriz para à administração

da justiça. Assegura às partes um juiz imparcial, independente, direcionado a maximizar os

direitos e garantias fundamentais e cuja competência fora fixada por lei anterior à ocorrência

Aula 01 | Fundamentos da Existência do Processo Penal

Saiba MaisUm dos primeiro e principais críticos da Teoria Geral do Processo, que visa “unificar” processo civil com processo penal, foi o professor Rogério Lauria Tucci, por isso é importante a leitura do seu livro “Direitos e Garantias Individuais no Processo Penal Brasileiro” para fins de aprofundamento.

Page 12: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

12

do fato criminoso. Assim, corresponde ao direito das

partes em ter ciência antecipadamente do juiz ou

tribunal que julgará o processo (TOURINHO FILHO,

2012, p. 77).

O supracitado princípio foi recepcionado em duas

vertentes. A primeira disposta no artigo 5º, inciso

XXXVII, da Constituição Federal, que veda a criação

de tribunal de exceção ou da escolha parcial de

determinados juízes para o julgamento de um processo.

A segunda acepção encontra-se no artigo 5ª, inciso LIII, que “ninguém será processado nem

sentenciado senão pela autoridade competente”. Apesar de a jurisdição ser una e indivisível,

a fim de otimizar administração da justiça, foi estabelecido por lei uma ordem taxativa de

competência, que definirá a competência do juiz em conhecer determinado processo

(FERNANDES, 2002, p. 127).

2.2 Princípio Acusatório

Por meio de uma interpretação constitucional, depreende-se que fora adotado para o processo penal o sistema acusatório. Isso porque, em um Estado Democrático de Direito, exalta-se a valorização do homem e a dignidade da pessoa humana, fato que não condiz com um sistema inquisitório, mas sim acusatório (LOPES JÚNIOR, 2013, p. 165).

No mesmo sentido, foram estabelecidas regras constitucionais que permitem delimitar a opção pelo sistema acusatório, quais sejam, titularidade exclusiva da ação penal pública por porte do Ministério Público (art. 129, inc. I), devido processo legal (art. 5ª, LVII) exigência de publicidade e fundamentação das decisões judiciais (art. 93, IX), contraditório e ampla defesa (art. 5º, inc. LVII) e a presunção de inocência (art. 5º, inc. LVII) (LOPES JÚNIOR, 2013, p. 165).

Em posicionamento contrário, o professor Guilherme de Souza Nucci, dispõe que adotamos o sistema misto, pois em uma análise exclusivamente constitucional, poderia firmar a adoção do sistema acusatório. Entretanto, ao analisar o Código de Processo Penal de 1941, percebe-se que fora desenvolvido por um ideal inquisitivo. Desse modo, não seria possível negar a

Aula 01 | Planejamento e Gestão de Vendas

Saiba MaisO princípio do Juiz Natural tem origem no Direito anglo-saxão e está intimamente relacionado ao princípio da legalidade, posto que a competência do Juiz ou Tribunal deverá ter sido fixada antes do fato criminoso. Um exemplo internacional que infringiu o referido princípio foi o Tribunal de Nuremberg.

Page 13: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

13

existência dos dois sistemas, que resultou no sistema misto. Por fim, assevera a prática atual dos magistrados de produzir provas de ofício, decretar prisão do acusado de ofício, sem que nenhuma parte tenha requerido e cita os artigos 155 e 156 do Código de Processo Penal,

redação introduzida pela lei 11.690/08 (NUCCI, 2012, p. 117-119).

Por fim, o sistema acusatório caracteriza-se pela separação das funções processuais de acusar,

defender e julgar, estando em cada polo partes distintas. A iniciativa da produção de provas é

ônus exclusivo da acusação e da defesa, principalmente daquele. O juiz apresenta-se como

um espectador que formará sua convicção através das provas produzidas exclusivamente

pelas partes, a fim de manter sua imparcialidade. Além disso, o processo é pautado nos

princípios do contraditório e ampla defesa, oralidade e publicidade (LIMA, 2013, p. 4-5).

2.3 Princípio da Presunção de Inocência

O princípio do estado de inocência foi concebido pela Declaração de Direito do Homem e

do Cidadão, de 1789, promulgada em 1793, na qual previa, em seu artigo 9º, que “todo

homem é considerado inocente, até o momento em que, reconhecido como culpado, se

julgar indispensável sua prisão, todo rigor desnecessário, empregado para efetuá-la, deve

ser severamente reprimido pela lei”.

Antes de o referido princípio ser proclamado, vigorava na Idade Média, o entendimento de

que o processo penal tinha como função confirmar o que os julgadores preconcebiam, ou

seja, o processo penal era um instrumento que buscava confirmar a culpa do acusado, que

era estabelecida antes do início da persecução criminal. Além disso, a dúvida ocasionada

pela insuficiência de provas equivalia a uma “semiprova”, que bastava para considerar uma

“semiculpabilidade” e “semicondenação” a uma pena leve. Nesse sentido, não reconheciam

direitos ao acusado, sendo este, portanto, apenas um objeto do processo (LOPES JÚNIOR,

2013, p. 166).

O princípio da presunção de inocência foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988,

na qual dispõe em seu artigo 5º, inciso LVII, que, “ninguém será considerado culpado até o

trânsito em julgado da sentença penal condenatória”.

Aula 01 | Planejamento e Gestão de Vendas

Page 14: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

14

Justifica-se a existência do supracitado princípio,

na medida em que, as pessoas nascem inocentes,

sendo este o seu estado natural. Logo, a única forma

de afastar a presunção de inocência seria através

da apresentação de provas concretas pelo órgão

acusador, o qual detém todo ônus de provar a culpa do

acusado (NUCCI, 2012, p. 81). Ademais, apresenta-

se como um mecanismo de garantia contra eventual

decisão arbitrária do Estado.

O princípio da presunção de inocência estabelece

duas regras de tratamento em relação ao acusado. A primeira dispõe, que, acusado deve

ser considerado inocente, afastando prisões cautelares abusivas e sem fundamentação,

respeitando, assim, seu direito fundamental de liberdade. A segunda estabelece que incumbirá

à Acusação o ônus de comprovar a culpa do acusado, para o qual bastará à dúvida para

absolvição, nos termos do princípio in dubio pro reo (OLIVEIRA, 2013, p. 48).

2.4 Princípio do Contraditório

O princípio do contraditório está disposto no artigo 5º, inciso LV da Constituição Federal,

além dos Tratados e Convenções Internacionais, tais como, no de Direito Civis e Políticos de

1966 e na Convenção Americana de Direitos Humanos de 1969 (Pacto de São José da Costa

Rica).

Atualmente, tem a finalidade de assegurar duas regras processuais, o direito à informação

e o direito de participação efetiva do processo. O direito à informação está fundamentado

no princípio da publicidade e exige que o acusado seja cientificado sobre todo o trâmite do

processo, a fim de permitir a defesa técnica deste (AVENA, 2012, p. 36).

Quanto ao direito de participação, é necessário que seja oportunizado ao acusado o direito de

contraditar as alegações suscitadas pelo Estado-acusação, de modo a garantir um equilíbrio

entre a pretensão punitiva do Estado e o direito de liberdade do acusado.

Aula 01 | Planejamento e Gestão de Vendas

LinkQuanto ao princípio da presunção de inocência, o professor da USP em Direito Penal expõe, em seu artigo “Deixem em paz o princípio da presunção de inocência”, as origens e a repercussão do princípio no direito brasileiro. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2013-jan-08/direito-defesa-deixem-paz--principio-presuncao-inocencia>.

Page 15: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

15

Assim, Fernandes (2012, p. 79) dispõe que a efetividade do contraditório se dará quando

for proporcionado ao réu meios hábeis que tenham condições reais de contra argumentar o

disposto pela acusação.

2.5 Princípio da Ampla Defesa

O direito da ampla defesa é um direito fundamental, irrenunciável e inalienável de todo

acusado, no qual, encontra-se ligado ao devido processo legal, de modo que sua inobservância

acarretará a nulidade absoluta do processo, pois se trata de um requisito de validade do

processo.

Assim como o princípio do contraditório, o princípio da ampla defesa encontra-se disposto no artigo 5º, inciso LV da Constituição Federal, no qual, assegura o direito de ampla defesa aos litigantes em processo judicial e administrativo.

O princípio da ampla defesa compreende-se no direito a autodefesa e a defesa técnica. A autodefesa é aquela realizada pelo próprio acusado perante o juiz em audiência de instrução e julgamento. Tal tipo de defesa deverá ser sempre ofertada ao acusado em momento oportuno disposto em lei. Entretanto, poderá o acusado renunciar o referido direito, conforme sua conveniência e oportunidade. Essa situação decorre do direito do réu ser ouvido pelo juiz da causa. Tal direito encontra-se consubstanciado no artigo 8º, 1, do Pacto de São José da Costa Rica (MARQUES, 2009, p. 68).

Outrossim, a defesa técnica é aquela realizada por quem exerce a profissão de advogado, o qual é indispensável à administração da justiça, conforme a Constituição Federal, devendo estar devidamente registrado no quadro geral da Ordem dos Advogado do Brasil (OAB), sendo o supramencionado direito irrenunciável por tratar-se de interesse de ordem pública, no qual visa garantir o devido processo legal.

Consagrando a inafastabilidade do direito a defesa técnica ao réu, o artigo 261 do Código de Processo Penal, firma que, “nenhum acusado, ainda que ausente ou foragido, será processado ou julgado sem defensor”.

Aula 01 | Planejamento e Gestão de Vendas

Saiba MaisConstitucionalmente, o princípio da ampla defesa fora disposto pela primeira vez na Constituição de 1946. Segundo TUCCI, ela implica três realidades procedimentais, quais sejam, o direito à informação, a bilateralidade da audiência e o direito à prova legitimamente obtida ou produzida (TUCCI, 2011, p. 149). Além disso, diferença de tratamento posto à defesa justifica-se, pois o acusado responde um processo, não configurando um desequilíbrio.

Page 16: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

16

Ademais, a defesa técnica deve ser plena, e não meramente formal. Logo, a mera constituição

de advogado ou nomeação de advogado dativo para a defesa do réu não garante que o

princípio da ampla defesa fora contemplado no processo.

2.6 Motivação das Decisões Judiciais

O princípio da motivação das decisões judiciais está previsto no artigo 93, inciso IX, da

Constituição Federal, assim como no artigo 381, inciso III do Código de Processo Penal, e

permite um controle quanto à valoração da prova e a capacidade desta em afastar o princípio

da presunção de inocência. Assim, a fundamentação de uma decisão é necessária para o

controle de racionalidade da decisão judicial (LOPES JÚNIOR, 2013, p. 179).

A função do Magistrado é apreciar livremente os fatos apresentados, a fim de formar sua

convicção e aplicar o direito vigente. Essa liberdade de convencimento encontra seu limite na

justificação, na fundamentação de decisão, que para tanto deverá ser precisa, lógica e clara.

Desse modo, o professor Tucci (2011, p. 119), enumera as funções da motivação dos atos

decisórios, expondo que:

a) no plano subjetivo, evidenciar ao órgão jurisdicional (...), a ratio scripta que legitima o ato decisório, cujo teor se encontrava em sua intuição; b) objetivamen-te, persuadir as partes, especialmente aquela desfavorecida pelo ato decisório (...).; c) no campo da hierarquia funcional, no exercício da jurisdição, permitir o controle crítico do decidido (...), dos limites objetivos do julgado, e propiciada ao órgão recursal rigorosa análise (...); d) servir para o aprimoramento da aplicação do direito, e, reflexivamente, para o aperfeiçoamento das instituições jurídicas e da orientação jurisprudência.

Atualmente, a leitura do exposto princípio é realizada de forma mais abrangente. Antes era

entendido que serviria apenas para as partes tomarem conhecimento da convicção do Juiz e

para o controle do Tribunal Recursal. Essa perspectiva endoprocessual não comporta mais.

Assim, a fundamentação das decisões permite, além do exposto, o controle da ordem polícia

e da própria jurisdição pela sociedade (FERNANDES, 2012, p. 119).

Todo ato judicial decisório, por exemplo, sentença ou decisão interlocutória, deverá ser

fundamentado, posto que isto ofereça a legitimidade da decisão, sob pena de nulidade.

Page 17: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

17

3. INVESTIGAÇÃO PRELIMINAR

Ao tomar e regulamentar o poder punitivo, o Estado assumiu o dever de apurar eventuais

crimes, punindo seus agentes quando comprovada a sua prática, a fim de promover

e reestabelecer a paz social. Para tanto, a persecução penal divide-se em duas fases: a

investigação preliminar (inquérito policial) e a instrução processual.

O inquérito policial é um procedimento administrativo que tem a finalidade de colher elementos

de autoria e materialidade de um suposto crime, visando formar a convicção do órgão

acusador. Isso ocorre, pois, tendo o Estado o poder punitivo, lhe compete angariar elementos

probatórios para valer o referido direito/poder. Essa atividade é desenvolvida, em regra, pela

Polícia Judiciária, também denominada de Polícia Civil (artigo 144, CF), não estando afastada

a competência de autoridades administrativas designas por lei para tal função (art. 4º §ú,

CPP) (NESTOR, 2013, p. 98).

Concluída a colheita de provas (o inquérito policial), este será entregue ao Ministério Público,

que, uma vez convencido da existência de eventual crime, levará o fato ao conhecimento do

Juiz através do oferecimento da denúncia.

Oferecida denúncia juntamente com as provas obtidas, o juiz decidirá quanto à continuidade

da persecução penal, ou seja, será analisada a existência de elementos que justifiquem a

formação ou não do processo.

Apesar de prescindível, uma vez que o Ministério Público pode formar sua convicção a partir

de outros elementos informativos (art. 46 §1ª, CPP), trata-se de importante fase que confere

racionalidade e justificativas concretas para a persecução penal (LOPES JÚNIOR, 2013, p. 197).

3.1 Caracteres: Instrumentalidade e Autonomia

Tendo em vista a distinção dos atos praticados no inquérito policial e no processo, bem como

a natureza dos sujeitos (não existem partes no inquérito policial) e ao objeto (notícia-crime e

não pretensão acusatória), diz-se que é autônomo (LOPES JÚNIOR , 2013, p. 199).

Page 18: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

18

Essa autonomia é visível a partir da possibilidade de um inquérito policial não gerar um

processo penal, sendo meramente arquivado, bem como pela possibilidade do processo

penal se iniciar sem o inquérito policial, mas sim através de outros elementos informativos.

Quanto à instrumentalidade, cabe ressaltar que o inquérito policial é um instrumento a serviço

do processo, que visa investigar e obter provas quanto à autoria e materialidade de um crime,

para justificar a formação daquele, garantindo o funcionamento e a eficácia da Justiça.

3.2 Fundamentos da Existência da Investigação Preliminar

O processo penal é um instrumento necessário para análise de uma infração penal e

para aplicação de uma pena, cujo qual necessita de uma leitura pautada nos princípios

e normas adotados pela Constituição Federal, a fim de cumprir sua função de maximizar

direitos e garantias constitucionais. Sendo inquérito policial o instrumento do processo penal

(instrumento do instrumento-processo) deverá seguir as mesmas diretrizes (LOPES JÚNIOR,

2013, p. 200).

Um dos objetivos do inquérito penal é afastar qualquer persecução penal que não tenha

elementos justificantes, tendo em vista que o processo, por si só, gera uma “pena” em relação

ao acusado, logo deve ser visto com um obstáculo a ser superado para, então, seguir a

persecução em juízo.

Desse modo, é possível concluir que a investigação preliminar tem a função de obter e

assegurar elementos probatórios da existência do fato criminoso, evitar que um inocente seja

processado indevidamente, bem como oferecer uma resposta à sociedade quanto ao crime

praticado.

Page 19: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

19

Referências

AFONSO DA SILVA, José. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros Editores, 2012.

AVENA, Norberto. Processo penal esquematizado. 4ª ed. São Paulo: Editora Método, 2012.

BITENCOURT, Cesar Roberto. Falência da pena de prisão. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993.

BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. São Paulo: Editora Edipro, 2014.

CIRINO DOS SANTOS, Juarez. Direito penal: parte geral. 3ª ed. Curitiba: Lumens Juris, 2008.

FERNANDES, Antônio Carlos. Processo penal constitucional. 3ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002.

FERNANDES, Antônio Scarance. Processo penal constitucional. 7ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012.

LIMA, Renato Brasileiro de. Curso de processo penal. Rio de Janeiro: Editora Impetus, 2013.

LOPES JÚNIOR, Aury. Direito processual penal. 10ª ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2013.

MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. 3ª ed. São Paulo: Editora Millenium, 2009.

NESTOR, Távora; ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Curso de direito processual penal. 8ª ed. Salvador: Editora JusPodivm, 2013.

NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 6ª ed. rev. ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012.

OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. Curso de processo penal. 17ª ed. ver e ampl. São Paulo: Editora Atlas, 2013.

TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. 34ª ed. rev. e ampl. São Paulo: Editora Saraiva, 2012. vol. 1.

TUCCI, Rogério Lauria. Direitos e garantias individuais no processo penal brasileiro. 4ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.

Page 20: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

Aula

20

02

ÓRGÃO ENCARREGADO: INVESTIGAÇÃO POLICIAL, JUIZ INTRUTOR OU PROMOTOR INVESTIGADOR

Objetivos

Apresentar ao aluno após a competente introdução das bases do direito processual penal,

a análise do órgão encarregado pela investigação, com as figuras da própria investigação

policial, do juiz instrutor, ou ainda do promotor investigador.

Dentro do tema, não se pode evitar a discussão sobre a possibilidade do Ministério Público

realizar a investigação criminal, trazendo a análise para o plano constitucional.

Fundamental também é a compreensão do objeto e grau de cognição da referida investigação

preliminar, dando lastro para concatenar o desencadeamento lógico do procedimento.

1. ÓRGÃO ENCARREGADO: INVESTIGAÇÃO POLICIAL, JUIZ INSTRU-TOR OU PROMOTOR INVESTIGADOR

Como disposto anteriormente, a investigação preliminar é de competência do Estado, a fim

de buscar provas da autoria e materialidade do fato delituoso para que seja possível exercer

seu poder punitivo.

Existem algumas formas de realizar essa investigação, que são adotadas conforme o modelo

de política interna de cada Estado. Assim, existe o modelo de investigação presidida e

realizada pela Polícia Judiciária, pelo Ministério Público ou por um Juiz Instrutor. Nesta aula,

será analisada cada forma, apostando suas vantagens e desvantagens.

Page 21: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

21

1.1 Investigação Preliminar Policial

Neste modelo, a Polícia é responsável por realizar e presidir a investigação preliminar. Trata-

se do modelo adotado pelo Brasil, conforme artigo 144 §1º, inciso IV da Constituição Federal.

Esse sistema permite um dinamismo na apuração dos fatos delituoso, principalmente nos

Estados que apresentem grande extensão territorial, posto que a polícia se faz presente em

todos os locais. Esse foi o argumento utilizado para a manutenção da polícia judiciária na

investigação preliminar, conforme Exposição de Motivos do Código de Processo Penal.

Além disso, a polícia está mais próxima do povo, o que permite uma atuação mais célere,

apresentando-se, inclusive, como um sistema mais barato do que se fosse utilizado Juiz ou

Promotor para desempenhar tal função (LOPES JÚNIOR, 2013, p. 206).

Suas desvantagens são o alto grau de discricionariedade na apuração ou não de um

determinado fato, a eficácia ou rigorismo variável conforme o escalão social do investigado,

possibilidade de sofrer manobras políticas em face do Pode Executivo, bem como está mais

vulnerável a pressões midiáticas (LOPES JÚNIOR, 2013, p. 207).

1.2 Investigação Preliminar Judicial – Juiz Instrutor

A busca de provas quanto à autoria e a materialidade são presididas e realizadas por um Juiz,

sendo que este procedimento valerá como a instrução propriamente dita (TOURINHO FILHO,

2012, p. 328). Em relação ao Juiz Instrutor, é reconhecida a presunção de parcialidade, motivo

pelo qual está impossibilidade de realizar o julgamento, fato exclusivo de outro Juiz.

Esse sistema apresenta algumas vantagens, quais sejam: a) a investigação não sofrerá

manobras políticas do Poder Executivo, tendo em vista a independência do Poder Judiciário;

b) confere credibilidade aos elementos probatórios colhidos; c) sendo um órgão imparcial, as

provas obtidas servirão tanto à acusação, quanto para defesa; d) em virtude do reconhecimento

da presunção de parcialidade do Juiz Instrutor, este não será competente para julgar a

demanda.

Aula 02 | Órgão Encarregado: Investigação Policial, Juiz Instrutor ou Promotor Investigador

Page 22: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

22

Aula 02 | Órgão Encarregado: Investigação Policial, Juiz Instrutor ou Promotor Investigador

Entretanto, quanto aos pontos negativos esses são

explícitos e contrários ao ordenamento pátrio, posto

que se trata de um procedimento que apresenta

a figura do Juiz Inquisidor. Assim, ao determinar a

realização de um procedimento investigatório, ele

mesmo decidirá sobre a legalidade e necessidade do

ato. Em virtude da coleta pessoal de provas, torna a

relação processual desequilibrada e representa uma

contradição o Juiz Inquisidor realizar provas para a

Acusação de forma independente, apresentando uma

confusão entre o polo acusador e julgador.

1.3 Investigação Preliminar a Cargo do Mi-nistério Público: Promotor Investigador

Atualmente, discute-se a possibilidade de o responsável pela propositura da ação penal (atividade-fim) realize e presida as investigações (atividade-meio), posto que a investigações preliminares servirão, justamente, para formar a convicção da Acusação.

Alguns países europeus, por exemplo, Alemanha e Itália, adotam este modelo de investigação preliminar. A reforma processual na Alemanha ocorreu em 1974 e tinha como finalidade fornecer meios ao Ministério Público para tornar eficaz o combate ao terrorismo. Seguindo a mesma ideia, a Itália pós-guerra visava com esse modelo combater a corrupção dos órgãos públicos, a máfia e o crime organizado (LOPES JÚNIOR, 2013, p. 210).

Neste modelo exposto, o Ministério Público terá a incumbência de presidir a investigação preliminar, que buscará os elementos de prova pessoalmente e/ou por meio da Polícia Judiciária.

Este sistema ressalta o sistema acusatório, posto que manterá o juiz afastado das investigações, garantindo a imparcialidade deste. Além disso, aumenta a credibilidade das investigações e possibilita uma formação melhor da convicção do Ministério Público, afinal quem investigará será o mesmo que oferecerá a Ação Penal.

Saiba MaisA possibilidade do Magistrado atuar na investigação preliminar, não como garantidor de direito e garantias fundamentais, mas como verdadeiro órgão investigador, tem sido amplamente rechaçada pela doutrina e tribunais. Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal, Habeas Corpus nº 115.015/SP, Rel. Min. Teori Zavascki, “Sendo o ato de indiciamento de atribuição exclusiva da autoridade policial, não existe fundamento jurídico que autorize o magistrado, após receber a denúncia, requisitar ao Delegado de Polícia o indiciamento de determinada pessoa. (...) incompatível com o sistema acusatório (...). Ordem concedida.”

Page 23: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

23

Aula 02 | Órgão Encarregado: Investigação Policial, Juiz Instrutor ou Promotor Investigador

Apesar das vantagens descritas, ressalta-se que ao invés de um Juiz Inquisidor será

estabelecido um Promotor Inquisidor, cuja imparcialidade é contestável na obtenção de provas,

pois sua função natural é acusar o imputado. É perceptível que o Ministério Público estará

inclinado na obtenção de provas em desfavor do acusado, não tendo utilidade a investigação

preliminar para a defesa. Por fim, seria necessária a independência do Ministério Público em

relação ao Poder Executivo a fim de evitar manobras e influências políticas (LOPES JÚNIOR,

2013, p. 211).

1.3.1 Quanto à Possibilidade de o Ministério Público Realizar Investigação Criminal à Luz da Constituição Federal

Atualmente, o presente tema tem sido amplamente discutido, tendo em vista sua capacidade de comportar diversas visões e fundamentações. Neste sentido, será apresentado o posicionamento favorável e o contrário a possibilidade do Ministério Público realizar e presidir as investigações. Comecemos pelos argumentos contrários.

A Constituição Federal em seu artigo 144, “caput”, §1º inciso II e §4º, estabelece a competência da Polícia Judiciária – Polícia Federal e Polícia Civil – para apuração de infrações penais.

O artigo 129 da Constituição Federal expõe as funções do Ministério Público, expondo no inciso I a sua competência privativa de propor as ações penais públicas. Quanto à possibilidade de presidir o inquérito policial, nada foi exposto, demonstrando a sua incompetência para tanto, expôs no inciso III sua competência para promover, apenas, o “inquérito civil”.

Ainda, o inciso VII prevê a competência de controlar externamente a atividade policial, podendo, conforme o inciso VIII, requisitar diligências investigatórias, bem como a instauração de inquérito policial.

Tais incisos não autorizam a condução da investigação preliminar, não permite a produção, sozinho, de elementos probatórios, mas concede a possibilidade de controlar da investigação e requisitar diligências que servirão para a formação da convicção do Promotor de Justiça. Logo, requisitar diligência não significar realizar.

Page 24: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

24

Dissertando sobre o tema, Nucci (2012, p. 147) expõe, que:

O sistema processual penal foi elaborado para apresentar-se equilibrado e har-mônico, não devendo existir qualquer instituição superpoderosa. Note-se que, quando a polícia judiciária elabora e conduz a investigação criminal é supervisio-nada pelo Ministério Publico e pelo juiz de Direito. Este, ao conduzir a instrução criminal, tem a supervisão das partes - Ministério Público e advogados. Logo, a permitir-se que o Ministério Público, por mais bem intencionado que esteja, produza de per si investigação criminal, isolado de qualquer fiscalização, sem a participação do indiciado, que nem ouvido precisaria ser, significaria quebrar a harmônica e garantista investigação de uma infração penal.

A fase preliminar do processo é um importante momento para obtenção de provas, seja em favor da defesa ou da acusação. Admitir o Ministério Público a competência de presidir o inquérito policial é estabelecer uma via de sentido único, um procedimento que buscará provas para condenação, tendo em vista sua possível parcialidade por ocupar, por excelência, a posição de órgão acusador.

A presença de diferentes órgãos ao longo da persecução penal, atuando cada um em seu tempo e nos termos da lei, permite a presença de um sistema de fiscalização, que permitirá a obtenção da imparcialidade e da justiça.

Neste sentido, Grecco Filho (2012, p. 113) expõe, que:

Da autonomia, independência e responsabilidade de cada uma é que pode ra-zoavelmente resultar uma Justiça humana aceitável. Daí nossa posição radical no sentido de que não cabe ao Ministério Público querer substituir-se à função investigatória do Delegado de Polícia, porque isso comprometeria a dignidade e importância garantista da formação isenta da opinio delicti que em nada é incom-patível com a atitude dialética acusatória. Da dialética, do respeito às atribuições e da autonomia das funções é que se pode alcançar algo de justiça em face da imparcialidade do juiz.

Em parecer proferido perante a 2ª Turma do Tribunal Regional Federal, o professor Juarez Tavares, firmou, que:

Primeiro cumpre-nos salientar que a ação penal desfechada contra o paciente, lastreada em inquérito penal realizado pelo próprio órgão do Ministério Publico, constitui, realmente, fato inusitado e estranho, em face da falta de atribuição do Parquet quanto ao colhimento de provas com a finalidade de instaurar ação penal, uma vez que cabe ao mesmo, tão somente, realizar inquéritos civis, con-forme reza a nossa Carta Magna, em seu art. 129, quando dispõe a respeito das funções institucionais do Ministério Publico. (Habeas Corpus nº 1.137)

Aula 02 | Órgão Encarregado: Investigação Policial, Juiz Instrutor ou Promotor Investigador

Page 25: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

25

Ademais, Tourinho Filho (2012, p. 340) traz informações quanto à discussão desta possibilidade do Ministério Público avocar a investigação criminal durante a Assembleia Constituinte, destacando que todas as emendas foram rejeitadas, mantendo apenas a competência tradicional deste de propor ação pena pública.

Não há fundamentos para invocar a teoria dos poderes implícitos para justificar a possibilidade do Ministério Público presidir o inquérito policial. Essa teoria conclui, simplificadamente, que, “quem pode o mais pode o menos”, entretanto somente seria cabível se não existisse dispositivo conferindo tal competência para algum órgão. Então, se a Constituição atribui à Polícia Judiciária a competência de investigar fatos ilícitos, não seria possível utilizar a teoria, pois a competência fora exposta de forma explícita, sem necessidade de utilizá-la (TOURINHO FILHO, 2012, p. 343).

Em posicionamento favorável ao órgão do Ministério Público, encontram-se os professores Eugenio Pacelli, Nestor Tavares, Renato Brasileiro e Norberto Avena. Vejamos as justificativas.

Inicialmente, cumpre destacar que não se busca a presidência do inquérito policial, mas sim a possibilidade do responsável pela ação penal em colher pessoalmente as provas (TÁVORA, 2013, p. 101).

O sistema acusatório não será atingindo com o procedimento proposto, posto que a investigação preliminar servirá apenas para formar a convicção da Acusação, que decidirá quanto ao oferecimento ou não da denúncia, devendo as provas obtidas serem realizadas em juízo sob o crivo do contraditório e da ampla defesa (LIMA, 2013, p. 145).

Além disso, destaca-se a “Teoria dos Poderes Implícitos”, cuja qual considera, que, se a Constituição concedeu uma atividade-fim a determinado órgão público, automaticamente ela concedeu os meios necessários para efetivação daquele objetivo (AVENA, 2012, p. 227).

Destaca-se, também, a diferença exposta na Constituição Federal quanto “polícia investigativa” e “polícia judiciária”. A primeira dispõe quanto à prática de investigar a autoria e materialidade de um determinado crime. A segunda está relacionada ao cumprimento das ordens firmadas pelo Poder Judiciário, por exemplo, mandado de prisão.1

Antes a supracitada distinção, é possível destacar do texto constitucional, que, apenas a função de Polícia Judiciária fora conferida com exclusividade à Polícia Federal e à Polícia Civil. Logo, as atribuições investigativas poderiam ser desenvolvidas pessoalmente pelo Promotor

1 STJ. Resp. 332.172/ES. 6ª Turma. Relator Ministro Hamilton Carvalhido.

Aula 02 | Órgão Encarregado: Investigação Policial, Juiz Instrutor ou Promotor Investigador

Page 26: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

26

de Justiça, nos termos do artigo 4º, parágrafo único, “a competência definida neste artigo não excluirá a de autoridade administrativa, a quem por lei seja cometida a mesma função”.

Por fim, a Lei Complementar nº 75/93, nos artigo 7º e 8º, enumera outras atribuições do Ministério Público da União, entre elas a possibilidade de instaurar inquérito policial, podendo acompanha-lo e apresentar provas.

Quanto ao posicionamento jurisprudencial favorável:

Contudo, ainda que se tratasse da temática dos poderes investigatórios do Mi-nistério Público, melhor sorte não assistiria ao recorrente. A denúncia pode ser fundamentada em peças de informação obtidas pelo órgão do MPF sem a neces-sidade do prévio inquérito policial, como já previa o Código de Processo Penal. Não há óbice a que o Ministério Público requisite esclarecimentos ou diligencie diretamente a obtenção da prova de modo a formar seu convencimento a respei-to de determinado fato, aperfeiçoando a persecução penal, mormente em casos graves, como o presente, que envolvem altas somas em dinheiro movimentadas em contas bancarias” (STF. RE 535478, Rel. Min. Ellen Gracie, 2ª Turma, DJ de 21.11.2008).

A outorga constitucional de funções de polícia judiciária à instituição policial não impede nem exclui a possibilidade de o Ministério Público, que é o “domínus litís”, determinar a abertura de inquéritos policiais, requisitar esclarecimentos e diligências investigatórias, estar presente e acompanhar, junto a órgãos e agen-tes policiais, quaisquer atos de investigação penal, mesmo aqueles sob regime de sigilo, sem prejuízo de outras medidas que lhe pareçam indispensáveis à formação da sua “opinio delicti”, sendo-lhe vedado, no entanto, assumir a presi-dência do inquérito policial, que traduz atribuição privativa da autoridade policial. (STF - Segunda Turma - HC 94173 - ReI. Min. Celso de Mello DJe 27/11/2009)

HABEAS CORPUS. TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL. INVESTIGAÇÃO CRI-MINAL REALIZADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. EXCEPCIONALIDADE DO CASO. POSSIBILIDADE. GRAVAÇÃO CLANDESTINA (GRAVAÇÃO DE CON-VERSA TELEFÔNICA POR UM INTERLOCUTOR SEM O CONHECIMENTO DO OUTRO). LICITUDE DA PROVA. PRECEDENTES. ORDEM DENEGADA. O tema comporta e reclama disciplina legal, para que a ação do Estado não resulte prejudicada e não prejudique a defesa dos direitos fundamentais. A atu-ação deve ser subsidiária e em hipóteses específicas. No caso concreto, restou configurada situação excepcional a justificar a atuação do MP: crime de tráfico de influência praticado por vereador. (STF. Habeas Corpus nº 91.613/MG. Rel. Min. Gilmar Mendes. DJe 15/05/2012)

Atualmente, existem processos que estão em julgamento do Supremo Tribunal Federal que discutem a presente temática, que são os Habeas Corpus nº 839933/SP, nº 84548/SP e nº 83643/SP.

Aula 02 | Órgão Encarregado: Investigação Policial, Juiz Instrutor ou Promotor Investigador

Page 27: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

27

2. OBJETO E GRAU DE COGNIÇÃO

O objeto do inquérito policial são os fatos narrados na notícia-crime ou aqueles apurados em investigação de órgãos administrativos competentes por lei para a investigação.

Tendo em vista o caráter instrumental e preparatório do inquérito policial em relação ao processo penal, bem como sua finalidade de angariar provas da autoria e materialidade do fato para a formação da convicção do órgão acusador, servindo como um filtro para evitar que inocentes sofram a “pena” do processo em si, o seu grau de conhecimento será sumário.

Isso significa, segundo Lopes (2013, p. 212), que:

A summaria cognitio significa uma limitação na atividade instrutória, que deve responder a uma inda-gine limitata o superficiale. O nível de conhecimento é limitado, pois se busca um juízo de verossimi-lhança e não de certeza. Posterior-mente, no processo, a cognição será plena, suprindo as limitações da atividade anterior.

Assim, as provas obtidas no curso da investigação deverão ser realizadas novamente na fase instrutória do processo, pois neste a produção passará pelo crivo do contraditório e da ampla defesa.

Outra classificação, mas que não se adequa ao nosso sistema, é a Cognição Plena, que torna a investigação preliminar em fase de instrução do processo, pois é neste momento que se esgota toda produção de prova, sem a presença do princípio do contraditório e da ampla defesa.

LinkO professor Luiz Flávio Gomes comenta o assunto, expondo seu posicionamento contrário à possibilidade do Ministério Público presidir o Inquérito Policial.Disponível em: <http://institutoavantebrasil.com.br/poder-de-investigacao-do-mp-do-radi-calismo-ao-abismo/>.

LinkQuestão interessante é quanto à possibilidade de instaurar inquérito policial através de denúncia anônima. O superior Tribunal de Justiça entendeu pela impossibilidade, entretanto, não impede que a informação obtida seja averiguada pela Polícia. Encontrando indícios de autoria e materialidade do crime instaura-se o inquérito. O jurista Luiz Flávio Gomes comenta o assunto.Disponível em: <http://institutoavantebrasil.com.br/denuncia-anonima-investigacao-pos-terior-precaria-ausencia-de-elementos-mini-mos-impossibilidade-de-abertura-de-inqueri-to-policial/>.

Aula 02 | Órgão Encarregado: Investigação Policial, Juiz Instrutor ou Promotor Investigador

Page 28: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

28

3. PRAZO PARA O TÉRMINO DA INVESTIGAÇÃO PRELIMINAR

Segundo o artigo 10º do Código de Processo Penal, o inquérito policial deverá ser finalizado no prazo de dez dias, se o indiciado tiver sido preso em flagrante delito, ou se estiver preso preventivamente. O temo inicial do prazo é o dia da efetivação da ordem de prisão.

Entretanto, encontrando-se o réu em liberdade, mediante fiança ou sem ela, o prazo para o término será de 30 (trinta) dias.

Nos termo do artigo 10º §3º do supracitado diploma, será possível a prorrogação do prazo desde que o fato apresentado seja de alta complexidade e o indiciado esteja solto.

A legislação especial dispõe prazos distintos para conclusão da investigação preliminar. A lei 5.010/66 que regulamenta a Justiça Federal de primeira instância dispõe que para a conclusão para réu preso será de 15 dias, podendo ser prorrogado por igual período, desde que fundamentado. Quanto ao réu solto, a lei não dispõe qualquer regra, devendo, então, ser aplicado o prazo de 30 (trinta) dias do artigo 10º do Código de Processo Penal.

O Código de Processo Penal Militar estabelece que o inquérito policial deverá ser encerrado no prazo de 20 dias para o réu preso, ou no prazo de 40 dias para réu solto. Este último prazo poderá ser prorrogado por igual período pela autoridade militar superior.

Ainda quanto às leis especiais, a Lei de Drogas 11.343/06, dispõe que o inquérito deverá ser findado em 90 dias para o réu solto e 30 dias para o réu preso, podendo ambos os prazos serem prorrogados por igual período, por meio de pedido devidamente fundamentado.

A inobservância do prazo para réu solto tem sido considerada imprópria, não ocasionando grandes consequências.

O não cumprimento do prazo para o término do inquérito policial para réu preso, com atraso de poucos dias também não tem ocasionado consequências. Entretanto, conforme a complexidade e o tempo dispensado para tanto, fugindo de um prazo razoável, deverá o indiciado ser posto em liberdade, posto que a prisão torna-se ilegal.2

2 HABEAS CORPUS. Falsidade Ideológica e Uso do Documento Falso Alega constrangimento ilegal em face do inde-ferimento da liberdade provisória e também excesso de prazo na formação da culpa Reconhecimento do Excesso de Prazo Paciente preso em flagrante aos 19/07/2012, aguardando-se sua citação Paciente preso há mais de seis meses sem data prevista para o início da instrução processual. O princípio da razoabilidade não pode ser invocado para justificar

Aula 02 | Órgão Encarregado: Investigação Policial, Juiz Instrutor ou Promotor Investigador

Page 29: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

29

A limitação do prazo para a conclusão da investigação preliminar é de extrema relevância, posto que exige um procedimento célere e eficaz, evitando que se prolonguem por muito tempo, sob pena de relaxamento da prisão por excesso de prazo.

4. INVESTIGAÇÃO PRELIMINAR E EXTINÇÃO DE PUNIBILIDADE

Antes da vigência da Lei nº 11.719/08, previa o artigo 61 do Código de Processo Penal que, sendo caso de prescrição levando em consideração a pena abstrata prevista para o tipo penal ou qualquer outra causa de extinção da punibilidade, deveria o Ministério Público requerer o reconhecimento judicial de tal causa, especificando os fatos para efeitos de coisa julgada.

O referido artigo fora revogado, sendo apresentadas modificações aos artigos 396 e 397 do supracitado diploma. Assim, segundo estes artigos, para o reconhecimento da extinção da punibilidade, seria necessário o oferecimento da denúncia, em seguida a apresentação de defesa para, então, nos termos do artigo 397, inciso IV ser reconhecida a causa de extinção da punibilidade.

Ora, na lei anterior, existira apenas um inquérito arquivado e, atualmente, um processo cuja decisão fora pela absolvição sumária. Por óbvio, a formação de um processo apresenta-se mais gravoso. Assim, tendo em vista esta lesão, a imagem do acusado e da burocracia exposta, o professor Eugênio Pacelli propõe que o Ministério Público, ante uma situação de extinção de punibilidade, deverá requerer o arquivamento do inquérito policial ou das peças de informação, fundamentando tal pedido. Entretanto, tendo oferecido denúncia, a solução será a que fora exposta no parágrafo anterior (OLIVEIRA, 2013, p. 78).

Outrossim, insta salientar que, sendo causa de extinção de punibilidade ou até mesmo de fato atípico, a investigação policial é abusiva, sendo constrangimento reputado ilegal, motivo pelo qual será possível o trancamento do inquérito policial por meio da impetração de Habeas Corpus.

a evidente ineficiência do Estado. Ordem concedida, com observação. (Habeas Corpus nº 0214659-16.2012.8.26.0000.

TJSP 12ª Câmara de Direito Criminal).

Aula 02 | Órgão Encarregado: Investigação Policial, Juiz Instrutor ou Promotor Investigador

Page 30: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

Referências

30

AVENA, Norberto. Processo penal esquematizado. 4ª ed. São Paulo: Editora Método, 2012.

GRECCO FILHO, Vicente. Manual de processo penal. 9ª ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2012.

LIMA, Renato Brasileiro de. Curso de processo penal. Rio de Janeiro: Editora Impetus, 2013.

LOPES JÚNIOR, Aury. Direito processual penal. 10ª ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2013.

NESTOR, Távora; ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Curso de direito processual penal. 8ª ed. Salvador: Editora JusPodivm, 2013.

NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 6ª ed. rev. ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012.

OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. Curso de processo penal. 17ª ed. ver e ampl. São Paulo: Editora Atlas, 2013.

TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. 34ª ed. rev. e ampl. São Paulo: Editora Saraiva, 2012. vol. 1.

Page 31: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

31

Page 32: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

Aula

32

03

Atos do Inquérito Policial

Objetivos

Apresentar ao aluno um panorama atualizado e crítico dos principais procedimentos

pertinentes às diligencias do inquérito policial. A análise de cada passo envolvendo o

procedimento inquisitivo e suas consequências que perduram até o momento da ação penal,

no momento da realização da prova com origem na fase inquisitiva através dos indícios.

Atos de iniciação do Inquérito Policial

1. Notitia Criminis

Trata-se do conhecimento pela autoridade policial da prática de fato delitivo. Há formas distintas para a ocorrência da notícia do crime:

- Modo direto ou cognição imediata: a autoridade policial tem conhecimento do crime ocorrido por meio das atividades rotineiras do plantão policial, através das investigações em andamento.

- Modo indireto ou cognição mediata: ocorre a provocação da atividade policial pela vítima, através de requerimento, representação do membro do Ministério Público e requisição da autoridade judiciária.

Alguns doutrinadores, como Fernando da Costa Tourinho Filho creditam um terceiro modo de notitia criminis: a cognição coercitiva através da prisão em flagrante do suposto autor do delito.

Assim que tiver conhecimento do crime praticado, deve o delegado de polícia ir ao local dos fatos para verificar a natureza, gravidade, envolvidos, circunstâncias para preservação da cena e, posteriormente conforme situação concreta, instauração de inquérito policial e diligências pertinentes.

Saiba MaisEm caso de crime eleitoral, a notitia criminis, conforme artigo 6º da Resolução n.22.376 do TSE, será apresentada ao juiz eleitoral para, posteriormente, ser encaminhada ao Ministério Público Eleitoral ou à Autoridade Policial competente.

Page 33: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

33

Neste primeiro contato da autoridade policial com o local do crime, na prática, temos a problemática relacionada à precariedade de mão de obra e material da polícia em muitas comarcas de nosso país, unido ao alto índice de comunicações de crimes nos locais com

maiores índices de violência.

2. Início do Inquérito Policial

Para maior entendimento do ato de instauração do inquérito policial, é necessário realizar

um breve exame das espécies de ação penal, quanto à legitimidade para agir, presentes em

nosso ordenamento jurídico pátrio: Ação pública e privada.

A ação pública destaca o interesse e monopólio do Estado em assegurar a manutenção da

ordem jurídica através do seu poder de investigar, julgar e punir o infrator. Com isso, ocorre

divisão da ação pública em:

- Ação Publica Incondicionada: de iniciativa do Ministério Público, como titular da presente

ação. Via de regra, é a ação a ser utilizada quando o texto legal nada indicar a respeito da

espécie de ação penal para aplicação. Na instauração do inquérito policial, o delegado, de

ofício, iniciará o procedimento administrativo por meio da portaria, conforme artigo 5º, inciso

I do CPP.

- Ação Publica Condicionada: nesta situação, o Ministério Público precisa de autorização

prévia do ofendido ou representante legal para oferecimento da denúncia. Logo, no presente

caso do inquérito policial, a instauração somente é realizada mediante representação do

ofendido representante legal, podendo também através de requisição do Ministro da Justiça,

previsto no artigo 5º, inciso II do CPP.

Na ação Privada, o ofendido ou seu representante legal, conforme os crimes previstos,

requerem a instauração da ação. Nesse caso, a instauração de inquérito policial é realizada

pela vítima, ofendida ou seu representante legal através de requerimento, conforme CPP, §

2º do artigo 5º.

Conforme o disposto no artigo 100 do CP, a ação penal é pública, salvo disposição expressa

da lei que estabeleça, conforme o delito praticado, pública incondicional ou privada. Logo,

Aula 03 | Atos do Inquérito Policial

Page 34: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

34

percebemos que o legislador utilizou o critério de legitimidade ativa para propositura da ação

penal a ser utilizado para estabelecer o modo de início do inquérito policial no artigo 5º do

CPP.

2.2 Atos Praticados

O artigo 6º do CPP trata de como a autoridade policial deve proceder quando o conhecimento

da notitia criminis, ou seja, as diligências e investigações necessárias para apuração da

infração.

O inciso I do 6º do CPP preceitua “Dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem

o estado e conservação das coisas, até a chegada dos peritos criminais.” Aqui é visado para

a preservação do local do crime para fiel e clara análise dos vestígios ali encontrados e,

futuramente, analisados pela equipe técnica, a perícia.

Em crimes que deixam vestígios, materiais, é de extrema importância e imprescindível para

elucidação dos fatos a preservação de toda a cena do delito, pois uma alteração, por menor

que seja, pode comprometer toda a investigação de modo a faltar ou chegar a uma conclusão

errônea.

Atualmente, a problemática da nossa polícia judiciária é a escassez de recursos humanos

ou na sua precária qualificação para realização de uma ótima investigação, além da falta

de equipamentos e tecnologia atualizada para análise e estudo pela perícia, prejudicando

ou dificultando as investigações, tornando inquéritos policiais infinitos e, em muitos casos,

prejudicando a obtenção de provas.

No inciso II do artigo 6º do CPP, temos “apreender os objetos que tiverem relação com

o fato, após liberados pelos peritos criminais.” Trata-se dos utensílios ou objetos presentes

no ambiente do crime e, conforme os acontecimentos e natureza do delito, devendo ocorrer

apreendidos para perícia para utilização como prova.

A busca e apreensão, neste caso, tem como efeito a busca da verdade real nos autos,

conforme artigo 240 e seguintes do CPP. A busca pode ser realizada antes ou durante a

instauração do inquérito policial, no momento que a autoridade policial toma conhecimento do

Aula 03 | Atos do Inquérito Policial

Page 35: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

35

delito, com o intuito da expedição de mandado judicial de busca e apreensão para fortalecer

ou preservar o conjunto probatório existente.

Busca e apreensão, por mais que sejam utilizados sempre juntos, tem natureza diversa.

A busca é o procedimento estatal, através da investigação, que objetiva a descoberta em

pessoas ou objetos de indícios que formem meio de prova na esfera processual penal. Já a

apreensão é uma medida cautelar de característica probatória, visando preservar direitos e

provas interessantes a busca da verdade real.

Tais medidas, geralmente, invadem a esfera intima do individuo, seja em seu ambiente

domiciliar ou laboral. Por isso, acaba esbarrando em garantias individuais do cidadão:

inviolabilidade do domicílio; dignidade da pessoa humana e incolumidade física e moral do

indivíduo. É sempre necessária a observância das garantias constitucionais insculpidas no

artigo 5º, incisos X e XI da Constituição Federal, que são cláusulas pétreas e essenciais à

segurança individual e jurídica do Estado Democrático de Direito.

Para que a busca e apreensão sejam feitas de modo a assegurar todas as garantias de direitos

e deveres, a observância aos preceitos legais, atendendo aos requisitos formais previstos no

artigo 243 do CPP. Por se tratar de medida que atenta contra as garantias constitucionais do

cidadão, a utilização deve ser restritiva e como modo imperativo para obtenção da prova.

Sendo assim, trata-se de exceção.

No caso da busca domiciliar, devem ser preenchidos, cabalmente, os requisitos do artigo 243,

245 e 246 do CPP, com devida motivação e finalidade da diligência constante no mandado

expedido pela autoridade judiciária competente.

Na busca pessoal, artigo 240, § 2º do CPP, não é necessário ordem judicial para sua realização

e pode ser também realizada no curso da busca domiciliar. Basta ocorrer fundada suspeita,

espécie de desconfiança de certo individuo. Caso, o agente estatal aja além ou desconforme

a lei e suas atribuições administrativas para a revista, incorrerá em infração funcional e de

abuso de autoridade.

Além do local do crime e da colheita de objetos pertinentes ao fato que ali estejam, o inciso III

do artigo 6º do CPP trata de modo amplo de outros modos de prova, abrangendo a de natureza

Aula 03 | Atos do Inquérito Policial

Page 36: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

36

testemunhal, bem como na obtenção de documentos

a empresas prestadoras de serviços: telefonias,

instituições financeiras para, respectivamente, quebra

de sigilo telefônico e bancário.

Chega o momento da autoridade policial ouvir a vítima e o indiciado, conforme disposto nos inciso IV e V do artigo 6º do CPP. O ofendido é a pessoa afetada pelo crime praticado e essencial para a elucidação dos acontecimentos e autoria. Mas, sempre deve ser considerada a oitiva do ofendido como meio de prova e, por isso, não deve ter caráter absoluto na sua análise, devendo ser relacionada e com análise aos demais elementos do conjunto probatório, uma vez que a vítima não é imparcial e tem uma mistura de razão e sentimentos provocados pelo medo e impressões. Para tanto, a oitiva do ofendido deve ser realizada de modo condizente ao disposto no artigo 201 do CPP.

Indiciamento é o ato do Estado, mediante indícios verificados no curso do inquérito policial, em atribuir ao indivíduo determinado a autoria, inicialmente, de uma determinada prática delitiva. Logo, o indiciado passa a ser o objeto de análise e corroboração das provas para a conclusão da autoria e circunstancias do crime. O ato de indiciar gera inúmeras divergências em nosso ordenamento jurídico pátrio.

Muitas vezes, a análise do conjunto probatório que enseja o indiciamento é realizado de modo subjetivo e despreparado pela autoridade policial, gerando um juízo de valor questionável, ainda mais que a lei não exige que a autoridade policial justifique os motivos pelo indiciamento. Talvez, se houvesse uma alteração legal tornando exigível tal justificativa para indiciamento, teríamos a diminuição de procedimentos administrativos, como o ato de indiciar, injustos e desnecessários, seria um controle para maior atenção e observância das garantias individuais constitucionais.

Saiba MaisA Lei 12.850/2013, que trata da Organização Criminosa, determinou em seu artigo 15 “O delegado de polícia e o Ministério Público terão acesso, independentemente de autorização judicial, apenas aos dados cadastrais do investigado que informem exclusivamente a qualificação pessoal, a filiação e o endereço mantidos pela Justiça Eleitoral, empresas telefônicas, instituições financeiras, provedores de internet e administradoras de cartão de crédito.”

Devida a complexidade e alto grau de agilidade na atuação das organizações criminosas, com o intuito de facilitar a obtenção de provas de modo rápido e seguro para atuação estatal contra a força e poder dessas organizações, que cada vez mais crescem e assombram o Brasil, o legislador afastou o procedimento de análise e expedição de mandado pelo judiciário para acesso da autoridade policial a tais informações. Lembrando que o rol é taxativo.

Aula 03 | Atos do Inquérito Policial

Page 37: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

37

Igualmente, a questão da obrigatoriedade do interrogatório e da condução coercitiva do indiciado, principalmente quando ele utilizar o direito ao silêncio o que para muitas autoridades policiais é considerada negativa, falta de colaboração com as investigações e mais um “indício” de culpa.

Na oitiva do indiciado, a presença do advogado é

facultativa, deve ser reduzida a termo e assinada por

duas pessoas e assegurado ao indiciado o direito de

manter-se em silêncio.

Os incisos VI e VII do artigo 6º do CPP estão

relacionados ao reconhecimento de coisas, pessoas,

acareações, exame de corpo de delito e demais

periciais pertinentes. São meios de prova para

analisar e concluir a veracidade dos fatos alegados

pelas partes no processo.

No inciso VI, o reconhecimento de pessoas, coisas e

acareação deve seguir, cabalmente, os procedimentos elencados nos artigos 226 a 230 do

mesmo diploma processual legal. O reconhecimento de pessoas e coisas é ato formal onde

um indivíduo afirma, com convicção, a identidade de uma pessoa ou as características de

uma coisa.

O grande problema no reconhecimento de pessoas, conforme bem colocado por Lopes Junior

(2006), é a questão da indução: “O reconhecimento pessoal é um meio de prova bastante

sensível à indução e aos falsos reconhecimentos, devendo por isso ser realizado com suma

prudência e cautela e valorado pelo juiz com reservas, em conjunto com as demais provas,

nunca com valor decisivo ou única prova para legitimar a sentença condenatória”.

O reconhecimento pessoal deve ser avaliado não de modo único e inquestionável, mas sempre

baseando e interagindo com os demais meios de prova presentes nos autos. Igualmente, é

necessário refletir acerca do nosso sistema de produção e valoração de provas brasileiro,

Saiba MaisNo tocante, a condução coercitiva do indiciado para interrogatório, pertinente é a análise de Távora e Alencar (2013, p. 121):

Sem embargo, certo é que a condução coercitiva do indiciado é medida de duvidosa constitucionalidade, mercê da previsão da garantia fundamental ao silêncio, que torna sem propósito a condução daquele que não deseja participar do interrogatório, acrescido do fato de que este, de acordo com os termos da Lei nº 10.792/2003, passou a ostentar prevalentemente caráter de meio de defesa, não se justificando a condução coercitiva, ainda que autorizada pelo juiz.

Aula 03 | Atos do Inquérito Policial

Page 38: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

38

quando lidamos, muitas vezes, com a morosidade no andamento dos inquéritos e processos

em virtude da falta de pessoas especializadas, alto índice de autos gerados por inúmeros

boletins de ocorrência e, posteriormente, processos e, por fim, a falta de integração entre as

polícias estaduais do âmbito das provas. Todos esses fatores, aliados ao tempo e mudanças

físicas do ofendido e da memória da testemunha, podem contribuir para fragilidade de tal

meio de prova ao gerar dúvida e incerteza.

O valor do reconhecimento no contexto probatório em fase inquisitiva de inquérito policial,

sempre é analisada com desconfiança e certo cuidado uma vez que não se tem o crivo do

contraditório, é apenas um procedimento administrativo e de natureza provisória: dependendo

do contexto e tempo da prática delitiva e todo o rito de processamento do feito entre inquérito

policial e ação penal, pode haver alteração substancial de tal prova.

O inciso VIII, do artigo em comento, chama a atenção especialmente para a identificação

criminal do indiciado, assunto de grande polêmica devido à perícia, o exame de corpo de

delito ser realizado tanto na vítima quanto no indiciado, a intervenção corporal.

A intervenção corporal é tratada na lei nº 12.654, de 2012, que trata do perfil genético como

identificação corporal. Tal lei é muito debatida, haja vista que cria um embate a garantias

individuais: direito ao silêncio e de que ninguém é obrigado a produzir prova contra si próprio.

Mas, ao estabelecer a obrigatoriedade na coleta de informações biológicas, conforme o crime

de vestígios praticado, muitos indagam que isso não seria uma afronta às garantias individuais

supramencionadas.

Para tal medida coercitiva, é necessário demonstrar a imprescindibilidade da medida para

investigação e autorização judicial devidamente fundamentada para justificar tal invasão a

esfera íntima do indiciado. A grande dificuldade é o caráter subjetivo de análise dos fatos

concretos para tal medida, de início, constrangedora a ser utilizada. O receio é o abuso

de autoridade, uma vez que o direito ao silêncio abrange a preservação da sua identidade

física, por mais que na fase de inquérito policial tenhamos o marco do inquisitório, o indiciado

continua passível de direitos como todo cidadão.

O inciso VIII, do artigo 6º do CPP, trata da identificação do indiciado por exame datiloscópico

por meio da colheita da impressão digital e comparação com o armazenado com o banco de

Aula 03 | Atos do Inquérito Policial

Page 39: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

39

dados da Secretaria de Segurança Pública de cada estado da federação. Tal matéria, sempre

foi motivo para grandes discussões doutrinarias e jurisprudencial.

No passado, pela Súmula 568, o STF adotou o seguinte entendimento: “a identificação

criminal não constitui constrangimento ilegal, ainda que o indiciado já tenha sido identificado

civilmente”. Mas, com o advento da nova e atual Carta Magna brasileira, em seu artigo 5º,

inciso LVIII, foi estabelecido que “o civilmente identificado não será submetido a identificação

criminal, salvo nas hipóteses previstas em lei”. Tal modificação trazida pela Constituição

Federal tem relação com o período de transição política a época da sua elaboração, de

um país sob o regime da ditadura militar a ainda recém-conquistada democracia. Logo, a

Constituição Federal tornou a identificação criminal apenas utilizada em certos casos a serem

relacionados por lei complementar, sendo a exceção.

A primeira regulamentação foi através da Lei nº 10.054/2000, em que em seu artigo 3º elencou

o rol de crimes passíveis de identificação criminal obrigatória. A grande maioria da doutrina

sempre criticou a forma como legislador estabeleceu os crimes passíveis da identificação

criminal, pela escolha ter sido realizada sob o critério da natureza e gravidade do delito,

mesmo com a identificação civil do indiciado ou acusado.

Posteriormente, a Lei nº 12.037 de 2009 acabou com qualquer rol de delitos passíveis de

identificação criminal, determinando em seu artigo 3º as situações ocorridas, durante as

investigações, que possam ter a identificação criminal para individualização do indiciado.

Averiguação da vida pregressa do agente é tratada no inciso IX do artigo 6º do CPP, juntamente

com a folha de antecedentes, é um modo de analisar a conduta social, familiar e de caráter do

agente. Tem relação e utilidade no momento da dosimetria e aplicação da pena, no momento

da sentença.

2.3 Reprodução simulada dos fatos (Reconstituição)

É a famosa reconstituição, para verificar de modo mais preciso e técnico todos os momentos

da execução do crime. O indiciado não é obrigado a produzir prova contra si mesmo, logo

também não está compelido a participar da constituição do delito, vendo que também é um

meio de prova a colher informações para o inquérito.

Aula 03 | Atos do Inquérito Policial

Page 40: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

40

3.Valor Probatório do Inquérito Policial.

O inquérito policial é um procedimento que visa buscar

indícios de autoria e materialidade para justificar a

propositura da ação penal. Assim, ele não deve ter, em

princípio, força probatória para condenar ou absolver

o réu, ao passo que as provas, que partiram de tais

indícios, são produzidas sob o prisma do processo

penal com o seu aprofundamento e certeza devida.

Assim, temos o pensamento de Jacinto Coutinho:

“ao inquisidor cabe o mister de acusar e julgar,

transformando-se o imputado em mero objeto de

verificação, razão pela qual a noção de parte não tem sentido” (COUTINHO, 2001, p. 23).

O inquérito policial segue o modelo inquisidor, visto que não falamos em contraditório e ampla

defesa por tratar-se de um modo administrativo, mesmo o averiguado ou indiciado sofrer

constrangimentos e demais inferências em sua esfera privada, física e psíquica atropelando

garantias fundamentais. Logo, é chegado o momento de compreender e levantar um espírito

crítico a respeito da eficiência ou não do atual modelo para obtenção de indícios através

do inquérito policial e do quanto, o concluído pela autoridade policial e a forma como é

desenvolvida na instrução criminal para obtenção da prova propriamente dita.

Tais pontos supramencionados serão objeto de maior detalhamento no material da aula

seguinte.

Saiba Mais Existem alguns doutrinadores, como Fernando Capez, que analisando o artigo 260 do CPP, acreditam que mesmo negando a participar da reconstituição, o indiciado tem o dever de comparecimento ao local, mesmo de modo coercitivo. Porém, prevalece em grande parte da doutrina e do STF o entendimento de que se trata de um mal desnecessário e que pode gerar constrangimento ilegal ao indiciado.

Aula 03 | Atos do Inquérito Policial

Page 41: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

41

Referências

BADARÓ, Gustavo Henrique Regi Ivahy. Direito processual penal. Tomo I. Rio de Janeiro: Elsevier, 2008.

FERRAJOLI, Derecho y Razón. Teoria del Garantismo Penal. 2. ed. Trad. Perfecto Andrés Ibánez; Alfonso Ruiz Miguel; Juan Carlos Bayón Mohino; Juan Terradillos Basoco e Rocio Cantareno Bandrés. Madri, Trotta, 1997

FILHO, Vicente Greco. Manual de Processo Penal. 6. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 1999.

GRINOVER, Ada Pellegrini; FERNANDES, Antonio Scarance; GOMES FILHO, Antonio Magalhães. As nulidades no processo penal. 8.ed. São Paulo: RT, 2004.

COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. O papel do Novo Juiz no Processo Penal. In: Critica à Teoria Geral do Processo Penal. Jacinto Nelson de Miranda Coutinho (coordena-dor). Rio de Janeiro: Renovar, 2001.

LOPES JR., Aury. Introdução critica ao Processo Penal. 4ª. ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2006.

LIMA, Arnaldo Siqueira de. Vícios do inquérito maculam a ação penal. Boletim IBCCRIM. São Paulo, v.7, n.82, p. 10, set. 1999.

NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. 12. ed. São Paulo: RT 2013.

TAVORA, Nestor e ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 8. ed. Salvador: Editora Jus Podivm, 2013.

TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. v. 1, 25ª ed. São Paulo: Saraiva. 2003.

Page 42: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

Aula

42

04

Diligências e Conclusão do Inquérito Policial

Objetivos

Apresentar ao aluno um panorama atualizado e crítico dos principais procedimentos

pertinentes às diligências e conclusão do inquérito policial. O intuito é a análise do sistema

investigatório em vigor e toda a sua problemática que tanto interfere na concretização dos

indícios e, consequentemente, na futura produção de provas na ação penal. O fim precípuo é

identificar as fraquezas do sistema e analisar as melhores propostas para a sua melhoria em

conformidade com as garantias individuais.

Introdução

Mesmo sendo um procedimento inquisitivo, o inquérito policial tem a sua forma definida em

lei para a busca de indícios visando à propositura da ação penal, tal assertiva parece simples

e sem maiores questionamentos num primeiro momento. Mas, se ocorrer um detalhamento

e análise da atual situação prática do inquérito até o processo penal, veremos que ocorrem

certos erros e arbitrariedades que afrontam a garantias individuais e, posteriormente, a

formação probatória em fase processual, tendo como resultado sentença maculada pela falta

de imparcialidade marcada por provas apenas realizadas e consideradas na fase inquisitiva.

Logo, num primeiro momento, é necessário identificar as diferenças entre atos investigativos

e atos de prova com as diferenças e relações com o momento de cada um, inquérito e

processo.

Após, temos o problema da contaminação dos indícios colhidos no inquérito policial com

as provas colhidas na ação penal, o quanto o magistrado pode se confundir e acabar pela

condenação com base em indícios, algo inadmissível em nosso direito pátrio.

Ainda dois pontos que geram polêmica, mas que precisam de solução para a eficácia das

investigações e posteriores provas concretas, segurança jurídica e igualdade entre as partes:

nulidades, contraditório e ampla defesa no inquérito policial.

Page 43: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

43

Aula 04 | Diligências e Conclusão do Inquérito Policial

1. Distinção entre atos de prova e atos de investigação

É imprescindível a diferenciação entre tais atos pertinentes ao inquérito policial e ação penal. Há muita confusão ou simplesmente muitos operadores acabam por achar que são expressões sinônimas.

O ato de investigar trata de uma hipótese a ser considerada dentro de um cenário delitivo analisado, com carga anterior a ação penal com o intuito de formar um pensamento no órgão acusatório na existência de indícios ou não para futura propositura de processo penal.

Já os atos de prova, tem relação com a ação penal em si, buscando certeza, robustez nos fatos apresentados por meio de provas para o convencimento do magistrado, amparado pelos princípios do contraditório e ampla defesa das partes. Aqui não há possibilidades, mas certeza dos argumentos para apresentar e rebater.

Por isso, temos no inquérito policial, genuinamente, o ato de investigar com o trabalho da possibilidade que as investigações apresentam devido à mudança de focos, novas informações e novas provas. Tanto que, dependendo da prova colhida em fase de inquérito, poderá ser repetida ou não durante a instrução criminal.

Vemos a lição de Lopes Júnior (2006, p. 225):

O objetivo é a absoluta originalità do processo penal, de modo que não se atribui à fase pré-processual o poder de aquisição da prova. Somente deve recolher elementos úteis à determinação do fato e da autoria, em grau de probabilidade, para justificar a ação penal. A efetiva coleta da prova está reservada para a fase processual – giudice del dibattimento –, cercada de todas as garantias inerentes ao exercício da jurisdição.

Resumindo ao analisado no presente tópico, segue orientação de Távora e Alencar (2013, p. 112):

Calha por fim destacar que as provas de caráter eminentemente técnico realiza-das na fase do inquérito, a exemplo das perícias, têm sido comumente utilizadas na fase processual como prova de valor similar às colhidas em juízo, sobretudo pela isenção e profissionalismo atribuídos aos peritos. Melhor seria, como já tem sido implementado, porém de forma minoritária, que durante o inquérito fosse permitido ao defensor do indiciado, quando da produção de exames periciais, formular quesitos aos peritos, no intuito da demonstração de fatos relevantes à futura tese defensiva.

Page 44: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

44

2. CONTAMINAÇÃO DO JULGADOR E EXCLUSÃO FÍSICA DOS AUTOS DA INVESTIGAÇÃO

Atualmente, ocorrem muitas situações nas quais o órgão acusador, já na fase da ação penal,

não consegue reproduzir ou desenvolver, durante a instrução, prova vista durante o inquérito

policial.

Com propriedade Lopes Júnior (2006, p. 225) comenta tal situação:

A situação é ainda mais grave porque o inquérito policial integra os autos do pro-cesso (por isso defendemos a exclusão física), contaminando o (in)consciente o julgador com atos de investigação (pois o inquérito não gera atos de prova) colhi-dos no segredo da inquisição. Essa contaminação faz com que o julgador valore na sentença os atos praticados em segredo, seja de forma inconsciente (pois os elementos estão no processo), seja de forma consciente.

Lopes Júnior (2006) propõe como medida a retirada do inquérito policial dos autos da ação penal para que seja atendida a sua função endoprocedimental, ou seja, que o procedimento inquisitivo administrativo tenha apenas a função de justificativa para a instauração do processo e não para convencimento do juiz da instrução.

Com isso, existirão sentenças mais justas e plausíveis, deixando no processo apenas as peças, oriundas do inquérito, que não tenham como serem repetidas e através da antecipação de provas.

Igualmente, tais peças produzidas em fase policial não tem o crivo do contraditório e ampla defesa, princípios presentes na fase instrutória e, consequentemente, apresentando maior segurança quanto a sua veracidade e força probatória, deixando o magistrado mais livre e certo para apreciação.

2.1 Contaminação consciente ou inconsciente do julgador

Ainda que na teoria e aprendido nos bancos universitários trate que os atos do inquérito não podem ser objeto de valoração para basear uma futura condenação, ainda assim existe o risco de contaminação (consciente ou inconsciente) do julgador em valorar provas apenas realizadas em sede de inquérito policial e, com isso, acompanhe a acusação participando dos

autos da ação.

Aula 04 | Diligências e Conclusão do Inquérito Policial

Page 45: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

45

O grande problema de tal prática é condenar o acusado com base em provas exclusivas da

fase de inquérito policial, sem o aprofundamento e confirmação probatório na fase processual.

Assim, é cediço que essa utilização jurídica é realizada de modo descabido e apelativo da

acusação, quando não encontrada no processo prova que garanta a condenação.

A prova judicial é a formalmente válida, produzida no trâmite do processo penal, que deve

ser suficiente para um veredicto certeiro, sem dúvidas. Do contrario, in dubio pro reo, deve-

se imperar a absolvição. Ao não ocorrer a repetição ou aprofundamento na ação penal das

provas realizadas, quando possível, em fase de inquérito policial temos o risco de injustiças

pela precariedade e fragilidade probatória.

Tal situação ocorre devida à vinculação, nos mesmos autos, do inquérito policial e processo,

sob a justificativa em possuir todas as informações e não perder detalhes relevantes desde a

prática delitiva e comunicação à autoridade policial. Mas, como ocorre em nosso atual sistema,

tal procedimento pode contaminar o inconsciente ou consciente do julgador, levando-o a não

exercer a sua atividade em compasso com os ditames constitucionais.

Devido a tal utilização, é constatado que o inquérito sob esse enfoque não é tratado como

um procedimento para obtenção de indícios para a propositura da ação penal, mas como

parte integrante dela e com o mesmo valor de análise e importância probatória, totalmente

violentando preceitos formais da lei.

A solução proposta por alguns doutrinadores, entre eles Aury Lopes Júnior e Ada Pellegrini

Grinover, seria a que determine a exclusão física do inquérito policial dos autos do processo,

impedindo a formação de “confusões cognoscitivas”, orientando acerca do alcance e a

finalidade das provas.

Tal procedimento é utilizado pelo sistema italiano, não incluindo nos futuros autos processuais

as peças da investigação preliminar, exceto documentos que tratem de provas somente

possíveis de realização no exato momento do inquérito policial, ao exemplo do exame de

corpo de delito e das antecipadas.

Neste sentido, o ensinamento de Ferrajoli (1995, p. 103-104), no sentido que a única prova

válida para uma condenação é a:

Aula 04 | Diligências e Conclusão do Inquérito Policial

Page 46: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

46

[...] prueba empirica llevada por una acusación ante un juez imparcial, en um proceso público y contradictorio con Ia defensa y mediante procedimientos legal-mente preestablecidos.

Em suma, a proposta de reforma, alteração é para que os atos de investigação cumpram o

seu papel primordial e único, a investigação com a limitação de força probatória, tratada como

indícios para produção de prova na fase processual. É a denominada função endoprocedimental

dos atos de investigação do inquérito policial, buscando a sua eficácia interna na fase para

fundamentar as decisões interlocutórias nas tomadas do andamento investigatório.

3. Problemática das nulidades cometidas no inquérito policial

Nulidade trata-se de um vício de forma ou modo procedimental que impregna, prejudica

determinado ato processual realizado sem observância aos ditames legais.

A forma é estabelecida em lei, ocorrendo a tipicidade das formas em que atos devem ser

praticados e respeitados conforme o modelo legal. Vemos assim a excelente explanação de

Greco Filho (1999, p. 300) acerca do tema:

O abrandamento advém do princípio da instrumentalidade das formas, que signi-fica que a sua existência não é um fim em si mesmo, mas tem a função de pro-teger algum interesse que deve ser perquirido antes de se decretar a invalidade do ato. Isso não quer dizer, porém, que qualquer ato possa ser substituído ou praticado de maneira diferente, porque a amplitude da instrumentalidade depen-de da natureza da norma sobre a forma [...].

É pacifico em nosso ordenamento jurídico brasileiro, atualmente, a inexistência de nulidades em

fase de inquérito policial. A justificativa é por se tratar de procedimento administrativo, apenas

para fins de colheita de provas para futura ação penal. Ocorrendo alguma irregularidade,

pode o juiz determinar que tal ato realizado em desacordo com a lei, seja refeito.

Nucci (2013, p. 979) defende a inexistência de nulidade no inquérito policial:

[...] os vícios eventualmente ocorridos no inquérito policial não têm o condão de macular o processo, já que o magistrado possui o poder (dever) de determinar o “refazimento” da prova irregularmente produzida na fase policial ou mandar que seja desentranhada dos autos do processo a prova ilicitamente obtida.

Aula 04 | Diligências e Conclusão do Inquérito Policial

Page 47: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

47

Mas, existem alguns doutrinadores, como Aury Lopes Jr. e Eneida Orbage de Britto Taquary,

que militam pela existência das nulidades no inquérito policial. Defendem que as diligências

são parte do processo, sendo parte de valoração pelos magistrados e que o legislador, ao

admitir provas ilícitas no processo de conhecimento, fez modo generalizado, abrangendo a

fase inquisitiva do inquérito policial.

Lima (1999, p. 10) acredita numa interpretação stricto sensu das nulidades em face do

momento inquisitivo:

O constituinte, ao não admitir provas ilícitas no processo, referiu-se a este de forma ‘lato sensu’, incluindo-se aí, portanto, o inquérito, apesar do sistema pro-cessual brasileiro ser acusatório, adotando como prova, ‘stricto sensu’, aquela produzida em juízo.

Nesse contexto, temos a teoria do prejuízo, brilhantemente explicada por Grinover (2004, p. 31-32):

[...] sem ofensa ao sentido teleológico da norma não haverá prejuízo e, por isso, o reconhecimento da nulidade nessa hipótese constituiria consagração de um formalismo exagerado e inútil, que sacrificaria o objetivo maior da atividade ju-risdicional; assim, somente a atipicidade relevante dá lugar à nulidade; daí a conhecida expressão utilizada pela doutrina francesa: ‘pas de nullité sans grief’.

As formas dos atos são as premissas de todo o processo penal, incluindo o inquérito policial.

Existe um modelo a ser respeitado em lei para a prática de determinado ato, isso é para

segurança jurídica com a preservação das garantias constitucionais individuais, para que

ocorra a paridade de tratamento entre os cidadãos conforme cada situação concreta e a

respectiva norma a ser aplicada, afinal vivemos e lutamos por um Estado Democrático de

Direito.

Nesse sentido, coaduna-se o entendimento de Badaró (2008, p. 189):

O ponto mais importante é que, seja nas chamadas nulidades absolutas (insa-náveis), seja nas nulidades relativas (sanáveis), a parte que for prejudicada pela nulidade não precisa demonstrar o prejuízo. Se há um modelo, ou uma forma prevista em lei, que foi desrespeitado, o normal é que tal atipicidade gere preju-ízo, sob pena de se admitir que o legislador estabeleceu uma formalidade abso-lutamente inútil. (...) a eficácia do ato ficará na dependência da demonstração de que a atipicidade não causou prejuízo algum.

Aula 04 | Diligências e Conclusão do Inquérito Policial

Page 48: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

48

Quando tratamos de formalismo legal, é pertinente tratar da natureza instrumental da

investigação preliminar, que serve para reconstruir o fato delitivo com seus agentes e detalhes

da cena. A ideia é a indicação dos elementos que permitam produzir a prova em juízo, conforme

o desenrolar do conjunto probatório na ação. A oitiva de uma testemunha durante o inquérito

pode ser de extrema importância também para ser ouvida na fase processual, uma vez que

levantando informações úteis no inquisitório, poderá produzir a prova concreta no processo.

Quando tratamos da instrumentalidade do processo penal, em especial ao inquérito policial,

vemos com o alcance de provas, para posterior sentença substanciada e justa, a garantia da

eficácia de direitos e garantias fundamentais presentes na Carta Magna.

Nesses termos, a análise Lopes Júnior (2006, p. 11):

É uma especial conotação do caráter instrumental e que só se manifesta no processo penal, pois se trata de instrumentalidade relacionada ao Direito Penal e à pena, mas, principalmente, a um instrumento a serviço da máxima eficácia das garantias constitucionais. Está legitimado enquanto instrumento a serviço do projeto constitucional.

Sob a análise do presente tópico, é necessário mencionar a teoria da inversão de sinais, que trata basicamente de proteger e garantir direitos da parte mais fraca, o réu. É necessário demonstrar o prejuízo pela irregularidade realizada no processo, fica sob a responsabilidade do juiz que concentra os atos de decisão e andamento do feito. Igualmente, cabe também ao magistrado demonstrar que a atipicidade não teve força para impedir o alcance do objetivo.

4. Contraditório e ampla defesa no inquérito policial

Princípios previstos no art. 5º, inciso LV da Constituição Federal, o contraditório e ampla defesa são princípios constitucionais basilares no processo penal.

Ambos os princípios, acabam sendo desdobramentos um do outro, ou seja, o contraditório advém de outro famoso princípio do audiatur et altera pars, em que a parte contraria também deve ser ouvida. Logo, quem é acusado deve ter o direito de se defender dos fatos que lhe são atribuídos de todos os modos previstos em lei, de modo amplo. Tais garantias constitucionais visam, primordialmente, estabelecer igualdade de direitos entre as partes durante os atos dos

procedimentos.

Aula 04 | Diligências e Conclusão do Inquérito Policial

Page 49: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

49

Tais garantias, atualmente, são consideradas e praticadas somente durante a fase processual,

pela interpretação doutrinária e jurisprudencial, majoritariamente, entender que a Constituição

Federal apenas atribuiu a sua aplicação a ação penal. Assim, pelo inquérito policial ser

considerado um procedimento administrativo inquisitivo, apenas para angariar indícios para

oferecimento da denúncia.

O que não se concebe é a permissão do contraditório naquela fase informativa que antecede à instauração do processo criminal, pois não há ali nenhuma acu-sação. Não havendo, não se pode invocar o princípio da par conditio – igualdade de armas. Todos sabemos que não se admite um decreto condenatório respalda-do, exclusivamente, nas provas apuradas na etapa pré-processual. A autoridade Policial não acusa; investiga. E investigação contraditória é um não senso.

Porém, temos outra corrente de doutrinadores, incluindo os professores Aury Lopes Jr. e Ada Pellegrini Grinover, que defendem já na fase inquisitiva das investigações a existência dos princípios em estudo, defendendo que tais garantias constitucionais não devem ser interpretadas de modo limitadoras dos direitos fundamentais do indivíduo, assim como o ato de se defender é inerente ao ser humano, já consta da sua essência, independente da sua cultura. Nesse sentido:

Ora, não é preciso maior capacidade de abstração para verificar que qualquer

noticia-crime que impute um fato aparentemente delitivo a uma pessoa determi-

nada constitui uma imputação, no sentido jurídico de agressão, capaz de gerar

no plano processual uma resistência. Foi isso que o legislador constitucional quis

dizer com “acusados em geral (note-se bem, o texto constitucional não fala sim-

plesmente em “acusados”, o que daria abrigo a uma leitura mais formalista, mas

sim em “acusados em geral”, o que sem dúvida é muito mais amplo e protecio-

nista (LOPES JÚNIOR, 2006, p. 252).

Para constatação da assertiva de Lopes Júnior (2006), basta acompanhar um inquérito policial para verificar que o indiciado ou seu advogado ao acessar aos autos já procura exercitar o contraditório e a ampla defesa, mesmo de modo indireto, ao analisar o material do inquérito procura criar a estratégia para rebater e apresentar a fragilidade de tais indícios, com o intuito

de arquivamento dos autos inquisitivos.

Aula 04 | Diligências e Conclusão do Inquérito Policial

Page 50: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

50

Talvez, se houvesse o reconhecimento de tais princípios, ora aqui abordados, tivéssemos

menos inquéritos e ações desnecessárias, com alto custo para o Estado e, principalmente,

para o indivíduo averiguado que teria seus direitos e

garantias realmente cumpridos conforme os ditames

constitucionais.

4. Conclusão do Inquérito Policial

O fim do inquérito policial ocorre com a elaboração

de uma peça, descritiva, chamada relatório final pelo

delegado de polícia, informando todo o trabalho feito

na presidência do inquérito. A autoridade policial não deve realizar nenhum juízo de valor,

uma vez que o inquérito policial serve para angariar indícios de autoria e materialidade, sendo

o Ministério Público o titular da ação penal quem deve verificar, ao analisar o relatório e

material probatório anexado, a necessidade ou não de novas diligências para a colheita de

novas provas.

Diante da finalização com a elaboração do relatório final, os autos serão encaminhados ao Ministério Público que terá três opções diante do conteúdo apresentado pelo relatório:

a) Satisfeito com as provas colhidas no inquérito policial, oferecer a denúncia.

b) Se entender ao analisar os autos do inquérito policial a necessidade, imprescindível, de novas provas para o oferecimento da denúncia, requerer a continuidade das investigações visando formar sua opinio delicti de modo seguro, conforme artigo 16 do CPP.

c) Requerer o arquivamento do Inquérito Policial.

O arquivamento do inquérito policial somente pode ser pedido pelo Ministério Público, uma vez que é o destinatário das investigações. Ao pedir o arquivamento, pode o magistrado concordar ou não com o Parquet ao verificar a fundamentação do órgão ministerial e as informações contidas nos autos do inquérito policial, uma vez que a ação penal é obrigatória.

Caso o magistrado discorde do promotor de justiça, deve encaminhar os autos ao Procurador Geral de Justiça, nos termos do artigo 28 do CPP, para que possa analisar e dar a solução

definitiva acerca do caso.

Aula 04 | Diligências e Conclusão do Inquérito Policial

Saiba MaisImportante destacar, que o Brasil aderiu à Convenção Americana de Direitos Humanos – CADH (Pacto de San José de Costa Rica), trazendo tais disposições a integrar o art. 5º, § 2º da Constituição Federal.

Page 51: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

51

Aula 04 | Diligências e Conclusão do Inquérito Policial

Pelo inquérito policial tratar de peça meramente informativa, a falta do relatório é considerada

mera irregularidade, não causando qualquer prejuízo à ação penal futuramente instaurada.

Neste sentido, segue a análise de Nucci (2013, p. 112) a respeito da ausência ou sucinto

relatório policial:

Cremos inadequado determinar o retorno dos autos do inquérito à policia judici-ária somente porque o delegado declarou encerrada a investigação sem empre-ender o relatório minucioso a respeito do caso. Prossegue-se, com oficio comu-nicativo à Corregedoria da Polícia, para as providencias cabíveis.

Saiba MaisO Projeto de Lei 4.209 de 2001 (atual PLS 205/2008), que trata da investigação criminal, em seu artigo 10, abole a figura do relatório elaborado pela autoridade policial.

Page 52: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

Referências

52

BADARÓ, Gustavo Henrique Righi Ivahy. Direito processual penal. Tomo I. Rio de Janeiro:

Elsevier, 2008.

FERRAJOLI. Derecho y Razón. Teoria del Garantismo Penal. 2ª ed. Trad. Perfecto Andrés

Ibánez; Alfonso Ruiz Miguel; Juan Carlos Bayón Mohino; Juan Terradillos Basoco e Rocio

Cantareno Bandrés. Madri, Trotta, 1997 FILHO, Vicente Greco. Manual de Processo

Penal. 6ª. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 1999.

GRINOVER, Ada Pellegrini; FERNANDES, Antonio Scarance; GOMES FILHO, Antonio

Magalhães. As nulidades no processo penal. 8.ed. São Paulo: RT, 2004.

LOPES JR., Aury. Introdução critica ao Processo Penal. 4ª. ed. Rio de Janeiro: Editora

Lumen Juris, 2006.

LIMA, Arnaldo Siqueira de. Vícios do inquérito maculam a ação penal. Boletim IBCCRIM.

São Paulo, v.7, n.82, p. 10, set. 1999.

NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. 12ª. ed. São Paulo:

RT 2013.

TAVORA, Nestor e ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 8ª.

ed. Salvador: Editora Jus Podivm, 2013.

TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. v. 1. 25ª ed. São Paulo: Saraiva.

2003.

Page 53: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar

53

Page 54: DPP Sistemas de Investigacao Preliminar