Efeitos oculares de medicação sistémica

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At um medicamento ser lanado no mercado passa por um programa de testes intensivo, no qual se avalia a sua farmacocintica (isto , a absoro, distribuio, metabolismo e excreo), a farmacodinmica (mecanismo e aco), as doses teraputicas, a via ptima de administrao, e aos potenciais efeitos txicos. Este processo demora, normalmente, vrios anos. J depois do lanamento no mercado, os mdicos devem estar atentos a novos efeitos que podero surgir da sua utilizao, e particip-los a entidades competentes, como o INFARMED, ou a FDA (Food and Drug Administration).

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Boa histria clnica, com medicao actual e eventuais sintomas durante o perodo de administrao do medicamento. Exame fsico: no s do olho, mas tambm inspeco geral; ex: midrase, por toma de imipramina (antidepressivo com efeitos anticolinrgicos); rash cutneo, devido a bloqueador ; rash em forma de borboleta, tpico do LES, quando secundrio a isoniazida deve-se pesquisar sinais de neuropatia ptica, que um efeito lateral do mesmo frmaco. Importncia da suspeio, at porque os doentes, normalmente, no referem queixas oculares ao mdico assistente. Se suspeita referenciar atempadamente ao mdico assistente, informando sobre os achados do exame ocular.

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Os antihistamnicos H1, que inibem os receptores H1 perifricos da histamina, so um grupo de frmacos bem conhecido no tratamento da rinite alrgica, e na urticria crnica. Os efeitos laterais so raros e desaparecem normalmente mesmo com a manuteno da terapeutica. Os mais frequentes relacionam-se com a sua aco atropine-like, e so as dilatao pupilar, viso turva e queratoconjuntivite seca. Recentemente foram descritos de 9 casos de crises oculogricas relacionadas com a cetirizina, 8 deles em crianas, que cederam com a interrupo do tratamento.

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Os corticosterides so frmacos bastante conhecidos pelas suas propriedades antiinflamatrias, e que podem ser utilizados topicamente, por toma oral, via inalatria ou endovenosa. Em termos de efeitos laterais, destaca-se: -aumento da PIO, devido a alteraes estruturais e funcionais no sistema de drenagem do humor aquoso, e risco de evoluo para glaucoma de ngulo aberto; este aumento reversvel, mas o tempo para diminuio do mesmo inverso durao do tratamento com estes frmacos. -catarata subcapsular posterior, com opacidades que comeam no plo posterior com pontos policromticos, e que , nesta fase, caracterstica de toxicidade por corticosterides. Mesmo com a interrupo do tratamento, raramente h regresso da catarata. Aconselha-se reavaliao a cada 3 meses destas duas situaes.

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A amiodarona um frmaco utilizado em diversas arritmias cardacas. Os efeitos oculares so comuns, e dependem da dose e durao do tratamento. A crnea a estrutura mais afectada, e quase todos os doentes medicados apresentam linhas castanho-claro, verticiladas ou estreladas, da zona interpalpebral do epitlio da crnea, a chamada crnea verticilada. O efeito lateral mais grave sem dvida a neuropatia ptica. Apresenta uma evoluo insidiosa, progresso lenta, perdas visuais bilaterais e edema da papila, e mantem-se alguns meses aps a suspenso do frmaco. A causa ainda no conhecida, mas pensa-se que possa estar relacionada com uma doena de armazenamento de lpidos, isto uma lipidose, induzida pela amiodarona, a nvel do nervo ptico, e que dificulta o fluxo axonal. Isto acrescido ao facto da maioria dos doentes j apresentar doena vascular da retina, leva progresso das perdas visuais, com edema da cabea do nervo ptico. Aconselha-se a avaliao oftalmolgica a cada 6 a 12 meses.

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Os bloqueadores da entrada de clcio so frmacos com aco vasodilatadora e diminuem a fora de contrao cardaca, por isso usados na teraputica da hipertenso, e tambm como antiarritmicos. O efeito lateral mais comum neste grupo de frmacos a dor ocular, sobretudo com a nifedipina, e que se relaciona com a vasodilatao. Verificam-se ainda, situaes de eritema palpebral e conjuntival, e edema periorbital e lacrimejo. Foi descrito recentemente um caso de isquemia da retina transitria e unilateral aps a toma do frmaco, que se pensa estar relacionada com um fenmeno de steal. Isto , a artria oftlmica esquerda mais rgida, com maior grau de aterosclerose, no foi capaz de dilatar to eficazmente, acabando o sangue por ser desviado para os vasos que mais dilataram.

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Os nitratos so vasodilatadores coronrios e sistmicos, muito usados no contexto da angina de peito e nas urgncias hipertensivas, por administrao sistmica ou sublingual. A nvel ocular produzem tambm vasodilatao, incluindo da circulao da retina e coroide, sendo que durante muito tempo foram associados a aumento da PIO, pensando-se que seriam contra-indicados em doentes com glaucoma. Mas recentemente demonstrou-se que podero, pelo contrrio, conferir proteco contra a isquemia das celulas ganglionares da retina por provocarem vasodilatao na retina temporal. Esto ainda descritos casos de miopia transitria, situao que se poder relacionar com espasmos ciliares.

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A digoxina um glicosdeo cardaco que aumenta a output cardaco sem aumentar o consumo de oxignio. Por ter um reduzido intervalo de segurana frequente haver efeitos txicos relacionados com a sobredosagem. A nvel do olho verificam-se defeitos no azul/amarelo, que se explicam pela inibio da bomba de sdio-potssio dos fotoreceptores, e que regridem alguns meses aps normalizao dos valores teraputicos. Todos os doentes medicados com digoxina devero fazer regularmente testes da viso a cores. Esto descritos ainda escotomas pericentrais e alucinaes visuais.

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Os IECAs, ou inibidores da enzima de converso da angiotensina so potentes antihipertensores, muito importantes na proteco renal de doentes diabticos hipertensos. Alm disso, verifica-se melhoria das leses retinopatia diabtica nos doentes medicados com estes frmacos. Relativamente a outros frmacos, h um maior risco de angioedema envolvendo o olho e a rbita, mas a sua incidncia muito reduzida. O edema angioneurtico ocorre geralmente algumas semanas aps o inicio do tratamento, mas pode surgir apenas alguns anos depois da primeira exposio.

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Os bloqueadores adrenrgicos so dos frmacos mais prescritos em todo o mundo, e diferem entre si em vrias caractersticas, nomeadamente na sua lipossolubilidade, que determina se podero ou no atingir o SNC e o olho, levando manifestao de efeitos oculares. Todos provocam olho seco, e diminuio da secreo de lisozima na lgrima, dificultando o uso de lentes de contacto. Tambm diminuem a PIO, podendo mascarar situaes de glaucoma primrio de ngulo aberto.

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A varfarina um anticoagulante com baixo ndice de segurana, pelo que muito frequentemente ocorrem situaes de toxicidade, que se manifestam como hemorragias macias da retina. So mais frequentes quando h doenas tecidulares e fragilidade capilar, como na degenerescencia macular relacionada com a idade.

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As estatinas so frmacos cada vez mais utilizados no tratamento das dislipidemias. Os efeitos oculares so raros, mas esto descritos casos de olho seco, viso turva, e hemorragias da retina. Sabe-se ainda que podem aumentar a PIO.

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Este grupo de frmacos, conhecidos pelas fenotiazinas, utilizado para o tratamento de diversas formas de psicose, e na esquizofrenia. O sintoma mais comum a diminuio da viso devido aos efeitos anticolinrgicos destes frmacos, que condicionam diminuio da acomodao. Pode ver-se poeira fina de pigmento na crnea ou no cristalino, com evoluo para catarata subcapsular anterior. Verifica-se ainda retinopatia pigmentar periferica, e alguns casos avanados podem envolver a mcula. Aconselha-se o acompanhamento a cada 6 meses.

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Estes trs frmacos pertencem ao grupo dos antiepilpticos, e a gabapentina ainda utilizada na dor neuroptica. Causam efeitos laterais muito semelhantes, e com relativa frequncia, como nistagmo, diplopia e viso turva. O topiramato aumenta a aco do GABA, um neurotransmissor inibitrio, com aco semelhante aos inibidores da anidrase carbnica, e que provocam edema do corpo ciliar, miopia transitria bilateral, alm de poderem precipitar episdios de glaucoma de ngulo fechado. importante relacionar o glaucoma com o frmaco em questo, de modo a fazer-se o diagnostico diferencial com o glaucoma de angulo fechado por bloqueio pupilar, para o qual seria necessrio correco cirrgica. Se o medicamento for interrompido, a PO volta ao normal em algumas horas.

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Este grupo de frmacos, dos inibidores selectivos da recaptao de serotonina, cada vez mais prescrito em todo o mundo, pelas suas aces antidepressivas. Pela sua aco anticolinrgica produz, frequentemente midrase com diminuio da capacidade de acomodao, assim como diminuio da secreo lacrimal. H caso descritos de aumento dos movimentos oculares durante a noite, efeito que pode persistir at 19 meses aps interrupo do frmaco.

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Os ansiolticos do tipo das benzodiazepinas, so tambm frmacos muito prescritos em todo o mundo. Podem, ocasionalmente, provocar midrase e diminuio da capacidade de acomodao, e olho seco, devido aos efeitos anticolinrgicos. Tm vindo a ser detectados vrios casos de diplopia. Alguns ansiolticos originam um metabolito que funciona como antignio, despertando uma reaco de hipersensibilidade, levando a uma conjuntivite alrgica que se manifesta ao fim de meia hora e pode durar dois dias.

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Os retinides so derivados sintticos da vitamina A, utilizados no tratamento de formas graves e desfigurantes de acne que no respondem a terapias convencionais. O mais utilizado a isotretinona. Os efeitos oculares relacionam-se com a dose, e constituem os efeitos laterais mais importantes deste grupo de frmacos. A isotretinona secretada na lgrima causando diminuio da actividade das glndulas de Meibomian. Isto condiciona olho seco, blefaroconjuntivite com irritao da crnea, e justifica a intolerncia de alguns dos doentes ao uso de lentes de contacto. Pode ocorre diminuio da viso nocturna, manifestando-se at dois anos aps o inicio do tratamento, e que poder ser irreversvel. Um dos efeitos mais graves verificado recentemente o aumento da presso intracraneana, por aumento da produo e diminuio da reabsoro de LCR. Desenvolve-se em poucas horas aps o inicio do tratamento, e pode ser diagnosticada por queixas sugestivas, como nauseas, vmitos e cefaleias, e observao de edema da papila.

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As hormonas da tiride so utilizadas como teraputica de substituio nas deficincias glandulares, tais como o hipotiroidismo e bcio. O efeito lateral mais frequente o olho seco. Em idades peditricas, incluindo na adolescencia, podem dar alteraes da PIC, com edema da papila. Normalmente os efeitos desaparecem alguns meses aps suspenso da medicao. A sobredosagem pode levar manifestao de sintomas myasthenia-like, tais como diplopia, ptose e paralisia dos musculos extraoculares.

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utilizada nas mulheres na fase da menopausa, para diminuio dos sintomas tpicos e diminuio do risco de osteoporose. um tratamento hormonal base de componente estrognico, com ou sem progestativo. Como h receptores hormonais nas glndulas de meibomian, podem provocar alterao da composio da lgrima, com olho seco. A intolerncia s lentes de contacto uma das queixas mais frequentes.

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A contracepo oral faz-se base dos mesmos tipos de frmacos usados na THS, pelo que os efeitos laterais so semelhantes. No entanto, h um risco acrescido de alteraes vasculares da retina, j que alguns componentes tm potencial trombognico elevado, e estes tratamentos so normalmente efectuados durante mais tempo que a THS.

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Os IBP so utilizados largamente em todo o mundo, no tratamento da lcera gastrica e na esofagite de refluxo. No tm efeitos laterais importantes, apenas e raramente alucinaes visuais e vertigens.

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A cloroquina um antimalrico, e no passado era tambm utilizada no tratamento de doenas vasculares do colagnio. Actualmente tem vindo a ser substituida pela hidroxicloroquina, que tem menos efeitos secundrios. Os doentes referem viso turva com dificuldade na focagem, alterao da viso a cores. Pode-se observar cornea verticilada. A retina apresenta ligeiro ponteado pigmentado da mcula, diminuio ou perda do reflexo normal da fvea, e maculopatia tipo olho de boi. Em caso extremos poder ocorrer atrofia ptica. Pelos risco possveis, os doentes devero ser observados a cada 3 meses.

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O etambutol e a isoniazida so usados no tratamento da tuberculose, inibindo o crescimento bacteriano, e os efeitos oculares por eles produzidos dependem da dose e durao do tratamento. Ambos podem provocar diminuio da acuidade visual ou de campos visuais, alterao da viso a cores, e escotomas paracentrais. A isoniazida pode ainda provocar alucinaes visuais. Pode ocorrer atrofia ptica uni ou bilateral, mas a progresso para cegueira rara. importante que os doentes sejam observados antes do inicio do tratamento, e depois de 6 em 6 meses.

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A nvel de terapeutica broncodilatadora importa falar nos agonistas dos receptores adrenrgicos , que so utilizados por via inalatria, no alvio sintomtico nas crises de asma, e no tratamento da DPOC. A nvel do olho provocam midrase e diminuio da capacidade de acomodao, e hiperemia conjuntival crnica por vasodilatao local. muito comum o aparecimento de hemorragias petquiais conjuntivais.

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Os bifosfonatos so frmacos muito utilizados sobretudo na mulher na menopausa, porque inibem a reabsoro ssea caracterstica desta fase, diminuindo o risco de evoluo para osteoporose. Eles diferem entre si pela sua eficcia e efeitos laterais, mas todos esto associados a reaces inflamatrias a nvel do olho. Pensa-se que estes efeitos estejam relacionados com o facto de formarem imunocomplexos secretados pela glandula lacrimal, causando irritao das mucosas, e por vezes obrigam interrupo do tratamento. O pamidronato foi o primeiro frmaco descrito a causar esclerite, uma situao que provoca dor ocular severa, e pode levar a alteraes estruturais do globo ocular, e perda de viso.

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Este um grupo muito heterogneo de frmacos, utilizados em situaes inflamatrias, com dor e febre, sobretudo nas queixas osteoarticulares, e no caso da aspirina usada na profilaxia de acidentes tromboemblicos. O efeito mais frequente e comum a todos a miopia transitria, cujo mecanismo foi j explicado, e que resolve ao fim de 2 a 3 meses aps supenso do tratamento. So tambm segregados pela glndula lacrimal, causando conjuntivite transitria , agravamento de olho seco e de situaes de queratite. A alterao da viso a cores pode durar at 8 meses aps interrupo do frmaco. A indometacina, utilizada na gota, est ainda relacionada com o aparecimento de depsitos corneanos com padro em vrtex, e aumenta a fotosensibilidade da mcula, pelo que se deve encorajar a proteco solar.

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Os frmacos utilizados no tratamento da disfuno erctil so vasodilatadores , e podem causar alteraes da viso a cores e viso turva, que normalmente se iniciam 15 minutos aps a toma. Tambm aumentam a sensibilidade luz, e alguns doentes referem flashes sobretudo quando pestanejam. Estes frmacos podem ser utilizados com segurana em doentes com glaucoma e degenerescncia da mcula. No entanto, e apesar de at hoje no ter sido provada a relao com neuropatia ptica isqumica no arteritica, se houver algum sintoma de perda subita de viso, o frmaco dever ser interrompido.

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A camomila usada sob a forma de cha, em situaes de insonia, indigesto, cefaleias, bronquite, febre, gripe. Sabe-se que, se for aplicado sob os olhos, pode causar conjuntivites graves, sobretudo em doentes que por si so j tm algum grau de alergia ao polen da camomila. As folhas da datura so utilizadas para tratar inflamao ocular, asmas, bronquite, constipaes e gripes. Elas contem alcaloides, em concentraes muito variadas, com efeitos anticolinergicos e parasimpaticoliticos, e por isso produzem dilatao pupilar. O gingko bilob usado como estimulante do SNC, com efeitos esperados de aumento da concentrao e da memoria. Tem ainda efeitos anticoagulantes, aumentando o tempo de sangramento. Podem aparecer hifemas espontaneos e hemorragias da retina. A echinacea usada nas constipaes, tosse, febre e infeces urinrias. Pode produzir reaces anafilticas graves, com conjuntivite e edema periobitrio. Esta provado que aumenta as respostas autoimunes, devendo por isso ser evitada em doentes com este tipo de doenas.

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