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ENSINO/APRENDIZAGEM DE ESPANHOL COMO LÍNGUA
ESTRANGEIRA: CONTRASTE ENTRE CRENÇAS DE PROFESSORES E
ALUNOS DE ESCOLAS PÚBLICAS DO DISTRITO FEDERAL
Rosilene dos Anjos SANT’ANA
Instituto Federal Goiano (IFGoiano)
Julyana Peres CARVALHO
Centro Interescolar de Línguas de Taguatinga (CIL-Taguatinga)
RESUMO
Com o passar dos anos, a sociedade mudou, e com isso se destacaram também mudanças no
caminho das pesquisas dentro da Linguística Aplicada (LA). Nesse sentido, os questionamentos
dos profissionais envolvidos no ensino/aprendizagem de línguas passaram a ter maior apoio no
campo teórico. O ensino de língua estrangeira (doravante LE) nas escolas públicas é um exemplo
da inquietação de professores e alunos. No que diz respeito às aulas de língua espanhola, que
demandam pouco tempo na carga horária, a situação se torna ainda mais angustiante. Com base
nessa inquietação, o presente trabalho pretende identificar, observar e contrastar as crenças sobre
o ensino/aprendizagem de professores e alunos de espanhol como língua estrangeira (ELE) de
escolas públicas do Distrito Federal. Adotando uma abordagem qualitativa (FLICK, 2009) de
coleta e análise de dados e interpretativista (MOITA LOPES, 1994), esta pesquisa utiliza um
recorte dos dados coletados em duas dissertações de mestrado desenvolvidas no Programa de Pós-
graduação em Linguística Aplicada da UNB e publicadas em 2014. Este estudo de caso,
caracterizado por focar em um determinado evento pedagógico (TELLES, 2002), apoia-se no
conceito de crenças a partir de uma perspectiva bakhtiniana (SILVA, 2010) e as considera como
diferentes modos de dar sentido ao mundo, uma vez que esses diferentes modos podem ser
direcionados por interações discursivas, o que Barcelos (2006) nomeia como crenças sociais.
Embora seja um assunto importante e mesmo que esteja sendo bastante pesquisado na atualidade
(GIMENEZ, 1994), faz-se necessário que as pesquisas sobre crenças não se limitem à descrição,
e sim devem procurar compreender a relação delas com o ensino/aprendizagem. Por assim ser,
para esta pesquisa conhecer e refletir sobre crenças é importante para que se possa analisar a
relação delas com o ensino/aprendizagem de espanhol. Portanto, espera-se que a discussão dos
dados desta pesquisa possa encaminhar um repensar das políticas públicas que envolvem o ensino
de ELE e que as representações de professores e alunos possam contribuir para que a interação e
a aprendizagem em sala de aula sejam ressignificadas.
Palavras-chave: Ensino/aprendizagem de espanhol; Crenças; Contraste.
1. INTRODUÇÃO
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Tendo em vista o poder de inclusão e de inserção do sujeito na vida social,
principalmente no que diz respeito a interação discursiva, a língua estrangeira (LE) tem
sido, cada vez mais, procurada pela sociedade. Concomitante a essa demanda surgem
também diferentes discussões por parte dos envolvidos no processo de
ensino\aprendizagem de LE, dessa forma a Linguística Aplicada (doravante LA)
possibilita o diálogo dessas discussões com outras áreas do conhecimento.
Nesse sentido, os questionamentos dos profissionais envolvidos no
ensino/aprendizagem de línguas passaram a ter maior apoio no campo teórico. O ensino
de LE nas escolas públicas é um exemplo da inquietação de professores e alunos. No que
diz respeito às aulas de língua espanhola, que demandam pouco tempo na carga horária,
a situação se torna ainda mais angustiante. Dessa forma, essa inquietação acompanha a
prática dos docentes em sala de aula.
Este trabalho surgiu das inquietações que persistem mesmo depois de termos
defendido nossa pesquisa de mestrado. Como não foi possível analisar os dados coletados
pelo viés da teoria das Crenças no ensino-aprendizagem de LE, optamos por juntar aqui
os dados de nossas dissertações de mestrado desenvolvidas no Programa de Pós-
graduação em Linguística Aplicada na UNB em 2014. Esses dados dizem respeito às
crenças de professores e alunos de ELE de diferentes escolas públicas do Distrito Federal
(DF).
Com base nessa inquietação, o presente trabalho pretendeu identificar, observar
e contrastar as crenças sobre o ensino/aprendizagem de professores e alunos de espanhol
como língua estrangeira (ELE) de escolas públicas do Distrito Federal.
Adotando uma abordagem qualitativa (FLICK, 2009) de coleta e análise de
dados, e interpretativista (MOITA LOPES, 1994). Este estudo de caso, caracterizado por
focar em um determinado evento pedagógico (TELLES, 2002), apoia-se no conceito de
crenças a partir de uma perspectiva bakhtiniana (SILVA, 2010) e as considera como
diferentes modos de dar sentido ao mundo, uma vez que esses diferentes modos podem
ser direcionados por interações discursivas, o que Barcelos (2006) nomeia como crenças
sociais. Embora seja um assunto importante e mesmo que esteja sendo bastante
pesquisado na atualidade (GIMENEZ, 1994), faz-se necessário que as pesquisas sobre
crenças não se limitem à descrição, e sim busquem compreender a relação delas com o
ensino/aprendizagem. Por assim ser, para esta pesquisa conhecer e refletir sobre crenças
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é importante para que se possa analisar a relação delas com o ensino/aprendizagem de
espanhol.
Com base nas teorias citadas, este estudo investigou que as crenças dos alunos e
professores participantes desta pesquisa foram construídas por meio das experiências
vivenciadas por eles no processo de ensino\aprendizagem, além disso, nosso estudo
mostrou que as práticas orais se forem significativas, se fizerem sentido para os alunos,
podem fazer com que eles se sintam engajados a participar das ações de linguagem oral
e podem fazer também com que si sintam sujeito da ELE.
2. CRENÇAS E O ENSINO/APRENDIZAGEM DE LE
Para iniciarmos a discussão a respeito de crenças, faz-se necessário tentar
conceituá-las, afirmamos tentar, pois existe uma dificuldade para definir o termo crenças
no âmbito do processo de ensino/aprendizagem de línguas. Entretanto é possível
selecionar algumas definições que são coerentes entre si e nos ajudam a esclarecer melhor
as questões levantadas por essa pesquisa.
De acordo com Barcelos e Kalaja (2003) as crenças (no âmbito do ensino de
línguas) são, ao mesmo tempo, dinâmicas, pois mudam através de um período de tempo;
são emergentes, uma vez que são socialmente construídas e situadas contextualmente; são
também experienciais, pois, de acordo com desenvolvimentos recentes nos estudos da
cognição todos os processos cognitivos nascem da natureza contextual; são ainda
medianas, pois podem ser vistas como instrumentos, ferramentas disponíveis as quais
podemos usar ou não dependendo da situação.
Dentre as definições de crenças citadas, o construto experiências foi o que teve
maior atenção em estudos como os de Miccoli (2010). A pesquisadora nomeia duas
categorias para as experiências, sendo elas diretas e indiretas. A autora explicita que “as
experiências diretas tem origem nos acontecimentos que acontecem em sala de aula,
subdividindo-se em grandes categorias e subcategorias menores” (MICCOLI, 2010, p.
142). Para que se compreenda melhor essa divisão, vale discutir ainda como é apresentada
essa categorização expressa no excerto abaixo.
Para os estudantes, as categorias maiores são de experiências cognitivas
(referentes à compreensão das oportunidades de aprendizagem),
experiências sociais (relação dos estudantes com professores e colegas)
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e experiências afetivas (referentes às emoções associadas aos
acontecimentos em sala de aula) (MICCOLI, 2010. p. 142).
Essas divisões apresentadas pela autora nos auxiliam a observar como as
experiências no ensino\aprendizagem de LE podem ser analisadas para que assim os
envolvidos nesse processo possam refletir sobre as crenças, traçar mudanças e
ressignificar o processo de ensino\aprendizagem de LE.
Além de caracterizar as experiências diretas para estudantes, Miccoli (2010),
também as caracteriza para professores alterando as experiências cognitivas para
experiências pedagógicas, que se referem às atividades que os professores propõem aos
estudantes, as demais subcategorias, social e afetiva, são consideradas as mesmas para
professores e alunos. Quanto as experiências indiretas, a autora não apresenta diferenças
entre as experiências de alunos e professores. Sendo assim, as indiretas são consideradas
como experiências contextuais, referentes ao contexto em que professores e alunos se
encontram, experiências anteriores, referentes as experiências pessoais de alunos e
professores, experiências conceptuais, referentes a concepções que modulam decisões e
cursos de ação em sala de aula, e, experiências futuras, referentes à questão cuja
realização se projeta em direção ao futuro.
Toda essa divisão nos orienta a como interpretar os dados coletados nesta
pesquisa, além de também nos orientar na escolha das categorias de análise, como será
melhor explicitado na discussão dos dados. Esse aspecto é importante, uma vez que o
objetivo deste trabalho é contrastar as crenças de alunos e professores de ELE, sendo
então necessário nos apoiar em teorias que consideram a relação das crenças, experiências
e ações, como assim considera Miccoli (2010).
Outra definição de crenças que nos auxilia a compreender e explicar
comportamentos de professores e alunos é a que considera as crenças como sociais e
individuais.
(...) uma forma de pensamento, como construções da realidade, maneiras
de ver e perceber o mundo e seus fenômenos, co-construídas em nossas
experiências resultantes de um processo interativo de interpretação e (re)
significação. Como tal, crenças são sociais (mas também individuais),
dinâmicas, contextuais e paradoxais (BARCELOS, 2006, p.18).
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As crenças são verdadeiras para cada um que as têm, por isso é considerada
individual, mas também são construídas na vida em sociedade, por isso não se pode negar
o caráter social no processo de construção.
Sobre as crenças vale ainda citar que “por nascerem da experiência pessoal e
direta, crenças descritivas tendem a ser fortemente aderidas e difíceis de mudar”
(BOMFIM, 2011. p. 78). Em contra partida, “crenças são formadas e mudadas na e por
causa da interação social”, (BOMFIM, 2011. p.79). Assim, de acordo com o que foi
apresentado por Bomfim (2011), nem sempre a ação do professor se justifica pelas
crenças formadas anteriormente.
Ainda sobre esse aspecto, Borg (2003) reconhece que nem sempre as crenças
do professor influenciam sua prática de ensino devido a fatores contextuais. Um
professor, muitas vezes, toma algumas atitudes ou escolhe formas metodologias que não
condizem com suas crenças, mas que são mais adequadas, por exemplo, ao sistema no
qual trabalha, obedecendo assim às normas daquela instituição de ensino.
Embora seja um assunto importante e mesmo que esteja sendo bastante
pesquisado na atualidade, concordamos que as pesquisas sobre crenças não devem ser
limitadas à descrição, e sim devem procurar compreender a relação delas com a prática
de ensino e, no caso desta pesquisa, com a prática e reflexão do professor.
Neste trabalho corroboramos as perspectivas teóricas que consideram as crenças
dinâmicas, sociais e individuais, emergentes, medianas e experienciais. Dessa forma,
buscamos promover a reflexão no sentido de questionar até que ponto cada crença
contribui de forma positiva para o ensino/aprendizagem de línguas e que após a reflexão
seja possível pensar em ações que melhorem o processo de ensino\aprendizagem de ELE.
Não cabe aqui julgamento de valor sobre as crenças dos participantes, mas sim uma
reflexão sobre elas e as ações. Isso pode contribuir para a tomada de atitudes na
preparação didática do professor e até influenciar as práticas nos momentos de interação
espontâneos que ocorrem durante as aulas.
De acordo com Dufva (2003) a natureza da linguagem está expressa nos termos
de Bakhtin, em suas múltiplas vozes ou heteroglosia, isto é, há diferentes discursos em
uma mesma realidade. Dessa forma concordamos que há uma polifonia de crenças
advindas de várias fontes.
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3. METODOLOGIA
Ao considerar a subjetividade, tanto do pesquisador quanto dos sujeitos
participantes, a pesquisa qualitativa impossibilita a neutralidade (MARTINS, 2004). Por
interpretar as questões mais focadas em contextos específicos ela nega generalizações,
afinando-se a realidade. Dessa forma, a pesquisa qualitativa é relevante ao estudo das
relações sociais, como afirma Flick (2009), sendo também relevante para investigar os
problemas da prática educacional.
Por esses fatores esta pesquisa qualitativa-interpretativista utilizou o estudo de
caso como método para coleta e análise de dados. Chizzotti (2011) define com
propriedade o estudo de caso, quando afirma que este método de pesquisa visa “alcançar
um conhecimento mais amplo sobre esse objeto, dissipando as dúvidas, esclarecendo
questões pertinentes, e, sobretudo, instruindo ações posteriores” (2011, p. 135).
Esta pesquisa utilizou os dados coletados em duas pesquisas de mestrado
desenvolvidas no Programa de Pós-graduação em Linguística Aplicada na UNB em 2014.
Para melhor esclarecimento, denominamos pesquisa um (01)1, quando nos referirmos aos
dados coletados, às análises e observações feitas à respeito da pesquisa desenvolvida em
uma escola pública do Distrito Federal (DF), cujo objetivo era analisar o uso dos gêneros
discursivos nas aulas de Espanhol como LE no Ensino Regular. E a pesquisa dois (2)2 se
refere ao trabalho desenvolvido também em escolas públicas, porém com objetivo de
descrever como tem ocorrido a implantação da Lei 11.161/2005 em duas Regiões
Administrativas do DF: Taguatinga e Paranoá, analisar se as realidades de ensino com a
implantação da Lei 11.161/2005 nestas duas regiões são semelhantes ou se diferem e
apresentar os descompassos presentes nesta implantação, constatando as limitações e
necessidades deste ensino.
Como os dados destas duas pesquisas foram analisados por diferentes viés,
ainda ficaram algumas indagações a respeito da pesquisa e que não puderam ser
1 Cf. SANT’ANA, R.A. Gêneros discursivos no ensino de LE na escola pública: ações de linguagem por
meio de sequências didáticas. Brasília: Departamento de Línguas Estrangeiras e Tradução, Universidade
de Brasília, 2014, 212f. Dissertação 2 Cf. PERES CARVALHO, J. Contrastes e reflexões sobre o ensino de Espanhol em escolas públicas do
DF: uma visão real acerca da implantação da lei 11.161/2005. Brasília: Departamento de Línguas
Estrangeiras e Tradução, Universidade de Brasília, 2014, 249f. Dissertação de Mestrado.
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exploradas no trabalho de mestrado. Por isso, nós decidimos juntar os dados das duas
pesquisas e selecionar os que nos inquietavam e que diziam respeito às crenças de alunos
e professores.
Os dados que serão apresentados expressam, na pesquisa 01, a opinião de
alunos de duas turmas de 3º ano do Ensino Médio que foram coletados por meio de diário
de itinirância do participante (BARBIER, 2007). Na pesquisa 02, expressam as opiniões
de professores de ELE de duas escolas públicas do DF, que foram coletados por meio de
questionários.
Vale ressaltar ainda que os relatos não foram corrigidos, sendo apresentados
então da forma como os alunos e os docentes escreveram.
4. DISCUSSÃO DE DADOS
A análise de dados é o caminho mais denso do trabalho com a pesquisa, assim
como afirma Flick (2009) a interpretação de dados é a parte essencial da investigação.
Dessa forma, ao delimitar os dados que aqui são abordados não podemos deixar de lado
o caráter ético da pesquisa qualitativa. Cabe ressaltar que as pesquisas que deram origem
aos dados aqui analisados não tiveram como objetivo investigar as crenças, porém fatores
relacionados a elas emergiram durante a coleta de dados fazendo com que fosse possível
despertar uma discussão sobre crenças de alunos e professores de espanhol do DF.
Durante a seleção dos dados coletados, chamou-nos atenção algumas crenças que
se destacavam nos dados da pesquisa 1 (referentes aos alunos), e nos dados da pesquisa
2 (referentes aos professores). Dessa forma, selecionamos para esta análise as crenças em
relação ao ensino\aprendizagem de ELE que foram manifestadas nas opiniões dos
participantes ao produzir seus discursos nos relatos das duas pesquisas.
Para melhor clareza da discussão, apresentaremos a análise em dois eixos, sendo
o primeiro, a representação das crenças sobre o que pensam os alunos, em seguida, a
representação sobre o que pensam os professores de espanhol.
4. 1 O QUE PENSAM OS ALUNOS
Esta pesquisa, ao ouvir a voz dos participantes, possibilitou o diálogo profícuo
entre a análise dos pesquisadores e as representações dos sujeitos engajados na
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investigação. Esse diálogo foi possível por meio dos instrumentos de coleta de dados
abordados neste trabalho. Por meio desses instrumentos, foi possível perceber que a
dúvida tradicional: “Se aprende LE na escola pública?” Também esteve presente nos
discursos dos alunos de ELE do DF.
Abaixo é possível observar algumas das representações dos participantes a esse
respeito, que foram expressas no questionário inicial aplicado no início da pesquisa 1,
antes de ser aplicado o uso dos gêneros discursivos por meio de Sequências Didáticas
(SD) (DOLZ et al, 2011) nas práticas em sala de aula.
Durante a coleta de dados no questionário inicial os alunos ainda não haviam
escolhido seus pseudônimos, por isso as opiniões expressas abaixo não apresentam
identificação, nos demais dados coletados nos diários de itinerância do participante (DIP)
(BARBIER, 2007), os alunos já tinham escolhido seus pseudônimos.
Na sua opinião, se aprende Língua Estrangeira na escola pública?
- Não. Pois o tempo de aula é pouco. E aprender uma língua requer tempo, dedicação e esforço.
- Não, porque não tem muito tempo é bem rápido as aulas.
- Não. Infelizmente o que é passado para nós alunos não é nem o suficiente para compreender
o idioma.
- Sim, pois depende de cada aluno se esforçar, porque professores que explicam tem na Rede
pública.
- Sim. Mas falta o interesse dos alunos em aprender, não se aprende somente na escola.
- Não muito, porque são poucas aulas.
- Não. É muito pouco a quantidade de aula por semana.
- Não, pois temos pouco tempo para aprendermos a língua.
- Não, pouca aula, pouco tempo, fazendo com que tenhamos pouca interação com a língua,
pouco conhecimento.
- Sim, se o professor for bom aprendemos.
- Sim, porque até hoje tive excelentes professores capacitados e depende do interesse do
aluno.
Quadro 01- Dados coletados por meio do Questionário Inicial
Fonte: SANT’ANA, 2014, p. 97.
Nas respostas dos participantes, observamos que eles apresentaram diferentes
justificativas para suas respostas e a crença de que não se aprende língua estrangeira em
escola pública foi maior do que a afirmação positiva. Essa disparidade entre as respostas
nos leva a questionar: Por que há essa crença a respeito do Ensino Básico Regular público
no Brasil? É notável que os alunos atribuem o insucesso na aprendizagem a diferentes
fatores, tais como, a falta de interesse dos alunos, a falta de verbas do governo, a
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quantidade insuficiente de aulas, a qualidade do trabalho do professor e a falta de
interação na língua nas práticas em sala de aula.
Para interpretar essas justificativas expressas pelos alunos, é importante
retomar as teorias sobre como se constroem as crenças. Para Miccoli (2010), as crenças
são formadas, principalmente, por meio das experiências, No caso dos participantes da
pesquisa, é possível que essa crença da afirmação negativa quanto à aprendizagem de LE
tenha sido construída pelas experiências negativas nas aulas de ELE e que fizeram com
que o aluno considerasse sua aprendizagem insuficiente. Isso seria possível, pois os
alunos que participaram desta pesquisa cursavam o 3º ano do Ensino Médio e estudavam
ELE desde o 1º Ano. Em contrapartida, as crenças também são individuais e sociais
(BARCELOS, 2006), dessa forma é possível que essa crença também tenha sido
influenciada pelos discursos tradicionais de que não se aprende LE na escola pública.
Kalaja (1995) também considera que as crenças são socialmente construídas,
então essa crença aqui expressa não pode apenas ser apontada como sendo o que os alunos
pensam por si mesmos, mas o que ouvem, veem e vivem a respeito da aprendizagem de
ELE. Essa descrença quanto a aprendizagem não é evidenciada apenas no senso comum,
como lembra Paiva (2014), essa descrença aparece também nos documentos oficiais,
como os PCNs ao emocionar que
No Brasil, tomando-se como exceção o caso do espanhol, principalmente nos
contextos das fronteiras nacionais, e o de algumas línguas nos espaços das
comunidades de imigrantes (polonês, alemão, italiano etc.) e de grupos nativos,
somente uma pequena parcela da população tem a oportunidade de usar línguas
estrangeiras como instrumentos de comunicação oral, dentro e fora do país
(BRASIL, 1998, p. 20).
O que está expresso no documento acima citado deixa de incluir possibilidades
de interação social e atribui um papel elitista da LE, principalmente do inglês, uma vez
que considera o espanhol uma exceção desta falta de oportunidade de uso da língua. Esse
determinismo dos PCNs não leva em conta o constante contato que os sujeitos têm com
produções culturais, com as novas tecnologias (embora em 1998 o uso da internet era
diferente de hoje), com o turismo, com as relações comerciais, dentre outros meios nos
quais é frequente o contato com uma LE.
Ainda sobre as justificativas dos alunos, cabe reflexões a respeito da relação
entre elas e o trabalho de implementação da ELE no Brasil. Para que se cumprisse a lei
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11.161, a preocupação foi de que se oferecesse a ELE nos currículos de Ensino Médio,
porém ao oferecê-la com uma carga horária de 1h\a por semana não se pensou nos
inúmeros problemas que poderiam surgir com essa quantidade de aula. Ainda depois da
implementação da ELE nos currículos de Ensino Médio, algumas pesquisas e publicações
foram feitas a respeito do cenário da língua espanhola nas escolas. Essas pesquisas focam
alguns temas como, Algumas Incoerências no Ensino de Espanhol (FERNÁNDEZ,
2010); A Avaliação do Ensino (MATOS, 2010), A leitura, escrita e oralidade
(CASTELA, 2013), dentre outros temas objeto de estudo dentro do processo de ensino
aprendizagem de ELE.
Outro fator que apareceu nas justificativas dos participantes foi a carga horária
insuficiente das aulas de ELE. A esse respeito é importante refletir que a realidade das
escolas dificulta a resolução desse problema, isso porque ainda seria preciso resolver os
problemas com a estrutura organizacional, as turmas com grande número de alunos, a
falta de recursos, dentre outros inúmeros problemas enfrentados na escola. Além disso, a
alteração na grade curricular vai além das ações de professores e alunos, pois diz respeito
às políticas públicas, porém isso não significa que calar as opiniões seja o melhor caminho
para tentar sanar esse problema. No caso específico do Distrito Federal, existe uma parte
diversificada no currículo que seria para projetos, mas o que acontece na prática é que
professores de ELE são orientados a trabalharem outras disciplinas dentro dessa parte
diversificada, uma dessas disciplinas é a Redação.
Se há uma cobrança dos próprios alunos de que se amplie a carga horária da
língua, por que não ofertar o espaço diversificado para o espanhol? Essa é uma pergunta
que ninguém ainda respondeu. Esse descaso pode ter desencadeado os problemas que
foram citados pelos alunos, como por exemplo, professores desmotivados, pois assumem
uma carga horária elevada com maior número de diários e turmas, não tendo condições
de preparar suas aulas como gostariam, o que, por sua vez, pode refletir nos alunos que
além dos problemas que já têm de aprendizagem e falta de estímulo para estudar se sentem
ainda mais desestimulados a aprender uma LE.
O resultado desse ciclo é que a descrença quanto ao aprendizado de LE nas
escolas públicas não contribui para o desenvolvimento do aprendiz, e, além disso, como
considera BOMFIM (2011) as crenças são difíceis de serem mudadas, e como as crenças
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são verdades para quem as têm, os alunos podem não se engajar no aprendizado de LE
por não acreditarem nele.
Abordamos agora o que os participantes manifestaram não gostar nas
aulas de ELE. Chamou nossa atenção o fato de os alunos apontarem não gostar da
oralidade nas aulas, ou seja, eles não se sentiam a vontade ao ter que participar de
atividades que envolviam a prática oral da língua. Isso foi apresentado no quadro abaixo
que também é resultado de relatos expressos no questionário inicial.
- Não gosto muito dos trabalhos em forma de peça de teatro e das poucas quantidades de aulas
semanais.
- Apesar de ser bom para prática a nossa fala não gosto de ler em público pois sou muito tímido.
- Falar em espanhol.
- Não gosto de apresentar em espanhol porque não sei falar em espanhol.
Quadro 02 :Dados coletados por meio do Questionário Inicial
Fonte: SANT’ANA, 2014, p. 93.
O que foi expresso nos relatos acima descrevem opiniões contrárias ao uso da
oralidade nas aulas de ELE, isso nos faz pensar, que o pouco contato com a oralidade faz
com que os alunos acreditem ser essa uma prática ruim, pois os desestabilizavam. Esse
incômodo sentido pelos alunos ao estudar uma LE é o mesmo que se colocar numa
situação de não saber tudo, é voltar a fase de bebê quando ainda não se sabe falar
(REVUZ, 1998). Nesse sentido, os alunos ainda não se sentem parte da língua, ou seja,
o pouco tempo destinado à oralidade nas aulas de LE não estimulam os alunos a se
engajarem em ações de linguagem oral causando estranhamento e recusa nas ações de
linguagem oral.
Essa característica de recusa da oralidade também foi mencionada ao pedir que os
alunos opinassem sobre o que precisaria mudar nas aulas de ELE.
Pirate 3º A: menos atividade oral.
Jeanzito 3º A: aulas cada vez mais interativas.
Alfa 3º A: mais atividades orais.
Son3º A: que continue do mesmo jeito.
Kelly Kel 3ºA: exercitar a fala em espanhol.
Derson 3º A: mais trabalhos práticos, como por exemplo, interpretar um filme.
Dete 3º A: mais aulas.
Yokohama 3º A: mais aulas práticas, fazer mais exercício junto com a professora
Quadro 03: Dados coletados por meio do Questionário Inicial
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Fonte: SANT’ANA, 2014, p. 93.
O quadro acima apresenta opiniões que mesclam diferentes pontos de vista.
Alguns participantes opinaram que para melhorar a aula é preciso praticar mais a
oralidade, já outros não querem praticar a oralidade. Essa divergência caracteriza a crença
de alguns alunos de que é necessário falar a língua que se estuda. Não se pode esperar
que todos os alunos saiam fluentes das aulas de ELE na escola pública, mas sim que eles
tenham oportunidade de ter contato com a oralidade para que possam se sentir motivados
a continuarem estudando. É possível notar também nas opiniões dos alunos a crença de
que não se aprende a falar o idioma na escola pública, então para eles não há a necessidade
de ter contato prático com a oralidade nas aulas.
Assim como considera Miccoli (2014), a proposta de ensino de LE pela metade
tem que ser superada, pois “o ensino de línguas com foco na comunicação, no uso da
língua em sala de aula na interação entre professor e alunos no desenvolvimento das
quatro habilidades, embora desafiador, passa a ser propósito das ações de professores...”
(MICCOLI, 2014. p. 180). Como chegar a esse propósito talvez seja o grande desafio, no
entanto, ainda que a realidade da Escola Básica não seja a ideal, é bom lembrar que as
OCEMs (2006) recomendam o desenvolvimento das quatro habilidades. No entanto, não
podemos deixar de reconhecer a dificuldade que é trabalhar a oralidade na sala de aula, e
por isso, corroborando Bruno (2010), apoiamos a concepção de que é preciso estabelecer
uma relação entre o oral e o escrito para que o oral não seja trabalhado de maneira isolada
fazendo com que as crenças que já existem perdurem e estimulem o desinteresse em
engajar-se nas ações de linguagem oral.
No quadro 03, foi mencionada também a necessidade de fazer mais exercício
junto com a professora, esse aspecto explicita a dificuldade dos alunos em ter apenas um
encontro semanal com o professor, o que acaba resultando em práticas isoladas, pois
muitas vezes, as atividades propostas são concluídas pelos alunos em casa para otimizar
o tempo da aula. Com isso, o aluno perde a oportunidade de junto com seu professor
analisar e discutir suas dúvidas. É fato que o aluno deve ser sujeito de seu aprendizado,
mas para que ele possa caminhar sozinho na tarefa de buscar novos caminhos para
aprender, ele precisa de suporte e orientação, e com turmas cheias e pouco tempo de aula
não é possível acompanhar cada aluno para que ele possa ter a oportunidade de sanar suas
dúvidas.
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Contrapondo as crenças até aqui apresentadas, discutiremos agora o que
relataram os participantes a respeito das atividades desenvolvidas nas SDs aplicadas nas
turmas.
Observemos os relatos a seguir.
Alfa 3º A: A produção do vídeo clipe foi a mais legal e divertida, acredito que não fizemos apenas
pra ganhar nota e sim porque a ideia de produzir um clipe foi sensacional, cantando em espanhol que
para mim seria quase impossível.
Make up 3º B: Eu nunca pensei que poderia cantar uma música em espanhol, pra mim foi uma alegria
cantar com minhas amigas eu me diverti muito nas aulas de espanhol.
Quadro 04: dados coletados por meio dos DIPs
Fonte: SANT’ANA, 2014, p. 137.
A participante Alfa relatou que percebeu uma diferença nos colegas ao
desenvolver a atividade proposta, ela considerou que a atividade não foi feita apenas por
nota, o que nos faz pensar que houve um envolvimento maior dos alunos. Para a
participante Make up a alegria de se sentir capaz a estimulou nessa prática da oralidade.
Observando essas considerações, notamos que elas vão de encontro ao que foi
apresentado nas justificativas dos alunos nos quadros 01, 02 e 03. Percebemos que a
experiência de vivenciar ações positivas nas aulas de espanhol deram características
diferentes aos discursos dos alunos no que diz respeito a suas crenças na aprendizagem
de ELE. Assim como aponta Miccoli (2010), crenças explicam ações e podem reforçar
ou transformar crenças, nesse caso, observamos que houve diferenças nas crenças
apresentadas, pois a experiência de vivenciar a língua na prática pode ter levado a
construção de outras crenças, ou pode ter transformado e ressignificado as antigas crenças
a respeito da oralidade na ELE.
Dessa forma, ressaltamos a importância de se oferecer aos aprendizes de LE
contatos com experiências em aprendizagens significativas para que eles possam ver
sentido no que estudam. Apontamos ainda que, no caso da pesquisa 1, o uso dos gêneros
discursivos contribuiu para que as ações de linguagem fossem significativas, uma vez que
possibilitou o contato com ações da vida cotidiana dos alunos. Esse aspecto reafirma a
teoria baktiniana de que os gêneros moldam nossos discursos. Além disso, revozeamos
Bruno (2010), com a importância de se refletir como trabalhar a oralidade nas aulas de
ELE, para que os aluno se sintam capazes de agir nos discursos orais. E como aponta
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Miccoli (2010, p.152) “é preferível estar num ambiente dessa possibilidade em que a
oportunidade de aprender LE seja real, que numa sala que oferece apenas a metade”.
Observamos ainda nesses relatos do quadro 04 a presença do que Miccoli (2010)
chama de experiência cognitiva, como foi apresentado no tópico teórico, pois ela diz
respeito às oportunidades que o estudante tem de aprendizagem e as oportunidades de
aprendizagem podem ter sido as responsáveis pelas ressignificação das crenças dos
alunos.
Passaremos agora a abordar as crenças apresentadas por professores que
participaram da pesquisa 2.
4.2 O QUE OS PROFESSORES PENSAM?
Os professores participantes da pesquisa 2 em seus depoimentos a respeito do
ensino\aprendizagem da ELE deixaram expressas considerações a respeito de sua prática
e do que a envolve. Dentre essas considerações, foi possível destacar alguns traços de
crenças que consideramos ser importantes explicitar neste trabalho para que suscite um
repensar das práticas no processo de ensino\aprendizagem de ELE e das políticas
públicas.
Abordaremos primeiramente as considerações dos professores participantes a
respeito do que eles pensam sobre aprender ELE na escola pública de Ensino Básico. Para
isso, evidenciaremos o pensamento de alguns professores que participaram da pesquisa
2.
Professora 1: (...) o nosso tempo é muito corrido, é pouco tempo pra muita coisa, então assim, eles
acabam assimilando pouco, né (...), quando a gente percebe que um aluno fala assim: “ah professora,
eu faço Espanhol há tantos anos no CILT e depois disso eu quero fazer Espanhol na UnB”, então
é uma das poucas satisfações (...).
Professora 2: A minha maior satisfação é saber que, por exemplo, um aluno, ele se interessou para
aprender a língua espanhola não só aqui na escola, porque a gente sabe que, por causa, pelo tempo,
não dá tempo dele aprender muita coisa (...).
Quadro 05: Dados coletados por meio de entrevista
Fonte: PERES CARVALHO, 2014, p. 139.
Pelas falas das docentes acima, vê-se a crença de que pelo pouco tempo de aula
não se pode aprender Espanhol na escola, sendo necessário um aprendizado posterior e
extracurricular, pois, em função da pouca carga horária, “eles assimilam pouco”, não dá
tempo do aluno “aprender muita coisa”.
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A crença de que não é possível aprender LEM em escolas públicas surge mais
uma vez, crença já constatada e confirmada em diversos estudos (COELHO, 2005;
MIRANDA, 2005; VESZ, 2012). Todavia, como afirmou Rinaldi (2014, p. 12): “é
necessário que se desmitifique a ideia de que a aprendizagem de idiomas na escola é
ineficaz. Ela é possível, sim, desde que as condições sejam favoráveis (...)”. As condições
das escolas públicas, já mencionadas nesta pesquisa, muitas vezes impedem um melhor
desenvolvimento das aulas, não se pode fugir da realidade. Entretanto também não se
pode desperdiçar o pouco tempo que é disponibilizado a ELE nas escolas, dessa forma,
enquanto as Políticas Públicas não mudam a respeito dessa situação o melhor caminho
não seria cruzar os braços, mas pensar em estratégias, metodologias que funcionassem
para que o interesse do aluno fosse despertado e a motivação do professor não se fadasse
ao fracasso.
Note que os professores expressaram aqui em suas considerações a insatisfação
de ver que os alunos não aprendem o que deveriam, dessa forma a experiência desses
professores influenciam na construção dessa crença de que não se aprende ELE na escola,
ademais essa crença é reforçada pelo discurso social que existe em grande escala de que
para aprender uma língua é preciso morar fora ou estudar em cursos livres. Esse tipo de
crença nos remete ao que Miccoli (2010) considera ser um tipo de crença de experiências
diretas denominada experiências pedagógicas, pois essa crença é formada a partir do que
propõe o professor e vivencia na prática em suas aulas.
Diante da descrença quanto ao aprendizado de LE, cabe ressaltar neste espaço
que algumas pesquisas desenvolvidas na área da LA têm apresentado resultados que
contribuem para a melhoria desse quadro de ensino-aprendizagem e podem ajudar a
desconstruir ou amenizar essa crença negativa. Essas pesquisas apresentam práticas de
sala de aula que têm dado resultados favoráveis que dribla parte das dificuldades
enfrentadas por professores e alunos de LE. Esses trabalhos, tais como, Buzato (2001),
Leffa (2006), Menezes (2010), Coscarelli (2009), Dias (2012, 2014) e Sousa (2013)
valorizam o uso das novas tecnologias de comunicação como forma de interação dentro
e fora da sala de aula. Isso ocorre, principalmente porque se baseia em novas práticas de
linguagem, e como afirma Gregoli (2013) essas novas práticas não são novas roupagens,
mas sim trata-se de questionar como trabalhar, por exemplo, as novas tecnologias
incorporadas às práticas significativas.
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Outra crença apresentada pelos participantes é quanto a implementação da ELE
nas escolas de Ensino Médio. Notemos na fala a seguir como os professores consideram
que se deu a implementação do espanhol.
Questionados sobre o motivo da implantação do Espanhol no Brasil, muitos
professores afirmaram que o motivo foi a criação do MERCOSUL e a tentativa de
fortalecimento do Brasil com países cuja língua oficial é o Espanhol.
Professor 2: Eu acho porque o Espanhol tem tido uma importância a mais pro Brasil, devido ao
MERCOSUL, devido às empresas multinacionais, ao setor de turismo, de hotelaria (...).
Professor 3: Pela proximidade (fronteira) com os países da língua espanhola e a implantação do
MERCOSUL.
Professor 5: (...) pelo acordo, penso eu, do Brasil com o MERCOSUL.
Professor 6: Eu acho que tem a ver com o MERCOSUL, né?
Quadro 06: Dados coletados por meio das entrevistas
Fonte: PERES CARVALHO, 2014, p. 132.
De acordo com Amaral e Mazzaro (2007, p. 1) “a principal causa para essa
mudança repentina no status da língua espanhola costuma ser atribuída à criação do
Mercosul”. De fato, o MERCOSUL foi um grande elemento para a integração dos países
latino-americanos, contribuindo não somente para o estreitamento dos laços, mas também
para a valorização do Espanhol no Brasil (IBIDEM). Entretanto, como elucidou Jaeger
(2009, p. 31), “a resposta cristalizada pelo senso comum não hesita atribuir à participação
do Brasil no Mercosul a razão para esta novidade no sistema educativo”. Assim, tal visão
corresponde a um senso comum enraizado, uma vez que muitas outras motivações de
distintas naturezas – principalmente econômicas e políticas – contribuíram para a
implantação do Espanhol ao Sistema de Ensino Brasileiro, pois, ao nos depararmos com
a implantação da Lei 11.161/2005, percebemos que estamos “diante de um gesto político
claro e, sobretudo, de um gesto de política linguística...” (BRASIL, 2006, p.128, grifo
nosso). Assim, cabe o questionamento levantado por Maciel e Oliveira (2011, p. 3): “A
sanção da lei foi mais um ato político que educacional?”.
Ao levantar esse questionamento, refletimos também a crença de que a
implementação se deu apenas com base na relação do Mercosul, sem considerar as
relações sociais de interação, principalmente por meio das redes sociais e da globalização
da comunicação advinda por meio do avanço das novas tecnologias o que também tem
possibilitado a inserção social do aprendiz de ELE.
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Abrindo espaço para a última crença observada nas considerações
apresentadas pelos professores, abordaremos o fato de a ELE ser considerada uma língua
que “dá pra levar”.
Segundo Ribeiro da Silva (2011), a concepção do Inglês como língua dominante
na escola contribuiu para a existência de uma “política implícita” para a língua inglesa.
O núcleo dessa política seria o status (social, profissional e acadêmico) que a sociedade
atribui a esse idioma, uma vez que grande parte da comunidade escolar acredita que o
Inglês é obrigatório no ensino brasileiro. Em contrapartida, o Espanhol é visto como uma
língua “muito fácil”, na qual existe uma “facilidade maior” para compreender e se
comunicar, como é possível ver nos relatos das docentes abaixo:
Professor 7: Então, por exemplo, quando eu viajo, eu falo Inglês, mas quando eu não entendo eu
falo assim: “hablas Español?” e eles “hablan”, e aí eu me viro!
Professor 8: Acredito que seja pelo fato (...) da necessidade que as pessoas tenham mesmo, né, de
irem pra outros países e o Espanhol você sabe se virar... Né, de qualquer forma, que seria mais assim,
entre aspas, considerado mais fácil, digamos assim, que o Inglês.
Quadro 07: Dados coletados por meio
Fonte: PERES CARVALHO, 2014, p. 136.
Dessa maneira, pelos fragmentos acima, é possível perceber que os professores
participantes possuem a crença de que o brasileiro “sabe se virar” ao tentar falar Espanhol
em função da proximidade entre as línguas. De fato, tal proximidade cria um estereótipo
e expectativa de facilidade na aprendizagem de Espanhol por um brasileiro
(GONZÁLEZ, 2010). Contudo, é preciso cuidado, uma vez que é possível o falante
brasileiro “iludir-se” com um bilinguismo inexistente, dando espaço ao que Selinker
(1972) denominou “interlíngua”.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS: BREVES REFLEXÕES SOBRE OS
RESULTADOS DO ESTUDO E SUAS IMPLICAÇÕES PARA O
ENSINO\APRENDIZAGEM DE ELE
De maneira sucinta, podemos concluir que as crenças apresentadas por
professores e alunos que participaram das duas pesquisas que originaram este estudo
foram construídas por suas experiências no processo de ensino\aprendizagem de ELE.
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Dessa forma, fica evidenciada a urgência em trabalhos que investiguem práticas
pedagógicas que desmistifiquem as crenças que estão inteiramente ligadas a prática oral.
Nosso estudo mostrou que as práticas orais se forem significativas, se fizerem
sentido para os alunos podem fazer com que eles se sintam engajados a participar das
ações de linguagem oral e podem fazer também com que si sintam sujeitos da ELE.
Fica também evidenciado em nossa pesquisa, que é preciso repensar as políticas
públicas de maneira a favorecer o ensino-aprendizagem possibilitando maior interação
entre professores e alunos, com turmas reduzidas e maior carga horária para a ELE, que
seja no mínimo igualada a carga horária da língua inglesa.
Finalmente, advogamos a importância da formação continuada para dar suporte
aos professores de ELE para que eles reflitam sobre a importância de trabalhar as quatro
habilidades e não apenas a metade delas. E que além de refletir, que eles tenham a
orientação de investigar diferentes maneiras para integrar o escrever, o ler, o falar e o
ouvir, para que assim a ação de linguagem oral não seja esquecida.
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