EcoSol-caderno4

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FORMAÇÃO EM ECONOMIA SOLIDÁRIA PROJETO CASA BRASIL MÓDULO 4 Economia Solidária e Desenvolvimento Local e Sustentável Fabiana Pereira Gomes Janete Schubert Maurício José Klein Ana Cristina Moreira Tiago Filgueiras Pimentel Everton Rodrigues Ministério do Trabalho e Emprego – M.T.E. Secretaria Nacional de Economia Solidária – SENAES

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FORMAÇÃO EM ECONOMIA SOLIDÁRIA

PROJETO CASA BRASIL

MÓDULO 4

Economia Solidária e

Desenvolvimento Local e

Sustentável

Fabiana Pereira Gomes

Janete Schubert

Maurício José Klein

Ana Cristina Moreira

Tiago Filgueiras Pimentel

Everton Rodrigues

Ministério do Trabalho e Emprego – M.T.E.Secretaria Nacional de Economia Solidária – SENAES

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Casa Civil da Presidência da República

Instituto Nacional de Tecnologia da Informação - ITI

Secretaria de Comunicação de Social - SECOM

Ministério da Educação - MEC

Ministério da Ciência e Tecnologia – MCT

Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq

Ministério das Comunicações - MC

Ministério da Cultura - MinC

Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão - MPOG

Serviço Federal de Processamento de Dados - SERPRO

Caixa Econômica Federal - CAIXA

Banco do Brasil S. A. - BB

Centrais Elétricas S.A. - ELETROBRAS

Empresa Brasileira de Correios e Telégrafo - CORREIOS

Petróleo Brasileiro S.A. - PETROBRAS

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Este é o quarto de seis cadernos que fazem parte do

programa de formação em Economia Solidária promovido

pelo projeto Casa Brasil em parceria com a Senaes/MTE,

com o objetivo de fomentar o desenvolvimento e o

fortalecimento de iniciativas de Economia Solidária.

Atribuição-Uso Não-Comercial-Compatilhamento pela mesma licença 2.5 Brasil

Você pode:● copiar, distribuir, exibir e executar a obra ● criar obras derivadas

Sob as seguintes condições:Atribuição. Você deve dar crédito ao autor original, da forma especificada pelo autor ou licenciante. Uso Não-Comercial. Você não pode utilizar esta obra com finalidades comerciais. Compartilhamento pela mesma Licença. Se você alterar, transformar, ou criar outra obra com base nesta, você somente poderá distribuir a obra resultante sob uma licença idêntica a esta.

● Para cada novo uso ou distribuição, você deve deixar claro para outros os termos da licença desta obra.

● Qualquer uma destas condições podem ser renunciadas, desde que Você obtenha permissão do autor.

Esta é a versão preliminar do Módulo 4 – Economia

Solidária e Desenvolvimento Local e Sustentável. A

versão definitiva será oportunamente disponibilizada no

sítio www.casabrasil.gov.br.

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SumárioApresentação............................................................................................1

1 – Introdução..........................................................................................5

2 – O Ser Humano e o Meio Ambiente................................................5

3 - Contextualizando o desenvolvimento sustentável....................8

3.1 Desenvolvimento Sustentável.....................................................13

3.2 Mas o quê é Desenvolvimento Sustentável?........................14

4 - Desenvolvimento local...................................................................16

4.1 - Princípios do desenvolvimento local e sustentável.........21

4.2 - Condições para o desenvolvimento local e sustentável.24

4.3 - Desenvolvimento local e sustentável: o quê fazer?........28

5 - Economia solidária como ferramenta estratégica para o

Desenvolvimento local e sustentável...............................................29

6 - Referências.......................................................................................32

7 - Anexo.................................................................................................34

Declaração de Joanesburgo sobre Desenvolvimento

Sustentável.........................................................................................34

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Apresentação

O Projeto Casa Brasil e a Secretaria Nacional de Economia

Solidária - Senaes/MTE – promovem em parceria um conjunto de

ações de formação em Economia Solidária. Essas ações consistem

em cinco encontros presenciais regionais, um curso a distância, um

conjunto de oficinas e uma comunidade de prática. Este é o quarto

de seis cadernos que compõem o material didático dos encontros

presenciais de Economia Solidária.

Projeto Casa Brasil

O Projeto Casa Brasil oferece, junto a comunidades de notório

baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), um espaço

destinado a convergência das ações do Governo Federal nas áreas

de Inclusão Digital, Inclusão Social, geração de trabalho e renda,

além de desenvolvimento e ampliação da cidadania. Trata-se de um

projeto de difusão e formação para o uso intensivo das tecnologias

da informação e comunicação com vistas a preparar as populações

dessas comunidades para o rompimento da cadeia de reprodução da

pobreza.

Entre seus seus objetivos estão promover a emancipação de

cidadãs e cidadãos, proporcionando a universalização do acesso aos

meios, ferramentas, conteúdo e saberes da Sociedade do

Informação, por meio das tecnologias da informação e comunicação,

bem como:

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• Trabalhar para a redução da desigualdade social.

• Viabilizar a apropriação autônoma e livre das novas

tecnologias.

• Estimular o desenvolvimento da cidadania ativa.

• Fortalecer as ações das organizações da sociedade civil

e a participação popular.

• Contribuir para a formulação de políticas públicas mais

eficazes e justas.

• Promover a integração da comunidade, estimulando o

lazer, a cultura e o convívio social.

• Democratizar as comunicações.

• Proporcionar um espaço para a manifestação cultural

local e regional.

• Estimular e difundir o hábito de leitura.

• Divulgar a ciência.

• Promover inclusão digital e preparação para uma

releitura das tecnologias por meio dos Laboratórios de

Montagem e Manutenção de Equipamentos de Informática.

• Proporcionar à comunidade a oportunidade de criar e

editar conteúdo multimídia.

• Promover o acesso da população às Unidades

Bancárias.

• Promover a divulgação e o acesso aos Programas do

Governo Federal por intermédio das unidades locais do

Projeto Casa Brasil e do Portal Casa Brasil.

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O Projeto Casa Brasil apresenta este material como parte de

um conjunto de ações de formação em Economia Solidária. O tema

Economia Solidária constitui um dos principais fios condutores do

Projeto, já que articula comunidades a partir de princípios

solidários, promovendo, dessa forma, a inclusão social de seus

agentes. A Economia Solidária valoriza a diversidade, preocupa-se

com a relação do ser humano com o meio ambiente do qual é parte,

oferece alternativas para uma construção social de desenvolvimento

econômico, para a desmistificação das técnicas, para a

democratização da ciência e da tecnologia e para o exercício pleno

da cidadania, identificando-se intimamente com os princípios mais

caros do Projeto Casa Brasil, que, por isso, empreende formações

em Economia Solidária.

Secretaria Nacional de Economia Solidária - Senaes/MTE

Dione ManettiDiretor do Departamento de Fomento à Economia Sol idária

Secretaria Nacional de Economia Sol idária

Ministério do Trabalho e Emprego

A Economia Solidária constitui-se hoje em um importante

instrumento de combate à exclusão social e à pobreza, pois

promove a geração de trabalho e renda para milhões de

trabalhadores(as) de todo o país. Além disso, a Economia Solidária

contesta o modelo excludente, concentrador e perverso da

economia capitalista e propõe a construção de relações econômicas

justas, sustentáveis e solidárias. Por isso, se apresenta como uma

outra forma de organização econômica, que possibilita a promoção

do desenvolvimento justo e solidário.

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A Economia Solidária constrói-se em diálogo permanente

com as diferentes lutas sociais. Para além das questões específicas

que marcam cada uma delas, a disputa do poder econômico é

elemento central na superação de questões de gênero, sexualidade,

etnia, geração, entre outras.

A SENAES – Secretaria Nacional de Economia Solidária, do

Ministério do Trabalho e Emprego – MTE, tem incentivado o contato

e a interação da Economia Solidária com uma multiplicidade de

aspectos de diferentes lutas sociais. Nesse processo, empreende-se

a articulação da Economia Solidária com as tecnologias livres que,

para além de possibilitar o desenvolvimento tecnológico dos

empreendimentos econômicos solidários, que são fortalecidos pelo

amplo acesso à informação.

Nesse sentido, o Projeto Casa Brasil, do Governo Federal,

cumpre papel central na medida em que suas unidades incorporam

a Economia Solidária como prioridade de atuação. Nesses espaços,

formam-se parcerias que possibilitam a ampliação do conhecimento

em relação às tecnologias livres por parte dos empreendimentos

econômicos solidários, ao mesmo tempo em que promove a

apropriação comunitária dos princípios fundamentais da Economia

Solidária, o que proporciona a construção e a disseminação de uma

cultura em relação a essa forma de organização econômica.

A aliança da Economia Solidária com ações do âmbito

governamental ou da sociedade civil, agregada ao conjunto de

outras lutas sociais que cerram fileiras com a Economia Solidária

para a construção de outro mundo possível e que já acontece,

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possibilita a consolidação de uma sociedade que tem a autogestão

como elemento central de sua organização.

1 – Introdução

O quarto caderno da Formação Presencial em Economia

Solidária promovido pelo Projeto Casa Brasil e pela Senaes/MTE

trata da relação da Economia Solidária com o desenvolvimento local

e sustentável. Para falar de sustentabilidade, são abordadas as

relações de homens e mulheres com o meio ambiente do qual fazem

parte, incluindo os aspectos sociais, políticos e econômicos. São

discutidas, em seguida, questões relacionadas a desenvolvimento

sustentável e desenvolvimento local, no contexto do movimento

mundial de reação contra os efeitos homogeneizantes e predatórios

da globalização. Finalmente, apresenta-se a Economia Solidária

como ferramenta estratégica para o desenvolvimento local. Com o

intuito de provocar reflexões sobre essa temática, este caderno

apresenta questões conceituais sobre Economia Solidária e

desenvolvimento local e sustentável, trazendo um panorama

histórico do surgimento desse conceito.

2 – O Ser Humano e o Meio Ambiente

A terra não pertence ao homem; o homem pertence à terra.

Cacique Seattle.

O surgimento da espécie homo sapiens é datado de

aproximadamente 200 mil anos atrás - estamos há um bom tempo

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neste planeta! Façamos, então, um exercício de imaginação, num

passado não muito distante. Vamos tentar vislumbrar a forma como

vivíamos há 300 anos e compará-la ao modo como vivemos hoje.

Vamos pensar, então: quais as mudanças ocorridas nesse período?

De que forma essas mudanças alteram o ambiente em que vivemos?

O Planeta Terra encontra-se num momento crítico. Em virtude

do rápido desenvolvimento das tecnologias e do sistema econômico

vigente nos países de economia central, os nossos sistemas naturais

estão em crise. Por toda parte, constata-se a degradação ambiental

em diversas formas. O mundo perde bilhões de toneladas de solos

férteis anualmente. Os desertos continuam crescendo a uma

velocidade ameaçadora. O abastecimento de energia e água potável

para o futuro próximo está ameaçado, além de outros problemas

generalizados que continuam se agravando, como as mudanças

climáticas recentes ocasionadas pelo impacto do nosso consumo

excessivo de combustíveis fósseis.

Almeida e DaCosta (2007) acreditam que a única forma de

reverter esse quadro é o ser humano sentir-se novamente natureza,

incorporar a natureza. O ser humano não deve se separar do “meio

ambiente”, mas ver sua existência como parte de um “ambiente

inteiro”.

Mas, o que é meio ambiente?

“Lugar determinado ou percebido onde os elementos naturais e

sociais estão em relações dinâmicas e em interação. Essas relações

implicam processos de criação cultural e tecnológica e processos

históricos e sociais de transformação do meio ambiente – o que a

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torna uma concepção na qual o homem está incluído. Não se

limitando a considerar com meio ambiente apenas a fauna e a flora

ou os recursos naturais mas, sobretudo, todos os espaços sociais.”

(Reigota, 1995)

A definição de Reigota, vista acima, destaca a importância dos

aspectos históricos e sociais na concepção de meio ambiente.

Assim, incluem-se nela todos os espaços sociais, e, claro, o homem

e a mulher em seus processos históricos, sociais, políticos,

econômicos e culturais.

Uma abordagem muito interessante sobre a relação do homem

e da mulher com o meio ambiente é dada por Guattari (199). O

autor afirma que há três ecologias: a mental ou pessoal, a social e a

ambiental. Para o autor, a ecosofia é o conjunto dessas três

ecologias, necessária e inelutavelmente relacionadas umas com as

outras. O que a ecosofia de Guattari defende é que as relações

entre meio ambiente, sociedade e indivíduo não podem ser

consideradas isoladamente.

A ecologia ambiental deve ser pensada sob o ponto de vista

das relações entre natureza e meio social, nas dimensões social,

política e econômica. Da mesma forma, a ecologia social deve tratar

da reconstrução de formas de convivência em sociedade e pelas

modificações existenciais na essência da subjetividade, no mundo

abstrato das idéias. E a ecologia mental vê sob um novo ponto de

vista a relação sujeito-corpo, de modo a reinventar meios de fugir à

uniformização social vendida pela mídia - o consumismo, o

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conformismo da moda, as manipulações de opinião pela publicidade,

dentre outros aspectos.

Essa abordagem é uma nova postura em relação à visão

tradicional que coloca a ecologia como o “ambiente natural”,

portanto, externo e separado do homem e da mulher e da

sociedade. Hoje em dia grande parte dos países do mundo conhece

os fenômenos visíveis provocados pelos padrões de produção e

consumo impostos pelo capitalismo – para Weill (2007), tudo indica

que a destruição está chegando, mas de modo lento e invisível, o

que aumenta ainda mais o seu perigo.

Além das questões citadas anteriormente, ampliam-se os

conflitos religiosos e étnicos, as guerras, as desigualdades em todos

os âmbitos provocadas pelo processo de globalização excludente,

que procura impor, a outras nações e povos, padrões de consumo e

de estilo de vida dos países de economia central. Weill (2007)

afirma que o processo de destruição da vida no Planeta começa

individualmente, por uma miragem, uma ilusão de ótica, que o autor

chama de fantasia da separatividade, criada pela dualidade entre o

sujeito que olha para a natureza e os objetos ou pessoas. Fomos

educados para distinguir o mundo exterior de nós, em uma visão

relativizada, construída pelos nossos cinco sentidos e, portanto,

ilusória. Quando trabalhamos sob um ponto de vista que inclui a

vida do ser humano em todas as suas esferas possíveis na

concepção de meio ambiente, podemos ver como todas os seres e

coisas estão inter-relacionados, e falar sobre desenvolvimento

sustentável.

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3 - Contextualizando o desenvolvimento sustentável

METÁFORA AMBIENTAL

Sobre vacas, bernes e política

Autor: Desconhecido

“Era uma vez uma vaca feliz, saudável e bonita.

Mas nem tudo é perfeito.

A vaca tinha hóspedes.

Alguns bernes se hospedaram nela e alimentavam-se da sua carne. Mas

os bernes eram poucos e pequenos... vaca e bernes viviam em paz.

Aconteceu, entretanto, que os bernes começaram a se multiplicar. Os

bernes aumentavam, mas a vaca não aumentava, confirmando a lei de

Malthus, que disse que “os alimentos crescem em razão aritmética, enquanto

as bocas crescem em razão geométrica.”

O couro da vaca se encheu de calombos, que indicavam a presença dos

bernes. Mesmo assim, a vaca continuava saudável. Ela tinha muita carne de

sobra. Foi então que uma coisa inesperada aconteceu: alguns bernes sofreram

uma mutação genética e passaram a crescer em tamanho... foram crescendo,

ficando cada vez maiores, e com uma voracidade também cada vez maior. Os

vermes magrelos ficaram com inveja dos vermes grandes e trataram de tomar

providências para crescerem também.

O corpo da pobre vaca passou a ser uma orgia de crescimento. Os bernes

só falavam numa coisa: É preciso crescer!”Mas a vaca não crescia”, ficava do

mesmo tamanho. De tanto ser comida pelos bernes, a vaca ficou doente.

Emagreceu. Mas os bernes nada sabiam sobre a vaca em que moravam. Para

perceberem, seria preciso que eles estivessem do lado de fora.

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Os bernes estavam dentro da vaca. Assim, não percebiam que sua

voracidade estava matando-a. A vaca morreu!... E, com ela, morreram os

bernes...! Fizeram autópsia da vaca. O relatório do legista observou que os

bernes mortos eram excepcionalmente grandes, bem nutridos, muitos deles

chegando à obesidade.”

(Folha de São Paulo, Caderno Mais, 22/1/06, p. 9).

James Lovelock é um cientista que sugeriu que a nossa Terra é um

organismo vivo, como a vaca dessa parábola. Sendo uma coisa viva, ela pode

ter saúde ou ficar doente.

Sua conclusão é que nós, “os bernes”, já estragamos a Terra, “a nossa

vaca,” além de qualquer possibilidade de cura. A Terra está doente.

O crescimento das nações está provocando profundas mudanças

climáticas irreversíveis: a atmosfera está se aquecendo, as geleiras estão

derretendo, a poluição do meio ambiente aumenta, acontecem catástrofes

naturais numa intensidade desconhecida. Esses são os sintomas dos estertores

da nossa Terra, destruída pela voracidade dos bernes. E o pior está por

acontecer, ele diz. Ecossistemas inteiros serão extintos, e os sobreviventes

terão de se adaptar a um clima infernal...

Nossa relação com o planeta tem se pautado historicamente pela

exploração sem limites. Agimos como se todos os recursos do ambiente

existentes fossem inesgotáveis. Uma pergunta importante é: até quando nosso

planeta irá suportar a velocidade com que o estamos destruindo e explorando?

Outra questão importante que, na maioria dos casos não nos ocorre, é que

integramos esta terra e, como dizia o Cacique Seattle1: Tudo que acontecer à

terra acontecerá aos filhos da terra.

O biogeógrafo americano Jared Diamond, em seu livro “Colapso, como as

sociedades escolhem o fracasso ou o sucesso”, lançado em 2005, constrói a

1 Carta do Cacique Seattle ao Presidente Norte-americano. Texto de

domínio público distribuído pela Organização das Nações Unidas (ONU).

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tese de que o descuido com as questões ambientais foi a causa do colapso de

algumas civilizações históricas, a exemplo dos Maias no México, dos Anasazis

do Novo México e os Vikings em suas colônias da Groenlândia. Considerando a

tese de Diamond, é possível traçar um paralelo entre as crises que esses povos

enfrentaram e a crise ambiental que o planeta enfrenta hoje. Contudo, é

necessário considerar que a crise que enfrentamos hoje, caso não sejam

tomadas as devidas providências, terá dimensões catastróficas,

comprometendo toda a vida do planeta, incluindo a espécie humana.

Essa degradação ambiental ganha mais evidência na segunda metade do

século XIX, em conseqüência dos efeitos provocados pela Revolução Industrial,

o que deu origem às primeiras reações no sentido de se desenvolver fórmulas

e métodos de diminuição dos danos ao ambiente. Mas foi em 1948 que

autoridades reconheceram formalmente os problemas ambientais. Na reunião

do chamado Clube de Roma2, que tinha por objetivo analisar a situação

mundial e oferecer previsões e soluções para o futuro da humanidade, foi

constatada a falência dos recursos naturais.

Em 1968, o Clube de Roma concluiu que a produção mundial de bens

teria que ser reduzida, de forma que os recursos naturais fossem menos

solicitados, e que teria de haver uma redução gradual dos resíduos,

fundamentalmente do lixo industrial. Por isto, a primeira proposta do Clube de

Roma foi essa: “vamos diminuir a produção industrial”.

Um outro momento importante nesse processo foi a Conferência de

Estocolmo, promovida pela Organização das Nações Unidas (ONU), no ano de

1972. Como resultado desse evento, houve a criação da Declaração sobre o

Ambiente Humano, que introduziu na agenda política internacional a dimensão

ambiental. Sua tarefa é condicionar e limitar o modelo tradicional de

crescimento econômico e o uso dos recursos naturais. Esta declaração

determinou ao mundo que "tanto as gerações presentes como as futuras

2 O Clube de Roma nasceu na década de 60 e reunia chefes de estado, economistas,

pedagogos, humanistas, industriais, banqueiros, líderes políticos, cientistas, entre outros membros de diversos países. Retirado de:

http://www.ibps.com.br/index.asp?idnoticia=1996: acesso em abri l de 2007.

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tenham reconhecido como direito fundamental a vida num ambiente sadio e

não degradado".

No início da década de 80, a ONU retomou o debate das questões

ambientais. O documento final desses estudos chamou-se “Nosso Futuro

Comum” ou “Relatório Brundtland3”. O Relatório Brundtland faz parte de uma

série de iniciativas, anteriores à Agenda 21, que reafirmam uma visão crítica

do modelo de desenvolvimento adotado pelos países industrializados e

reproduzido pelas nações em desenvolvimento. Ressalta os riscos do uso

excessivo dos recursos naturais sem considerar a capacidade de suporte dos

ecossistemas. Esse relatório aponta para a incompatibilidade entre

desenvolvimento sustentável e os padrões de produção e consumo vigentes no

sistema capitalista.

A segunda Conferência Mundial para o Meio Ambiente e

Desenvolvimento (que ficou conhecida como Eco-92), realizada no Rio de

Janeiro em 1992, teve como um de seus resultados a formulação de

documentos muito importantes. Porém, muitos dos termos desses documentos

ainda não foram colocados em prática. Isso por tratarem de questões que

estabelecem mudanças no comportamento dos países em relação ao meio

ambiente, o que afetaria diretamente os interesses de grandes corporações

capitalistas.

O documento Agenda 21 é considerada como o resultado mais

importante da Eco-92, e foi assinado por 179 paises. É um texto-chave com as

estratégias que devem ser adotadas para a sustentabilidade. Já foi adotado em

diversas cidades por todo o mundo, inclusive através de parcerias e de

intercâmbio de informações entre municipalidades. A sua implementação leva

em conta, principalmente, as especificidades e as características particulares

das localidade e das cidade para planejar o que deve ser desenvolvimento

sustentável em cada uma delas.

Transcorridos 10 anos da ECO – 92, a Cúpula Mundial sobre

Desenvolvimento Sustentável, realizada em Joanesburgo, África do Sul, em

3 Retirado de:

http://pt.wikipedia.org/wiki/Desenvolvimento_sustent%C3%A1vel

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2002 (carta final em anexo), afirma que o Desenvolvimento Sustentável é

construído sobre “três pilares interdependentes e mutuamente sustentadores”

— desenvolvimento econômico, desenvolvimento social e proteção ambiental.

Esse paradigma reconhece a complexidade e o inter-relacionamento de

questões críticas como pobreza, desperdício, degradação ambiental,

decadência urbana, crescimento populacional, igualdade de gêneros, saúde,

conflito e violência aos direitos humanos.

3.1 Desenvolvimento Sustentável

Os colonizadores Espanhóis e Portugueses adotaram estratégia

de colonização exploratória na América Latina durante séculos.

Assim, em suas ações, retiravam a maior quantidade possível de

recursos dos países latinos, indiscriminadamente. Os recursos eram

levados para seus países, o que movimentava a economia européia

mas provocava marginalidade e conseqüentemente imobilidade dos

nossos governos.

Ainda hoje esse modelo persiste sob outra forma – agora,

tendo como protagonistas grandes corporações, que atuam tanto em

nível global como local. Essas corporações utilizam nossos recursos

minerais e vegetais e exploram a nossa mão-de-obra barata apenas

para seus interesses. Isolam as culturas locais e disseminam

culturas de massas de forma impositiva, descaracterizando assim

identidades locais e gerando marginalidade e conflitos nas

comunidades.

Nesse aspecto, é necessário considerar pontos importantes

como:

• os saberes já existentes na comunidade;

• seus anseios, valores e perspectivas;

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Page 18: EcoSol-caderno4

• valorizar o entendimento da comunidade sobre o

desenvolvimento.

Objetivamente, o desenvolvimento local cria um contexto onde

se manifesta um modo de ser da comunidade. Diz-se que uma

comunidade se desenvolve quando torna dinâmicas suas

potencialidades, não somente econômicas, mas culturais e sociais.

É necessário considerar que o modelo de crescimento

econômico hoje hegemônico – o capitalismo - gerou e tem gerado

enormes desequilíbrios, tanto sociais quanto ambientais. Esse

modelo, por um lado, gerou riqueza e fartura no mundo, e por outro,

aumento da miséria, degradação ambiental e poluição.

3.2 Mas o quê é Desenvolvimento Sustentável?

Diante desse quadro, a idéia do Desenvolvimento Sustentável é

conciliar o desenvolvimento econômico com a preservação

ambiental e o fim da pobreza no mundo.

Para isso, todas as formas de relação do ser humano com a

natureza devem ocorrer com o menor dano possível ao ambiente. As

políticas, os sistemas de produção, o comércio, os serviços e o consumo

devem existir preservando a biodiversidade e garantindo a distribuição das

riquezas geradas.

Conceitualmente, o Desenvolvimento Sustentável harmoniza o

imperativo do crescimento econômico com a promoção da eqüidade

social e com a preservação do patrimônio natural, garantindo assim

que as necessidades das atuais gerações sejam atendidas sem

comprometer o atendimento das necessidades das gerações futuras.

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Esquematicamente, podemos pensar o Desenvolvimento

Sustentável conforme o diagrama abaixo.

Fonte:

http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/5/51/Developpement_durable.s

vg

Autor: Johann Dréo

Adaptado por: Miguel Steffen e Janete Schubert

As razões mais profundas que levaram à configuração do

panorama atual do planeta Terra, porém, não são amplamente

conhecidas pela maior parte das populações. Elas estão

relacionadas ao modo em que é estruturado o sistema capitalista,

que apóia a sua produção na exploração indiscriminada do meio

ambiente – ser humano, inclusive -, em busca de maiores lucros. Em

todos os países pelos quais espalha seus tentáculos, o capitalismo

funciona dentro dessa mesma lógica. Dessa forma, os modos de vida

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Social

Ambiente Econômico

Visibilidade

Sustentável

Eqüitativo

Viável

Page 20: EcoSol-caderno4

individuais e coletivos estão se deteriorando progressivamente. É

por isso que milhões de pessoas são condenadas à desnutrição e à

morte, apesar de termos capacidade produtiva para alimentar todas

as populações do planeta.

Assim, precisamos urgentemente pensar:

• Que desafios estão colocados para a sociedade do século

XXI?

• Quais os modelos de desenvolvimento possíveis, em que

pesem as desigualdades sociais, o sistema econômico

vigente e os limites dos recursos da natureza?

• Como podemos estabelecer uma relação entre seres vivos

no seu meio ambiente, o planeta Terra, que seja pautada

pela ética?

• Como criar bens e serviços de forma que os frutos do trabalho sejam

igualmente distribuídos e que sua produção seja realizada de maneira

a preservar os ecossistemas?

Do encaminhamento que será dado a essas questões depende

a continuidade da nossa espécie neste planeta. Por isso, é urgente

que repensemos o modo como temos nos relacionado com o planeta.

Assim, é crucial que se construa a relação necessária entre

desenvolvimento sustentável e desenvolvimento local.

4 - Desenvolvimento local

A temática do desenvolvimento local emerge no contexto da globalização

como reação e resistência a uma economia global e como resposta à exclusão

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provocada por esse modelo de desenvolvimento, com os objetivos de valorizar

os saberes locais da comunidade e promover uma relação equilibrada e

saudável entre homens e mulheres das comunidades e seu meio ambiente.

De certa maneira, todo desenvolvimento é local, seja esse local um

distrito, um município, uma microregião, a região de um país ou um país. O

conceito de local adquire a conotação de território de desenvolvimento das

ações e passa assim a ser definido como o âmbito atingido por um processo de

transformação em curso.

É possível que a palavra desenvolver queira dizer isso mesmo:

desenrolar, desdobrar, dar seguimento a uma tendência, realizar uma

predisposição genética, rodar um programa herdado. Quer dizer: tornar

dinâmica uma potencialidade.

Uma outra referência, nem sempre explicitamente reconhecida no

conceito, é a idéia de comunidade. Essa é uma idéia central para pensarmos a

questão do desenvolvimento local.

Mas, o quê é comunidade?

O dicionário Houaiss apresenta várias definições para

comunidade. Algumas delas são:

1. estado ou qualidade das coisas materiais ou das noções

abstratas comuns a diversos indivíduos; comunhão;

2. conjunto de habitantes de um mesmo Estado ou qualquer

grupo social cujos elementos vivam numa dada área, sob um

governo comum e irmanados por um mesmo legado cultural e

histórico;

3. população que vive num dado lugar ou região, geralmente

ligada por interesses comuns;

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Page 22: EcoSol-caderno4

4. conjunto de indivíduos com determinada característica

comum, inserido em grupo ou sociedade maior que não partilha

suas características fundamentais;

5. conjunto de indivíduos organizados num todo ou que

manifestam, geralmente de maneira consciente, algum traço

de união;

6. grupo de indivíduos que partilha uma crença econômica

ou social particular e vive em conjunto;

7. conjunto de indivíduos, inclusive de nações diferentes,

ligado por determinada consciência histórica e/ou por

interesses sociais e/ou culturais e/ou econômicos e/ou políticos

comuns.

Diferentes elementos surgem nessas definições:

1. Comunhão

2. Patrimônio comum

3. Espaço geográfico

4. Governo comum

5. Legado cultural e histórico comum

6. Interesses comuns

7. Característica comum dentro de um contexto maior com

outras características diferentes

8. Traço de união

9. Identidade Comum

10.Crença econômica ou social particular

11.Consciência histórica, interesses sociais, culturais,

econômicos ou políticos comuns

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Page 23: EcoSol-caderno4

12.Como podemos ver, o conceito de comunidade parece

simples, mas são muitos os elementos que podem definir uma

comunidade.

Quando uma população ou uma parcela dela identifica-se como

comunidade, ela tem maior poder de transformação, já que suas

ações são potencializadas - como comunidade, ela se organiza, se

protege e se fortalece.

O que nos une é o que nos diferencia como comunidade.

Qual a sua comunidade: o bairro, a cidade, o Estado, o País, o

planeta? Há muitas questões que extrapolam os limites de nossas

comunidades. Há questões do bairro que só podem ser entendidas

em relação a aspectos que são mais abrangentes e que se referem à

cidade. Que papel o nosso bairro exerce na cidade? O que nos une

enquanto comunidade? O que nos diferencia de toda a cidade?

Da mesma forma há questões que são mais abrangentes que a

nossa própria cidade, e se referem ao Estado. Assim também há

questões que são maiores que os nossos Estados, que são da Região

ou do País.

Há ainda as questões que são maiores que o nosso próprio

país. O que nos une? O que nos diferencia dos outros?

Tomemos a questão ecológica ou o combate às desigualdades

sociais. Por serem mais amplas, fogem e muito aos limites de

nossas comunidades. Ou mais do que isso, essas lutas alargam o

nosso conceito de comunidade, fazendo-nos pensar em comunidades

19

Page 24: EcoSol-caderno4

cada vez mais abrangentes, chegando a uma comunidade global,

planetária, humana.

Boaventura de Souza Santos fala de lutas de dimensão

planetária, são as lutas em defesa de valores humanitários.

"Tratam-se de lutas transnacionais pela proteção e

desmercadorização de recursos, entidades, artefatos, ambientes

considerados essenciais para a sobrevivência digna da humanidade

e cuja sustentabilidade só pode ser garantida à escala planetária.

Pertencem ao patrimônio comum da humanidade, em geral, as lutas

ambientais, as lutas pela preservação da Amazônia, da Antártida, da

biodiversidade ou dos fundos marinhos e ainda as lutas pela

preservação do espaço exterior".

Assim, também a questão da comunidade local tem que ser

recolocada. Mais do que conectar a comunidade local à comunidade

global, as questões passam a ser: como a comunidade local se

relaciona com a comunidade global? Como o local se integra

ao global?

O próprio Boaventura parece dar a pista: "A resistência

consiste em transformar trocas desiguais em trocas de autoridade

partilhada, e traduz-se em lutas contra a exclusão, inclusão

subalterna, a dependência, a desintegração, a despromoção."

Assim, exclusão, inclusão subalterna e dependência são formas

de o Local se relacionar com o Global. A resistência da qual fala

Boaventura é então a luta por conectar a comunidade local de forma

a garantir a sua autonomia, para que não se estabeleça uma relação

20

Page 25: EcoSol-caderno4

de dependência em relação à comunidade global (globalizada e

globalizante).

O filósofo Martin Buber vê a categoria comunidade como um

caminho de superação da relação indivíduo - coletividade.

Contrapõe o conceito de comunidade ao de massa. Para ele, ao

perder sua consciência interna, a massa se torna uma máquina de

grande tensão e de intensa energia, mas que não é um organismo.

Perde, portanto, a relação entre o "outro" e o "mundo" e o "si

mesmo". Ao tornar-se comunidade, a massa encontra o si-mesmo. A

identificação e o fortalecimento dos vínculos comunitários são,

portanto, fatores importantes para o desenvolvimento local e

sustentável.

4.1 - Princípios do desenvolvimento local e sustentável

Como foi visto, desenvolvimento local é uma forma de

melhorar a vida de todas as pessoas (desenvolvimento humano e

social), incluindo as gerações atual e futura (desenvolvimento

sustentável). Por isso, quando se pensa em Desenvolvimento Local,

pensa-se em protagonismo local e mudança de paradigma, em

promoção da democracia participativa, em construção de ambientes

equilibrados e produtivos e na sua associação com preceitos

fundamentais da Economia Solidária. São alguns dos princípios de

Desenvolvimento Local:

1 - Democracia Participativa: as políticas de desenvolvimento local

devem vir acompanhadas da intensificação de todas as formas de participação

e protagonismo do povo, como meio de garantir a inclusão justa de todos os

setores da sociedade no desenvolvimento local e nacional.

21

Page 26: EcoSol-caderno4

2 - Organização popular: o êxito do modelo depende da capacidade

organizativa e do compromisso de todos os sujeitos do desenvolvimento, e por

eles é necessário promover e garantir a participação e o protagonismo das

comunidades nos processos de diagnóstico, desenho e consolidação das

propostas.

3 - Desconcentração territorial: a estratégia territorial obedece à

necessidade de superar o modelo centralizador, promotor da desigualdade

geográfica e do subdesenvolvimento regional, e de oferecer a todas as

comunidades do país oportunidades iguais de desenvolvimento considerando

as potencialidades locais e a inter-relação de comunidades e regiões.

4 - Redistribuição da terra: os fins da justiça social, soberania alimentar e

equilíbrio territorial dependem do desenvolvimento rural integral e de uma

justa redistribuição de terras. Segue daí o valor estratégico outorgado à luta

contra o latifúndio, e em favor da reforma agrária integral, como meios para

garantir o direito à terra dos campesinos e demais produtores agropecuários.

5 - Ambiente equilibrado e produtivo: para conseguir um

desenvolvimento eqüitativo e duradouro é necessário garantir um

aproveitamento sustentável dos recursos naturais e o respeito ao meio

ambiente em todas as atividades produtivas, industriais e extrativas.

6 - Priorizar a produção nacional: o modelo coloca especial ênfase na

recuperação, fortalecimento, ativação e criação de atividades produtivas

nacionais, e na sua diversificação e eficiência.

7 - Independência e pertinência tecnológica: não se trata de promover a

simples aquisição de tecnologias, mas de conjugar os saberes tradicionais com

os avanços tecnológicos, sob critérios de pertinência. Isso significa combinar a

tecnologia artesanal com a de ultima geração, segundo a necessidade de cada

atividade produtiva.

8 - Soberania alimentar: fortalecer a capacidade da nação para auto-

sustentabilidade. Daí o valor estratégico de ambos os elementos, desde o

ponto de vista da economia sustentável, a defesa e a seguridade nacional.

22

Page 27: EcoSol-caderno4

9 - Cooperativismo: as formas de associação econômica e solidária

constituem a modalidade básica de organização para o trabalho em prol dos

objetivos do desenvolvimento local. O cooperativismo como modelo de

organização põe em prática os princípios de interesse coletivo, da

solidariedade, participação igualitária e inclusão social.

10 - Trabalho não-dependente: por meio do cooperativismo e das

associações de produção e comercialização se busca transformar as relações

de produção capitalista dependentes, para formar uma rede de cooperativas e

de produtores independentes mutuamente relacionados com base em

interesses comuns.

11 - Cultura local: esse modelo valoriza e fortalece as vocações e

particularidades locais, regionais e nacionais, levando em conta os saberes e

culturas populares, a história das comunidades, das etnias e de suas raízes.

12 - Igualdade de gênero: a plena incorporação das mulheres, em

igualdade de condições na vida política, econômica e cultural do país, é um

pressuposto fundamental para superar as desigualdades e garantir um

desenvolvimento sustentável e eqüitativo para todos e todas.

13 - Comunicação livre e alternativa: a importância de fortalecer e

promover as formas e meios de comunicação alternativas das comunidades é

vital e necessária para o êxito das novas dinâmicas de desenvolvimento. Por

isso, as experiências de desenvolvimento local devem promover as iniciativas

de comunicação independentes e comunitárias, para garantir a liberdade de

informação e expressão a todos.

Vimos os princípios e a necessidade do fortalecimento das

comunidades para o desenvolvimento local e sustentável.

Abordaremos agora fatores como conhecimento humano,

organização social e condições naturais no que concerne ao

desenvolvimento local e sustentável.

23

Page 28: EcoSol-caderno4

4.2 - Condições para o desenvolvimento local e

sustentável

Há alguns fatores importantes para a criação de boas

condições para o fomento ao desenvolvimento local e sustentável.

Educação e conhecimento humano e social, tanto na forma de

escolaridade formal como na de saberes e cultura constituídos na

comunidade apresentam-se como elementos basilares para a

promoção do desenvolvimento local e sustentável.

Conhecimento humano, organização social e condições

naturais

É preciso aumentar o grau de acesso das pessoas não apenas à

renda, mas também à riqueza, ao conhecimento e ao poder ou à

capacidade e à possibilidade de influir nas decisões públicas.

Devido à importância da participação social no desenvolvimento

local, é necessário investir na ampliação das capacidades pessoais

e coletivas, o que podemos considerar como o conhecimento

humano e social acumulado. Baixos níveis de conhecimento humano

indicam baixos níveis de desenvolvimento. A diferença entre a

sociedade Belga, por exemplo, em que a escolaridade média do

trabalhador é de 12 anos, e a brasileira, que não alcança o patamar

de seis anos, pode dar bons indícios sobre o desenvolvimento de

cada país.

Processos de educação informal, em que as ações educativas

não são sistematizadas, e de educação não-formal, em que as ações

são empreendidas fora do sistema regular de ensino, mas de forma

24

Page 29: EcoSol-caderno4

sistematizada e com objetivos definidos, têm também grande

importância na organização social. Ações de educação não-formal,

como as que ocorrem no âmbito das unidades Casa Brasil e nas

ações de formação da Senaes, e de educação informal, como a

própria organização da comunidade - por exemplo, em seus

processos de estruturação para a autogestão -, contribuem

grandemente para o fortalecimento da sociedade e para a

construção de uma inteligência coletiva essencial para os processos

relacionados às atividades de Economia Solidaria.

Para se provocar transformação pessoal e do outro, que pode

estar perto ou distante, é necessária também a integração das

comunidades. É na integração e na interação com outros sujeitos da

comunidade que aprendemos a conviver em grupo - devemos saber

que nossas ações isoladas são fracas diante das ações coletivas.

"a educação é um ato de amor, por isso, é um ato

de coragem.

Não se pode temer o debate, a análise da realidade.

Não se pode fugir à discussão criadora, sob pena de

ser uma farsa"

Paulo Freire - Educação como prática da liberdade:

pág: 104

Portanto, o amor relaciona-se com a coletividade e com o

compartilhamento do saber e do conhecimento. O que acima está

expresso é o contrário daquilo que estamos vivendo em nossa

sociedade atual. O modo com que somos educados nos deixa em

constante conflito, e vivemos uma alternância de papéis de

oprimido e opressor. Quando oprimimos o mais próximo ou o mais

distante, oprimimos a nós mesmos.

25

Page 30: EcoSol-caderno4

Somos opressores e oprimidos, mas isso não ocorre de forma

necessariamente intencional – em geral, não percebemos. Por isso é

importante termos consciência de que, muitas vezes, nos colocamos

na condição de opressor. Essa condição, no entanto, elimina muitas

ou todas as possibilidades de articulação e integração comunitária.

É necessária, portanto, a permanente vigilância no que se refere à

postura no trabalho, de modo que não se assuma a condição de

opressor, seja por se estar numa posição hierárquica superior no

projeto, seja por se exercer função administrativa, seja porque

alguém é de fora da comunidade ("intrusos") - em qualquer

situação, é importante trabalhar no sentido de promover a

integração e a interação entre os membros do grupo. Assim, é

fundamental que a intervenção na comunidade ocorra de modo que

se valorizem as representações, a linguagem, as relações grupais e

as emoções e afetos característicos do indivíduos que compõem

cada grupo - para que, assim, se possa construir uma verdadeira

ação de transformação social.

A integração depende da interatividade entre dois ou mais

sujeitos. Dessa forma, não podemos exigir apenas apoio de outros

sujeitos às nossas ações, mas também temos que apoiar as

iniciativas dos outros sujeitos. Assim, podemos fortalecer os

diferentes processos e motivar todos os envolvidos – tanto de

dentro quanto de fora da comunidade - com um trabalho coletivo e

colaborativo.

Como já foi dito, outro fator importante para o

desenvolvimento local é a capacidade de organização social e

26

Page 31: EcoSol-caderno4

comunitária. Existe uma relação direta entre o grau de associação,

confiança e cooperação com a boa governança e a prosperidade

econômica. Esse processo é amplamente beneficiado pelas ações

educativas informais e não-formais pelos quais passa a comunidade.

O fortalecimento da sua identidade, o revigoramento e a

disseminação de sua cultura e a consolidação de suas relações

sociais e comunitárias dão à comunidade uma capacidade de

organização social e comunitária que favorece significativamente o

seu desenvolvimento local e sustentável.

De outra parte, as condições ambientais e físico-territoriais

herdadas são também determinantes para a promoção do

desenvolvimento local. Conhecer essa realidade e saber relacionar-

se com ela é desafio para qualquer território que almeje o

desenvolvimento.

Pois bem, a equação do desenvolvimento relaciona todas essas

variáveis de uma maneira que ainda não é bem conhecida. Mas já é

bom saber que, para promover o desenvolvimento, é preciso levar

em conta essas diferentes dimensões.

Além disso, não há como promover o desenvolvimento sem

estimular o “protagonismo” local. Isso implica alterar as condições

que determinam a concentração do conhecimento, e que

possibilitaram a concentração do poder e da riqueza, gerando, como

conseqüência, pobreza e exclusão social. Portanto, promover o

desenvolvimento significa promover mudanças políticas,

econômicas, sociais e culturais.

27

Page 32: EcoSol-caderno4

O “protagonismo” local é o fenômeno pelo qual os agentes

locais se reconhecem como sujeitos do seu próprio destino. Tornam-

se atores sociais. Logo, trata-se de um processo de

“empoderamento”, de ampliação da esfera pública, de

transformação nas relações entre Sociedade, Mercado e Estado.

O desenvolvimento é um fenômeno que resulta das relações

humanas. São as pessoas que fazem o desenvolvimento . O

desenvolvimento depende do sonho, do desejo, da vontade, da

adesão, das decisões e das escolhas das pessoas. E isso é chamado

de “protagonismo” local.

Portanto, é verdade que podemos até induzir um processo de

desenvolvimento de modo exógeno (que vem de fora), mas só

podemos realizá-lo de modo endógeno (que é gerado dentro da

comunidade). Assim, podemos até mobilizar e convencer as pessoas

em torno de um projeto de desenvolvimento que foi concebido “de

fora para dentro” e “de cima para baixo”. Todavia, para realizá-lo,

vamos precisar da adesão e da participação das pessoas. Quer

dizer, elas vão precisar se engajar neste projeto, como um produto

construído “de baixo para cima” e “de dentro para fora”.

Mas, se é assim, por que não fazemos desse modo desde o

início? Simples: porque os planejadores e os tomadores de decisões,

na maior parte dos casos, não acreditam na capacidade dos agentes

locais de planejarem e gerenciarem seu próprio desenvolvimento.

4.3 - Desenvolvimento local e sustentável: o quê fazer?

Como vimos, para que a renda produzida se distribua,

melhorando as condições de vida da população, é preciso que as

28

Page 33: EcoSol-caderno4

pessoas tenham acesso à riqueza, ao conhecimento e ao poder.

Assim, é preciso investir no incremento de todos esses fatores

simultaneamente.

E, nesse sentido, “o desenvolvimento local ou territorial” pode

ser concebido como um processo endógeno de mobilização das

capacidades (humanas, sociais, políticas e culturais) e

aproveitamento das potencialidades econômicas locais com a

finalidade de melhoria das condições de vida da população, não

esquecendo um pressuposto importante: a conscientização de que

seres humanos e meio ambiente são uma coisa só, que o homem e a

mulher são a natureza.

Todo processo de desenvolvimento é uma experiência de

aprendizado. Precisamos transformar as experiências em curso em

observatórios, para não desperdiçarmos a oportunidade de aprender

com os atores locais a construção de novos caminhos para um

desenvolvimento humano, social e sustentável.

Considerando um desenvolvimento que se paute pela ética da

vida, torna-se imperativo, face aos desafios que estão colocados

para a sociedade no século XXI, pensar na nossa responsabilidade

com o planeta e conseqüentemente com as futuras gerações.

Possivelmente em nenhum outro momento histórico foi tão urgente

e necessário repensar nossa cultura, em sentido amplo, revendo

conceitos como o crescimento, a riqueza, o consumo, a educação. O

desafio está colocado para cada um e cada uma de nós. A partir

disso, o que faremos? Quais serão nossas atitudes?

29

Page 34: EcoSol-caderno4

5 - Economia solidária como ferramenta estratégica para o

Desenvolvimento local e sustentável

Desenvolvimento não é apenas aumento da produtividade

global, como em geral é compreendido. Não é o crescimento

econômico gerado como resultado de investimentos realizados por

capitais privados ou públicos em uma região. Quando pensamos em

desenvolvimento apenas nesses níveis em geral ocorre agravamento

da questão social, devido à precarização das relações de trabalho e

ao aumento do desemprego. Isso ocorre porque essa concepção de

desenvolvimento considera somente seu aspecto econômico

quantitativo e ignora o aspecto distributivo. Tal prática favorece a

concentração do capital e gera desigualdades sociais e territoriais,

além de degradação ambiental e desvalorização das culturas locais.

É por essa razão que desenvolvimento não se deve limitar a

ampliação de investimentos para gerar produção. Existem outras

concepções de desenvolvimento que consideram muito mais as

pessoas envolvidas nesse processo, que geram justiça social,

cidadania, valorização da diversidade cultural e sustentabilidade

ambiental. Tudo isso sendo articulado com as atividades

econômicas. Esse é o modelo de desenvolvimento proposto pela

Economia Solidária.

O fortalecimento da Economia solidária como estratégia de

inclusão econômica e social oferece um caminho com grande

potencial para o desenvolvimento, em especial o local ou territorial

sustentável. A inserção da economia solidária nesses processos

fortalece a combinação de ações estruturantes de acesso e

30

Page 35: EcoSol-caderno4

incentivo às alternativas locais de geração de trabalho com outras

melhorias nas condições de vida da população.

O desenvolvimento local sustentável e solidário requer a

democratização do acesso e a ampliação de programas e projetos

que contribuam para a criação e fortalecimento das redes, das

cadeias, das centrais de comercialização e do sistema de comércio

justo, de modo a dar sustentabilidade aos diversos

empreendimentos solidários.

Neste sentido, a indução do desenvolvimento local ou territorial requer a

combinação de políticas públicas adequadas com as necessidades e

potencialidades locais. Essa forma de promover desenvolvimento está

sendo conduzida atualmente no Brasil. Várias comunidades estão se

mobilizando para promovê-lo de modo coletivo, através de

cooperativas ou associações de produtores familiares, redes,

cadeias produtivas e grupos informais.

Trata-se, portanto de um desenvolvimento comunitário ou

solidário, porque sua principal característica é que todos os

envolvidos se beneficiam de seus resultados econômicos, sociais,

políticos e culturais. Esse compartilhamento é feito com respeito à

diversidade de raça, etnia, gênero, geração e opção religiosa. Por

essa razão é possível dizer que a Economia Solidária é uma

estratégia para um novo modelo de desenvolvimento sustentável,

includente e solidário.

É verdade que as comunidades que buscam promover o seu

próprio desenvolvimento dessa forma demandam apoio e assistência

de qualidade dos diferentes órgãos de governo (União, Estados e

31

Page 36: EcoSol-caderno4

Municípios), dos bancos públicos, de organizações não-

governamentais, das universidades e dos movimento sociais. Todo

esse apoio contribui para ampliar e qualificar a participação do

coletivo envolvido, identificando e desenvolvendo suas

potencialidades socioeconômicas, étnicas e culturais na busca de

níveis crescentes de bem-estar.

6 - Referências

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busca de novos significados. In: Revista do Serviço Público. Brasília, v.

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GUATTARI, Felix. (1990). As Três Ecologias. Campinas, SP: Papirus, 1990.

32

Page 37: EcoSol-caderno4

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MTE/SENAES, 2004. (mimeo)

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Natal/RN:FETARN, 1997.

__________. Dilemas da Gestão Participativa do Desenvolvimento Local.

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1995. (Col. Questões de Nossa Época, n.41).

Revista Política Hoje, ano 5, n. 8 e 9. Recife: UFPE, 1999.

__________. Modernização Econômica e Pobreza Crônica: duas faces de uma

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__________. A Construção da Gestão Participativa do Desenvolvimento Rural

Sustentável: o caso do PRONAF em São Paulo do Potengi/RN. In: VII

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___________. Gestão Municipal Participativa: institucionalidade e cultura

política. Revista Desafios Sociais, ano 01, n. 01. Natal: UFRN, 2002.

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rurais no Vale do Açu/RN. In: VIII Encontro Nacional de Pesquisadores em

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_________. A Economia Solidária e os Novos Paradigmas de

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Brasília, 2004. (mimeo)

SANTOS, Milton. Por uma Outra Globalização: do pensamento único à

consciência universal. Rio de Janeiro: Record, 2001.

SINGER, Paul. Desenvolvimento Solidário: significado e estratégia. Brasília,

2004. (mimeo).

33

Page 38: EcoSol-caderno4

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Brasília, 2004. (mimeo).

WEILL, Pierre. Novas idéias para novos tempos: as três ecologias.

Disponível em: http://www.pierreweil.pro.br/Novas/Novas-65.htm

34

Page 39: EcoSol-caderno4

7 - Anexo

Declaração de Joanesburgo sobre Desenvolvimento

Sustentável

Das origens ao futuro

1. Nós, representantes dos povos do mundo, reunidos durante a Cúpula

Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável em Joanesburgo, África do Sul,

entre 2 e 4 de setembro de 2002, reafirmamos nosso compromisso com o

desenvolvimento sustentável.

2. Assumimos o compromisso de construir uma sociedade global

humanitária, eqüitativa e solidária, ciente da necessidade de dignidade

humana para todos.

3. No início desta Cúpula, crianças do mundo nos disseram, numa voz

simples, porém clara, que o futuro pertence a elas e, em conseqüência,

conclamaram todos nós a assegurar que, através de nossas ações, elas

herdarão um mundo livre da indignidade e da indecência causadas pela

pobreza, pela degradação ambiental e por padrões de desenvolvimento

insustentáveis.

4. Como parte de nossa resposta a essas crianças, que representam

nosso futuro coletivo, todos nós, vindos de todos os cantos do mundo,

formados por diferentes experiências de vida, estamos unidos e animados por

um sentimento profundo de que necessitamos criar, com urgência, um novo e

mais iluminado mundo de esperança.

5. Por conseguinte, assumimos a responsabilidade coletiva de fazer

avançar e fortalecer os pilares interdependentes e mutuamente apoiados do

desenvolvimento sustentável - desenvolvimento econômico, desenvolvimento

social e proteção ambiental - nos âmbitos local, nacional, regional e global.

6. Neste Continente, Berço da Humanidade, declaramos, por meio do

Plano de Implementação e desta Declaração, sermos responsáveis uns pelos

outros, pela ampla comunidade da vida e por nossas crianças.

35

Page 40: EcoSol-caderno4

7. Reconhecendo que a humanidade se encontra numa encruzilhada,

estamos unidos numa determinação comum, a fim de realizar um esforço

determinado para responder afirmativamente à necessidade de apresentar um

plano prático e visível, que leve à erradicação da pobreza e ao

desenvolvimento humano.

De Estocolmo ao Rio de Janeiro a Joanesburgo

8. Trinta anos atrás, em Estocolmo, concordamos sobre a necessidade

urgente de reagir ao problema da deterioração ambiental. Dez anos atrás,

durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e

Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro, concordamos que a proteção do

meio ambiente e o desenvolvimento social e econômico são fundamentais para

o desenvolvimento sustentável, com base nos Princípios do Rio. Para alcançar

tal desenvolvimento, adotamos o programa global Agenda 21 e a Declaração

do Rio, aos quais reafirmamos nosso compromisso. A Cúpula do Rio foi um

marco significativo, que estabeleceu uma nova agenda para o

desenvolvimento sustentável.

9. Entre o Rio e Joanesburgo, as nações do mundo se reuniram em

diversas conferências de larga escala sob a coordenação das Nações Unidas,

incluindo a Conferência de Monterrey sobre Financiamento ao

Desenvolvimento, bem como a Conferência Ministerial de Doha. Essas

conferências definiram para o mundo uma visão abrangente para o futuro da

humanidade.

10. Na Cúpula de Joanesburgo muito se alcançou na convergência de um

rico tecido de povos e pontos de vista, numa busca construtiva por um

caminho comum rumo a um mundo que respeite e implemente a visão do

desenvolvimento sustentável. Joanesburgo também confirmou haver sido feito

progresso significativo rumo à consolidação de um consenso global e de uma

parceria entre todos os povos de nosso planeta.

Os Desafios que Enfrentamos

11. Reconhecemos que a erradicação da pobreza, a mudança dos

padrões de consumo e produção e a proteção e manejo da base de recursos

36

Page 41: EcoSol-caderno4

naturais para o desenvolvimento econômico e social são objetivos

fundamentais e requisitos essenciais do desenvolvimento sustentável.

12. O profundo abismo que divide a sociedade humana entre ricos e

pobres, junto à crescente distância entre os mundos desenvolvidos e em

desenvolvimento, representam uma ameaça importante à prosperidade, à

segurança e à estabilidade globais.

13. O meio ambiente global continua sofrendo. A perda de biodiversidade

prossegue, estoques pesqueiros continuam a ser exauridos, a desertificação

toma mais e mais terras férteis, os efeitos adversos da mudança do clima já

são evidentes e desastres naturais são mais freqüentes e mais devastadores;

países em desenvolvimento são mais vulneráveis e a poluição do ar, da água e

do mar segue privando milhões de pessoas de uma vida digna.

14. A globalização adicionou uma nova dimensão a esses desafios. A

rápida integração de mercados, a mobilidade do capital e os significativos

aumentos nos fluxos de investimento mundo afora trouxeram novos desafios e

oportunidades para a busca do desenvolvimento sustentável.

Mas os benefícios e custos da globalização são distribuídos

desigualmente, e os países em desenvolvimento enfrentam especiais

dificuldades para encarar esse desafio.

15. Corremos o risco de perpetuação dessas disparidades globais e, a

menos que ajamos de modo a modificar fundamentalmente suas vidas, os

pobres do mundo podem perder a confiança em seus representantes e nos

sistemas democráticos com os quais permanecemos comprometidos,

enxergando em seus representantes nada além de imagens pomposas e sons

retumbantes.

Nosso Compromisso com o Desenvolvimento Sustentável

16. Estamos determinados a assegurar que nossa rica diversidade, que é

nossa força coletiva, será usada numa parceria construtiva para a mudança e

para alcançar o objetivo comum do desenvolvimento sustentável.

37

Page 42: EcoSol-caderno4

17. Reconhecendo a importância de ampliar a solidariedade humana,

instamos a promoção do diálogo e da cooperação entre os povos e civilizações

do mundo, a despeito de raça, deficiências, religião, idioma, cultura e tradição.

18. Aplaudimos o foco da Cúpula de Joanesburgo na indivisibilidade da

dignidade humana e estamos resolvidos, através de decisões sobre metas,

prazos e parcerias, a rapidamente ampliar o acesso a requisitos básicos tais

como água potável, saneamento, habitação adequada, energia, assistência

médica, segurança alimentar e proteção da biodiversidade. Ao mesmo tempo,

trabalharemos juntos para nos ajudar mutuamente a ter acesso a recursos

financeiros e aos benefícios da abertura de mercados, assegurar o acesso à

capacitação e ao uso de tecnologia moderna que resulte em desenvolvimento,

e nos assegurar de que haja transferência de tecnologia, desenvolvimento de

recursos humanos, educação e treinamento para banir para sempre o

subdesenvolvimento.

19. Reafirmamos nossa promessa de aplicar foco especial e dar atenção

prioritária à luta contra as condições mundiais que apresentam severas

ameaças ao desenvolvimento sustentável de nosso povo. Entre essas

condições estão: subalimentação crônica; desnutrição; ocupações estrangeiras;

conflitos armados; problemas com drogas ilícitas; crime organizado; corrupção;

desastres naturais; tráfico ilegal de armamentos; tráfico humano; terrorismo;

intolerância e incitamento ao ódio racial, étnico e religioso, entre outros;

xenofobia; e doenças endêmicas, transmissíveis e crônicas, em particular

HIV/AIDS, malária e tuberculose.

20. Estamos comprometidos a assegurar que a valorização e

emancipação da mulher e a igualdade de gênero estejam integradas em todas

as atividades abrangidas pela Agenda 21, as Metas de Desenvolvimento do

Milênio e o Plano de Implementação de Joanesburgo.

21. Reconhecemos o fato de que a sociedade global possui os meios e

está dotada de recursos para encarar os desafios da erradicação da pobreza e

do desenvolvimento sustentável que confrontam toda a humanidade. Juntos

tomaremos medidas adicionais para assegurar que os recursos disponíveis

sejam usados em benefício da humanidade.

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Page 43: EcoSol-caderno4

22. A esse respeito, visando contribuir para o alcance de nossos objetivos

e metas de desenvolvimento, instamos os países desenvolvidos que ainda não

o fizeram a realizar esforços concretos para atingir os níveis

internacionalmente acordados de Assistência Oficial ao Desenvolvimento.

23. Aplaudimos e apoiamos o surgimento de grupos e alianças regionais

mais robustos, tais como a Nova Parceria para o Desenvolvimento da África

(NEPAD), para a promoção da cooperação regional, do aperfeiçoamento da

cooperação internacional e do desenvolvimento sustentável.

24. Continuaremos a dedicar especial atenção às necessidades de

desenvolvimento dos Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento e dos

Países Menos Desenvolvidos.

25. Reafirmamos o papel vital dos povos indígenas no desenvolvimento

sustentável.

26. Reconhecemos que o desenvolvimento sustentável requer uma

perspectiva de longo prazo e participação ampla na formulação de políticas,

tomada de decisões e implementação em todos os níveis. Na condição de

parceiros sociais, continuaremos a trabalhar por parcerias estáveis com todos

os grupos principais, respeitando os papéis independentes e relevantes de

cada um deles.

27. Concordamos que, na busca de suas atividades legítimas, o setor

privado, tanto grandes quanto pequenas empresas, tem o dever de contribuir

para a evolução de comunidades e sociedades eqüitativas e sustentáveis.

28. Concordamos também em prover assistência para ampliar

oportunidades de emprego geradoras de renda, levando em consideração a

Declaração de Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho da Organização

Mundial do Trabalho (OMT).

29. Concordamos que existe a necessidade de que as corporações do

setor privado implementem suas responsabilidades corporativas. Isto deve

ocorrer num contexto regulatório transparente e estável.

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30. Assumimos o compromisso de reforçar e aperfeiçoar a governança

em todos os níveis, para a efetiva implementação da Agenda 21, das Metas de

Desenvolvimento do Milênio e do Plano de Implementação de Joanesburgo.

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O Multilateralismo é o Futuro

31. Para alcançar os objetivos do desenvolvimento sustentável,

necessitamos de instituições multilaterais mais eficazes, democráticas e

responsáveis.

32. Reafirmamos nosso compromisso com os princípios e propósitos da

Carta das Nações Unidas e do Direito Internacional, bem como com o

fortalecimento do multilateralismo. Apoiamos o papel de liderança das Nações

Unidas na condição de mais universal e representativa organização do mundo,

e a que melhor se presta à promoção do desenvolvimento sustentável.

33. Assumimos adicionalmente o compromisso de monitorar, em

intervalos regulares, o progresso alcançado na implementação das metas e

objetivos do desenvolvimento sustentável.

Fazendo Acontecer!

34. Estamos de acordo que este deve ser um processo inclusivo,

envolvendo todos os grupos principais e os governos que participaram da

histórica Cúpula de Joanesburgo.

35. Assumimos o compromisso de agir juntos, unidos por uma

determinação comum de salvar nosso planeta, promover o desenvolvimento

humano e alcançar a prosperidade e a paz universais.

36. Assumimos compromisso com o Plano de Implementação de

Joanesburgo e com a aceleração do cumprimento das metas socioeconômicas

e ambientais com prazo determinado nele contidas.

37. Do continente Africano, Berço da Humanidade, afirmamos

solenemente aos povos do mundo e às gerações que certamente herdarão este

planeta estarmos determinados a assegurar que nossa esperança coletiva para

o desenvolvimento sustentável seja realizada.

Expressamos nossa mais profunda gratidão ao povo e ao Governo da

África do Sul por sua hospitalidade generosa e excelentes acomodações

destinadas à Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável.

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