Eduardo Viveiros de Castro - A Noção de Espécie Em Antropologia
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A noo de espcie em antropologia
traduo em ingls publicada em
http://hemisphericinstitute.org/hemi/en/e-misferica-101/viveiros-de-castro
Reportaje a Eduardo Viveiros de Castro
lvaro Fernndez Bravo
REPORTAJE A EDUARDO VIVEIROS DE CASTRO, 16 DE OCTUBRE
2012
1. Para comenzar, me gustara que hablara de la nocin de especie en la historia del pensamiento antropolgico y la filosofa occidental, y la contrapusiera con la mirada del perspectivismo multinaturalista amerindio amaznico desarrollada en su obra. En el primer caso, la nocin de especie ha tenido una relacin productiva con la categora de humano versus animal. El ser humano fue definido por la filosofa griega como ser racional, en oposicin a la supuesta irracionalidad animal y desde el evolucionismo, el animal ha operado no solo como un ancestro del ser humano, sino en el lmite interno y en el patrn de medida del grado de humanidad o de inhumanidad atribuido de manera arbitraria a tipologas antrpicas divididas y contrapuestas sobre la base de su presunta calidad racial (R. Esposito, Tercera persona 2009: 107-108). Es decir, ciertas razas fueron pensadas como ms prximas a lo animal o incluso inferiores a los animales domsticos, con lo que la especie ha intervenido en el interior del conjunto humanidad para dividirlo y establecer tipologas, dentro de las cuales algunos gneros quedan situados incluso por fuera de la misma especie humana. De qu modo opera el perspectivismo multinaturalista en relacin con la categora de especie? Mantiene algunas de sus funciones, las reformula o las reemplaza por otras completamente distintas? Debemos abandonar la especie como concepto, dada su historia ligada al reduccionismo y racialismo occidentales, que la emple para establecer estructuras de conocimiento rgidas y en ltima instancia incapaces de conocer culturas sin someterlas a una violencia epistemolgica?
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No tenho competncia para falar sobre a histria da noo de espcie na
filosofia ocidental. No caso da antropologia, a noo entra em jogo em dois contextos
conceituais diferentes.
Em primeiro lugar, e de modo mais importante pois envolve a definio
mesma do objeto da disciplina , a antropologia desde muito cedo se apega ao
postulado da unidade psquica da espcie, o que equivale a definir a espcie humana
por suas capacidades psquicas, entenda-se, no caso, essencialmente cognitivas. O
que, por sua vez, pressupe uma descontinuidade fundacional entre nossa espcie e
todas as demais, visto que a unidade psquica sugere que nossa espcie contra-
unifica todas as demais em uma s provncia sub-psquica ou a-psquica, isto ,
exaustivamente determinada por uma corporalidade extra-psquica. A ideia de espcie,
neste caso, funciona de modo algo paradoxal, visto que para a antropologia s h, a
rigor, uma espcie, a humana, que se reveste assim da natureza de um gnero ou
domnio, visto que as diferenas nticas ou empricas entre as inumerveis
espcies vivas so neutralizadas pela grande diferena ontolgica ou
transcendental entre esta espcie especial e as espcies comuns. A humanidade
funciona aqui como um anjo coletivo, no sentido em que os anjos, segundo alguns
pensadores medievais, eram indivduos que constituam, cada um separadamente, sua
prpria e exclusiva espcie. A analogia com os anjos no acidental, uma vez que a
humanidade foi frequentemente pensada como uma entidade entre o macaco e o
anjo. No preciso observar que o aspecto macaco o corpo, e o anjo a alma ou
a unidade psquica. A antropologia congenitamente dualista, e por isso a ideia de
espcie menos um modo de situar o homem na multiplicidade natural que de separ-
lo radicalmente como unicamente dual e dualmente nico.
Por outro lado, qualquer tentativa de introduzir descontinuidades
antropologicamente (isto , psiquicamente) relevantes no domnio animal, entendido
como o domnio residual do no-humano, ameaa a homogeneidade e portanto a
integridade da espcie humana como unidade. Como se houvesse um jogo de soma-
zero entre unidade interna e contra-unidade externa: toda diferenciao interna
significativa do domnio exterior do no-humano ameaa diferenciar internamente o
domnio do humano, exteriorizando parte deste domnio como quase-humano ou sub-
humano. Em outras palavras, tudo se passa como se o nico modo de exorcizar o
fantasma do racismo (ou especismo interno) fosse pelo endurecimento do especismo
externo (a tese do excepcionalismo humano). Mas Lvi-Strauss, em sua clebre
homenagem a Jean-Jacques Rousseau (1962), j advertia que a relao entre racismo e
especismo no de descontinuidade, e sim de continuidade. O especismo antecipa e
prepara o racismo:
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On a commenc par couper l'homme de la nature, et par le constituer en rgne souverain ; on a cru ainsi effacer son caractre le plus irrcusable, savoir qu'il est d'abord un tre vivant. Et, en restant aveugle cette proprit commune, on a donn champ libre tous les abus. Jamais mieux qu'au terme des quatre derniers sicles de son histoire, l'homme occidental ne put-il comprendre qu'en s'arrogeant le droit de sparer radicalement l'humanit de l'animalit, en accordant l'une tout ce qu'il retirait l'autre, il ouvrait un cycle maudit, et que la mme frontire, constamment recule, servirait carter des hommes d'autres hommes, et revendiquer, au profit de minorits toujours plus restreintes, le privilge d'un humanisme, corrompu aussitt n pour avoir emprunt l'amour-propre son principe et sa notion.
Em segundo lugar, o conceito de espcie foi mobilizado na antropologia
para dar conta de um fenmeno cuja histria intelectual indissocivel da
histria da disciplina ela prpria, a saber, o chamado totemismo ou, mais
geralmente, os inmeros dispositivos de diferenciao interna de uma
sociedade1 que lanam mo das diferenas sensveis entre as espcies vivas (ou
mais geralmente, os chamados natural kinds) para pensar a segmentao do
socius em categorias articuladas horizontal ou verticalmente. A interpretao
clssica, que remonta anropologia vitoriana, dos fenmenos totmicos os via
como manifestaes da crena em uma identidade originria entre os humanos
e os animais e demais formas de vida. Lvi-Strauss, mais uma vez, se no foi o
primeiro, foi o antroplogo que inverteu os termos do problema e chamou a
ateno para o fato de que a identidade entre dois gneros diferentes (o
humano e um no-humano genrico) era subordinada diferena entre dois
sistemas de diferenas, as diferenas entre as espcies naturais, por um lado,
e as diferenas entre as espcies sociais ou segmentos internos sociedade
humana, por outro lado. Notem que a explicao, embora enfatize as
diferenas internas ao domnio no-humano, continua a pensar a srie natural
dos totens como globalmente descontnua em relao srie cultural dos
segmentos sociais. O pai do estruturalismo, por fim, reservar noo de
espcie um papel absolutamente central em sua imagem do pensamento
selvagem: a noo de espcie aparece como o operador central de uma razo
essencialmente classificatria, disposta como ela est a meio caminho entre o
indivduo e a categoria; acrescente-se que a espcie, para Lvi-Strauss, o
1Dispositivos que frequentemente servem tambm para distingui-la de sociedades vizinhas, ou, ao contrrio, para assemelh-la a estas na qualidade de partes comuns de um mesmo conjunto mais amplo.
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equivalente emprico do signo pleno, a meio caminho da pura ostenso
concreta (o indivduo) e da categoria abstrata (o conceito). A espcie, enquanto
unidade de uma multiplicidade, aparece assim como a forma mesma do Objeto
para o pensamento selvagem. Neste sentido, o pensamento selvagem
aristotlico (e vice-versa), como argumentar, alis, Scott Atran, um antroplogo
de tendncia cognitivista.
Note-se ainda que o primeiro contexto de uso da noo de espcie
antropocntrico: a espcie humana no uma espcie como as outras, pois
exprime determinaes inexistentes nas demais espcies tomadas como um
todo. Ela exprime, na verdade, uma certa indeterminao essencial, uma
irredutibilidade s determinaes naturais que distinguem as espcies entre si. A
espcie humana, como vimos, dupla, uma espcie e ao mesmo tempo um
domnio, uma entidade emprica e um sujeito transcendental, que conhece a
sua prpria condio natural e nesta medida se liberta dela. O segundo
contexto de uso os sistemas totmicos permanece em certa medida
antropocntrico, na medida em que as espcies vivas so pensadas como
estando em relao binunvoca com sub-espcies humanas (os segmentos
totmicos). Cada espcie totmica corresponde a um tipo de humano, uma
humanidade parcial; como se o universo, representado em miniatura pela
multiplicidade finita das espcies totmicas, estivesse em relao projetiva
homolgica com a sociedade. A relao entre a sociedade como microcosmos
e o cosmos como macro-sociedade estabelece uma identidade formal entre
relaes internas e relaes externas.
A descoberta do perspectivismo multinatural como solo
pressuposicional das cosmologias amerndias e muitas vezes como doutrina
explicitamente elaborada no xamanismo e na mitologia nativas levou
posio conceitual de uma virtualidade no-antropocntrica da ideia de
espcie. O perspectivismo o nome que demos a uma elaborao
culturalmente caracterstica do chamado animismo, o nome clssico para a
atitude cosmolgica que consiste em recusar a descontinuidade psquica entre
os diferentes tipos de seres que povoam o cosmos, imaginando todas as
diferenas inter-especficas como um prolongamento horizontal, analgico ou
metonmico das diferenas intra-especficas (e no, como o caso do
totemismo, como sua repetio vertical, homolgica ou metafrica). A
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espcie humana deixa de ser um domnio separado e passa a definir o universo
de discurso: todas as diferentes espcies aparecem como modalidades ou
modulaes do humano. O que faz com que a condio humana deixe de ser
especial, passando, ao contrrio, a ser o modo no-marcado (default) ou a
condio genrica de qualquer espcie. Desaparece assim o domnio da
Natureza como provncia contra-unificada pela unidade eminente do domnio
humano. O animismo antropomrfico na exata medida em que anti-
antropocntrico. A forma humana , literalmente, a forma no interior da qual
todas as espcies emergem: cada espcie um modo finito de uma
humanidade como substncia universal. Isso inclui a espcie humana (tal como
n a entendemos), que passa efetivamente a ser apenas uma espcie entre as
demais: as diferenas entre as sub-espcies humanas (segmentos sociais de um
mesmo povo, ou povos diferentes) so de mesma natureza que as super-
espcies humanas, i.e. o que ns chamamos de espcies naturais.
O perspectivismo a pressuposio que cada espcie viva humana em
seu prprio departamento, humana para si, ou antes, que todo para-si humano
ou antropogentico. Esta ideia tem sua origem nas cosmogonias indgenas,
onde a forma primordial do ser humana: no princpio no havia nada,
dizem alguns mitos amaznicos, s havia pessoas. Os diferentes tipos de
sseres e fenmenos que povoam e correm no mundo so transformaes desta
humanidade primordial.
Tal condio originria persiste como uma espcie de radiao
antropomrfica de fundo, fazendo com que todas as espcies atuais se
apreeendam mais ou menos intensamente como humanas. Na medida em que
elas no so apreendidas pelas demais espcies como humanas, a distino
entre perspectiva reflexiva ou interna e perspectiva dita de terceira pessoa ou
externa crucial. A diferena entre as espcies deixa de ser apenas uma
distino externa, e passa a incorporar constitutivamente uma mudana de
ponto de vista. O que define uma espcie a diferena entre o ponto de vista
interno e o ponto de vista externo desta espcie sobre si mesma e das outras
sobre ela. Assim, por um lado, toda espcie passa a ser dupla, consistindo em
uma dimenso espiritual (a pessoa humana interior de cada espcie) e uma
dimenso corporal (a roupa ou equipamento corporal habilitante das
capacidades de cada espcie). Ao se universalizar, o dualismo invisvel/visvel,
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interno/externo, primeira pessoa/terceira pessoa, deixa de singularizar uma
espcie e passa a definir toda espcie enquanto tal. No h definio de uma
espcie que possa ser feita de um ponto de vista independente de uma
condio especfica. Toda espcie um ponto de vista sobre as outras.
Na medida em que toda espcie formalmente composta de uma
mesma oscilao perspectiva dentro/fora, alma/corpo, humano/no-humano
pois toda espcie apreendida desde o ponto de vista de outra espcie no
apreendida como humana, o que inclui a nossa prpria espcie quando
considerada, por exemplo, do ponto de vista dos jaguares ou dos pecaris (para
os quais somos, respectivamente, pecaris e jaguares, ou espritos canibais) , a
passagem entre as espcies muito mais fluida do que no caso de nossa vulgata
cosmolgica antropocntrica e excepcionalista. As espcies so fixas para as
cosmologias amaznicas, no sentido de que as transformaes globais
pertinentes se fizeram em geral de uma s vez no mundo pr-cosmolgico do
mito (os mitos so, em essncia, narrativas do processo de especiao) no
h transformismo continusta como em nossa biologia evolutiva moderna.2 Mas
ao mesmo tempo os indivduos de cada espcie podem saltar de uma espcie
a outra com relativa facilidade, um processo que esquematizado
principalmente pela imagstica da predao alimentar: a incorporao por outra
espcie frequentemente concebido como a transformao integral da presa
em um membro da espcie do predador. O que parece dar razo frase de
Samuel Butler, quando este dizia que there is no such persecutor of grain, as
another grain when it has once fairly identified itself with a hen (Life and Habit,
p. 137). Outra forma de transformao inter-espcies o xamanismo, que a
capacidade manifesta por certos individuos (de diferentes espcies) de oscilar
entre o ponto de vista de duas (ou mais) espcies, sendo capaz de ver os
membros de ambas como estes se vem, i.e., como humanos, e assim de
comunicar os pontos de vista e tornar inteligvel o que s para eles (os xams)
tambm sensvel, a saber, o fato de que cada espcie aparece para outra de
modo radicalmente diferente daquele que aparece para si mesma.
2Ainda que, bom ressaltar, algumas mitologias indgenas falem em um processo de transformao sucessiva de certas espcies animais em outras espcies, todas elas porm concebidas como formas a priori que se substituem umas s outras mais que evoluem umas a partir das outras.
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A diferena essencial deste perspectivismo para com o nosso
multiculturalismo que a variao de ponto de vista no afeta apenas o
modo de ver um mundo que seria objetivamente exterior ao ponto de vista e
maior que qualquer ponto de vista possvel, um mundo ontolgica ou
epistemologicamente infinito. Em primeiro lugar, o mundo perspectivista um
mundo composto exaustivamente por pontos de vista: todos os seres e coisas do
mundo so sujeitos em potencial, os seres que vemos portanto so sempre
seres que vem, aquilo que experimentamos sempre um sujeito de uma
experincia posvel: todo objeto um tipo de sujeito. Em segundo lugar, a
diferena entre as espcies no do tipo de uma diferena de opinio ou de
cultura, mas uma diferena de natureza: uma diferena no modo como
cada espcie experimentada pelas outras, ou seja, como corpo, como
conjunto de afetos sensveis, de capacidades de modificar e ser modificado por
agentes de outra espcie. O mundo visto por outra espcie no o mesmo
mundo visto diferentemente, mas um outro mundo visto da mesma maneira.
Cada espcie, ao se ver como humana, v as demais, isto , o mundo, como
ns, aqueles que nos apreendemos como humanos, o vemos. Toda espcie v o
mundo do mesmo jeito. S h um ponto de vista, o ponto de vista da
humanidade. O que muda o ponto de vista deste ponto de vista: que
espcie est vendo o mundo, ao se ver a si mesma como humana? Se a
espcie dos jaguares, estes vero os humanos (para ns) como se fossem
pecaris, porque seres humanos comem pecaris (e no outros humanos). Todos
os humanos compartilham da mesma cultura, a cultura humana. O que muda
a natureza do que vem, conforme o corpo que esses humanos de referncia
possuem. O ponto de vista est no corpo. O perspectivismo no assim uma
teoria da representao (da natureza pelo espirito), mas uma pragmtica dos
afetos corporais. a potncia especfica de cada corpo que determina o
correlativo objetivo das categorias culturais universais aplicadas por todas as
espcies em seu momento humano.
A espcie viva, a diferena entre as espcies, assim, um conceito
fundamental nos mundos perspectivistas. Mas a espcie ali no tanto um
princpio de distino quanto um princpio de relao. A diferena entre as
espcie no , para comear, principalmente anatmica ou morfolgica, como
para ns, herdeiros de Linnaeus, mas comportamental ou etolgica (o que
distingue as espcie muito mais seu etograma o que comem, onde
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habitam, se vivem em grupo ou no etc. do que sua anatomia ou sua
fisiologia). Nesta medida, as diferenas entre espcies no se deixam projetar
sobre um plano ontolgico homogneo, exceto se definirmos a corporalidade
como constituindo tal plano: mas esta corporalidade um conjunto
heterogneo e relacional de afetos, antes que uma substncia dotada de
atributos. Diferenas entre hbitos alimentares de jaguares, pecaris e humanos,
diferenas entre hbitos alimentares de grupos humanos, diferenas na etologia
(o que inclui a aparncia fsica, os hbitos no sentido de roupas ou
vestimentas) de animais diferentes e povos diversos todas estas diferenas
so igualmente tomadas como diferenas que exprimem afetos corporais
diversos. No mais difcil, de jure, que um Arawet se transforme em um
Kayap do que em um jaguar. Os processos de transformao envolvero
apenas afetos qualitativamente distintos. Em segundo lugar, as diferenas inter-
especficas so blocos de virtualidades relacionais, modos de posicionamento
relativo das espcies entre si. A diferena entre as espcies no um princpio
de segregao mas de alternao: pois o que define a diferena especifica que
duas espcies (ao contrrio de dois indivduos quaisquer) que ambas no
podem ser humanas ao mesmo tempo, isto , ambas no podem se perceber
como humanas uma para a outra, ou deixariam de ser duas espcies diferentes.
Se projetarmos o perspectivismo sobre ele mesmo, e sobre nosso
multiculturalismo, seremos obrigados a concluir que no possvel ser ao
mesmo tempo perspectivista e multiculturalista. Nem desejvel. Deveremos
concluir que estas duas antropologias so inter-tradutveis (comensurveis), mas
so incompatveis (no h sntese dialtica possvel). Falei em antropologias,
porque entendo que toda cosmologia uma antropologia, no no sentido trivial
de que os seres humanos s conseguem pensar segundo categorias humanas
os ndios estariam de acordo com isto, mas no concordariam que s nossa
espcie seja humana , mas de que mesmo nosso antropocentrismo
inevitavelmente um antropomorfismo, e que toda tentativa de ir alm da
correlao entre humanidade e mundo apenas um antropocentrismo
negativo, ainda e sempre referido ao anthropos. Mas o antropomorfismo que
ousa dizer o seu nome (por assim dizer), longe se ser um especismo, como o
o antropocentrismo ocidental, seja este cristo, kantiano, ou neo-construtivista,
exprime a deciso originria de pensar o humano como dentro do mundo,
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no acima dele (mesmo que apenas por um lado de seu ser dual). Em um
mundo onde toda coisa humano, a humanidade toda uma outra coisa.