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Indexada em:• BBE: Biblioteca Brasileira de Educação (Brasília, INEP)• Latindex: Sistema Regional de Información em Línea para Revistas Científicas de America Latina, el Caribe, España Portugal.Qualis: B1 - Educação

Educação em FocoAno 14, n. 18 – dezembro de 2011

ISSN 1519-3322

Revista da Faculdade de Educação da Universidade do Estado de Minas GeraisPublicação: Centro de Comunicação - CenC - Campus Belo Horizonte

Rua Paraíba - 29 - sala 704 - Belo Horizonte - MG - Cep: 30.130-140Tel.: (31) 3239-5912 - [email protected]

[email protected]

Comissão EditorialMaria da Consolação Rocha (Editora)Magda Chamon (Editora Adjunta)Lana Mara de Castro Siman (Editora Adjunta)Karla Cunha Pádua (Editora Adjunta)Santuza Amorim Silva (Editora Adjunta)

Conselho CientíficoAlmerindo Janela -Universidade do Minho – PortugalAntônio Carrilo Avelar - Universidade do MéxicoEneida Maria Chaves - UFSJFrancisco Antônio Loiola – Universidade de MontrealJosé Antonio Martin Moreno Afonso - Universidade do Minho - PortugalJosé Augusto Cardoso Bernardes - Universidade de CoimbraAdilson Xavier da Silva - UNA/BHJosé Carlos Libâneo – UCG Júlio César Furtado – UNIABEUMaria Aparecida da Silva - CEFET/MGMaria Teresa Machado Duran - Universidade de Camaguey – CubaMauro Henrique Nogueira Guimarães de Abreu – UFMGMírian Paura Sabrosa Zippin Grispun – UERJPatrícia Sadovsky - Villa Dominico – Universidade de Buenos Aires – ArgentinaVera Lúcia Ferreira Alves de Brito – UEMG

Educação em Foco - ano 14, n. 18 (dezembro/2011)Belo Horizonte: Faculdade de Educação/Campus BH/UEMG,1995

v. : il.; 21 x 15 cmSemestralISSN: 1519-3322

Educação – Brasil – periódicos 2 - Educação – América LatinaPeriódicos: I – Faculdade de Educação/CBH/UEMG

COD - 370

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ISSN 1519-3322

Belo Horizonte2011

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Universidade do Estado de Minas Gerais

Reitor: Dijon Moraes JúniorVice-Reitora: Santuza Abras

Faculdade de Educação – Belo Horizonte

Diretora : Fátima da Silva RisérioVice-Diretora: Kátia Gardênia Henrique da Rocha Campelo

Programa de Mestrado em Educação

Coordenadora: Magda Lúcia ChamonSubcoordenadora: Lana Mara de Castro Siman

Centro de Comunicação - CenC

Coordenadora: Maria Odília Figueiredo De SimoniEditora: Maria da Consolação Rocha

Editora Gerente: Lavínia Rosa Rodrigues

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Linha editorial

A revista Educação em Foco é um periódico científico semestral, com o objetivo de publicar artigos, a partir de reflexões sobre a educação em diálogo com outros campos do saber, sobretudo aqueles ligados à escola pública. Educação em Foco é a revista do Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade do Estado de Minas Gerais, editada com o apoio do Centro de Comunicação da FaE/UEMG.

EdUEMG – Editora da Universidade doEstado de Minas Gerais

Avenida Coronel José Máximo - 200 - Bairro São SebastiãoCEP: 36.202-284 - Barbacena - MG

Tel.: (32) 3362-7385 - Fax: (32) [email protected]

CapaCentro Design - ED/UEMG

CoordenaçãoDaniele Alves Ribeiro

Projeto gráfico e diagramaçãoMarco Aurélio Costa Santiago

Revisão final e normalizaçãoAndré Luiz Silva

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Sumário

Editorial

Núcleo de Estudos e Pesquisas em Educação de Jovens e Adultos – NEPEJA: uma experiência de interface extensãoe pesquisaCenter for Studies and Research Youth and Adult – NEPEJA:one extension interface experience and researchNágela Brandão, Vânia Costa, Márcia Nunes Monteiro, Gilvanice Musial, Roberto Rezende, Walquíria Rosa

Formação Docente para a Diversidade e a InclusãoTeacher Education for Diversity and InclusionMargareth Diniz

Educação e Relações Étnico-Raciais: desafios eperspectivas para o trabalho docenteEducation and ethnic-racial relations: challenges andperspectives for the teaching workJosé Eustáquio de Brito

O Programa de Educação Profissional de Minas Geraise a evasão escolar: um estudo preliminar (2008-2010)The Vocational Education Program of Minas Gerais anddrop out: a preliminary study (2008-2010)Wander Augusto Silva, Rosemary Dore

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SumárioO Sistema Mineiro de Avaliação da Educação Pública:a percepção dos profissionais das escolas públicasestaduais de Belo HorizonteThe Assessment System of Public Education in Minas Gerais:perceptions of public school professional in Belo HorizonteStella Willians de Carvalho,Jussara Maria de Pinho Magalhães Penna,Elias José Lopes de Freitas, Maria José Pereira,Ofélia de Souza Vieira

Uma proposta de formação docente no contexto dautilização das tecnologias da informação e comunicaçãono curso de Pedagogia da FaE/CBH/UEMG: linhas e entrelinhasA proposal for teacher education in the context of the useof information technology and communication in the facultyof Pedagogy of the FaE/CBH/UEMG: lines and linesSantuza Abras, Cleder Tadeu Antão da Silva,Luciana Zenha, Alecir Carvalho

Uma estratégia de ensino inspirada na DialéticaSocrática e na ErísticaA teaching strategy inspired by the Socraticdialectic and EristicElivane Amaral de Souza Assis,Fábio Wellington Orlando da Silva

La progresión de las concepciones de los futurosprofesores de primaria sobre la metodología de enseñanzaThe progression of conceptions of prospective teachersprimary on teaching methodologyAna Rivero, Pilar Azcárate, Rafael Porlán,Rosa Martín Del Pozo, Joao B. Harres, Emilio Solís Ramírez

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Editorial

Prezados leitores,

É com muita satisfação que apresentamos o 18º número da revista “Educação em Foco”. Primeiramente, porque a “Educação em Foco” foi elevada em sua classificação Qualis/Capes para B1, na última avaliação da área de Educação e, em segundo lugar, pelo fato de ela passar a contar com o protagonismo do Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade do Estado de Minas Gerais.

Este número da revista dá prosseguimento à sua já consistente trajetória de divulgação de estudos e pesquisas produzidos, cuja centralidade se ancora na formação e na ação docente. Os avanços do campo de investigação teórica e empírica sobre as questões pedagógicas escolares e não escolares, vinculadas às condições de ensino e de aprendizagem, bem como sobre as políticas públicas e os ordenamentos jurídico-legais que regulamentam a formação dos profissionais da educação, vêm sendo objeto de debates fecundos do campo de estudo. Nessa perspectiva, esses avanços têm possibilitado processos de análises mais qualificados sobre o tema. Embora não sejam poucas as iniciativas de um amplo número de instituições formadoras que têm somado esforços na busca de manter vivo este debate, de se aproximarem de respostas ainda não tangenciadas e de desenvolverem experiências comprometidas com a diversidade, com o multiculturalismo e com o sucesso do trabalho escolar, a formação dos docentes e a sua atuação como elemento articulador do processo pedagógico, merece atenção especial.

Os textos que compõem o presente número da “Educação em Foco” buscam analisar políticas públicas e processos sociais que refletem as teorias da educação e de outras áreas do conhecimento com as quais essas teorias dialogam. Assim, a sequência de textos apresentados contribui para a compreensão de que uma dada concepção de educação precede as ações educativas e que aquela depende de princípios ideológicos, que interferirão na fonte epistemológica ou no corpo teórico que lhe dá sustentação. Dizendo de outra forma, a função do

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saber, dos conhecimentos, da organização curricular e das práticas que os materializam não se constituem como algo neutro ou imparcial. Decorrem, sim, de uma certa fonte epistemológica que expressa uma intencionalidade e uma ação política a serviço de uma determinada visão de mundo e, portanto, de uma dada concepção de educação.

A democratização do saber como objeto de construções históricas e sociais ocorre em diferentes tempos e espaços. Recorrentemente, não devem ser tratadas em “si”, de forma abstrata e atemporal, mas em suas devidas relações a partir de um contexto social, histórico, econômico e político. O debate epistemológico contemporâneo coloca em evidência a potencialidade do entrecruzamento das fronteiras disciplinares e(ou) entre campos científicos para a construção de possibilidades de leitura dos fenômenos sociais. No entanto, ainda é comum o discurso que coloca a educação como o lugar da aplicação de conhecimentos produzidos em outros campos, descaracterizando-a como ciência. A luta contra esse esvaziamento epistemológico do campo educacional deve reforçar o lugar das Ciências da Educação na produção de grades de inteligibilidade dos fenômenos sociais, incorporando perspectivas e interlocuções teóricas capazes de sustentar o movimento de seu fortalecimento como campo do conhecimento detentor de seu próprio estatuto epistemológico.

A Faculdade de Educação da Universidade do Estado de Minas Gerais, Campus de Belo Horizonte, o seu Programa de Pós-Graduação em Educação e o seu Centro de Comunicação, atentos aos avanços históricos e à necessidade de dar sustentação à importância da educação e dos processos formativos no cenário contemporâneo, organizaram esta edição pautados na concepção da educação pela via da complexidade e pela possibilidade de contribuir para a produção de novos saberes e fazeres na área do conhecimento. É sabido que os modelos de causalidade simples passaram a ser ineficazes, a partir da segunda metade do século XX, frente à imprevisibilidade das formas de realização e de produção do conhecimento, gerando a necessidade de elaboração de modelos de causalidade complexa que requerem uma interlocução entre os diferentes campos do saber. Assim, os textos que compõem esta edição não devem ser percebidos como uma produção unidirecional, mas sim como um

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diálogo entre os autores que integram os diversos núcleos de pesquisa da Faculdade de Educação com autores de outras instituições.

No primeiro artigo, “Núcleo de Estudos e Pesquisas em Educação de Jovens e Adultos – NEPEJA: uma experiência de interface extensão e pesquisa”, os(as) autores(as) Nágela Brandão, Vânia Costa, Gilvanice Musial, Roberto Rezende, Walquíria Rosa, Márcia Nunes Monteiro apresentam suas reflexões acerca do papel social da Universidade, em especial da extensão, e indagam em que medida os sujeitos da sociedade civil, sobretudo dos movimentos sociais, têm sido incorporados no direito ao acesso e à criação cultural e às pesquisas científicas e tecnológicas produzidas no âmbito da universidade pública, não só como receptores, mas também como participantes e protagonistas. Essa reflexão sobre os desafios da indissociabilidade extensão-pesquisa-ensino se dá a partir das experiências dos projetos desenvolvidos pelo NEPEJA e parceiros, sobretudo os projetos vinculados a Educação de Jovens e Adultos do campo. A noção de interface auxiliou na compreensão dos caminhos que o Núcleo vem trilhando nesta busca da indissociabilidade ensino-pesquisa-extensão.

No segundo artigo, “Formação docente para a diversidade e a inclusão”, a professora da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) Margareth Diniz discute a formação docente analisando as múltiplas situações em que se veem envolvidos durante uma jornada de trabalho, a partir da metodologia da conversação, realizada com grupos de docentes, elucidando em seus resultados o caráter provisório do saber e da formação docente. A autora analisa a diversidade presente nas escolas hoje e os constantes questionamentos que se apresentam aos processos educativos, os quais fazem emergir um novo conhecimento escolar e passam a exigir múltiplas habilidades do(a) professor(a). Ao mesmo tempo, interroga sobre qual o tipo de formação que é requerida aos profissionais da educação para lidar com tantas situações que envolvem a diversidade e as políticas de inclusão em curso no Brasil. E mais, quais os recursos internos/subjetivos que o docente precisa mobilizar em si para ensinar os alunos?

No terceiro artigo, “Educação e relações étnicos-raciais: desafios e

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perspectivas para o trabalho docente”, o professor José Eustáquio de Brito, coordenador do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Educação e Relações Étnico-Raciais da FaE/UEMG, analisa o sentido histórico da educação das relações étnico-raciais como forma de enfrentamento do racismo e das desigualdades sociais naturalizadas pela ideologia hegemônica, tendo como argumento central o avanço das lutas do Movimento Social Negro no contexto da redemocratização da sociedade brasileira. Para isso, discute as implicações dessa demanda a partir da aprovação da Lei 10.639/2003, que altera o disposto na Lei de Diretrizes e Bases da Educação para instituir a obrigatoriedade do ensino de história da África e culturas afro-brasileiras nas etapas e modalidades da educação básica. Busca, ainda, identificar alguns desafios postos para a atividade dos professores, descrevendo algumas iniciativas no campo da formação docente que têm possibilitado o desenvolvimento de práticas pedagógicas pautadas pelo reconhecimento e valorização da diversidade étnico-racial.

O quarto artigo, de autoria da professora Rosemary Dore, da FaE/UFMG, e do professor Wander Augusto Silva, da FaE/UEMG, “O Programa de Educação Profissional de Minas Gerais e a evasão escolar: um estudo preliminar”, apresenta um breve histórico das políticas públicas educacionais adotadas pelo Governo do Estado de Minas Gerais, nas últimas décadas, para o ensino profissionalizante, buscando analisar e compreender aspectos relativos à evasão escolar ocorrida no PEP I. Além disso, estuda o Programa de Educação Profissionalizante de Minas Gerais (PEP/MG) instituído em 2007, que oferece, gratuitamente, vagas aos estudantes que desejam realizar cursos técnicos e estejam cursando ou tenham terminado o ensino médio.

O quinto artigo, intitulado “O Sistema Mineiro de Avaliação da Educação Pública: a percepção dos profissionais das escolas públicas estaduais de Belo Horizonte”, é de autoria de Stella Willians, Jussara Maria de Pinho, Elias José Lopes, Maria José Pereira, Ofélia de Souza Vieira. Os(as) autores(as) analisam os resultados da pesquisa “O olhar das escolas públicas estaduais de Minas Gerais para os resultados do SIMAVE”, desenvolvida pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre

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Políticas Educacionais da FaE/UEMG, que trata da centralidade das avaliações sistêmicas no cenário educacional brasileiro e suas implicações para a prática pedagógica dos atores sociais que atuam na escola: diretores, coordenadores e professores.

No sexto artigo, “Uma proposta de formação docente no contexto da utilização das tecnologias da informação e comunicação no curso de Pedagogia da FaE/CBH/UEMG: linhas e entrelinhas”, os(as) autores(as) Santuza Abras, Cleder Tadeu Antão da Silva, Luciana Zenha e Alecir Carvalho abordam historicamente a política de educação e tecnologia da faculdade, os antecedentes da proposta, passando pelas ações realizadas pela instituição. Resgatam a inserção dessa discussão no curso de Pedagogia e descrevem as diferentes iniciativas que se constituíram em práticas pedagógics de formação para seus estudantes, servidores e educadores no contexto da inclusão do debate sobre a utilização das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC).

O sétimo artigo, de autoria de Elivane Amaral de Souza Assis e Fábio Wellington Orlando da Silva, “Uma estratégia de ensino inspirada na Dialética Socrática e na Erística”, investiga uma proposta de ensino inspirada nos diálogos socráticos (Dialética) e nos estratagemas de Schopenhauer (Erística), com o objetivo de educar os estudantes para o debate de conceitos científicos e o reconhecimento de argumentos falaciosos encontrados em textos pseudocientíficos presentes na mídia não especializada e no contexto da vida cotidiana. A metodologia de pesquisa usada foi o Estudo de Caso, por meio de um minicurso ministrado a estudantes de engenharia, com carga horária total de oito horas-aula, divididas em quatro módulos de duas horas-aula cada.

O último artigo, “La progresión de las concepciones de los futuros professores de primaria sobre la metodologia de enseñanza”, de autoria coletiva de Ana Rivero, Emílio Solís Ramírez e Rafael Porlán (Universidade de Sevilha), Pilar Azcárate (Universidade de Cádiz), Rosa Martín Del Pozo (Universidad Complutense de Madrid), e João B. Harres (Universidade de Porto Alegre). O estudo descreve e analisa a evolução das concepções de professores dos anos iniciais, em processo de formação, sobre metodologias de ensino. Em destaque, três categorias

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de análise: conceito de atividade, organização das atividades e conceito de recurso didático, e a apresentação dos resultados obtidos em relação a uma delas – a organização das atividades. A pesquisa foi realizada com cinco grupos de futuros professores que participaram de cursos de formação inicial de orientação construtivista em diferentes universidades.

Boa leitura!

Magda ChamonCoordenadora do Mestrado em Educação – FaE/UEMG

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Núcleo de Estudos e Pesquisas em Educação de Jovens e Adultos – NEPEJA: uma experiência de interface extensão e pesquisa

Nágela Brandão1

[email protected]

Vânia Costa2

[email protected]

Márcia Nunes Monteiro3

[email protected]

Gilvanice Musial4

[email protected]

Roberto Rezende5

[email protected]

Walquíria Rosa6

[email protected]

1 Doutora em Educação, professora da FaE/UEMG, integrante do NEPEJA.2 Doutora em Educação, professora da FaE/UEMG, integrante do NEPEJA.3 Mestre em Educação, professora da FaE/UEMG, integrante do NEPEJA.4 Doutora em Educação, professora da FaE/UEMG, integrante do NEPEJA.5 Mestre em Educação, professor da FaE/UEMG, integrante do NEPEJA.6 Doutoranda em Educação, professora da FaE/UEMG, integrante do NEPEJA.

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Núcleo de Estudos e Pesquisas em Educação de Jovens e Adultos - NEPEJA:uma experiência de interface extensão e pesquisa

Resumo

As ações desenvolvidas pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas em Educação de Jovens e Adultos da Faculdade de Educação da Universidade do Estado de Minas Gerais – NEPEJA/FaE/UEMG – têm possibilitado aos seus integrantes refletir acerca do papel social da universidade, em especial da extensão. Tais ações têm nos levado a indagar em que medida os sujeitos da sociedade civil, sobretudo dos movimentos sociais, têm sido incorporados no direito ao acesso e à criação cultural e às pesquisas científicas e tecnológicas produzidas no âmbito da universidade pública, não só como receptores, mas também como participantes e protagonistas. Este texto busca refletir sobre os desafios da indissociabilidade extensão-pesquisa-ensino a partir das experiências dos projetos desenvolvidos pelo NEPEJA e parceiros, sobretudo os projetos vinculados à Educação de Jovens e Adultos do campo. A noção de interface auxiliou na compreensão dos caminhos que o Núcleo vem trilhando nessa busca da indissociabilidade extensão-pesquisa-ensino.

Palavras-Chave: Educação de Jovens e Adultos (EJA); EJA do campo; extensão-pesquisa-ensino.

1 Introdução

A experiência do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Educação de Jovens e Adultos (NEPEJA)7 na gestão de projetos e na reflexão sobre a Educação de Jovens e Adultos (EJA), sobretudo a EJA do campo, tem incitado um conjunto de indagações sobre os limites e as potencialidades da sua atuação nessa área. Que desafios o Núcleo de Estudos e Pesquisas em Educação de Jovens e Adultos da Faculdade de Educação da UEMG se propõe a refletir em sua busca pela indissociabilidade extensão-ensino-pesquisa?

7 Agradecemos aos professores(as) vinculados(as) ao NEPEJA, que têm contribuído ao longo dos anos de existência do Núcleo com trabalhos e reflexões sobre o campo da Educação de Jovens e Adultos em suas diferentes interfaces com os movimentos sociais, educação do campo, educação e trabalho e história da educação das populações rurais, entre eles: Josemir Almeida Barros, Enelice Gomes Miconi, Lázaro Eustáquio da Silva Simin, Jussara Pinto Magalhães Penna, Ana Catharina Mesquita de Noronha. Agradecemos também aos alunos e alunas que integraram o Núcleo e aqueles que continuam inseridos nele, quer como bolsistas, quer como voluntários.

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Nágela Brandão, Vânia Costa, Márcia Nunes Monteiro, Gilvanice Musial, Roberto Rezende, Walquíria Rosa

Essa reflexão retoma um dos grandes debates no campo acadêmico quando se define a prática universitária pela indissociabilidade extensão--pesquisa-ensino. Esse debate, quando enfrentado a partir de uma concepção mais ampliada e alargada dessa prática, parte do pressuposto de que a indissociabilidade é um de seus princípios e, portanto, a ela inerente. Visto dessa forma, passaríamos a identificar as três atividades, mesmo que de forma desigual ou diferente, em toda prática universitária.

As críticas à universidade, e em especial à sua função social, recaem com maior intensidade quando em sua prática há prioridade ou ainda uma tendência para a desigualdade entre essas atividades8. Freire (1983), Chauí (2003), Santos (2005), entre outros têm debatido o compromisso social da universidade pública. Nesse debate e no discurso corrente, a indissociabilidade extensão-pesquisa-ensino, defendida como princípio da universidade, coloca-se mais como um devir, o que exige uma constante reflexão e busca.

Essas indagações têm sido objeto de reflexão no NEPEJA, principalmente pela sua trajetória que se inicia com questões provocadas pela extensão universitária. Dessa forma, entendemos que os desafios, objeto dessa reflexão, situam-se mais diretamente na interface extensão-pesquisa. Isso não significa o abandono do princípio da indissociabilidade, ao contrário, como perspectiva do fazer universitário, a noção de interface auxilia no clareamento dos caminhos que o Núcleo vem trilhando na busca desse princípio. Embora a indissociabilidade seja um princípio orientador das práticas, a interface se coloca como um caminho trilhado rumo a esse princípio. Para tanto, explorar os significados da palavra interface pode ser interessante como exercício reflexivo. No dicionário Houaiss (2004, p. 1.633), o verbete apresenta os seguintes significados, entre outros:

1. elemento que proporciona uma ligação física ou lógica entre dois sistemas ou parte de um sistema que não poderiam ser conectadas diretamente.2. área em que coisas diversas (dois departamentos, duas ciências, etc.) interagem;3. fronteira compartilhada por dois dispositivos,

8 Um exemplo forte de distinção entre as atividades pode ser identificado com a desproporção entre o financiamento da pesquisa e da extensão.

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sistemas ou programas que trocam dados e sinais;4. superfície definida pela fronteira entre dois sistemas ou duas fases (HOUAISS, 2004, p. 1.633).

Percebemos que o verbete interface9 apresenta um leque de possibilidades que nos permite, neste momento, como processo de construção do fazer universitário, trazer para o debate termos como comuns, ligação, fronteira compartilhada, interação.

As ações desenvolvidas no âmbito da extensão têm possibilitado aos integrantes do NEPEJA refletir acerca do papel social da universidade e, em especial, da extensão. Assim, perguntamo-nos como tem se constituído historicamente as atribuições do ensino superior, bem como a relação universidade/sociedade. Tais ações têm nos levado a indagar em que medida os sujeitos da sociedade civil, sobretudo os movimentos sociais, têm sido incorporados no direito ao acesso e à criação cultural e às pesquisas científicas e tecnológicas produzidas no âmbito da universidade pública, não só como receptores, mas também como protagonistas? Tais questionamentos nos levam a refletir sobre as concepções de extensão adotadas pelas universidades e a necessidade de superar uma lógica de extensão cujos pressupostos sinalizam em direção a projetos assistencialistas visando a compensar a ausência do Estado com intenções puramente mercadológicas e esvaziada de qualquer sentido emancipatório.

É nessa direção que propomos as nossas reflexões acerca dos desafios do NEPEJA na busca pela indissociabilidade extensão-pesquisa-ensino a partir da análise da interface extensão-pesquisa nas experiências em seus projetos.

2 O Núcleo de Educação de Jovens e Adultos - NEPEJA

O Núcleo de Estudos e Pesquisas em Educação de Jovens e Adultos da Faculdade de Educação da Universidade do Estado de Minas Gerais – NEPEJA/FaE/UEMG – constituiu-se a partir da prática e da reflexão de um grupo professores e estudantes da Faculdade de Educação na atuação em diferentes espaços educativos nos quais a Educação de Jovens e Adultos se realiza. Isso tem possibilitado uma aproximação 9 A FAPEMIG tem um edital anual intitulado “Apoio a projetos de extensão em interface com a pesquisa”.

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Núcleo de Estudos e Pesquisas em Educação de Jovens e Adultos - NEPEJA:uma experiência de interface extensão e pesquisa

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das questões que envolvem as relações entre educação e trabalho, dos debates em torno da educação do campo (KOLLING et al., 1999; ARROYO et al., 2004) e, mais recentemente, das questões inerentes à história da educação das populações rurais em Minas Gerais.

O envolvimento em diferentes atividades ao longo dos últimos doze anos10, tais como a inserção no Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária – PRONERA11–, através do “Projeto educação, campo e consciência cidadã”12; a participação nas conferências estadual e nacionais de educação do campo e nos seminários de pesquisa em educação do campo13; a participação no Fórum Mineiro de Educação de Jovens e Adultos14; o diálogo iniciado com um grupo de educadores populares no âmbito da Grande BH15; a elaboração, em conjunto com educadores de jovens e adultos de acampamentos e assentamentos, de um material didático-pedagógico – Caderno do Educador – para a EJA16; o programa de estudos intitulado “Educação de jovens e adultos em áreas de reforma agrária em Minas Gerais”; os processos educativos gestados no “Projeto educação, campo e consciência cidadã”17; e a experiência recente no “Observatório

10 A experiência no desenvolvimento e na execução de atividades ligadas à EJA desde o ano 2000 levou à institucionalização do NEPEJA em julho de 2003.11 No próximo tópico, trataremos do referido programa.12 No próximo tópico, trataremos do referido projeto. 13 1997: Conferência estadual de Educação do Campo; 1998: I Conferência Nacional de Educação do Campo; II Conferência Nacional em Educação do Campo; 2005: I Encontro Nacional de Pesquisa em Educação do Campo; 2008: II Encontro Nacional de Pesquisa em Educação do Campo; 2010: III Encontro Nacional de Pesquisa em Educação do Campo.14 Durante os anos de 2001 e 2002, a Faculdade de Educação secretariou o Fórum Mineiro de Educação de Jovens e Adultos e coordenou a realização do 4º Encontro Nacional de Educação de Jovens e Adultos, em 2002.15 No ano de 2002, tivemos a oportunidade de dialogar com um grupo de educadores que participavam do processo de consolidação de um projeto desenvolvido no bairro Palmital, na cidade de Santa Luzia, em Minas Gerais. O projeto se organizara a partir da constituição de uma rede de educadores populares nas cidades de Betim, Contagem e Ribeirão das Neves com o objetivo de atender a uma parcela da população de jovens e adultos excluída do ensino regular.16 A primeira fase de elaboração desse material didático-pedagógico contou com o financiamento do Programa de Extensão (PROEXT), financiado pelo MEC, em 2007, e foi coordenado pelas professoras Márcia Helena Nunes Monteiro e Nágela Aparecida Brandão da FaE/UEMG.17 O programa mencionado foi coordenado pela professora Lourdes Helena Silva (DPE/UFV), financiado pela FAPEMIG e teve como objetivos: a) Em relação ao conjunto dos parceiros envolvidos – Universidades, MST, FETAEMG e INCRA –, identificar suas avaliações sobre o projeto e analisar suas representações sociais sobre a dinâmica de gestão implementada; b) Em relação aos educadores(as), construir uma caracterização desses sujeitos e das práticas desenvolvidas no trabalho de alfabetização, de maneira a identificar, no processo de formação vivenciado por eles(as), os fatores explicativos da adoção de um determinado conceito de alfabetização e educação de jovens e adultos; c) Em relação aos educandos(as), descrever a trajetória dos assentados(as) envolvidos no projeto, de maneira a identificar tanto os impactos do processo de alfabetização em suas vidas sócio-profissionais, quanto analisar suas representações sociais sobre o projeto.

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da educação do campo” CAPES/INEP18; apresenta-nos elementos para pensar sobre as expectativas e os desafios colocados para o Núcleo no que se refere à construção de um trabalho coletivo, marcado pelos desafios constitutivos da indissociabilidade extensão-pesquisa-ensino.

Os resultados obtidos com os projetos acima citados, aliados às práticas, às reflexões e aos debates, têm contribuído para consolidar um conjunto de produções em torno da Educação de Jovens e Adultos, mais precisamente da EJA do campo. Essas produções têm revelado a existência de uma diversidade de processos e práticas educativas na realidade do campo que exigem repensar a concepção de EJA orientadora das práticas construídas em nossa sociedade, bem como sobre as relações entre universidade e sociedade nos anos iniciais do século XXI.

É importante ressaltar que essas reflexões são oriundas da interface extensão-pesquisa realizada ao longo desses anos, o que sinaliza em direção ao fortalecimento da articulação entre universidade e movimentos sociais de maneira dialógica. Temos pautado nossas ações pela lógica do trabalho coletivo, em que nossos parceiros (movimentos sociais, sindicais, educadores populares) possam conosco participar do processo de construção de novos conhecimentos.

Ao se originar de atividades eminentemente de extensão universitária, o NEPEJA não a tratou pelo viés da prestação de serviço, mas por uma concepção que caminha no sentido de superar a perspectiva de via de mão única, tão presente nos anos 80, nas universidades brasileiras (NETO, 1996). Assim, as experiências vividas no interior dos diferentes projetos têm nos permitido caminhar em direção a uma prática de extensão que supera a dimensão de transmissão de saber pela universidade, bem como considerar os diferentes saberes produzidos no cotidiano de vida e de trabalho de homens e mulheres como saberes válidos.

Nesse sentido, no interior do NEPEJA, considera-se que a produção 18 Aprovado no âmbito do Edital nº 038/2010 – CAPES/INEP, o “Programa Observatório Educação do Campo: práticas em Educação de Jovens e Adultos, Letramento e Alternâncias Educativas” tem por objetivo congregar os grupos de pesquisas e extensão, pesquisadores e parceiros – movimentos sociais e sindicais do campo – e os programas de pós-graduação das três universidades públicas mineiras em torno de um trabalho articulado de pesquisa que visa a dar continuidade e avançar na sistematização e nos estudos que vêm sendo realizados em torno dos temas práticas de Educação de Jovens e Adultos, alfabetização e letramento e alternâncias educativas, de maneira a contribuir para o aprofundamento das reflexões e análises sobre as experiências de EJA na educação do campo. O referido projeto conta com a coordenação geral da Professora Lourdes Helena da Silva da DPE/UFV.

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do conhecimento, comprometido com os processos de transformação social, deve considerar a participação efetiva da comunidade, de forma interativa e coletiva. Nesse processo, os sujeitos contribuem com os processos de produção de conhecimentos que têm como ponto de partida a reflexão sobre sua realidade imediata.

Cabe ressaltar que a temática da educação do campo, nos últimos tempos, tem se consolidado nas produções acadêmicas e, principalmente, no cenário político nacional, com as lutas dos movimentos sociais, sindicais e tantos outros por políticas públicas de educação do campo.

Tais ações se coadunam com uma revisão profunda da concepção de universidade e de extensão. O papel da universidade assume um novo sentido a partir de sua inserção nas ações coletivas de formação humana desenvolvidas no âmbito dos movimentos sociais. Assim, a universidade passa a ser o espaço de discussões, de produção científica, tendo por base o trabalho coletivo, a partir do elo do compromisso social, na medida em que essa passa a ser participativa e coconstrutora dos saberes de novos modos de organização coletiva e de cidadania.

Assim, reconhecemos que a realidade da EJA do campo (RESENDE et al., 2011) é um tema ainda a ser mapeado, considerando a existência de uma diversidade de práticas e experiências dispersas no cotidiano do campo, captadas durante todos esses anos, e que demandam estudos mais específicos que se apresentam como novos desafios à universidade. Quais são eles? Para contribuir para esse debate, apresentamos em seguida a experiência do NEPEJA, em três de seus projetos.

2.1 Projeto educação, campo e consciência cidadã

O “Projeto educação, campo e consciência cidadã: 1º segmento do Ensino Fundamental” foi desenvolvido no interior do PRONERA/INCRA/MG desde 2001 e é coordenado pela Faculdade de Educação da Universidade do Estado de Minas Gerais.

O PRONERA19 é abalizado por princípios político-pedagógicos, nos 19 “[...] a Educação do campo nasceu das demandas dos movimentos camponeses na construção de uma política educacional para os assentamentos de reforma agrária. Este é um fato extremamente relevante na compreensão da história da educação do campo. Dessa demanda também nasceu o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (PRONERA).” (FERNANDES, 2005, p. 1-2).

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quais se articulam a inclusão de fundamentos teórico-metodológicos que ampliam as condições do acesso à educação como um direito social fundamental na construção da cidadania dos jovens e adultos que vivem nas áreas de reforma agrária; a indicação das demandas educacionais pelas comunidades das áreas de reforma agrária e suas organizações que, em conjunto com os demais parceiros, decidem sobre a elaboração, a execução e o acompanhamento dos projetos; a interação das ações desenvolvidas por meio de parcerias entre órgãos governamentais, instituições públicas de ensino e instituições comunitárias de ensino sem fins lucrativos, comunidades assentadas nas áreas de reforma agrária e as suas organizações; e a multiplicação que se relaciona à ampliação não só do número de pessoas alfabetizadas e formadas em diferentes níveis de ensino, mas também do número de educadores, de técnicos/agentes mobilizadores nas áreas de reforma agrária.

Esses princípios têm orientado a experiência do “Projeto educação, campo e consciência cidadã”20, que, de 2001 a 2012, desenvolveu quatro projetos21. Os quatro projetos envolveram a alfabetização e a escolarização de jovens e adultos de assentamentos e acampamentos de reforma agrária de seis regiões de Minas Gerais – Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba, Vale do Jequitinhonha, Mucuri, Vale do Rio Doce, Centro-Sul e Norte.

Ao longo desses anos, o projeto vem cumprindo três objetivos. O primeiro, a alfabetização e escolarização no 1º segmento do Ensino Fundamental, incluindo a certificação referente a esse segmento. O segundo, a capacitação de educadores(as) através de ciclos de formação, oficinas e visitas às salas de aula. O terceiro, e, pontualmente, a certificação no 2º segmento22 do Ensino Fundamental de jovens e adultos,

20 Ao longo dos projetos, construiu-se uma identidade para o trabalho que acabou sendo intitulado: “Projeto Educação, Campo e Consciência Cidadã”. Todavia, cada um dos projetos teve um convênio específico, com metas próprias. Em 2005, o referido projeto ganhou o prêmio Medalha Paulo Freire, concedido pelo MEC.21 O primeiro projeto foi coordenado pela FAFIDIA/UEMG e os outros três pela FaE/UEMG. Têm sido parceiros mais permanentes ao longo desses dez anos, a Faculdade de Educação da Universidade do Estado de Minas Gerais, Departamento de Educação da Universidade Federal de Viçosa, Faculdade de Filosofia e Letras de Diamantina, Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, Federação dos Trabalhadores Rurais da Agricultura do Estado de Minas Gerais. Em cada um dos convênios estiveram presentes fundações que fizeram a gestão financeira dos projetos (2000-2002: FEVALE; 2003-2004: FRAMINAS; 2004-2007: FUNARBE; 2007-2012: FUNDEP) pelas universidades e instituições de ensino superior e pelos movimentos sociais e sindicais parceiros.22 O 2º segmento se refere aos quatro últimos anos do Ensino Fundamental e foi desenvolvido na terceira versão do projeto (2004-2007).

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educadores(as) do projeto. A experiência construída nos quatro projetos, relacionada à

alfabetização e escolarização no primeiro segmento do Ensino Fundamental, tem provocado um conjunto de reflexões e, a partir disso, publicações (SILVA et al., 2007; SILVA, 2009; SILVA et al., 2010; ROSA et al., 2009; COSTA et al., 2010; BRANDÃO, MUSIAL, 2010; SILVA, COSTA, ROSA, 201123; entre outras) em torno do processo de formação dos educadores(as) envolvidos no projeto. As questões ali suscitadas foram sistematizadas em um programa de estudos intitulado “Educação de jovens e adultos em áreas de reforma agrária em Minas Gerais: os processos educativos gestados no Projeto educação, campo e consciência cidadã”, coordenado pelo Departamento de Educação da Universidade Federal de Viçosa24, uma parceria fundada no diálogo e na ação coletiva em prol da construção do conhecimento.

Nesse sentido, um aspecto importante é a experiência de gestão e formação coletiva. Busca-se, nessa lógica, avançar na concepção, gestão e elaboração de um modelo de formação que visa a ampliar a mobilização dos envolvidos, aprofundar a discussão acerca dos eixos temáticos e elaborar conjuntamente a programação das atividades do projeto, afirmando o “Projeto educação, campo e consciência cidadã” como lócus formativo de todos os envolvidos na sua implementação, professores(as), alunos(as) universitários(as), educadores(as) de EJA das áreas de reforma agrária e lideranças dos movimentos sociais/sindicais parceiros. Assim sendo, o projeto contribui de maneira significativa para a emergência de um novo olhar para os sujeitos da EJA25, seus movimentos de luta, seus modos de vida e as formas de opressão social que vivenciam. Nesse sentido, as questões que afetam o cotidiano dos acampados e assentados e suas trajetórias de lutas no interior dos movimentos sociais se tornam também presentes no cotidiano das universidades públicas envolvidas.

A presença da sala de aula nos espaços de vida dos educandos(as),

23 Artigo recebeu 1º lugar no Concurso Nacional de Artigos Científicos sobre Educação para a Diversidade, na área temática Alfabetização e Educação de Jovens e Adultos – ANPED/SECAD.24 A Professora Lourdes Helena Silva (DPE/UFV) foi a coordenadora deste programa de pesquisas.25 Para Arroyo (2005), esse novo olhar exige que se abandonem orientações supletivas e assistencialistas, de maneira a contribuir para que a Educação de Jovens de Adultos se efetive como uma política pública, como um dever do Estado.

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ou seja, nos assentamentos e acampamentos da reforma agrária provoca uma reflexão importante construída através das experiências do referido projeto (BARROS, AQUINO, SANTOS, 2010a; BARROS, AQUINO, SANTOS, 2010b). A garantia desse espaço/tempo, além de permitir o acesso e a realização dos processos educativos, materializa uma perspectiva de vida centrada na luta, na mobilização e na organização em prol de uma sociedade mais justa, fraterna, favorecendo, assim, o reconhecimento e a afirmação da identidade dos sujeitos assentados e acampados, bem como o fortalecimento das forças sociais ali existentes.

Arroyo (2005) insiste que é fundamental ampliar os olhares sobre os sujeitos da EJA, considerar não apenas suas trajetórias escolares truncadas, mas construir uma sensibilidade para suas trajetórias humanas, de vida, suas identidades coletivas de classe, gênero, raça, etnia. É preciso olhar para a trajetória perversa de exclusão social, de negação de direitos básicos à vida, ao trabalho e à sobrevivência. O autor aponta, ainda, para a necessidade de captar as trajetórias humanas na sua totalidade e as perceber como construtoras de percursos de socialização e sociabilidade, de busca de saberes, interrogação, tentativas de escolhas e formação de valores. As trajetórias escolares e humanas truncadas não significam a paralisação nos processos de formação mental, ética, identitária, cultural, social e política. Os jovens e adultos – homens e mulheres – trazem consigo um acúmulo de formação e aprendizagens que devem ser considerados no processo de escolarização desses sujeitos.

Em relação aos educadores(as), os resultados do programa de estudo revelam um conjunto das aprendizagens por eles(as) desenvolvidas nos diferentes tempos e espaços pedagógicos do projeto, do movimento social, assim como de outros espaços e/ou processos de escolarização formal. Cabe aqui ressaltar nessa direção o lugar ocupado pelas mulheres-educadoras que participam do projeto, que, em suas trajetórias como educadoras, refletem sistematicamente sobre suas histórias, suas condições de vida, suas escolhas e sobre os lugares que ocupam nos movimentos sociais.

Elas se veem envolvidas com o seu processo de formação e se mostram atentas aos seus processos de escolarização, bem como reconhecem a necessidade de continuidade dos estudos e da formação, e, para tal,

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empreendem ações objetivando a realização desses propósitos. Todavia, não deixam de reconhecer a existência de outros espaços significativos de aprendizagens para além dos processos de educação formal.

Pode-se afirmar que a prática pedagógica dos educadores no interior do referido projeto apresenta as seguintes especificidades: o trabalho é o tempo todo marcado pelas situações de sala de aula e vai sendo construído a partir dessas situações; embora os momentos de formação e acompanhamento pedagógico signifiquem muito no processo de formação dos educadores, é no cotidiano da sala de aula, sozinhos com os educandos, que os educadores constroem estratégias e redefinem as finalidades do trabalho; ao mesmo tempo em que interpretam e adaptam seus objetivos em função das situações concretas de trabalho, os educadores concebem e constroem meios para a realização dos objetivos.

Confirmou-se também a compreensão de que assentamentos e acampamentos26 de reforma agrária se configuram como espaços, territórios (FERNANDES, 2005) e organizações sociais diferenciadas, cujas especificidades se expressam nos desafios enfrentados pela EJA. Explicitam-se, assim, as tensões e as fronteiras da educação formal com a educação não formal própria da EJA, a própria ressignificação da concepção do que seja considerada uma aula que passa pela discussão e (re)definição, realizadas em conjunto pelos educandos(as) e educadores(as), sobre as aprendizagens envolvidas e os espaços de formação existentes no cotidiano de vida e de trabalho dos sujeitos da EJA. Dessa forma,

[...] conceber essas políticas impõe-nos desafios da produção de novos saberes inter-transdisciplinares, que sejam capazes de articular diferentes dimensões da vida dos sujeitos do campo, aliadas ao seu processo educacional, ou seja, uma escola colada ao chão da vida, ligada aos processos de produção da existência social desses sujeitos (MOLINA, 2008, p. 30).

26 O movimento social ocupa a terra devoluta ou improdutiva e ali as pessoas passam a viver em um acampamento que tem um sentido pedagógico de organização da vida em comum das famílias sem-terra debaixo das lonas, em situação de extrema precariedade material, mas de muita riqueza humana. É um espaço social de formação identitária de uma coletividade. Quando as terras são conquistadas pelo movimento social e, na perspectiva do Estado, a área é destinada a um conjunto de famílias sem-terra como forma de solucionar um problema fundiário, constitui-se um assentamento. Para o MST, o assentamento é um processo histórico de transição e transformação, de organização do território, do espaço agrário em questão. (CALDART, 2004).

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Deve-se ressaltar aqui a materialização de uma das diretrizes da extensão, qual seja o da bilateralidade, segundo o qual, há, conforme aponta Zedine (2011, p. 9), “[...] uma relação de reciprocidade, mutuamente transformadora, a partir da qual o saber científico se associa ao saber popular, a teoria à prática, onde se percebe um movimento dialético”, mediatizado pela realidade concreta vivida pelos sujeitos em suas comunidades.

No interior do referido projeto, a universidade foi responsável pela formação dos educadores(as) e pelo acompanhamento das turmas de educação de jovens e adultos. A formação e o acompanhamento eram realizados em três formatos: visitas às turmas nos assentamentos e acampamentos de reforma agrária, oficinas em cada uma das regiões, e ciclos de formação em Belo Horizonte. O conjunto dessas atividades de formação e os processos reflexivos em torno dessas práticas, bem como a realização da pesquisa, já citada, que analisou os processos educativos gestados a partir dos diferentes parceiros envolvidos nos projetos de extensão desenvolvidos, evidenciaram, sobretudo, a importância da produção de um material didático-pedagógico para os(as) educadores(as). E é sobre essa experiência que nos debruçaremos no próximo tópico.

2.2 Projeto elaboração de material didático-pedagógicopara a educação de jovens e adultos: uma construção coletiva

O “Projeto elaboração de material didático-pedagógico27 para a educação de jovens e adultos de acampamentos e assentamentos de reforma agrária”, que deu origem ao “Caderno do educador”, é resultado de uma demanda dos educadores e das educadoras que atuavam nas salas de aula dos assentamentos e acampamentos de reforma agrária de Minas Gerais.

O trabalho educativo desenvolvido nos assentamentos e acampamentos mostrou a capacidade e criatividade dos educadores e das educadoras. Mostrou ainda a necessidade de se criar um material didático adequado aos educandos, jovens e adultos, e ao seu contexto

27 Este projeto foi inicialmente financiado pelo PROEXT/MEC, em 2007.

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sociocultural. Considerando os educadores e as educadoras como autores de sua prática pedagógica, o projeto teve como objetivo geral elaborar um material com eles, a partir do trabalho que realizavam em sala de aula, e intensificar a formação como pesquisadores(as) da e com as comunidades das quais fazem parte.

Para a elaboração do “Caderno do educador”, foi feita uma pesquisa com a intenção de se obter informações mais sistemáticas sobre a prática pedagógica desenvolvida nas turmas de educação de jovens e adultos. Em razão do objetivo do projeto, da realidade dos assentamentos e acampamentos, da sua localização de norte a sul de Minas Gerais e do número de educadores e educadoras (75), optou-se por uma metodologia de pesquisa que assegurasse, naquele momento (de 2005 a 2007), a participação de todos educadores e educadoras de forma direta ou representativa. Os educadores e as educadoras que fizeram parte do grupo representativo foram indicados pelos movimentos sociais e sindicais, pelos professores e pelos alunos universitários que atuavam com os educadores no “Projeto educação, campo e consciência cidadã: 1º segmento do Ensino Fundamental”.

A concepção metodológica que norteou o projeto se pautou em trabalhos que veem os educadores como coparticipantes da construção de projetos políticos-pedagógicos e do currículo. Nesse grupo se destacam Giroux (1997), Sacristan (1998), Nóvoa (1995), Perrenoud (1993) e Freire (no conjunto de sua obra). Giroux (1997) explicita a sua opção por encarar os professores como intelectuais, o que significa, segundo ele, fornecer uma “[...] vigorosa crítica teórica das ideologias tecnocráticas e instrumentais subjacentes à teoria educacional que separa a conceituação, planejamento e organização curricular dos processos de implementação e execução.” (GIROUX, 1997, p. 161). A metodologia foi pautada em momentos inter-relacionados e, às vezes, simultâneos e que não podem ser vistos como etapas lineares.

No primeiro momento de elaboração desse material, como citado, foi feita uma pesquisa com todos os educadores e educadoras que participavam do projeto e que responderam a questões relativas ao seu trabalho: temas, conteúdos, atividades. No segundo momento, foi feita

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uma entrevista com roteiro previamente construído, com a intenção de identificar alguns elementos de suas práticas pedagógicas. As informações obtidas na pesquisa mais ampla e nas entrevistas foram organizadas e analisadas de modo que pudessem orientar a construção do material.

No terceiro momento, universidade (professores e alunos bolsistas) e movimentos sociais e sindicais passaram a identificar as experiências de sala de aula que iam ao encontro das temáticas indicadas na fase anterior da pesquisa. Cada experiência identificada foi registrada por um professor da universidade a partir de entrevista com o educador que a realizou e dos materiais que haviam sido produzidos. Dessa forma, as atividades selecionadas para o material didático-pedagógico, construídas pelos educadores e educadoras, foram relatadas, refletidas e teorizadas pelo professor universitário e reelaboradas por um grupo de doze educadores(as) com a participação de professores e alunos universitários. O resultado desse processo contou com a diagramação e editoração realizada por alunos estagiários da Escola de Design da UEMG e ficou denominado “Caderno do educador”.

Esse caderno possui a seguinte sequência: o histórico do projeto e da pesquisa, um texto sobre Planejamento – relato oral feito por uma educadora do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra de Minas Gerais (MST/MG) – e outro sobre O primeiro dia de aula – carta de uma educadora da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de Minas Gerais (FETAEMG) –, ambos adaptados para esse caderno. Os temas e as atividades correspondentes a cada tema foram indicados pela pesquisa realizada com os educadores e as educadoras, e apresentados no caderno na seguinte ordem: Identidade, Reforma Agrária, Trabalho, Ofícios e Bilhetes, Meio Ambiente e Cooperação.

O trabalho e o investimento realizado na elaboração do caderno exigem uma nova etapa de investigação, de modo a identificar, refletir e analisar o processo de apropriação dos educadores e das educadoras desse material didático-pedagógico destinado à educação de jovens e adultos que vivem nos assentamentos e acampamentos de reforma agrária em pelo menos duas regiões de Minas Gerais. As reflexões a seguir dizem respeito a essa experiência.

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3 Os modos de apropriação do material didático--pedagógico por educadores de jovens e adultos de acampamentos e assentamentos de reforma agrária

Buscando compreender, no campo da formação de educadores, como se dá o processo de apropriação de um material didático-pedagógico produzido com educadores de jovens e adultos foi elaborado o projeto “Educação do campo em construção: apropriação de material didático-pedagógico por educadores de jovens e adultos”.28 Pautado pelos pressupostos teórico-metodológicos anteriormente explicitados, o projeto foi organizado em alguns momentos inter- -relacionados: o primeiro momento foi destinado a instaurar o interesse e o envolvimento dos(as) educadores(as) para a participação no processo de uso e de reelaboração do material didático-pedagógico. Para tanto, organizou-se um seminário com a participação de educadoras de duas regiões de Minas Gerais, quais sejam Norte e Rio Doce29. O evento contou ainda com a presença de três educadores da educação básica30 e bolsistas de iniciação científica da FaE/UEMG que acompanham os trabalhos nas duas regiões que participam do projeto. Lideranças do MST e da FETAEMG também marcaram presença. A coordenação dos trabalhos foi realizada por professores da FaE/UEMG nos diferentes temas discutidos e analisados durante o dia de trabalho.

Os temas debatidos durante o seminário foram assim definidos: em um primeiro momento, apresentação do “Caderno do educador” e seu histórico, em seguida, apresentação do “Observatório da educação do campo” e do projeto de pesquisa em questão. Na sequência, foi discutida a metodologia de trabalho/pesquisa e construído, coletivamente, o

28 O referido projeto integra o “Observatório da Educação do Campo: educação de jovens e adultos, alternâncias educativas e letramento”, financiado pela CAPES (2010-2012), tem a coordenação geral da Professora Lourdes Helena Silva, DPE/UFV e na FaE/UEMG é coordenado pela Professora Gilvanice Barbosa da Silva Musial. Conta ainda com a coordenação da professora Maria do Socorro Alencar Nunes Macedo, pela UFSJ. Essa proposta do Observatório é desenvolvida pelas três universidades que compõem um Núcleo em Rede, integrando os seus programas de pós-graduação em educação.29 O referido seminário contou com a presença de três educadoras de salas de aula de educação de jovens e adultos das seguintes áreas: acampamento Eloy Ferreira do MST, em Engenheiro Navarro-MG, assentamentos Para Terra I e Betinho da FETAEMG, localizados em Bocaiúva-MG, todos da região Norte de Minas Gerais.30 Dois representantes do MST (um da região Norte e outra do Rio Doce) e um da FETAEMG (região Norte).

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cronograma de trabalho para os meses de agosto a dezembro de 2011.Os educadores de jovens e adultos de acampamentos e assentamentos

receberam e analisaram o material didático-pedagógico e demonstraram grande interesse em trabalhar com ele nas suas salas de aula. Sendo assim, definiu-se que esses educadores de jovens e adultos utilizariam o material durante os meses de agosto de 2011 a junho de 2012 e fariam anotações diárias sobre o planejamento, o acontecimento (aula propriamente dita) e a avaliação do acontecimento. Na oportunidade, destacou-se que o primeiro ponto considerado pelos educadores é que o “Caderno do educador” é um instrumento que possibilita conhecer, entender mais sobre a educação de jovens e adultos do campo e, consequentemente, apresenta contribuições para o referido campo. Outro ponto destacou que a simbologia que envolve o material ajuda a construir um sentido no cotidiano da sala de aula. Entretanto, antes de tomarem o material, algumas questões são muito importantes: O que fazer com o material? O que fazer a partir do momento que tomam o material nas mãos? E por onde começar?

Nesse sentido, ressaltou-se que esse material não se destina à alfabetização especificamente, embora possa ser utilizado em alguns momentos dos processos de aquisição da leitura. Outra característica é o fato de o material não se constituir em livro de uso diário. Antes, constitui-se como um material de apoio ao educador de jovens e adultos no processo de ensino da leitura e da escrita, entendidas como práticas sociais, e está organizado por temas, em que cada um deles compreende um relato sucinto sobre a experiência que deu origem à referida unidade de estudo, texto de aprofundamento sobre o tema escolhido e as sugestões de atividades.

O segundo momento, já iniciado, refere-se ao mapeamento e descrição das práticas pedagógicas desenvolvidas nas turmas de educação de jovens e adultos. A observação e o registro estão sendo realizados por alunas universitárias – bolsistas de iniciação científica –, educadores da educação básica e educadoras da educação de jovens e adultos, que utilizarão o material durante os meses de agosto de 2011 a junho de 2012. Os registros serão realizados durante os onze meses em períodos contínuos de uma semana a cada dois meses para as bolsistas de iniciação

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científica, semanalmente para os educadores da educação básica e diariamente para as educadoras da EJA.

O terceiro momento compreenderá a análise dos usos e apropriações do material pelos(as) educadores(as). Nesse momento serão sistematizados os referenciais teóricos que orientam esse projeto. O resultado dessas análises orientará tanto a reformulação do material quanto a formação continuada de educadores da EJA que participarão de todo o processo. O quarto momento será específico para a reelaboração e formatação final do material didático-pedagógico. O projeto culminará com a realização de um seminário final envolvendo os participantes e outros interlocutores da comunidade e da sociedade diretamente relacionados à educação de jovens e adultos em um debate sobre a educação do campo.

4 Considerações finais

As análises das produções teóricas dos seminários e encontros de pesquisadores da educação do campo revelam que ainda são poucos os estudos que têm como foco as experiências de educação de jovens e adultos que se realizam no campo brasileiro.

Essa situação expressa a necessidade de um aprofundamento da interface educação do campo e educação de jovens e adultos, o que os projetos aqui apresentados têm se proposto e o fazem, colocando como foco central a formação de educadores e a produção de material didático-pedagógico para a educação de jovens e adultos do campo, de forma compartilhada com educadores e educadoras de áreas de reforma agrária de diferentes regiões de Minas Gerais.

Desse modo, tanto a formação de educadores e educadoras, como produção de material didático-pedagógico para educação de jovens e adultos adquirem novos significados na vida e no trabalho dos assentados e dos acampados rurais, como na própria ação da universidade, que pode ressignificar seu papel político e social nas parcerias com os movimentos sociais e sindicais do campo.

Dessa forma, as atividades do NEPEJA em torno dos projetos apresentados aqui possibilitam uma reflexão acerca da concepção de

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universidade e de extensão, bem como do desafio da indissociabilidade extensão-ensino-pesquisa. Isso nos leva a aprofundar os questionamentos e a indagar acerca da relação estabelecida com a produção do conhecimento e a relação que estabelecemos com os movimentos e os sujeitos sociais como coparticipantes dessa produção.

A concepção de extensão como prática construída com os sujeitos e não para (assistencialista) se evidencia na experiência realizada no interior dos projetos desenvolvidos pelo NEPEJA e parceiros, sobretudo os vinculados aos movimentos sindicais e sociais do campo. Assim, a gestão e a formação coletiva nos processos de organização e desenvolvimento do trabalho nos projetos em seus vários âmbitos, como, por exemplo, o planejamento e a execução coletiva dos ciclos e oficinas de formação de educadores, a produção de material didático, entre outros, afirmam uma visão de extensão como atividade emancipadora, como construção conjunta de conhecimentos e modos de intervenção na realidade e não política compensatória diante da ausência do Estado.

As ações desenvolvidas nos diferentes projetos remetem à reflexão sobre a necessidade de se ampliarem as discussões acerca das fronteiras entre os papéis de formação e as práticas educativas desenvolvidas pelos movimentos sociais e a universidade. Nesse sentido, aprendemos nessas ações que a produção do conhecimento tem como base a realidade concreta na qual estamos inseridos, movimentos sociais e universidade, como integrantes da sociedade civil.

A experiência de formação coletiva vivida e as produções teóricas delas decorrentes nos são colocadas como desafios: na interface entre extensão e pesquisa, a compreensão do significado da alfabetização na vida de jovens e adultos acampados e assentados rurais e maior clareza sobre os fatores que possibilitam a criação e a permanência de uma sala de aula em determinada comunidade, tendo em vista os índices de evasão na educação de jovens e adultos. Acreditamos que o aprofundamento da interlocução entre movimentos sociais e universidades visando à ampliação dos conhecimentos das diferentes e diversas práticas da EJA do campo e das possibilidades de intervenção coletiva nessas realidades contribuirá para o fortalecimento dessa interface. Na interface

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entre extensão e ensino, entendemos que, para além da formação de bolsistas de extensão e de pesquisa, nas questões tratadas no interior das experiências do NEPEJA, precisamos avançar na formação do pedagogo no interior do curso da FaE/UEMG, de modo que, para além da formação específica para educação infantil e séries iniciais, também possa formar educadores de jovens e adultos.

Finalmente, insistimos que o nosso desafio é a indissociabilidade extensão-pesquisa-ensino e que a análise na perspectiva da interface extensão-pesquisa se constitui um exercício analítico importante como parte do processo de construção do fazer universitário.

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Center for Studies and Research Youth and Adult – NEPEJA: one extension interface

experience and research

Abstract

The actions developed by the Nucleus of Studies and Researches in the Youth and Adults Education by the College of Education of the University of the State of Minas Gerais (NEPEJA/FaE/UEMG) have enabled its members to reflect upon the social role of the university, especially the role of extension. Such actions have made us wonder to what extent the civil society individuals, especially the ones from the social movements have been included in the rights of the access and cultural creation as well as the scientific and technological researches performed in the public university settings, not only as receptors but also as participants and protagonists. This text pursuits the reflection upon the challenges of the inseparableness of teaching, research and extension from the experiences of the projects developed by the NEPEJA and its partners, particularly the projects related to the education of the youth and adults of the rural areas. The notion of interface aided in the comprehension of the course of the action of the Nucleus in the aim of inseparableness of teaching, research and extension.

Keywords: Education of Youth and Adults (EJA); EJA of rural areas; teaching-research-extension.

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Recebido: 14/09/11Aprovado: 09/12/11

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Resumo

A diversidade presente nas escolas atuais e os constantes questionamentos que se apresentam à educação fazem emergir um novo conhecimento escolar que passa a exigir múltiplas habilidades do(a) professor(a). Que tipo de formação o(a) professor(a) precisa para lidar com tantas situações que envolvem a diversidade e as políticas de inclusão em curso no Brasil? Quais os recursos internos/subjetivos que ele precisa mobilizar em si para ensinar aos alunos? O presente artigo tem como objetivo discutir a formação docente visando às múltiplas situações em que se veem envolvidos durante uma jornada de trabalho, a partir da metodologia da conversação, realizada com grupos de docentes, elucidando em seus resultados o caráter provisório do saber e da formação docente.

Palavras-Chave: formação docente; subjetividade; diversidade; inclusão.

1 Professora adjunta de Psicologia da Universidade Federal de Ouro Preto. Integrante do Programa de Pós-Graduação do Mestrado em Educação da UFOP.

1 O contexto sócio-histórico cultural educacional

Uma professora de 52 anos diz na conversação que não suporta mais ser professora, que quer se aposentar, pois essa história agora de colocar crianças que tem paralisia cerebral junto com as outras para ela é insuportável. Ela diz que o aluno tem problemas graves, grita, bate o pé pra fazer o que quer. Diz que gosta muito de dar aula, mas não aguenta mais a presença desse aluno.

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Uma outra relata que o seu sofrimento se refere às crianças pobres e negras que vão à escola apenas para comer..que não querem aprender nada...Uma terceira diz da sua dificuldade com os adolescentes que querem insistentemente falar de sexualidade e trazer à tona as experiências que vivem com meninos e meninas. Um professor se refere a uma situação em que recebeu por ordem do juiz um adolescente de 12 anos que tinha matado uma criança e estava cumprindo medida socioeducativa. (DINIZ, 2010)

O mundo contemporâneo, desde a segunda metade do século XX, assiste sistematicamente à emergência de movimentos sociais urbanos e não urbanos que lutam pelo reconhecimento de suas ideias e concepções políticas. Diferentes grupos passaram a manifestar suas formas de ver o mundo (gays, lésbicas, mulheres, crianças, jovens, velhos, punks, pessoas com deficiência e\ou necessidades especiais, índios, negros) em contraposição a um modelo hegemônico que valorizava a homogeneização e uma pretensa igualdade no trato social. Esses grupos, então, estão requerendo da sociedade capitalista a igualdade de direitos em relação aos que se enquadram nos modelos pré-estabelecidos. A novidade que esses grupos e os movimentos por eles engendrados apresentam é o conceito de diferença, que passa a ser entendida como o reconhecimento das múltiplas formas de manifestar os gêneros, a sexualidade, a etnia etc. A diferença se alia à constituição das novas identidades que passam a configurar-se na ordem social vigente. Esses sujeitos exigem o direito de manifestar sua subjetividade e identidade cultural marcadamente singular e não fixa, podendo ser provisoriamente atraentes e, depois, descartadas, abandonadas, rejeitadas.

A partir dessas mudanças manifestas no campo social, cultural e educacional, intensificadas na década de 1990, surgiram questões que colocam os profissionais que atuam diretamente com o público que frequenta esses espaços em situações embaraçosas. A partir da pluralidade de manifestações comportamentais, religiosas, políticas, sexuais, estéticas, de pensamento e inúmeras outras, os profissionais da educação têm se perguntado: o que fazer? Como agir em relação

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a essas diferenças? Como lidar com os diferentes sujeitos que manifestam e querem manifestar-se de formas variadas no tecido social e consequentemente na escola?

Atualmente, observamos uma intensificação social da temática da diversidade cultural, que, por sua vez, impacta a sociedade, e especialmente a educação, de forma intensa: de um lado, situações de violência e de discriminação racial, de gênero, de condição social, de sexualidade, de diferenças físicas, mentais e tantas outras que ocupam a cena da cultura escolar e social, muitas vezes traduzidas em exclusão. Do outro, a tentativa de absorvê-la a partir de políticas de direitos universalistas que defendem seu pertencimento, mas evidenciam as particularidades subjetivas que por vezes também escapam a essa perspectiva.

Na formação docente inicial e continuada, muitos profissionais expõem situações que envolvem as práticas educativas formais e não formais. O que temos constatado nos discursos dos profissionais da educação é que a formação inicial dos cursos de graduação não tem suprido essa formação. Esses profissionais não se sentem preparados para lidar com essa gama de questões, embora já tragam em seus discursos a vontade de construir uma sociedade inclusiva. Silenciadas nos conteúdos disciplinares e nos aspectos mais gerais da formação desses profissionais que atuam no campo educacional, as questões que envolvem as diferenças ficam, muitas vezes, reservadas às suas vivências e atuações nas quais se veem impotentes diante dessa diversidade de situações. Dessa forma, aprendizagens caricatas sobre as diferenças vão se tecendo no espaço escolar, alargando e fomentando importantes preconceitos construídos pela humanidade. Pensar e desenvolver uma formação que visa a forjar práticas educativas para o público da diversidade implica pensar tanto as teorias e os campos de saber propícios a essa formação, quanto considerar a subjetividade do(a) docente para enfrentar a gama de valores que geram conflitos tão presentes nos espaços educativos e nas políticas públicas educacionais. As práticas dos profissionais que atuam com esse público estão marcadas por uma formação precária para atuar com esses sujeitos, pois em grande parte sua formação baseou-se num modelo em que a questão ética não se fez presente, não interrogando os

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valores subjetivos dos professores e professoras, escondendo também os sujeitos submetidos a essas práticas. O modelo da racionalidade técnica que vigorou por muito tempo na formação docente não era e não é capaz de considerar a existência de sujeitos em sua particularidade, nem a dos(as) formadores(as) nem dos(as) alunos(as) que hoje frequentam as escolas.

A seguir farei uma breve retomada desse modelo na formação docente para, em seguida, avançar um pouco nesse paradigma, discutindo quais seriam os princípios a serem considerados em uma formação docente para a diversidade e inclusão numa perspectiva ética.

2 Breve retrospectiva dos elementos presentesna formação docente

Os estudos produzidos sobre a formação e o trabalho docente têm apresentado mudanças ao longo das décadas. As linhas de pesquisa, até a década de 1960, centravam suas investigações em encontrar características pessoais do professor e relacioná-las à aprendizagem dos alunos2.

No início da década de 1970, as investigações sobre o professor sofrem uma mudança de paradigma ao focalizarem os estudos não mais em características pessoais, mas na situação de ensino propriamente dita, centrando-se na observação e análise da atuação docente. Ao final dessa década, enfatizou-se a investigação sobre o professor cuja preocupação residiu nos processos de pensamento e de tomada de decisões dos docentes durante sua atividade profissional.

A discussão sobre a formação vem se destacando muito nas conferências e seminários sobre educação desde o final da década de 1970, época em que se iniciou um movimento de reflexão sobre a escola brasileira, partindo de sua realidade, buscando caminhos que permitissem a saída da crise em que se encontrava tanto a escola brasileira, quanto o ensino que nela se efetivava. A preocupação com o

2 A despeito da minha opção em incorporar neste texto as recentes discussões sobre gênero, anunciando correntemente, por exemplo, “professor” e “professora”, ao invés de tão somente o modo genérico e habitual da língua culta “professor”, dada a perspectiva histórica do apanhado das concepções sobre formação e profissão docente nos anos 1960, 1970 e parte dos anos 1980, o debate sobre gênero ainda não havia resultado na mudança no estilo de escrita. Daí, optar nesta parte do texto em manter a forma genérica de tratar o gênero masculino e o feminino.

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fracasso escolar levou os educadores à discussão e à análise dos fatores responsáveis pela baixa qualidade do ensino e da possibilidade de se oferecer uma boa escola à população de baixa renda. Evidenciou-se a necessidade de melhorar a formação dos professores como condição para a melhoria da qualidade do ensino em geral.

Durante os debates ocorridos no “I Seminário de Educação Brasileira”, realizado na Universidade Estadual de Campinas, em 1978, foi muito discutida a ideia de que as licenciaturas e o curso de pedagogia deveriam, antes de tudo, formar o educador; ressaltando-se, assim, a primazia do ato de educar sobre o ato de ensinar.

Os enfoques investigativos do início dos anos 1980 referem-se ao caráter político da prática pedagógica e ao compromisso do educador com as classes populares. Nesse momento, procurou-se definir a natureza da função docente e o papel do educador para se direcionar às reformas dos cursos de formação de educadores.

Após os primeiros anos da década de 1980, a preocupação com a formação técnica do educador ganhou considerável importância, ao mesmo tempo que a questão da formação política do futuro educador. Nesse contexto, a competência técnica (traduzida pelo domínio do conteúdo do saber escolar e dos métodos adequados para se transmitir este conteúdo às crianças que não apresentam pré-condições estabelecidas para sua aprendizagem), à qual subjaz um suporte pedagógico e um compromisso educacional e social, apresenta-se como condição necessária para que o educador assuma um compromisso político. A formação técnica deveria envolver tanto o conhecimento específico de determinado campo, quanto o conhecimento pedagógico, o que gerou inúmeras críticas de educadores em relação à estrutura e ao conteúdo dos cursos de formação de professores e especialistas cuja marca era a justaposição da parte de conteúdo específico à de formação pedagógica.

Outra vertente que se fez valer na década de 1980 foram as pesquisas sobre o pensamento do professor, que focalizam o seu conhecimento prático pessoal. Para Nóvoa (1991), nesse paradigma, a concepção de professor é a de um profissional ativo, autônomo, que reflete, analisa e interpreta sua própria prática. O paradigma norteado pelo pensamento

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do professor deu início a diversas investigações que analisaram os tipos de conhecimentos que os professores elaboram e utilizam no cotidiano escolar. Os estudos dos processos de pensamento e ação do professor ressaltam duas dimensões da cognição: o processamento de informações e a tomada de decisões. Nesses dois enfoques investigativos dos processos de pensamento dos professores, destacam-se que o modelo de tomada de decisões estuda como o professor decide e o que deve fazer frente a uma situação específica. Junto a isso, o modelo de processamento de informação procura relacionar a definição de ensino que o professor possui com a sua conduta. Essas duas dimensões da cognição constituem fases de um mesmo processo pelo qual passa o professor face à complexidade das tarefas em que se envolve e que o torna um profissional ativo.

Como o processamento de informações e a tomada de decisões não ocorrem apenas num contexto mental, mas interligam-se às situações vividas pelos docentes, pressupõe-se que os professores têm diferentes tipos de conhecimentos que configuram as suas concepções epistemológicas. É importante destacar, neste contexto, as contribuições de Shulman (1986), pesquisador preocupado com o papel do conhecimento no ensino, nas investigações dos diferentes tipos e modalidades de conhecimento. Com o objetivo de estudar o que sabem os professores sobre o conteúdo que ensinam, onde e quando adquiriram esses conteúdos e como devem ser utilizados no cotidiano escolar, este autor conduziu suas investigações sobre o professor e a sua formação, apontando novas perspectivas investigativas sobre a questão da competência para ensinar.

Mas o modelo da racionalidade técnica, visando a prever ou prescrever o ato docente de educar, pôs de lado o sujeito. O sujeito constituído com base nos efeitos das relações de poder, no que se referem aos valores e produções discursivas, como gênero, etnia, sexualidade, credo, local etc., enunciado nos discursos, passa a trazer à tona o lugar da subjetividade – sempre em relação ao outro social e cultural, tão silenciada estava no discurso da racionalidade técnica. Aqui falamos de uma concepção de sujeito que não é o ser, nem é o indivíduo que muda historicamente e se compõe como parte indivisível (daí o nome) do grupo social, podendo se fazer autônomo, ideal e senhor de seus atos; aqui falamos do sujeito como efeito discursivo, simples

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e puro resultado de um processo de produção social e cultural, tão móvel e singular como são tais processos. É a emergência desse sujeito dividido no campo educacional, até então subsumido pela técnica, que desarticula e interroga os docentes e seus saberes, levando-os à necessidade de romper com os instrumentos, as técnicas e os planejamentos que vêm estabelecidos antes de atingir ou incluir sujeitos, mesmo sendo para eles destinados, pois sabemos que a racionalidade demonstra construir positividades à custa do abafamento dos posicionamentos subjetivos.

Assim, uma prática docente que inclua os sujeitos e suas diferenças exige também uma formação que alcance a concepção de sujeito de nossos tempos como fruto de uma série de rupturas nos discursos do conhecimento racional e científico, levando-os a considerarem que o seu trabalho é marcado por incongruências, incertezas e descontinuidades que o podem formar tanto ou mais que todo e qualquer esforço de agências destinadas a tal fim. Então, considerar que a experiência pedagógica não reserva aos docentes somente positividades pré-concebidas leva-os a inventar (ou reinventar) a educação a todo instante. Os atos dos docentes produzem saberes tão particulares quanto são esses próprios atos, pois são saberes produzidos por sujeitos induzidos de singularidades, muitas vezes à revelia das prescrições educativas.

Assim, a década de 1990 passa a valorizar os saberes da experiência, a partir das discussões sobre os saberes que um educador e uma educadora precisam ter para se constituírem como profissionais da educação. Surge, então, uma complexidade de teorias e práticas marcadas por rupturas com modelos ou pensamentos sobre trabalho docente e formação de profissionais da educação estabelecidos anteriormente, consentindo com um sujeito também produtor de saberes, sempre induzido pelas relações de poder fabricadas no ato de educar.

3 A perspectiva teórica, prática e subjetiva condizente com uma formação para a diversidade

Geralmente, as teorias que discutem a formação docente centram-se no debate sobre método e o procedimento didático, ou seja, em sua dimensão técnica, atribuindo a esses um melhor ou pior resultado da formação.

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É o que visamos a superar, considerando que a escolha da teoria, a consideração dos saberes práticos e a subjetividade se aliam na formação docente que visa a incluir a diversidade humana.

Hall (2002) condensa em cinco itens os avanços das ciências humanas e sociais sobre o descentramento do sujeito cartesiano. O primeiro descentramento ele atribui ao pensamento marxista que sujeita o homem e a mulher às condições sócio-históricas que os constituem, tornando-os alienados, pois agem apenas mediante condições materiais, históricas e econômicas criadas por outros.

O segundo descentramento vem da descoberta freudiana do inconsciente que divide o sujeito entre o sentido e a pulsão, definindo-o por um inevitável embate com o outro que o habita. Aqui, como em Marx, o sujeito não é mais o dono de sua própria história, capaz de transformar o mundo a partir da tomada de consciência, como se, percebendo a dominação e a força do outro, o sujeito pudesse lutar e chegar à condição paradisíaca e originária de sujeito uno, pleno de poder.

O terceiro descentramento é causado pela linguística estrutural de Saussure, que diz ser o significado inerente e instável, sempre escapando ao indivíduo. Não somos, de modo algum, autores das afirmações que fazemos ou dos significados que expressamos na língua. Através de significantes, buscamos alcançar significados plenos e fechados, fixando uma identidade, mas tais significados são constantemente perturbados pela diferença, sempre por desestabilizar certezas discursivas.

O quarto descentramento trata-se de uma genealogia do sujeito moderno ou uma arqueologia do biopoder propostas por Foucault. Tal genealogia é constituída pelo poder disciplinar que, antes do indivíduo e do corpo, preocupa-se com a regulamentação e com a vigilância de homens, mulheres e populações inteiras. Para isso, as instituições como escolas, prisões, hospitais, clínicas, quartéis e tantas outras que compõem a modernidade, são amplamente requeridas, construídas e utilizadas no sentido de policiarem e disciplinarem as vidas, o trabalho, os saberes, a saúde física e mental, as práticas sexuais, os hábitos familiares, as infelicidades e os prazeres dos mais diversos sujeitos submetidos a essas instituições.

Por fim, o quinto descentramento, para o autor, advém dos

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movimentos sociais: o feminismo, a contracultura, as manifestações pró-ecológicas, as lutas pelos direitos civis, étnicos, sexuais, de gênero etc., que politizaram a subjetividade. Juntam-se a isso, os movimentos antibelicistas das décadas de 1960 e 1970, as revoltas estudantis (tendo as de maio de 1968 como as mais proeminentes), as lutas antiditatoriais do terceiro mundo, bem como as manifestações que se opunham tanto à política liberal capitalista do ocidente, quanto à política estalinista do leste europeu e partes das Ásia.

Dessa forma, instituíram-se nas ciências humanas dimensões subjetivas à política, ao lado de dimensões tão somente objetivas, pois cada movimento reivindicava uma identidade própria. Nascia, então, uma política de identidade que, para além de simples manifestações de posição social e de contestação, fez desestabilizar uma identidade fixa e centrada (como, por exemplo, a branca, masculina, burguesa, heterossexual e cristã) em favor de novas formas de subjetividade que admitem em si mesmas também o lugar da contradição, do inacabamento, da incongruência e da descontinuidade.

Tudo isso faz ressonância no campo educacional. Esse processo de construção de identidade é um processo complexo através do qual cada educador e educadora em formação, bem como as demais personagens da esfera educativa, narram suas subjetividades de maneira diversa, agora influenciados pelos discursos ideológicos e políticos dos movimentos sociais, marcados, por sua vez, pelas lutas de poder, bem como divididos por pulsões inconscientes e pelas condições históricas que as constituíram. O que somos como educadores e educadoras e o trabalho pedagógico que realizamos vêm do desejo, de experiências, do lugar social, da luta de poder, de significantes que instauram discursos, de acasos que se consolidam em gestos, rotinas, ações, comportamentos que nos fazem nos identificarmos como docentes.

Assim, pensar uma formação docente que considere a diversidade humana implica considerarmos os valores, as normas, os discursos, os princípios que os sujeitos interiorizaram ao longo de suas trajetórias de vida e, ainda, a forma como os exteriorizam, transformando-os em atos diante da realidade objetiva. Há de se considerar também, ao lado de

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valores e princípios enunciados, os traços inconscientes e as insurreições pulsionais que constituem o trabalho docente tanto quanto as prescrições formadoras. A aposta é que possamos ter acesso a esses aspectos do trabalho docente, visando a entender as escolhas e atitudes que caracterizam as possíveis subjetividades de cada educador e educadora, suas definições com relação à concepção de aluno, de educação, de escola e do seu próprio papel social, escutando como cada um se posiciona sobre as concepções pedagógicas e sobre seu posicionamento político e subjetivo frente ao ato de ensinar.

A posição do sujeito no trabalho docente antecede toda e qualquer formação e preparação para o exercício da carreira profissional, associando-se à própria história de vida do educador e da educadora. Sua trajetória individual o induz a um percurso formador e, sem dúvida, não apenas marca, como, sobretudo, determina sua vida profissional. A configuração na formação dos profissionais da educação pelas agências formadoras precisa, então, considerar a tripla dimensão formativa do docente: a teoria, os saberes da experiência e a subjetividade.

Na esteira dos anos 2000, a formação docente proposta por pesquisadores e pesquisadoras que seguem nesse campo de rupturas pretende interrogar os saberes teóricos que os(as) docentes precisam ter numa perspectiva curricular que intencionalmente aponte para a diversidade formativa. Os estudos culturais invocam, assim, as questões sobre identidades e subjetividades, constituindo-se e constituindo sujeitos nos diversos espaços institucionais de caráter educativo e no trabalho docente. Passa-se a considerar como o educador e a educadora são influenciados profundamente pelas identidades étnicas, sexuais, etárias, religiosas e de gênero ao construírem saberes sobre suas práticas.

Aqui se faz necessário introduzir mais alguns elementos que, somados aos estudos culturais, possam de fato alterar significativamente a formação dos docentes.

A partir das discussões que a Psicanálise apresenta acerca do método clínico, da noção de implicação e da noção de relação com o saber, passamos a interrogar o paradigma conceitual professor reflexivo, pois esse paradigma não alcança o inconsciente presente na relação

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professor(a)-aluno(a).Considerando o paradigma indiciário, buscamos um método

capaz de considerar a incompletude do saber no campo científico e, posteriormente, na formação docente. A pesquisa acadêmica que se dispõe a utilizar o método clínico, de acordo com Levy (2001), não despreza a análise da relação entre o(a) pesquisador(a) e seu objeto, entendendo que o seu desafio é o trabalho que consente com a não neutralidade do(a) pesquisador(a) na produção do conhecimento. Os percalços na construção de um conhecimento fazem parte do processo, por isso não devem ser escamoteados.

Importante destacar que um dos fundamentos do método clínico é a noção de sujeito, já elucidada neste texto, ao considerá-lo como sujeito do inconsciente, sujeito da falta. Inventar uma experiência de ensino congruente com o consentimento do inconsciente colocaria o sujeito não só em relação com o saber diferente daquele que se produz no ensino acadêmico, uma vez que esse não considera as emergências do inconsciente, mas também, e por isso mesmo, em relação aos efeitos de verdade. Saber que temos diferentes relações com o saber em diferentes situações faz diferença para constituir nosso estilo de ensinar. O(A) educador(a) desavisado(a) de que o saber em sua dupla dimensão forma uma unidade ambígua e contraditória dá à função de ensinar um caráter problemático, uma vez que as questões daí decorrentes são comumente tratadas no registro patológico, principalmente quando se analisa a relação do(a) aluno(a) com a aprendizagem.

Outro elemento é a relação desse sujeito com o saber que se define pela relação que ele estabelece consigo mesmo, com o outro e com o mundo. Esse saber não se reduz ao conhecer propriamente dito (efeito da inteligência), mas também ao orientar-se e ao comportar-se diante da vida, ou diante do saber. É uma posição que move o sujeito ainda que ele não saiba nomeá-la. Nesse sentido, o saber é efeito do desejo inconsciente, de acordo com Santos (1991). A formação inicial exigirá tanto dos profissionais que nela se encontram transmitindo a formação quanto dos(das) professores(as) iniciantes a problematização da relação com o saber em sua dupla dimensão: o conhecimento formalizado e

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organizado em forma de teorias, e um saber não sabido que perpassa as relações educativas, mas que não é aprendido nesse tipo de formação.

É sobre esse saber não sabido, presente nos atos e escolhas dos professores e professoras e também dos alunos e alunas, que pensamos ser importante nos debruçarmos no decorrer dos processos formativos, pois temos nos deparado com situações enigmáticas no que tange tanto à aquisição de conhecimentos formalizados na formação docente, quanto na aquisição da leitura e da escrita por parte dos(as) alunos(as). De um lado, certa impermeabilidade por parte dos(as) professores(as) em assimilar as mudanças propostas no campo educacional e, de outro, os(as) alunos(as) que têm demonstrado certa recusa em relação à educação escolarizada e suas implicações.

Outra questão que o método clínico coloca é a noção de implicação: ao trazer à discussão o método clínico, é inevitável pensar que, ao formular uma pergunta, somos parte da pergunta formulada, colocando-nos em um cenário de incertezas, nem sempre confortável e desejável. Além disso, o método clínico traz à tona a desmistificação do ideal do método, pois reconhece que o produto do trabalho contém em si uma parte de desconhecimento, chamando-o como as zonas cegas, que são elementos nem sempre nomeáveis, de ordem inconsciente. Esse método passa a enfatizar mais os processos que precedem e subjazem os possíveis resultados ou produtos.

O trabalho para que o(a) professor(a) se coloque numa posição investigativa, e não numa posição cujo saber antecede a sua relação com o sujeito aluno(a), é lento. Aprender com o que surge e não submeter a uma rápida explicação os fracassos do ato educativo é consentir com o imponderável, com o desconhecido. É preciso aceitar trabalhar com as “zonas cegas”, no dizer de Levy (2001). O(A) professor(a) passa a lidar com a incerteza dos resultados da tarefa de ensinar, com o imponderável, pelo fato de se estabelecer uma relação sujeito-sujeito. Dessa forma, procedimentos como memorial, estudos de caso, relatos de experiência, discussões sobre filmes têm sido utilizados com esse objetivo.

Ao trabalhar com o método clínico é possível narrar e analisar a minha própria relação com o saber e evidenciar a compreensão de um estilo de

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ser, que pode apontar pistas para o estilo de ser professor(a), alterando significativamente a perspectiva da formação docente, pois se passa a abordar a implicação do sujeito professor(a) no processo de ensino. Os impulsos inconscientes, os desejos insatisfeitos, amor e ódio permeiam as relações entre os sujeitos em situação de ensino e de aprendizagem e não são escamoteados quando se opera com esse método. É importante assinalar que o(a) aluno(a) aprende o(a) professor(a).

Dessa forma, o trabalho na formação docente visa a que ele(a) possa elucidar algo do que se apropriou, aquilo que lhe tenha sido significativo, do que se transmite, mesmo sem o saber, nomeada aqui como uma produção do(a) aluno(a), a qual é considerada no procedimento avaliativo, sem julgamento algum a priori. O trabalho em torno da produção se constitui em um procedimento processual, começando pelo convite para conversar sobre temas desconcertantes presentes em suas práticas pedagógicas, principalmente aqueles ligados à diversidade, como podemos constatar na epígrafe deste texto. Sexualidade, gênero, raça e etnia, diferenças em relação à condição física e mental e à situação econômica, indisciplina, toxicomania são alguns desses temas. Conversar é um princípio que orienta o trabalho. Para Miller (2003, p. 36), uma conversação é:

um tipo de associação livre, em que se tem êxito. A associação livre pode ser coletivizada na medida em que não somos donos dos significantes. Um significante chama a outros significantes, não sendo tão importante quem o produz em um momento dado. Se confiamos na cadeia de significantes, vários participam do mesmo. Ao menos é a ficção da conversação produzir – não uma enunciação coletiva – senão uma associação livre coletivizada, da qual esperamos um certo efeito de saber. Quando as coisas passam bem, os significantes de outros me dão idéias, me ajudam e, finalmente, resulta – às vezes – em algo novo, um ângulo novo, perspectivas inéditas.

Assim, aposto que, ao conversar em sala de aula sobre um determinado assunto, possa-se produzir um efeito interrogativo nos sujeitos sobre os elementos subjetivos que perpassam o processo de ensino e de aprendizagem. Buscar a formalização teórica desses elementos é

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consentir que nem todos serão passíveis de elucidação. Por isso, o importante é conversar, trocar significantes.

Nas conversações, os(as) alunos(as), em situação de formação, estão a todo momento a se perguntar se agiram corretamente em uma determinada situação, principalmente quando essa ação envolve o trato com as diferenças subjetivas. O posicionamento ético permitirá que se faça uma escolha por um determinado procedimento ou ato em sala de aula, e possibilitará ao sujeito assumir essa escolha, pois sempre haverá múltiplas possibilidades de atuação.

A conversa sobre essas possibilidades também funciona como balizador para que cada um(a) decida sobre a justeza de seu ato. A indicação, leitura e discussão sobre textos teóricos só são apresentados após essa conversa. Além disso, a perspectiva de uma possível epistemologia da prática passa a conviver lado a lado com uma episteme universal e hegemônica, que prescreve conhecimentos e modelos de formação. Para isso, uma arqueologia do trabalho docente é requerida nessa perspectiva a fim de investigar como saberes da experiência são construídos com os conhecimentos hegemônicos, sem que os primeiros sejam subsumidos a tais conhecimentos.

A apropriação de elementos teóricos poderão ser captados e enunciados pelos sujeitos; em parte, pois consideramos que os aspectos objetivos dessa formação, os quais nomeamos conhecimento, podem ser explicitados, quanto aos efeitos subjetivos, ligados à singularidade de cada um, ao estilo de cada um, talvez possamos perceber alguns traços que eles e elas poderão elucidar, ou não, pois se torna difícil narrar esse processo no momento de seu acontecimento. Somente a posteriori é possível aos sujeitos dizer se a formação produziu neles algum efeito. Só nos é possível enunciar algo sobre nosso próprio estilo de ensinar.

Objetivamente visamos que a inclusão provoque alterações no que está em geral disponível na sociedade e na escola no que tange aos aparatos e políticas públicas. Essas alterações deverão se dar através da reforma e nova organização do currículo, da avaliação, da pedagogia, das formas de agrupamento de alunos(as), das escolas e do sistema educacional como um todo para responder a uma ampla gama de necessidades, celebrando

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a diversidade de gênero, de raça e etnia, de linguagem de origem, de nível de aquisição de aprendizagem ou a deficiência e suas especificidades. Para isso, teremos que alterar a lógica do aluno como objeto para aluno como sujeito que porta diferenças. Não é possível ensinar tudo a todos ao mesmo tempo. Será preciso rever processos avaliativos, sem que isso signifique ausência de avaliação. O ponto de partida deve ser o que aquele sujeito sabe, o que aprendeu para propor novos desafios e não a comparação com a aprendizagem do outro. Também a função da escola não poderá se restringir a ensinar a ler e a escrever, nem tampouco transmitir conteúdos pré-existentes. Teremos que ampliar essas intenções.

Do ponto de vista subjetivo há ainda mais complexidades a serem enfrentadas, pois trabalhar com as noções de sujeito do inconsciente, de relação com o saber e de implicação é pouco usual e distante das pesquisas acadêmicas e em processos de formação docente, principalmente em nosso país. Trabalhar com uma noção pressupõe que, ao desenvolver práticas que a utilizam e ao descrever os fenômenos balizados por ela, avaliem-se, também, as possibilidades e limites dessa noção, analisando a viabilidade de operar com ela para elucidar problemas e apontar novas leituras da realidade. O método clínico permite essa reflexão, uma vez que não escamoteia os obstáculos e os impasses daí decorrentes.

Nessa perspectiva, a implicação da subjetividade do(a) pesquisador(a) e do(a) professor(a), em seu processo de formação, em suas dimensões consciente e inconsciente, é tratada não como obstáculo à compreensão, mas como um fenômeno a ser reconhecido e trabalhado no processo de produção de conhecimento. Considero também a riqueza de se trabalhar com uma noção, pois a sua fluidez permite que se possa criar e transformá-la, indo além do conhecimento formalizado, estabilizado, permitindo transitar nas fronteiras do desconhecimento, das incertezas, do imprevisível.

O princípio axial neste trabalho é o da incompletude do saber. Partindo do princípio de que há um mal-estar inerente à condição humana e de que não é possível escamotear esse mal-estar, seja na produção de conhecimentos, seja na transmissão desses, a partir da concepção de sujeito dividido e plural, faz-se necessário continuar perguntando: O que é formar para a diversidade e a inclusão?

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Referências

DINIZ, Margareth. Relatório de pesquisa: O mal-estar docente e os problemas das crianças e adolescentes. Conversação. UFOP. 2010.

HALL, S. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro, DP&A, 2002.

LEVY, A. Ciências clínicas e organizações sociais. Belo Horizonte, Autência-FUMEC, 2001.

MILLER, J. A. Conversação. IN: MILLER, J. A pareja e o amor. Paidós. Buenos Aires. 2003:36.

NÓVOA, A. O passado e o presente dos professores. In: NÓVOA, Antônio (Org.) Profissão professor. Portugal: Porto, 1991.

SANTOS, E. H. Le savoir em travail: l´expérience de développement technologique par les travailleurs d’une industrie brésiliene. Saint-Denis: Université de Paris VIII, Départament des Sciencies de l’Education, 1991.

SHULMAN, L. S. Those who understand: knowledge growth in teaching. Educational Esearcher. v. 15, n. 2. p. 4-14, 1986.

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Formação Docente para a Diversidade e a Inclusão

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Teacher Education for Diversity and Inclusion

Abstract

The diversity present in schools today and the constant questions that present themselves to bring out a new education school knowledge that now requires multiple skills (a) teacher (a). What kind of training the (a) teacher (a) need to deal with many situations involving diversity and inclusion policies in place in Brazil? What internal resources / subjective that it needs to mobilize itself to teach students? This article aims to discuss teacher training aimed at multiple situations that are seen involved during a workday, using the methodology of conversation held with groups of teachers, explaining their results in the provisional nature of knowledge and training teacher.

Keywords: teacher education; subjectivity, diversity, inclusion.

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Margareth Diniz

Recebido: 20/05/11Aprovado: 04/08/11

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Educação e Relações Étnico-Raciais: desafios e perspectivas para o

trabalho docenteJosé Eustáquio de Brito1

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Resumo

O avanço das lutas do Movimento Social Negro no contexto da redemocratização da sociedade brasileira oferece o argumento central para o artigo, que reflete acerca do sentido histórico da educação das relações étnico-raciais como forma de enfrentamento do racismo e das desigualdades sociais naturalizadas por essa ideologia. O artigo discute as implicações dessa demanda a partir da aprovação da Lei 10.639/2003, que altera o disposto na Lei de Diretrizes e Bases da Educação para instituir a obrigatoriedade do ensino de história da África e culturas afro-brasileiras nas etapas e modalidades da educação básica. Conclui-se identificando alguns desafios postos para a atividade dos professores, descrevendo algumas iniciativas no campo da formação docente que têm possibilitado o desenvolvimento de práticas pedagógicas pautadas pelo reconhecimento e valorização da diversidade étnico-racial.

Palavras-Chave: relações raciais; trabalho docente; formação de professores.

1 Doutor em Educação pela Universidade Federal de Minas Gerais. Professor da Faculdade de Educação da Universidade do Estado de Minas Gerais. Coordenador do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Educação e Relações Étnico-Raciais da FaE/UEMG/CBH.

1 Introdução

Ao longo da última década, presenciou-se, nas diversas regiões de nosso País, um amplo esforço no campo da pesquisa acadêmica e das práticas de ensino no sentido de desenvolver estudos e propor ações

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político-pedagógicas em torno da relação entre educação e relações étnico-raciais visando à ressignificação da formação identitária brasileira e ao enfrentamento do quadro de desigualdades históricas que coloca a população negra em condições de desvantagem estrutural no campo do acesso a direitos fundamentais, que se reflete nos mais diversos indicadores sociais, com destaque para os relativos ao mercado de trabalho e aos educacionais.

Entre as iniciativas impulsionadas no decorrer da década passada e que projetam um conjunto de ações para o momento presente, destaca-se a aprovação da Lei 10.639/2003, que, alterando a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional atualmente vigente, dispõe sobre a obrigatoriedade de incorporação da temática do ensino da história do continente africano e das culturas afro-brasileiras no currículo das escolas de educação básica brasileira públicas e privadas. Esse dispositivo legal, longe de expressar uma imposição governamental de caráter autoritário sobre o trabalho que se desenvolve no interior das escolas, sintetiza o acúmulo de mobilizações históricas empreendidas pelo Movimento Social Negro ao longo de sua trajetória histórica, sobretudo no período de ascensão das lutas sociais no contexto da redemocratização do país, em finais da década de 19702.

A importância histórica desse dispositivo legal tem sido refletida por vários estudiosos das relações raciais em nosso país. Ao considerar o ineditismo desse instrumento no contexto das Américas, Carlos Moore (2007) assim se expressa:

Se aplicada com o requerido vigor e rigor, essa medida poderia ter um impacto permanente nas consciências das gerações vindouras. A implementação dessa Lei pioneira abriu uma nova porta para a sociedade inteira reavaliar as bases da fundação do Brasil, como entidade histórica nos tempos modernos, e reconsiderar as relações étnico-raciais nele travadas. Desse modo, poder-se-ia enxergar a Nação brasileira por meio da experiência da população que conforma hoje a metade do País, e não somente, como até então vinha acontecendo,

2 Uma abordagem panorâmica da atuação do Movimento Social Negro brasileiro que confirma essa assertiva pode ser encontrada na obra organizada por Alberti e Pereira (2007), que se fundamenta em depoimentos de lideranças reconhecidas do Movimento para apresentar a trajetória de organização e luta do Movimento em torno de questões ao longo desse período.

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Educação e Relações Étnico-Raciais: desafios e perspectivas para o trabalho docente

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por meio da experiência da população brasileira de origem européia (MOORE, 2007, p. 27).

Ao conferir destaque a iniciativas no campo da formação de professores para a educação das relações étnico-raciais a partir do que dispõe a referida Lei, o artigo, num primeiro momento, reflete sobre a importância do protagonismo histórico do Movimento Social Negro brasileiro ao apresentar essa demanda à sociedade no contexto da redemocratização do País. Dessa forma, reconhece, nas ações desenvolvidas pelo movimento social, uma das fontes do direito, como tem sido abordado pela doutrina jurídica. A demarcação desse ponto de partida é importante para que se reflita sobre as formas de expressão dessa demanda, que se expande para as instituições de ensino superior e busca reconhecimento e legitimidade no âmbito de Programas de Pós-Graduação e de instituições de pesquisa no campo educacional em nosso país.

A partir de algumas considerações acerca das Diretrizes Curriculares fundamentadas na Lei 10.639/03, apresenta-se uma reflexão acerca dos desafios postos para a formação docente visando à tradução do espírito da Lei em atividades pedagógicas críticas. Problematiza-se um relato de uma situação de estágio partilhado por uma estudante do curso de Pedagogia da Faculdade de Educação da Universidade do Estado de Minas Gerais, campus Belo Horizonte (FaE-UEMG/CBH), para fundamentar a compreensão de que as relações de trabalho vivenciadas nas escolas são portadoras de um conteúdo formativo que apresenta desafios ao currículo de formação de professores e às atividades pedagógicas.

2 Educação das relações étnico-raciais: sentido histórico de uma conquista do Movimento Social Negro

O ano de 2011 foi escolhido pelas Organizações das Nações Unidas (ONU) para homenagear os afrodescendentes. Uma série de iniciativas tem sido desenvolvida em várias partes do mundo para se referir a essa temática. Em nosso País, por exemplo, encontra-se em curso uma agenda densa de discussões, debates, produções culturais e acadêmicas, iniciativas políticas com vistas a promover o encontro da população

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brasileira com suas heranças africanas, de modo a atualizar o sentido de nossa formação3.

Entretanto, a compreensão acerca do alcance e significado de iniciativas implementadas no campo das políticas públicas, visando ao reconhecimento da população negra como sujeito sócio-político-cultural, deve nos situar em diversos momentos de nossa história em que emergem na sociedade formas de manifestação do protesto negro contra o racismo em suas multifacetadas formas de expressão4.

Um momento dessa pressão política, que tenho em mente como dado autobiográfico, expressa o sentido da afirmação acima: o País acabara de deixar para trás o longo ciclo da última ditadura militar de nossa história. Era o ano de 1987 e os “novos” arranjos político-institucionais davam conta da emergência de uma “Nova República”. O governo do presidente Sarney era confrontado por um conjunto de demandas sociais – do campo e da cidade – contido violentamente durante o período da ditadura militar, que adquiriu visibilidade com a entrada de novos personagens na cena política. Essas demandas, por sua vez, seriam apresentadas por vários atores sociais nos debates em torno da elaboração da nova constituição.

Nesse contexto, reúnem-se em Brasília, na sede do Ministério da Educação e Cultura, representantes de entidades nacionais do Movimento Social Negro para assinar, com o então Ministro da Educação, um documento denominado “Protocolo de intenções”, que propunha, como parte de uma ampla plataforma de combate ao racismo, a inclusão nos currículos escolares do tema História e Cultura Afro-Brasileira a integrar a formação de estudantes da escola básica. Esse fora um ato político de grande relevância por expressar a convicção do Movimento Social Negro que a abordagem do tema é de responsabilidade de toda a sociedade, não podendo ser tratado apenas nos espaços restritos de

3 Faz parte dessa agenda, entre outras iniciativas, a realização de seminários regionais para o lançamento da Coleção História Geral da África, organizada pela UNESCO, numa ação conjunta com o Ministério da Educação. Em Belo Horizonte, o seminário ocorreu no dia 13 de abril de 2011, tendo sua pauta centrada no debate sobre os desafios postos à implementação da educação das relações étnico-raciais.4 Uma abordagem que busca situar o movimento negro como ator político ao longo do século XX pode ser encontrada em Gonçalves (1998), que destaca em sua análise do movimento negro brasileiro a construção de suas estratégias de ação política em consonância com modelos culturais hegemônicos em cada momento analisado.

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Educação e Relações Étnico-Raciais: desafios e perspectivas para o trabalho docente

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formação constituídos pelas entidades do Movimento Negro.Anteriormente à aprovação desse dispositivo legal, observa-se um

movimento articulado no campo da educação que se configura, ao mesmo tempo, numa base de pressão social e de sustentação teórica que resultou no reconhecimento, no âmbito da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd), do grupo de trabalho denominado “Educação e Relações Étnico-Raciais (GT - 21)”, conforme breve histórico abaixo:

A 25ª Reunião Anual da ANPEd, ocorreu no ano de 2002. Nela, surge o então Grupo de Estudos número 21 (GE 21), o mais novo GE da ANPEd nessa reunião, intitulado “GE Relações Raciais/Étnicas e Educação”, fundado que fora no ano anterior (2001) no âmbito da ANPEd por um grupo de pesquisadores da área de Relações Raciais e Educação dos Afro-Brasileiros. Sua fundação foi precedida de amplos debates, congregando a maioria significativa dos pesquisadores dessa área, presentes naquela reunião (SISS; OLIVEIRA, 2006, p. 10).

No ano seguinte, esse Grupo de Estudos viria a ser reconhecido como um Grupo de Trabalho, demarcando o seu espaço no campo da pesquisa acadêmica no âmbito da educação no seio da principal entidade que congrega estudantes, professores, pesquisadores e instituições acadêmicas do País. A análise dos trabalhos apresentados no âmbito do “Grupo de Trabalho Educação e Relações Étnico-Raciais da ANPEd” ao longo desses últimos anos nos fornece a dimensão da diversidade de questões presentes na abordagem do tema, que tem contribuído para o alargamento das fronteiras da pesquisa acadêmica e proporcionado a construção de novos problemas de pesquisa. Entretanto, cabe ainda indagar: para além de uma reivindicação reiterada em diversos momentos e lugares pelo Movimento Social Negro, qual o sentido histórico da educação das relações étnico-raciais?

No documento intitulado “Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana”, aprovado pelo Conselho Nacional de Educação em 10 de março de 2004, identificamos várias passagens

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em que são explicitados os objetivos da incorporação dessa temática no currículo escolar. Todavia, uma advertência apresentada nas primeiras linhas do documento é esclarecedora quanto às intenções e ao alcance da incorporação dessa temática de corte interdisciplinar:

Não se trata de mudar um foco etnocêntrico, marcadamente de raiz europeu, por um africano, mas de ampliar o foco dos currículos escolares para a diversidade cultural, racial, social e econômica brasileira (BRASIL, 2004, p. 17).

Essa afirmação nos remete às tensas relações raciais produzidas e reproduzidas ao longo de nossa história, cujas representações se encontram presentes nas diversas instituições sociais. Ao afirmar que não se trata de estabelecer diálogos interculturais a partir de uma perspectiva etnocêntrica, o documento propõe que haja um deslocamento dessa posição, que consagra privilégios de um grupo étnico-racial sobre o outro, para outra em que os diversos segmentos se reconheçam a partir de uma perspectiva de direitos. No entanto, esse deslocamento é proposto a partir da constatação de que é preciso:

[...] ressarcir os descendentes de africanos negros dos danos psicológicos, materiais, sociais, políticos e educacionais sofridos sob o regime escravista, bem como em virtude das políticas explícitas ou tácitas de branqueamento da população, de manutenção de privilégios exclusivos para grupos com poder de governar e de influir na formulação de políticas, no pós abolição (BRASIL, 2004, p. 11).

O desenvolvimento de uma educação das relações étnico-raciais implica aquilo que o educador Paulo Freire (1997) descreveu como um dos saberes necessários à prática educativa crítica: a necessidade de criticar a cultura existente como um pressuposto básico para a instauração de uma nova cultura.5 Nesse sentido, há um conjunto de representações presentes no imaginário social, marcadamente de cunho

5 No livro intitulado “Pedagogia da autonomia”, Paulo Freire (1997) elenca um conjunto de saberes por ele julgados fundamentais para o exercício do trabalho docente. Além da necessidade de criticar a cultura existente em seus fundamentos antidemocráticos, destacamos com o autor a necessidade de que “ensinar exige pesquisa”, atitude essa que nos mobiliza a construir saberes em torno do silenciamento histórico acerca do continente africano.

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etnocêntrico e racista, que devem ser criticados em função da constituição de novas bases para o reconhecimento numa sociedade marcada pela diversidade e pluralidade cultural.

Um dos objetivos apresentados pelo documento para a incorporação da temática História e Culturas Afro-Brasileiras nos currículos escolares consiste em:

[...] oferecer uma resposta, na área da educação, à demanda da população afro-descendente, no sentido de políticas de ações afirmativas, isto é, de políticas de reparações, e de reconhecimento e valorização de sua história, cultura e identidade. Trata o parecer de política curricular, fundada em dimensões históricas, e busca combater o racismo e as discriminações que atingem particularmente os negros (BRASIL, 2004, p. 18).

Além desse objetivo, o documento propõe a divulgação e produção de conhecimentos, a formação de atitudes, posturas e valores que eduquem “[...] cidadãos orgulhosos de seu pertencimento étnico- -racial – descendentes de africanos, povos indígenas, descendentes de europeus, de asiáticos – para interagirem na construção de uma nação democrática, em que todos, igualmente, tenham seus direitos garantidos e sua identidade valorizada” (BRASIL, 2004, p. 10).

A partir dessa formulação, podemos identificar um objetivo vinculado ao trabalho de construção de uma sociedade democrática, o que nos leva a criticar o mito reiteradamente propagado da “democracia racial” brasileira e nos mobiliza à construção permanente de novas bases de sociabilidade democrática, que não se restringem aos espaços escolares, mas que se apresentam como um desafio para o conjunto das instituições de nossa sociedade.

O documento em questão formula como um dos objetivos da incorporação do tema no currículo escolar a possibilidade de que o estudo da História e Cultura Afro-Brasileira proporcione aos negros melhorias em suas inserções nos sistemas de ensino, propugnando o direito de:

[...] cursarem cada um dos níveis de ensino em escolas devidamente instaladas e equipadas, orientados por professores qualificados para o

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ensino das diferentes áreas do conhecimento; com formação para lidar com as tensas relações produzidas pelo racismo e discriminações, sensíveis e capazes de conduzir a reeducação das relações entre diferentes grupos étnico-raciais (BRASIL, 2004, p. 12).

Nesse sentido, no contexto da celebração do Ano dos Afrodescendentes, instituído pela Organização das Nações Unidas (ONU), vem ao público de língua portuguesa a “Coleção História Geral da África”, em oito volumes, patrocinada pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), e publicada pelo Ministério da Educação para ser distribuída aos centros de formação de professores da educação básica das universidades e para equipar bibliotecas6.

O fato de o documento contendo as diretrizes enfatizar a formação docente como elemento estratégico na implementação de propostas para a abordagem da educação das relações étnico-raciais nos convida a apresentar algumas considerações sobre esse desafio que se coloca às redes de ensino a partir da aprovação da Lei 10.639/03. Que iniciativas decorrem da incorporação do tema da educação das relações étnico-raciais para a formação inicial e continuada de professores?

3 Trabalho e formação docente naimplementação da Lei 10.639/03

Em nível nacional, tem-se ampliado a percepção de que a educação das relações étnico-raciais é uma questão que diz respeito ao conjunto da sociedade brasileira, não se restringindo às bandeiras de luta do Movimento Social Negro. Constata-se, em várias regiões do País, uma mobilização que envolve gestores da política educacional, agentes públicos e privados, instâncias do poder judiciário, universidades, profissionais da educação e militantes do Movimento Social Negro,

6 A coleção é reconhecida como a principal obra de referência internacional sobre o continente africano, informa o coordenador do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros da Universidade Federal de São Carlos, Valter Silvério, coordenador dessa iniciativa. Foi publicada pela primeira vez no final da década de 1980, pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO). A “Coleção história geral da África” está disponível para ser baixada no endereço: http://www.unesco.org/new/pt/brasilia/special-themes/ethnic-and-racial-relations-in-brazil/general-history-of-africa/.

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entre outros segmentos, no sentido de construir estratégias locais visando à implementação da lei7.

Sem a pretensão de apresentar um balanço exaustivo acerca dessas iniciativas em curso, mas com a intenção de situar o campo de atuação em que se orienta o trabalho desenvolvido pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Educação e Relações Étnico-Raciais da Faculdade de Educação da Universidade do Estado de Minas Gerais (NEPER-FaE/UEMG), relatamos abaixo algumas experiências orientadas para o campo formação docente.

A partir de demanda apresentada à Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais pela Secretaria Municipal de Educação de Belo Horizonte, encontra-se em andamento desde meados da década passada o curso de especialização em “História da África e Cultura Afro-Brasileira: uma introdução à Lei 10.639/03 ”8, direcionado à formação de professores que atuam nas várias etapas e modalidades da educação básica. Esse curso é organizado pelos professores vinculados ao Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Ações Afirmativas na Universidade Federal de Minas Gerais e conta com a participação interinstitucional de docentes vinculados à Faculdade de Educação da Universidade do Estado de Minas Gerais. Essa proposta visa a capacitar o corpo docente das escolas municipais, de modo a aprofundar as possibilidades de abordagem da temática da educação das relações étnico-raciais a partir de um enfoque interdisciplinar. No decorrer da formação, o aprofundamento dos temas discutidos nas disciplinas oferece subsídios para que professores em formação continuada possam elaborar um projeto de intervenção a ser implementado nas escolas onde atuam em torno de alguma dimensão relativa aos conteúdos curriculares.

Pela importância que tem demonstrado a partir da capacidade de desenvolver uma estratégia de formação de professores articulada em nível nacional, bem como pela qualidade do material disponibilizado

7 Um quadro nacional dessas iniciativas pôde ser revelado durante a realização do VI Congresso Brasileiro de Pesquisadores(as) Negros(as) – COPENE, que teve por eixo o tema da “Afrodiáspora: saberes pós-coloniais, poderes e movimentos sociais”. Esse evento, organizado pela Associação Nacional de Pesquisadores Negros, reuniu, na cidade do Rio de Janeiro, entre os dias 26 e 29 de julho de 2010, centenas de pessoas interessadas em aprofundar os mais diversos temas que compõem essa agenda.8 Na versão de 2011, o curso, em nível de pós-graduação lato sensu, passou a ser denominado “Educação e Relações Étnico-Raciais”.

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para a realização do trabalho, destaca-se aqui o processo de formação desencadeado no interior do projeto “A Cor da Cultura”, uma iniciativa que envolve instâncias do governo federal em parceria com organizações da sociedade civil9.

No âmbito do estado de Minas Gerais, a partir de uma iniciativa da Secretaria Estadual de Educação, em parceria com a Secretaria Municipal de Educação de Belo Horizonte, realizou-se, no ano de 2005, o Fórum Estadual de Educação e Diversidade Étnico-Racial. Esse evento, que reuniu profissionais da educação, gestores de sistemas municipais de educação de vários municípios do estado, pesquisadores, militantes de organizações do Movimento Negro, teve por objetivo a disseminação das diretrizes curriculares visando à implementação da Lei 10.639/03. O Fórum se constituiu num espaço de aprofundamento do diálogo com experiências internacionais, bem como de socialização de iniciativas em curso em várias escolas e redes de ensino.

Não obstante o pioneirismo dessa iniciativa, constata-se que o tema esteve ausente das prioridades apontadas pela Secretaria do Estado da Educação ao longo das últimas gestões, o que contrasta com a percepção do desafio manifestada pelo Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais (Sind-UTE), que tem realizado um trabalho de estímulo ao desenvolvimento e divulgação de práticas pedagógicas centradas na abordagem da diversidade na educação e, especialmente, da educação das relações raciais, além de pautar o tema em seus fóruns de formação10.

A considerar, no entanto, a situação no setor privado de ensino é importante ressaltar que, embora questões suscitadas a partir da abordagem do tema sejam discutidas pelos trabalhadores e trabalhadoras do setor, ainda há muito a ser feito, tendo em vista o fato de vermos

9 O projeto “A Cor da Cultura” se encontra neste ano em sua segunda edição e está presente em várias regiões do País. É uma iniciativa do governo federal por meio da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, Fundação Cultural Palmares e Ministério da Educação em associação com a Fundação Roberto Marinho, através do Canal Futura.10 Durante a realização da Conferência Estadual de Educação, ocorrida em Caxambu, em fevereiro de 2011, o tema da educação das relações étnico-raciais foi tratado numa das mesas temáticas, contando com a participação de dezenas de professores e professoras interessados em aprofundar reflexões sobre o tema e partilhar suas experiências pedagógicas. Da mesma forma, o Sindicato dos Professores de Minas Gerais (SINPRO), no âmbito do ensino privado, tem desenvolvido um conjunto de ações voltadas à abordagem da educação das relações raciais, inclusive em seu 11º Congresso, realizado em agosto de 2010.

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refletido no segmento da educação básica o quadro das desigualdades raciais apontado na primeira parte deste ensaio.

Uma situação relatada por uma estudante do curso de Pedagogia da Faculdade de Educação da Universidade do Estado de Minas Gerais – Campus Belo Horizonte (FaE-UEMG/CBH), no contexto de sala de aula quando da socialização de uma vivência de estágio curricular numa escola particular de educação infantil, ilustra bem o desafio que se apresenta para o trabalho com o tema da educação das relações étnico-raciais. (APÊNDICE A)

A situação relatada pela estudante negra do curso de Pedagogia, a partir de sua interação numa situação de estágio, tem muito a nos ensinar acerca das formas oferecidas para a percepção da diversidade étnico-racial na educação infantil, sobretudo considerando uma dimensão manifesta do currículo, mas pouco problematizada quando se discute o tema. Buscamos extrair desse fato algumas reflexões de modo a responder à seguinte pergunta: O que os sujeitos da Educação Infantil podem aprender acerca da diversidade étnico-racial, convertida em desigualdade, a partir das dinâmicas das relações de trabalho presentes no cotidiano das escolas de Educação Infantil? Essa reflexão se justifica à medida que, a partir das diretrizes atualmente vigentes, o curso de graduação em Pedagogia passou a priorizar a formação de professoras e professores para atuação nessa etapa da educação básica.

Inicialmente, é preciso reconhecer que os avanços sociais verificados em nosso País, consubstanciados no quadro de mobilidade ascendente de parte da população no decorrer da última década, têm sido responsáveis pela incorporação, no nível superior de ensino, de parte da população que concretamente não encontrava meios de incluir essa aspiração em seus projetos de vida. Um levantamento que vem sendo conduzido na Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG) acerca do perfil socioeconômico dos estudantes aponta que, em sua maioria, eles apresentam características que reforçam essa constatação: são provenientes de famílias que tiveram poucas oportunidades educacionais e, por essa razão, em larga proporção, pertencem à primeira geração de estudantes universitários; têm trajetória de escolarização,

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predominantemente, em escolas públicas; demandam serviços de assistência estudantil; alguns utilizam o sistema de cotas raciais e sociais para ingresso na universidade.

Por outro lado, a emergência desse novo perfil de professores da Educação Básica tem sido também interpretada como sintoma de uma crise que se abate sobre a educação pública, que hoje não tem oferecido condições de trabalho suficientes para atrair jovens talentosos para o exercício da docência. Entretanto, a constatação acerca da histórica precarização do trabalho docente não deve ocultar de nosso horizonte de compreensão a situação de uma geração de jovens – mulheres e homens negros – que tem encontrado no exercício da docência um espaço de atuação profissional de maior reconhecimento social em comparação a outras estratégias de inserção ocupacional disponíveis no mercado de trabalho para a população negra.

O fato aqui relatado nos leva a problematizar as tensões e as armadilhas provocadas pelo racismo em nossa sociedade. A iniciativa tomada por alguns pais de procurar a direção da escola para reivindicar o afastamento da professora negra de suas funções de Professora de Referência atualiza, no território da escola, a clássica demarcação entre os espaços da “Casa Grande” e da “Senzala”, presente na conformação da sociabilidade em nosso País. A partir do recurso a esse referente, talvez seja interpretado como natural se referir à primeira babá de seu filho como uma “negra muito caprichosa”; por outro lado, pode ser que soe como uma referência fora de lugar a exibição de uma foto da professora negra sustentando o status de alfabetizadora de seu filho branco.

Todavia, a considerar o contexto da Educação Infantil, essa demarcação hierarquizada das atividades de trabalho no interior da escola pode ser identificada a partir da relação entre Educar e Cuidar, notadamente no trabalho que se desenvolve com crianças na faixa etária de 0 a 3 anos, que tende a explicitar também uma divisão racial do trabalho no interior das escolas.

O fato relatado também chama atenção para uma dimensão do currículo da Educação Infantil que é aprendida pelas crianças pequenas no cotidiano da escola sem que seja, necessariamente, objeto de uma prática

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pedagógica específica. Encontra-se presente no campo da organização do trabalho na escola uma divisão do trabalho que tende a reproduzir estereótipos e a naturalizar relações sociais de subordinação e submissão, que exibem conteúdos relativos às tensas relações raciais que configuram as relações sociais em nosso País e se apresentam a partir das mais diversas estatísticas sobre desigualdade social. Esses arranjos organizacionais e muitas práticas derivadas desses arranjos têm constituído um campo de reflexão que desloca a prática do racismo do âmbito de ação do indivíduo para perceber essa ideologia enraizada nas instituições.

A partir dessa referência, é preciso admitir que o trabalho de implementar medidas no sentido de democratizar as relações de trabalho constitui um elemento importante na agenda da gestão da escola, bem como da política educacional, visando à abordagem crítica do tema da diversidade étnico-racial, de modo a proporcionar condições para o desenvolvimento das atividades cujas características não venham a reproduzir hierarquias sociais marcadas historicamente pela divisão racial do trabalho e pela distribuição desigual dos recursos de poder. Do contrário, avalio que a introdução de conteúdos ou a divulgação de materiais pedagógicos que proponham uma leitura não estereotipada acerca da diversidade étnico-racial para as crianças pequenas encontre como limite à aprendizagem as formas objetivas de como se organizam as hierarquias sociais e a distribuição desigual de poder no interior das instituições, sobretudo da escola.

O fato relatado também nos ensina que a abordagem do tema da diversidade étnico-racial no cotidiano escolar apresenta um questionamento às formas de ver o mundo e atribuir sentido às relações sociais. Por isso, implica a articulação de um conjunto diverso de saberes provenientes de fontes igualmente diversas de aquisição cuja integração na atividade docente é resultado de escolhas – individuais e coletivas – permanentemente feitas e atualizadas pelos sujeitos, por vezes, em circunstâncias em que nem sempre os professores dispõem de recursos de poder suficiente para fazer prevalecer a perspectiva que julguem mais adequada num determinado momento.

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4 Considerações finais

As comemorações do aniversário de 40 anos do Curso de Pedagogia da Faculdade de Educação da Universidade do Estado de Minas Gerais nos apresentam a demanda de refletir sobre a história construída pela instituição na formação de gerações de professores e professoras, bem como nos convida a refletir sobre o trabalho a ser desenvolvido nesse campo, tendo em vista os desafios que se apresentam para a sociedade brasileira. O momento coincide também com o debate sobre a reforma do currículo do curso de Pedagogia cujas proposições iniciais, em resposta às disposições legais, incorporam a educação das relações étnico-raciais como um de seus conteúdos obrigatórios.

Nesse sentido, é importante destacar que a abordagem do tema na formação inicial de professores possa ser feita de modo a estabelecer um canal aberto de diálogo com as experiências de formação desenvolvidas pelo Movimento Social Negro ao longo de sua trajetória de resistência e luta contra o racismo e a promoção da igualdade racial. Esse tem sido o compromisso assumido pelos integrantes do NEPER ao longo de sua breve existência, com o objetivo de ampliar a interlocução do espaço acadêmico com os movimentos sociais.

A reflexão proposta sobre uma situação de estágio centrada numa das dimensões da educação das relações étnico-raciais nos mostra que, mesmo que não tenhamos até o momento um lócus disciplinar capaz de propor um aprofundamento acerca do tema, encontra-se latente no contexto da sala de aula o tema da educação das relações étnico-raciais. Por essa razão, é importante que estejamos suficientemente capacitados para conduzir esse debate em sala de aula.

O relato de um caso particular tem a pretensão de chamar atenção para uma dimensão do currículo que não é necessariamente objeto de ensino: é vivência no cotidiano de relações marcadas pela distribuição desigual de poder. Entretanto, é preciso reconhecer que há iniciativas sendo tomadas por parte do poder público, de gestores, de coletivos de professores e professoras em vários municípios no sentido de profissionalizar as relações de trabalho no âmbito da Educação Infantil.

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Entretanto, igualmente reconhecemos que há muito ainda a ser feito nesse campo. Enfim, que o fato relatado nos sirva de alerta quando nos depararmos com o desafio de trabalhar a diversidade étnico-racial na Educação Infantil. Eleger as relações de trabalho na escola para o desenvolvimento de um trabalho comprometido com a diversidade étnico-racial na Educação Infantil como um valor deve se constituir “foco estratégico” a repercutir no currículo de promoção de igualdade racial e de afirmação de identidades positivas para crianças negras e não negras. Que seja essa agenda um compromisso a ser assumido no curso de Pedagogia.

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UNESCO. Coleção história geral da África. 2010. Disponível em: <http://www.unesco.org/new/pt/brasilia/special-themes/ethnic-and-racial-relations-in-brazil/general-history-of-africa/>. Acesso em: 30 jan. 2012.

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Educação e Relações Étnico-Raciais: desafios e perspectivas para o trabalho docente

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APÊNDICE A - De Professora Referênciaa Professora Auxiliar

Uma estudante negra do 5º período do curso de Pedagogia da FaE/UEMG, a propósito de sua vivência de estágio numa unidade de Educação Infantil, relatou um fato que a ela fora confidenciado por uma professora, também negra, que trabalha numa escola de educação infantil ligada ao sistema privado. Empregada nessa escola há pouco mais de dois anos, a professora lhe fizera um relato que expõe um drama que, fico a imaginar, não se restringe a sua experiência pessoal.

Disse-lhe a professora que, quando admitida naquela escola logo depois de concluir a graduação em Pedagogia, fora-lhe atribuída a responsabilidade de ser Professora Referência de uma turma composta por crianças na faixa etária de 4 anos. Tão logo assumira o trabalho, começara a receber questionamentos acerca de sua suposta incompetência para conduzir processos de ensino-aprendizagem na educação infantil até que, num certo dia, recebera uma comunicação da supervisora da escola de que ela estaria sendo deslocada para trabalhar em outra turma. O motivo alegado dizia respeito à resistência de alguns pais que procuraram a direção da escola para manifestar o seu descontentamento diante do fato dos filhos estarem sendo formados por uma professora negra. Assim, cedendo à pressão feita pelos pais, a direção da escola deliberou por remanejar a referida professora, que então passou a ser Professora Auxiliar de outra professora numa outra turma, sendo que a escola assumira o compromisso de preservar o salário contratual pago às professoras de educação infantil.

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José Eustáquio de Brito

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Education and ethnic-racial relations: challenges and perspectives for the teaching work

Abstract

The advance of the fights of the black social movement in the context of the democratization of the Brazilian society offers the central argument for the article that it reflects on the historical direction of the education of the ethnic-racial relations as form of confrontation of racism and the social inaqualities naturalized by this ideology. It argues the implications of this demand from the approval of law 10,639/2003, that it modifies the Law of Lines of direction and the Bases of the Education to institute the obligatoriness of the education of history of Africa and cultures afro-Brazilians in the stages and modalities of the basic education. It is concluded identifying to some challenges for the activity of the professors, describing some initiatives in the field of the teaching formation that have made possible the development of practical pedagogical of recognition and valuation of the ethnic-racial diversity.

Keywords: racial relations; teaching work; formation of professors.

Ano 14 - n. 18 - dezembro 2011 - p. 57-74

Educação e Relações Étnico-Raciais: desafios e perspectivas para o trabalho docente

Recebido: 12/07/11Aprovado: 12/12/11

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O Programa de Educação Profissional de Minas Gerais e a evasão escolar: um estudo preliminar (2008-2010)

Wander Augusto Silva1

[email protected]

Rosemary Dore2

[email protected]

1 Professor da Faculdade de Educação da Universidade do Estado de Minas Gerais (FaE/CBH/UEMG). Doutorando em Educação pela FaE/UFMG.2 Professora-doutora do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais (FaE/UFMG).

Resumo

Este estudo apresenta um breve histórico das políticas públicas educacionais adotadas pelo governo do Estado de Minas Gerais, nas últimas décadas, para o ensino profissionalizante. Tenta-se definir e identificar a questão do abandono escolar no sentido de entender melhor esse fenômeno educacional. Posteriormente, é estudado o Programa de Educação Profissionalizante de Minas Gerais (PEP/MG) instituído pelo governo desse estado em 2007, que oferece, gratuitamente, vagas aos estudantes mineiros que desejam realizar cursos técnicos e estejam cursando ou tenham terminado o ensino médio. Para oferecer os cursos do PEP-MG, o estado compra vagas em escolas privadas e as disponibiliza aos estudantes aprovados em exame de seleção organizado pelo próprio estado. O estudo aqui apresentado resulta de uma análise preliminar relativa ao PEP I, primeiro ano do programa, realizado em 2008. Em seguida, mostra-se, com base em dados estatísticos, a evasão ocorrida no PEP I, indicando seus principais motivos.

Palavras -Chave : ens ino médio ; ens ino profissionalizante; evasão escolar.

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O Programa de Educação Profissional de Minas Gerais e a evasão escolar: um estudo preliminar (2008-2010)

1 Introdução

Este trabalho é um estudo preliminar sobre o Programa de Educação Profissional (PEP), política educacional do governo do Estado de Minas Gerais instituída a partir do ano de 2007. O presente texto focaliza, brevemente, as políticas adotadas pelo governo mineiro com referência à formação profissional de nível médio, entre 1996 e 2007: primeiramente, o governo extinguiu a formação profissional nas escolas de nível médio do estado, em 1996, e, dez anos depois, por meio da política do PEP, passou a comprar vagas na rede privada para oferecê-las aos estudantes que desejam uma formação técnico-profissional. Trata-se de uma clara tendência à privatização da formação de técnicos de nível médio, ocorrida no Estado de Minas Gerais. Além disso, mesmo que muitos estudantes recebam gratuitamente vagas em escolas privadas para seguir sua formação técnica, é muito alto o índice de abandono verificado no PEP-MG. Esse é o problema que este estudo procura evidenciar.

2 O ensino profissionalizante em Minas Gerais:1995-2010

Nos primeiros anos da década de 1990, acentuou-se no Brasil a tendência à privatização da educação, com a retirada do Estado como agente financiador de políticas públicas na área social, atingindo, particularmente, a educação e a cultura.

O Estado de Minas Gerais, à época governado por Eduardo Azeredo, seguia de perto e acolhia a política de minimização do Estado na área social. Em 1995, o governo mineiro celebrou com o Banco Mundial um contrato de empréstimo para financiamento do “Projeto de Melhoria da Qualidade na Educação Básica” e, ao mesmo tempo, iniciou a elaboração do “Programa de Melhoria do Ensino Médio” (PIRES, 2002). O intuito principal dessa medida foi o de solucionar o problema de vagas na educação média, então considerado meta principal a ser atingida pelo governo Azeredo (DORE SOARES, 1999). A proposta a ser implementada

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Wander Augusto Silva, Rosemary Dore

tinha como objetivo ampliar o ensino médio com formação propedêutica e estabelecer parcerias com os setores produtivos e de serviços para oferecer cursos técnicos. Esse modelo implicava a extinção dos cursos profissionalizantes, então existentes nas escolas estaduais. Essas suprimiriam os seus cursos técnicos3, os quais seriam organizados pelo Estado em parceria com o setor privado, tais como organizações sociais, instituições particulares, instituições ou empresas governamentais.

Em 1996, o governo de Minas Gerais estabeleceu que, até 1998, as habilitações profissionais ofertadas pelas escolas da rede estadual seriam avaliadas e, dependendo do resultado da avaliação, seriam extintas4. Como resultado dessa medida, foram eliminadas 311 habilitações profissionais das instituições escolares da rede estadual (PIRES, 2002).

A consequente redução da oferta de formação profissional pelas escolas estaduais, resultante da reforma empreendida pelo governo do Estado de Minas Gerais, atendia, segundo Dore Soares (1999), às recomendações do Banco Mundial, que se transformou na principal agência de assistência técnica em matéria de educação para os países em desenvolvimento. Ainda conforme a autora, as políticas adotadas pelo Banco Mundial vinculavam-se às determinações advindas do “Consenso de Washington”.

O elo entre as políticas educacionais no Brasil e as diretivas do Banco Mundial também é analisado por Cunha (2000). Para ele, desde o início da década de 1990, aquele banco fazia recomendações explícitas a respeito da educação técnico-profissional, entendida como um elemento estratégico de mudança da estrutura educacional de diversos países, especialmente dos da América Latina.

Cunha (2000) menciona o documento “Educación técnica y formación profesional” para dele destacar o propósito de separar a educação e a capacitação profissional, com base no argumento de que cada uma delas demanda aspectos diferentes dos sistemas, das instituições,

3 Conforme Pires (2002), a Escola Estadual Técnica Industrial Professor Fontes, em Belo Horizonte, em 1998 esteve obrigada pela Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais (SEE/MG) a encerrar os cursos técnicos de nível médio. A comunidade dessa escola, através de forte mobilização, pediu a continuidade dos cursos técnicos, que foram reativados em 1999 (curso de Técnico em Mecânica e Técnico em Eletrônica).4 Conforme Resolução nº 7.905, de 1996, da SEE/MG, indicada em Pires (2002).

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dos instrutores e dos administradores. No que concerne ao formato institucional, o Banco Mundial chega a recomendar a retirada das escolas técnico-profissionais do âmbito do Ministério da Educação de cada país e a sua vinculação ao setor privado.

No Estado de Minas Gerais, o Banco Mundial financiou um projeto na área gerencial, o “Programa de Qualidade Total na Educação” (PQTE), concebido com o apoio técnico da Fundação Christiano Ottoni (DORE SOARES, 1999). A iniciativa e o apoio do Banco Mundial para implementar suas estratégias de política educacional em Minas Gerais se sustentavam nos seguintes argumentos: foi o primeiro estado que implantou, simultaneamente, o ciclo básico, o programa de avaliação da escola pública, a eleição dos diretores pela comunidade escolar, a criação dos colegiados escolares e a autonomia escolar. Eram justamente as medidas tidas como resultado de um processo de democratização da educação em Minas Gerais que davam ao Banco Mundial os subsídios para aplicar suas propostas conservadoras.

Justamente no período de 1996 a 1997, quando se iniciou o processo de extinção das habilitações profissionais na rede estadual de Minas Gerais, a professora Rosemary Dore coordenava uma pesquisa, intitulada “Análise Prospectiva da Formação Profissional: o caso de Minas Gerais”, realizada por professores e pesquisadores de instituições integrantes do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Formação Profissional em Minas Gerais (NEFOR-MG)5.

Naquela época, de acordo com os dados da referida pesquisa, Minas Gerais tinha 1.852 escolas de ensino médio (profissionalizante e propedêutico), compreendendo todas as redes existentes, na esfera pública e privada (ver TAB. 1)6.

5 As instituições participantes do NEFOR-MG eram: Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG), Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC/MG), Universidade Federal de Lavras (UFLA), Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e a Fundação de Educação para o Trabalho de Minas Gerais (UTRAMIG). Essa pesquisa ganhou prêmio de Educação Profissional do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC) em 2000.6 As Tabelas 1, 2, 4 e 6 foram organizadas pela equipe de pesquisadores do NEFOR-MG (ver DORE SOARES, 1999), tendo como fonte de dados a SEE/MG e foi atualizada, em 2000, por Pires (2002).

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O Programa de Educação Profissional de Minas Gerais e a evasão escolar: um estudo preliminar (2008-2010)

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Rede de ensino

FederalEstadualMunicipalParticularTotal

1986

16522145499

1.182

%

1,3544,1612,2742,22

100

1991

14811123407

1.355

%

1,0359,859,08

30,04100

1996

221.203

179448

1.852

%

1,1964,969,67

24,19100

2000

611.532

154804

2.551

%

2,3960,056,04

31,54100

Fonte: “Análise Prospectiva da Formação Profissional: o caso de Minas Gerais”, 1999, relatório técnico final.

No ano de 1996, a rede estadual se destacava na oferta do ensino profissional, possuindo um número de 183.649 matrículas, representando 69,56% do total de alunos matriculados nesse tipo de ensino. A rede particular de ensino, por sua vez, registrava um número de 37.892 alunos, representando 14,35% do total de matrículas no ensino profissionalizante em Minas Gerais (ver TAB. 2).

TABELA 2Número de matrículas na educação profissional por dependência

administrativa, em MG: 1986-2000

Fonte: “Análise Prospectiva da Formação Profissional: o caso de Minas Gerais”, 1999, relatório técnico final.

Rede de ensino

FederalEstadualMunicipalParticularTotal

1986

4.86674.12014.76664.126

157.856

%

3,0846,959,35

40,62100

1991

4.933104.71715.80140.902

166.353

%

2,9762,959,50

24,59100

1996

9.887183.64932.57037.892

263.998

%

3,7569,5612,3414,35

100

2000

4.56810.1494.859

26.17745.753

%

9,9822,1810,6257,21

100

A partir da reforma do ensino médio no Estado de Minas Gerais, ocorreu um expressivo aumento da participação da rede privada na oferta de ensino profissional. Tal crescimento, correspondendo a 82,60% de todas as escolas (rede estadual, rede municipal e rede federal), pode ser identificado com base nos dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), referente ao ano de 2009 (ver TAB. 3).

TABELA 1Número total de estabelecimentos no ensino médio (profissionalizante e não profissionalizante), por dependência administrativa: 1986-2000

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Wander Augusto Silva, Rosemary Dore

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TABELA 3Número de estabelecimentos de educação profissional por

dependência administrativa, em MG: 2009

Rede de ensino

FederalEstadualMunicipalParticularTotal

2009

282732414501

%

5,605,406,40

82,60100

Fonte: INEP. Censo Escolar 2009. Sinopses Estatísticas.

Os dados do INEP sobre o número de estabelecimentos escolares de Minas Gerais em 2009, na esfera pública e privada, mostram que, enquanto as escolas públicas representam 17,4% do total da oferta de ensino profissional, as escolas da rede particular representam 82,60%. Nesse quadro, o governo estadual é responsável por apenas 5,4% da oferta de formação profissional em nível médio.

Com referência ao número de alunos matriculados no ensino médio, os dados do INEP também permitem dizer que, em 1986, a maioria (67,20%) frequentava escolas profissionalizantes. Contudo, a situação se inverte em 2009, pois a maioria dos alunos (87%) passa a frequentar a escola de formação geral (ver TAB. 4 e 5). No ano de 2000, passa a predominar a formação geral, já que 95,39% dos alunos, portanto a maioria, frequentava escolas que não ofereciam nenhuma habilitação profissional (ver TAB. 4).

TABELA 4Número de matrículas no ensino médio, por tipo de ensino,

em Minas Gerais: 1986-2000

Fonte: “Análise Prospectiva da Formação Profissional: o caso de Minas Gerais”, 1999, relatório técnico final.

Tipo de ensino

Sem habilitaçãoProfissionalizanteTotal

1986

77.060157.856234.916

%

32,8067,20100

1991

118.674166.353285.027

%

41,6458,36100

1996

309.660263.998573.658

%

53,9846,02100

2000

947.25645.753993.009

%

95,394,61100

Ano 14 - n. 18 - dezembro 2011 - p. 75-95

O Programa de Educação Profissional de Minas Gerais e a evasão escolar: um estudo preliminar (2008-2010)

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TABELA 5Número de matrículas no ensino médio, por tipo de ensino,

em Minas Gerais em 2009

Tipo de ensino

Sem habilitaçãoProfissionalizanteTotal

2009

716.146107.318823.464

%

87,0013,00

100

Fonte: INEP. Censo Escolar 2009. Sinopses Estatísticas.

Já em 1996, os dados do relatório técnico final da pesquisa “Análise Prospectiva da Formação Profissional: o caso de Minas Gerais” (1999) mostram que o número de matrículas no ensino profissionalizante da rede estadual em Minas Gerais correspondia a 183.649 alunos, o que representava 69,56% do total de matrículas (ver TAB. 6). Naquele ano, quando tem início a extinção dos cursos profissionalizante da rede estadual, esta se constituía na maior rede a oferecer esse tipo de ensino em Minas Gerais. Todavia, em 2009, o declínio da rede estadual na oferta de formação profissional é gritante, correspondendo a apenas 6,90%, enquanto a rede particular se responsabiliza pela mais elevada oferta de ensino profissional, correspondendo a 76,85% da oferta dessa modalidade de formação no Estado de Minas Gerais (ver TAB. 7). Em seguida, com uma diferença bastante significativa, encontra-se a rede pública federal, representando apenas 12,08% da oferta de ensino profissional no estado.

TABELA 6Número de matrículas na educação profissional por

dependência administrativa, em MG: 1986-2000

Fonte: “Análise Prospectiva da Formação Profissional: o caso de Minas Gerais”, 1999, relatório técnico final.

Rede de ensino

FederalEstadualMunicipalParticularTotal

1986

4.86674.12014.76664.126157.856

%

3,0846,959,3540,62100

1991

4.933104.71715.80140.902166.353

%

2,9762,959,5024,59100

1996

9.887183.64932.57037.892263.998

%

3,7569,5612,3414,35100

2000

4.56810.1494.85926.17745.753

%

9,9822,1810,6257,21

100

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Wander Augusto Silva, Rosemary Dore

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TABELA 7Número de matrículas na educação profissional por dependência

administrativa, em MG: 2009

Fonte: INEP. Censo Escolar 2009. Sinopses Estatísticas.

Rede de ensino

FederalEstadualMunicipalParticularTotal

2009

12.9717.4084.471

82.468107.318

%

12,086,904,17

76,85100

Também em 2009, de acordo com os dados do INEP (2009), a maioria dos alunos matriculados na educação profissional, em Minas Gerais, estava na faixa de 20 a 24 anos, correspondendo a um total de 40.222 alunos (ver TAB. 8). Já aqueles que deveriam cursar essa modalidade de ensino na idade regular, entre 15 e 17 anos, representavam somente 9.317 alunos. Dessa forma, quem cursa o ensino profissionalizante atualmente é, predominantemente, o jovem maduro e que já passou pelo ensino médio de formação geral.

TABELA 8Número de alunos da educação profissional por faixa etária, em

Minas Gerais: 2009

Fonte: INEP. Censo Escolar 2009. Sinopses Estatísticas.

Total

106.701

0 a 14

69

15 a 17

9.317

18 e 19

19.527

20 a 24

40.222

25 a 29

19.446

30 a 39

13.206

Mais de 39

4.914

A extinção da educação profissionalizante nas escolas estaduais pelo governo de Minas Gerais, entre 1996 e 1998, levou à situação atual, na qual é insignificante a oferta de formação profissional na rede pública, principalmente quando comparada à rede particular.

Assim, tendo destruído as possibilidades de formação profissional na rede estadual, o governo de Minas Gerais decidiu, a partir de

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O Programa de Educação Profissional de Minas Gerais e a evasão escolar: um estudo preliminar (2008-2010)

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2007, criar o Programa de Educação Profissional do Estado de Minas Gerais (PEP-MG). Por meio desse programa, passou a comprar vagas das escolas particulares de ensino profissional para oferecê-las aos estudantes da rede pública estadual e também aos concluintes da rede particular ou municipal.

Com essa política pública do governo de Minas Gerais, consolida-se a transferência da competência da oferta do ensino médio profissional do setor público estadual para o setor privado. O governo estadual passa a contratar a escola técnica privada para um serviço temporário e não assume o seu papel de manter escolas públicas para essa modalidade de ensino. O PEP-MG oferece curso e material gratuito aos estudantes das escolas públicas estaduais. Entretanto, mesmo que os alunos disponham dos recursos oferecidos pelo governo para realizar sua formação profissional, é elevada a quantidade daqueles que abandonam os cursos profissionalizantes.

3 O Programa de Educação Profissional deMinas Gerais e a evasão escolar

Com o Programa de Educação Profissional, o governo de Minas Gerais estabeleceu a meta de qualificar profissionalmente, no período de 2007 a 2010, cerca de 110 mil jovens que frequentam o 2º e 3º anos do ensino médio das escolas estaduais, bem como jovens de 18 a 24 anos que já concluíram o ensino médio em qualquer rede7.

O governo compra vagas em escolas da rede privada de ensino profissionalizante e as oferece ao aluno melhor classificado em uma prova classificatória, realizada anualmente. O aluno não paga o seu curso nem o material didático requerido, pois o governo do Estado custeia sua formação, embora não forneça outro tipo de ajuda, tal como bolsa de estudo ou auxílio financeiro indireto. Podem participar do processo seletivo, para ingressar no PEP-MG, alunos regularmente matriculados no 2º ou no 3º ano do ensino médio de escolas públicas estaduais, alunos regularmente matriculados no 1º ou no 2º ano do

7 Esses dados são apresentados no sítio do PEP-MG. Disponível em: <www.educacao.mg.gov.br/projetos/projetos-estruturador>. Acesso em: 20 abr. 2010.

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Wander Augusto Silva, Rosemary Dore

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curso de Educação de Jovens e Adultos (EJA) de ensino médio, na modalidade presencial, e aqueles que já concluíram o ensino médio, em instituições públicas ou privadas, desde que não estejam cursando o ensino superior. Metade das vagas do PEP-MG é destinada somente aos alunos que estão cursando o ensino médio na rede pública estadual; a outra metade das vagas é disputada por alunos oriundos de escolas privadas ou que já concluíram o ensino médio em qualquer rede de ensino.

Os convênios estabelecidos entre o governo do Estado de Minas Gerais e as instituições de formação profissional se fundamentam em análises das propostas das escolas que desejam participar do PEP-MG e aceitam a sua regulamentação.

Nas instituições credenciadas pela SEE/MG (escolas particulares e do “sistema S”8) o PEP-MG ofereceu, em 2008, 23 mil vagas para 67 diferentes cursos, em 72 municípios9. Na rede estadual, 81 escolas, pertencentes a 60 diferentes municípios do estado, passaram a oferecer 24 cursos profissionalizantes para 10.891 alunos, incluindo o curso normal, voltado para a educação infantil.

Não obstante as maiores facilidades oferecidas pelo governo do Estado de Minas Gerais para os jovens realizarem o curso de formação profissional, o abandono no PEP-MG tem se mostrado surpreendentemente elevado.

As informações sobre a evasão no PEP-MG10 foram obtidas por meio de um sistema de monitoramento dos cursos, organizado pela SEE/MG, no qual são listados 13 motivos a serem escolhidos pelos alunos para indicar as suas razões para abandonar a formação profissional (ver TAB. 9).

8 O chamado “sistema S” refere-se ao ensino técnico de nível fundamental e médio profissionalizante, oferecido pelas seguintes autarquias: Serviço Social do Comércio (SESC), Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) e Serviço Social da Indústria (SESI).9 As referidas informações são apresentadas no sítio do PEP-MG. Disponível em: <https://www.educacao.mg.gov.br/projetos/projetos-estruturadores/417-programa-de-educacao-profissional-pep>. Acesso em: 20 abr. 2010.10 No que diz respeito ao PEP, seus gestores convencionaram designar cada etapa do programa como PEP I, para o ano de 2008, PEP II para o ano de 2009, PEP III para o ano de 2010 e assim sucessivamente. Os dados aqui apresentados se relacionam ao PEP I.

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TABELA 9Causas de evasão no Programa PEP 2008

Causas do abandono (PEP)

1. Emprego2. Desinteresse / Sem justificativa3. Horário incompatível4. Estudos5. Ingresso no curso superior6. Mudança de município7. Saúde8. Transporte9. Gravidez10. Achou muito difícil11. Não se identificou com o curso12. Filhos

%

36,5620,919,158,917,404,233,012,951,851,851,751,43

Fonte: SUPERINTENDÊNCIA DE ENSINO MÉDIO E EDUCAÇÃO PROFISSIONAL, SEE/MG, 2010

As informações obtidas através do sistema de monitoramento mostram que, em relação ao ano de 2008 (PEP-MG), do qual participaram 72 municípios, houve um índice de evasão superior a 10% nos cursos oferecidos em 25 cidades do Estado de Minas Gerais. Trata-se de um índice alto de abandono.

Avaliar se uma determinada taxa de evasão é alta ou não é algo complexo, pois o objetivo das organizações internacionais, voltadas à educação, bem como de pesquisadores do assunto, é o de que não exista evasão. No âmbito internacional, a União Europeia fixou, numa reunião realizada em Lisboa, em 2000, que, até o ano de 2010, a taxa média de abandono escolar precoce nos países componentes daquela organização não deveria ser mais de 10% (Cf. EUROPEAN COUNCIL, 2004, p. 21). No que diz respeito ao Brasil, uma pesquisa realizada pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), em 2009, indica que uma taxa de evasão acima de 17,8% poderia ser considerada alta, embora não apresente maiores detalhamentos sobre o uso desse parâmetro. Entretanto, tomando-se o valor de 10% como índice aceitável e 17% como elevada taxa de evasão, verifica-se que, em 11 municípios do Estado de Minas Gerais, os índices são ainda maiores do que aquele da pesquisa brasileira, apresentando

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uma taxa que varia entre 46,67 e 19,26%, sendo que, em quatro deles, a taxa é até de até 15% de evasão (ver TAB. 10).

TABELA 10Cidades com maior índice de evasão no programa PEP 2008

Fonte: SUPERINTENDÊNCIA DE ENSINO MÉDIO E EDUCAÇÃO PROFISSIONAL, SEE/MG, 2010

MUNICÍPIO (PEP)

Carmo do ParanaíbaSanta VitóriaSanta Rita do SapucaíAraguariFrutalMatozinhosItaúnaPoços de CaldasCataguasesVespasianoVazanteParacatuCaratingaTeófilo OtoniBelo Horizonte

% de evasão

46,6729,8227,4926,6725,7621,3220,4819,7519,6719,5819,2617,3917,1415,2515,02

Considerando o índice de 1,5% como baixo e tomando-o como parâmetro do desempenho do PEP-MG, verifica-se que somente 15 municípios, dos 72 participantes desse programa, demonstraram, no ano de 2008, um baixo índice de evasão (ver TAB. 11).

TABELA 11Cidades com menor índice de evasão no programa PEP 2008

MUNICÍPIO (PEP)

Sete LagoasÁguas FormosasItuiutabaArcosBrumadinhoCel. Fabriciano

% de evasão

1,150,950,860,000,000,00

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Fonte: SUPERINTENDÊNCIA DE ENSINO MÉDIO E EDUCAÇÃO PROFISSIONAL, SEE/MG, 2010.

MUNICÍPIO (PEP)

Cons. LafaieteCoromandelDiamantinaOliveiraPedra AzulSantos DumontTimóteoTrês CoraçõesTrês Marias

% de evasão

0,000,000,000,000,000,000,000,000,00

As informações obtidas pela SEE-MG sobre a evasão do PEP-MG mostram que a principal razão apresentada pelos evadidos é a necessidade de emprego (36,56%), seguida pelo desinteresse (20,91%) e, depois, bem abaixo, encontram-se outros motivos, tais como horário incompatível, ingresso no curso superior, mudança de cidade. O aluno do PEP abandona o curso por duas razões principais: a) pela sobrevivência, ou seja, a necessidade imediata de trabalho; b) devido ao desinteresse em fazer um curso profissionalizante.

Os motivos para a evasão escolar, constantes do questionário aplicado pelo PEP-MG, não são muito precisos quanto a algumas alternativas para aferir as causas do abandono do aluno. Algumas opções são imprecisas, como se pode observar, por exemplo, na segunda opção mais indicada “Desinteresse/Sem justificativa”, que corresponde a 20,91%, não deixando claro o tipo de desinteresse ao qual o aluno se refere.

O estudo sobre o fenômeno da evasão escolar no ensino médio profissionalizante no Brasil, especialmente em Minas Gerais, ganha contornos de urgência, uma vez que se trata de um curso caro, para o qual têm sido canalizados investimentos muito altos. Sem concluir a formação profissional, o indivíduo também reduz suas chances de inserção de modo qualificado no mercado de trabalho.

Dramática também é a evasão escolar no ensino médio, como mostra a pesquisa da Fundação Getúlio Vargas (2009). Seus resultados indicam que a tendência de abandono da escola, no ano de 2006, foi de 17,8%,

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considerando os jovens entre 15 a 17 anos, ocorrendo já no primeiro ano de estudos. Entre os principais motivos para a evasão escolar, a pesquisa menciona três fatores: não quer estudar ou falta interesse (40,29%), necessidade de trabalhar (27,09%) e falta de acesso à escola (10,89%).

Com o objetivo de melhorar a qualidade do ensino médio nas escolas públicas do país, o Ministério da Educação elaborou o documento “Ensino Médio Inovador” (BRASIL, 2009), fixando diretrizes voltadas a: superar desigualdades de oportunidades educacionais, universalizar o acesso e a permanência dos adolescentes de 15 a 17 anos no ensino médio, consolidar a identidade do ensino médio, oferecer aprendizagem significativa para jovens e adultos, reconhecer a prioridade da interlocução com as culturas juvenis. De acordo com o mencionado documento, apenas 68% dos jovens brasileiros, entre 15 e 19 anos, que deveriam frequentar o ensino médio estavam na escola; desses, apenas 13,44% estavam matriculados em cursos profissionalizantes em 200611.

Já as informações apresentadas pelo Censo Escolar do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) sobre a situação do ensino profissionalizante de nível médio no Brasil, nos anos de 2007 e 2008, mostram que a maioria dos alunos matriculados na educação profissional técnica, por faixa etária, está na idade entre 20 e 24 anos e representa 31,78% das matrículas nessa modalidade de ensino. Ainda conforme os dados do INEP (2007; 2008), houve um decréscimo no número de alunos matriculados no ensino médio no Brasil, nos anos de 2007 e de 2008: enquanto em 2007 o percentual de alunos representava 15,78% (correspondendo a 8.369.369 alunos), em 2008 houve um declínio, passando para o percentual de 15,72% (representado 8.366.100 alunos).

Atualmente, não é tarefa simples definir, identificar e classificar a evasão escolar, pois, além de existir uma indeterminação sobre o conceito de evasão, há também outros obstáculos a serem superados. Eles se relacionam, por exemplo, à obtenção de dados sobre a evasão, aos períodos considerados pelos organismos que coletam informações sobre o problema, às metodologias para o seu estudo. Não bastassem essas limitações, há

11 Os dados constantes do documento “Ensino Médio Inovador” (BRASIL, 2009) apresentam estimativas baseadas na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), relativas ao ano de 2006.

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também a grande dificuldade de localizar jovens que abandonaram a escola e de conseguir que eles falem sobre o assunto, devido, muitas vezes, ao desconforto que a situação representa para eles. Buscando identificar as condições que levam ao abandono escolar no ensino médio, Schargel e Smink (2002) indicam que o National Center for Education Statistics (NCES), nos Estados Unidos, considera como evadido o aluno que, em relação ao ano letivo daquele país, que se inicia no mês de outubro:

a) Estava matriculado em uma escola em algum período do ano letivo anterior, mas que não se encontrava mais matriculado em 1 de outubro do ano letivo em curso, oub) Não estava matriculado em 1 de outubro do ano letivo anterior, embora devesse estar,c) Não conclui o segundo grau nem um programa educacional aprovado pelo estado ou distrito,d) Não atende qualquer das seguintes condições excludentes: – transferência para escola pública de outro distrito, para uma escola particular, ou para um programa educacional aprovado pelo estado ou distrito, – ausência temporária da escola por motivo de suspensão ou doença ou – morte (SCHARGEL; SMINK, 2002, p. 17).

Outros fatores relevantes a serem considerados no exame do problema da evasão escolar dizem respeito à complexidade e à variedade de situações que o permeiam e aos diversos tipos e fatores que sobre ele incidem. Entre eles, segundo Schargel e Smink (2002), encontram-se, por exemplo, o abandono “eventual” (aquele que abandona e depois de um período retorna), o abandono “situacional” (o aluno faz o curso, mas não o conclui e não recebe um certificado de segundo grau) e o abandono por “contemporaneidade” (refere-se ao conjunto de alunos que deixam o ensino médio ao longo de um período de formação).

Existem fatores que, para Schargel e Smink (2002), podem ser considerados como de maior incidência sobre a evasão escolar, como a necessidade de trabalho, a pobreza, a falta de formação básica de qualidade no ensino fundamental, a dificuldade de acesso à escola, o não gostar da escola, a violência, a gravidez, entre outros. Os referidos autores traçam um resumo dos três possíveis tipos de evadidos mais

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12 Ver Emenda Constitucional n. 14, de 1996.13 Conforme os art. 36A, 36B, 36C e 36D da Seção IVA da LDB 9.394/1996, incluídos através da Lei 11.741, de 16 de julho de 2008. 14 Isso ocorre quando foi alterado o texto da LDB 9.394/1996, passando-se da “progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade ao ensino médio” para “universalização do ensino médio gratuito”. Ver Lei n. 12.061/2009, no título III, artigo 4º, inciso II.

comuns e chegam à seguinte classificação: o primeiro tipo seria o dos “dissidentes”, alunos prestes a abandonar ou que já abandonaram a escola; o segundo seria o dos “desinteressados”, alunos que permanecem na escola, mas que perderam o interesse pelo aprendizado; e, finalmente, o dos “excluídos”, que são aqueles suspensos ou expulsos das escolas.

4 Considerações finais

As políticas públicas propostas e executadas pelo governo do Estado de Minas Gerais, destinadas ao ensino profissional, mostram que, desde o ano de 1996, houve uma reversão de peso com respeito à oferta dessa modalidade de ensino. A tendência à privatização da oferta do ensino profissional de nível médio, expressa nos dados aqui apresentados, é muito clara. Eles mostram também que o governo do Estado de Minas Gerais não assume de forma integral sua responsabilidade em relação não apenas ao ensino profissional, como também em relação ao ensino médio em geral12, obrigação essa estabelecida pela Constituição Federal.

A transferência da responsabilidade da oferta do ensino médio do setor público para o privado indica também que o governo de Minas Gerais não tem respeitado as diretrizes legais para o ensino (Lei de Diretrizes e Bases da Educação LDB – 1996). Desde o ano de 200813, a legislação educacional do país incorporou o ensino técnico profissional ao ensino médio, indicando que a habilitação ali oferecida poderá ser desenvolvida nos próprios estabelecimentos de ensino médio ou em cooperação com instituições especializadas. A compra de vagas, oferecida através do PEP-MG, não pode ser considerada uma ação de cooperação e sim uma transferência de responsabilidade.

Em 2009, a legislação que orienta nacionalmente a educação no país passou a ter uma nova redação, segundo a qual o ensino médio e o ensino fundamental têm a mesma importância14. Assim, a busca da

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universalização do ensino não fica restrita somente ao ensino fundamental, mas vai mais além, abrangendo também o ensino médio. Considerando esses aspectos das diretivas educacionais do país, o governo de Minas Gerais deveria oferecer ensino médio a todos os jovens na faixa etária de 15 aos 18 anos, seja ou não profissional, em sua própria rede de ensino e não de forma eventual, como a que tem sido ofertada através do PEP-MG. Outro aspecto que evidencia a desatenção do governo com referência à educação profissional é a pouca cobertura de cidades que foram contempladas com o PEP-MG em 2008, limitando-se a apenas 72 municípios, num total de 853 de cidades em todo o Estado de Minas Gerais.

A política educacional do Governo de Minas Gerais tem dado prioridade ao setor privado, o que vem ocorrendo nitidamente desde 1996, quando foi extinta a formação profissional nas escolas públicas. A nova política de formação profissional, aqui examinada, também privilegia a aplicação de recursos públicos no setor privado, beneficiando as escolas profissionalizantes da rede particular e não respondendo adequadamente às exigências de qualificação profissional dos jovens mineiros, dado o elevado índice de evasão registrado no PEP-MG.

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Referências

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SCHARGEL, F. P.; SMINK, J. Estratégias para auxiliar o problema de evasão escolar. Tradução de Luiz Frazão Filho. Rio de Janeiro: Dunya Ed., 2002.

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The Vocational Education Program of Minas Gerais and drop out: a preliminary study

(2008-2010)

Abstract

This study presents a brief history of educational public policies adopted by the State of Minas Gerais, in recent decades, for vocational education. The paper tries to define and identify the issue of school dropout in order to better understand this education phenomenon. Subsequently, it is studied the Vocational Education Program of Minas Gerais (PEP-MG in Portuguese) introduced by the government of this state in 2007, which offers free seats for students from Minas Gerais who wish to follow vocational courses and are studying or have finished high school. To offer courses of PEP-MG, the state buys places in private schools and provides them to students who have passed in an exam organized by the state. The study presented here results from a preliminary analysis on the PEP I, the first year of the program conducted in 2008. Then it is shown, based on statistical data, the drop out occurred in the PEP I, indicating their main reasons.

Keywords: high school; vocational education; school dropout.

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Recebido: 21/06/11Aprovado: 27/08/11

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O Sistema Mineiro de Avaliação da Educação Pública: a percepção dos profissionais das escolas públicas

estaduais de Belo HorizonteStella Willians de Carvalho1

[email protected]

Jussara Maria de Pinho Magalhães Penna2

[email protected]

Elias José Lopes de Freitas3

[email protected]

Maria José Pereira4

[email protected]

Ofélia de Souza Vieira5

[email protected]

1 Professora da FaE/UEMG.2 Professora da FaE/UEMG.3 Professor da FaE/UEMG e da Rede Municipal de Belo Horizonte.4 Professora da FaE/UEMG.5 Professora da FaE/UEMG.

Resumo

Este artigo analisa os resultados da pesquisa “O olhar das escolas públicas estaduais de Minas Gerais para os resultados do SIMAVE”, desenvolvida pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Políticas Educacionais da FaE/UEMG, que trata da centralidade das avaliações sistêmicas no cenário educacional brasileiro e suas implicações

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para a prática pedagógica dos sujeitos que atuam na escola: diretores, coordenadores e professores. Inicialmente, pretende-se discutir o processo de implementação das avaliações sistêmicas no país a partir do resgate da conjuntura histórica mundial e brasileira. Em seguida, focaliza-se a percepção dos sujeitos envolvidos nas escolas no processo de avaliação do SIMAVE.

Palavras-Chave: avaliação sistêmica; política educacional; reforma educacional; instituição escolar.

1 Introdução

As avaliações sistêmicas, universo no qual se insere o Sistema Mineiro de Avaliação da Educação Pública (SIMAVE), são uma das mais recentes e controversas iniciativas do poder público em termos de política educacional. De um lado, estão aqueles que as defendem, afirmando sua importância na garantia da eficiência do sistema no que se refere à aquisição de competências básicas pelos alunos. De outro, estão aqueles que as criticam, apontando-as como passíveis de homogeneização e controle pelo poder central do conteúdo curricular das escolas. Divergências a parte, o que se sabe é que tais avaliações têm estado presentes em vários sistemas de ensino, como acontece frequentemente nas escolas da cidade de Belo Horizonte. Elas passaram a nortear a gestão educacional no sentido de apontar em que aspectos devem ser investidos maiores esforços para o alcance de melhores resultados no processo de ensino-aprendizagem. Por essa razão, não se pode mais desconsiderar o estudo dessa política quando se pretende entender a gestão dos sistemas educacionais na atualidade.

Mas, se por um lado, as avaliações sistêmicas têm sido uma ferramenta de gestão das instâncias centrais, a divulgação dos seus resultados acaba por remeter-nos à outra ponta do processo educacional: a escola. Um dos efeitos das avaliações sistêmicas é ensejar um olhar para a escola como uma das responsáveis pelo bom ou mau resultado conseguido nessas aferições. Cabem aí algumas perguntas: como aqueles que se inserem dentro da escola, seja como gestores ou professores, percebem

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O Sistema Mineiro de Avaliação da Educação Pública:a percepção dos profissionais das escolas públicas estaduais de Belo Horizonte

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os resultados dessas avaliações? Até que ponto esses atores veem esses resultados como consequência de suas condutas pedagógicas? Até que ponto tais resultados norteiam modificações e transformações nos seus projetos pedagógicos?

Este artigo é resultado de pesquisa que pretende dirigir tais questionamentos para o processo específico do SIMAVE, em escolas da cidade de Belo Horizonte (MG) que integram o projeto “Escola Viva, Comunidade Ativa”. As escolas pesquisadas foram selecionadas de forma aleatória, contemplando as metropolitanas A, B e C, que são responsáveis pela organização e funcionamento das escolas públicas na região metropolitana de Belo Horizonte. Entende-se que a interação na forma de aceitação, rejeição, apoio ou crítica, dos atores envolvidos nas políticas públicas influencia a trajetória das escolas, determinando seus avanços ou recuos.

A metodologia adotada para a investigação foi a pesquisa de campo, acompanhada de pesquisa bibliográfica e documental. A coleta de dados se deu por meio de entrevista semiestruturada e observação sistemática não participante nas escolas selecionadas. A análise e a discussão dos dados resultaram em um texto descritivo e analítico das categorias e dos atores envolvidos: diretores, coordenadores (incluindo-se supervisores e orientadores) e professores.

2 Revisão de literatura

2.1 As políticas públicas

Segundo Azevedo (1997), o Estado ganha visibilidade e materialidade através da adoção de determinadas medidas, as quais podem ser chamadas de políticas públicas. A autora parte desse pressuposto para argumentar que o Estado, através de suas estratégias, diante de determinados problemas, tentará impor um modelo de organização social de acordo com a orientação dos grupos que nele ocupam posições estratégicas. Deutsch (1984) lembra que as políticas públicas, apesar de formuladas pelo Estado, refletem os conflitos entre os vários grupos de interesses que compõem a sociedade.

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De acordo com Azevedo (1997), a formulação de tais políticas emerge da existência de determinadas questões que passam a ser discutidas pela sociedade através de alguns de seus grupos que conseguem dar a elas o status de uma questão socialmente problematizada e que passa a exigir especial atenção do poder público. A satisfação dessas expectativas daria legitimidade ao poder público, facilitando a governabilidade. As políticas públicas seriam, portanto, as políticas tomadas pelo Estado que tenham por objeto o público. Em outras palavras, as políticas públicas nasceriam das demandas de determinados grupos que, por sua mobilização, inserem-nas na agenda governamental.

Deve-se ressaltar que, por essa razão, as políticas públicas assumirão a marca dos grupos que ocupam posições estratégicas, tanto dentro da sociedade civil quanto do aparato burocrático responsável pela sua formulação e implementação. Ressalte-se, também, o papel daqueles setores responsáveis pela sua execução que, certamente, poderão influir nos seus contornos finais.

Estudar a relação de forças presentes entre os grupos que compõem a sociedade civil permite, como defendia Gramsci (1978), compreender os caminhos traçados na sociedade política, já que os grupos hegemônicos presentes na primeira estariam em condição de exercer grande influência na tomada de decisão pela sociedade política. Mesmo o aparato burocrático responsável pela implementação das políticas estaria sob a influência desses grupos hegemônicos.

É importante assinalar que mesmo os grupos que, aparentemente, não têm poder de influir na formulação e na implementação das políticas não se silenciam e, através de alguns atos, mostram sua posição de oposição ou não concordância a elas. Dessa forma, quando da operacionalização de uma política pública, esta poderá avançar ou não de acordo com o que pensam os grupos que com ela lidarão nessa etapa. Segundo Bonetti (2006, p. 76):

[...] as pessoas, todavia, que entram em contato com as políticas públicas no decorrer de suas longas trajetórias, não pensam de modo uniforme, não têm a mesma interpretação de intervenção na realidade. As políticas públicas, ao longo de seus percursos, são contaminadas por interesses, inocências e sabedorias.

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Dessa forma, tem-se que as políticas públicas nascem para a solução, por parte do Estado, daquilo que chamamos de questões socialmente problematizadas, trazem em si a marca de grupos hegemônicos dentro da sociedade, grupos esses que influenciam sua formulação e operacionalização, e dependem, em última instância, da concordância dos grupos responsáveis por sua implementação.

No caso das políticas educacionais, deve-se considerar que elas articulam-se ao projeto de sociedade que os grupos hegemônicos pretendem implantar ou que está em curso, em cada momento histórico ou em cada conjuntura, projeto esse que corresponde ao referencial global de uma sociedade.

Tal projeto de sociedade é construído pelas forças sociais, globais, nacionais e locais que têm poder de voz e de decisão e que, por isso, fazem chegar seus interesses até o Estado e a máquina governamental, influenciando a formulação e a implementação das políticas ou dos programas de ação. “O cotidiano escolar, portanto, representa o elo final de uma complexa cadeia que se monta para dar concretude a uma política – a uma policy – entendida aqui como um programa de ação” (AZEVEDO, 1997, p. 59).

2.2 As políticas educacionais brasileiras nosúltimos anos do século XX

2.2.1 Os problemas da evasão e da repetência

Pode-se afirmar que nas décadas de 70 e 80 tornou-se realidade a universalização do ensino público, fruto de uma luta iniciada em meados do século XX. Esse processo representou, sem dúvida, um grande passo para a democratização da educação no país e ganhou visibilidade com a chegada da escola às periferias dos grandes centros urbanos. Isso significou a incorporação de grandes contingentes da população, notadamente as classes populares.

A expansão quantitativa da rede pública trouxe consigo uma nova realidade, a de que as classes populares não conseguiam seguir a trajetória escolar tida como ideal, isto é, a superação de todas as etapas

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previstas na escolarização. Os números da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), referentes ao censo realizado pelo IBGE em 1982, atestam isso, mostrando a incidência da repetência entre os grupos menos favorecidos economicamente:

TABELA 1Incidência de repetência escolar no Brasil e em grupos

econômicos diversos – 1982

Série Escolar

1a 2a3a4a5a6a7a8a

Brasil

53,733,425,920,430,417,214,215,4

Sudesteurbano de renda alta

37,424,723,317,330,423,016,113,6

Centro-Oeste urbano de renda

baixa

63,638,921,523,149,046,413,749,6

Nordesterural de

renda baixa

73,952,450,448,748,425,538,655,8

Fonte: Modelo Profluxo aplicado aos dados PNAD 82.

A TAB. 1, além de evidenciar o prejuízo na escolarização de determinados grupos da população, ainda aponta os gargalos da trajetória escolar como sendo o 1º e o 5º ano da escolarização. Os números confirmam que a democratização do acesso não propiciou as condições de permanência dos grupos recém-chegados à escola. Essa seria a outra face do processo de democratização do ensino, a questão da permanência, ou, como afirma Arelaro (1988, p. 38), “[...] o desafio da permanência na escola da maioria da população constitui-se, hoje, a questão crucial da educação [...]”.

Essas questões passaram a ser debatidas no Brasil por intelectuais, buscando colocar o problema na ordem do dia. Weber (2003), ao analisar o referido contexto, constatou o surgimento de duas posições: uma que apontava a escola como modelo de reprodução social e responsável pelo quadro de evasão e de repetência. Nessa direção, autores como Arroyo (1992), Arelaro (1988) e Campos (1983) procuraram associar o quadro da

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exclusão escolar a um quadro mais amplo da exclusão social relacionada ao sistema econômico. Para esses autores, o fracasso escolar não é um fenômeno individual ligado a aptidões e capacidades, mas um fenômeno social que atinge determinada classe, sendo os mecanismos da escola partes ativas do processo.

Outra corrente de pensamento irá destacar a necessidade de se reorientar a gestão dos sistemas escolares como forma de diminuir a sua baixa produtividade. Segundo essa corrente, se fossem colocadas metas e avaliados os resultados, haveria possibilidade de um diagnóstico mais preciso do contexto educacional, o que orientaria políticas públicas mais eficazes. Nesse sentido, tal perspectiva estaria mais preocupada com a eficiência e a eficácia do processo educacional. Uma das autoras que representam essa corrente de pensamento é Guiomar Namo de Mello, que atribui a baixa produtividade do sistema aos fatores ligados a um padrão caótico de gestão, como: a ausência de planejamento estratégico no nível federal e de um regime de colaboração entre União, estados e municípios; a centralização e a verticalização das decisões resultando na falta de autonomia e no enfraquecimento da escola; a irracionalidade e o clientelismo na expansão da rede física; a ausência de uma política racional de recursos humanos. Além do mais, defende uma readequação da gestão interna da escola (MELLO, 1992).

Essas duas posições que se ocupavam da mesma problemática, embora tivessem para ela soluções diferenciadas, orientarão os debates e as políticas educacionais surgidas nos anos 80 e 90.

Em 1991, surge em Minas Gerais o “Pró-Qualidade”, uma política que apostava na eficiência e na eficácia da gestão pública como forma de dotar o sistema educacional de uma maior produtividade, paradigmas que nortearão, também, as políticas educacionais implementadas pelo poder central (MEC) a partir de 92. Weber (2003) assinala que a implantação dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) e das avaliações sistêmicas, além da própria LDB, são parte desse processo em que o poder administrativo central, MEC, assume a condução de políticas educacionais, dando a elas uma nova configuração.

Os princípios norteadores dessas políticas se ancoravam nas ideias

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surgidas no contexto de transnacionalização da economia que, segundo Weffort (1992), criava um novo sistema produtivo mundial em que fábricas poderiam atravessar fronteiras de um país para outro, sendo os recursos básicos de cada nação as habilidades e as ideias de seus cidadãos.

2.2.2 A conjuntura econômica mundial do fimdo século XX e as reformas educacionais

Assistiu-se, no fim do século XX, à emergência de uma sociedade pautada pela variedade e pelo volume de informações e inovações cotidianas que obrigaram os indivíduos a tomar muitas decisões no seu dia a dia frente às demandas do mercado de trabalho. Atualmente, mudanças profundas ocorrem nos campos econômico, sócio-cultural, ético-político, ideológico e teórico. A face do mundo hoje é outra, uma vez que existe uma cartografia geopolítica diferente, determinada por fatores como a globalização e a reestruturação do Estado.

A educação, como um fenômeno social, não ficou isenta dessa revolução, sendo o seu papel e as suas funções questionados como elementos fortes nessa etapa de mudanças, como destacam Frigotto e Ciavatta (2003, p. 97): “[...] ocorre uma disputa entre o ajuste dos sistemas educacionais às demandas da nova ordem do capital e às demandas por uma efetiva democratização do acesso ao conhecimento em todos os níveis”.

A relação existente entre a mundialização e as reformas educacionais é discutida por Cardoso (1999) da seguinte forma: o impacto sobre a organização do trabalho passa a exigir maior qualificação do trabalhador; os governos aumentam as despesas com a educação, a fim de ter um sistema educacional bem-estruturado; a comparação entre os diferentes países sobre a qualidade dos sistemas educacionais força os sistemas a buscarem os mesmos padrões; a utilização da informática e da educação a distância como forma de baratear os custos e atingir maior número de pessoas; a internet como forma de globalizar as informações e a educação.

A partir dessa realidade, os organismos internacionais passam a determinar as metas que os países devem atingir também no âmbito da educação. Nesse cenário, as políticas educacionais passam a ser desenhadas segundo critérios internacionais. As reformas tornam-se

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intencionais com objetivos determinados pelos organismos multilaterais que, visando ao crescimento econômico, procuram alinhar a escola à empresa e os conteúdos ensinados às exigências do mercado.

A partir do final da década de 80, as reformas na educação, impactadas pelas mudanças econômicas impostas pela globalização, passaram a exigir maior eficiência e produtividade dos trabalhadores de modo a se adaptarem mais facilmente às exigências do mercado. Essas reformas apresentam um objetivo político bem definido que envolve a estrutura administrativa e pedagógica da escola, a formação de professores, os conteúdos a serem ensinados, os aportes teóricos a serem adotados, enfim, tudo o que possa estar relacionado com o processo de ensino-aprendizagem.

Nesse contexto, as reformas educacionais se apresentam como ferramenta de desenvolvimento econômico e, como política pública, passam a ser compreendidas como instrumento usado pelo Estado para manter as bases de funcionamento do sistema de acumulação. Isso reforça a tese de regulação social como controle, mas também aponta na direção de ajuste estrutural exigido pelos organismos multilaterais aos países com dívidas externas, como forma de garantir o pagamento delas.

Nas reformas educacionais, tem papel preponderante a atuação de organismos internacionais mediante o patrocínio de grandes eventos no âmbito educacional, a oferta de assessorias técnicas para auxiliar na reestruturação da legislação no campo da educação e do trabalho, bem como na elaboração de materiais teóricos que visam a argumentar a favor da necessidade e da urgência dessas mudanças.

O primeiro evento que inaugurou um grande projeto de educação em nível mundial realizou-se em Jomtien, na Tailândia, em 1990, sob o título “Conferência Mundial sobre Educação para Todos”. Esse evento foi financiado pela Organização para a Educação, a Ciência e a Cultura das Nações Unidas (UNESCO), pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e pelo Banco Mundial. Participaram da reunião de Jomtien, além de representantes de 155 governos, agências internacionais, organizações não governamentais, associações de profissionais e personalidades na área da educação em nível mundial.

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A conferência de Jomtien apresentou uma proposta de educação para o decênio de 90, tendo como objetivo principal a satisfação das necessidades básicas de aprendizagem:

Cada pessoa – criança, jovem ou adulto – deverá estar em condições de aproveitar as oportunidades educacionais oferecidas para satisfazer suas necessidades básicas de aprendizagem. Estas necessidades abarcam tanto as ferramentas essenciais para a aprendizagem (como a leitura e a escrita, a expressão oral, o cálculo, a solução de problemas), como os conteúdos básicos da aprendizagem (conhecimentos teóricos e práticos, valores e atitudes) necessários para que os seres humanos possam sobreviver e desenvolver plenamente suas capacidades, viver e trabalhar com dignidade, participar plenamente do desenvolvimento, melhorar a qualidade de sua vida, tomar decisões fundamentais e continuar aprendendo. A amplitude das necessidades básicas de aprendizagem varia de país a país, sua cultura muda inevitavelmente com o transcurso do tempo (ORGANIZAÇÃO PARA A EDUCAÇÃO, A CIÊNCIA E A CULTURA DAS NAÇÕES UNIDAS, 1990, p. 11).

A conferência apresentou documentos expedidos pelos organismos internacionais – como o Banco Mundial e a UNESCO –, apontando a educação básica como prioridade. A educação de base é definida no documento acima citado como sendo as habilidades e as competências gerais relativas à linguagem, à ciência, à matemática e à comunicação. Daí decorre a reestruturação dos currículos e dos programas e a criação de novos sistemas de avaliação.

Na década de 90, as orientações políticas do Banco Mundial para a educação brasileira recaíram sobre descentralização e a autonomia da gestão escolar, assegurando a presença da comunidade escolar e da sociedade civil e reduzindo as responsabilidades do Estado pelo sucesso ou fracasso educacional. Essas ideias já se delineavam desde a década de 80, quando os pressupostos da descentralização e da flexibilidade dos sistemas de ensino tornavam-se estratégias para a redução de custos na proposta neoliberal que se desenrolava.

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Dessa forma, são propostas avaliações externas à escola e a qualidade do ensino passa a ser medida a partir da ideia do rankeamento e da competitividade entre as instituições de ensino. Além disso, o Banco Mundial irá sugerir a utilização de modelos gerenciais que demonstram eficiência em setores da iniciativa privada para serem implementados nas escolas, como exemplos de gerenciamentos bem-sucedidos. A intenção seria a utilização dessas ferramentas para otimizar os processos educacionais, para erradicar a evasão e a repetência, vistas como provas da baixa produtividade da educação brasileira.

A racionalidade da eficiência e da eficácia presente nas teorias administrativas empresariais será importada pelas teorias pedagógicas, subsidiando as reformas da educação dos anos 90. Pereira citado por Oliveira (2001) argumenta que a recuperação da legitimidade burocrática foi encontrada na administração pública gerencial caracterizada pela transformação de agentes públicos em gerentes capazes de administrar recursos em favor de resultados desejáveis.

A gestão democrática da escola, entendida como processo de descentralização que responsabiliza os agentes locais pelos processos educacionais, torna-se um dos mecanismos dessas novas políticas em consonância com a reforma do setor público. As avaliações sistêmicas também ganham funcionalidade nesse contexto, já que seriam mecanismos indicadores da qualidade e da eficiência dos sistemas. A definição de qualidade da educação seria dada pelos resultados das avaliações sistêmicas que teriam como referência os PCNs.

2.3 As avaliações sistêmicas – um breve histórico

Denomina-se avaliação sistêmica aquela que é feita em larga escala, de forma padronizada, visando a aferir os conhecimentos obtidos pelos alunos com a finalidade de guiar a implementação de políticas públicas na educação. É conduzida pela instância governamental gestora dos processos educacionais atribuindo-se ao Estado, nesse caso, o papel de um Estado Avaliador. Esse tipo de avaliação permite o controle, pelas instâncias centrais, sobre o desenvolvimento do currículo, uma vez que

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tais processos terão como referência as diretrizes curriculares emanadas por elas. Segundo Mello (1992):

[...] a avaliação externa feita pela administração central ou por ela contratada, não substitui nem conflita com a avaliação realizada pela escola. Trata-se neste caso de um instrumento de gestão, cujo objetivo é analisar o desempenho do sistema como um todo e gerar informações que subsidiem decisões sobre alocação de recursos técnicos e financeiros. Enquanto a avaliação feita pela escola, que também deveria merecer uma profunda revisão, tem como um de seus objetivos tomar decisões sobre cada aluno individual, a avaliação externa visa a aferir o desenvolvimento de escolas, municípios, regiões e sistemas como um todo (MELLO, 1992, p. 100).

A mesma autora esclarece que os objetivos dessa avaliação não seriam avaliar alunos em particular, mas apontar pontos fortes e fracos do sistema como um todo, sendo que sem essa informação ela incorreria no risco de continuar tratando de forma homogênea os desiguais, aumentando as desigualdades escolares.

Na América Latina, o contexto histórico em que é formulado esse procedimento é o das reformas educacionais dos anos 90. No Brasil, a partir desse período, foi instituído um dos mais complexos modelos avaliativos do mundo, que vai do ensino fundamental até os cursos de pós-graduação. Nesse sistema temos: o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB); o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM); o Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (ENADE), dirigido ao ensino superior, além de iniciativas dos Estados da Federação, como Minas Gerais, que implantou o Sistema Mineiro de Avaliação da Educação Pública (SIMAVE).

No caso brasileiro, cabe ressaltar que os anos 90 acabaram por materializar em políticas algumas críticas feitas ao sistema educacional, como a sua baixa produtividade ilustrada nos altos índices de evasão e de repetência. Dessa forma, as reformas impetradas pelo poder público passaram a ter como objetivo corrigir tais distorções. A instituição de um sistema de avaliação seria uma das ferramentas utilizadas na melhoria

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da qualidade de ensino entendida como superação dos problemas apresentados pela educação no país.

2.3.1 O SIMAVE – as avaliações externas em Minas Gerais

Desde 1991, a avaliação externa das escolas mineiras tem sido parte integrante da política educacional estadual, preconizada pela Constituição do Estado de Minas Gerais, como garantia de um ensino de qualidade, conforme previsto na alínea a, do inciso X, de seu art. 196 (MINAS GERAIS, 2001). Torna-se, dessa forma, instituído o Programa de Avaliação Educacional da Escola Pública de Minas Gerais, conforme Resolução n. 6.908, de 18 de janeiro de 1992, do Secretário de Estado de Educação, Walfrido dos Mares Guia.

Em 1992, foi realizada a primeira experiência de avaliação, da qual participaram todas as escolas da rede estadual cujas crianças já tivessem completado o Ciclo Básico de Alfabetização (CBA). Os resultados obtidos compuseram relatórios com os seguintes elementos:a) situação do alunado no que se refere aos conteúdos básicos de Português, Matemática e Ciências;b) caracterização geral dos alunos: sexo, idade, situação de novatos e repetentes e aspectos relacionados ao seu ambiente familiar;c) caracterização das escolas em relação aos profissionais que atuam no CBA e ao gerenciamento do ensino nas duas primeiras séries do ensino fundamental.

Em novembro de 1992, aconteceu a avaliação de rendimento dos alunos da 8ª série do ensino fundamental.

A partir de 2009, o Sistema Mineiro de Avaliação da Educação Pública (SIMAVE) passou a fazer parte dos Projetos Estruturadores do Estado, sendo que estes:

[...] nasceram do planejamento estratégico do atual Governo do Estado de Minas Gerais e consistem em ações prioritárias para o Governo, dentro do PMDI (Plano Mineiro de Desenvolvimento Integrado) e do PPAG (Plano Plurianual de Ação Governamental). Estes Projetos fazem parte do GERAES (Gestão Estratégica dos Recursos e Ações do Estado),

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conforme Artigo 23, Decreto 43.554/2003. O projeto estruturador é uma iniciativa que:Transforma a visão de futuro em resultados concretos que sinalizam a mudança desejada.Tem efeito multiplicador: capacidade de gerar outras iniciativas privadas ou públicas.Mobiliza e articula recursos públicos, privados ou em parceria.Produz a percepção da sociedade: “quem governa tem uma visão de futuro que está sendo construída, mediante ações concretas”.Organiza-se como um projeto, com foco bem definido, objetivo mensurável, ações, metas, prazos, custos, resultados esperados, que permitem um gerenciamento intensivo (MINAS GERAIS, 2004).

Parte do Projeto Estruturador está no Acordo de Resultados que visa à concretização, expressa por meio de indicadores, de compromissos assumidos pela Secretaria de Estado de Educação, pelas Superintendências Regionais de Ensino e pelas Escolas Estaduais. Em contrapartida, é concedido aos acordados, em caso de desempenho satisfatório, o pagamento de prêmio de produtividade aos servidores, como incentivo. Os diretores das escolas estaduais assinam um termo de compromisso, assumindo ter como meta a melhoria dos resultados educacionais de sua escola.

3 SIMAVE: o olhar da escola para os seus resultados

3.1 Metodologia

Na pesquisa optou-se por uma abordagem qualitativa, principalmente pelas possibilidades abertas comuns a esse tipo de investigação, que permite maior contato com o grupo investigado, além da estreita interação entre o investigador e o objeto da pesquisa.

Foram selecionadas escolas participantes do projeto “Escola Viva, Comunidade Ativa” da Secretaria de Estado da Educação de Minas Gerais (SEE/MG). Esse projeto é voltado para o fortalecimento de escolas em áreas urbanas, com população de vulnerabilidade social e sujeita a índices expressivos de violência. Procura proporcionar a tranquilidade

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e as condições básicas de educabilidade no ambiente escolar para que o processo de ensino e de aprendizagem aconteça. O desafio desse projeto consiste em repensar a escola, tornando-a mais aberta à participação da comunidade e mais inclusiva.

O universo dos participantes restringiu-se aos responsáveis pela gestão pedagógica das escolas (diretores, coordenadores pedagógicos e professores). Para a composição da amostra, foram selecionadas dez escolas e, de cada unidade, foram entrevistados: um diretor, um coordenador pedagógico, um professor de Língua Portuguesa e um professor de Matemática do Ensino Fundamental.

3.2 Apresentação e análise dos dados

3.2.1 Diretores

A visão que os diretores têm do SIMAVE reflete uma espécie de ambiguidade em relação à Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais (SEE/MG) e suas políticas de avaliação. De um lado, temos falas que respaldam o sistema avaliativo, reconhecendo nele uma boa tentativa de melhorar a gestão da escola. Para esses, as diretrizes adotadas estão corretas, embora acreditem que falte um pouco mais de envolvimento, por parte dos profissionais da educação, para que se tenham melhores resultados, conforme explicitado no comentário a seguir: “Apesar de termos uma boa política para monitoramento da qualidade, falta maior responsabilidade e comprometimento por parte dos profissionais da educação” (DIRETOR).

De outro lado, porém, há observações de que os problemas enfrentados pelas escolas (violência, indisciplina e descaso dos pais) estão longe de serem resolvidos por esses modelos de avaliação. Essas questões têm tamanho impacto sobre o cotidiano escolar que impedem, inclusive, uma maior eficiência do processo de ensino-aprendizagem: “Algumas diretrizes da SEE/MG são impossíveis de serem cumpridas pela escola em virtude da realidade que vive” (DIRETOR).

Nessa última fala, nota-se uma postura crítica em relação à gestão da educação feita pelas instâncias centrais.

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Alguns diretores manifestam o desconhecimento sobre a metodologia da avaliação. Eles destacam que alunos que optam por uma escolha aleatória das opções de resposta podem ter uma falsa boa nota, que dá a impressão de aquisição de habilidades:

Avaliações externas não refletem a realidade cognitiva do aluno que, em “um chute”, pode acertar uma questão dando a falsa impressão de aquisição de habilidade. Em decorrência da questão da indisciplina, não se consegue nem trabalhar questões de aprendizagem cobradas pelo SIMAVE (DIRETOR).

Por outro lado, a maioria dos diretores admite que as atuais políticas educacionais têm contribuído para melhorias no processo de ensino-aprendizagem. Nesse sentido, o próprio SIMAVE estaria propiciando uma melhor medição da qualidade, tirando o professor de sua zona de conforto, obrigando-o a rediscutir seu trabalho, de acordo com as menções que se seguem:

O SIMAVE facilita a visualização do nível de aprendizagem do aluno e tira o professor da zona de conforto levando-o a repensar suas estratégias de atuação (DIRETOR).Avaliações sistêmicas buscam apontar erros mais constantes e a partir daí contribuem para a melhoria da qualidade da educação (DRETOR).A avaliação ajuda fazer diagnóstico, traçar metas e avaliar o processo de ensino-aprendizagem da escola (DIRETOR).A avaliação fornece dados para o planejamento da escola (DIRETOR).

Em algumas falas fica patente a ideia de que existe uma lacuna na interlocução entre a instância gestora da política educacional, ou seja, a Secretaria do Estado de Minas Gerais, e a escola, como ilustra a fala abaixo: “Não há uma assessoria da Secretaria de Educação de Minas Gerais na tentativa de solucionar os problemas apontados pela avaliação sistêmica. A Secretaria dá o diagnóstico, mas não avança na busca de soluções” (DIRETOR).

A respeito das implicações dos resultados do SIMAVE sobre o

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trabalho da escola, existem situações bastante distintas nas escolas que vão desde a organização de reuniões que têm por finalidade discutir e traçar estratégias de melhoria, até a desmotivação por parte de diretores para um trabalho dessa natureza, sendo que, nesses casos, nem os resultados se tornam públicos.

3.2.2 Coordenadores pedagógicos (supervisores ou orientadores)

De acordo com os resultados da investigação, destacam-se nas falas dos coordenadores as seguintes questões: a violência, a indisciplina e a falta de autoridade dentro das escolas. Na totalidade das falas, destaca-se que:

As políticas educacionais não dão conta dos problemas enfrentados pela escola pelo próprio desconhecimento dos problemas reais que a escola enfrenta no seu cotidiano, tais como: descompromisso da família, falta de capacitação dos professores, ausência de política salarial, violência, falta de apoio aos projetos implantados pela SEE/MG, entre outros. (COORDENADOR PEDAGÓGICO).

As respostas apontam para a desvalorização da escola, sendo que a avaliação externa do sistema desconhece a sua realidade e destaca os seus pontos fracos sem levar em consideração os reais motivos que interferem na qualidade do ensino. No entanto, a maioria dos coordenadores reconhece a importância da avaliação como se pode perceber na citação abaixo: “Os sistemas de avaliação externa têm evoluído substancialmente, contribuindo para a reformulação do planejamento, os ajustes do currículo, a capacitação dos professores e a melhoria dos resultados do ensino público” (COORDENADOR PEDAGÓGICO).

Outros elementos surgiram na fala dos interlocutores em relação aos resultados do SIMAVE. Como a ação dos coordenadores é de apoio pedagógico aos professores, a forma com que a avaliação acontece deixa transparecer uma ação controladora por parte da equipe pedagógica, gerando assim uma insatisfação por parte do corpo docente. Nessa percepção, seis coordenadores justificaram a dificuldade de trabalhar com os resultados do SIMAVE.

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Ao abordarem a postura da SEE/MG em relação ao programa de avaliação, os coordenadores pedagógicos assinalaram algumas dúvidas em relação ao desempenho da Secretaria como atraso na divulgação dos resultados, falta de uma assessoria pedagógica, complexidade das tabelas e gráficos dos boletins pedagógicos.

3.2.3 Professores

De acordo com os resultados da investigação, alguns entrevistados afirmaram que a falta de participação dos professores na elaboração e nas discussões acerca da formulação das políticas públicas tem levado ao adoecimento profissional da categoria. Afirmam que há um distanciamento entre a realidade da escola e as propostas governamentais. Essas, muitas vezes, desconsideram questões que afetam o trabalho docente, levando os professores a uma busca solitária por soluções de problemas que são estruturais. Sendo assim, alguns professores denunciam: “As políticas educacionais têm servido mais de propaganda para o Governo do Estado do que, de fato, como busca para a solução dos graves problemas que afetam a escola” (PROFESSOR).

Por outro lado, alguns docentes afirmam que há um enfrentamento dos problemas através das políticas públicas, especialmente quanto ao diagnóstico das escolas, elaborados através dos resultados das avaliações sistêmicas, dos projetos e capacitações:

Algumas políticas públicas atuais, como Bolsa--Escola, têm contribuído para enfrentamento de alguns problemas como a pobreza. Também avaliações sistêmicas como o SIMAVE auxiliam na compreensão dos problemas enfrentados pela escola na questão da aprendizagem (PROFESSOR).

A aceitação e o envolvimento com o SIMAVE são manifestados na fala dos professores, como indica o trecho acima. Porém, há opiniões que apontam grandes lacunas nesse modelo de avaliação, como ilustra a fala abaixo:

As avaliações externas não refletem a realidade das escolas e nem mesmo a realidade cognitiva dos

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alunos que podem se sair bem nas avaliações, mas ter respondido “no chute”. [...] a desconexão da avaliação com a realidade da sala de aula em que são desconsideradas as condições de trabalho dos professores e as condições de aprendizagem dos alunos interferem nos resultados (PROFESSOR).

Em contrapartida, houve um número significativo de profissionais que reconhecem o SIMAVE como:

Um excelente instrumento para diagnosticar a realidade da educação no Estado e a realidade da própria escola, oferecendo, através de seus dados, um diagnóstico preciso sobre o qual o professor pode se debruçar e construir seus planejamentos focados nas lacunas apontadas nos resultados que recebe (PROFESSOR).

Sendo assim, sugeriram um trabalho de continuidade que deveria acontecer após a divulgação dos resultados para as escolas. Esse trabalho envolveria a capacitação dos professores nas áreas em que foram detectadas necessidades de melhoria nos níveis de aprendizado. Além disso, consideraram essa forma de avaliação como importante instrumento para medir a qualidade da educação no Estado, destacando que a leitura e a interpretação dos resultados são acessíveis e de fácil compreensão.

Alguns professores, ao avaliarem os resultados referentes à escola na qual atuam, disseram considerá-los condizentes com o momento em que seus alunos se encontram, mas que, por outro lado, esses resultados não consideram a precária condição de alfabetização em que esses alunos chegaram até a escola e o grande desenvolvimento que tiveram a partir do trabalho realizado pelos professores.

Alguns professores, ao retratar a escola que trabalham perante outras escolas do Estado, demonstraram um descontentamento, como:

Os resultados da escola poderão estar abaixo do nível esperado. Contudo, se a análise é feita em relação ao avanço dos alunos desde que entraram naquela unidade e considerando a precariedade de condições em que chegaram, os resultados desta mesma escola se tornam excelentes (PROFESSOR).

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A maioria dos professores queixa-se de que o SIMAVE avalia, mas que não há uma assessoria da SEE/MG na tentativa de solucionar os problemas indicados pela avaliação, o que, na opinião deles, torna a avaliação uma medida ineficaz. Segundo eles, “dá o diagnóstico, mas não avança na busca de soluções” (PROFESSOR). Essa busca de soluções diz respeito a capacitações e auxílios pedagógicos nos aspectos que foram avaliados como desfavoráveis.

Em relação aos descritores usados na análise dos resultados, as opiniões dos professores são contraditórias:

Conhecer e trabalhar com os descritores dos resultados [...] a “prisão” a que os professores são submetidos quando se veem obrigados a desenvolver o seu trabalho com seus alunos em função apenas dos descritores para atender aos resultados da avaliação (PROFESSOR).

Analisando as outras falas dos professores, pode-se afirmar que as escolas divulgam os resultados da avaliação sendo os mesmos registrados em cartazes com identificação das médias obtidas e das metas a serem alcançadas. Mesmo assim, alguns professores afirmam que essa informação se dá de forma superficial e que seria necessário maior tempo para analisar os pontos levantados nas planilhas enviadas pela SEE/MG.

4 Considerações finais

A qualidade do ensino passa, a partir das reformas educacionais dos anos 90, a ser definida em função dos instrumentos de medida utilizados nos testes, sendo gerida pelas instâncias centrais de decisão. A avaliação é também dirigida à unidade escolar que poderá analisar os resultados, à luz de um panorama maior e de sua própria realidade, a partir dos conteúdos mínimos nela estabelecidos.

Todos esses fatores, componentes das avaliações sistêmicas, ao contrário de concluírem o propósito avaliativo, deveriam representar o ponto de partida para a busca da qualidade da educação no país.

As falas dos atores escolares que participaram da pesquisa remetem aos olhares que eles têm sobre a educação e o palco em que se desenvolve

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a prática pedagógica. As manifestações acabam por sintetizar o que aqueles que atuam no campo educacional entendem como sendo o seu principal desafio e como sendo a eficiência ou não das políticas que sobre eles atuam. Parece ser consenso a impressão de que a escola lida, hoje, com uma realidade social complexa que envolve graves questões sociais refletidas na violência, que acaba por ensejar a indisciplina e outros problemas. Tudo isso impactaria negativamente a dinâmica escolar e dificultaria o processo de ensino-aprendizagem na medida em que muito tempo seria gasto na solução desses problemas em detrimento do trabalho com conteúdos dos currículos escolares.

Reside aí um aspecto de crítica dos profissionais da educação em relação à política de avaliação sistêmica. Seguindo a lógica de que a escola enfrenta desafios que transcendem o simples trabalho com conteúdos escolares, vê-se como limitada uma política de avaliação que não leve em conta a complexidade da realidade presente na escola. Dessa forma, essa política estaria longe de ser uma solução para os problemas sociais importantes – como a violência e a negligência dos pais – que impactam negativamente a escola.

Ainda sobre o SIMAVE, os entrevistados constatam que as discussões que deveriam ser realizadas após a divulgação dos resultados são ainda insuficientes e os resultados são apresentados sem muita possibilidade de aprofundamento, pois a ênfase se situa mais nos gráficos, nas tabelas e nas metas em detrimento das dificuldades concretas existentes na realidade de cada escola.

O Estado, como maior interessado pelos resultados, mostra-se inoperante, cumprindo o papel de divulgador dos resultados sem, porém, apresentar soluções para os problemas detectados. Ao não participar efetivamente da resolução dos problemas, acaba apenas apontando o baixo rendimento em determinadas habilidades e competências, delegando para as escolas a tarefa de resolver os problemas de ensino da educação brasileira.

Nessa lógica, não se tem conseguido avaliar a importância do monitoramento de resultados a partir de um procedimento de avaliação sistêmica. Está aí presente uma falta de foco sobre o que deve ser o

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papel da escola: ocupar-se dos problemas sociais que se refletem nela ou ocupar-se da questão da aprendizagem dos conteúdos universalmente aceitos. Para alguns professores, o primeiro aspecto é tão premente que impede o trabalho com o segundo.

Fica evidente a dificuldade de interlocução entre os profissionais da escola e as instâncias centrais de planejamento. Não se conseguiu, no período de implementação dessa política, convencer os profissionais da educação de que, a despeito dos problemas enfrentados pela escola, eles devem eleger as avaliações sistêmicas como parâmetro do trabalho pedagógico a ser desenvolvido na escola.

Essa falta de convencimento tem feito com que os resultados apontados pelo SIMAVE figurem em planilhas e gráficos, mas não orientem efetivamente o trabalho da escola. Além disso, falta, segundo alguns entrevistados, uma assessoria mais efetiva das instâncias centrais como forma de auxiliar a escola no trabalho com esses resultados. Dessa forma, estaria a escola isolada sem saber ao certo como lidar com seus problemas e com os desafios explicitados pelas avaliações sistêmicas.

Apesar disso, um grande número de entrevistados manifestou-se favorável à avaliação como instrumento capaz de trazer melhorias para a educação no Estado e em suas escolas em particular, uma vez que seus trabalhos são norteados em função dos resultados do SIMAVE. Percebe-se aí um olhar que avalia o processo como ferramenta de melhoria da qualidade de ensino.

Esses profissionais demonstraram que pautam seu trabalho nos resultados da avaliação, preparando seus alunos para terem um bom desempenho e sua escola para alcançar as metas estabelecidas.

Destacamos que esse tema pode ser abordado a partir de outros enfoques, como a visão dos pais e alunos. Esses enfoques poderão contribuir para uma compreensão mais abrangente do SIMAVE e da forma como é visto pelos atores da comunidade escolar.

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The Assessment System of Public Education in Minas Gerais: perceptions of public school

professional in Belo Horizonte

Abstract

This article analyzes the results of the survey: “A view of the public schools in Minas Gerais about SIMAVE´s results”, developed by the Center of Studies and Research on Educational Policy (FAE/UEMG). It deals with the centrality of systemic assessment in the Brazilian educational scenario and its implications for pedagogical staff who work in schools: principals, coordinators and teachers. Initially, it discusses the implementation process of systemic assessment in the country by rescuing of the historical conjuncture Brazil in and the world. In a second moment, the article focuses on the perceptions of the school staff involved in the assessment process SIMAVE.

Keywords: systemic assessment; educational policy; educational reform; educational institution.

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Stella Willians de Carvalho, Jussara Maria de Pinho Magalhães Penna,Elias José Lopes de Freitas, Maria José Pereira, Ofélia de Souza Vieira

Recebido: 19/05/11Aprovado: 24/10/11

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Uma proposta de formação docente no contexto da utilização das tecnologias da informação e comunicação no curso

de Pedagogia da FaE/CBH/UEMG: linhas e entrelinhas

Santuza Abras1

[email protected]

Cleder Tadeu Antão da Silva2

[email protected]

Luciana Zenha3

[email protected]

Alecir Carvalho4

[email protected]

1 Mestre em Educação Tecnológica pelo Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais (CEFET-MG), professora, pesquisadora, e vice-reitora da Universidade do Estado de Minas Gerais.2 Mestre em Educação Tecnológica pelo CEFET-MG, professor, pesquisador e coordenador do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Educação, Comunicação e Tecnologia (NECT) da FaE/CBH/UEMG.3 Doutoranda em Educação pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), professora e pesquisadora da FaE/CBH/ UEMG.4 Mestre em Design pela Escola de Design da UEMG, professor, pesquisador e sub coordenador do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Educação, Comunicação e Tecnologia (NECT) da FaE/CBH/UEMG.

Resumo

O presente artigo analisa a experiência da Faculdade de Educação da UEMG de Belo Horizonte na implantação de uma proposta de formação de professores e gestores da educação básica, no contexto da inclusão do debate sobre a utilização das Tecnologias da Informação e Comunicação em seu

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Uma proposta de formação docente no contexto da utilização das tecnologias da informação ecomunicação no curso de Pedagogia da FaE/CBH/UEMG: linhas e entrelinhas

curso de Pedagogia. Nesse sentido, são discutidas as ações desenvolvidas pela instituição nos campos do ensino, pesquisa e extensão, em que se destacam os processos de reformulação curricular, a aquisição de infraestrutura tecnológica e a criação de um núcleo de estudos e pesquisas que se notabilizou por ser o ponto culminante do desenvolvimento de uma política efetiva para as áreas de Educação, Comunicação e Tecnologia na faculdade.

Palavras-Chave: Pedagogia; formação docente; TIC.

1 Introdução O presente artigo trata da experiência da Faculdade de Educação

da Universidade do Estado de Minas Gerais, campus Belo Horizonte (FaE/CBH/UEMG), na implantação de uma proposta de formação de professores e gestores da educação básica, no contexto da inclusão do debate sobre a utilização das Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs), em seu curso de Pedagogia.

O texto, que busca resgatar o histórico da política de educação e tecnologia da faculdade, traz os antecedentes da proposta, passando pelas ações realizadas pela instituição, no que se refere à inserção dessa discussão no referido curso de Pedagogia da FaE/CBH/UEMG, onde se descrevem também as diferentes iniciativas que se constituíram em práticas pedagógicas de formação para seus estudantes, servidores e educadores.

Promove-se ainda, de forma paralela, uma reflexão sobre os desafios que esse campo da educação e tecnologia apresenta para a formação de docentes da educação básica no atual contexto, delineando ainda algumas possíveis perspectivas que contribuam para o avanço dessa área nos próximos anos no País.

2 A Pedagogia e as novas demandas de formação

Atualmente, a Pedagogia tem sido alvo de grandes discussões em

relação à sua área de estudo. Nesse aspecto, o debate epistemológico que permeia seu campo por vezes é colocado em xeque, em que se questiona a

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Santuza Abras, Cleder Tadeu Antão da Silva, Luciana Zenha, Alecir Carvalho

sua identidade, a sua legitimidade e até mesmo o seu papel na sociedade contemporânea, apesar de em outros momentos este saber ser afirmado como um tipo de conhecimento específico que contempla peculiaridades e especificidades, como discute (ROCHA, 2001):

De fato, se por um lado a Pedagogia é destituída de autonomia por aqueles que consideram a impossibilidade de se estatuir um conhecimento científico de base prática, por outro, temos assistido a uma construção da Pedagogia como forma de consolidar seu estatuto e dar conta de uma demanda concreta de organização das práticas e das experiências educativas humanas, mas que é essencialmente diferente delas (ROCHA, 2001, p. 28).

Para Libâneo (2002), a Pedagogia[...] ocupa-se das práticas educativas intencionais destinadas a favorecer o desenvolvimento dos indivíduos no interior de sua cultura por meio de processos de transmissão e assimilação ativa de experiências, saberes e modos de ação culturalmente organizados.

[...] situa-se entre as ciências que dão o suporte teórico a essas vias de acesso (sociologia, filosofia etc.), entretanto distingue-se delas por ter a tarefa de integrar os enfoques parciais do fenômeno educativo para analisá-lo em sua globalidade (LIBÂNEO, 2002, p. 162).

Tal cenário tem despertado nos pedagogos e nos formadores de professores uma busca permanente de reflexão, com especial preocupação para os desafios que estão postos para a Pedagogia no atual contexto da contemporaneidade. Tais desafios têm gerado, sobretudo, uma tentativa de se pensar em propostas de formação nessa área que estabeleça um diálogo estreito entre tais proposições e às necessidades e demandas emergentes encontradas.

Entre as diversas demandas que a Pedagogia tem se dedicado a debater no atual contexto, encontra-se o campo da Educação e Tecnologia, que apresenta avanços significativos nos últimos anos, seja através do desenvolvimento de políticas públicas de inclusão digital ou das próprias

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iniciativas de formação de professores para o uso das TICs nos diversos níveis de ensino.

Prova disso é que, desde as últimas décadas, parte da literatura educacional tem se dedicado a desenvolver importantes discussões sobre a temática das inovações tecnológicas. Perrenoud (2000), por exemplo, já afirmava que as TICs têm transformado os modos de trabalhar, pensar e comunicar, e que a partir daí é necessário realizar uma reflexão crítica em relação à sua utilização, assim como de avaliar suas implicações para os processos de aprendizagem, como se observa no trecho a seguir:

Uma cultura tecnológica de base também é necessária para pensar as relações entre a evolução dos instrumentos (informática e hipermídia), as competências intelectuais e a relação com o saber que a escola pretende formar. Pelo menos sob esse ângulo, as tecnologias novas não poderiam ser indiferentes a nenhum professor, por modificarem as maneiras de viver, de se divertir, de se informar, de trabalhar e de pensar. Tal evolução afeta, portanto, as situações que os alunos enfrentam e enfrentarão, nas quais eles pretensamente mobilizam e mobilizarão o que aprenderam na escola (PERRENOUD, 2000, p. 138).

Já Moran (2000), ao discutir as mudanças na educação envolvendo transformações nos processos de comunicação por meio da utilização de novas mídias e outras tecnologias, afirmara que a educação é um ato de mediação, uma ação que facilita o processo de aprendizagem dos alunos pessoal e profissionalmente para cidadania:

Os processos de comunicação tendem a ser mais participativos. A relação professor-aluno mais aberta, interativa. Haverá uma integração maior entre as tecnologias e das metodologias de trabalhar o oral, a escrita e o audiovisual.

Ensinar com novas mídias será uma revolução, se mudamos simultaneamente os paradigmas convencionais do ensino, que mantêm distantes professores e alunos. Caso contrário conseguiremos dar um verniz de modernidade, sem mexer no essencial (MORAN, 2000, p. 7).

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O avanço das TICs e o desenvolvimento de seu processo de apropriação pelos sujeitos têm produzido novas interlocuções para a área tecnológica. Kerkhove (2009), em suas discussões sobre psicotecnologia,5 demonstra que a experiência acumulada pelos indivíduos a partir do contato com os novos meios técnicos promove uma verdadeira mutação na consciência humana, especialmente em termos de sua extensão:

Com a videoconferência e os videofones, a televisão aproxima-se da flexibilidade e da comunicação instantânea conseguida com o telefone. De fato, estas tecnologias não apenas prolongam as propriedades de envio e recepção da consciência, como penetram e modificam a consciência dos seus utilizadores. A realidade virtual ainda está mais ajustada a nós. Acrescenta o tato à visão e à audição e está mais próxima de revestir totalmente o sistema nervoso humano do que qualquer tecnologia até hoje o fez. Com a realidade virtual e a telepresença permitida pela robótica projetamos literalmente para o exterior a nossa consciência e vemo-la “objetivamente”. Esta é a primeira vez que o homem consegue fazer isso (KERKHOVE, 2009, p. 23-24).

Nessa direção, Behar et al. (2009) defendem que os impactos produzidos pelas transformações geradas através das TICs promovem mudanças significativas também no universo das práticas pedagógicas. O crescimento da produção de objetos de aprendizagem tem exigido cada vez mais uma adaptação por parte dos professores, no que diz respeito a sua própria atuação, no qual o docente abandona o papel de transmissor do conhecimento e assume um papel de medição nos processos educativos.

A utilização de objetos de aprendizagem remete a um novo tipo de aprendizagem, apoiada pela tecnologia, na qual o professor abandona o papel de transmissor de informação para desempenhar um papel de mediador da aprendizagem. Logo, cada vez mais recursos didáticos para uso no computador vem sendo desenvolvidos e publicados para serem agregados ao processo de aprendizagem,

5 Psicotecnologia é um termo cunhado por Kerkhove para definir qualquer tecnologia que emula, estende ou amplifica o poder de nossas mentes.

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Santuza Abras, Cleder Tadeu Antão da Silva, Luciana Zenha, Alecir Carvalho

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adaptando-os às diferentes necessidades, tais como de público, conteúdo, tempo e prática pedagógica (BEHAR, et al., 2009, p. 66).

Nesse sentido, Silva e Garíglio (2010), ao analisarem as políticas públicas de uso das TICs nas escolas, destacam a importância de se preparar adequadamente o profissional da educação nessa área, considerando que o trabalho com essas tecnologias na educação dependem fundamentalmente de uma boa formação docente para o sucesso dos programas:

Diante de tal contexto, torna-se essencial destacar, portanto, a importância da formação de professores para o uso das TIC nas escolas: políticas de qualificação voltadas para esses profissionais são estratégias indispensáveis ao projeto de inclusão digital, visto a não formulação de ações nessa direção poder fazer com que as políticas de inclusão digital corram o risco de ficar apenas na dimensão do discursivo político formal, mantendo-se distante da realidade prática das escolas brasileiras (SILVA; GARÍGLIO, 2010, p. 484).

Portanto, evidencia-se de forma cada vez mais clara, que a qualificação no campo da educação e tecnologia tem sido uma das demandas importantes para a Pedagogia nesses últimos anos. O fato dessas TICs se fazerem cada vez mais presentes nos diversos setores da sociedade, inclusive no campo educacional, faz com que elas se tornem uma condição sine qua non para cursos de formação de professores, tanto no âmbito da formação inicial, quanto nos programas de formação continuada.

3 A tecnologia na FaE/CBH/UEMG: breve histórico

Considerando a importância de se estabelecer um diálogo com esse

novo panorama, pelo qual a Pedagogia vem se deparando, no ano de 1997, iniciam-se, na FaE/CBH/UEMG, as primeiras discussões coletivas para a reformulação do currículo de licenciatura plena em Pedagogia. Naquele momento, percebeu-se pouco interesse de parte dos educadores da faculdade em introduzir questões que envolviam o debate sobre a

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utilização das TICs na educação. Por se interessar por essa temática, a professora Santuza Abras objetou que, ao reformular tal currículo, que pretendia formar professores e gestores educacionais, seria inadmissível, ou melhor, imprescindível contemplar o debate acerca das implicações e potencialidades pedagógicas do uso das TICs nas práticas de ensino-aprendizagem nos diferentes níveis de ensino.

Antes mesmo desse desafio de reformulação do currículo do curso de Pedagogia da FaE/CBH/UEMG, a preocupação com a formação de professores, inclusive na área da educação e tecnologia, em especial no campo da informática, já existia no País, como evidencia Valente (1999):

[...] a formação de professores na área de informática na educação vem acontecendo desde 1983, quando foram iniciadas as primeiras experiências de uso do computador nessa área. Essa formação tem sido baseada em diversas abordagens que foram utilizadas ao longo desses quinze anos e que apresentam características distintas, ditadas pela necessidade de formação de profissionais qualificados, pelas limitações técnicas e financeiras, pelo nível de conhecimento que os pesquisadores dispõem e pelo interesse desses pesquisadores em elaborar e estudar novas metodologias de formação (VALENTE, 1999, p. 99).

Diante dessa realidade, é necessário contextualizar que naquela época não existia computadores, ambientes informatizados ou outras tecnologias da informação e comunicação destinadas a promover a formação de estudantes e educadores do curso de Pedagogia da Faculdade de Educação da UEMG de Belo Horizonte.

Entretanto, um levantamento realizado por Abras (1999),6 na forma de pesquisa exploratória com alunos de 5º, 6º e 7º períodos de Pedagogia, visando a investigar as percepções que os estudantes apresentavam acerca da tecnologia, revelou um quadro bastante interessante e surpreendente sobre a representação que os futuros educadores tinham sobre essa temática.

Movidos pela hipótese de que haveria um número significativo de 6 Mestranda em Tecnologia do CEFET-MG, na área de concentração em Educação Tecnológica, no ano de 1995 – com publicação da dissertação em 1999.

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graduandos que teria resistência ao uso da tecnologia, os pesquisadores tinham como objetivo obter informações sobre o que esses estudantes pensavam sobre a questão do avanço tecnológico. As questões do questionário se dividiam em solicitar ao respondente que opinasse a respeito de:

a) seu conceito de tecnologia;b) se os conceitos de ciência e tecnologia eram sinônimos;c) se a tecnologia era boa ou má;d) se o(a) entrevistado(a) era favorável ao avanço tecnológico e o que pensava sobre o mesmo;e) como ele(a) imaginava o mundo daqui a dez anos, ou seja, em 2005;f) que posição tomaria a educação nessa perspectiva de avanço;g) se o(a) estudante trabalhava em alguma escola e em caso afirmativo, em que Rede de Ensino;h) e finalmente, se o(a) entrevistado(a) gostaria de acrescentar outras informações e percepções.

Tal questionário foi intitulado “TECNOFILIA – TECNOFOBIA:

um estudo exploratório com alunos da Faculdade de Educação da Universidade do Estado de Minas Gerais – curso de Pedagogia”. Naquele momento histórico, os pesquisadores desejavam investigar se existiriam mais tecnófobos ou tecnofílicos entre os discentes entrevistados.

Cabe ressaltar que os conceitos de tecnofilia e tecnofobia são baseados nos termos utilizados por Papert (2008) quando este autor faz referência aos grupos de yearners e schoolers, que, segundo ele, são grupos de educadores que se encontram nas escolas e que se posicionam de maneira distinta quando defrontados com a perspectiva de inovação, inclusive em relação à inserção de tecnologias que buscam promover transformações no dia a dia da escola. Encontra-se na obra do próprio autor este importante esclarecimento:

O neologismo yearner origina-se do verbo inglês yearn – desejar fortemente algo difícil de tornar realidade, como a ânsia de liberdade por pessoas que vivem em um regime autoritário. E o neologismo (schoolers),

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uma forma verbal infinitiva do substantivo school (Escola) [...] significa aproximadamente “defensores da instituição escolar na sua estrutura atual” (PAPERT, 2008, p. 17).

Nesse sentido, os yeaners, pela sua ânsia de romper com o status quo da escola, aproximam-se dos tecnofílicos, que são integrados à perspectiva de uso das tecnologias, já os schoolers, pela sua posição de manutenção da estrutura tradicional da escola, identificam-se com os tecnófobos, que veem na tecnologia uma ameaça, no que se refere a sua presença e utilização pela instituição escolar (PAPERT, 2008).

Feito esse esclarecimento, ressalta-se que no levantamento realizado por Abras (1999) analisou-se um conjunto de cem questionários, sem separação por turno ou turma.

Sobre a similaridade entre ciência e tecnologia, 24 alunos(as) afirmaram que sim, existe similaridade entre os termos, 68 responderam que não, e oito não expressaram opinião. Interessante notar que 88 alunos(as) responderam que a tecnologia é um artefato bom, e um justificando-se pelo medo do novo, respondeu que a tecnologia é um artefato mau em si mesmo, sendo que outras 11 alunos(as) afirmaram que não é bom, nem mau, pois depende da forma como é utilizado. Já sobre a questão do avanço tecnológico, dos cem questionários aplicados, 97 foram favoráveis a esse avanço, sendo um contra e dois não se manifestaram.

As conclusões preliminares dão conta que 97% dos(as) alunos(as) pesquisados eram favoráveis ao avanço tecnológico e que 88% desses estudantes consideravam a tecnologia como algo bom, em que foi possível identificar que eram poucos os discentes que apresentavam características tecnofóbicas. Esses dados, de certa forma, surpreenderam os pesquisadores e, ao mesmo tempo, mostraram boas perspectivas de aceitação dos(as) alunos(as) em relação às possíveis reformulações do currículo de Pedagogia, apontando assim para um perfil de formação que contemplasse aspectos relativos à área tecnológica.

Dentro dessa perspectiva, Moran (2007) afirma que:Se os alunos fazem pontes entre o que aprendem intelectualmente e as situações reais, experimentais, profissionais ligadas aos seus estudos, a aprendizagem

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será mais significativa, viva, enriquecedora. As universidades e os professores precisam organizar nos seus currículos e cursos atividades integradoras da prática com a teoria, do compreender com o vivenciar, o fazer e o refletir, de forma sistemática, presencial e virtualmente, em todas as áreas e ao longo de todo o curso (MORAN, 2007, p. 6).

Portanto, educação e escola não poderiam ficar à margem desse debate, pois ficar aquém do acesso à tecnologia e de seus avanços significaria continuar subordinado às relações de poder que permeiam os interesses do sistema.

[...] Os países de primeiro mundo concentram-se na produção de bens com uso de intensivo de tecnologia e informação, como a indústria dos processadores de computador, redes ou telefonia, enquanto os países de terceiro mundo têm que se contentar com os produtos agrícolas, que têm baixíssimo valor agregado. Aos países em desenvolvimento como o Brasil é reservada parte da indústria, geralmente poluente, que aos países desenvolvidos não interessa mais manter em seus territórios. Nessa dinâmica produtiva, a capacidade de determinados países entrarem soberanamente no mercado global é cada vez mais remota. Conseqüentemente, o desemprego estrutural ou o subemprego tornam-se parte do cotidiano das nações periféricas (BRITO, 2001, p. 14).

Numa rota oposta a esse cenário, a educação precisaria se posicionar no sentido de promover intervenções que enfrentassem a reprodução dessas desigualdades, de maneira a favorecer práticas de inclusão social em busca de uma apropriação efetiva das TICs:

[...] a Escola se configura como um importante instrumento de inclusão social, no sentido da formação e instrumentalização para uma sociedade que exige o desenvolvimento de capacidades para um mercado de trabalho “informacional”, mas, sobretudo, como fomentadora de contradição e espaço de formação da criticidade, tão fundamentais às transformações sociais. Como alicerces da “Sociedade da Informação”, a Internet e

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o computador são ferramentas; e, como tais, podem ser utilizados para edificar uma sociedade sem excluídos (BRITO, 2001, p. 14).

Considerando essas contribuições, em seguida serão apresentadas as etapas do processo de inserção da temática das tecnologias na FaE/CBH/UEMG, destacando a criação da infraestrutura técnica que possibilitou a construção de uma política mais ampla nesta área para a faculdade. Nesse percurso, analisam-se também as ações realizadas pela instituição, nos campos do ensino, da pesquisa, e da extensão e que foram os alicerces para a consolidação dessa proposta de formação de educadores.

4 A proposta de formação docente da FaE/CBH/UEMG no contexto das Tecnologias da Informação e Comunicação

4.1 Pesquisa e reforma curricular Como se destacou, a partir da reformulação do currículo de Pedagogia

da FaE/CBH/UEMG em 1997, vários e intensos debates foram promovidos nos sentido de se planejar uma proposta de formação do pedagogo que contemplasse também o campo da educação e tecnologia.

Com isso, travou-se uma disputa para que na nova proposta curricular do curso pudesse conter um ciclo de formação optativo em Informática na Educação, mesmo que esse fosse oferecido após a conclusão do ciclo básico de quatro anos. Esse ciclo optativo, a ser realizado no nono semestre letivo, teria a carga de 500 horas-aula, acrescidas de mais cem horas de Práticas Pedagógicas de Formação.

Contudo, em se tratando de uma proposta de formação de docentes e pedagogos, seria necessário algo mais, pois, para Valente (1993):

[...] a formação do professor para ser capaz de integrar a informática nas atividades que realiza em sala de aula, deve prover condições para ele construir conhecimento sobre as técnicas computacionais, entender por que e como integrar o computador na sua prática pedagógica e ser capaz de superar barreiras de ordem administrativa e

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pedagógica. Essa prática possibilita a transição de um sistema fragmentado de ensino para uma abordagem integradora de conteúdo e voltada para a resolução de problemas específicos do interesse de cada aluno. Finalmente, deve-se criar condições para que o professor saiba recontextualizar o aprendizado e a experiência vividas durante a sua formação para a sua realidade de sala de aula, compatibilizando as necessidades de seus alunos e os objetivos pedagógicos que se dispõe a atingir (VALENTE, 1993, p. 22).

No entanto, a implantação do Currículo em 1998 foi feita sem conter disciplinas específicas relacionadas à educação e tecnologia nos ciclos de formação básica de caráter obrigatório. O currículo de Pedagogia da FaE/CBH/UEMG apresentava “Habilitações integradas relacionadas à docência para a Educação Básica – anos iniciais do Ensino Fundamental e gestão de processos educativos: administração, planejamento, inspeção, supervisão e orientação educacional”.

Paralelamente às discussões do currículo, foi criado, em 16 de março de 1998, o grupo de pesquisa TEIA-GEPE7, sob a coordenação da professora Maria Inês de Matos Coelho.

O grupo TEIA-GEPE desenvolveu conhecimento acerca de processos de introdução de novas tecnologias na educação e na formação de professores. Realizou-se de agosto de 2001 a abril de 2003, o Projeto FAPEMIG SHA 1044/98 – Introdução de Novas Tecnologias de Comunicação e Informação na educação o presencial e a distância: contextos, fatores e resultados. Também investigamos a relação entre compreensão e apropriação de espaços sociais da Internet e a prática em processos de formação de Professores na Universidade inclusive com desenvolvimento de ambiente virtual de formação docente em comunidade de prática, com apoio do CNPq (ago/2001 a dez/2003). No período de 1998 a fev de 2001, foram desenvolvidos com apoio do CNPq (maio de 1999 a março de 2001) dois projetos: I) A introdução de novas tecnologias de informação

7 Grupo de Estudos e Pesquisas de Tecnologias Interativas de Aprendizagem.

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e de comunicação na escola, os contextos, as mudanças no papel do professor, percepções, resistências, prática pedagógica e a capacitação dos professores; II) Ambientes interativos de aprendizagem e trabalho por WWW: fatores de avaliação e de design. Promovemos também o Projeto III) BH2 – Rede de alta velocidade–(Consórcio PROTEM – CNPq-RNP) Capacitação de docentes de ensino superior na relação entre ensino, pesquisa e avaliação via Internet. (Apoio do CNPq, RNP). A pesquisa se integra com o ensino de graduação e com o ensino médio e fundamental. Outra repercussão é a capacitação de docentes pesquisadores. Além disto, promove divulgação e difusão científica, como Seminário de Educação e tecnologias de informação e de comunicação (COELHO, 2002, p. 1).

O TEIA-GEPE desenvolveu pesquisas com apoio do CNPq e FAPEMIG entre os anos de 1998 e 2003 e fez parte do Diretório de Grupos de Pesquisa do CNPq8. Ao longo das pesquisas realizadas pelo grupo, foram produzidos vários artigos, e uma das conclusões que um deles revela é que

A formação dos professores nas escolas precisa ser repensada no sentido de se tornar realmente inicial e continuada, como dois momentos distintos, e de contribuir para formas mais participativas de inserção da informática e de outras tecnologias de comunicação e de informação na escola. Para isto é preciso que os fatores organizacionais tanto do currículo escolar quanto do trabalho docente sejam alterados significativamente de forma a possibilitar o trabalho coletivo/colaborativo entre professores e alunos e a integração curricular pela interdisciplinaridade.

8 O TEIA-GEPE desenvolveu vários projetos dentro do programa “Introdução de novas tecnologias de comunicação e informação na educação presencial e a distância”. O Projeto 01 se referia à introdução de novas tecnologias de informação e comunicação na escola, os contextos, as mudanças no papel do professor, percepções, resistências, prática pedagógica e a capacitação de professores. O Projeto 02 tratava de ambientes interativos de aprendizagem trabalhando na perspectiva do WWW, assim como envolvia fatores de avaliação e design como continuidade do projeto “Gestão de C & T” de 1997. Já o Projeto 03 era voltado à capacitação de docentes de ensino superior na relação entre ensino, pesquisa e avaliação via Internet. O projeto integrou o consórcio PROTEM-CNPqRNP – Projeto BH-2 – Rede Metropolitana de Alta Velocidade de BH. Atividade de ensino a distância.

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Uma estratégia-chave é manter um foco central nas trocas (on-line ou off-line) centradas no aprendiz e em profissionais que examinam resultados e trabalhos dos estudantes. O dar e receber entre estudantes, professores e profissionais ajuda aos participantes compreenderem suas próprias estratégias de pensamento e o contexto de outras (COELHO et al., 2001, p. 96).

Diante de tais constatações, depreende-se que:O uso de tecnologia pode evoluir para ampliar as redes colaborativas de profissionais da educação, possibilitando o envolvimento deles em planejamento de desenvolvimento profissional com profissionais da tecnologia, construindo as habilidades, conhecimentos e compreensão profunda do conteúdo e da pedagogia requeridos para ensino e aprendizagem efetivo de estudantes e de outros educadores (COELHO et al., 2001, p. 97).

Paralelo ao TEIA-GEPE e dando sequência às ações voltadas para a implantação de estudos sobre educação e tecnologia na FaE/CBH/UEMG, foi-se constituindo, a partir do segundo semestre de 1999, ainda de maneira muito tímida, um grupo de estudos para discutir as implicações do uso de TIC na educação em seus diversos níveis e espaços, grupo este coordenado pela professora Luciana Zenha Cordeiro9. O grupo que era composto por alunos de diversos Núcleos Formativos10, interessava-se em aprofundar seus conhecimentos e estudos sobre a temática tecnológica, sobretudo, devido à necessidade de buscar embasamento teórico para desenvolvimento de seus trabalhos de conclusão de curso.

A necessidade de tais encontros era imperiosa visto que à época havia no curso de Pedagogia da FaE/CBH/UEMG uma carência de professores habilitados para orientar tais trabalhos. Os encontros aconteciam aos sábados à tarde, num trabalho voluntário da professora, já que a faculdade não dispunha ainda de espaços ou laboratórios de informática

9 Professora da FaE/CBH/UEMG e naquele período mestranda em Educação e Novas Linguagens pela UFMG.10 Os Núcleos Formativos no curso de Pedagogia da FaE/CBH/UEMG ainda hoje correspondem aos períodos semestrais de formação.

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e a dinâmica dos encontros baseava-se em leituras, discussões de textos, relatos de experiências e, eventualmente de algumas experimentações, a partir do uso de um notebook disponibilizado pela própria professora.

A partir do aprofundamento das discussões e estudos realizados pelo grupo, tornava-se urgente a adoção de políticas para a implantação e implementação de laboratórios, a aquisição de bibliografia específica e a criação de outras iniciativas que pudessem consolidar uma proposta de utilização e análise das implicações das TIC na educação.

De certa forma, concretizava-se, assim, a preocupação já evidenciada nos embates de reestruturação curricular do curso de Pedagogia da FaE/CBH/UEMG, em que era cada vez mais notório que a área de educação e tecnologia não poderia ser um apêndice no rol das disciplinas optativas do curso, mas precisaria se tornar uma realidade, compondo os ciclos básicos de formação do pedagogo, como já alertava Cysneiros (1991):

A informatização da escola também deve começar pelas Faculdades de Educação. É importante que o pedagogo e o licenciado de qualquer disciplina se familiarizem com o computador desde o início de sua formação profissional (CYSNEIROS, 1991, p. 48).

Nesse sentido, a Faculdade de Educação da UEMG estava ciente que era necessário partir para uma ação pontual, no sentido de contribuir efetivamente para a formação do pedagogo, visando a preparar esse profissional para enfrentar os novos desafios e perspectivas que envolviam o processo de disseminação e apropriação das tecnologias no âmbito das práticas educativas e mais, que tais ações deveriam ser ampliadas para além do universo das pesquisas acadêmicas.

4.2 O fortalecimento da política de educação e tecnologia da FaE/CBH/UEMG: a criação do NECT e a consolidação de sua infraestrutura tecnológica

A partir de meados do ano 2000, o Grupo de Estudos em Educação e

Tecnologia, orientado pela professora Luciana Zenha, reunir-se-ia com os então candidatos à direção e vice-direção da instituição, respectivamente, os professores José Cosme Drumond e Santuza Abras11, para discutir

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propostas e reivindicar políticas para a área de Educação e Tecnologia da FaE/CBH/UEMG. Era ponto pacífico que seria necessário criar um espaço multiuso para que alunos e professores pudessem vivenciar as novas formas de comunicação, a partir da experiência de utilização das tecnologias da informação em interseção com as práticas educativas. Seria necessário também, intensificar as reflexões advindas desse campo de conhecimento, de forma a estabelecer uma política concreta na área tecnológica para a comunidade acadêmica da faculdade.

Naquele momento, foi acordado com os professores supracitados que não seriam poupados esforços para que fossem tomadas medidas efetivas para criação desse espaço, que em princípio seria um laboratório de informática, com perspectiva de ampliação de utilização de outras mídias. No entanto, reivindicava-se também que fossem inseridos disciplinas nos currículos dos cursos de graduação e pós-graduação da instituição, para atendimento às necessidades da comunidade, tanto sob o ponto de vista da formação de educadores, quanto em relação às demandas acadêmicas de discentes e docentes.

A partir daí, iniciaram-se os levantamentos necessários para orientar a implantação desse espaço multiuso, etapa inicial para implementação de um projeto para uso das TICs na educação, como enfatiza Tajra (2001):

Para implantar ou reformular um projeto de informática educativa, podemos optar por uma metodologia a partir dos seguintes passos: diagnóstico tecnológico da escola, do professor e do aluno; plano de ação; capacitação dos docentes; conhecimento e pesquisa de softwares; elaboração do projeto pedagógico com uso de informática educativa; implantação e avaliação do projeto e replanejamento (TAJRA, 2001, p. 84).

Ao pensar na inserção dos computadores em ambientes educacionais muitos fatores são analisados, tais como: quantos computadores precisam instalar? Qual é a configuração dos computadores? Os computadores? Os

11 Os professores José Cosme Drumond e Santuza Abras foram responsáveis pela direção da Faculdade de Educação da UEMG entre os anos de 2000 e 2004.

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computadores ficarão em rede? Qual rede deverá ser utilizada? É necessário que todos os computadores possuam kits multimídia? Devemos colocar a Internet em todos os computadores? Qual tipo de conexão de acesso à Internet estaremos utilizando? Quais softwares serão comprados? Esses softwares são multiusuários? Ou monousuários? Quem será o coordenador das atividades do ambiente de informática? Quais são as suas funções? (TAJRA, 2001, p. 98).

Essa etapa foi importante para que, a partir do segundo semestre de 2000, com a posse da nova direção da FaE/CBH/UEMG, medidas fossem tomadas para a criação do primeiro laboratório de informática da instituição, como iniciativa principal de estabelecimento de uma política na área de Educação e Tecnologia. O Laboratório de Informática da FaE/CBH/UEMG se constituiu num espaço dedicado à discussão e realização de experiências na área de Educação e Tecnologia e fora inaugurado em setembro de 2001. Sua implementação contou com o auxílio de uma equipe de designers12, que desenvolveu uma proposta de layout que pudesse proporcionar ao ambiente aspectos de mobilidade e flexibilidade durante os procedimentos de uso dos computadores, apresentando um caráter bastante inovador para a época. O mobiliário do laboratório se organizava em círculos, em que as mesas eram móveis e a organização de cabeamento fora planejado para permitir possíveis adequações. Os conceitos de mobilidade e autossustentação, além de modernos, encaixavam-se dentro de uma perspectiva inclusiva13, já que todos os computadores foram instalados com o Sistema Operacional Linux14.

12 Os designers Alecir Carvalho, Fernando Lima e Welison Capeletti desenvolveram um projeto de mobiliário com características de mobilidade e flexibilidade de forma a atender a demanda da instituição.13 A implantação foi planejada para que alunos e professores se adaptassem ao modelo e a uma versão menos popular de uso de interface – o software livre. Esse processo de implantação não foi fácil, uma vez que a maioria dos usuários já utilizavam o Sistema Operacional Windows e muitos rejeitavam reaprender ou compreender a nova lógica de acesso à informação. 14 Sistema Operacional baseado em licença GPL, em que é permitido que o usuário utilize, estude, modifique e distribua o software de acordo com princípios livres.

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FIGURA 1 - Laboratório de informática da FaE/CBH/UEMG inaugurado em setembro de 2001Fonte: Centro de Comunicação FAE/CBH/UEMG, 2001.

Tal espaço constituiu-se, então, no embrião para a criação do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Educação, Comunicação e Tecnologia (NECT), que tinha como objetivo coordenar e implantar uma política tanto em termos teóricos quanto práticos na área Tecnológica para a FaE/CBH/UEMG. Sob a coordenação dos professores Daniel Mill e Haroldo Bertoldo15 e a participação de vários professores da instituição, com formação em diversas áreas do conhecimento, o NECT deu início às suas atividades, atuando no desenvolvimento de múltiplos projetos nas áreas de ensino, pesquisa e extensão.

A partir de 2002, finalmente foram criadas disciplinas que seriam incluídas no currículo do curso de Pedagogia, proposta essa que contou com a participação dos professores do núcleo e representantes da direção e coordenação de curso. Com o título de “Estudos sobre Educação,

15 O professor-doutor Daniel Mill participou de todo o processo de criação e expansão do NECT até 2006, sendo responsável pela formação de grupos de estudos, realização de pesquisas e estabelecimento de parcerias com outros núcleos. O professor-mestre Haroldo Bertoldo esteve vinculado ao NECT até 2009 e foi responsável pela expansão do laboratório de produção de mídias, além de desenvolver outros projetos de pesquisa e extensão.

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Comunicação e Tecnologia”, as disciplinas foram alocadas nos Núcleos Formativos 2, 5, 6 e 7, integrados a outras temas-disciplinas já existentes no currículo de Pedagogia.

No QUADRO 1, seguem as disciplinas incorporadas ao currículo do curso de Pedagogia com suas respectivas ênfases:

Quadro 01Relação de disciplinas incorporadas pelo currículo de

Pedagogia da FaE/CBH/UEMG

Disciplina

Sociedade da Informação

Mediação Pedagógica

Softwares Educativos

Mídias e EAD

Ementa

Analisa do ponto de vista das teorias da sociedade da informação (pós industrial ou pós moderna), do fenômeno informacional na estrutura e organização da sociedade contemporânea, assim como na constituição e distribuição da cultura/educação.

Introdução e desenvolvimento de projetos que perpassem o ensino/aprendizagem como um todo em uma perspectiva interacionista: epistemologias subjacentes ao trabalho docente, com ênfase numa didática baseada nas estruturas da inteligência e no meio sócio-cultural. O enfoque dado está relacionado a recursos e tecnologias de informação e comunicação – TICS (Tecnologias de Informação e Comunicação).

Descreve e analisa a produção tecnológica no campo da informática aplicada à educação, em termos de aplicativos dirigidos ao processo de ensino-aprendizagem, enfocando as construções de novos ambientes de aprendizagem e sua repercussão no âmbito educativo.

Analisa o desenvolvimento dos meios de comunicação eletrônicos e das redes digitais e sua influência na práxis educativa e na atual sociedade da informação, enfocando também a construção de ambientes de aprendizagem cooperativos, fazendo uso das tecnologias no processo ensino/aprendizagem.

Núcleo Formativo

II

V

VI

VII

Fonte: Dossiê NECT, 2002.

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Portanto, além de promover uma formação teórica e prática por meio de sua estrutura curricular básica, o NECT também começou a desenvolver outros projetos, atuando na promoção de cursos e oficinas de informática básica abertos à comunidade acadêmica e atuando também no oferecimento de tópicos de enriquecimento curricular direcionados aos estudantes de graduação da faculdade. O núcleo também iniciou sua participação na proposta de extensão universitária “Universidade Livre – pleno viver”,16 projeto que visava a incluir pessoas da terceira idade em processos de iniciação a informática.

O Núcleo de Estudos e Pesquisas em Educação, Comunicação e Tecnologia também promoveu diversas ações de qualificação para a utilização das TICs, entre elas destacam-se o curso Normal Superior da FaE/CBH/UEMG, em parceria com a Prefeitura Municipal de Betim, e o curso Normal Superior a distância, desenvolvido em parceria com a Secretaria de Estado da Educação de Minas Gerais, denominado “Projeto Veredas”. Cabe ressaltar que o NECT também contribui com a formação de servidores da UEMG oferecendo minicursos de inclusão digital para funcionários e professores e realizando diversos treinamentos específicos para gestores, bibliotecários e secretários acadêmicos.17

A partir do ano 2003, o NECT cria seu curso de Pós-Graduação lato sensu em “Educação, Comunicação e Tecnologia”, com as ênfases em mídias e educação, “Educação a Distância e Práticas Presenciais em Informática Educativa”, destinado a formar profissionais e educadores, especificamente nesse campo de conhecimento.

Entre as ações que contemplam as políticas da FaE/CBH/UEMG na área de educação e tecnologia pode-se citar ainda a proposta de criação e implantação do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação a Distância (CEPEAD), projeto que foi desenvolvido pela Faculdade de Educação em conjunto com o Núcleo de Educação a Distância da Universidade (NEAD/UEMG).

Atualmente, o NECT e o CEPEAD vêm desenvolvendo pesquisas,

16 O projeto “Universidade Livre – pleno viver” foi um curso de extensão voltado para a inclusão digital de alunos da melhor idade e coordenado pela Pró-Reitoria de Pesquisa e Extensão da UEMG.17 Os projetos realizados no NECT nesse período contaram com supervisão do núcleo e com a coordenação dos professores Cleder Tadeu Silva, Carlos Helmar Duarte e Sirléia Ferreira Rosa.

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Uma proposta de formação docente no contexto da utilização das tecnologias da informação ecomunicação no curso de Pedagogia da FaE/CBH/UEMG: linhas e entrelinhas

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projetos de extensão e outras propostas de intervenção voltadas ao desenvolvimento do trabalho pedagógico utilizando as TICs, tanto no âmbito presencial quanto na modalidade a distância. Podem ser citadas as pesquisas e propostas extensionistas sobre “Plataformas Open Source, Acessibilidade e Softwares de Inclusão para pessoas com Deficiência”, “Projeto Regênesis de Formação Continuada de Professores”, “Produção e uso de Objetos de Aprendizagem na Escola”, entre outros.

5 Considerações finais

As tecnologias são decorrentes de toda a transformação histórica. É

preciso compreender os movimentos complexos nos quais as sociedades têm se defrontado, especialmente nos benefícios e prejuízos causados pela interação homem-máquina. Independente dos dispositivos móveis digitais utilizados neste momento, inclusive na sala de aula, sejam eles notebooks, tablets, telas, teclados, celulares, entre outros, o mais importante é a constante busca pelo acesso à informação, pela produção de um conhecimento pessoal, processual, consistente e que privilegie a construção coletiva de uma aprendizagem significativa.

Um dos grandes desafios da atualidade, portanto, é contextualizar e pensar formas de desenvolver ações que perpassem o cotidiano da educação e das tecnologias. Kenski (2007, p. 127) afirma que “na nova realidade, o tempo da educação é o tempo da vida”. A autora reafirma ser necessário que políticas educacionais e instituições educativas estejam alinhadas pelas novas exigências.

Nessa mesma perspectiva, Filatro (2004) afirma que educação para toda vida passa a ser uma exigência permanente de toda a sociedade, desembocando na compreensão da escola e da Universidade como conceito e não como lócus. “[...] A educação tradicional vê aflorar novas formas de pensar, de construir e de comunicar com o conhecimento, as quais lançam importantes questionamentos quanto a seus objetivos, práticas e resultados” (FILATRO, 2004, p. 36). Filatro ainda complementa que precisamos compreender alguns elementos básicos das TICs não apenas de forma técnica, mas os significados para as atividades humanas.

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É nesse sentido que as tecnologias da informação e comunicação podem ser incorporadas no cotidiano das escolas e de todos envolvidos com a educação e a cidadania.

Por esse motivo, é que se torna um grande desafio para as universidades e para os professores formadores pensar na formação de agentes incentivadores e multiplicadores de mudança nos mais variados níveis da Educação Básica. Espera-se, de maneira audaciosa e ousada, contribuir para a apropriação das tecnologias digitais nas escolas, colaborando com a formação de pedagogos que critiquem, estudem, dominem e se apropriem das tecnologias como um recurso didático inovador (TAPSCOTT, 2010).

A experiência da Faculdade de Educação da UEMG de Belo Horizonte, de certa forma, traduz esse desejo já expresso nas contribuições dos diversos autores, como Tapscott (2010), Filatro (2004), Kenski (2007), entre tantos outros, de se pensar a inserção das TICs nas práticas educativas das escolas e universidades, no sentido de promover mudanças que possam colaborar com a melhoria das intervenções pedagógicas.

É somente a partir da construção de ações coletivas em direção ao processo de aquisição de práticas de inclusão e letramento digital, que será possível sair do plano das possibilidades vislumbradas em direção à utilização concreta desses valiosos recursos, de forma que se avance concretamente para se estabelecer um novo patamar de qualidade para o ensino e a aprendizagem de nossas instituições educativas.

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Uma proposta de formação docente no contexto da utilização das tecnologias da informação ecomunicação no curso de Pedagogia da FaE/CBH/UEMG: linhas e entrelinhas

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A proposal for teacher education in the context of the use of information technology and

communication in the faculty of Pedagogy of the FaE/CBH/UEMG: lines and lines

Abstract

The present article analyzes the experience of Faculdade de Educação of UEMG in Belo Horizonte in implementing a proposal of formation of professors and basic education managers, in the context of the inclusion of the debate about the use of Tecnologies of Information and Communication in the Education course. To this end, the actions developed by the institution in the education, research and extension fields are discussed, where are emphasized the processes of curricular reformulation, the acquisition of technological infrastructure and the creation of a study and research core that excelled itself for being the high point of the development of an effective policy for areas of Education, Technology and Communication in the university.

Keywords: Pedagogy; teacher training; TIC.

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Uma proposta de formação docente no contexto da utilização das tecnologias da informação ecomunicação no curso de Pedagogia da FaE/CBH/UEMG: linhas e entrelinhas

Recebido: 08/11/11Aprovado: 16/12/11

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Uma estratégia de ensino inspirada na Dialética Socrática e na Erística

Elivane Amaral de Souza Assis1

[email protected]

Fábio Wellington Orlando da Silva2

[email protected]

Resumo

Esta pesquisa investiga uma proposta de ensino inspirada nos diálogos socráticos (Dialética) e nos estratagemas de Schopenhauer (Erística), com o objetivo de educar os estudantes para o debate de conceitos científicos e o reconhecimento de argumentos falaciosos encontrados em textos pseudocientíficos na mídia não especializada e no contexto da vida cotidiana. A metodologia de pesquisa usada foi o estudo de caso, por meio de um minicurso ministrado a estudantes de engenharia, com carga horária total de oito horas-aula, divididas em quatro módulos de duas horas-aula cada. Ao fim dessa atividade, os estudantes foram capazes de reconhecer as falhas de argumentação contidas nos textos apresentados, inclusive de áreas distintas das que foram exploradas ao longo das atividades, manifestando também o desejo de prosseguir no aprofundamento desse tipo de estudo.

Palavras-Chave: ensino de ciências; educação; erística; dialética socrática; pseudociência.

1 Professora da Faculdade de Educação, campus Belo Horizonte, da Universidade do Estado de Minas Gerais (FaE/CBH/UEMG). Mestre em Educação Tecnológica, membro do grupo de pesquisa Filosofia da Ciência e da Tecnologia (FICITEC).2 Professor do Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais (CEFET-MG). Doutor em Física, membro do grupo de pesquisa FICITEC.

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Uma estratégia de ensino inspirada na Dialética Socrática e na Erística

1 Introdução

Esta pesquisa investiga uma proposta de ensino inspirada nos diálogos socráticos (Dialética) e nos estratagemas de Schopenhauer (Erística). O objetivo é educar os estudantes para o debate de conceitos científicos e o reconhecimento de argumentos falaciosos encontrados em textos pseudocientíficos na mídia não especializada e no contexto da vida cotidiana.

A pesquisa sobre percepção pública da ciência tem revelado que uma parte significativa da população desconhece diversas informações básicas, apesar de relevantes para suas vidas, e não distingue ciência de outras formas de manifestação cultural. Por exemplo, o relatório do teste padronizado Eurobarometer de 2005 registra que apenas 46% dos europeus manifestaram-se corretamente sobre as afirmações “os antibióticos matam vírus tão bem quanto matam bactérias” e “elétrons são menores do que átomos”; somente 47% discordaram da proposição “o laser funciona por meio da focalização de ondas sonoras”, apesar da palavra inicial que dá origem a essa sigla em inglês ser light. Talvez ainda mais grave do que isso, 41 % dos europeus citaram a Astrologia como exemplo de boa ciência, ocupando um honroso sétimo lugar, atrás naturalmente de Física e Medicina, mas à frente de História e Economia. À parte sutis considerações teóricas usadas para distinguir ciência, como a Biologia e a Física, de ramos de atividade que utilizam a ciência, como a Medicina e a Engenharia, a presença da Astrologia nessa lista é estarrecedora.

Nos Estados Unidos da América, pesquisadores renomados como Carl Sagan mostravam-se há muito preocupados com o desconhecimento generalizado a respeito de ciência e tecnologia, ao lado do crescimento vertiginoso de publicações sensacionalistas. Tal situação de ignorância estaria presente inclusive no congresso americano, no qual apenas 1% dos deputados teria recebido uma educação científica relevante. Ao discutir as consequências da perda dessa capacidade de discernimento em uma civilização global em que a ciência e a tecnologia proveem elementos cruciais, profetizou: “Podemos escapar ilesos por algum tempo, porém mais cedo ou mais tarde essa mistura inflamável de ignorância e poder

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Elivane Amaral de Souza Assis, Fábio Wellington Orlando da Silva

vai explodir na nossa cara” (SAGAN, 2007, p. 44). No Brasil, as pesquisas de percepção têm se concentrado mais em

verificar a atitude dos indivíduos em relação à ciência (BRASIL, 2011) do que em avaliar o nível de conhecimento da população. Entretanto, as poucas informações disponíveis sobre aplicações no Brasil do Eurobarometer assinalam baixo nível de conhecimento (VOGT; POLINO, 2003). Por exemplo, em 1987, somente 25% dos brasileiros deram uma resposta correta à proposição “uma usina nuclear só serve para fabricar bomba atômica” (GALLUP, 1987). Diante dessa constatação, como esperar que o povo decida com algum discernimento sobre a conveniência da construção de novas usinas nucleares? Ou de votar em candidatos a cargos políticos com base na defesa ou na crítica a esse tipo de usina? E que modelo de usina a ser adotado?

À falta de informação científica, acrescenta-se o desconhecimento a respeito dos procedimentos específicos da área. Isso tem permitido que pessoas inescrupulosas façam acusações inverídicas sobre o trabalho dos pesquisadores ou proponham modelos explicativos falaciosos, destituídos das características inerentes à atividade.

Na visão de senso comum, a ciência aparece como um conjunto de verdades definitivas que cresce continuamente pela contribuição de outros cientistas sem qualquer contestação por parte dos colegas. Entretanto, isso não corresponde à realidade, pois a discussão é indissociável da pesquisa (DASCAL, 2005) e de suas manifestações: “Os encontros científicos vivem cheios de disputas. Há colóquios universitários em que o conferencista mal discursou trinta segundos e já se ouviram perguntas e comentários devastadores da platéia” (SAGAN, 2007, p. 51).

Nesses encontros, questiona-se tudo, a clareza dos objetivos, a validade dos procedimentos, a precisão dos resultados. Aliás, para iniciar uma pesquisa, já é necessário propor questões: “É preciso saber formular problemas. [...] Se não há pergunta, não pode haver conhecimento científico. Nada é evidente. Nada é gratuito. Tudo é construído” (BACHELARD, 1996, p. 81).

Apesar de reconhecer a necessidade de o estudante saber formular problemas, alguns professores de ciências relatam que eles são bons

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“respondedores” de questões, porém mostram-se reticentes quando se trata de elaborar suas próprias questões (WENNING, 2005). Por que isso ocorre? Provavelmente porque sejam tratados como recipientes passivos de informações, não devendo se admirar que façam aquilo para o qual foram treinados, ou que se espera que façam. Os alunos não questionam porque não são ensinados a questionar ou porque perderam essa habilidade ao longo do processo escolar. Eles confundem ciência com a mera apresentação de seus resultados ou com outras manifestações culturais porque sua formação limitou-se a apresentar-lhes esses resultados, sem preocupação com fundamentos epistemológicos.

Uma estratégia para superar essa deficiência é levar os estudantes a debater concepções ou teorias conflitantes, de acordo com a Reconstrução Racional Didática (SILVA; NARDI; LABURU, 2008a, 2008b), ou engajá-los em diálogos socráticos (LEIGH, 2007; WENNING, 2005; WENNING; HOLBROOK; STANKEVITZ, 2006).

Observou-se também nos estudantes uma dificuldade para reconhecer argumentos ilícitos em publicações pseudocientíficas (ASSIS; SILVA, 2010). Essa dificuldade está relacionada à anterior, pois, se os estudantes fossem estimulados a formular questões e analisar as respostas uns dos outros, seriam forçados a detectar as falhas de argumentação. Assim como o raciocínio lógico é uma construção humana, com procedimentos desenvolvidos ao longo de séculos, a argumentação ilícita é também uma construção coletiva a ser aprendida e dominada para ser denunciada (PRACONTAL, 2004).

No presente trabalho, testou-se a viabilidade de uma estratégia de ensino inspirada nos diálogos socráticos (Dialética) e nos estratagemas de Schopenhauer (Erística), com o objetivo de desenvolver nos estudantes a habilidade de formular questões, debater conceitos científicos e reconhecer argumentos falaciosos. A parte empírica foi realizada por meio de um minicurso. O resultado foi altamente promissor, demonstrando que, uma vez que os estudantes aprenderam a reconhecer os truques em uma determinada área, como a Biologia, por exemplo, são capazes de extrapolar para outras áreas do conhecimento, como a Psicologia, para citar apenas um exemplo.

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Uma estratégia de ensino inspirada na Dialética Socrática e na Erística

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2 Metodologia

A metodologia de pesquisa adotada é o estudo de caso, pois essa metodologia ajuda a esclarecer uma decisão ou conjunto de decisões, o motivo porque foi tomada, o modo como foi concretizada e os resultados gerados, bem como investigar os limites entre o fenômeno observado e o contexto do qual faz parte (YIN, 2010; SCHRAMAMM, 1971). Por conseguinte, ela constitui uma boa estratégia quando se parte de proposições teóricas que norteiem a coleta e a análise dos dados, como no presente estudo.

A hipótese de partida é que, apesar de os estudantes não reconhecerem diversos argumentos falaciosos, nem estabelecerem a diferença entre argumentos lícitos e ilícitos, poderiam ser educados para reconhecê-los e utilizá-los, por meio de análise e reflexão, como forma de construção de conhecimento.

Esses desafios envolveram o teste de várias habilidades, tais como: análise, reflexão, discurso, perspicácia, conhecimento dos temas, embasamento teórico, diálogos, debates, redação de suas ideias (argumentos), interatividade no grupo, superação de timidez para estabelecer e manter relação intersubjetiva, incentivo, motivação, contato face a face, resolução de dilemas, entre outras. Do ponto de vista filosófico, o trabalho fundamentou-se na dialética de Sócrates e na dialética erística de Schopenhauer.

O filósofo grego Sócrates (470-399 a. C.) inaugurou o chamado período antropológico da filosofia ocidental, que legou a estruturação da linguagem baseada no desenvolvimento da argumentação por meio do raciocínio lógico, bem-encadeado e que se baseia na capacidade de fazer análises e reflexões para se chegar a conclusões (MONDOLFO, 1972).

O filósofo Platão (427-347 a. C.) apresenta esse método nos famosos Diálogos Platônicos. Por exemplo, no Teeteto (PLATÃO, 2007) descreve com maestria como Sócrates, por meio de indagações aos interlocutores, leva-os a perceber os pontos fortes e as falhas ou contradições de seu próprio pensamento. O valor ético e educativo desse método é muito grande, pois, a partir do reconhecimento da própria ignorância ou contradição, o

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indivíduo pode retomar sua linha de raciocínio, reorganizando-a em uma estrutura lógica coerente e que permite novas descobertas ou conclusões.

Aristóteles, outro filósofo do sec. V a.C, organiza em sua obra as regras do debate lícito e do debate ilícito. Ele mostra como se estrutura o pensamento lógico dedutivo e indutivo, a lógica e instrui sobre o cuidado que se deve ter ao participar das disputas que são matéria da Erística. Ele esclarece que a controvérsia é útil para os dois lados, pois permite retificar os próprios pensamentos e também adquirir novos pontos de vista. Os dois contendores, entretanto, devem ser similares em cultura e inteligência – porque Aristóteles também tinha, em sua filosofia, a finalidade ética e educativa. Ele alertava para o cuidado com a disputa, pois esta serve ao interesse daqueles que querem ganhar o debate a qualquer preço, utilizando argumentos falaciosos, enganosos e chegando mesmo aos ataques pessoais. Por isso, Aristóteles já indicava no último capítulo dos Tópicos:

Não disputar com o primeiro, com o melhor de todos, mas somente com aqueles que conhecemos e dos quais sabemos que possuem juízo suficiente para não apresentar coisas tão absurdas a ponto de serem expostos à humilhação; e que sejam capazes de disputar com fundamentos [...] e, por fim, que prezem a verdade, gostem de ouvir bons fundamentos, mesmo quando provêm da boca do adversário, e possuam a quantidade necessária de equidade para suportar a perda da razão quando a verdade permanecer do outro lado. Consequentemente, de cem pessoas, talvez haja uma com quem valerá a pena disputar. Aos restantes, deixemos falar o que bem entenderem... (VOLPI, 2005, p. 55).

Schopenhauer (1788-1860) foi um filósofo alemão que reuniu 38 estratagemas indicando como podem ser utilizados nas disputas para vencer o adversário. Ele não publicou essa obra, encontrada após sua morte, publicada sob o nome de Erística e amplamente divulgada até a atualidade. Ela não tem uma finalidade ética e educativa no sentido da dialética socrática, citada anteriormente, é apenas uma discussão técnica.

Um dos elementos inovadores deste trabalho é a utilização da dialética erística para estudar, compreender e ensinar a reconhecer e desmontar

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Uma estratégia de ensino inspirada na Dialética Socrática e na Erística

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as artimanhas do debate capcioso em textos pseudocientíficos. Para avaliar a viabilidade desse tipo de estratégia, foi apresentado o

minicurso “A erística e a falácia no discurso pseudocientífico”, oferecido a estudantes de graduação em engenharia de uma escola pública. O minicurso recebeu a aprovação das coordenações dos cursos envolvidos, que o divulgaram em seus sites oficiais, com direito à aquisição de créditos em atividades complementares, necessários para a integralização do currículo.

A chamada obteve boa aceitação, apesar da pouca antecedência e do prazo exíguo para divulgação, com 38 inscrições, das quais 30 estudantes foram selecionados, de acordo com o número de vagas previsto. O minicurso foi ministrado no período de março a abril de 2009, com a carga horária total de oito horas-aula, distribuídas em quatro módulos de duas horas-aula cada. Antes do início das atividades, os estudantes assinaram, espontaneamente, um termo de consentimento livre e esclarecido, no qual eram apresentadas as características da atividade a serem desenvolvidas, assegurando-se o sigilo de suas identidades, a possibilidade de retirar essa autorização a qualquer momento etc.

No primeiro módulo, estiveram presentes 26 alunos; no segundo, quatro alunos que não puderam comparecer à aula anterior justificaram suas ausências e compensaram a carga horária com a prorrogação do horário previsto, com o consentimento dos demais colegas. No terceiro e quarto módulos, estiveram presentes 25 alunos, os quais participaram de todos os encontros e atividades. Por esse motivo, para a análise dos resultados de pesquisa, foram consideradas apenas as atividades desenvolvidas por esses 25 alunos.

O curso apresentou aos estudantes práticas de dialética socrática e de dialética erística, para que aprendessem a detectar falhas de argumentação, argumentos enganosos, a melhorar sua capacidade de análise crítica e de redigir, com maior propriedade, os seus argumentos discursivos. Como material de suporte, foi distribuída uma apostila especialmente elaborada para essa finalidade, expondo sinteticamente as dialéticas envolvidas, textos para serem discutidos e exercícios práticos.

Os procedimentos metodológicos escolhidos para o desenvolvimento do curso foram:

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Elivane Amaral de Souza Assis, Fábio Wellington Orlando da Silva

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a) avaliação prévia com alunos; b) fundamentação e desenvolvimento;c) avaliação.

O primeiro módulo iniciou-se com a apresentação do objetivo do curso: “despertar nos participantes o interesse pela reflexão e capacitá-los a distinguir argumentos lícitos e ilícitos, levando-os a reconhecer os argumentos falsos do discurso pseudocientífico, contribuindo para sua formação técnica e científica”. Discutiu-se, mas sem apresentar nenhuma estratégia específica, a relevância de reconhecer a pseudociência contida em artigos, livros, propagandas e projetos com aparência de ciência, mas não o são. Comentou-se que a pseudociência apresenta, em todas as suas manifestações, algumas características comuns: uso abusivo e reiterado de conceitos e terminologia provenientes da Matemática e da Física; invocação abundante de teorias científicas das quais são expostas apenas ideias confusas; extrapolação dos conceitos das ciências naturais para as ciências sociais e humanidades, sem a necessária justificação conceitual ou empírica; ostentação de erudição superficial; manipulação de frases e sentenças, inclusive com carência de sentido.

O primeiro módulo foi encerrado com uma avaliação prospectiva, distribuindo-se aos alunos dois textos supostamente científicos, identificados como Textos 1 e 2, solicitando-se que fizessem uma análise crítica do conteúdo: “Analise cada um dos textos, separadamente. Elabore uma crítica ou defesa de cada um deles, utilizando-se de uma análise ou reflexão bem elaborada e raciocínio lógico bem encadeado.”

O Texto 1 é um panfleto criacionista de um autor contemporâneo, o Texto 2 (LACAN, 1970) trata de uma suposta aplicação da Matemática à Psicanálise, no qual o autor comete vários equívocos. O objetivo foi detectar se os alunos seriam capazes de perceber as falhas dos textos e comparar esse resultado com o da avaliação final, a ser aplicada no fim do curso, para verificar a eficiência do trabalho realizado. As orientações gerais para o teste incluíram a solicitação para que não houvesse comentários verbais, explicando aos participantes que “não fazer comentários” sobre aquela atividade naquele momento seria importante para um colega não

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influenciar as respostas dos outros, e para que eles viessem, posteriormente, a compreender o processo experienciado ao longo do curso.

Nas considerações finais da apostila, foi exposto que essa contribuição visava a levá-los à compreensão da importância do debate; despertar o prazer de estudar, pesquisar, fazer sua própria investigação; motivá-los a prosseguir no desenvolvimento do espírito investigativo como uma forma de construção pessoal e coletiva do saber; superar a visão simplista de progresso como acumulação; e reconhecer no debate um processo indissociável da construção do conhecimento.

O tema do segundo módulo foi “Dialética Socrática e Dialética Erística de Schopenhauer”. Utilizando a apostila distribuída aos alunos como material de suporte, com a devida contextualização histórica, foram apresentados os conceitos gerais da dialética socrática, que utiliza o diálogo como ferramenta para investigação da verdade, distinguindo-a da dialética erística de Schopenhauer, que esclarece o uso dos estratagemas nas disputas e como defender-se deles. Discutiu-se a importância das seguintes perguntas: por quê? Para quê? Como? no processo de construção do conhecimento.

Esclareceu-se a diferença entre três tipos de interações polêmicas: disputa, discussão, controvérsia; e entre pensamento lógico e pensamento dialético. Foi realizada uma dinâmica, usando-se um exemplo clássico, contido na apostila; em seguida, solicitou-se aos participantes que transpusessem esse caso para exemplos do cotidiano. No fim dessa atividade, foi sugerida, como atividade extraclasse, que os estudantes analisassem os estratagemas das páginas 26 a 28 da apostila, retirados de um site da internet, e os relacionassem com os estratagemas de Schopenhauer apresentados nas páginas de 13 a 20.

O terceiro módulo teve início com a socialização oral da atividade proposta extraclasse, a partir da formação de um grupo de discussão. Isso permitiu aos estudantes não apenas memorizar os estratagemas, mas compreender seu mecanismo de atuação e comparar a taxionomia de Schopenhauer com outras classificações. A seguir, passou-se à atividade de relacionar teoria e prática, por meio do exercício real do diálogo, para a investigação de um tema proposto. Essa dinâmica permitiu aos

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estudantes a compreensão e identificação gradual do processo dialógico e do processo da disputa – o como, o porquê, o para quê, ou seja, a finalidade de cada debatedor.

No quarto e último módulo, os estudantes realizaram uma atividade semelhante à do segundo módulo, mas nesse momento de forma individual e por escrito, em que deveriam relacionar, pelo menos, dois estratagemas de Schopenhauer aos estratagemas sugeridos no quadro das páginas 26 a 28 da apostila. Após essa atividade, foram entregues dois textos para serem analisados, novamente o Texto 1, já conhecido deles, e o Texto 3, um artigo novo para eles, também de Lacan (1977), versando sobre uma suposta aplicação da Matemática à Psicanálise, acompanhados da seguinte instrução: “Leia, atentamente, o texto e verifique se há presença de falácias e estratagemas no mesmo. Se houver, identifique-os, se possível.”

O Texto 1 foi usado com o objetivo de detectar se o curso produziu nos participantes alguma mudança de comportamento, se aprimorou a capacidade de avaliar inconsistências e a habilidade para reconhecer falácias e estratagemas, em suma, se o objetivo foi atingido. O fato de usar um dos textos iniciais permitiu comparar diretamente as respostas dos mesmos estudantes nas duas situações, antes e após o curso. Por outro lado, o fato de representar uma segunda leitura, de não constituir mais uma novidade à qual se é exposto para dar uma resposta em tempo limitado, representa uma alteração nas condições experimentais. Por esse motivo, foi distribuído também o Texto 3, inédito para eles, tal como o Texto 1 fora no primeiro módulo, com o qual se balanceou ainda a quantidade de textos analisados, dois em ambos os casos.

3 Resultados e discussão

No primeiro encontro, os alunos apresentaram-se com atitude curiosa e tímida; vários deles recusaram-se a colocar seus nomes nos dois textos (Texto 1 e Texto 2) que analisaram e entregaram.

Seguiu-se uma aula expositiva, como foi dito anteriormente. Um estudante manifestou-se dizendo que buscara, no Google, o significado

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de erística; outro perguntou se o tema e o conteúdo do curso tinham a ver com persuasão.

À medida que os conceitos foram apresentados e correlacionados com o cotidiano dos estudantes e com seu contexto sócio-histórico-cultural e temporal (são jovens estudantes com expectativas típicas de sua faixa etária, um código de linguagem comum), eles foram fazendo perguntas, expressando curiosidade e busca de entendimento do conteúdo ministrado. Isso se reflete na análise comparativa entre os resultados do Texto 1, obtidos na aula de 23 de março e de 01º de abril.

No Texto 1, distribuído em 23/03/2009, 60% dos estudantes criticaram ou questionaram a fala do autor; 84% não perceberam o uso de falácias, sofismas e estratagemas; 16% não aceitaram os argumentos por professarem uma crença diferente; apenas 4% dos estudantes aceitaram a argumentação do autor por possuírem a mesma crença; 20% tiveram uma aceitação acrítica dos argumentos; 28% argumentaram de forma incoerente; 72% apresentaram coerência na argumentação, baseada no senso comum; 60% fizeram uso de argumentação apropriada com base no senso comum; e 80% fizeram uma análise crítica do texto, também baseados no senso comum.

No mesmo Texto 1 distribuído em 01º/04/2009, 100% dos estudantes criticaram ou questionaram a fala do autor por meio de argumentação apropriada. Todos (100%) perceberam falácias, sofismas, estratagemas; não houve aceitação ou não aceitação das ideias do autor por motivo de crença; todos os estudantes (100%) tiveram coerência.

Um resultado semelhante foi observado em 01º de abril com a atividade relacionada aos Textos 2 e 3 aplicados no curso. No Texto 2, distribuído aos participantes do curso em 23/03/2009, 60% não responderam, alegando ser o texto incompreensível; 44% criticaram ou questionaram a fala do autor, baseados em senso comum; 100% não perceberam o uso de falácias, sofismas ou estratagemas; não houve aceitação ou não aceitação das ideias; 16% tiveram uma aceitação acrítica dos argumentos, 0% argumentou de forma incoerente; 40% apresentaram coerência na argumentação baseada em senso comum; e 36% fizeram uma análise crítica do texto, também baseados no senso comum.

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No Texto 3, distribuído em 01º/04/2009, 100% dos estudantes criticaram ou questionaram a fala do autor utilizando argumentação apropriada; todos (100%) perceberam falácias, sofismas e estratagemas; não houve aceitação ou não aceitação por crença; todos (100%) os estudantes tiveram coerência na argumentação, fizeram uso de argumentação apropriada e analisaram o texto de forma crítica e reflexiva.

Exemplos de respostas dos alunos referentes ao Texto 2:3

a) discordo de Jacques Lacan. O texto diz muito e significa pouco, pois suas idéias por mais diversas que sejam, estão totalmente desconexas no texto, o que impossibilita a coerência. O autor colocou grande quantidade de informações no texto no intuito de passar imagem para o leitor de um texto rico em significado, tentando assim intimidar o leitor e convence-lo da validade de sua posição.

b) Jacques Lacan em sua tese apresentada no texto 2, faz uso de uma linguagem e lógica tão complicada que chega a prejudicar seu entendimento por completo. Tentar ligar os fatos com um objeto aparentemente não demonstra nenhuma lógica, já que no início do texto ele começa falando de perdas e de como elas afetam o sujeito.

c) O autor diz que a estrutura neurótica é um toro, mas sua linha de raciocínio confusa mal deixa abertura para questionamentos. Não concordo nem discordo de Lacan, pediria outro exemplo.

Exemplos de respostas dos alunos referentes ao Texto 3:4

a) o zero não é um número racional, como ele diz. No cálculo diferencial e integral nós vemos que o tender a zero é irracional. É um número muito pequeno, que não é zero, ele passa perto de zero. A definição de um número imaginário é a V-1=i. Um número irracional é diferente dos imaginários. Os irracionais geralmente são usados a partir de sinais. Como por exemplo o PI (meu computador não tem este sinal). Nesse texto Lacan usa o E36 porque

3 Transcrição literal.4 Transcrição literal.

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muitas pessoas que não sabem matemática, podem pensar que é verdade. Além disso, tem o E29, pois ele tenta misturar matemática com psicologia.

b) E36- discurso incompreensível: o autor utiliza uma linguagem de difícil compreensão a fim de desconcertar e aturdir o adversário. E11- salto indutivo: o autor conclui apressadamente que todo número irracional é imaginário. Argumento falso, pois os números irracionais são aqueles que não podem ser representados por uma fração e os números imaginários são aqueles representados pelo eixo y cartesiano. E11-salto indutivo: o autor conclui apressadamente que, por não serem intuitivos, os números imaginários não correspondem a algo real. Os números imaginários possuem várias aplicações na engenharia.

c) Jacques Lacan usa em seu texto uma certa dose de manipulação semântica (E12) ao escolher a metáfora “...a vida humana poderia ser definida como um cálculo no qual o zero seja irracional”, pois esta metáfora favorece sua tese de uma maneira melhor do qualquer outra. Há também, claro, uma certa dose de discurso incompreensível (E36) durante todo o texto pois, para leigos, o texto não passa de um grande discurso técnico. Ora, para alguém que entende razoavelmente de matemática, o zero não é irracional, portanto essa afirmação é falsa. Percebe-se então que Lacan usa intencionalmente premissas falsas (E20). Consequentemente, as conclusões do autor são feita “a força” através de distorções de conceitos (E24). É possível concluir que Lacan faz um discurso duplamente falacioso. Duplamente pois, em primeiro lugar há um discurso incompreensível para leigos e, em segundo lugar por usar argumentos falsos durante todo o texto e sua conclusão se baseia nesses falsos argumentos.

Diante desse resultado, conclui-se que os estudantes aprenderam a identificar argumentos falaciosos, sofismas e estratagemas. No primeiro dia de aula, eles apenas detectavam a presença de “algo errado” ou “esquisito”, criticavam, mas utilizando-se de afirmações do senso comum.

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Embora houvesse coerência em suas falas, estavam longe de manifestar uma argumentação apropriada no sentido de análise crítica ou reflexiva; dois alunos até usaram a palavra “inferência”, mas demonstrando que não compreendiam a acepção correta do termo e, portanto, não sabiam aplicar o processo relacionado a inferência na argumentação.

No último dia, todos os estudantes identificavam falácias, sofismas, estratagemas, e colocaram espontaneamente seus nomes e assinaturas nas atividades entregues, sendo que lhes foi dada a opção, desde o primeiro dia, de usar pseudônimos, se quisessem. Outro fator significativo: eles não apenas identificaram, mas também colocaram o nome e o número dos estratagemas aos quais correspondiam as falhas nos textos, ou seja, foram além da proposta.

Isso evidencia a capacidade de motivação da prática desenvolvida no segundo e terceiro encontros. O processo de emulação funcionou: treinaram em duplas e em grupo de discussão, juntamente com a professora. Gradualmente, foram relacionando teoria e prática, estabelecendo relações com seu cotidiano escolar e extraescolar, reconhecendo a aplicabilidade do conteúdo ministrado em outras áreas e tentando envolver a professora em alguns estratagemas.

No terceiro e quarto encontros, eles chegaram animados, rindo, contanto que, em salas de aula da graduação, nas diversas disciplinas, um colega falava para o outro: “Olha, isso é E...” (referindo-se aos estratagemas E1, E2 etc.) e divertiam-se com a curiosidade dos demais colegas de turma que queriam saber do que se tratava.

4 Conclusão

Percebe-se que a hipótese de partida foi confirmada: ensinando a reconhecer falácias, sofismas e estratagemas em textos pseudocientíficos, os estudantes mostraram-se capazes de reconhecer essas falhas e manifestaram motivação para prosseguir no aprofundamento desse conteúdo.

A pesquisa revelou ainda que a habilidade desenvolvida para reconhecer estratagemas em uma determinada área do conhecimento, ou a partir de alguns textos, foi extrapolada espontaneamente pelos

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estudantes para outras áreas e textos, pois não depende do assunto específico em que ocorreu a formação, mas das falhas de argumentação lógica intrínsecas ao texto.

Como estratégia de ensino, a metodologia mostrou-se uma alternativa viável e envolvente, capaz de motivar os alunos e permitir um aprendizado altamente agradável, em uma atmosfera de camaradagem. Isso, contudo, não dispensa o professor de uma intensa preparação prévia das aulas, pois deverá enfrentar argumentos em um nível mais elevado que o usualmente observado em salas de aula, com as sutilezas de argumentação ou sofismas que ele mesmo ensinou.

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A teaching strategy inspired by the Socratic dialectic and Eristic

Abstract

This research investigates a teaching strategy inspired in Socratic dialogues (Dialectic) and Schopenhauer stratagems (Eristic) with the aim to educate students to discussion of scientific concepts and recognition of fallacious arguments found in pseudo-scientific texts, non-specialized media and in the context of daily life. The methodology is the case study, accomplished by a mini-course given to under-graduated students of engineering, with total workload of eight hours/class, distributed in four modules of two hours each one. At the end of this activity, students were able to recognize failures of reasoning present in texts, also from areas of knowledge different of them used in the mini-course, and they expressed a desire to pursue in such type of studies.

Keywords: science education; education; eristic; Socratic dialectic; pseudo-science.

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Elivane Amaral de Souza Assis, Fábio Wellington Orlando da Silva

Recebido: 14/09/11Aprovado: 02/12/11

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La progresión de las concepciones de los futuros profesores de primaria sobre la metodología de enseñanza

Ana Rivero1

[email protected]

Pilar Azcárate2

[email protected]

Rafael Porlán3

[email protected]

Rosa Martín Del Pozo4

[email protected]

Joao B. Harres5

[email protected]

Emilio Solís Ramírez6

[email protected]

1 Professora del Departamento de Didáctica de las Ciencias de la Universidad de Sevilla.2 Professora del Departamento de Educación de la Universidad de Cádiz.3 Professor del Departamento de Didáctica de las Ciencias de la Universidad de Sevilla.4 Professora del Departamento de Didáctica de las Ciencias de la Universidad Complutense de Madrid.5 Professor de la Universidad de Porto Alegre.6 Professor del Departamento de Didáctica de las Ciencias de la Universidad de Sevilla.

Resumen

Este artículo describe y analiza la evolución de las concepciones de profesores de Primaria en formación acerca de la metodología de enseñanza. En concreto, aunque se han estudiado tres categorías (concepto de actividad, organización de

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La progresión de las concepciones de los futuros profesores de primaria sobre la metodología de enseñanza

las actividades y concepto de recurso didáctico), se presentan los resultados obtenidos en relación a una de ellas: la organización de las actividades. El estudio se ha realizado con cinco equipos de futuros profesores que participaron en cursos de formación de orientación constructivista e investigadora en varias universidades. En los resultados obtenidos se detectan muy diversos itinerarios en los procesos de cambio y la presencia de dos fuertes obstáculos, que la enseñanza es la causa directa del aprendizaje, y el absolutismo epistemológico. El estudio nos permite señalar algunas implicaciones para la formación inicial de los profesores.

Palabras-Clave: formación inicial de profesores; c o n o c i m i e n t o p r o f e s i o n a l ; e s t r a t e g i a s metodológicas; secuenciación de actividades.

1 Introducción

Son numerosos los estudios que han descrito y analizado las concepciones de los profesores sobre la ciencia y sobre su enseñanza y aprendizaje. Estas concepciones se caracterizan por ser estables y difíciles de cambiar pues, en la mayoría de los casos, proceden de su experiencia interiorizada como alumnos y no de la formación recibida para ser docente (AGUIRRE; HAGGERTY, 1995; GUSTAFSON; ROWEL, 1995; HASWEH, 1996; MELLADO, 1996; YERRICK; PARKE; NUGENT, 1997; JORAM; GABRIEL, 1998; PORLÁN; RIVERO, 1998; SZYDLIK; SZYDLIK; BENSON, 2003; BESWICK, 2006). Así mismo, es un criterio bastante aceptado que la formación de profesores ha de organizarse en torno a dichas concepciones para facilitar su evolución (LEMBERGER et al., 1999; DUIT; TREAGUST, 2003; AMBROSE, 2004). En relación con esto, nuestro equipo de investigación se ha venido ocupando desde hace tiempo de tres ámbitos de estudio relacionados y complementarios:a) el estudio de las concepciones didácticas y epistemológicas de los profesores. En este ámbito hemos identificado una tendencia mayoritaria, basada en una visión empiro-positivista de la ciencia y en un modelo transmisivo de enseñanza, y otras minoritarias, con una vision más relativista de la ciencia y más centradas en el papel activo del alumno

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Ana Rivero, Pilar Azcárate, Rafael Porlán, Rosa Martín Del Pozo, Joao B. Harres, Emilio Solís Ramírez

(PORLÁN et al., 1998; Martín del Pozo; Porlán, 2001; Porlán; Martín del Pozo, 2002; 2004; 2006); b) la caracterización del conocimiento del profesorado como un conocimiento práctico profesional (CPP). Este conocimiento se organiza en torno a los Problemas Prácticos Profesionales (PPP), y se construye por superación gradual de obstáculos epistemológicos y didácticos (PORLÁN et al., 1996; 1998; PORLÁN; RIVERO; MARTÍN DEL POZO, 1997; AZCÁRATE, 1999a; HARRES et al., 2005);c) el diseño y experimentación de estrategias de formación que promuevan la construcción del CPP. Estas estrategias se fundamentan en un modelo de formación que denominamos “Formación de Profesores para Investigar la Práctica” (FOPIP) (PORLÁN et al., 1996; PORLÁN; RIVERO, 1998; PIZZATO; HARRES, 2007), basado en dos ideas claves: - organizar el proceso formativo en torno a “Problemas Prácticos Profesionales” (PPP) (PETERSON; TREAGUST, 1998; WATTERS; GINNS, 2000). Los que consideramos más relevantes para la construcción del conocimiento profesional son aquellos relacionados directamente con aspectos vinculados al currículo escolar: las ideas de los alumnos, los contenidos de enseñanza, la metodología de enseñanza, la evaluación, el diseño de unidades didácticas, la planificación de un curso completo y la definición del modelo didáctico personal (PORLÁN; GARCÍA, 1992; PORLÁN; RIVERO, 1998; MARTÍN DEL POZO; RIVERO, 2001; PORLÁN; MARTÍN DEL POZO, 2006),- facilitar la construcción de respuestas a los PPP planteados gracias al contraste con informaciones tanto teóricas como prácticas y mediante procesos de negociación del conocimiento, en ambientes democráticos y críticos (WATTS; JOFILI, 1998).

Con este marco de fondo, nos hemos centrado en los últimos años en el estudio de la progresión de los futuros profesores cuando participan en procesos formativos coherentes con el modelo FOPIP. Es lo que Niedderer, Goldberg y Duit (1992) denominan estudios del aprendizaje como consecuencia de intervenciones específicas. Para ello, hemos diseñado un curso denominado “Concepciones de los Alumnos e Innovación Curricular” (CAIC) que concreta y adapta dicho modelo a los

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contextos formativos en los que trabajamos. En el CAIC se abordan los siguientes “Problemas Prácticos Profesionales”: las ideas de los alumnos, los contenidos escolares y la metodología de enseñanza.

En este artículo vamos presentar y analizar los resultados obtenidos en relación con uno de ellos: la metodología de enseñanza.

2 La metodología de enseñanza

En la actualidad, existe un consenso bastante generalizado entre los investigadores acerca de algunos de los principios de lo que podríamos denominar metodología deseable. Nos referimos a los siguientes (WATTS; JOFILI, 1998; DUIT; TREAGUST, 2003):a) poner el foco en el que aprende; es decir, pasar de una enseñanza centrada en el profesor a una enseñanza centrada en el alumno (sus ideas, afectos, intereses, necesidades, etc.);b) generar un ambiente de aprendizaje que favorezca las interacciones (entre profesores y alumnos, entre los propios alumnos, entre distintos tipos de saberes, etc.);c) promover la construcción de conocimientos mediante procesos de negociación democrática, lo que implica un cierto relativismo epistemológico y el cuestionamiento de las relaciones de poder habituales.

En esta línea, consideramos que resultan especialmente adecuadas las propuestas metodológicas basadas en la investigación de problemas abiertos, cercanos, interesantes y relevantes para los alumnos. Para el tratamiento de estos problemas en el aula es necesario negociar los significados que aportan mejores soluciones, fomentando así la actividad y el protagonismo real de los alumnos en los procesos de enseñanza-aprendizaje. En este enfoque, las actividades constituyen el elemento organizador de la vida del aula, la unidad de programación. Mediante ellas se definen las interacciones didácticas, los contenidos a trabajar, las actuaciones concretas, la distribución del tiempo y del espacio, los recursos necesarios, etc. Cañal (2000, p. 5) define las actividades como “procesos de flujo y tratamiento de la información (orientados, interactivos y organizados) característicos del sistema aula”.

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La progresión de las concepciones de los futuros profesores de primaria sobre la metodología de enseñanza

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Desde otras visiones, sin embargo, las actividades se conciben de manera distinta. Por ejemplo, desde enfoques transmisivos se consideran como situaciones protagonizadas por los alumnos para comprobar y/o aplicar la información que transmite el profesor (AZCÁRATE, 1999b). Para muchos profesores, las actividades son sólo situaciones especiales, ligadas a la práctica (hands-on activities), que se caracterizan por ser interesantes y motivadoras para los alumnos (APPLETON, 2002). Pero, desde perspectivas constructivistas, como acabamos de señalar, la actividad es la unidad del proceso metodológico y su sentido es facilitar a los alumnos la construcción del conocimiento.

Para conseguir esto, las actividades deben relacionarse entre sí de manera coherente, configurando un conjunto articulado. Aunque es habitual que los profesores organicen la secuencia temporal en el aula en función de la lógica de los contenidos, desde el enfoque de enseñanza que venimos defendiendo, el hilo conductor de la secuencia de actividades lo constituye la evolución de las ideas de los alumnos. Los contenidos se consideran entonces como herramientas para abordar los problemas investigados y para promover el desarrollo de las competencias necesarias.

En el desarrollo de cada actividad es necesario utilizar diversos recursos didácticos. La validez de los recursos depende de la finalidad perseguida y no sólo del recurso en sí mismo. Consideramos, pues, que los recursos que se pueden usar en la enseñanza son muy variados (instrumentos, objetos, documentos, lugares, personas, acciones, etc.), y que es muy importante seleccionar aquellos que resulten más adecuados, en cada caso, para facilitar la construcción de conocimientos.

Por todo lo que acabamos de exponer, consideramos que para caracterizar las distintas opciones metodológicas son relevantes las siguientes categorias: definición y sentido de la actividad, criterio de organización de las actividades (el hilo conductor de la secuencia) y definición y sentido de los recursos didácticos, y son las que abordamos en nuestro estudio. En esta comunicación nos vamos a centrar en describir y analizar las progresiones de futuros profesores con relación a una de estas categorías (organización de las actividades) cuando participan en el curso CAIC.

Según los estudios revisados los futuros profesores inician su

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formación con visiones sobre la enseñanza coherentes con un enfoque de caracter transmisivo (PETERSON; TREAGUST, 1998; MEYER et al., 1999; HAEFNER; ZEMBAL-SAUL, 2004). En menos ocasiones lo hacen con enfoques inductivos, coherentes con la idea de descubrimiento, o incluso se pueden detectar tendencias próximas al constructivismo (GUSTAFSON; ROWEL, 1995; SKAMP; MULLER, 2001a; PORLÁN; RIVERO; MARTÍN DEL POZO, 1998). Debemos señalar también que frecuentemente suelen aparecer contradicciones entre lo que los futuros profesores de primaria declaran acerca de sus enfoques o modelos educativos y lo que diseñan para sus aulas (HEWSON; HEWSON, 1987) y entre lo que diseñan y lo que hacen (MELLADO, 1996; BRYAN; ABELL, 1999). Las declaraciones pueden estar alejadas de los modelos transmisivos - llegando a ser próximas a perspectivas constructivistas, pero las prácticas no lo consiguen (HANEY; MCARTHUR, 2002; SO; WATKINS, 2005; CHENG et al., 2009). Estas contradicciones pueden ser debidas a la ausencia de referentes prácticos de carácter innovador que apoyen y orienten las intenciones de cambio, por lo que los futuros profesores acaban enseñando como han sido enseñados y son pocos permeables en la práctica a las ideas innovadoras. Así, el estudio de Skamp y Muller (2001 b) resalta que los factores que los estudiantes de profesor señalan como más relevantes en sus concepciones acerca de un buen profesor de ciencias, son sus experiencias previas como alumnos y sus experiencias durante las prácticas de enseñanza en la formación inicial.

Respecto a los cambios de los futuros profesores cuando participan en programas de formación inicial, los datos no son muy esperanzadores. Parece que, en general, se presentan resistencias importantes al cambio (PETERSON; TREAGUST, 1998), no siendo fácil conseguir que se desarrollen los modelos metodológicos recomendados desde la investigación didáctica (SKAMP; MULLER, 2001a). No obstante, algunos cambios que se detectan, al menos en una parte importante de los futuros profesores investigados, son:a) ampliación del tipo de actividades que se tienen en cuenta (HAEFNER; ZEMBAL-SAUL, 2004); b) valoración positiva del uso de problemas o preguntas (HAEFNER;

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ZEMBAL-SAUL, 2004);c) consideración más activa de los estudiantes (se les anima a explorar los materiales, a intentar descubrir las ideas, etc.) (SKAMP; MULLER, 2001a);d) Consideración didáctica de las ideas de los alumnos, aunque en un sentido bastante limitado: cuando reproducen lo que el profesor quiere escuchar, para crear un mejor ambiente de clase (MEYER et al., 1999; HAEFNER; ZEMBAL-SAUL, 2004);e) aceptación de que puede haber más de un respuesta a los problemas y más de un resultado en los experimentos (SKAMP; MULLER, 2001a).

3 Diseño metodológico

La metodología seleccionada para esta investigación es de carácter cualitativo dentro del paradigma crítico. La finalidad de este tipo de investigaciones es principalmente la comprensión de cómo los sujetos experimentan, perciben e interpretan la realidad y su actuación en ella, estudiando el fenómeno en el contexto en el que se produce.

La investigación se centra en el estudio de una propuesta formativa (el curso CAIC) que se desarrolla en cinco escenarios diferentes, en los que son seleccionados cinco equipos que configuran los cinco casos analizados. El programa formativo tiene un contexto temporal definido, pues se desarrolla a lo largo del curso escolar. Es un estudio de casos de naturaleza evaluativa, ya que intenta analizar/valorar los resultados de una intervención específica, vinculados a la progresión de las ideas de los participantes.

En las páginas siguientes caracterizamos la investigación realizada, el contexto donde se ha desarrollado, los instrumentos para la obtención de los datos y el procedimiento de análisis empleado.

3.1 Problema de investigación y sistema de categorías

El problema central de la investigación es:

a) ¿cómo progresan las concepciones de diversos equipos de profesores en formación en relación con la metodología cuando participan en un

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curso de orientación constructivista (y qué obstáculos aparecen)?El estudio de este problema nos permite:

- describir y analizar la progresión de las concepciones sobre la metodología de enseñanza,- inferir los obstáculos didácticos y epistemológicos que bloquean su evolución,- detectar las actividades formativas que parecen más relacionadas con los momentos de mayor progreso.

Como ya hemos dicho, para abordar el problema formulado hemos seleccionado una de las categoría de análisis: Criterio de organización de las actividades, que hemos formulado en tres niveles de progresiva complejidad, como resultado de nuestra reflexión teórica, de la experiencia en la formación del profesorado, de los modelos didácticos y formativos en los que venimos trabajando y del contraste con los primeros datos empíricos (PORLÁN et al., 1996; 1998; PORLÁN; RIVERO, 1998; AZCARATE, 1999b; HARRES et al., 2005).

Los niveles responden a lo siguiente:a) el primero refleja nuestra previsión sobre las concepciones de los participantes al inicio del curso (N1); b) el segundo describe las concepciones que consideramos que son posibles alcanzar al final de un curso de estas características (N2);c) el tercero responde al referente teórico que nosotros consideramos deseable (N3).

Por tanto se trata de un posible Itinerario de Progresión de las concepciones de los futuros profesores en relación con la categoría estudiada, que incluye los valores inicial, posible y de referencia (CUADRO 1). Como veremos más adelante, este itinerario de progresión, en interacción con los datos empíricos completos, se enriqueció con niveles intermedios.

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CUADRO 1Itinerario de Progresión

Nivel 3

La secuenciametodológica tiene

relación con las ideas de los alumnos y

pretendefavorecer su evolución a

través de procesos de investigación

(planteamiento deproblemas, formulaciónde hipótesis,

contraste con otras informaciones,

establecimiento deconclusiones y

reflexiónsobre lo aprendido).

Los contenidos se consideran

como herramientas para abordar dichos

problemas

Nivel 2

La secuenciametodológica tiene

relación con las ideas de

los alumnos y pretende, de

manera más o menos explícita,

ampliarlas, corregirlas y

sustituirlas por el conocimiento

verdadero.

Nivel 1

La secuenciaMetodológica

vienedeterminada

por lalógica de los contenidos y pretende su

transmisión a los alumnos.

Categoria

Criterio deorganización

de las actividades

3.2 Contexto formativo y muestra

El curso (CAIC) responde a un referente epistemológico constructivista, según el cuál las estrategias basadas en la investigación son especialmente adecuadas tanto para la enseñanza de los alumnos como para la formación de los profesores. Como hemos dicho en la introducción, el curso se organiza en torno a tres PPP:a) PPP I: las ideas espontáneas de los alumnos (naturaleza, cambio, detección y análisis);b) PPP II: los contenidos escolares (fuentes, tipos, relaciones, niveles de formulación y manera de presentarlos a los alumnos);

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c) PPP III: la metodología de enseñanza (concepto y sentido de la actividad, secuencia metodológica y recursos didácticos).

El curso comienza con el tratamiento de las ideas de los alumnos porque, como señalan varios autores, es una herramienta de primer orden para transformar el conocimiento de los futuros profesores (JONES; CARTER; RUA, 1999; MORRISON; LEDERMAN, 2003). Empezar a conocer y a tener en cuenta las ideas de los alumnos les ayuda a distanciarse del modelo tradicional de enseñanza.

La metodología de formación, por tanto, gira en torno a la participación activa de los futuros profesores en la construcción de su conocimiento profesional. En líneas generales esta metodología se caracteriza por fomentar el análisis, la reflexión crítica, la discusión en pequeños grupos de trabajo y el debate entre todos los participantes. El papel del formador es de mediador y orientador: revisa los informes, interviene en los debates abriendo interrogantes, facilita documentos que favorezcan el contraste de ideas y la reflexión, orienta las puestas en común y facilita las síntesis finales.

En el PPP I, los futuros profesores, organizados en equipos, deben investigar las ideas de 50 alumnos de Educación Primaria (6 a 12 años) sobre un contenido del curriculo de ciencias o matemáticas escogido libremente por ellos según sus intereses (actividades 1 a 6).

En el PPP II, deben diseñar los contenidos que consideran adecuados en relación a la temática escogida y teniendo en cuenta las ideas de los alumnos investigadas anteriormente (actividades de la 7 a la 9).

Por último para tratar el PPP III, deben diseñar el plan de actividades que consideran adecuado para hacer evolucionar las ideas de los alumnos acerca de los contenidos seleccionados. Los datos que se presentan y analizan en este artículo proceden fundamentalmante de las producciones escritas elaboradas por los futuros profesores durante el tratamiento de este problema profesional (actividades de la 10 a la 12).

Pero, veamos más en detalle el desarrollo de cada una de estas tres actividades:a) actividad 10. Los equipos elaboran una primera propuesta de

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actividades para enseñar los contenidos seleccionados. Lo hacen sin consultar ningún material, teniendo en cuenta solo sus ideas en ese momento. Los equipos exponen sus producciones en la clase y se analizan entre todos en relación con: las actividades que se proponen (su papel y su sentido); cómo están organizadas (cómo se ordenan y secuencian, y por qué) y los recursos didácticos que se usan (su papel y su sentido);b) actividad 11. A continuación se presentan, analizan y debaten otras propuestas de actividades obtenidas de experiencias de innovación e investigación didáctica. En estas propuestas las actividades y los recursos didácticos juegan distintos papeles y las secuencias se establecen según la metodología que inspira cada experiencia. Posteriormente, se leen y analizan textos que presentan diferentes modelos metodológicos generales y los argumentos didácticos que los fundamentan, fundamentalmente ejemplificaciones y textos teóricos coherentes con metodologías basadas en la investigación de los alumnos. Finalmente, los equipos cumplimentan un Guión de Reflexión que les ayuda a relacionar su primera propuesta de actividades con los ejemplos alternativos presentados;c) actividad 12. Por último, los equipos reconsideran su propuesta inicial y elaboran una segunda, justificando los cambios introducidos, que someten a crítica ante el resto de los participantes en el curso.

Como se observa, cada uno de los tres problemas se aborda a través de una secuencia de actividades formativas organizadas en tres momentos (CUADRO 2):a) inicial, para activar, tomar conciencia y elaborar los puntos de vista de los participantes sobre el problema planteado;b) intermedio, para provocar contraste y reflexión argumentada entre esos puntos de vista y otras informaciones procedentes de diferentes fuentes. Estas informaciones se seleccionan tomando como referencia el nivel de partida de los sujetos;c) final, para facilitar la reelaboración de los puntos de vista iniciales y la reflexión sobre los cambios que se hayan producido.

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CUADRO 2Actividades desarrolladas en el PPP III

¿Qué secuenciade actividadespuede favorecerque evolucionenlas ideas de losalumnos?

A.10: Elaborar una primera versiónde la secuencia de actividades

A.11: Conocer y debatiraportaciones de la investigacióndidáctica. Guión de reflexión

A.12: Elaborar la segunda versiónde la secuencia de actividades

Momento inicial

Momento intermedio

Momento final

Secuencia formativa

El CAIC se desarrolló durante un semestre en distintas asignaturas de la Formación Inicial del Profesorado, en diferentes universidades y conducidos por distintos profesores.

Las asignaturas previas al desarrollo de este curso están relacionadas con la enseñanza de algunas materias escolares (matemáticas, ciencias de la naturaleza, etc.) o con la enseñanza de contenidos psicopedagógicos generales; en ningún caso, los participantes han realizado Prácticas de Enseñanza.

El número de futuros profesores que cursaron cada asignatura varía desde 37 hasta 50, la mayoría de ellos mujeres y con una edad de entre 18 y 25 años.

Normalmente han cumplimentado estudios de Bachillerato antes de acceder a la universidad, sin que predomine ninguna de las especialidades (ciencias, arte, tecnología o humanidades). Estos estudiantes se organizaron en equipos de entre 4 y 6 miembros, formándose entre 9 y 10 equipos en cada contexto.

Se toma como unidad informativa los equipos y el trabajo desarollado por ellos. El papel del trabajo colaborativo y la elaboración del conocimiento compartido, como piezas claves del desarrollo profesional, son referentes teóricos que justifican esta elección (TILLEMA, 2000; WATTERS; GINNS, 2000; OSBORNE; COLLINS, 2001; TILLEMA; VAN DER WESTHUIZEN, 2006; ZELLERMAYER; TABAK, 2006).

La muestra seleccionada como objeto de estudio está constituida por 5 casos (A, B, C, D y E), correspondientes a un equipo de cada contexto en que se desarrolló el curso CAIC. Los equipos que constituyen la

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muestra se escogieron al azar de entre todos los equipos formados en cada contexto. En el CUADRO 3 se detallan las características de esta muestra.

CUADRO 3Muestra

Caso

A

B

C

D

E

Temática

Lareproducción

humana

Los animales

Ácidos y bases

La Tierra y elUniverso

Los polígonos

Universidad

UniversidadComplutense

deMadrid (España)

Universidad de Sevilla (España)

Centro Universitario-

UNIVATES (Lajeado, Brasil)

Universidad de Sevilla (España)

Universidad de Cádiz (España)

Estudios(Program)

Diplomadoen Maestro de

Primaria

Diplomadoen Maestro

de EducaciónEspecial

Licenciatura enProfesor de

Ciencias

Diplomadoen Maestro de

Primaria

Diplomadoen Maestro de

Primaria

Asignatura(Course)

Concepciones de los alumnos sobre la ciencia(Optativa. 40

horas.1º curso, 2º semestre)

Didáctica Del área de

Conocimiento del Medio

(Obligatoria. 50horas. 1º curso,

2º semestre)

Laboratorio deEnseñanza de

Ciencias I(Obligatoria. 40horas. 1º curso,

2ºsemestre)

Ciencias de laNaturaleza

y suDidáctica

(Obligatoria. 80horas. 2º curso,

1º semestre)

Desarrollo delpensamientomatemático

y suDidáctica

(Obligatoria. 60horas. 1º curso,

1º semestre)

Nº dealumnos/equipos

37 estudiantes(9 equipos)

57 estudiantes(10 equipos)

40 estudiantes(10 equipos)

53 estudiantes(9 equipos)

52 estudiantes(9 equipos)

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3.3 Instrumentos y técnicas de análisis

Los datos se obtuvieron en los tres momentos del curso mencionados anteriormente: inicial (al elaborar las primeras concepciones sobre el problema), intermedio (al someterlas a contraste) y final (al re-elaborarlas de manera argumentada). Los instrumentos de recogida de información fueron algunos de los documentos producidos por los equipos de la clase, y que se recogen en el CUADRO 4.

CUADRO 4Instrumentos de recogida de información

M. Inicial

Primera propuesta de la secuencia de

actividades(Documento 10)

M. Intermedio

Guión de reflexión sobre cómo enseñar

(Documento 11)

M. final

Segunda propuesta de la secuencia de

actividades(Documento 12)

Instrumentos

Los documentos 10 y 12 son producciones libres, en las que la reflexión en torno al problema es totalmente abierta, sin restricciones de ningún tipo (Actividades 10 y 12). El documento 11 es un guión de reflexión que actúa como cuestionario de preguntas abiertas que dirigen la discusión y la toma de decisiones en los equipos (Actividad 11). Las argumentaciones presentadas en estos documentos no sólo organizan el aprendizaje de los grupos sino que nos dan claves para comprender sus concepciones y su posible evolución. Los documentos 10, 11 y 12 se pueden ver en el anexo 2.

La información obtenida fue convertida en unidades de información y codificada según la categoría (1, 2, 3), el caso/equipo (A, B, C, D, E), el documento (10, 11, 12) y el número de orden de aparición en el documento. Para el tratamiento de estos datos se ha seguido el siguiente procedimiento:a) identificación de Unidades de Información Significativas (UIS) en las producciones escritas;

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b) codificación y clasificación de las mismas en la categoría correspondiente. Elaboración de Proposiciones de Síntesis (PS) a partir de las diferentes UIS para cada categoría, momento formativo y caso, con un bajo nivel de inferencia;c) validación de las categorizaciones y de la elaboración de proposiciones a través de un proceso de triangulación en el que cada caso fue revisado independientemente por un mínimo de dos participantes en la investigación. Hubo un índice de concordancia de más del 90% en todos los casos. Las divergencias fueron analizadas separadamente por todo el equipo de investigación buscando un consenso y, cuando esto no fue posible, se adoptó la posición mayoritaria.

El análisis y la discusión de los datos se ha realizado siguiendo los pasos que se describen a continuación:a) ubicación de las PS en los niveles de progresión previstos (N1, N2 y N3). Este proceso puso en evidencia la necesidad de definir niveles intermedios (N01 y N12) para recoger mejor la diversidad presente en los datos;b) teniendo en cuenta lo anterior, presentación del Itinerario de Progresión identificado para cada caso y categoría;c) en cada categoría, formulación y análisis de los obstáculos que están presentes en la muestra y su relación con las actividades formativas;d) por último, integrando los niveles definidos en cada categoría, elaboración de los Niveles Generales de Progresión sobre la metodología y los Obstáculos Generales asociados.

Un ejemplo de una parte sustancial de todo este procedimiento de tratamiento y análisis de los datos puede verse en el CUADRO 5.

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Unidades de InformaciónSignificativas (UIS)

(En la primera versión del plan de actividades) no hay

nada que explique el orden pues la secuencia ha salido al

azar, sin ningún criterio.

(El modelo metodológico que defendemos en estos

momentos es:) 1. Problema. 2. Ideas previas. 3. Nuevas

informaciones. 4Actividades (motivación,

aplicación, intervención en el medio). 5. Actividades de

refuerzo.

Debemos partir del planteamiento de un

problema que esté dentro del contexto cotidiano de los

niños, es decir, que les resulte familiar. Una vez establecido el problema, podemos ver que

ideas tienen losalumnos sobre el mismo y,

poco a poco, irnos acercando más a ellos. Gracias a estas ideas previas nos

será más fácil seleccionar las informaciones que

debemos darles, para que les sea más fácil relacionar

ambas. Como siguiente punto creemos conveniente

Proposición deSíntesis (PS)

En nuestra primera versión del plan de

actividades no hay nada que explique el orden, la secuencia se ha diseñado

al azar, sin ningún criterio. No se tuvieron

en cuenta las ideas de los alumnos, ni se plantearon problemas, ni se siguió un orden en el planteamiento

de la metodología, sólo se elaboraron ejercicios

prácticos.Se deben introducir

cambios para mejorarla: plantear problemas y averiguar las ideas de

los alumnos para poder facilitar que los alumnos relacionen dichas ideas con lo que le queremos

enseñar.La secuencia

metodológica que en estos momentos consideramos

adecuada es:

1. Planteamiento de un problema del contexto cotidiano de los niños, que les resulte familiar.

2. Ideas previas. Podemos ver qué ideas tienen los

Nivel

La secuencia metodológica

tiene relación con las ideas de los

alumnos y pretende, de manera más o menos explícita,

ampliarlas, corregirlas y

sustituirlas por el conocimiento

verdadero.

(Nivel 2)

CUADRO 5Procedimiento de tratamiento y análisis de los datos

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programar actividades tanto de motivación, como de

aplicación y de intervención en el medio. Con ellas

evaluaremos a los alumnos para ver si han entendido lo que les hemos explicado anteriormente. Si se hacen

las actividades y hay algunos alumnos que no se han

enterado, debemos de poner más actividades de refuerzo.

No tiene coherencia (nuestro nuevo plan de enseñanza

respecto a la primera versión), puesto que en la primera versión ni hemos

tenido en cuenta las ideas de los alumnos ni hemos seguido un orden en el planteamiento

de la metodología, sólo habíamos elaborado ejercicios

prácticos.

(Con respecto a nuestra primera versión) un primer

cambio (que debemos hacer), es que en la primera versión no hemos tenido en cuenta el planteamiento de problemas, ni averiguar sus

ideas previas.

alumnos y poco a poco irnos acercando más a

ellos.3. Nueva información que,

gracias a los anteriores pasos, nos será

más fácil decidirla. Por la misma razón, a los

alumnos les será más fácil relacionarla con sus ideas.

4. Actividades prácticas de motivación, aplicación e

intervención en el medio. Con ellas se evaluará si los alumnos han entendido lo explicado anteriormente.

5. Actividades de refuerzo para los alumnos que lo

necesiten.

Como vemos en este ejemplo, hemos identificado cinco UIS (todas ellas procedentes del documento 11 de uno de los equipos) y desde ellas elaboramos la PS correspondiente a una de las categorías (criterio de organización de las actividades) en uno de los momentos del curso (intermedio).

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4 Resultados y discusión

En la categoría “Criterio de organización de las actividades” no se da la progresión que esperábamos del nivel N1 al nivel N2 (ver Figura 1). De hecho, sólo uno de los equipos (caso A) organiza, en el momento inicial, la secuencia metodológica en función de la lógica de los contenidos y con el objeto de facilitar su transmisión a los alumnos. El caso E parte de una situación parecida (N12), pues el eje organizador de la secuencia también son los contenidos pero pretendiendo que los alumnos los descubran por sí mismos. El resto de los equipos (B, C y D) parten de niveles que hemos considerado más simples, pues no organizan con ningún criterio las actividades propuestas (N01), o más complejos, que organiza la secuencia en función de las ideas de los alumnos. Como en la categoría anterior, los datos iniciales nos han permitido definir dos niveles nuevos que no aparecían en el itinerario de progresión previsto (N01 y N12).

CUADRO 6Criterio de organización de las actividades

La secuencia metodológica tiene

relación con las ideas de los alumnos y

pretende favorecer su evolución a través de

procesos de investigación (planteamiento de

problemas, formulación de hipótesis, contraste

con otras informaciones, establecimiento de

conclusiones y reflexión sobre lo aprendido). Los contenidos se consideran

como herramientas para abordar dichos

problemas.

N3

AntesNiveles detectados Durante

E A

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La secuencia metodológica tiene relación con las ideas de los alumnos y pretende,

de manera más o menos explícita, ampliarlas,

corregirlas y sustituirlas por el conocimiento verdadero.

La secuencia metodológica viene determinada por la lógica de los contenidos y persigue ampliar las ideas de los alumnos, corregir los errores conceptuales

y sustituirlos por el conocimiento verdadero.

La secuencia metodológica viene determinada por la lógica de los contenidos y pretende su transmisión a

los alumnos.

N2

N12

N1

Antes

D

E

A

Durante

D B C

Niveles detectados

Veamos las progresiones detectadas. Entre el momento inicial y el intermedio, los equipos A y E experimentan una evolución muy importante, pues pasan de organizar la secuencia en función de los contenidos a organizarla para favorecer la evolución de las ideas de los alumnos mediante procesos de investigación (N3). Sin embargo, en el momento final estos dos equipos experimentan una regresión, como ocurrió en la categoría anterior, desde el nivel 3 hasta el nivel 2. La secuencia de actividades propuesta finalmente pretende sustituir las ideas iniciales de los alumnos por las consideradas correctas por el profesor, como se observa, por ejemplo, en la secuencia diseñada por el equipo A:

Caso A:

El orden [de las situaciones propuestas en el plan de enseñanza] es: primero hacer la distinción entre aparato reproductor masculino y

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femenino, utilizando el busto desmontable. Segundo, explicación de las funciones de cada órgano mediante el busto, películas y comparación con objetos de la vida cotidiana. Tercero, explicación del concepto de fecundación mediante esquema o comparación con animales. (Momento inicial; Documento 10)

El nuevo plan de enseñanza debe estar constituido por: Actividades de motivación: ofrecer al niño propuestas de investigación sobre algo cercano a él.

Actividades de puesta en común: con el resto de los compañeros sobre el tema de investigación (así intercambian ideas previas con sus compañeros).

Actividades experimentales: a partir de las cuales se acercan a la realidad.

Actividades de explicación del profesor: enlazan los conocimientos previos con los nuevos, poniendo en relación todo lo realizado desde que comenzó la actividad de motivación, las ideas que aportan los alumnos en el debate y demostrándoles lo que han aprendido a través de su investigación, sugiriéndoles ideas, etc.

Actividades de aplicación de lo aprendido: realizar ejercicios de aplicación que, además, sirvan para comparar las ideas que tenían antes y las que han elaborado a lo largo de todo el proceso.

Actividades de puestas en común: para que comparen lo que han aprendido entre sí, que aporten y que lleguen a una conclusión que responda a la actividad de partida y también que puedan justificar si les ha servido de algo el proceso. (Momento intermedio; Documento 11)1º Se pregunta a los alumnos “¿Sabéis lo que pasa entre dos adultos cuando quieren tener hijos?”. Se pide que cada grupo (de 3 alumnos) llegue a una conclusión, teniendo en cuenta lo que saben o han escuchado fuera de clase. Se hace una puesta en común en forma de debate. El profesor actúa de observador y modificador apuntando en la pizarra las posibles respuestas. Al finalizar el debate, el profesor anunciará a los alumnos que las conclusiones iniciales quedarán en un mural que se colgará en la pared del aula, para revisarlas al terminar el tema de la reproducción.

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2º Se les propone que, en grupos de 3, hagan una encuesta para investigar las causas por las que se tienen hijos. Cuestión: ¿Por qué nace un bebé? Esta encuesta la aplicarán a familiares, vecinos, etc... 3º Cuando los alumnos hayan realizado sus encuestas, se les pedirá que recopilen la información en forma de gráfico de barras. Se procederá a realizarlo en grupos de 3 (como inicialmente)… 4º. Tras reconocer que en la reproducción intervienen 2 sexos, trataremos de que los alumnos identifiquen las diferencias entre ellos. Para eso acudimos al laboratorio y les ofrecemos bustos de los diferentes órganos sexuales, para que la manipulación ayude a la interiorización del contenido a enseñar. Se les dará un tiempo aproximado de 10 minutos para que, de forma libre y espontánea, observen las diferencias… 5º. Ya en el aula se procederá a trabajar en grupo (de 3 en 3, los iniciales). El profesor ofrecerá a los alumnos los diferentes órganos (masculino y femenino) en forma de recortables. Trabajarán con ellos pintándolos y construyendo un mural de cada uno de los aparatos (en cada cartulina ya estaba dibujada la silueta). El profesor se prestará a dar las informaciones y aclaraciones que sean necesarias a los alumnos, así como a resolver dudas, solucionar conflictos, etc., siempre y cuando sean los alumnos quienes pidan la ayuda. (Momento final; Documento 12)

Como podemos observar, este equipo proponía en el momento intermedio una secuencia de actividades basada en la investigación de los alumnos, a lo largo de la cual podían acercarse a la realidad, enlazar los conocimientos nuevos con los previos, comparar lo que han aprendido entre sí,… etc. Sin embargo, en la secuencia diseñada en el momento final, se observa que los futuros profesores dan un valor significativo a constatar las ideas correctas de los alumnos.

Los equipos B y C, que en el momento inicial no siguen ningún criterio para organizar las actividades (no hay nada que explique el orden pues la secuencia que diseñamos salió al azar, sin ningún criterio; sólo nos hemos basado en proponer muchas actividades prácticas, porque son actividades que a los niños les gustan mucho; caso B, Documento 11), en el momento intermedio proponen organizar la secuencia de actividades en función de las ideas de los alumnos. Ambos equipos comparten también, de manera más o

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menos explícita, que la finalidad de esta secuencia es sustituir las ideas de los alumnos por el conocimiento verdadero (N2).

Caso C:

Nuestro modelo metodológico en este momento es: - Ideas previas: conocimiento existente del contenido que va a ser estudiado; - Explicar los errores: corregir ideas distorsionadas, incrementar el conocimiento, comprender los contenidos con debates y prácticas; - Test: verificar si ha habido crecimiento en el contenido tratado. (Momento intermedio; Documento 11)

Por último, el equipo D se ha mantenido en el mismo nivel en los momentos inicial, intermedio y final, precisamente el que considerábamos que era posible alcanzar al final del proceso formativo (N2). Desde el inicio, su propuesta está ya más centrada en los alumnos que en el profesor, pues su secuencia metodológica toma como eje las ideas de los alumnos. Como ellos mismos declaran en el momento intermedio, esta consideración de las ideas de los alumnos se hace para poder corregirlas.

Caso D:

Vamos a desarrollar nuestra unidad didáctica a través de una serie de preguntas/problemas o proyectos, en los cuales vamos a seguir siempre los mismos pasos: 1) Se lanza la pregunta/problema o proyecto y se reune a los alumnos en grupo para que hagan una puesta en común sobre el tema sin consultar nada. 2) Se va poniendo en la pizarra las opiniones de todos los grupos y una vez terminado, el profesor, mediante nuevas cuestiones, hará reflexionar a los alumnos sobre aquellas cosas que falten o estén mal planteadas. 3) Se dará tiempo a los niños para que investigen por su cuenta, consultando libros u otros recursos, o preguntando a sus mayores. 4) En clase volverá a hacer una puesta en común sobre lo investigado por cada niño y así tendremos todos los contenidos que queremos trabajar. 5) Por último, se hará una actividad para poner en práctica todo lo aprendido y que será la única que difiera en el desarrollo

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de una pregunta/problema o proyecto respecto a otra (Momento inicial; Documento 10)

En la primera versión del plan de enseñanza el orden de las actividades viene condicionado por: las ideas de los alumnos, en el sentido de que, grosso modo, se sigue una secuencia del tipo: conocer las ideas de los alumnos, dar información para corregir los errores y vacíos detectados y comprobar si las ideas han cambiado.

El modelo metodológico que hemos hecho ahora es prácticamente el mismo que el de la primera versión, la única diferencia es que una de las actividades finales no está encuadrada en una pregunta o proyecto concreto, sino que es general para todo el temario. (Momento intermedio; Documento 11)

Trabajo con el primer problema: 1. Se lanza la siguiente pregunta: ¿Siempre ha sido igual el universo? Los alumnos se reúnen en grupo para hacer una puesta en común sobre el tema sin consultar nada. 2. Se van poniendo en la pizarra las opiniones de todos los grupos y, una vez terminado, el profesor, mediante cuestiones, hace reflexionar a los alumnos sobre aquellas cosas que falten o estén mal planteadas. 3. Se da tiempo a los niños para que investiguen por su cuenta, consultando libros, otros recursos o preguntando a sus mayores. 4. En clase se vuelve a hacer una nueva puesta en común sobre lo investigado y así tendremos todos los contenidos que queremos trabajar. 5. Se hace también una actividad final para aplicar todo lo aprendido: hacemos un debate sobre este asunto.

Trabajo con el segundo problema: 1. Se lanza la siguiente pregunta: ¿Qué hay en el universo? Los alumnos se reúnen en grupo para hacer una puesta en común sobre el tema sin consultar nada. 2. Se van poniendo en la pizarra las opiniones de todos los grupos y, una vez terminado, el profesor, mediante cuestiones, hace reflexionar a los alumnos sobre aquellas cosas que falten o estén mal planteadas. 3. Se da tiempo a los niños para que investiguen por su cuenta, consultando libros, otros recursos o preguntando a sus mayores. 4. En clase se vuelve a hacer una nueva puesta en común sobre lo investigado y así tendremos todos los contenidos que queremos trabajar. 5. Se hace también una actividad final para aplicar todo lo aprendido: reunir a los niños una noche en el patio

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del colegio para observar el cielo. (…). (Momento final; Documento 12)Como vemos, aunque este equipo incorpora elementos importantes

de una metodología basada en la investigación de los alumnos –planteamiento de preguntas, formulación de hipótesis, contraste con otras informaciones, etc.-, cree que la búsqueda de información que se propone a los alumnos será tan fructífera que les permitirá aprender todos los contenidos que queremos trabajar.

En definitiva, podemos decir que, salvo en un caso, en el que no se detectan cambios, existe progresión entre el momento inicial y final. Las progresiones identificadas son de cierta relevancia, pues se ha pasado, en general, de una secuencia metodológica desorganizada u organizada en función de los contenidos, a una secuencia metodológica organizada en función de las ideas de los alumnos. Las distintas situaciones que se han dado a lo largo del proceso (progresiones, no cambio, regresiones) han reagrupado a los equipos en un mismo nivel (N2), precisamente el nivel que considerábamos posible.

Parece, pues, confirmarse nuestra impresión de que aunque se le dé importancia a los alumnos y se adopten metodologías que tenga como eje sus ideas, es bastante difícil asumir que dichas ideas pueden cambiar y que los alumnos pueden elaborar significados intermedios entre sus puntos de partida y las nuevas informaciones. Esto está relacionado, a nuestro entender, con dos obstáculos importantes, uno de carácter didáctico y otro más profundo de naturaleza epistemológica. El primero tiene que ver con la idea de que la enseñanza es la causa directa del aprendizaje, por lo que se espera que los alumnos aprendan fielmente lo que se les enseña, sin interferencia de sus ideas. El segundo, el absolutismo epistemológico, según el cual el conocimiento científico es un conocimiento verdadero y superior y, en consecuencia, el que los alumnos deben exactamente aprender.

Algunos estudios han detectado resultados similares a los nuestros. En el estudio que ya hemos mencionado de Yerrick, Parke y Nugent (1997), los participantes consideraban a los estudiantes como los receptores del conocimiento y con poca influencia en las decisiones acerca de qué y cómo enseñar. Estas visiones se modificaron tras el

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proceso formativo de manera que, al rediseñar sus lecciones de ciencia, los profesores consideraron las concepciones de los estudiantes como un elemento importante a tener en cuenta, pero sin renunciar a la idea de que existe un conjunto predeterminado de ideas verdaderas que son las que se deben enseñar y, por tanto, aprender.

Meyer et al. (1999) describen, en forma de estudio de caso, las concepciones y prácticas de tres maestros de Primaria en formación en un curso de ciencias basado en el cambio conceptual. Como en nuestro estudio, una de las maestras participantes, Karen, experimenta algunos cambios en sus concepciones sobre las ideas de los estudiantes, y sobre su papel activo en la construcción de conocimientos, pero no reconoce que el resultado final del aprendizaje pueda ser una mezcla de dichas ideas y de las nuevas, sino que espera que los alumnos las cambien por los conocimientos científicos adecuados, mediante las actividades propuestas.

En el estudio de Lemberger et al. (1999) se analiza el cambio de las concepciones de tres futuros profesores de Biología de Secundaria cuando participan en un curso basado en el cambio conceptual. Al inicio, la visión que compartían sobre la enseñanza era básicamente transmisiva y organizada en función de la lógica de los contenidos. A lo largo del curso pasaron a planteamientos más centrados en el estudiante. Todos prestaron atención a detectar las ideas previas de los alumnos, aunque luego no las tuvieron en cuenta; en este estudio el afloramiento de las ideas de los alumnos juega más bien un papel afectivo, con la intención de crear un ambiente de aula agradable. En los casos estudiados por nosotros, la detección de ideas de los alumnos ha tenido más bien el papel de detectar vacíos, errores, e ideas incompletas.

Sin embargo, en otros estudios los resultados son diferentes a los nuestros. En algunas investigaciones no se detectan apenas cambios en las secuencias de actividades que proponen los profesores tras determinados procesos formativos (GUSTAFSON; ROWELL, 1995). En otras, como la de Lauriala (1998), que estudia el cambio de las concepciones de profesores en un programa de formación basado en la asistencia a clases de colegas con visiones constructivistas, los profesores declaran al final que el aprendizaje de los estudiantes es diverso y que no siempre coincide

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con el predeterminado. Igualmente, en el estudio de Crawford (1999), una futura maestra experimenta cambios muy importantes diseñando y desarrollando en las Prácticas de Enseñanza secuencias de actividades como las que conforman nuestro nivel 3 (nivel teórico de referencia). Es destacable que en estos casos está presente un elemento que nosotros no hemos podido incluir en el curso CAIC, dadas las características organizativas de la Formación Inicial en nuestros contextos: la interacción con la práctica de aula.

5 Conclusiones

Podemos concluir diferenciando cuatro Niveles Generales en relación a la metodología, que se pueden ordenar en un Itinerario General de Progresión. Dichos niveles son:a) Nivel General de INTUICIÓN (N01), que no esperábamos encontrar. En él, la metodología no responde a un modelo articulado y las situaciones de enseñanza que se proponen no se ordenan lógicamente. El equipo C, en el momento inicial, es un claro ejemplo de este nivel. El obstáculo que subyace es que parece que no es necesaria una determinada metodología para poder enseñar. Se trata de un obstáculo que aparece en nuestra muestra únicamente en el momento inicial, afectando de manera desigual a cuatro de los cinco equipos analizados. La actividad formativa que ha podido tener más influencia para su superación es la Actividad 11, en la que se somete a análisis y contraste crítico las propuestas iniciales de los equipos; b) Nivel General de TRANSMISIÓN (N1 y N12). En él, la lógica metodológica es subsidiaria de la lógica de los contenidos que se quieren transmitir. El obstáculo que subyace es la creencia de que los alumnos y sus ideas no influyen en la metodología. Este obstáculo está presente en los momentos iniciales e intermedio de nuestro estudio, pero afecta a pocos casos y no en todas las categorías. Las actividades formativas que han podido influir más en su superación son las relacionadas con la lectura y el análisis de ejemplos de metodologías innovadoras (lectura de artículos y observación de vídeos sobre experiencias alternativas basadas en la

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investigación de los alumnos), así como el diseño del plan de enseñanza definitivo (Actividades 11 y 12); c) Nivel General de SUSTITUCIÓN (N2). Es el que considerábamos posible alcanzar y en el que, efectivamente, se sitúan todos los casos al final del curso. Este modelo está más centrado en el alumno que en el profesor, aunque sin renunciar a que hay un saber predeterminado que hay que aprender. La metodología de enseñanza responde a una lógica basada en la detección de las ideas de los alumnos y en su ampliación o/y sustitución por el conocimiento verdadero. El obstáculo que subyace es entender que la enseñanza es la causa directa del aprendizaje. En un ámbito más profundo, está influyendo el absolutismo epistemológico. Estos obstáculos están presentes en la muestra estudiada durante todos los momentos (inicial, intermedio y final); son los que no hemos podido “sortear” con nuestra propuesta formativa. La presencia de estos obstáculos parece impedir que se opte por metodologías que faciliten la construcción de conocimientos genuinos y negociados por los alumnos. Seguramente para incidir sobre ellos es necesario participar en más ocasiones en cursos de similares características al que hemos desarrollado, o en propuestas formativas que permitan el desarrollo del diseño realizado y la reflexión sobre ello, o la participación en clases de colegas innovadores y constructivistas (GUSTAFSON; ROWELL, 1995; LAURIALA, 1998); d) Nivel General de INVESTIGACIÓN (N3), es el nivel teórico de referencia. En él, la metodología de enseñanza responde a una lógica basada en la investigación de problemas relevantes para favorecer la evolución de las ideas de los alumnos. Dichas ideas se consideran el eje del proceso de enseñanza-aprendizaje. Dos de los cinco equipos analizados se han aproximado a este modelo en el momento intermedio, aunque sin consolidarse en él.

Este Itinerario de Progresión General puede representarse en forma de una escalera en la que podemos visualizar los cuatro Niveles Generales formulados, los Obstáculos Generales que dificultan la progresión de unos a otros y las Actividades Formativas que parecen ayudar a la progresión (Figura 2).

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CUADRO 7Criterio de organización de las actividades

La secuencia metodológica tiene relación con las ideas de los

alumnos y pretende favorecer su evolución a través de procesos de investigación (planteamiento de

problemas, formulación de hipótesis, contraste con otras informaciones, establecimiento de conclusiones y reflexión sobre lo aprendido). Los

contenidos se consideran como herramientas para abordar dichos

problemas.

La secuencia metodológica tiene relación con las ideas de los alumnos

y pretende, de manera más o menos explícita, ampliarlas, corregirlas y

sustituirlas por elconocimiento verdadero.

La secuencia metodológica viene determinada por la lógica de los

contenidos y persigue ampliar las ideas de los alumnos, corregir los

erroresconceptuales y sustituirlos por el

conocimiento verdadero.

La secuencia metodológica viene determinada por la lógica de los

contenidos y pretende su transmisión a los alumnos.

La secuencia metodológicaes aditiva.

N3

N2

N12

N1

N01

Niveles detectados DespuésAntes Durante

E

A

D

B

C

D

B

C

D

E

A

B

C

E

A

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6 Implicaciones formativas

Los datos obtenidos confirman la idea de que el cambio en las ideas y en las prácticas del profesorado es un proceso que se produce de forma lenta y con grandes dificultades. La formación de profesores no puede pretender sustituir las ideas iniciales del profesorado por aquellas otras que la investigación educativa considera más adecuadas, sino que debe adoptar enfoques progresivos y constructivistas, tal como se propone para la formación del alumnado (DUIT; TREAGUST, 2003).

En relación con lo anterior, coincidimos con Flores, Gallegos & Baroja (2000) en que es necesario moderar las expectativas de cambio en las actividades formativas y procurar transiciones progresivas, que supongan avances bien consolidados en las concepciones y prácticas de los profesores, construídos por ellos mismos, y no saltos en el vacío con pocas posibilidades de mantenerse en el tiempo.

Organizar el currículo de la formación de profesores en torno a problemas prácticos profesionales da sentido a la formación. El hecho de trabajar sobre situaciones vinculadas con la práctica futura, y reflexionar sobre como abordarlas, permite a los futuros profesores ponerse en la situación del docente y tomar decisiones, reflexionando sobre cuáles son las más adecuadas y por qué. Problematizar, por tanto, estas situaciones les hace avanzar desde sus planteamientos iniciales hacia concepciones más elaboradas.

Es imprescindible que los futuros profesores contrasten sus propias visiones con prácticas alternativas y no sólo con informaciones teóricas (DUIT; TREAGUST, 2003). No podemos olvidar que los únicos referentes prácticos directos que poseen los estudiantes son aquellos que han vivido como alumnos, es la única práctica educativa que conocen y en ella se basan, aún sin ser conscientes, para diseñar y desarrollar su enseñanza. Este referente no es contrastable con ideas teóricas generales, sino con otros de la misma naturaleza, de carácter alternativo.

Los futuros profesores necesitan experimentar sus nuevas ideas y reflexionar sobre dicha experimentación para poder ir consolidando los cambios (WATTS; JOFILI, 1998). Las reflexiones sobre el diseño de la

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práctica, que es una de las estrategias dominantes en los programas de formación, tienen influencia en las ideas de los futuros profesores, como hemos visto en nuestro estudio. Pero si esta reflexión está vinculada a la inmersión en la práctica y permite el intercambio directo con ella, creemos que es la manera más prometedora de provocar desarrollo profesional auténtico (TILLEMA, 2000; ZEMBAL-SAUL; KRAJCIK; BLUMENFELD, 2002; RUSSELL; MARTIN, 2007). Tener la oportunidad de tender un puente entre teoría y práctica es crítico para provocar el cambio en las creencias y las acciones de los futuros profesores. En esa línea, Tillema (2000) comenta que los procesos de reflexión sobre las prácticas de enseñanza y sobre las creencias que los profesores en formación activan durante las mismas, son uno de los instrumentos fundamentales para provocar un cambio o evolución estable en sus ideas. Estos procesos permiten poner en cuestión las ideas interiorizadas durante su experiencia como alumnos y construir nuevos referentes en sus prácticas como profesores.

Por último, consideramos que es necesario que los profesores desarrollen un conocimiento profesionalizado sobre la metodología de enseñanza, que les permita generar contextos de auténtico aprendizaje (y no situaciones en las que se simula que se enseña y que se aprende).

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The progression of conceptions of prospective teachers primary on teaching methodology

Abstract

This article describes the evolution of prospective primary teachers’ conceptions of the methodology of teaching. Three categories were analyzed: the concept of activity, the organization of activities, and the concept of teaching resources, but in this paper only show the organization of activities. The study was conducted with five teams of prospective teachers, who were participating in teacher education courses of a constructivist orientation. The results showed very different itineraries in the processes of change, and the presence of two major obstacles—the belief that teaching is the direct cause of learning, and epistemological absolutism. The study allows us to deduce some implications for initial teacher education.

Keywords: pre-service teacher education; professional knowledge; methodological strategies; organization activities.

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Recebido: 17/07/11Aprovado: 26/09/11

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Normas para publicação

Linha editorial A revista Educação em Foco é um periódico científico semestral, com o objetivo de publicar artigos, a partir de reflexões sobre a educação em diálogo com outros campos do saber, sobretudo aqueles ligados à escola pública. Educação em Foco é a revista do Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade do Estado de Minas Gerais, editada com o apoio do Centro de Comunicação da FaE/UEMG.As propostas para publicação devem ser originais, não tendo sido publicadas em qualquer outro veículo do país e devem ser classificadas em uma das seguintes modalidades: • Ensaios: estudos teóricos, com análises de conceitos;• Resultados de pesquisa: texto baseado em dados de pesquisa;• Estudos bibliograficos: análise crítica e abrangente da literatura sobre tema definido.Todos os números são divulgados por meios digitais, estando disponíveis online pelo endereço: <http://www.uemg.br/openjournal/index.php/educacaoemfoco. A publicação também é disponibilizada em versão impressa (ISSN 1519-3322).

Processo de avaliação dos artigosOs artigos recebidos serão apreciados inicialmente pelo Conselho Editorial e os que estiverem de acordo com as normas da revista Educação em Foco serão encaminhados aos membros do Conselho Cientifico ou para pesquisadores de diferentes instituições de ensino e pesquisa, por eles indicados como pareceristas ad hoc, em função da competência no tema/assunto do artigo avaliado, garantindo-se o processo duplo cego.Após o processo de avaliação, os autores são notificados. Os artigos aprovados incondicionalmente são diretamente enviados para publicação.Caso o texto dependa de modificações, as alterações propostas são enviadas aos autores, que decidem se concordam em empreendê-las, de acordo com as sugestões do conselheiro ou parecerista ad hoc, no prazo a ser definido pelo editor. As modificações introduzidas no texto deverão ser grifadas para efeito de verificação pelo editor.

Apresentação dos trabalhos Ao enviar o artigo para a revista, o autor compromete-se a não encaminha-lo para outro(s) veículo(s) de publicação pelo prazo de seis meses, a contar da data do envio.As propostas devem ser submetidas via internet, pelo endereço: http://www.uemg.br/openjournal/index.php/educacaoemfocoAceitam-se artigos em português e espanhol.Os artigos devem ser encaminhados em arquivo Microsoft Word ou compatível em formato doc, em fonte Times New Roman, tamanho 12, em páginas A4, com espaçamento 1,5 entre linhas. Margens: superior e esquerda de 3 cm; inferior e direita de 2 cm. Os artigos devem ter a extensão mínima de 15 e máxima de 20 páginas ou até 42.000 caracteres. O resumo deve ter no mínimo 100 e no máximo 150 palavras na mesma língua do trabalho e palavras-chave (no mínimo três e no máximo cinco). Após esse resumo, deve-se incluir

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também o abstract, acompanhado da tradução do título e das keywords.As notas de rodapé devem ser usadas somente quando estritamente necessário para algum esclarecimento. O texto deve ser sucinto, corpo 10, alinhado à esquerda com espaçamento simples. Elas devem ser apresentadas em algarismos arábicos, com numeração única e consecutiva para todo o artigo.

IlustraçõesAs tabelas, quadros e gráficos devem ser inseridas no texto com títulos e legendas em acordo com a ABNT. As figuras devem ter seu lugar indicado no texto e ser enviadas também em anexos separados, em formato de arquivo JPG, cor cinza, 300 dpi. Devem ser nomeadas FIG. 1, FIG. 2, sucessivamente, podendo ainda ter um título sugestivo do seu conteúdo. Sempre com a indicação das fontes.

Citações As citações no texto devem utilizar o sistema autor-data e seguir as normas da ABNT para esse sistema. Em citações diretas ou literais o nome do autor fora de parênteses tem apenas a inicial maiúscula e dentro de parênteses, todas as letras maiúsculas (AUTOR, data, página). Para citações até três linhas, usam-se aspas, sem itálico. Citações com mais de três linhas, são recuadas 4 cm da margem esquerda, fonte menor, espaçamento simples, sem aspas e sem itálico. Em citações indiretas, se o nome do autor estiver inserido no texto, usa-se apenas a inicial maiúscula com a data entre parênteses. Caso o nome do autor venha entre parênteses, todas as letras em maiúscula e a data, sem a necessidade de colocar a página. Ex:Na perspectiva de Arendt (1997), que a educação assuma seu caráter conservador é fundamental para que o mundo não se torne mortal como os mortais, para que o mundo continue e se renove a cada nova geração. Ou Que a educação assuma seu caráter conservador é fundamental para que o mundo não se torne mortal como os mortais, para que o mundo continue e se renove a cada nova geração (ARENDT, 1997).*Esse formato de citação vale também para o caso de depoimentos ou entrevistas. Em citação de citação, emprega-se a expressão latina apud (junto a) ou o equivalente em português “citado por”, para identificar a fonte secundária que foi efetivamente consultada. A referência da obra citada deve vir em nota de rodapé ou como parte da referência no final do texto.Ex:No texto:Um modelo de liderança bastante estudado e utilizado na década de 1960 foi o Grid Gerencial (BLAKE; MOUTON1, 1972 apud RONCHI, 2007).Em nota de rodapé1 BLKE, R. R.; MOUTON, J. S. A estruturação de uma empresa dinâmica através do desenvolvimento organizacional do tipo Grid. São Paulo: Edgard Blücher, 1972.Citações de diversos documentos de um mesmo autor e data devem ser distinguidos pelo

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acréscimo de letras minúsculas em ordem alfabética após a data. Essas letras devem constar também nas referências.Ex:Vygotsky (1998a)Vygotsky (1998b)ou(VYGOTSKY, 1998a, p. 55)(VYGOTSKY 1998b, p. 37)

ReferênciasAs referências bibliográficas devem seguir as normas da ABNT para esse sistema (NBR 6023). Elas devem ser listadas no final do artigo, alinhadas somente à margem esquerda, identificando-se individualmente cada documento em espaço simples, separados uns dos outros por dois espaços simples.

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- Livro eletrônicoROSÁRIO, A. B.; KYRILLOS NETO, F.; MOREIRA, J. DE O. (Orgs.). Faces da violência na contemporaneidade: sociedade e clínica. Barbacena: EdUEMG, 2011. Disponível em: <http://intranet.uemg.br/comunicacao/arquivos/PubLocal172P20120518123259.pdf>. Acesso em: 2 out. 2011

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Teses, dissertações e monografiasALMEIDA, L. C. Curso de pedagogia na Unicamp: marcas de formação. 2008. 199 f. Dissertação (mestrado em Educação) - Faculdade de Educação, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2008.

Trabalhos apresentados em congressoFRANCO, M. A. S. Saberes pedagógicos e prática docente. In: ENDIPE: EDUCAÇÃO FORMAL E NÃO FORMAL, PROCESSOS FORMATIVOS E SABERES PEDAGÓGICOS, 13. , 2006, Recife. Anais... Recife: Edições Bagaço, 2006. v. 1, p. 27-50.

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