DZ revista de design

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edição 1 - Ano I - R$ 15,00 DE DESIGN REVISTA

description

DZ issue zero. Design magazine project of Sao Paulo Casper Libero University of Journalism, Brazil.

Transcript of DZ revista de design

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edição 1 - Ano I - R$ 15,00

de designRevista

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Pela Equipe DZ

Em pé, da esquerda

para a direita:

Geoffrey, Gabriella e

Samantha; sentadas:

Mariana e Nathália.

Cadeira Vermelha e Azul, de Gerrit Rietveld, 1917. Foto: Divulgação

Expediente

Quem faz

Quer ido Lei tor

Capa

O sabor do novoEdiTOR Geoffrey Scarmelote

SEcRETÁRia dE REdaçãO Gabriella de Lucca

aSSiSTEnTE dE REdaçãOMariana Pasini

REviSãONathália Moraes

cOmERcialSamantha de Tommaso

REpORTagEmGabriella de Lucca, Geoffrey Scarmelote, Mariana Pasini, Nathália Moraes, Samantha de Tommaso

cOnSElhEiRO EdiTORialCarlos Roberto da Costa

EdiTORa dE aRTEFabiana Caruso

cOlabORadORESEduardo Foresti (texto), Rafael de Queiroz, Raquel Faila (fotos)

agRadEcimEnTOS Aliki Ribas, Camila Mamede, Diogo Bercito, Ethel Leon, Helena Jacob, Renato Assada e Ricardo Rosado

cOnTaTO [email protected]

Analisar o rótulo e extrair o conceito. Enumerar novidades. Falar de sentimen-tos. Teletransportar momentos fotográfi-cos. Reunir as informações do mundo do design – editorial, de produto e de moda – pode soar superficial, fácil, pretensioso. Mas não é.

Chegar a esse produto que você, lei-tor, tem agora em mãos, foi um grande exercício – não apenas jornalístico, mas de paciência, jogo de cintura, trabalho em equipe. Deparamo-nos com uma natureza transformadora, como a do design, com a missão de fazê-la transformar. Quere-mos que, a cada página, você reflita e se inspire para o desenvolvimento de seus trabalhos. E, principalmente, enriqueça seu repertório pessoal e profissional.

DZ é uma revista bimestral de design que visa trazer ao mercado brasileiro uma publicação com conteúdo que incite à análise, ligado aos interesses tanto dos

profissionais como dos apreciadores des-sa área. Chegamos com a proposta de esmiuçar processos criativos, materiais, pessoas e ideias por trás de um produto. Viaje conosco pelos passos do moveleiro francês Michel Arnoult. Surpreenda-se, como nós, com a expansão do graffiti. Celebre, sem reservas, os 90 anos da escola de Bauhaus. Participe da história dessa revista e envie seus trabalhos para a seção Portfólio.

Sinta-se à vontade para, durante a lei-tura, explorar sua criatividade. Acredita-mos que a arte e o design devem ser in-centivados. A nossa intenção é oferecer, a cada página, possibilidades de reflexão e inspiração.

Esperamos que, ao final dessa expe-riência, você tenha aprendido, ampliado seus horizontes e, sobretudo, aguarde ansiosamente – como nós – pelo próxi-mo número.

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44Nos passos de Arnoult

O caminho do francês que ensinou o

brasileiro a pensar na produção seriada de

móveis, com elegância e sustentabilidade

O iluminado

Ronnie Lot Sergio, proprietário da ViaLight,

prevê bons tempos para o design mundial e

ganha reforço do designer Karim Rashid

Sempre julgue um livro

pela capa

Nas prateleiras das livrarias, vence o design

mais criativo

Brincadeira de adulto

Feitos pra gente grande, os toy arts exigem

paciência e estilo para serem criados

Cinema em miniatura

O britânico Craig Lyons recria cartazes

de filmes clássicos com peças de Lego

Síndrome de Cinderela

Exclusivos, os sneakers mesclam tênis e

obras de arte

Vamos bater lata

Já incorporado à cultura urbana, o graffiti

ganha novos rumos e públicos

A Avó do Design Moderno

A comemoração dos 90 anos da escola de

Bauhaus, uma das mais influentes do mundo

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Nesta Edição

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44Esparramados no sofá

Você acredita que um móvel possa

aliar design e conforto?

Afiadí

ssimas

Muito de arte, muito de técnica:

é a cutelaria artesanal

Irmãos Coragem

Fernando e Humberto Campana

contam como conquistaram as vitrines

estrangeiras de diversos segmentos

Bonequinha de luxo

A jovem estilista Karin Feller dá

as caras no mundo da moda

A marca Brasil

A produção nacional de joias e bijuterias

desponta lá fora e peita a crise do setor

“Minha vida é uma

montanha-russa”

A paulistana Fabiana Daniel combina

dinamismo e ousadia na vida e no trabalho

De vilão a mocinho

Veja porque a madeira de eucalipto é

um material resistente e versátil

Editorial

Notas

Compras

10 perguntas

sobre

Agenda

Biblioteca

Design BR

Opinião

Seções

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SUMÁRIO

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“Livrar o mundo da caretice, do óbvio e da escala de cinza e estampar um sorriso no rosto das pessoas”: esse é o lema de O Segredo do Vitório (www.osegredodovi-torio.com). A loja on-line está no ar desde novembro de 2008 e é repleta de produtos divertidos e diferentes – a maioria de lojas estrangeiras que não entregam no Brasil, como as norte-americanas Fred & Friends e Kikkerland.

O site foi criado pelo casal curitibano Paulo Stolfo e Flavia Bley, apaixonado por objetos coloridos e com design bem-humorado. A ideia por trás de ser apenas virtual, sem um espaço físico, foi a de atingir o nicho de pessoas acostumado a procurar esses produtos lá fora. “Apenas algumas lojas enviam para o Brasil. Quem dificulta é a Receita Federal, que tributa tudo com 60% do valor do produto mais o frete”, diz Flávia. “Sempre levávamos um susto com o que a Receita cobrava para retirarmos nossas compras nos correios. Pensávamos: ‘deve ter mais alguém neste país que gos-te dessas coisas!’, conta a proprietária do site. Agora, quem é o tal Vitório e qual o seu segredo... ah, isso eles não revelam!

Programado para iniciar suas atividades em agosto, no antigo Cassino da Urca, o Instituto Europeo di Design (IED) está sem data definida para abrir as portas no Rio de Janeiro. Segundo o vereador Eliomar Coelho (PSOL/RJ), não houve licitação para o funcionamento do Instituto, nem estudo de impactos ambientais sobre a área de ins-talação. O tombamento do prédio, cedido ao IED pelo ex-prefeito César Maia em 2007, também dificulta o andamento das obras.

O atual prefeito, Eduardo Paes, cogitou transferir a escola para o armazém 7 do Cais do Porto, mas recuou após reunir-se com os dirigentes do IED. Agora, a prefeitura tenta na Justiça o direito de concluir a reformado Cassino.

produtos Bem-humorados

Impasses atrasam chegada do Ied ao rIo

Criado pelos designers italianos Pasquale Volpe e Tommaso Minnetti, o projeto Good 50 X 70 convida profissionais de todo o mundo a criar cartazes voltados às cau-sas de diversas instituições internacionais, como WWF, Unicef, Anistia Internacional, Greenpeace e Unesco. Neste ano, 210 pôsteres – cujas medidas batizam a empreitada – foram selecionados para o catálogo, vendido no site www.good50x70.org. Os preços variam de 22 a 27 euros e a renda é revertida às agremiações participantes.

desIgn com propósIto

FiquE pOR dEnTRO daS úlTimaS dicaS dE dESign

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Desde setembro no país, a marca fundada pelos skatistas americanos Rodney Smith, Eli Morgan Gessner e Adam Schatzcriaram, em 1993, deve abrir sua primeira loja no Brasil no primeiro semestre do ano que vem, no shopping Cidade Jardim, em São Paulo. Voltada para a urbanwear, a Zoo York foi uma das primeiras a difundir o skate, o hip-hop, o punk e o grafitti como estilo de vida.

Por aqui, a primeira coleção da grife apostou na mistura de estilos, no design e na estamparia. Tatuagens, grafites, ícones de Nova York, skate, surf e BMX são sempre parte do universo criativo da marca, que, por enquanto, vende seus produtos em lojas como Torquay e Tahai.

Zoo York quer loja próprIa no BrasIl

Motivadas por apelo ecológico e neces-sidade de reduzir custos, as empresas de diversos segmentos diminuem novamente as medidas de suas embalagens, que che-gam a ocupar apenas um quarto do volume anterior. Em alguns casos, a redução acon-tece com uma solução de design, sem que as quantidades sejam alteradas. Em outros, o produto é reformulado de tal maneira que, mesmo em versão compacta, tenha o mesmo conteúdo do original.

Até o início de 2010, cinco grandes fabricantes de bens de consumo, como Unilever e Procter&Gamble, devem colo-car versões menores de seus produtos nos supermercados brasileiros. Em tempos de crise financeira, garrafas, caixas e paco-tes menores significam menos gastos com insumos na produção e mais economia em transporte e estocagem.

O designer alemão Konstantin Grcic é o curador convidado para a primeira expo-sição de design da Serpentine Gallery, em Londres. Grcic trabalhará com o grupo de curadores fixos da galeria: Julia Peyton-Jones, Hans Ulrich Obrist e Kathryn Rattee. Convidar um curador de fora para selecionar e desenhar a exposição integra o conceito do pavilhão da Serpentine, que desde 2000 recebe projetos de artistas renomados.

A mostra Real Design vai de 26 de novembro a 7 de fevereiro de 2010 e exibirá ob-jetos de uso corrente, que estão em produção ou à venda. Haverá uma área com ori-gens e processos produtivos de algumas das peças expostas.

empresas reduZem emBalagens para cortar custos

novIdades na serpentIne galleY

NOTAS

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nos passos de

autor de móveis simples e funcionais, que não descartam conforto, durabilidade e estética, o francês é uma fonte de inspiração para o século 21

Por Mariana Pasini

arnoul t

PERFIL

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Quando chegou em terras brasi-

leiras, em 1950, Michel Arnoult

tinha ideias fervilhando na cabe-

ça. Muito provavelmente, algumas delas

diziam respeito ao presente que acabaria

deixando ao país: um novo modo de pen-

sar e fazer os móveis para a classe mé-

dia, combinando produção seriada, bom

gosto e durabilidade. Menos provável,

porém, era que ele soubesse o quanto

esses conceitos influenciariam toda uma

geração de designers.

Os produtos pensados por Arnoult têm

linhas elegantes e contidas, são hoje fei-

tos totalmente em madeira de refloresta-

mento e duram anos a fio. São cadeiras,

poltronas, sofás, mesas e estantes feitas

em formas econômicas e padronizadas,

com o diferencial de serem desmontá-

veis. É o resultado da sensibilidade des-

se desenhista que conseguiu detectar

um momento peculiar nas décadas de

1960 e 1970 no Brasil. Com a crescen-

te industrialização do país, a parcela da

população que vivia na cidade saltou de

19 milhões para 138 milhões de pessoas,

segundo o Instituto Brasileiro de Geogra-

fia e Estatística (IBGE).

arnoult previu cedo a importância da

produção nacional

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A indústria começava a fomentar o consumo de-

senfreado. O então presidente da República, Juscelino

Kubitschek, anunciava os “50 anos em 5” que o Brasil

deveria avançar. A classe média crescia, mas suas ca-

sas e apartamentos diminuíam, o que não significava a

necessidade de poltronas, cadeiras e sofás feios e pou-

co resistentes. Arnoult se preocupava com o aproveita-

mento da matéria-prima e a produção racionalizada, o

que garantia um preço mais acessível a seus móveis.

Fazendo-os desmontáveis, facilitava seu transporte; ao

variar as formas e recombiná-las, tornava-os eternos.

Nenhuma de suas criações foi pensada como objeto de

ostentação: o alvo sempre foi o grande público.

Não está claro o paradeiro de boa parte dos projetos

e desenhos técnicos dos móveis que Arnoult criou. Isso

não impediu que a empresa Atec Original Design, com

escritórios em São Paulo e no Rio de Janeiro, reeditas-

se desde o ano passado alguns dos exemplares mais

importantes da Mobília Contemporânea, marca criada

pelo designer com dois sócios em 1955. A empresa fa-

brica os móveis a partir de produtos originais que foram

usados desde os anos 1960 e 1970 e duram até hoje.

“Recebemos muitos elogios pela reedição dessa linha”,

conta Silvia Serber, diretora de marketing da Atec. “E é

incrível: os móveis realmente eram e ainda são de uma

qualidade absurda. Podemos ver hoje, quarenta anos

depois, que ainda existem produtos inteiros da Mobília

Contemporânea”, completa.

Nomear as criações não era o forte do designer, con-

forme relatos da família. Com exceção da cadeira Ouro

Preto, cujo título Arnoult deixou designado, a Atec bati-

zou todos os relançamentos com os nomes de lugares

no Brasil admirados por ele, consultando sua família.

São dez produtos fabricados em eucalipto reflorestado

tingido no tom da imbuia, destinados tanto ao uso domi-

ciliar quanto para escritórios.

a mesa Angra tem o eucalipto trabalhado com o máximo de aproveitamento

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PERFIL

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Não é pequeno o número de desenhis-tas influenciados por Arnoult. Nascido no Rio Grande do Sul, Fernando Jae-ger é um deles. A partir de técnicas an-tigas de marcenaria, ele se preocupa em criar móveis sóbrios e “sem firulas”, num estilo quase espartano, como já foi considerado o trabalho de seu ins-pirador, e não tem preconceitos contra esse rótulo: “Talvez esse espartano esteja mais para ‘sintético’. Tem muito conceito atrás de um móvel assim. A ideia, a forma e a ergonomia mudam para atender a diferentes necessida-des”. As cadeiras Twist e Croma de Ja-eger são exemplos desses ideais. Os traços econômicos e sem formalidades originam formas anatômicas e corre-tas, que acolhem bem o corpo.

Nos anos 1980, Jaeger foi o repre-sentante do francês na rede Tok&Stok, criada em São Paulo. O gaúcho discor-re sobre madeiras e sustentabilidade

com o interesse e a familiaridade de quem sabe o que fala. Ao mesmo tem-po em que Arnoult tentava desenvolver projetos sustentáveis em eucalipto com a empresa brasileira Aracruz Celulose, nos anos 1980, o desenhista voltou-se para a madeira reflorestada. A opção ocorreu involuntariamente.

Ele havia escolhido, por acaso, a pi-nus -– madeira clara de reflorestamen-to cultivada pela empresa alemã Freu-denberg no interior de São Paulo. Mas acabou identificando-se com o cultivo sustentável, já que a floresta era cons-tantemente replantada e abastecia a indústria num ciclo ininterrupto. Jaeger ainda lembra do preconceito em rela-ção ao eucalipto naquela época: “Ha-via alguns aficionados, mas ninguém nunca o olhou como uma madeira pos-sível de ser usada na cadeia produtiva da indústria moveleira”, explica. “Viam-no como matéria-prima para celulose, carvão ou forno de pizzaria”.

O designer considera que o modo de pensar de Arnoult foi fundamental para que se fizesse um uso maior dessa ma-deira que, reflorestada, causa menos impactos na floresta nativa. Hoje, o eu-calipto é largamente utilizado para a fa-bricação de móveis, mas ainda existem entraves logísticos, como o transporte da madeira, que encarece o produto final, e empresas intermediárias en-tre a madeireira e o profissional, que

colocam preços mais salgados na matéria-prima. Sobre a dificuldade de encontrar madeira de reflorestamento para seus produtos, Jaeger tem um comentário singelo: “E daí?”.

Ele possui uma parte do seu sho-wroom em São Paulo destinada a clientes com orçamento limitado. Assim como a adoção de material sustentável, Jaeger pensa que é uma questão de atitude a ser tomada. “Isso tudo diz respeito a como o móvel é produzido. Se você usa mais opera-ções de máquina e mais matéria-pri-ma, obviamente ele será mais caro. Se você racionaliza isso, consegue móveis bons, duráveis, bem constru-ídos, confortáveis e com preços aces-síveis”, esquematiza.

insp i r ador

releituras da poltrona Pelicano feitas por Francisco cálio (ao lado e acima)

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homenagem em milão Em 2003, aos 81 anos, Arnoult ga-

nhou a 17ª edição do Prêmio Design Museu da Casa Brasileira na categoria mobiliário, com a poltrona Pelicano. Es-truturada em 9 quilos de madeira reflo-restada e lona de algodão, fácil de mon-tar, foi uma das criações do francês que mereceram releituras de nove desig-ners brasileiros para a 1ª Mostra Brasil é Cosi. A mostra, integrante do projeto de mesmo nome que pretende divulgar o design brasileiro mundialmente, foi re-alizada no Salão Internacional do Móvel de Milão deste ano, entre 22 e 27 de abril. No espaço destinado a Arnoult, as releituras da poltrona, feitas por designers como Jum Nakao, Brunete Fraccaroli e Giovanna Nucci, alcança-ram a repercussão esperada.

Pedro Paulo Franco, designer e di-retor da loja A Lot Of, que idealizou e realizou a mostra, pensa que a escolha do homenageado casou perfeitamen-te com os objetivos do Brasil é Così.

“O cenário do design atual apresen-ta duas vertentes diferentes: produtos seriados com consciência ecológica, concentrando processos de fabricação junto a um único material, e preocupa-ções sociais e ecológicas, utilizando por exemplo madeira reflorestada”, afirma. “Essas conjunturas valorizam e respal-dam todo o trabalho de Arnoult.” Fran-co é otimista: “O mundo hoje está mais preparado para assimilar os seus pen-samentos”.

O designer paulistano Francisco Cá-lio foi um dos escolhidos para reler a Pelicano. “Fiz um trabalho descontraído, modernizei a poltrona, que já é um íco-ne”, comenta. Grande admirador de Ar-noult, Cálio discorre sobre a originalidade do francês com o entusiasmo de quem fala do trabalho de um mestre: “Ele foi um precursor. Inovou numa época em que as pessoas andavam conforma-das”, lembra Cálio. “Criou algo inusi-tado atemporal, com possibilidades e funções ilimitadas: onde você colocar o móvel, ele compõe perfeitamente, seja na varanda, na sala ou no escritório”.

O interesse maior de Arnoult era an-tes fabricar móveis duráveis do que en-riquecer com eles. Prova disso é a vida simples e elegante que levam os her-deiros do designer. Annick Arnoult, sua filha, mora no Butantã, em São Paulo, num sobrado típico de classe média, de espaços aconchegantes, móveis sóbrios e um quê de hippie. “Papai não era nada egoísta, não guardava segre-dos, estava sempre disposto a ajudar”, lembra a produtora musical. Tímida e reservada, ela fala do pai com humil-dade, carinho e brilho nos olhos. “Ele era workaholic, trabalhava muito, esta-va sempre inventando. As cadeiras da sala de jantar de nossa casa eram pro-tótipos dos desenhos e trabalhos dele. Mas ele era também absolutamente apaixonado pelo que fazia”, conta.

linhas leves

design espartano e sem firulas, as cadeiras twist,

de Fernando jaeger, seguem a linha do francês

PERFIL

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Nascido em Paris em 1922, Michel Arnoult apren-deu marcenaria quando foi preso e obrigado a traba-lhos forçados pelas tropas nazistas. Após se formar na União das Artes Decorativas, na capital francesa, ele topou trabalhar na Cidade do México para a empresa Bloc & Cia. A inovação e a experimentação que se en-xergam em seu trabalho só poderiam ter saído da mes-ma mente inquieta e aventureira que, em 1950, dirigiu um jipe do México até Caracas e de lá para o Rio de Janeiro, motivada pela vontade de conhecer o arquiteto Oscar Niemeyer. E foi à porta dele que Arnoult bateu quando pisou em terras cariocas. Com a disposição de seus 28 anos, conseguiu um estágio no escritório do arquiteto, mas logo ficou claro que seu interesse maior era o design.

O clima no Brasil era diferente, ele logo notou. A população parecia ser mais aberta aos estrangeiros do que no México e menos afeita a frescuras como os eu-ropeus. Arnoult cursou a Faculdade de Belas Artes do Rio de Janeiro de 1951 a 1955 e então contratou um marceneiro em Curitiba para que ele fabricasse os mó-veis que desenhava. Estava criada a Mobília Contempo-rânea, empreendimento feito juntamente com os sócios Norman Westwater e Abel de Barros Lima. Com ela, os três venderam móveis simples e desmontáveis, e com o diferencial da venda por correio. Michel inaugurou o conceito Peg Lev: fabricados em série, seus produtos podiam ser comprados em supermercados e facilmente

montados em casa.Avesso a burocracias e ao trabalho

administrativo, Arnoult deixava-os por conta dos dois sócios. Em

1973, com 11 lojas no Brasil e o lançamento de novas linhas a cada três anos, a Mobília Contemporânea fechou as portas devido a complicações financeiras. Três anos depois, o francês inaugurou a Senta, que vinha com as mesmas propostas de sua primeira empresa: produtos charmosos, resistentes e leves, cuja montagem não con-sistia num desafio intelectual. Após o encerramento das atividades dessa companhia, ele compôs seus produtos para trabalhos sob encomenda.

A sustentabilidade começou a marcar seu trabalho em 1980, quando participou de uma pesquisa sobre eucalipto no Instituto de Pesquisa Tecnológicas da Uni-versidade de São Paulo. A partir dela, Arnoult encontrou novas técnicas de secagem para o eucalipto, e desenvol-veu sua linha a partir dessa madeira reflorestada, com a qual foi o precursor no Brasil. Àquela época, a Europa já não permitia a fabricação de móveis com madeira que não fosse certificada. Mesmo que a madeira utilizada por Arnoult antes desse período não fosse reflorestada, a produção de seus móveis sempre foi pensada tendo em vista o melhor emprego e o menor desperdício possíveis da matéria-prima.

Arnoult adotou o Brasil como pátria. Nunca aban-donou o sotaque no português, mas aos poucos apor-tuguesou o francês. Gostava do clima, da atitude, e de uma brasileira em particular. A paulista Norma Paulo de Freitas morava num apartamento em cima da pri-meira loja da Mobília Contemporânea e foi com ela que ele se casou, em 1959. Teve dois filhos, Jean e Annick, que herdaram os dotes artísticos do pai: ele é músico, ela é produtora musical e possui formação na área de Moda.

a história do designer que juntou boas ideias à produção racional e seriada

des-mon-

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poltrona e banqueta Ouro Preto, a única linha batizada pelo designer

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O iluminadOPor Gabriella de Lucca

Ronnie Lot Sergio comandaa ViaLight, empresa que investe em luminárias assinadas pelo designer egípcio Karim Rashid

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uma empresa falhará se não inovar criativamente. A afirma-ção do norte-americano Phillip Kotler – considerado o “pai do marketing” – durante visita ao Brasil, em 2007, não poderia ser melhor aproveitada pela ViaLight. O tímido Ronnie Lot Sergio, 33 anos, é diretor da empresa, sediada em São José do Rio Preto, sua cidade natal. A fala mansa e o sotaque do interior de São Paulo, com um so-noro “r” puxado, guardam muitas de suas ambições mais fortes.

Em março e setembro deste ano, o empresário lançou duas li-nhas de luminárias desenhadas por Karim Rashid, inaugurando o segmento de design da empresa de iluminação. Ele comanda a Via-Light desde 2004, quando tornou-se diretor. A partir daí, o primeiro passo foi adaptá-la ao seu perfil ad-ministrativo, deixando-a mais enxu-ta, competitiva e produtiva. Investiu em novos equipamentos, mais mo-dernos e eficientes, melhorando o processo fabril.

Também ampliou a participa-ção no mercado de varejo com abertura de showrooms em Lon-drina (PR), Araçatuba (SP) e em São José do Rio Preto. Hoje, os produtos chegam a praticamente todos os estados no Brasil, além do comércio com Argentina, Chile, Paraguai e Venezuela.

A ViaLight tem uma longa tra-jetória. Em 1984, o pai de Ronnie, Robin Santana Sergio, fundou-a como uma pequena loja de ilumi-nação. Ainda na década de 1980, foi o precursor das luminárias tubu-lares e fluorescentes, além de criar uma linha decorativa. Dez anos de-pois de sua fundação, Ronnie en-trou na empresa.

Ele havia terminado o ensi-no médio nos Estados unidos e, quando voltou para o Brasil, come-çou a cursar administração de em-presas na faculdade Dom Pedro II, em sua cidade natal. “Tinha in-teresse em arquitetura, mas optei por administração para poder con-ciliar com o trabalho. Acho que foi uma escolha mais sensata, tomei o rumo certo”, avalia. Orientado pelo pai, mas sem nenhum privilé-gio por ser o “filho do dono”, traba-lhou em diversos departamentos, aprendendo um pouco de cada função até se tornar um verdadei-ro homem de negócios.

hoje todo mundo

reconhece as

empresas italianas,

alemãs e espanholas

como fontes de

design de qualidade.

por que não ter algo

assim no Brasil?

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investimentOsA experiência consolidada no mercado de luminárias

permitiu voos mais altos: a empresa assinou, no final de 2005, um contrato com o designer egípcio Karim Rashid. Lançou, em março deste ano, uma linha de luminárias assinadas por ele. “O Karim tem um trabalho reconheci-do mundialmente e isso agrega muito à nossa marca”, conta Ronnie. A escolha não foi mero acaso. O objetivo atual traçado pela ViaLight é focar em produtos de de-sign. O fato de Karim ser estrangeiro, longe de revelar qualquer preconceito em relação à produção nacional,

está ligado à possibilidade de internacionalizar a em-presa. “Com o Karim, a ViaLight fica mais valorizada”, analisa. “O produto pode ser oferecido e reconhecido no mundo inteiro”. Parcerias com o México e os Estados unidos já estão em andamento.

A maior preocupação de Ronnie é onde o produ-to será vendido. “Não adianta expor em qualquer lugar. É um artigo de design, a loja precisa ter esse perfil de venda”, explica. São oito tipos de luminárias divididas em duas linhas: uma delas é feita em aço com peque-

com o karim,

a vialight fica

mais valorizada.

nas cruzes e asteriscos desenhados, por onde passa a luz. Já a outra tem como matéria-prima o vidro e ainda não tem previsão de lançamento. Em São Paulo, elas podem ser encontra-das nas lojas A Lot Of e Zona D, mas devem ser comercializadas também em Teresina, Goiânia, Salvador, San-tos e Rio de Janeiro.

Atualmente, este novo segmento da empresa não tem pressa para se adaptar ao mercado e compreender sua dinâmica. A estratégia é conso-lidar o nome no Brasil e em seguida partir para outros mercados.

A ViaLight é dividida em três ra-mificações. A primeira delas é a VR, marca de luminárias e ventiladores de teto, para vendas em atacado, que pode ser encontrada nas lojas Leroy Merlin e Balarot. O brasileiro André Cruz é o diretor de design da marca desde o início do ano e redesenhou alguns produtos, além de criar no-vos. Há também a ViaLight Projetos, que é voltada para o setor hoteleiro e empresas, e tem seus produtos ven-didos nos show rooms. Ao perceber a necessidade de lançar luminárias com design, foi criada a ViaLight De-sign, que iniciou suas atividades com a coleção de Karim Rashid. “Este é um mercado que está em expansão, não podíamos ficar fora dele”, diz.

versão de mesa da luminária Ikon

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próximO passOO dinamismo e a novidade do

mercado dão novo fôlego às ambi-ções da ViaLight. E para concretizar tantos projetos, Ronnie conta com a ajuda de seus dois irmãos mais novos, Gustavo – que cuida da área comercial e visita lojas por todo o Brasil como supervisor de vendas – e Fábio, responsável pelos forne-cedores internacionais. Casado há quase cinco anos, o empresário vive em sua cidade natal até hoje. Já teve um escritório da empresa em São Paulo, que não deu certo devido aos altos custos de manutenção.

Depois dessa nova empreitada, o degrau seguinte será a parceria com algum designer brasileiro, que já seja reconhecido. “Ainda é cedo para lançarmos alguém menos co-nhecido, às vezes ele é tão bom ou melhor, mas precisamos consolidar a nossa marca para depois investir em novos talentos e, quem sabe, ajudá-los a fortalecer seu nome”.

não adianta expor

em qualquer lugar.

É um artigo

de design.

o empresário ronnie lot sergio, comanda a vialight

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O rosto alongado e de tra-ços fortes, escondido pelos óculos com armação de ace-tato, deixa transparecer o su-cesso no qual transforma tudo em que põe as mãos. Nascido no Cairo em 18 de setembro de 1960, filho de pai egípcio e mãe inglesa, Karim Rashid foi criado no Canadá, estudou na Itália e hoje mora nos Esta-dos unidos. Considerado um dos maiores nomes do design atual, sua imaginação não tem limites, seja projetando hotéis, baladas, restaurantes, sapatos e até produtos de limpeza. Hoje, tem mais de dois mil produtos lançados no mercado.

Formou-se em Desenho Industrial em 1982, na Car-leton university, em Ottawa, e seguiu para a Itália para terminar seus estudos com grandes designers como Ga-etano Pesce e Ettore Sott-sass. Em 1993, inaugurou seu estúdio em Nova York.

Workaholic assumido, estão entre seus clientes Prada, Is-sey Miyake, Method, umbra, Sony, Giorgio Armani, Gren-dene e Carolina Herrera. Ele também se arrisca como DJ e já tem dois CDs lançados e sete livros.

Karim tem 70 objetos na coleção permanente de 14 museus pelo mundo, entre eles o Museu de Arte Moder-na de Nova York (MoMa) e o Centro Pompidou, em Paris. Preocupado com o meio am-biente, está sempre inovando não só no design e na utiliza-ção de seus produtos, mas também na matéria-prima e em sua reutilização. Desen-volveu toda a linha de em-balagens Method, fabricante de produtos de limpeza eco-logicamente corretos. Suas fórmulas têm ingredientes biodegradáveis, derivados de materiais naturais como a soja e coco que surpreendem por seus formatos e cores.

Defensor do design de-mocrático ou “designocracia”, termo que inventou, afirma que não trabalha pensando apenas na classe mais alta, mas em todas as pessoas. Segundo ele, o design não é só visual ou estético, mas está por toda parte e repre-senta o que realmente é o mundo contemporâneo.

Há dois anos, Karim vive na ponte aérea com o Bra-sil, onde já desenhou para a grife Melissa, assinando as sandálias Aranha, High e Dynamik. No ano passado, participou de uma palestra no Boom SP Design, em ou-tubro. Na mesma época, inau-gurou sua exposição no Insti-tuto Tomie Ohtake, também em São Paulo, em cartaz até janeiro deste ano, exibindo suas últimas criações que ex-ploravam o rosa, cor favorita do designer.

dO designo queridinho

o designer egípcio karin rashid

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dO designo queridinho

Você costuma dizer que sua missão é democratizar o design. Como trabalha para isso?

Desde criança, sempre me perguntei porque o design não poderia ser uma coisa mais democrática, que todo mundo pudesse aproveitar.

Mas hoje ele é vendido em qualquer lugar. Primeiro, tento criar objetos democráticos, que possam ser comprados por todo mundo. Depois, procuro disseminar a cultura do design para o maior número de pessoas. Ele provoca mudanças no nosso dia-a-dia, no conforto. Há muitos pontos em que eu penso simultaneamente na hora de criar, como métodos de produção, matérias, uso, tecnologia, conforto, comportamento, forma, estética, custo, mobilidade, transporte e o mais importante: a cultura da companhia para a qual estou trabalhando. Se não há um casamento entre minha ideologia e a deles, então o projeto não será bem-sucedido. O design não é um ato egoísta, ele é colaborativo e deve ser para todos, não só para a elite. Sempre comparo desenhar um objeto bastante democrático com escrever uma música que se torne um hit pop. Algumas pessoas podem fazer isso e, quando acontece, há um sentimento maravilhoso de que você consegue causar um impacto na memória das pessoas.

Quais materiais prefere usar?

Apesar de trabalhar com todos os materiais, amo plástico. Ele é muito melhor do que qualquer material natural e possui ótimas propriedades.

Agora estou trabalhando com diversos bioplásticos. A oportunidade de criar novas formas, objetos que são altamente complexos e orgânicos, só pode ser feita com plásticos e bioplásticos. Eles também são melhores do que processos rápidos de manufatura para fazer produtos mais democráticos. Eu trabalho pela frase “a forma segue o produto”, e as formas do futuro serão inspiradas pela matéria de cada artigo. Meu interesse é torná-las mais sensuais, humanas, evocativas e esculturais tanto quanto for possível, tentando encontrar uma nova forma que nunca existiu.

Porque o rosa é tão predominante nas suas criações?

Rosa é meu branco super otimista. É enérgico, fulgente, envolvente, uma coragem para o mundo masculino que domina a paisagem

que construímos. Existem muitas variações e tons de rosa para todos os gostos, todas as pessoas. A cor também comunica claramente a ideia de imaterialidade, entropia, energia e otimismo. Rosa é o novo preto! Alguém disse uma vez que eu faço formas masculinas virarem femininas. O mesmo vale para a minha cor favorita. A cor é um dos fenômenos mais belos da nossa existência. É vida. Para mim é uma forma de lidar e tocar com nossas emoções, nossa psique, nosso espírito. Algumas cores são suaves, outras são fortes, o que importa é que elas trabalhem juntas. Ela pode ser bem ou mal usada, mas ninguém deve ter medo dela. É uma euforia espiritual fenomenológica.

O que acha do design brasileiro?

O Brasil é um epicentro incrível de cultura, arte, beleza e contemporaneidade. Isso tudo é tão onipresente no país! Eu também

acho que a cultura é vibrante, positiva e otimista, e esse é o ambiente perfeito para o design. Mas o Brasil tem uma longa tradição de ter design feito apenas por brasileiros. Agora é que estão começando a sair do país e abrindo portas para designers de todo o mundo. A ViaLight é um grande exemplo disso.

rosa é meu

branco super

otimista

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PERFIL

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sempre julgue um

livro pela

capa

Por Nathália Moraes

Nunca julgue um livro pela capa”, diz o

velho ditado popular. A máxima, dispa-

rada em situações que exigem análise

profunda, é o oposto do que sugere o design

editorial. Entre milhares de títulos expostos em

uma livraria, o que faz com que uma ou outra

publicação se destaque é a aparência. Fotogra-

fias de belas paisagens, cores fortes e marcan-

tes, padronagens que imitam tecidos e até o

título escrito de maneira rebuscada: vale tudo

para chamar a atenção do comprador. De pos-

se da obra, o leitor também se depara com um

outro tipo de desenho, que inclui a tipografia e

a diagramação.

Formado em Editoração pela Escola de Co-

municação e Artes da universidade de São

Paulo (ECA-uSP), Ricardo Assis é proprietário

da Negrito Produção Editorial, sediada em São

Paulo e há oito anos no mercado. A empresa,

que publica em média dez títulos por mês, sur-

giu da necessidade de Assis profissionalizar a

grande demanda de trabalhos que executava

como freelancer.

Ele acredita que um projeto bem feito é es-

sencialmente invisível. “O que a editoração deve

fazer é permitir o transe, aquele estado em que

a pessoa está em contato direto com a histó-

ria e as ideias do autor, sem sequer reparar no

tipo de fonte ou papel utilizados no livro”, expli-

ca. “Quando alguém agarra uma publicação e

a devora, página após página, existe um traba-

lho de editoração bem executado atrás da his-

tória interessante, pois o design permite essa

condição. Ao mesmo tempo, quem de nós não

tentou ler livros e mal passou da terceira pá-

gina?”, questiona Assis. “Muitas vezes a leitu-

ra pode ser tão desconfortável que, somada

às idéias do autor, nos afasta definitivamente

de uma obra.”

despeRtaR quem anda distRaído

de um bom pRojeto gRáfico pelas livRaRias é só o começo

Page 31: DZ revista de design

capa do designer ricardo assis

PRODuçãO E INSPIRAçãOFábio uehara, também egresso da ECA-uSP, é

responsável pelo departamento de capas da Compa-

nhia das Letras. Sediada em São Paulo, há 22 anos

no mercado e com quase 2.500 títulos publicados

(mais de 230 só no ano passado), a editora mantém

três selos: Cia. das Letras, Companhia das Letrinhas

e Companhia de Bolso. Em todos, a produção conta

com profissionais contratados (designers) e colabora-

dores (pesquisa iconográfica e ilustradores).

“O destaque na prateleira vem pela criatividade e

elegância, uma tipografia alinhada, uma imagem plás-

tica bem escolhida e interessante. Tudo isso distribu-

ído em uma boa diagramação”, diz uehara, leitor as-

síduo desde criança que escolheu o ofício para unir o

gosto por leitura e desenho.

Na Companhia das Letras, a criação dos trabalhos

passa por diversas fases. “Os projetos são iniciados

com o editor-chefe, o editor responsável do livro e a

diretoria do departamento de produção. Depois, en-

tra o designer gráfico”, destrincha uehara. A equipe

é guiada pelo briefing, que pode ser tanto um estilo

a ser seguido, uma imagem sugerida pelo autor ou

o conteúdo do livro, deixando o capista apresentar a

sua própria interpretação da obra.

A Negrito Produção Editorial tem na literatura a refe-

rência para a paginação dos volumes. “O editor de arte

deve ter contato direto com o texto original do autor, en-

tender a estrutura, como é a divisão dos capítulos e das

partes, se a obra tem citações e notas de rodapé. Não

dá para fazer um bom projeto gráfico sem conhecer a

fundo a intenção de quem escreve”, acredita Assis.

não dá para

fazer um bom

projeto gráfico

sem conhecer a

fundo a intenção

de quem escreveFO

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dESIgN gRÁFICO

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capas de Fábio uehara, da companhia das letras. para cada livro, cores e imagens que traduzem a mensagem da obra. em Descobertas Perdidas, um de seus trabalhos favoritos, o destaque fica por conta da pirâmide maia em chichen Itzá, no méxico.

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dESIgN gRÁFICO

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trabalhos de ricardo assis, que ganhou o prêmio jabuti com o projeto de A Plumária Indígena Brasileira

GuERRA DE CANETASNão é raro o autor interferir na editoração sem

conhecer exatamente as ferramentas e concei-

tos utilizados na hora de paginar. Ricardo Assis

alerta que o bom editor media os conflitos entre

autores e departamento de arte. O processo para

alcançar uma boa diagramação é essencialmen-

te igual para os dois lados da moeda: conhecer o

livro, entender a estrutura e começar o trabalho.

O responsável pela Negrito acrescenta: o de-

signer não pode ser preguiçoso na busca por

inovações. “Temos que experimentar pequenas

variações de tamanho de letra e entrelinhamento

e tipo de grafia até chegar à obra ideal. O design

de livros deve prestar atenção especialmente aos

pequenos detalhes”, afirma.

Buscar referências nas artes plásticas, fotogra-

fia, cinema e ilustração também integram a concep-

ção de um projeto exemplar. Fábio uehara lembra

a importância de conhecer a história e a atuali-

dade do design, além de arte e cultura. “O livro

é, simultaneamente, um objeto cultural e comer-

cial”, explica.

Para quem crê que o bom profissional

deve ter vastos conhecimentos de desenho e

artes plásticas, Ricardo Assis – que afirma não

dominar as técnicas de desenho e caligrafia –

avisa: “O necessário é ser um bom leitor. Essa

é a premissa básica para fazer bons projetos”.

Afinal, o design de livros deve traduzir visual-

mente o conteúdo de uma obra.

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Feitos para os grandinhos, os Toy art mesclam a inocência dos bonecos e a ousadia da estética urbana

Por Samantha De Tommaso

Meras semelhanças aproxi-mam os Toy Art de peças decorativas ou brinquedos.

Os “brinquedos arte”, como são também conhecidos, tornaram-se verdadeiros objetos de desejo de colecionadores em todo o mundo. Trazem uma linguagem adulta, mui-tas vezes irônica, que dialoga com uma cultura diferente daquela vista em bonecos tradicionais.

O precursor foi Michael Lau, um designer de Hong Kong, formado pelo Design First Institute, que, em 1997, customizou versões urbaniza-das de G.I. Joe (os famosos Coman-dos em Ação da Hasbro) para uma banda musical de amigos. No lugar das roupas militares tradicionais, usou nos personagens peças da cul-tura hip-hop americana e da arte do skate, parte do seu universo.

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A iniciativa de Lau desencadeou o movimento Toy Art, um verdadeiro fascínio por bonecos colecionáveis, que serviu como uma ponte para que artistas pudessem reproduzir sua arte e exprimir sua identidade em um objeto 3D. Designers, artistas plásticos, ilustradores e grafiteiros estão entre os que criam e conso-mem os toys.

As embalagens, geralmente, exi-bem a mensagem “voltado ao públi-co adulto”. Se antes ter um bichinho de pelúcia ou uma boneca transfor-mava o consumidor crescido em mo-tivo de chacota, com o Toy Art não há esse risco. O surgimento dos toys veio como uma espécie de liberta-ção para os adultos.

Calcados no conceito de contes-tação, esses bonecos exibem tra-ços futurísticos e nada ingênuos, e representam a arte contemporânea. Você encontrará desde figuras de-primidas, agressivas e irônicas, até monstrinhos e humanoides. Não es-tranhe uma eventual identificação com esses personagens e até a cria-ção de um laço afetivo que faça que-rer levá-los para casa. Algum desejo de infância pode ter sido resgatado.

Outra peculiaridade é a tiragem limitada. Os artistas criam um mode-lo e reproduzem poucas peças, que dificilmente serão iguais. Elas geral-mente são numeradas e assinadas para garantir a autenticidade e con-

ferir um caráter de item de coleção. Alguns toys são customizados ape-nas uma vez, o que lhes atribui um valor ainda maior.

Os materiais utilizados variam en-tre vinil, tecido, argila, madeira, can-vas, metal, resina e porcelana. Após a criação das plataformas, os artistas podem comercializá-las em branco (sem pintar), para que o consumidor ou outros artistas possam customi-zá-las por conta própria. Esse pro-cesso é conhecido como DIY (Do It Yourself) – “faça você mesmo”, na tradução para o português.

Na Plastik, primeiro e maior distri-buidor especializado em Toy Art do país, você encontra os DIY, inclusive os famosos moldes Munny e Dunny, desenvolvidos pela empresa ameri-cana Kid Robot (maior do gênero), do designer Paul Budnitz.

Criada em 2006 por Nina San-ders, a Plastik possui o diferencial de reunir loja, galeria e livraria em um mesmo espaço. A sede fica no bairro dos Jardins, em São Paulo, e ali são comercializados mais de 500 produ-tos nacionais e importados.

Essa paulistana de 28 anos, for-mada em História da Arte pela uni-versidade de San Diego, nos Esta-dos unidos, é também colecionadora de toys e possui mais de 200 peças. Foi assim que surgiu a ideia de abrir a loja. “Meu primeiro contato foi em 2002, quando comprei um toy na Kid Robot. Depois do primeiro, nun-ca mais parei. Em qualquer viagem que fazia para o exterior, comprava um”, disse Nina em entrevista ao site de notícias UOL em maio deste ano. Nossa reportagem traz mais alguns artistas desse universo.

plastIk rua Dr. Melo Alves, 459

São Paulo – SPtel. (11) 3081-2056

lIvrarIa pop rua Dr. V. de Carvalho Pinto, 297

São Paulo – SPtel. (11) 3081-7865

casa dIssensorua Pinheiros, 747

São Paulo - SPtel. (11) 3061-9842

poderosa ÍsIs rua Augusta, 2202

São Paulo – SPtel. (11) 3091-9636

katkIller www.katkiller.com.br

WassaBe www.wassabe.com

onde comprar

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ARTE URBANA

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Bastam 52 centímetros de pano para que o paulistano Josmar Madureira, de 39 anos, reproduza com originalidade grandes astros da música, cinema, moda, cultura pop e da arte em geral.

Publicitário por formação, ilustrador e designer freelancer, Josmar fundou, em 2005, a Katkiller – um estúdio de criação que, inicialmente, funcionava como grife de camisetas. Ali eram desenvolvidas estampas inteligentes e criativas, tanto para a própria marca quanto para outras grifes.

Inspirada em ícones pop e desenvolvida toda em pano, a linha de Toy Art da Katkiller surgiu em 2007. Devido à repercussão e à demanda, não demorou até que os bonecos se tornassem o carro-chefe da marca.

Apontado como um dos precursores do movimento Toy Art no Brasil, Josmar conta que “a ideia era fazer uma releitura de algo que estava há muito tempo guardado no fundo do baú – os tradicionais bonecos de pano dos tempos de nossos avós”.

O artista discorda de quem acha que os bonecos são exclusividade dos adultos. Ele acredita ter desenvolvido um produto único e completo, que atende a todas as faixas etárias, agradando pais e filhos. “É contemporâneo e conceitual, funciona muito bem como artigo de decoração e, o melhor de tudo, é colorido e divertido”, esmiúça o artista.

Além do intuito lúdico, a Katkiller vende seus toys como um produto sustentável, que utiliza materiais ecologicamente corretos. Os bonecos são confeccionados em algodão cru (corpo), tecidos diversos (roupa), fibra de poliéster 100% virgem (enchimento antialérgico) e face silkada e/ou pintada com tinta à base de água.

Uma equipe de apenas cinco pessoas compõe a empresa. A tiragem mensal de bonecos gira entre 200 e 250 peças. A Katkiller vende toys para todo o Brasil, bem como para a Inglaterra e os Emirados Árabes. No catálogo, há uma variedade de mais de 40 modelos, cada qual com seu grau de complexidade. Consequentemente, cada peça leva um tempo específico para ser produzida.

Entre as maiores conquistas da grife estão projetos firmados com a Colcci, a MTV e a Patachou, que solicitaram a confecção de toys personalizados. “A busca por um posicionamento de vanguarda tem feito com que esse tipo de cliente nos procure para criar artifícios que imprimam seus conceitos. A Toy Art, sem dúvidas, possibilita isso”, explica o designer.

A contemporaneidade de seus bonecos rendeu a Josmar a oportunidade de figurar entre os maiores nomes da Toy Art mundial, junto a Tokidoki, Jon Burgerman e Gary Baseman. Louis Bou, em seu livro Toyland (Instituto Monsa de Ediciones, 255 págs, R$ 107), publicou nesse ano as criações da Katkiller.

sem fronteiras

cláudia holanda e cris mergulhão

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As irmãs Cláudia Holanda e Cris Mergulhão, naturais de Recife (PE), encontraram no graffiti e na moda underground contemporânea a inspiração para criar a Urbanus Toys, uma marca de Toy Art desenvolvida em cerâmica.

Cris é formada em arquitetura e trabalhou na área de ambientação e design de móveis antes de ingressar nos trabalhos em cerâmica. Cláudia formou-se na área de saúde, mas logo descobriu nas artes plásticas uma alternativa prazerosa, o que lhe abriu portas para trabalhar com pintura em tecido e serigrafia.

Em 2001, as duas decidiram trabalhar juntas com modelagem e pintura em cerâmica, produzindo luminárias, fontes e outros objetos de decoração. Apenas em 2007 surgiu a ideia de criar bonecos. “Achamos que fazer toys em cerâmica seria algo inovador, pois não conhecíamos nenhum outro trabalho de Toy Art feito com essa técnica”, conta Cris. “Ficamos muito satisfeitas com o resultado da primeira coleção, que foi bem aceita nas lojas de design daqui.

Logo apresentamos nossos toys em São Paulo e também tivemos uma excelente recepção”, completa.

As artistas usam como base para criação dos personagens a estética da arte urbana. “Nossos personagens são punks, emos, monstrinhos. Alguns são meio góticos, outros mais fofinhos. Não acho que tem um estilo único. Alguns são mais figurativos, outros mais lúdicos”, explica a arquiteta.

A Urbanus Toys produz, em média, 50 peças a cada quinze dias. Todas as modelagens das matrizes são criadas pelas irmãs, cuja coleção soma 14 modelos. As lojas para as quais elas vendem seus toys, entre elas a Livraria Pop, não mantêm estoque. Os pedidos chegam com a especificação do modelo e da quantidade dos toys, mas a pintura fica a critério das artistas. “Pela impossibilidade de reprodução perfeita, deixamos essa etapa mais livre, ao gosto da nossa inspiração”, diz Cris.

negócio entre irmãs

josmar madureira

ARTE URBANA

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marina moura

Bruno oliveira

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No ateliê Onze & Onze, três artistas trabalham com pintura e serigrafia, reproduzem gravuras, cartazes para shows e criam Toy Art. O recém-chegado Thiago Balbi, de 29 anos e natural de Taubaté, interior de São Paulo, é formado em Desenho Industrial e Programa-ção Visual pela Faculdade de Belas Artes. Já fez ilustrações para re-vistas como Fórum e Caros Amigos e foi responsável pelo desenvol-vimento do projeto gráfico do CD e DVD acústico dos Engenheiros do Hawaii, em 2004, pela Universal Music e MTV Brasil. Thiago está no processo de desenvolvimento do seu primeiro toy – um peixe com cara de totem.

A designer Marina Moura tem 25 anos e é formada há quatro em Desenho Industrial pela FAAP. É pós-graduada em curadoria na Es-panha. Hoje, trabalha como freelancer em comunicação visual. Para corar o extenso currículo, Marina criou o toy Banana Love.

Ela tem verdadeira paixão por desenhar e pintar, e o personagem que deu origem ao Banana Love já existia em suas ilustrações e telas. Essa foi a primeira peça em resina que o ateliê produziu. Eles tiveram a ideia de fazer um item pequeno, leve, com aproximadamente três polegadas, feito a partir de um único molde – bem próximo aos que são vendidos no mercado. Portanto, fizeram uma plataforma oca, com a resina só na parte externa. E para manter o caráter da origi-nalidade, típico do Toy Art, a tiragem limitou-se a apenas cem peças. “É um objeto de colecionador. É aí que está a arte. Eu fiz cem e acabou. E dessas cem, a cada dez, seis são marrons, três são ro-xas e apenas uma é dourada, que é a mais rara”, explica Marina. As bonecas vêm em blind boxes, isto é, quem compra não sabe o que tem dentro. Cada peça é pintada, flocada uma a uma, assinada e numerada. A Banana Love custa 40 reais e hoje só é vendida na Casa Dissenso e na Livraria Pop. Em breve, estará disponível também na loja virtual Wassabe.

O namorado de Marina, Bruno Oliveira, de 26 anos, formou-se em Audiovisual pela Anhembi-Morumbi e, posteriormente, fez uma licenciatura em Artes Plásticas na Faculdade Mozarteum. Suas cria-ções em Toy Art são o Toco, o Minitoco e o Minitoco Deluxe. Ele tra-balha como artista plástico há seis anos. O pai tem o mesmo ofício e os dois já tiveram um ateliê juntos. “A coisa vem de família”, diz bem-humorado.

Os toys de Bruno também têm tiragem limitada. Primeiro, veio o Minitoco, em apenas 50 peças. O tronquinho de árvore é feito de canvas – tem o mesmo preenchimento dos bichos de pelúcia e por fora é de tela. Já do Minitoco Deluxe, que está para ser lançado, se-rão produzidas 200 unidades. O diferencial é que esses vêm em blind boxes, e além do galho da versão original, trazem também um tentá-culo ou uma cabeça de alce. Além das plataformas próprias, Bruno foi convidado a customizar o toy Lobinho DYI, criação da loja virtual Wassabe. O artista pintou à mão três peças para uma promoção que a marca lançou para o Dia dos Namorados.

A polivalência é mesmo um de seus pontos fortes. “Foi ele quem modelou e fez todo o estudo para produzir a Banana Love em toy”, orgulha-se Marina. Ela explica que até certo ponto o pro-cesso é manual, depois torna-se semi-artesanal. “É preciso de um molde para produção em série. Primeiro é feito um desenho de onde são tiradas as medidas de cada parte, para só então começar a modelagem em clay, uma argila sintética. Depois, há um molde de silicone e dele tiramos as peças. Para conseguir o produto final, pegamos duas peças em resina e cada uma delas é trabalhada e lixada até que fiquem perfeitas. Tudo é executado no ateliê, até as embalagens”, esclarece a designer.

E a característica multifacetada de Bruno não para por aí. “Con-venci a Marina a fazer o toy. Cuido do processo inteiro, desde a con-fecção, a distribuição, até a venda, tanto que depois peguei a mochila e fui de loja em loja oferecer”, diz o namorado e braço direito.

Em setembro, os dois participaram da exposição Reprodutíveis – série 3, da galeria RV Cultura e Arte, em Salvador (BA), ao lado de artistas como Adriano Lemos e Arthur D’Araujo. Eles acreditam que aqueles que fazem Toy Art, geralmente, não ganham dinheiro com isso, mas sim com exposições, palestras, entre outras coisas. “O toy é uma extensão do trabalho do artista”, afirma Bruno. A ideia do casal é tentar lançar mais linhas em um ano. 2010 promete!

toys em equipe

ARTE URBANA

Page 42: DZ revista de design

Maíra, ao lado de Alessandro Braga, é dona da Poderosa Ísis, uma espécie de loja e galeria charmosa, na rua Augusta, em São Paulo, que comercializa roupas, acessórios e objetos de arte. Ela conheceu Adriano enquanto ambos expunham em feiras, como Mercado Mundo Mix, Como Assim? e Pulgueiro. Hoje, são bons amigos e parceiros de negócio. Segundo Maíra, as telas de Adriano são o maior atrativo da loja. E reconhece também a transformação no estilo do amigo. “O traço dele mudou muito ao longo do tempo. Era mais ingênuo. Se você olhar os desenhos mais antigos, vai notar a diferença”, relata. “Há poucos dias, vendi algumas das peças dele para um merchant”, conta, orgulhosa.

Além dos trabalhos do pernambucano, a Poderosa Ísis oferece produtos de vários outros artistas nacionais de Toy Art. Entre eles, Fabíola Cally, criadora da personagem Tôsqka, Ismael Lito, autor do Paleolito – um dos primeiros DIY de vinil lançados no Brasil – e Delfina Renck Reis, dona da Dodô Dadá Toy Art. Para Maíra, é essencial estimular a arte brasileira. “É muito gratificante abrir as portas para vários artistas, porque de alguma forma estamos valorizando o trabalho deles também”, desabafa. “Como dificilmente rolam feiras de designers aqui no Brasil, esses artistas acabam fazendo feirinhas de artesanato, que no meu ver, depreciam um pouco a arte. Imagine o toy ou a tela expostos ao lado do pano de prato!”

abrindo portas

adriano lemos

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Page 43: DZ revista de design

ARTE URBANA

Figuras góticas, parecidas com os personagens dos filmes de Tim Burton, mas de um traço único, é o que encontramos nas criações de Adriano Lemos, pernambucano de Afogados da Ingazeira. De lá, ele só trouxe as raízes.

Com um mês de vida, Adriano já viajava com a mãe rumo a São Paulo. E foi na capital paulista que o gosto pela arte tomou forma. Ele concluiu o curso de Desenho de Comunicação em 2000, na Escola Técnica Estadual Carlos de Campos – uma instituição que faz parte do patrimônio histórico da cidade de São Paulo – e no mesmo ano começou a vender seus primeiros bonecos, feitos em porcelana fria, a conhecida massa de biscuit.

Três anos antes, houve tentativas em durepox. Por ser um material de difícil manuseio, o projeto não foi levado adiante. Somente mais tarde, a mãe de uma amiga recomendou a massa de biscuit. Foi quando a inspiração de adolescente se concretizou em bonecos punks e skatistas, que logo tiveram grande receptividade, pois eram inovadores para a época.

Mais tarde, teve a ideia de divulgar seu trabalho em feiras de design, e como não dispunha de verbas, a alternativa foi montar sua banca do lado de fora. A qualidade das peças chamou a atenção dos organizadores, que o convidaram para os eventos.

Quando a onda Toy Art invadiu o mercado, Adriano se interessou pelos moldes de vinil e resolveu estudar alguns livros, que usou como referência para, posteriormente, em setembro de 2008, criar o Fooze, sua própria

plataforma DIY. A figura passou dos rascunhos em papel para a modelagem em biscuit, depois para a forma em silicone e, por último, a uma peça acabada, que deu origem ao molde final.

Então, ele contratou os serviços de uma fábrica e produziu as primeiras 200 peças. Um shopping de Ribeirão Preto (SP), cliente da mesma fábrica, conheceu o trabalho de Adriano e entrou em contato para comprar uma tiragem dos toys, que eles dariam como brinde no Dia dos Namorados. No processo industrial, uma máscara de serigrafia foi usada para produzir 20 mil peças dos quatro modelos customizados pela agência do próprio cliente.

Já os toys de customização própria são pintados à mão, um a um, com pincel e tinta vinílica. Em alguns, são utilizadas canetas de marcar CD. Há modelos tão complexos que demandam sete horas de trabalho. Esses são produtos mais caros, comercializados em torno de 200 reais. “Os Fooze que customizo são únicos. Nunca um vai ser igual a outro e eu até prefiro fazer pinturas diferentes para cada toy”, diz o artista plástico que, aliás, não se sente muito confortável com o termo. “Prefiro dizer que sou marceneiro. Se digo que sou artista plástico, o povo vai me achar metido”, brinca.

Além dos toys, Adriano cria outros tipos de bonecos, luminárias e também pinta telas. O traço ousado das pinturas veio da época em que ele dividiu uma loja de artes com Maíra Maciel. “Tínhamos o espaço, mas nada para colocar nas paredes, então resolvi pintar”, conta.

arretado e moderno

maíra e alessandro Braga

Page 44: DZ revista de design

Cinema em miniaturaCinema em miniatura

O designer britânico Craig Lyons recria pôsteres de filmes famosos com peças do brinquedo lego

Por Gabriella de Lucca e Nathália Moraes

Criado na década de 1950, o brinquedo

de montar – inventado originalmente

para crianças – é uma febre no mundo

pop, especialmente na música, cinema e games.

Nascido na cidade de Bourne, em Lincolnshire,

no Reino unido, o designer gráfico Craig Lyons

tem uma coleção de mais de 10 mil peças de

Lego. Sua paixão pelo brinquedo – e também

por cinema – fez com que começasse a recriar

pôsteres de filmes com os famosos bloquinhos.

Seu primeiro trabalho foi Tubarão. “É o meu fa-

vorito”, conta Lyons.

No repertório do artista estão, entre outros,

Indiana Jones e Cães de Aluguel, que segun-

do ele, foi o mais trabalhoso de ser produzido,

pois foi necessário fotografar os bonequinhos

um a um para montar o cartaz. Para recriar os

pôsteres, Lyons monta a cena usando Lego e

depois a fotografa. Na maioria das vezes, usa

o Photoshop para dar o acerto final e incluir o

logo do filme. Resultado: um trabalho artístico e

bastante criativo. A seguir você confere alguns

dos cartazes feitos pelo britânico.

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Page 45: DZ revista de design

Com os braços de um boneco e uma

peça feita de rosquinha, Lyons recriou

o cartaz de Simpsons - O Filme,

mas também usou o Photoshop para

finalizar o pôster.

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ENSAIO

Page 46: DZ revista de design

O cartaz de E.T. – O Extraterrestre,

filme ícone da década de 1980,

é composto exclusivamente com

peças do brinquedo dinamarquês.

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ENSAIO

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O primeiro trabalho de Craig

Lyons – e o seu favorito – recria

o cartaz de Tubarão, clássico

produzido por Steven Spielberg.

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Harry Potter e a Ordem da Fênix deixa os bonecos

do Lego com um ar sombrio. O mais curioso é que

o designer não esqueceu de fazer a cicatriz na testa

de Harry, grande marca do bruxinho.

ENSAIO

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Page 52: DZ revista de design

Ser a escolhida do príncipe por ter um sapato

exclusivo, de cristal, com tamanho único. Se

o conto de fadas soa antigo, a modernidade

já se encarregou de fazer a releitura de Cinderela.

Em inglês, sneaker é um dos termos que designam

tênis. Mas a moda conferiu outra conotação à pala-

vra, agora relacionada aos calçados exclusivos, com

design arrojado e fora da proposta esportiva. Os sne-

akers são cada vez mais procurados pelos fashionis-

tas, que buscam peças customizadas e com ar retrô.

Quanto mais original for o calçado, melhor. “Dentro de

qualquer círculo social, uma pessoa com um modelo

exclusivo lança tendência, pois tem nos pés um obje-

to de desejo”, diz a designer Kate Lu.

Nossa reportagem foi buscar quais caminhos

esses tênis tão bacanas têm percorrido pelo Brasil.

CinderelaSíndrome de

Ter um calçado único deixou de ser mote do conto de fadas e virou realidade por meio dos sneakers

Por Nathália Moraes

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Sneaker customizado pelo grafiteiro Jimmy, que tem como referência o hip hop

moda

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O site Sneakers BR surgiu em dezembro de

2005, no formato blog, para agregar e difundir

a cultura sneaker. “Percebi que ninguém falava

sobre o assunto, até então desconhecido aqui

no Brasil”, conta Ricardo Nunes, criador da pá-

gina. Após um ano e meio no ar, o blog virou

um mini-portal dedicado a cobrir a cena de sne-

akers no país, que dava os primeiros passos,

além de trazer informações em português so-

bre os lançamentos globais.

No aniversário de dois anos do portal, Ricar-

do foi convidado pela Nike a desenhar um tênis

comemorativo em homenagem ao site. O sne-

aker foi batizado de Lanceiro, desenhado com

base no modelo Air Max 1 (que acabava de ser

lançado e é assinado por Fabrício Machado, da

Nike). Para criar esse tênis, Ricardo baseou-se

em sua terra natal, Recife, capital pernambuca-

na. O nome, Lanceiro ou Caboclo de Lança, re-

mete aos maracatus rurais da Zona da Mata do

estado e ao movimento musical manguebeat.

Feito em couro, mescla as cores azul e creme e

possui um solado transparente, com marcas de

lama e um caranguejo de miçangas coloridas.

Pontos verdes, amarelos e vermelhos estão

nos cadarços, palmilhas e na parte superior do

sneaker e que lembram as lantejoulas e brilhos

existentes nas vestes típicas dos lanceiros. A

versão foi vendida em algumas lojas, com tira-

gem de 330 pares.

Para celebrar o terceiro ano do site, mais

uma peça comemorativa – dessa vez, assinada

pela designer Kate Lu, em parceria com a Dia-

dora. Formada em administração de empresas,

Kate abandonou o mercado financeiro para tra-

balhar com design. Hoje, migrou para desenvol-

vimento de linguagem off-line para empresas e

adorou ser convidada para desenhar um tênis.

“Fazer um sneaker é muito bacana, porque

você sabe que as pessoas vão desejar aquele

Fazer um sneaker

é muito bacana,

porque você sabe

que as pessoas vão

desejar aquele tênis

DA WEB PARA OS PéS

Page 55: DZ revista de design

tênis” relata. “Você expressa a sua arte em um

produto que é pouco convencional”.

Para desenvolver o calçado, a empresa

disponibilizou diversos modelos e materiais.

A autora ainda sugeriu algumas mudanças para

deixar o sneaker com a cara da página na web.

“O tênis precisava ter alguns elementos que

existem também no site, pois é comemorativo.

Para fazer isso, seguimos uma tabela de cores

e algumas referências do Sneakers BR. Não foi

tão difícil buscar os materiais”, avalia.

Há apenas 48 pares em todo o planeta, en-

viados a colecionadores e formadores de opi-

nião dentro da cultura deste tipo de calçado. “A

edição será publicada na Sneaker Freaker, que

é a revista mais importante do seguimento no

mundo. Ela tem três edições anuais e é con-

siderada a Bíblia dos sneakers”, explica Kate.

“Todo tênis que sai lá se torna uma referência

mundial” arremata, orgulhosa de seu trabalho.

Modelo Lanceiro, desenhado em comemoração ao aniversário de dois anos do Sneakers BR

moda

Page 56: DZ revista de design

“Foi natural eu entrar no universo sneaker,

pois o mundo em que vivo é movido por essa

cultura, que inclui o hip hop”, diz Jimmy, gra-

fiteiro, tatuador e custom – que, ao contrário

dos designers, não chega a criar um projeto

desde seu princípio, mas personaliza mode-

los de tênis de acordo com suas ideias ou pe-

didos. Ele conta que já gostava de sneakers

desde que via, em filmes antigos, os grafitei-

ros fazendo tênis para os B-boys (dançarinos

de breakdance) irem às batalhas de hip hop

em Nova York. Começou pintando os tênis

dos amigos, mas não vingou. “No início, pintei

uns dois pares com todas as tintas erradas.

Conforme usavam, as tintas saíram de uma

maneira bizarra, grudavam na calça”, conta.

SuBúRBIO CHIC

Calçar um

sneaker pelo

qual você pagou

muito e não

gostar é chato

moda

Page 57: DZ revista de design

Jimmy reforça: a grande vantagem do cal-

çado customizado é a exclusividade. “Podem

olhar, achar muito característico, muito ‘style’, e

decidir comprar o calçado” explica. Mas, mes-

mo considerando a cultura da customização um

trunfo, ele acredita que a mania ainda não pe-

gou no Brasil. “O tênis é um suporte muito caro.

Calçar um sneaker pelo qual você pagou muito

e não gostar é chato”, completa.

Suas referências vêm do cotidiano, univer-

so urbano, moda conceitual e da cultura hip

hop. “Quando fiz sapatos femininos, procurei

colocar um aspecto mais conceitual no cal-

çado, tanto no acabamento quanto nos mate-

riais, mas sempre conectado ao graffiti”, conta

Jimmy, que vende seus trabalhos com a ajuda

da internet. gente de diversos países, como

Estados unidos, Espanha e Alemanha, possui

sneakers com o toque, cores e desenhos do

grafiteiro, que nunca imaginou tanto sucesso.

Para quem acredita que a cultura sneaker

fica apenas no pé dos usuários, Jimmy con-

ta que já foi convidado para diversas exposi-

ções sobre o tema, tanto em lojas quanto em

galerias de arte, e cheg ou a desenhar um

modelo gigante para uma mostra. “Teve um

projeto da Nike, em São Paulo, realizado jun-

to à revista Good, de moda. Nesse trabalho,

pintei um Air Max 90 gigante”, lembra. “O tê-

nis pode ser considerado um quadro. Então,

os donos de galeria procuram os customiza-

dores”, conclui Jimmy.

Versão Star Wars, de Jimmy

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Popó vive em dois mundos muito diferentes. Para ganhar a vida, tra-balha como restaurador de quadros e convive com obras de grandes pintores brasileiros, como Portinari, Volpi e Di Cavalcanti. Porém, nas horas livres, gosta mesmo é de pin-tar paredes com seus graffitis. “O trabalho que paga minhas contas, há quatro anos, é o de restauração. Nele, cuido de grandes obras, en-quanto no meu mundo acabo su-jando a cidade”, brinca o grafiteiro. O mundo que Popó chama de seu é um universo bem urbano, que in-clui o graffiti, o skate e também os sneakers, que ele customiza, por acaso, desde 2006, quando sua namorada concluía a faculdade de moda. “Ela estava fazendo o traba-lho de conclusão de curso e ajudei nos calçados. Pintei alguns All Stars e personalizei uma galocha com tin-ta permanente”, lembra.

Na mesma época, Popó se in-teressou pela customização de tênis em couro e consultou o ami-go Jimmy: “Ele consome a cultura sneaker há muito mais tempo que eu e me ensinou bastante”, conta. “Lembro quando a gente começou a andar de skate. Saíamos de gua-rulhos para vir para a Barra Funda, porque havia uma loja que vendia tênis de skate por um preço mais bacana”, diz Popó.

Para ele, a customização é uma saída para quem busca exclusivida-de sem sacrificar o bolso. “Os tênis mais legais são também os mais caros. Por isso, as pessoas fazem o sneaker do seu jeito. Em vez de pagar 450 reais em um calçado, a galera pode aplicar 150 reais em al-gumas tintas, pintar e ganhar exclu-sividade”, explica o grafiteiro, que possui um blog no portal da MTV. Lá, conta as novidades sobre sne-akers e exibe vídeos para ensinar técnicas de customização.

Para produzir, Popó segue as sugestões do cliente. “Escolhido o tema, pesquiso conceitos para aplicar. Muitas vezes, o próprio tê-nis me dá dicas sobre qual dese-nho posso encaixar, como posso brincar com as formas”, explica. E já que a customização não “paga as contas”, Popó aproveita para trabalhar tranquilamente nos pares – o que faz apenas quando está inspirado. “Cada tênis tem um cari-nho especial, um jeitinho certo. Por isso, posso demorar mais de um mês para acabar”.

EXCLuSIVO POR ACASO

Calçado customizado pelo restaurador Popó, que costuma seguir as sugestões dos clientes

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moda

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Modificar o espaço público por meio da arte.

Descrever assim a proposta da intervenção ur-

bana, em poucas linhas, pode remeter à sim-

plicidade. Então, cuidado! O ato de pegar latas de tinta

e grafitar muros por aí esconde histórias, paixões, cami-

nhos e movimentos mais complexos do que o produto

final pode revelar.

O graffiti teve início há milhares de anos, com as pin-

turas rupestres nas paredes das cavernas, durante o pe-

ríodo Paleolítico Superior (40.000 a.C.). A evolução dos

traços, a passagem para as telas e o retrato do cotidiano

dão a tônica de um dos mais difundidos elementos da

arte urbana ao redor do mundo.

vamos bater lataEmblema da cultura de rua, o graffiti rompeu barreiras sociais e paredes de galerias para ganhar o status de movimento artístico

Por geoffrey Scarmelote e Samantha De TommasoF

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Celso Gitahy e os seus principais trabalhos

Arte no bAnheiro

O paulistano Celso gitahy, de

41 anos, começou no graffiti com

rabiscos. “Percebi que o banheiro

de bar é muito interessante, por-

que tem aquela caixa de descar-

ga. E quando o homem está uri-

nando fica olhando pro alto, tendo

aquela sensação de alívio que é

muito interessante. Pensei ‘puxa,

esse negócio branquinho aqui’...

Aí eu comecei a desenhar”, con-

ta, bem-humorado. A brincadeira

evoluiu. Na segunda metade da

década de 1980, durante a facul-

dade, gitahy aprendeu com os

amigos grafiteiros Maurício Villa-

ça e Alex Vallauri as técnicas de

stêncil e não parou mais.

Hoje, alçou a nova abrangên-

cia do graffiti: as exposições. Pet

Machine figurou até o mês passa-

do na Mônica Filgueiras galeria

de Arte. Os 30 trabalhos, desen-

volvidos ao longo da carreira de

gitahy, mostram “uma perspecti-

va poética e animal do caos e da

insanidade da obsessão humana

com máquinas em detrimento do

ser vivo: a banalização da vida”.

arte urbana

Page 64: DZ revista de design

Velhos trAcos , noVos rumos

O graffiti ainda encontra cer-

ta resistência de crítica e público

para encarar mostras e exposi-

ções. é para quebrar essa barreira

que José Carlos “Baixo” Ribeiro,

de 43 anos, estilista especializa-

do em skate, rock e graffiti, abriu a

galeria Choque Cultural, no bairro

de Pinheiros, São Paulo. “O jovem

não é muito bem contemplado pe-

los espaços artísticos, que geral-

mente são muito formais e criam

um ambiente um pouco chato pra

galera mais nova, que tem uma ex-

periência visual muito mais poluída

pra chegar numa galeria, ou num

museu muito comportado”, expli-

ca. “A ideia da Choque Cultual é

criar um público novo para as ar-

tes plásticas. é uma galeria focada

em pintura, que tem a cidade como

suporte”, arremata. Em setembro,

o arquiteto por formação começou

uma nova empreitada, o Acervo da

Choque. A nova galeria fica na Vila

Madalena e abriga todo o acervo

da Choque Cultural, além de ter

exposições dos artistas que fazem

parte da galeria. Quem inaugura

o espaço é TitiFreak, que fica em

cartaz com a exposição AmorInsis-

tente até dia 14 de novembro.

Baixo Ribeiro ousou ao criar a galeria Choque Cultural e proporcionar um novo espaço ao graffiti

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arte urbana

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GrAfiteiro , GrAcAs A Deus

A veia underground do graffiti,

porém, continua latente. Binho Ri-

beiro, um dos principais nomes do

street art mundial e um dos pio-

neiros no Brasil e América Latina,

já trabalhou com embalagens e

cenografia. Mesmo assim, culti-

va as raízes urbanas de sua arte.

“Sou grafiteiro, graças a Deus.

Quando a gente pinta na rua, não

tem essa pretensão de conseguir

trabalhos ou de fazer algo que a

sociedade acha lindo”, comenta.

“Fazemos algo dentro do conceito

do que realmente queremos. Sem-

pre tive bastante oportunidade no

lado profissional dentro da cultu-

ra do graffiti, desde a decoração

de uma loja de skate a grandes

projetos e encontros. um lado se

agrega ao outro”, arremata.

Binho Ribeiro não abre mão das raízes marginais do underground

Page 66: DZ revista de design

Do bueiro pArA o munDo

Os paulistanos do Duo 6emeia

são um bom exemplo de como o

graffiti pode sedimentar uma car-

reira artística. Anderson Augusto, o

“São”, de 26 anos, é ilustrador, de-

signer e grafiteiro. Chegou a cursar

Design gráfico na universidade

Anhembi Morumbi, mas não con-

cluiu. Leonardo Ávila Fontes, o De-

lafuente, de 27 anos, é artista plás-

tico, desenhista e pintor. Formou-se

técnico em Design gráfico.

Amigos dos tempos de ginásio,

ambos herdaram da família o gos-

to pelas artes. Os irmãos de An-

derson são desenhistas e o pai de

Leonardo é artista plástico. Após

perderem o contato na adolescên-

cia, reencontraram-se em 2006.

Começaram a desenhar juntos, e

então surgiu a ideia de colorir os

bueiros da Barra Funda, onde mo-

ram, com graffitis. “Modificamos

o bairro pra melhor. Todo mundo

está acostumado a ver cinzas e

sujeira. Quando veem algo colo-

rido, um personagem rabiscado,

acham graça e dão risada sozi-

nhos”, diverte-se Delafuente.

Com a iniciativa, veio a necessi-

dade de criar um nome para assinar

os trabalhos. 6emeia foi uma inspi-

ração no único horário em que os

dois ponteiros do relógio apontam

para baixo. “A ideia é fazer as pes-

soas olharem para a calçada en-

quanto andam, prestando atenção

nos bueiros coloridos”, explica São.

A notoriedade veio após a pu-

blicação de fotos dos bueiros na

internet. O Wooster Collective, um

site americano que celebra a arte

de rua, teve acesso às imagens e

publicou uma matéria sobre a du-

pla. Na sequência, o site hospedei-

ro Fotolog escreveu uma reporta-

gem sobre os amigos.

Vários usuários os adicionaram

e começaram a replicar os traba-

lhos. Com isso, outros veículos

entraram em contato, a maioria de

fora do Brasil, como o diário italia-

no La Repubblica, a sucursal irlan-

desa do gratuito Metro e a revista

francesa Shoes Up.

Duo 6emeia deu nova cara à Barra Funda

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Em julho deste ano, o 6emeia

viajou a trabalho para a Europa.

A convite da organizadora do Slot

Art Festival, em Lubiaz, na Polônia,

eles fizeram um trabalho de live

paint (pintura ao vivo) em um mos-

teiro abandonado do século 16,

além de palestras. Da Polônia, São

e Delafuente seguiram para Karsl-

ruhe, na Alemanha, onde pintaram

as fachadas laterais da instituição

de arte Steiger.

Para os próximos meses, a

dupla deve continuar com o pro-

jeto de revitalização de áreas de-

gradas da capital paulista. “Com

essa repercussão toda, a gente

vai tentar alguma autorização

junto à Telefônica e à Eletropaulo

para trabalhar em postes de luz

e telefone”, explica São. Sinal de

que ainda vem muita tinta por aí.

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arte urbana

Page 68: DZ revista de design

Celeiro de ideias, a Bauhaus completa 90 anos em 2009, enquanto estudiosos e profissionais ainda avaliam suas Contribuições para o design mundial

Por gabriella de Lucca, geoffrey Scarmelote e Mariana Pasini

A avó do design moderno

Page 69: DZ revista de design

Bauhaus Dessau, o edifício-sede da escola, desde 1925

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arquitetura

Page 70: DZ revista de design

Cadeira em ripas de madeira, segunda versão, de Marcel Breuner, 1923

Cartaz para a exposição itinerante da Bauhaus em Basileia, 1929 e, abaixo, cartaz de Joost Schmidt para a exposição Bauhaus de 1923, em Weimar

Cadeira de madeira com

contraplacado leve, de Marcel Breuer, 1924

Candeeiro de mesa de vidro, de Karl J. Jucker e Wilhelm Wagenfeld, 1923-24

Tapeçaria de parede de Anni Albers, 1926

Page 71: DZ revista de design

O objetivo último de todo

trabalho plástico é a

construção”. A frase, do

arquiteto alemão Walter gropius,

inicia o manifesto Bauhaus, data-

do de 1919. Em 2009, chegou ao

nonagésimo aniversário a escola

de design mais influente já ergui-

da, tanto por papel e concreto,

quanto por ideias e pessoas. Epi-

centro de círculos de intelectuais e

designers, a Bauhaus, do alemão

“Casa de Construção”, abrigou

um turbilhão de diferentes verten-

tes artísticas no meio de um deba-

te intenso em torno das relações

entre design, artesanato, arte e

indústria. Funcionalistas, produti-

vistas e construtivistas deixaram

sua marca no DNA da escola, fa-

zendo com que essa mistura de

interpretações e pontos de vista

continue sendo sua maior contri-

buição, além de uma influência

inominável em áreas como arqui-

tetura, design, arte e pedagogia.

A Bauhaus procurou fomentar

um design sóbrio, buscando nas

formas geométricas de inspiração

construtivista a linguagem univer-

sal que fizesse dialogar os dife-

rentes gostos dos indivíduos. Essa

linguagem foi a solução da escola

para o problema da forma no de-

sign industrial e unir a arte e a téc-

nica, questão em voga desde o sé-

culo anterior ao do seu surgimento.

Entre as contribuições da escola

para o design atual, estão a aceita-

ção dos metais em móveis e obje-

tos de maneira explícita e aberta, o

que antes era inimaginável.

A escola foi tema de exposição

em Berlim até o mês passado,

no centro de arte Marin-gropius-

Bau, em comemoração aos seus

90 anos. A mostra, batizad de

Bauhaus, um Modelo Conceitu-

al, contoou com peças do Mudeu

de Arte Moderna de Nova York

(MoMa). Até janeiro de 2010, as

Sullivan galleries da School of the

Art Institute of Chicago (SAIC),

nos Estados unidos, abrigam a

exposição Learning Modern, com

instalações, vídeos e trabalhos

difitais inspirados na herança da

escola. é o mundo comemorando

os 90 anos.

Alegre ascensão, litografia de Kandisky, 1923

Carimbo da Bauhaus Estatal de Weimar,

concebido por Oskar Schlemmer, 1992

capa

Page 72: DZ revista de design

Walter Gropius em 1920

Reunião no pátio após o encerramento da escola, em abril de 1933

Jarro com tampa e decoração gravada, de Otto Lindig, 1922

Esquema de cor para interior de um apartamento, Wilhelm Jacob Hess, 1932

Bagas Silvestres de Paul Klee, 1921-22

O Golpe Contra a Bauhaus, colagem de Iwao Yamawaki, 1932; e, à direita,

o primeiro carimbo utilizado pela Bauhaus de 1919 a 1922, concebido

por Karl-Peter Röhl

Page 73: DZ revista de design

Um pouco de história

Antes da Primeira guerra Mundial, a Alemanha promovia uma política de Estado que incentivava a observação do desenho industrial feito ao redor do mundo. “Eles levaram isso tão a sério que chegam a mandar pessoas impor-tantes para fora da Alemanha para in-vestigar e observar como era resolvida a questão do desenho para a indústria e para a arquitetura em outros países”, explica Marcos Braga, professor de His-tória do Design da Faculdade de Arqui-tetura e urbanismo da universidade de São Paulo (FAu-uSP). Ao aplicar tais conceitos na indústria nacional para fo-mentar a competição com a Inglaterra, o país buscava a unificação das formas e a padronização dos gostos, na con-tramão do Arts and Crafts, movimento inglês que pregava a volta ao artesana-to nos moldes medievais, condenando a produção mecanizada. Com objetos tipificados, os bens industrializados ale-mães ganhariam o mercado interno e, depois, o externo.

A partir daí, dois designers e inte-lectuais se posicionaram a partir de vi-sões opostas. Hermann Muthesius, de um lado, defendia formas padronizadas e estandardizadas, que minimizassem diferenciações e pudessem ser produ-zidas – e consumidas – em larga es-cala. Do outro, Henry van der Velde, artista belga do art nouveau, também admitia a importância da produção seriada, mas apostava em peças que permitissem mais experimentações e variações, produzidas num volume me-nor. Enquanto o primeiro condicionava a estética de um objeto à sua funcio-nalidade, o segundo não separava ou diferenciava esses dois aspectos.

Por ser estrangeiro, van der Vel-de não assumiu um projeto novo que se colocava à época: uma escola que unisse o artesanato, a arte e a produ-ção industrial. O escolhido foi o jovem berlinense Walter gropius (1883-1969) que, embora tenha sido inicialmente

influenciado por Muthesius, aos pou-cos se aproximava do modo de pensar de van der Velde. O que o fez mudar de idéia? “A Primeira guerra Mundial, que aconteceu numa proporção vio-lenta, num volume de matança como nunca tinha ocorrido antes, provocou desilusões na intelectualidade com a tecnologia”, explica Marcos Braga. Em 1919, na República de Weimar, surgiu a Staatliches Bauhaus, ou Casa Es-tatal da Construção, a partir da união da Escola do grão-Duque para Artes Plásticas de Weimar, que foi dirigida por van der Velde e fechada em 1915, e de outra Escola Superior de Belas Artes também em Weimar, a Kunst-gewerberschule. Ao fundá-la, com o apoio do governo weimariano, gropius já tinha em mente o foco num design mais artesanal. Como ele pregou no Manifesto Bauhaus, artistas e arte-sãos deveriam, em conjunto, pensar a estrutura dos produtos.

Ao longo de seus breves – mas produtivos – 14 anos de existência, a Bauhaus atravessou fases distintas de acordo com a cabeça de quem a diri-gia. Entre 1919 e 1928, sob a batuta de gropius, a educação voltou-se para o ensino e o estudo do design – ape-sar de seu projeto inicial de dedicação maior à arquitetura, o departamento dessa forma de arte da escola só foi aberto em 1927. O curso, conta Marcos Braga, era configurado entre um gru-po de artes, outro de oficinas artesãs, com a presença do mestre artesão, e um ciclo profissional com a arquitetu-

ra como eixo de formação. “Você tinha uma formação artística, uma formação artesã e uma formação em arquitetura. A Bauhaus recupera alguns conceitos e tentativas de união de arte e técni-ca para qualificar o produto industrial. Isso é um debate típico do século 19.”

Em seguida, quando Adolf Meyer assumiu a direção, a Bauhaus voltou aos ideais de Hermann Muthesius, po-rém de forma adaptada ao comunismo: a padronização traria um barateamen-to dos produtos, que então se torna-riam acessíveis aos operários. Depau-perada, a escola não experimentou grandes inovações com Mies van der Rohe, seu último diretor, e foi fechada pelo regime nazista em 1933.

Por conta do estilo padronizado e frio que pregava, a escola já chegou a ser apontada como fonte de inspiração para os prédios cinzentos e sem vida das grandes cidades e para o desenho apático dos produtos modernos. “Isso aconteceu pela apropriação deturpada do mercado internacional em cima de algumas premissas da Bauhaus ape-nas no lado da linguagem estética, não dos aspectos políticos e sociais de democratizar a boa forma garan-tindo a funcionalidade da arquitetura”, conta Braga.

A Bauhaus influenciou o design das décadas de 1950 e 1960 como nenhu-ma outra escola de design. A partir da fundação da Wtg-ulm, o modo de pen-sar a atividade foi se espalhando pelo mundo. O que hoje é conhecido como “estilo Bauhaus” é o nome dado pelos norte-americanos o trabalho origina-do na insitiuição comandada gropius. Nesse período, entre 1922 e 1923, a Bauhaus chegou ao auge e sofreu maior influência construtivista – o que também contribuiu para que os nazis-tas a relacionassem aos bolcheviques russos, os principais propagadores do construtivismo. um fato interessante é que, anos depois, os próprios nazistas utilizaram as formas da Bauhaus no desenho industrial e na arquitetura – ou seja, o conflito com a instituição era apenas político.

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Brasil? Prazer, Bauhaus

Braga avalia que o grande legado da Bauhaus está no modo do ensino. O estudioso afirma que a instituição ger-mânica, síntese dos debates artísticos que movimentaram o mundo entre os séculos 19 e 20, influencia até hoje a criação de design a partir de núcleos ligados às artes. “Durante décadas, influenciou escolas no mundo todo a ideia de ter uma formação básica que passe pelas artes, pelo artesanato, pela formação técnica e pela formação conceitual das formas. Desde a per-cepção ao trabalho com as cores, essa noção de uma preparação básica é o grande mérito da Bauhaus”, diz.

Interpretar a escola como um con-ceito pedagógico é fundamental para entender sua chegada ao Brasil. O pon-to de vista é defendido pelo professor Pedro Luís Sousa, docente de Dese-nho Industrial na universidade Federal do Rio de Janeiro (uFRJ). “Precisamos salientar que os objetivos de um con-ceito pedagógico são sempre formado-res, ou seja, visam a capacitação de seus alunos para um tipo de trabalho”, explica. “No caso da Bauhaus, um tipo de trabalho inovador. Nesse aspecto, ela teve uma influência muito limitada no Brasil”, defende.

Para Fernando Vázquez, arquiteto espanhol radicado no Brasil que teve a Bauhaus como objeto de estudo de doutorado, a principal porta da institui-ção no país foram as revistas alemãs que circularam, principalmente, no Rio de Janeiro durante a década de 1930 – como a Die Form e Moderne Baufor-men. Vázquez salienta, porém, que o acesso a esses veículos era restrito. “O alemão não era uma língua muito po-pular ou divulgada no Brasil, o que cer-tamente reduzia o número de leitores. Provavelmente, a influência foi mais visual do que erudita”, esmiúça.

Professores e ex-alunos da Bauhaus estiveram no Brasil, porém apenas de forma particular, sem que pudessem

exercer maiores interferências no ensi-no ou mesmo na formulação de con-ceitos pedagógicos. Walter gropius nos visitou, estabeleceu contatos com arquitetos brasileiros, alguns ligados ao projeto do Ministério da Educação no Rio de Janeiro (Affonso Eduardo Reidy, Oscar Niemayer, Lucio Costa, Carlos Leão, Jorge Moreira e Ernani Vasconcellos), considerado um marco da arquitetura moderna do país. Po-rém, segundo Sousa, a influência mais forte nesse projeto foi do francês Le Corbusier e não da arquitetura alemã. O artista plástico e arquiteto suíço Max Bill (1908-1994), cujo reconhecimen-to inicial de seu valor artístico deu-se através da premiação na 1ª Bienal de São Paulo, estabeleceu alguns víncu-los e foi sempre um tema de discussão para grupos ligados tanto ao design como à arte concreta no país. Bill foi um dos responsáveis pela difusão dos conceitos da Bauhaus em todo o mun-do, através não apenas de suas obras nas artes plásticas, bem como em arti-gos e ensaios.

Nascido na Bélgica, Alexander S. Buddeüs também deixou sua marca por aqui. Lecionou durante dois anos no curso de Arquitetura da Escola Nacional de Belas-Artes, dirigido por Lúcio Costa, além de construir alguns edifícios no Rio e em Salvador, onde ergueu, entre 1932 e 1936, o Instituto do Cacau. O arquiteto alemão Alexan-dre Altberg foi responsável por alguns edifícios racionalistas até os anos 1940. Seus trabalhos concentraram-se na então capital federal. Algumas resi-dências foram modificadas, mas ainda estão de pé, na rua Paul Redfern, em Ipanema. “Deve-se interpretar tais in-fluências como um fenômeno indireto, já renovado em relação ao que seriam os pressupostos de uma pedagogia propedêutica da Bauhaus”, destaca o professor da uFRJ. Fernando Vazquez vai além. “A participação desses arqui-tetos na formação da Arquitetura Mo-derna no Brasil pode ser considerada depreciável”, dispara.

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O projeto do Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand (MASP), um dos mais populares

ícones da capital paulista, é da arquiteta modernista ítalo-brasileira Lina Bo Bardi

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No edifício CBI Esplanada, em São Paulo, o polonês Lucjan Korngold

adotou técnicas inovadoras para criar uma arquitetura simples e equilibrada

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Supremo Tribunal Federal, em Brasília-DF

Igreja Nossa Senhora de Fátima, a Igrejinha, também de Oscar Niemeyer. A construção durou apenas 100 dias.

Casa Sommerfeld, Berlim, 1920-21, de

Walter Gropius e Adolf Meyer, foi o primeiro

grande projeto

igrejinha

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Efeitospós-guerra

Segundo Vázquez, o estudo do fenômeno Bauhaus desenvolvido após a Segunda guerra Mundial foi mais importante para marcar algum tipo de influência se comparado à experiên-cia direta, especialmente em design gráfico. “Artistas como Antonio Maluf, criador do cartaz da 1ª Bienal de São Paulo, em 1951, foram fortemente in-fluenciados pela estética tipográfica da Bauhaus”, relata. “Relacionado com este tipo de influencia podemos lem-brar a exposição da obra de Max Bill em 1950. Não encontro, na arquitetura anterior aos anos 1950, influências diretas do ‘estilo’ Bauhaus na arquit-etura moderna no Brasil. O cenário tomou forma, certamente, na órbita do racionalismo francês representado por Le Corbusier e seus seguidores nati-vos, Lucio Costa e Oscar Niemeyer”, completa. Porém, ele ressalta que os anos 1950 foram importantes para marcar uma revisão do pensamento Bauhaus por parte de arquitetos e fun-damentalmente de artistas plásticos.

A presença da Bauhaus no ensino brasileiro, de fato, só pode ser con-siderada através de fontes indiretas, a partir década de 1960, com a cria-ção da Escola Superior de Desenho Industrial do Rio de Janeiro, a ESDI. Essa instituição foi bastante influen-ciada pelos padrões pedagógicos da Hfg-ulm, Hochschule fur gestaltung de ulm, escola alemã fundada no iní-cio da década de 1950, considerada inicialmente como uma sucessão da Bauhaus e dirigida por seu ex-aluno Max Bill. “Outras eventuais influências ou iniciativas isoladas podem ter ocor-rido. Porém, não tiveram um caráter de continuidade, essencial para que se possa analisar criticamente um processo pedagógico”, analisa Sousa. “Professores e ex-alunos da Bauhaus estiveram no Brasil, porém apenas de forma particular, sem que pudes-sem exercer maiores interferências no ensino ou mesmo na formulação de conceitos pedagógicos”, completa o docente da uFRJ.

A arquitetura do Clube dos Marimbás, projeto de Lucio Costa em parceria com Gregori Warchavchik, reflete a herança do movimento modernista

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Bauhaus 2.0Ainda hoje, os conceitos que romp-

eram as fronteiras da cidade germâni-ca de Weimar reverberam nas mais diversas áreas – inclusive a internet. Vinicius Madureira, diretor de arte e publicitário que coordenou diver-sas equipes de criação em agências web, acredita na integração entre a Bauhaus e a rede mundial de com-putadores. Para ele, o fácil acesso à informação via internet diminuiu as disparidades e trouxe à baila um mun-do muito mais voltado para resultados em curto prazo. Por consequência, os jovens se distanciaram dos conceitos de design e arte, inclusive na hora de desenvolver sites. “Essa busca pela perfeição em tão pouco tempo tem feito muitos novos profissionais opta-rem por um caminho curto, ou seja, aprender a executar o design sem entendê-lo”, afirma Madureira. “Vemos muitos que criam com destreza, mas são simplesmente ótimos operadores de computador – que desconhecem, inclusive, os conceitos que utilizaram para criar”, completa.

Formado pela Faculdade Cásper Líbero e Webdesigner pelo Senac-SP, Frederico Antonelli faz coro a Vinícius Madureira. “Aprendemos a técnica, não a teoria. Podemos afirmar que o curso de webdesign hoje equivale ao de datilografia há alguns anos. é uma maneira fácil e rápida de conquistar um emprego”, diz. Para ele, o cenário é alarmante, pois no curso de webde-sign, ninguém pensa em mídias soci-ais. “Quem tem o know-how de progra-mação não se interessa pelo potencial comunicativo da internet. E os jornalis-tas, que são preparados para pensar a comunicação e em como transmitir uma mensagem, não sabem ou não se interessam por layouts para a web”, explica Antonelli. “Aliar webdesign à informação é essencial, é uma nova porta que se abre, mas quase nin-guém explora. Ou por preguiça, ou por distração, ou por ignorância”, conclui.

Para romper esse ciclo, Vinicius Madureira propõe a aplicação da es-tética da Bauhaus na construção das páginas virtuais. Como? “Com um layout simples e funcional. um bom exemplo é o site do tablóide inglês The Guardian”, cita. Os recursos di-sponíveis nas páginas, como barras de busca e nuvem de tags – um espaço que destaca os termos mais presentes no site – também podem ser associa-dos ao funcionalismo da escola alemã. “Essas ferramentas obedecem ao pre-ceito de que a forma deve resultar da perfeita adequação à função. O motivo de uma barra de buscas se adapta à função de procurar o conteúdo dese-jado”, esquematiza. “O problema hoje em dia é saber usar estes elementos na dose certa”, arremata.

De acordo com Madureira, o uso dos conceitos estéticos também con-fere mais identidade ao trabalho do webdesigner. Ele reforça que a Bau-haus primava em ser funcional nos projetos, e que o desenvolvimento de um produto deve reter as necessi-dades de quem irá usá-lo, sempre de forma elegante e com visual limpo. “Designers como Marcel Breuer, que desenvolveu a famosa cadeira Wassi-ly, replicada no mundo inteiro, mostram bem o que é unir a criatividade à es-tética funcional”, lembra. “Traduzir isto para a web é apenas mudar o meio, o design sempre será o mesmo, sempre será projeto, independente do lugar que estiver”, sugere o publicitário. E Frederico Antonelli complementa: “é preciso ter criatividade, sim. Mas é bom lembrar que para alcançá-la são necessários 1% de inspiração e 99% de transpiração”.

Edifício do Congresso Nacional do Brasil inaugurado em 1960 e

projetado por Oscar Niemeyer

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Poltrona Fusca, de Kiko Sobrino e Alessandro Jordão

Esparramados no sofáAliar beleza e conforto nem sempre é fácil. Confira os conceitos e soluções de alguns designers de móveis para conquistar o público.

Por gabriella de Lucca e Nathália Moraes

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Acredito que o design tenha que gerar sensa-

ções”. A sentença é de André Cruz, designer

de móveis que sempre tenta mesclar a beleza

e o conforto em suas criações. Mas nem todos os pro-

jetos conseguem reunir um formato arrojado e confor-

to. Quem nunca bateu o olho em um sofá ou em uma

cadeira, imaginou-se na posição mais aconchegante

possível, mas, após sentar, saiu com aquela dor nas

costas? Aí está um desafio para os projetistas: acertar

na estética e no conforto que o produto proporciona.

Há quem preze o formato do móvel em detrimento à

comodidade. “Tem gente que gosta de comprar deter-

minados objetos que não trazem nenhum conforto, mas

a presença deles naquele ambiente os deixa tão satis-

feitos que isso basta”, explica o designer André Marx.

Nossa reportagem verificou para qual público estão vol-

tados os conceitos que motivam os designers e empre-

sários na hora de criar ou comercializar seus produtos.

Esparramados no sofá

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produto

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S i n E S t E S i a SAndré Cruz está no mercado

desde 1987, quando deixou a área de publicidade para trabalhar com o desenvolvimento de móveis e objetos. “Trabalhei com cinema pu-blicitário e em produtoras grandes, que tinham marcenaria própria. Por isso, sempre que eu construía um cenário, fazia também o mó-vel para ele”, conta. “Essa brinca-deira começou a virar um hobby, e logo se tornou uma profissão”, arremata Cruz. Em seu escritório, o André Cruz Design e Ideias, em Perdizes, zona oeste de São Pau-lo, ele lida com diferentes tipos de projetos, estudos de mercado, re-posicionamento de marcas e cria-ções para empresas de estofados, mobiliário e iluminação.

No quesito conforto, ele acredita que o desenho tem de gerar sensações. “Antes de você sentar em um sofá, para saber se ele é confortável, o desenho tem que passar a sensação de con-forto também. Para mim, a forma, o desenho, todo esse universo de sensações está dentro do design”, explica. “A cadeira e o sofá devem ser bonitos e confortáveis, a base de mesa tem de sustentar um tam-po mais pesado e comportar um número de cadeiras em volta”, diz.

André Cruz já deixou de lançar alguns produtos após sentir que eles não estavam prontos, por mo-tivos de conforto ou problemas na produção. “Acredito que grande parte do que projetei atingiu o equi-líbrio desejado para o lançamen-to. Se algum ficou aquém, corrigi. é claro que o ideal é muito difícil, porque você deve mesclar o custo de uma produção com o preço de venda”, justifica o moveleiro.

No momento de desenvol-ver suas criações, o designer ten-ta se isolar de informações que possam influenciar o trabalho. “Em época de criação, não leio revista, nem jornal. Não quero ter informação externa para poder trabalhar o meu interior”, diz Cruz. A informação interna a que ele se refere vem de seus cadernos de anotações e do seu dia-a-dia. “Cada vez mais, minha referência é a vida, a arquitetura, viagens. Não tenho uma referência espe-cífica, muito pelo contrário”.

Sofá e cadeira branca (acima), do Estúdio

André Cruz: ergonomia e

conforto

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O a c O n c h E g O d a S a r j E t a

André Marx é formado em Fí-sica, mas trabalha com móveis desde 1987. Começou com uma oficina em sua casa e não parou mais. Sua matéria-prima básica é a madeira de demolição, mas ele também usa aço-inox e vidro para os acabamentos. Marx tem como referência o corpo feminino, ani-mais marinhos e insetos.

Para ele, há dois tipos de con-forto: o psicológico e o físico. “Tem gente que gosta de comprar deter-minados objetos que não lhes dão nenhum conforto físico, mas a pre-sença deles naquele ambiente os deixa tão satisfeitos que isso lhes basta”, explica. O designer procu-ra conciliar os dois pontos de vista, mas nem sempre alcança seu ob-jetivo, já que a madeira é um mate-rial duro e às vezes desconfortável. “Posso sentar na sarjeta, num ban-co e num sofá, mas o sofá traz mais conforto que o banco, e o banco que a sarjeta – isso na teoria. Na prática, eu posso estar muito infeliz sentado num sofá e muito feliz sentado na sarjeta, o que não significa que a sarjeta é mais confortável. Mas a mi-nha felicidade suplanta isso”, avalia. Segundo Marx, o bem estar físico varia de acordo com o momento.

Seu trabalho é voltado para ca-deiras, poltronas, espreguiçadei-ras e bancos. Todos os móveis são produzidos por ele na oficina que fica em sua casa, no bairro do Mo-rumbi, zona sul da capital paulista. “Nunca tive nenhum funcionário e espero nunca vir a ter”, afirma. Por conta disso, suas peças são feitas sempre em séries limitas, com cer-ca de doze móveis por linha. De acordo com André Marx, arrumar alguém para ajudá-lo é difícil, por-que ele trabalha com madeira ma-ciça e os marceneiros de hoje não estão acostumados a usar esse tipo de material.

Em São Paulo, três lojas vendem seus produtos: Arango, A Lot Of e Dibot. Mas as criações também che-gam a Brasília e Rio de Janeiro. “Meu objetivo é a arte utilitária, algo que o consumidor use e se sinta bem”, explica. O designer está totalmente voltado para as vendas e procura sempre trabalhar com peças lucra-tivas, mesmo que não goste tanto delas. Pé no chão, Marx é categóri-co: “cultura é muito bonito, mas não paga minhas contas”.

O banco Araribá é feito com madeira de demolição; abaixo, a cadeira Bi

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Amigos há mais de 15 anos, Kiko Sobrino e Alessandro Jor-dão são formados em Artes Plásticas e cursaram, em 2000, a pós-graduação na Domus Aca-demy de Milão. Lá permanece-ram por dois anos e aprenderam com ícones da área, como Karim Rashid, Phillipe Starck e Moroso. Na mesma época, decidiram criar seu próprio estúdio, o Mãos Con-temporary Design, no Brooklin, zona sul de São Paulo. Kiko e Alessandro preferem materiais sustentáveis, mas não trabalham com madeira de demolição nem espumante inflamável. Eles gos-tam de criar com materiais sintéti-cos que possam ganhar um novo uso depois.

Para a dupla, o bom designer deve unir beleza e conforto. “Se a função é sentar, o conforto é primordial sempre”, diz Sobrino. “Como a gente trabalha com ele-mentos naturais, que existem, já possuímos uma facilidade estéti-ca. Nossas criações não partem do nada, então o mínimo que po-demos fazer é nos preocupar com o conforto do usuário”, afirmam. Sobrino acredita que o desenho industrial de hoje valoriza muito mais a beleza, sem se preocupar com a usabilidade da peça. “O design foi feito para servir o ser humano, para ser útil”, avalia.

Os amigos buscam referên-cias em viagens, temas do coti-diano e, principalmente, nos íco-nes brasileiros. Em 2004, veio a Coleção Brasil, com móveis que simbolizam grandes capitais bra-sileiras: a chaise Pão de Açúcar, em homenagem ao Rio de Janei-ro; a poltrona Capô de Fusca, que remete a São Paulo; os bancos Esplanada, com a cara de Bra-sília; os pufes e cadeiras Feijão, simbolizando a Bahia; e, final-mente, a peça Romeu e Julieta, uma ode a Belo Horizonte. Ago-ra, os designers conferem outro viés ao patriotismo. “Hoje vamos para a Europa buscar referências e depois transformamos em ele-mentos brasileiros”, contam.

Os bancos Clicquot estão estre as novas criações dos designers

A chaise Pão de Açúcar faz parte da coleção Brasil

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a S S E n t O S S a u d á v E i S

Escolher móveis para escritó-rio pode ser um desafio, pois é ne-cessário considerar a ergonomia e conforto das cadeiras e mesas. Se a opção não for adequada, o corpo pode sofrer as consequên-cias, como dores crônicas na co-luna, braços e ombros – principal-mente para quem trabalha muito tempo sentado ou digitando.

Esse é o segmento que a Atec Original Design, no mercado des-de 1987, explora. A empresa é uma das distribuidoras oficiais dos produtos Herman Miller, “pio-neiros na pesquisa e desenvolvi-mento de mobília com materiais sustentáveis, design ergonômico e original”, diz João Figueira, di-retor da Atec.

uma das cadeiras comercia-lizadas é a Embody, desenvolvi-da por Jeff Weber e Bill Stumpf. O produto foi capa da revista I.D. na edição Melhores de 2008, que elegeu as criações de destaque no ano passado. “A Embody fa-cilita o fluxo de sangue pelo cor-po e ajuda a cuidar da saúde de quem passa horas em frente ao computador. Ela alinha a cabeça ao monitor e reduz a compres-são na coluna”, explica João. O assento e o encosto do modelo também se adaptam ao corpo e distribuem o peso dos usuários. A profundidade do assento pode se ajustar a diferentes comprimen-tos de pernas. Para desenvolver a peça, foram consultados cerca de 30 profissionais, entre médicos, biomecânicos e terapeutas, que ajudaram a testar as hipóteses e revisar os protótipos.

O modelo Aeron também é co-mercializado pela Atec. A cadeira foi eleita o design da década pela Sociedade Americana de Design e garante mais conforto na região lombar. Outro diferencial é o re-vestimento Pellicle, que permite a ventilação e diminui a pressão do corpo na cadeira. Precisa mais?

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E outros endereços

O n d E c O m p r a r

Aeron Chair garante mais conforto para a coluna. A esquerda, a premiada

cadeira Embody

produto

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O cuteleiro Peter Hammer, que já criou peças para a minissérie A Muralha, exibida em 2000, pela TV Globo

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Ferramenta ou obra de arte?

“Faca é uma ferramenta.

Quando muito bem feita,

com criatividade, é até uma obra

de arte”, explica o cuteleiro ar-

tesanal Pedro guilherme Telles

Rosa – ou Peter Hammer, pseudô-

nimo pelo qual é conhecido. Aos

39 anos e há quase duas décadas

no ramo, esse paulista de Bauru,

cidade a 345 quilômetros da capi-

tal, é um dos 200 brasileiros que

exercem a profissão.

De porte atlético, barbas e

cabelos ruivos e sempre vestido

com roupas camufladas, no me-

lhor estilo exército, Hammer é

constantemente comparado ao

boneco Falcon, da Estrela, lan-

çado em 1978. A semelhança foi

explorada, inclusive, pelo apre-

sentador Jô Soares, durante uma

entrevista ao Programa do Jô em

2002. Mas o homem com cara de

brinquedo está além da carica-

tura. Suas peças, vendidas para

colecionadores e produtores de

televisão e cinema, não passaram

batidas na minissérie A Muralha,

exibida pela rede globo em 2000.

“São facas moldadas a partir de

uma pesquisa histórica, de acor-

do com a época e com o perfil do

personagem que irá manuseá-la”,

explica. E, se alguém tem dúvidas,

“cortam e furam de verdade”.

Hammer divide os clientes em

três grupos. O maior é formado

pelos que usam as facas profissio-

nalmente, seguido pelos amado-

res (pescadores e mergulhadores,

por exemplo) e, por fim, os cole-

cionadores. Apesar de focar-se na

confecção de artigos funcionais,

o cuteleiro lembra que é comum

o público se render primeiro ao

desenho, e não a funcionalidade.

Defensor do trabalho autoral, ele

reforça que o resultado é fruto de

inspiração. “Se alguém copia seu

produto e as pessoas descobrem,

o seu nome acaba”, sentencia.

Com design de encher os olhos, as facas artesanais são desde instrumentos de trabalho para policiais até objetos de coleção

Por Samantha De Tommaso

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Usa-se uma placa laminada de aço, na qual se faz o desenho da faca, recortando-a em seguida. É um processo menos demorado. A maioria das facas usadas em co-zinha são recortadas. “É igual ao molde usado em costura de rou-pa”, explica Silvana. “O cuteleiro corta com serrote a chapa lamina-da, usa também lixadeira, e vai tra-balhando, dando o ângulo certo à faca”. Ao contrário do forjamento – quando a peça fica praticamente pronta a partir do molde, e é neces-sário tirar só o excesso de material – no desbaste é preciso remover bastante as rebarbas até a faca fi-car completamente limpa.

A lâmina de aço (uma combina-ção de ferro com carbono; quanto mais carbono, melhor o aço) é mol-dada a martelo em brasa, ou seja, o aço é esquentado e trabalhado ain-da quente. É um processo que exi-ge excelente habilidade do artesão. “É como brincar de massinha”, ex-plica Silvana Mouzinho. Por ser mais difícil, o processo de forja-mento é o mais valorizado entre os cuteleiros, embora não dê para per-ceber se a faca foi forjada ou des-bastada depois de pronta.

SISTEMA DE FORJAMENTO

SISTEMA DE DESBASTE

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M u l h e r e s A f i A d A sMulher de Hammer, Marina Fa-

rão tem 42 anos, nove dedicados

à cutelaria. Afinado no casamento,

o casal difere na hora de trabalhar.

“gosto de colocar muitos detalhes.

O Peter prefere um desenho mais

limpo”, explica a artista, que criou

a sua primeira peça artesanal para

venda em 2000, em celebração

aos 500 anos do descobrimento

do Brasil. Por sinal, “uma das co-

leções mais admiradas entre todas

que fizeram para a data”, conta o

marido, orgulhoso.

O artigo comemorativo foi con-

feccionado em aço inox, com em-

punhadura de madeira pau-brasil

e o Cruzeiro do Sul desenhado na

lâmina. Cada detalhe foi escolhido

com cuidado para representar as

origens do país. Aos fins de sema-

na, viajava de Lençóis Paulistas,

onde morava, para Bauru, onde

fez o curso, só para poder trabalhar

nesta e outras peças.

A fala serena, o biotipo peque-

no e as mãos miúdas guardam o

pioneirismo de Marina, primeira

mulher a exercer o ofício no país.

Ela trabalha com o marido des-

de que se conheceram, durante

um curso ministrado por Peter

Hammer. Hoje, além do trabalho

artesanal, ela chefia a produção

das facas Wotan, fabricadas pela

empresa Corneta, sediada em

Osasco, na grande São Paulo.

Ao lado de Marina, apenas ou-

tra mulher desempenha essa arte

no Brasil: a paranaense Silvana

Delcorso Lopes Mouzinho, de 50

anos. Quando trabalhava como

secretária executiva em uma im-

portadora de facas de São Paulo,

Silvana visitou uma feira de cute-

laria e se encantou com o trabalho

de Marina Farão. Em 2002, come-

çou a produzir as próprias peças.

Na sequência, decidiu participar

do curso de Hammer. “gosto de

fazer facas pequenas, pontudas e

com cabos arredondados”, conta.

Silvana entende que facas ar-

tesanais são únicas. “Mesmo que

tentássemos criar duas peças

iguais, ou em escala, isso não se-

ria possível... Seria, quando muito,

um processo semi-industrial”, diz.

“Por isso, não tenho um catálogo.

O cliente fala o que quer e até traz

um modelo, mas o produto será

único”, arremata a cuteleira.

Marina Farão criou uma faca para o Brasil 500

Silvana Mouzinho diz que só produz peças únicas

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“Não existe no Brasil uma faca de me-lhor qualidade do que a Wotan em relação à dureza, resistência e funcionalidade”, conta a cuteleira Marina Farão. Wotan é o nome de uma linha de facas especiais para caça, pesca, prática de esportes, uso em comba-te e para colecionadores. Peter Hammer é o responsável pela criação, composta por três diferentes modelos e produzida pela Cutelaria Corneta, uma extinta empre-sa alemã, cuja filial continuou a funcionar no Brasil. De uma ação conjunta entre a Corneta e o Batalhão de Operações Policiais Especiais do Rio de Janeiro (Bope), surgiu

uma nova versão da Wotan 3. Com proces-so de design e fabricação reformulados, a 3K é feita em aço carbono 52100 forjado, tem ponta reforçada e pintura epóxi negra.

A corporação, depois de avaliar e sub-meter a Wotan 3K a rigorosos testes, apro-vou e elegeu essa faca como a preferida dos homens da unidade de combate. Ela é usada como ferramenta para operações es-peciais, isto é, arrombamentos, auxílio em escaladas, montagem de cargas de demo-lição, perfuração de tijolos e, como último recurso, no combate individual para garan-tir a sobrevivência.

A ExCELêNCIA DO AçO DAMASCO

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O quE é uMA FACA WOTAN?

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f A c A d e v A l o r , s A l á r i o n e M t A n t o

Segundo Peter Hammer, cinco

itens valorizam uma faca artesanal:

os valores enxergados pelos olhos

do comprador (qualidade de dese-

nho, acabamento e ajustes); os va-

lores invisíveis (estrutura interna e

material utilizado, não vistos a olho

nu); capacidade de corte; materiais

de valores agregados (um arabesco

especial ou um cabo de marfim de

elefante, por exemplo); e, por último,

a assinatura do artesão, que pode

conferir credibilidade ao produto.

Aliás, credibilidade seguida de

valorização é uma das reclama-

ções de Hammer e sua mulher em

relação a esse mercado. “Se exer-

cêssemos nossa profissão em ou-

tro país, não trabalharíamos tanto

e seríamos mais reconhecidos”,

reclamam. A renda fixa do casal se

resume ao salário de Marina como

chefe de produção da Corneta e

ao que o marido recebe minis-

trando aulas no Espaço-Escola de

Cutelaria Corneta. No terreno da

fábrica, o artesão tem um galpão

que funciona como oficina e es-

cola. Além disso, ambos adminis-

tram a Hammer Assessoria, que

presta apoio a outras empresas

do nicho. Já a produção das facas,

atividade que os dois preferem, é

uma renda extra. “A faca mais cara

do Brasil é de minha autoria, feita

também para a comemoração dos

500 anos, e que foi vendida por

2.500 dólares”, orgulha-se Peter,

que não acredita que feiras e as-

sociações sejam benéficas para

profissão: “Servem mais para tro-

car cartãozinho”, diverte-se.

Já a ex-pupila Silvana Mouzinho

é otimista em relação ao merca-

do brasileiro. Atualmente, dirige a

Sociedade Brasileira de Cutelaria

(SBC), organiza o Salão de Cute-

laria de São Paulo (ex-São Paulo

Knife Show e principal feira do se-

tor, existente desde 2001) e coor-

dena o grupo de discussão Conver-

sa Afiada. “gostamos de facas e de

conversar sobre isso”. Já o foco do

sósia do boneco Falcon, que não

participa muito das discussões,

está na arte em si. “O apaixonado

por facas as produz em primeira

pessoa: pensa que se o objeto não

servir para ele próprio, não vai ser-

vir para o seu cliente”, resume.

Como nada é tão afiado assim,

a arte de fazer facas conta com

um ingrediente nem sempre bem-

vindo. Para Peter Hammer, a maio-

ria dos cuteleiros, assim como ele,

tem um defeito: o prazo de entrega.

“é crônico”, brinca.

Damasco é um processo de caldeamento (fusão de peças de metal por aquecimento) de vá-rios tipos de aço, que formam uma liga extremamente valori-zada para facas. “São aços de diferentes durezas, colocados em camadas, como em uma la-sanha”, explica Silvana. Depois de aquecidos, são dobrados.

Na etapa seguinte, são cor-roídos por produtos químicos, e é aí que se forma o desenho fi-nal. Peter Hammer foi o primei-ro cuteleiro a caldear aços no Brasil, reduzindo o damasco. Ele mesmo explica que fazer um pe-queno pedaço do aço de damas-co pode levar semanas, tamanha a complexidade do processo.

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o n d e c o M p r A r

A ExCELêNCIA DO AçO DAMASCO

produto

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Humberto, à esquerda e Fernando

Irmãos

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CoragemNa contramão

do design seriado, Fernando e Humberto Campana apostam

no trabalho autoral e na

mistura de tendências

Por gabriella de Lucca e Nathália Moraes

entrevista

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Fernando é mais alto que Humberto, muito

extrovertido e falante. O irmão é o seu opos-

to, mais introspectivo e com a fala sempre

objetiva. Já é possível ver nele algumas

marcas da idade e o cabelo grisalho não

o deixa esconder seus 56 anos, ante 48 do caçula. Em

comum, eles guardam a sintonia de ideias e ideais.

Conhecidos internacionalmente, os irmãos Cam-

pana cresceram em Brotas, no interior de São Paulo.

O Estúdio Campana surgiu há 21 anos. Humberto,

formado em Direito, criava peças, objetos e algum

mobiliário. Fernando, arquiteto, foi trabalhar com o ir-

mão. A primeira exposição aconteceu em 1989 e foi

batizada de Des-Confortáveis, mas não teve grande

repercussão. Depois de passarem por tempos difíceis,

veio a recompensa. Em 1998, fizeram uma exposição

no Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMa),

com curadoria de Paola Antonelli, que os lançou para

o mundo. Neste ano, expuseram seu “Jardim de In-

fância” no Museu de Arte Moderna de São Paulo, en-

tre julho e setembro e também assinaram o figurino e

cenário do espetáculo de dança Metamorfoses, exe-

cutado pelo Ballet National de Marseille em outubro.

Mais do que talento, eles tiveram coragem. Enquan-

to o design internacional caminhava para a industriali-

zação, Fernando e Humberto seguiram em outra ver-

tente. Resgataram o trabalho artesanal, teceram novas

superfícies e valorizaram materiais considerados lixo.

Poltrona Banquete Panda

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Os Campana tornaram-se populares no Brasil após assinarem coleções para a Melissa

O Fernando é arquiteto, profissão mais próxima ao design, mas o Humberto

é advogado. Quando vocês começaram a traba-lhar juntos?

HC A profissão chegou até a gente. Nunca pensei em ser designer, queria

ser escultor. Um dia, o Fernando veio me ajudar no meu estúdio, que era de escultura e peças de cerâmica, cestaria. Aí ele ficou até hoje.

FC Acho engraçado porque não teve nenhum programa, nenhuma

estratégia. Fui lá para fazer entrega da parte de cerâmica para lojas de presente, fazer nota fiscal e colar concha nos espelhos que ele fazia [risos]. Acho bacana isso. E até hoje acontece assim, a gente não programa “vamos fazer uma cadeira assim ou assado”. Tem um fluxo que nos leva a fazer um determinado tipo de trabalho ou outro, como trabalhar com sapato ou fazer uma cura-doria. Na nossa primeira exposição, a intenção não era ser comercial, vendável. A gente até chamou de Des-Confortáveis e foi numa galeria que também trabalhava com móveis, na Vila Ma-dalena. Era um lugar totalmente fora de circuito para a época, 1989. Tudo isso foi acontecendo e a gente foi vendo que aquilo tinha uma liga-ção, uma coerência com o que queríamos fazer. A carreira de designer veio ao nosso encontro, mais do que nós a procuramos.

Como vocês começam um processo de criação?

HC Vamos conversando, ou a gente tem uma ideia e o outro termina.

HF Hoje em dia vem muito através de briefing também. Um museu pede

uma curadoria ou a Grendene pede um sapato, por exemplo. Mas existem trabalhos que cor-rem em paralelo. O Humberto tem um hábito de pensar determinado número de materiais e começar a trabalhar. Com isso discutimos e vão surgindo objetos, mas muitas vezes o que era para nascer cadeira nasce luminária ou cres-ce mesa...isso é que é bacana. Não definimos “vamos fazer cadeira hoje”. Primeiro, deixamos o material se revelar, para que depois a gente tenha condições de trabalhar um móvel ou uma luminária ou uma escultura.

Vocês costumam discutir juntos ou cada um dá uma ideia?

HC Discutimos juntos.

FC E é até fácil, porque a gente “viaja” muito junto. Mas hoje, adotamos um

vocabulário de ideias e formas que vamos só transpondo. Às vezes, surge alguma coisa de uma conversa informal. Uma visita ao museu, um espaço, um parque.

Qual linha de trabalho vocês seguem? Como se retratam?

HC Somos designers. Fazemos pontes entre várias disciplinas. Hoje, o design

abrange outras disciplinas como moda, arte, arquitetura. Este é o século de rompimento de fronteiras e não de limitação. Tudo que me inte-ressa relativo a criar significa liberdade. Quando deixei advocacia, queria ser livre, não queria ter patrão, queria viver da minha criação. Para mim, tudo o que é desafio é válido.

FC É um design investigativo, de buscar novas fontes, novas ideias. Às vezes,

elas até vem em um estado mais bruto e não in-dustrializado. Daí temos a paciência de esperar que a técnica e certos processos se desenvol-vam com mais tecnologia ou métodos para que essas peças se tornem industriais e seriadas. Al-gumas peças ficam no limite da escala do ateliê. São séries limitadas. O importante é o trabalho ter nossa alma, nosso conceito. Elas [as peças] têm um poder de comunicar mais forte. Quando não tem isso, nem interessa. Mesmo que seja fazer um carro novo, se não é o carro que a gente pensaria, se é só mudar a lanterna, já não é o que nos interessa. Não temos o tesão de fazer essas coisas, só mudar uma vírgula.

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entrevista

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HC Queremos sempre trazer algo novo.

FC Inverter processos, subverter. A ideia de para quê o material veio. A man-

gueira de aguar jardim, por exemplo, vem com uma determinada função, mas a gente começou a ver uma outra, que é sentar. Então se tornou o plástico de uma cadeira, que produz uma textu-ra. Uma máquina não conseguiria fazer aquilo.

Então a escolha do material começa do zero?

HC Do zero. Às vezes, a forma vem primeiro que o material.

FC É, a forma primeiro e depois a função. Se a gente começar a trabalhar pela

função, vamos ser matemáticos demais e não vai ter a poesia. Não nos prendemos a isso. Deixamos por último o lado mais técnico, mais funcional, para poder trabalhar o conceito, a forma, cor, textura. Uma das características do nosso trabalho é falar alto, depois a gente vai limpando.

Tem algum material pelo qual vocês tenham preferência ou acham melhor

de trabalhar?

HC Estou adorando trabalhar com fibras, vime. É um material que eu acho a cara

do Brasil, do nosso clima. Couro também.

FC Cerâmica também é legal. Mas eu acho que todos nos interessam, desde que

não tenham uma limitação. Para citar um briefing de exemplo: o plástico da Melissa não é o melhor para se trabalhar. Mas eles tiveram a intenção de nos deixar colocar o máximo de PVC reciclável dentro de um calçado: 30%. A gente também está numa outra ponta, com fibras naturais, que é to-talmente contra esse processo. Quisemos mostrar que o PVC é eternamente reciclável. O problema do plástico é ser colocado na natureza sem nenhum outro fim. Mas a primeira coleção nós fizemos quase sem pensar na questão da reciclagem.

Vocês costumam dar preferência para o uso de materiais recicláveis?

FC Sim, mas no início não foi assim. Era o design da escassez. A gente não ti-

nha dinheiro para fazer uma peça de determina-do material, então fomos buscar o que tinha de similar no mercado.

HC A gente só não queria trabalhar com as madeiras nobres, mogno, jacaran-

dá. Teve uma época que trabalhar com jacarandá era sinônimo de design brasileiro. Essa estrada a gente não quis trilhar.

FC Hoje em dia, é óbvio, tem que ter uma escolha para uma matéria ou

um processo que demande menos emissão de carbono. Também tem o que a gente chama de ecologia social. Na verdade, o que nós fazemos é humanizar a produção. Ao invés de só colocar uma máquina e um botão, colocamos dez pes-soas trabalhando. Isso resgata a auto-estima de muita gente. Tem muito vimeiro que trabalha com palha que começa a ficar alcoólatra porque não tem oportunidade. Falta valorização do trabalho. E isso a gente está pouco a pouco resgatando. Muitos dos nossos móveis são feitos à mão, não tem nenhum que seja uma máquina só fazendo.

HC É o slow design.

Vocês citaram a Melissa e algumas condições do briefing. Como é traba-

lhar com uma marca? A empresa dá liberdade?

HC Nosso trabalho tem uma peculiaridade de questionamento. Quem chega até

nós já sabe com quem vai lidar. Não vai querer uma coisa racionalista, toda matemática.

FC Primeiro que a gente nem vai desenvolver. Mesmo colocando o

maximalismo, tentamos entender o processo da empresa para dar esse caráter à produção. Quando a gente vai trabalhar na Itália, com o Alessi ou com a Edra [indústrias de móveis], te-mos mais diálogo do que outros designers com a produção. Já temos esse treino aqui no estúdio. Acho uma vantagem. Enquanto muitos designers trabalham só no computador, no bidimensional, a gente vai na escala 1x1 direto. Isso nos dá uma possibilidade de diálogo com o técnico, com o dono da empresa ou até com o cara que vai aper-tar o parafuso, porque a gente sabe como apertar esse parafuso.

Os irmãos desenvolveram para a marca francesa Lacoste esta edição limitada de 12 camisas, bordadas somente com o logo, que lembra a renda do Nordeste

Cadeiras Harumaki

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Isso é bom, porque vocês participam de todo o processo.

HC Temos uma base. Comecei do nada, fazendo espelho de conchas. Apren-

di tudo, desde nota fiscal, entregas, embalar. Eu e o Fernando sabemos como funciona todo o processo.

FC Tem transportadora que pergunta “como eu ponho isso no caminhão?”.

Até isso a gente tem que saber. Como embalar, como divulgar, como colocar numa vitrine, ex-por. Isso é importante. Hoje em dia, muitos de-signers pensam que essa é a profissão da moda. Você sai, bota uma roupa bonita e uns óculos [risos], tem um carro bacana e pronto: “sou de-signer”. Não é tão assim, mas acho que depende do que cada um quer para si.

Vocês participaram do Salão de Milão deste ano. Isso repercute no trabalho?

HC A Itália abre um mercado pro mundo. Costumam chegar mais convites para

fazer uma exposição, uma mostra, uma ceno-grafia de teatro. Abre portas.

FC A Itália e o Salão de Milão, quando trazem um lançamento, não é para

vender na semana que vem, nem daqui a 15 dias. É para um ano. É um timing diferente do Brasil. Acho que tem tudo aqui, criatividade, mão-de-obra, maquinário, mas não existe uma razão de fazer. Não dá tempo de maturar o projeto ou de informar bem, fazer a opinião do público. Primei-ro começa com a mídia, depois as lojas que vão expor de uma determinada forma na vitrine. De-

mora dois anos para vender. Isso no Brasil não existe, essa persistência de esperar o projeto ficar maduro. Geralmente, o que se lança é uma ideia, um conceito, um protótipo. A gente joga num sa-lão para ver qual é a reação do público, e mesmo que ela seja negativa, eles vão mandar melhorar o projeto, revê-lo, para que tenha uma aceitação. E a gente aprende muito com isso. A cadeira Ver-melha, por exemplo, foi projetada em 1993 e só em 1997 entrou em produção industrial. A cadei-ra Favela é de 1990 e só saiu em 2003. Então, mais paciência do que essa [risos]...não existe. Tem que ter tempo para pensar coisas que sejam mais vendáveis e digestíveis.

Vocês se preocupam em agradar o mercado?

HC Tem peças que são sementes para outras que vão ser mais aceitas.

Não descarto quando um trabalho não dá cer-to, que não vai vender, porque nesse processo vou aprender muito e ganhar maturidade para, mais tarde, voltar nele com um olhar mais apu-rado, sofisticado.

FC Acho que a função do design é atingir o maior número de pessoas. É dife-

rente das artes plásticas, em que há restrição a um tipo de público, ou é uma crítica a um deter-minado comportamento ou situação, um teste-munho de uma época. O design pode fazer isso e ainda levar função. Hoje, acho que é um ins-trumento de comunicação também, porque ele vai - de uma forma muito mais rápida que uma obra de arte - entrar na casa de alguém e come-çar a falar com aquela residência, com aquele público diferente. Você vê pelas exposições de design, como elas têm muito mais público, lei-go mesmo. O design é imediato. Gosto ou não gosto. Nós podemos trabalhar nas duas pontes, tanto fazendo um manifesto através das nossas peças quanto torná-lo comercial e estar na casa de mais pessoas.

Feita de cordas trançadas, a cadeira Vermelha, lançou os designers para o mundo e faz parte do acervo do MoMa

A sobreposição dos pedaços de madeira na cadeira Favela é baseada nas formas dos barracos

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entrevista

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Sofá Sushi

O design brasileiro está ganhando reconhecimento lá fora?

HC Sim. Atualmente, tem criadores brasileiros, alguns moram na Europa,

que estão conquistando espaço.

FC Existe uma enorme procura por design brasileiro. Todo mundo está sempre nos

perguntando o que tem de novo, o que está sur-gindo. O que falta um pouco no Brasil são as esco-las darem mais poesia e liberdade. Toda a escola brasileira forma o profissional para ser industrial, para fazer carro.

HC Deveriam focar para outros aspectos, como o artesanato. O Brasil é rico

nisso. A maioria das pessoas veem como uma coisa inferior.

FC Falta isso para indústria do mobiliário. Por exemplo, o Rio Grande do Sul, se

tivesse mais propostas com desafio, conceito, provavelmente poderia até mudar o processo das empresas que copiam os móveis italianos.

HC O design brasileiro está muito ainda preso aos conceitos modernistas. Isso

me choca. As pessoas às vezes duvidam do nos-so trabalho, eu vejo matérias. Eles se pergun-tam: “será que eles são designers?” [risos].

FC Fazemos todas essas loucuras mas não somos designers. Estamos só brin-

cando. Chamam para dar um tom na festa só. A manualidade não está presente no país. É um ra. As pessoas não consideram a habilidade artesanal. Computador, botão, máquina, isso sim é conside-rado. E não é por aí. O que fazemos também é tra-balhar numa linha muito tênue entre o kitsch e o regionalista. Poderia ficar horrível, até pode. Tem coisas que ficam horríveis mesmo, mas a gente tenta rever e não abortar o projeto. Ele pode ser kitsch e folclórico, popular, sem nenhuma inda-gação, com uma outra linguagem. A renda é uma coisa bacana. O [Renato] Imbroise faz isso, de combinar materiais diferentes. Nós fizemos isso com o vime. O tecedor está acostumado com um padrão de trama, a gente fez com que ele tivesse caroço, tecesse com outros materiais, mas sem deixar que ele perdesse a noção do que está fa-zendo. No começo eles se assustam. Depois, têm mais amor pelo que estão fazendo.

Quais são os projetos que estão em andamento agora?

FC A gente lançou em junho uma edição limitada para a Lacoste, na França. São

três tipos de edição de camisas pólo: uma é espe-cial, que vai para todas as lojas, outra vai só paras lojas conceituais e a terceira é super limitada, tem somente 12 masculinas e 12 femininas. A gente pensou na renda e fez uma pólo só com o logo do jacaré. Você olha e parece uma renda do Ceará. Tem certas coisas que até valorizam o processo. Todo mundo que olhava em Paris dizia “nossa, isso parece renda brasileira”. Mas o processo foi manual, as camisas foram uma a uma costuradas. Tem também a exposição do Vitra Design Museum que vai viajar durante cinco anos por todo o plane-ta e vem para o Brasil.

HC Tem também o hotel em Atenas, um projeto que já dura dois anos. É

de arquitetura de interiores. A gente criou um workshop com estudantes de arquitetura de lá, para eles reprojetarem os móveis. É um hotel an-tigo, então estamos tentando reprocessar tudo o que tem dentro, não jogar nada fora, principalmen-te os móveis. O nosso trabalho é muito alta-cos-tura, alfaiataria, então precisamos ter gente que entenda. Eles fizeram dentro do hotel uma escola.

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Cadeira Café

FC Eles sugerem tudo. Qual vai ser o talher, o prato. Pensar a cultura grega contemporânea e não só a antiga. Era um hotel dos anos

1960, que foi fechado, e depois comprado por esse cara que nos chamou. Ele só pediu que não colocássemos o prédio abaixo, por ser um edifício de seis andares, no centro de Atenas, mas o resto a gente tem liberdade. Nossa maior preocupação foi isso, não pegar o que estava dentro, jogar fora e comprar um novo. Tinha muita coisa de mármore também, mas com racha-dura por causa de terremoto. A gente decidiu polir, limpar e manter aquilo. São cicatrizes de arquitetura.

HC O dono do hotel queria que fosse direcionado mais para o emocional. A gente queria um hotel mais ecológico, mas tivemos

que mudar. Estamos usando plástico por exigência dele, que é um dos maio-res colecionadores de arte contemporânea do mundo e tem um em casa. Fa-lou que queria um hotel arte.

FC E para negócio ainda, porque é no centro de Atenas. A gente está montando uns painéis que são favela. Tudo quanto é móvel antigo a

gente recortou e está recolocando nessas paredes, tem até pedaço de cama. Deve ficar pronto no ano que vem. A crise atrasou um pouco o ritmo da obra. Pra gente é melhor, porque podemos testar mais, só que trabalhamos mais do que foi proposto. Isso mostra que ele tem confiança na gente. Eu não queria fazer um projeto de arquitetura, mesmo depois de 28 anos de forma-do. E a gente aceitou nessa condição de trabalhar como se fosse alfaiataria, alta-costura. Porque arquitetura demora. O Humberto já enjoou do projeto. Eu disse “ah, você vai enjoar dez vezes até ficar pronto”, porque é isso, fazer aos poucos, rever. É diferente do móvel. Estamos acostumados a fazer protó-tipos lá no estúdio e, de repente, já temos uma série de cadeiras do jeito que queremos, na hora que queremos, mesmo que não seja com o material e o acabamento, mas a gente tem o visual daquilo. Lá não, ficamos rabiscando no papel como vai ser, sem ter a dimensão.

Hoje em dia, muitos

designers pensam que

essa é a profissão da

moda. Você sai, bota

uma roupa bonita e uns

óculos [risos], tem um

carro bacana e pronto:

sou designer.

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O jeito meigo e recatado esconde uma moça

tagarela, curiosa e com muita vontade de tra-

balhar. Entre os vícios, usar a palavra “tipo”.

A garota não aparenta a idade que tem, parece mais

nova, e com trejeitos delicados consegue fazer com

que qualquer um sinta-se em casa. Os cabelos cache-

ados e castanhos, a pele clara, o corpo magro, a baixa

estatura e o ar de criança denunciam que as roupas

cheias de mimo, que levam seu nome, só podiam mes-

mo ter sido criadas por ela. Tudo faz parte desse gran-

de pacote menina-mulher que é Karin Feller.

Aos 22 anos, a designer e ilustradora é uma das

mais novas apostas da moda brasileira. Ela mora no

Sumarezinho, zona oeste de São Paulo, num aparta-

mento aconchegante com os pais e irmãos. À porta,

o capacho já mostra a delicadeza da família: em for-

mato de flor rosa, ele recebe os convidados, sobre

uma inscrição em madeira que contém o nome do

clã, “Feller”. Seu quarto, todo em tons de rosa, possui

no mural diversas imagens de referência. Entre eles,

uma foto com looks mais ousados e recados escritos

à mão com canetas coloridas. Suas criações chamam

a atenção pelo visual despojado, à la street, e os vo-

lumes. Detalhes suaves e femininos, como drapeados

e babados, e a brincadeira com materiais inusitados,

como clipes de papel, também são exemplos de suas

marcas registradas. Nas figuras e desenhos que pro-

duz em fluxo constante, o toque feminino dá o tom.

Como uma menina que passava as tardes desenhando encontrou na moda a sua vocação

B onequinha de luxo

Por Mariana Pasini e Nathália Moraes

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Karin é assistente de estilo

da designer de moda carioca Ju-

liana Jabour, que é toda elogios

para a jovem. A pupila afirma ter

total liberdade para apresentar

ideias novas à estilista consa-

grada ou mesmo recriar suas

peças antigas. Para aguentar o

dia-a-dia maluco e conciliar as

criações próprias com a assis-

tência à Jabour, a jovem estilis-

ta tem a sua receita: “Força de

vontade, disciplina, organiza-

ção, garra e coragem. Tem que

ter lista de coisas para fazer no

dia e não pode deixar nada para

depois”. Mesmo sendo difícil,

vale a pena, ela garante.

Por isso, sempre anda com

um caderno de anotações. “Se

deixar escapar uma ideia, você

não lembra mais. Tem que ficar

rabiscando e depois pegar to-

dos aqueles rabiscos e organi-

zar”, aconselha. Desenhar, para

ela, sempre foi uma atividade

divertida e espontânea. “O tema

da coleção sempre surge para

mim, nunca tenho que pensar

muito. Escuto uma música, vejo

alguma coisa nova, e pronto,

está aí o tema”, ela explica.

Karin Feller é assistente da estilista Juliana Jabour

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moda

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Karin deixou Tel Aviv, em Isra-

el, onde nasceu, aos 9 anos. Veio

para o Rio Grande do Sul e de lá

para São Paulo. Sua convivên-

cia em família sempre foi ótima:

“Eu era a irmã que mima e que

cuida”, conta. Com um pé nas

artes desde criança, ela assus-

tou seus pais quando decidiu ser

desenhista de rua. A família não

aprovou totalmente a tendência

da filha para esse ramo artístico

e procurou direcioná-la para uma

profissão menos arriscada. Foi

assim que Karin encontrou sua

vocação na moda.

Formada pela Faculdade Santa

Marcelina em 2008, no mesmo ano

ganhou destaque na 23ª Casa de

Criadores, evento anual que traz o

que há de novo no circuito alterna-

tivo de moda. Seu projeto de con-

clusão de curso, inspirado na teo-

ria do caos, rendeu-lhe o prêmio

máximo na 1ª edição do concurso

Ponto Zero, que divulga o trabalho

de designers em início de carreira,

ainda estudantes. A sensação da

vitória? “Incrível! Foi tipo, pronto,

Karin, agora você entrou no rio,

tem que nadar!”, brinca.

Para o verão de 2010, Karin

apostou na textura de São Paulo

como mote inspirador. Na coleção

apresentada na Casa de Criado-

res deste ano, a estrutura da ci-

dade apareceu em estampas, for-

mas e tie-dye, colorida em tons

claros e delicados, como rosa e

laranja. Fugindo do óbvio – “quan-

do é literal, perde a graça”- Karin

sabia o efeito que queria causar

no público: “Você olha para aquilo

e fala, nossa, de onde veio?”.

Ansiedade não é palavra dis-

tante de seu vocabulário cotidiano.

“Dá também um pouco de medo,

mas sou jovem. Se errar, ainda dá

tempo de consertar”, afirma. Re-

cém-saída do mundo adolescente,

já com um pé na vida adulta, Karin

tem uma visão madura do merca-

do. “A concorrência está crescendo

muito. Só ‘bom’ não serve, só ‘ta-

lento’ não adianta. Tem que ter vi-

são e pensar em negócio, ter o pé

no chão e ir devagar”, enumera. A

moça acredita que o mundo tende

a cada vez mais ser atraído pelas

criações dos designers brasileiros.

Hoje, a jovem estilista busca

inspiração para seu próximo des-

file no tema das bonecas russas,

trabalho que sempre adiou, mas

que agora vem com força total.

Quais serão as estampas e mo-

tivos que devem surgir da cabeça

de Karin Feller? O público desco-

brirá na 26ª edição da Casa de

Criadores, de 17 a 27 de novem-

bro, que mostrará a coleção outo-

no-inverno 2010. Mas para chegar

lá, bem como ao reconhecimento

pleno, uma coisa é certa: a estilis-

ta ainda terá muito trabalho.

Escuto uma música,

vejo alguma coisa

nova, e pronto, está aí

o tema [da coleção]

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moda

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Na contramão do mercado mundial de luxo – que em 2009 pode

sofrer uma recessão de até 4% segundo a consultoria Eurostat

e o banco JP Morgan – o Brasil segue otimista. Lá fora, o setor

joalheiro, que anualmente movimenta 15 bilhões de dólares, já sentiu os

efeitos da crise. Detentor de marcas como Montblanc e Cartier, o conglo-

merado suíço Richemont anunciou uma queda de 12% nas vendas no

último trimestre do ano passado.

Em terras tupiniquins, as exportações do setor joalheiro rendem cerca

de 100 milhões de dólares por ano. Fomentado pela riqueza em matérias-

primas e pelos investimentos na especialização de ourives, o mercado de

joias e bijouterias no Brasil quer ousar não só na forma dos produtos, mas

nas estratégias para se manter firme no segmento.

Ainda com participação tímida no PIB do país, o mercado de joias, bijuterias e folheados cresce a passos largos e fortalece a identidade brasileira no cenário mundial

A mArcA BrAsil

Por Geoffrey Scarmelote

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NEM TuDO O QuE RELuZ...O nicho de bijuterias e folheados

não integra o mercado de luxo. Ape-

sar disso, movimenta cerca de 220

milhões de dólares por ano e gera

mais de 200 mil empregos diretos

no país – cujo Produto Interno Bru-

to (PIB) está na casa dos 2 trilhões

de reais. uma participação ainda

pequena para a empresária Vera

Masi, diretora-executiva da Bijoias,

o maior evento do setor na América

Latina. “Estamos nadando de bra-

çada. Na última edição da feira, em

agosto, registramos um crescimen-

to de 26% em relação ao mesmo

período do ano passado”, comenta.

“Diante dessa alta, aguardamos um

aquecimento de 35% para a pró-

xima edição, que acontece nesse

mês”, completa Masi.

Criada em 1990, paralela a

Feira Internacional da Indústria

Têxtil (Fenit), a Bijoias foi inspira-

da na Semana de Moda de Paris,

onde, simultaneamente aos des-

files, aconteciam também os lan-

çamentos em bijuterias e aces-

sórios. Hoje, há de se ressaltar,

o terreno está mais arado do que

há duas décadas. um dos moti-

vos é a difusão do mercado e a

formação de novos profissionais,

voltados aos conceitos de moda.

“Há 20 anos, era impossível ima-

ginar um curso de design de joias.

Hoje, conseguimos manter um

núcleo de extensão só para essa

área”, conta Andréa Tibery, dese-

nhista industrial e professora da

universidade de Brasília (unB).

“Antes, a ourivesaria apenas in-

tegrava a grade do curso de De-

senho Industrial. O interesse dos

alunos pela área despontou com o

fortalecimento da moda no país”,

explica Tibery.

Na unB, o departamento de

Desenho Industrial e o Laboratório

de Joias, coordenado por Tibery,

oferecem cursos semestrais nas

áreas de pesquisa e extensão em

Joalheria Básica e Desenho Téc-

nico de Joias. Nas aulas, o discen-

te tem contato com os metais, pro-

cessos de laminação e fundição e

representação de projetos até a

execução final da peça.

A Mirácolo, de Presidente Prudente/SP, explora pérolas e pedras naturais em sua ampla linha de colares. Destaque para os modelos clássicos, feitos com pérolas de água doce, com tamanhos que vão de 0,45m a 1,60m. Aliás, as pérolas cultivadas em água doce vêm, em sua maioria, dos lagos e rios da China. Elas têm formato assimétrico, brilho médio e alto e podem ser brancas ou ter sombreado rosa ou vermelho claro.

Peça da coleção Canaã, de Adriana Bragança

moda

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A grife Franco George, Uberlândia/MG, está sintonizada aos apelos das mulheres em total sintonia com a moda. Para a próxima temporada, aguarde brincos poderosos, com pérolas e cristais, aliados às cores quentes.

A mistura do vintage com o futurista dá vida à nova coleção da Euro Relógios. De um lado, o ar retrô que traz a tona recordações clássicas e atemporais. De outro, construções arquitetônicas e formas geométricas mostram um design único e totalmente novo, tal qual apontam as tendências da temporada.

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MADE IN BRAZILMercado aquecido, profissio-

nais especializados e fartura em

materiais são elementos que for-

talecem o design brasileiro no

mercado externo de acessórios.

Mas o principal ingrediente dessa

equação está na ousadia de nos-

sos profissionais. “Embora a moda

siga um comportamento mundial,

o brasileiro tem muita criatividade,

sempre busca materiais alternati-

vos e explora diferentes técnicas

artesanais”, defende Vera Masi.

“Aqui, transformam até mesmo

folhas caídas e escorpiões em

joias. O brasileiro extrapola as

diretrizes das tendências e

simplesmente cria.”

Adriana Bragança está nes-

se time. A designer carioca tem

entre suas clientes celebridades

como as apresentadoras Xuxa

e Ana Maria Braga e as atrizes

Juliana Paes, Deborah Secco e

Rosa Maria Murtinho. Apesar da

clientela estelar, Adriana mantém

a humildade. “O segredo é o mes-

mo de qualquer outro negócio:

diversificar, buscar sempre algo

diferente”, conta. “Gosto de tra-

balhar com pedras únicas, como

lodolita, rutílo, cocochonita e la-

bradolita, que já tem consigo a

exclusividade”, arremata a desig-

ner, que estudou moda nos Esta-

dos unidos.

O brasileiro

extrapola as

diretrizes das

tendências e

simplesmente cria

Adriana Bragança com o ator Eriberto Leão e, ao lado, com Rosamaria Murtinho

moda

Page 112: DZ revista de design

O CAMINHO DAS PEDRASDurante a criação, Adriana pre-

fere que as próprias pedras indi-

quem a forma, de modo intuitivo,

sem uma concepção prévia do

produto final. E por falar em cami-

nho das pedras, foi um momento

de dificuldade financeira que a le-

vou para as bijuterias. “Em uma

fase muito difícil da minha vida,

meu marido, empresário, foi para

o Japão e me deixou uma reserva

em dinheiro. Com ela, comprei os

primeiros materiais”, relata.

O brilho nos olhos e o sorriso

estampado no rosto não deixam

escapar o prazer que essa cario-

ca da gema tem no que faz. “O

sucesso é só a consequência de

um bom trabalho, fui muito aben-

çoada!”. O novo catálogo foi ba-

tizado para expressar essa grati-

dão: Canaã, a terra prometida por

Deus no Antigo Testamento.

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O Brasil é a inspiração das criações da carioca Adriana

Colares, pulseiras e aneis bem coloridos, para alegrar o look feminino e ressaltar o visual das mulheres modernas. Essa é a aposta da Philipines, que juntou miçangas e contas às pedrarias artesanais e pulseiras de madeira e de resina, como nesse conjunto, em ametista.

Page 113: DZ revista de design

FuTuRO BRILHANTE?A previsão para o setor de aces-

sórios genuinamente brasileiros é

otimista. Vera Masi explica que

esse nicho não tem limites para

crescer, pois mexe com a vaida-

de feminina e masculina. “Nossos

designers são criativos e ousados,

se inspiram na flora e fauna brasi-

leiras, que são únicas. Nosso povo

é alegre e extrovertido e encanta

todo o mundo. Tudo isso cria uma

situação bastante favorável aos

nossos produtos”, afirma a empre-

sária, entusiasmada.

Mas o diagnóstico não vem só

do ufanismo. “Com a retração da

economia, bijuterias e acessórios

são mimos acessíveis, além de fa-

zerem bem ao ego feminino”, es-

miúça a empresária. “Além disso,

a confecção de acessórios se tor-

na fonte de renda alternativa para

muitos trabalhadores que tiveram

seus rendimentos comprometidos

com a crise”, completa.

A grife Piu Bella traz novidades com modelagens mais leves. Aneis, colares e pulseiras de aço escovado chegam ao país com banhos diferenciados, como o Ionizado, o banho Brown e o banho em dourado, que conferem sofisticação às peças. Além disso, os produtos são hipoalergênicos.

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moda

Page 114: DZ revista de design
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“Minha v id a é uma montanh a - russa”

Page 117: DZ revista de design

A designer gráfica Fabiana Daniel acredita na renovação e aposta na ousadia para se manter no mercado

Por Geoffrey Scarmelote

A porta do guarda-roupa, forrada por

cartões postais e cards promorcio-

nais, e os cartazes de filmes antigos

espalhados pelo escritório dão a pista: ali

mora uma designer. Aos 22 anos e egressa

da Faculdade de Belas Artes, a paulistana

Fabiana Daniel vive com a família no bairro

da Penha, zona leste da capital.

Técnica em Publicidade pela Fundação

Escola de Comércio Álvares Penteado,

“Fabi”, como é chamada pelos familiares

e amigos, entrou em contato com as fer-

ramentas de editoração logo cedo. “Aos

14 anos, fui apresentada ao bom e velho

Corel Draw, e meu interesse por diagrama-

ção e tratamento de imagens foi desperta-

do”, comenta. Para o Trabalho de Conclusão

do Curso Técnico, ela criou uma agência

de comunicação integrada e executou uma

campanha de marketing direto, com mais

de 30 peças publicitárias, para a rede va-

rejista Magazine Luiza. “Foi uma correria,

era muito nova e o nível de exigência do

colégio era o mesmo para alunos de En-

sino Superior”, lembra. “Mas valeu a pena,

porque ali percebi de fato o quanto queria

ser uma designer”, diz a moça, que ficou

responsável pela parte gráfica do projeto.

“Minha v id a é uma montanh a - russa”

FO

TO

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C.H

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PoRTFÓLIo

Page 118: DZ revista de design

Ainda durante o Ensino Médio,

começou a trabalhar como ope-

radora de atendimento no Núcleo

Brasileiro de Estágios – Nube. Foi

o primeiro passo de uma carreira de

quase sete anos dentro da empresa,

onde está até hoje. “Pouco depois

de iniciar a faculdade, em fevereiro

de 2005, fui promovida ao setor de

comunicação”, explica.

Lá, Fabiana participou de diver-

sos projetos. “Tive a oportunidade

de acompanhar a modernização do

logotipo, a mudança de identidade

visual e hoje coordeno toda a área

de criação e desenvolvimento de ma-

teriais institucionais e de vendas da

empresa”, enumera. No desenvolvi-

mento dessas atividades, a designer

conta com ferramentas como Adobe

Illustrator e Adobe Photoshop. Seus

referenciais teóricos vêm de profis-

sionais como Jinyoung Shin, Vanyam

James Jean, David Carson, Paula

Scher, Sagmeister, Paul Rand e Ne-

ville Brody. Mas ela enfatiza: “cos-

tumo caminhar na contramão das

faculdades e teorias, que buscam

um design moldado, sem persona-

lidade própria. Meus jobs respeitam

a cultura das empresas e a identida-

de visual dos clientes com os quais

trabalho, mas sempre tento inserir

um ‘temperinho’ meu nas coisas.

Isso faz com que o resultado tenha

um pouco do meu sangue criativo”.

Além do Nube, ela trabalha com ou-

tras empresas, como freelancer, que

“funcionam como um exercício para

não cair na rotina”.

[os freelances]

funcionam

como um

exercício

para não cair

na rotina“Minha vida é um

a m o n t anha-russa”

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Page 119: DZ revista de design

Cartaz criado pela designer

“Minha vida é uma

m o n t anha-russa”

PoRTFÓLIo

Page 120: DZ revista de design

Trabalhos feitos por Fabiana

o debate sobre

qualquer tipo

de design é um

pouco de mim

também

“Mi n h a v i d a é u m a

mon t a n h a - r u s s a ”

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Page 121: DZ revista de design

estágiosSaber

Para se manter no segmento, cultiva uma

visão ousada. “Para mim, o design é simples,

objetivo e não requer reflexão e sim interpreta-

ção, ou seja, o debate sobre o qualquer tipo de

design é um pouco de mim também”, explica.

“Há muitas oportunidades e quem é competen-

te e persiste acha espaço em qualquer merca-

do. A área tem crescido no Brasil e espero que

continue crescendo com o valor do desenho”,

acrescenta Fabiana.

Para o futuro, sonhos e realidade se misturam

em uma atmosfera repleta de cores e formas.

“Costumo dizer que minha vida é uma verdadeira

montanha-russa! Todos os dias, acordo com uma

maneira diferente de pensar e agir. Talvez isso

seja um reflexo do meu trabalho, pois sempre te-

nho projetos diferentes para realizar e aprendo

todos os dias”, sentencia. “Meu sonho sempre foi

trabalhar em uma gráfica. Adoro cores e gosto

de ver a magia acontecer. Mas o dinamismo de

uma agência de publicidade sempre me chamou

muita atenção. Cada dia é um dia, e procuro vi-

ver intensamente cada um deles. O que pode

acontecer amanhã? Você sabe?”.

“Mi n h a v i d a é u m a

mon t a n h a - r u s s a ”

PoRTFÓLIo

Page 122: DZ revista de design
Page 123: DZ revista de design

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Page 124: DZ revista de design

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Page 125: DZ revista de design

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Aos poucos, o mundo do design começa a reconhecer e usar o potencial da madeira de eucalipto

De vilão a mocinho

Por Mariana Pasini

Page 129: DZ revista de design

O eucalipto é pau para toda obra. Lugar-comum quando o assunto é celulose e papel, o público pode não vê-lo com

bons olhos, mas cada vez mais faltam argumen-tos para sustentar o preconceito contra a qua-lidade do material. Com cerca de 20 espécies introduzidas no Brasil, a grande vantagem da árvore é a alta produtividade em menos tem-po e utilização de pouco espaço para plantá-lo. Versátil, ele é matéria-prima para diversas apli-cações, desde a estruturação interna à compo-sição de cadeiras, mesas, estantes e armários. Impacto ambiental? Apenas quando derrubada a mata nativa para que seja cultivado. A planta apresenta até uma vantagem em relação a ou-tras, notadamente o Pinus (gênero da planta), por permitir a divisão do seu território com ma-tas nativas sem invadir suas áreas.

No país, as primeiras mudas de eucalipto fo-ram trazidas da Austrália, de onde é originário, na década de 1860, como mero objeto de curiosi-dade. Mas foi em pleno desenvolvimento cafeeiro paulista da virada do século 19, após intensas pesquisas do agrônomo Edmundo Navarro de Andrade, que a planta ganhou um objetivo co-mercial definido: combustível para as caldeiras dos trens que transportavam café, o que poupou boa parte das nossas matas originais.

O designer deve atentar a qual espécie usará.

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meIo ambIenTe

Page 130: DZ revista de design

Os exemplares mais duros e densos são os mais propí-cios para a fabricação de objetos e móveis, ao contrário dos mais leves, próprios para serem moídos e virar ce-lulose ou papel. O saligna, por exemplo, é um material leve, porém pouco resistente. O citriodora, no entanto, é uma madeira robusta e durável. Algumas definições são aplicáveis a todas as espécies e devem ser levadas em conta pelo profissiona que deseja trabalhar com elas. Guido Otte, presidente da construtora catarinense de móveis Butzke, resume eucalipto uma palavra: nervoso. “Genericamente, os eucaliptos produzem madeiras com grandes tensões, geradas por retrações tangenciais e radiais”, explica. Além disso, as fibras da madeira de eucalipto não são as formas mais organizadas da natu-reza: tortas e rebuscadas, diferente de outros gêneros, elas diminuem um bocado o poder de corte de serras comuns e exigem mais precisão para que a madeira não empene depois. Seu processo de secagem tam-bém é difícil: quando não respeitadas as características de cada espécie, as chances de problemas futuros são altas. Felizmente, esses problemas podem ser contor-nados com a tecnologia adequada.

O eucalipto cresce reto e seus galhos ficam mais para cima. é possível administrar o fornecimento da madeira

e ter um controle maior sobre o resultado final. Dados de 2006 da Sociedade Brasileira de Silvicultura apontam uma produtividade de 30 a 40 metros cúbicos por hecta-re para o gênero. Deve-se, no entanto, prestar atenção que uma árvore que se adaptou bem a uma área não necessariamente o fará em outra. Além disso, deve-se repor o solo de maneira orgânica ou até química.

Matéria-prima barata em relação às outras madei-ras no mercado, é grande seu potencial comercial nas classes C e D. Mesmo assim, o mercado de eucalipto para móveis e objetos ainda é pulverizado, sem muitas empresas de alto porte. O designer Christian ullmann, porém, não endossa o coro dos entusiastas da madeira de eucalipto. Nascido em Buenos Aires e radicado no Brasil desde 1996, ele prefere o diferencial das nossas madeiras nativas. “O eucalipto não é uma madeira char-mosa nem tem apelo, não dá vontade de trabalhar com ela”, dispara. Para ele, a madeira australiana será sem-pre um “bastardo do setor florestal”.

ulmann também questiona quão bom pode ser o ne-gócio do eucalipto sob a ótica do custo ambiental que seu cultivo pode acarretar. O designer alerta que derru-

É isso que nós,

designers, fazemos

errado por enquanto:

ainda não descobrimos

como tirar proveito

dessa madeira de uma

forma mais inteligente

Page 131: DZ revista de design

bar mata original para plantar eu-calipto não é, de modo algum, um negócio sustentável, pois além de acabar com a flora original, uma flo-resta de reflorestamento não pode ser habitada por animais ou comu-nidades ribeirinhas. Mesmo dentro da possibilidade de uma plantação que atenda aos princípios ambien-tais, ele se pergunta: “E por que não plantar madeira nativa?”.

Para o moveleiro, somam pon-tos contra a madeira a memória negativa que o público tem dela, construída, segundo ele, por em-presários que procuravam lucro fácil nas décadas de 1980 e 1990.

Mesa bar e Chaise Ibiza

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meIo ambIenTe

Page 132: DZ revista de design

Sofá Duna

Para o moveleiro, somam pontos contra a madeira a

memória negativa que o público tem dela, construída,

segundo ele, por empresários que procuravam lucro

fácil nas décadas de 1980 e 1990. Até hoje, o porte-

nho argumenta, ninguém parou para pensar qual é a

melhor aplicação para o eucalipto. “é isso que nós, de-

signers, fazemos errado por enquanto: ainda não des-

cobrimos como tirar proveito dessa madeira de uma

forma mais inteligente”, arremata.

A arquiteta e designer catarinense Marina Otte

aposta na criatividade como solução do impasse. Filha

de Guido Otte, da Butzke, ela trabalha com o euca-

lipto desde 1998 e aposta que, dentro dos limites da

madeira, é possível proceder de várias formas. Marina

exemplifica o ponto de vista com um modo engenhoso

para driblar a dificuldade em obter formas curvas: usar

partes seccionadas. E já que a cor natural do euca-

lipto não é um grande atrativo, mais clara do que, por

exemplo, o mogno ou a imbuia, com as quais as pes-

soas estão mais acostumadas, tingi-la é uma opção.

“A gente tem que se adaptar ao material que escolhe”,

defende Marina, para quem o eucalipto em ripas é o

mais fácil para trabalhar. Ela não nega que a certifi-

cação florestal, que limita os riscos ambientais e visa

garantir o reflorestamento, encarece o produto final. “O

eucalipto pode ser mais caro na hora da compra, mas

se você conservar bem e considerar que pode durar a

vida inteira, com certeza é mais barato”.

Page 133: DZ revista de design

Marina Otte

Mesa pufe Duna

Até hoje, o portenho argumenta, ninguém parou para pensar qual é a melhor aplicação para o eucalip-to. “é isso que nós, designers, fa-zemos errado por enquanto: ainda não descobrimos como tirar pro-veito dessa madeira de uma forma mais inteligente”, arremata.

A arquiteta e designer catari-nense Marina Otte aposta na cria-tividade como solução do impasse. Filha de Guido Otte, da Butzke, ela trabalha com o eucalipto desde 1998 e aposta que, dentro dos li-mites da madeira, é possível pro-ceder de várias formas. Marina exemplifica o ponto de vista com um modo engenhoso para driblar a dificuldade em obter formas cur-vas: usar partes seccionadas. E já que a cor natural do eucalipto não é um grande atrativo, mais clara do que, por exemplo, o mogno ou a imbuia, com as quais as pessoas estão mais acostumadas, tingi-la é uma opção. “A gente tem que se adaptar ao material que escolhe”, defende Marina, para quem o eu-calipto em ripas é o mais fácil para trabalhar. Ela não nega que a cer-tificação florestal, que limita os ris-cos ambientais e visa garantir o re-florestamento, encarece o produto final. “O eucalipto pode ser mais caro na hora da compra, mas se você conservar bem e considerar que pode durar a vida inteira, com certeza é mais barato”.

Para Ricardo Cardim, mestrando do Instituto de Biociências da uni-versidade de São Paulo, o principal desafio relacionado ao eucalipto é a tecnologia. “Há muitas espécies e o potencial ainda não foi totalmen-

te estudado para a indústria move-leira”, enumera. “O eucalipto não é fácil de serrar e tem uma secagem complicada, que precisa respeitar a anatomia de cada espécie. Mas toda madeira é boa, dependendo do uso que você vai fazer dela”, alerta Cardim.

Ele acrescenta que a sustentabi-lidade é uma questão de metodolo-gia e a possibilidade de um cultivo sustentável do eucalipto é latente. Como os próprios consumidores estão cada vez mais exigentes quanto à certificação da madeira, o negócio de madeira reflorestada começa a realmente valer a pena, segundo sua avaliação. O biólogo derruba o mito de que o gênero absorve muita água. “Por crescer muito rápido, ele precisa de muito nutriente e também de muita água para formar toda a sua estrutura”, esclarece. O que precisa ser feito é a reposição dos nutrientes do solo de maneira orgânica ou química. E o estudioso dá o veredicto: “O euca-lipto em si não é o vilão, mas uma ferramenta para a produção de ma-deira que nós precisamos tanto”.

A árvore nunca terá a qualidade ou até o luxo das chamadas madei-ras de lei, mas cresce a uma veloci-dade surpreendentemente rápida e responde bem se trabalhada com a tecnologia adequada. Além disso, é de se perguntar que outras opções restam ao designer que deseja tra-balhar com madeira, já que a ex-tração e a exploração de material nativo da Amazônia estão proibidas pelo Código Florestal. Para resolver o dilema, vale o conselho de Mari-na Otte: “a questão é se adaptar”.

meIo ambIenTe

Page 134: DZ revista de design
Page 135: DZ revista de design
Page 136: DZ revista de design

Por Mariana Pasini

Também conhecida como madeira de redescobrimento,

ela começa a despontar no mundo do design. Entre suas

vantagens, estão a reutilização e a reciclagem de com-

ponentes que, de outra forma, não seriam tão bem aplicados e

poderiam inclusive ser esquecidos. Cynthia Marzola, lojista da

Raízes Design e apaixonada por madeira, esmiúça alguns deta-

lhes sobre essa matéria-prima cujo uso só tende a crescer.

Page 137: DZ revista de design

Poltrona Mônaco

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10 PeRgunTas sobRe

Page 138: DZ revista de design

A chamada madeira de demolição é basicamente madeira antiga, utilizada

em construção civil, aplicada no design?

RD Sim. Na maioria das vezes, a madeira vem de casas que são derrubadas no

interior de Minas e do Paraná, substituídas por obras de alvenaria. Para não desperdiçarmos esse material, aproveitamos para transformá-lo num móvel de design bacana. As madeiras são todas de aproveitamento de casas derrubadas.

Elas sofrem tratamento?

RD Todas elas passam pelo tratamento total: descupinização, lavagem, cla-

reamento, para dar o tom que você quiser. Em seguida, são aparelhadas. E isso de acordo com o que você for fazer. Se for um piso, fazemos o macho-fêmea [peças que se encaixam]; se for só para móveis, ela recebe o tratamento normal e é trabalhada dentro do design da peça.

Não há mais o problema de a madeira estar verde?

RD Não é bem assim. Na madeira, todo mundo se engana um pouco com

isso. Perguntam “a madeira é centenária, en-tão ela não vai abrir?” Vai. Com toda madei-ra, deve-se evitar o máximo possível do uso contínuo em áreas externas, que pedem ma-nutenção. A madeira é linda? Sim, mas corre o risco de abrir. De acordo com a região para onde vai, ela pode abrir inteirinha sem o refor-ço adequado. É como o ser humano: tem vida e continua trabalhando.

Uma vez tratada, o que pode ser feito com ela?

RD De tudo! Eu, por exemplo, trabalho desde o revestimento de pisos, pare-

des, tetos, pergolados, bancadas pra lavabos até os móveis de design. Resolvi inserir produtos modernos para dar uma cara contemporânea à madeira de demolição. Entrei com o corian, que é uma resina. A bandeja Panamá, por exemplo, tem o apoio em madeira e as alças em corian. A poltrona Mônaco tem vidro. Ao misturar com produtos mais modernos, emprego menos ma-deira. Ou seja, uso mas não abuso da madeira de demolição.

Usar a madeira de demolição é promover design sustentável?

RD Exato, pois preserva a biodiversidade e os ecossistemas naturais. Ao invés

de derrubar uma árvore para fazer um móvel, aproveita-se uma madeira que está em uso há

muitos anos. Para o empreendimento humano ser sustentável e garantir a preservação da bio-diversidade, deve ter em vista quatro princípios básicos: ser ecologicamente correto, economica-mente viável, socialmente justo e culturalmente aceito. A madeira de demolição preenche esses requisitos.

É um mercado que tende a crescer?

RD Com certeza. Lá fora, inclusive, dão muito mais valor à madeira de demo-

lição do que no Brasil. Uma prova do potencial desse mercado estava na Casa Cor desse ano, em que cerca de 80% dos ambientes contavam com madeira de demolição, seja em peças avul-sas, pisos ou paredes. Por aqui, há a febre de MDF, compensados, lacre, mais fáceis de se trabalhar. O boom no mercado da madeira de demolição ocorreu há cerca de dez anos e está sendo descoberto aos poucos. Há profissionais adeptos da madeira de demolição, como Carlos Motta, Pedro Petri e Hugo França.

É um material difícil de encontrar?

RD É, é bem complicado. Até conseguir os fornecedores... E é um meio de

mercado muito desleal. Extremamente desones-to, dificílimo de contatar, é uma dor de cabeça. Mas compensa pelo resultado final. O cliente chega, os arquitetos chegam, e ficam encanta-dos. Mas é muito difícil, os fornecedores, de um modo geral, são precários, são pessoas muito simples e difíceis de negociar, prometem uma coisa e mandam outra, às vezes você compra um lote enorme de mil metros quadrados, por exemplo, e 600 vêm bacana, 400 não.

Como funciona o fornecimento?

RD Há duas formas. Na primeira, há um fornecedor com fácil acesso aos ca-

minhoneiros que vendem a madeira. Então, já compro dele o móvel com a madeira. Na segun-da, eu tenho um outro, aqui de São Paulo, que consegue o móvel do Paraná. Coloco meus for-necedores dos caminhoneiros em contato com essa fábrica e eles compram. Senão, a logística fica muito complicada. Outro problema é que há vários preços para os lotes. Quando está muito barato, pode desconfiar. É aquela história, quan-do o milagre é grande, o santo desconfia! Tem de todo preço, varia bastante. O necessário é viabilizar o custo e pesar a qualidade.

Ela é mais difícil de trabalhar?

RD É difícil conseguir a mão de obra, que deve ser especializada – normalmen-

te, marceneiros mais antigos, que viveram numa época em que não existia essa história tão fácil de MDF. Aqui na Raízes Design, trabalhamos com peroba rosa de demolição. É muito dura, mas tem uma grande vantagem: é amarga e os cupins não gostam. E isso é um grande diferen-cial. Não vou dizer que ela nunca vai dar cupim. Se você pegar um lote que já teve algum pro-blema e não fizer um trabalho de higienização perfeito, há o risco de ela vir a ter cupim. Porém, a possibilidade é mínima. Optamos pela peroba por conta de sua beleza natural.

Há preconceito no público?

RD Nenhum. Muito pelo contrário! Quando eu falo que é madeira rea-

proveitada, eles adoram! Afinal, também estão preocupados com o meio ambiente. Na medida em que as pessoas percebem a importância da sustentabilidade, essa consciência ecológica só tende a crescer. Quando resolvi apostar nisso, tive medo que passasse logo, que fosse uma fe-bre. Agora, acredito que a madeira de demolição vá ficar cada vez mais em alta, sempre com mui-ta criatividade. Depende de nós, lojistas, trazer novidades ao mercado e fazer com que o consu-midor assimile a ideia.

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Encerramento das inscrições para o Prêmio Green Good De-sign. Podem participar arquitetos, designers, urbanistas, instituições e organizações com trabalhos vol-tados para o design sustentável. A premiação acontece em março. Informações no site www.europe-anarch.eu.

Os ares cosmopolitas prome-tem sacudir a edição, aberta ao público até o dia 6 de dezembro, no Pavilhão da Bienal do Parque do Ibirapuera, em São Paulo. uma exposição mostra como 12 países receberam megaeventos. Para dis-cutir a produção nacional, a área Expo Brasil conta com cerca de 50 trabalhos - 25 projetos e 25 obras. Na expo Internacional, a novidade fica por conta da premiação aos melhores trabalhos, semelhante àquela concedida à produção bra-sileira. E, às vésperas da Copa do Mundo da África do Sul, os organi-zadores prometem debater a infra-estrutura montada para o evento.

Termina a EXS 09 em São Paulo. Os admirado-res da sticker art podem ver nos muros da loja El Cabritón y Amigos adesi-vos de 200 artistas nacio-nais e internacionais.

1 DE NOVEMBRO

8ª BIENAL DE ARQuTETuRA TEM “ECOS uRBANOS”

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3 DE NOVEMBROEl CabRitón

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Page 143: DZ revista de design

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A segunda edição do Simpósio Internacional e Brasileiro sobre De-sign Sustentável, evento científico mais importante da América do Sul sobre o tema, acontece dias 5 e 6 novembro, na universidade Anhem-bi Morumbi, em São Paulo. Entre os palestrantes confirmados está John Thackara, um dos profissionais de visão mais sistêmica em relação a sustentabilidade, e Carlo Vezzoli, professor do Politécnico de Milão, que já há 15 anos faz pesquisas na área. A coordenação científica é do professor Aguinaldo dos Santos, da universidade Federal do Paraná (uFPR). Informações pelo e-mail [email protected].

Último dia do Experimentadesign Lisboa, bienal cultural dedicada ao de-sign, projeto e criatividade. Informa-ções em www.experimentadesign.pt

Término das inscrições para o concurso Poster4Tomorrow, que selecionará os 100 melhores cartazes que representem a luta pelos Direitos Humanos em todo o mundo. os contemplados serão exibidos em ´metró-poles como Amsterdã, berlim, Nova Iorque e Paris no ano que vem. Para se inscrever, acesse http://www.poster4tomorrow.org/

Início da exposição Meias Órfãs Brasil, que pega carona no ano da França no país. Idealizado pela estilista franco-brasi-leira Márcia de Carvalho, o projeto traz alunos da re-conhcida escola parisiense Esmod em parceria com a universidade Castelo Bran-co, do RJ. Os futuros estlilis-tas transformam meias que perderam seus pares em outras peças, como echar-pes, mantos e chapéus. O workshop com os alunos se estenderá a donas de casa carentes de Marechal Deodoro, em Alagoas. mais informações no site http://meiasorfasbrasil.blogspot.com/

Fim das inscrições para o concurso de mobiliário Design.br, promovido pela loja Micasa. Os projetos serão ava-liados e julgados por grandes nomes do design como Fernando e Humber-to Campana, Marcio Kogan e Marcelo Rosembaum. Podem ser apresentados projetos de estantes, bancos, cadeiras, sofás, puffs, aparadores e mesas, que nunca tenham sido comercializados. Profissionais e estudantes podem par-ticipar. A cerimônia de premiação acon-tecerá em 27 de fevereiro de 2010. Mais informações no site www.micasa.com.br/design.br

5 DE NOVEMBRO

8 DE NOVEMBRO

15 DE NOVEMBRO

10 DE NOVEMBRO

agenda

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47ª bijóias sp

26ª Casa DE CRiaDoREs

saint ÉtiEnnE CiDaDE Do DEsign

alEjanDRo saRmiEnto

23º pRêmio DEsign

O pavilhão do Shopping Frei Caneca, em São Pau-lo, recebe a 47ª Bijóias SP. A maior feira de bijuterias, acessórios, jóias de prata, aço e folheados da América Latina é exclusiva para lojis-tas e traz as novidades para o verão.

Início da 26ª Casa de Criadores. Realizado desde 1997, o evento apon-ta as principais tendências da moda no Brasil. A edição contempla o que deve ganhar as ruas na temporada outono/inverno. Mais de 20 marcas apresenta-rão suas coleções no Centro de Con-venções Frei Caneca.

São Paulo recebe a exposi-ção “Saint étienne - Cidade do Design”. A mostra, que integra o calendário ofical do Ano da Fran-ça no Brasil, começou na Bie-nal Internacional do Design de Saint étienne, no ano passado. O evento traz trabalhos inéditos que unem tecnologia e susteta-bilidade. Já passou por Brasília, Rio de Janeiro e fica em Curitiba até 21/11. Na semana seguinte, aporta em São Paulo, onde fica até 1º de janeiro de 2010.

uma retrospectiva do designer argentino Alejandro Sarmiento, co-nhecido por usar artigos recicláveis e resíduos em suas obras, ganha espaço no Museu da Casa Brasilei-ra. Prepare-se para muita inovação tecnológica e experimentação de novos materiais.

23º Prêmio Design - Museu da Casa Brasileira. O concurso anual reconhece os trabalhos brasileiros que se destacaram na arquitetura e no desenho industrial. A exposição dos vencedores começa no dia se-guinte à premiação.

16 A 18 DE NOVEMBRO

25 A 27 DE NOVEMBRO

30 DE NOVEMBRO

ATé 22 DE NOVEMBRO

24 DE NOVEMBRO

Centro de Convenções Frei Caneca Rua Frei Caneca, 569, 4º e 5º andares, Cerqueira César São Paulo - SP

Centro de Convenções Frei Caneca rua Frei Caneca, 569, 4º e 5º andares

Cerqueira César - São Paulo/SP tel. (11) 3472-2000

Centro Cultural Banco do Brasil Rua Álvares Penteado 112Centro - São Paulo - SP Ter. a dom., das 10h às 20h.tel. (11) 3113-3651

Museu da Casa Brasileira Av. Brigadeiro Faria Lima, 2705

São Paulo/SP tel. (11) 3032-3727 e

(11) 3032-2564

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agenda

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Organização: Silvana Rubino e Marina GrinoverCosac Naify, 208 págsR$ 59

Adrian FortyTradução: Pedro Maia SoaresCosac Naify, 352 págsR$ 59w

Lina Por EscritoLina Bo Bardi

Objetos de Desejo: Design e Sociedade Desde 1750

O livro revela a extraordinária capacidade que a arquiteta ítalo-brasileira tinha de transformar seu universo criativo em palavras. Seus textos foram reunidos pela primei-ra vez em Lina Por Escrito, mas ha-viam sido publicados originalmente em revistas italianas. Os 33 artigos repassam e propõem novos con-ceitos para temas como habitação, mobiliário, arte popular, museolo-gia, restauro, educação e políticas culturais. Os textos são ilustrados por desenhos originais, fotografias e obras gráficas da própria arqui-teta, incluindo alguns layouts em-pregados na publicação de seus textos. Através de seus escritos é possível perceber como a mulher que criou projetos emblemáticos, como o Museu de Arte de São Paulo (Masp), Sesc Pompeia e o Museu de Arte Moderna da Bahia, foi peça-chave na constituição de um olhar moderno sobre a cultura, tanto na Itália como no Brasil.

Com Objetos de Desejo: Design e Sociedade desde 1750, Adrian Forty pro-põe uma tarefa nada fácil: esmiuçar a complexa e nem sempre aparente rela-ção entre o design e a dinâmica social. Porém, o professor da Bartlett School of Architecture de Londres a realiza com des-treza em pouco mais de 300 páginas com linguagem ágil e saborosa, valendo-se de reproduções de jornais e catálogos de pro-dutos de cada época analisada. O livro, de 1986, ainda surpreende pela atualidade.

Forty aventura-se num terreno inóspito, frequentemente evitado pelos profissio-nais: o uso da atividade como justificati-va de convenções sociais, destrinchando o design e jogando-o cru a nossos olhos. A edição da Cosac Naify traz também uma interatividade inovadora com a cartela de adesivos que permite a cada leitor mon-tar a capa de seu próprio exemplar. É uma obra referência para aqueles que desejam entender o design para compreender a so-ciedade – e vice-versa.

textos inéditos da arquiteta lina Bo Bardi

sociedade de consumo

Os LIvrOs FunDAmentAis Do Design

Tem Que TerF

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Ellen Lupton e Jennifer Cole PhillipsTradução: Cristian BorgesCosac Naify, 248 págsR$ 69

Donald A. NormanTradução: Ana Deiró

Rocco, 278 págsR$ 45

Ellen Lupton e J. Abbott MillerTradução: André StolarskiCosac Naify, 72 págsR$ 55

novos Fundamentos do Design

Design Emocional

ABC da Bauhaus: a Bauhaus e a Teoria do Design

Nem só de boas ideias é feito o design. Com as mudanças tecnológicas que vêm com softwares poderosos e aparelhos pre-cisos, as possibilidades criativas aumen-tam e também a necessidade de conhecer cada vez mais ferramentas. As educadoras Ellen Lupton e Jennifer Cole Phillips dei-xam isso claro em Novos Fundamentos do Design, em que explicam como a forma mais adequada para cada criação nunca é alcançada sem amplo conhecimento técni-co. O objetivo do livro é trazer os pontos cruciais do design – como ritmo, cor e tex-tura – associados às novas tecnologias. O guia mostra com exemplos práticos a rela-ção entre técnica e intenção. As colabora-ções de estudantes de design de diversas partes do mundo, da China a Porto Rico, dos Estados Unidos à Índia, enriquecem o livro. Obrigatório para quem não quer ficar parado quando o assunto é design.

Será que os objetos bonitos funcionam melhor do que os feios? Esta é a questão que o psicólogo, engenhei-ro elétrico e professor de ciência da computação Donald Norman tenta responder no livro Design Emocional, em que apresenta ao leitor uma nova tendência de consumo. Segundo ele, o usuário atribui o que sente diretamen-te aos objetos, mediante as emoções geradas em suas experiências de utilização. A obra também trata de uma série de produtos que intrigam e irritam o consumidor – como o espremedor de sucos Phillip Starck e o compu-tador –, além de ser uma manifesto contra os manuais de instrução, considerados inimigos da modernidade. Para Norman, um design bem elaborado dispensa apresenta-ções e bulas. Por fim, o autor afirma que muitos objetos são funcionais, os utensílios domésticos, por exemplo, mas nem sempre prazerosos de usar.

A escola de design que influenciou im-portantes artistas do século 20 completa 90 anos em 2009 e é tema do livro ABC da Bauhaus: a Bauhaus e a Teoria do Design, organizado pelos críticos norte-america-nos J. Abbott Miller e Ellen Lupton. Com um projeto gráfico bem elaborado, a obra reúne ensaios sobre a linguagem visual do movimento. O designer e teórico J. Abbott Miller mergulha na história da educação para mostrar a enorme influência da teoria alemã do Jardim da Infância (Kindergarten) – que pregava o estímulo ao desenvolvi-mento da imaginação das crianças – nos princípios elaborados pela Bauhaus. Já Ellen Lupton, uma das estudiosas mais ativas e reconhecidas atualmente, exami-na de forma crítica os principais elementos do “dicionário visual” criado pela escola, questionando sua neutralidade e seu afas-tamento da linguagem verbal.

a linguagem visual na era da tecnologia

produtos que exploram a emoção

edição lembra 90 anos da Bauhaus

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Page 148: DZ revista de design

salva-vidas de muitas emergências, o orelhão é um exemplar do design brasileiro que ganhou o mundo

Alô,

mamãe!

Por Gabriella de Lucca

Nos tempos em que pagers

e telefones celulares figura-

vam apenas em roteiros de

ficção, e em que uma linha telefôni-

ca custava cerca de mil dólares – o

equivalente a 1.900 reais, o telefone

público era a opção de muitos brasi-

leiros para realizar uma chamada.

Mas as antigas cabines telefôni-

cas, além de serem fácil e frequen-

temente depredadas, custavam 3 mil

cruzeiros cada uma – um valor alto

para a época, marcada pela inflação.

Foi para acabar com esse “boi na li-

nha” que Chu Ming Silveira, arquiteta

chinesa radicada em São Paulo, criou

os protetores para telefones públicos.

Idealizado em 1970, o orelhão –

como ficou popularmente conhecido

– foi implantado experimentalmente

na rua Sete de Abril, no centro de

São Paulo, no final do ano seguinte.

O local escolhido foi a Companhia

Telefônica Brasileira (CTB) – que

mais tarde se transformou na Telesp.

Os primeiros orelhões ganharam as

vias públicas da capital paulista em

Chu Ming Silveira nasceu em Xangai, na China, naturalizou-se brasileira e formou-se em Arquite-tura na universidade Presbiteriana Mackenzie, em São Paulo. Morreu em 1997, aos 56 anos. Para pre-servar sua memória seus filhos Djan e Alan Chu Silveira elabo-raram um site sobre a invenção: www.orelhao.arq.br.

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25 de janeiro de 1972, aniversário da

cidade. No Rio de Janeiro, os proteto-

res para telefones públicos chegaram

cinco dias antes, em 20 de janeiro,

feriado de São Sebastião.

Chu Ming descreve no memorial

do projeto que “procurou encontrar

uma solução de design e acústica

para protetores de telefones públicos

que apresentassem uma relação cus-

to-performance melhor dos que a dos

já existentes e que se adequassem

às nossas condições ambientais.” A

arquiteta era chefe da seção de pro-

jetos da CTB nesse período. Partindo

da forma de um ovo, ela criou o de-

sign do protetor, que tinha cor alaran-

jada. O aparelho telefônico em si era

um caixotão vermelho, que funciona-

va com fichas de ranhura dupla.

Após longa pesquisa, Chu Ming

chegou ao material que atendia a re-

quisitos como proteção do usuário e

do telefone, baixo custo de fabricação

e manutenção, facilidade de instala-

ção, durabilidade, boa acústica e esté-

tica: a fibra de vidro não transparente.

A altura dos orelhões, de 1,75 metros,

é baseada na estatura média dos ho-

mens brasileiros. Atraente ao público,

o modelo foi copiado em países da

América do Sul, como Bolívia e Chi-

le, e também na China – país de sua

inventora. Na 1ª Bienal de Arquitetu-

ra, ocorrida em São Paulo de 8 a 30

de junho de 1973, no Parque do Ibi-

rapuera, a arquiteta expôs os projetos

de sua autoria relativos aos protetores

para telefones públicos.

Chu Ming também projetou varian-

tes do orelhão, como o “orelhinha” (o

protetor público interno de acrílico,

que até hoje se encontram instalados

em todos os aeroportos brasileiros), a

concha, que foi uma variante encon-

trada somente em postos de gasoli-

na e o que foi mais importante para

esse mobiliário urbano nas ruas – as

variações modulares duplas e triplas.

Depois disso, cada cidade brasileira

adaptou o design do orelhão confor-

me suas características culturais. Na

Bahia, por exemplo, é possível encon-

trá-los em forma de berimbau e coco.

FOTOS: DIVuLGAçãO

desIgn bRasIL

Page 150: DZ revista de design

Design de macarrãoPor Eduardo Foresti, colaborador da revista DZ

Abra uma revista. Não precisa ser de moda, nem de arquitetura. Dê uma volta a pé pela rua Teodoro Sampaio, observe as vitrines e os nomes das lojas. Assista a qualquer canal de televisão durante uma hora. O que essas atividades têm em comum? O bombardeio da pa-lavra design. Há dez anos, era pou-co comum conhecer o termo, que atualmente integra o vocabulário da maioria das pessoas.

Ao folhear uma revista qualquer, você verá que o termo é usado para falar de móveis e arquitetura. Se for um veículo de moda ou comporta-mento, haverá extremos: designers de pães, bolos e até de cabelo. No passeio pela Teodoro Sampaio, ha-verá muitas lojas com design no nome ou anúncios de “móveis com design”, para vender desde um berço até uma réplica da cadeira Barcelona. E, ao assistir à TV, os comerciais falarão de carros e edi-

fícios com design avançado.Mas por que essa superexpo-

sição? O termo design surgiu no início do século passado, após o processo de industrialização e pa-ralelo ao modernismo. Servia para designar o profissional que projeta-va objetos destinados à produção em massa – ou seja, os desenhis-tas industriais.

Os modernistas acreditavam que um bom produto precisava unir a forma e a função de uma manei-ra harmônica, sem que um atributo ofuscasse outro. Para tanto, o de-signer deveria pensar em artigos úteis, simples, fáceis de reproduzir e esteticamente agradáveis. Por isso a palavra acabou associada, ao longo do tempo, a artefatos bem resolvidos e convenientes, cuja execução foi pensada e repensada.

Posteriormente, o vocábulo teve seu significado ampliado e passou a representar qualquer atividade re-

lacionada ao processo de dar forma a algum objeto, e também ao seu desenho. Por esse motivo, quem cria sites, por exemplo, também é tratado como designer.

Vivemos em uma sociedade cada vez mais visual: a forma pas-sou, gradativamente, a ter mais im-portância e significado para a popu-lação. Valoramos cada vez mais a origem dos objetos, sua história e, por consequência, o seu design.

Porém, geramos situações extre-mas ao classificar toda e qualquer atividade manual de design. Soa inadequado. Ainda que se trate da tentativa de apropriar uma palavra com conotação positiva, para tentar glamourizar uma atividade artesa-nal por vezes desvalorizada, é pre-ciso bom senso. Não estranhe ao se deparar por aí com um designer de sobrancelhas, unhas, ou mesmo com um designer de macarrão!

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Formado na FAU-USP e pós graduado na Basel School of Design, na Su-íça, Eduardo Foresti começou sua carreira no escritório de branding e design Landor Associates, em San Francisco. no Brasil, atuou na Almap/BBDO, F/nazca e Giovani, FCB como designer gráfico e web designer, e criou para grandes marcas como Sagatiba, Kaiser, VW, Audi, Claro, Brah-ma e Pepsi. Seus trabalhos já foram premiados nos festivais de Londres, Cannes, Clio, CCSP e One Show. Hoje é Diretor de Criação da ?EC.150

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