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KATIUSCIA CORRÊA

No universo escolar, dissertar quer dizer analisar criticamente, discutir um tema, opinar e debater sobre um

assunto de maneira ordenada (começo, meio, fim) e usando uma linguagem que se distancie da norma popular,

coloquial, mas que condene o pedantismo, o purismo, o preciosismo. Ou seja: analisar, escrever sobre um tema

que nos seja oferecido no vestibular usando preferencialmente a linguagem com a qual nos

comunicamos (norma padrão), mas sem gírias, palavrões, lugares-comuns, os quais empobrecem o texto.

Como fazer uma boa dissertação?

A dissertação exige amadurecimento no assunto tratado, conhecimento da matéria, pendor para a reflexão, raciocínio lógico, potencial argumentativo, capacidade de análise e de síntese, além do domínio de expressão verbal adequada e de estruturas lingüísticas específicas.

Como começar uma dissertação?

Normalmente, o aluno de redação manifesta sua angústia: "Não sei como iniciar". Não sabe como iniciar, porque não sabe como desenvolver e como concluir, simplesmente porque não organizou um plano. Nas palavras de Boaventura, "o plano é o itinerário a seguir: 'um ponto de partida', onde se indica o que se quer dizer, e 'um ponto de chegada', onde se conclui. Entre os dois, há as etapas, isto é, as 'partes' da composição. Construir o plano é, em última análise, estabelecer as divisões".

Como estruturar uma dissertação?

A argumentação deve iniciar-se com a apresentação clara e definida do tema ou do juízo que se tem em mente e irá ser comprovado. A "segunda parte" da argumentação destina-se a oferecer as provas ou argumentos que confirmem a tese. É comum colocarem-se os argumentos em ordem crescente de importância. A "terceira fase" consiste em exibir contra-provas ou contra-argumentos e refutá-los, isto é negá-los. Na "última parte", ou síntese

recapitulam-se os argumentos apresentados e conclui-se, com a reafirmação da tese.

O que é dissertação argumentativa?

Na verdade, há dois tipos de dissertação. Podemos falar em dissertação expositiva, em que se expressam idéias sobre determinado assunto, sem a preocupação de convencer o leitor ou ouvinte. Já a dissertação argumentativa implica a defesa de uma tese, com a finalidade de convencer ou tentar convencer alguém, demonstrando, por meio dea evidência de provas consistentes, a superioridade de uma proposta sobre outras ou a relevância dela tão-somente.

O que é preciso para argumentar?

Para argumentar é preciso, em primeiro lugar, saber pensar, encontrar idéias e concatená-las. Assim, embora se trate de categorias diferentes, com objetos próprios, a argumentação precisa ter como ponto de partida elementos da lógica formal. A tese defendida não se impõe pela força, mas pelo uso de "elementos racionais" - portanto toda argumentação "tem vínculos com o raciocínio e a lógica", como disse Oléron na obra já citada.

Marleine Ferreira de Toledo

INTRODUÇÃO

A questão do menor no Brasil

a)ROTEIRO:

“ Para se analisar a questão da violência contra o menor no Brasil é essencial que se discutam suas causas e suas conseqüências”

b) HIPÓTESE (hipo) tese

“A questão da violência contra o menor tem origem na miséria - a principal responsável pela desagregação familiar”

c) PERGUNTAS:

“ É possível imaginar o Brasil como um país desenvolvido e com justiça social enquanto existir tanta violência contra o menor? “

d) HISTÓRICA:

“ Às crianças nunca foi dada a importância devida. Em Canudos e em Palmares não foram poupadas. Na Candelária ou na Praça da Sé continuam não sendo. “

e) COMPARAÇÃO: por aproximação ou oposição

“É comum encontrar crianças de dez anos vendendo balas nas esquinas brasileiras. Na França, nos EUA ou na Inglaterra - países desenvolvidos - nessa idade, as crianças estão na escola e não submetidas a violência das ruas. “

f) DEFINIÇÃO:

“Menor: o mais pequeno, de segundo plano, inferior, aquele que não atingiu a maioridade. O uso da palavra “menor” para se referir às crianças no Brasil já demonstra como são tratadas: em segundo plano.“

g) CONTESTAÇÃO:

“O Brasil é o país do futuro. A criança é o futuro do país. Ora, se a criança no Brasil passa fome, ésubmetida às mais diversas formas de violência física, não tem escola, nem saúde, como pode ser esse o país do futuro? Ou será que a criança não é o futuro do país? “

h) NARRAÇÃO:“Sentar numa frigideira com óleo quente foi o castigo

imposto ao pequeno D., de um ano e meio, pelo pai, alcoólatra. Temendo ser preso, ele levou a criança a um hospital uma semana depois. A mulher, também vitima de espancamentos, o denunciou à polícia. O agressor fugiu. “

i) ESTATÍSTICA:“Quarenta mil crianças morreram hoje no mundo, vítimas

de doenças comuns combinadas com a desnutrição. Para cada criança que morreu hoje, muitas outras vivem com a saúde debilitada. Entre os sobreviventes, metade nunca colocará os pés em uma sala de aula. Isso não éuma catástrofe futura. Isso aconteceu ontem, estáacontecendo hoje. E irá acontecer amanhã, exceto se o mundo decidir proteger suas crianças.”

j) MISTA:

“Crianças mortas em frente a Igreja da Candelária. Denúncias de meninas se prostituindo nas cidades e nos campos. Garotos vendendo balas nas esquinas. Não é possível imaginar o Brasil um país desenvolvido e com justiça social enquanto perdurar tão triste quadro. ‘

Tipos de Desenvolvimento

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a) Desenvolvimento por explicação: esse tipo de desenvolvimento, um dos mais comuns, consiste em elaborar cada parágrafo com base em uma explicação para o problema exposto na introdução. Para fazê-lo, podemos proceder da seguinte forma: após definirmos o ponto de vista ou o assunto a ser apresentado, perguntamos “Por quê?” a essa informação inicial. Cada resposta a esse “Por quê?” resultaráem um parágrafo do desenvolvimento. Vejamos um exemplo produzido a partir do tema “A crise entre o Canadá e o Brasil”.

Definida a tese, o escritor perguntou-lhe “Por quê?” e, com base em cada resposta, produziu os parágrafos do desenvolvimento:

Tese: A proibição do consumo de carne brasileira no Canadá teve fins político-comerciais.

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POR QUÊ?

Argumento 1 (resposta 1): a alegação de que o gado brasileiro estava contaminado é infundada, uma vez que a contaminação só se dá por ingestão de ração animal. No Brasil, os animais são tratados à base de vegetais.

Argumento 2 (resposta 2): uma das maiores empresas do Canadá - a Bombardier - queria conter a expansão de sua principal rival, a brasileira Embraer. Épor isso que houve o boicote à carne brasileira.

Quando o ministro da agricultura canadense proibiu a comercialização desse produto, teve como alegação a suposta contaminação da carne pelo mal da vaca louca. E, de acordo com pesquisadores, o animal só é contaminado pela ingestão de ração animal, ou seja, tal fato não tem fundamento no Brasil, visto que os animais são tratados àbase de vegetais.

Na realidade o Canadá teve o objetivo de brecar a expansão da Embraer, principal concorrente da Bombardier no mercado internacional de jatos regionais de atécinqüenta lugares. Porque o monopólio que a empresa canadense exercia havia alguns anos estava sendo superado pela rival brasileira, Embraer.

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b) Desenvolvimento por causas e conseqüências: expõem-se, obviamente, as causas e as conseqüências do problema abordado. Geralmente se encadeiam as causas em um parágrafo e as conseqüências noutro, mas, como sabemos, não se pode dizer que isso seja uma regra, e sim um costume da redação dissertativa. É possível, ainda, valer-se somente das causas ou somente das conseqüências do problema. Tudo vai depender dos dados e dos conhecimentos de que você dispõe. Leia um exemplo, produzido a partir do tema “Evolução tecnológica e proteção ambiental – como conciliar?”, sugerido pelo Enem. Note que o aluno priorizou as conseqüências que a displicência do homem em relação à natureza pode acarretar:

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Questionamentos sobre o futuro do mundo já estão sendo levantados por muitos cientistas que se preocupam, principalmente, com itens relacionados ao desmatamento. Mais de 45% das florestas tropicais foram desmatadas e nada se tem feito para reverter essa situação.

A sociedade é rodeada de pessoas gananciosas que visam apenas ao seu bem-estar, não importando quanto mal tal procedimento poderá causar aos demais. É o caso, por exemplo, da Amazônia. 25% de sua mata original deu espaço à agricultura e àpecuária, e, atualmente, foi reivindicado ao governo o desflorestamento de mais 25% do restante. Isso gerou certa revolta por parte da população, mas como intervir nesse tipo de problema, que envolve pessoas com muita influência no poder?

c) Desenvolvimento por trajetória histórica: se você tiver um bom conhecimento de história (fruto de seu estudo ou de uma boa coletânea de textos do vestibular!), pode utilizá-lo a seu favor. Épossível ilustrar a defesa de seu ponto de vista ou a exposição de informações por meio de fatos históricos. Nas dissertações escolares, costuma-se fazer isso desta maneira: em um parágrafo, geralmente o primeiro do desenvolvimento, utiliza-se um fato do passado; noutro, o segundo, um do futuro. Se quiser, você também pode elaborar um terceiro parágrafo, no qual se vislumbre uma situação futura. Leia uma dissertação sobre o tema “Em briga de elefantes, é a grama que sai perdendo”. O aluno-escritor, que dispunha de bom referencial histórico, optou por ilustrar o seu ponto de vista com um fato do passado e um do presente. Confira:

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Fatos como a Guerra Fria mostram exorbitantemente isso. Nessa época, as potências URSS e EUA eram os elefantes. Impunham suas políticas intervencionistas em todo e qualquer país sob seu regime. É o caso de nações do Oriente Médio, às vezes financiadas pelos ianques contra o inimigo vermelho ou vice-versa. Esses povos tiveram muitos soldados mortos em prol de seu subdesenvolvimento.

A conotação mais atual, porém não tão recente, da inversão dessa passagem bíblica é o neoliberalismo, principalmente no aspecto social. Os pobres (a grama), cada vez mais pobres, são "exilados" por fugirem dos pisoteios. No entanto, os "elefantes humanos" retomam sua briga nesse novo local. É o que ocorre em virtude das guerras empresariais em que, sedentos por lucro e por superar seus concorrentes, os grandes "engolem" as pequenas empresas e, com toda a sua tecnologia, deixam milhares desempregados.

Essa inversão de valores gera um mundo violento e selvagem. Éinteressante, porém, que, mais que não olhar para as conseqüências, os responsáveis se deixem levar pela sua falsa segurança (o dinheiro) e continuem com sua conduta, imperceptível aos próprios, injusta em relação àhumanidade.

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d) Desenvolvimento por contraste de idéias: na dissertação argumentativa, é possível contrastar argumentos contrários e favoráveis a algum tema e, a partir dessa oposição, posicionar-se (contrária ou favoravelmente, é claro) diante dele. É importante que, nesse embate de idéias, aquelas que respaldam o real ponto de vista do autor sejam nitidamente, digo NITIDAMENTE mesmo, mais convincentes e razoáveis que as adversas.

Veja agora uma dissertação sobre um tema bastante polêmico: A clonagem em seres humanos. Observe que o autor, no primeiro parágrafo do desenvolvimento, explora o lado negativo desse procedimento científico e, no segundo, o positivo.

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Alguns constatam que a clonagem em humanos, para apenas reproduzir novos seres, pode ser perigosa, pois ela não está livre de resultados anômalos. Cite-se o exemplo da ovelha Dolly. Dos 276 embriões manipulados, apenas 29 sobreviveram para serem implantados em ovelhas, e desses somente um teve a reprodução efetivada. Então, da mesma maneira que o sucesso dessa tecnologia nos animais foi custoso, o mesmo pode ocorrer no projeto que envolve humanos.

Entretanto, no ano passado, cientistas apresentaram àsociedade o projeto Genoma, que consistiu na "leitura" dos cromossomos humanos. Com esse avanço da ciência, no futuro, eles pretendem identificar as funções de cada cromossomo, para depois corrigir os erros genéticos. Essas falhas talvez possam ser corrigidas com a "clonagem terapêutica", que visa à regeneração de órgãos e tecidos danificados. A conciliação do Genoma com a clonagem terapêutica pode resultar em uma grande conquista científica.

e) Desenvolvimento a partir de enumeração: sempre que se enumerarem na introdução os argumentos ou informações que constarão dos parágrafos subseqüentes, tratar-se-á de um desenvolvimento a partir de enumeração. É importante, como jávimos, que em cada parágrafo do desenvolvimento seja abordado somente um argumento/informação e que nenhum dos argumentos/informações antecipados na introdução seja “esquecido” na parte mais importante do texto dissertativo. O exemplo a seguir foi produzido a partir do seguinte tema: “O Brasil é o Brasil das novelas?”. À disposição do escritor havia uma coletânea de textos, nos quais era possível encontrar importantes reflexões a respeito dos contrastes entre o Brasil real e o Brasil “maquiado”. Leia:

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As cenas dramáticas de miseráveis pedindo nos semáforos, crianças trabalhando desde muito pequenas, famílias morando em meio ao lixão e sobrevivendo dele, são muito mais freqüentes do que imaginamos.

O governo, preocupado com assuntos “mais importantes”, lembra-se desse povo somente em véspera de eleição. Promete mundos e fundos ou troca votos por qualquer miséria.

Mas não é só o governo que tem culpa do enorme problema. A classe média só pensa em aumentar sua riqueza para não entrar nesse índice de pobreza e os ricos preferem blindar os vidros de seus carros para se proteger dessa população, que teima em incomodar e pela qual não se acham responsáveis.

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f) desenvolvimento por contra-argumentação: é o tipo de desenvolvimento em que o escritor expõe um argumento com o qual não se concorda e, por meio de um contra-argumento mais convincente, refuta-o, nega-o, corrige-o. A dissertação a seguir, cuja estrutura argumentativa foi auxiliada pela consulta a uma farta coletânea de textos, demonstra muito bem como se pode refutar um argumento ou um dado, indicando-lhe a fragilidade e a inconsistência. O tema é “As pesquisas mostram melhoras no Brasil. E a realidade?”. Veja:

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E a desconfiança dessas informações animadoras parte, até mesmo, do próprio FHC, que não consegue relacionar os baixos níveis de renda da população ao aumento do consumo de bens eletrônicos pela mesma. Uma explicação otimista para tais estatísticas pode estar no fato de que a estabilidade monetária aumentou o poder de compra do povo com a queda dos preços e maior facilidade de acesso ao crédito. Porém, melhor condiz com as características da nova sociedade a justificativa de que os únicos responsáveis pelo aumento das vendas são consumidores pertencentes a classe alta da população, com a qual se concentra a maior parte da riqueza do Brasil.

A tal fator pode ser comparada a contraposição entre os 60% de brasileiros com mais de dez anos que não conseguiram concluir o ensino fundamental e o indicador social da pesquisa de que a grande maioria das crianças está matriculada e passa mais tempo estudando. Essa relação deixa claro o caráter maquiador do resultado do Censo, que éaproveitado pelo governo como forma de autopromoção e não representa um retrato fiel da sociedade.

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TemaA ÉTICA NA POLÍTICA

Ética na Política? Da sagrada ingenuidade dos céticos ao realismo maquiavélico.

Por Antônio Ozaí da Silva (docente na UEM e doutorando na Faculdade de Educação da Universidade de S. Paulo).

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Até que ponto a política é compatível com a ética? A política pode ser eficiente se incorporar a ética? Não seria puro moralismo exigir que a política considere os valores éticos?

Quando se trata da relação entre ética e política não hárespostas fáceis. Há mesmo quem considere que esta é uma falsa questão, em outras palavras, que ética e política são como a água e o vinho: não se misturam. Quem pensa assim, adota uma postura que nega qualquer vínculo da política com a moral: os fins justificam os meios.

O ‘realismo político’, ou seja, a busca de resultados a qualquer preço, subtrai os atos políticos à qualquer avaliação moral, entendendo esta como restrita à vida privada, dissociando o indivíduo do coletivo.

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Esta concepção sobre a relação ética e política desconsidera que a moral também é um fator social e como tal não pode se restringir ao santuário da consciência dos indivíduos. Em outras palavras, embora a moral se manifeste pelo comportamento do indivíduo, ela expressa uma exigência da sociedade (um exemplo disso é a adoção dos diversos "códigos de ética"). Ou seja, não leva em conta que a política nega ou afirma certa moral e que, em última instância, a política também é avaliada pelo comportamento e entendimento moral das pessoas. Aliás, se a política almeja legitimidade não pode, entre outros fatores, dispensar o consenso dos cidadãos — o que pressupõe o apelo à moral.

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Há também os que, ingenuamente ou não, adotam critérios moralizantes para julgar os atos políticos. Por conseguinte, condicionam a política à pureza abstrata reservada ao ‘sagrado’ espaço da consciência individual. Estes imaginam poder realizar a política apenas pelos meios puros.

O moralismo abstrato concentra a atenção na esfera da vida privada, do indivíduo. Portanto, aprisiona a política à moral intimista e subjetiva deste. Ao centrar a atenção na esfera individual, o moralista julga o governante tão-somente por suas virtudes e vícios, enfatizando suas esperanças na transformação moral dos indivíduos.

Ao agir assim reduz um problema de teor social e coletivo a um problema individual. No limite, chega à conclusão de que as questões sociais podem ser solucionadas se convencermos os indivíduos isoladamente a contribuírem, por exemplo, dividindo sua riqueza como os desafortunados.

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O resultado é catastrófico: o moralista angustia-se porque a política não se enquadra nos seus valores morais individuais e termina por renunciar à própria ação política. Dessa forma, contribui objetivamente para que prevaleça outra política.

De um lado o ‘realismo político’; de outro, o moralismo absoluto. Nem tanto mar, nem tanto terra. A política e a moral, embora expressem esferas de ação e de comportamento humano específicas e distintas, são igualmente importantes para a ação humana no sentido da transformação social.

Política e moral são formas de comportamento que não se identificam (a primeira enfatiza o coletivo; a segunda o indivíduo). Nem a política pode absorver a moral, nem esta pode ser reduzida à política. Embora sejam esferas diferentes, há a necessidade de uma relação mútua que não anule as características particulares de cada uma. Portanto, nem a renúncia à política em nome da moral; nem a exclusão absoluta da política.

Mas, ainda fica a pergunta inicial: é possível a ética na política? [...]

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DISSERTAÇÃO EM 1ª PESSOA

Aquilo por que viviTrês paixões, simples, mas irresistivelmente fortes, governaram-me a

vida: o anseio de amor, a busca do conhecimento e a dolorosa piedade pelo sofrimento da humanidade. Tais paixões, como grandes vendavais, impeliram-me para aqui e acolá, em curso, instável, por sobre o profundo oceano de angústia, chegando às raias do desespero.

Busquei, primeiro, o amor, porque ele produz êxtase – um êxtase tão grande que, não raro, eu sacrificava todo o resto da minha vida por umas poucas horas dessa alegria. Ambicionava-o, ainda, porque o amor nos liberta da solidão – essa solidão terrível através da qual nossa trêmula percepção observa, além dos limites do mundo, esse abismo frio e exânime. Busquei-o, finalmente, porque vi na união do amor, numa miniatura mística, algo que prefigurava a visão que os santos e os poetas imaginavam. Eis o que busquei e, embora isso possa parecer demasiado bom para a vida humana, foi isso que – afinal – encontrei.

Com paixão igual, busquei o conhecimento. Eu queria compreender o coração dos homens. Gostaria de saber por que cintilam as estrelas. E procurei apreender a força pitagórica pela qual o número permanece acima do fluxo dos acontecimentos. Um pouco disto, mas não muito, eu o consegui.

Amor e conhecimento, até ao ponto em que são possíveis, conduzem para o alto, rumo ao céu. Mas a piedade sempre me trazia de volta à terra. Ecos de gritos de dor ecoavam em meu coração. Crianças famintas, vítimas torturadas por opressores, velhos desvalidos a construir um fardo para seus filhos, e todo o mundo de solidão, pobreza e sofrimentos, convertem numa irrisão o que deveria ser a vida humana. Anseio por avaliar o mal, mas não posso, e também sofro.

Eis o que tem sido a minha vida. Tenho-a considerado digna de ser vivida e, de bom grado, tornaria a vivê-la, se me fosse dada tal oportunidade.

(Bertrand Russel, Autobiografia. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1967.)

"Jamais se desespere em meio às mais sombrias aflições de sua vida, pois das nuvens mais negras cai água límpida e fecunda.“

(Provérbio chinês)

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