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Entre a habitação social e o mercado: que lugar para o acesso à propriedade? Paulo Conceição CITTA – Centro de Investigação do Território, Transportes e Ambiente [email protected] Quinzena da Habitação, Porto, 3 de Outubro de 2007

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Entre a habitação social e o mercado: que lugar para o acesso à propriedade?

Paulo Conceição

CITTA – Centro de Investigação do Território, Transportes e Ambiente

[email protected]

Quinzena da Habitação, Porto, 3 de Outubro de 2007

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Introdução

De um texto introdutório do debate sobre o Plano Estratégico para uma Política de Habitação 2007/2013…:

• Como responder à população insolvente? • O que fazer aos bairros sociais?• Diferenças regionais• (…), como inverter este processo, fomentando o investimento,

público e sobretudo privado, na reabilitação?• Como dinamizar o mercado de arrendamento?• Como suprir as crescentes e irreversíveis reduções financeiras

do Orçamento de Estado?

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Introdução

De um texto introdutório do debate sobre o Plano Estratégico para uma Política de Habitação 2007/2013…:

O QUE FAZER AOS BAIRROS SOCIAIS?• A gestão dos bairros sociais tem mesmo de ser ineficaz? é

rentável ? permite a boa gestão da reabilitação social e urbana?• Qual o tipo de gestão: critérios de rentabilidade privada? gestão

por princípios de “discriminação positiva”?• A quem compete a sua gestão? ao estado? à região ? ao

município? a empresas municipais? a entidades sem fins lucrativos? a entidades com fins lucrativos?

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Introdução

De um texto introdutório do debate sobre o Plano Estratégico para uma Política de Habitação 2007/2013:

• Em casos de muito más condições habitacionais e urbanísticas é de considerar a implosão como se faz hoje na Europa?

• Quais os custos sociais e económicos da “condenação” da população insolvente à vivência nos bairros sociais por impossibilidade de apoio no acesso ao mercado ?

• A alienação dos fogos públicos é uma boa medida económica, social, habitacional e urbanística?

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Introdução

O que significa, no contexto deste debate, o tópico desta intervenção: “entre a habitação social e o mercado: que lugar para o acesso à propriedade?”?

Olhar para o acesso à propriedade (incluindo as possíveis medidas dirigidas para os actuais inquilinos da habitação pública – alienação dos fogos, incentivos ao acesso aos mercados), com duas preocupações:

• A preocupação com o percurso habitacional das pessoas e das famílias, com as suas aspirações;

• A preocupação com a gestão da habitação social e com as relações entre habitação social e mercados

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Introdução

Estrutura da intervenção:

• Uma reflexão sobre o contexto português: como se pode articular, de forma coerente, a questão do acesso à propriedade nas políticas de habitação?

• Alguns apontamentos de experiências de outros contextos e das suas controvérsias

• Algumas sugestões de debate, algumas pistas de intervenção

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Enquadramento

À partida, podem ser várias as justificações para a colocação do acesso à propriedade nos debates em torno das políticas (sociais) de habitação :

• Argumentos relacionados com a importância concedida à propriedade ou com a forma como se olha para a capacidade do Estado responder às aspirações das pessoas;

• Argumentos relacionados com o financiamento das políticas (por exemplo, a redução do esforço financeiro do Estado ou a necessidade de novas fontes de financiamento);

• Argumentos relacionados com a reestruturação do parque público;

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Enquadramento

Argumento: no contexto português, a discussão sobre o acesso à propriedade (por actuais inquilinos do parque púbico) não pode esquecer...:

• A importância do arrendamento (não serão úteis opções que conduzam a uma diminuição drástica do “sector do arrendamento”…)

• A importância do esforço público com a habitação (não serão úteis opções que conduzam a um desinvestimento nas políticas de habitação…)

• A importância da atenção às mudanças sociais e às “novas necessidades de habitação” (serão úteis opções que conduzam a maiores capacidades de adaptação, a maior diversidade de percursos e de respostas…)

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Enquadramento

Arrendamento

Regime de ocupação: ocupante proprietário (%)

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20

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(ex-R

DA)

1980/81

2000/01

Fontes: Housing Statistics in the European Union (2003); Itália (2001) - ISTAT

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Enquadramento

“Arrendamento social”

Regime de ocupação: "habitação social" (%)

0

5

10

15

20

25

30

35

40

Holanda

Suécia

Áustri

a

Reino U

nido

Dinam

arca

Finlân

dia

Franç

a

Irlan

da

Bélgica

Itália

Aleman

ha

Portu

gal

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mbu

rgo

Espanh

a

Grécia

Fonte: CECODHAS (2005)

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EnquadramentoNecessidades de intervenção (“política social de habitação”)

Pessoas em alojamentos com pelo menos 1 quarto por pessoa e que não assinalam problemas qualitativos (%)

Tot

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Não

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Portugal 31 13 43 13 16 32 55 31 30 39 34 27 22Grécia 49 43 51 30 39 50 52 47 49 45 46 55 50Espanha 59 46 63 45 58 64 75 61 58 64 57 60 62Itália 59 39 66 24 54 65 80 62 57 52 56 61 68Luxemburgo 62 50 66 43 59 57 67 61 63 53 56 69 76Finlândia 63 61 65 61 60 60 69 65 62 62 53 72 77França 64 49 80 53 53 71 73 69 60 53 53 71 85Reino Unido 67 60 72 56 64 73 71 70 66 64 59 72 83Irlanda 67 47 75 43 57 68 87 65 70 67 64 69 78Dinamarca 70 57 78 68 65 71 73 77 66 69 57 81 87Bélgica 70 50 79 55 66 69 71 69 72 68 62 78 82Holanda 70 64 77 59 62 72 83 71 70 67 64 76 84Áustria 74 66 82 63 74 72 83 77 71 62 68 86 82Suécia 74 68 79 67 71 78 80 74 74 60 63 87 89Alemanha 78 71 88 80 64 84 84 83 75 76 69 87 89Fonte: First European Quality of Life Survey: Social dimensions of housing (2006)

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Enquadramento

Necessidades – e meios - de intervenção (“política social de habitação”)

Despesa do Estado com a habitação

0

100 000 000

200 000 000

300 000 000

400 000 000

500 000 000

600 000 000

700 000 000

800 000 000

1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

Fonte: Conta Geral do Estado

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Enquadramento

Necessidades de atenção às mudanças e à diversidade de percursos

• Mudanças demográficas e nos modos de vida• Mudanças no emprego• Mudanças nos sistemas e nas políticas de bem-estar social

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Alguns apontamentos de outros contextos

A escolha entre arrendamento e casa própria e o seu significado social: um debate controverso

• (Como indicam os dados apresentados), os contextos são diferentes. Não se pode desligar o regime de ocupação do seu contexto: não se opta em abstracto pelo arrendamento ou pelo acesso à propriedade, mas por determinadas formas de arrendamento / determinadas formas de acesso à propriedade…

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Alguns apontamentos de outros contextos

A escolha entre arrendamento e casa própria e o seu significado social: um debate controverso

• A propriedade de habitação pode constituir uma oportunidade: segurança face ao futuro, património que se pode valorizar e contribuir para a capacidade de endividamento, património que se pode transmitir; pode constituir riscos e novos encargos. A ponderação de oportunidades e de riscos não é a mesma, por todas as pessoas e famílias.

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Alguns apontamentos de outros contextos

As experiências de alienação da habitação social

O caso britânico – o mais expressivo das políticas de alienação da habitação social (com o chamado “Right-to-buy”) - tem sido muito estudado. Ressaltam duas conclusões principais:

• A dimensão quantitativa; a adesão, em número significativo, por parte das pessoas; a posterior capacidade de investimento na casa (para o que contribuíram as condições em que o direito à compra foi exercido – em especial, os importantes descontos nos preços da habitação)

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Alguns apontamentos de outros contextos

As experiências de alienação da habitação social

• O seu carácter selectivo (indutor de riscos nas condições de gestão do parque de habitação social): o nível de vendas é superior para determinados tipos de habitação e para determinadas localizações; os inquilinos que compram têm características sócio-económicas específicas (por exemplo, uma relação mais estável com o emprego). Como resultado, discute-se a existência dos chamados processos de “residualização da habitação pública”.

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Alguns apontamentos de outros contextos

As relações entre habitação social e mercados: a distinção entre mercados unitários e dualistas

A (eventual) opção pela alienação dos fogos públicos não dispensa a reflexão sobre as condições de gestão do arrendamento social. Estudos comparados, no contexto europeu, têm vindo a chamar a atenção para duas questões:

• A questão das organizações que gerem o parque de habitação social, das suas capacidades/competências de gestão e de relação com os inquilinos, do seu modelo de acção[nota: a importância do conceito de rede]

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Alguns apontamentos de outros contextos

As relações entre habitação social e mercados: a distinção entre mercados unitários e dualistas

• A questão – mais geral – da relação entre habitação social e mercados. Alguns autores distinguem os chamados “mercados integrados/unitários”, nos quais a coexistência competitiva entre senhorios sem fins lucrativos e senhorios com fins lucrativos é estimulada, e “mercados segmentados/dualistas”, baseados na distinção muito acentuada entre habitação sem fins lucrativos e mercado.[nota: a situação portuguesa é, neste contexto, marcada pela fragmentação]

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Sugestões de debate, pistas de intervenção

Duas ideias recorrentes:

A importância da atenção à especificidade dos contextos, a necessidade de mais conhecimento específico sobre o contexto e sobre as experiências em curso:

• As aspirações das pessoas e das famílias, o significado da sua relação com a casa;

• A situação do parque habitacional público;• O “conceito” de arrendamento social (de “direito à habitação”) e

a construção das políticas orientadas para o arrendamento

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Sugestões de debate, pistas de intervenção

Duas ideias recorrentes:

A importância da diversidade de instrumentos de intervenção: não há, necessariamente, uma separação simples/absoluta entre arrendamento social, arrendamento privado e propriedade; as experiências porventura mais inovadoras situam-se precisamente nas relações entre estes “sectores”.