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28 Revista Linha Direta IRIDESCÊNCIA Asa da borboleta A superfície da asa de uma borboleta é uma estrutura de partículas sem pigmento. Enxerga-se a cor devido a um padrão de refle- xão e refração nas diversas camadas nanométricas das partículas. capa EDUCAÇÃO EM NANOCIÊNCIA E NANOTECNOLOGIA Programa apresenta aos alunos conceitos e inovações que irão prepará-los para uma nova dimensão F enômenos que acontecem no dia a dia, como a facili- dade das lagartixas em subir paredes e andar no teto, a varie- dade de cores das borboletas e a capacidade da flor de lótus de não absorver líquidos, podem ser explicados através da nanociên- cia e da nanotecnologia. Esses conceitos, desconhecidos até há pouco tempo, aparecem como o suprassumo da evolução tecno- lógica atualmente, estando cada vez mais presentes no cotidiano das pessoas. Nano é um prefixo que vem do grego nannós e significa excessiva pequenez. Um único nanômetro (nm) corresponde a 10 -9 metros, ou seja, a bilionésima parte do metro. Então, a nanociência é o mundo do muito pequeno, do que acontece entre os átomos e as moléculas. Ela se refere espe- cificamente ao estudo de objetos que estão na gama de 10 a cen- tenas de nanômetros. Já a nano- tecnologia é a manipulação real, a aplicação e o uso de objetos de tamanho nanométrico. Pensado pela primeira vez em meados da década de 1970, o desenvolvimento da nanotecno- logia se deu de maneira lenta nas duas décadas seguintes, vindo a se intensificar no início dos anos 2000 e fazendo com que, hoje, a expressão “pensar pequeno” não possua o mesmo sentido de ou- tras épocas. Áreas como medicina, química e engenharia já contam com im- portantes contribuições dessas inovações. O setor industrial é outro que possui grande cam- po de atuação nanotecnológico, apresentando, ainda, grande po- tencial de crescimento para as próximas décadas. Programa educacional Pensando nesse horizonte de possibilidades que se abre diante do “nano mundo”, o Serviço So- Revista Linha Direta

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ADERÊNCIAMOLECULAR

Pata da lagartixaCada pata da lagartixa

possui cerca de 500 mil pelos de queratina com terminações

pontiagudas menores que 100nm de diâmetro. Essas nanoestruturas promovem a adesão do animal

em qualquer superfície, devido à força de atração

intermolecular.

IRIDESCÊNCIAAsa da borboleta

A superfície da asa de uma borboleta é uma

estrutura de partículas sem pigmento. Enxerga-se a cor

devido a um padrão de refle-xão e refração nas diversas

camadas nanométricas das partículas.

HIDROFOBIAEfeito lótus

A superfície nanoestru-turada da flor de lótus

permite que ela não apodreça na água porque a água não

molha a superfície da flor. O mesmo se dá com a asa da borboleta, que continua a voar na chuva, ou com o

inseto que parece andar sobre a água.

capa

EDUCAÇÃO EM NANOCIÊNCIA E NANOTECNOLOGIAPrograma apresenta aos alunos conceitos e inovações que irão prepará-los para uma nova dimensão

Fenômenos que acontecem no dia a dia, como a facili-dade das lagartixas em subir

paredes e andar no teto, a varie-dade de cores das borboletas e a capacidade da flor de lótus de não absorver líquidos, podem ser explicados através da nanociên-cia e da nanotecnologia. Esses conceitos, desconhecidos até há pouco tempo, aparecem como o suprassumo da evolução tecno-lógica atualmente, estando cada vez mais presentes no cotidiano das pessoas.

Nano é um prefixo que vem do grego nannós e significa excessiva pequenez. Um único nanômetro (nm) corresponde a 10-9 metros, ou seja, a bilionésima parte do metro. Então, a nanociência é o mundo do muito pequeno, do que acontece entre os átomos e as moléculas. Ela se refere espe-cificamente ao estudo de objetos que estão na gama de 10 a cen-tenas de nanômetros. Já a nano-tecnologia é a manipulação real,

a aplicação e o uso de objetos de tamanho nanométrico.

Pensado pela primeira vez em meados da década de 1970, o desenvolvimento da nanotecno-logia se deu de maneira lenta nas duas décadas seguintes, vindo a se intensificar no início dos anos 2000 e fazendo com que, hoje, a expressão “pensar pequeno” não possua o mesmo sentido de ou-tras épocas.

Áreas como medicina, química e engenharia já contam com im-portantes contribuições dessas inovações. O setor industrial é outro que possui grande cam-po de atuação nanotecnológico, apresentando, ainda, grande po-tencial de crescimento para as próximas décadas.

Programa educacional

Pensando nesse horizonte de possibilidades que se abre diante do “nano mundo”, o Serviço So-

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ADERÊNCIAMOLECULAR

Pata da lagartixaCada pata da lagartixa

possui cerca de 500 mil pelos de queratina com terminações

pontiagudas menores que 100nm de diâmetro. Essas nanoestruturas promovem a adesão do animal

em qualquer superfície, devido à força de atração

intermolecular.

IRIDESCÊNCIAAsa da borboleta

A superfície da asa de uma borboleta é uma

estrutura de partículas sem pigmento. Enxerga-se a cor

devido a um padrão de refle-xão e refração nas diversas

camadas nanométricas das partículas.

HIDROFOBIAEfeito lótus

A superfície nanoestru-turada da flor de lótus

permite que ela não apodreça na água porque a água não

molha a superfície da flor. O mesmo se dá com a asa da borboleta, que continua a voar na chuva, ou com o

inseto que parece andar sobre a água.

cial da Indústria (SESI) e o Servi-ço Nacional de Aprendizagem In-dustrial (SENAI) do Estado de São Paulo desenvolveram o Programa de Educação em Nanociência e Nanotecnologia, voltado para alu-nos dos ensinos fundamental e médio do SESI e dos cursos téc-nicos e tecnológicos do SENAI. O Programa tem como objetivo apresentar essas inovações aos estudantes e, consequentemen-te, prepará-los para trabalhar com uma nova dimensão.

Se nanociência e nanotecnologia são conceitos novos, a aplicabi-lidade deles está apenas engati-nhando. Responsável pelo Progra-ma, o diretor técnico do SENAI/SP, Ricardo Terra, explica que existe uma gama de possibilida-des de aplicação em diferentes campos industriais e comerciais e lembra que, no passado, tí-nhamos a tabela periódica, e as combinações dos elementos re-sultavam em novas moléculas. “Hoje, é possível criar moléculas não existentes, e isso traz inúme-ras e novas possibilidades para a ciência”, argumenta.

Segundo Terra, a compreensão desses conceitos dentro do univer-so educacional é permitida por-que não demanda muito aparato tecnológico. Porém, o diretor res-salta que, se existir um ambiente com esse aparato, permitindo que o aluno faça descobertas e viven-cie experiências, a aprendizagem será muito mais valiosa. “Existe

um provérbio oriental interessan-te que diz que saber e não fazer ainda não é saber.”

Nessa direção, a ideia do Progra-ma de Educação em Nanociência e Nanotecnologia do SESI/SENAI de São Paulo surgiu, há dois anos. Desde então, ele vem sendo pen-sado e desenvolvido, tendo co-meçado suas atividades no início de 2013. “Esse projeto nasceu com a visão, compartilhada por todos os envolvidos, que prega a necessidade de trabalharmos a ciência e a tecnologia em todos os níveis da educação, incluindo os ensinos fundamental e médio, e não apenas a educação profis-sional”, explica Terra, lembrando que o projeto se inspirou em ex-periências de outros países, atra-vés de prospecções realizadas pelo SENAI em feiras internacio-nais. “Vimos experiências nos Es-tados Unidos, na Alemanha, Suíça e França, e a partir daí criamos a nossa estratégia.”

Teoria e prática

Ricardo Terra ressalta que o Pro-grama desenvolvido pelo SESI/SE-NAI se inicia no ensino fundamen-tal e tem diferentes estratégias para cada ano. “Começamos com o nano esclarecimento e depois acompanhamos toda a evolução das ciências no currículo, sempre contemplando a visão da escala de 10-9, que é o primeiro conceito que precisa ser trabalhado.” O di-retor explica ainda que o homem

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conseguiu chegar a essa esca-la graças à evolução da ciência, da microscopia e da manufatura e que, daqui para a frente, ela estará cada vez mais presente em nossas vidas, principalmente através de produtos.

Para os mais novos, o primeiro passo é aprender os conceitos da nanociência, importantes para que eles entendam os fenôme-nos que acontecem no dia a dia e despertem o interesse por esses estudos. O conteúdo do Programa para o ensino fundamental está distribuído nas aulas de ciências e procura desenvolver os concei-tos de forma prática, chamando a atenção dos alunos para ques-tões científicas. “A estratégia é trabalhar o conteúdo através de exemplos. Explicar para a garota-da o porquê de a lagartixa ficar grudada no teto é importante para que eles entendam o fenô-

meno e tudo o que está associa-do ao processo. Assim, fica mais fácil compreender os efeitos da ciência em sua vida”, diz Terra. Além disso, com a estrutura que foi montada pelo Programa, o en-tendimento se torna ainda mais fácil. “Quando o professor for fa-lar, por exemplo, da flor de lótus e da questão da hidrofobia, ele terá todo um aparato tecnológico que permitirá exemplificar o fe-nômeno existente”, completa.

Vários exemplos são apontados pelo Programa e mostram como a indústria se apropria da na-nociência presente na natureza para produzir novos produtos e serviços. “Os alunos começam a entender, por exemplo, que a asa da borboleta não tem cor. Que nessa asa ocorre um fenômeno de reflexão e refração de luz, em função de sua estrutura molecu-lar, que faz com que ela apresen-

te uma cor através de um proces-so chamado iridescência. Hoje, a indústria de cosméticos se apro-pria desse fenômeno para criar produtos de beleza para o rosto”, explica o diretor do SENAI.

Ainda para o trabalho com o en-sino fundamental, foi desenvolvi-do, em parceria com uma univer-sidade de Taiwan, um DVD com desenhos animados explicativos para os alunos.

No ensino médio, o tema princi-pal é a nanotecnologia, que é a aplicação da ciência do 10-9 na vida das pessoas, seja em pro-dutos, processos etc. “Os jovens do ensino médio do SESI já estão articulados com o ensino técni-co do SENAI. Então, construímos para eles um itinerário formati-vo inicial, que é um curso de 20 horas de imersão na nanotecno-logia, com várias atividades, in-

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clusive práticas”, conta o diretor. Após esse curso inicial, as disci-plinas do SENAI passam a ser de-senvolvidas de forma articulada com as disciplinas técnicas da nanotecnologia, aplicando seus conceitos na prática. “Na área de mecânica, por exemplo, existem lubrificantes que usam conceitos nanotecnológicos. Na área de po-límeros existe a inclusão de nano-particulados, que acabam crian-do outras funcionalidades para o composto”, explica Terra.

O SENAI não atua apenas no cam-po da educação, mas também com a prestação de serviços para empresas. Ricardo Terra acredita que essa experiência facilita o desenvolvimento de conceitos, já que existe uma vivência do mun-do real. “Isso nos dá o know-how para trabalhar nos ensinos funda-mental e médio, passando para os alunos todo esse conhecimento.”

Sala de aula móvel

O Programa de Educação em Na-nociência e Nanotecnologia do SESI/SENAI conta com duas ver-tentes, sendo a primeira delas a da construção de 12 laborató-rios em três unidades de ensi-no do SENAI. Esses laboratórios serão utilizados pelos alunos da entidade dos cursos técnicos, de graduação e de pós-graduação. Já a segunda vertente do proje-to prevê a construção de cinco escolas móveis, montadas em carretas, que percorrerão as vá-rias regiões de São Paulo, aten-dendo aos alunos das unidades do SENAI e do SESI do interior do Estado. As unidades móveis são salas de aula equipadas com o que há de mais moderno em microscópios eletrônicos e equi-pamentos de alta tecnologia, em que o visitante pode assistir a demonstrações e experiências

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Sala de aula no interior da Escola Móvel

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de aplicações práticas de nano-ciência e nanotecnologia.

A preparação dos professores responsáveis por ministrar as aulas foi feita a partir da cria-ção de um grupo de trabalho que envolveu profissionais do SESI e do SENAI. O processo contou ainda com a contrata-ção de cinco pesquisadores que foram responsáveis pela qualifi-cação dos docentes.

Visita in loco

A concepção da Escola Móvel, como ela está configurada, é única. Inclusive o SESI/SENAI de São Paulo foi escolhido por um de seus fornecedores como uma experiência bem-sucedida, segundo contou Ricardo Terra, durante a visita que a equipe da

Linha Direta fez a uma das car-retas. “Usamos essa estrutura também em feiras. Temos uma palestra de cerca de 20 minutos, pela qual prestamos um nano esclarecimento para a comuni-dade. Na última bienal do livro, por exemplo, atendemos a cerca de 2 mil pessoas por dia.”

A bioquímica Nathália Moreira, instrutora do SENAI, foi uma das capacitadas para o Progra-ma. Ela fala da importância de projetos como esse diante da necessidade de preparar os alu-nos para o cenário que se de-senha no futuro. Nathália pres-tou um nano esclarecimento à equipe da Linha Direta durante a visita. Ela contou sobre o tra-balho realizado, dando exem-plos das áreas em que o curso visa a trabalhar e evidenciando

a presença da nanotecnologia nos diversos setores.

“Na área têxtil, encontramos al-gumas camisetas nanotecnológi-cas, como uma que é antibacteri-cida, que tem em sua composição algo que não permite que as bac-térias cresçam e, por isso, não retêm odor”, explica Nathália. A bioquímica fala, também, da in-dústria de alimentos, que desen-volveu um shake de Ômega 3 com nanocápsulas que estouram no intestino, permitindo que todos os nutrientes sejam absorvidos. “Saber dessas questões é muito importante para o jovem, pois ele começa a perceber, através dessas aplicações, a presença da ciência em sua vida. Assim, esta-mos cumprindo o objetivo prin-cipal do projeto: a aplicação da ciência no cotidiano”, finaliza.

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Divulgação

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Amanda Oliveira, aluna do 2º ano do ensino médioO que aprendemos na teoria pôde ser visto na prática e isso vai me ajudar futuramente, pois quero fazer o curso superior de quí-mica e já estou pensando em fazer uma pós-graduação em na-notecnologia. Percebemos que muitas coisas podem ser feitas a partir da utilização da nanotecnologia. Pensamos em um guarda--chuva impermeável, que não absorve a água e que pode ser guardado logo após o uso. Tem muita coisa que pode ser pensada e se tornar viável com a nanotecnologia.

Fernanda Martins,aluna do 2º ano do ensino médioDurante o curso, aprendemos a uti-lizar os materiais, o que despertou nossa curiosidade para essas manipu-lações. Para mim, o curso foi impor-tante, pois quero fazer engenharia metalúrgica e ele me deu uma noção dos processos utilizados.

Barbara Pereira, aluna do 3º ano do ensino médio

Foi interessante, pois eram coisas desconhecidas para mim. Ainda estou na dúvida em relação à mi-nha profissão, mas se eu seguir gastronomia, que é uma das mi-nhas opções, percebi que poderei utilizar muito conhecimento rela-

cionado à nanotecnologia.

Gabriella Mayumi, alunado 3º ano do ensino médio

Vi coisas que eu nem imaginava que existiam. Acredito que esse conhecimento pode me ajudar no futuro, pois estou fazendo o curso de automação industrial no SENAI, e esse conteúdo dado aqui é de mil e uma utilidades

para a minha área.

Lucas Ribeiro, aluno do 2º ano do ensino médio

Foi uma experiência legal e di-ferente, pois uma coisa é saber que existem coisas pequenas por aí, e outra coisa é ver, de fato,

essas pequenas coisas.

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