Eleição e predestinação
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2
Sumário
Introdução
3
A Causa da Eleição
7
É Possível Negar Biblicamente a Eleição e a Predestinação?
17
Eleição e Predestinação
25
Eleição pela Graça
40
O Conselho da Própria Vontade de Deus
150
3
Introdução
O assunto da predestinação e da eleição tem
assombrado as mentes de muitas pessoas ao longo
dos séculos, inclusive de crentes autênticos em
Jesus Cristo, uma vez que parece muito absurda a
ideia de que Deus tenha escolhido a alguns e que
tenha rejeitado a outros quanto a serem seus filhos
amados.
Com exceção de uns poucos que consagram
voluntariamente suas vidas a Satanás e que se
declaram inimigos declarados e abertos de Deus, e
outros que sequer acreditam na Sua existência, a
grande maioria da humanidade se considera na
condição de ser filha amada dileta de Deus, uma vez
que se raciocina que sendo bom, não pode excluir a
qualquer pessoa da referida condição.
4
De fato Ele não faz acepção de qualquer pessoa, e
tem o desejo de que todos fossem seus filhos
amados, mas, não por qualquer ação voluntária da
Sua parte, há tanto nos homens, quanto nos anjos,
na condição de seres morais livres, conforme foram
criados, quanto ao exercício de suas inclinações e
vontades, uma determinação para se resistir
continuamente a Deus e aos Seus mandamentos, ou
o contrário, quando se busca nEle graça, força e
instrução para se viver em pleno acordo com tudo
aquilo que planejou para que fôssemos perante Ele
em amor.
O falso raciocínio de que está obrigado a receber a
todos de igual forma cai inteiramente por terra
mesmo em face de argumentos naturais, pelo que
se pode observar no comportamento dos próprios
homens.
É certo que a maior parte das nações abre
oportunidades iguais de acesso à cidadania e de
5
aceitação pela sociedade a todas as pessoas.
Todavia, não são poucos os que não atendem às
condições para isto, e que a si mesmos se
prejudicam ao viverem como malfeitores, para os
quais nada mais pode ser esperado do que a
rejeição pela sociedade como um todo, e o seu
isolamento em prisões.
Se o homem, sendo pecador, exerce tal juízo, que é
muito necessário para a continuidade pacífica da
vida social, quanto mais não estaria Deus, de quem
procede esta deliberação, disposto a rejeitar todos
aqueles que são contrários a uma vida em
comunhão, paz e amor fundamentada na justiça, no
bem e na verdade?
Chega-se então à conclusão que para sermos
aceitos por Deus necessitamos de arrependimento
e conversão, uma vez que não há quem não peque
– que não seja, por natureza, inimigo de Deus e da
Sua vontade.
6
Necessitamos de restauração e livramento de nossa
condição caída.
Isto nos é propiciado apenas pelo fato de existir
uma eleição que é inteiramente por graça, pois,
caso contrário, estaríamos todos, sem qualquer
exceção, perdidos para sempre.
7
A Causa da Eleição A Causa Foi um Grande Amor “1 Ele vos deu vida, estando vós mortos nos vossos delitos e pecados,
2 nos quais andastes outrora, segundo o curso deste
mundo, segundo o príncipe da potestade do ar, do
espírito que agora atua nos filhos da desobediência;
3 entre os quais também todos nós andamos
outrora, segundo as inclinações da nossa carne,
fazendo a vontade da carne e dos pensamentos; e
éramos, por natureza, filhos da ira, como também
os demais.
4 Mas Deus, sendo rico em misericórdia, por causa
do grande amor com que nos amou,
5 e estando nós mortos em nossos delitos, nos deu
vida juntamente com Cristo, - pela graça sois
salvos,” (Efésios 2.1-5)
8
Nesta breve passagem de Efésios, especialmente
nos seus versículos 4 e 5 é declarada a causa da
nossa eleição para a salvação: o grande, o infinito
amor de Deus por nós.
O pecado não foi capaz de anular o amor de Deus
por aqueles que ele pretende salvar para
participarem deste mesmo amor que há na
natureza divina.
A eleição não se trata portanto de um projeto
mecânico, de uma escolha baseada em princípios
que levem em conta o nosso mérito e importância
para Deus.
Ao contrário, pois como se declara em nosso texto,
toda a humanidade, inclusive os eleitos, se
encontram numa completa miséria e desgraça em
relação ao seu estado espiritual, em razão dos seus
delitos e pecados. Na verdade, mais do que em
estado de miséria, pois todos, sem serem vivificados
9
por Cristo, acham-se mortos espiritualmente e sob
uma maldição de condenação eterna.
Então o apóstolo declara final e triunfalmente no
verso 5: “pela graça sois salvos”, ou seja, a causa da
eleição é a graça, o amor, o favor e a misericórdia
de Deus para com pecadores que mereciam, sem
qualquer exceção, a condenação eterna debaixo do
seu justo juízo contra o pecado e o pecador.
E a grande prova de que a causa foi o amor, e por
este modo como o amor se comprovou em ter o
próprio Deus sofrido e morrido em nosso lugar
numa cruz carregando sobre Si os nossos pecados,
revela de modo muito claro e direto qual era a nossa
completa miséria e impotência para que fôssemos
eleitos por algo de bom e especial que Deus tivesse
visto em nós, indignos pecadores.
10
Assim, Cristo teve que tomar o nosso lugar, para
que pudéssemos receber a graça da nossa eleição
para que pudéssemos ser salvos por Ele.
Deus é espírito onisciente, onipotente, onipresente
e completamente santo e puro.
Nós, evidentemente, não o somos.
É por isso que, sem que Ele manifeste a nós a sua
graça, não podemos conhecê-lo de modo pessoal e
íntimo.
Deve ser também considerado, que para este
conhecimento pessoal, é necessário antes que seja
operado em nós, por Ele, o trabalho da nossa
justificação (perdão pleno); regeneração (novo
nascimento) e santificação.
Ponderemos agora sobre quais seriam os principais
motivos porque que nem todos sejam participantes
dessa graça salvadora referida.
11
Caso fosse suposto que tal sucedesse em razão de
um processo eletivo divino, no qual escolhesse ao
léu quem seria agraciado, ao modo de um
lançamento de sortes, equivaleria atribuir ao Deus
que afirma não ter prazer na morte de ninguém, e
que deseja que todos fossem salvos, alguma forma
de vontade caprichosa.
O bom senso recomenda portanto, que tal hipótese
seja excluída.
Podemos então, ter como segura causa da eleição,
a assertiva bíblica de que somos:
“eleitos, segundo a presciência de Deus Pai, em
santificação do Espírito,” (I Pedro 1.2a).
Ou seja: como o fim da eleição é o de que sejamos
santificados pelo Espírito Santo, Deus conhece, por
seu atributo de presciência, quais são as pessoas
que aceitarão o convite da graça do evangelho para
ser operada nelas a referida santificação, do mesmo
12
modo que também conhece aqueles que resistirão
ao citado convite, sem que haja nesta eleição
qualquer qualificação moral ou espiritual
antecedente que recomendasse o pecador à
eleição, uma vez que todos pecaram e se encontram
destituídos da graça divina.
Como a condição natural de toda e qualquer pessoa
é de endurecimento ao conhecimento de Deus e da
sua vontade, então é de se supor, que Ele mantenha
em endurecimento, por não conceder a sua graça, a
estes que sabe, com antecedência, que a rejeitariam
caso lhes fosse fornecida, para operar neles o
trabalho de remoção do referido endurecimento.
Daí afirmar o Senhor nas Escrituras que endureceu
a faraó, nos dias de Moisés, ou seja, ele não lhe
concederia graça para que se arrependesse e fosse
transformado, porque conhecia, em sua
presciência, que ele lhe resistiria, não permitindo
ser convertido.
13
Não foi o Senhor o agente causador do
endurecimento de faraó, mas o próprio mau uso
deste, do livre arbítrio que lhe fora dado (Romanos
9.17,18).
Deus a ninguém tenta, e em ninguém produz o mal
moral. É Deus de vida e não de morte. É Deus de
santidade e não de pecado.
O que distingue os pecadores é que alguns chegam
a lamentar o fato de serem pecadores e buscam
serem transformados por Deus, enquanto outros
jamais se arrependerão dessa condição de
possuírem a natureza pecaminosa que é comum a
todas as pessoas.
Não se pense também que será este
arrependimento sem qualquer tipo de resistência
inicial, pois isto é visto como um fato real na vida de
muitos eleitos, que resistem ao evangelho até
14
mesmo por longos anos em suas vidas, antes que se
convertam a Cristo.
Assim, não seria de se supor que Deus desperdice os
seus dons, ou faça empenhos para nenhum
propósito, quando usa de todos os meios
necessários para conduzir àqueles que conheceu de
antemão à salvação; e que não os use em relação
àqueles que também já sabe em sua presciência que
o rejeitarão.
Como poderíamos admitir que tentasse salvar
quem ele conheceu antes mesmo de formar no
ventre, como sendo alguém que lhe resistiria de
forma obstinada e para sempre, assim como fazem
Satanás e seus demônios?
Por isso citou o exemplo de Esaú e Jacó para o nosso
conhecimento desta verdade (Romanos 9.13).
Assim, as Escrituras declaram que bem-aventurados
são os humildes de espírito, porque estes
15
comprovam por sua humildade diante do Criador,
que são o objeto da revelação da sua graça
salvadora.
Não há portanto qualquer mérito para a eleição,
porque afinal, todos somos pecadores, mas é
conhecido por Deus, de antemão, quem obterá o
benefício da sua misericórdia para salvação, por
desejar ser santificado, e, quem não receberá o
citado benefício, por não se sujeitar a Ele, nem à sua
vontade.
Daí usar de misericórdia com quem quer usar de
misericórdia (os eleitos, os que se arrependem), e
de não usá-la com quem não quer usá-la (os não
eleitos, por saber que seria por eles rejeitada, e
assim permanecem endurecidos em seus pecados
não perdoados).
“terei misericórdia de quem eu tiver misericórdia e
17
É Possível Negar Biblicamente a
Eleição e a Predestinação?
Leia os poucos textos que destacamos abaixo e
conclua, por si mesmo, sobre qual seja a resposta
correta.
Rom 8:28 Sabemos que todas as coisas cooperam
para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles
que são chamados segundo o seu propósito.
Rom 8:29 Porquanto aos que de antemão conheceu,
também os predestinou para serem conformes à
imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o
primogênito entre muitos irmãos.
Rom 8:30 E aos que predestinou, a esses também
chamou; e aos que chamou, a esses também
justificou; e aos que justificou, a esses também
glorificou.
18
Ef 1:4 assim como nos escolheu nele antes da
fundação do mundo, para sermos santos e
irrepreensíveis perante ele; e em amor
Ef 1:5 nos predestinou para ele, para a adoção de
filhos, por meio de Jesus Cristo, segundo o
beneplácito de sua vontade,
Ef 1:11 nele, digo, no qual fomos também feitos
herança, predestinados segundo o propósito
daquele que faz todas as coisas conforme o
conselho da sua vontade,
1Pe 1:2 eleitos, segundo a presciência de Deus Pai,
em santificação do Espírito, para a obediência e a
aspersão do sangue de Jesus Cristo, graça e paz vos
sejam multiplicadas.
João 15:16 Não fostes vós que me escolhestes a
mim; pelo contrário, eu vos escolhi a vós outros e
vos designei para que vades e deis fruto, e o vosso
19
fruto permaneça; a fim de que tudo quanto
pedirdes ao Pai em meu nome, ele vo-lo conceda.
João 15:19 Se vós fôsseis do mundo, o mundo
amaria o que era seu; como, todavia, não sois do
mundo, pelo contrário, dele vos escolhi, por isso, o
mundo vos odeia.
João 17:6 Manifestei o teu nome aos homens que
me deste do mundo. Eram teus, tu mos confiaste, e
eles têm guardado a tua palavra.
João 17:9 É por eles que eu rogo; não rogo pelo
mundo, mas por aqueles que me deste, porque são
teus;
João 17:24 Pai, a minha vontade é que onde eu
estou, estejam também comigo os que me deste,
para que vejam a minha glória que me conferiste,
porque me amaste antes da fundação do mundo.
20
2Tm 2:19 Entretanto, o firme fundamento de Deus
permanece, tendo este selo: O Senhor conhece os
que lhe pertencem. E mais: Aparte-se da injustiça
todo aquele que professa o nome do Senhor.
Apo 13:8 e adorá-la-ão todos os que habitam sobre
a terra, aqueles cujos nomes não foram escritos no
Livro da Vida do Cordeiro que foi morto desde a
fundação do mundo.
João 10:26 Mas vós não credes, porque não sois das
minhas ovelhas.
João 10:27 As minhas ovelhas ouvem a minha voz;
eu as conheço, e elas me seguem.
João 10:28 Eu lhes dou a vida eterna; jamais
perecerão, e ninguém as arrebatará da minha mão.
Tito 1:1 Paulo, servo de Deus e apóstolo de Jesus
Cristo, para promover a fé que é dos eleitos de Deus
21
e o pleno conhecimento da verdade segundo a
piedade,
Tito 1:2 na esperança da vida eterna que o Deus que
não pode mentir prometeu antes dos tempos
eternos
“pois não tendo os gêmeos ainda nascido, nem
tendo praticado bem ou mal, para que o propósito
de Deus segundo a eleição permanecesse firme, não
por causa das obras, mas por aquele que chama, foi-
lhe dito: O maior servirá o menor. Como está
escrito: Amei a Jacó, e aborreci a Esaú. Que diremos,
pois? Há injustiça da parte de Deus? De modo
nenhum. Porque diz a Moisés: Terei misericórdia de
quem me aprouver ter misericórdia, e terei
compaixão de quem me aprouver ter compaixão.
Assim, pois, isto não depende do que quer, nem do
que corre, mas de Deus que usa de misericórdia.
Pois diz a Escritura a Faraó: Para isto mesmo te
levantei: para em ti mostrar o meu poder, e para
22
que seja anunciado o meu nome em toda a terra.
Portanto, tem misericórdia de quem quer, e a quem
quer endurece.” (Rm 9.11-18).
“E logo enviará os seus anjos, e ajuntará os seus
eleitos, desde os quatro ventos, desde a
extremidade da terra até a extremidade do céu.”
(Mc 13.27).
“Saudai a Rufo, eleito no Senhor, e a sua mãe e
minha.” (Rm 16.13).
“Revesti-vos, pois, como eleitos de Deus, santos e
amados, de coração compassivo, de benignidade,
humildade, mansidão, longanimidade,” (Cl 3.12).
“Por isso, tudo suporto por amor dos eleitos, para
que também eles alcancem a salvação que há em
Cristo Jesus com glória eterna.” (II Tim 2.10).
“Estes combaterão contra o Cordeiro, e o Cordeiro
os vencerá, porque é o Senhor dos senhores e o Rei
23
dos reis; vencerão também os que estão com ele, os
chamados, e eleitos, e fiéis.” (Apo 17.14).
“E peço também a ti, meu verdadeiro companheiro,
que as ajudes, porque trabalharam comigo no
evangelho, e com Clemente, e com os outros meus
cooperadores, cujos nomes estão no livro da vida.”
(Fp 4.3).
“Antes que eu te formasse no ventre materno, eu te
conheci, e antes que saísses da madre, te consagrei
e te constituí profeta às nações.” (Jer 1.5).
“Nós somos de Deus; quem conhece a Deus nos
ouve; quem não é de Deus não nos ouve. Assim é
que conhecemos o espírito da verdade e o espírito
do erro.” (I Jo 4.6).
“Respondeu-lhes Jesus: Porque a vós é dado
conhecer os mistérios do reino dos céus, mas a eles
não lhes é dado;” (Mt 13.11).
24
“Todas as coisas me foram entregues por meu Pai;
e ninguém conhece quem é o Filho senão o Pai, nem
quem é o Pai senão o Filho, e aquele a quem o Filho
o quiser revelar.” (Lc 10.22).
“conhecendo, irmãos, amados de Deus, a vossa
eleição;” (I Tes 1.4).
“Os gentios, ouvindo isto, alegravam-se e
glorificavam a palavra do Senhor; e creram todos
quantos haviam sido destinados para a vida
eterna.” (At 13.48).
25
Eleição e Predestinação
Que a eleição é pela graça está fora de qualquer
dúvida, pois este é o ensino claro e direto das
Escrituras.
Os eleitos foram conhecidos de Deus, como afirma
a Bíblia, antes mesmo que houvesse mundo, e isto
indica conhecimento pessoal prévio daqueles que
viriam a fazer parte da Sua própria vida divina,
participando da Sua natureza e formando um só
espírito com Ele.
Deus disse ao profeta Jeremias: "Antes que te
formasse no ventre te conheci".
Jacó foi conhecido por Deus antes que fosse
formado no ventre de sua mãe, e foi escolhido
porque o Senhor sabia que ele amaria fazer a Sua
vontade, e ensinaria o povo que seria formado a
partir dele, a amar os Seus mandamentos.
26
Seu irmão Esaú, ao contrário, foi rejeitado porque
também foi conhecido de antemão pelo Senhor,
como quem não viveria como um crente e não
amaria a Sua vontade.
A Bíblia está repleta de exemplos em relação a isto,
conforme afirmado pelo próprio Deus. Veja o caso
de Sansão, dos reis Josias e Ciro, do profeta
Jeremias, de João Batista, do próprio apóstolo
Paulo, cujos nascimentos foram preanunciados
com grande antecedência, ou sobre os quais
foi afirmado diretamente por Deus, que os havia
conhecido antes que os formasse no ventre.
Deus não somente anunciou o nascimento dos reis
Josias e Ciro, como citou-os por nome cerca de dois
séculos antes do nascimento de ambos, e não
somente isto, disse também o que eles fariam, um
para a purificação da religião em Israel, e o outro
para trazer os judeus de volta do cativeiro
babilônico.
27
João Batista, a voz que clamaria no deserto, teve
seu nascimento predito e que seria o precursor do
Messias, cerca de 600 anos antes, através do
profeta Isaías.
Então, Deus conhece ou não com completa
antecedência a todos que chegarão à existência
neste mundo? Há alguma base para se duvidar da
sua presciência?
Deste modo, conforme a Bíblia ensina, somente
Deus é glorificado na eleição, e toda a jactância do
homem é excluída (Rom 3.27), exatamente para
que ninguém se glorie em si mesmo (I Cor 1.26-29;
Ef 2.9), por ter tido qualquer mérito ou iniciativa na
sua salvação.
Somente Deus é glorificado, e é somente em Cristo
portanto, que devemos nos gloriar quanto à nossa
salvação, porque houve uma eleição pela graça,
28
antes da nossa conversão, e mesmo antes que
houvesse mundo (Mt 25.34; Ef 1.4; Apo 17.8).
Há uma chamada geral do evangelho a todos os
homens de modo que Cristo seja aroma de vida para
a vida nos que se salvam, e cheiro de morte para a
morte nos que se perdem.
A rejeição do evangelho confirmará a condenação
daqueles que não são conhecidos por Deus, por
amarem as trevas e o pecado, e por não virem
jamais a amar a Deus, por mais misericórdia e favor
que Ele possa lhes demonstrar.
Por isso, muitos são chamados com esta chamada
geral do evangelho, mas poucos são os escolhidos,
isto é, os eleitos de Deus, que além de atenderem à
chamada geral da pregação do evangelho, são
também chamados por um modo distinto e
especial, pelo Espírito, de modo que se convertam
ao Senhor, vindo a formar um só espírito com ele.
29
“Mas, o que se une ao Senhor é um só espírito com
ele.” (I Cor 6.17).
Negar a eleição corresponde a negar a veracidade
das Escrituras porque é nelas que são afirmadas
verdades relativas à eleição, como as seguintes:
“Se o Senhor não abreviasse aqueles dias, ninguém
se salvaria mas ele, por causa dos eleitos que
escolheu, abreviou aqueles dias.” (Mc 13.20).
“E logo enviará os seus anjos, e ajuntará os seus
eleitos, desde os quatro ventos, desde a
extremidade da terra até a extremidade do céu.”
(Mc 13.27).
“Saudai a Rufo, eleito no Senhor, e a sua mãe e
minha.” (Rm 16.13).
“Revesti-vos, pois, como eleitos de Deus, santos e
amados, de coração compassivo, de benignidade,
humildade, mansidão, longanimidade,” (Cl 3.12).
30
“Por isso, tudo suporto por amor dos eleitos, para
que também eles alcancem a salvação que há em
Cristo Jesus com glória eterna.” (II Tim 2.10).
“Paulo, servo de Deus, e apóstolo de Jesus Cristo,
segundo a fé dos eleitos de Deus, e o pleno
conhecimento da verdade que é segundo a
piedade,” (Tt 1.1).
“eleitos segundo a presciência de Deus Pai, na
santificação do Espírito, para a obediência e
aspersão do sangue de Jesus Cristo: Graça e paz vos
sejam multiplicadas.” (I Pe 1.2).
“Estes combaterão contra o Cordeiro, e o Cordeiro
os vencerá, porque é o Senhor dos senhores e o Rei
dos reis; vencerão também os que estão com ele, os
chamados, e eleitos, e fiéis.” (Apo 17.14).
“Todavia o firme fundamento de Deus permanece,
tendo este selo: O Senhor conhece os seus, e:
31
Aparte-se da injustiça todo aquele que profere o
nome do Senhor.” (II Tim 2.19).
“Paulo, apóstolo de Cristo Jesus pela vontade de
Deus, aos santos que estão em Éfeso, e fiéis em
Cristo Jesus: Graça a vós, e paz da parte de Deus
nosso Pai, e do Senhor Jesus Cristo. Bendito seja o
Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, o qual nos
abençoou com todas as bênçãos espirituais nas
regiões celestes em Cristo; como também nos
elegeu nele antes da fundação do mundo, para
sermos santos e irrepreensíveis diante dele em
amor; e nos predestinou para sermos filhos de
adoção por Jesus Cristo, para si mesmo, segundo o
beneplácito de sua vontade, para o louvor da glória
da sua graça, a qual nos deu gratuitamente no
Amado; em quem temos a redenção pelo seu
sangue, a redenção dos nossos delitos, segundo as
riquezas da sua graça, que ele fez abundar para
conosco em toda a sabedoria e prudência, fazendo-
nos conhecer o mistério da sua vontade, segundo o
32
seu beneplácito, que nele propôs para a
dispensação da plenitude dos tempos, de fazer
convergir em Cristo todas as coisas, tanto as que
estão nos céus como as que estão na terra, nele,
digo, no qual também fomos feitos herança,
havendo sido predestinados conforme o propósito
daquele que faz todas as coisas segundo o conselho
da sua vontade, com o fim de sermos para o louvor
da sua glória, nós, os que antes havíamos esperado
em Cristo; no qual também vós, tendo ouvido a
palavra da verdade, o evangelho da vossa salvação,
e tendo nele também crido, fostes selados com o
Espírito Santo da promessa, o qual é o penhor da
nossa herança, para redenção da possessão de
Deus, para o louvor da sua glória.” (Ef 1.1-14).
“Eu rogo por eles; não rogo pelo mundo, mas por
aqueles que me tens dado, porque são teus; todas
as minhas coisas são tuas, e as tuas coisas são
minhas; e neles sou glorificado. Eu não estou mais
no mundo; mas eles estão no mundo, e eu vou para
33
ti. Pai santo, guarda-os no teu nome, o qual me
deste, para que eles sejam um, assim como nós.
Enquanto eu estava com eles, eu os guardava no teu
nome que me deste; e os conservei, e nenhum deles
se perdeu, senão o filho da perdição, para que se
cumprisse a Escritura. Mas agora vou para ti; e isto
falo no mundo, para que eles tenham a minha
alegria completa em si mesmos. Eu lhes dei a tua
palavra; e o mundo os odiou, porque não são do
mundo, assim como eu não sou do mundo. Não
rogo que os tires do mundo, mas que os guardes do
Maligno. Eles não são do mundo, assim como eu
não sou do mundo. (Jo 17.9-16). Não são do mundo
porque são eleitos de Deus.
Esta é a eleição de Deus: eleição para santificação e
para fé. Deus escolhe a seu povo para ser santo e
crente. Ninguém tem o menor direito de considerar-
se eleito, a não ser em sua santidade.
34
Devemos reconhecer estas duas coisas: é necessário
que haja soberania divina e responsabilidade
humana. É necessário que haja eleição, porém
também é necessário que abramos nossos corações,
dando acolhida à verdade.
A eleição para a vida eterna foi determinada por
Deus, através da sua onisciência e presciência, antes
mesmo que houvesse mundo, conforme ensinam as
Escrituras.
O ensino escriturístico sobre a eleição não leva em
conta a quantidade e qualidade dos bons ou maus
atos dos homens, para a justificação.
Tanto que a eleição foi estabelecida antes da
criação do mundo, sem levar em conta os bons e
maus atos que cada eleito praticaria até ser
chamado pelo Espírito, para ser justificado,
regenerado e santificado.
35
Jesus pode salvar perfeitamente o pior dos ímpios,
justificando-lhe pelo Seu sangue e Justiça.
Assim, não é salvo em razão da preexistência de
algo bom em sua natureza (Rom 7.18, Ef 2.3), mas
pela sua resposta favorável ao convite da graça.
É neste sentido que deve ser considerado como
sendo pela verdade, e não por ser alguém que a
amava e não estava consciente disso.
O homem pode escolher muitas coisas, mas,
quando esta escolha se refere à salvação da sua
alma, o que poderá fazer com a sua decisão de
desejar ser salvo se a providência divina não colocar
em execução todos os meios de graça necessários
para produzir nele o verdadeiro arrependimento e
para conduzi-lo à conversão?
Quem poderá chegar ao céu pela simples
manifestação do seu desejo? Quem conhece o
caminho? Quem está habilitado, atendendo todas
36
as condições impostas pelo Justo e Santo Deus para
poder chegar até a Sua presença?
Por isso Paulo diz que no que tange à eleição do
pecador, o fator preponderante é o de que Deus
tem misericórdia de quem Lhe apraz ter
misericórdia (Rom 9.14-16; Êx 33.19).
Não depende de quem quer ir para o céu. De quem
afirma que deseja ir para lá. A propósito, a maioria
das pessoas recusa a simples ideia de ir para o
inferno. Querem ir para o céu depois da morte. Mas,
desejar ir para o céu significa desejar viver em
santidade sob o senhorio de Deus. Se é isto que o
homem deseja de fato quando a graça lhe é
manifestada, então ele é um eleito, e certamente
irá para o céu, mas se não é isto o que deseja, então
tem apenas o desejo de não ir para o inferno, mas
não desejaria de fato ir para o céu, onde tudo e
todos são santos.
37
Jesus veio de fato salvar pecadores e não justos.
Veio buscar aqueles aos quais Deus, pela Sua
exclusiva graça, aprouve, eleger para a salvação.
Deste modo, como Paulo ensina em Romanos, a
eleição não foi estabelecida com base em quem
quer ou para quem corre mas em Deus usar de
misericórdia.
O homem nada tem ou pode fazer de bom, de modo
que seja considerado digno de obter a justificação
que é pela graça, mediante a fé, e por causa da
eleição.
A salvação em Cristo está disponível a todos os
homens, mas nem todos os homens virão a Cristo.
Mas aqueles que se permitirem serem atraídos a Ele
pelo Pai, pela chamada do Espírito Santo, não serão
rejeitados e não serão lançados fora de modo
algum.
38
Os que atendem a esta chamada e realmente se
convertem, por receberem o dom da verdadeira fé
para crer em Cristo, são os eleitos de Deus. São
estes que Ele escolheu para si desde antes da
fundação do mundo. Seus nomes são escritos no
livro da vida para nunca mais serem apagados.
A eleição é a consequência da predestinação que é
feita por Deus com base na sua presciência, ou seja,
por saber quais serão aqueles que atenderão ao
convite da graça do evangelho para a salvação. A
estes concederá graça para que sejam livrados do
endurecimento produzido pelo pecado, e os demais
permanecerão endurecidos por rejeitarem a graça
que lhes está sendo oferecida pela pregação do
evangelho.
Você pode ler os versículos bíblicos contendo
destacadas as palavras
1 – ekloge (grego) – eleição; 2 – eklektos (grego) – eleito;
39
3 – proorizo (grego) – predestinar;
4 – prognosis (grego) – presciência;
5 – prognosko (grego) – conhecer de antemão;
relativas ao assunto, acessando o seguinte link:
http://www.poesias.omelhordaweb.com.br/index.
php?cdPoesia=128377
40
Eleição pela Graça
Sempre faremos bem em não discutir no assunto
relativo à doutrina bíblica da eleição, o modo desta
eleição, isto é, o critério que Deus usou para eleger,
porque isto não foi revelado por Ele nas Escrituras,
além do que nos é dito que foi segundo a Sua
presciência, por amor, misericórdia e graça, antes
mesmo da fundação do mundo.
O que devemos estudar na Bíblia, em relação a este
assunto, é o fato relativo à realidade da eleição,
para entendermos que há uma escolha de um povo
por Deus, dentre os pecadores, por causa da Sua
misericórdia, para viver em santidade perante Ele, e
que esta eleição é feita pela graça, sendo efetivada
na salvação, que é também pela graça, mediante a
fé.
Deus escolheu honrar alguns mais do que outros
pela sua livre escolha, sem levar em conta o seu
41
mérito, e o mesmo se dá em relação à eleição para
a salvação que foi feita também sem levar em conta
o mérito humano. Se Deus tivesse escolhido com
base em alguma justiça, santidade ou bondade do
pecador, por causa de algum resquício da imagem e
semelhança com Ele, ou então com base em boas
obras praticadas pelo homem, a eleição não seria
pela graça, mas pelo mérito.
Que a eleição é pela graça está fora de qualquer
dúvida, pois este é o ensino claro e direto das
Escrituras.
No assunto da eleição, não se pode afirmar
qualquer mérito ou qualificações especiais relativas
à vida de Deus, que já estivessem presentes nos
eleitos, como sendo a causa da sua eleição, porque
isto contrariaria o ensino claro e direto da Bíblia
sobre a condição de corrupção do coração de todos
os homens, em razão do pecado original, e a sua
total inabilidade para a vida espiritual do céu, por
estarem mortos espiritualmente em seus pecados.
42
Vemos na Bíblia, o próprio Deus declarando que não
tem prazer na morte do ímpio, antes que ele se
converta e viva (Ez 18.23; 33.11).
O apóstolo Paulo afirmou o seguinte: “Pois isto é
bom e agradável diante de Deus nosso Salvador, o
qual deseja que todos os homens sejam salvos e
cheguem ao pleno conhecimento da verdade.” (I
Tim 2.3,4).
Isto demonstra claramente que até mesmo os
eleitos eram ímpios diante de Deus, antes da sua
conversão.
A manifestação deste desejo expresso de Deus de
salvar ímpios está revelada no Novo Testamento:
“porém ao que não trabalha, mas crê naquele que
justifica o ímpio, a sua fé lhe é contada como
justiça;” (Rm 4.5).
43
“Pois, quando ainda éramos fracos, Cristo morreu a
seu tempo pelos ímpios” (Rm 5.6).
“Ele vos vivificou, estando vós mortos nos vossos
delitos e pecados, nos quais outrora andastes,
segundo o curso deste mundo, segundo o príncipe
das potestades do ar, do espírito que agora opera
nos filhos de desobediência, entre os quais todos
nós também antes andávamos nos desejos da nossa
carne, fazendo a vontade da carne e dos
pensamentos; e éramos por natureza filhos da ira,
como também os demais.” (Ef 2.1-3).
Contudo, uma vez convertido, o crente não é mais
designado na Bíblia como ímpio, mas como justo,
como eleito de Deus, e a palavra ímpio continua
designando aqueles que não foram alcançados pela
salvação que há em Cristo Jesus.
É chamado ímpio (im = não; pio = piedoso) porque
não possui a vida cujas realidades se referem à
44
piedade, e piedade em seu sentido bíblico significa
vida santa e consagrada a Deus.
Então concluímos que se houvesse em todos os
seres morais a condição de serem salvos pelo
Senhor, eles seriam efetivamente salvos, porque
Deus afirma que tem o desejo de que todos se
salvem. E se este desejo não fosse sincero, não
veríamos Jesus repreendendo pessoas e até mesmo
cidades inteiras pelo fato de não terem se
arrependido e crido nEle, depois de ter se esforçado
tanto para conduzi-los à conversão.
Por conseguinte, o homem é justamente
responsabilizado quanto à condenação eterna, nem
tanto pelo fato de ser pecador, pois todos são
pecadores, mas pelo fato de não se arrepender e
crer.
A causa da sua condenação será o seu próprio
pecado e endurecimento no pecado, mas a
45
determinação desta condenação terá sido pelo fato
de ser o que é, a saber, alguém totalmente
indisposto para as coisas de Deus, alguém
totalmente avesso à simples ideia de viver em
santidade para Deus, alguém inteiramente disposto
a escolher o seu próprio caminho e a fazer a sua
própria vontade, e não a do Senhor.
Então, em sua presciência, como Deus poderia ter
escolhido alguém que Ele previamente sabia que
não se submeteria à Sua vontade?
No entanto, tal não é o caso dos eleitos, porque
apesar de pecadores, de terem sido ímpios como os
demais, aspirarão pela santidade e justiça de Deus,
no momento oportuno, quando estas lhes forem
reveladas pelo Evangelho.
Então, é especialmente a estes ímpios que se
converterão a quem Deus ordena que se
arrependam dos seus pecados e creiam, porque Ele
46
sabe, em Sua presciência, que somente eles
atenderão ao convite à conversão, para que não
morram, e vivam eternamente.
É dito que somente estes, que são irmãos de Cristo
pela fé, foram conhecidos de antemão por Deus
como aqueles que O amariam, que são
predestinados por Ele, isto é são os seus eleitos, os
que escolheu para serem parte da Sua família, pelo
que os chamou para serem justificados e
glorificados (Rm 8.30).
Por isso se diz: “a fé que é dos eleitos de Deus” em
Tt 1.1:
“Paulo, servo de Deus, e apóstolo de Jesus Cristo,
segundo a fé dos eleitos de Deus, e o pleno
conhecimento da verdade que é segundo a
piedade,”.
Se diz fé dos eleitos, porque somente os que são da
fé são chamados de eleitos na Bíblia, pois os que
47
não são da fé não são eleitos, porque não são
escolhidos por Deus para fazerem parte do Seu
reino.
Que fique claro entretanto, que esta fé só veio a
habitar nos eleitos quando lhes foi dada como um
dom de Deus na sua conversão. E esta fé que é a
principal graça do evangelho, da qual todas as
demais derivam, é exclusiva dos eleitos de Deus.
Os não eleitos não chegarão jamais a possuí-la,
porque é concedida somente para produzir a vida
de Deus naqueles que se arrependem.
É fé que salva, à qual se refere Tiago, que é viva e
eficaz, e que nos habilita a fazer as boas obras que
Deus também preparou de antemão para que
andássemos nelas.
Isto se aprende claramente nas parábolas de Jesus
sobre o Reino dos céus, especialmente nas relativas
48
aos peixes bons e ruins; ao trigo e ao joio; e em
afirmações diretas como a de Mt 13.49:
“Assim será no fim do mundo: sairão os anjos, e
separarão os maus dentre os justos,”.
Sobre esta condição determinada pela eleição da
graça, o próprio João Batista havia se referido: “A
sua pá ele tem na mão, e limpará bem a sua eira;
recolherá o seu trigo ao celeiro, mas queimará a
palha em fogo inextinguível.” (Mt 3.12). O trigo são
os eleitos e a palha os não eleitos.
A fé não é de todos porque há eleição, e há eleição
porque Deus conhece previamente os que são Seus,
e a fé é dada como um dom somente aos que são
conhecidos de Deus, como aqueles que o amariam
e se uniriam a Ele, vindo a ser adotados como Seus
filhos, para serem ovelhas do Seu rebanho, ainda
que antes de serem chamados por Ele, todos fossem
49
pecadores, e alguns dentre eles, os mais terríveis
pecadores.
Deus os conheceu antes mesmo de formá-los no
ventre, e sabia que eram Seus e portanto não
permaneceriam nas trevas, assim que lhes
resplandecesse a Luz do evangelho de Cristo Jesus.
Paulo disse: “e para que sejamos livres de homens
perversos e maus; porque a fé não é de todos.” (II
Tes 3.2).
A fé não é de todos porque é somente dos eleitos.
Porque é somente dada aos que são chamados e
justificados. E os que não são da fé, que não são
conhecidos de Deus, permanecerão para sempre
endurecidos em seus pecados:
“Pois quê? O que Israel busca, isso não o alcançou;
mas os eleitos alcançaram; e os outros foram
endurecidos,” (Rm 11.7).
50
Deste modo, conforme a Bíblia ensina, somente
Deus é glorificado na eleição, e toda a jactância do
homem é excluída (Rm 3.27), exatamente para que
ninguém se glorie em si mesmo (I Cor 1.26-29; Ef
2.9), por ter tido qualquer mérito ou iniciativa na
sua salvação.
Somente Deus é glorificado, e é somente em Cristo
portanto, que devemos nos gloriar quanto à nossa
salvação, porque houve uma eleição pela graça,
antes da nossa conversão, e mesmo antes que
houvesse mundo (Mt 25.34; Ef 1.4; Apo 17.8).
E ainda que não concordemos com nada disto, e
embora sejamos salvos, nós o seremos não por
causa do nosso conhecimento sobre este assunto,
mas porque esta verdade se cumprirá conforme
está determinado por Deus, e não pelo homem.
Então, a própria ignorância do homem não anula a
doutrina e verdade bíblica sobre a eleição pela
51
graça, antes a confirma, pois demonstra na prática
que a salvação é pela graça e mediante a fé, e não
segundo o conhecimento, mérito, ou obras do
homem.
Na verdade o homem escolhe a Deus porque foi
antes escolhido por Ele.
O homem jamais poderia, por sua própria
capacidade e poder, quitar a dívida de seus pecados
e chegar ao conhecimento de Deus, se o Senhor não
se revelasse a Ele.
O homem está morto em seus pecados, envolvido
em trevas espirituais em sua alma, e se o Senhor
não dissipar estas trevas e não lhe der a vida eterna,
ficará para sempre perdido.
Desta forma, se diz que:
“pois não tendo os gêmeos ainda nascido, nem
tendo praticado bem ou mal, para que o propósito
52
de Deus segundo a eleição permanecesse firme, não
por causa das obras, mas por aquele que chama, foi-
lhe dito: O maior servirá o menor. Como está
escrito: Amei a Jacó, e aborreci a Esaú. Que diremos,
pois? Há injustiça da parte de Deus? De modo
nenhum. Porque diz a Moisés: Terei misericórdia de
quem me aprouver ter misericórdia, e terei
compaixão de quem me aprouver ter compaixão.
Assim, pois, isto não depende do que quer, nem do
que corre, mas de Deus que usa de misericórdia.
Pois diz a Escritura a Faraó: Para isto mesmo te
levantei: para em ti mostrar o meu poder, e para
que seja anunciado o meu nome em toda a terra.
Portanto, tem misericórdia de quem quer, e a quem
quer endurece.” (Rm 9.11-18).
Deus conhece os corações. Ele conhece os que são
Seus. Então a salvação não depende de quem quer
ou de quem se esforça com suas obras e justiça
própria para obtê-la, senão de Deus usar de
misericórdia e conceder a Sua graça para que
53
possamos ser redimidos do pecado e capacitados a
viver a vida de Deus.
O que queremos dizer com isto, é o que a própria
Bíblia ensina, particularmente este texto de
Romanos citado, que não é o homem quem decide
sobre a sua salvação, porque isto já está decidido
por Deus pelo conhecimento que possui de cada
uma das suas criaturas.
Ele chamará os que predestinou, e que conheceu de
antemão, e somente a estes.
E esta chamada é a chamada íntima e específica do
Espírito que produz a regeneração ou novo
nascimento.
Há uma chamada geral do evangelho a todos os
homens de modo que Cristo seja aroma de vida para
a vida nos que se salvam, e cheiro de morte para a
morte nos que se perdem.
54
“Se o Senhor não abreviasse aqueles dias, ninguém
se salvaria mas ele, por causa dos eleitos que
escolheu, abreviou aqueles dias.” (Mc 13.20).
“E logo enviará os seus anjos, e ajuntará os seus
eleitos, desde os quatro ventos, desde a
extremidade da terra até a extremidade do céu.”
(Mc 13.27).
“Saudai a Rufo, eleito no Senhor, e a sua mãe e
minha.” (Rm 16.13).
“Revesti-vos, pois, como eleitos de Deus, santos e
amados, de coração compassivo, de benignidade,
humildade, mansidão, longanimidade,” (Cl 3.12).
“Por isso, tudo suporto por amor dos eleitos, para
que também eles alcancem a salvação que há em
Cristo Jesus com glória eterna.” (II Tim 2.10).
“Paulo, servo de Deus, e apóstolo de Jesus Cristo,
segundo a fé dos eleitos de Deus, e o pleno
55
conhecimento da verdade que é segundo a
piedade,” (Tt 1.1).
“eleitos segundo a presciência de Deus Pai, na
santificação do Espírito, para a obediência e
aspersão do sangue de Jesus Cristo: Graça e paz vos
sejam multiplicadas.” (I Pe 1.2).
“Estes combaterão contra o Cordeiro, e o Cordeiro
os vencerá, porque é o Senhor dos senhores e o Rei
dos reis; vencerão também os que estão com ele, os
chamados, e eleitos, e fiéis.” (Apo 17.14).
“Todavia o firme fundamento de Deus permanece,
tendo este selo: O Senhor conhece os seus, e:
Aparte-se da injustiça todo aquele que profere o
nome do Senhor.” (II Tim 2.19).
“Paulo, apóstolo de Cristo Jesus pela vontade de
Deus, aos santos que estão em Éfeso, e fiéis em
Cristo Jesus: Graça a vós, e paz da parte de Deus
nosso Pai, e do Senhor Jesus Cristo. Bendito seja o
56
Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, o qual nos
abençoou com todas as bênçãos espirituais nas
regiões celestes em Cristo; como também nos
elegeu nele antes da fundação do mundo, para
sermos santos e irrepreensíveis diante dele em
amor; e nos predestinou para sermos filhos de
adoção por Jesus Cristo, para si mesmo, segundo o
beneplácito de sua vontade, para o louvor da glória
da sua graça, a qual nos deu gratuitamente no
Amado; em quem temos a redenção pelo seu
sangue, a redenção dos nossos delitos, segundo as
riquezas da sua graça, que ele fez abundar para
conosco em toda a sabedoria e prudência, fazendo-
nos conhecer o mistério da sua vontade, segundo o
seu beneplácito, que nele propôs para a
dispensação da plenitude dos tempos, de fazer
convergir em Cristo todas as coisas, tanto as que
estão nos céus como as que estão na terra, nele,
digo, no qual também fomos feitos herança,
havendo sido predestinados conforme o propósito
57
daquele que faz todas as coisas segundo o conselho
da sua vontade, com o fim de sermos para o louvor
da sua glória, nós, os que antes havíamos esperado
em Cristo; no qual também vós, tendo ouvido a
palavra da verdade, o evangelho da vossa salvação,
e tendo nele também crido, fostes selados com o
Espírito Santo da promessa, o qual é o penhor da
nossa herança, para redenção da possessão de
Deus, para o louvor da sua glória.” (Ef 1.1-14).
“Eu rogo por eles; não rogo pelo mundo, mas por
aqueles que me tens dado, porque são teus; todas
as minhas coisas são tuas, e as tuas coisas são
minhas; e neles sou glorificado. Eu não estou mais
no mundo; mas eles estão no mundo, e eu vou para
ti. Pai santo, guarda-os no teu nome, o qual me
deste, para que eles sejam um, assim como nós.
Enquanto eu estava com eles, eu os guardava no teu
nome que me deste; e os conservei, e nenhum deles
se perdeu, senão o filho da perdição, para que se
cumprisse a Escritura. Mas agora vou para ti; e isto
58
falo no mundo, para que eles tenham a minha
alegria completa em si mesmos. Eu lhes dei a tua
palavra; e o mundo os odiou, porque não são do
mundo, assim como eu não sou do mundo. Não
rogo que os tires do mundo, mas que os guardes do
Maligno. Eles não são do mundo, assim como eu
não sou do mundo. (Jo 17.9-16). Não são do mundo
porque são eleitos de Deus.
Spurgeon disse o seguinte referindo-se aos eleitos:
“Em todas as epístolas, os santos são chamados “os
eleitos” (Col 3.12; Tito 1.1; I Pe 1.2 etc). Eles não se
envergonhavam de serem chamados assim
naqueles dias, como tampouco teriam medo de
declará-lo. Este era o termo mais usual que
empregavam como fórmula de tratamento entre
muitas igrejas cristãs primitivas.
Eleger é o mesmo que escolher entre muitos. Ser
eleito de Deus significa ter sido escolhido para viver
59
nEle e com Ele, fazendo a Sua vontade. Assim, até
mesmo os anjos que Lhe são obedientes são eleitos
(I Tim 5.21). Estes foram conhecidos por Deus em
Sua onisciência, tanto quanto os anjos não eleitos,
antes que estes últimos viessem a cair juntamente
com Satanás, revelando assim o seu amor pelas
trevas e não pela luz; o amor pelo autogoverno,
rejeitando assim o governo de Deus.
Não é correto portanto, considerar que Deus tivesse
falhado na criação dos anjos, em razão da queda de
muitos deles, porque afinal, não eram eleitos. Pode-
se dizer o mesmo em relação à criação do homem.
Não houve nenhuma falha no plano de Deus, e nem
mesmo está corrigindo qualquer falha com a
salvação por meio de Cristo, porque também há
entre os homens, eleitos e não eleitos. Tanto anjos
quanto homens são seres morais que foram criados
com livre arbítrio, e mais cedo ou mais tarde, cada
um deles, a seu tempo, haveria de revelar para onde
lhes conduziria o uso da sua liberdade: à submissão
60
ao Senhor ou à rejeição do seu senhorio. Os que
amam a Sua vontade são eleitos, e os que a rejeitam
não são eleitos, como de fato, estes últimos não
poderiam ser. Porque afinal, somos eleitos para
participarmos da santidade de Deus.
Em razão da queda de Adão, todos os homens
tornaram-se escravos do pecado. Condição esta,
que segundo a Bíblia, é de inimizade contra Deus
(Rom 8.7), isto é, dentre outras coisas,
impossibilidade de conhecerem a Deus por si
mesmos. É falsa portanto a afirmação de que o
homem pode chegar por si mesmo ao
conhecimento de Deus, sem que seja atraído por Ele
para vir a Jesus Cristo. Sem a operação da graça
divina, o livre arbítrio do homem nunca o levaria a
alcançar o conhecimento do único Deus verdadeiro,
por si mesmo e por sua própria capacidade, à parte
da ajuda do Espírito Santo, porque contaminada
pelo pecado, a natureza do homem é inimizade
contra Deus conforme afirmam as Escrituras.
61
Deus submete todos os homens à revelação da luz
do evangelho, e não lhes pede licença para tal, isto
é, não lhes dá a oportunidade de exercerem o livre
arbítrio, de modo que possam escolher não serem
submetidos a tal revelação. De igual modo, também
não é concedido aos homens usarem o livre arbítrio
para fugirem do juízo de Deus.
Jesus disse que os que são pela verdade ouvem a
Sua voz, como que a afirmar que somente estes
podem atender ao Seu chamado para viverem para
Ele. Se bem que isto não signifique que antes da
conversão estivessem na verdade ou na luz. Ao
contrário, como a Palavra é bastante clara em
afirmar, estavam em trevas como os demais
pecadores.
É portanto, somente pela resposta positiva ao
convite do evangelho, que se confirma e se revela a
sua eleição.
62
Eles são agora pela verdade de Deus e é por isso
que podem ouvir a voz de Cristo. Por causa do
trabalho da graça de Cristo neles. Jesus mesmo é
quem salva o homem do pecado, de modo a poder
ser transformado em filho de Deus.
Estes que Lhe pertencem, que Lhe ouvem a voz e
são por Ele conhecidos, ainda que em fraqueza,
dúvidas e temores, serão assistidos pela Sua graça,
de modo que sejam aperfeiçoados, firmados,
fortificados e fundamentados.
Este encontro pessoal com Deus acontece num
determinado momento da vida, escolhido também
pelo Senhor, em Sua Soberania, para se revelar
àqueles cujos nomes estão escritos no livro da vida.
“E peço também a ti, meu verdadeiro companheiro,
que as ajudes, porque trabalharam comigo no
evangelho, e com Clemente, e com os outros meus
63
cooperadores, cujos nomes estão no livro da vida.”
(Fp 4.3).
“A besta que viste era e já não é; todavia está para
subir do abismo, e vai-se para a perdição; e os que
habitam sobre a terra e cujos nomes não estão
escritos no livro da vida desde a fundação do mundo
se admirarão, quando virem a besta que era e já não
é, e que tornará a vir.” (Apo 17.8).
O trabalho de santificação dos eleitos
será realizado progressivamente pelo Espírito
Santo em suas vidas.
Jesus está firmemente empenhado nisto, e usará
todos os recursos necessários para apresentar ao
Pai todos os que Lhe foram dados, sem mancha,
ruga ou qualquer mácula.
Paulo não sabia que ele havia sido eleito por Deus,
antes mesmo de ter sido concebido no ventre de
sua mãe, (Gál 1.15a), para ser o apóstolo dos
64
gentios. Era uma pessoa que seria pela verdade, que
estava lutando contra a verdade, antes da sua
conversão.
A Escritura afirma: não há, fora de Cristo, dentre os
pecadores, um justo sequer. Não há quem busque
o bem. Isto é uma referência à natureza terrena
inteiramente corrompida pelo pecado.
Assim, Cristo salva pessoas desprovidas de qualquer
bondade e justiça que as recomendasse à salvação.
Realmente, quanto à justificação nada há no
homem que lhe possa recomendar a Deus.
Deste modo, ninguém está sendo impedido por
Deus de vir a Ele, em razão de ser pecador. Mas, é
igualmente verdadeiro que ninguém poderá vir a
Jesus se não for atraído a Ele pelo Pai (Jo 6.44). O
próprio homem não eleito escolhe permanecer
endurecido no pecado, e Deus, conhecendo-lhe a
real profundidade íntima do seu espírito em
65
permanecer definitivamente em tal inclinação ao
endurecimento, permite que continue entregue a si
mesmo, deixando de lhe conceder a Sua graça (Rom
1.24,28).
Deus resiste ao soberbo. Conhece-lhe de longe as
intenções reais do coração. Mas ao que se humilha,
isto é, ao que se reconhece pecador e necessitado
de salvação, concede Sua graça (Hc 2.4; Tg 4.6).
“Porque o coração deste povo se endureceu, e com
os ouvidos ouviram tardiamente, e fecharam os
olhos, para que não vejam com os olhos, nem
ouçam com os ouvidos, nem entendam com o
coração, nem se convertam, e eu os cure.” (Mt
13.15).
Nada há no homem que o recomende à eleição. Por
isso Deus predestinou e prometeu salvar pela fé,
somente aqueles que viessem a crer no Seu Filho.
66
Não podemos negar que os tais foram conhecidos
por Deus antes mesmo da criação do mundo, pois
negá-lo seria negar-Lhe o atributo da onisciência, no
qual se inclui o de presciência (I Pe 1.2).
O homem, não é deste modo, eleito e salvo em
razão de sua própria justiça, bondade ou amor a
ambas e à verdade. Mas em razão da justiça,
bondade e verdade que pertencem a Cristo (Rom
5.17-19). Ao contrário, é pecador, e só será salvo
através do reconhecimento desta verdade, pois
Jesus não veio chamar justos, mas pecadores ao
arrependimento.
Quem se considera justo e salvo sem ter-se
arrependido dos seus pecados, não será chamado
pelo Senhor, pois Ele só chama a pecadores, que
reconhecerão que estavam nas trevas, enquanto
não se achegaram à luz de Cristo. Por isso, o Senhor
declara que veio dar vista aos cegos, e que os
67
fariseus permaneciam no pecado, porque não se
consideravam cegos.
Não é portanto, sem motivo, que todos os eleitos
são chamados a demonstrarem boa vontade e amor
para com todos os homens, quer eleitos ou não
eleitos, porque eles próprios são pecadores que
foram resgatados do pecado, inteiramente pela
graça de Deus.
Há uma maior misericórdia, longanimidade e
bondade do que as de que se tornaram alvo?
Por isso são convocados a serem misericordiosos
assim como o Senhor foi misericordioso para com
eles. Pois qualquer que nele creia é salvo. Qualquer
que invoque o Seu nome é salvo.
Não devemos restringir aos eleitos a nossa atenção
e o nosso amor. E nem devemos fazê-lo
simplesmente pela expectativa de ganhar para
Cristo alguns dentre aqueles que ainda não O
68
conhecem. Afinal, nem sabemos quem é eleito
antes que se converta ao Senhor. A ninguém Deus
tem revelado quem é ou não eleito, de modo que
nenhuma pessoa está impedida de buscar se
aproximar dEle e se render a Cristo para que seja
salva.
A Bíblia exorta-nos a fazer o bem a todos os
homens, a amar os nossos inimigos, a dar-lhes de
comer e beber quando têm fome e sede. Enfim, os
que foram alcançados pelo bem devem viver na
benignidade. Os que alcançaram misericórdia
devem ser misericordiosos.
Jesus fez o bem a todos os homens em seu
ministério terreno, e devemos seguir-Lhe os passos.
Ele curou dez leprosos mesmo sabendo que apenas
um deles voltaria para dar glória a Deus. Ele curou a
muitos, que mesmo assim não se arrependeram do
pecado, ainda que não lhes tivesse isentado da
responsabilidade pela sua incredulidade.
69
O bem deve ser feito a todos os homens,
independentemente de serem eleitos ou não
eleitos.
É importante saber que o Senhor não elegeu alguns
para a salvação e outros para a perdição por mero
capricho da Sua vontade. Como quem tivesse
colocado, em sua presciência, toda a humanidade
em fila, e determinado por exemplo salvar os que
ocupassem as posições pares, e condenar os das
posições ímpares.
A isto já respondemos pelas Escrituras, pois Deus
elegeu aqueles que têm crido em Cristo, sem que
lhes seja atribuído qualquer mérito por isto, porque
são tanto pecadores quanto os demais homens.
Leiamos um pouco mais o que Spurgeon escreveu
sobre este assunto:
“Por que murmuram contra a eleição aqueles que
desprezam a Deus? Pelo fato de que Deus não os
70
tenha eleito para viver em santidade? Se a
amassem, seria porque Ele os teria escolhido, e se
não, que direito têm de dizer que Deus deveria ter-
lhes dado o que não lhes agrada? Imagine que eu
tivesse em minha mão algo que não fosse do seu
agrado, e decidisse dá-lo a determinada pessoa, não
é verdade que não se queixaria disso?
Não creio que fosse tão néscio para protestar de
que outro houvesse recebido o que para você era de
nenhum valor.
Por que pois teriam que se queixar de que outras
pessoas tiveram o que vocês rejeitaram?
Muitos não desejam Jesus, não querem ter um
coração novo e nem um espírito reto, não apreciam
o perdão dos pecados nem a santificação, não
anseiam por serem eleitos para estas coisas, então,
por que o lamentam enfurecidos?
71
Por que se queixam contra Deus de que Ele tenha
dado estas coisas, que para eles são como nada, aos
eleitos?
Se elas são preciosas, e se as desejam, aí estão para
todos. Deus dá abundantemente a todos os que lhe
pedem, porém, antes de nada, Ele põe o desejo nos
seus corações (dele é tanto o querer quanto o
realizar), de outra forma jamais o teriam desejado.
Se anelam por tudo isso, Ele os tem escolhido para
que o tenham, porém se não, quem são vocês para
censurar a Deus, quando é o próprio eu de vocês
quem faz com que as odeiem.
“Ah! Porém eu cria”, dirá alguém, “que era Deus
que escolhe uns para o céu e a outros para o
inferno” (de modo frio e aleatório, como
comentado antes – nota do tradutor). Isso é
completamente diferente da doutrina do
Evangelho. Ele tem eleito os homens para o céu
72
mediante a santidade e a justiça. Não se pode dizer
que haja simplesmente escolhido uns para o céu, e
outros para o inferno. Os tem elegido para a
santidade, se vocês a amam. Se alguém quer ser
salvo por Jesus Cristo, Ele o elegeu para ser salvo.
Os chamou para a salvação se vocês a desejam
sincera e ardentemente.
“Bem”, dizem outros, “é porque Deus os elege
porque prevê sua fé”, isto é, que os eleitos antes de
conhecerem Jesus eram pessoas cheias de fé. Mas,
se a fé é Ele quem a dá, tampouco é sensato dizer
que os eleja porque a tem previsto neles. A fé é um
dom de Deus. Toda virtude emana dEle. Por ser,
pois, a fé um dom, não pode ser a causa da eleição.
A eleição, estamos seguros, é absoluta;
completamente à parte de qualquer mérito que os
santos possam ter depois.
“Terei misericórdia de quem me aprouver ter
misericórdia”, salva porque quer salvar. E se me
perguntam por que me salvou a mim, somente lhes
73
direi: porque quis fazê-lo. Havia algo em mim que
me desse algum valor ante os olhos de Deus? Não,
tudo o haveria afastado, não havia nada
recomendável em mim.
Se abrirem a Bíblia em II Tim 1.9, encontrarão: "Que
nos salvou e chamou com uma santa vocação". Aqui
encontramos, portanto, a primeira prova pela qual
podemos examinar nosso chamado - muitos são os
chamados, mas poucos os escolhidos - e isso porque
há várias classes de chamado; porém o chamado
verdadeiro, e somente ele, corresponde à descrição
deste texto.
É um chamado santo, não conforme as nossas
obras, mas segundo o seu propósito e graça, a qual
nos é dada em Cristo Jesus antes dos tempos dos
séculos.
Este chamado elimina toda confiança em nossas
obras, e nos leva a confiar unicamente em Cristo
74
para nossa salvação. Se alguém anda em pecado,
então não foi chamado; se continua vivendo da
mesma maneira que antes da sua pretendida
conversão, então não se trata de conversão real; o
bêbado que receber o chamado, abandonará o
vício.
Vivendo na prática do pecado os homens podem
receber o chamado, mas depois de recebê-lo já não
continuarão mais no pecado. (Não há uma
justificação e regeneração que seja aos poucos, e
não instantânea. O convencimento do pecador sem
a conversão não nos dá o direito de lhe dizer que ele
está sendo salvo aos poucos. Ele poderá
permanecer em nosso meio, frequentando os
serviços da igreja, mas enquanto não tiver um
encontro pessoal com Cristo não se pode dizer que
seja de fato um crente. – nota do tradutor).
Em Hebreus 3.1 lemos estas palavras: "Irmãos
santos, participantes da vocação celestial". Aqui
75
achamos outra prova. É um chamado celestial. Um
chamado celestial significa algo que veio do céu. Foi
chamado por Deus? Ou chamado pelo homem?
Pode agora descobrir em seu chamado a mão de
Deus e a voz de Deus? Se foi apenas o homem quem
o chamou, então você não recebeu o verdadeiro
chamado. Seu chamado veio de Deus? É um
chamado que o encaminha ao céu, do mesmo modo
que veio do céu?
Aqueles que foram chamados são homens que,
antes de sua chamada, gemiam no pecado. Jesus
não veio para chamar justos, e sim pecadores ao
arrependimento. Assim sendo, posso dizer sem
demora ao que confia na justiça própria, que ele não
possui evidência alguma de haver sido eleito. Eu lhe
digo: não! Cristo nunca chama os justos, e se você
não foi chamado (condição que permaneça até ao
dia da morte), isso confirma que não faz parte do
número dos eleitos e portanto você e sua justiça
própria devem ser sujeitos à ira de Deus e à
76
perdição eterna. Somente o pecador a quem Deus
tem despertado de sua condição pecaminosa pode
estar seguro de que foi chamado.
A Palavra de Deus menciona duas classes de
chamado. Fala-se, primeiramente, de um chamado
geral, que se dá no evangelho a todos os que o
ouvem. O servo de Deus tem a obrigação de
convidar todas as almas, sem distinção alguma, a
aceitar a Cristo (Mc 16.15).
A trombeta do evangelho soa fortemente nos
ouvidos de cada pessoa. Este chamado é sincero da
parte de Deus; mas o homem por natureza é tão
contrário a Deus, que o apelo nunca resulta eficaz,
pois despreza-o, dá-lhe as costas e prossegue seu
caminho sem preocupar-se com ele.
Todavia, lembrem-se que embora o chamado seja
rejeitado, o homem não tem nenhuma desculpa
para fazê-lo; o chamado universal tem em si tal
77
autoridade, que a criatura humana que não o
atende não terá escusa no dia do juízo.
Quando alguém é ordenado a arrepender-se e crer,
quando é exortado a fugir da ira vindoura, se ele
menosprezar a exortação e rejeitar o mandamento,
terá que sofrer as consequências disso.
Este chamado universal que é desprezado pelo
homem; é um chamado, porém não vem
acompanhado com a força e a energia do Espírito
Santo para torná-lo um chamado invencível; e em
consequência, as almas perecem, mesmo depois do
chamado universal do evangelho ter soado em seus
ouvidos. Mas o chamado citado em Rom 8.30 é de
natureza distinta; não é um chamado universal, e
sim especial, particular, pessoal, diferenciador,
eficaz e invencível. Este chamado é dirigido aos
eleitos, e a eles somente (pode-se assegurar que é
dirigido somente aos eleitos porque se diz em
seguida no texto de Romanos 8.29,30, que estes
78
chamados foram também justificados e
glorificados, e sabemos que isto se refere apenas
aos salvos – nota do tradutor); eles pela graça
ouvem o chamado, o obedecem e o recebem (Joel
2.32; At 2.39). Sem que isso indique qualquer tipo
de acepção, porque Deus não faz acepção de
pessoas, qualquer tipo de exclusividade,
preferência divina, ou até mesmo discriminação.
A prostituta e o ladrão serão bem recebidos por
atenderem ao chamado. E Deus chamará
eficazmente a qualquer um em cujo coração Ele
perceber que haverá recepção do dom da fé para
receber a Cristo e confiar nEle. Entretanto, jamais
lançará suas pérolas aos porcos e suas coisas santas
aos cães, para que sejam desprezadas e pisadas por
eles. E estes não são comparados a porcos e a cães
por serem pecadores, mas por serem conhecidos na
sua onisciência, como aqueles que se manterão
rebeldes contra a Sua vontade e Pessoa divina.
79
A soberania da chamada eficaz pode ser ilustrada na
história de Zaqueu. Por que Jesus chamou Zaqueu?
Simplesmente porque o chamado de Deus se
estende a pecadores indignos. Nada existe no
homem que o faça merecedor desta chamada - nem
mesmo no melhor dos homens. Deus tem
misericórdia de quem quer ter misericórdia, e o Seu
chamado humilha e quebranta mesmo os piores
pecadores. Eles não podem fazer outra coisa senão
cair da árvore do seu pecado e prostrarem-se
penitentes aos pés do Senhor Jesus.
Em Rom 8.28-30 vemos que os que agora amam a
Deus, são apenas aqueles que foram chamados por
Ele. E por que foram chamados? Porque foram
predestinados para a salvação antes que houvesse
mundo para que sejam transformados à imagem de
Jesus.
Estes que foram assim chamados, são justificados
para participarem da glória divina. Deus, pelo Pacto
80
Eterno feito pela Trindade, antes da fundação do
mundo, determinou salvar pecadores, formando
dentre eles, um povo exclusivamente Seu, zeloso de
boas obras.
Esta é a predestinação. Como consequência direta
desta predestinação para a salvação dos que
viessem a crer em Cristo, ficou determinada a
eleição, isto é, a escolha destes que seriam salvos
pela fé, para terem vida eterna, perdão total dos
pecados e adoção, sendo feitos filhos de Deus. Para
a concretização desta predestinação e eleição, é
necessário convidar, chamar os pecadores para
serem justificados, regenerados e glorificados.”.
Nós percebemos nitidamente que Spurgeon se
distanciou do determinismo calvinista, na
expressão de uma escolha aleatória dos eleitos por
Deus designando assim os que desejaria salvar e os
que desejaria condenar no inferno. É a isto que
faremos realmente bem em rejeitar no ensino dos
81
reformadores em geral, porque não há base para se
fazer uma afirmação final neste sentido à luz do
contexto geral das Escrituras.
Spurgeon se expressou bem quando disse com base
no ensino da Bíblia que a eleição foi para a
santidade, e se alguém deseja a santidade de Deus
evidencia nisto ser verdadeiramente um eleito,
como que a dizer que a eleição foi feita para todos
aqueles que viessem a aspirar à santidade de Deus,
e Ele teria determinado a eleição destes, pelo Seu
conhecimento presciente desta condição inerente a
eles.
Há vários textos bíblicos que ensinam claramente
que a eleição foi fixada por Deus antes da criação do
mundo, e dentre estes destacamos: II Tim 1.9; II Ts
2.13b,14; Ef 1.4,5; I Pe 1.2.
Os nomes dos eleitos estão registrados no livro da
vida, e os dos não eleitos não se encontram
82
registrados no mesmo, sendo que o registro foi feito
antes da fundação do mundo: Apo 13.8; 17.8b;
20.15; 21.27; Fp 4.3.
O próprio Jesus ensinou que muitos são chamados
com a chamada geral da pregação do evangelho,
mas somente uns poucos dentre estes são
escolhidos (eleitos) por Deus, para a salvação (Mt
20.16b; 22.3,12-14).
No contraste entre os vasos de ira (não eleitos) e os
de misericórdia (eleitos) em Rom 9.21-25, afirma-se
que somente os vasos de misericórdia podem dar a
conhecer as riquezas da glória do Senhor, em razão
do trabalho da graça em suas vidas.
As palavras “Ou não tem o oleiro direito sobre a
massa, para do mesmo barro fazer um vaso para
honra e outro para desonra?” não devem ser
interpretadas que Deus mesmo modelou espíritos
desobedientes, infundindo-lhes a incapacidade de
83
se voltarem para Ele, e também ao mesmo tempo
inclinando-lhes para o erro.
Como podemos conciliar a ideia de que Deus é
bondoso e justo com a de que Ele próprio modelou
a perversidade em alguns espíritos, para finalmente
condená-los à perdição eterna no inferno?
Deus em sua bondade nem mesmo pode tentar
qualquer pessoa (Tg 1.13).
Somente o homem é responsável pelo pecado que
existe em sua natureza terrena. E não podemos
esquecer em nenhum momento, que criaturas
morais, como o homem, são dotadas de livre
arbítrio, e que além deste livre arbítrio, têm uma
alma que pode ser avessa ou não à presença do
Espírito de Deus e à Luz de Jesus.
Jesus disse aos discípulos: "Não fostes vós que me
escolhestes a mim; pelo contrário, eu vos escolhi a
vós outros, e vos designei para que vades e deis
84
frutos, e o vosso fruto permaneça;" (Jo 15.16). Não
padece qualquer dúvida que o Senhor estava se
referindo à eleição.
Na conclusão da parábola do juiz iníquo Jesus fez
referência aos eleitos (Lc 18.7).
Judas foi escolhido como apóstolo mas não era um
dos escolhidos (eleitos) de Deus quanto à salvação.
Referindo-se a ele, Jesus disse que lhe havia
escolhido sabendo que era um diabo, isto é, inimigo
para o propósito de traí-lo, conforme já estava
profetizado na Escritura (Jo 6.70,71; 13.18).
Muitos ensinam que Judas poderia ser um crente
fiel caso o desejasse, mas isto não concorda com o
ensino geral das Escrituras, nem com as palavras
específicas de Jesus a seu respeito, pois não sendo
um dos eleitos de Deus, como poderia crer?
Não por nada que Deus tivesse feito nele em tal
sentido, mas pelo que ele era em sua própria
85
natureza e espírito, e que era conhecido por Deus, a
ponto de ter falado da sua perdição muitos séculos
antes de ter chegado à existência. Jesus também se
referiu a Judas chamando-o de filho da perdição (Jo
17.12). Ora, quem é filho da perdição, senão aquele
que nasceu para se perder.
O Senhor foi bastante claro quanto à
impossibilidade de alguém crer nEle caso não se
encontre entre os eleitos. Isto se depreende dos
seguintes textos, dentre outros: Jo 6.37, 39, 64,65;
8.42-44, 47; 10.26; 15.19; 17.6.
A distinção entre eleitos e não eleitos será bem
marcada no tempo do fim, quando os anjos fizerem
separação entre ambos (Mc 13.27).
Necessitamos ainda de palavras mais enfáticas
quanto à eleição do que as de Jo 17.9? Jesus não
incluiu os não eleitos na cobertura da sua oração
sacerdotal, mas apenas aqueles que lhes foram
dados pelo Pai, a saber, os escolhidos.
86
Além das várias referências bíblicas já destacadas
ao longo do nosso estudo, podem ser citadas ainda
muitas outras que confirmam a realidade da eleição
pela graça: I Ts 1.4; Ef 1.11; Mc 13.20; Rom 8.33;
16.13; I Pe 5.13; II Jo 13; I Cor 1.24.
Para demonstrar que a eleição é por graça e não por
mérito, Deus tem mais eleitos entre os fracos e
desprezados (I Cor 1.26-29; Tg 2.5), do que entre os
sábios, poderosos e nobres. Isto é para que ninguém
se glorie, como afirma o apóstolo Paulo (I Cor 1.29).
Em que nos gloriaremos então quando o assunto se
trata da nossa eleição, senão somente em Jesus
Cristo. Porque fomos escolhidos nEle,
predestinados em amor para Ele, para a adoção de
filhos, e por meio dEle (Ef 1.3-5).
Como fica a glória humana? Reduzida a menos do
que nada. Deste modo, prosperar no mundo,
87
participar da sua glória efêmera, não é‚ nunca foi e
nunca será sinal da graça e do favor divino.
Muitos têm sido enganados pela glória do mundo
que hoje é e amanhã já não será.
Há um reino e uma glória que não são deste mundo.
Luxo, conforto, riquezas... quanto tempo duram e
por quanto tempo podemos desfrutar deles? Como
comparar uns poucos anos terrenos com toda a
eternidade? Tais coisas são como laços para aqueles
que nelas colocam os seus corações.
Quais aplicações práticas e úteis podemos fazer do
aprendizado da doutrina da eleição?
Dentre outras podemos destacar as seguintes:
a) Perseverar na fé, rejeitando as acusações da
carne e do diabo, em razão da prática eventual de
possíveis pecados, por sabermos que a nossa
filiação a Deus não está baseada na nossa própria
88
justiça, santidade ou méritos, mas no fato de
termos sido escolhidos por determinação exclusiva
da Sua graça. Isto servirá para termos uma boa
consciência (não paralisada por tais acusações) e
fortalecimento de nossa fé nos méritos de Jesus,
que nos foram atribuídos na justificação.
b) Maior eficácia na evangelização pessoal ou
pregação pública do evangelho, pela ministração da
verdade a toda e qualquer pessoa (boa ou má)
sabendo que Jesus tem seus escolhidos até entre os
piores, e que veio chamar os eleitos entre
pecadores, e não justos.
c) Maior e melhor qualidade da adoração, louvor e
serviço à Trindade, pelo conhecimento da
profundidade da graça salvadora, especialmente no
que se refere à eleição.
d) Discernimento do oferecimento da graça pelo
Espírito, não lançando pérolas e cousas santas a
89
pessoas reprovadas (não eleitas) sabendo que a fé
não é de todos.
e) Paz no espírito quanto à certeza de que o
trabalho de alcançar os eleitos, sem exceção de
qualquer um deles será feito pelo Espírito Santo,
ainda que sejam imperfeitos os nossos
empreendimentos evangelísticos e missionários,
sem que isto signifique qualquer incentivo a nos
acomodarmos ou a fazermos a obra de Deus
relaxadamente, sem o devido zelo fervoroso,
porque é necessário muita intercessão diante de
Deus para que tire os eleitos das trevas para a Sua
luz, e do endurecimento em que eles se encontram.
Não devemos esquecer que para revelar que há
eleição, está escrito: “amei a Jacó, porém me
aborreci de Esaú”, e isto se refere ao fato de ter
Deus escolhido a Jacó e não a Esaú, quando os
gêmeos não eram ainda nascidos e nem tinham
praticado o bem ou o mal (Rom 9.11-13); e quanto
90
a Faraó nos dias de Moisés foi dito por Deus em
relação a ele: “Para isto mesmo te levantei pra
mostrar em ti o meu poder, e para que o meu nome
seja anunciado por toda a terra”, e em face disto o
apóstolo Paulo conclui: “Logo, tem ele misericórdia
de quem quer, e também endurece a quem lhe
apraz.” (Rm 9.16-18).
Assim, também se diz em relação a Judas que era
filho da perdição, e isto indica que não poderia ser
um crente, incluído no rol dos remidos pelo sangue
de Jesus, porque era um diabo, isto é, um inimigo
de Deus, no dizer do próprio Jesus, e fora escolhido
por Ele exatamente para o propósito de o trair.
O Espírito de Deus revelou nas Escrituras a traição
de Judas alguns séculos antes de que ele nascesse.
Estes são apenas uns poucos exemplos dentre os
muitos que estão registrados na Bíblia quanto à
presciência de Deus relativa àqueles que são e que
não são Seus.
91
Em relação a Jeremias Ele disse: “Antes que eu te
formasse no ventre materno, eu te conheci, e antes
que saísses da madre, te consagrei e te constituí
profeta às nações.” (Jer 1.5).
Paulo diz a respeito de si mesmo: “Quando, porém,
ao que me separou antes de eu nascer e me chamou
pela sua graça, aprouve revelar seu Filho em mim,
para que eu o pregasse entre os gentios,...” (Gl
1.15).
Portanto, a presciência de Deus é inegavelmente
um dos Seus atributos, e por meio dele pode
conhecer e pesar os espíritos antes que cheguem à
existência neste mundo.
“Nós somos de Deus; quem conhece a Deus nos
ouve; quem não é de Deus não nos ouve. Assim é
que conhecemos o espírito da verdade e o espírito
do erro.” (I Jo 4.6).
92
“Então lhes direi claramente: Nunca vos conheci;
apartai-vos de mim, vós que praticais a iniquidade.”
(Mt 7.23).
“Respondeu-lhes Jesus: Porque a vós é dado
conhecer os mistérios do reino dos céus, mas a eles
não lhes é dado;” (Mt 13.11).
“Porque cada árvore se conhece pelo seu próprio
fruto; pois dos espinheiros não se colhem figos, nem
dos abrolhos se vindimam uvas.” (Lc 6.44).
“Todas as coisas me foram entregues por meu Pai;
e ninguém conhece quem é o Filho senão o Pai, nem
quem é o Pai senão o Filho, e aquele a quem o Filho
o quiser revelar.” (Lc 10.22). Este versículo é
bastante claro quanto à verdade que a eleição para
a salvação está inteiramente dependente da
iniciativa de Cristo em escolher a quem Ele quiser se
revelar. O pecador nada pode fazer senão se render
à Sua revelação.
93
“Mas o próprio Jesus não confiava a eles, porque os
conhecia a todos,” (Jo 2.24).
“Eu sou o bom pastor; conheço as minhas ovelhas,
e elas me conhecem,” (Jo 10.14).
“a saber, o Espírito da verdade, o qual o mundo não
pode receber; porque não o vê nem o conhece; mas
vós o conheceis, porque ele habita convosco, e
estará em vós.” (Jo 14.17).
“E Deus, que conhece os corações, testemunhou a
favor deles, dando-lhes o Espírito Santo, assim
como a nós;” (At 15.8).
“Porque os que dantes conheceu, também os
predestinou para serem conformes à imagem de
seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre
muitos irmãos;” (Rm 8.29).
“Mas, se alguém ama a Deus, esse é conhecido
dele.” (I Cor 8.3).
94
“conhecendo, irmãos, amados de Deus, a vossa
eleição;” (I Tes 1.4).
“sempre aprendendo, mas nunca podendo chegar
ao pleno conhecimento da verdade.” ( II Tim 3.7).
“Paulo, servo de Deus, e apóstolo de Jesus Cristo,
segundo a fé dos eleitos de Deus, e o pleno
conhecimento da verdade que é segundo a
piedade,” (Tito 1.1).
Que nenhum dos eleitos se abençoe no seu íntimo,
julgando-se melhor do que os demais homens,
porque na verdade todos são pecadores.
Deus nos vê e nos julga como canas quebradas, por
causa de nossa fraqueza e pecado, e não como
carvalhos majestosos.
Paulo se gloriava na sua própria fraqueza sabendo
que era um vaso de barro no qual toda a excelência
era a de Cristo.
95
A propósito, os eleitos são chamados de vasos de
misericórdia, porque se não fosse pela misericórdia
de Deus em elegê-los, a par de serem pecadores,
jamais poderiam ter sido escolhidos por Deus, por
ser completamente justo e santo.
É pela copiosa redenção que há em Cristo que
pudemos ser eleitos por Deus e não por qualquer
bondade e justiça própria que houvesse em nós.
Acerca disto, bem se expressou Davi no Salmo 130:
“Se tu, Senhor, observares as iniquidades, Senhor,
quem subsistirá?” (v. 3). “Mas contigo está o
perdão, para que sejas temido” (v. 4). “Espera, ó
Israel, no Senhor! pois com o Senhor há
benignidade, e com ele há copiosa redenção; e ele
remirá a Israel de todas as suas iniquidades.” (v.
7,8).
Tudo o que se refere à eleição não foi por ter Deus
criado nos que se perdem uma disposição para isto,
96
pois na condição de seres morais dotados de livre
arbítrio, manifestam pelo seu próprio
endurecimento no pecado, uma permanente
inimizade contra Deus, condição esta, da qual são
libertados os eleitos, a saber, todos aqueles que se
arrependem de seus pecados e se voltam para Deus,
crendo nas promessas e verdades do Evangelho.
É preciso pois ter o cuidado de não tentar
apresentar Deus aos outros como sendo
complacente e bonzinho para com todos, para não
desfigurarmos o Seu real caráter, por deixar de
apresentá-lo como verdadeiro, soberano,
onisciente e onipotente.
Não temos o poder de fazer com que Deus deixe de
ser Deus, e todas as teorias teológicas que ocultem
a grande verdade da Sua soberania na eleição serão
abatidas quando forem submetidas ao juízo da Sua
Majestade quando Ele se manifestar em glória.
97
Para o nosso próprio bem e dos nossos ouvintes
será uma boa praxe passar todas as nossas
afirmações sobre as Escrituras sob o crivo do devido
temor ao Senhor.
A Bíblia declara que a salvação dos homens
pecadores é uma questão de graça. De Efésios 1:7-
10 aprendemos que o propósito primordial de Deus
no trabalho da redenção foi o de exibir a glória
deste atributo divino da misericórdia e da graça, de
forma que por épocas sucessivas o universo
inteligente pudesse admirar isto por ser feito
conhecido pelo amor não merecido dEle e Sua
bondade ilimitada para com criaturas culpadas, vis,
desamparadas.
Adequadamente, todos os homens são
representados como estando numa condição de
pecado e miséria, dos quais não podem se livrar
totalmente.
98
Quando mereciam somente a ira e a maldição de
Deus, Ele determinou que iria, graciosamente,
prover redenção para eles enviando o Seu próprio
Filho eterno para assumir a sua natureza e culpa e
obedecer e sofrer no seu lugar, e o Espírito Santo,
para aplicar a redenção comprada pelo Filho.
No mesmo princípio representativo pelo qual o
pecado de Adão é imputado a nós, somos
completamente responsáveis por isto e sofremos as
suas consequências, o nosso pecado em
contrapartida é imputado a Cristo e a Sua justiça nos
é imputada.
Assim, foi pela determinação de um pacto de graça,
que Deus oferece a salvação numa condição bem
mais baixa do que a condição que foi imposta a
Adão de permanecer perfeito perante Ele, pois em
vez de exigir obediência perfeita Ele aceita somente
a fé e a obediência evangélica, conforme o pobre
pecador imperfeito pode fazer.
99
A palavra "graça" em seu próprio sentido e
significado é o amor livre e imerecido ou favor de
Deus oferecidos a pecadores indignos.
É algo que é determinado independente de
qualquer mérito do homem; e introduzir obras ou
merecimentos em qualquer parte deste esquema
planejado por Deus para a salvação, corrompe a
natureza e frustra o Seu propósito eterno.
Como é por graça, não pode incluir méritos
precedentes que existissem no que é salvo. E é e
deve ser por graça porque é somente por ela que
todas as criaturas morais de Deus podem ser
mantidas santas e inculpáveis perante Ele, porque
isto não está no próprio poder delas.
Somente Deus tem poder em si mesmo para não
pecar.
Todas as suas criaturas morais, sejam anjos ou
homens, dependem inteiramente dEle e
100
especificamente da operação da Sua graça para que
estejam de pé e inculpáveis na Sua presença. E vale
dizer que isto não pode ser obtido sem estar em
comunhão com Ele.
Como o homem depende inteiramente da
misericórdia de Deus para que seja salvo, pois diz
que terá misericórdia de quem Lhe aprouver, então
está somente em Deus poder livrar o homem da
condição de escravidão ao pecado, porque, por
melhores que sejam as obras do pecador, está
inteiramente sem méritos diante de Deus, em razão
de ser pecador, de suas más obras e da sua
incapacidade inata de não poder fazer as obras de
Deus e ter a vida de Deus em santidade e justiça
plenas, que seria a única forma de alguém ser salvo
sem a graça, mas como vimos, ninguém pode ser
santo e justo sem que seja fortalecido e capacitado
pela graça divina, e daí decorre então que qualquer
pessoa natural, sem a justiça e a graça salvadora de
Cristo está sem méritos diante de Deus e não
101
merece dEle senão somente castigo e nenhum dom
ou favor.
Tudo que os homens têm de bom, foi Deus quem
lhes deu; e o que não têm, certamente é porque,
obviamente não o receberam de Deus.
Como Deus, em Seu plano eterno, preparou boas
obras que procedem dEle, para que andássemos
nelas (Ef 2.10), e como estas obras são o resultado
da graça que passou a habitar naqueles que elegeu
para a salvação, porque de outro modo não
poderiam praticá-las porque todas estas obras são
o resultado, a consequência da operação da graça
neles, então não têm do que se gloriar, nem mesmo
em suas obras, porque não são propriamente deles,
mas da graça (I Cor 15.10).
Deste modo, tudo permanece debaixo da soberana
graça do Senhor, efetuando nos seus eleitos tanto o
querer quanto o realizar.
102
Assim, toda a glória e honra são devidas ao Pai, ao
Filho e ao Espírito Santo, posto que Deus mesmo faz
as Suas obras em nós e por meio de nós.
Tendo sido criados portanto, para a exclusiva glória
e honra do Senhor, por um viver em santidade e
justiça, em completa dependência do Seu próprio
poder, requer-se de toda criatura moral que tenha
pureza imaculada e obediência perfeita a Deus.
Como já vimos antes, como poderá o homem
pecador alcançar isto até a perfeição completa que
terá na glória futura, se não for por um trabalho da
graça em sua vida?
Esta perfeição é provida pela justiça de Cristo, que é
imputada a eles, e que é também implantada em
suas naturezas pelo processo da santificação.
É dito claramente que Cristo sofreu como um
substituto, "o justo pelo injusto"; e quando o
homem é encorajado a pensar que deve a si mesmo
103
um pouco de seu próprio poder e arte nesta
salvação que na realidade é totalmente pela graça,
Deus é roubado de parte da Sua glória.
Por nenhuma extensão da imaginação as boas obras
de um homem podem ser consideradas ainda por
um pouco que seja, equivalentes às bênçãos da vida
eterna.
Na realidade, nós nada somos além de meros
receptores; nós nunca poderíamos de nós mesmos
atender ao propósito de viver em perfeita justiça e
santidade diante de Deus, pois como vimos, isto
será um trabalho exclusivo da graça de Cristo em
nós.
A nossa parte consiste em crer e andar na presença
de Deus procurando ser-Lhe agradáveis em tudo,
mas sabendo de antemão que nada podemos fazer
de nosso próprio poder.
104
Até nossas imperfeições e falhas em nossa
comunhão servem para comprovar que somos
inteiramente dependentes da graça e do favor do
Senhor, que não sendo manifestados a nós, e não
estando fortalecidos na graça de Jesus, não
podemos viver do modo que Lhe seja agradável e
praticar as obras de justiça da fé, conforme o Senhor
nos capacita, pelo Seu próprio poder.
Aqui temos experimentado a graça em nossas
imperfeições em medidas recebidas não em grau
absoluto, constante e permanente, ainda que nos
esforcemos para tê-lo em todo o tempo, porque não
está em nós sermos assistidos em todo o tempo,
ininterruptamente pelo poder da graça do Senhor
para não pecarmos e fazermos somente o que Lhe
seja agradável, pois como diz Tiago, tropeçamos em
muitas coisas neste mundo, e como diz João, se
dissermos que não temos pecado, mentimos, pois
para propósitos específicos, Deus nos tem ensinado
por privações momentâneas da Sua graça, que
105
realmente todo o poder espiritual que há em nós
procede dEle e não de nós mesmos.
Isto nos estimula e encoraja ao exercício da fé para
buscar nEle os recursos espirituais necessários para
viver na prática da justiça, e em santidade de vida.
Louvado seja o Seu santo nome!
Louvada seja a Sua soberania e misericórdia!
Assim, se alguém é grande e poderoso diante dEle
em obras e palavras é porque tem recebido uma
maior assistência da Sua graça do que outros, e não
tem portanto do que se gloriar em si mesmo, senão
nAquele de quem procede toda esta graça e poder.
Por isso Paulo diz que toda a jactância do homem é
excluída pelo plano de salvação de Deus.
Ainda que o homem não tivesse pecado, e não
precisasse de um Redentor que pagasse o preço
devido para satisfazer à justiça de Deus, e assim
106
poder libertar o pecador da escravidão ao pecado,
ao diabo, e da sujeição à ira eterna de Deus, nem
mesmo neste caso, o homem teria qualquer mérito
no fato de ser mantido perfeitamente santo e justo
diante de Deus, pois ninguém poderia sê-lo a não
ser por uma capacitação direta da própria graça
divina.
“É a lei, então, contra as promessas de Deus? De
modo nenhum; porque, se fosse dada uma lei que
pudesse vivificar, a justiça, na verdade, teria sido
pela lei. Mas a Escritura encerrou tudo debaixo do
pecado, para que a promessa pela fé em Jesus Cristo
fosse dada aos que creem.” (Gl 3.21,22).
É por isso que Jesus diz em Lc 17.10 que não há
nenhum mérito em nossas obras, porque tudo o que
fazemos é uma mera consequência do que
deveríamos fazer e para o quê somos inteiramente
capacitados pela exclusiva graça de Deus:
107
“Assim também vós, quando fizerdes tudo o que vos
for mandado, dizei: Somos servos inúteis; fizemos
somente o que devíamos fazer.” (Lc 17.10).
Pelo mesmo motivo se diz em Is 64.6: “Pois todos
nós somos como o imundo, e todas as nossas
justiças como trapo da imundícia; e todos nós
murchamos como a folha, e as nossas iniquidades,
como o vento, nos arrebatam.”.
E em Is 55.1: “Ó vós, todos os que tendes sede,
vinde às águas, e os que não tendes dinheiro, vinde,
comprai, e comei; sim, vinde e comprai, sem
dinheiro e sem preço, vinho e leite.”.
Se a salvação é pela graça, como a Bíblia tão
claramente ensina, não pode ser por obras.
Não há nenhum mérito nem mesmo na fé que
temos porque é um dom de Deus.
Deus dá ao Seu povo a operação do Espírito para
que possam crer.
108
Então, é somente a fé a causa instrumental, o meio,
e não a causa meritória da salvação. Assim a fé que
é dom de Deus e a Sua graça, antecedem as nossas
boas obras.
“Querendo ele passar à Acaia, os irmãos o
animaram e escreveram aos discípulos que o
recebessem; e tendo ele chegado, auxiliou muito
aos que pela graça haviam crido.” (At 18.27).
Vemos claramente aqui que foi por causa da graça
que eles creram, isto é, que receberam o dom da fé.
“Os gentios, ouvindo isto, alegravam-se e
glorificavam a palavra do Senhor; e creram todos
quantos haviam sido destinados para a vida
eterna.” (At 13.48).
Aqui se diz que creram os que estavam destinados
para a vida eterna. E quem creu senão o que foi
eleito pela graça para a salvação? E foi pelo poder
operante desta mesma graça que ele pôde crer.
109
Em At 16.14 se diz que foi Deus quem abriu o
coração de Lídia para receber o evangelho. Se é a
graça que tudo faz em relação à salvação, vemos
então que como se afirma em Ef 2.10, as boas obras
não são em nenhum sentido a base meritória da
salvação, mas o fruto e a prova da salvação.
É por causa deste sistema de graça na salvação que
se diz que aquele que se gloriar, glorie-se no Senhor,
pois a redenção foi comprada por um preço
elevadíssimo e infinito pelo próprio Senhor.
Quando Adão pecou e Deus fez para ele e para sua
mulher vestimentas de peles de animais, naquele
ato mesmo já estava preanunciada a salvação pela
graça unicamente pela fé em Cristo, e que seria
portanto, desde então, a única forma de Deus se
prover de filhos dentre os pecadores, por meio da
Sua eleição soberana, em redimir pecadores não
merecedores da salvação.
110
Ainda que reconheçamos que a justiça de Adão,
enquanto em santidade, estava baseada na sua
obediência ao mandamento de Deus de não comer
do fruto proibido, o que se comprovou é que assim
como Adão caiu em desobediência, qualquer
homem, no lugar de Adão, deixado à sua própria
capacidade e poder para não pecar, acabaria
pecando em dado momento, tal como ele.
Ele deveria recorrer à graça de Deus, apesar de se
encontrar em estado de perfeição, antes do pecado,
para que fosse fortalecido e não caísse na tentação,
mas o fato é que ele não o fez e veio a cair.
É o poder operante do Espírito em conceder esta
condição de perfeita obediência que nos impede de
cair, e é isto que impede também os anjos eleitos de
pecarem.
É por pura graça concedida em grau absoluto (como
a teremos no céu) que impede qualquer ser moral
111
criado por Deus de pecar contra Ele. Sem que Ele
conceda tal graça seria impossível permanecer em
estado de retidão absoluta perante Ele.
Cremos que é isto que Ele queria mostrar, ensinar,
principalmente aos anjos eleitos, com a criação do
homem, e a forma que este está sujeito ao pecado,
sem que receba graça e misericórdia da parte de
Deus para vencê-lo.
Daí o conselho de Paulo a Timóteo para se fortificar
na graça que está em Cristo Jesus, e não somente a
Timóteo como também a toda a Igreja, como está
escrito em Ef 6.10.
Esta graça foi revelada desde o princípio. Quando
João diz que a lei veio por Moisés e a graça e a
verdade por Jesus Cristo o que há muito de
revelação nisto é que Moisés não tinha nenhuma
graça para transmitir por si mesmo a nenhum
pecador, mas Cristo é a fonte de toda a graça.
112
A revelação nisto é também que Moisés não foi
Mediador de nenhuma aliança que fosse firmada na
pura graça de Deus para a justificação.
Esta aliança da graça foi firmada por Jesus.
No entanto, não se pode afirmar que a graça que
opera pela fé não estava operando nos dias do
Antigo Testamento, pois vemos que mesmo antes
da Lei, Abraão foi justificado pela fé, e certamente
também Enoque, Noé e muitos outros eleitos de
Deus, que viveram em tal período.
Como comentamos antes, quando Adão pecou,
ficou comprovado que o homem não poderia ser
salvo por sua própria capacidade, e jamais poderia
se manter no estado de total santidade pelo seu
próprio poder.
O homem necessita ser eleito por Deus para receber
dEle graça e misericórdia, para poder vencer o
pecado e chegar ao estado de santidade absoluta no
113
porvir, que também lhe será garantido pelo
exclusivo poder da graça de Deus.
Leia mais atentamente todos os textos de Paulo
relativos à graça e verifique que é exatamente a isto
que ele se refere em todas as suas epístolas.
Ele sabia perfeitamente que quanto Deus disse a
Moisés que usa de misericórdia com quem lhe apraz
o que Ele quer dizer com isso, é que todos são
eleitos, justificados, capacitados, honrados,
amados, aperfeiçoados etc, unicamente pela graça
que Ele concede no exercício da Sua misericórdia, e
que foi este o modo que Ele fixou desde a
eternidade para firmar todos os seres morais na Sua
justiça e santidade, de modo que sejam
considerados Seus filhos, e possam viver de modo
que Lhe seja agradável.
Sem o Seu amor e graça, o homem nada é, segundo
o propósito para o qual foi criado, a saber, de viver
114
na prática das obras que o próprio Deus preparou
na eternidade, assim como o Seu método de
salvação pela graça.
Não são as boas obras segundo a própria escolha e
imaginação do homem que estão em foco, senão as
boas obras que Deus preparou de antemão, como
se diz em Ef 2. Então, até mesmo para a prática
destas boas obras o crente necessitará da
iluminação e capacitação do Espírito Santo,
mediante a mesma graça que lhe foi concedida para
a justificação. Afinal, não são as obras do homem
mas as obras de Deus.
É assim que nós podemos entender que os maiores
feitos pelos maiores homens do mundo que não
têm a Cristo como Salvador, nada lhes aproveitará
na eternidade, e realmente nada para a sua
salvação eterna, porque continuam debaixo da ira
de Deus, por serem escravos do pecado, por não
serem Seus eleitos, por não terem alcançado
115
misericórdia, por não terem sido santificados pela
graça.
Mesmo os atos valorosos dos crentes, que não são
feitos em Deus e para Ele, não contarão em nada
para o seu galardão futuro, e não servem para lhes
recomendar ao Senhor, porque, como vimos antes,
são as Suas obras, e não propriamente as nossas
que nos recomendam perante Ele.
Por isso se lê em I Cor 13 que apesar de grandes
feitos e sacrifícios e sofrimentos sem a ação do
amor de Cristo em graça, nada teremos e seremos.
Lendo Is 53.4,5, 11, 12 o que vemos ali é a pura graça
e misericórdia de Deus manifestada em Cristo em
favor da salvação dos pecadores.
II Cor 5.21 diz que: “Àquele que não conheceu
pecado, Deus o fez pecado por nós; para que nele
fôssemos feitos justiça de Deus.”. A graça nos deu
116
Cristo, e sem Cristo não podemos ter o poder da
graça.
O texto de Rom 3.20-28 mostra claramente que a
salvação é inteiramente pela graça e que todo o
mérito na salvação pertence exclusivamente a
Cristo.
Em Rm 5.18,19 e Fp 3.8,9 Paulo mostra que a justiça
que salva é a de Cristo, e não a justiça própria, e que
aquela justiça é obtida unicamente pela fé, para que
seja por graça e não por obras.
Deus quer nos ensinar que os nossos melhores
esforços, sem o trabalho do Espírito Santo
aplicando a Sua graça em nossas vidas, não nos
levariam a lugar algum, porque não podemos ser
participantes da natureza de Deus, que é espírito,
senão pela operação e habitação do Seu próprio
Espírito que Ele nos concede livremente pela fé em
Cristo.
117
A posição determinista de que Deus escolheu alguns
para a salvação e outros para a perdição eterna
mantém intocado o sistema de salvação
unicamente pela graça e segundo a soberania e
misericórdia exclusiva de Deus na eleição; mas cria
algumas dificuldades, e a maior delas é que se Deus
quisesse, qualquer pessoa poderia ser salva, então
não seria correto ou mesmo verdadeiro que Ele
afirme que não tem prazer na morte do ímpio e que
é Seu desejo que todos se salvem, já que estaria na
esfera do Seu poder fazê-lo.
Se por um lado a soberania de Deus na eleição é um
fato incontestável, por outro, não se pode tratar
como um fato moral em termos meramente
técnicos e teológicos, sem levar em conta outros
aspectos como o do caráter moral do próprio Deus,
que seria considerado negativamente, se fosse
aventada esta hipótese de que se Ele quisesse
poderia manter o próprio Satanás em estado de
perfeita obediência, temor e amor a Ele.
118
Nós cremos que, segundo o que se pode aprender
das Escrituras, é Deus quem pode nos firmar na
verdade e santidade pela Sua graça, mas seria
inteiramente incompatível com o Seu caráter santo,
compassivo e perdoador considerar que Ele
endureceria no pecado quem estivesse buscando
sinceramente encontrar a verdade e a Sua própria
pessoa divina, para viver do modo que Lhe fosse
agradável, e daí Jesus dizer que a nenhum que vier
a Ele, será lançado fora, como que a dizer que todos
que o buscarem de fato Lhe encontrarão, e sabemos
que certamente estes estarão sendo atraídos pelo
Pai a Ele, porque de outro modo jamais O
encontrariam, e João diz isto nas palavras que nós O
amamos porque Ele nos amou primeiro, quer dizer,
a iniciativa de procurá-lo partiu dEle mesmo.
Os evangelhos mostram claramente o esforço de
amor e misericórdia de Jesus entre os homens,
fazendo inclusive muitos sinais entre eles para atraí-
los à salvação, ainda que dissesse que muitos
119
permaneceriam endurecidos pelos seus pecados e
não viriam para a Luz, e para estes nem sequer a
verdade seria colocada em termos diretos e claros
para que não se convertessem à doutrina, sem um
real conhecimento de Deus, porque isto não estava
nos seus corações.
Em Sua onisciência, Deus que conhece os corações,
sabia que seria lançar pérolas aos porcos, chamar os
tais por uma ação direta do Espírito, pois seria em
vão pelo conhecimento prévio da disposição dos
seus corações.
Deste modo, vemos que há uma ação de Deus em
manter em endurecimento os que já estão
endurecidos e que desejam permanecer nesta
condição, sem que sejam tentados a permanecerem
no pecado, porque isto não somente é uma
impossibilidade moral para Deus, como não estaria
em conformidade com o Seu caráter santo, bondoso
e justo.
120
Então, no desejo correto de afirmarmos a Soberania
de Deus devemos ter o cuidado de não forjar uma
teologia que não esteja em conformidade com o
todo da revelação bíblica, que nos apresenta sim,
como já dissemos Deus soberano na salvação do
homem, mas que não exime a responsabilidade do
homem, de modo que não seria correto julgá-los
dignos do inferno se não fossem responsáveis pelos
seus atos, quanto especialmente a terem a
possibilidade de se voltarem para Deus, de modo
que pudessem ser salvos por Ele.
Entretanto, as dificuldades permanecem, porque se
de fato, como realmente é, a salvação dos eleitos é
de conhecimento presciente de Deus, tanto que
foram conhecidos de antemão como os que seriam
salvos pela exclusiva graça e misericórdia de Deus,
já que são pecadores, não se pode negar, que uma
grande dificuldade seria levantada se pensássemos
que a eleição não foi feita por nenhum mérito por
um conhecimento prévio para a fé da parte de Deus,
121
daqueles que aceitariam o convite à salvação,
porque isto, tiraria a salvação da esfera exclusiva da
graça, e seria então pelo mérito deles de crerem.
Mas isto é o que afirmam os reformadores.
Entretanto, se vemos por outro lado, que em
relação ao pecado ou à capacidade de ficarem
firmes na justiça e santidade, não há qualquer
mérito em nenhum pecador, pois como vimos
antes, ninguém é capaz disto, então, não seria um
ato meritório deles o fato de ter Deus conhecido em
Sua presciência quem viria a crer para que pudesse
ser justificado pela graça, pois continuariam
dependendo da graça, não somente para serem
justificados, mas para serem firmados na justiça.
Então, sem que façamos do homem um parceiro de
Deus na questão da salvação, pois como vimos, ele
é inteiramente dependente da soberania e
misericórdia do Senhor, no entanto, não excluímos
a responsabilidade humana em não somente buscar
o reino de Deus e a Sua justiça, no que tange à
122
justificação e regeneração, como também na busca
da santificação durante todo o curso da sua vida,
sem que isto implique em qualquer mérito para ele,
no sentido de anular a glória que é devida
totalmente ao Senhor, senão somente a obediência
a um dever que é imposto por Deus àqueles que tem
chamado à salvação pela Sua graça.
Se não há de fato mérito na criatura em crer, já que
a fé é um dom de Deus, no entanto, ainda que não
haja também de fato nenhum mérito nos eleitos,
aceitaram o convite de Deus à salvação,
recepcionaram a fé que lhes foi dada como um dom,
e em Sua presciência, Deus pôde perfeitamente
conhecer quais seriam aqueles que viriam para a Luz
de Cristo, quando fossem por Ele atraídos pela
chamada da graça, por meio do Espírito Santo.
Assim, permanece inalterável a exclusão do mérito
para que a eleição seja por graça, como afirmam as
Escrituras.
123
“eleitos segundo a presciência de Deus Pai, na
santificação do Espírito, para a obediência e
aspersão do sangue de Jesus Cristo: Graça e paz vos
sejam multiplicadas.” (I Pe 1.2).
É inegável que Deus conhece os que são Seus, como
afirma o apóstolo Paulo, e Jesus mesmo disse que
conhece as Suas ovelhas e é por elas conhecido, e
que não seguirão o estranho porque sabem qual é a
voz do Seu Pastor.
Os eleitos não podem ser enganados pelos falsos
profetas e cristos de modo a abandonarem a Jesus
definitivamente, depois de tê-lo conhecido, para
segui-los, porque é o próprio Cristo que se revela a
eles e os atrai a Si, e nada e ninguém pode separar
o eleito do amor de Deus que está em Cristo Jesus.
Esta é a garantia de que ainda que pecadores neste
mundo, ainda que tropecem em muitas coisas, por
estarem sujeitos à fraqueza da carne, nisto, que é o
principal, os eleitos jamais falharão, a saber, na
124
atração espiritual de estarem unidos a Cristo num
laço eterno e indestrutível, que nem mesmo a
morte pode exterminar.
Por mais que errem, jamais virão a ser inimigos
eternos de Deus, para se colocarem prazerosa e
voluntariamente debaixo do serviço de Satanás.
E é com base neste mistério espiritual da atração
mútua que passa a existir entre aqueles que se
unem a Cristo pela fé, que são os eleitos de Deus,
que é garantido o trabalho da graça em educar os
eleitos a viverem justa, santa e piedosamente para
Deus, até chegarem à estatura de varão perfeito.
Não se deve confundir o significado da graça divina
com a mera noção de grátis, porque a graça é um
dos maiores atributos de Deus.
Paulo reconheceu que foi a graça que fez com fosse
o que ele era, e que pudesse fazer tudo quanto
realizou (I Cor 15.10).
125
Que todo o trabalho que fizera não foi
propriamente ele quem fizera pelo próprio poder e
capacidade, mas a graça de Jesus que nele estava e
operava.
O que deve estar bem claro diante de nós é a grande
verdade que apesar de terem os eleitos sido
conhecidos e designados segundo a presciência de
Deus, não havia e não há e não haverá qualquer
perfeição e bondade que lhes seja inerentemente
pessoal, ligadas à sua própria natureza, porque na
verdade, na carne não habita bem algum, dado
serem pecadores, e tudo o que houver de bom neles
terá sido recebido pela graça de Deus.
Nenhum eleito, antes da conversão, antes de ter
sido redimido do pecado e da ira de Deus, por
Cristo, era uma ovelha, uma pessoa qualificada à
salvação, ao contrário, estava sujeito à condenação
eterna como os demais pecadores.
126
É por pura graça que os pecadores são salvos.
É por pura graça que há eleição de pecadores.
É pelo trabalho exclusivo da graça que serão
transformados à imagem do Seu Salvador e Senhor.
É por isso que se diz que os crentes têm recebido da
plenitude de Cristo, como graça sobre graça, pois
esta é concedida progressivamente neste mundo,
até que nos seja dada em plenitude no céu, no grau
absoluto que nos tornará perfeitos e totalmente
sem pecado, diante de Deus.
Outra dificuldade é a que diz respeito à forma de
recepção da graça, pois não é passiva como muitos
a imaginam, ao contrário, é ativa, pois Paulo diz que
trabalhou muito e que se esforçava muito, à medida
que a graça lhe era concedida, capacitando-lhe,
fortalecendo-lhe, enquanto atuava através dele
pela sua cooperação e empenho para que a graça
fosse plenamente atuante.
127
Pedro fala da necessidade de diligência em
empenho para se confirmar cada vez mais a nossa
vocação e eleição, e isto fala de uma graça que é
recepcionada de modo ativo e não passivo. E que
saberemos que somos eleitos, pela nossa
perseverança e diligência em santificação.
Em outras palavras, não há nenhuma graça para ser
recebida, por quem não quer se dispor a trabalhar
muito para Deus, pois Ele não desperdiçará os seus
dons com aquele que desprezá-los ou que não se
disponha a usá-los.
Por conseguinte, se determina a necessidade da fé,
e de uma fé ativa que confia não somente em Deus,
mas também que Ele é poderoso para atuar em nós
e através de nós, segundo a capacitação concedida
pela Sua graça., nas boas obras que preparou de
antemão para que andássemos nelas, para a glória
da Sua honra e nome.
A fé de Noé levou-o a construir uma imensa arca.
Abraão a peregrinar numa terra estranha. Davi a
128
construir um reino. Paulo a pregar o evangelho às
nações gentias.
Se a salvação é unicamente por graça, e graça que
salva pecadores, a quem se deve excluir portanto da
possibilidade da eleição, pelo argumento da
impossibilidade por ser um grande pecador?
Quem seria excluído de se aproximar do banquete
do grande Rei, em razão dos seus muitos pecados?
O publicano da parábola citada por Jesus, que era
desprezado pelo fariseu?
A prostituta que se prostrou aos pés do Senhor na
casa de Simão?
O ladrão agonizante na cruz?
Onde estão os grandes pecadores que se
converterão e virão a ser amigos de Deus para
sempre?
129
Somente o Senhor o sabe em Sua presciência.
E a muitos deles deixa viverem neste mundo por
longos anos, afastados da Sua presença, em terrível
inimizade contra Ele, por causa do estado da carne
ser o de inimizade contra Deus, até que, para
revelar que salva por exclusiva graça, se manifesta
a eles somente em ocasião muito próxima da sua
morte, revelando-lhes toda a majestade, santidade,
amor e doçura que há em Cristo, e eles se encantam
com a glória e a bondade do Senhor, e em profundo
arrependimento e tristeza por aquilo que foram e
viveram, prostram-se aos Seus pés e lhe entregam
as suas almas para serem seus servos por toda a
eternidade.
Onde está pois a jactância?
A graça não a exclui totalmente?
De que se gloriará o homem no que respeita à sua
eleição e salvação, senão unicamente na sua
130
própria fraqueza e incapacidade, e na total
suficiência e mérito de Cristo?
Mas o ladrão e a prostituta que se converteram não
devem se gloriar em terem sido o que foram, ao
contrário, devem se envergonhar disto, mas podem
e devem se gloriar na graça de Deus que lhes
transformou.
Contudo, uma vez salvos, não devem se considerar
menos importantes que os demais servos de Deus,
em razão do que foram, porque afinal todos são
pecadores, não merecedores da graça de Deus, e
todos são salvos por um único meio, a saber, a graça
que opera mediante a fé, e por isso, os que confiam
na justiça própria de suas obras, permanecem
debaixo da ira de Deus e da condenação eterna.
Assim, muitos fariseus e escribas permaneciam
condenados em seus pecados, enquanto ladrões e
131
prostitutas estavam entrando no reino de Deus, por
causa da sua fé e arrependimento.
O que furtava não furtará mais, o que se prostituía
não mais se prostituirá, porque a graça, ainda que
eleja pecadores, trabalhará neles para que se
cumpra o propósito de Deus na eleição, a saber, ter
muitos filhos semelhantes a Cristo.
Desta forma, se não se vê qualquer aspiração pela
santidade de Deus, e de um sincero desejo de ser-
lhe obediente, ou ainda, de falta de amor à Sua
Palavra e aos demais irmãos na fé, é para se duvidar
da nossa eleição, porque esta produzirá em nós, a
partir do momento em que Cristo manifestar a Sua
presença a nós, convertendo-nos das trevas e de
Satanás para o domínio de Deus, todas estas coisas,
dentre muitas outras, passarão a existir em nós, por
causa do trabalho que a graça realiza em todos os
eleitos de Deus, sem exceção.
132
A graça revela quem são os verdadeiros filhos
espirituais de Abraão, por terem a mesma fé que ele
teve. Revelará a mudança que é operada por ela no
seu caráter, de modo que a luz que faz com haja
neles não possa ser escondida, pois o propósito
mesmo de Deus é que a sua luz brilhe diante dos
homens, pelas suas boas obras que são produzidas
por meio da Sua graça.
“Com grande poder os apóstolos davam
testemunho da ressurreição do Senhor Jesus, e em
todos eles havia abundante graça.” (At 4.33).
“Ora, Estêvão, cheio de graça e poder, fazia
prodígios e grandes sinais entre o povo.” (At 6.8).
“sendo justificados gratuitamente pela sua graça,
mediante a redenção que há em Cristo Jesus,” (Rm
3.24).
“Mas não é assim o dom gratuito como a ofensa;
porque, se pela ofensa de um morreram muitos,
133
muito mais a graça de Deus, e o dom pela graça de
um só homem, Jesus Cristo, abundou para com
muitos.” (Rm 5.15).
“Porque, se pela ofensa de um só, a morte veio a
reinar por esse, muito mais os que recebem a
abundância da graça, e do dom da justiça, reinarão
em vida por um só, Jesus Cristo. Portanto, assim
como por uma só ofensa veio o juízo sobre todos os
homens para condenação, assim também por um só
ato de justiça veio a graça sobre todos os homens
para justificação e vida.” (Rm 5.17,18).
“para que, assim como o pecado veio a reinar na
morte, assim também viesse a reinar a graça pela
justiça para a vida eterna, por Jesus Cristo nosso
Senhor.” (Rm 5.21).
“Assim, pois, também no tempo presente ficou um
remanescente segundo a eleição da graça. Mas se é
134
pela graça, já não é pelas obras; de outra maneira,
a graça já não é graça.” (Rm 11.5,6).
“Porque pela graça que me foi dada, digo a cada um
dentre vós que não tenha de si mesmo mais alto
conceito do que convém; mas que pense de si
sobriamente, conforme a medida da fé que Deus,
repartiu a cada um.” (Rm 12.3).
“De modo que, tendo diferentes dons segundo a
graça que nos foi dada, se é profecia, seja ela
segundo a medida da fé;” (Rm 12.6).
“Segundo a graça de Deus que me foi dada, lancei
eu como sábio construtor, o fundamento, e outro
edifica sobre ele; mas veja cada um como edifica
sobre ele.” (I Cor 3.10).
“Mas pela graça de Deus sou o que sou; e a sua graça
para comigo não foi vã, antes trabalhei muito mais
do que todos eles; todavia não eu, mas a graça de
Deus que está comigo.” (I Cor 15.10).
135
“e ele me disse: A minha graça te basta, porque o
meu poder se aperfeiçoa na fraqueza. Por isso, de
boa vontade antes me gloriarei nas minhas
fraquezas, a fim de que repouse sobre mim o poder
de Cristo.” (II Cor 12.9).
“Estou admirado de que tão depressa estejais
desertando daquele que vos chamou na graça de
Cristo, para outro evangelho,” (Gl 1.6).
“Mas, quando aprouve a Deus, que desde o ventre
de minha mãe me separou, e me chamou pela sua
graça,” (Gl 1.15).
“Não faço nula a graça de Deus; porque, se a justiça
vem mediante a lei, logo Cristo morreu em vão.” (Gl
2.21).
“para o louvor da glória da sua graça, a qual nos deu
gratuitamente no Amado; em quem temos a
redenção pelo seu sangue, a redenção dos nossos
136
delitos, segundo as riquezas da sua graça,” (Ef
1.6,7).
“estando nós ainda mortos em nossos delitos, nos
vivificou juntamente com Cristo (pela graça sois
salvos),” (Ef 2.5).
“para mostrar nos séculos vindouros a suprema
riqueza da sua graça, pela sua bondade para
conosco em Cristo Jesus.” (Ef 2.7).
“Porque pela graça sois salvos, por meio da fé, e isto
não vem de vós, é dom de Deus;” (Ef 2.8).
“do qual fui feito ministro, segundo o dom da graça
de Deus, que me foi dada conforme a operação do
seu poder.” (Ef 3.7).
“Mas a cada um de nós foi dada a graça conforme a
medida do dom de Cristo.” (Ef 4.7).
“que já chegou a vós, como também está em todo o
mundo, frutificando e crescendo, assim como entre
137
vós desde o dia em que ouvistes e conhecestes a
graça de Deus em verdade,” (Cl 1.6).
“E o próprio Senhor nosso, Jesus Cristo, e Deus
nosso Pai que nos amou e pela graça nos deu uma
eterna consolação e boa esperança,” (II Tes 2.16).
“e a graça de nosso Senhor superabundou com a fé
e o amor que há em Cristo Jesus.” (I Tim 1.14).
“que nos salvou, e chamou com uma santa vocação,
não segundo as nossas obras, mas segundo o seu
próprio propósito e a graça que nos foi dada em
Cristo Jesus antes dos tempos eternos,” (II Tim 1.9).
“Tu, pois, meu filho, fortifica-te na graça que há em
Cristo Jesus;” (II Tim 2.1).
“Porque a graça de Deus se manifestou, trazendo
salvação a todos os homens,” (Tt 2.11).
138
“para que, sendo justificados pela sua graça,
fôssemos feitos herdeiros segundo a esperança da
vida eterna.” (Tt 3.7).
“Pelo que, recebendo nós um reino que não pode
ser abalado, retenhamos a graça, pela qual sirvamos
a Deus agradavelmente, com reverência e temor;”
(Hb 12.28).
“Não vos deixeis levar por doutrinas várias e
estranhas; porque bom é que o coração se fortifique
com a graça, e não com alimentos, que não
trouxeram proveito algum aos que com eles se
preocuparam.” (Hb 13.9).
“Todavia, dá maior graça. Portanto diz: Deus resiste
aos soberbos; dá, porém, graça aos humildes.” (Tg
4.6).
“Desta salvação inquiririam e indagaram
diligentemente os profetas que profetizaram da
graça que para vós era destinada,” (I Pe 1.10).
139
“servindo uns aos outros conforme o dom que cada
um recebeu, como bons despenseiros da
multiforme graça de Deus.” (I Pe 4.10).
“Semelhantemente vós, os mais moços, sede
sujeitos aos mais velhos. E cingi-vos todos de
humildade uns para com os outros, porque Deus
resiste aos soberbos, mas dá graça aos humildes.” (
I Pe 5.5).
“antes crescei na graça e no conhecimento de nosso
Senhor e Salvador Jesus Cristo. A ele seja dada a
glória, assim agora, como até o dia da eternidade.”
(II Pe 3.18).
Deus nos deu a salvação antes da fundação do
mundo para que a nossa salvação fosse totalmente
pela graça, através de Jesus Cristo, de modo que
ficaria bem marcado para todos os salvos que foram
realmente eleitos somente por graça, porque antes
mesmo que nascessem ou fizessem qualquer obra,
140
boa ou má, já haviam sido escolhidos por Deus e
tiveram os seus nomes registrados no livro da vida.
É neste fato que Jesus afirma que devemos nos
regozijar, a saber, que na condição de salvos, temos
os nossos nomes arrolados nos céus, isto é,
registrados no livro da vida.
Sabendo que a salvação é por graça e não por obras,
podemos saber que estamos firmes na graça que
nos foi dada gratuitamente por Deus em Cristo
Jesus (Rom 5.2), e isto é o fundamento no qual
estamos firmemente seguros, porque como a
salvação é por graça e não por obras, não somos
salvos portanto, pelo esforço humano, porque
como poderíamos saber que o nosso esforço foi
suficiente para sermos salvos?
Mas, como é pela graça, nossos pés estão firmados
nas doutrinas da graça e não precisamos ter medo
de cair.
141
Spurgeon disse o seguinte: “Os que dizem,
pensando com isso obter a salvação: “Deve haver
algum mérito no que fazemos”. Essas pessoas estão
sob a lei e não sob a graça. Elas não aprenderam a
primeira coisa sobre o evangelho, se pensam que
podem ser salvas recebendo algum mérito por suas
próprias obras.”.
Por que Arão depois de ter fabricado o bezerro de
ouro, já sendo um servo de Deus, justificado pela fé,
pôde exercer o sumo sacerdócio, e ao morrer foi
elevado à presença de Deus para se reunir aos
demais crentes no céu?
Por que Davi, depois de conhecer a Deus, cometeu
o pecado de adultério com Bate-Seba e fez um
arranjo covarde e vil para que o marido dela fosse
morto, e apesar disso recebeu promessas
grandiosas da parte de Deus, e produziu parte das
Escrituras com os textos que escreveu sob
inspiração do Espírito, e foi chamado por Deus de
142
homem segundo o Seu coração, ainda que tivesse
sido corrigido por Deus relativamente ao seu
pecado?
A única resposta para tudo isto é que eram eleitos
de Deus. E a eleição é por pura graça e é destinada
a pecadores.
Transgressões, apostasias temporárias, pecados
graves podem ocorrer na vida de um crente, mesmo
depois de grandes serviços em comunhão e em
santidade para Deus, mas ainda que isto lhe traga
as correções do Senhor, nada poderá anular a sua
eleição, porque esta não foi estabelecida segundo
as nossas obras e justiça própria, mas segundo a
graça e justiça de Deus.
Crentes verdadeiramente amadurecidos para o
exercício do ministério, são de grande auxílio para
conduzirem os pecadores não somente à conversão,
mas sobretudo, para auxiliá-los na sua caminhada
143
cristã, amparando os fracos, admoestando os
insubmissos, consolando os desanimados e sendo
longânimos para com todos (I Tes 5.13), em razão da
sua eleição pela graça, que lhes transformou em
novas criaturas, em filhos de Deus, ovelhas do
rebanho de Cristo, que necessitam ser
apascentados para aprenderem o modo que devem
viver para o inteiro agrado do Seu Salvador e
Senhor.
Condenar um crente como se fosse um ímpio, por
causa dos seus erros, é um grande erro, pois Deus
não mais os condenará. Ainda que sejam
submetidos à disciplina da aliança, não devem ser
acusados e condenados, porque Deus lhes justificou
com a justiça de Cristo. Quem intentará acusação
contra os eleitos de Deus, já que é Ele quem lhes
justifica? Quem lhes condenará?
144
Embora verdadeiramente salvo, o crente pode
apostatar temporariamente, e pode cometer
pecados.
Por mais que se esforcem pela santidade os crentes
estão sujeitos a pecar por causa da fraqueza da
carne, e do fato de não receberem de Deus,
enquanto neste mundo, a graça em grau absoluto,
de modo que possam ser perfeitamente santos e
justos.
Além disso há toda sorte de limitações
(conhecimento em parte) e de tentações.
A doutrina da perseverança dos santos não significa
portanto que os crentes não caiam vítimas do
pecado, temporariamente.
Até mesmo o melhor dos crentes pode apostatar
temporariamente. Mas eles nunca são derrotados
completamente por causa da graça que lhes foi
dada em Cristo Jesus, e que habita
145
permanentemente em seus corações. E é por isso
que até mesmo o santo mais fraco está livre de uma
apostasia final de Deus.
Todavia, obviamente, é incompatível para um
crente cometer pecado e o pecado lhe causará
muitas dores e trará desonra para Cristo, mas por
outro lado dará ocasião a que Deus demonstre a
superabundância da Sua graça, em exercício de
perdão e de misericórdia, por meio do
arrependimento e da fé.
Enquanto permanece neste mundo o crente é o
palco vivo onde se desenrola uma verdadeira guerra
entre o Espírito Santo e a natureza terrena ou carne.
Ele sofrerá derrotas temporárias e pode até parecer
por algum tempo que tenha perdido toda a fé, mas
se foi verdadeiramente salvo, não poderá cair
completa e definitivamente da graça, porque está
146
firme e seguro pelo próprio Cristo, de quem nada e
ninguém poderá separá-lo.
O tempo que ele permanecer no pecado pode
prejudicá-lo grandemente e até mesmo trazer
destruição a outros, mas ainda que suas obras
sejam queimadas (I Cor 3.12-15), será salvo como
que através do fogo, porque a eleição é irrevogável
e não foi estabelecida com base nas suas obras, mas
unicamente na graça de Deus.
Se a ovelha se extraviar o Bom Pastor a buscará e a
trará de volta em segurança ao aprisco.
Cada um dos eleitos de Deus são como o filho
pródigo, que durante um tempo, uns mais e outros
menos, se iludem com o mundo e se deixam
conduzir por suas paixões carnais. Todavia, mais
cedo ou mais tarde dirão que pecaram contra o céu
e contra o Seu pai celestial e voltarão à comunhão
com Ele. E o Pai o receberá como filho, porque
147
tendo sido eleito pela graça, não poderá perder
jamais o laço familiar daquela relação filial.
Nossos juízos acerca da graça de Deus podem às
vezes estarem errados como ocorreu na Igreja dos
gálatas; os nosso afetos podem esfriar como
ocorreu com a Igreja de Éfeso; a Igreja pode se
tornar sonolenta como ocorreu com alguns em
Tessalônica; crentes podem ser carnais, ciumentos,
contenciosos, e até mesmo praticarem a
imoralidade como muitos na Igreja de Corinto, e a
graça pode parecer às vezes ter abandonado alguns
filhos de Deus, quando na verdade isto jamais
acontece. O sol pode ser eclipsado, mas recupera o
seu esplendor anterior. As árvores podem perder
suas folhas mas ganham novas folhas em lugar das
que caíram.
Aqueles que são espirituais e crentes confirmados
na fé, no corpo de Cristo devem atender à ordem de
Gál 6.1,2 no aconselhamento e acompanhamento
148
dos crentes que forem surpreendidos em alguma
falta: “Irmãos, se um homem chegar a ser
surpreendido em algum delito, vós que sois
espirituais corrigi o tal com espírito de mansidão; e
olha por ti mesmo, para que também tu não sejas
tentado. Levai as cargas uns dos outros, e assim
cumprireis a lei de Cristo.”.
Deus nos chama ao exercício da misericórdia, assim
como Ele usou de grande misericórdia para conosco
perdoando pela graça todos os nossos pecados em
Cristo. É um dever exercer a mesma misericórdia da
qual fomos alvo: em graça e não segundo a
condenação da lei.
Mesmo nos casos de aplicação de disciplina
extrema, que conduza à exclusão de membros da
comunhão visível da Igreja, não somos
desobrigados do exercício da misericórdia e da
intercessão, porque isto nos é ordenado até mesmo
em relação aos que não são do rebanho de Cristo, e
149
àqueles que são nossos inimigos, e que nos
perseguem e nos maldizem.
Se nos é ordenado orarmos pelo bem dos que nos
maldizem, quanto mais dos membros do corpo do
Senhor, que ainda que por ordem dEle tenham sido
excluídos da comunhão visível na terra, até que se
arrependam, jamais serão excluídos da comunhão
em perfeição que terão no céu, por serem filhos de
Deus, que ganharam o céu, não pelas suas obras,
mas pelo modo determinado por Deus, a saber:
unicamente pela graça, por meio da fé em Cristo
Jesus.
150
O Conselho da Própria Vontade de Deus
“Nele, digo, em quem também fomos feitos
herança, havendo sido predestinados, conforme o
propósito daquele que faz todas as coisas, segundo
o conselho da sua vontade;” (Ef 1.11).
O conselho da própria vontade de Deus é tudo
aquilo que Ele tem planejado desde toda a
eternidade conforme a Sua exclusiva autoridade e
soberania.
Quanto à nossa salvação nós vemos em Hebreus
6.17 que este conselho é imutável.
Em Atos 2.23 nós vemos que Jesus foi entregue por
nós conforme o conselho determinado e presciência
de Deus.
Em Atos 4.28 é dito que a perseguição de Herodes,
de Pilatos e do povo contra a Igreja estava
151
acontecendo conforme Deus havia predeterminado
no Seu conselho eterno.
Em Atos 20.27 nós vemos Paulo afirmando aos
Efésios que não havia se esquivado de lhes anunciar
todo o conselho de Deus.
A palavra boulê usada no original grego para
conselho, no texto de Ef 1.11 é a mesma que é usada
em todos estes demais textos.
As ações contra a Igreja já estavam determinadas
por Deus desde antes da fundação do mundo (At
4.28) para a Sua exclusiva glória, pelo testemunho
dos Seus servos no amor a Ele e à verdade, na
medida em que teriam a fé deles aperfeiçoada por
estas tribulações, que vêm aos crentes como
oposições de Satanás.
O nosso texto de Ef 1.11 diz que os crentes foram
feitos herança do Senhor por terem sido
predestinados de acordo com o propósito de Deus,
152
que foi feito segundo o conselho da Sua própria
vontade.
Estes que foram predestinados para serem
herdeiros da glória juntamente com Cristo são
portanto os eleitos de Deus. É declarado quanto à
salvação deles que o caráter do decreto eterno é
imutável, isto é, os que foram eleitos para a
salvação jamais poderão perder a condição de filhos
de Deus porque foram marcados por um conselho
que é imutável e absoluto quanto a isto.
De igual modo é também imutável o conselho
quanto ao crescimento destes eleitos na graça e no
conhecimento de Jesus, mas ele não é absoluto
quanto à sua execução relativamente a todos os
crentes porque este crescimento não dependerá
somente da vontade de Deus, mas também do
empenho e diligência de cada crente em
santificação. Ainda que esteja determinado que
todos eles serão perfeitos em santidade na glória,
153
porque Deus é santo, e importa que Seus filhos
sejam santos, no entanto, enquanto eles estiverem
neste mundo se verá mais progresso em santidade
em uns do que em outros. E aqui se revela que eles
devem crescer por um ato de escolha voluntária,
porque não há amor e obediência verdadeiros que
não sejam voluntários. Isto implica a necessidade de
cooperação com o trabalho do Espírito Santo para
que haja crescimento espiritual.
Em Apocalipse 10.6 nós lemos o seguinte:
“e jurou por aquele que vive pelos séculos dos
séculos, o qual criou o céu e o que nele há, e a terra
e o que nela há, e o mar e o que nele há, que não
haveria mais demora,”.
A humanidade está em contínuo processo de
criação através dos séculos, com a geração de novas
pessoas, mas se diz que Deus tudo criou, com o
verbo criar no tempo passado, indicando uma ação
154
concluída. Isto indica que tudo chega à existência no
tempo, mas tudo já foi visto por Deus como criado
no Seu próprio planejamento eterno, conforme o
conselho da Sua vontade. Assim, o que virá a ser
ainda, já foi conhecido por Ele em Sua presciência,
especialmente aqueles que alcançariam a salvação
em Cristo Jesus (I Pe 1.2).
Há muitos que pensam estar-se limitando o poder
de Deus quando se afirma que Ele não poderia fazer
de um Esaú um Jacó, porque para admitir que Ele
seja de fato Todo-poderoso, deveria ter a condição
de transformar num autêntico santo qualquer
criatura que em Sua presciência, Ele sabia que
jamais se submeteria voluntariamente ao Seu
governo divino, tanto na terra, quanto no céu.
Mas, se houvesse tal possibilidade, nós teríamos
que assumir consequentemente que Satanás não
seria o diabo (opositor) caso Deus desejasse que Ele
voltasse a ser santo e inculpável. E isto se aplicaria
155
não somente a Satanás mas a todos os anjos caídos.
É inegável que há no Senhor o poder para
transformar pecadores em santos, mas este
trabalho não pode ser realizado senão nos eleitos, e
estes eleitos são aqueles que responderão de
maneira positiva à chamada de Deus ao
arrependimento e para a transformação das suas
vidas, porquanto foram conhecidos por Ele antes
que houvesse mundo, em Sua presciência divina (I
Pe 2).
Assim o ato da escolha não é feito no momento da
geração da pessoa no ventre materno, mas antes da
fundação do mundo, segundo o conselho da
vontade de Deus (Ef 1.11b), isto é, no planejamento
que Ele fez segundo a Sua vontade, para a criação
de todas as coisas e seres morais, antes dos tempos
eternos (Tito 1.1), tendo concebido a todos os que
viriam à existência a um só tempo em Seu próprio
ser, e por serem seres morais livres, Ele pôde em
Seu atributo de presciência conhecer com
156
antecedência aqueles que Lhe amariam e aqueles
que sempre resistiriam à Sua vontade, não
propriamente no sentido de cumprimento, porque
até mesmo os anjos caídos Lhe obedecem quando
lhes despacha as suas ordens, mas o fazem por
terror dos castigos que poderão sofrer, e não por
amá-Lo, coisa que na verdade nunca o fizeram em
verdade mesmo quando estavam sem pecado no
céu, porque não chegaram a participar do
conhecimento íntimo da natureza divina por uma
entrega voluntária de seus espíritos para uma tal
comunhão com Deus.
Isto explica porque é possível haver muita
obediência externa entre os homens mas na
maioria dos casos, pouca ou nenhuma obediência
de coração. O simples cumprimento de ordens não
é a obediência que conduz à salvação, porque esta
obediência que salva é do espírito e não o mero
consentimento da vontade.
157
Por isso se diz quanto à eleição, que não depende
de quem quer ou de quem corre, porque o ato de
querer e de correr se encontram na exclusiva esfera
da vontade do homem, que é uma faculdade da sua
alma, e não do espírito. A obediência que se requer
para a salvação é do coração, isto é, do espírito, por
isso se diz que é preciso não somente confessar com
a boca, mas também crer com o coração que Jesus
é o Senhor, porque para isto se demanda revelação
do Espírito ao nosso espírito, e a capacitação que é
concedida pelo mesmo Espírito para que possamos
crer de coração, e assim sermos salvos. Somente os
eleitos permitirão ao Espírito tal revelação no
interior deles. Somente eles se arrependerão e se
renderão à chamada de Deus para a salvação.
Deus planejou em Seu conselho eterno que salvaria
por graça e mediante a fé, e somente os eleitos
podem crer que são salvos por causa da graça que
lhes é oferecida em Cristo, e não por causa de
158
quaisquer obras de justiça própria que eles possam
fazer.
Eles se unem em espírito ao Espírito de Deus e
formam um só espírito com o Senhor. Mais do que
serem salvos da condenação eterna eles desejam
estar unidos em amor Àquele que os salvou, e
viverem para o inteiro agrado dEle.
É pelo conhecimento prévio destas realidades
espirituais que haveria nestes espíritos que viriam a
obedecer a Deus quando fossem alcançados pela
graça do evangelho, que Ele os elegeu desde toda a
eternidade para estarem para sempre com Ele em
íntima comunhão.
Tudo o que vier a ser já se encontrava em latência
na mente de Deus, assim como um arquiteto tem
todo o planejamento de um edifício em sua mente,
antes de construí-lo.
159
Podemos por assim dizer, que todos os seres morais
que chegam à existência já se encontravam criados
na imaginação e vontade de Deus antes de serem
formados por Ele no tempo da chegada que Ele
previu para cada um deles a este mundo.
Há este controle perfeito do Senhor sobre os seres
morais porque eles têm um espírito, tal qual Deus é
espírito, e assim não poderiam ser o fruto de uma
geração espontânea ou meramente natural, porque
também são seres espirituais além de terem um
corpo natural.
Deste modo não podemos cogitar se haveria ou não
a possibilidade de se transformar um não eleito em
um eleito, porque são condições absolutas, tal qual
a natureza dos vegetais é uma e a dos minerais é
outra; de forma que se alguém desejasse se prover
de minerais, não o faria entre os vegetais, porque
estes não possuem a natureza dos minerais.
160
Isto não significa que houvesse algum bem prévio
ou mérito nos eleitos, porque quanto ao pecado,
como ensinam as Escrituras, são tanto pecadores e
culpados como os não eleitos, sendo salvos
gratuitamente pela graça que está em Cristo Jesus.
Não podemos afirmar então que haja uma
impossibilidade em Deus, porque tudo Lhe é
possível, mas trazer um não eleito em obediência
somente seria possível por meio de uma
mecanização do seu ser, transformando-o num
robô, ou num ser obediente por meio de
constrangimento e força. Mas não é isto que Deus
espera na filiação em amor que Ele determinou
desde antes da fundação do mundo.
Vemos portanto, que não estamos diante de um
caso de impossibilidade, mas de não realização
daquilo que Deus intentou não realizar em Seus
conselhos eternos, porque ao contrário do que
muitos pensam, a Bíblia é clara em afirmar que os
161
não eleitos foram chamados à existência para o
propósito de serem aqueles vasos de ira, nos quais
Deus revelará que é justo Juiz que castiga toda
oposição à Sua vontade. (Rom 9.6-24).
E deve ser dito que Deus não o faz por capricho, mas
porque o céu não poderia ser céu caso não houvesse
ali somente obediência voluntária e de coração, em
amor.
Não é cabível portanto o tipo de pergunta que
muitos fazem se seria possível transformar um Esaú
num Jacó; porque Esaú jamais se permitiria
renunciar à Sua própria vontade, ao seu ego, para
dar o governo da sua vida ao Espírito Santo de Deus.
Não podemos esquecer que tudo indica que os
anjos foram criados ao mesmo tempo e que
acabariam por revelar, por serem seres morais tal
como os homens, se lhes agradaria estar debaixo do
governo de Deus. E assim os espíritos dos homens
162
são também provados pela luz que é o Senhor Jesus,
de maneira que manifestarão diante dEle, mediante
a Sua revelação a eles, se amarão a luz e virão para
ela, ou se permanecerão amando as trevas,
recusando-se vir para a luz, para que as suas más
obras não sejam manifestas.
É realmente muito fascinante sabermos que Deus
criou os seres morais à Sua imagem e semelhança.
Eles estão dotados desta capacidade de juízo
próprio, de direção própria, de determinação
própria, em escolhas que podem fazer pelo
exercício da razão e da imaginação. Temos então
em cada ser moral criado uma personalidade
específica e definida. Cada um deles é único e
distinto uns dos outros. E é por isso que alguns
afirmam erroneamente que Deus arriscou em havê-
los criado, porque muitos deles poderiam por esta
característica de direção própria, determinarem
caminhar afastados da Sua vontade. Dizemos que
não houve erro porque tudo isto estava planejado
163
nos conselhos eternos de Deus, de maneira que
estes vasos rebeldes são enchidos com a Sua ira,
para manifestar neles o Seu poder como Juiz e
Vingador do mal. É a isto que Paulo quer se referir
em Romanos 9, quando diz que Deus criou vasos
para honra (eleitos) e vasos para desonra (não
eleitos). Ele sabia de antemão e desejava este efeito
de maneira a exibir tanto a sua misericórdia, graça
e amor nos eleitos, que salvou de suas misérias no
pecado, como o Seu grande poder em julgar e
condenar ao sofrimento eterno aqueles que
resistem à Sua vontade (não eleitos); apesar de não
ter nenhum prazer em fazer isto, porque não criou
nem anjos, nem homens, para serem rebeldes, e
prova isto sujeitando-os aos Seus juízos, porque são
responsáveis perante Ele pelo uso da liberdade que
receberam, e que deveriam colocar debaixo da Sua
instrução e governo, por uma obediência voluntária
em amor.
164
Assim, não houve portanto nenhum risco envolvido
no fato de ter Deus criado os seres morais de tal
forma, que somente alguns deles (eleitos) poderiam
adorá-lo, amá-lo e servi-lo, do único modo aceitável
por Ele, a saber, voluntariamente e em amor.
Para que estes eleitos não o fizessem
mecanicamente, ou por imposição contrária à
vontade deles, não poderia o Senhor receber uma
verdadeira glória caso os que se aproximam dEle
não o fizessem com um coração voluntário.
É nisto que se encontra a maior razão porque Deus
criou os seres morais com tal característica de poder
de escolha, de maneira que aqueles que O amassem
o fizessem do único modo que é inerente ao
verdadeiro amor, a saber, não por obrigação, mas
livre e voluntariamente.
Então, apesar de não ser a vontade do homem o
fator determinante da sua salvação, não se pode
165
negar este conhecimento prévio de Deus daqueles
que são Seus, e que se converterão a Ele, porque
apesar de pecadores como os demais homens,
haverá uma resposta adequada de seus espíritos à
chamada de Deus para que sejam santos, e
reconciliados a Ele, pela adoção de filhos, tornando-
se verdadeiramente amigos de Deus e inimigos do
diabo e de todos os anjos caídos.
Deste modo, nós vemos que não são os anjos e os
homens que escolhem pelo simples exercício de
suas vontades, serem bons ou maus, santos ou
ímpios. Por isso o apóstolo Paulo afirma que a
eleição que não é feita dependendo de quem quer
ou de quem corre. Deus pesa os espíritos e conhece
os corações. Ele conheceu o espírito de Jacó tanto
quanto o de Esaú. Sabia que Jacó seria Seu, mas não
Esaú.
Não é portanto pelo exercício da própria vontade
que os eleitos são salvos, mas pelo conhecimento
166
prévio de Deus, dos seus espíritos, como sendo
aqueles que responderiam positivamente à Sua
chamada para a salvação.
É por isso que nós O vemos dizendo ao apóstolo
Paulo que permanecesse ainda em Corinto, e que
não saísse da cidade, porque Ele tinha muitos
eleitos naquela região e que se converteriam com a
pregação de Paulo (At 18.9,10). Então eles eram
conhecidos de Deus antes mesmo da sua conversão.
Não por nenhuma obra boa que tivessem feito, ou
má que tivessem deixado de praticar, que eles
seriam salvos, mas por causa deste conhecimento
presciente deles por Deus. Somente o Senhor
conhece até mesmo entre os piores pecadores,
aqueles que serão adotados como Seus filhos, em
face do arrependimento que terão de seus pecados
quando Ele revelar a eles a salvação que há em
Cristo Jesus.
167
É ordenado que se pregue o evangelho a todos,
porque apesar de o Senhor conhecer a todos os que
são Seus, nós não sabemos quem é eleito ou não, e
a nenhuma pessoa também Deus tem revelado
diretamente que está impedida de vir a Cristo. Ao
contrário Ele convida a todos a se esforçarem por
entrarem no Seu reino, com a promessa de que não
lançará fora a ninguém que vier a Ele.
Assim, se alguém tem vindo a Cristo e tem sido salvo
por Ele, tal pessoa é bem-aventurada porque é uma
eleita de Deus, conhecida por Ele desde a fundação
do mundo. De igual modo, se alguém rejeita a Cristo
e ao evangelho por toda a sua vida e vem a morrer
em tal condição, tal pessoa enfrentará um castigo
eterno, dando provas de que não pertencia ao
número dos eleitos de Deus por causa da
permanente e incurável dureza do seu coração.