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EDUCAÇÃO "O sucesso escolar não tem dono" Resultados dos alunos portugueses na maior avaliação internacional desceram a Ciências e mantiveram-se a Matemática e leitura. Mas a evolução de Portugal ao longo do tempo é positiva e não tem paralelo na OCDE

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EDUCAÇÃO

"O sucesso escolar não tem dono"Resultados dos alunos portugueses na maior avaliação internacional desceram a Ciências e mantiveram-sea Matemática e leitura. Mas a evolução de Portugal ao longo do tempo é positiva e não tem paralelo na OCDE

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Texto ISABEL LEIRIAInfografia SOFIA MIGUEL

ROSA

Desde o primeiro ano em queo PISA (Programme for Inter-national Student Assessment)foi aplicado, em 2000, muda-ram-se currículos, criaram-se e

extinguiram-se exames, houve

programas lançados e outros

que desapareceram. Aindaassim, Portugal é o único paísmembro da OCDE a melhorarde forma continuada nos trêsdomínios de literacia testadosnesta avaliação trianual, que em2018 abrangeu um recorde de

79 países e regiões pertencentes

à organização e não só. Claroque ter partido atrás dos outros

ajuda a que o caminho seja paraa frente. No primeiro ano daprova, que incide sobre a litera-cia matemática, científica e emleitura, os jovens portuguesesde 15 anos não conseguiram me-lhor do que ficar em penúltimoe antepenúltimo entre os então

28 países participantes.Mas, afinal, que políticas con-

tribuíram para esta história desucesso? Como respostas con-sensuais podem ser apontadoso aumento das qualificaçõesda população portuguesa — háuma relação comprovada entrepais com mais estudos e o su-cesso dos filhos — e a expansão

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da frequência do pre-escolar.A partir daqui torna-se maisdifícil identificar as medidasque resultaram melhor. E estadificuldade acaba por dar azo atrocas recorrentes de argumen-tos entre responsáveis políticospresentes e passados.

Mais importânciaaos resultados

Desta vez, os resultados obtidos

pelos jovens portugueses de 15

anos, divulgados esta semana e

que apontam para uma estabili-

zação a matemática e a leiturae uma descida a ciências, nãosuscitaram um debate tão acesosobre méritos e culpas. Mas oministro da Educação, TiagoBrandão Rodrigues, não deixoude apontar o dedo ao Executivoanterior, ainda que não tenhareferido nomes.

"Durante o período 2011-2015(primeiro-ministro Passos Coe-

lho, ministro da Educação Nuno

Crato) houve um afunilamentocurricular, com um foco exacer-bado num conjunto de discipli-nas, deixando outras de fora,como Ciências da Natureza",declarou o ministro, como umadas justificações para a quebrana literacia científica. E referiuainda como possíveis causas as

"mudanças bruscas de políticasno campo educativo, como a re-vogação do currículo do ensinobásico e de vários programas, asuspensão do Plano de Ação paraa Matemática ou os cortes entãoexecutados no Ciência Viva e noPlano Nacional de Leitura".

Mais comedido nas críticas agovernações anteriores, o se-cretário de Estado, João Costa,aponta outras razões para o tra-jeto positivo. "Não se pode dizer

que foi esta ou aquela medida.A evolução é o efeito de diferen-tes políticas, por vezes até emsentido contrário, mas que per-mitiram que as práticas e o foco

fossem progressivamente orien-tados para os resultados e o su-

cesso", apontou, concluindo: "Osucesso escolar não tem dono. Eeste facto é reiterado pela me-lhoria sustentada e cumulativa

que se verificou no PISA."

Na mesma linha, DomingosFernandes, ex-secretário deEstado e coordenador do estu-do "Políticas educativas e de-sempenho de Portugal no PISA2000-2015", também apresen-tado esta semana, diz que nãoé rigoroso estabelecer relaçõesde causa-efeito entre as políti-cas públicas de educação e osresultados do PISA. Mais im-portante, reforça o investiga-dor da Universidade de Lisboa,é perceber que mudanças acon-tecem nas práticas pedagógicasdentro das escolas, induzidas

por essas medidas.Além disso, sublinha, apesar

das alterações regulares, à me-dida dos tempos legislativos,há características que unem os

diferentes programas lançadosdesde 2000 e que têm ajuda-do à melhoria. A começar pela"continuidade" nos objetivosdefinidos, como o combate ao

abandono escolar e a diminui-ção do insucesso ou a melhoriadas aprendizagens em áreasespecíficas (Matemática, Por-tuguês e leitura, por exemplo).A este traço deve ainda juntar--se como fatores de sucessoa abrangência nacional dos

programas, o envolvimento de

instituições de ensino superior,a avaliação dos impactos e umacerta autonomia dada às esco-las para os aplicar.

Tempo de ensinonão é determinante

O relatório da OCDE de maisde mil páginas, que acompanhaa divulgação dos resultadosPISA, também permite perce-ber em que medida determina-das circunstâncias favorecemou nem sequer interferem comos resultados. Uma das análisesfeitas pela OCDE cruza o tempopassado em aulas com o desem-

penho na leitura. E a conclusãoé a de que não há relação entreas duas variáveis. Finlândia,Alemanha, Japão e Suécia são

países com resultados acimada média no PISA e cujos diasde aulas são menos longos do

que a média da OCDE, situadaem 44 horas por semana. Por-tugal está na média: de horasde aulas (45) e de desempenho.Por outro lado, outras regiõesque se saíram particularmentebem no teste de 2018, como as

quatro províncias chinesas queparticiparam, Singapura e Co-reia combinam resultados altoscom muitas horas de ensino:mais de 50 por semana.

Já em relação à despesa poraluno, os dados mostram ha-ver alguma relação com os

resultados, mas só até certonível. Ou seja, à medida queaumentam os gastos, o desem-penho tende a melhorar. Masesse efeito perde impacto apartir do momento em que se

garante um nível mínimo de fi-nanciamento que é asseguradopor quase todos os países daOCDE. O caso mais paradig-mático é o da Estónia, o paísque chegou ao topo do PISA— teve o melhor resultado emleitura e Ciência e o segundomelhor a Matemática — e cujadespesa por aluno fica bemaquém da média.

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