E meu inverno chega ao fim (capítulos 5, 6 e 7)

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Prévia dos capítulos 5, 6 e 7 do livro "E meu inverno chega ao fim"

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Capítulo V

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s primeiras conversas foram iguais a todas as ou-tras conversas que envolvem duas pessoas que ainda não se conhecem: quais bandas você pre-fere? Onde você mora? O que faz da vida? O que faz pra se divertir?... Nada de muito exótico. Po-

rém, ficou bem claro que havia um interesse bem grande, de ambos os lados, em conhecer mais sobre a vida do outro. Eu (ainda perplexo com minha vontade de falar tudo para ela), res-pondia a todos os tipos de pergunta, exceto aquelas que viessem a deixar cair o véu de mistério que eu mantinha sobre minha vida pessoal – e ela pareceu gostar do mistério. Ela se chamava Rachel (nome bíblico de origem hebraica e que significa “a fê-mea do cordeiro”) Sydow (nome germânico originário da Pome-rânia, mas que, no caso da sua família, havia vindo da Suécia). Ela disse que havia visto minha foto na lista de amigos de um amigo que tínhamos em comum no Facebook e que, por ter se sentido atraída por mim, resolveu entrar em meu perfil. Vascu-lhando minha vida, ela disse ter gostado dos meus clipes e se identificado muito com algumas de minhas músicas (principal-mente "Veneno" e “Eu Sei”); disse que havia descoberto que meu nome verdadeiro era Rodrigo e ficou muito sem graça quando soube que, na verdade, não era. Ela disse que era DJ, que tinha vinte e seis anos e que estava fazendo faculdade de design de interiores. Disse que também morava no Rio de Janeiro, no lon-gínquo reino da Barra da Tijuca com os pais e seus amados bi-chinhos de estimação.

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Foi quando eu, em um ímpeto desesperado de consciência

e sinceridade, misturado com uma falta de noção de ridículo, resolvi escrever a primeira de muitas mensagens gigantescas pa-ra ela. Essa talvez tenha sido a mais difícil, já que nunca tive co-ragem de revelar a ninguém que estava "abalado" – muito prova-velmente porque essa havia sido a primeira vez em que alguém realmente me havia abalado as estruturas de verdade. Porém, junto a essa informação, também resolvi fazer uma dura revela-ção:

28 de Agosto de 2012 (01:50) – Chat do Facebook:

Eu: “Então... Vou precisar ser muito sincero com você em vários aspectos... A maioria deles, inclusive, são aspectos que, para mim são inadmissíveis de serem discutidos com alguém que me conheceu graças ao meu trabalho... ! Desde minha desilusão com a Sony Music, entrei em uma espiral de aversão ao contato pela internet (Orkut, MSN, etc), pois essas coisas me transportavam para os sentimentos ruins da história toda (já que TODA vez em que eu entrava on-line, por exemplo, tinha que ler um recado de fã perguntando "quando é que vai ter show?" ou "quando você vem na mi-nha cidade?" ou "porque não está tendo divulgação?"). Cansei de dar as mesmas respostas que me faziam mal...

Só há bem pouco tempo, graças ao Facebook, é que

voltei a ter contato com as pessoas que admiram meu traba-lho. O que acontece é que eu nunca aceitei conversar com ninguém diretamente por mensagens privadas e aqui no Fa-cebook eu não entendi ainda como desabilitar isso... Então, eu pego as dezenas de mensagens que recebo diariamente de fãs e pessoas que admiram meu trabalho e, simplesmente, finjo que não vi (literalmente)... "MAS" cometi a besteira de, quando vi a sua, clicar na foto (coisa que eu não faço NUNCA) e como achei você muito bonita, acabei não me se-gurando e pensei: "ahh.. Olhar não faz mal..." Depois pen-sei: "responder não faz mal"... Enfim...

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Essa introdução excessivamente prolixa e sem pé nem

cabeça foi apenas pra dizer que, se eu não disser agora que eu moro com minha namorada, eu estarei sendo injusto com você... (não estou dizendo que acho que você tenha interesse em mim... Até porque, a vida inteira, sempre fiz questão de achar o contrário: que ninguém se interessa por mim... En-fim... Sistema padrão de defesa).

Mas, independente dos motivos que fizeram com que

você quisesse continuar conversando comigo... Acho que, como abri essa porta de contato com o mundo exterior para você, me senti na obrigação de deixar certas regras de lado e dizer isso tudo para você...

Nossa... Falei demais... Mas repetindo pra ficar claro: não estou dando uma de

convencido dizendo que acho que você esteja interessada por mim! Não é isso! É só o fato de que acho injusto manter cer-tas coisas no escuro se você está sendo clara comigo…” Muita enrolação para dizer algo que poderia se resumir em

três palavrinhas: “eu tenho namorada”. Mas não poderia ser as-sim; no susto. Eu não queria espantá-la demonstrando que eu estava comprometido e indisponível, pois, para ela, mesmo sem saber exatamente o porquê ainda, eu estava completamente dis-ponível. Mais do que disponível; eu a estava esperando.

A conversa continuou constrangedoramente com ela dizen-

do que não dava em cima de caras comprometidos e comigo ten-tando desesperadamente deixar bem claro que não estava insi-nuando que ela estava dando em cima de mim (quando, no fun-do, eu estava rezando para que estivesse).

A grande maioria dessas conversas acontecia durante as

longas madrugadas em que eu estava trabalhando em um proje-to muito chato, desgastante e estressante.

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Eu costumava chegar no estúdio às dez da noite e saía de lá

por volta das quatro da manhã, sempre aproveitando todas essas horas trabalhando sem parar. Mas, depois que nossas conversas começaram, percebi que, toda vez em que eu tentava me con-centrar no trabalho, um diabinho vinha ao pé do meu ouvido e dizia: "e se ela tiver mandado uma mensagem? Vai deixá-la esperan-do?"; enquanto um anjinho vinha ao outro ouvido e dizia: "o que você está fazendo? Você precisa terminar esse trabalho e ir para casa descansar!". Sempre dando ouvidos ao diabinho, eu acabava não conseguindo tirar os olhos do celular (onde eu lia e respondia as mensagens dela), e assim perdia horas inteiras de trabalho. Gra-ças a isso, o projeto acabou se estendendo bem mais do que precisaria, mas nunca me arrependi de nenhuma hora perdida, pois, no fundo, eu estava amando a sensação de estar, vagarosa-mente, voltando a sentir o sangue correndo nas minhas veias.

Também foi nessa mesma época que descobri algo que,

mais tarde, acabaria me proporcionando as piores noites da mi-nha vida (competindo apenas com as primeiras noites que se seguiram à morte do meu pai): ela era "baladeira profissional" e costumava, pelo menos duas ou três vezes por semana, sair com as amigas e chegar em casa depois das seis da manhã. Outra coi-sa que serviu para colocar lenha no meu desespero foi perceber que, apesar de ela gostar de rock, se vestir como quem gosta de rock, se maquiar como quem gosta de rock, ter piercings como quem gosta de rock e ter tatuagens como quem gosta de rock, ela frequentava baladas de sertanejo e pagode, recheadas de playboyzinhos e mauricinhos. Isso não só não combinava em na-da com ela como me assustava um pouco a ideia de ela estar constantemente cercada de idiotas bêbados sem personalidade nenhuma dando em cima.

Um belo dia (ou melhor, "bela noite") em que eu já havia

desistido de trabalhar para ficar conversando com ela, me veio um ímpeto incontrolável de fazer algo absolutamente avesso à minha baixa estima e ao meu medo crônico de ser rejeitado:

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Uma proposta.

Ela estava dizendo que em breve iria ao banco fazer o depó-

sito para comprar meu CD na loja virtual e eu estava me sentin-do constrangido em deixá-la pagar por isso. Sendo assim, resolvi propor que, se ela trouxesse um Redbull para me ajudar a me manter acordado no estúdio, eu daria meu CD para ela. Jurando (e talvez até mesmo desejando) que ela recusaria, a resposta me deixou nervoso em um nível que nem meus remédios para sín-drome do pânico seriam capazes de me acalmar:

28 de Agosto de 2012 (23:16) – Chat do Facebook:

Ela: "Um Redbull por um CD?.. Nada mal!" Depois de uma longa conversa para determinar o melhor

dia, ficou combinado que seria na noite de sexta-feira (trinta e um de agosto), durante meu horário macabro de trabalho. Quando ela tentou me deixar à vontade para desmarcar ou sim-plesmente desistir, deixei escapar uma informação muito valiosa para alguém que certamente já estava preparando uma poção mágica para colocar dentro daquele Energético:

- "Não vou desmarcar... Acho que a hora de mudar de ideia já ficou para trás..." O que eu ainda não sabia era que não era apenas "a hora de

mudar de ideia" havia ficado para trás, como também era a mi-nha vida inteira antes daquela madrugada, que nem havia acon-tecido ainda, que ficaria para trás. Tudo ficaria para trás. Meu passado, meus valores, meus gostos... Eu não fazia ideia de que estava marcando a data da minha morte e da minha reencarna-ção ao mesmo tempo. Assinando minha sentença de morte e minha nova certidão de nascimento. Com tudo combinado, só me restava dizer:

- "Sleep well Miss Baby Firefly..."

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Capítulo VI

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a noite anterior ao nosso encontro, fui com um dos meus melhores amigos assistir a uma das minhas bandas preferidas: o Dream Theater. Eu já havia assistido eles ao vivo três vezes, mas esse acabaria sendo o melhor show deles que já havia

visto. No dia seguinte, acordei tarde e quebrei logo o gelo.

31 de Agosto de 2012 (17:06) – Chat do Facebook:

Eu: "Olá..." Ela: "Oi! E o show, foi bom?" Eu: "MUITO!" Ela: "Ah que legal!" Eu: "Então... Desistiu de hoje?" Ela: "Não… Você desistiu?" Eu: "Não."

Depois de uma rápida conversa sobre o show seguida de

uma tentativa frustrada de justificar que eu estava me sentindo horrível graças à bateria de noites em claro trabalhando, passei todas as coordenadas cartográficas para que ela não se perdesse e combinamos um horário bem emblemático para um encontro de uma menina que, mais tarde, descobri ser uma bruxa feiticei-ra, com um menino que alguns teimavam em dizer que era um vampiro: a meia-noite.

31 de Agosto de 2012 (23:48) – Chat do Facebook:

Ela: "Estou saindo..."

"Geleiras se derreteram até o mar Eu queria que a maré me carregasse

Eu tenho estado de joelhos Enquanto você vai se aproximando cada vez mais"

(The XX - "Crystalized" )

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01 de Setembro 2012 (00:37) – Chat do Facebook:

Ela: "Ei... Fala comigo! Não sei se estou na rua certa." Eu: "Seu carro é branco?! Segue em frente que eu já estou te vendo!" Eu sempre imaginei que, se soubesse a hora exata da minha

morte, prepararia uma frase de efeito para ser dita ou um epitá-fio para ser colocado em minha lápide. No entanto, normalmen-te, as pessoas não estão preparadas para isso porque não sabem exatamente a data e a hora em que ela vai chegar.

Mas ela estava chegando.

O Peugeot branco foi se aproximando, subindo vagarosa-

mente por aquela deserta rua de paralelepípedos no bairro do Jardim Botânico e, quando finalmente parou ao meu lado, a ja-nela se abriu.

Foi quando eu morri pela primeira vez.

Quando marquei aquele encontro, eu acreditava que esta-

ria em uma posição confortável de admirado mais do que de admirador, afinal de contas, eu era o ídolo e ela a fã; porém, no momento imediato em que aquela janela se abriu, eu percebi, tarde demais, que na verdade eu havia caído em uma perversa armadilha. Eu era a presa e ela, o predador. Naquele momento, já não havia mais tempo para "últimas palavras", muito menos para escrever nenhum epitáfio. A pessoa que eu fui desde meu nascimento até aquele exato momento estava morta; instantane-amente. E junto com ela, todas as pessoas, todos os sentimentos e todas as sensações que já havia sentido. Tudo pereceu imedia-tamente naquele momento mágico em que ela, com um simples sorriso, fez nascer um sol dentro de mim, derretendo todo o ge-lo que havia aqui.

Meu inverno finalmente chegava ao fim.

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Capítulo VII

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"O mundo estava em chamas Ninguém poderia me salvar além de você.

É estranho o que o desejo faz os tolos fazerem Eu nunca sonhei que conheceria alguém como você"

(Chris Isaak - "Wicked Game" ) - "Nossa... Como seu cabelo é bonito..."

ssas foram as primeiras palavras que proferi em minha nova vida e elas já demonstravam algo que se tornaria constante e absolutamente ne-cessário para mim: elogiar aquela menina. Logo que ela saiu do carro, pude respirar pela primei-

ra vez o ar que circulava em torno daquele ser perfeito e que, daquele momento em diante, seria vital para o funcionamento do meu corpo, assim como o meu sangue, que iria, dali pra fren-te, correr desesperadamente em minhas veias disputando espaço para entrar dentro dela. E o ar em volta dela parecia tão mais leve... Mais doce... Mais quente. Mais tarde descobri que o poder daquele ar era intensificado por mais uma das inúmeras poções mágicas que aquela bruxa usaria para me enfeitiçar: "Lady Mil-lion", da marca espanhola Paco Rabanne.

Depois de um rápido cumprimento desajeitado em que

ambas as partes estavam com o rosto ruborizado, tamanha era nossa vergonha, entramos no estúdio e nos sentamos. Para “quebrar o gelo”, logo começamos a brincar (como havíamos previamente combinado) de um jogo em que um deveria adivi-nhar coisas sobre outro, sob a pena de pagar uma prenda: meu CD, o tal Redbull... Mas era mais do que óbvio que, mais cedo ou mais tarde, as prendas materiais acabariam.

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Após três ou quatro rodadas, sem mais nem menos, me veio

um impulso absolutamente inédito: tomar uma atitude. Eu sabia que ela estava constrangida pelo fato de eu estar comprometido, por isso, contrariando todo aquele medo idiota de ser rejeitado que (injustificavelmente) me impediu a vida inteira de dar o primeiro passo em direção a todas as meninas que estiveram em minha frente em situações semelhantes, eu disse:

- "Posso encostar em você?" Ela respondeu, com um tom de incerteza e um sorriso no

cantinho da boca: - "Mas você tem namorada..." Eu sabia disso e ela sabia disso, mas naquele momento já

era mais do que óbvio que eu estava disposto a morder a maçã da árvore do conhecimento do bem e do mal, que me estava sendo ofertada pelo demônio disfarçado de serpente, sob a pena de ser expulso do paraíso. O que eu não imaginava era que, na realidade, o paraíso estava a menos de um metro de distância de mim, disfarçado de menina e que, contrariando tudo aquilo que a Bíblia sagrada dizia no livro do Gênesis, aceitar aquela maçã na verdade seria a chave para entrar naquele paraíso.

Ela estava sentada em um sofá e eu em uma cadeira bem

em frente, porém aquele caminho que consistia em menos de um passo me pareceu mais difícil e distante do que uma traves-sia por um deserto... A pé... Descalço... Mas eu tinha que dar aquele passo, pois, naquele momento em que ela abriu a janela daquele Peugeot branco, um alarme já havia disparado me avi-sando: era ela. Inclinei-me em direção ao lugar vazio ao lado dela, apoiando minhas duas mãos naquele sofá de couro preto e – como quem já sabia que passaria o resto da vida "de quatro" por aquela menina – coloquei o joelho direito para, em seguida, como um animal que vai em direção a uma presa, engatinhar aquele deserto de distância entre nós.

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Nossos rostos ficaram a milímetros de distância por milési-

mos de segundos que poderiam ter durado a vida inteira. Sem que eu me desse conta, o crime estava sendo cometido ao mes-mo tempo em que eu estava ganhando a minha liberdade.

Eu estava beijando pela primeira vez a mulher da minha vida.

"A maça cai O destino chama

E eu sigo você" (Depeche Mode - "The Bottom Line" )

Se o ar em volta dela era diferente do ar do resto do mun-

do, o gosto dela era como uma droga... Intoxicante... Inebrian-te... E eu já estava viciado e totalmente dependente daquele bei-jo antes mesmo que fosse necessário que ela me concedesse a honra de um segundo.

Nosso primeiro beijo foi, provavelmente, o beijo mais suave

e delicado que demos até hoje; quase em slow motion. Depois desse, fui me deixando levar pelo ímpeto incontrolável de abrir uma jaula que estava trancada em mim, libertando algo que nem eu mesmo sabia que estava aprisionado aqui dentro. Em poucos minutos eu já estava imprensando aquela pequena menina na parede como se quisesse atravessar a parede junto com ela. Nos-sas mãos não tinham mais controle, nossos lábios não tinham mais controle, nossas línguas não tinham mais controle e a cada pequena pausa (para não morrermos sem ar), nossos olhos sim-plesmente não conseguiam desgrudar dos olhos do outro nem por um segundo sequer (o que contrariava todo o meu passado em que eu fazia questão de desviar rapidamente o olhar do olhar de alguém para não me sentir constrangido). Eu nunca havia permitido que alguém entrasse em mim daquela maneira: com os olhos... Com a língua... Ela foi onde nenhuma outra jamais havia chegado e abriu todas as portas dentro de mim.

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"Invade a minha boca, me arranca todo o ar

Me deixa desarmado e me penetra com o olhar E todos os demônios vão sair de dentro

Só pra ver o que você fez." (Libra - "O Que Você Fez” )

Mas foi no momento mais aparentemente inocente que a

minha maneira de enxergar aquela menina fez com que ela ga-nhasse um lugar no meu coração que nenhuma outra jamais havia conquistado até então. Como quem sabe exatamente o poder que tem e sabia exatamente o que aquele pedido iria pro-vocar em mim, ela me olhou (com aqueles olhos que, sem dizer absolutamente nada, me fazem querer entregar o mundo em uma bandeja de prata para ela) e disse:

- "Me dá colo?" Sem que eu me desse conta ela já estava em meus braços

como uma criança: as pernas envolvendo minha cintura e os braços pendurados em volta de meu pescoço. Ela era leve... Quase sem peso... E eu poderia ter passado a madrugada inteira ali em pé com ela daquele jeito, sem me cansar. Ela estava em meu colo, mas era eu quem estava com os pés fora do chão.

"Apenas essa noite, nós continuaremos dançando E a cidade não irá contar para ninguém

Apenas essa noite, as luzes estão brilhando E nosso segredo permanecerá incógnito"

(Manna & Ville Valo - "Just For Tonight" )

Até hoje eu me pergunto se havia algo dentro daquele Red-

bull... Uma poção mágica, uma droga entorpecente ou alguma coisa semelhante. Independentemente disso eu já percebia niti-damente que aquela menina (aparentemente inofensiva) seria

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meu fim. E como a única maneira realmente eficaz de se destru-ir um coração é de dentro para fora, então eu havia finalmente conhecido a primeira (e única) mulher verdadeiramente capaz de despedaçar o meu pois, até aquela data, nenhuma outra havia chegado tão longe... Tão fundo... Nenhuma outra havia conquis-tado aquele órgão pulsante em meu peito e fincado ali uma ban-deira, como quem conquista uma montanha, um continente ou um planeta, clamando para si a propriedade daquele coração. E, por mais que eu soubesse disso; por mais que soubesse que o mais sensato e seguro era correr o mais rápido possível para longe daquela boca vermelha e cheia de carne, eu sabia que já era tarde demais para mim. Eu já pertencia àquela mulher.

Com apenas um beijo ela havia matado aquela com quem eu havia construído uma vida até então. E eu nunca me arre-pendi daquele beijo nem por um segundo.

Baby Firefly: -"O que quer que você precise fazer, faça. Não existe errado.

Se alguém precisa ser morto, você mata. É assim que deve ser."

(Do filme “House Of 1000 Corpses” de Rob Zombie)