Enfermeiras da terra

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As enfermeiras da terra As chamadas "plantas invasoras" não surgem acidentalmente, mas em circunstância bem definidas, como indicadoras de determinadas carências ou de determinados excessos de elementos do solo. Assim, conhecendo-se as razões de seu aparecimento, fica-se mais armado não apenas para combatê-las, mas, principalmente, para corrigir os desequilíbrios do solo. Na relação que se segue, estão algumas invasoras mais comuns, sua características e as indicações que elas fornecem. Nessa relação, após o nome vulgar, vêm o nome científico e o tipo de solo onde é mais freqüente o seu aparecimento. Os tipos de solo ficm designados pelas seguintes abreviaturas: A = terra agrícola; A - P = solo agrícola deixado para formação de pasto; P= pasto; C = cerrado. Amendoim-bravo (Euphorbia heterophylla) - A - "Leiteira"que invade campos de soja; indica solos onde há desequilíbrio do nitrogênio com micronutrientes e, em especial, com molibdênio e cobre. Ariri(Cocos vagans) - P - Aparece em solos muito queimados, imprestáveis. Assa-peixe (Veronica spp.) - P - Indica solos de cerrado secos e com lajes. Babaçu (Orbignya martiana) - C - Palmeira indicadora da transição da mata para o cerrado. Mais babaçu, maior tendências para cerrado. Bacuri (Plantonia insignis) - C - Palmeira do cerraso. Indica solo fértil, tanto física como quimicamente. Barba-de-bode (Arristida pallens) - P - Capim típico de paisagem do gfogo. Indica pobreza de fósforo, de cálcio e de potássio. Recém-brotado, o gado o aceita. Banindo-se o fogo, roçando-se e adubando, desaparece em um ano, dando lugar a outras ferrugens. Beldroega (Portulaca oleracea e outras) - Recurso de pastagem na seca (NE). Nos campos agrícolas, invade os solos melhores. Não precisa ser combatida, pois não prejudica as lavouras e protege o solo. Berneira ou maria-mole (Senecio brasiliensis) - P - Indica solos (pastagens) com uma camada adensada, entre 40 a 120 cm de profundidade. É depositária das larvas do berne (SP). Venenosa para o gado. Regride mediante adubação potássica e emprego de plantas subsoladoras. Buriti(Mauritia vinifera) - C - Típica de cerrado e lavrado (NE). Indica sempre presença de água. Os frutos muídos servem de ração. Capim-amargoso ou capim-açu (Digitaria insularia ou Trichachne insulares) A - P - Surge em lavouras abandonadas e em pastagens, nas manchas úmidas, onde a água estagna após a chuva. Nunca indica solos com boa produtividade. Capim-amoroso ou capim-carrapicho (Cenchrus echinatus) - A - P - Indica campos agrícolas muito decaídos, erodidos e adensados. Surge também em pastagens onde o pisoteio foi intenso em época adversa. Afofado o solo, desaparece. Capim-arroz ou capim capivara (Echinocloa crusgalli) - A - Frequente em campos de arroz irrigados. Indica a formação de um "horizonte de redução"(rico em substâncias tóxicas) logo abaixo da superfície do solo. Eliminando-se o "horizonte de redução" - por drenagem _ palha de arroz infestado + adubação fosfocálcica - o capim-arroz não mais germina.

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As enfermeiras da terra

As chamadas "plantas invasoras" não surgem acidentalmente, mas em circunstância bem definidas, como indicadoras de determinadas carências ou de determinados excessos de

elementos do solo. Assim, conhecendo-se as razões de seu aparecimento, fica-se mais armado não apenas para combatê-las, mas, principalmente, para corrigir os desequilíbrios do solo.

Na relação que se segue, estão algumas invasoras mais comuns, sua características e as indicações que elas fornecem. Nessa relação, após o nome vulgar, vêm o nome científico e o tipo de solo onde é mais freqüente o seu aparecimento. Os tipos de solo ficm

designados pelas seguintes abreviaturas: A = terra agrícola; A - P = solo agrícola deixado para formação de pasto; P= pasto; C = cerrado.

Amendoim-bravo (Euphorbia heterophylla) - A - "Leiteira"que invade campos de

soja; indica solos onde há desequilíbrio do nitrogênio com micronutrientes e, em especial, com molibdênio e cobre.

Ariri(Cocos vagans) - P - Aparece em solos muito queimados, imprestáveis. Assa-peixe (Veronica spp.) - P - Indica solos de cerrado secos e com lajes.

Babaçu (Orbignya martiana) - C - Palmeira indicadora da transição da mata para o cerrado. Mais babaçu, maior tendências para cerrado.

Bacuri (Plantonia insignis) - C - Palmeira do cerraso. Indica solo fértil, tanto física como quimicamente.

Barba-de-bode (Arristida pallens) - P - Capim típico de paisagem do gfogo. Indica pobreza de fósforo, de cálcio e de potássio. Recém-brotado, o gado o

aceita. Banindo-se o fogo, roçando-se e adubando, desaparece em um ano, dando lugar a outras ferrugens.

Beldroega (Portulaca oleracea e outras) - Recurso de pastagem na seca (NE).

Nos campos agrícolas, invade os solos melhores. Não precisa ser combatida, pois não prejudica as lavouras e protege o solo.

Berneira ou maria-mole (Senecio brasiliensis) - P - Indica solos (pastagens) com uma camada adensada, entre 40 a 120 cm de profundidade. É depositária

das larvas do berne (SP). Venenosa para o gado. Regride mediante adubação potássica e emprego de plantas subsoladoras.

Buriti(Mauritia vinifera) - C - Típica de cerrado e lavrado (NE). Indica sempre

presença de água. Os frutos muídos servem de ração. Capim-amargoso ou capim-açu (Digitaria insularia ou Trichachne insulares) A

- P - Surge em lavouras abandonadas e em pastagens, nas manchas úmidas, onde a água estagna após a chuva. Nunca indica solos com boa produtividade.

Capim-amoroso ou capim-carrapicho (Cenchrus echinatus) - A - P - Indica campos agrícolas muito decaídos, erodidos e adensados. Surge também em

pastagens onde o pisoteio foi intenso em época adversa. Afofado o solo, desaparece.

Capim-arroz ou capim capivara (Echinocloa crusgalli) - A - Frequente em

campos de arroz irrigados. Indica a formação de um "horizonte de redução"(rico em substâncias tóxicas) logo abaixo da superfície do solo. Eliminando-se o

"horizonte de redução" - por drenagem _ palha de arroz infestado + adubação fosfocálcica - o capim-arroz não mais germina.

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Cabelo-de-porco (Carex ssp.) - A - P - Aparece em solos muito compactados e

anaeróbicos, com um nível de cálcio irrisório. Altamente beneficiado pelas queimadas. Some com adubação e calagem.

Capim-caninha ou capim-colorado (Andropogon incanis) - P - Surge em solos temporariamente encharcados e periodicamente queimados (RS). Indica

deficiência aguda de fósforo. Adubado com fosfato, torna-se forrageira boa. Em pastejo rotativo, tende a desaparecer.

Capim-favorito, capim-gafanhoto ou capim-natal (Rhynchelytrum roseum) -

indicação de solos muito secos, decaídos e onde o adubo quase não faz efeito. O capim-gafanhoto pode ser erradicado com a adição ao solo de matéria orgânica e

um fosfato cálcico. A princípio, viceja mais; depois some. Capim-marmelada ou capim-parapuã (Brachiaria plantaginea) - A - Surge só

em terra arada ou gradeada. Boa forrageira. Indica solos em decadência. Quanto

pior o solo para cultura, melhor para o marmelada. É prejudicado por produtos de sua própria decomposição (um composto de capim-marmelada faz com que este

desapareça). Sofre hostilidade do centeio, da aveia-preta e da ervilhaca. Capim-rabo-de-burro (Andropogon bicornis e outros) - A - P - Invasor de terras

abandonadas e pastos. Indica solos muito ácidos, com baixo teor de cálcio e uma

camada impermeável entre 60 e 120 cm de profundidade. Fraco como forrageira. Rompida a lage subterrânea - com plantio de guandu, por exemplo - desaparece.

Capim-rabo-de-raposa (Setaria geniculata) - P - A - Indica solos pobres. Faz pouca massa verde e floresce cedo. Em campos, após a cultura, pode ser exuberante, constituido-se, durante a seca, em recurso forrageiro. Típico de

beiras de campos e de estradas, onde a compactação é maior. Caranguatá ou gravatá (Eryggium ciliatum) - P - Típica de pastos com húmus

ácido. Em pastejos permanentes, no lugar em que o solo é fraco, surge em grande quantidade. Com pastejo rotativo e calagem, desaparece.

Carquejas (Baccharis spp.) - P - Preferem terrenos que, na estação das chuvas,

estagnam água, do subsolo até a superfície, mas que, na época de estiagem, são muito secos. Dependem da pobreza do solo em molibdênio. Remédio para males

do estômago, do intestino, do fígado (variedade de folhas estreitas). Chirca (Rupatorium spp.) P - Indica boas condições para o gado e só aparece em

solos ricos em molibdênio e nos quais haja o manejo rotativo das pastagens. Cravo-branco ou erva-fedorenta (Tagetes erecta e T. minuta) - A - Assentam-

se, em grande quantidade, nos solos infestados por nematóides. Com estrutura de solo deficiente, alcançam mais de 2 m, formando talos de até 1 polegada, o que prjudica a colheita mecanizada. Queimadas, podem procurar também as

pastagens. Dente-de-leão (Taraxum officilis) - P - Surge em pastagens (S), indicando a

presença de boro no solo. O gado o aprecia como aperitivo. As folhas novas são comestíveis para o homem. É medicinal para o fígado, contra o reumatismo, nevragias, diabetes.

Fazendeiro ou picão-branco (Galinsoaga parviflora) - A - Surge em solos com excesso de nitrogênio, mas deficientes em micronutrientes. Aparentemente, é

beneficiado pela deficiência de cobre. Tóxico, não deve ser arrancado com a mão. Grama-batatais, forquilha, mato-grosso e, em estado melhorado,

pensacola (Paspalum notatum var.) - Em solos argilosos, cresce rápido, dando folhas glabras (lisas). Em solos arenosos, cresce pouco e tem folhas pilosas, que prejudicam o gado. Sinal de decadência do solo pastoril (SP), especialmente em

pastagens plantadas. De todo modo, suporta pisoteamento intenso.

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Grama-seda, do burro, paulista e, em estado melhorado, bermudagrass

(Cynodon dactylon) - A - P - Indica solos muito compactados, muito pisoteados. Surge tanto em lavouras como em pastagens. Melhorando o solo, viceja mais,

torna-se menos persistentes e acaba sumindo. O solo onde aparece é bem mais rico do que aquele onde cresce o amoroso, mas é menos compactado.

Guanxuma, malva ou vassourinha (Sida spp.) - Invade terrenos onde o

subsolo é adensado ou onde, pela erosão, o solo superficial for lavado. Indicadora de laje mais ou menos grossa, que restringe o crescimento radicular em geral,

mas que a guaxuma consegue vencer. Em solo fértil, guanxuma viçosa, em solo pobre, guanxuma pequena. Aparece por efeito de aração profunda demais, de pisoteio de gado ou de movimentação excessiva de máquinas. Brota fácil,

especialmente depois das lavouras de batatinha e de algodão. Medicinal: em bochechos, após a extração de dentes, e em banhos, contra feridas.

Leguminosas em geral (Papilonaceae, Cassia, Mimosoideae) - Indicam, no solo,

presença de fósforo, que elas aumentam. Faltando potássio no solo, são dominadas por capins. Faltando cálcio, são atacadas pelas cochonilhas, como

guandu, e suas sementes são facilmente parasitadas por brocas. Há leguminosas, como o tremoço, que enriquecem o solo em cálcio. Boas forrageiras, no mínimo até a formação de sementes, que às vezes são tóxicas. Seu aparecimento em

maior escala indica melhoramento do terreno. Mestrado (Agerathum conzoides) - A - Indica o melhoramento físico do solo e é

tomado como planta sanadora de solos decaídos. Não prejudica a cultura; às vezes, porém, dificulta a colheita, pois suas sementes voadoras são leves e, espalhadas pelo vento, podem, por exemplo, infestar o algodão. Medicinal

(bálsamo do fígado). Mio-mio (Bacharis coridifolia) - P - Tem um agente tóxico mortal para o gado.

Indica, sobretudo, deficiência de molibdênio no solo. Em campos muito infestados, o mio-mio, quando queimado, desaparece, pois suas cinzas contêm tanto molibdênio que lhe tiram a possibilidade de crescer. Em campos pouco infestados,

a queimada serve para aumentá-lo, já que, pela combustão, o molibdênio se torna ainda mais inaproveitável para as forrageiras. Roçando-se o mio-mio com roçadeira de ferro ou faca sem fio, aumenta a infestação.

Nabisco ou nabo-bravo (Rapahus raphanistrum) - A - Invasora temida no trigo. Pode aparecer em grande quantidade em campos de monocultura ou na

rotação trigo/soja. Suas sementes não acompanham as sementes do trigo, desde que estas sejam classificadas e rigorosamente limpas. Indicadora de carência de boro e, de manganês (muito consumidos pelas culturas). A inclusão da aveia na

rotação faz o nabisco-dormente nascer. Misturando-se, ao adubo convencional, 3 Kg/ha bórax e 5 Kg/ha sulfato de manganês consegue-se controlar quase que completamente o nabisco.

Papoula (Papava spp.) - A - Embora não muito comum no Brasil, indica solos em que há excesso de cálcio. Plantando-se soja ou colza, desaparece.

Pinhá (Jatropha curcas) - Surge em grande quantidade nas pastagens do Nordeste (especialmente em Fernando de noronha). Indica solos adensados pelo

uso do fogo e pela exposição ao impacto das chuvas, solos que alternam erosão e enchentes com secas. Nesses solos, nem árvores conseguem se manter em pé ( o vento as derruba). Somente banindo o fogo e fornecendo muita matéria orgânica

é que esses solos se recuperam e o pinhá desaparece. De todo modo, suas sementes são muito oleaginosas.

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Samambaia-de-tapera (Pteridium aquilinum) - C - P -A - Existe no cerrado e

invade roças novas, bem como pastagens. Indica sempre níveis elevados de alumínio. Nem por isso esses solos são necessariamente pobres. Com terra fértil,

cresce até alturas consideráveis; com solo pobre, fica pequena e raquítica. Nunca deveria ser queimada; nesse caso, o alumínio retorna ao solo, perpetuando o ciclo samambaia-fogo-samambaia. A calagem a faz desaparecer, mas cabe lembrar

que, se a dose de calcário for pequena, não surtirá efeito. Seus brotos, se ingerindos pelo gado, produzem uma intoxicação cumulativa, que só se manifesta semanas depois do gado deixar o campo. Sinais mais evidentes dessa intoxicação:

anemia profunda e tendência à hemorragia (o gado sangra a cada picada que recebe). Sinais dessa intoxicação nos eqüinos, mais sensíveis: olhos congestionados, cabeça caída, perda de equilíbrio; em casos graves, ocorre forte

isterícia e morte. Sapé-macho, mãe-de-sapé ou erva-lanceta (Solidago microglosis) - A -

Indica solos muito ácidos, com pH entre 4,5 e 5,2. Como possui estolões, infesta o campo. Uma calagem pode controlá-lo.

Sapé (Imperata exaltada) - A - P - Capim ácido, rico em alumínio, indica um pH

entre 4,0 e 4,5. Invade pastos, bem como campos agrícolas, especialmente o comem recém-brotado e quando com muita fome. Os equinos o comem recém-

brotado e quando com muita fome. Os equinos o comem sempre, mantendo aparente boa forma. Porém, quando as éguas se alimentam de sapé, os potros delas nascem de tal maneira desmineralizados que, geralmente aos 3 meses,

adquirem poliartrite e morrem. Assim, deve-se afastar as prenhes do sapé. Uma calagem que aumente o pH até 5,8 faz o sapé desaparecer.

Taboca (Bambusa trinii) - Surge no cerrado, onde se usa fogo. Enriquece o solo

com alumínio e gera um terreno muito bem granulado, grumoso e permeável. Assim, os solos onde ocorre têm fama de boa fertilidade após a calagem. Porém,

onde vegetam taquaras, o enriquecimento de alumínio é tanto que, durante anos, as tabocas surgem como manchas de vegetação raquítica dentro das culturas. Uma calagem não elimina esse efeito; apenas aplicações de grandes quantidades

de matéria orgânica, como as que ocorrem quando se trilha o feijão no campo, deixando, aqui e ali, a palha se decompor.

Tiririca ou capim-dandá (Cyperus rotundus) - A - Invasora muito persistente em culturas. Indica solos muito ácidos, adensados e temporariamente encharcados - ou anaeróbios pela perda de macroporos. Viceja, em geral,

também, nos solos em que há uma deficiência de magnésio. Tem hostilidade com o feijão podem eliminá-la. A aversão da tiririca com a sombra é tamanha que uma

simples cobertura de jornal, aplicada ao solo, faz com que suas batatinhas subam à superfície, podendo então ser arrancadas com a mão. Em contrapartida, é pouco sensível - e bastante resistente - à maioria dos herbicidas. Como invasora,

diminui sensivelmente a produção de cana-de-açucar.