EL PRÍNCIPE DESTRONADO E O DESAFIO DE TRADUZIR … · trair a poética escritural de sua...

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80 EL PRÍNCIPE DESTRONADO E O DESAFIO DE TRADUZIR MIGUEL DELIBES Robson LEITÃO Virginia CASCO Resumo Este é um romance inédito em português, como a maioria dos livros de Delibes. A responsabilidade para traduzi-lo requer cuidado especial, pois nele o autor espanhol fez de Quico, um menino de quatro anos, o centro observador de um mundo abalado pela Guerra Civil, a parr da convivência com seus familiares e com sua babá, e sem jamais perder o olhar lúdico e pueril, comum às crianças sem uma consciência formada. Escrito em 1964 e lançado somente em 1973, El príncipe destronado uliza, na voz do protagonista, estruturas de linguagem de quem ainda está aprendendo a se expressar e, no contexto social da época em que é situada a narrava, muitas palavras e expressões que desapareceram ou caíram em desuso, o que torna o verter para o português um trabalho ainda mais complexo e cuidadoso. Somos dois nesta empreitada. Um brasileiro e uma uruguaia de nascimento, mas brasileira naturalizada. Unimos os conhecimentos de nossas línguas maternas e a paixão pela literatura para tentar, mesmo que isso possa ser quesonado por muitos tradutores, sermos o mais fiel possível ao eslo escritural de Delibes, em uma obra que, para nós, é primorosa e rica em retratar a linguagem e o pensamento infanl. Nossos quesonamentos e discussões são inúmeros, sempre na busca por palavras e expressões adequadas, ou mais apropriadas, para não deturparmos seu real sendo, mantendo-o o mais próximo do original. E, à medida que avançamos página a página, temos a consciência do grande desafio que nos aguarda no próximo capítulo. EL PRÍNCIPE DESTRONADO E O DESAFIO DE TRADUZIR MIGUEL DELIBES 1 Robson LEITÃO (UFF) 2 Virginia CASCO (UFRJ) 3 Resumo Este é um romance inédito em português, como a maioria dos livros de Delibes. A responsabilidade para traduzi-lo requer cuidado especial, pois nele o autor espanhol fez de Quico, um menino de quatro anos, o centro observador de um mundo abalado pela Guerra Civil, a parr da convivência com seus familiares e com sua babá, e sem jamais perder o olhar lúdico e pueril, comum às crianças sem uma consciência formada. Escrito em 1964 e lançado somente em 1973, El príncipe destronado uliza, na voz do protagonista, estruturas de linguagem de quem ainda está aprendendo a se expressar e, no contexto social da época em que é situada a narrava, muitas palavras e expressões que desapareceram ou caíram em desuso, o que torna o verter para o português um trabalho ainda mais complexo e cuidadoso. Somos dois nesta empreitada. Um brasileiro e uma uruguaia de nascimento, mas brasileira naturalizada. Unimos os conhecimentos de nossas línguas maternas e a paixão pela literatura para tentar, mesmo que isso possa ser quesonado por muitos tradutores, sermos o mais fiel possível ao eslo escritural de Delibes, em uma obra que, para nós, é primorosa e rica em retratar a linguagem e o pensamento infanl. Nossos quesonamentos e discussões são inúmeros, sempre na busca por palavras e expressões adequadas, ou mais apropriadas, para não deturparmos seu real sendo, mantendo-o o mais próximo do original. E, à medida que avançamos página a página, temos a consciência do grande desafio que nos aguarda no próximo capítulo. recepção: 10/09/2013 aprovação: 20/10/2013 recepção: 10/09/2013 aprovação: 20/10/2013

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EL PRÍNCIPE DESTRONADO E O DESAFIO DE TRADUZIR MIGUEL DELIBES

Robson LEITÃO

Virginia CASCO

Resumo

Este é um romance inédito em português, como a maioria dos livros de Delibes. A responsabilidade para traduzi-lo requer cuidado especial, pois nele o autor espanhol fez de Quico, um menino de quatro anos, o centro observador de um mundo abalado pela Guerra Civil, a partir da convivência com seus familiares e com sua babá, e sem jamais perder o olhar lúdico e pueril, comum às crianças sem uma consciência formada. Escrito em 1964 e lançado somente em 1973, El príncipe destronado utiliza, na voz do protagonista, estruturas de linguagem de quem ainda está aprendendo a se expressar e, no contexto social da época em que é situada a narrativa, muitas palavras e expressões que desapareceram ou caíram em desuso, o que torna o verter para o português um trabalho ainda mais complexo e cuidadoso. Somos dois nesta empreitada. Um brasileiro e uma uruguaia de nascimento, mas brasileira naturalizada. Unimos os conhecimentos de nossas línguas maternas e a paixão pela literatura para tentar, mesmo que isso possa ser questionado por muitos tradutores, sermos o mais fiel possível ao estilo escritural de Delibes, em uma obra que, para nós, é primorosa e rica em retratar a linguagem e o pensamento infantil. Nossos questionamentos e discussões são inúmeros, sempre na busca por palavras e expressões adequadas, ou mais apropriadas, para não deturparmos seu real sentido, mantendo-o o mais próximo do original. E, à medida que avançamos página a página, temos a consciência do grande desafio que nos aguarda no próximo capítulo.

EL PRÍNCIPE DESTRONADO E O DESAFIO DE TRADUZIR MIGUEL DELIBES1

Robson LEITÃO (UFF)2

Virginia CASCO (UFRJ)3

Resumo

Este é um romance inédito em português, como a maioria dos livros de Delibes. A responsabilidade para traduzi-lo requer cuidado especial, pois nele o autor espanhol fez de Quico, um menino de quatro anos, o centro observador de um mundo abalado pela Guerra Civil, a partir da convivência com seus familiares e com sua babá, e sem jamais perder o olhar lúdico e pueril, comum às crianças sem uma consciência formada. Escrito em 1964 e lançado somente em 1973, El príncipe destronado utiliza, na voz do protagonista, estruturas de linguagem de quem ainda está aprendendo a se expressar e, no contexto social da época em que é situada a narrativa, muitas palavras e expressões que desapareceram ou caíram em desuso, o que torna o verter para o português um trabalho ainda mais complexo e cuidadoso. Somos dois nesta empreitada. Um brasileiro e uma uruguaia de nascimento, mas brasileira naturalizada. Unimos os conhecimentos de nossas línguas maternas e a paixão pela literatura para tentar, mesmo que isso possa ser questionado por muitos tradutores, sermos o mais fiel possível ao estilo escritural de Delibes, em uma obra que, para nós, é primorosa e rica em retratar a linguagem e o pensamento infantil. Nossos questionamentos e discussões são inúmeros, sempre na busca por palavras e expressões adequadas, ou mais apropriadas, para não deturparmos seu real sentido, mantendo-o o mais próximo do original. E, à medida que avançamos página a página, temos a consciência do grande desafio que nos aguarda no próximo capítulo.

recepção: 10/09/2013aprovação: 20/10/2013

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Palavras-chave

Miguel Delibes, El príncipe destronado, Tradução, Infância, Guerra-civil espanhola.

Corpo de texto

El príncipe destronado é um romance ainda inédito em língua portuguesa. Aliás, como a grande maioria dos livros do espanhol Miguel Delibes (1920 - 2010) tanto no Brasil quanto em Portugal, que até o presente não foi traduzida para nosso idioma. Portanto, a responsabilidade de traduzir El príncipe destronado (sem trair a poética escritural de sua narrativa) é enorme e requer cuidado redobrado de quem se predispõe a fazê-lo, pois nele o autor fez de Quico, um menino de quatro anos, o centro observador de um mundo abalado pelo “franquismo”, período que se seguiu ao fim da Guerra Civil Espanhola, e os horrores ditatoriais impostos às pessoas comuns, sempre a partir da convivência com seus familiares e com sua babá, porém sem jamais perder aquele olhar lúdico e pueril, comum às crianças ainda sem uma consciência formada e que absorvem todas as influências do universo que as cerca. Quico é, sem dúvida, a personagem central deste romance, eleito por Delibes como o eixo delimitador da narrativa.

De acordo com isto, a crítica María Isabel Vázquez Fernández informa que, nos romances de Miguel Delibes, a personagem alcança sempre o primeiro plano e se torna determinante da estrutura e técnica narrativas (2007), confirmando sua linha de raciocínio com o que o próprio autor diz: El personaje es para mí el eje de la narración y, en consecuencia, el resto de los elementos que se conjugan en una novela deben plegarse a sus exigencias (DELIBES: 2004, p. 109 apud VÁZQUEZ FERNÁNDEZ: 2007, p. 126).

Vázquez Fernández acrescenta ainda que

Al ser el centro de la composición, la atención del relato recae sobre él. Dado el interés del autor por el hombre individual, sus novelas se vertebran en torno a un protagonista individual, el cual

Palavras-chave

Miguel Delibes, El príncipe destronado, Tradução, Infância, Guerra-civil espanhola.

Corpo de texto

El príncipe destronado é um romance ainda inédito em língua portuguesa. Aliás, como a grande maioria dos livros do espanhol Miguel Delibes (1920 - 2010) tanto no Brasil quanto em Portugal, que até o presente não foi traduzida para nosso idioma. Portanto, a responsabilidade de traduzir El príncipe destronado (sem trair a poética escritural de sua narrativa) é enorme e requer cuidado redobrado de quem se predispõe a fazê-lo, pois nele o autor fez de Quico, um menino de quatro anos, o centro observador de um mundo abalado pelo “franquismo”, período que se seguiu ao fim da Guerra Civil Espanhola, e os horrores ditatoriais impostos às pessoas comuns, sempre a partir da convivência com seus familiares e com sua babá, porém sem jamais perder aquele olhar lúdico e pueril, comum às crianças ainda sem uma consciência formada e que absorvem todas as influências do universo que as cerca. Quico é, sem dúvida, a personagem central deste romance, eleito por Delibes como o eixo delimitador da narrativa.

De acordo com isto, a crítica María Isabel Vázquez Fernández informa que, nos romances de Miguel Delibes, a personagem alcança sempre o primeiro plano e se torna determinante da estrutura e técnica narrativas (2007), confirmando sua linha de raciocínio com o que o próprio autor diz: El personaje es para mí el eje de la narración y, en consecuencia, el resto de los elementos que se conjugan en una novela deben plegarse a sus exigencias (DELIBES: 2004, p. 109 apud VÁZQUEZ FERNÁNDEZ: 2007, p. 126).

Vázquez Fernández acrescenta ainda que

Al ser el centro de la composición, la atención del relato recae sobre él. Dado el interés del autor por el hombre individual, sus novelas se vertebran en torno a un protagonista individual, el cual

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cumple la función de hilo conductor, dando unidad y coherencia al relato. [...] En cuanto a la técnica narrativa, el personaje es también factor determinante. Las posibles relaciones autor-personaje, establecidas por Valle-Inclán, parten de la posición que adopte el primero respecto al segundo y, según la cual, el prisma visual de observación puede ser: desde el suelo, frente a frente o desde el aire. A estas tres visiones corresponden otros tantos tratamientos y resultados: el héroe, el personaje de la novela realista y el muñeco de guiñol o títere, respectivamente. A las tres formas citadas, habría que añadir otra posición autorial: la identificación del autor con el personaje que parte de la comprensión hacia él. Este es el caso de Delibes, que se ciñe a sus personajes en actitud de afecto y, lejos de juzgarles, penetra en su interior para tomar su propia conciencia. (VÁZQUEZ FERNÁNDEZ, 2007, p. 138, 140-141)

Escrito em 1964 e lançado somente em 1973, este 15º romance publicado por Miguel Delibes utiliza, na voz do principal protagonista, estruturas de linguagem de quem ainda está aprendendo a se expressar e, no contexto social da época em que é situada a narrativa, muitas palavras e expressões que desapareceram ou caíram em desuso, o que torna o (con)verter este trabalho para o português um exercício bastante complexo e, sem dúvida, cuidadoso e exaustivo. É importante lembrarmos que este livro específico incorpora reminiscências da infância do próprio autor e que segue, de perto, um padrão estabelecido por ele ao tentar reproduzir, o mais fidedignamente possível, hábitos, situações, falas e formas de vida de pessoas que vivenciaram a realidade espanhola, principalmente em e a partir de Valladolid, sua cidade natal. Não que isto seja fundamental para o conhecimento do tradutor, mas ajuda e muito na adequação referencial e contextual durante o processo de tradução-versão de seus romances. Que, em nosso caso, trata-se de El príncipe destronado.

Sobre a técnica narrativa que Delibes normalmente emprega em seus romances, novamente neste ele a repete, selecionando apenas um fragmento de vida da personagem central, ao invés de estabelecer uma história de vida completa,

cumple la función de hilo conductor, dando unidad y coherencia al relato. [...] En cuanto a la técnica narrativa, el personaje es también factor determinante. Las posibles relaciones autor-personaje, establecidas por Valle-Inclán, parten de la posición que adopte el primero respecto al segundo y, según la cual, el prisma visual de observación puede ser: desde el suelo, frente a frente o desde el aire. A estas tres visiones corresponden otros tantos tratamientos y resultados: el héroe, el personaje de la novela realista y el muñeco de guiñol o títere, respectivamente. A las tres formas citadas, habría que añadir otra posición autorial: la identificación del autor con el personaje que parte de la comprensión hacia él. Este es el caso de Delibes, que se ciñe a sus personajes en actitud de afecto y, lejos de juzgarles, penetra en su interior para tomar su propia conciencia. (VÁZQUEZ FERNÁNDEZ, 2007, p. 138, 140-141)

Escrito em 1964 e lançado somente em 1973, este 15º romance publicado por Miguel Delibes utiliza, na voz do principal protagonista, estruturas de linguagem de quem ainda está aprendendo a se expressar e, no contexto social da época em que é situada a narrativa, muitas palavras e expressões que desapareceram ou caíram em desuso, o que torna o (con)verter este trabalho para o português um exercício bastante complexo e, sem dúvida, cuidadoso e exaustivo. É importante lembrarmos que este livro específico incorpora reminiscências da infância do próprio autor e que segue, de perto, um padrão estabelecido por ele ao tentar reproduzir, o mais fidedignamente possível, hábitos, situações, falas e formas de vida de pessoas que vivenciaram a realidade espanhola, principalmente em e a partir de Valladolid, sua cidade natal. Não que isto seja fundamental para o conhecimento do tradutor, mas ajuda e muito na adequação referencial e contextual durante o processo de tradução-versão de seus romances. Que, em nosso caso, trata-se de El príncipe destronado.

Sobre a técnica narrativa que Delibes normalmente emprega em seus romances, novamente neste ele a repete, selecionando apenas um fragmento de vida da personagem central, ao invés de estabelecer uma história de vida completa,

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dentro da perspectiva início/meio/fim. Segundo explica Alfonso Rey, em seu artigo Tradición y originalidad en Delibes, este autor não costuma desenvolver a história de suas personagens da forma mais tradicional ou usual, optando quase sempre pela fragmentação:

La novela psicológica del pasado siglo, y también la del presente, tendía a ofrecer una amplia panorámica de la vida (la infancia en varios casos) y deteniéndose en un momento o hecho que diera una sensación de redondez y conclusión. Podía ser éste el matrimonio, el final de alguna aventura, la llegada a la madurez, la conclusión de una intensa experiencia vital o, sencillamente, la muerte. Contando de este modo, el autor completaba la vida del personaje dando un sentido a su trayectoria vital y seleccionando, de entre los mil datos de la vida diaria, los más significativos para el desarrollo final, apoyándose en bastantes casos en una trama complicada. Es así, por citar un ejemplo, como Galdós o Clarín escribieron sus más conocidas novelas. En las de Delibes falta ese desarrollo total. El autor suele seleccionar un fragmento cualquiera de la vida de los personajes, sin que exista exactamente un principio y un final. Hay, meramente, un fragmento de vida. (REY in JIMÉNEZ LOZANO, 1993)

Outro crítico, Francisco Javier Higuero, também aponta para o fato de o autor ostentar uma grande sensibilidade, pouco comum na literatura espanhola, no tratamento do mundo infantil:

[...] Estos niños están en relación dialógica entre sí y también con el mundo de los adultos, aunque no lo comprendan. [...] El príncipe destronado es una experiencia inacabada, quizá un tanteo que sólo pretendía mostrar las tragedias del mundo infantil, bajo el yugo y la incomprensión de los adultos. (HIGUERO in JIMÉNEZ LOZANO, 1993).

Não por acaso, Delibes expressa com desenvoltura ímpar a visão e o comportamento esperado de uma criança de apenas quatro anos, como é o

dentro da perspectiva início/meio/fim. Segundo explica Alfonso Rey, em seu artigo Tradición y originalidad en Delibes, este autor não costuma desenvolver a história de suas personagens da forma mais tradicional ou usual, optando quase sempre pela fragmentação:

La novela psicológica del pasado siglo, y también la del presente, tendía a ofrecer una amplia panorámica de la vida (la infancia en varios casos) y deteniéndose en un momento o hecho que diera una sensación de redondez y conclusión. Podía ser éste el matrimonio, el final de alguna aventura, la llegada a la madurez, la conclusión de una intensa experiencia vital o, sencillamente, la muerte. Contando de este modo, el autor completaba la vida del personaje dando un sentido a su trayectoria vital y seleccionando, de entre los mil datos de la vida diaria, los más significativos para el desarrollo final, apoyándose en bastantes casos en una trama complicada. Es así, por citar un ejemplo, como Galdós o Clarín escribieron sus más conocidas novelas. En las de Delibes falta ese desarrollo total. El autor suele seleccionar un fragmento cualquiera de la vida de los personajes, sin que exista exactamente un principio y un final. Hay, meramente, un fragmento de vida. (REY in JIMÉNEZ LOZANO, 1993)

Outro crítico, Francisco Javier Higuero, também aponta para o fato de o autor ostentar uma grande sensibilidade, pouco comum na literatura espanhola, no tratamento do mundo infantil:

[...] Estos niños están en relación dialógica entre sí y también con el mundo de los adultos, aunque no lo comprendan. [...] El príncipe destronado es una experiencia inacabada, quizá un tanteo que sólo pretendía mostrar las tragedias del mundo infantil, bajo el yugo y la incomprensión de los adultos. (HIGUERO in JIMÉNEZ LOZANO, 1993).

Não por acaso, Delibes expressa com desenvoltura ímpar a visão e o comportamento esperado de uma criança de apenas quatro anos, como é o

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caso aqui de Quico. Vejamos um exemplo disso, quando o menino brinca com um tubo de pasta de dentes, fazendo de conta que é um canhão, e pede para sua mãe enxugar o brinquedo: “- ¿Ves? Me se ha mojado el cañón. Sécamele.” (DELIBES, 1988, p. 15)

Na linguagem infantil, empregada por Delibes na voz de Quico, por várias vezes, algumas expressões e estruturas gramaticais serão ditas propositadamente erradas, se referendadas pela norma culta da língua espanhola. Mas que costumam estar “corretas” no linguajar infantil. No exemplo acima, a estrutura correta da frase, em espanhol, seria: ¿Ves? Se me ha mojado el cañón. Sécamelo. Ou seja alterando-se a posição do pronome direto “me” e “corrigindo” a contração “Sécamele” - errada - para “Sécamelo”. Porém, o que é errado para a norma padrão ou culta é correto no modo de expressar de uma criança, cuja capacidade cognitiva ainda é pequena, pois está em desenvolvimento. Isto nos levou, a nós que ousamos traduzir este romance, a muitos questionamentos sobre a forma em que trabalharíamos em conjunto.

Somos dois indivíduos distintos. Um brasileiro e uma uruguaia de nascimento, embora brasileira naturalizada. Unimos os conhecimentos de nossas línguas maternas, as lembranças de nossas infâncias e a paixão pela literatura para tentar, mesmo que isso possa ser questionado por muitos tradutores, sermos o mais fiel possível ao estilo escritural de Delibes, nesta obra que, para nós, é primorosa e rica em retratar a linguagem e a percepção infantis. Entretanto, percebemos com clareza que El príncipe destronado não é um livro infanto-juvenil, mas um livro que apresenta, a partir da perspectiva infantil, o retrato de uma típica família espanhola da década de 1960, que tem seu cotidiano de conflitos internos influenciado pelo regime ditatorial do general Franco, sem que este seja exatamente o foco central da narrativa. Nossa percepção é confirmada pela de Vázquez Fernández:

Muchas novelas de Delibes registran dichos enfrentamientos en el interior de las familias: las distintas posiciones ideológicas frente

caso aqui de Quico. Vejamos um exemplo disso, quando o menino brinca com um tubo de pasta de dentes, fazendo de conta que é um canhão, e pede para sua mãe enxugar o brinquedo: “- ¿Ves? Me se ha mojado el cañón. Sécamele.” (DELIBES, 1988, p. 15)

Na linguagem infantil, empregada por Delibes na voz de Quico, por várias vezes, algumas expressões e estruturas gramaticais serão ditas propositadamente erradas, se referendadas pela norma culta da língua espanhola. Mas que costumam estar “corretas” no linguajar infantil. No exemplo acima, a estrutura correta da frase, em espanhol, seria: ¿Ves? Se me ha mojado el cañón. Sécamelo. Ou seja alterando-se a posição do pronome direto “me” e “corrigindo” a contração “Sécamele” - errada - para “Sécamelo”. Porém, o que é errado para a norma padrão ou culta é correto no modo de expressar de uma criança, cuja capacidade cognitiva ainda é pequena, pois está em desenvolvimento. Isto nos levou, a nós que ousamos traduzir este romance, a muitos questionamentos sobre a forma em que trabalharíamos em conjunto.

Somos dois indivíduos distintos. Um brasileiro e uma uruguaia de nascimento, embora brasileira naturalizada. Unimos os conhecimentos de nossas línguas maternas, as lembranças de nossas infâncias e a paixão pela literatura para tentar, mesmo que isso possa ser questionado por muitos tradutores, sermos o mais fiel possível ao estilo escritural de Delibes, nesta obra que, para nós, é primorosa e rica em retratar a linguagem e a percepção infantis. Entretanto, percebemos com clareza que El príncipe destronado não é um livro infanto-juvenil, mas um livro que apresenta, a partir da perspectiva infantil, o retrato de uma típica família espanhola da década de 1960, que tem seu cotidiano de conflitos internos influenciado pelo regime ditatorial do general Franco, sem que este seja exatamente o foco central da narrativa. Nossa percepção é confirmada pela de Vázquez Fernández:

Muchas novelas de Delibes registran dichos enfrentamientos en el interior de las familias: las distintas posiciones ideológicas frente

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al hecho bélico intensifica la oposición ya existente, alimentando rencores y fomentando rivalidades; Cinco horas con Mario o El príncipe destronado son ejemplos ilustrativos. […] El príncipe destronado: las tensiones internas del matrimonio derivan siempre en el desprecio de papá a mamá, humillándola y recordándole a su padre y su condición de vencido. […] Además, quizá porque en la sociedad española el padre suele ostentar la fuerza impositiva familiar, el ambiente bélico es más notorio en El príncipe destronado […]. (VÁZQUEZ FERNÁNDEZ, 2007, p.109-10)

Sob esta percepção, logo de início, muitas questões surgiram sobre o caminho que devíamos tomar. Traduzir, apenas, convertendo as palavras em espanhol para o que melhor se encaixasse em português? Adaptar o texto para o contexto mais próximo à realidade de nossos países, a partir das vivências que tivemos nos períodos das ditaduras no Brasil e no Uruguai? Reescrevermos, em português, “O príncipe destronado”, tornando-nos coautores do livro de Miguel Delibes?

Destas opções, a última era a que mais nos incomodava, porque ouvimos de alguns tradutores atuais que isto vem acontecendo e de forma consciente, acreditando-se que a atualização da língua e, por conseguinte do contexto semântico, pode atrair mais e melhor uma nova geração de leitores. Sim, porque o número de leitores no Brasil tem crescido no que diz respeito aos livros escritos na atualidade, dentro de uma linha editorial que se adéqua principalmente para o público jovem, dinâmico e que tem pouco ou nenhum interesse pelos clássicos. Aqui, poderiam nos questionar sobre nosso entendimento do que é “clássico” e até onde El príncipe destronado se enquadra em tal categoria. Porém, mais que tentar enquadrar este pequeno romance em quaisquer categorias, escolhemos em comum acordo não desvirtuá-lo da proposta de seu autor. Melhor: daquela que entendemos ser a sua proposta. Pois havíamos percebido que, se Delibes escolhera dar a voz protagonista a um menino de quatro anos e mostrar seu universo pela ótica infantil, até mesmo pela voz do narrador onipresente, tínhamos que respeitar isto o máximo possível. Pois não foi outra a decisão

al hecho bélico intensifica la oposición ya existente, alimentando rencores y fomentando rivalidades; Cinco horas con Mario o El príncipe destronado son ejemplos ilustrativos. […] El príncipe destronado: las tensiones internas del matrimonio derivan siempre en el desprecio de papá a mamá, humillándola y recordándole a su padre y su condición de vencido. […] Además, quizá porque en la sociedad española el padre suele ostentar la fuerza impositiva familiar, el ambiente bélico es más notorio en El príncipe destronado […]. (VÁZQUEZ FERNÁNDEZ, 2007, p.109-10)

Sob esta percepção, logo de início, muitas questões surgiram sobre o caminho que devíamos tomar. Traduzir, apenas, convertendo as palavras em espanhol para o que melhor se encaixasse em português? Adaptar o texto para o contexto mais próximo à realidade de nossos países, a partir das vivências que tivemos nos períodos das ditaduras no Brasil e no Uruguai? Reescrevermos, em português, “O príncipe destronado”, tornando-nos coautores do livro de Miguel Delibes?

Destas opções, a última era a que mais nos incomodava, porque ouvimos de alguns tradutores atuais que isto vem acontecendo e de forma consciente, acreditando-se que a atualização da língua e, por conseguinte do contexto semântico, pode atrair mais e melhor uma nova geração de leitores. Sim, porque o número de leitores no Brasil tem crescido no que diz respeito aos livros escritos na atualidade, dentro de uma linha editorial que se adéqua principalmente para o público jovem, dinâmico e que tem pouco ou nenhum interesse pelos clássicos. Aqui, poderiam nos questionar sobre nosso entendimento do que é “clássico” e até onde El príncipe destronado se enquadra em tal categoria. Porém, mais que tentar enquadrar este pequeno romance em quaisquer categorias, escolhemos em comum acordo não desvirtuá-lo da proposta de seu autor. Melhor: daquela que entendemos ser a sua proposta. Pois havíamos percebido que, se Delibes escolhera dar a voz protagonista a um menino de quatro anos e mostrar seu universo pela ótica infantil, até mesmo pela voz do narrador onipresente, tínhamos que respeitar isto o máximo possível. Pois não foi outra a decisão

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do autor. Para exemplificarmos melhor este nosso posicionamento, vejamos o primeiro parágrafo do livro:

Entreabrió los ojos y, al instante, percibió el resplandor que se filtraba por la rendija del cuarterón, mal ajustado, de la ventana. Contra la luz se dibujaba la lámpara de sube y baja, de amplias alas —el Ángel de la Guarda— la butaca tapizada de plástico rameado y las escalerillas metálicas de la librería de sus hermanos mayores. La luz, al resbalar sobre los lomos de los libros, arrancaba vivos destellos rojos, azules, verdes y amarillos. Era un hermoso muestrario y en vacaciones, cuando se despertaba a la misma hora de sus hermanos, Pablo le decía: “Mira, Quico, el Arco Iris”. Y él respondía, encandilado: “Sí, el Arco Iris; es bonito, ¿verdad?”(DELIBES, 1988, p. 09)

Antecedendo a este parágrafo, como um título, encontra-se “Las 10”. Pois o livro segue cronologicamente algumas horas na vida do menino Quico, no dia 03 de dezembro de 1963, uma terça-feira. E aqui temos mais uma preocupação do autor em querer manter a verossimilhança. O leitor não precisa, em tese, preencher lacunas temporais dentro da narrativa. É como se lesse “em tempo real”, à medida que as situações acontecem na vida daquele menino e em seu entorno.

Agora, vejamos como traduzimos o parágrafo inicial de El príncipe destronado:Entreabriu os olhos e, instantaneamente, percebeu o brilho que escoava através

da fresta do postigo, mal ajustado, da janela. No contra luz se desenhavam a luminária de sobe e desce, de amplas asas - o Anjo da Guarda -, a poltrona estofada de plástico florido e as escadinhas metálicas da estante de seus irmãos mais velhos. A luz, ao resvalar sobre a lombada dos livros, produzia vivos lampejos vermelhos, azuis, verdes e amarelos. Era um belo mostruário e nas férias, quando acordava à mesma hora de seus irmãos, Pablo lhe dizia: “Olha, Quico, o Arco-Íris”. E ele respondia deslumbrado: “Sim, o Arco-Íris! É bonito, não é?”

Delibes nos oferece, como porta de entrada para seu romance, o “despertar” de Quico para mais um dia de sua vida, que pode ser igual à vida de muitos

do autor. Para exemplificarmos melhor este nosso posicionamento, vejamos o primeiro parágrafo do livro:

Entreabrió los ojos y, al instante, percibió el resplandor que se filtraba por la rendija del cuarterón, mal ajustado, de la ventana. Contra la luz se dibujaba la lámpara de sube y baja, de amplias alas —el Ángel de la Guarda— la butaca tapizada de plástico rameado y las escalerillas metálicas de la librería de sus hermanos mayores. La luz, al resbalar sobre los lomos de los libros, arrancaba vivos destellos rojos, azules, verdes y amarillos. Era un hermoso muestrario y en vacaciones, cuando se despertaba a la misma hora de sus hermanos, Pablo le decía: “Mira, Quico, el Arco Iris”. Y él respondía, encandilado:“Sí, el Arco Iris; es bonito, ¿verdad?”(DELIBES: 1988, p. 09)

Antecedendo a este parágrafo, como um título, encontra-se “Las 10”. Pois o livro segue cronologicamente algumas horas na vida do menino Quico, no dia 03 de dezembro de 1963, uma terça-feira. E aqui temos mais uma preocupação do autor em querer manter a verossimilhança. O leitor não precisa, em tese, preencher lacunas temporais dentro da narrativa. É como se lesse “em tempo real”, à medida que as situações acontecem na vida daquele menino e em seu entorno.

Agora, vejamos como traduzimos o parágrafo inicial de El príncipe destronado:Entreabriu os olhos e, instantaneamente, percebeu o brilho que escoava através

da fresta do postigo, mal ajustado, da janela. No contra luz se desenhavam a luminária de sobe e desce, de amplas asas - o Anjo da Guarda -, a poltrona estofada de plástico florido e as escadinhas metálicas da estante de seus irmãos mais velhos. A luz, ao resvalar sobre a lombada dos livros, produzia vivos lampejos vermelhos, azuis, verdes e amarelos. Era um belo mostruário e nas férias, quando acordava à mesma hora de seus irmãos, Pablo lhe dizia: “Olha, Quico, o Arco-Íris”. E ele respondia deslumbrado: “Sim, o Arco-Íris! É bonito, não é?”

Delibes nos oferece, como porta de entrada para seu romance, o “despertar”

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outros meninos, em idade próxima ou semelhante, mas vivendo em sua mesma época, pois muitos dos objetos descritos a partir deste parágrafo são pertinentes ao mobiliário da década de 1960. O que nos fez buscar também, em nossas memórias, o referencial de nossos antigos lares e dos lares de nossos vizinhos, quando éramos ainda crianças. E, de repente, nos vimos à caça de lembranças e de um vocabulário que evocavam nossas próprias infâncias. Um desses momentos aconteceu quando nos deparamos com o seguinte parágrafo:

El niño bajaba las escaleras primero con el pie izquierdo y, seguidamente, juntaba el izquierdo con el derecho en el mismo escalón, pero lo hacía rápido, casi automáticamente, a fin de no retrasar el apresurado descenso de la Vítora. La tienda estaba tres casas más allá y el niño, de la mano de la chica, recorrió la distancia, restregando su dedo anular por la línea de edificios. En la tienda olía a chocolate, a jabón y a la tierra de las patatas. Avelino distribuía el género en rejillas de aluminio y Quico recorrió con los ojos los casilleros coloreados con alcachofas, zanahorias, cebollas, patatas, lechugas y, por encima, los paquetes sugestivos de chocolate, galletas, cubanitos, macarrones y, más arriba aún, las botellas de vino negro y las de vino rojo y las de vino blanco y, a mano derecha, los tarros con los caramelos. (DELIBES, 1988, p. 18)

Foi curioso como ambos nos trasladamos ao passado e nos vimos em alguma quitanda ou mercearia de bairro, onde eram vendidos vários produtos, entre alimentícios e de limpeza. Porém, nossas lembranças, embora parecidas, eram de contextos e regiões bem diferentes. Assim como os nomes e características de alguns produtos dos quais recordávamos, na tentativa de nos aproximarmos da realidade descritiva daquele armazém em que o menino Quico e sua babá Vítora encontravam-se, na Espanha. Foram também muitas as pesquisas que fizemos para diminuir as dúvidas e, em alguns casos, optamos ainda por manter alguns termos no original, como podemos observar na tradução do parágrafo acima referido:

de Quico para mais um dia de sua vida, que pode ser igual à vida de muitos outros meninos, em idade próxima ou semelhante, mas vivendo em sua mesma época, pois muitos dos objetos descritos a partir deste parágrafo são pertinentes ao mobiliário da década de 1960. O que nos fez buscar também, em nossas memórias, o referencial de nossos antigos lares e dos lares de nossos vizinhos, quando éramos ainda crianças. E, de repente, nos vimos à caça de lembranças e de um vocabulário que evocavam nossas próprias infâncias. Um desses momentos aconteceu quando nos deparamos com o seguinte parágrafo:

El niño bajaba las escaleras primero con el pie izquierdo y, seguidamente, juntaba el izquierdo con el derecho en el mismo escalón, pero lo hacía rápido, casi automáticamente, a fin de no retrasar el apresurado descenso de la Vítora. La tienda estaba tres casas más allá y el niño, de la mano de la chica, recorrió la distancia, restregando su dedo anular por la línea de edificios. En la tienda olía a chocolate, a jabón y a la tierra de las patatas. Avelino distribuía el género en rejillas de aluminio y Quico recorrió con los ojos los casilleros coloreados con alcachofas, zanahorias, cebollas, patatas, lechugas y, por encima, los paquetes sugestivos de chocolate, galletas, cubanitos, macarrones y, más arriba aún, las botellas de vino negro y las de vino rojo y las de vino blanco y, a mano derecha, los tarros con los caramelos. (DELIBES: 1988, p. 18)

Foi curioso como ambos nos trasladamos ao passado e nos vimos em alguma quitanda ou mercearia de bairro, onde eram vendidos vários produtos, entre alimentícios e de limpeza. Porém, nossas lembranças, embora parecidas, eram de contextos e regiões bem diferentes. Assim como os nomes e características de alguns produtos dos quais recordávamos, na tentativa de nos aproximarmos da realidade descritiva daquele armazém em que o menino Quico e sua babá Vítora encontravam-se, na Espanha. Foram também muitas as pesquisas que fizemos para diminuir as dúvidas e, em alguns casos, optamos ainda por manter alguns termos no original, como podemos observar na tradução do parágrafo acima referido:

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O menino descia as escadas primeiro com o pé esquerdo e, em seguida, juntava o esquerdo com o direito, no mesmo degrau, mas o fazia rápido, quase automaticamente, a fim de não atrasar a apressada descida da Vítora. O armazém ficava três casas mais à frente e o menino, de mãos dadas com a moça, percorreu a distância, passando seu dedo anular pela linha dos prédios. O armazém cheirava a chocolate, a sabão e à terra das batatas. Avelino distribuía a mercadoria em engradados de alumínio e Quico percorreu com o olhar os caixotes coloridos com alcachofras, cenouras, cebolas, batatas, alfaces e, acima deles, os sugestivos pacotes de chocolates, biscoitos, cubanitos, macarrones e, bem mais acima, as garrafas de vinho tinto e as de vinho rosé e as de vinho branco, e, do lado direito, os potes de vidro com doces.

No caso dos cubanitos e macarrones, não encontramos nada parecido que pudéssemos utilizar como tradução ou versão compreensível. Assim, optamos aqui por colocar um pé de página, onde explicamos que cubanitos podem tanto ser um tipo de doce cubano, no formato de canutilho recheado, ou também uma massa de pão de ló, recheada e com cobertura, de origem espanhola, encontrada principalmente em Sevilha. Macarrones é a adaptação do francês macaron, nome de um doce arredondado, feito com amêndoas, açúcar e claras.

O uso do pé de página, na tradução de romances, é raro, mas nossa escolha se baseou no que já dissemos antes, ou seja, tentarmos nos aproximar o máximo possível do texto original e não substituirmos alguns termos por outros aproximados que, neste caso específico, não iriam condizer com os tipos de doces observados pela personagem Quico. E o ato de traduzir, como sabemos, exige decisões como esta.

Umberto Eco, em seu livro Quase a mesma coisa - experiências de tradução, diz:

Traduzir significa sempre “cortar” algumas das consequências que o termo original implicava. Nesse sentido, ao traduzir não se diz nunca a mesma coisa. A interpretação que precede cada tradução deve estabelecer quantas e quais das possíveis consequências ilativas que o termo sugere podemos cortar. Sem nunca estarmos completamente seguros de que não perdemos uma reverberação

O menino descia as escadas primeiro com o pé esquerdo e, em seguida, juntava o esquerdo com o direito, no mesmo degrau, mas o fazia rápido, quase automaticamente, a fim de não atrasar a apressada descida da Vítora. O armazém ficava três casas mais à frente e o menino, de mãos dadas com a moça, percorreu a distância, passando seu dedo anular pela linha dos prédios. O armazém cheirava a chocolate, a sabão e à terra das batatas. Avelino distribuía a mercadoria em engradados de alumínio e Quico percorreu com o olhar os caixotes coloridos com alcachofras, cenouras, cebolas, batatas, alfaces e, acima deles, os sugestivos pacotes de chocolates, biscoitos, cubanitos, macarrones e, bem mais acima, as garrafas de vinho tinto e as de vinho rosé e as de vinho branco, e, do lado direito, os potes de vidro com doces.

No caso dos cubanitos e macarrones, não encontramos nada parecido que pudéssemos utilizar como tradução ou versão compreensível. Assim, optamos aqui por colocar um pé de página, onde explicamos que cubanitos podem tanto ser um tipo de doce cubano, no formato de canutilho recheado, ou também uma massa de pão de ló, recheada e com cobertura, de origem espanhola, encontrada principalmente em Sevilha. Macarrones é a adaptação do francês macaron, nome de um doce arredondado, feito com amêndoas, açúcar e claras.

O uso do pé de página, na tradução de romances, é raro, mas nossa escolha se baseou no que já dissemos antes, ou seja, tentarmos nos aproximar o máximo possível do texto original e não substituirmos alguns termos por outros aproximados que, neste caso específico, não iriam condizer com os tipos de doces observados pela personagem Quico. E o ato de traduzir, como sabemos, exige decisões como esta.

Umberto Eco, em seu livro Quase a mesma coisa - experiências de tradução, diz:

Traduzir significa sempre “cortar” algumas das consequências que o termo original implicava. Nesse sentido, ao traduzir não se diz nunca a mesma coisa. A interpretação que precede cada tradução deve estabelecer quantas e quais das possíveis consequências ilativas que o termo sugere podemos cortar. Sem nunca estarmos completamente seguros de que não perdemos uma reverberação

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ultravioleta, uma alusão infravermelha. Mas a negociação nem sempre é uma tratativa que distribui perdas e ganhos com equanimidade entre as partes em jogo. Também posso considerar satisfatória uma negociação em que concedi à contraparte mais do que ela me concedeu e contudo, considerando meu propósito inicial e sabendo que já parti em condições de nítida desvantagem, considerar-me igualmente satisfeito. (ECO, 2007, p. 107)

E, referindo-se ao pé de página, Eco acrescenta:

Existem perdas que poderíamos definir como absolutas. São os casos em que não é possível traduzir e, se casos do gênero acontecem, digamos, no curso de um romance, o tradutor recorre à ultima raio, a de anexar uma nota de pé de página [...] (ECO, 2007, p. 109)

Em outras partes do primeiro capítulo de El príncipe destronado, nos deparamos com outra situação aparentemente delicada, mas que, por causa de nossa proposta em conjunto, não tivemos muitos questionamentos a respeito. Trata-se do emprego, pelo autor, de palavras consideradas chulas na voz de um garoto de três anos. Porém, esses supostos “palavrões” são ditos pela criança sem o peso dado pelos adultos que o cercam. Então, por que não traduzi-los literalmente, mantendo-se a intenção do autor? Vejamos um exemplo:

A Quico le dolía la nuca y la estatura de ella y su condescendencia y experimentó uno de sus súbitos arrebatos. Chilló:—¡Mierda, cagao, culo...!La sonrisa de la Señora se cerró instantáneamente, mecánicamente, como un esfínter.Le regañó:—Eso está muy feo. Los niños buenos no dicen esas cosas.(DELIBES, 1988, p. 21)

Qual criança já não ouviu palavras chulas e sabendo do efeito que causam entre os adultos as utilizou, mesmo não tendo total consciência de seus significados?

ultravioleta, uma alusão infravermelha. Mas a negociação nem sempre é uma tratativa que distribui perdas e ganhos com equanimidade entre as partes em jogo. Também posso considerar satisfatória uma negociação em que concedi à contraparte mais do que ela me concedeu e contudo, considerando meu propósito inicial e sabendo que já parti em condições de nítida desvantagem, considerar-me igualmente satisfeito. (ECO: 2007, p. 107)

E, referindo-se ao pé de página, Eco acrescenta:

Existem perdas que poderíamos definir como absolutas. São os casos em que não é possível traduzir e, se casos do gênero acontecem, digamos, no curso de um romance, o tradutor recorre à ultima raio, a de anexar uma nota de pé de página [...] (ECO: 2007, p. 109)

Em outras partes do primeiro capítulo de El príncipe destronado, nos deparamos com outra situação aparentemente delicada, mas que, por causa de nossa proposta em conjunto, não tivemos muitos questionamentos a respeito. Trata-se do emprego, pelo autor, de palavras consideradas chulas na voz de um garoto de três anos. Porém, esses supostos “palavrões” são ditos pela criança sem o peso dado pelos adultos que o cercam. Então, por que não traduzi-los literalmente, mantendo-se a intenção do autor? Vejamos um exemplo:

A Quico le dolía la nuca y la estatura de ella y su condescendencia y experimentó uno de sus súbitos arrebatos. Chilló:—¡Mierda, cagao, culo...!La sonrisa de la Señora se cerró instantáneamente, mecánicamente, como un esfínter.Le regañó:—Eso está muy feo. Los niños buenos no dicen esas cosas.(DELIBES: 1988, p. 21)

Qual criança já não ouviu palavras chulas e sabendo do efeito que causam entre os adultos as utilizou, mesmo não tendo total consciência de seus significados?

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Portanto, em nossa tradução, mais uma vez, optamos por seguir à risca o original:

A nuca de Quico doía, e a altura dela e sua condescendência o fez experimentar um de seus súbitos arrebatamentos. Gritou:- Merda, cagão, cu...!O sorriso da Senhora se fechou instantaneamente, mecanicamente, como um esfíncter. O repreendeu:- Isso é muito feio. Crianças boas não falam essas coisas.

Em suas análises sobre El príncipe destronado, Vázquez Fernández também aborda o tema da insegurança em Delibes, observado em nossas leituras e percepções, que manifesta-se já na primeira infância:

El príncipe destronado es una novela concebida en torno al personaje de Quico, un niño de tres años. Una lectura detenida descubre, tras la aparente simpleza, todas las sugerencias que proyecta la narración. Al haber sido desplazado por la hermana que ha nacido, trata de recuperar el protagonismo perdido reclamando atención por parte de los adultos: palabrotas que sabe censuradas, travesuras y acciones prohibidas, se suceden en una escalada ininterrumpida a lo largo del día (tiempo de duración de la novela) hasta llegar a simular haber tragado un clavo. El miedo, tan característico en el niño, parte del sentimiento de inseguridad y se une a la curiosidad ante lo misterioso, también inherente a la condición infantil. De esa combinación surge la emoción ante la muerte: Quico comienza por no comprender la muerte del gato de la vecina; las explicaciones que recibe –muere por viejo, o es arrojado a la caldera para que arda en el fuego- le confunden todavía más; luego recibe información sobre el infierno, unido al fuego como destino de los malvados, y teme correr la suerte del gato si no es bueno. La novela termina con el terror de Quico a la oscuridad, proyección de la caldera donde fue arrojado el gato. El miedo a la muerte se relaciona directamente con la atracción por los entierros que sienten tanto niños como ancianos […]. (VÁZQUEZ FERNÁNDEZ, 2007, p. 184-185)

Portanto, em nossa tradução, mais uma vez, optamos por seguir à risca o original:

A nuca de Quico doía, e a altura dela e sua condescendência o fez experimentar um de seus súbitos arrebatamentos. Gritou:- Merda, cagão, cu...!O sorriso da Senhora se fechou instantaneamente, mecanicamente, como um esfíncter. O repreendeu:- Isso é muito feio. Crianças boas não falam essas coisas.

Em suas análises sobre El príncipe destronado, Vázquez Fernández também aborda o tema da insegurança em Delibes, observado em nossas leituras e percepções, que manifesta-se já na primeira infância:

El príncipe destronado es una novela concebida en torno al personaje de Quico, un niño de tres años. Una lectura detenida descubre, tras la aparente simpleza, todas las sugerencias que proyecta la narración. Al haber sido desplazado por la hermana que ha nacido, trata de recuperar el protagonismo perdido reclamando atención por parte de los adultos: palabrotas que sabe censuradas, travesuras y acciones prohibidas, se suceden en una escalada ininterrumpida a lo largo del día (tiempo de duración de la novela) hasta llegar a simular haber tragado un clavo. El miedo, tan característico en el niño, parte del sentimiento de inseguridad y se une a la curiosidad ante lo misterioso, también inherente a la condición infantil. De esa combinación surge la emoción ante la muerte: Quico comienza por no comprender la muerte del gato de la vecina; las explicaciones que recibe –muere por viejo, o es arrojado a la caldera para que arda en el fuego- le confunden todavía más; luego recibe información sobre el infierno, unido al fuego como destino de los malvados, y teme correr la suerte del gato si no es bueno. La novela termina con el terror de Quico a la oscuridad, proyección de la caldera donde fue arrojado el gato. El miedo a la muerte se relaciona directamente con la atracción por los entierros que sienten tanto niños como ancianos […]. (VÁZQUEZ FERNÁNDEZ: 2007, p. 184-185)

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Quanto a isto, nós dois não temos dúvidas. Porém, embora haja uma cumplicidade em nossas escolhas, principalmente por causa das leituras similares na hora de traduzir, temos, sim, muitos questionamentos e discussões, quase sempre na busca por palavras e expressões adequadas, ou mais apropriadas, para não deturparmos seu real sentido, mantendo-o o mais próximo daquilo que, acreditamos, queria o autor. Não é fácil retratar, em toda sua complexa dimensão, o universo de uma criança de três, quatro anos, em quem se coloca, por sua vez, o peso de ser o fio condutor da narrativa. Entre tantos desafios, manter a coerência dessa escolha, na tradução, é para nós uma das mais importantes. E nos respaldamos, mais uma vez, em Vázquez Fernández, que diz:

El primer valor de la novela radica en la difícil tarea del desdoblamiento en un niño de tan poca edad. Delibes retorna al mundo infantil para rastrear los orígenes y gestación de los problemas del hombre adulto. Quico se siente desplazado porque, al nacer otra hermana, ha dejado de ser centro de atención. Además del atractivo de un personaje tan tierno, la novela ofrece el interés de mostrar el aprendizaje del lenguaje. El sentimiento del miedo y la inseguridad son temas que preocupan tanto al autor, que se propone rastrear su origen expresándolo de primera mano a través de un niño de cuatro años: aquí reside la originalidad narrativa de El príncipe destronado. (VÁZQUEZ FERNÁNDEZ, 2007, p. 44-45)

Trabalhar em dupla, tendo duas línguas maternas, no caso o português e o espanhol, aparentemente vem auxiliando o processo que, apesar de tudo, segue devagar por causa de nossa cautela na escolha de palavras, expressões, significados e significantes que satisfaçam o nosso objetivo de não trairmos o autor, mantendo não somente o contexto, mas a poética estrutural que tanto nos encanta em El príncipe destronado.

O trabalho, como já dissemos, é árduo e requer muitos cuidados. A língua, em qualquer idioma, é viva. Sabemos disso. Porém, também como já apontamos aqui, são raras as traduções das obras de Delibes para o português. Por que,

Quanto a isto, nós dois não temos dúvidas. Porém, embora haja uma cumplicidade em nossas escolhas, principalmente por causa das leituras similares na hora de traduzir, temos, sim, muitos questionamentos e discussões, quase sempre na busca por palavras e expressões adequadas, ou mais apropriadas, para não deturparmos seu real sentido, mantendo-o o mais próximo daquilo que, acreditamos, queria o autor. Não é fácil retratar, em toda sua complexa dimensão, o universo de uma criança de três, quatro anos, em quem se coloca, por sua vez, o peso de ser o fio condutor da narrativa. Entre tantos desafios, manter a coerência dessa escolha, na tradução, é para nós uma das mais importantes. E nos respaldamos, mais uma vez, em Vázquez Fernández, que diz:

El primer valor de la novela radica en la difícil tarea del desdoblamiento en un niño de tan poca edad. Delibes retorna al mundo infantil para rastrear los orígenes y gestación de los problemas del hombre adulto. Quico se siente desplazado porque, al nacer otra hermana, ha dejado de ser centro de atención. Además del atractivo de un personaje tan tierno, la novela ofrece el interés de mostrar el aprendizaje del lenguaje. El sentimiento del miedo y la inseguridad son temas que preocupan tanto al autor, que se propone rastrear su origen expresándolo de primera mano a través de un niño de cuatro años: aquí reside la originalidad narrativa de El príncipe destronado. (VÁZQUEZ FERNÁNDEZ: 2007, p. 44-45)

Trabalhar em dupla, tendo duas línguas maternas, no caso o português e o espanhol, aparentemente vem auxiliando o processo que, apesar de tudo, segue devagar por causa de nossa cautela na escolha de palavras, expressões, significados e significantes que satisfaçam o nosso objetivo de não trairmos o autor, mantendo não somente o contexto, mas a poética estrutural que tanto nos encanta em El príncipe destronado.

O trabalho, como já dissemos, é árduo e requer muitos cuidados. A língua, em qualquer idioma, é viva. Sabemos disso. Porém, também como já apontamos aqui, são raras as traduções das obras de Delibes para o português. Por que,

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então, optaríamos por mudar a forma estrutural da linguagem empregada por Delibes, ao retratar apenas um dia da infância do menino Quico? Para nós isto não fazia qualquer sentido, ainda que fosse até mais simples, acreditamos, contextualizar o vocabulário e os termos para a realidade atual brasileira. Ou não. Entretanto, como explica o estudioso Santiago de los Mozos, em suas Consideraciones lingüísticas sobre Miguel Delibes:

Mucho se ha ponderado el léxico de Miguel Delibes. Por su precisión, por su claridad, por tratarse de palabras más oídas que leídas, por su castellanía, por el acierto en su selección, por su encaje perfecto en el contexto, por su abundancia, por su capacidad para la caracterización de los personajes, que hablan como son y son como hablan. Ahora bien, los textos no pueden ofrecernos los procesos de selección mediante los cuales el escritor ha rechazado una palabra y ha escrito otra, sino sólo el resultado de la elección, es decir, la palabra, entre otras, quizá muchas, que pasa y se incorpora al texto. El lector ingenuo puede pensar, ante una palabra o frase particularmente feliz, que el escritor es inconsciente de su acierto, porque la inspiración funciona automáticamente, sin que cuente mucho la intención del autor. Ni siquiera en la comunicación oral acontece esto. Cada unidad lingüística -dice Martinet- supone una elección. [...] Decir el crío está dormido supone elegir entre esta posibilidad y otras presentes en la competencia del hablante: el niño, el pequeño, el nene, etc., en vez de el crío; y duerme, está durmiendo, en lugar de está dormido. Entender un texto, entre otras cosas, es sobre todo reconocer el conjunto de elecciones por las cuales ha llegado a constituirse como tal. (DE LOS MOZOS, in JIMÉNEZ LOZANO, 1993)

Continuamos fazendo nossas escolhas e eleições. E à medida que avançamos página a página, temos a consciência do grande desafio que nos aguarda sempre na próxima palavra, na próxima hora, no próximo capítulo, do dia 03 de dezembro de 1963.

então, optaríamos por mudar a forma estrutural da linguagem empregada por Delibes, ao retratar apenas um dia da infância do menino Quico? Para nós isto não fazia qualquer sentido, ainda que fosse até mais simples, acreditamos, contextualizar o vocabulário e os termos para a realidade atual brasileira. Ou não. Entretanto, como explica o estudioso Santiago de los Mozos, em suas Consideraciones lingüísticas sobre Miguel Delibes:

Mucho se ha ponderado el léxico de Miguel Delibes. Por su precisión, por su claridad, por tratarse de palabras más oídas que leídas, por su castellanía, por el acierto en su selección, por su encaje perfecto en el contexto, por su abundancia, por su capacidad para la caracterización de los personajes, que hablan como son y son como hablan. Ahora bien, los textos no pueden ofrecernos los procesos de selección mediante los cuales el escritor ha rechazado una palabra y ha escrito otra, sino sólo el resultado de la elección, es decir, la palabra, entre otras, quizá muchas, que pasa y se incorpora al texto. El lector ingenuo puede pensar, ante una palabra o frase particularmente feliz, que el escritor es inconsciente de su acierto, porque la inspiración funciona automáticamente, sin que cuente mucho la intención del autor. Ni siquiera en la comunicación oral acontece esto. Cada unidad lingüística -dice Martinet- supone una elección. [...] Decir el crío está dormido supone elegir entre esta posibilidad y otras presentes en la competencia del hablante: el niño, el pequeño, el nene, etc., en vez de el crío; y duerme, está durmiendo, en lugar de está dormido. Entender un texto, entre otras cosas, es sobre todo reconocer el conjunto de elecciones por las cuales ha llegado a constituirse como tal. (DE LOS MOZOS: in JIMÉNEZ LOZANO, 1993)

Continuamos fazendo nossas escolhas e eleições. E à medida que avançamos página a página, temos a consciência do grande desafio que nos aguarda sempre na próxima palavra, na próxima hora, no próximo capítulo, do dia 03 de dezembro de 1963.

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Referencias (Referências)

DELIBES, Miguel. El príncipe destronado. 7ª ed. Barcelona: Ediciones Destino, S.A., 1988. 176 p.

DELIBES, Miguel. Un año de mi vida. Barcelona: Ediciones Destino, col. Áncora y Delfín, 2004.

ECO, UMBERTO. Quase a mesma coisa - experiências de tradução. Rio de Janeiro: EDITORA RECORD LTDA, 2007. 458 p.

JIMÉNEZ LOZANO, José et al. El autor y su obra - Miguel Delibes. Madrid: Editorial ACTAS, s.l., 1993. 194 p.

LOS MOZOS, Santiago de. Consideraciones lingüísticas sobre Miguel Delibes. In: JIMÉNEZ LOZANO, José et al. El autor y su obra - Miguel Delibes. Madrid: Editorial ACTAS, s.l., 1993. 194 p.

REY, Alfonso. Tradición y originalidad en Delibes. In: JIMÉNEZ LOZANO, José et al. El autor y su obra - Miguel Delibes. Madrid: Editorial ACTAS, s.l., 1993. 194 p.

VÁZQUEZ FERNÁNDEZ, María Isabel. Miguel Delibes, el camino de sus héroes. Madrid: EDITORIAL PLIEGOS, 2007. 412 p.

Notas

1 Versão em lingua espanhola pelos autores.2 Robson LEITÃO. Mestre em Literatura Hispano-Americana pela UFF. Doutorando em Literatura

Comparada, sob a orientação da Profª Drª Livia Reis (UFF).3 Virginia CASCO. Mestre em Literatura Espanhola pela UFF. Doutoranda em Literaturas Hispânicas,

sob a orientação da Profª Drª Silvia Cárcamo (UFRJ).

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THE UNCROWNED PRINCE (EL PRÍNCIPE DESTRONADO) AND THE CHALLENGE OF TRANSLATING MIGUEL DELIBES

Abstract: This is an unpublished novel in Portuguese, like most Delibes books. The responsibility to translate it requires special care, because in it the Spanish author made Quico, a boy of four years, the observer center of a world torn apart by the Civil War, from living with their families and with their nanny, and without never lose the childlike and playful look, common to children without a formed conscience. Written in 1964 and released only in 1973, El Prince dethroned it uses the voice of the protagonist, language structures of who is still learning how to express themselves and the social context of the time in which it is situated narrative, many words and expressions that have disappeared or they have fallen into disuse, which makes pouring into the Portuguese work even more complex and careful. We are two in this endeavor. A Brazilian and Uruguayan by birth but a naturalized Brazilian. We combine the expertise of our mother tongues and passion for literature to try, even if it can be questioned by many translators, to be as faithful as possible to the book style Delibes, in a work that, for us, is exquisite and rich in portraying language and child thought. Our questions and discussions are numerous, always in the search for appropriate words and expressions, or more appropriate, not deturparmos its real sense, keeping it as close to the original. And as we go page by page, we are aware of the challenge that awaits us in the next chapter. Key words: Miguel Delibes, El príncipe destronado, translation, Childhood, War-civil Spanis