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SOCIOLOGIA - 1º ANO - Apostila 3 - Prof. Renato Fialho - Página 1 1. Cultura, diversidade cultural e desigualdade social EDUCAÇÃO? EDUCAÇÕES: APRENDER COM O ÍNDIO Pergunto coisas ao buriti; e o que ele responde é: a coragem minha. Buriti quer todo o azul, e não se aparta de sua água - carece de espelho. Mestre não é quem sempre ensina, mas quem de repente aprende. João Guimarães Rosa/Grande Sertão: Veredas Ninguém escapa da educação. Em casa, na rua, na igreja ou na escola, de um modo ou de muitos todos nós envolvemos pedaços da vida com ela: para aprender, para ensinar, para aprender-e- ensinar. Para saber, para fazer, para ser ou para conviver, todos os dias misturamos a vida com a educação. Com uma ou com várias: educação? Educações. E já que pelo menos por isso sempre achamos que temos alguma coisa a dizer sobre a educação que nos invade a vida, por que não começar a pensar sobre ela com o que uns índios uma vez escreveram? Há muitos anos nos Estados Unidos, Virgínia e Maryland assinaram um tratado de paz com os Índios das Seis Nações. Ora, como as promessas e os símbolos da educação sempre foram muito adequados a momentos solenes como aquele, logo depois os seus governantes mandaram cartas aos índios para que enviassem alguns de seus jovens às escolas dos brancos. Os chefes responderam agradecendo e recusando. A carta acabou conhecida porque alguns anos mais tarde Benjamin Franklin adotou o costume de divulgá-la aqui e ali. Eis o trecho que nos interessa: “... Nós estamos convencidos, portanto, que os senhores desejam o bem para nós e agradecemos de todo o coração. Mas aqueles que são sábios reconhecem que diferentes nações têm concepções diferentes das coisas e, sendo assim, os senhores não ficarão ofendidos ao saber que a vossa idéia de educação não é a mesma que a nossa. ...Muitos dos nossos bravos guerreiros foram formados nas escolas do Norte e aprenderam toda a vossa ciência. Mas, quando eles voltavam para nós, eles eram maus corredores, ignorantes da vida da floresta e incapazes de suportarem o frio e a fome. Não sabiam como caçar o veado, matar o inimigo e construir uma cabana, e falavam a nossa língua muito mal. Eles eram, portanto, totalmente inúteis. Não serviam como guerreiros, como caçadores ou como conselheiros. Ficamos extremamente agradecidos pela vossa oferta e, embora não possamos aceitá-la, para mostrar a nossa gratidão oferecemos aos nobres senhores de Virgínia que nos enviem alguns dos seus jovens, que Ihes ensinaremos tudo o que sabemos e faremos, deles, homens.” De tudo o que se discute hoje sobre a educação, algumas das questões entre as mais importantes estão escritas nesta carta de índios. Não há uma forma única nem um único modelo de educação; a escola não é o único lugar onde ela acontece e talvez nem seja o melhor; o ensino escolar não é a sua única prática e o professor profissional não é o seu único praticante. Em mundos diversos a educação existe diferente: em pequenas sociedades tribais de povos caçadores, agricultores ou pastores nômades; em sociedades camponesas, em países desenvolvidos e industrializados; em mundos sociais sem classes, de classes, com este ou aquele tipo de conflito entre as suas classes; em tipos de sociedades e culturas sem Estado, com um Estado em formação ou com ele consolidado entre e sobre as pessoas. Existe a educação de cada categoria de sujeitos de um povo; ela existe em cada povo, ou entre povos que se encontram. Existe entre povos que submetem e dominam outros povos, usando a educação como um recurso a mais de sua dominância. Da família à comunidade, a educação existe difusa em todos os mundos sociais, entre as incontáveis práticas dos mistérios do aprender; primeiro, sem classes de alunos, sem livros e sem professores especialistas; mais adiante com escolas, salas, professores e métodos pedagógicos.

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SOCIOLOGIA - 1º ANO - Apostila 3 - Prof. Renato Fialho - Página 1

1. Cultura, diversidade cultural e desigualdade social

EDUCAÇÃO? EDUCAÇÕES: APRENDER COM O ÍNDIO

Pergunto coisas ao buriti; e o que ele responde é:

a coragem minha. Buriti quer todo o azul, e não se

aparta de sua água - carece de espelho. Mestre não é

quem sempre ensina, mas quem de repente aprende.

João Guimarães Rosa/Grande Sertão: Veredas

Ninguém escapa da educação. Em casa, na rua, na igreja ou na escola, de um modo ou de muitos todos nós envolvemos pedaços da vida com ela: para aprender, para ensinar, para aprender-e-ensinar. Para saber, para fazer, para ser ou para conviver, todos os dias misturamos a vida com a educação. Com uma ou com várias: educação? Educações. E já que pelo menos por isso sempre achamos que temos alguma coisa a dizer sobre a educação que nos invade a vida, por que não começar a pensar sobre ela com o que uns índios uma vez escreveram? Há muitos anos nos Estados Unidos, Virgínia e Maryland assinaram um tratado de paz com os Índios das Seis Nações. Ora, como as promessas e os símbolos da educação sempre foram muito adequados a momentos solenes como aquele, logo depois os seus governantes mandaram cartas aos índios para que enviassem alguns de seus jovens às escolas dos brancos. Os chefes responderam agradecendo e recusando. A carta acabou conhecida porque alguns anos mais tarde Benjamin Franklin adotou o costume de divulgá-la aqui e ali. Eis o trecho que nos interessa: “... Nós estamos convencidos, portanto, que os senhores desejam o bem para nós e agradecemos de todo o coração. Mas aqueles que são sábios reconhecem que diferentes nações têm concepções diferentes das coisas e, sendo assim, os senhores não ficarão ofendidos ao saber que a vossa idéia de educação não é a mesma que a nossa. ...Muitos dos nossos bravos guerreiros foram formados nas escolas do Norte e aprenderam toda a vossa ciência. Mas, quando eles voltavam para nós, eles eram maus corredores, ignorantes da vida da floresta e incapazes de suportarem o frio e a fome. Não sabiam como caçar o veado, matar o inimigo e

construir uma cabana, e falavam a nossa língua muito mal. Eles eram, portanto, totalmente inúteis. Não serviam como guerreiros, como caçadores ou como conselheiros. Ficamos extremamente agradecidos pela vossa oferta e, embora não possamos aceitá-la, para mostrar a nossa gratidão oferecemos aos nobres senhores de Virgínia que nos enviem alguns dos seus jovens, que Ihes ensinaremos tudo o que sabemos e faremos, deles, homens.” De tudo o que se discute hoje sobre a educação, algumas das questões entre as mais importantes estão escritas nesta carta de índios. Não há uma forma única nem um único modelo de educação; a escola não é o único lugar onde ela acontece e talvez nem seja o melhor; o ensino escolar não é a sua única prática e o professor profissional não é o seu único praticante. Em mundos diversos a educação existe diferente: em pequenas sociedades tribais de povos caçadores, agricultores ou pastores nômades; em sociedades camponesas, em países desenvolvidos e industrializados; em mundos sociais sem classes, de classes, com este ou aquele tipo de conflito entre as suas classes; em tipos de sociedades e culturas sem Estado, com um Estado em formação ou com ele consolidado entre e sobre as pessoas. Existe a educação de cada categoria de sujeitos de um povo; ela existe em cada povo, ou entre povos que se encontram. Existe entre povos que submetem e dominam outros povos, usando a educação como um recurso a mais de sua dominância. Da família à comunidade, a educação existe difusa em todos os mundos sociais, entre as incontáveis práticas dos mistérios do aprender; primeiro, sem classes de alunos, sem livros e sem professores especialistas; mais adiante com escolas, salas, professores e métodos pedagógicos.

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SOCIOLOGIA - 1º ANO - Neja 1 - Prof. Renato Fialho - Página 2

A educação pode existir livre e, entre todos, pode ser uma das maneiras que as pessoas criam para tornar comum, como saber, como idéia, como crença, aquilo que é comunitário como bem, como trabalho ou como vida. Ela pode existir imposta por um sistema centralizado de poder, que usa o saber e o controle sobre o saber como armas que reforçam a desigualdade entre os homens, na divisão dos bens, do trabalho, dos direitos e dos símbolos. A educação é, como outras, uma fração do modo de vida dos grupos sociais que a criam e recriam, entre tantas outras invenções de sua cultura, em sua sociedade. Formas de educação que produzem e praticam, para que elas reproduzam, entre todos os que ensinam-e-aprendem, o saber que atravessa as palavras da tribo, os códigos sociais de conduta, as regras do trabalho, os segredos da arte ou da religião, do artesanato ou da tecnologia que qualquer povo precisa para reinventar, todos os dias, a vida’ do grupo e a de cada um de seus sujeitos, através de trocas sem fim com a natureza e entre os homens, trocas que existem dentro do mundo social onde a própria educação habita, e desde onde ajuda a explicar - às vezes a ocultar, às vezes a inculcar - de geração em geração, a necessidade da existência de sua ordem. Por isso mesmo - e os índios sabiam - a educação do colonizador, que contém o saber de seu modo de vida e ajuda a confirmar a aparente legalidade de seus atos de domínio, na verdade não serve para ser a educação do colonizado. Não serve e existe contra uma educação que ele, não obstante dominado, também possui como um dos seus recursos, em seu mundo, dentro de sua cultura. Assim, quando são necessários guerreiros ou burocratas, a educação é um dos meios de que os homens lançam mão para criar guerreiros ou burocratas. Ela ajuda a pensar tipos de homens. Mais do que isso, ela ajuda a criá-los, através de passar de uns para os outros o saber que os constitui e legitima. Mais ainda, a educação participa do processo de produção de crenças e idéias, de qualificações e especialidades que envolvem as trocas de símbolos, bens e poderes que, em conjunto, constroem tipos de sociedades. E esta é a sua força. No entanto, pensando às vezes que age por si próprio, livre e em nome de todos, o educador

imagina que serve ao saber e a quem ensina mas, na verdade, ele pode estar servindo a quem o constituiu professor, a fim de usá-lo, e ao seu trabalho, para os usos escusos que ocultam também na educação - nas suas agências, suas práticas e nas idéias que ela professa- interesses políticos impostos sobre ela e, através de seu exercício, à sociedade que habita. E esta é a sua fraqueza. Aqui e ali será preciso voltar a estas idéias, e elas podem ser como que um roteiro daqui para a frente. A educação existe no imaginário das pessoas e na ideologia dos grupos sociais e, ali, sempre se espera, de dentro, ou sempre se diz para fora, que a sua missão é transformar sujeitos e mundos em alguma coisa melhor, de acordo com as imagens que se tem de uns e outros: “... e deles faremos homens”. Mas, na prática, a mesma educação que ensina pode deseducar, e pode correr o risco de fazer o contrário do que pensa que faz, ou do que inventa que pode fazer: “... eles eram, portanto, totalmente inúteis”. (Texto extraído do livro “O que é Educação”, de C.R. Brandão)

TEMA: CULTURA

Origem da palavra cultura:

A palavra cultura origina-se do latim medieval e significa cultivar o solo, cuidar da terra. Ao longo do tempo, esse termo passou a ser aplicado em diferentes contextos da vida humana e, consequentemente, a ser objeto de várias áreas do conhecimento.

Conceitos de cultura:

"Cultura não é simplesmente a arte ou o evento, [mas] criação individual e coletiva das obras de arte, do pensamento, dos valores, dos comportamentos e do imaginário". (CHAUÍ, 1992, p. 41)

"Conjunto de traços característicos do modo de vida de uma sociedade, de uma comunidade ou de um grupo, aí compreendidos os aspectos que se podem considerar como os mais cotidianos, os mais triviais ou os mais inconfessáveis". (FORQUIN, 1993, p. 11)

Em função de sua complexidade e importância, o conceito de cultura tem sido abordado por um considerável número de autores. Entretanto, apesar de ser discutida sob enfoques variados, cultura pode ser entendida como: um conjunto de experiências humanas construídas pelo contato social e acumuladas pelos povos, ao longo do tempo. Assim, ela corresponde, na prática, à expressiva variedade de processos e modos de convivência pelos quais os povos constroem suas identidades. (NEJA 1, p. 301)

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SOCIOLOGIA - 1º ANO - Neja 1 - Prof. Renato Fialho - Página 3

Cultura, indivíduo e sociedade O que acontece quando a sociedade humana é insuficiente ou simplesmente não existe?

O “menino selvagem” de Aveyron: uma história verídica Em 1797, um menino quase inteiramente nu foi visto pela primeira vez perambulando pela floresta de Lacaune, na França. Em 9 de janeiro de 1800, foi registrado seu aparecimento num moinho em Saint-Sernein, distrito de Aveyron. Tinha a cabeça, os braços e os pés nus; farrapos de uma velha camisa (sinal de algum contato com seres humanos) cobriam o resto do corpo. Sempre que alguém se aproximava, ele fugia como um animal assustado. Era um menino de cerca de 12 anos, tinha a pele branca e fina, rosto redondo, olhos negros e fundos, cabelos castanhos e nariz comprido e aquilino. Sua fisionomia foi descrita como graciosa; sorria involuntariamente e seu corpo estava coberto de cicatrizes. Provavelmente abandonado na floresta aos 4 ou 5 anos, foi objeto de curiosidade e provocou discussões acaloradas principalmente na França. Após sua captura, verificou-se que Victor (assim passou a ser chamado) não pronunciava nenhuma palavra e parecia não entender nada do que lhe falavam. Apesar do rigoroso inverno europeu, rejeitava roupas e também o uso de cama, dormia no chão sem colchão. Locomovia-se apoiado nas mãos e nos pés, correndo como os animais quadrúpedes.

Um olhar sociológico Victor de Aveyron tornou-se um dos casos mais conhecidos de seres humanos criados livres em ambiente selvagem. Médicos franceses, como Jean Étienne Esquirol (1772-1840) e Philippe Pinel (1745-1826),

afirmavam que o menino selvagem sofria de idiotia, uma deficiência mental grave. Segundo eles, teria sido essa a razão pela qual os pais o haviam abandonado. O psiquiatra Jean-Marie Gaspard Itard, diretor de um instituto de surdos-mudos, não compartilhava da opinião dos colegas. Quais as conseqüências,

perguntava ele, da privação do convívio social e da ausência absoluta de educação para a inteligência de um adolescente que viveu assim, separado de indivíduos de sua espécie? Itard acreditava que a situação de abandono e afastamento da civilização explicava o comportamento diferente do menino. Discordava, assim, do diagnóstico de deficiência mental para o caso.

No livro A educação de um homem selvagem, publicado em 1801, Itard apresenta seu trabalho com o menino selvagem de Aveyron, descrevendo as etapas de sua educação: ele já é capaz de sentar-se convenientemente à mesa, tirar a água necessária para beber, levar ao seu terapeuta as coisas de que necessita; diverte-se ao empurrar um pequeno carrinho e começa também a ler. Cinco anos mais tarde, Victor já fabricava pequenos objetos e podava as plantas da casa. Com base nesses resultados, Itard reforçou sua tese de que os hábitos selvagens iniciais do menino e sua aparente deficiência mental eram apenas e tão-somente resultado de uma vida afastada de seus semelhantes e da civilização. A partir de sua experiência com o menino, Itard formulou a hipótese de que a maior parte das deficiências intelectuais e sociais não é inata, mas tem sua origem na falta de socialização do indivíduo considerado deficiente, na falta de comunicação com seus semelhantes, especialmente de comunicação verbal. Aproximando-se de uma visão sociológica, o pesquisador concluiu que o

isolamento social prejudica a sociabilidade do indivíduo. Ora, a sociabilidade é o que torna possível a vida em sociedade. O caso do menino selvagem de Aveyron mostra que o ser humano é um animal social por excelência, como afirmava o filósofo grego Aristóteles (384-322 a.C.). Sua vida só adquire sentido na relação com outros seres humanos. (veja o texto a seguir)

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Uma situação extrema: vivendo com lobos Você certamente já ouviu falar de Mogli, o menino-lobo. Trata-se de uma criação literária do escritor anglo-indiano Rudyard Kipling (1865-1936). Na história de Kipling, Mogli é um menino inteligente e sociável que se dá muito bem com os animais e também com os seres humanos. Mogli é um personagem fictício criado pela imaginação do autor. Mas o que aconteceria realmente a um ser humano, caso fosse criado entre lobos? A história a seguir pertence à vida real e mostra como o personagem Mogli está longe de refletir a realidade.

Duas meninas, Amala e Kamala, foram descobertas em 1921, numa caverna da Índia, vivendo entre lobos. Essas crianças, que na época tinham quatro e oito anos de idade, foram confiadas a um asilo e passaram a ser observadas por estudiosos. Amala, a mais jovem, não resistiu à nova vida e logo morreu. A outra porém, viveu cerca de oito anos. Ambas apresentavam hábitos alimentares bem diferentes dos nossos. Como fazem normalmente os animais, elas cheiravam a comida antes de

tocá-la, dilaceravam alimentos com os dentes e

faziam pouco uso das mãos para beber e comer. Possuíam aguda sensibilidade auditiva e o olfato desenvolvido. Locomoviam-se de forma curvada, com as mãos apoiadas no chão, como o fazem os quadrúpedes. Kamala levou seis anos para andar de forma ereta. Notou-se também que a menina não ficava à vontade na companhia de pessoas, preferindo o convívio com os animais, que não se

assustavam com sua presença e pareciam até entendê-la.

(Adaptado de: A. Xavier Telles.

Estudos Sociais. São Paulo, Nacional, 1969. p. 115-6.)

Conclusão

Assim como no caso do menino de Aveyron, a experiência das duas crianças criadas entre lobos na Índia mostra que os indivíduos só adquirem características realmente humanas quando convivem em sociedade com outros seres humanos, estabelecendo com eles relações sociais. Outro personagem célebre surgido da imaginação do escritor norte-americano Edgar Rice Burroughs (1875-1950), é Tarzan. Criado por macacos na África, Tarzan aprendeu a ler sozinho, com a ajuda apenas de um livro encontrado em uma cabana. Além disso, demonstrava sentimentos humanos e defendia valores semelhantes aos da sociedade em que viveu o escritor. Como obra de ficção, Tarzan sempre atraiu o interesse de jovens leitores, mas está tão distante da vida real quanto Mogli, o menino- lobo. Na verdade, crianças que crescem entre animais são incapazes de desenvolver atitudes e sentimentos humanos antes de qualquer contato com outros indivíduos de sua espécie que já vivam em sociedade. Para o pensador Lucien Malson, a conclusão é clara: “Será preciso admitir que os homens não são homens fora do ambiente social, visto que aquilo que consideramos ser próprio deles, como o riso ou o sorriso, jamais ilumina o rosto das crianças isoladas”. A história das crianças selvagens, que sobreviveram quase milagrosamente entre os animais e penaram para alcançar algumas das características básicas de uma existência “civilizada”, deixa uma lição que não pode ser ignorada: sem o denso tecido das relações sociais, do qual participa toda criança, simplesmente não há humanidade. (Texto extraído do livro 'Introdução à sociologia', de Pérsio Santos de Oliveira. Editora Ática).

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SOCIOLOGIA - 1º ANO - Neja 1 - Prof. Renato Fialho - Página 5

O IMPÉRIO DO CONSUMO por Eduardo Galeano

A explosão do consumo no mundo atual faz mais barulho do que todas as guerras e mais algazarra do que todos os carnavais. Como diz um velho provérbio turco, aquele que bebe a conta, fica bêbado em dobro. A gandaia aturde e anuvia o olhar; esta grande bebedeira universal parece não ter limites no tempo nem no espaço.

Mas a cultura de consumo faz muito barulho, assim como o tambor, porque está vazia; e na hora da verdade, quando o estrondo cessa e acaba a festa, o bêbado acorda, sozinho, acompanhado pela sua sombra e pelos pratos quebrados que deve pagar. A expansão da demanda se choca com as fronteiras impostas pelo mesmo sistema que a gera. O sistema precisa de mercados cada vez mais abertos e mais amplos tanto quanto os pulmões precisam de ar e, ao mesmo tempo, requer que estejam no chão, como estão, os preços das matérias primas e da força de trabalho humana. O sistema fala em nome de todos, dirige a todos suas imperiosas ordens de consumo, entre todos espalha a febre compradora; mas não tem jeito: para quase todo o mundo esta aventura começa e termina na telinha da TV. A maioria, que contrai dívidas para ter coisas, termina tendo apenas dívidas para pagar suas dívidas que geram novas dívidas, e acaba consumindo fantasias que, às vezes, materializa cometendo delitos. O direito ao desperdício, privilégio de poucos, afirma ser a liberdade de todos.

Dize-me quanto consomes e te direi quanto vales. Esta civilização não deixa as flores dormirem, nem as galinhas, nem as pessoas. Nas estufas, as flores estão expostas à luz contínua, para fazer com que cresçam mais rapidamente. Nas fábricas de ovos, a noite também está proibida para as galinhas. E as pessoas estão condenadas à insônia, pela ansiedade de comprar e pela angústia de pagar. Este modo de vida não é muito bom para as pessoas, mas é muito bom para a indústria farmacêutica. Os EUA consomem metade dos calmantes, ansiolíticos e demais drogas químicas que são vendidas legalmente no mundo; e mais da metade das drogas proibidas que são vendidas ilegalmente, o que não é uma coisinha à-toa quando se leva em conta que os EUA contam com apenas cinco por cento da população mundial.

«Gente infeliz, essa que vive se comparando», lamenta uma mulher no bairro de Buceo, em Montevidéu. A dor de já não ser, que outrora cantava o tango, deu lugar à vergonha de não ter. Um homem pobre é um pobre homem. «Quando não tens nada, pensas que não vales nada», diz um rapaz no bairro Villa Fiorito, em Buenos Aires. E outro confirma, na cidade dominicana de San Francisco de Macorís: «Meus irmãos trabalham para as marcas. Vivem comprando etiquetas, e vivem suando feito loucos para pagar as prestações».

Invisível violência do mercado: a diversidade é inimiga da rentabilidade, e a uniformidade é que manda. A produção em série, em escala gigantesca, impõe em todas as partes suas pautas obrigatórias de consumo. Esta ditadura da uniformização obrigatória é mais devastadora do que qualquer ditadura do partido único: impõe, no mundo inteiro, um modo de vida que reproduz seres humanos como fotocópias do consumidor exemplar.

O consumidor exemplar é o homem quieto. Esta civilização, que confunde quantidade com qualidade, confunde gordura com boa alimentação. Segundo a revista científica The Lancet, na última década a «obesidade mórbida» aumentou quase 30% entre a

população jovem dos países mais desenvolvidos. Entre as crianças norte-americanas, a obesidade aumentou 40% nos últimos dezesseis anos, segundo pesquisa recente do Centro de Ciências da Saúde da Universidade do Colorado. O país que inventou as comidas e bebidas light, os diet food e os alimentos fat free, tem a maior quantidade de gordos do mundo. O consumidor exemplar desce do carro só para trabalhar e para assistir televisão. Sentado na frente da telinha, passa quatro horas por dia devorando comida plástica.

Vence o lixo fantasiado de comida: essa indústria está conquistando os paladares do mundo e está demolindo as tradições da cozinha local. Os costumes do bom comer, que vêm de longe, contam, em alguns países, milhares de anos de refinamento e diversidade e constituem um patrimônio coletivo que, de algum modo, está nos fogões de todos e não apenas na mesa dos ricos. Essas tradições, esses sinais de identidade cultural, essas festas da vida, estão sendo esmagadas, de modo fulminante, pela imposição do saber químico e único: a globalização do hambúrguer, a ditadura do fast food. A plastificação da comida em escala mundial, obra do McDonald´s, do Burger King e de outras fábricas, viola com sucesso o direito à autodeterminação da cozinha: direito sagrado, porque na boca a alma tem uma das suas portas.

A Copa do Mundo de futebol de 1998 confirmou para nós, entre outras coisas, que o cartão MasterCard tonifica os músculos, que a Coca-Cola proporciona eterna juventude e que o cardápio do McDonald´s não pode faltar na barriga de um bom atleta. O imenso exército do McDonald´s dispara hambúrgueres nas bocas das crianças e dos adultos no planeta inteiro. O duplo arco dessa M serviu como estandarte, durante a recente conquista dos países do Leste Europeu.

As filas na frente do McDonald´s de Moscou, inaugurado em 1990 com bandas e fanfarras, simbolizaram a vitória do Ocidente com tanta eloquência quanto a queda do Muro de Berlim. Um sinal dos tempos: essa empresa, que encarna as virtudes do mundo livre, nega aos seus empregados a liberdade de filiar-se a qualquer sindicato. O McDonald´s viola, assim, um direito legalmente consagrado nos muitos países onde opera. Em 1997, alguns trabalhadores, membros disso que a empresa chama de Macfamília, tentaram sindicalizar-se em um restaurante de Montreal, no Canadá: o restaurante fechou. Mas, em 98, outros empregados do McDonald´s, em uma pequena cidade próxima a Vancouver, conseguiram essa conquista, digna do Guinness.

As massas consumidoras recebem ordens em um idioma universal: a publicidade conseguiu aquilo que o esperanto quis e não pôde.

Qualquer um entende, em qualquer lugar, as mensagens que a televisão transmite. No último quarto de século, os gastos em propaganda dobraram no mundo todo. Graças a isso, as crianças pobres bebem cada vez mais Coca-Cola e cada vez menos leite e o tempo de lazer vai se tornando tempo de consumo obrigatório. Tempo livre, tempo prisioneiro: as casas muito pobres não têm cama, mas têm televisão, e a televisão está com a palavra. Comprado em prestações, esse animalzinho é uma prova da vocação democrática do progresso: não escuta ninguém, mas fala para todos.

Pobres e ricos conhecem, assim, as qualidades dos automóveis do último modelo, e pobres e ricos ficam sabendo das vantajosas taxas de juros que tal ou qual banco oferece. Os especialistas sabem transformar as mercadorias em mágicos conjuntos contra a solidão. As coisas possuem atributos humanos: acariciam, fazem companhia, compreendem, ajudam, o perfume te beija e o carro é

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o amigo que nunca falha. A cultura do consumo fez da solidão o mais lucrativo dos mercados.

Os buracos no peito são preenchidos enchendo-os de coisas, ou sonhando com fazer isso. E as coisas não só podem abraçar: elas também podem ser símbolos de ascensão social, salvo-condutos para atravessar as alfândegas da sociedade de classes, chaves que abrem as portas proibidas. Quanto mais exclusivas, melhor: as coisas escolhem você e salvam você do anonimato das multidões. A publicidade não informa sobre o produto que vende, ou faz isso muito raramente. Isso é o que menos importa. Sua função primordial consiste em compensar frustrações e alimentar fantasias. Comprando este creme de barbear, você quer se transformar em quem?

O criminologista Anthony Platt observou que os delitos das ruas não são fruto somente da extrema pobreza. Também são fruto da ética individualista. A obsessão social pelo sucesso, diz Platt, incide decisivamente sobre a apropriação ilegal das coisas. Eu sempre ouvi dizer que o dinheiro não trás felicidade; mas qualquer pobre que assista televisão tem motivos de sobra para acreditar que o dinheiro trás algo tão parecido que a diferença é assunto para especialistas.

Segundo o historiador Eric Hobsbawm, o século XX marcou o fim de sete mil anos de vida humana centrada na agricultura, desde que apareceram os primeiros cultivos, no final do paleolítico. A população mundial torna-se urbana, os camponeses tornam-se cidadãos. Na América Latina temos campos sem ninguém e enormes formigueiros urbanos: as maiores cidades do mundo, e as mais injustas. Expulsos pela agricultura moderna de exportação e pela erosão das suas terras, os camponeses invadem os subúrbios. Eles acreditam que Deus está em todas as partes, mas por experiência própria sabem que atende nos grandes centros urbanos.

As cidades prometem trabalho, prosperidade, um futuro para os filhos. Nos campos, os esperadores olham a vida passar, e morrem bocejando; nas cidades, a vida acontece e chama. Amontoados em cortiços, a primeira coisa que os recém chegados descobrem é que o trabalho falta e os braços sobram, que nada é de graça e que os artigos de luxo mais caros são o ar e o silêncio.

Enquanto o século XIV nascia, o padre Giordano da Rivalto pronunciou, em Florença, um elogio das cidades. Disse que as cidades cresciam «porque as pessoas sentem gosto em juntar-se». Juntar-se, encontrar-se. Mas, quem encontra com quem? A esperança encontra-se com a realidade? O desejo, encontra-se com o mundo? E as pessoas, encontram-se com as pessoas? Se as relações humanas foram reduzidas a relações entre coisas, quanta gente encontra-se com as coisas?

O mundo inteiro tende a transformar-se em uma grande tela de televisão, na qual as coisas se olham mas não se tocam. As mercadorias em oferta invadem e privatizam os espaços públicos.

Os terminais de ônibus e as estações de trens, que até pouco tempo atrás eram espaços de encontro entre pessoas, estão se transformando, agora, em espaços de exibição comercial. O shopping center, o centro comercial, vitrine de todas as vitrines, impõe sua presença esmagadora. As multidões concorrem, em peregrinação, a esse templo maior das missas do consumo. A maioria dos devotos contempla, em êxtase, as coisas que seus bolsos não podem pagar, enquanto a minoria compradora é submetida ao bombardeio da oferta incessante e extenuante. A multidão, que sobe e desce pelas escadas mecânicas, viaja pelo mundo: os manequins vestem como em Milão ou Paris e as

máquinas soam como em Chicago; e para ver e ouvir não é preciso pagar passagem. Os turistas vindos das cidades do interior, ou das cidades que ainda não mereceram estas benesses da felicidade moderna, posam para a foto, aos pés das marcas internacionais mais famosas, tal e como antes posavam aos pés da estátua do prócer na praça.

Beatriz Solano observou que os habitantes dos bairros suburbanos vão ao center, ao shopping center, como antes iam até o centro. O tradicional passeio do fim-de-semana até o centro da cidade tende a ser substituído pela excursão até esses centros urbanos. De banho tomado, arrumados e penteados, vestidos com suas melhores galas, os visitantes vêm para uma festa à qual não foram convidados, mas podem olhar tudo. Famílias inteiras empreendem a viagem na cápsula espacial que percorre o universo do consumo, onde a estética do mercado desenhou uma paisagem alucinante de modelos, marcas e etiquetas.

A cultura do consumo, cultura do efêmero, condena tudo à descartabilidade midiática. Tudo muda no ritmo vertiginoso da moda, colocada à serviço da necessidade de vender. As coisas envelhecem num piscar de olhos, para serem substituídas por outras coisas de vida fugaz. Hoje, quando o único que permanece é a insegurança, as mercadorias, fabricadas para não durar, são tão voláteis quanto o capital que as financia e o trabalho que as gera. O dinheiro voa na velocidade da luz: ontem estava lá, hoje está aqui, amanhã quem sabe onde, e todo trabalhador é um desempregado em potencial.

Paradoxalmente, os shoppings centers, reinos da fugacidade, oferecem a mais bem-sucedida ilusão de segurança. Eles resistem fora do tempo, sem idade e sem raiz, sem noite e sem dia e sem memória, e existem fora do espaço, além das turbulências da perigosa realidade do mundo.

Os donos do mundo usam o mundo como se fosse descartável: uma mercadoria de vida efêmera, que se esgota assim como se esgotam, pouco depois de nascer, as imagens disparadas pela metralhadora da televisão e as modas e os ídolos que a publicidade lança, sem pausa, no mercado. Mas, para qual outro mundo vamos nos mudar? Estamos todos obrigados a acreditar na historinha de que Deus vendeu o planeta para umas poucas empresas porque, estando de mau humor, decidiu privatizar o universo? A sociedade de consumo é uma armadilha para pegar bobos.

Aqueles que comandam o jogo fazem de conta que não sabem disso, mas qualquer um que tenha olhos na cara pode ver que a grande maioria das pessoas consome pouco, pouquinho e nada, necessariamente, para garantir a existência da pouca natureza que nos resta. A injustiça social não é um erro por corrigir, nem um defeito por superar: é uma necessidade essencial. Não existe natureza capaz de alimentar um shopping center do tamanho do planeta.

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SOCIOLOGIA - 1º ANO - Apostila 3 - Prof. Renato Fialho - Página 7

NA TELINHA DA SUA CASA VOCÊ É CIDADÃO? - MÍDIA E CULTURA NO CAPITALISMO GLOBALIZADO

A partir da II Revolução Industrial no século XIX e da predominância das regras do mercado capitalista, as artes, a cultura e a mídia foram submetidas à ideologia da indústria cultural.

Ou seja, os produtos de criação da cultura dos homens foram submetidos à idéia de consumo, como produtos fabricados em série. As obras de arte se transformam em meras mercadorias, produtos de consumo, onde a maioria dos bens artísticos não são criados para a contemplação, para a busca do belo, e, sim, para a obtenção do lucro.

A indústria cultural massifica a cultura e as artes para o consumo rápido no mercado da moda e na mídia. Massificar é banalizar as artes e a produção das idéias e, também, vulgarizar os conhecimentos.

Marilena Chauí (1995) nos dá um exemplo disso afirmando:

"A indústria cultural vende cultura. Para vendê-la, deve seduzir e agradar o consumidor. Para seduzi-lo, não pode chocá-lo, provocá-lo, fazê-lo pensar. Fazê-lo ter informações novas que perturbem, mas deve devolver-lhe, com nova aparência, o que ele já sabe, já viu, já fez".

Daí surgem as revistas de fofocas, o teclado, o MSN, os programas de TV sobre futilidades, os comerciais que tentam vender produtos sem qualidades, mas com ótima produção de marketing.

O poder da mídia - Expressão máxima da indústria cultural são os meios de comunicação de massa, ou mídia escrita ou eletrônica. Aqui vale destacar o poder da mídia enquanto manipulação, formação de opinião, infantilização e condicionamento de mentes e produção cultural do grotesco visando a despolitização. Essas características da mídia se expressam particularmente através da TV, rádio, jornais e revistas, que são de fácil acesso à grande maioria das pessoas.

Muitos estudiosos, jornalistas e políticos costumam dizer que a mídia - ou meios de comunicação de massa - representa um quarto poder (além dos poderes governamentais do judiciário, do legislativo e do executivo). Isto porque influencia comportamentos, opiniões e atitudes de forma constante e permanente.

Vejamos essa passagem do livro Convite à Filosofia, de Marilena Chauí (1995):

"Vale a pena, também, mencionar dois outros efeitos que a mídia produz em nossas mentes: a dispersão da atenção e a infantilização."

"Para atender aos interesses econômicos dos patrocinadores, a mídia divide a programação em blocos que duram de sete a dez minutos, cada bloco sendo interrompido pelos comerciais. Essa divisão do tempo nos leva a concentrar a atenção durante os sete ou dez

minutos de programa e a desconcentrá-la durante as pausas para a publicidade."

"Pouco a pouco isso se torna um hábito. Artistas de teatro afirmam que, durante um espetáculo, sentem o público ficar desatento a cada sete minutos. Professores observam que seus alunos perdem a atenção a cada dez minutos e só voltam a se concentrar após uma pausa que dão a si mesmos, como se dividissem a aula em 'programa' e 'comercial'."

"Ora, um dos resultados dessa mudança mental transparece quando criança e jovem tentam ler um livro: não conseguem ler mais do que sete a dez minutos de cada vez, não conseguem suportar a ausência de imagens e ilustrações no texto, não suportam a idéia de precisar ler 'um livro inteiro'. A atenção e a concentração, a capacidade de abstração intelectual e de exercício do pensamento foram destruídas. Como esperar que possam desejar e interessar-se pelas obras de artes e de pensamento?"

"Por ser um ramo da indústria cultural e, portanto, por ser fundamentalmente uma vendedora de cultura que precisa agradar o consumidor, a mídia infantiliza. Como isso acontece? Uma pessoa (criança ou não) é infantil quando não consegue suportar a distância temporal entre seu desejo e a satisfação dele. A criança é infantil justamente porque para ela o intervalo entre o desejo e a satisfação é intolerável (por isso a criança pequena chora tanto)."

"Ora, o que faz a mídia? Promete e oferece gratificação instantânea. Como o consegue? Criando em nós os desejos e oferecendo produtos (publicidade e programação) para satisfazê-los. O ouvinte que gira o dial do aparelho de rádio continuamente e o telespectador que muda continuamente de canal o fazem porque sabem que, em algum lugar, seu desejo será imediatamente satisfeito."

Além disso, como a programação se dirige ao que já sabemos e já gostamos, e como toma a cultura sob a forma de lazer e entretenimento, a mídia satisfaz, imediatamente nossos desejos porque não exige de nós atenção, pensamento, reflexão, crítica, perturbação de nossa sensibilidade e de nossa fantasia. Em suma, não nos pede o que as obras de arte e de pensamento nos pedem: trabalho sensorial e mental para compreendê-las, amá-las, criticá-las, superá-las. A cultura nos satisfaz se tivermos paciência para compreendê-la e decifrá-la. Exige maturidade. A mídia nos satisfaz porque nada nos pede, senão que permaneçamos para sempre infantis."

_____________

(Trecho extraído do livro: "Sociologia para jovens do século XXI", de OLIVEIRA, Luiz F. de & COSTA, Ricardo Cesar R. da)

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SOCIOLOGIA - 1º ANO - Apostila 3 - Prof. Renato Fialho - Página 8

CONCEITOS & DISCUSSÕES Grupo social

Procurando o verbete "grupo social" no

dicionário Aurélio, encontramos a seguinte definição: "Forma básica da associação humana; agregado social que tem uma entidade [individualidade] e vida própria, e se considera como um todo, com suas tradições morais e materiais".

Para o psicanalista argentino José Bleger, "um grupo é um conjunto de pessoas que entram em interação, mas, além disso, o grupo é, fundamentalmente, uma sociabilidade estabelecida".

Complementando o conceito de Bleger sobre o que é um grupo social, o filósofo francês Jean-Paul Sartre afirma que "enquanto não se estabelecer a interação não existe grupo, há somente uma serialidade, em que cada indivíduo é equivalente a outro e todos constituem um número de pessoas equiparáveis e sem distinção entre si". (Um exemplo de serialidade são pessoas numa fila de ônibus ou de cinema. Elas estão juntas mas não interagem, pois não se comunicam entre si. Não formam, portanto um grupo.)

Seja qual for a definição, uma coisa é certa: grupo social sempre significa a reunião de pessoas que estão mutuamente em interação (duas pessoas já podem formar um grupo). A partir daí, cada ciência amplia o conceito de acordo com o objeto e objetivo de seus estudos.

Para a Sociologia, grupo social é toda reunião mais ou menos estável de duas ou mais pessoas associadas pela interação. Devido à interação social, os grupos têm de manter alguma forma de organização, no sentido de realizar ações conjuntas de interesse comum a todos os seus membros.

Os grupos sociais apresentam normas, hábitos e costumes próprios, divisão de funções e posições sociais definidas. Como exemplos podemos apontar a família, a escola, a igreja, o clube, a nação, etc.

Principais grupos sociais: grupo familial, grupo vicinal, grupo educativo, grupo religioso, grupo de lazer, grupo profissional e grupo político.

Principais características dos grupos sociais

Os grupos sociais se caracterizam por ter: - pluralidade de indivíduos - interação social

- organização - objetividade e exterioridade - conteúdo intencional ou objetivo comum - consciência grupal ou sentimento de "nós" - continuidade.

Tipos de grupos sociais Como os contatos sociais, os grupo sociais

podem ser classificados em: - grupos primários - predomínio dos contatos

primários (pessoais diretos), caracterizados pela intimidade e cooperação - família, vizinhos, grupo de lazer.

- grupos secundários - possui certas características que se apresentam como opostas às do grupo primário. As relações geralmente são estabelecidas por contato indireto e, no caso de serem por contato direto, são passageiras e desprovidas de intimidade; as relações são ainda formais e impessoais. Ex: o coletivo de um ônibus.

Agregados Para o sociólogo Karl Mannheim existem

sensíveis diferenças entre grupos sociais e agregados sociais.

Agregado social é uma reunião de pessoas com fraco sentimento grupal e frouxamente aglomeradas. Mesmo assim, conseguem manter entre si um mínimo de comunicação e de relações sociais.

O agregado social se caracteriza por não ser organizado - não tem estrutura estável nem hierarquia de posições e funções. As pessoas que dele participam são relativamente anônimas, isto é, são praticamente desconhecidas entre si. O contato social entre elas é limitado e de pequena duração.

Tipos de agregados - multidão - se caracterizam por falta de

organização, anonimato, objetivos comuns, indiferenciação (todos são iguais), proximidade física. Ex: reunião de foliões no carnaval ou multidão observando um incêndio.

- público - é um agrupamento de pessoas que seguem os mesmos estímulos. Ex: público de uma partida de futebol;

- massa - consiste num agrupamento relativamente grande de pessoas separadas e desconhecidas uma das outras e que recebem, de maneira mais ou menos passiva, opiniões formadas, que são veiculadas pela mídia.

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Identidade

Na Grécia Antiga, o filósofo pré-socrático Parmênides de Eléia trouxe à tona o que chamou de "princípio de identidade ou princípio da não-contradição", cuja síntese se expressa na seguinte frase: “ou uma coisa é ou não é”. De outra forma: “o ser é; o não-ser não é”.

Parmênides é contemporâneo e arquiinimigo de Heráclito de Éfeso. Heráclito é considerado o pai da dialética, que ensinava que "tudo flui e que, portanto, uma coisa 'é' e 'não-é' ao mesmo tempo". Com isto, Heráclito abre caminho para a discussão e compreensão do movimento ou das coisas em movimento, na época, considerado algo caótico, incompreensível, portanto, incognoscível.

A posição de Parmênides foi defendida por Platão de Atenas, que costumava chamá-lo de "O Grande Parmênides". O princípio da identidade, em termos políticos, é de matiz conservador, ao adotar a perspectiva de que nada muda e que tudo carrega em si sua própria essência. Logo é uma perspectiva conceitual, classificatória e defensora da ordem (que naquela época era escravagista). Não aceitava a crítica ou a revisão de conceitos, pois que estes eram considerados definitivos e imutáveis.

OUTROS USOS DO TERMO - Além da origem filosófica do termo, ele é usado também em diversas outras áreas, tais como na psicologia, na psicologia social e na matemática (A=B, se todas as propriedades que caracterizam A caracterizarem também B - lei de Leibniz ou da identidade abstrata).

Identificação

Segundo o 'Dicionário de Ciências Sociais', da Fundação Getúlio Vargas, "Em sentido geral, identificação designa: a) reconhecimento de outro por um aspecto, propriedade ou atributo: identificar alguém; b) assimilação de um aspecto, propriedade ou atributo de outro: identificar-se".

"O 'identificar-se' é o processo que vai dar condições ao crescimento do psiquismo. A fantasia facilita a identificação". (Idem)

"Inicialmente coube a S. Freud, fundando-se na existência do inconsciente, buscar uma nova explicação para fatos antes mencionados como imitação, estabelecendo assim o conceito de identificação; mas é sobretudo em M. Klein que fica evidente, através da fantasia, o processo de produção da identificação". (Idem)

Identidade e diferença "A identidade e a diferença estão, pois, em

estreita conexão com as relações de poder. O

poder de definir a identidade e de marcar presença não pode ser separado das relações mais amplas de poder. A identidade e a diferença não são, nunca, inocentes". (Tomaz Tadeu da Silva)

Art. 5º. “Todos são iguais perante a lei, sem

distinção de qualquer natureza”. (Constituição Brasileira, 2002, p. 15).

"Temos o direito a sermos iguais quando a

diferença nos inferioriza. Temos o direito a sermos diferentes quando a igualdade nos descaracteriza. As pessoas querem ser iguais, mas querem respeitadas suas diferenças. (Boaventura de Souza Santos)

A identidade em questão O trecho a seguir é de Stuart Hall, em "A

identidade cultural na pós-modernidade": «A questão da identidade está sendo

extensamente discutida na teoria social. Em essência, o argumento é o seguinte: as velhas identidades, que por tanto tempo estabilizaram o mundo social, estão em declínio, fazendo surgir novas identidades e fragmentando o indivíduo moderno, até aqui visto como um sujeito unificado. A assim chamada "crise de identidade" é vista como parte de um processo mais amplo de mudança, que está deslocando as estruturas e processos centrais das sociedades modernas e abalando os quadros de referência que davam aos indivíduos uma ancoragem estável no mundo social.

(...) as identidades estão sendo "descentradas", isto é, deslocadas ou fragmentadas. (...)

(...) Para aqueles/as teóricos/as que acreditam que as identidades modernas estão entrando em colapso, o argumento se desenvolve da seguinte forma. Um tipo diferente de mudança estrutural está transformando as sociedades modernas no final do século XX. Isso está fragmentando as paisagens culturais de classe, gênero, sexualidade, etnia, raça, e nacionalidade, que, no passado, nos tinham fornecido sólidas localizações como indivíduos sociais. Estas transformações estão também mudando nossas identidades pessoais, abalando a idéia que temos de nós próprios como sujeitos integrados. Esta perda de um "sentido de si" estável é chamada, algumas vezes, de deslocamento ou descentração do sujeito. Esse duplo deslocamento - descentração dos indivíduos tanto de seu lugar no mundo social e cultural quanto de si mesmos - constitui uma "crise de identidade" para o indivíduo. Como observa o crítico cultural Kobena Mercer, "a identidade somente se torna uma questão quando está em crise, quando algo que se supõe como fixo, coerente e estável é deslocado pela experiência da dúvida e da incerteza" (Mercer, 1990, p. 43).»

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"Ciladas da diferença" e "Em defesa da História"

O texto a seguir é uma resenha, extraída da Internet, elaborada por Marcelo Coelho sobre os dois livros citados acima.

«O ser humano não existe: existem ingleses,

chineses, americanos. O americano não existe: existem mulheres

americanas, negros americanos, gays americanos. A mulher americana não existe: existem mulheres americanas negras, mulheres americanas gays. A mulher americana negra não existe: existem mulheres americanas negras de classe média, mulheres americanas negras operárias...

Isto não é tudo. As classes sociais também

não existem. Há grupos que se redefinem a cada momento, a cada circunstância: motoristas de táxi se dissolvem em corintianos ou palmeirenses, que se dissolvem em adolescentes ou velhos, que se constroem enquanto moradores do Bixiga ou da Lapa.

A Lapa não existe: é uma construção

imaginária, uma identidade geográfica criada segundo juízos de valor, experiências subjetivas, jogos de linguagem sedimentados historica-mente.

Só que a história não existe tampouco:

existem ficções, narrativas que podemos organizar conforme uma estrutura de começo, meio e fim, mas que sempre irão trair a arbitrariedade básica com a qual cada sujeito compõe os dados da realidade. Lembre-se também que o sujeito não existe: é um campo onde se entrecruzam percepções, desejos, linguagens. De resto, a realidade não existe tampouco.

Bobagens como as escritas acima correm o

risco, atualmente, de passar como puro senso comum. Com maior ou menor intensidade, volta e meia topamos com raciocínios desse tipo, que correspondem a uma espécie de vulgata pós-moderna. É um grande alívio, nesse quadro de relativismo exacerbado, ler livros como "Ciladas da Diferença" ou "Em Defesa da História". No primeiro, o sociólogo Antônio Flávio Pierucci

desmonta, com clareza e bom humor, os paradoxos a que leva o culto contemporâneo à "identidade" (social, racial, cultural, sexual etc.). A crítica ao "ser humano abstrato", hoje tão disseminada entre a esquerda pós-moderna e os teóricos mais radicais dos movimentos negro e feminista nos Estados Unidos, passa hoje em dia por ser coisa avançada. Nota Pierucci, entretanto, que suas raízes podem ser encontradas no extremo oposto do espectro político.

No século passado, teóricos ultracon-

servadores como Edmund Burke e Joseph de Maistre, em plena luta contra a idéia de direitos humanos universais, aferravam-se à constatação empírica das "diferenças". De Joseph de Maistre, Pierucci cita uma frase tirada das "Considerações sobre a França": "O homem (universal) não existe. Em minha vida eu vi franceses, italianos, russos etc. (...) Quanto ao homem, contudo, declaro que nunca o encontrei". Mais de cem anos depois, o "elogio da diferença" se torna um tema da "nova esquerda", que, contudo, não pode deixar de lado o tema clássico da igualdade. Pierucci ironiza: "Como se vê, tudo parece muito simples, muito claro: "Os seres humanos são diferentes, mas iguais". Neste jogo de linguagem, tudo se passa inocentemente como se não fosse também um jogo de palavras". É como se a luta contra as várias discriminações, a luta por direitos iguais, estivesse imbricada com outra luta, na qual se procura afirmar a identidade, o valor, a originalidade de um grupo. O que, em si, não encerra nenhuma contradição.

Mas, diz Pierucci, quando o movimento

negro, por exemplo, vem afirmar que "negro é diferente", isto será repetir algo que os racistas sempre disseram: "Legitima que a diferença seja enfocada e as distâncias, alargadas... essa atmosfera pós-moderna que muitos de nós hoje respiramos nos ambientes de esquerda, essa onda de celebração neobarroca das diferenças, de apego às singularidades culturais (...), tudo isso assusta muito pouco as cabeças de direita...". O que provoca ojeriza na direita é "ainda hoje, 200 anos depois, o discurso dos direitos humanos, o discurso revolucionário da igualdade". No fundo, o problema dessa e outras "ciladas" talvez seja redutível a um mal-entendido linguístico: só posso defender quem é "diferente" em nome da igualdade; mas a defesa do "diferente" passa a se chamar, num modismo pós-moderno, defesa da "Diferença", com letras maiúsculas... e aí, evidentemente, a igualdade fica falando sozinha.

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SOCIOLOGIA - 1º ANO - Apostila 3 - Prof. Renato Fialho - Página 11

Com ensaios que tratam desde a

mentalidade do eleitor de direita na cidade de São Paulo até as mudanças no feminismo americano, "Ciladas da Diferença" mantém uma admirável unidade de argumentação, que se aproxima bastante da de alguns textos reunidos no livro "Em Defesa da História". O escritor Kenan Malik, por exemplo, em "O Espelho da Raça: O Pós-modernismo e a Louvação da Diferença", nota que "a crítica pós-moderna ao universalismo, longe de formular uma crítica à teoria racial, apropria-se, na verdade, de muitos de seus temas e reproduz os próprios pressupostos sobre os quais, historicamente, assentou-se o racismo". Mas este é apenas um dos temas do volume, que surge como uma impressionante máquina teórica contra os vários cacoetes da teoria pós-moderna. A introdução do volume, escrita por Ellen Meiksins Wood -editora da publicação inglesa de esquerda "The Monthly Review"- aponta de forma demolidora a falta de novidade de temas como "o fim da história", "a fragmentação do sujeito" ou o antiuniversalismo pós-moderno.

A ironia de tudo, diz a autora, é que se

insiste na fragmentação e no particularismo num momento em que, como nunca, o capitalismo se tornou uma realidade totalizante num grau sem precedentes. Marxista do começo ao fim, com grande vigor crítico e variedade de enfoques - e, sobretudo, sem nenhum ranço "pré-queda do Muro de Berlim"-, o livro traz ensaios de teóricos conhecidos no Brasil, como Terry Eagleton ("De

Onde Vêm os Pós-modernistas?") e Fredric Jameson ("Cinco Teses Sobre o Marxismo Realmente Existente"), nenhum dos dois, a meu ver, no melhor de sua forma. É graças às contribuições de Aijaz Ahmad (sobre cultura nos países "pós-coloniais"), de Bryan Palmer (sobre a pertinência do conceito de classes sociais), de Meera Nanda (contra a "desconstrução" do conhecimento científico) e de Carol Stabile (sobre feminismo) que este volume se faz indispensável. Pelo menos para quem esteja farto do oba-oba pós-moderno.»

Fonte: http://www.cliohistoria.110mb.com/ biblioteca/resenhas/ciladas_marcelo.html

FRASE PARA REFLETIR: "A humanidade só saiu da barbárie mental primitiva quando se evadiu do caos das suas velhas lendas e não temeu mais o poder dos taumaturgos, dos oráculos e dos feiticeiros. Os ocultistas de todos os séculos não descobriram nenhuma verdade ignorada, ao passo que os métodos científicos fizeram surgir do nada um mundo de maravilhas. Abandonemos às imaginações mórbidas essa legião de larvas, de espíritos, de fantasmas e de filhos da noite – e que, no futuro, uma luz suficiente os dissipe para sempre."

(Gustave Le Bon - 1841-1931. Sociólogo)