Edição 249

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joRNAl uNIVeRsITáRIo de coImbRA a cabra 10 de julho de 2012 ANo XXI N.º 249 QuINZeNAl GRATuITo dIReToR cAmIlo soldAdo • edIToRes-eXecuTIVos INês AmAdo dA sIlVA e joão GAspAR Anselmo Borges, uma voz crítica dentro da Igreja Pág. 14 Apesar das dificuldades económicas, as secções da academia tiveram, no geral, uma época positiva. Três títu- los coletivos e dois vice-campeona- tos, a juntar a diversos títulos individuais, fazem a soma das vitó- rias do balanço desportivo universi- tário. Manter o nível e aumentar o número de títulos é o que espera o coordenador geral do pelouro do des- porto da AAC, Nuno Lopes, ao elogiar o dinamismo e variedade de apostas das equipas da casa. BALANço desPorTivo Gastos controlados, mas o nível mantem-se Durante cerca de três anos, Celas foi palco para um dos mais em- blemáticos movimentos que se viveu na cidade: o punk. Não descurando outros como o hard- core e o rockabilly, Coimbra sur- giu no panorama musical nacional, em boa parte através de bandas como os Tédio Boys e Émasfoi-se. Jovens e idosos con- viviam num espaço típico de uma associação recreativa, com um concerto punk como fundo. BAirro de CeLAs Um espaço de reunião entre gerações Pág. 2 e 3 Pág. 10 e 11 Encerramento de mais uma cantina no Polo I para o ano Os SASUC, em articulação com a Universidade de Coimbra, pretendem adequar a oferta à procura dos estudantes. A contenção de custos continua a ser tema central e pode gerar dificuldades omeçam-se a conhecer as mudanças que a ação so- cial comportará no pró- ximo ano letivo. O fecho da segunda cantina no Polo I é uma certeza e há também alterações nos serviços médicos, bem como na la- vandaria, que se encontra por en- quanto encerrada. Assim, a racionalização da oferta, dado o corte no financiamento, faz com que estejam em cima da mesa even- tuais parcerias com a Administra- ção Regional do Centro e a suspen- são de especialidades médicas que não sejam tão procuradas. Está assim em aberto a mudança do es- tatuto dos serviços médicos. Para as residências, a alteração do regula- mento de modo a atender às espe- cificidades de cada uma quer trazer um novo equilíbrio. A punição por gastos desnecessários na água, luz e gás também é uma realidade. Quanto à lavandaria chegará, ao que tudo indica, no início do pró- ximo ano, com uma nova configu- ração de modo a conceder outros serviços aos estudantes Pág. 5 C Lançado em 2009 pela Associação Académica de Coimbra, em parceria com o Centro de Acolhimento João Paulo II, o projeto “Lado a Lado” tem como objetivo fornecer aos estudan- tes uma alternativa para alojamento, e, ao mesmo tempo, garantir às pes- soas mais idosas companhia e ajuda. O feedback tem sido positivo, apesar de não haver muitos estudantes a can- didatarem-se a esta iniciativa. ProjeTo “LAdo A LAdo” Uma entreajuda benéfica Pág. 19 Mais informação em acabra. net @ Em 1992 era promulgada a lei 20/92 que introduzia as primeiras propinas no ES. Esta nova lei foi a alavanca para o início de uma vaga de contestações por parte do movimento estudantil que, não ficando indiferente, se deba- teu ao longo dos anos por um ensino gratuito. No ano em que assinalam vinte após a introdução desta lei, o Jornal A CABRA, em jeito de resenha histórica, recorda os marcos mais im- portantes desta luta estudantil, desde a maior manifestação de estudantes do ES às invasões do Senado. 20 ANos de ProPiNAs Duas décadas de propinas As memórias não se podem perder. Os acontecimentos da noite de 9 de maio de 1970 estão pouco relatados na bibliografia, normalmente reduzi- dos a algumas linhas. Jorge Seabra, membro da DG/AAC, em 1970, foi uma das pessoas presentes nesses in- cidentes sucedidos na zona do TAGV. Os episódios, originados nas cliva- gens ideológicas da época, resulta- ram numa das maiores repressões policiais de sempre contra estudan- tes, com balas verdadeiras a toma- rem o lugar das de borracha. TiroTeio 1970 Confrontos entre estudantes e polícia Pág. 4 e 5 Pág. 6 Não são só os edifícios que caem com o passar dos dias. Também ao abandono ficaram cerca de dois mil trabalhadores ao longo de dez anos. A história contada por quem lá trabalhou. O que resta das grandes indústrias de Coimbra Pág. 14,15 ,16 e 17 Perfil

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Jornal Universitário de Coimbra A CABRA

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joRNAl uNIVeRsITáRIo de coImbRA

acabra

10 de julho de 2012 • ANo XXI • N.º 249 • QuINZeNAl GRATuITodIReToR cAmIlo soldAdo • edIToRes-eXecuTIVos INês AmAdo dA sIlVA e joão GAspAR

Anselmo Borges,

uma voz crítica

dentro da Igreja

Pág. 14

Apesar das dificuldades económicas,as secções da academia tiveram, nogeral, uma época positiva. Três títu-los coletivos e dois vice-campeona-tos, a juntar a diversos títulosindividuais, fazem a soma das vitó-rias do balanço desportivo universi-tário. Manter o nível e aumentar onúmero de títulos é o que espera ocoordenador geral do pelouro do des-porto da AAC, Nuno Lopes, ao elogiaro dinamismo e variedade de apostasdas equipas da casa.

BALANço desPorTivo

Gastos controlados,mas o nível mantem-se

Durante cerca de três anos, Celasfoi palco para um dos mais em-blemáticos movimentos que seviveu na cidade: o punk. Nãodescurando outros como o hard-core e o rockabilly, Coimbra sur-giu no panorama musicalnacional, em boa parte atravésde bandas como os Tédio Boys eÉmasfoi-se. Jovens e idosos con-viviam num espaço típico deuma associação recreativa, comum concerto punk como fundo.

BAirro de CeLAs

Um espaço de reuniãoentre gerações

Pág. 2 e 3 Pág. 10 e 11

Encerramento de mais umacantina no Polo I para o anoOs SASUC, em articulação com a Universidade de Coimbra, pretendem adequar a oferta à procura dos

estudantes. A contenção de custos continua a ser tema central e pode gerar dificuldades

omeçam-se a conhecer asmudanças que a ação so-cial comportará no pró-ximo ano letivo. O fecho

da segunda cantina no Polo I é umacerteza e há também alterações nos

serviços médicos, bem como na la-vandaria, que se encontra por en-quanto encerrada. Assim, aracionalização da oferta, dado ocorte no financiamento, faz comque estejam em cima da mesa even-

tuais parcerias com a Administra-ção Regional do Centro e a suspen-são de especialidades médicas quenão sejam tão procuradas. Estáassim em aberto a mudança do es-tatuto dos serviços médicos. Para as

residências, a alteração do regula-mento de modo a atender às espe-cificidades de cada uma quer trazerum novo equilíbrio. A punição porgastos desnecessários na água, luze gás também é uma realidade.

Quanto à lavandaria chegará, aoque tudo indica, no início do pró-ximo ano, com uma nova configu-ração de modo a conceder outrosserviços aos estudantes

Pág. 5

C

Lançado em 2009 pela AssociaçãoAcadémica de Coimbra, em parceriacom o Centro de Acolhimento JoãoPaulo II, o projeto “Lado a Lado” temcomo objetivo fornecer aos estudan-tes uma alternativa para alojamento,e, ao mesmo tempo, garantir às pes-soas mais idosas companhia e ajuda.O feedback tem sido positivo, apesarde não haver muitos estudantes a can-didatarem-se a esta iniciativa.

ProjeTo “LAdo A LAdo”

Uma entreajuda benéfica

Pág. 19

Mais informação em

acabra.net@

Em 1992 era promulgada a lei 20/92que introduzia as primeiras propinasno ES. Esta nova lei foi a alavanca parao início de uma vaga de contestaçõespor parte do movimento estudantilque, não ficando indiferente, se deba-teu ao longo dos anos por um ensinogratuito. No ano em que assinalamvinte após a introdução desta lei, oJornal A CABRA, em jeito de resenhahistórica, recorda os marcos mais im-portantes desta luta estudantil, desde amaior manifestação de estudantes doES às invasões do Senado.

20 ANos de ProPiNAs

Duas décadas de propinas

As memórias não se podem perder.Os acontecimentos da noite de 9 demaio de 1970 estão pouco relatadosna bibliografia, normalmente reduzi-dos a algumas linhas. Jorge Seabra,membro da DG/AAC, em 1970, foiuma das pessoas presentes nesses in-cidentes sucedidos na zona do TAGV.Os episódios, originados nas cliva-gens ideológicas da época, resulta-ram numa das maiores repressõespoliciais de sempre contra estudan-tes, com balas verdadeiras a toma-rem o lugar das de borracha.

TiroTeio 1970

Confrontos entre estudantes e polícia

Pág. 4 e 5 Pág. 6

Não são só os edifícios que caem com o passar dos dias. Também ao abandono ficaram cercade dois mil trabalhadores ao longo de dez anos. A história contada por quem lá trabalhou.

O que resta das grandesindústrias de Coimbra

Pág. 14,15 ,16 e 17

Perfil

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2 | a cabra | 10 de julho de 2012 | terça-feira

Secção de Jornalismo,

Associação Académica de Coimbra,

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3000 - Coimbra

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Diretor Camilo Soldado Editores-Executivos Inês Amado da Silva, João Gaspar Editoras-Executivas Multi-média Ana Francisco, Catarina Gomes Editores Carlota Rebelo (Fotografia), Inês Balreira (Ensino Superior), AnaDuarte (Cultura), Fernando Sá Pessoa (Desporto), Ana Morais (Cidade), Filipe Furtado (Ciência & Tecnologia), LilianaCunha (País), Maria Garrido (Mundo) Paginação Carlota Rebelo, João Miranda Redação Andreia Gonçalves, DanielAlves da Silva, João Valadão, Paulo Sérgio Santos Fotografia Carlota Rebelo, Douglas Rabelo, Inês Amado da Silva, InêsBalreira, João Gaspar, Stephanie Sayuri Paixão Ilustração Ana Beatriz Marques, Tiago Dinis Colaborou nesta ediçãoAntónio Cardoso, Emanuel Pereira, Fábio Rodrigues, João Martins, Miguel Patrão, Rafaela Carvalho, Tiago GonçalvesColaboradores Permanentes Carlos Braz, João Miranda, João Ribeiro, João Terêncio, João Valadão, José AfonsoBiscaia, José Miguel Pereira, José Santiago, Lígia Anjos, Luís Luzio, Nicole Inácio, Pedro Nunes, Pedro Leitão, RuiCraveirinha Publicidade Inês Amado da Silva 239410437 Impressão FIG – Indústrias Gráficas, S.A.; Telefone. 239499 922, Fax: 239 499 981, e-mail: [email protected] Tiragem 4000 exemplares Produção Secção de Jornalismo da Associ-ação Académica de Coimbra Propriedade Associação Académica de Coimbra Agradecimentos Reitoria da Univer-sidade de Coimbra, Serviços de Acção Social da Universidade de Coimbra, Luís Reis Torgal

editoriAl

Um mUseU de lUtAs pAssAdAs

om o decorrer de um austero ano, o Jornal ACABRA encontrou na situação socioeconómica dapopulação estudantil o móbil para dissecar uma

palavra que, por tão repetida, se vulgariza e perde signi-ficado semântico nos números que são anunciados dia-riamente. É ela a crise, apresentada pelos media em formaestatística, numeral, matemática, nem sempre como umaestória ou rosto por trás.

De quem se vê obrigado a desfazer-se do que ainda pos-suiu para se alimentar, da forma como a crise afeta os es-tudantes psicologicamente, de quem espera anos nobanco do Centro de Emprego, de quem recorda com sau-dade a Reforma Agrária, das diferentes vertentes do tra-balho que nem sempre é emprego. Modos distintos deabordar um tema que urge humanizar.

O produto da ruína industrial de Coimbra está aqui,em rostos que se descobrem por entre a densidade dosnúmeros que o desemprego encerra. Os edifícios fantas-magóricos das antigas grandes indústrias nos arredoresda cidade parecem querer metaforizar o retrato de umanação: a estabilidade momentânea de outrora que acabouem estado de súbita degradação. Mas é no centro deCoimbra, no meio do aglomerado urbano, que se faz notara diminuição do nível de vida e o aumento da indigência.Os “novos demais para a reforma e velhos demais paraum novo emprego” escondem a realidade dramática daqual a classe política está desligada. Ao que governos cha-mam flexibilização do mercado de trabalho é, para umalarga franja da população, sinónimo de desemprego e pre-cariedade.

Social-democracia ou Socialismo constituem meros ele-mentos ornamentais na palavra Partido, que administrao Portugal do pós-Abril. Apartados da realidade e da duravivência de uma larga maioria, a minoria não tem como seaproximar, ao encontrar a sua subsistência em ciclos depoder fechados. E é da comodidade desses ciclos que ape-lam à saída da zona de conforto. É então nesta dicotomiaestranha que se desenvolve a carreira política (iniciada depreferência num ambiente de propício debate e discus-são, como é o exemplo das associações académicas e deestudantes) à qual a academia de Coimbra não está

imune. Tal repercute-se de forma decisiva nas ações le-vadas a cabo pela sua direção geral que se foram suavi-zando gradualmente.

A lei que impôs o pagamento de propinas funcionoucomo um primeiro momento agregador da vontade dosestudantes em liberdade. Em 1992, as motivações por de-trás do “Contrato Social” fazem com que o título do do-cumento seja irónico quando comparado à obrahomónima de Rosseau. Vinte anos depois, algum amor-fismo levou a que as propinas sejam já encaradas comouma inevitabilidade e, hoje, não se imagina o financia-mento do ensino superior (ES) sem elas. Seguiu-se a im-plementação de medidas que resultaram numa profundaalteração do ES. Bolonha veio apenas fazer com que, de-pois da redução do número de anos necessário para com-pletar a licenciatura, as entidades empregadoraspassassem a exigir o grau de mestrado.

Mas a frequência no ensino superior levanta hoje di-versas interrogações. Para quê estudar se a consequênciaprovável será o desemprego ou a precariedade? Gover-nantes dizem que, quanto mais habilitações, maior é aprobabilidade de empregabilidade. No entanto, quandovemos que muitos dos estudantes que saíram para o mer-cado de trabalho com uma licenciatura ou mestrado nosúltimos anos têm poucas perspetivas de vir a trabalhar nasua área de formaçãoou, se trabalharem, alógica irracional demercado leva a que oseu exercício se tornepenoso, esse argu-

mento capitula.Com a soma destas incertezas, é profundamente de-

vastador verificar que todos os anos as condições de fre-quência no ensino superior pioram afetando sempre o elomais desprotegido da cadeia: o estudante. Neste aspeto, élamentável ver sucessivas direções gerais reclamar parasi meias vitórias que não passam de demagogia, com oobjetivo final de assegurar a continuidade no poder e aperpetuação dos seus quadros. A Associação Académicade Coimbra corre o risco de funcionar como museu, comomemória histórica das lutas passadas e perder qualquerrelevância.

Camilo Soldado

A lei que impôs o pagamento de propinas funcionou como umprimeiro momento agregador da vontade dos estudantes em

liberdade. (...) Vinte anos depois, algum amorfismo levou a que aspropinas sejam já encaradas como uma inevitabilidade e, hoje, não seimagina o financiamento do ensino superior sem elas.

“C

É profundamente devastador verificar que todos os anosas condições de frequência no ensino superior pioram,

afetando sempre o elo mais desprotegido da cadeia: o estudante.“

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próximo ano letivo prevêalgumas alterações nosServiços de Ação Social daUniversidade de Coimbra

(SASUC). Certas especialidades dosserviços médicos vão ser suprimidas,há mais uma cantina que fecha e a la-vandaria voltará a funcionar no iní-cio do ano e noutros moldes. “Tudoisto segundo uma perspetiva: de rees-truturação, de sustentabilidade e deracionalização das escolhas”, defendea vice-reitora para o planeamento efinanças, Margarida Mano.

“O que nos garantiram é que iamfechar duas cantinas, as verdes, e aoutra não nos disseram qual”, admitea funcionária da cantina dos grelha-dos, Emília Carvalho. A confirmaçãode que mais uma cantina encerra écerta, só não se sabe “exatamentequando e não está definida qual”,afirma Margarida Mano. No entanto,a funcionária dos grelhados suspeitaque é a sua cantina: “os grelhados

estão na baila, mas não sei se real-mente é”.

A nova diretriz dos SASUC, mar-cada pela nomeação da nova admi-nistradora, Regina Bento, veiointroduzir a necessidade de realizarmudanças estruturais, dado o corteem quase dois milhões de euros no fi-nanciamento dos serviços, neste anoletivo. A racionalização das escolhas eda adequação da oferta originou já oencerramento de uma cantina - asverdes: “tivemos um aumento na po-pulação estudantil de 15 por cento euma redução em termos de refeiçõesno Polo I de 30 por cento”, garante avice-reitora.

Há o “rumor de fechar os grelha-dos”, afiança a coordenadora geral dopelouro da ação social da direção-geral da Associação Académica deCoimbra (DG/AAC), Rita Andrade. Aprova de que mais uma cantina en-cerrava não era alheia à coordena-dora – “já nos garantiram, mas nósmostrámo-nos completamente con-tra”.

Já o presidente da DG/AAC, Ri-cardo Morgado, adianta que aindanão tem “confirmada a decisão”.Quanto à possibilidade de fecharmais do que duas cantinas, a vice-rei-tora é clara: “só uma, tudo farei paraisso e tem de encerrar neste contextopara oferecer aos estudantes algo quenão oferecíamos antes”.

Novos serviçosA tónica de conceder algo diferenteaos estudantes marca o objetivo donovo plano da ação social. Pautará osserviços médicos, os alojamentos, acreche e o jardim-de-infância, e comojá referido, o plano das refeições.“Temos que ter uma resposta dife-rente para um estudante que chegaou que está cá e que precisa de apoioa vários níveis”, avança a vice-reitora.

Essa resposta poderia tomar consis-tência num “espaço de acolhimento ede resposta”, reitera a mesma.

“Choca-me a ideia de dispersão delocais e de serviços cuja lógica o estu-dante não conhece”, renova Marga-rida Mano. Também Rita Andradecompartilha da ideia de que “muitosalunos nem fazem ideia que há oapoio psicológico, o apoio à creche ea existência dos serviços médicos gra-tuitos”. O objetivo da DG/AAC pas-sará por uma maior divulgação emarticulação com os SASUC, já no iní-cio do próximo ano letivo. “Para in-cutir este conhecimento desde oinício”, garante a coordenadora-geral.

Os serviços médicos também vãover o seu estatuto alterado. “Vãoapresentar um novo estatuto dos ser-viços médicos, mas ainda não seinada concreto, foi-nos dito em con-texto informal”, assegura Rita An-drade.

“Na reestruturação foi decididoque os serviços médicos se manti-nham”, determina Margarida Mano.Todavia, a lógica de adequar o nú-mero de especialidades à procura es-tudantil, vai levar aodesaparecimento de especialidadesmenos requisitadas. No que toca àtransição recente do serviço de psi-cologia para o S. Jerónimo “foi deci-dido que tudo o que era serviços deapoio psicopedagógico ou psicológicoaos estudantes, tinha de ser concen-trado”, afirma a vice-reitora.

“Os serviços médicos têm aí umpapel que não há no Serviço Nacionalde Saúde (SNS) nada que os substi-

tua”, atesta Margarida Mano. O papelde exceção reside na procura pelosestudantes de mobilidade que acor-rem aos serviços. Em teoria, para avice-reitora, o objetivo é ter uma al-ternativa ao SNS “interessante”. Paraisso, há em cima da mesa a negocia-ção de uma parceria com a Associa-ção Regional de Saúde (ARS), ou atémesmo com os hospitais da UC.“Gostaríamos muito de ter uma uni-dade de saúde primária em articula-ção com a ARS. Seria fantástico paranos ajudar a financiar um serviço”,

assevera Margarida Mano.Ricardo Morgado afirma que veria

com bons olhos esta ligação se esta“melhorar o serviço e a oferta ao es-tudante e a sua qualidade”. Porém, aalteração da génese não está prevista,só o cofinanciamento para aliviar ofardo dos SASUC.

Residências e lavandariaA UC terá de cobrir neste verão obrasde cariz urgente em algumas residên-cias e cantinas. “A lógica de constru-ção de residências que existiu há bempouco tempo agora está fora de causaporque o financiamento não existe

nem para a manutenção”, explica avice-reitora para o planeamento e fi-nanças.

A questão da sustentabilidade vemde novo ao de cima para os gastosenergéticos nas residências universi-tárias. A possibilidade de cobrançaaos residentes de 25 por cento nasdespesas com água, luz e gás é des-cartada mas, “vamos ter de ter meca-nismos de controlo dos custos epenalização dos desperdícios”, ga-rante Margarida Mano. Interpõe-seassim a mudança de regulamento dasresidências. Conhecer muito bem assituações e especificidades de cadaresidência é essencial para “depoisprocurar uma alteração do regula-mento que traduza um equilíbrio di-ferente”, admite a mesma. São tudoassuntos que estão a ser refletidospela pasta e pela administradora dosSASUC.

Por agora muita coisa está a serpensada e ponderada. A lavandariatinha o aval da reitoria para reabrirno início do próximo ano letivo, massabe-se que poderá ser em outrosmoldes e num outro lugar, com umaempresa que suporte o serviço. Tal-vez contenha ainda “costura e a jun-ção de mais serviços”, certifica RitaAndrade.

O diálogo tem-se procurado cons-tante, entre reitoria, SASUC, eDG/AAC. Para Ricardo Morgado, oobjetivo é “tentar que a reestrutura-ção salvaguarde sempre os interessesdos estudantes”.

Com Inês Amado da Silva e

Inês Balreira

Na sequência da racionalização e de

melhor aproveitamento dos recursos

existentes, os SASUC estão a desenvolver

uma mudança na sua génese dado o

aperto financeiro. Reduzir a oferta, buscar

parcerias e a adaptação à nova realidade

estudantil vão obrigar a ação social a

cortar e a redefinir-se. Por Liliana Cunha

“Vão apresentar um

novo estatuto dos

serviços médicos,

foi-nos dito em con-

texto informal”

Cortes iminentes naação social da UC

O

“Choca-me a ideia

de dispersão de

locais e de serviços

cuja lógica um

estudante não

conhece”,

renova

Margarida Mano

arquivo © leandro rolim

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PROPINAS: 20 anos de protestosE irreverência

agar propinas no ensino

superior (ES) nem sem-

pre foi uma realidade en-

tendida como é atualmente. Até

ao ano letivo de 1992/1993, o

valor pago pelo estudante era de

1200 escudos - seis euros na

moeda atual - valor que era enca-

rado como uma taxa de matrícula,

uma vez que o pagamento era

feito em ato único aquando a ins-

crição do estudante.

Foi pela mão de Diamantino

Gomes Durão, que assumiu a

que se gera em torno da possibili-

dade de aumentar as propinas

leva à demissão do ministro,

sendo substituído pelo então mi-

nistro-adjunto e dos assuntos par-

lamentares, António Couto dos

Santos. Em abril de 1992, Couto

dos Santos recupera a proposta do

seu antecessor.

No sentido de perceber a opi-

nião dos estudantes da Universi-

dade de Coimbra (UC) sobre o

aumento das propinas, a direção-

geral da Associação Académica de

dia, ocorrem manifestações no

Porto e em Lisboa. No final do

mês, a lei era aprovada na Assem-

bleia da República e publicada em

Diário da República sob a desig-

nação de lei 20/92 em agosto, es-

tabelecendo as normas relativas

ao sistema de propinas. A propina

é aumentada de seis para 250

euros no ano letivo de 1992/1993.

O reitor da UC na altura, Rui

Alarcão, recorda que “a lei das

propinas suscitou no meio uni-

versitário uma grande oposição”.

ção da altura. O contrato surgia

como um rebuçado para aprovar

as propinas e, como não achámos

isso correto, a AAC não aderiu”,

afirma o antigo presidente da

DG/AAC. António Vigário acres-

centa que “um ano depois a maior

parte das associações que subs-

creveram o pacto tinham saído

porque perderam as eleições”.

Ainda em 1992, dez mil estu-

dantes juntaram-se em Lisboa

para contestar a lei do aumento

das propinas e as medidas educa-

pasta do Ministério da Educação

do governo liderado

por Cavaco Silva,

em 1991, que

foi aplicada

a lei das pri-

m e i r a s

propinas

no sistema

de ES pú-

blico em

Portugal. A

c o n t e s t a -

ção estu-

dantil

Coimbra (DG/AAC), liderada por

António Vigário, realiza um re-

ferendo, onde participaram

“mais de 50 por cento dos

estudantes da academia”,

relembra o dirigente.

Dos resultados apura-

dos, 74 por cento mos-

tra-se contra as

propinas, 20 por cento

defende que não devem

ser aplicadas enquanto não

forem dadas garantias de

melhoria do ES e cinco por

cento vota a favor das pro-

pinas.

O flagelo dalei 20/92A 14 de maio

desse ano, o

Conselho de

M i n i s t r o s

aprova a pro-

posta que

instaura a

lei das pro-

p i n a s .

N e s s e

“O Senado Universitário de Coim-

bra pronunciou-se unanime-

mente pela decidida contestação

à lei das propinas, no quadro da

legalidade democrática”, afirma o

antigo reitor. No decorrer dos

protestos, Mário Soares, então

Presidente da República, pediu a

fiscalização da constitucionali-

dade da lei ao Tribunal Constitu-

cional. “O Tribunal Constitucional

não decretou a inconstitucionali-

dade da lei, mas estabeleceu uma

certa interpretação equilibrada e

que, de alguma forma, continha

os limites das propinas”, relembra

Rui Alarcão.

A 27 de outubro de 1992, o go-

verno e várias associações de es-

tudantes assinam o “Contrato

Social”, documento que, tendo

como pressuposto a implementa-

ção das propinas, visava dar algu-

mas garantias às universidades e

aos estudantes. “A maior parte

das associações, que na altura

eram dominadas pela Juventude

Social Democrata, subscreveram

o pacto com o ministro da educa-

tivas seguidas pelo governo. “Alu-

garam-se dois comboios que

foram cheios de estudantes de

Coimbra para Lisboa”, lembra

António Vigário. Nesse mesmo

ano, os estudantes da Faculdade

de Direito da Universidade de Lis-

boa, também em forma de pro-

testo, ridicularizam a figura de

Couto dos Santos. Ao simular um

julgamento em tribunal universi-

tário, o ministro era representado,

simbolicamente, na figura de um

burro. Couto dos Santos era acu-

sado de “propinar e ter praticado

má educação”. A sentença por

parte dos estudantes foi clara:

“enforcamento, empalamento e

cremação em frente à reitoria da

universidade”.

A partir daqui, as manifestações

passaram a ser parte constante da

vida dos estudantes. Em 1993, os

cerca de mil estudantes que se di-

rigiam para São Bento foram re-

cebidos à bastonada pela polícia

de choque. A carga policial sobre

os estudantes permitiu que, ainda

nesse ano, a contestação extrava-

sasse as faculdades, pondo na rua,

a 7 de dezembro, mais de 20 mil

pessoas, incluindo estudantes do

ES, do ensino secundário, profes-

sores e cidadãos solidários com a

causa. No seguimento da vaga de

protestos, Coutos dos Santos é de-

mitido, dando lugar a Manuela

Ferreira Leite. A nova ministra re-

voga a lei 20/92 e institui uma

nova lei para as propinas, que se

baseava numa taxa única, ao con-

trário da revogada, que funcio-

nava por escalões de IRS. A lei

postulava ainda que as receitas

provenientes da propina servi-

riam para financiar a ação social

escolar. No final de 1995, 16 mil

estudantes não pagavam a pro-

pina em Coimbra, tendo-se insti-

tucionalizado o boicote.

Muda o governo, masas propinas mantêm-seAntónio Guterres é eleito pri-

meiro-ministro, em 1995. Um ano

mais tarde, tal como havia pro-

metido em campanha eleitoral,

revogou a lei das propinas, pas-

sando estas a ser reguladas pela

lei de 1941, que previa um valor de

1200 escudos. A medida vigorou

durante dois anos. Mais tarde, em

junho de 1997, surge a ideia de in-

dexar a propina ao valor do salá-

rio mínimo nacional, através da

polémica lei-quadro do governo.

O documento visava o estabeleci-

mento de uma propina única, que

desta vez não se baseava em esca-

lões de IRS, como ainda o con-

ceito de estudante elegível, que

introduzia a possibilidade de, em

determinados casos, o estudante

suportar o custo total da sua fre-

Aplicadas em 1992 pela primeira vez, a verdade é que, 20 anos depois, as propinas

estão cá e estão para ficar. Fruto da sua aplicação, os boicotes e manifestações

multiplicaram-se ao longo de várias gerações, opondo governo e estudantes.

Por Inês Balreira, Tiago Gonçalves e João Martins

P

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10 de julho de 2012 | terça-feira | a cabra | 5

quência no ES, po-

dendo chegar a pagar até três

mil euros. A par desta nova lei

surge ainda um outro diploma le-

gislativo, que confere o grau de li-

cenciatura aos Institutos

Politécnicos. Depois de várias ma-

nifestações e até mesmo da reali-

zação de um acampamento em

Lisboa, o governo desiste da apli-

cação do conceito de estudante

elegível.

Um outro marco da luta estu-

dantil contra as propinas no ano

de 1997 foi o rapto, em Coimbra,

da mascote da Expo’ 98, o Gil, que

se encontrava na cidade para a

promoção do evento. Tempos de-

pois, a mascote aparece abando-

nada na Alta Universitária, com

uma placa onde estava inscrito:

“antes quero desaparecer que

pagar propinas”.

Em 2002, Durão Barroso sobe

ao poder, conferindo a pasta da

Ciência e do ES a Pedro Lynce. O

novo governo acaba com a lei de

indexação do valor das propinas

ao salário mínimo e incumbe a

responsabilidade de fixar o

valor da propina às universida-

des. Vítor Hugo Salgado, presi-

dente da DG/AAC, entre 2001 e

2003, afirma que “as despesas

correntes deixaram de ser pagas

pela transferência do orçamento

do estado e passaram a ser pagas

pelas propinas”. “Se a universi-

dade não fixasse propinas sufi-

cientes para pagar as despesas

correntes, não tinha orçamento

para funcionar”, acrescenta.

De entre os protestos de Coim-

bra contra a nova medida, con-

tam-se “o fecho da ponte de Santa

Clara, com cerca de três mil estu-

dantes, vários encerramentos da

universidade e o leilão da UC na

abertura solene das aulas”. Vítor

Hugo Salgado recorda ainda que

um dos protestos foi “a entrega do

valor das propinas em papel hi-

giénico ao ministro, porque era

um dos gastos onde ia ser utili-

zado o dinheiro das propinas dos

estudantes”. A nível nacional,

ocorre uma manifestação de estu-

dantes do ES, em Lisboa, que nas

palavras do antigo dirigente foi “a

maior manifestação de estudan-

tes de sempre, com 14 mil estu-

dantes”.

A invasão do SenadoNo dia da referida manifestação,

o Senado Universitário de Coim-

bra aprova, à revelia dos estudan-

tes, a aplicação da propina

mínima para o ano letivo de

2003/2004, de 463 euros, au-

mentando, no ano letivo seguinte,

para o seu valor máximo, fixado

nos 852 euros. Nessa mesma ses-

são, cerca de meia centena de alu-

nos, incluindo os representantes

dos estudantes com assento no

Senado, invadiram a sala em sinal

de protesto.

Em resposta à indignação estu-

dantil, no ano letivo seguinte,

Seabra Santos, reitor na altura,

decide recorrer ao voto por cor-

respondência, de maneira a evitar

novas ações contestatárias. Neste

seguimento, a DG/AAC interpõe

uma providência cautelar que

pretende impedir os efeitos desta

votação. Apesar de o tribunal ter

dado razão aos estudantes, a vo-

tação por correspondência não se

chegou a realizar.

Face à ameaça de os estudan-

tes boicotarem de novo a votação

presencial, a 20 de outubro, Sea-

b r a

Santos convoca a

sessão do Senado, exce-

cionalmente, para o Polo II. Com

vista a impedir a fixação do valor

da propina, agora em 880 euros,

os estudantes tentam uma nova

invasão. O protesto acaba por ori-

ginar confrontos com as forças

policiais, chamadas ao local pelo

reitor em questão. Mais tarde, os

estudantes exigiram a demissão

de Seabra Santos. O diálogo entre

estudantes e reitoria cessa, sendo

apenas retomado três anos e meio

depois.

A realidade da propinaatualmenteJá no próximo letivo, a propina

volta a aumentar, nas universida-

des que assim o decidirem, fruto

da atualização ao valor da taxa de

inflação. Um estudante vai passar

a pagar agora 1.036,6 euros

anuais na frequência do primeiro

ciclo de estudos, o que corres-

ponde a mais 36,9 euros em rela-

ção a este ano letivo. Este é o

maior aumento desde 2003, al-

tura em que a responsabilidade

de fixar as propinas foi entregue

às universidades e o seu valor

passou a ser indexado à taxa

média de inflação do ano anterior.

O atual presidente da DG/AAC,

Ricardo Morgado, considera que

esta atualização “passa a barreira

psicológica dos mil euros, que era

algo que se esperava que nunca

acontecesse” e que “o aumento da

propina não é solução para a

questão do financiamento ES”.

Analisando o atual modelo de fi-

nanciamento das universidades,

Ricardo Morgado conclui que “se

não houvesse propinas o ES neste

momento não funcionava”. “Isto

é triste de se dizer, mas chegou-se

a este ponto”, acrescenta. Con-

tudo, o dirigente valoriza as lutas

travadas contra as propinas: “a

verdade é que a AAC, ao longo

destes 20 anos, de diversas for-

mas, lutou contra a propina e o

seu aumento. Mas a verdade é

que não saímos vencedores desta

batalha”.

CRONOLOGIADA Propina

1992Agostofixação da lei 20/92,que aumenta a propinade seis para 250 euros

1992Outubro

várias associações de

estudantes assinam o “Contrato Social”.

A AAC fica de fora

1993a lei 20/92 é revogadapor Manuela FerreiraLeite, ministra da educação da altura. A nova lei das propinas é baseadanuma taxa aplicada de acordocom os escalõesde IRS

1995o governo de

António Guterres revoga a lei das

propinas, que passama ser reguladas pela lei de 1941 .

1997uma nova lei de propinas entra emvigor, anexando ovalor da propina ao salário mínimo nacional

2002o governo lideradopor Durão Barroso

incumbe a responsabilidade de

fixar a propina àsinstituições de ES

200420 de outubroos estudantes tentaminvadir o Senado, envolvendo-se em confrontos com a polícia

2012O valor da propina

máxima passa a barreira dos

mil euros

Page 6: Edição 249

6 | a cabra | 10 de julho de 2012 | terça-feira

oimbra, 9 de maio de 1970.

No seguimento da estreia

da peça “O Livro de Cris-

tovão Colombo”, represen-

tada pela Oficina de Teatro da

Universidade de Coimbra (OTUC),

geram-se confrontos no exterior do

Teatro Académico de Gil Vicente

(TAGV). Entre estudantes de es-

querda e a polícia houve disparos por

parte das forças de autoridade, que

acabaram por ferir com gravidade

um estudante de Engenharia, Fer-

nando Seiça.

Torna-se importante fazer uma pe-

quena ressalva histórica. Jorge Sea-

bra, antigo estudante da

Universidade de Coimbra (UC) e

membro da direção-geral da Asso-

ciação Académica de Coimbra

(DG/AAC) de 1970, começa por dizer

que “estranhamente, para quem a

viveu, a história da Crise acaba em

1969”. No entanto, na sua opinião,

continua em 1970, ano em que nos

situamos, e prolonga-se ainda em

1971. Em fevereiro de 1970 há a elei-

ção de um novo reitor, vindo da Fa-

culdade de Medicina, o Professor

Gouveia Monteiro. Nas palavras de

Jorge Seabra, era “muito apoiado

pela academia” por ter dito ser o rei-

tor da academia junto do Governo e

não o contrário.

A génese de 9 de maioEm abril, começa o prólogo que ha-

veria de despoletar os acontecimen-

tos da noite de maio. A OTUC, criada

em 1966 e ligada à fação estudantil

nacional-revolucionária, estabelece a

encenação da obra de Paul Claudel

para o mês seguinte, no TAGV. Em-

bora a OTUC tivesse tido algum des-

taque no ano anterior, devido a

conflitos com a DG/AAC de 1969,

poucos eram os estudantes que a co-

nheciam. “Todos pensavam que eles

nunca tinham feito teatro”, afirma

Jorge Seabra, secundado por Vítor

Lamas, também ele antigo estudante

da UC, que completa: “e em Coimbra

nunca fizeram”.

Este anúncio da OTUC foi, então,

encarado como um ato desafiador.

“Foi uma situação absolutamente

provocatória, para quem viveu o

clima da altura. A direita estava com-

pletamente marginalizada, tinha in-

clusive manifestações clandestinas”,

refere Jorge Seabra. A DG/AAC ana-

lisou a situação e, percebendo que se

tratava de uma provocação, decide

não convocar nada, não fazendo se-

quer um protesto.

Início da manifestaçãoNaqueles anos de plena Crise Acadé-

mica, difícil era que não acontecesse

nada. Perante “uma manifestação do

regime, planeada com nomes da di-

reita mais radical, críticos de Marcelo

Caetano, imagem de uma liberaliza-

ção muito contestada”, conforme ex-

plica Jorge Seabra, gerou-se uma

situação tensa, na noite de 9 de maio.

Vítor Lamas exemplifica: “havia mui-

tas pessoas, que se espalhavam pela

Praça da República e pelas áreas cir-

cundantes. Em frente ao TAGV esta-

vam sentadas no chão e mandavam

uns piropos cada vez que chegava um

fascista”.

Entretanto, o reitor chega a Coim-

bra vindo de Lisboa e desloca-se di-

retamente para o Convívio (atuais

Cantinas Monumentais), onde, num

ambiente escaldante, “os estudantes

exigem, coletiva e absolutamente,

que o TAGV seja desocupado”, re-

corda Jorge Seabra, que esteve en-

volvido diretamente nas

conversações com o reitor. Este, de

seguida, desloca-se para o TAGV, a

fim de interromper a peça. Do suce-

dido no interior do Teatro, há pouca

informação, apenas o descrito no

livro de Riccardo Marchi, “Império,

Nação, Revolução”.

Marchi relata que o reitor se “apre-

sentou no hall vindo da assembleia

estudantil, ordenando ao presidente

da OTUC, Cavaleiro Brandão, para

interromper imediatamente o espe-

táculo”. A sala ganhou, imediata-

mente, uma efervescência e “o reitor

foi insultado, chamado inclusive de

judeu”, completa Jorge Seabra. Cá

fora, o ambiente começa a descon-

trolar-se. O rastilho que precipita a

carga policial é fonte de alguma con-

trovérsia. Vítor Lamas fala numa

“pedra que é atirada à fachada do

TAGV”, não se sabe por quem.

A dimensão da violênciaA investida da polícia apanha de sur-

presa o próprio comandante, que não

havia dado qualquer ordem. «Só o

ouvia gritar ao meu lado “Mas o que

é que se passa?”», adianta Jorge Sea-

bra. “A zona onde estávamos ficou

praticamente deserta por causa do

gás lacrimogénio lançado e, então,

começaram-se a ouvir tiros”, remata.

O grosso dos confrontos passa

para a Rua Dr. Oliveira Matos, para

as escadas das cantinas, com pedras

a voarem contra as forças policiais.

«Eu tinha subido as escadas com um

colega. Só o ouvia gritar “São de bor-

racha, não tenham medo.” Ao outro

dia é que vi lá as marcas e percebi

que alguém se deve ter esquecido de

trocar as balas verdadeiras», relata

Vítor Lamas. Em consequência, é fe-

rido com gravidade um estudante,

Fernando Seiça. “Mas apenas mais

tarde nessa noite, através da Rádio

Universidade de Coimbra, que tinha

só circuito interno, é que isso se

soube”, relembra o antigo estudante.

Jorge Seabra considera que estes

acontecimentos “não se devem per-

der no tempo”. Pois estes foram, na

sua opinião, marcantes por duas ra-

zões: “nunca uma manifestação, li-

gada a questões políticas, havia sido

reprimida com tanta violência” e por-

que foi uma viragem na relação com

o reitor, “que não se demarcou face à

atitude da OTUC”, conclui.

A Cabra tentou chegar à fala com

Manuel Cavaleiro Brandão, presi-

dente à data da OTUC, que se escu-

sou a prestar quaisquer declarações.

Num contexto que muitos erradamente

consideram pós Crise Académica, dá-se uma

das repressões mais violentas sobre uma

manifestação estudantil de que há memória

na cidade dos estudantes. Da carga da polícia,

sem ordens para tal, acaba por resultar um

estudante baleado. Por Paulo Sérgio Santos

As balas nãopodem perder-se

nas memórias

FotograFias cedidas pelo museu académico

C

Page 7: Edição 249

10 de julho de 2012 | terça-feira | a cabra | 7

UM ANO DE DESPORTO NA AAC

O desporto

continua a ser uma

parte integrante da

vida académica

coimbrã. Embora

em tempos de crise

e apesar das

dificuldades, a

Associação

Académica de

Coimbra (AAC),

mantém um nível

elevado e as

conquistas

acumulam-se.

Um balanço da

época. Por

Emanuel Pereira,

João Valadão e

Miguel Patrão

A atravessar um período menos bom

da sua história, a Secção de Andebol

conseguiu manter-se na segunda di-

visão. António Sousa, presidente, re-

lata que “nas equipas juniores e

seniores houve uma continuação”. A

nível das camadas jovens, o presi-

dente enaltece os resultados conse-

guidos, nomeadamente dos escalões

de formação de juvenis para baixo.

Com um futuro ainda incerto equa-

ciona-se a hipótese dos seniores não

competirem no próximo ano, apesar

de, na época que se avizinha, a secção

comemorar 75 anos de existência. O

dirigente afirma que se “ vive um mo-

mento de indefinição devido aos pro-

blemas financeiros ”. A aposta nas

camadas jovens é o grande objetivo.

Andebol

O badminton conseguiu alcançar um

inédito terceiro lugar em equipas

mistas no campeonato nacional.

Além desse feito, Celso Baía, tesou-

reiro, enaltece outras conquistas

como ”grandes resultados a nível na-

cional, em individuais e pares”. Des-

taque para o segundo lugar individual

em seniores masculinos. Mas a

grande prova está a ainda para che-

gar, os Europeus Universitários co-

meçam dia 13 deste mês. No entanto,

as escolas de formação podem termi-

nar antevê. “Podemos deixar de ter

escolas, devido à falta de espaço para

treinar”, lamenta o tesoureiro. Este

foi o ponto mais negativo da época le-

vando inclusive à perda de alguns

treinos.

Badminton

Mário Ferreira, presidente da Secção

de Atletismo, critica a direção geral

da AAC (DG/AAC) e o Conselho Des-

portivo. Afirma que “a situação da

AAC na área desportiva está um caos

em termos financeiros ”, o que levou

a que a equipa de atletismo faltasse

aos campeonatos nacionais de ar

livre. O melhor da época foi a conti-

nuação na primeira divisão nacional,

na qual a secção se classificou no sé-

timo lugar em pista coberta. Quanto

ao futuro, várias reticências se levan-

tam, como declara Mário Ferreira:

“não tenho nada definido para a pró-

xima época, já pusemos em cima da

mesa a possibilidade de desistir da

competição e ficar só com os escalões

de formação”.

Atletismo

Depois de um ano sem atividade, o

Basebol está de volta. Patrick Alves,

novo presidente, afirma que há “gran-

des expetativas” com a tentativa de

“reunir antigos e novos jogadores de

forma a participar nos jogos da fede-

ração”. “Ainda temos de tratar algu-

mas questões, para depois podermos

competir como deve ser”, afirma o di-

rigente. A aposta inicial será no base-

bol (seniores masculinos e femininos)

e no softball (juniores

femininos).Com um historial vasto e

com o regresso de alguns ex-jogado-

res, a esperança da secção em obter

bons resultados na próxima época au-

menta, contudo como diz Patrick

Alves, “ainda é preciso muito traba-

lho”.

Basebol

Com uma nova direção, presidida por

Carlos Gonçalves, a Secção de Bas-

quetebol conseguiu o feito de atingir

a final da taça em seniores masculi-

nos, que acabou por perder. A nível

feminino “foi campeã distrital em

todos os escalões”. A formação co-

nimbricense conseguiu ainda o ter-

ceiro lugar em masculinos no

nacional de desporto universitário.

Os objetivos passam pela aposta na

formação, a subida de seniores femi-

ninos à primeira divisão, a constru-

ção de um plantel competitivo nos

seniores masculinos e conseguir um

pavilhão próprio. Como afirma o pre-

sidente, “a Académica é um gigante

adormecido que só com muito traba-

lho, será possível de acordar.”

Basquetebol

A Secção de Boxe teve boas presta-

ções nesta época. Na vertente de kick-

boxing, alcançou “bons resultados no

campeonato de Portugal, com 14 me-

dalhas”, afirma o treinador Paulo No-

gueira. Também é importante referir

a conquista do segundo lugar em

equipas. Na modalidade de boxe não

houve competição nacional. “Partici-

pámos em duas galas e ganhámos

quatro medalhas”, explica. A Secção

é composta por 90 por cento de atle-

tas universitários, e as frequências de

final de ano não permitiram uma

maior participação nestes eventos.

Mesmo assim foi uma “época muito

positiva”, declara o técnico. Para o fu-

turo fica também o seu desejo de

“conseguir mais algumas tacinhas”.

Boxe

Com a temporada a chegar ao fim, o

presidente, Ricardo Salgado, asse-

gura que “todos os objetivos foram

atingidos”. A secção garantiu a pre-

sença na fase final de todas as com-

petições que disputou e alcançou a

vitória no campeonato distrital de

equipas. A habilidade dos jogadores

levou também à conquista do quinto

lugar nacional de snooker inglês de

equipas e o terceiro lugar nacional in-

dividual, na mesma modalidade. A

época mostrou-se favorável a uma

das mais recentes secções da AAC,

ainda que esta sofra de “graves difi-

culdades financeiras”, como ressalta

o dirigente. Para o próximo ano, a

conquista de um título nacional é o

grande objetivo.

Bilhar

A época da Secção de Cultura Física

foi dominada pela preparação para

o Mundial de Powerlifting que vai

decorrer em Las Vegas, Estados

Unidos de 6 a 11 de Novembro. O

presidente, Eduardo Cabrita,

afirma que, na preparação para este

campeonato foi feito “um trabalho

que permitiu verificar onde era pre-

ciso «afinar a máquina» ”. No mun-

dial esperam-se boas classificações,

sobretudo a nível da categoria de

supino. A competição da secção só

termina em dezembro. “A nível da

representação nacional, está dentro

das nossas expetativas, sobretudo a

nível da academia de juniores ”,

afirma o dirigente.

Cultura Física

Seniores poderão não competir pela primeira vez

Futuro incerto

O melhor resultado de sempre Secção reativada

Devolver a Académica aostempos de glória do passado

Bons resultados superam dificuldades

Boas prestações Grande preparação para omundial

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8 | a cabra | 10 de julho de 2012 | terça-feira

Para além da participação nos cam-peonatos nacionais, a secção esteveenvolvida em diversas atividades dedivulgação. “O balanço é positivo,para além do número de pilotos teraumentado, participámos em diver-sas exposições e encontros de de-monstração”, afirma Cátia Morais,presidente da secção. A nível compe-titivo, saúda-se o segundo lugar ob-tido na categoria de quad cross. Comos campeonatos a decorrer, mais tí-tulos são esperados. A lamentar, “ afalta de envolvimento da comunidadeuniversitária”, declara. Para o futuro,a dirigente pretende que a secção“mantenha o nível” e continue a serprocurada “para participar em ativi-dades”.

Desportos Motorizados

A equipa de seniores masculinos daSecção de Futebol da Académica ter-minou em oitavo lugar no campeo-nato distrital. Rui Pita, presidente dasecção, explica que, nos seniores osobjetivos foram alcançados até de-zembro. “Estávamos em primeiro,mas a ponta final foi mais fraca”, re-lata. A taça distrital foi outro objetivoque escapou, assim como o campeo-nato nacional universitário. As cama-das jovens não conquistaramqualquer título mas, como diz o diri-gente, “tivemos bons resultados epara o ano esperamos melhorar”.Para a temporada que se avizinha RuiPita sabe que vai ter um campeonatonos seniores complicado e difícil.

Futebol

A comemorar o trigésimo aniversário,a Secção de Desportos Náuticos daAAC, teve um ano marcado por con-quistas. Seis títulos nos escalões se-niores e juniores, quatro nos escalõesde remo jovem, a participação em trêsregatas internacionais, com dois pri-meiros lugares na regata HollandBecker, são os pontos de destaque.”Apesar de a secção atravessar umasituação financeira muito compli-cada, houve investimento na manu-tenção do material desportivo”,declara Ricardo Reis, presidente.Eventos como o Open Day permiti-ram a promoção do remo junto da co-munidade. A substituição do técnicoprincipal e uma aposta mais forte nascamadas jovens permitirá melhoresresultados futuros.

Desportos Náuticos

Com “vários campeões nacionais aépoca foi muitíssimo positiva ”, men-ciona João Castelo, tesoureiro da sec-ção. Para além das conquistas,destaca-se a presença de atletas nasequipas nacionais e nas provas inter-nacionais mais importantes. “Somoso único clube a colocar na seleçãoatletas nas três vertentes da ginás-tica”, enaltece o dirigente. A épocatermina com a realização do Euro-gym, festival de demonstração quedecorre em Coimbra, de 15 a 19 dejulho, algo que espalhará a ginásticapela cidade. Preservar o nível de re-sultados e continuar a desenvolver otrabalho são as ambições para o fu-turo.

Ginástica

Maior divulgação Vitórias além fronteiras

Académica cumpre serviçosmínimos

Acabar a temporada emgrande

O campeonato nacional de halterofi-lismo, realizado em Coimbra, deu àAcadémica dois novos campeões fe-mininos, um campeão masculino eainda dois vice-campeões. O presi-dente da secção, Bruno Almeida,afirma que a época se revelou “bas-tante positiva”. A temporada ficoutambém marcada pela aposta na mo-dalidade de Powerlifting, onde a con-quista do primeiro e segundo lugar nocampeonato nacional assegurou aqualificação para o campeonato domundo. Apesar de não enfrentaremgrandes dificuldades, Bruno Almeidalamenta ser “difícil angariar novosatletas”. Os objetivos passam pormanter o nível de qualidade e asse-gurar os campeonatos conquistados.

Halterofilismo

Foi um ano bastante produtivo paraa Secção de Karaté da AAC. José Ar-lindo, presidente da secção, afirmaque “foi bastante positivo sobretudoa nível das camadas mais jovens, atéaos cadetes juniores pois obtivemosbons resultados a nível nacional,tanto nos campeonatos nacionais ofi-ciais como nos particulares”. Outrodestaque da época foi a participaçãono torneio da Queima das Fitas 2012.O dirigente espera que a próximaépoca “venha a ser melhor e que osjovens estejam mais bem preparadospara obter melhores resultados ”. Aum nível menos positivo o dirigentelamenta: “o pavilhão podia estar me-lhores condições ”.

Karaté

Depois das taças de Portugal em se-niores masculinos e femininos, asconquistas do judo da Académicacontinuaram a aumentar. “Possivel-mente, a melhor época de sempre”afirma Gonçalo Órfão, presidente dasecção. O ponto alto da temporadaocorreu com a conquista do campeo-nato nacional de seniores femininos,sendo que os masculinos obtiveram oterceiro lugar, algo considerado “umfeito histórico”. “ O top a nível nacio-nal está aqui ”, enaltece o dirigente.Vários pódios individuais e camadasjovens muito promissoras são outrosmotivos de destaque. Continuar comos excelentes resultados e tentar co-locar, pelo menos, um atleta nosJogos de 2016 são as ambições.

Judo

A Secção de Lutas Amadoras não con-seguiu revalidar nenhum título doano precedente. Contudo o presi-dente Adilson Brito afirma que “umdos principais atletas, Francisco Ro-drigues, estava lesionado e já come-çou a competir, tendo ido a algumasprovas”. O dirigente deixa assim orepto para a próxima época, onde aprincipal pretensão é a reconquistados troféus perdidos. A formação nãoé descurada, estando a secção “a ten-tar formar atletas”. Apesar de os atle-tas “ainda não estarem preparados”,Adilson Brito garante que “o futuropassará por aí”. O dirigente lamenta ofacto de existirem poucas equipas nazona centro, o que dificulta a roda-gem dos lutadores.

Lutas Amadoras

Rumo às competições internacionais Feitos sucedem-se

Camadas jovens brilham Ano de recuperação

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10 de julho de 2012 | terça-feira | a cabra | 9

“Foi uma época muito boa em termosdesportivos”, esclarece MiguelAbrantes, coordenador geral da sec-ção. No polo aquático a briosa alcan-çou a subida à segunda divisãonacional em seniores masculinos. Notriatlo, a Académica brilhou, sobre-tudo através de José Estrangeiro, queconquistou provas e o apuramentopara o mundial. A nível da natação, asecção teve “uma época brilhantecom 11 pódios individuais, títulos na-cionais e atletas nas selecções ”, enal-tece o dirigente. Todas estasconquistas são dedicadas a JorgeCosta, presidente falecido em abril.Miguel Abrantes lamenta o facto de acomunidade universitária não “que-rer nadar”.

Natação

Apesar das dificuldades financeiras,a secção conseguiu atingir as metasdelineadas. João Rodrigues, presi-dente, assevera que, ”ao nível dos se-niores masculinos, com uma equipacomposta por novos elementos e trei-nador” a Académica conseguiu “man-ter-se na segunda divisão”. A nívelfeminino, as patinadoras de Coimbramelhoraram a classificação no nacio-nal e disputaram a ´final four` dataça de Portugal. No desporto univer-sitário, tanto em masculinos comoem femininos a AAC alcançou o se-gundo lugar. Um ponto a salientar foia reativação da patinagem artística.Na próxima temporada, o dirigenteespera melhorar os resultados.

Patinagem

As equipas da Secção de Rugby da AAC obtiveram desempenhos positi-vos nas competições em que participaram. Segundo o presidente, JaimeCarvalho, “a ‘final four’ foi atingida em todos os campeonatos”. Desta-cam-se ainda a vitória na Taça de Portugal em sub-21 e a presença nafinal sénior da Taça, em masculinos. Nos campeonatos universitários aAcadémica conquistou o campeonato nacional em seniores femininos.Jaime Carvalho salienta ainda “o aumento do número de atletas e a co-locação de alguns deles nas seleções”, número que pretende aumentarna próxima época.

Rugby

Vitórias com homenagemObjetivos conseguidos e patinagem artística de volta

Enquanto a maioria das secções en-cerra a sua época, a Secção de PescaDesportiva inicia a sua atividade. Ocomeço foi agridoce, com “resultadosindividuais positivos”, embora “os co-letivos nem tanto”, comenta o treina-dor, Belisário Borges. A secção, quede momento se encontra no nonolugar no campeonato, procura recu-perar as posições de topo. No cam-peonato de veteranos, BelisárioBorges alcançou o quarto lugar, qua-lificando-se para os nacionais. A taça,ainda longe, disputa-se no final doano. Com poucas provas realizadas anível individual e coletivo, torna-seprematura uma antevisão. Aliciar osestudantes para a modalidade é ogrande desafio.

Pesca Desportiva

A Secção de Radiomodelismo des-taca-se no campeonato europeu namodalidade de 1:8 TT, com MiguelMatias e Carlos Durães a terminaremem oitavo e décimo segundo lugar,respetivamente. O tesoureiro, CarlosLobo, lembra que a nível nacional“ainda está tudo em aberto”, porainda estarem a decorrer provas nasdiversas modalidades. Dados os cus-tos elevados da modalidade, as difi-culdades passam pela aquisição deatletas. Contudo, segundo o tesou-reiro, “o problema vai estar no diri-gismo da próxima secção”, poisfaltam pessoas jovens. Manter os tí-tulos e “ver se há malta nova” são osobjetivos, ressalta Carlos Lobo.

Radiomodelismo

“Ainda há muita água parapescar”

“A secção está bem e recomenda-se”

Conquistas marcam a época

Nas palavras de Ana Lopes, presi-dente da Secção de Taekwondo daAAC, “a equipa de competição teveótimos resultados a nível nacional enas provas internacionais em queparticipou ”. Um dos títulos que se sa-lienta foi a conquista da taça distritalem seniores masculinos. A formaçãodos treinadores foi também um pontorelevante desta temporada e contri-buiu para “ uma excelente época”,como explica a dirigente. “A níveleconómico está difícil, apesar de todoo apoio”, afirma Ana Lopes. Para o fu-turo esperam-se mais e melhores re-sultados continuando a aposta naformação dos técnicos.

Taekwondo

A competição da Secção de Ténis daAAC começa verdadeiramente emjulho e agosto. Eduardo Cabrita, pre-sidente, refere a estadia da secção nocampeonato nacional sub-16 e sub-14em femininos, no escalão de sub-16” etem “grandes expectativas de conquis-tar o primeiro lugar”. Um facto queconstata é a obtenção de melhores de-sempenhos a nível feminino. Aindaassim, a AAC tem equipas masculinaspresentes em três divisões. “Economi-camente não está famoso”, mas o diri-gente tem em mente a realização deprovas inovadoras como um jogo deténis em cadeiras de rodas, um jogo depádel e ainda um torneio associado aos125 anos da AAC.

Ténis

Apesar de Bruno Pais, presidente da Secção de Xadrez da AAC, salien-tar o “eterno problema de faltas de verbas”, afirma que “os objetivos dasecção foram cumpridos ”.“ Em todas as divisões acabámos no pódio,ganhámos diversos torneios individuais e tivemos um vice-campeão na-cional em sub-12 ”, esclarece. Para a próxima época, o dirigente apontapara a conquista do único título que falta, a Taça de Portugal.

Xadrez

Bons resultados obtidosÉpoca a sério está prestes acomeçar

Manuel Silva, presidente da Secçãode Tiro com Arco da AAC, lamentaque “a adesão por parte dos estudan-tes universitários tenha estado aquémdas expectativas”. A secção participouno campeonato organizado pela Fe-deração de Arqueiros e Besteiros dePortugal, onde conquistou o primeirolugar em equipas, bem como algunsprémios individuais. O ponto maisnegativo foi “a falta de participaçãono campeonato de tiro de precisão”,confessa Manuel Silva. Quanto ao fu-turo, as aspirações passam por “con-tinuar a treinar” uma vez que “temchegado material novo e até algumpessoal”, salienta o dirigente.

Tiro com Arco

Segundo Manuel Leal, vice-presi-dente da secção, “a época correubem” e foram “atingidos todos os ob-jetivos”. As equipas seniores, conse-guiram a manutenção na segundadivisão nacional. Nos escalões de for-mação, duas equipas conseguiram irà segunda fase do campeonato nacio-nal. “ O maior feito da época foi a con-quista do campeonato nacionaluniversitário no sector masculino ”,destaca o dirigente. O equilíbrio fi-nanceiro conseguido contrasta com adificuldade em arranjar atletas mas-culinos em idade jovem. Manter onível, melhorar condições de treino ecaptar mais jovens são as ambiçõespara a próxima temporada.

Voleibol

Faltam atletas universitáriosUm ano plenamente concretizado

AAC no pódio

Nuno Lopes, coordenadorgeral do pelouro do des-porto da AAC, afirma que “anível geral foi uma época po-sitiva, apesar de todas as di-ficuldades financeiras”. Odirigente deixa elogios àssecções: “ todas se mostra-ram bastante dinâmicas,promoveram diferentes ati-vidades desportivas e con-quistaram títulos”. A nível dodesporto universitário, sal-dam-se três títulos coletivose dois vice campeonatos ajuntar a diversos títulos indi-viduais. ”A AAC tenta ajudarao máximo todas as sec-ções, mas não podemos aju-dar em tudo o quepretendem pois tem quehaver uma contenção”, re-lata. Manter o nível e se pos-sível aumentar o número detítulos são os desejos.

Análise

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Celas: é mas foi-se!

havalos, calças de gangajustas, com Doc Mar-tens nos pés, uns combrincos, casacos de ca-

bedal, uns de cabelinho com bri-lhantina, outros góticos. Cabiatudo no Centro de Trabalhadoresde Celas. Concertos por 300 escu-dos, muito fumo, sala à pinha, háquem espreite pela janela, háquem vá fumar umas ganzas paraos pátios detrás do centro, háquem beba tinto com os velhos dobairro.

Durante pouco mais de trêsanos foi

a s s i m .“Íamos até à praça, ao Moçam-

bique, mas depois batíamos todosno centro de traba-

lhadores”, lembraCláudia Abreu, frequentadora dosconcertos. De Celas, passava-separa o States, e daí ainda se pa-rava na Cave das Químicas, “ondejá estava tudo a gregar”. Depois,ainda se esgueiravam às traseirasdas padarias, para o belo do pe-queno-almoço.

“Procurou-se o sítio, não sei seaquele foi o primeiro”, afirmaFrancisco Correia, na altura dosFetos Enlatados. Mas foi o queficou. “Passou de 40 a 50 pessoaspor lá para 150 e com um visualterrível”, conta Bráulio Alexan-dre, antigo membro dos Tooma-tes Noise. Dum momento para ooutro, Coimbra tinha um espaçoalternativo para concertos – isto,num centro recreativo, com umapequena sala onde se destacavaum mural com uma imagem-pos-tal de Coimbra, e um bar onde amalta mais velha jogava (e aindajoga) sueca e dominó.

O punk em CoimbraPutos na José Falcão. O movi-mento punk surgia em força.Dead Kennedys, Ramones, Clash,X-Ray Spex trocavam-se em cas-setes, rodavam-se fanzinese manda-vam-se virvídeos do es-trangeiro. “Aidade era pro-pícia – acháva-mos quep o d í a m o smudar o

mundo”, explica Luís Martins, an-tigo baterista dos DK Hard Jazz.José Mota, ex-vocalista dos Too-mates Noise, também foi na onda:“foi aquela coisa da rebeldia. Masdepois acaba por ser um marco”.

José Mota sobressaía na alturacom a crista: “começa-se com umpiercing, corta-se o cabelo, depoiscompram-se umas botas”. E láem casa a relação com os pais tor-nava-se complicada. “Com asbotas não me punham problemas,com tudo o resto

sim”. André Leitão,antigo guitarrista dos Foragidosda Placenta, recorda quep a r a

u s a rumas Doc Martens na altura

“era uma guerra que se tinha emcasa”. “Quando íamos a qualquersítio pensavam logo ‘lá vêm estesque só causam problemas’,quando na realidade isso nãoacontecia”, afirma Luís Martins.

O aparecimento de bandasde garagem foi repentino –especialmente no seio daJosé Falcão, com Mansonsmanhosas e combos de 20watts. “Uma das grandesdificuldades era arran-jar sítio para tocar.Mas ainda demos umconcerto na JoséFalcão, com bandasque foram apare-cendo”, dizAndré Leitão.“Foi assim quesurgiu o Cen-tro de Tra-balhadoresde Celas”.C a r l o sD i a s ,membrodos Sub-way Riders,conta que estes í t io

“foi a necessidade de arranjarmosalguma coisa” onde pudessemtocar.

Mas o ponto de partida foi nosPirilampos – Centro Desportivode Celas. Os Tédio Boys foram látocar, que antes, por falta de es-paço, desenrascavam concertosao lado do sítio onde ensaiavam.Também no centro desportivo to-caram os Foragidos da Placenta.Despertaram o interesse de Car-los Dias: “faziam um hardcore

bem feito”. Já conheciaAndré Leitão, das suas idas à

loja de música A Fuga, onde tra-balhava, e sugeriu ser manager dabanda. Aceitaram e começaram a

procurar um espaçopara tocar.

Surgiu o bairro deCelas. “Os concertos eram nos sí-tios mais pobres e populares. Ocentro de trabalhadores de Celasera um lugar de gente humilde, eos Pirilampos era praticamente amesma coisa”, explica CarlosDias. Os Foragidos da Placentaderam lá um concerto em 93, sem

muita gente,mas “as pes-

soas gosta-ram do

espírito”,d i z

André Leitão. Chegou o verão, e oguitarrista dos Foragidos foi tra-

balhar para Aveiro. Lá, conheceuos Inkisição, banda punk, e teve oprimeiro contacto com as zinesanarco-sindicalistas e metaleiras.

Quando voltou para Coimbra,chegou a um ensaio da banda esugeriu que se devia organizar umconcerto e trazer bandas de fora.Sérgio Cardoso, que também erados Foragidos, dá umas ideias aAndré Leitão e decidem criar umapromotora – a Arame Farpado -para divulgar bandas de garagem.Decidido a andar com o projetopara a frente, vai até ao bairro deCelas e fala com a direção: “lem-bra-se de mim? Somos daquelamalta que esteve aqui há unsmeses a tocar, podem fazer umpreço porreiro?”. Aceitaram e vie-

C

O bairro de Celas foi um dos espaços de música alternativa

na cidade. O espírito de comunidade juntava-se gerações em concertos peculia-

res. Por António Cardoso, Ana Duarte e João Gaspar

“Era umafesta umbocadoparticular”,Ávila

“O centro de trabalhadores de Celas ERa

um lugar de gente humilde”, Carlos Dias

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10 de julho de 2012 | terça-feira | a cabra | 11

ram os Inkisição tocar a Coimbra.“Metemos nessa noite umas 180pessoas, não houve problemas,apanhou-se uma bebedeira,fumou-se uns charros e pronto.No outro dia, vim à praça e disse-ram-me que devia continuar”.

A partir daí, começam a surgiros concertos com mais regulari-dade em Celas. Contratos verbaiscom estadia, transporte, alimen-tação e cervejas pagas. “Aquilo eratudo feito por amigos, alguém fa-lava com a mãe para fazer umapanelada de comida, iam uns dor-mir a casa de outros. Sem grandesprotagonismos, nem gente a sertratada como estrela. Estávamo-nos todos nas tintas para isso”,conta Bráulio.

André Leitão comprava a cola,

pedia a Sérgio para de-senhar os car-

tazes,e o resto damalta ajudava a es-palhá-los pela cidade até às

4 da manhã. “Depoisa r r a n j a v a

meiadúzia de sub-sídios, das rádios quenos divulgavam, e um patrocí-nio de cinco contos dos meus paispara as fotocópias dos cartazes”.Com as zines que André tinha lidono verão, em Aveiro, começa a termais contactos e põe um anúncionuma zine a divulgar as promoto-ras. “Começaram a chover casse-tes e demo tapes de tudo o que erabanda”.

Saudações nazis e provocações“Era uma festa um bocado parti-cular”. Nuno Ávila, frequentadorassíduo dos concertos de Celas,descreve assim o que viveu. Vic-tor Torpedo, ex-membro dosTédio Boys, afirma mesmo que“era ótimo chegar lá ao final datarde. Já não se veem hoje em diaconcertos assim, com montes depessoas na rua. E isso era feno-menal, era o espírito do Bairro deCelas”.

Torpedo lembra-se bem de umdos concertos dos Inkisição onde“eram cinco minutos de paleio eum minuto de música” e a ideolo-gia sobrepunha-se ao resto. “Fa-lavam que os fascistas andavamatrás de nós, mas não havia fas-cistas, só fantasmas. Eu estavacom o Carlos Dias, à frente,ele mete a mão para cima[saudação nazi], e eu sigo-o,como quem diz ‘vocês é quesão os nazis’”, em jeito deprovocação.

Conflitos ideoló-gicosFrancisco acha que foi opessoal de fora, essen-cialmente de Lisboa,que “acabou por estra-gar tudo”. “Começa-ram a dividir aspessoas, vinham comideias muito radicais.E aqui era mais festado que propriamentea consciência, queexistia, mas não da-quela forma”, explica,lembrando que pelaideologia começou ahaver “conflitos políti-cos”.

“Havia pessoal de Lisboaque eram uns wannabe,cheios de cinismo, e isso co-meçou a fartar, já nem era tãoentusiasmante marcar ensaios”,confessa André Leitão. “A pri-meira parte do clube de Celas foiinteressante, mas nos últimosconcertos, aquilo já começou atornar-se enfadonho, porque erapregar o sermão aos convertidos.Estava tudo cheio de palavras delei – pensa assim, não faças isto,não podes comer carne... tornou-se ridículo”, conta Torpedo.

“Cinco litros que nem duravam cinco minutos”

Ideologias e divisões àparte, o Centro

de Tra-b a l h a -dores de Celas é e

será sempre relembradopelos episódios carica-

tos que por láacon-

t e c e r a m .Francisco Correiarecorda “o concerto dos X-Acto, uma banda straight-edge,que foi interrompido para aí umas30 vezes porque eles eram contraa violência” e o pessoal andava aomoche. Lá desistiram de apelar ànão violência, porque senão oconcerto não acabava. Victor Tor-pedo, lembra de um concerto“muito importante” dos TédioBoys. “Decidimos pôr uma rede àfrente do palco, à americana, gas-tou-se não sei quanto dinheironaquilo e depois, à primeira mú-sica, veio logo abaixo. Esse con-certo foi uma balburdia docarago. Foi daqueles bons”. Cláu-dia fala de um episódio, em que“andava no meio do palco todabêbada e desliguei a guitarra do

Vitinho dos TédioBoys”.

Já José Mota, ex-vocalista dosToomates Noise, recorda-se maisvivamente de momentos com“pessoal mais velho, alguns paisou avós de malta da nossa idade”.“Acabávamos por ir para as tra-seiras do clube, a comer presuntoe queijo e a beber um tinto deles.

Esses até foram os melhoresmomentos – a acei-

tação da dife-rença”. Luciano,

o bombo dabanda das marchas do centro de

Celas, 84 anos, lembra-sede dar ao pessoalque por lá pas-

sava um garrafãode vinho. “Cinco litros que nemduravam cinco minutos”.

Em 95, os concertos em Celascomeçaram a acabar, com umatentativa posterior de reativação,mas sem sucesso. E não há cáanalogias de morcegos de “mo-mentos que passam, saudades

que ficam”. “Teve o seu

tempo e o seu espaço”, reiteraLuís Pinheiro, que filmou muitosdos concertos que por lá passa-ram, mas só das bandas nacio-nais: “nas estrangeiras pousava acâmara e ia curtir eu”.

Hoje, o centro de Celas faz-sede uns jogos de sueca, assiste-seao futebol e surgem “os pratican-tes do copo”, conta António Men-des, 95 anos, que por lá passatodos os dias. Uns prémios ga-nham pó nas prateleiras e na salaonde antes se davam os concer-tos, hoje estão umas mesas deping-pong para os jantares dabanda das marchas e no palco lácontinua a imagem-postal deCoimbra, sem resquícios dos con-certos a 300 paus.

“Havia pessoal de Lisboa que eram uns

wannabe, cheios de cinismo”, Torpedo

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stephanie sayuri paixão stephanie sayuri paixão

stephanie sayuri paixão

stephanie sayuri paixão

stephanie sayuri paixão stephanie sayuri paixão

douglas rabelo

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10 de julho de 2012 | terça-feira | a cabra | 13

avidadooutroladodorioais do que o Por-

tugal dos Peque-

nitos, os

Mosteiros de

Santa Clara e a Praça da Canção,

o outro lado do rio também tem

pessoas. Devido à proximidade

com a Universidade, a maioria dos

estudantes vive na margem direita

e naturalmente permanece mais

tempo deste lado. Muitos chegam

a formar-se sem nunca ter conhe-

cido bem a margem esquerda.

Quando se pensa em Coimbra,

uma das primeiras ideias que vem

à mente é a clássica imagem da

Torre da Universidade. Vista e fo-

tografada perfeitamente da mar-

gem esquerda. Mas, na prática

quando se chega a Coimbra, pou-

cos são os que vão lá ver com os

próprios olhos a imagem dos pos-

tais. Porém, há quem contrarie

este padrão e passe muito mais

tempo do outro lado. Ao explorá-

lo um pouco mais é possível sentir

facilmente a simplicidade e sim-

patia dos que lá vivem: crianças a

brincar na rua, senhores e senho-

ras a conversar à porta das suas

casas. Longe da agitação da mar-

gem direita, deste lado caminha-

se no silêncio e nos sons. O

silencioso som das ruas tranquilas

e iluminadas.

Stephanie Sayuri Paixão

M

Fotorreportagem

completa em

acabra.net@

stephanie sayuri paixão stephanie sayuri paixão

stephanie sayuri paixãostephanie sayuri paixão

stephanie sayuri paixão

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14 | a cabra | 10 de julho de 2012 | terça-feira

le não tem propria-

mente feitio de

monge”, troça Marinho

Borges do irmão que

sai para almoçar, jantar e beber uns

copos fora do seminário. Marinho

fala de um homem que aproveita os

momentos que lhe oferecem acredi-

tando que as pessoas foram feitas

para viver com alegria a própria vida.

“Foi nascido” em 1944, segundo o

que lhe disseram, em Resende. An-

selmo Borges, teólogo, padre e filó-

sofo, foi criado no seio de uma família

cristã em tempos que eram outros. O

facto de ter um irmão mais velho

também padre, diz, não teve influên-

cia na escolha que fez: “fiz-me padre

para anunciar a boa-nova de Jesus

dando sentido à existência dos ho-

mens e das mulheres aqui e para lá

da morte”.

Refletir sobre a fé Enveredar pelo caminho da fé foi a

resposta encontrada às questões fun-

damentais que o habitavam: o que é o

homem? Qual o fundamento de

tudo? Qual o sentido último da exis-

tência? Interrogações às quais, acre-

dita, as ciências exatas não dão

resposta. Respostas, essas, que resi-

dem antes na teologia, na filosofia e

no compromisso com Deus.

Padre Nuno Santos, atual diretor

do Instituto Justiça e Paz de Coim-

bra, conheceu Anselmo ainda nos

tempos de estudante. Isto há cerca de

13 ou 14 anos, a propósito de um con-

vite para falar da morte. A forma

como se relaciona com Deus é enten-

dida pelo Padre Nuno como uma

missão intelectual. Pensar Deus,

torná-lo pensável e dialogável e aju-

dar um conjunto de meios e contexto

a refletir sobre as suas perguntas, é a

forma como Anselmo Borges encara

a sua missão. Padre Nuno define o

colega como um “buscador de Deus

que nos faz perguntas sobre Ele, para

nos ajudar no caminho.”

Anselmo Borges é conhecido dos

jornais e das televisões onde assume

a posição pela qual é polémico contra

alguns dos princípios da Igreja. Ao

defender abertamente o uso do pre-

servativo, ao encarar o debate sobre

a eutanásia sem tabus e a apoiando a

despenalização do aborto, aquando

do referendo de 2007, Anselmo facil-

mente ganhou as críticas da Institui-

ção, cada vez mais, política no

sentido da hierarquia. “Nós não acre-

ditamos no Vaticano, não acredita-

mos no Papa, não acreditamos nos

bispos, nos padres. Nós acreditamos

em Deus, no Deus de Jesus que é

bom, que é força de libertação”, ex-

plica.

A Igreja já o tentou calar, mas a sua

posição assumidamente consequente

não deixou que qualquer superior lhe

baixasse a voz. Por volta de 1970, um

bispo acusou-o ao diretor, da insti-

tuição onde lecionava, de dizer here-

sias e que por isso deveria ser

afastado. No entanto, esse diretor,

um homem que respeitava, disse ao

bispo: “primeiro o senhor vai escre-

ver as heresias que ele disse, a seguir

vamos ver se efetivamente são here-

sias e, então depois, agiremos em

consequência”.

Se não fosse padre, o Direito seria

a área do saber pela qual teria op-

tado, por ter a ver com o contacto

com as pessoas. Não é por acaso que

escolheu também ser professor. Pro-

fissão ou vocação? Tudo depende da-

quilo que se entender por uma

profissão, diz. Se se pensar em pro-

fissão, professor, profissional, tudo

isso vem do latim de profiteri que sig-

nifica ‘ter uma mensagem para en-

tregar’. “Nesse sentido sim, ser Padre

é uma profissão”, aclara. No entanto,

no sentido vulgar, ser padre não é

propriamente uma profissão: “para

se ser padre tem de se ter uma base,

uma vocação, um apelo profundo e

uma resposta”, explica Anselmo.

O jovem Anselmo Ainda gaiato, o filósofo já dava mos-

tras do seu espírito crítico e justo. O

irmão conta uma história da qual o

próprio Anselmo se recorda. Uma

das primeiras lembranças da infân-

cia. “Uma vez caiu uma colher ao

chão e o meu pai mandou-o apanhá-

la. Ele disse que não apanhava, por-

que não tinha sido ele o culpado. O

meu pai agarrou nele e, mesmo

assim, não conseguiu que ele apa-

nhasse a colher e a pusesse em cima

da mesa”, conta Marinho. “Não tinha

sido eu quem a tinha deitado ao chão,

mas o meu pai imaginou que sim”,

recorda Anselmo. O padre lembra-se

de reivindicar, da teimosia ou da au-

tonomia e também de alguma justiça.

Lembra-se, mais tarde, que uma vida

exclusivamente a obedecer seria uma

vida que não era interessante. “Sem-

pre tive a ideia de que devíamos ser

nós autónomos e iniciadores de algo

de novo no mundo”.

Ivo é um dos sobrinhos de An-

selmo. Estudante, em Coimbra, par-

tilhou conhecimentos com o tio,

sentado num dos grandes auditórios

da Faculdade, do lado da audiência.

A ideia de frequentar as suas aulas

era uma forma de tentar entender

como este seria a lecionar. No en-

tanto, a relação de sanguinidade ficou

em segredo. “No início ninguém

sabia, ele nem falava comigo durante

as aulas”, diz Ivo. E desengane-se

quem possa pensar que a relação o

poderia favorecer de alguma forma.

“Se há alguma coisa que eu fui, foi

desfavorecido”, brinca.

Entre os alunos, era conhecido

como o “anti-padre”,

uma denominação cu-

riosa. “Ele falava muito contra os pa-

dres e por isso ninguém fazia ideia de

que ele próprio seria padre, porque lá

na ficha aparece como Doutor não sei

quê”, conta o sobrinho.

O tio, diz Ivo, é reservado. Anselmo

e os irmãos foram criados segundo

uma educação diferente, o que faz

com que o padre e o professor não ex-

teriorize diretamente os seus senti-

mentos. Por vezes, escreve livros que

dedica aos sobrinhos. Ivo só sabe

quando o volume chega à caixa do

correio. Pode ler um qualquer texto

de Ivo mas expressa a sua apreciação

ao irmão, pai do sobrinho: “sei que

ele está atento, que gosta do que faço

e que tem orgulho mas não é uma

pessoa que me ligue a dizer”, explica

Ivo Borges.

Conhecer além de reconhecer Apesar do lado provocador e muito

crítico dos seus comentários publica-

dos nos jornais, para conhecermos

melhor Anselmo Borges “temos que

o ler nos livros”, destaca Nuno San-

tos. Nas palavras do Padre Nuno,

o padre Anselmo é um teólogo, logo

não é a única, nem a última voz da

Igreja: “os teólogos não são a voz

final, os teólogos são os buscadores

que vão à frente a abrir caminho, as

pessoas que vão a rasgar ideias e a ver

as possibilidades”.

As melhores recordações do padre,

diz, têm a ver com a experiência da

beleza e a música que é o divino do

mundo. “Um pôr-do-sol sobre o mar,

na praia, uma porta em pé do resto

da casa. Tive ali um arrebatamento,

tudo me pareceu perfeito. Já não

havia sujeito e objeto, tudo estava no

seu lugar e a eternidade tocou o

tempo.”

Nuno Santos cita o teólogo Rui

Ambrósio na melhor forma que en-

contra para resumir Anselmo: “eu

sinto-me cá dentro, a empurrar as

margens, para que as margens fi-

quem maiores, para que haja mais

gente dentro ”. “Acho que é essa a po-

sição do Anselmo. Alguém que está

dentro e que ama a Igreja e que tam-

bém ama a Teologia e o pensamento.

Procurou toda a vida com liberdade

e integridade ir alargando as mar-

gens”.

Perfil

Anselmo Borges é um eclesiástico também já chamado de

anti-padre. O pensamento moderno que incomoda a Igreja,

projeta-o como uma figura polémica das televisões e jornais.

Um homem reservado que procura na religião e em Deus a

resposta às suas dúvidas. Por Filipe Furtado e Maria Garrido

A voz que a

Igreja não cala

“E

Pensar Deus, torná-lo pensável e dialogável, é a forma como Anselmo Borges encara a sua missão

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10 de julho de 2012 | terça-feira | a cabra | 15

A industria sem chAODesolação e angústia são os sentimentos dominantes daqueles que, em tempos,

fizeram parte das grandes indústrias a laborar em Coimbra, assombradas agora de

vazio. Uma afeição ganha ao longo de anos de dedicação e a incerteza de quem,

lançado no desemprego, se sente sem chão nem amparo. Por Inês Amado da Silva

Inês sIlva

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16 | a cabra | 10 de julho de 2012 | terça-feira

osé Pena mostra-nos apastinha em que guardaalguns documentos – umcontrato antigo, entre

eles. Uma folha azul gasta e redi-gida a máquina de escrever. Aoexibi-la, percebe-se que essa folhavelha, com traços de grafia antiga,encerra um significado maior. É oseu primeiro contrato de traba-lho, datado de 1981. O contratadotem 16 anos, diz a folha, e fez aquarta classe. Marcava o início deum conjunto de memórias de 27anos passados na Ceres – Cerâ-micas Reunidas SA, que JoséPena guarda tão bem quanto apasta dos documentos. Mas re-corda ambos com tristeza.

Na mesma secção que José tra-balhava Joaquina, a prensadora,enquanto ele lidava com o forno.Das tantas noites de trabalho nãoesquece também as horas a mais,que fazia quando era preciso, enem sempre eram pagas. “Nãofaltava trabalho, até para Angola”,conta, perplexo. “Gostei muito [detrabalhar na Ceres]” é, no en-tanto, a afirmação que perma-nece, apesar de todo o sacrifício.O desalento vem depois. Já nãovive em Torre de Vilela, ondemorou nos anos de trabalho na fá-brica. Sabe de cor o dia em quecessou contrato: 17 de dezembrode 2006, ano em que a fábrica decerâmicas sucumbe.

Sente “falta de ir ter com os co-legas” da fábrica, e seis anos jácorreram desde o encerramento.José Pena tem agora 47 anos, ocabelo grisalho acusa-o. Foi sacu-dido para o desemprego duranteos dois anos que se seguiram, etudo o que consegue desde aí re-sume-se a parcos recibos verdes etrabalho temporário. Cai nova-mente no desemprego. Resideagora numa terra diferente, sub-sistiu sem qualquer apoio de fa-miliares ou amigos.

No sentido Coimbra-Aveiro,quem viajar de comboio poderáadmirar parte da grande fachadada Ceres, ou do que dela resta. Apaisagem é decadente: o letreiromantém-se, moribundo, e asplantas selvagens engolem, poucoa pouco, o esqueleto que sobra detempos áureos. Mas os tempossão outros, e o declínio das indús-trias conimbricenses projetouperto de dois mil trabalhadorespara o desemprego entre 2000 e2010, segundo dados do memo-rando da CGTP de Coimbra, emnovembro de 2011.

Não sabemos se se conheciam,mas Joana Cabido, residente naLousã, trabalhou na mesma fá-brica. Tal como José, sabe o diado início e do fim da sua estada –e os anos, que foram 24. “Nuncana minha vida pensei em sair daCeres sem ser reformada”, repe-

J

carlota rebelo

carlota rebelo

inês balreira

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10 de julho de 2012 | terça-feira | a cabra | 17

tindo o “nunca” seis vezes. Nasviagens de comboio até ao traba-lho encontrou amizades e algumaajuda para descobrir emprego,que não encontrou desde o encer-ramento da fábrica. “Têm-me aju-dado com muita coisa. Que eu nosprimeiros dias [depois do encer-ramento] quase que nem me le-vantava da cama. Chorava,chorava…”. São rostos perplexos,os destes trabalhadores, perantea ruína daquelas que foram tam-bém as suas empresas.

Dominó para a insolvênciaAs paisagens são largas em cadauma destas fábricas – paisagensde largo abandono. A ferrugemcobre os esqueletos metálicos, osestilhaços desdobram-se debaixodos pés. Os pequenos barulhosdos pombos, único sinal de movi-mento, assustam como fantas-mas. Ceres; Cerâmicas Estaco;fábrica têxtil Ideal; Triunfo eTriunfo Rações; Real Cerâmica ePoceram: um rol de nomes que é,na verdade, muito mais extensoque esta enumeração, um dominóque foi empurrando uma por umapara a insolvência. Fábricas queantes fizeram o florescimento dacidade e que desenham agorauma linha de vazios na sua cin-tura industrial. O declínio destasgrandes referências afigura-se umato contínuo desde os anos 80,começado muito antes do encer-

ramento da Ceres, e talvez queiradizer muito mais do que aquiloque aparenta.

A sul de Coimbra, ao longo daEstrada Nacional Nº1, vai-seconstituindo a zona industrial deAntanhol, outra das frações dacintura industrial da cidade. A úl-tima fábrica desta sucessão é aPoceram, nome exibido aindabem visivelmente pelo seu grandeletreiro azul, por cima de um seg-mento espelhado da fachada. Otí-lia Veiga, 44 anos, passou 23 nafábrica que se dedicava exclusiva-mente à produção de mosaico eazulejo, e pertenceu aos cerca de150 trabalhadores mandados paraa rua. Parada desde abril de 2009,a unidade atravessou um pro-cesso de liquidação arrastado pormais de um ano. “Disseram-nosque era por causa das encomen-das, mas nós sabíamos que eramau, que estavam a mentir”,afirma Otília Veiga, garantindoque a fábrica tinha “muito traba-lho, até para o estrangeiro. Deixá-mos lá muito material quasepronto”.

A Poceram, tal como a Ceres, foium império de família, construídode raiz e descuidado pelas gera-ções posteriores. Otília aponta amá gestão dos sucessores de Mar-ques de Almeida, o fundador,como a razão fulcral da falência.Do que sente mais falta, porém, édas relações que por lá criou.“Agora até já está a passar, mas ao

!“Nunca na minha vida pensei

em sair da Ceres sem ser

reformada”, repetindo o

“nunca” seis vezes

- Joana Cabido

início custou-nos muito: era umacoisa boa, porque ao fim do diagostávamos do que estávamos afazer”. “23 anos não é nenhumabrincadeira”, lembra: “aindaagora me custa passar e olharpara lá”.

“Foi tudo ao Deus dará”Teoriza-se, no mundo do traba-lho, que os 45 anos definem alinha em que a entrada do traba-lhador no mercado começa a en-frentar sérias dificuldades.António Acácio e a esposa repre-sentam o paradigma de velhos demais para ingressar no mercado, enovos de mais para a reforma. Talleva, muitas vezes, a um pedidode reforma antecipada, num pa-drão verificado em trabalhadorescom nível baixo de qualificações eque dedicaram grande parte davida a determinado emprego. An-tónio Acácio, 54 anos, trabalhoudesde 1973 na Ceres, até ao seuencerramento. Também a esposatrabalhava na mesma fábrica.Hoje, António está reformado porinvalidez, não tendo encontradooutro emprego. A esposa pediu areforma antecipada. Precisaramaté da ajuda dos filhos, já casados.De nada lhes valeu a experiênciaacumulada de tantos anos.

De nada valeram também astentativas de reabilitar estas in-dústrias – caso da Ceres, reabertaem maio de 2009 e re-encerradalogo em 2010. A todos há um

fator comum: salários em atrasoe indemnizações por receber.Apesar dos recheios já vendidos,os trabalhadores de ambas as fá-bricas continuam na espera de re-ceber os dividendos a que têmdireito. José Pena recebeu, pelaúltima vez, 1500 euros, em 2007,esfumados no pagamento de dívi-das acumuladas. Mas volta aopassado com nostalgia, recor-dando sempre uma empresa “queera muito boa, como ainda hojenão há nenhuma em Coimbra”. Aperplexidade volta ao seu rosto:“foi tudo ao Deus dará”.

Num modelo industrial que seafunda cada vez mais, o terrenonão é fértil para a indústria emCoimbra. Aquilo que antes eraterreno firme faz agora crescer aimundície que devora as arma-ções dos edifícios. O seu chão jánão os sustenta. Na Poceram “atéjá roubam as janelas”, lamentaOtília Veiga. Há pigmentos colo-ridos virados e espalhados pelochão, contrastando com a deca-dência sépia envolvente. Mas “ochão já não era deles [proprietá-rios], já tinham até vendido o ter-reno”, conta Otília. “É ver que estátudo a acabar aqui na nossa zona,o que é triste”. Porque não háchão que sustente tamanha au-sência. Nele, apenas se mantêmde pé grandes carcaças vazias da-quela que já foi a grande indústriade Coimbra.

Com Camilo Soldado

INDU

STRI

A

carlota rebelo

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18 | a cabra | 10 de julho de 2012 | terça-feira

inês balreira carlota rebelo

carlota rebelo

inês silva

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10 de julho de 2012 | terça-feira | a cabra | 19

á muito mais a ganhardo que a perder”, dizTeresa Sousa, técnicasuperior de serviço

social do Centro de AcolhimentoJoão Paulo II, sobre o projecto “Ladoa Lado”, lançado em 2009 pela Asso-ciação Académica de Coimbra (AAC),em parecia com o centro. De umlado, a casa fica menos vazia, ajuda-se na toma dos remédios, numa idaao centro de saúde, ou até numafonte de conselhos. Do outro, ofe-rece-se residência, mas também doisdedos de conversa e experiência devida.

Apesar do projeto contar já comtrês anos, ainda só teve nove estu-dantes envolvidos. “Já tivemos ofeedback dos estudantes que partici-param e só ouvimos coisas boas”,conta a coordenadora do pelouro deAção Social da direção-geral da AAC(DG/AAC), Rita Andrade.

Silêncio quebradoExemplo disso é Ana Filipa Miranda,de 25 anos, finalista de Direito, quese virou para o projeto “Lado a Lado”quando perdeu a sua estadia numaresidência universitária. Em perigode abandonar o ensino superior pornão poder pagar um quarto, foi acasa de dona Rosinha, na rua do Bra-sil, que lhe deu a possibilidade de

continuar a estudar. Rosinha, se-nhora de 83 anos, baixa e de cabelocurto, amável, recebeu-a há dois anosatrás, através do projeto. O início, amedo, custou um pouco. Foram duassemanas de alguns silêncios e timi-dez de parte a parte. “Ia com o receiode que não desse certo”, confessa.Contudo, Rosinha pô-la à vontade, epassadas duas semanas, a estudantede Direito já se sentia em casa. “Con-tava-me as histórias dela de quandoera mais nova, dos seus namorados,e eu contava as minhas, fartávamo-nos de rir as duas”, recorda. Rosinhapassou a ser a família de Ana Filipaem Coimbra, mas também suaamiga. “Quando estava indecisa emdeterminados pormenores da minhavida, pedia-lhe conselhos e muitasvezes fez-me olhar para outroslados”.

Ana Filipa lembra-se que um diachegou a casa e Rosinha não estavalá. Apenas um bilhete a dizer que

tinha tido um problema na perna eque estaria nos Hospitais da Univer-sidade de Coimbra (HUC). “Fiqueitão aflita que fui a pé de casa, na Ruado Brasil, até aos HUC, e depois es-perei que ela tivesse alta para a tra-zer para a casa. Foi um dos episódiosem que reparei que também eu eraútil para a Rosinha e não só ela paramim”.

Contudo, o problema na pernacomplicou-se e Rosinha teve que irpara um lar de idosos. “A primeiravez que a fui lá visitar foi muito triste– chorámos as duas. De certeza quegostava mais de morar comigo doque no lar”, afirma Ana Filipa Mi-randa, que admite que preferia tam-bém a companhia da Rosinha àresidência universitária, onde voltouagora, depois de ter estado na casa deoutra senhora através do projeto“Lado a Lado”.

O “mandado”Também Júlio de Santos participouno projeto, mas de forma excecional.Em vez de lhe ser facultada residên-cia, pagaram-lhe as propinas na trocada sua ajuda a Maria de Lurdes, já fa-lecida. “Acompanhava-a a atividadesque tinha, comprava-lhe medica-mentos, levava-a ao hospital ou aocentro de saúde, ou ia ter com ela sópara conversar”, explica Júlio, estu-

dante de Direitoproveniente deGuiné-Bissau.

“A vida vai-tecorrer bem”,dizia Maria deLurdes a Júlio,no meio de la-mentos que lan-çava de quandoem vez. QuandoJúlio levavaumas amigas atéà casa de Mariade Lurdes, a se-nhora não evi-tava lançaralguns pareceresde gente com ex-p e r i ê n c i a :“aquela deve serboa para ti”,

dizia-lhe. Júlio aborda esta experiência no

projeto de uma forma muito natural:“se há idosos que não têm família, ouque a família não tem disponibili-dade, porque não arranjar um tempode passeio com eles?”. Lembra-seque o que cá é institucionalizado, naGuiné-Bissau é uma questão cultural.“Na Guiné há o mandado, que é umapessoa que faz recados aos mais ve-lhos. Sente-se orgulho em ajudar osvizinhos ou uma senhora que precisade companhia. É a nossa segurançasocial”, explica. “A ajuda que dás àspessoas vai levar a que alguém te váajudar depois”, afirma Júlio, con-victo.

Venisa de Pina, 18 anos, estudantede Engenharia do Ambiente, tambémcompreende Júlio, visto que vem deCabo Verde, onde ajudar os mais ve-lhos é também tradição. Inscreveu-se há dois meses no projeto e, emprincípio, para o ano, estará comple-tamente integrada. “É difícil pagar aestadia, e esta iniciativa vem ajudar”.

Aposta na divulgaçãoTeresa Sousa considera que a fracaparticipação pode residir na falta deconhecimento do projeto: “para alémde ajudar alguém que está sozinho,há o fator económico. E, em tempos

de crise, pergunto-me, onde é queestão os que passam tão mal?”.Quanto a barreiras geracionais, Te-resa pondera que os estudantes pos-sam ter medo que lhes seja cortada aliberdade, mas avisa que isso nãoacontece. “Elas entendem, sabemque é Coimbra, que há festas, queeles são jovens. Há compreensãonesse sentido, apenas querem ter al-guém com quem conversar, que es-teja alerta em situações de doença e

de apoio em pequenas atividades”. A coordenadora do pelouro de

Ação Social da DG/AAC coloca ogrande entrave deste projeto na “mádivulgação”. “Embora a AAC tenhausado mais meios ultimamente, commandatos de um ano, não chega ahaver estabilização – quanto estamosmais à vontade com a iniciativa, es-tamos quase a dizer adeus”. Contudo,Rita Andrade avança que no início dopróximo ano letivo, a DG/AAC vaiapostar numa forte divulgação, acre-ditando que tal vá “aumentar o nú-mero de participantes”.

Neste momento, quando há seisidosas em lista de espera, só umapessoa é que está a participar - Mar-garida Leão, estudante a tirar espe-cialização em Pedopsiquiatria emCoimbra, mas a morar no Porto.Quando teve conhecimento do pro-jeto, interessou-se imediatamente,visto que faz muitas viagens entrePorto e Coimbra. Fernanda Antão es-tava disponível e, duas vezes por se-mana, fica em casa dela, desde 16 deabril deste ano. “Adaptámo-nos umbocado uma à outra. Depois do tra-balho, é bom chegar aqui e ter al-guém com quem falar”, dizMargarida. Ouve com atenção as his-tórias de Fernanda Antão, que, se-gundo Margarida, “basta-se a siprópria”. Falam das notícias que apa-recem no Diário de Coimbra, da ju-ventude, do que surgir. Fernandaficou logo rendida à jovem médica,quando esta calçou umas galochas eajudou no seu jardim e quintal, quin-tal esse que, dantes, com as limita-ções físicas de Fernanda, estava umpouco descuidado. “É complicadoencontrar uma menina da idade delaque faça dessas coisas. Houve logoempatia”, conta Fernanda.

“Ao final do dia, quando chegaaquela hora, já sinto que venho parater este bocadinho de conversa e adona Fernanda já está à espera”, ex-plica Margarida, que já consideraFernanda a sua “avó adotiva” – “éuma relação que já se estende para ládo projeto”. Uma começa a frase, aoutra completa-a, e sorriem entreelas, lado a lado, nas escadas da casada dona Fernanda.

São gerações diferentes, com estilos,

hábitos, experiências e perspetivas de vida

díspares, mas entrelaçam-se num espírito

de ajuda mútua. Os estudantes ganham

casa, os idosos ganham companhia.

Eis o projeto “Lado a Lado”.

Por João Gaspar

“H

Casa por companhia

Ana Filipa Miranda

admite que preferia

a companhia de

Rosinha à residência

universitária

As idosas

“entendem, sabem

que há festas e

que eles são jovens.

Há compreensão”

Page 20: Edição 249

aRteS20 | a cabra | 10 de julho de 2012 | terça-feira

Cin

Em

a

uito do que se tem dito sobremim ao longo dos anos tem sidocompletamente mitológico, exa-gerado… ou completamente

mentira”. Depois de 50 anos de carreira e cerca de70 filmes, o peculiar Woody Allen aparece num re-trato único. “Wody Allen, Um Documentário” é oresultado de seis entrevistas ao cineasta sob a dire-

ção de Robert B. Weide. Inigualável, estupendo, idiota, adolescente, hipocon-dríaco, maluco, coração de manteiga. São algumas das caraterísticas maiscuriosas apontadas por algumas personalidades do mundo cinematográficoque convivem de perto com o génio. Até que ponto a imagem cómica de Woodycorresponde à sua personalidade complexa e invulgar? Ao mergulhar na in-trincada carreira do cineasta, Robert B. Weide tenta encontrar uma respostaa este paradoxo. Para os eternos seguidores deste génio, eis que chegou a opor-tunidade para distinguirem os mitos que se têm dito sobre Allen. Para os quenão nutrem muita simpatia por este dinossauro, esta é também uma boa hi-pótese para descodificarem a lenda. Com a promessa de ser um retrato fiel davida de Woody, este documentário apresenta, no entanto, algumas falhas aoevitar episódios mais polémicos, como a não referência à relação com Mia Far-row, antiga musa e companheira.

um génio desmistificado

“Mempos houve em que James Bond era umhomem com classe. Do excelso sibilar deSean Connery, ao charme intemporal deRoger Moore, passando pela fleuma de

Pierce Brosnan. Momentos que passam, bondgirlsque ficam, aos magotes aos pés do espião britânico,incapazes de resistir ao compêndio de raros atribu-tos e qualidades de Bond, James Bond.O ano de

2006 marca o fim de James como o conhecemos. Asluzes acendem-se e não mostram mais do que um corpo esculpido que balbu-cia com dificuldade meia dúzia de frases. Ao ponto de não estranharmos se umdia se der a substituição do etéreo shaken, not stirred por um hasta la vista,baby. Poder-se-á argumentar que Bond é Bond. Quiçá se trate de uma daque-las questiúnculas envolvendo meros gostos que são pessoais e, como tal, diz-se,indiscutíveis. Contudo, quem não apreciar a encarnação protagonizada porCraig pode tomar consolo no facto de não estar sozinho (danielcraigisnot-bond.com). Esste verão teremos nova aparição de James, desta feita envolvidona Operação Skyfall, onde terá de salvar não só o mundo, como o próprio MI6que se vê a braços com uma eminente ameaça. No campo da realização, umaestreia no mundo do 007, com Sam Mendes (Beleza Americana, Máquina Zero)a apontar para uma quase impossível tarefa: impedir Sir Ian Flemming de con-tinuar a dar voltas na tumba.

aqui jaz James bond?

T

outras sugestões

De

chRiStoPheR nolan

CoM

chRiStian bale, liaM neeSon, anne hathaWay

the daRK Knight RiSeS

De

beRtRand taveRnieR

CoM

Mélanie thieRRy, laMbeRt WilSon, gRégoiRe lePRince-Ringue

la PRinceSSe de MontPenSieR

De

JoachiM tRieR

CoM

andeRS danielSen lie, hanS olav bRenneR, ingRid olava

oSlo, 31. auguSt

ameron Crowe, realizador do aclamado Eliza-bethtown, serve-nos agora uma comédia dramá-tica familiar. O elenco destaca-se pela presençade estrelas de Hollywood - Matt Damon e Scar-

lett Johansson partilham o ecrã num filme para uma boatarde de domingo. Um homem tenta recuperar um antigo jar-dim zoológico, mas o sonho tem como obstáculo a doença damulher e árdua tarefa de educar os filhos. O filme mostra-nosoutra faceta de Matt Damon, que interpreta o papel de um

pai viúvo. Uma película que até se saiu bem nas críticas éum trabalho que cruza sonhos e emoções. O realizadorprende-se agora com duas hipóteses: ou se dá bem na pro-dução deste tipo de filmes tão apreciados pelo público norte-americano, ou subverte-se às tendências comerciais dasétima arte e perde-se, não só economicamente mas na suaessência. A obra não se espera grande, mas com um elencoque até pode dar frutos e um bom argumento, CameronCrowe tem a oportunidade para se destacar como um im-portante realizador. Ainda sobre o elenco, ficam os fãs deScarlett à espera do ressuscitar de um ídolo, que ultima-mente se tem mostrado apagado.

CPara uma tarde de sofá

João vAlADão

epois de uma passagem pelas salas de cinema api-mentada mais pelas acusações de plágio do que pelovalor artístico, “Os Jogos da Fome” chegam em DVD.Os aficionados da saga podem juntar o filme ao livro

de Suzanne Collins. Num futuro pós-apocalíptico o Estado to-talitário de Panem força os seus jovens a participar num jogo desobrevivência transmitido em horário nobre. Os “tributos” sãosorteados para representarem o seu distrito numa competiçãoem que a derrota significa a morte. A primeira reacção à estreia

de “Os Jogos da Fome” foi a de comparar com o filme de KinjiFukasaku “Battle Royale”. Num Japão onde os jovens, depoisde terem perdido todo o respeito pela tradição e costumes ni-pónicos, são enviados para uma ilha onde têm que lutar até àmorte. Deixo à consideração do leitor a procura pelas diferen-ças. Polémicas à parte, mesmo deixando de lado as gritantessemelhanças, “Os Jogos da Fome” aparece como um exercícioforçado de imaginação, com pouco rasgo e que em nada deve àprofundidade de outras distopias. De louvar, apenas a estéticaimpressa por Gary Ross na caracterização das cerimónias dosjogos, bastante inspirada nos rituais dos Estados totalitários,mas pautada com a inovação tecnológica do “futuro”.

oS JogoS da foMe

DMigalhas que não alimentam ninguém

João ribeiro

oPeRaÇÃo SKyfall

VER

Woody allen, uM docuMentÁRio

reAlizADor

gaRy RoSS

CoM

JennifeR laWRence

JoSh hutcheRSon

lAnçAMento

18 de agoSto

coMPRÁMoS uM Zoo!

reAlizADor

caMeRon cRoWe

CoM

Matt daMon

ScaRlett JohanSSon

2012

De

david cRonenbeRg

CoM

RobeRt PattinSon

Paul giaMatti

SaRah gadon

fábio roDriguez

De

RobeRt b. Weide

CoM

ScaRlet JohanSSon,oWen WilSon

MaRtin ScoRSeSe

AnA MorAis

Page 21: Edição 249

feitaS10 de julho de 2012 | terça-feira | a cabra | 21

a grande competição do disco, ter aousadia de editar Les études deChopin é actualmente arriscado,

mas nem as inúmeras interpretações assus-tam o pianista chinês Lang Lang. Depois de oouvirmos, em 2009, com a Polonaise No. 6 inA flat major, Op. 53 'Héroïque' ou ainda ÉtudeOp. 25 No. 1 in A flat major 'Aeolian Harp' nãorestam dúvidas de que poderíamos ter pre-visto este próximo trabalho. Onde as facilida-des técnicas continuarão a ser evidentesatravés da mão esquerda, sempre presente,com dramatismo e expressão. O pianista chi-nês deixou de usar o rótulo Deutsche Gram-mophon em 2010 e passou a assinar com aSony Music com Live in Vienna e é com essecarimbo que iremos conhecer Les études deFrederic Chopin. Esperemos que continue apartilha de sensibilidade e dinâmicas com amesma intensidade que nos abre progressiva-mente espaço às emoções.

OUViR

De

lang lang

eDitorA

Sony MuSic

lAnçAMento

outono 2012

NLER

“espaço às emoções” Sonho africano

JOGaR

leS étudeS

a verdade, o disco deste Verãochegará em Outubro. A bandaaustraliana, liderada por Kevin

Parker, levou-nos de volta ao fim dos anos60, e devolveu-nos um pouco de rock psi-cadélico, num mundo cada vez mais elec-trónico. Desde 2010, os Tame Impala têmpercorrido todo o mundo em tour, colabo-raram com os Flaming Lips e remistura-ram os Daft Punk. Do segundo disco,Lonerism, já se conhece uma faixa, e es-pera-se mais um single para meados deAgosto. Como no primeiro registo, oálbum foi escrito pelo vocalista no seuquarto em Perth e trabalhado depois peloresto da banda. Espera-se um disco quesoará a Verão, para não nos esquecermosdele durante o Inverno.

De

taMe iMPala

eDitorA

ModulaR RecoRdS

N lonerism [Modular]

loneRiSM

luís luzio

dura a escolha de um álbum paraeste Verão. Os meses mais ricosem edições são, sem dúvida, Julho

e Agosto. De entre rumores e confirmaçõesoficiais, há um disco de escuta obrigatória:“Son Of Ivonne” de MA DOOM. Estarão osamantes de Rap mais sedentos, na expecta-tiva da mais recente colaboração de MastaAce e MF DOOM. Uma das mais reputadasfiguras da cena nova-iorquina decidiu jun-tar as trouxas com o experimentalismo bri-tânico, que outrora abraçara projectos comnomes tão reputados como Madlib ou Dan-ger Mouse. Como aperitivo para este disco,estão disponíveis alguns ‘singles’ na web,mas quase que vão tendo um papel obso-leto, uma vez que, não é novidade a obriga-toriedade de escuta do início ao fim dodisco, para certificar a qualidade a que MFDOOM nos habituou.

De

Ma dooM

eDitorA

fat beat RecoRdS

É“escuta obrigatória”

Son of yvonne

CArlos brAz

expectativa em torno do disco de es-treia de Luís Vicente deriva, sobre-tudo, do trabalho que estetrompetista tem vindo a realizar nos

últimos anos. Liderando também um quarteto,Vicente não tem somente interesse no jazz,mantendo um projecto no âmbito da electró-nica exploratória (com Jari Marjamaki), parti-cipando nos Farra Fanfarra e colaborandoactivamente na cena improv de Lisboa. Acom-panhado pelo percussionista Oori Shalev, ale-mão de fortes raízes judaicas, e pelocontrabaixista Francesco Valente, Luís Vicenteproduziu o seu disco de estreia fazendo uso demúltiplas fontes, sempre com uma forte ênfaseno groove e no “folclore imaginário” que une ospovos da bacia mediterrânica.

De

luíS vicente tRio

eDitorA

Jaac RecoRdS

A “outeiro”

outeiRo

José Miguel PereirA

romance A conquista do Sertão promete enalte-cer a peculiar beleza das terras africanas. Con-tudo, o seu enredo parece assumir contornos

idênticos a todos os romances que tomam Angola comopalco.

Pedro Costa é um jovem abastado que se despede da ci-dade de Lisboa, com o fim de deixar a vida boémia que oiludiu, e toma como destino Angola. Aqui as facilidades ci-tadinas estão ausentes, mas é isso que permite enrijecer oespírito do jovem, que trilhará pelo agreste sertão africanoe testemunhará acontecimentos históricos à luz do encantoafricano. Torna-se num verdadeiro homem e define os seus

objetivos de vida. Apesar das adversidades, demonstra umaperseverança digna de qualquer figura romanesca. O sonho de deter uma fazenda de cultivo de algodão e café sóse realiza no final da vida de Pedro e, ironicamente, é depois da sua morte que esta prospera.

A obra poderá ter sido inspirada pela paixão que o autor desenvolveu por África, durante a sua estadia em Joa-nesburgo como cônsul. O enredo aparenta pouca originalidade, pelo que esperamos que a escrita de um autor quepassou pelos caminhos do jornalismo seja capaz de tornar a obra mais apelativa.

O

niCole ináCio

De

guilheRMe ayala MonteiRo

eDitorA

caSa daS letRaS

DAtA De lAnçAMento

10 de Julho

a conQuiSta do SeRtÃo

a fronteira de urbano

rbano Tavares Rodrigues não quer desvirtuar o seutrabalho. Nesta compilação de duas novelas, perma-nece dentro do âmbito literário e do espectro dos es-

paços e elementos a que nos habituou, pelo menos, desde oprincípio da chancela da D. Quixote.

“Solidões em Brasa” explora a esfera recorrente da tensão sexualperante a figura simbólica do amor. Sob as suas mais variadas con-figurações, o sexo surge como elemento central das relações, oracompletamente desconexo, que se mostra violento, frio e egoísta,ora perfeitamente alinhado, quando se mostra mais impetuoso e,sobretudo, fortuito. Elemento que constrói a viagem e a narração

de duas personagens, ao mesmo tempo prolonga-se nas interroga-ções éticas e existenciais da própria diegese. A outra novela, “Escu-

tando o rumor da vida”, arrisca transgredir o espaço de conforto de Urbano. Se os elementos e a temática central não extrapolamo comum do autor, a narrativa e o ambiente ultrapassam o convencionalismo neo-realista, para um imaginário, onde a per-cepção dos sentimentos se sobrepõe à mera apreensão do real e do palpável. E onde o rocambolesco impera sobre a lógica daacção. Não deixando, contudo, de suscitar a mesma problemática existencial. Não existe grande espaço para pausas, nem in-dagações prolongadas. Tudo é descomplicado e directo. Para que não sobrevivam grandes irresoluções.

U

João MirAnDA

De

uRbano tavaReS RodRigueS

eDitorA

d. QuiXote

2012

"eScutando o RuMoR da vida",Seguido de "SolidõeS eM bRaSa"

neat cryno dia 29 de Novembro que chega às prate-leiras europeias o tão aguardado Far Cry 3,mais uma vez sob a alçada da Ubisoft. Apóso sucesso relativo ao segundo capítulo da

saga (principalmente quando comparado com a ver-dadeira revolução que foi o primeiro Far Cry), muitasquestões se levantam em relação ao novo título.

Até agora, pouco de realmente novo se sabe: o set-ting regressa a uma ilha paradisíaca (após a incursãopela savana do segundo jogo), o motor gráfico apre-senta-se bastante promissor. E revelam-se alguns de-talhes interessantes no que à narrativa diz respeito.Dúvidas sobre a sanidade dos habitantes da ilha, viagens proporcionadas pela ingestão de cogumelos mágicos, npcsexcêntricos e misteriosos - muito foi mostrado nos diversos trailers divulgados, mas não existem ainda respostasconcretas para um título que, como os antecessores, se fará de exploração livre e descoberta.

Resta-nos esperar para saber se é desta vez que Far Cry se volta a afirmar como o FPS/Survival/Free Roam porexcelência. Sabendo de antemão que a concorrência vai ser muito forte.

É

PeDro leitão

PlAtAforMA

PS3, XboX, Pc

eDitorA

ubiSoft

lAnçAMento

29 de noveMbRo

faR cRy 3

“uma amálgama de compromissos”

esident Evil” é a série ideal para entender odilema das produções nipónicas. Referênciamáxima do seu género, por praticamente so-

zinho ter definido os seus códigos e coordenadas estilísticas,encontra-se em crise desde 2005. “Resident Evil 4” inaugurouum novo sub-género de terror mais orientado para a acção, e“Resident Evil 5” seguiu nesse novo caminho com ímpeto.Essa direcção acabou por fragmentar a sua identidade estéticae consequentemente o seu público, ao ponto de já não haversaída glória possível para a série. “Resident Evil 6” dá corpo fí-sico à esquizofrenia que reina dentro das mentes da Capcom.Foi dividido em 3 personagens, cada uma com registos lúdicos díspares: os segmentos de Leon respeitam a linhagem clássica dasérie, Chris entra num pastiche de shooter militar entre “Gears of War” e “Call of Duty” e um novo personagem, Jake, entra emcenários cinemáticos reminiscentes de “Uncharted”. Corroída a sua integridade, “Resident Evil” tornou-se uma amálgama de com-promissos entre aquilo que os seus autores pretendem explorar e o que o mercado exige. Já não é possível vender jogos de ten-são puramente psicológica; nem por acaso, o registo mais atacado nas previews do jogo é o de Leon.

“R

rui CrAveirinhA

PlAtAforMA

Pc

eDitorA

caPcoM

lAnçAMento

2 de outubRo

ReSident evil 6

lígiA AnJos

Page 22: Edição 249

soltAs22 | a cabra | 10 de julho de 2012 | terça-feira

Num excelente discurso, nacerimónia de 10 de Junho(dia de Portugal, de Ca-

mões e das Comunidades) deste anode 2012, o reitor da Universidade deLisboa, António Sampaio da Nóvoa,fez considerações sobre a falta de es-truturação do nosso país, já assina-lada pela geração de 60-70 do séculoXIX (ou ainda antes). Considerou, noentanto, que Portugal, nesta al-

tura de crise e de austeridade,

possuía, pela primeira vez, capi-

tal científico, cultural e profis-

sional formado pelas nossas

universidades, capaz de levar a

efeito essa estruturação, capital

esse que não era devidamente

aproveitado.Em parte estou de acordo com o

meu colega e amigo de Lisboa, cujatese de doutoramento, Le temps desProfesseurs, fui consultando ao longodos meus estudos. Todavia, não apoiocompletamente o seu juízo. Comefeito, considero que também a Uni-versidade ou o ensino superior (quepossui umadualidadeinstitucio-nal: univer-sidades einst i tutosp o l i t é c n i -cos), emconjuga-ç ã o

com as más políticas dos nossos vá-rios governantes, é responsável pelacrise do ensino, que faz parte, afinal,da crise mais ampla em que se encon-tra mergulhado o país. É responsávelpor duas ordens de razões: em pri-meiro lugar, porque as universidadese os institutos politécnicos criaramcursos de licenciatura (hoje diríamosde 1.º ciclo) muito especializados, al-guns de concepção ridícula e comple-tamente inúteis, que quando muito sejustificariam como cursos de pós-gra-duação ou como mestrados (agora 2.ºciclo) ou doutoramentos (3.º ciclo) —nisso dou razão a um interessante ar-tigo de Vasco Pulido Valente (Público,16 de Junho de 2012), com quemmuitas vezes não estou minimamentede acordo; e, em segundo lugar, por-que também alguns dos seus profes-sores — e não apenas a demagogiaregionalista, como acusava VPV —foram cúmplices e actores no pro-cesso de formação de muitas institui-ções de ensino superior públicas eparticulares e de cursos que nelas sur-

giram (20 cursos de Direito!,como exemplificava VPV).

Portanto, poderei concor-dar que há uma elite for-

mada nas universidades

e nas unidades de inves-

tigação dependentes da

Fundação para a Ciência

e a Tecnologia que não é

devidamente aproveitada

— parte dessa elite vai resistindocom sucessivas bolsas e empre-

gos científicos provisórios,até que vai procuraroutra vida em Portugalou no estrangeiro. To-davia, a grande maio-

ria dos diplomados constitui uma“massa acrítica” (não uma “massa crí-tica”, conceito que se generalizounesta nova nomenclatura) que andapor aí e que é vítima de uma miserá-vel situação de desemprego ou su-bemprego. “Eles que se lixem!”, comoexclamava VPV, dando este título aoartigo citado. Outros, porém, são

“gente de sucesso”, sobretudo

políticos profissionais, a maio-

ria das vezes medíocres, que

vêm buscar às universidade pri-

vadas (sendo estas coniventes), coma maior brevidade possível e semgrandes canseiras, o canudo de

“dr.” ou de “engenheiro”, só parase sentirem numa situação mais con-fortável e importante.

Fazendo concessões e dando “liber-dades”, numa lógica neoliberal (pala-vra que tem todo o sentido), emassificando o ensino superior, emvez de o procurar democratizar, o queimplica estruturação e exigência, oGoverno, as universidades e os insti-tutos politécnicos acabaram por con-tribuir para a crise, à qual se opõeagora (agravando a situação) um au-toritarismo de austeridade, de depen-dência e de burocracia, dificilmenteintegrável numa lógica de democra-cia, que supõe, com exigência de com-petência e rigor, a ciência, a cultura ea formação profissional. E assim se foitirando a professores e a estudantesaquilo que é (ou deveria ser) o maissignificativo na universidade — o es-pírito crítico.

Que ideia para a universidade? Per-gunte-se primeiro: Que universi-

dade? Ou que ensino superior?

Teremos de começar por aí. Depoisvoltaremos a falar.

umA ideiA PArA o eNsiNo suPeriorluís reis torgAl • ProFessor cAtedrático APoseNtAdo dA Fluc e coordeNAdor de iNvestigAção No ceis20

PrAto sociAl, Amor em temPos de Fome

Oh prato social, paladino dos porta-moedas esfomeados,alva circunferência delimitando universos de deleite gastro-económico. Ninguém te aprecia, prato social, atiram-te in-sultos: és mal confeccionado, mal cozinhado, falta carne, faltauma pitada de sal. Falta. Por isso esconde-te, como te tensescondido, que cada vez menos telha te alberga e menos por-celana se preenche.

Noutros tempos, foste farto. Rios de molho sucu-lento sulcavam planícies de arroz, desaguavam em nacos detenra carne, reflectindo a luz mortiça que descia do tecto dascantinas. Antes, quinta-feira não era só mais um dia. Traziasum etéreo feijão que escondia chispe e orelha, se envolvianuma calda espessa e insinuante, sussurrando confidênciasàs papilas gustativas, eram juras de amor eterno.

Separaram-nos, prato social. Hoje, somos como es-tranhos com um passado que nos esmaga. Nas mesmas can-tinas que foram leito de nossas núpcias, a luz continuamortiça, mas olhas-me envergonhado. Desconfiei durante a

sopa, durante a água morna que fazia lembrar sopa e agora, enquantome refaço do primeiro choque, estendes-me, da tua loiça branco-sujoe já riscada, meia dúzia de pedaços de salsicha Top Budget abraçadospor mais uns quantos fios de esparguete. Nada mais.

Nenhum de nós teve culpa. Foram outros que nos distancia-ram, os mesmos outros que romperam o abraço das nossas línguas,os mesmos outros que te despiram violentamente o traje de gala. Mastu não mudaste a tua essência. Ainda hoje, com o teu fato de treinocoçado, esperas pacientemente pela minha visita, e eu vou, porque ne-nhum de nós mudou, somente, tudo mudou à nossa volta. Somos aprova, prato social, que, por vezes, mesmo quando a culpa morre sol-teira, há amores condenados ao fracasso.

Por Fábio Rodrigues

tom

Ai e

co

mei

carlota rebelo

Arte.PoNto

ra mais uma noite normalpara Hugo (Francisco Ta-vares), um simples con-

trolador aéreo. Um tabuleiro dexadrez em compasso de espera,uma guitarra para tocar “sempensar” e um radar repetindo ovazio. Lá fora, ao largo dos Aço-res, uma noite silenciosa queaconselha a ficar em terra e a dei-xar o céu e o mar à vontade dotemperamento dos deuses.Porém, como sempre, nem tudocorre como planeado e é assimque nascem as histórias. As histó-rias que valem milhões.

James (Clive Russell), o pilotode uma princesa do ar, perdeu-sesob o céu estrelado, bem acima donegro Atlântico e agora não é maisdo que um ponto verde intermi-tente sem tempo para regressar ecom tempo mais do que suficientepara encontrar a paz interior.

E assim nasce uma amizade, noconstrangimento da incapacidadeperante o destino. Na impossibi-lidade de alterar as linhas escritas

do Fado. A partilha de duas horasde ondas de rádio, de confissões,de uma conversa entristecidapelas circunstâncias. Tudo istocom a certeza que na madrugadaseguinte já não estará lá.

“North Atlantic” leva-nos a pen-sar, a sentir e a perguntarmo-nos:como reagiríamos perante a quasecerteza da morte horas antes de aenfrentarmos? Ou como falar comalguém que não podemos salvar,mesmo que pareça tão irreal a cer-teza do fim?

Esta é a história, contada emmenos de quinze minutos, de doishomens nascidos no meio do marque dedicaram as suas vidas a ga-nhar asas e cruzaram as suas rotasna noite mais negra das suasvidas. Na noite em que um delesretorna às origens.

“North Atlantic” é a primeiracurta de Bernardo Nascimento etambém a sua primeira realiza-ção. Com um elenco bem com-posto entre atores reconhecidosinternacionalmente e atores na-

cionais em ascensão, esta produ-ção luso-britânica entra este mêsnos 50 finalistas da competição doYour Film Festival, o festival decurtas do Youtube. Uma curta-metragem que surge num mo-mento em que o cinemaportuguês está mais vivo do quenunca e arrecada prémios pelomundo. O vencedor tem presençagarantida no Festival de Veneza (adecorrer entre 29 de agosto e 8 desetembro) e um prémio de 400mil euros a ser entregue por o rea-lizador Ridley Scott e o ator Mi-chael Fassbender.

Na competição destaque aindapara “The Telegram Man”, do aus-traliano James Frances Khentie,“Cortometrage Teta y Sopa”, doespanhol Alberto Gómez e a série“El Provenir”, do mexicano Ma-nuel Alejandro Anell. As votaçõesdecorrem até 13 de julho no canaldo festival no Youtube, ondetodos os filmes a concurso podemser vistos na íntegra.

Por Rafaela Carvalho

ONDE O céU mERgUlhA NO OcEANO

“North AtlANtic” de BerNArdo NAscimeNto • YoutuBe • Até 13 de julho

d.r.

E

QUE UNIVERSIDADE?

d.r.

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soltAs10 de julho de 2012 | terça-feira | a cabra | 23

assim: se este jornalaguentar mais um ano,então nunca mais acaba!Dura para sempre! E eu

tenho dons premonitórios – lem-bram-se quando eu avisei que iamfechar mais cantinas? E que o djcoiso e tal vinha à queima? Eaquela do processo no conselhode veteranos ao gajo das praxesviolentas não dar em nada?

Isto pode parecer prosa ressa-biada mas não é nada disso. Al-guém vai ter de pagar pela decisãoque anúncio a seguir:

É com profundo pesar que mecabe informar-vos que o contratodo cronista Paulo Fernando nãoserá renovado para a próximatemporada. É mais uma vítima daprecarização laboral.

Foi ameaçado com a “prate-leira” (da Maria) em alternativaao pagamento à peça. Mas PauloFernando parte antes de se ver-gar, e assim reuniu os seus per-tences: cópia das 34 edições a quetinha direito, dois números do

jornal do exército, um busto do SáCarneiro e um pisa papéis emforma de busto do Sá Carneiro,um galhardete da freguesia deSanta Cruz, uma camisola ama-rela de malha polar, um CD daSharon Stone and The GipsyKings e uma tamparuere deaçorda de bacalhau que dizia“João Gaspar – Segunda-feira” -e partiu estrada fora, ao abrigo dalei Bosman, com o contrato namão (o qual pode ser negociadodirectamente com o meu agenteFIFA em 239410437).

Por isso, desejo aos responsá-veis por esta ignomínia decisãocoisas extremamente desagradá-veis - ao nível do regresso dos ve-lhos à secção em noite de fecho,as três ultimas horas de uma festada Cabra ou partilhar uma refei-ção nas cantinas com o Tanaka,muitos processos no fiscal e que amalta da RUC descubra a pas-

sword do wireless para vos voltara roubar a internet toda.

Além disso, deixo aqui tambémum aviso aos leitores que para oano correm o risco de chegar aesta página e ler uma coisa sempiada nenhuma - tipo metade doespaço que esta crónica ocupa po-deria estar preenchido por umconto do Fernando Alvim, vejambem a sorte que têm!

Provavelmente vão arranjar al-guém sem o mínimo de habilita-ções para escrever aqui, umbolseiro de investigação ou algopior, todo precário e tudo. Nãoquero parecer melodramáticomas acho que é um perigo real.Mas pronto, eles é que sabem.Esta malta nova tem a mania queé fera e que quer mudar as coisas– não aprenderam nada com oPaulo Bento.

Agora entra aquela parte que émeio testamento meio exaltaçãodo génio artístico:

>Sobre a minha passagem poreste espaço só tenho a agradeceraos leitores. Foi bastante agradá-vel chegar aos extintos grelhadose ver alguém de Cabra aberta a as-pergir caldo verde recém-ingeridosobre os demais convivas, e cons-tatar que a costeleta só com arroze salada era acompanhada poruns Panados Sociais. E aquelegrupo de sete professores que iamdissertar ao almoço de terça-feirapara as azuis, sobre o estrato mor-fossintáctico das minhas cróni-cas? Nem eu sei o que isso é masacho impecável.

São eles a raison d’être deste es-paço. E acreditem que tantoenche o ego ser citado numa As-sembleia Magna ou no Facebook,como ser vilipendiado num blo-gue.

Depois, deixar aqui o elogio aosdirectores que com uma sagaci-dade intelectual invejável com-preenderam que a existênciadeste cantinho de febra e pão ra-lado constituía uma mais-valiainegável para a qualidade jorna-lística do jornal universitário, aeles Rafaela Carvalho e CamiloSolnado desejo muitas felicidadespessoais e profissionais, e quequando forem estagiar no Jornalde Negócios se lembrem do quãoaprazíveis e coerentes eram asopiniões do bom velho douto-rando quando comparadas comas do Camilo Lourenço.

Este é o meu adeus à Lusa-Atena. O meu exílio forçado. Es-corraçado como um candidatoderrotado às eleições para a Di-recção Geral. Podem os velhos dorestelo da academia soltar osfogos, e podem correr abertas asbicas de cerveja da Padre AntónioVieira.

Por esta altura do ano os mu-rais do Facebook estão cheios dedeclarações lamechas de amoreterno à cidade do conhecimento,odes bacocas ao companheirismoetílico e recordações patéticas de

experiências partilhadas sobre ovaso sanitário, roubadas a bala-das e poesia praxista à la carte – aausteridade também chegou àcriatividade.

No meu mural, por sua vez, estáuma sondagem onde com apenasum clique podem salvar o douto-rando e reverter esta decisão, tãoinjusta e inaceitável como a reti-rada da feijoada das cantinas aoalmoço de quarta-feira, e aindaestarão a doar dois euros paraabrir um poço biológico em Áfricae adoptar um gatinho paraplégico– vocês sabem o que têm quefazer.

Os verdadeiros fãs destas cróni-cas não deixarão sem dúvida deenviar hate-mail para a redacção,à razão de duas cartas de amorpelo doutorando por cada três deameaças veladas à direcção desecção, uns pacotes bomba con-tendo comida das máquinas devending fora da validade, e pelomenos três telefonemas diários,fingindo ser um ministro-ad-junto, a intimidar e coagir um edi-tor.

Uma última referência aosmeus coleguinhas de redacção:segredos vossos levo comigo paraa vida, por isso vamos lá ver o queé que vão por aí dizer a meu res-peito – I will backtrace you andconsequences will never be thesame.

Shame on news. Agora vou es-crever um blogue.

*A minha verdadeira identidadeestá oculta num anagrama nestacrónica. Podem usar a sequênciaFibonacci para a descobrir.

É

moNumeNtAis PANAdos sociAisPor doutorando Paulo Fernando • facebook.com/paulofernandophd

requiem AeterNAm doNA eis.

mIcRO.cONtO

Ao contrário do habitual, a rubrica “micro.conto”não se realizou esta edição por motivos alheios àdireção do jornal. depois de confirmada a colabo-ração com o autor, esta não se realizou.Aos leitores o nosso pedido de desculpas.

Escorraçado como

um candidato

derrotado às

eleições para a

Direcção Geral.

Podem os velhos do

restelo da

academia soltar

os fogos, e podem

correr abertas as

bicas de cerveja

da Padre António

Vieira.

Sobre a minha

passagem por este

espaço só tenho a

agradecer aos

leitores. Foi bastante

agradável chegar aos

extintos grelhados e

ver alguém de Cabra

aberta a aspergir

caldo verde

recém-ingerido

sobre os demais

convivas, e constatar

que a costeleta só

com arroz e salada

era acompanhada

por uns Panados So-

ciais.

Page 24: Edição 249

acabra.netRedação:Secção de JornalismoAssociação Académica de CoimbraRua Padre António Vieira3000 CoimbraTelf: 239 41 04 37

e-mail: [email protected]

Conceção e Produção:Secção de Jornalismo da Associação Académica de Coimbra

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A voltA pArA cAsA por Stephanie Sayuri paixão 200x 100Já passou tanto tempo, que sauda-

des. Eu não queria voltar para umbom momento, para algo importanteque me aconteceu. Não queria viajarno tempo, só queria voltar para casa.Aqui está tudo ótimo, a primaveraficou para trás e o calor finalmentedeu o ar de sua graça. Mas o cansaçojá começa a dizer alguma coisa e asaudade não para de gritar dentro demim. Apanho o autocarro e começoo meu caminho, a cada minuto maisperto, a cada quilómetro que meaproximo a saudade diminui. É o alí-vio de estar a caminho. O caminhoconsola, acolhe, parece ser o primeiroabraço de tantos que tenho esperadodurante todo este tempo. Olho parao lado e no reflexo das lentes dosmeus companheiros de viagem vejoem mim as marcas do tempo. Elepassou e eu ainda cá estou. Comoserá que eles estão? Como será aminha chegada? Ainda falta um mês.

Há 20 anos era implementadaa famigerada lei que instituía asprimeiras propinas, constituindoa maior ameaça ao ensino supe-rior português desde o 25 de Abrile contrariando os pressupostos daRevolução. Porém, a resposta domovimento estudantil esteve à al-tura do problema. Pelo caminho,ministros caíram e subiram aopoder, nunca revogando as propi-nas de vez, mas os estudantes ja-mais se mostraram conformados.Contudo, é triste verificar queduas décadas volvidas a garra domovimento estudantil não seja amesma para lutar por um ensinopúblico, gratuito e de qualidade.I.B

MovimentoEstudantil

Projeto “Lado a Lado”

O projecto “Lado a Lado” assentaem bons valores, conjugando a di-ficuldade de alguns estudantes empagar residência e o isolamento naterceira idade. Tal iniciativa, criadapela DG/AAC em parceria com oCentro de Acolhimento João PauloII, é de louvar, conseguindo mos-trar que, com poucos recursos, sepode fazer a diferença. Apesar doprojecto intergeracional assentarem boas práticas, peca pela fracaadesão até hoje. Apenas 9 estudan-tes participaram em 3 anos de exis-tência. A divulgação foi fraca enaquilo que podia ser um projectoambicioso, tornou-se algo residual.Esperemos que a situação se in-verta. L.C.

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Jornal Universitário de Coimbra

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Universidade deCoimbra

Cortes, cortes, cortes. Já todos sa-bemos do aperto sintomático do fi-nanciamento, mas o facto de maisuma cantina fechar pode não ser tãoviável quanto se pensa. A proporçãode alunos da Universidade de Coim-bra aumentou nos últimos anos, mas,com esta reestruturação, perdem-serefeições. O que tem acontecido nasduas últimas semanas é exemplodisso, com as amarelas entupidas e ascantinas monumentais abertas,porém sem prato social. O bolo já nãoé grande, mas a decisão de fecharmais uma cantina pode vir a não ser aúnica. Quem sabe se uma terceira afechar não estará também em ques-tão. Só o tempo e a afamada reestru-turação o dirão… L.C.