E'IIDÊNCIAS DA UTILIDADE DA - Cochrane Brasil · Adetecção de anor- ... 70%, no caso específico...

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E'IIDÊNCIAS DA UTILIDADE DA ULTRA... SONOGRAFIA NA GESTAÇÃO Abrão Elias Abdalla •. Eder Viana de Souza •. Álvaro Nagib Atallah Por muito tempo nos acostumamos a 'ir de colegas mais velhos a frase "na lha experiência ...", quando se referiam nelhores formas de tratamento eJou ~nóstico das mais diversas patologias. A Medicina baseada em evidências ~iu para trabalhar com fatos e não osições. Baseia-se em provas científi- rigorosas-!' e tem por objetivo: Nortear as tomadas de decisões so- bre os cuidados em saúde. Compromisso da busca explícita e honesta das melhores evidências científicas da literatura médica. A experiência do médico e a concor- dância do paciente informado sem os riscos e benefícios da conduta. Na medicina baseada em evidências ere-se utilizar o resultado do ensaio co para a tomada de decisões tera- .icas e não se satisfazer apenas com a ia fisiopatológica. A teoria passa a ser uma hipótese a estada em um ensaio clínico.' Todas as revisões sistemáticas ten- responder uma pergunta de saúde mente formulada. Utilizam métodos rigorosos e explíci- ara identificar, selecionar e avaliar de ~ira crítica os trabalhos de investiga- elevantes. \ informação obtida com essa meto- ~ia é analisada posteriormente com dos estatísticos para finalmente .entar-se como revisão. l .... _..•_;::: Sintetizar as informações sobre determinado tópico. Integrar informações de forma crítica para auxiliar as decisões. Ser um método científico reprodutível. Determinar a generalização dos acha- dos científicos. Permitir avaliar as diferenças entre os estudos sobre o mesmo tópico. Explicar as diferenças e contradições encontradas entre os estudos indi- viduais. Aumentar o poder estatístico para detectar possíveis diferenças entre os grupos com tratamentos diferentes. Aumentar a precisão da estimativa dos dados, reduzindo o intervalo de confiança. Refletir melhor a realidade. As revisões sistemáticas têm a vanta- gem de seguir métodos científicos rigoro- sos; poderem ser reproduzidas, criticadas e a crítica incorporada em sua publicação eletrônica. É importante ressaltar ainda que com elas se evitam duplicações de esforços, já que, quando feitas uma vez, poderão ser divulgadas e utilizadas mun- dialmente. Além disso, podem tornar-se uma publicação viva, facilmente atualiza- da de tempos em tempos. Para essa tarefa, na década de 1990, foi criada na Inglaterra a Fundação Cochra- ne, organização sem fins lucrativos e sem fontes de financiamento internacionais, que tem por objetivo ajudar as pessoas a tomar decisões baseadas em informações de boa qualidade na área da saúde. Sua missão é preparar, manter e asse- de. Em outubro de 1996 foi inaugurado o Centro Cochrane do Brasil, com os mes- mos objetivos. A ultra-sonografia (US). como exame fundamental para a boa prática médica, não poderia deixar de ser avaliada, princi- palmente no que concerne ao seu uso na Ginecologia e Obstetrícia, visto serem estas especialidades talvez as mais bene- ficiadas pelo seu uso. Em revisão de 2001, Neilson 11 avali- ou o uso da US rotineira no início da gra- videz (primeiro exame feito antes de 24 semanas), tendo como objetivo detectar se haveria melhores resultados em com- paração ao seu uso seletivo. isto é. quan- do indicado por razões clínicas específi- cas. Nove ensaios foram incluídos. O exa- me ultra-sonográfico rotineiro esteve associado à detecção mais precoce da gravidez múltipla e uma redução da fre- qüência de indução do parto por gravidez pós-termo. Não houve diferenças detecta- das no que diz respeito a desfechos clíni- cos significativos tais como mortalidade perinata!. Nos casos em que a detecção de anormalidades fetais era objetivo específico da revisão, aumentou o núme- ro de interrupções da gravidez por ano- malia fetal. Concluiu-se, então, que a US rotineira na gravidez precoce parece me- lhorar a avaliação da idade gestacional, detecção mais precoce da gestação múl- tipla e detecção mais precoce de mal for- mação fetal não suspeitada clinicamen- te. Entretanto, não se observaram bene- ficios no que diz respeito a outros desfe- chos clínicos significativos como a mor- talidade perinatal.

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E'IIDÊNCIAS DA UTILIDADE DAULTRA...SONOGRAFIA NA GESTAÇÃO

Abrão Elias Abdalla •. Eder Viana de Souza •. Álvaro Nagib Atallah

Por muito tempo nos acostumamos a'ir de colegas mais velhos a frase "nalha experiência ...", quando se referiamnelhores formas de tratamento eJou~nóstico das mais diversas patologias.A Medicina baseada em evidências

~iu para trabalhar com fatos e nãoosições. Baseia-se em provas científi-rigorosas-!' e tem por objetivo:

Nortear as tomadas de decisões so-bre os cuidados em saúde.Compromisso da busca explícita ehonesta das melhores evidênciascientíficas da literatura médica.A experiência do médico e a concor-dância do paciente informado sem osriscos e benefícios da conduta.

Na medicina baseada em evidênciasere-se utilizar o resultado do ensaioco para a tomada de decisões tera-.icas e não se satisfazer apenas com aia fisiopatológica.A teoria passa a ser uma hipótese aestada em um ensaio clínico.'Todas as revisões sistemáticas ten-responder uma pergunta de saúdemente formulada.Utilizam métodos rigorosos e explíci-ara identificar, selecionar e avaliar de~ira crítica os trabalhos de investiga-elevantes.\ informação obtida com essa meto-~ia é analisada posteriormente comdos estatísticos para finalmente.entar-se como revisão.l ...._..•_;::: I·

• Sintetizar as informações sobredeterminado tópico.

• Integrar informações de forma críticapara auxiliar as decisões.

• Ser um método científico reprodutível.• Determinar a generalização dos acha-

dos científicos.• Permitir avaliar as diferenças entre os

estudos sobre o mesmo tópico.• Explicar as diferenças e contradições

encontradas entre os estudos indi-viduais.

• Aumentar o poder estatístico paradetectar possíveis diferenças entre osgrupos com tratamentos diferentes.

• Aumentar a precisão da estimativados dados, reduzindo o intervalo deconfiança.

• Refletir melhor a realidade.

As revisões sistemáticas têm a vanta-gem de seguir métodos científicos rigoro-sos; poderem ser reproduzidas, criticadase a crítica incorporada em sua publicaçãoeletrônica. É importante ressaltar aindaque com elas se evitam duplicações deesforços, já que, quando feitas uma vez,poderão ser divulgadas e utilizadas mun-dialmente. Além disso, podem tornar-seuma publicação viva, facilmente atualiza-da de tempos em tempos.

Para essa tarefa, na década de 1990,foi criada na Inglaterra a Fundação Cochra-ne, organização sem fins lucrativos e semfontes de financiamento internacionais,que tem por objetivo ajudar as pessoas atomar decisões baseadas em informaçõesde boa qualidade na área da saúde.

Sua missão é preparar, manter e asse-

de. Em outubro de 1996 foi inaugurado oCentro Cochrane do Brasil, com os mes-mos objetivos.

A ultra-sonografia (US). como examefundamental para a boa prática médica,não poderia deixar de ser avaliada, princi-palmente no que concerne ao seu uso naGinecologia e Obstetrícia, visto seremestas especialidades talvez as mais bene-ficiadas pelo seu uso.

Em revisão de 2001, Neilson 11 avali-ou o uso da US rotineira no início da gra-videz (primeiro exame feito antes de 24semanas), tendo como objetivo detectarse haveria melhores resultados em com-paração ao seu uso seletivo. isto é. quan-do indicado por razões clínicas específi-cas. Nove ensaios foram incluídos. O exa-me ultra-sonográfico rotineiro esteveassociado à detecção mais precoce dagravidez múltipla e uma redução da fre-qüência de indução do parto por gravidezpós-termo. Não houve diferenças detecta-das no que diz respeito a desfechos clíni-cos significativos tais como mortalidadeperinata!. Nos casos em que a detecçãode anormalidades fetais era objetivoespecífico da revisão, aumentou o núme-ro de interrupções da gravidez por ano-malia fetal. Concluiu-se, então, que a USrotineira na gravidez precoce parece me-lhorar a avaliação da idade gestacional,detecção mais precoce da gestação múl-tipla e detecção mais precoce de mal for-mação fetal não suspeitada clinicamen-te. Entretanto, não se observaram bene-ficios no que diz respeito a outros desfe-chos clínicos significativos como a mor-talidade perinatal.

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932 ULTRA-SONOGRAFIA EM GINECOLOGIA EOBSTETRíCIA

rastreamento de anomalias fetais atravésda mensuração da translucência nucal.Encontraram uma revisão não sistemáticade 13 estudos com aproximadamente56.000 gestantes? Apenas seis estudos,com 8.840 gestantes, apresentaram rJS-treamento em populações de baixo riscoou não selecionadas. A detecção de anor-malidades crornossômicas em geral foi de70%, no caso específico da trissomia do21 foi de 62%, o valor de falso-positivoencontrado foi de 4%. Um estudo pros-pectivo longitudinal de grande amostra-gern (96.127 gestantes}" demonstrouque a rnensuração da translucência nucalassociada à idade materna identifica 82%dos fetos portadores de síndrome deDown e 78% das gestações com outrasanomalias cromossômicas. A avaliação foibaseada em um algo ritmo que incluiu ida-de materna, prevalência da trissomia do21 na idade materna referida, compri-mento-crânio-caudal do feto e translucên-cia nucal; 8% das gestantes com gesta-ções normais foram consideradas comode alto risco para a síndrome de Down(risco~ 1:300).

Revisões sistemáticas, também, avali-aram os procedimentos invasivos para adetecção das anomalias cromossômicasfetais. Uma das revisões comparou a bióp-sia de vilo corial e a amniocentese no se-gundo trimestre.' O abortamento espon-tâneo foi maior nas gestantes submetidasà biópsia de vila corial (45515037 19%1v299/403017%); OR 1,37,95% IC 1,18). Ou-tra revisão comparou a amniocentese pre-coce (realizada antes de 14 semanas degestação) com a biópsia de vilo corial?Neste caso, a amniocentese apresentou pi-ores resultados (40/915 14%1 vs 21191712%);OR 1,92,95% IC 1,15-3,20).

A metánalise constitui-se lima dasmais importantes armas da Medicinabaseada em evidências.

Westergaard e cOIS.,15por exemplo,analisaram estudos controlados e rando-mizados do uso da dopplerfluxometriaem gestações de alto risco com objetivode identificar quais as gestações de altorisco beneficiar-se-iam do método.

Foram encontrados 13 estudos commetodologia adequada, seis destes estu-

dos incluíam apenas o uso da dopplerflu-xometria nas gestações com crescimentointra-útero fetal restrito (ClR)e doença hi-pertensiva específica da gestação (DHEG),os outros estudos incluíam uma grandevariedade de gestações de alto risco. Aavaliação dos seis primeiros estudos foimais uniforme demonstrando uma signi-ficante redução das internações antenata-is (OR 0,56; le 95%, 0,43-0,72), induçãodo parto (0,78; 0,63-0,96).

Pós-estratificação pode se observarque nas gestações com suspeita de ClRe/ou DHEG o uso da Dopplerfluxometriada artéria umbilical reduz o número demortes perinatais e intervenções obsté-tricas desnecessárias.

O uso da US na segunda metade dagestação, também, foi avaliado." Porexemplo, a detecção de anormalidadesfetais pela US no terceiro trimestre dagestação foi de 19%.

Metánalise da utilização rotineira daUS após 24 semanas de gestação com22.202 gestantes de baixo risco não de-monstrou beneficias do método quantoao número de internações, intervençõesneonatais (reanimação, ventilação e tera-pia intensiva), morbidade e mortalidadeperinatais.

Neste momento, dezenas de revisõessobre os mais variados interesses daMedicina estão em curso, sendo feitos ouatualizados, procurando sempre a melhoratuação e fundamentados em evidênciasinquestionáveis.

Em suma, utilizar ou fazer revisõessistemáticas da literatura é atuar sinteti-zando informações adequadas, definin-do evidências que validam as interven-ções que usamos no dia-a-dia. E atual-mente, é considerada a forma de evidên-cia mais confiável para tomada de deci-sões em saúde.'?

Os médicos precisam familiarizar-secom ela, pois hoje todos os livros, aulasatualizadas, diretrizes clínicas, congressose análises de economia em saúde necessi-tam das revisões sistemáticas como os na-vegadores precisavam das bússolas no pas-sado. É também a maneira mais eficientedo médico manter-se atualizado.

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Ultra-Sonografia em Ginecologia e ObstetríciaCo!>yright© 2003 by Livraria e Editora Revinter Ltda.

ISBN85-7309-747-7

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