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OPINIÃO

Elogios à escola pública efilhos na escola privadaPAULO SIMÕES LOPES 24/02/2016 - 06:25

O ensino contratualizado (do estado e de iniciativaprivada) é parte da solução, e não parte do problema.

A coisa vem num livro publicado em Paris em 1964, Les Héritiers, lesétudiants et la culture e o Vasco Pulido Valente chamou recentemente aatenção para a simplicidade da tese geral desta obra: “a classedominante tinha reproduzido a sua tirania transferindo o capital para adescendência; mas no mundo moderno passara a transferir o saber enão o capital. Ou seja, o seu método de reprodução mudara e o deverdo verdadeiro socialista estava agora em destruir essa nova maquinaçãoda burguesia.”

Assim, na impossibilidade de destruir numa geração os privilégios que aclasse dominante herda da família, há então que destruir o carácterseletivo da escola simbolizada nos resultados dos seus projetoseducativos: Acaba-se com os exames, privilegia-se o prazer emdetrimento da educação e, num universo de aprendizagens discentes dequase completa ignorância, sem “capital intelectual”, os filhos da “classesocial favorecida” seriam absorvidos pelo igualitarismo militante.

A insistirem nesta idiotia e a pretexto da “defesa da escola pública”,intentam há 42 anos contra as escolas do estado (veja-se por exemplo as20 mudanças introduzidas nos últimos 16 anos no sistema de avaliaçãodos alunos). Depois de anos a fio a insistirem na defesa do edifício dequem quer ensinar e não no de quem quer aprender, fixam o olhar noensino particular e cooperativo. Desta vez, a pretexto da escassez derecursos, em contrassenso, revoltam-se contra projetos educativos ondeformar, mais e melhor, custa menos que nas escolas do estado. Entram

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por esta porta ferrugenta ignorando as teses bourdieusianas sobre aslógicas de distinção que leram em Les Héritiers: São os contratos deassociação que permitem a uma “classe social desfavorecida” frequentaras escolas privadas nos mesmos moldes em que frequentariam a escolaestatal, ou seja, de forma gratuita. Sem o ónus das propinas, são estescontratos que possibilitam a liberdade de escolha constitucionalmentepreconizada. Acabar com estes contratos é acentuar a bipolarização doensino entre ricos e pobres, é elitizar as escolas que não são do estado,legitimando-se assim o “capital” como acesso privilegiado a percursosescolares marcados pelo sucesso e pela distinção. Sim, porque nestealarido por 2% do orçamento do ministério da educação, qualquerpessoa com dois dedos de informação percebe que esta discussão poucointeressa a quem paga propinas de 20.000 euros/ano.

A menos que o objetivo seja esta bipolarização, a verdade é que o ensinocontratualizado (do estado e de iniciativa privada) é parte da solução, enão parte do problema, no desafio honesto que aqui deixo: Criem, oudeixem criar, projetos educativos singulares e permitam que as famílias,ricas ou pobres, em igualdade de circunstâncias, escolham as escolaspara os seus filhos. A partir desse dia, não haverá necessidade de apelara lobbies de interesses políticos ou empresariais, nem de decretar oencerramento das escolas privadas ou estatais, porque as famílias,numa rede una onde coexistam várias ofertas, serão conduzidas peloseu grau de satisfação e encarregar-se-ão de valorizar as escolas que sãomais capazes.

Negar esta possibilidade é acentuar a bipolarização liderada por uma“classe dominante”, que tem ou teve os seus filhos a estudar em escolasprivadas. Chamam-lhe gauche caviar na França, champagne socialistno Reino Unido, limousine liberal nos Estados Unidos, radical chic emItália, esquerda caviar em Portugal. Fazem-no com a convicção de queum aluno, quando sai do ensino obrigatório, leva consigo pelo menos 4legislaturas e que, neste espaço, "é preciso que alguma coisa mude, paraque tudo fique na mesma". Reafirmo esta convicção ao relembrar afilosofia de Dom Fabrizio Salina (em O Leopardo), que conduz a suafamília através de tempos tempestuosos, mantendo o essencial da suaforma de vida.

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Membro do Conselho Nacional de Educação

COMENTÁRIOS

16:11

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"porque as famílias, numa rede una onde coexistam várias ofertas,serão conduzidas pelo seu grau de satisfação e encarregar-se-ão devalorizar as escolas que são mais capazes." duvido mas o artigoaborda assuntos bastante pertinentes

!

15:11

Álvaro Aragão AthaydeEngenheiro (aposentado) , Coimbra

O livro de Pierre Bourdieu e Jean-Claude Passeron “Les Héritiers, lesétudiants et la culture” (1964) reflecte a experiência militar de Bourdieuna Argélia Francesa (mais especificamente nos serviçosadministrativos da Résidence Générale, sob o comando de RobertLacoste, Ministro Residente e Governador Geral da Argélia entreFevereiro de 1956 e Maio de 1958), bem como a sua posteriorexperiência argelina como assistente na Faculdade de Letras de Argel.E isto é importante porque a violência simbólica a que a sua obra serefere era a violência exercida pela ‘École Public et Laïciste’ de JulesFerry sobre as populações autóctones e os ‘Héritiers’ eram os ‘Pieds-Noirs’, os cidadãos franceses, que viveram no Norte de África Francêsno período do Segundo Império Colonial Francês (1815 – 1962).

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