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Revista de Sociologia e Política ISSN: 0104-4478 [email protected] Universidade Federal do Paraná Brasil Pohlmann, Markus; Valarini, Elizângela ELITE ECONÔMICA NO BRASIL: DISCUSSÕES ACERCA DA INTERNACIONALIZAÇÃO DA CARREIRA DE EXECUTIVOS BRASILEIROS. Revista de Sociologia e Política, vol. 21, núm. 47, septiembre, 2013, pp. 39-54 Universidade Federal do Paraná Curitiba, Brasil Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=23828659005 Como citar este artigo Número completo Mais artigos Home da revista no Redalyc Sistema de Informação Científica Rede de Revistas Científicas da América Latina, Caribe , Espanha e Portugal Projeto acadêmico sem fins lucrativos desenvolvido no âmbito da iniciativa Acesso Aberto

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Revista de Sociologia e Política

ISSN: 0104-4478

[email protected]

Universidade Federal do Paraná

Brasil

Pohlmann, Markus; Valarini, Elizângela

ELITE ECONÔMICA NO BRASIL: DISCUSSÕES ACERCA DA INTERNACIONALIZAÇÃO DA

CARREIRA DE EXECUTIVOS BRASILEIROS.

Revista de Sociologia e Política, vol. 21, núm. 47, septiembre, 2013, pp. 39-54

Universidade Federal do Paraná

Curitiba, Brasil

Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=23828659005

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REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA V. 21, Nº 47: 39-53 SET. 2013

RESUMO

ELITE ECONÔMICA NO BRASIL:DISCUSSÕES ACERCA DA INTERNACIONALIZAÇÃO DA

CARREIRA DE EXECUTIVOS BRASILEIROS.

Markus Pohlmann

DOSSIÊS

Rev. Sociol. Polít., Curitiba, v. 21, n. 47, p. 39-53, set. 2013Recebido em 08 de junho de 2013.Aprovado em 04 de julho de 2013.

I. INTRODUÇÃO1

A emergência de uma elite econômica global2,composta por top managers3 e profissionais altamentecapacitados, é um dos principais pressupostos dasteorias mainstream da globalização (BECK, 1997;SKLAIR; 2001)4. Tal grupo se distinguiria além deoutros aspectos, por sua alta mobilidade internacional ealto desempenho profissional (BECK, 1997; SKLAIR,2001). Segundo Beck (1997) as fronteiras politico-geográficas não desempenhariam papel algum para essegrupo, uma vez que ele poderia escolher onde viver,trabalhar e até mesmo onde pagar seus impostos.Ancorada nessa idéia Moss-Kanter (1999) enfatiza oaparecimento de mercados globais para profissionaisaltamente capacitados, dentre eles executivos de altoescalão. Devido a sua alta qualificação e desempenho

Elizângela Valarini

O objetivo principal do artigo é examinar a hipótese da internacionalização da alta gerência industrial brasileirapor meio do grau de internacionalização de sua carreira no contexto da globalização. Tal hipótese estáintrinsicamente articulada às teorias da globalização que sugerem o surgimento de uma elite econômica globalcuja particularidade seria, entre outros aspectos, seu alto desempenho e sua alta mobilidade social. Por meio daobservação da biografia e da trajetória profissional, assim como da mobilidade internacional de altos executivosno Brasil, pretende-se verificar a ocorrência um novo padrão de carreira, ou seja, o surgimento de carreiras globaiscomo efeito do processo de globalização.

PALAVRAS-CHAVE: elite econômica brasileira; executivos brasileiros; top manager; carreira internacional;recrutamento internacional.

profissional, tais profissionais como CEOs, diretoresgerais e presidentes de grandes corporações seriamdisputados internacionalmente por organizaçõestransnacionais. Tal fenômeno é tratado pela autora dewar of talents, o qual indicaria o aparecimento de umaconcorrência internacional por profissionais altamentecapacitados, por empresas transnacionais, dando assimcondições para o surgimento de modelos de carreirastransnacionais (idem).

Esse processo de internacionalização da carreira levariaao surgimento de novos padroes e sistemas de carreiras,os quais deixariam de ser orientados por organizacoes emarcados por valores locais. Estudos sociológicosquestionam teorias a respeito do desenvolvimento decarreiras, nas quais o individuo é colocado como o únicoresponsável pela sua própria ascensão profissional(ARTHUR, HALL & LAWRENCE, 1989; GUNZ, EVANS& JALLAND, 2000). Diante de uma perspectivasociológica, carreiras são compreendidas tanto comoascenção quanto descenção de posições dentro de umaorganização. Elas são contruídas dentro de organizaçõese orientadas a elas. Socialmente, carreiras são carregadasde atributos como sucesso e insucesso profissional. Issosignifica que as organizações desempenham um papelmuito importante, na condução e orientação da carreira(LUHMANN, 2000; POHLMANN, 2006; 2009a;POHLMANN & BÄR, 2009). Além disso, valores,principios e crenças sociais, assim como aspectosculturais exercem uma certa influencia nos padrões esistemas de carreira em diferentes culturas (POHLMANN,2006; 2009a; POHLMANN & BÄR, 2009).

1 Agradecemos aos pareceristas da Revista de Sociologia ePolítica pelas sugestões a este artigo.2 O termo “elite econômica” descreve exclusivamente o grupoformado por atores que ocupam altas posições gerenciais naeconomia. Sendo assim, está sendo chamado aqui de “eliteeconômica” o grupo formado por presidentes, diretores gerais,diretores executivos, chief executive officers (CEOs) etc. dasmaiores indústrias no Brasil, sejam elas brasileiras, sejammultinacionais. O termo elite não está aqui articulado a nenhumdiscurso de classe, origens sociais, características pessoais,qualificações e/ou competências (POHLMANN, 2011b).3 Entre top managers estão incluídos todos os diretoresexecutivos, CEOs, diretores gerais e presidentes industriais.4 Para críticas sobre o tema, cf. Pohlmann (2006; 2009a).

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ELITE ECONÔMICA NO BRASIL

O objetivo principal deste artigo é discutir osprimeiros resultados de uma pesquisa empírica aindaem andamento a respeito da internacionalização do topmanagement nas maiores indústrias do Brasil. Aquestão abordada trata-se apenas de uma das hipótesesinvestigadas na pesquisa em andamento, intitulada “Onovo espirito do capitalismo no top management”5,cujo objetivo é verificar, por um lado, o surgimentode uma elite econômica global, investigada por meioda internacionalização da carreira de altos executivos,sua socialização dentro das organizações e seumecanismo de recrutamento. Por outro lado, estapesquisa tem como objetivo verificar o mecanismode reprodução de valores capitalistas, baseados nasteorias de Max Weber, em várias regiões do mundo,por meio dos estudos da orientação da ação de topmanagers, no intuito de verificar um processo deconvergência de valores e condutas neoliberais, osquais seriam dissiminados por meio de novos conceitosde gerenciamento empresarial (BOLTANSKI &CHAPELLO, 2009; POHLMANN, 2011b). Estetrabalho tem como objetivo principal investigarempiricamente uma possível mudança no padrão decarreira e recrutamento de altos executivos, emdecorrência da globalização, à luz de teoriassociológicas. A constatação da existência de carreirastransnacionais, ou ainda chamadas de boderless career(carreiras sem fronteiras), indicaria uma nova formade recrutamento da elite econômica, ou seja, omecanismo de recrutamento internacional.

Segundo Ianni (1994), a sociedade global é o novoobjeto de estudo das Ciências Sociais. Com isso, novosdesafios metodológicos vão sendo colocados para osestudos a respeito da sociedade global. As noções detempo e espaço, fundamentais para as Ciências Sociais,estão sendo revolucionadas por meio dodesenvolvimento tecnológico e científico, que éincorporado e dinamizado pela sociedade global (idem).

Temas abordados na literatura mainstream daglobalização, como o processo de desnacionalização esua influência na redefinição de novos espaços e valoressociais, passam agora a ser entendidos em uma escalaglobal, e não mais limitados à compreensão da sociedadelocal; ou, ainda, como a questão do surgimento de umaclasse capitalista global, investigada indiretamente nestetrabalho (IANNI, 1994; BECK, 1997; SKLAIR, 2001;LÓPEZ-RUIZ, 2004), instigam a investigação empiricasde tais pressupostos. Portanto, pretende-se através dainvestigação da internacionalização do top managementanalisar empiricamente a questão do recrutamentointernacional da elite econômica, o qual se refere a umdos pressupostos que indicaria a emergência de umaelite econômica global.

A metodologia empregada para o levantamento eanálise dos dados discutidos neste trabalho baseia-seem estudos anteriormente realizados na Alemanha eÁsia do Leste, em especial na Coréia do Sul(POHLMANN, 2011b). Sendo assim, pretende-se,aqui, não apenas verificar a hipótese deinternacionalização do top management no Brasil, mas,em um segundo momento, comparar os resultadosobtidos com pesquisas realizadas em outros países.

Uma pesquisa recentemente realizada (POHLMANN,2009b) a respeito da internacionalização da alta gerência,e com isso, da carreira de top-managers na Alemanha,na Coréia do Sul e ainda nos EUA, demonstra por umlado, um aumento significativo da mobilidade internacionalde presidentes e CEOs de corporações com atuaçãointernacional. No entanto pode-se dizer que a globalizaçãoconduz a mudanças nos padrões e sistemas de carreira?Os resultados de tais pesquisas demonstram ainda que ainternacionalização do top management, mesmo emcorporações multinacionais, encontra-se muito aquémda internacionalização do seu processo produtivo. Assim,a tão discutida mobilidade internacional de taisprofissionais parece restringir-se a trocas de postos emdiferentes filiais e unidades dentro da própria corporação,fenômeno chamado por Pohlmann e Bär (2009) deinternacionalização leve, nas palavras dos autores, lightinternationalization (idem; POHLMANN, 2006; 2009a).

A compreensão da influência da globalização nopadrão de carreira de altos executivos permite-noscompreender não somente a formação e orecrutamento de tal grupo no Brasil, mas ainda revisaralguns pressupostos a respeito desse tema, presentesna literatura sociológica, a fim de verificar a existênciade tendências ou mudanças na trajetória de tal grupo.Isso levaria também a investigação de tendências emudanças no padrão de carreira da elite econômicabrasileira. Sendo assim, as discussões levantadas nesteartigo não têm a pretensão de descartar ou provarhipóteses a respeito da temática, mas sim de provocar

5 “O novo espírito do capitalismo no top management” trata-se de uma série de pesquisas a respeito das mudanças noconjunto de modelos e padrões de interpretação social e formasde justificação do capitalismo, com base nos princípios daconduta de vida, organizacionais e econômicas, através da análiseda trajetória profissional de altos executivos industriais e dadifisão de conceitos administrativos na mídia especifica paraesse grupo-alvo. Tais estudos têm sido desenvolvidos a partirde meados do ano de 2011 em diferentes países, como Alemanha,Suiça, Áustria, Inglaterra, EUA, Coréia do Sul, Japão, China,India, Hong-Kong, Brasil e Argentina. A pesquisa temcoordenação geral do Prof. Dr. Markus Pohlmann, do Institutode Sociologia Max Weber da Universidade de Heidelberg, e emcooperação, no Brasil, com o Prof. Dr. Paulo Roberto NevesCosta, do Núcleo de Pesquisa em Sociologia Política Brasileirada Universidade Federal do Paraná (NUSP-UFPR).

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discussões sobre esse tema, frequentemente tratadasna literatural internacional.

Discussões envolvendo a metodologia pertinenteà pesquisa serão abordadas na segunda seção,contemplando a escolha e a formação da amostrageme o método empregado para o levantamento e análisedos dados da biografia e trajetória profissional dosexecutivos brasileiros. Na terceira seção serãoapresentados e discutidos importantes aspectos arespeito da mobilidade internacional de executivos,baseados em dados estatísticos. Tais discussões estãorelacionadas à tese do surgimento de uma boderlesscareer6.

Na quarta seção discutiremos os dados levantadosno Brasil e o possível modelo de carreira dominanteentre os executivos brasileiros e alemães. Em seguida,na quarta seção trataremos brevemente do mecanismode recrutamento da elite econômica brasileira, por meiodo levantamento de algumas hipóteses com relaçãoao mesmo, baseadas nos dados empíricosrecentemente levantados no Brasil.

II. ASPECTOS METODOLÓGICOS

Como mencionado acima, a metodologiaempregada baseia-se em estudos anteriormenterealizados na Alemanha e no Leste Asiático parainvestigar a elite econômica nesses países(POHLMANN, 2011). Os métodos empregados parao levantamento e análise dos dados correspondem ainstrumentos de pesquisa explorativa padronizados,os quais permitem o levantamento de grandequantidade de informações a respeito da amostragemestudada. (FRIEDRICHS, 1990; ATTESLANDER,2003; DIEKMANN, 2005). Mais especificamente,

utilizamos o método de prosopografia (life courseanalysis) para formação do sampling, padronizando aforma de levantamento e de análise dos dados. Atravésdessa padronização das informações quantitativas foipossível identificar o grupo a ser estudado e, também,fazer o levantamento de variáveis independentes edependentes a respeito da origem social, qualificaçãoe trajetória profissional dos diretores gerais,presidentes e CEOs das maiores indústrias no Brasil eainda das empresas por eles gerenciadas.

Para verificarmos a hipótese a respeito dainternacionalização do top management no Brasil,utilizamos uma amostragem contendo representantes,ou seja, presidentes, CEOs e diretores executivos das100 maiores indústrias no Brasil, a partir do critériodas vendas. O sampling foi composto inicialmente por61 variáveis e o levantamento de dados foi inicialmenterealizado por meio da busca de informações online arespeito das três dimensões acima descritas (origemsocial, qualificação e trajetória profissional).

A formação do sampling foi composta em duasetapas. Em um primeiro momento foram identificadasas 100 maiores indústrias do Brasil, as quaiscomporiam a amostragem, por meio de rankings eestudos já existentes. O critério utilizado para a seleçãodas empresas foi o faturamento da organização noano de 2010. Para a identificação das empresas, foiutilizado basicamente o ranking da revista Exame,publicado anualmente sob o título “Maiores e melhoresdo ano”. Após a seleção das empresas, foram entãoidentificados os nomes dos principais diretoresexecutivos das indústrias listadas. O Quadro 1 podeelucidar melhor esse processo.

6 O conceito de carreira sem fronteiras propõe novas formasde atuação e interação dos atores em um modelo onde estestransitam livremente entre diferentes organizações, adquirindocompetências que os permitem atuar em contextos diferentes,não estando mais vinculados à identidade de um empregador,corporação ou culturas locais. O profissional pode construir

QUADRO 1 – IDENTIFICAÇÃO DO GRUPO-ALVO DA PESQUISA

ranking EXAME Seleção das indústrias Titular da posição de presidente, CEO e diretor Geral

1 Empresa A Industria – Empresa B Presidente (Industria B)2 Empresa B Industria – Empresa C CEO (Industria C)3 Empresa C Industria – Empresa F Presidente America Latina (Industria F)4 Empresa D Industria – Empresa H …5 Empresa E … …6 Empresa F … …7 Empresa G … …

FONTE: Os autores.

sua carreira internacionalmente, estando livre dos limitesgeográficos. Interligada à questão profissional, a ideia de carreirassem fronteiras está pautada na realização do próprio individuo,expandindo-a para além da vida profissional (ARTHUR, HALL& LAWRENCE, 1989). Esse conceito traz uma visãocontraditória à compreensão de carreira em uma perspectivasociológica.

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ELITE ECONÔMICA NO BRASIL

Após a identificação do grupo-alvo de estudo,iniciou-se a segunda fase de exploração, ou seja, olevantamento de variáveis relacionadas às empresas erelacionadas à origem social, qualificação e trajetória

profissional dos executivos identificados. As variáveisdependentes e independentes com relação às empresase aos executivos podem ser vistas no Quadro 2, aseguir.

QUADRO 2 – VARIÁVEIS RELACIONADAS À EMPRESA E AOS EXECUTIVOS

Indicadores organizacionais CaracterísticasFaturamento/Vendas $ 0, $ 10 000, $ 100 000 etc.

Ano de fundação da empresa 1900, 1920, 2000 etc.

Número de funcionários 2 000, 8 000, 17 000 etc.

Ramo/setor econômico Indústria de energia, automobilística, de mineração,alimentícia etc.

Estrutura proprietária Particular, particular de capital estrangeiro, estatal(participação do Estado em %) etc.

Indicadores pessoais e profissionais CaracterísticasDados Pessoais e Origem Social

Ano de nascimento 1945, 1950, 1955 etc.

Sexo Masculino, feminino.

Estado civil Solteiro, casado, divorciado etc.

Posição atualmente ocupada Presidente, CEO, vice-presidente, presidente e CEO, etc.

Local de nascimento Brasil, Alemanha, Espanha, Chile etc.

Local onde cresceu Brasil, Alemanha, Espanha, Chile etc.

Formação educacional e acadêmica dos pais Educação básica, média, curso profissionalizante, cursouniversitário, mestrado, doutorado etc.

Profissão exercida pelos pais

Formação educacional e acadêmica dos avos Educação básica, média, curso profissionalizante, cursouniversitário, mestrado, doutorado etc.

Profissão exercida pelos avós

Qualificação

Formação acadêmica e titulação Bacharel, Mestre, Ph.D, sem formação universitária etc.

Área de formação/curso universitário Ciências Naturais, Engenharia, Direito, Economia etc.

Instituição de ensino USP, UFPR, FGV, etc.

MBA Sim, não. Nome do país e instituição de ensino

Permanência no exterior durante a Sim, não. Nome do país e instituição de ensinoformação acadêmica (> 1 ano)

Carreira e Trajetória Profissional

Tempo de permanência na atual posição (anos) 0, 1, 2, 3, 4, 5 etc.

Tempo de inserção na empresa atual (anos) 0, 1, 2, 5, 10, 20 etc.

Número de vezes que mudou de empresa 0, 1, 2, 3, 4, 5 etc.

Número de vezes que mudou de ramo 0, 1, 2, 3, 4, 5 etc.ou setor econômico

Número de vezes que mudou de área 0, 1, 2, 3, 4, 5 etc.de trabalho

Número vezes que mudou de conglomerado 0, 1, 2, 3, 4, 5 etc.empresarial

Permanência no exterior para atividades Tempo e número de permanências.profissionais (> 1 ano)

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FONTE: Os autores.

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O método life course analysis consiste em ummétodo normalmente utilizado pelas Ciências Sociaispara a investigação e análise da biografia e da trajetóriade determinados grupos sociais, e tem como objetivoinvestigar a estrutura social, assim como pontos deinflexões sociais em uma determinada sociedadeestudada. Segundo Sackmann (2007) todo indivíduotem uma trajetória e cada um pode muda-la por engajar-se e estabelecer novos objetivos a serem alcançadosao longo da vida. Esta dinâmica pode ser identificadae controlada através de métodos empíricos, os quaispermitem levantar as variedades e contradições doseventos sociais (idem).

As pesquisas de life course analysis permitem nãosó a identificação e a compreensão da dinâmica emomentos de inflexão social, mas também que seinvestigue temas como mobilidade social e profissional,trajetórias escolhidas durante a formação profissionale construção da carreira, ciclo de vida familiar etc.(MAYER, 1990). A trajetória de vida é compreendidaaqui como resultado de influências econômicas,politicas e culturais, processo de socialização, bemcomo de escolhas individuais (idem). Além disso, essemétodo permite o trabalho com grande número dedados, o que pode acrescentar maior validadequantitativa para a pesquisa.

A análise da prosopografia orienta-se pelainterpretação da “história” individual de cada atorestudado dentro de um grupo, mas é considerada comouma sequência de eventos que possuem uma dimensãocoletiva e que podem mudar o status social de umdado corte. Longitudinalmente, as mudanças nastrajetórias individuais estudadas de um grupo definido,são examinadas por meio de diferentes variáveisdependentes e independentes. A mudança no statussocial de um indivíduo é primeiramente comparadacom as mudanças, ocorridas ou não, com os outrosatores incluídos no corte. Assim, as diferençasindividuais não devem tornar-se o foco dos estudos,assim também como não podem ser compreendidasisoladamente por meio desse método (KLUGE &KELLE, 2001).

No caso aqui estudado, a life course analysiscontribui para o estudo da mobilidade internacional e asmudanças nos padrões de carreira da elite econômicabrasileira e, em um segundo momento, para a análiseda mobilidade social da chamada elite econômicabrasileira, uma vez que os dados sobre a origem socialcontribuem para a compreensão dos mecanismos derecrutamento e da reprodução social do grupo estudado.

III. BRAIN CIRCULATION

Como mencionado anteriormente, o processo deglobalização levaria à emergência de uma elite global,

ou seja, a formação de um pequeno grupo de grandeinfluência político-econômica (SKLAIR, 2001). Esseprocesso seria fomentado pelo acentuado processode transnacionalização das organizações. Grandescorporações estariam adquirindo um papel e um nívelde influência cada vez maior na sociedade atual, duranteeste último século (LOPEZ-RUIZ, 2004). Isso poderiaser compreendido como consequência da globalizaçãoda economia, que faria com que empresastransnacionais ganhassem cada vez mais significadonão somente na economia mundial, mas também noestilo de vida e trabalho da sociedade contemporânea(BECK, 1997; SKLAIR, 2001; LOPEZ-RUIZ, 2004).A ideia até então dominante baseada na existência dediferentes sociedades divididas em Estados-Naçõespassa a ganhar um novo elemento: sua integraçãotransnacional. Isso consiste na ideia de um novo espaçosocial, no qual fronteiras político-geográficas, assimcomo culturais, passariam a desempenhar um papelsecundário, não somente relacionado a trocas de di-nheiro e capital entre os países, mas também pertinen-tes a decisões políticas e ainda a temas como o dolivre deslocamento geográfico e aqui especificamenteda mobilidade internacional dos atores sociais.

Diante disso, tanto corporações como indivíduospoderiam atuar e influenciar o meio social além dassuas fronteiras regionais e nacionais. Este contextoseria de certa forma a mola propulsora para aemergência de uma classe pós-moderna formada nãosomente por corporações transnacionais, mas tambémpor governantes, profissionais liberais, elites deconsumo e profissionais altamente capacitados, comotop managers e executivos da alta gerência, atuantesna sociedade global. Sendo assim, tal grupo participariade importantes decisões de efeito para além de suasociedade local, ou seja, de efeito de escala global(SKLAIR, 1991; 2001). Nas palavras do próprio autor,a “transnacional capitalist class” pode conectar-se commembros de várias regiões do mundo e fazer parte deimportantes decisões globais.

Pohlmann e Bär (2009) procuram desmistificar taispressupostos. Mesmo concordando que o processo deglobalização pode significar para muitos um aumentoda insegurança decorrente da crescente concorrênciaprofissional e das incertezas relacionadas aos rumostomados com relação a formação profissional, aglobalização pode no entanto, também trazer consigonovas chances, assim como novas possibilidades deascensão social e mobilidade internacional(POHLMANN, 2008; POHLMANN & BÄR, 2009).

Observando alguns estudos a respeito damobilidade internacional de estudantes pode-seconstatar claramente uma tendência com relação aoaumento do deslocamento internacional de pessoas,

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ELITE ECONÔMICA NO BRASIL

neste caso, do grupo estudantil. Com relação a issomostram os dados estatisticos a respeito dodeslocamento internacional de estudantes no mundo,mostram um crescente aumento da mobilidadeinternacional deste grupo nas ultimas décadas.Pohlmann e Bär (2009a) identificaram em seus estudosque estudantes alemães estão entre os primeiros nogrupo de países europeus que mais enviam estudantespara o exterior. Em outras palavras, os estudantesalemães são os que mais buscam uma formaçãocomplementar no exterior, por meio de estágios,intercâmbios universitários, cursos de línguas etc.

Em termos gerais, os dados estatísticos sobre odeslocamento internacional de estudantes evidenciama procura por uma formação acadêmica ecomplementar em outro país, não se trata de fenômenosomente da sociedade alemã. Pode-se dizer que setrata de um fenômeno mundial, o qual também passaa ser fomentado por instituições de apoio ao ensino epesquisa (ALMEIDA et alii, 2004). Olhando pela

pespectiva dos estudantes, poder-se-ia pensar que estesestariam buscando, por meio de trocas, estágios,intercâmbios e cursos no exterior, melhorar suaschances diante da concorrência no mercado detrabalho em um mundo globalizado, assim legitimando,em seu curriculum vitae, o desenvolvimento de uma“competência internacional” sob o título de“experiência internacional”.

A Tabela 1, a seguir, mostra os países que maisrecebem e enviam estudantes para formaçãoacadêmica no exterior. Diante desses dados, EUA,Reino Unido, França, China, Austrália, Alemanha,Canadá e Japão, respectivamente, são os países quemais recebem estudantes estrangeiros anualmente,embora não sejam necessariamente os países que maismandam estudantes para o exterior. O maior númerode estudantes internacionais é, respectivamente, deorigem chinesa, indiana, coreana, americana,marroquina, argeliana, japonesa, malesia, turca, russae tailandesa.

TABELA 1 – CIRCULAÇÃO INTERNACIONAL DE ESTUDANTES

País Anfitrião 2009 2010 Países de Origem

EUA 690 923 723 277 China, Índia, Coreia do SulReino Unido 415 585 455 600 China, Índia, EUAFrança 266 448 283 621 Marrocos, China, ArgéliaChina 238 184 265 090 Coreia do Sul, EUA, JapãoAustrália 253 717 258 827 China, Índia, MalásiaAlemanha 244 766 252 032 Turquia, China, RússiaCanadá 161 679 174 760 China, Índia, Coreia do SulJapão 132 720 141 774 China, Coreia do Sul, Taiwan

FONTE: The Open Doors Report on International Educational Exchange, 2011.

O Gráfico 1 evidencia o crescimento da circulaçãointernacional de estudantes nas últimas décadas. Entreos anos de 1975 e 2009 houve um aumento significati-vo do deslocamento internacional de estudantes no

mundo, um crescente aumento da mobilidadeinternacional poderá chegar, no ano de 2020, a 5,8milhões de estudantes.

GRÁFICO 1 – ESTIMATIVA DE CRESCIMENTO DA CIRCULAÇÃO INTERNACIONAL DE ESTUDANTES NO MUNDO

1975

0,8M

1980

1,1M

1985

1,1M

1990

1,3M

1995

1,7M

2000

2,1M

2005

3,0M

2009

3,7M

2020

5,8M ?

(British Council, 2004)

FONTE: The Open Doors Report on International Educational Exchange, 2011.

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Com relação ao Brasil, também se pode observaro fomento com relação à mobilidade internacional deestudantes. O programa Ciência Sem Fronteiras, porexemplo, lançado em 2012, envolvendo a Capes e oCNPq, é voltado para o envio de estudantes brasileirosde graduação e pós-graduação ao exterior e a vinda deestudantes estrangeiros para o Brasil. Segundo dadosdo Ministério da Educação, esse programa tem comometa, a ser atingida até 2015, a conceção de 101 000bolsas para estudantes brasileiros que pretendemestudar no exterior. As bolsas estão distribuidas emdiferentes modalidades de ensino superior para cursosde graduação e pós-graduação. Além disso, a Capestem desenvolvido parcerias com outras instituiçõescomo: DAAD7, BMBF8 etc. para o oferecimento debolsas de estudos, sem vinculo direto com o programaCiências Sem Fronteiras. Entre os países que maisrecebem brasileiros segundo dados do GovernoFederal são respectivamente França, EUA, RepúblicaTcheca e Alemanha (BRASIL. ME, 2013). Como sepode perceber, o processo de internacionalização daformação profissional parece não ser unilateral, umavez que não se restringe somente à busca de estudantespor cursos de formação profissional no exterior, mastambém, segundo Almeida et alii (2004), esse processode internacionalização das competências acadêmicasparece ser de fato fomentado por instituições de ensinoou instituições vinculadas à instituições de ensinosuperior (idem).

A mobilidade internacional entre estudantes parecenão ser um mito da globalização, uma vez que, comovisto acima, os dados estatísticos mostram claramenteo aumento do deslocamento internacional desse grupo.Embora se possa constatar um crescente processode internacionalização na formação de jovensestudantes, ainda não se pode saber o quanto destespermanecem no país estrangeiro e desenvolvem lá suacarreira profissional.

Pohlmann e Bär (2009), em suas pesquisas sobreboderless career, investigaram o fenômeno do braincirculation9 de profissionais altamente capacitadosna Alemanha, entre eles presidentes e diretores gerais,no setor industrial, e médicos diretores gerais degrandes hospitas10. Seus estudos mostram que obrain drain está muito aquém se comparado com aabrangência do discurso político e medial alemãosobre o assunto. Os dados da Tabela 2 permitemvisualizar o que Pohlmann e Bär (idem) procuramevidenciar. Esses dados mostram que o número totalestrangeiros que ocuparam posições executivas naAlemanha, no ano de 2010, representa somente 7,5%do total de top managers ocupando essas posições.No ano de 2011, esse número sofreu ainda uma leveregressão, passando a representar somente 6,8% dototal de top e middle managers atuantes em empresasalemãs (idem).

7 DAAD: Deutscher Akademischer Auslandsdienst [ServiçoAlemão de Intercâmbio Acadêmico]. Disponível em: http://www.daad.org.br/pt/. Acesso em: 12.ago.2013.8 BMBF: Bundesministerium für Bildung und Forschung[Ministério da Educação e Pesquisa]. Disponível em: http://www.bmbf.de. Acesso em: 12.ago.2013.9 Esse termo foi primeiramente utilizado Chalamwong (2005)para descrever o deslocamento de profissionais altamente

TABELA 2 – ESTRANGEIROS EM ALTOS CARGOS DE DIRETORIA E GERÊNCIA NA ALEMANHAAlemanha Oriundos Oriundos Oriundos

de paises de países de outrasestrangeiros europeus regiões

No ano de 2010Diretor Executivo/Empresário 777 000 8,3% (65 000) 6,9% 1,4%Chefe de divisão 482 000 6,4% (31 000) 5,6% 0,8%Total 1 249 000 7,5% (95 000) 6,3% 1,2%

No ano de 2011Diretor Executivo/Empresário 893 000 8% (72 000) 6,6% 1,4%Chefe de Divisão 621 000 5,3% (33 000) 4,5% 0,8%Total 1 514 000 6,8% (104 000) 5,7% 1,1%

FONTES: Pohlmann e Bär (2009) e Mikrozensus (DESTATIS, 2013).

qualificados da Inglaterra para os Estados Unidos. O termorefere-se principalmente à alta mobilidade desses profissionaisentre países industrializados. Neste caso, referindo-se àAlemanha, o termo refere-se ao número de profissionaisaltamente qualificados que emigram ou imigram para a Alemanha.10 Serão tratados aqui somente os dados referentes aosdiretores gerais e presidentes de indústrias. Os dadosquantitativos, relacionados à area da Medicina, não serãoabordados neste artigo.

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ELITE ECONÔMICA NO BRASIL

Os dados atuais levantados na pesquisa “O novoespírito do capitalismo no top management”(POHLMANN, 2011b) têm confirmado um númeromuito restrito de brasileiros executivos atuando comopresidentes e/ou diretores gerais de grandes indústrias

Além dos dados do Mikrozensus apresentados naTabela 2, foi investigado, nas pesquisas de Pohlmann(2009b), o número de top managers alemães, entreos anos de 2005 e 200811, que dirigiam grandesempresas em diferentes países membros da Organiza-ção para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico(OECD), como Japão, Coréia do Sul, China e Índia.O resultado de seus estudos demostraram que, no topmanagement das indústrias estudadas, não havia apresença de nenhum executivo alemão (idem). Emoutras palavras, não foi identificado nenhum executivoalemão atuando como presidente ou diretor geral entreas 100 maiores empresas dos países acima citados(POHLMANN, 2009b; POHMANN & BÄR 2009).Michel Hartmann, outro pesquisador alemão sobre aformação e reprodução de elites econômicas, compro-va que a circulação internacional de profissionais alta-mente qualificados mostra-se significativamente peque-na na França, Inglaterra e EUA, o que demonstra quea dinâmica de brain circulation parece ser bem restritaquando referida a executivos atuantes em altas posi-

ções administrativas e gerenciais (HARTMANN, 2007).

Com relação ao processo migratório entre paísesda América do Sul e EUA, pode-se perceber, por meioda análise de dados estatísticos, que a ocupação dealtas posições na economia por estrangeiros não semostra muito diferente dos resultados obtidos nosestudos de Pohlmann (2009a; 2009b) e Pohlmann eBär (2009). Isso pode ser observado mais de pertocom os dados apresentados na Tabela 3, relacionadosao deslocamento internacional de profissionais depaíses sul-americanos para os EUA. Tais númerosmostram que a porcentagem de brasileiros e sul-americanos em geral trabalhando nos EUA, na áreaadministrativo-financeira, é significativamente redu-zido, exatamente 7%, comparado com o percentualde estrangeiros que exercem outras funções profissio-nais. Além disso, por meio dos dados do MPI (2007),não se pode afirmar com exatidão quantos brasilierosque atuam na área administrativo-financeira ocupamde fato uma alta posição gerencial.

TABELA 3 – IMIGRANTES NOS ESTADOS UNIDOS (ACIMA DE 16 ANOS) E SUA OCUPAÇÃO PROFISSIONAL

FONTE: MPI (2007).

América 1 080 071 8% 2% 2% 6% 4% 26% 11% 11% 18% 11% 3%do Sul(Total)

Colombia 217 356 8% 2% 3% 6% 4% 26% 11% 13% 12% 13% 3%

Brasil 201 129 7% 2% 2% 5% 2% 34% 8% 8% 23% 7% 2%

Peru 163 316 7% 1% 2% 6% 4% 28% 12% 11% 15% 12% 2%

Ecuador 163 049 3% 1% 1% 3% 2% 25% 8% 9% 28% 17% 4%

Venezuela 74 741 14% 2% 5% 11% 2% 19% 15% 13% 10% 6% 3%

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11 Uma reinvestigação desses dados está sendo realizado emsua atual pesquisa “O novo espírito do capitalismo no topmanagement” (POHLMANN, 2011a).

nos diferentes países estudados12. Seu total nãorepresentaria 3% do sampling. Quando analisado onúmero de estrangeiros no Brasil que assumemposições gerenciais, os números indicam a permanênciade 21 presidentes e diretores gerais liderando 21

12 Entre os países estudados estão Alemanha, Suíça, Áustria,Inglaterra, EUA, Japão, China, Coreia do Sul, India, Hong Kong,Brasil e Argentina.

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empresas listadas entre as 100 maiores indústrias noBrasil. Em um primeiro momento, pode-se pensar emum processo de internacionalização do topmanagement nas indústrias brasileiras. Todavia, entreas 100 maiores empresas do setor industrial situadasno Brasil, 49 são de capital estrangeiro. Isso representa48% das empresas estudadas, um númerorelativamente alto se comparado com os outros paísesinvestigados nesta pesquisa. Sendo assim, os 21executivos estrangeiros estão na presidência de filiaismultinacionais e/ou transnacionais no Brasil. O mesmoacontece com os poucos executivos brasileiros no ex-terior. Estes estão em via de regra a serviço de empre-sas genuinamente brasileiras de atuação internacional(idem). Tais dados podem indicar tendências deinternacionalização na trajetória profissional deexecutivos, mas ainda não demonstra característicasque indicariam a existência de borderless career.

Os executivos estudados, no Brasil, apresentamem sua formação acadêmica um alto grau de inter-nacionalização. Cerca 50% deles fizeram parte de suaformação acadêmica e/ou acadêmica complementarno exterior, em especial parte de pós-graduações. Noentanto, se somente forem consideradas permanênciasno exterior acima de um ano, o número cai para 22%.No que diz respeito à carreira propriamente dita, trêsquartos dos executivos brasileiros estiveram por nomínimo um ano a trabalho no exterior.

Uma breve análise dos dados apresentados acima,a respeito do movimento migratório de estudantes eda internacionalização da carreira de altos executivos,permite constatar que o tratamento da literatura arespeito do brain circulation demostra dar uma maiorênfase ao tema, quando observado empiricamente.Dessa forma, a ideia de um intenso processo migratóriode profissionais altamente capacitados, como propõemas teorias da globalização, não parece ter consistênciaempírica. Embora possa se observar um crescentedeslocamento internacional de estudantes, o mesmonão pode ser observado entre os altos executivos. Acrescente circulação internacional parece estar bemrestrita quando se trata de profissionais altamentequalificados, e, neste caso, em posições de altagerência.

Carreiras sem fronteiras ou internacionais parecemocorrer na prática dentro dos “limites” das própriasempresas, por meio de sua própria dinâmica deexpatriação. O processo de internacionalização parecemuito mais ocorrer por meio da formação acadêmico-complemantar e/ou de períodos de permanência emunidades ou filiais da empresa no exterior, em geralorganizados pela própria empresa, do que pelodesenvolvimento de uma carreira internacional

propriamente dita, que se justifica pelo recrutamentointernacional de executivos por diferentes empresasde diferentes nacionalidades. Diante dos dados apre-sentados, não existem indícios do desenvolvimento eda continuação de carreiras transnacionais, mas simum processo de internacionalização leve, descrito porPohlmann e Bär (2009) como light internatio-nalization, discutido na próxima seção.

IV. PROFISSIONAL DE CARREIRA X CARREIRAINTERNACIONAL

Um artigo da revista Exame (ESTAMOS NA ERADO EXECUTIVO INFIEL, 2013) traz que de cadadez executivos das maiores companhias no Brasil,quatro pretendem mudar de empresa nos próximosdois anos. Isso indicaria uma grande flutuação detrabalho nesse meio, caracterizada por constantestrocas de empresa ou conglomerado. Mas será queseria esse o padrão de carreira do executivo industrialbrasileiro, marcado por constantes trocas de setorese empresas, ou ainda envolvendo steps no exterior?

Como discutido acima, a globalização funcionariacomo uma mola impulsionadora do surgimento deborderless career para altos executivos. Esse grupopassaria não somente a desfrutar de previlégios, comoa escolha por onde viver e trabalhar, mas tambémparticipariam de importantes decisões político-econômicas de abrangência internacional. Tudo issoporque os limites político-geográficos não passariammais a desempenhar papel algum (BECK, 1997;SKLAIR, 2001). Esse novo paradigma de espaçopolítico-geográfico, conduziria a uma nova visão deespaço social, a qual implicaria, entre outros, odesenvolvimento de novos padrões de carreira,deixando de ser orientadas por normas e valoresnacionais e culturais. Beck (1997) e Sklair (2001)afirmam que esse processo seria desencadeado efomentado pelas organizações transnacionais por meiode seu processo de produção e sua atividade comerciale financeira global, acelerando com isso o processode recrutamento internacional de profissionaisaltamente qualificados e, consequentemente, aformação de carreiras transnacionais.

Pohlmann (2009b; 2011b) identificou que emboraexperiências internacionais sejam bem vindas no mo-mento de contratação, estas não parecem desempenharum papel determinante para a continuação da carreiradentro da organização, principalmente no que se refereà ocupação de posições superiores (top positions). Emvia de regra, chegam às posições mais altas aquelesque fazem sua carreira dentro da empresa, ou seja,profissionais com muitos anos de casa, tambémchamados de “profissionais de carreira” (POHLMANN2008; 2009a; 2011b; POHLMANN & BÄR 2009).

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ELITE ECONÔMICA NO BRASIL

A preferência por profissionais de carreira nãoexclui automaticamente a sua bagagem internacional,adquirida durante a trajetória profissional. Esta pode,por sua vez, alavancar em alguns momentos odesenvolvimento da carreira dentro da organização.Para os atuais top managers investigados, aspermenências no exterior em via de regra acontecerama serviço da própria empresa. Elas não estiveramvinculadas a mudanças de organização, mas sim a umatemporária expatriação do profissional em uma unidadeinternacional da empresa. Dessa forma, taisprofissionais haviam iniciado sua carreira edesenvolvido grande parte dela na sede da organização,localizada em seu país de origem, antes de assumirempostos em unidades no exterior e, portanto, a posiçãode top manager. Assim, pode-se verificar, em suabiografia, que suas permanências no exterior foramem sua maioria de curta duração e realizadas emunidades subsidiárias da empresa em outros países.Pohlmann e Bär (2009) descrevem essa dinâmica deexpatriação como uma forma de internacionalizaçãoleve na carreira de altos executivos, em suas palavras,light internationalization (idem). Uma vez que ainternacionalização da carreira de top managers parece,por via de regra, ocorrer dentro dos limites da própriaorganização, pode-se dizer que o sistema de carreiradesse grupo parece estar orientado por valores enormas culturais. Isso indicaria que mesmo diante daglobalização parece predominar um modelo de carreirapautado em normas e valores locais, ou, ainda,nacionais.

Pohlmann (2009a) identificou ainda que top managersde multinacionais alemãs comumente trabalharam amaior parte do tempo de sua carreira na sede daempresa, como apresentado acima. Os executivosalemães que permanecem longos períodos no exterior,gerenciando empresas subsidiárias alemãs, acabam porter menores chances de atigir posições no topmanagemet na sede da organização. Muitas vezes, osaltos salários e benefícios oferecidos são consideradoscomo uma forma de conpensação, por terem suaschances de atingir o top management diminuídas pelofato de terem passado muito tempo fora da sede daorganização (POHLMANN, 2008; 2009a; 2011b;POHLMANN & BÄR, 2009). Isso mostra a existênciade um modelo dominante de padrão de carreira entreos top managers das indústrias alemãs, caracterizadopela predominância de carreiras domésticas epreferência por profissionais insiders. Sociologicamente,pode se compreender esse fenômeno como umapreferência por profissionais com longo processo desocialização dentro da organização, o que garantiria umaforte identificação do profissional com os valores enormas da empresa e, consequentemente, um vínculoestável de lealdade e compromisso.

Os dados recentemente levantados a respeito dabiografia e trajetória dos executivos brasileirosmostram que estes também apresentam, em suamaioria, um longo tempo de socialização dentro daempresa, em média 22,67 anos, sugerindo que otempo de inserção dos executivos brasileiros dentroda organização desempenha um papel importantepara a sua ascensão ao top management(POHLMANN, 2011a). Outro aspecto importanteestá relacionado ao número de trocas de organizaçãodos executivos brasileiros ao longo de sua carreira.Os resultados mostraram que a grande maioria dosexecutivos estudados trocou de empresa no máximouma vez no decorrer de sua vida profissional,considerando que nos primeiros cinco anos podemocorrer algumas trocas de trabalho até que oexecutivo estabeleça-se em uma função eorganização de seu interesse (POHLMANN, 2009b;POHLMANN & BÄR, 2009).

Comparando os resultados da pesquisadesenvolvida no Brasil e os resultados dos estudos atéentão realizados na Alemanha, pode-se afirmar que omodelo dominante de carreira nos dois paísesestudados parece ser o modelo de carreira doméstica.O tempo de inserção do profissional alemão dentro daorganização é, em média, de 16 anos13. Como vistoacima, a média de tempo de trabalho do executivobrasileiro é de 22,67 anos (POHLMANN, 2009b;2011b; 2011a). Além disso, a porcentagem deexecutivos alemães que mudaram de organização nomáximo uma vez ao longo de sua carreira consisteem 76,7%, enquanto a porcentagem de executivosbrasileiros é de 61,6%.

Outro aspecto muito importante a ser ressaltado arespeito da internacionalização do top management noBrasil consiste no número de top managers estrangeirosatuantes no Brasil. Por meio dos dados recentementelevantados (POHLMANN, 2011a), pode-se verificara existência de 21 executivos estrangeiros entre os100 top managers estudados. A princípio, esses dadospoderiam levar a conclusões a respeito de um processomais intenso de internacionalização da carreira de altosexecutivos, podendo ser observado no Brasil. Noentanto, se tais dados forem analisados mais de perto,percebe-se que se trata mais uma vez de uma dinâmicade expatriação organizada pela própria empresa. Essadinâmica pode ser observada com mais precisão naTabela 4.

13 Dados recentemente levantados para a pesquisa “O novoEspirito do Capitalismo no Top-Management”. O tempo médiode 16 anos refere-se ao tempo de insercao organizacional dosCEOs e presidentes executivos das 100 maiores industriasalemas.

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De acordo com os dados apresentados na Tabela4, não há evidências de atuação de executivosestrangeiros em empresas genuinamente brasileiras,ao contrário, todos os 21 executivos estrangeirosatuam em empresas multinacionais no Brasil. Comisso, pode-se dizer que eles estão no Brasil a serviçode empresas, cuja sede está localizada em seu país deorigem. Um bom exemplo para essa dinâmica seria ade top managers alemães que frequentemente estãono Brasil como presidente de empresas alemãs. Pormais que o Brasil seja um país com uma grande atuaçãode indústrias internacionais no seu mercado interno,não se pode falar de uma internacionalização gerencialdessas indústrias, uma vez que a gerência parecepermanecer orientada por modelos nacionais decarreira (idem).

Diante dos dados apresentados acima se podeconcluir que, no Brasil, existe um modelo dominate decarreira de executivos que consiste em um longo períodode inserção dentro da organização e relativamente poucastrocas de trabalho durante a trajetória. Essascaracterísticas indicam um modelo de carreiradoméstica, ou seja, a trajetória profissional acabaacontecendo dentro de uma organização que orienta edetermina os caminhos a serem seguidos ao longo dacarreira. Carreiras domésticas são via de regra orientadaspor normas e valores nacionais, o que também podeser observado com relação a nacionalidade dos CEOs ea nacionalidade das empresas lideradas por eles no Brasil.Tais resultados contradizem os pressupostos das teoriasda globalização, que afirmam existirem carreiras transna-cionais como efeito do processo de globalização(POHLMANN, 2009a; 2011b; POHLMANN & BÄR,2009).

V. RECRUTAMENTO INTERNACIONAL?

Como discutido nas seções anteriores, a hipótesedo surgimento de uma elite econômica transnacionalformada por executivos e profissionais altamentequalificados e disputados globalmente pode serempiricamente revidada. Intimamente ligada a essediscurso da internacionalização do top managementestá a questão do recrutamento dessa elite econômica

TABELA 4 – INTERNACIONALIZAÇÃO DO TOP MANAGEMENT NO BRASILBrasileira Estrangeira Total

Nacionalidade 81 21 102

Gerenciando indústrias Gerenciando indústrias Totalbrasileiras multinacionais

Top-Manager brasileiros 54 27 81

Top-Manager estrangeiros no Brasil 0 21 21

FONTE: Pohlmann (2011a).

(POHLMANN & BÄR, 2009). Tais teorias enfatizamo desempenho profissional como um dos requisitosmais importantes para fazer parte desse grupo,desconsiderando, dessa forma, correlações comoutras possíveis variáveis, como a origem social,educação formal, entre outras. A preferência porcarreiras domésticas, como discutido no item anterior,não é o único aspecto que conduz à idéia de que outroscritérios também desempenham um papel importanteno recrutamento de executivos da alta administração(POHLMANN, 2009a).

Diferenças e similaridades, não só com relação aopadrão de carreira dominante, mas também com osmecanismos de recrutamento de inserção nesse grupoem diferentes sociedades, consistem em um dosprincipais interesses dos estudos a respeito da formaçãode elites econômicas. Pohlmann (idem) mostra que naAlemanha, por exemplo, o mecanismo de recrutamentopara o top management de corporações transnacionaisdemonstra estar organizado de tal forma que permiteuma reprodução de funções e posições. Isso indica aexistência de uma reprodução social, observada por meioda função exercida pelos pais e avós dos executivosestudados até o momento. Sendo assim, pode-seobservar que a maioria dos executivos alemães vem defamílias em que os pais e avós tinham profissões naárea econômica.

O recrutamento funcional parece ser determinadoainda muito cedo, ou melhor, antes mesmo do início datrajetória profissional. Isso demonstra que a escolhapor cursos acadêmicos específicos pode significar umaprimeira seleção, entre outras futuras (POHLMANN2011b; POHLMANN & BÄR, 2011). Isso indicaria quedeterminadas profissões poderiam conduzir adeterminadas posições. Esse processo pode sercomprovado pelos estudos de Pohlmann (2009a; 2011b)na Alemanha. Entre os executivos alemães estudados,pode-se observar uma grande representatividade dasáreas de Engenharia, Economia e Administração deEmpresas. Outro mecanismo de recrutamento dosexecutivos alemães indica que a atuação profissionalem determinados setores e a rede social desenvolvida

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pelo executivo dentro da empresa acabam pordesempenhar um papel importantíssimo para se chegarao top management (POHLMANN & BÄR, 2011).

O caminho que levaria ao top management nãopoderia, de forma alguma, ser investigado sem umarelação com a origem social desse grupo. Sendo assim,os resultados dos estudos de Pohlmann (2009a) ePohlmann e Bär (2011) mostram que, embora nãoexista uma representação massiva da alta burgesiaalemã – somente 7% –, pode-se perceber que a grandemaioria (80%) dos top managers alemães vem defamílias consideradas burguesas. Diante desses dados,pode-se dizer que, no caso da Alemanha, orecrutamento da elite econômica não se trata de umprocesso de reprodução da elite propriamente dita. Aocontrário, trata-se muito mais da mobilidade social,relacionada tanto à ascensão quanto ao descenso social(POHLMANN & BÄR, 2011). Mesmo que osexecutivos alemães tenham seu caminho para o topmanagement de certa forma preparado por seu gruposocial, inclusive pela família, a ocupação de altasposições não demonstra ser determinada pela família.Sendo assim, tratam-se mais de possibilidades deascensão social existentes na sociedade alemã, que semostram relativamente grandes (POHLMANN,2011b).

Os dados recentemente levantados a respeito dabiografia e trajetória profissional dos executivosbrasileiros parecem demonstrar, assim como naAlemanha, a existência de uma relativa permeabilidadesocial. Grande parte desse grupo vem de famílias deprofissionais liberais, sitiantes, empresários ecomerciantes de classe média e média alta. Apenasuma pequena parte desse grupo provém de famíliassituadas na chamada alta burguesia, famílias de grandesempresários, latifundiários etc. (POHLMANN, 2011a).No caso do Brasil, as instituições de ensino como aescola e a universidade poderiam desempenhar umpapel importante no que diz respeito ao recrutamentoda elite econômica. De acordo com os dados, o grupoestudado poderia ser dividido em dois grandes grupos,com relação à instituição de ensino superiorfrequentada. Enquanto pouco mais de 50% dosexecutivos investigados estudaram em universidadesfederais brasileiras, a outra metade concluiu seu cursoacadêmico em universidades e faculdades particularesde boa reputação na área administrativa, como aFundação Getúlio Vargas (FGV) e a Fundação DomCabral (FDC) (idem). Além da escolha pela instituiçãode ensino superior, pode-se observar também ummecanismo de recrutamento funcional entre osexecutivos brasileiros. Cerca de 60% dos top managersinvestigados concluíram um curso de Engenharia e/ou um curso na área das Ciências Naturais. O restante

de 40% formou-se em Economia ou Administração.Isso deixa claro o quanto a área de atuação podeinterferir no recrutamento da elite econômica brasileira.

Assim como a explicação para o deslocamentointernacional de top managers de grandes corporaçõesnão pode basear-se somente em critérios econômicos,mesmo que estes sejam também relevantes, a formade recrutamento da elite econômica não pode estarpautada unicamente em critérios relacionados aopróprio indivíduo, como, por exemplo, seudesempenho profissional. Para uma análise dessaordem, faz-se necessário que sejam melhor estudadoso padrão de carreira e a forma de recrutamentoinstitucionalizados na sociedade do grupo investigado(POHLMANN, 2009a). Diante disso, não é só o modelodominante de padrão de carreira, o do profissional decarreira, que tem sido intensamente investigado porsociólogos, mas também a forma como esse grupose reproduz (idem; HARTMANN, 2003).

Do ponto de vista sociológico, explicações quepossam determinar a variação entre padrões de carreirae a forma de recrutamento da elite econômica emdiferentes sociedades podem ser alcançadas somentepor meio da análise de fatores socioestruturais, culturaise também organizacionais, que é o que se pretendeinvestigar (POHLMANN, 2011a).

VI. CONCLUSÕES

O presente artigo teve como objetivo principalfazer uma análise da internacionalização do topmanagement a partir dos primeiros dados empíricoslevantados sobre a biografia e trajetória profissionalde top managers brasileiros e, assim, contribuir paraas discussões a respeito do surgimento de uma eliteeconômica global, tema frequentemente discutidopelas teorias da globalização. As análises aqui realizadastiveram como parâmetro metodológico pesquisasrealizadas sobre a Europa, o Leste Asiático e os EstadosUnidos. Seus resultados revelam importantes aspectos,tanto a respeito da estrutura social de cada um dospaíses estudados, como da mobilidade internacionalde executivos de alto escalão.

No decorrer deste artigo pode-se perceberclaramente uma crescente mobilidade internacional deestudantes de vários países do mundo. Tal movimentovem sendo, contudo, fomentado por instituições deapoio ao ensino e à pesquisa (ALMEIDA et alii, 2004).O aumento da mobilidade internacional também podeser percebido em outras formas de movimento social,como, por exemplo, no fluxo migratório profissional,cujo tema pode ser abordado em pesquisassociológicas voltadas para os fluxos migratórios. Noentanto, se observarmos o número de trabalhadoressul-americanos nos Estados Unidos, podemos

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perceber que, embora a quantidade de sul-americanosvivendo e trabalhando nos EUA seja significativa, essenúmero é muito pequeno quando se trata da ocupaçãode altas posições administrativas. O mesmo pode serobservado na Alemanha por meio dos dados doMikrozensus14 (DESTATIS, 2013).

Esses dados mostram que, embora algumas teoriasdescrevem a existência de um alto deslocamentointernacional de grupos elitizados, como governantes,executivos etc. e, assim, um crescente processo deinternacionalização da gerência de grandesorganizações internacionais impulsionado peloprocesso de globalização, os dados mostram-nos queessa internacionalização está restrita aos “limites” detais organizações, ou seja, um processo de lightinternationalization (POHLMANN & BÄR, 2009).

Isso nos leva a pensar que, embora as experiênciasinternacionais, mesmo que ainda na fase de formaçãoacadêmica, sejam valorizadas positivamente na buscade um trabalho, elas não parecem ser um critériodecisivo para a construção de carreiras gerenciais.Observando os dados levantados no Brasil sobre ostop managers brasileiros e das pesquisas realizadaspor Pohlmann (2009; 2011b), os executivos trazem,em seu currículo, uma leve internacionalização em suacarreira, ou seja, passam períodos curtos no exteriororganizados pela própria empresa. A lightinternationalization pode ser melhor compreendidaquando se observa o constante movimentointernacional de profissionais de companhiasmultinacionais e transnacionais entre suas subsidiárias.No entanto, se as estadias forem muito longas, essesprofissionais perdem a chance de assumir posiçõesmais altas na sede da corporação e ainda podem terdificuldades de recolocação profissional no seu retorno(POHLMANN & BÄR, 2009). Tais conclusões nãonos levam à confirmação do surgimento de mercadosinternacionais para top managers, uma vez que ainternacionalização da carreira trata-se de umainternacionalização leve.

Uma explicação seria o fato de que o padrão decarreira dominante nas organizações dos paísesestudados consiste no modelo de carreira doméstica,

ou seja, do profissional de carreira. Isso nos leva àcompreensão de que o padrão de carreirainstitucionalizado nos países está fortemente ligado avalores e princípios nacionais. Sendo assim,executivos com longo período de socialização dentroda empresa, em seu país de origem, têm maioreschances de chegar à presidência da empresa secomparandos com colegas de trabalho que passarammuito tempo no exterior.

O padrão de carreira está também relacionado aomodo como a elite econômica se reproduz. Diantedisso, observou-se que, além da preferência porprofissionais de carreira, existe ainda certa primaziapor determinadas áreas de formação acadêmica eatuação profissional quando se trata da ocupação deposições no top management. Tanto na Alemanhaquanto no Brasil, os dados empíricos mostram que agrande maioria dos diretores executivos das empresasestudadas tem formação acadêmica nas áreas deEngenharia, Economia e Administração de Empresas(POHLMANN, 2011b). Na Alemanha, o recrutamentofuncional e setorial ganha ainda um aspecto importante,a formação de uma rede social dentro da empresa,que, por sua vez, permite um impulso indireto nacarreira. Com relação ao tempo de inserção doprofissional dentro da empresa, pode-se observar queBrasil e Alemanha não apresentam grandes diferençascom relação a isso.

A análise dos padrões de carreira e recrutamentode elites econômicas alemãs e brasileiras permite-nosconcluir que em ambos os países, o sistema de carreiraestá intrinsicamente ligado a valores culturais enacionais e é corientado pelas organizações. Issosignifica que o meio organizacional, por meio dasfunções e setores percorridos, desempenham umpapel importante para se chegar a uma posição de altagerência. Com isso, o tempo de inserção doprofissional dentro da empresa torna-se um elementomuito importante para o seu exito e sua ascensãoprofissional.

Por fim, podemos concluir, com os dadosapresentados, que não pode ser observado osurgimento de mercados internacionais de topmanagers. Embora essa tese vem sido frequentementediscutida pelas teorias mainstream da globalização,pode ser verificada até o momento por meio de dadosempíricos, aqui relacionados a mobilidade internacionalde executivos de alto escalão. Enquanto os sistemasde carreira indicarem a reprodução de um status socialpor meio da ocupação de determinadas posições, ospadrões de carreira estarão vinculados a modelosnacionais e não a padrões internacionais.

14 O Mikrozensus é um órgão de pesquisa representativaoficial da Alemanha. O micro-senso (Mikrozensus) existe 1957e fornece dados sobre a estrutura da população e da situaçãoeconômica e social da população alemã. Com informações sobrea vida familiar, mercado de trabalho, agências de emprego eformação profissional, o micro-censo tornou-se uma importantefonte de dados, utilizada desde em estatísticas dos líderes dosparlamentos até em pesquisas acadêmicas.

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ELITE ECONÔMICA NO BRASIL

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REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA V. 21, Nº 47: 157-160 SET. 2013

ABSTRACTS

ECONOMIC ELITES IN BRAZIL: A STUDY OF THE INTERNATIONALIZATION OF TOPMANAGER’S CAREERS.

Markus Pohlmann and Elizângela Valarini

The main objective of this paper is to examine the hypothesis regarding the internationalization of Brazilianindustrial top management in the context of globalization. This hypothesis is intrinsically linked to theories ofglobalization, which indicate the emergence of a global economic elite whose particularities are, amongother things, a high performance and high social mobility. Through empirical observation of biographies andcareer paths, as well as the international mobility of top executives in Brazil, we aim to verify the emergenceof a new career pattern, i.e., global careers, as an effect of globalization..

KEYWORDS: brasilian economic elite; brasilian executives; top manager; international career;international recruitment.