EDUCOMUNICAÇÃO E BUEN VIVIR: REPENSANDO A...
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VII ESOCITE.BR tecsoc - ISSN∕ 1808-8716 Souza, Gomes. Anais VII Esocite.br/tecsoc 2017; 5(gt22):1-18
EDUCOMUNICAÇÃO E BUEN VIVIR: REPENSANDO ASUSTENTABILIDADE A PARTIR DO CAMPO CTS
GT22 – Educação para a sustentabilidade nas dimensões ambientais,culturais e tecnológicas
Leonardo da Rocha Bezerra de SouzaAdriano Lopes Gomes
Resumo: Este trabalho apresenta um estudo sobre o campo da Educomunicação e o campo do BuenVivir, a partir dos estudos de Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS), tendo como enfoque a questão dasustentabilidade e do Desenvolvimento Sustentável, numa perspectiva alternativa e crítica da visãointerdisciplinar sobre a problemática do consumismo e da relação humana com a natureza. Visamoscom esta proposta, levantar apontamentos e bases para se repensar a atividade humana sobre oPlaneta Terra, confrontando a visão andina de Buen Vivir (Bem-Viver), enquanto campo político e ético,com o modo contemporâneo de agir frente à Mãe Terra e do consumo exacerbado por parte dasociedade contemporânea. Com isto, construímos com a Educomunicação um caminho crítico,meditativo e humanizado, que estrutura novos modelos de ação comunicativa e educativa,possibilitando a solidificação de um novo paradigma de produção de conhecimento e detransformação de realidades para a sociedade tecnológica deste século XXI. Estes campos partem deuma nova relação entre Ciência e Tecnologia (C&T) e a sociedade, pois aprofundam a visão crítica sobreartefatos tecnológicos, a questão da mediação da tecnologia e a construção do conhecimento a partirda realidade social, cultural e mística. É da relação estabelecida entre estes dois campos, que faremosuma análise crítica com base nos estudos de CTS. Para tanto, adotamos como base teórica, autorescomo Walter Bazzo (2008), Décio Auler e Demétrio Delizoicov (2001), Boaventura de Sousa Santos(2008), Carla Cabral (2006), Alberto Acosta (2012), Aníbal Quijano (2005; 2012), Paulo Freire (2002;2005), Mário Kaplún (1975), Leonardo Boff (2012), entre outros. Esta pesquisa ocorre no âmbito doGrupo de Pesquisa Comunicação, Cultura e Mídia (COMIDIA/UFRN), também conta com um estudo decaso a partir de um rádio escolar no Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN), onde elaboramosuma proposta de intervenção, para consolidação do pensamento crítico-reflexivo e libertador. Guiadospor este escopo, buscamos com este estudo ampliar nosso entendimento sobre a C&T e sua relaçãocom a sociedade, especialmente, com as tecnologias de comunicação e informação, com as tecnologiasde educação e com modo de vida para o consumo e sua relação permeada de problemas com asustentabilidade no mundo global.
Palavras-chave: CTS; Buen Vivir; Educomunicação; Desenvolvimento Sustentável; Des-colonialidade
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1. INTRODUÇÃO
A Educomunicação e o Buen Vivir são campos novos enquanto discursos políticos.
Ambos assumem uma importante missão na construção crítica do mundo global, promovendo
um pensamento que parte da periferia. Neste estudo buscamos entender esta relação através
dos estudos de Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS), focando nas questões da
sustentabilidade e do desenvolvimento sustentável. Este trabalho é fruto de uma pesquisa em
andamento no Grupo de Pesquisa Comunicação, Cultura e Mídia (COMIDIA) da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).
A conjuntura formada e analisada no escopo deste trabalho é uma resposta à
emergência dos mais diversos setores e campos do conhecimento pelo Brasil e pelo mundo,
no tocante ao meio ambiente e a cultura latino-americana. As bases desse estudo formam um
conjunto que nos possibilita enxergar, de um modo crítico e transversal, parte significativa,
por que não dizer como um todo, da questão ambiental. Este tema tão importante e que gera
discussões cada vez mais acaloradas no âmbito nacional e internacional, será visto aqui pela
ótica de CTS e debatido por um viés emergente e periférico, que atua na construção de uma
relação humana diferente com o mundo onde estamos, onde a priori é um alerta e uma
consolidação de saídas que se aglomeram e se articulam com vistas à superação de um
modelo explorador. No entanto, não perderemos o fio autocrítico e por isso recorreremos em
muitos casos à reflexão própria das áreas relacionadas, garantindo assim uma solidificação
séria e libertária da constante transformação que vivenciamos.
A Educomunicação nasce do pensamento e da ação de dois pensadores latino-
americanos, Paulo Freire (1921-1997) e Mário Kaplún (1923-1998). Tanto Freire como
Kaplún possuem estreita ligação com movimentos populares e de educação de base, onde
ambos contribuem para com a formação de um novo pensamento e uma nova ação, que atinja
o universo da comunicação e da educação. Embora estes ocupem as bases históricas e
conceituais deste campo, a Educomunicação segue se desenvolvendo, construindo outros
vieses, adquirindo outras performances, que ao longo deste texto serão melhor esclarecidas e
de certo modo criticada.
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O segundo, o Buen Vivir, possui uma origem mais distanciada em termos temporais.
Originada dos conceitos SumakKarsay (andino) e/ou TêkoPora(guarani), a expressão Buen
Vivir nos levaaos conceitos pré-colombianos do sentido de vida plena, boa vida e bem viver,
em maior parte do território que hoje concebemos como América. Este conceito ancestral que
previa uma vida em harmonia com o planeta, ou a Mãe Terra, para as comunidades ancestrais
andinas PachaMama, tinha o humano como um elemento no planeta e concebia a vida em
harmonia com as demais espécies. Embora o Buen Vivir tenha esta origem ancestral,
enquanto discurso político aparece segundo Vanhulst e Beling(2013) já no final dos anos
1990.
Educomincação e Buen Vivir são campos de produção de conhecimento e modo de
vida, principalmente o último. Ambos ocupam posição clara com relação à
educação/comunicação, ao modo de vida consumista e a urgência de se repensar o processo
civilizatório e o estabelecimento de uma crítica concisa à Colonialidade. Bem como ao
sistema capitalista e imperialista que maltrata não somente a vida humana como também
outras formas de vidas presentes no planeta.
Estes dois campos dialogam diretamente com o campo de CTS, pois todos eles
possuem em si um vertente interdisciplinar e crítica, com relação à Ciência e a Tecnologia.
Principalmente, se pensarmos a tecnologia moderna, como essência do modo de pensar,
produzir e consumir, na modernidade. Construindo desde à colonização da América Latina,
um modo de operação sobre o planeta, onde se visava sumariamente a exploração de riqueza,
especialmente, no tocante à Portugal sobre o Brasil.
Inerentemente, pensamos também a questão da sustentabilidade, tão debatida neste
século XXI, como um caminho a se percorrer em termos de alternativa ou única via que
garanta qualidade de vida à humanidade e ao planeta. Isto é, embora falemos da
sustentabilidade, consolidaremos ao longo deste trabalho uma crítica acentuada, ao modelo de
sustentabilidade ocidental, caracterizado na categoria (neo) desenvolvimentista de:
desenvolvimento sustentável. O que buscamos aqui é compreender e nos fazermos
compreensíveis, quanto ao construto de campos interdisciplinares, críticos à C&T, e etc., que
emergem para uma alternativa, que rompa com a sistemática moderna, e consequentemente,
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pós-moderna, que impera sobre a o mundo global. Dito de outro modo, a relação entre
Educomunicação e Buen Vivir, pode estabelecer a abertura, a crítica e a fundamentação de
paradigmas que nascem com CTS, e muito este (s) paradigma (s) têm a contribuir com a
questão ambiental, vista a partir de uma crítica às categorias anteriormente mencionadas, sem
refutar-se de uma autrocrítica.
2. PROCESSO METODOLÓGICO
Adotamos como base metodológica o método de revisão bibliográfica, a observação
não participante e a Pesquisa-Ação.
Realizamos uma revisão de literatura referente às áreas da Educomunicação e do Buen
Vivir, onde estudamos, em primeiro momento, o surgimento de ambos os campos, sua história
e sua consolidação. Num segundo momento buscamos relacionar tais campos, concentrando
nossos esforços no encontrar de similitudes e divergências, que ancorariam uma autocrítica
(presente neste trabalho). No terceiro momento, articulamos nossa compreensão da literatura
sobre os campos trabalhados, buscando compor uma proposta de intervenção, que virá a
embasar um novo momento na pesquisa, mas que por instante, encontra-se aqui em caráter
propositivo.
No tocante ao projeto de pesquisa, a observação não-participante, quando o
“pesquisador toma contato com a comunidade, grupo ou realidade estudada, mas sem
integrar-se a ela: permanece de fora(MARCONI e LAKATOS, 2003, p. 193)”, foi o segundo
estágio metodológico. Nesta fase da pesquisa dedicamo-nos a visitar e observar três
transmissões de uma rádio escolar. Nesta parte compreendemos o funcionamento da rádio e
em que medida poderíamos compreender a realidade da escola e do nosso objeto de pesquisa.
Ainda no âmbito mais geral do projeto, podemos mencionar que o terceiro momento
consiste na Pesquisa-Ação que, segundo Chizzotti (1998), “[...] se propõe a uma ação
deliberada visando uma mudança no mundo real, comprometida com um campo restrito,
englobado em um projeto mais geral e submetendo-se a uma disciplina para alcançar os
efeitos do conhecimento (CHIZZOTTI, 1998, p. 100)”. Esta parte da pesquisa consiste na
intervenção na rádio escolar. É um estágio em andamento que, embora não tenha sido
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concluído, já se molda a partir do momento em que consolidamos o contato com a instituição,
no caso, o Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN). A partir do que já foi colhido na
observação não participante, solidificamos os pilares necessários sobre os estudos aqui
trabalhados e a formulação de uma proposta de intervenção.
De maneira mais sintética, podemos dizer que no tocante a este trabalho, nossa
metodologia consistiu sumariamente na revisão de literatura, com enfoque na relação dos dois
campos analisados com o Paradigma Emergente de Santos (2008) e, por conseguinte, uma
analise também vinculada aos estágios do projeto de pesquisa, onde pudemos discutir algumas
percepções nossas em relação à rádio e que, nesta peça, é debatido com ênfase sobre a
literatura mencionada, porém, sem fugir ao escopo da pesquisa. Respeitamos com isso, os
estágios e objetivos propostos neste estudo que envolve um complexo de realidades distintas.
3. BUEN VIVIR E EDUCOMUNICAÇÃO
A Educomunicação e o Buen Vivir são áreas vistas por alguns teóricos como novas,
mas que já possuem um arcabouço de pensamento, reflexão e estudos quase tão antigos
quanto sua origem, especialmente este segundo. São estudos latino-americanos (em origem) e
que possuem uma estreita relação com a realidade sócio-cultural do continente. Um, buscando
outra relação com a ancestralidade, e o outro envolvendo, em um caráter mais pontual, a visão
sobre a educação e a comunicação.
Segundo Santos (2015):
A “Educomunicação” surgiu a partir dos anos 1980 para designar um campo deintervenção social, onde os sujeitos não são considerados apenas comoconsumidores passivos de mídias, mas intervêm na receptividade desses conteúdosressignificando-os e posicionado-se diante das informações. (SANTOS, 2015, p.61).
Demarcamos, então, nosso ponto de partida para a Educomunicação, nos estudos de
Paulo Freire e Mário Kaplún. Ambos latino-americanos que tratavam: o primeiro, de uma
educação libertadora e popular; já o segundo, de uma comunicação popular. Desse modo,
podemos entender que a Educomunicação tem sua raiz na contraposição à “Educação
Bancária” de Freire (2005), aquela onde “Em lugar de comunicar-se, o educador faz
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“comunicados” e depósitos que os educandos, meras incidências, recebem pacientemente,
memorizam e repetem” (p. 33).
Assim como, podemos dizer que este campo parte da ideia de Kaplún (1975) quando
ele nos revela um modelo de educação de caráter endógeno, que corrobora com a ideia de
Freire. É esta relação entre Kaplún e Freire, que endossa à articulação do que mais tarde seria
a Educomunicação. Sustentada por Soares (2016):
Educomunicação é assumida como um paradigma que orienta o planejamento e aimplementação de ecossistemas comunicativos abertos, democráticos e criativos,visando a autonomia comunicativa dos sujeitos da Educação (professores e alunos),quer enquanto construtores de relações de convivência, enquanto produtores demensagens ou como usuários dos sistemas de informação (SOARES, 2016, p. 19).
O discurso político do Buen Vivir começa, segundoVanhulst e Beling (2013), no final
dos anos 1990. De modo simples, podemos entender este conceito através de sua definição de
Acosta (2012):
O Buen Vivir, na realidade, se apresenta como oportunidade para construircoletivamente novas formas de vida. O Buen Vivir não é uma originalidade nemuma novidade dos processos políticos do início do século XXI nos países andinos.Nem é uma espécie de superstição ou mágica pata todos os males do mundo. OBuen Vivir é parte de uma grande busca de alternativas de vida forjadas no calor daslutas da humenidade pela emancipação da vida (ACOSTA, 2012, p. 201).
O Buen Vivir conceituado por Acosta tem sua origem andina, como mencionado
anteriormente, sempre no sentido de se pensar uma boa vida, o bem viver, ou de forma mais
aprofundada uma Vida Plena, harmonizada com os demais elementos do planeta terra. Entre
os debates sobre este assunto, podemos mencionar, por ilustração, que em período anterior à
colonização, o chamado período pré-colombiano, existiam
comunidades/civilizações/povos/nações de habitantes que por aqui estavam há centenas de
anos e preservaram seu estilo de vida de um modo harmônico com o planeta, respeitando-o e
convivendo com suas nuances.
4. A SUSTENTABILIDADE E O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
O protagonismo da C&T no cenário global e nos aspectos macro e micro da vida
humana sobre o planeta é evidente.A Ciência Moderna em seu caráter eurocêntrico,
cartesiano; e a Técnica Moderna em seu caráter instrumental, linear, também eurocêntrico,
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articularam a tecnologia moderna como dotada de todas estas mesmas características.
Voltamos à ciência como motor multiplicador da produção tecnológica, chagando ao “modelo
linear de desenvolvimento” (MLD). Como nos mostra Cerezo et al (2003):
A concepção clássica das relações entre a ciência e a tecnologia com a sociedade éuma concepção essencialista e triunfalista, que pode resumir-se em uma simplesequação, o chamado “modelo linear de desenvolvimento”: + ciência = + tecnologia= + riqueza = + bem-estar social (CEREZO et al, 2003, p. 119).
Adotando a Modernidade conforme a hipótese dusseliana (2004) – expansão marítima
de Espanha e Portugal –, podemos dizer que é o marco da colonização que a nós, latino-
americanos, foi imposta uma Modernidade eurocêntrica, ocidental, exploratória. E de 1492 até
os dias atuais (século XXI), o trajeto da tecnologia moderna, alinhado ao capitalismo, culmina
em um século digital, que ainda convive com a fome, com o desmatamento, com ampla
desigualdade e concentração de terra e poder. Não superamos a dicotomia Centro-Periferia. E
consolida-se como mito, o progresso, conforme também citou Dussel (2007; 2012), o que
corrobora com este mito? A impossibilidade de vida digna, a partir de uma “modelo linear de
desenvolvimento”.
Dussel (2007; 2012), enquanto uma dos principais defensores do Buen Vivir,
estabelece uma crítica política e ética, ao que entendemos por MLD, no entanto, vai mais
além. Este MLD está entrelaçado diretamente com os mecanismos desenvolvimentistas e neo-
desenvolvimentista que não buscam superações ou rompimentos com este modo de ver
exploratório. O Buen Vivir se junta ao pensamento de Dussel e vice-versa, quando não se trata
somente do MLD, mas sim, de uma lógica desenvolvimentista que começou a fracassar,
explicada nas palavras de Acosta (2012):
Na verdade, quando os problemas começaram a minar nossa fé no“desenvolvimento”, passamos a buscar alternativas de desenvolvimento, demosnomes para diferenciá-lo do que nos incomodava, mas seguimos no caminho dodesenvolvimento: desenvolvimento econômico, desenvolvimento social,desenvolvimento local, desenvolvimento rural, desenvolvimento sustentável,ecodesenvolvimento, desenvolvimento em escala humana, desenvolvimentoendógeno, desenvolvimento com equidade de gênero, codesenvolvimento...Desenvolvimento, em resumo. O conceito de “desenvolvimento”, com toda crença,nunca foi questionado, mas simplesmente redefinido (ACOSTA, 2012, p. 199, grifomeu).
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Votamos a nossa premissa. A lógica deste desenvolvimento que nos afeta, está
profundamente cheia dos mecanismos de reprodução de si mesma. E ao fugirmos caímos na
mesma logicidade. Isto nos liga diretamente a ideia de geltellde Heidegger (2012) em relação
à técnica moderna, e que se incorpora à tecnologia moderna.Pois nossa ótica não foge do
caráter instrumental, tecnicista, cientificista, desenvolvimentista.
Grifamos o termo desenvolvimento sustentável, porque trabalharemos este termo
recuperando todos os sentidos apresentados. Inclusive, sua inconformidade conceitual,
alinhada com a sustentabilidade. Como aponta Boff (2001):
A categoria “desenvolvimento” é tirada da economia realmente existente que é acapitalista, ordenada pelos mercados hoje mundialmente articulados. Ela possui umalógica interna fundada na exploração sistêmica e ilimitada de todos os recursos daterra para atingir três objetivos fundamentais: aumentar a produção, o consumo eproduzir riqueza (BOFF, 2001, p. 3).
Em seguida, complementa:
A segunda categoria “sustentabilidade”, porém das ciências da vida, da biologia e daecologia. A sustentabilidade significa que no processo evolucionário e na dinâmicada natureza vigoram interdependências, redes de relações inclusivas, mutualidade elógicas de cooperação que permitem que todos os seres convivam, co-evoluam e seajudem mutuamente para manterem-se vivos e garantir a biodiversidade. Asustentabilidade vive do equilíbrio dinâmico, aberto a novas incorporações, e dacapacidade de transformar o caos gerador de novas ordens (estruturas dissipativas deIlya Prigogine) (BOFF, 2001, p. 3-4).
É aqui que reside o cerne de nossa proposta. A ida ao desenvolvimento sustentável é
reprodução do desenvolvimento de base, aquele originado na economia. A sustentabilidade e
o sustentável são condições requeridas por uma crítica, seja ela institucional; seja ela coletiva
ou individual, diante de fenômenos que se direcionam ao trágico ou ao problemático, com
relação ao nosso planeta.A sustentabilidade enquanto discurso políticosurge de modo crítico,
mas logo é cooptada através dos mesmos mecanismos de idário e ação política ligada ao
neoliberalismo (especialmente, nos anos 1980 e 1990).
A partir disso, Boff (2001) no diz ainda:
Importa, entretanto, reconhecer que o conceito “desenvolvimento sustentável” podeser útil para qualificar um tipo de desenvolvimento em regiões delimitadas e emregiões delimitadas e em ecossistemas definidos. Quer dizer, é possível existir apreservação do capital natural, vigorar um uso racional dos recursos e manter-se acapacidade de regeneração de todo ecossistema. Assim por exemplo, é possível,
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mantendo a floresta amazônica de pé, desenvolver um manejo tal de suas riquezasnaturais que ela mantém sua integridade, aberta a atender demandas das geraçõespresentes e futuras. Mas, em termos de estratégia globais que envolvem todo oplaneta com seus ecossistemas, o paradigma utilitarista, devastador e consumistaimperante produz uma taxa de iniqüidade ecológica e social insuportável pelosistema-terra (BOFF, 2001, p. 6).
Então questionamos (como exemplo): sendo o Brasil um país produtor de
Commodities (grãos), pode seu governo gerir uma área como à Amazônica em conciliação
com esta modalidade de agronegócio? Ou, como manter a Caatinga de fato protegida na
iminente ameaça da extração de carvão vegetal ou do agronegócio no Nordeste? Também
questionamos o problema da carcinicultura e a vida dos mangues, que acaba ameaçada.
Não acreditamos na resposta sintética e enfática quanto a todas estas situações. Muito
menos acreditamos em uma solução imediata, não existem soluções imediatas. Se refletirmos
um pouco, perceberemos que o problema não é imediato, ao contrário, é antigo, está
vinculado ao passado mais longínquo do que supõe os teóricos pós-modernos. Talvez comece
pela visão do humano moderno sobre o mundo, recuperando, ao modo heideggeriano, o
problema da dis-posição do mundo ao homem. A partir da nossa problematização, seria
interessante vislumbrarmos como a humanidade, a sociedade brasileira (em sua maioria) e os
governantes brasileiros, ao longo de mais da história do Brasil, enxergam a Amazônia como
fonte de riqueza, como bem de consumo, isto vale para todos os casos mencionados
anteriormente, sejam Mangues, Caatingas e etc. Isto não soluciona, mas aponta caminhos.
A ótica CTS é um dos caminhos mais precisos quanto a esta modalidade de reflexão.
Mas ela sozinha, contrariando suas premissas interdisciplinares, não consegue alcançar toda
esta dimensão. Já nos está claro que a Educomunicação é um campo de estudos, pensamento e
da práxis, que assume sua função crítica, e dialoga com profundidade acerca da dimensão da
tecnologia moderna, voltada, é claro, para as tecnologias de comunicação/educação, mas
também se relacionando com CTS. O Buen Vivir dialoga com ambos. Contribui, além de
outras perspectivas, com a sua crítica ao desenvolvimento sustentável e a recuperação de
sentidos originários de vida plena, harmônica com o planeta, re-fundando a sustentabilidade
da vida. Ou seja, o Buen Vivir, como divisor de águas, volta-se à discussão sobre que
sustentabilidade queremos, uma que sirva ao desenvolvimento, seja por via do
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desenvolvimento sustentável, ou uma sustentabilidade mais voltada ao cuidado, à harmonia, à
superação do antropocentrismo moderno? De maneira simples, a segunda opção nos satisfaz.
5. A LEITURA CTS
5.1. CTS
É neste caso que tecemos nosso principal alinhamento de proposta. Pois, tomando tudo
que discutimos até agora, chegamos a uma situação emblemática que confronta todos os
nossos ideais e nossas perspectivas.Aqui se filtra a migração discursiva do ambiente macro e
de ideário, para o micro e da práxis. A tecnologia e suas relações analisadas na rádio, que por
si só, incorporam os aspectos da Educomunicação, flui para o campo CTS, compartilhando da
mesma análise crítica, só que por outro viés.
Afinal, o que é CTS?Para Bazzo et al (2008):
Os estudos sociais da ciência e da tecnologia, ou estudos CTS, constituem umcampo de trabalho nos âmbitos da investigação acadêmica, da educação e daspolíticas públicas de todos os países onde atualmente já estão mais sedimentados.Estes estudos se originaram há pouco mais de três décadas, a partir de novascorrentes de investigação em filosofia, sociologia da ciência e de um incremento nasensibilidade social e institucional sobre a necessidade de uma regulaçãodemocrática das mudanças científico-tecnológicas.
[...]CTS define hoje um campo de trabalho bem consolidado institucionalmente emuniversidades, em centros educacionais e na administração pública de países maisindustrializados. É nossa aposta fecundar tais abordagens em nível de Brasil,buscando adicionar a estes estudos aspectos econômicos, sociais e políticoscontextualizados para o nosso país. (BAZZO, et al, 2008, p. 161-162)
A definição de CTS que Bazzo (2008) nos fornece um conceito muito comum aos
pesquisadores desta área, tais como Lopez Cerezo, Carla Cabral, entre outros. Trata-se de um
CTS acadêmico, formalmente instituído, que corresponde ao pilar crítico do viés acadêmico,
mas não sobressalta a relação deste campo com a práxis do campo tecnológico.
5.2 A LEITURA CRÍTICA; OS TRÊS CAMPOS
Partindo da conceituação, CTS engendra por muitos outros campos e vertentes. No
entanto, na expectativa de relacionarmos suas ideias com nossos campos de conhecimento,
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Educomunicação e Buen Vivir, passamos adotar uma linha de visão da perspectiva ampliada e
reduzida da Alfabetização Científico e Tecnológica (ACT) dos Professores Décio Auler e
Demétrio Delizoicov (2001), pois tanto a ACT como a Educomunicação encontram em Paulo
Freire um marco teórico. Como nos fala Auler e Delizoicov (2001):
A Alfabetização Científica e Tecnológica, no nosso entender, pode ser concebidasegundo duas perspectivas, ou seja, o sentido reducionista e o ampliado. Este último,mais próximo de uma concepção progressista de educação. Na perspectivareducionista, reduz-se a ACT ao ensino de conceitos, ignorando a existência demitos1, como os anteriormente apresentados e discutidos, aspecto que contribui parauma “leitura da realidade” que se poderia argumentar como sendo bastante ingênua.Reduzir ACT ao ensino de conceitos, bem como trabalhar na perspectiva de entenderartefatos tecnológicos e científicos numa dimensão apenas técnica, internalista, podecontribuir para manter ocultos mitos ligados à CT (AULER; DELIZOICOV, 2001,p. 127, grifo nosso).
Ao compreendermos esta visão da ACT, passamos a compreender que a presença desta
dualidade (ampliado e reduzido), nos promove uma crítica consistente quanto a compreensão
da C&T a partir de um modo a-crítico. Tanto a Educomunicação como Buen Vivir, lidam
com este processo, esta afinidade com Paulo Freire é um elo importante entre os campos.
Tendo em vista que ao pensarmos o ato de educomunicar, devemos levar em consideração que
a relação com a tecnologia extrapola a dimensão pretensamente neutra, um rádio não é apenas
um aparelho técnico um artefato mágico. Entender isto, por exemplo, é compreender de onde
vem o rádio, quem lida com o rádio, quem faz o rádio, quem vende, quem narra, o que se
narra.
As grandes mídias que regem a comunicação brasileira através de seus oligopólios,
conforme mostrou Marinoni (2015), são frutos não de uma mágica ou do poder divino, mas
da forma como se consolidou a comunicação em nosso país. Encontramos na Perspectiva
reducionista, o problema já revelado no cerne da Educomunicação, ao percebermos nela o
direcionamento à democratização. A perspectiva reducionista “Fundamenta-se numa postura
pouco crítica em relação às implicações da CT na sociedade” (AULER e DELIZOICOV,
2001, p. 128), é inerentemente condizente com a “Educação Bancária” (FREIRE, 2005), ou
seja, apontam para superação desta relação vertical, linear, neutra e elitista, que presume que o
aluno/ouvinte, sejam de uma cultura inferior.
1 Mitos elencados por Auler e Delizoicov (2001): 1 - Superioridade do modelo de decisões tecnocráticas; 2 -Perspectiva salvacionista da CT; 3 - Determinismo tecnológico.
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Assim, a lógica dos grandes meios de comunicação passa a interpretar os sujeitos como
depósitos. A educação é tomada por esta mesma base. Constrói-se com isso um mundo onde a
reprodução de conteúdo é dada pela linha hegemônica de comunicação/educação. Acontece,
que no Brasil, como em outras partes do mundo capitalista, o poder é concentrado nas mãos
da elite, e este poder inclui os mesmos atores, como apresentou Marinoni (2015), políticos
ocupam grande parte do espaço midiático. Estes políticos, em dois cenários possíveis, são
membros do agronegócio ou financiados pelo agronegócio. Este é mais um exemplo, da
impossibilidade de conciliação proposta pelo desenvolvimento sustentável como concebemos
aqui.Ficam abertas perguntas como: desenvolvimento sustentável para quem?
A Educomunicação dialoga com CTS na tentativa de, primeiramente, superar a
compreensão a-crítica da C&T, partindo da tecnologia de comunciação, não como mero
instrumento, mas sim, como uma parte significativa do processo e em processo. Portanto,
CTS e a comunicação e a Educomunicação, conversam promissoramente na contra-
hegemonia crítica, aos oligopólios e às elites dominantes, entorno de uma educação e
comunicação reflexiva, atuante, partindo dos artefatos não apenas como meio, mas como
partes do processo, e por esta razão não podemos condicioná-los à esfera do material
pragmático, uma ferramenta não está em mão apenas pela vontade alheia a si, de possuir tal
objeto, ele encontra-se ali e daquele modo por atuar daquela forma.
Na outra ponta temos a Perspectiva Ampliada,
Nessa perspectiva ampliada de ACT, aproximações com o referencial freiriano(Freire, 1987, 1996)2 podem contribuir para a superação dos mitos. Particularmenteno processo de formação de professores, a perspectiva problematizadora e dialógicapermite estruturar um trabalho pedagógico (Pernambuco, 19933; Delizoicov4, 1991)com a finalidade de obter e problematizar a visão dos licenciandos e licenciadossobre as relações CTS. Para Freire, educação relaciona-se com “conhecimentocrítico da realidade”, com “uma leitura crítica do mundo” (AULER; DELIZOICOV,2001, p. 128, grifo).
Compreendemos que esta perspectiva nos direciona ao encontro de CTS e da
Educomunicação de modo crítico. Entretanto, não podemos conceber que o modo crítico
2 Livros “Pedagogia do Oprimido” e “Pedagogia da Autononia”, respectivamente. 3 PERNANBUCO, M. M. C. (1993) Significações e Realidade: Conhecimento. In: Pontuschka, N. (org.) Ousadiano Diálogo. São Paulo: Edições Loyola. 4 DELIZOICOV, D. (1991) Conhecimento, Tensões e Transições. Tese de Doutoramento. São Paulo: FEUSP
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pretenda somente abordar uma visão única sobre o desenvolvimento sustentável, mas bem
mais que isso. Para muitos compreender e ser parte do desenvolvimento sustentável aspira
qualidade de vida, ascensão social, responsabilidade social, entre outras formas. Não podemos
nos distanciar da visão de que embora sejamos um país alinhado com o as demais nações
capitalistas, não evitamos trágicos acontecimentos como o desastre de Mariana em 2015, nem
mesmo conseguimos avançar significativamente na demarcação de terras indígenas. Mesmo
assim, o país continua caminhando sua política aliada aos objetivos de uma sustentabilidade
que atende ao desenvolvimento sustentável.
A perspectiva ampliada nos garante uma crítica dura a tais acontecimentos e a tal
política. Mas para onde caminhar? Ao debruçar-se sobre Freire (2002; 2005) encontramos
mais respaldo para nossa empreitada, pois ao questionar o caráter extensivo da educação, e
apresentar uma educação/comunicação, Freire nos diz, temos de romper com o caráter vertical
(reprodutor) – voltamos aqui à crítica à perspectiva reducionista –. Se a elite controla os
meios de comunicação e a concentram significativas porções de terras, reproduzir o conteúdo
é reproduzir a ideologia dominante, Educomunicação e CTS são obrigados por suas premissas
ideológicas a romper com tal lógica, eis aqui a compreensão ampliada.
Respondendo a pergunta lançada, caminhamos para além do limitado. Não entorno ao
desenvolvimento sustentável para o des-conheicido (para mantermos uma elite dominante). É
outra linha, que se assoma aos dois campos, é Buen Vivir! Ele nos leva a uma crítica ao
desenvolvimento sustentável, nos faz refletir a partir da origem de nosso povo ancestral, ele
nos direciona, de modo ampliado; ético e político, a repensar as bases de nosso conhecimento.
Não apenas suscitando uma mudança, mas sim uma nova relação, uma trans-formação, que
parte da periferia. Ou seja, dos povos que tiveram sua história negada, principalmente,
indígenas.
A perspectiva ampliada da ACT, corrobora diretamente com o Buen Vivir, ao abrir em
CTS e automaticamente na Educomunicação uma reflexão profunda quanto a atuação deste
dois campos. Não mais o estudante pode ser um depósito, mas sim, o sujeito ativo, capaz de
refletir sobre a tecnologia que o cerca e sua função no processo, enquanto parte integrante, e
não instrumento útil. Com isso também este estudante pode ter uma ideia mais ampla da
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cadeia que o cerca, vendo que o próprio desenvolvimento sustentável representa, na atual
conjuntura do século XXI nas sociedades capitalistas e neoliberais, uma categoria que
desponta para o desenvolvimento em si, se é sustentável o desenvolvimento, um planeta é
sustentável enquanto estiver a disposição do próprio desenvolvimento, desse modo,
sustentabilidade é uma subcategoria e não base.
Questionando assim, através da visão ampliada que o Buen Vivir representa uma
virada. Pois já impulsiona os sujeitos à atividade crítica desde a concepção negada. Navarro
(1995) aponta que os guaranis (além de outras nações) possuíam o conceito de “Terra sem
males” onde a relação com o mundo era de cuidado e de relação párea, o humano não era
melhor nem pior que outras espécies, nem reconhecia o poder sobre a Terra que, por sua vez,
não se tratava de um bem, mas sim de uma Mãe. Esta ideia é abarcada também por Boff
(2009), quando nos apresenta o conceito de bem comum:
Que é um bem comum? No plano infra-estrutural é o acesso justo de todos aos bensbásicos como alimentação, saúde, moradia, energia, segurança e comunicação. Noplano humanístico é o reconhecimento, o respeito e a convivência pacífica. Pelo fatode ter sido desmantelado pela virulência da globalização competitiva, o bem comumdeve agora se reconstruído. Para isso, importa dar hegemonia à cooperação e não àcompetição. Sem essa mudança, dificilmente se manterá a comunidade humanaunida e com um futuro que valha a pena. (BOFF, 2009, p. 65)
A Terra é uma casa ou mãe, é um bem comum, que exige o cuidado de todos. Inclusive,
a atenção de áreas que já são por si só críticas, mas que ainda emergem para uma
consolidação mais precisa. Através dessa aliança, esta tríade (Buen Vivir, Educomunicação e
CTS) conseguem se relacionar em um complexo guiado pela transformação sócio-cultural,
partindo também da visão crítica sobre a C&T.
6. UM CASO ANALISADO
Um estudo de caso realizado neste projeto nos revelou um sistema público que embora
parta da ação educomunicativa (mesmo que em caráter de observação preliminar, como
realizamos até então), não alcança resultados compatíveis com o desejável para fomentar uma
prática educomunicativa libertária.
A rádio analisada nos revelou (por meio de um período de observação) a sujeição do
corpo discente a uma lógica que fomenta um modelo vertical, linear e instrumental de educar
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e comunicar. Pois não havia interação entre o corpo docente e discente, modo autônomo e
construtivo, com a rádio. Isto é, esta rádio, em vez de incentivar à autonomia e a práxis da
libertação da comunidade envolvida, assume o papel de mero instrumento de
comunicação/informação, na reprodução de notícias e músicas. E mesmo assim, esta
montagem de programa e de ação, encontra-se permeada pela ausência desejável da
comunidade.
A rádio não atende às premissas básicas do que seria o modelo idealda
Educomunicação, ou seja, um ecossistema que empodere, que consiga estabelecer autonomia
e envolvimento da comunidade, entre outras características. Nosso projeto se
debruçoupreliminarmentena análisea respeito da medida em que se dava esta relação rádio e
público. Constamos um apanhado de faltas, entre elas podemos citar que a programação é
montada e executada exclusivamente por um estagiário do setor de comunicação da escola,
com auxílio de dois bolsistas, desse modo rompe diretamente com às características a pouco
citadas. Esta programação consiste na retransmissão de notícias vinculadas no site da
instituição. Além das notícias se transmitem músicas, escolhidas pelos estagiários ou
bolsistas, ou através de uma caixa de sugestões localizada na mesma sala de onde se parte a
transmissão. Ou seja, a rádio executa em si, um modelo de transmissão meramente reprodutor
de conteúdo.
Neste projeto, acompanhamos e estamos em fase de produção de material e de
conteúdo para oficinas que visem, não somente repassar conteúdo, mas sim produzi-los,
entendê-los, sob uma perspectiva ampliada, a partir principalmente de temática que se liguem
ao Buen Vivir, sejam questões ambientais ou humanas, que garantam que a comunidade
participe ativamente. Esta participação tende a gerar não um conteúdo meramente atrativo,
mas também contemplativo. Que instigue o cuidado com o outro e mundo, na busca pela
harmonia, conforme pensa o Buen Vivir. E CTS está envolvido nesta temática. Pois, para
além das muitas óticas possíveis, é o campo que contribui com as perspectivas críticas que
muito colaboram com os campos analisados. Não podemos tomar a ciência como um
construto unidirecional, portanto, os campos dialogam, se complementam e se aprofundam.
Especialmente, com relação à C&T.
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CONCLUSÃO
Considerando todo percurso realizado, chegamos à conclusão de que a relação entre
CTS, Educomunicação e Buen Vivir são imprescindíveis para compreensão crítica do mundo.
CTS em sua crítica a C&T colabora com a Educomunicação, que por sua vez adota através da
educação/comunicação perspectivas de leitura crítica quanto ao campo tecnológico, não
somente se restringindo a ele, já que os dois campos bebem da mesma fonte, especialmente,
no tocante a ciência. Já Buen Vivir compreende uma esfera que ambos não alcançaram
diretamente, vem a colaborar na fundamentação de vertentes novas, que enxergam além do
convencional, garantindo à ambos possibilidade de análises e de ações. O Buen Vivir abre
ambos os campos, assim como junta-se a eles na caminhada, isto é, Educomunicação e CTS
são percursos também para alcançar o Buen Vivir, e o Buen Vivir soma na construção de
ambos.
Isto tudo nos remete a uma tríade crítica que enxerga na sustentabilidade uma saída,
mas tmabém, ver na conjuntura seu desempenho secundário em relação ao desenvolvimento,
com enfoque sobre o desenvolvimento sustentável. Esta modalidade que não rompe, como
pretende o Buen Vivir (e em sua concepção alinhada aos outros dois campos), com a
sistemática desenvolvimentista. Pois é preciso ir além desse modo, recuperando, inclusive,
modos de vida e de pensamento anteriores a colonização.
A Educomunicação e Buen Vivir se afinam ao passo que podem contribuir
significativamente com intervenções sociais. Alinhadas com as perspectivas críticas de CTS,
esta ampliação pode se tornar ainda mais consistente. É o que se observa na construção de
oficinas por parte desta pesquisa, que articula tais campos na busca pela superação deste
modelo hegemônico de produzir conhecimento e gerar transformação social de realidade,
principalmente, as comunidades mais vitimadas pelo sistema desenvolvimentista, capitalista,
Ocidental. Por isso, é urgente que se conte a história negada, e isto se faz pela reflexão crítica
do hoje, do ontem e do amanhã.
REFERÊNCIAS
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