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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO FERNANDA BATISTA DO PRADO ENTRE O ORATÓRIO E A PROFISSÃO: FORMAÇÃO DE PROFESSORAS NA ESCOLA NORMAL RURAL NOSSA SENHORA AUXILIADORA EM PORTO VELHO/RO (1930- 1946) CUIABÁ-MT 2017

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

INSTITUTO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

FERNANDA BATISTA DO PRADO

ENTRE O ORATÓRIO E A PROFISSÃO: FORMAÇÃO DE

PROFESSORAS NA ESCOLA NORMAL RURAL NOSSA

SENHORA AUXILIADORA EM PORTO VELHO/RO (1930-

1946)

CUIABÁ-MT

2017

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

INSTITUTO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

FERNANDA BATISTA DO PRADO

ENTRE O ORATÓRIO E A PROFISSÃO: FORMAÇÃO DE

PROFESSORAS NA ESCOLA NORMAL RURAL NOSSA

SENHORA AUXILIADORA EM PORTO VELHO/RO (1930-

1946)

CUIABÁ-MT

2017

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FERNANDA BATISTA DO PRADO

ENTRE O ORATÓRIO E A PROFISSÃO: FORMAÇÃO DE

PROFESSORAS NA ESCOLA NORMAL RURAL NOSSA SENHORA

AUXILIADORA EM PORTO VELHO/RO (1930-1946)

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-

Graduação em Educação da Universidade Federal de

Mato Grosso como requisito para a obtenção do título

de Mestra em Educação na Área de Concentração

Educação, Linha de Pesquisa Educação, Cultura e

Sociedade, Grupo de Pesquisa e Estudos em História

da Educação, Instituições e Gênero.

Orientadora: Profa. Dra. Nilce Vieira Campos Ferreira

Cuiabá-MT

2017

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Dedico esta experiência a todas nós. Mulheres!

Especialmente, à Ana Heloiza Farias.

Uma mulher que agora é luz!

*In memoriam*

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AGRADECIMENTOS

Minha existência nesse mestrado foi a maior confirmação de que alguma força olhou

pelos meus passos durante todo o percurso. Mesmo sido criada em um lar cristão, a vida me

ensinou a optar por uma luz na qual confiei e que iluminou minhas ideias, tranquilizou meu

coração e permitiu-me ser grata a cada aprendizado vivenciado. Optei por olhar e confiar

nessa luz que me guiou, trazendo para mim outro sentido, outra abordagem sobre o mestrado

e a vida. Agradeço a um deus enquanto força vital, não institucionalizado, que é mãe e pai, ao

deus que há em cada pessoa que existiu nesse momento de minha vida e ao deus que há em

mim.

A realização do mestrado se deveu ao Programa Institucional de Bolsas

CAPES/CNPq. A bolsa tornou possível que eu pudesse residir em Cuiabá e ter a oportunidade

de aprofundar meus estudos na Pós-Graduação em História da Educação do Instituto de

Educação da Universidade Federal de Mato Grosso.

À minha família seria pouco dizer obrigada. Nossa “estrela de cinco pontas” foi

minha referência nos momentos de aprendizado. Somou forças para que eu não desistisse.

Acreditou em mim em cada segundo do início ao fim. Torceu para que este momento

chegasse. Luciana, Juliana, Paulo e Clara: falar apenas que os amo é pouco. O que eu sinto

ainda não tem nome.

“Lu” e “Ju”, minhas irmãs e melhores amigas. Obrigadas por serem tão atenciosas e

amáveis comigo e com tudo o que eu passei em Cuiabá. O que nos distanciou foi apenas a

distância física, geográfica, pois em nenhum momento vocês faltaram com a dedicação e

esforço que só os irmãos fazem por nós. Estiveram sempre presentes e sempre por dentro dos

acontecimentos. Sou muito grata por toda a ajuda que me ofereceram. Amo vocês!

Pai e mãe... Escrever esses agradecimentos deixou-me muito emocionada. Vocês são

os melhores pais desse mundo todo! Eu não tenho sequer qualquer reclamação para fazer.

Apenas agradecer. Confiaram uma vida a mim, a minha própria vida...e imagino como não

deve ser fácil para os pais um gesto como esse. Aproveito para pedir desculpas pela ausência,

pelas ligações não atendidas ou não retornadas, pelas mensagens não respondidas

imediatamente. Sei que não existem justificativas para isso, mas a correria dos dias me deixou

muito ocupada a ponto de procrastinar atenção para vocês. Só quero que saibam que eu

reconheço tudo o que fizeram por mim até aqui. Reconheço toda a atenção, todo o cuidado,

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toda a dedicação de ambos. Vocês sempre foram e continuam sendo pais maravilhosos!

Levarei comigo esse amor tão bonito e puro aonde quer que eu exista.

Aos meus avós, às minhas tias e aos meus tios também gostaria de deixar uma

singela homenagem. Claudete, Inácio, Júlio, Benedita, Lúcia, “Tio Tim”, Dulce, Neila, Rage,

Solange, Luís, Marilda e Joaquim. Sou muito grata a vocês que estiveram sempre torcendo

por mim! Aos primos e às primas e aos meus cunhados, também gostaria de dizer obrigada

pela força e apoio! Eu nada seria sem todo o afeto de minhas primas Lucila, Ângela, Anna

Clara, Mariana, Amanda, Janaína, Clélia e a mais nova integrante da família a pequena Lúcia

Vitória. Meus primos Inácio Neto e Vanildo, e meus cunhados Eriberto Júnior e Oliver

Ferreira. Muito grata por tudo!

Realizar essa pesquisa não teria sido possível, é claro, sem as experiências

compartilhadas com minha orientadora Professora Dra. Nilce Vieira Campos Ferreira.

Investigar a História das Mulheres na História da Educação ao lado dela foi muito especial.

Mesmo nos momentos de adversidades, ela jamais deixou de resistir e lutar pela visibilidade

das mulheres dentro de sala de aula, nas pesquisas e na vida. No momento em que mais

precisei de alguém que acreditasse em mim, foi ela quem deu o primeiro passo. Professora

Nilce, conforme aprendi com você, agora sou eu quem deseja muita luz em seus caminhos!

Obrigada por permitir que eu fizesse parte de sua história. O mestrado é curto... E você é rara!

Gostaria de deixar meus agradecimentos, também, aos mestres da graduação em

Psicologia da Universidade Federal de Rondônia. Uma admiração imensa por todos os

professores que enriqueceram o meu percurso durante a graduação com trocas valiosíssimas e

apoiaram a minha escolha pelo mestrado em Educação, e em especial, para as Professoras

Dras. Valéria Oliveira, Marli Tonatto, Vaderléia Dal Castel, Iracema Tada, ao Professor Dr.

José Carlos e ao Professor João Guilherme.

O mestrado do Programa de Pós-Graduação em Educação do Instituto de Educação

da UFMT também me proporcionou uma bela amizade. Rillyenne Kathy de Souza, obrigada

por ter sido uma das bases de segurança, por também ter sido a personificação de carinho,

flores e amizade para mim em Cuiabá. Você ensinou-me a não desistir, a lutar por aquilo que

acredito e a ser firme em minhas decisões: a não perder minha essência. Levarei sua amizade

comigo para todo o lugar, sempre. Muito obrigada por tudo!

Outro agradecimento especial é para Cleicinéia Oliveira de Souza, uma mulher que

interveio em um momento que eu precisei de alguém de confiança. Você resgatou em mim a

minha vontade de continuar na vida acadêmica, com seus pedidos para que eu fosse paciente e

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tolerante para persistir firme em busca daquilo que almejo ser. Muitíssimo obrigada! Jamais

me esquecerei de você! Conte comigo sempre, “Cleici”!

Muito obrigada, Yésica Paola Montes Geles. Você também fez a diferença nos meus

dias de estudo e nas conversas distraídas da rotina do mestrado. Especialmente grata por me

lembrar os prazos! Brincadeiras a parte, quero registrar que você é muito especial para mim.

Levarei comigo um carinho e amizade imensos pelos momentos compartilhados no Centro

Memória Viva e em outros momentos fora dele, “mana”!!

No meio do caminho deparamo-nos com um contratempo daqueles que nos tira um

pouco o ar... Que nos leva embora alguns dias de sol e nos deixa na companhia do luto. Ana

Heloiza foi uma das mulheres que participou de alguns dos meus dias de luta em 2015,

enquanto eu passava por uma situação delicada. Hoje, ela é luz e exemplo de luta e

resistência. Obrigada, Ana!

A todo o grupo do Centro Memória Viva também quero deixar meus sinceros

agradecimentos. Todas as mulheres que por lá passaram, compartilharam vidas e contribuíram

de alguma forma para todo o meu aprendizado no grupo, a todas minha gratidão e carinho!

Thaís Marques, Daniella Fialho, Vitória Hung, Natália Damascena, Letícias, Bruna, Rafaely

Alves, Thayla, Tatiane Dragoni, Gleici Elly, Viviane, Thaís Carlos, Carla Sereno, Sandras,

Keila e Marcela Gattas.

Dos amigos que compõe toda a organização do Programa de Pós-Graduação em

Educação do Instituto de Educação, essa pessoa merece um olhar especial também: Luísa. Ela

cuida das/dos alunas/alunos que ingressam no PPGE como quem cuida de suas/seus

filhas/filhos. Obrigada pela atenção e carinho!

Às Professoras Dras. Suely Dulce de Castilho, Sandra Cristina Fagundes e Maria das

Graças Martins da Silva, e Professor Dr. Josemir Almeida Barros, muito obrigada pelo aceite

em compor a Banca Examinadora, pelas contribuições ao texto e pela disposição em avaliar a

pesquisa.

Agradeço, agora, ao amor. Caminhar sozinhos nos ensina a caminhar mais fortes,

mas caminhar de mãos dadas com alguém nos ensina a ir além. O gosto de chegar até aqui

sempre na presença do seu amor, cuidado e atenção tem outro sabor. Luan Palla, obrigada por

me ensinar que não é preciso estar perto para estar junto. Todos foram essenciais nessa

trajetória, mas você também foi o diferencial.

Rita Clara, ou Ritinha (como gosta de ser chamada), também teve sua participação

neste trabalho. Como a brilhante historiadora que é, ajudou-me na construção da história de

Porto Velho com uma recepção acolhedora em sua casa. Obrigada por, desde os primeiros

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anos de escola, continuar fazendo parte de minha vida, Ritinha! Kelvin Ribeiro foi outra

pessoa que aceitou fazer parte dessa experiência. Um bom amigo que nos auxiliou nas

elaborações de alguns mapas que compõem essa dissertação.

A partir daqui, deixo um caloroso abraço para aqueles quem escolhi (e quem me

escolheram) para caminhar lado-a-lado: minhas ótimas amigas e meus maravilhosos amigos.

Luciano Henrique, Pricila Fernandes, Maurício Castro, Raila Myrria, Caroline Costa e Ivan

Nascimento. Vocês, mesmo longe, sempre se fizeram presente em minha rotina. Ajudaram-

me a administrar a saudade, e nunca se esqueceram da história e trajetória de nossa amizade.

Sempre ponderando os momentos de dificuldades como tempo para mudar e de mudanças. Os

melhores amigos-terapeutas que alguém pode ter! Amo muito vocês, irmãos!

Herta Maria, Melissa Barbosa, Amanda Norbiatto, Eder Rodrigues, Aline Monteiro,

Isabela Mesquita, Ariadne Telles, às minhas gêmeas favoritas Luana e Tauana Souza, Lígia

Sasso, Amanda Gava, Caroline Spinet, Thalita Bancalari, Fernanda Carvalho, Marcel

Rodrigues, Lorran Rodrigues, Rafael Foro, Mychel Oliveira, William Manerich, Maria Luísa

Teodoro, Lusiane Gomes e Rachel Midori: vocês sempre pacientes, sempre me apoiaram com

palavras acolhedoras e, mais do que eu mesma, confiaram no dia de mais essa conquista.

Vocês também são raros, minhas queridas e meus queridos! Amo muito vocês!

Reservo esse momento para agradecer, especialmente, ao Fabrício Ricardo Lopes.

Não encontrei definição melhor para representá-lo do que “Guia de Luz”! Você foi quem deu

o ponta pé inicial para mais esse capítulo de minha existência. Por toda a fé que sempre teve

em meu potencial, muito obrigada, meu amigo! Desejo um dia dar de volta todo o calor que a

sua amizade envolveu meu coração durante todo esse tempo. Sou muito grata por você ter

permitido compartilhar a sua existência nessa vida comigo. Amo-te!

Aos que cuidaram de mim e me acolheram. Uns como amiga, outros, como um

integrante da família: Vanessa Tarouco, João Pedro, Geovana Portela, Fábio Queiroz, Denise

França, Bruno Justino, Everton Lopes, Aila Serpa, Flávio Alves, Felipe Matheus, Matheus

Bobrim, Alana Chico, Rafael, Thaís Priscilla, Tainara Dieckman, Laís Maia, Luana, Kellen

Silva, Lélica Elis, Juliane Queiroz e Márcia Isabella. Obrigada, amigas e amigos por não

medirem esforços para fazer com que eu me sentisse sempre em casa. Vocês foram (e são)

incríveis!

Uma mulher, em especial, merece um parágrafo de agradecimentos só para ela

também. Obrigada, Meire. Agradeço por ter me apresentado um mundo de amor. O amor de

nossa amizade me mudou. Mudou minhas vivências. Tenho comigo a certeza de que você foi

toda a base de solidariedade, amor, atenção e compaixão que algo ou alguém no mundo pode

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ser. Pode dar. Ensinou-me a respeitar incondicionalmente, o que, conforme diz uma música de

Caetano, me faz afirmar que sua amizade foi “uma beleza que me aconteceu”. Do fundo do

meu coração, espero um dia retribuir tudo o que você representa para mim. Muito grata por

tudo! Pela espontaneidade, carinho, cuidado, verdade. Um abraço e muito carinho ao seu pai,

“seu Wandê”. Também um ótimo amigo durante todo esse tempo! “...mas ela ao mesmo

tempo diz que tudo vai mudar, porque ela vai ser o que quis, inventando um lugar onde a

gente e a natureza feliz vivam sempre em comunhão, e a tigresa possa mais do que o leão.”

Às funcionárias e aos funcionários dos arquivos que pesquisamos. Inicio

agradecendo às queridas Maria do Socorro (Secretária), Maria Tomázia (Orientadora

Educacional), Carmem Meireles (Bibliotecária), Irmã Cláudia Soraya (Diretora Financeira),

Crislaine Fernandes (Supervisora), Walbertina Santos (Recepcionista) e ao querido Raimundo

Arruda (Coordenador de disciplina), pessoas que me receberam de braços abertos e não

mediram esforços para me ajudar no Instituto Maria Auxiliadora, nosso lócus de pesquisa.

Às funcionárias e aos funcionários do Palácio da Memória Rondoniense: Ednair

Nascimento, Damaris Ramos, Alyne Rufino, Victor Langman, Suzana dos Satos, Augusto

Gomes, Luiz Brito, Elias Alves, Priscila Medeiros, Sara Ramos e Marinete Ramos.

Agradeço imensamente, também, à funcionária e aos funcionários do INEP/Brasília:

Welinton Ferreiro Santos (Arquivo histórico INEP), Leonardo Ruas Correia (Arquivista –

Arquivo Histórico INEP), Luiza Maria Souza do Amaral (Bibliotecária – CIBEC – INEP),

Adenilson Felix (Bibliotecário – CIBEC – INEP) e Rafael Lima Meireles de Queiroz

(Referência – CIBEC – INEP). Já, no IBGE/Brasília: Fernandez Kenji Iazawa (Bibliotecário

IBGE/DF). No Conselho Nacional de Educação/Brasília: Josélia Alves Costa (SAT – Serviço

de Auxílio Técnico, Serviço de Editoração e documentação CED – Biblioteca do CNE) e

Vitória Dione Carvalho Pereira (CAC – Coordenação de apoio ao Colegiado). No Ministério

da Agricultura e Pecuária e Abastecimento/Brasília: Maria Olimpio das Neves Silva (Agente

administrativo da BINAGRI – Biblioteca Nacional da Agricultura).

Por fim, às fontes, aos livros apreciados. Ao mundo acadêmico que sempre me

recebeu com livros abertos!

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O trabalho de construção simbólica não se reduz a uma operação

estritamente performativa de nominação que oriente e estruture as

representações, a começar pelas representações do corpo (o que ainda não é

nada); ele se completa e se realiza em uma transformação profunda e

duradoura dos corpos (e dos cérebros), isto é, em um trabalho e por um

trabalho de construção prática, que impõe uma definição diferencial dos usos

legítimos do corpo, sobretudo os sexuais, e tende a excluir do universo do

pensável e do factível tudo que caracteriza pertencer ao outro gênero – e em

particular todas as virtualidades biologicamente inscritas no “perverso

polimorfo” que, se dermos crédito a Freud, toda criança é – para produzir

este artefato social que é um homem viril ou uma mulher feminina. [...]

(BOURDIEU, 2012, p. 33).

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RESUMO

Analisamos o percurso de criação e implantação da Escola Normal Rural Nossa Senhora

Auxiliadora – ENRA, que teve sua origem nos anos de 1930, como Escola Paroquial e a partir

de 1937 até 1946, passou a oferecer o curso de formação para professoras normalistas rurais,

com objetivo principal de investigar como a instituição educou as moças porto-velhenses. A

partir daí analisamos, portanto, os cursos de formação oferecidos pela ENRA em Porto Velho

focalizando o Curso Normal Rural, oferecido na instituição a partir de 1937 até 1946.

Procuramos compor um registro histórico da trajetória dessa instituição educativa

compreendendo como se dava a escolarização das alunas e a formação de professoras

primárias na ENRA. Temos como fontes livros de atas e matrículas, livros de promoções,

termos de visitas coletados no acervo da instituição escolar, imprensa e outros documentos

encontrados nos arquivos públicos de Mato Grosso e de Porto Velho. Metodologicamente,

fundamentamo-nos em Peter Burke (1992), Marc Bloch (2002), Michel De Certeau (1982),

Carlo Ginzburg (1989) entre outros autores que adotaram os pressupostos da História Nova,

segundo os quais a análise dos documentos deixou de representar fontes que por si só

pudessem ser consideradas verdadeiras ou que definiam o passado como um acontecimento

rígido, que não poderia ser alterado. Corroborando a concepção desses autores, Carlos

Bacellar (2008) contribuiu para o entendimento de que os documentos coletados devem ser

analisados em seus detalhes, pois a história não deve ser vista só a partir do todo, mas também

dos detalhes, dos acontecimentos e modo de ver de cada sujeito histórico. No que se refere ao

estudo da História das Mulheres e escolarização feminina, Guacira Lopes Louro (1997; 2010),

Jane Soares de Almeida (1998; 2007) e Michelle Perrot (2007) foram imprescindíveis para

compreendermos a educação e formação imposta e apreendida pelas mulheres. As obras de

Ester Buffa e Paolo Nosella (1996; 2009) e Justino Pereira de Magalhães (2004) trouxeram

contributos para compreendermos a história das instituições educativas e nos ajudaram a

definir as nossas categorias de análises. As categorias de análise das quais nos munimos

foram: os cursos, as professoras e as normas da escola, nas quais buscamos analisar a

concepção de educação adotada e praticada para a educação de mulheres normalistas rurais na

Instituição. Uma educação que apreendemos, durante muito tempo, foi negada às mulheres.

Quando finalmente elas adentraram as instituições educativas, a educação feminina marcou-se

pelo controle austero em nome de uma suposta moralidade religiosa e cristã. Os resultados

apontaram evidências de que a instituição era conduzida sob os dogmas da sólida identidade

confessional católica preconizada pelas normas impostas por Dom Bosco, marcadas pela

submissão e aceitação das crenças salesianas. As Filhas de Maria Auxiliadora uniram-se aos

dirigentes, que buscavam proporcionar educação formal e controlada para suas filhas, e à

população de Porto Velho, que queria educar filhas e filhos. A instituição alcançou seus

objetivos educando uma geração de mulheres sob os dogmas do catolicismo que por sua vez

influenciaram outras gerações, em um local distante, negligenciado pelos seus governantes.

Rapidamente a escola tornou-se o Instituto Maria Auxiliadora, ainda hoje ofertando dos

primeiros níveis de educação até os últimos anos do ensino médio para uma abastada classe

social porto-velhense.

Palavras-chave: Curso Normal Rural; História das Mulheres; Colégio Salesiano; Educação

Católica; Igreja e educação feminina.

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ABSTRACT

We analyzed the course of creation and implantation of the Escola Normal Rural Nossa

Senhora Auxiliadora - ENRA, that originated in the years of 1930, like Escola Paroquial and

from 1937 until 1946, began to offer the training course for rural normal teachers, with main

objective of investigating how the institution educated the Porto Velho girls. From there, we

analyzed the training courses offered by ENRA in Porto Velho focusing on the Normal Rural

Course offered at the institution from 1937 to 1946. We tried to compose a historical record of

the trajectory of this educational institution, understanding how the schooling of the students

was given and the formation of primary teachers in the ENRA. We have as sources books of

ata and registrations, books of promotions, terms of visits collected in the collection of the

school institution, press and other documents found in the public archives of Mato Grosso and

Porto Velho. Methodologically, we are based on Peter Burke (1992), Marc Bloch (2002),

Michel De Certeau (1982), Carlo Ginzburg (1989) among other authors, who adopted the

New History assumptions, to represent sources that could by themselves be considered true or

that defined the past as a rigid event that couldn’t be changed. Corroborating the conception

of these authors, Carlos Bacellar (2008) contributed to the understanding that the documents

collected should be analyzed in detail, because the history shouldn’t be seen only from the

whole, but also from the details, events and way of view of each historical subject. As for the

study of Women's History and women's schooling, Guacira Lopes Louro (1997; 2010), Jane

Soares de Almeida (1998; 2007) and Michelle Perrot (2007) were essential to understand the

education and training imposed and apprehended by women. The studies of Ester Buffa and

Paolo Nosella (1996; 2009) and Justino Pereira de Magalhães (2004) brought contributions to

understand the history of educational institutions and helped us to define our categories of

analysis. The categories of analysis defined were: the courses, the teachers and the rules of the

school, in which we seek to analyze the conception of education adopted and practiced for the

education of normal rural women in the Institution. An education we have learned for a long

time has been denied to women. When they finally entered educational institutions, female

education was marked by austere control in the name of a supposed religious and christian

morality. The results showed evidence that the institution was conducted under the dogmas of

the solid catholic confessional identity advocated by the norms imposed by Don Bosco,

marked by the submission and acceptance of the Salesian beliefs. The Filhas de Maria

Auxiliadora joined the leaders, who to provide formal and controlled education for their

daughters, and the people of Porto Velho, who wanted to educate daughters and sons. The

institution achieved its goals by educating a generation of women from the dogmas of

catholicism that influenced other generations, in a distant place, neglected by its rulers. The

school quickly became the Instituto Maria Auxiliadora, still offering the first levels of

education until the last years of high school to a wealthy Porto Velho social class.

Keywords: Normal Rural Course; Women’s History; Salesian School; Catholic Education;

Church and women’s education.

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LISTA DE ABREVIATURAS

CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoa de Nível Superior

CMV Centro Memória Viva

CNPq Conselho Nacional de Pesquisa

D. Dom

ENR Escolas Normais Rurais

ENRA Escola Normal Rural Nossa Senhora Auxiliadora

FMA Filhas de Maria Auxiliadora

FUNAI Fundação Nacional do Índio

GEM Grupo de Pesquisa Educação e Memória

IE Instituto de Educação

IMA Instituto Maria Auxiliadora

Ir. Irmã

LDB Lei de Diretrizes e Bases

Pe. Padre

PPGE Programa de Pós-Graduação em Educação

Revd. Reverendo

Revdmo. Reverendíssimo

RSE Rede Salesiana de Escolas

S. São (de Santo)

UFMT Universidade Federal de Mato Grosso

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1. Mapa da localização de aldeias indígenas Xavante e Bororo, 2010 35

Figura 2. Mapa do percurso de construção da Estrada de Ferro Madeira-

Mamoré, 1909

48

Figura 3. Planta da cidade de Porto Velho, 1912 50

Figura 4. Mapa dos estados do Amazonas, Acre, Mato Grosso e Pará, 1915 53

Figura 5. Planta de Porto Velho em 1925 56

Figura 6. Mapa do Brasil em 1943 59

Figura 7. Carta de Aforamento da Intendência Municipal, 1916 61

Figura 8. Termo de Transferência, 1934 63

Figura 9. Mapa das localidades sob jurisdição da Prelazia de Porto Velho 64

Figura 10. Fachada do Instituto Maria Auxiliadora, 1935 91

Figura 11. Área que dá acesso ao salão do Auditório/ Vista de frente e fundo

do Auditório

93

Figura 12. Formandas da primeira turma de professoras normalistas da

ENRA

119

Figura 13. Diploma de alunas da Escola Normal Rural Nossa Senhora

Auxiliadora, 1946

136

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1. Quadro demonstrativo do Pessoal Indígena por sexo 40

Quadro 2. Nomes da Instituição e Cursos 82

Quadro 3. Livro de Matrícula, 1932 100

Quadro 4. Matrículas no período de 1930 a 1935 dos Cursos Preliminar e

Elementar

103

Quadro 5. Disposição e denominações dos anos e séries dos Cursos

Preliminar e Elementar

104

Quadro 6. Concluintes no período de 1930 a 1935 dos Cursos Preliminar e

Elementar

104

Quadro 7. Situação de matrículas no período de 1937 a 1946 do Curso

Normal da ENRA

116

Quadro 8. Quadro de diretoras e professoras que trabalharam na Escola

Normal Rural Nossa Senhora Auxiliadora (1940-1945)

120

Quadro 9. Cursos da Escola Normal Rural Nossa Senhora Auxiliadora (1937-

1946)

126

Quadro 10. Disciplinas do Curso Normal Rural (1937 – 1941) 128

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 18

CAPÍTULO I – AS FILHAS DE MARIA AUXILIADORA RUMO A

PORTO VELHO

28

1.1 O contexto sociopolítico de Porto Velho 45

1.2 A prelazia de Porto Velho 60

1.3 As Filhas de Maria Auxiliadora aportam em Porto Velho: revendo o percurso 68

CAPÍTULO II – SEMEANDO VALORES: A OBRA DAS FILHAS DE

MARIA AUXILIADORA EM PORTO VELHO

75

2.1 A instituição educativa: fundação e origens 78

2.2 Escola Paroquial (1930-1935) 97

CAPÍTULO III – ESCOLA NORMAL RURAL NOSSA SENHOR

AUXILIADORA EM PORTO VELHO: A ESCOLARIZAÇÃO FEMININA

NA ENRA

107

3.1 Professoras e alunas da Escola Normal Rural Nossa Senhora Auxiliadora 115

3.2 As Orientações da Instituição: normas, disciplinas, regras 124

CONSIDERAÇÕES

140

REFERÊNCIAS 144

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18

INTRODUÇÃO

A temática que abordamos compõe um percurso da educação feminina e

formação destinada à formação de professoras normalistas rurais na Escola Normal

Rural Nossa Senhora Auxiliadora, doravante denominada ENRA, no período de 1937 a

1946.

Rememorando o caminho percorrido na vida acadêmica, ao adentrar o

mestrado, o encontro com novas abordagens de estudo, a formação de novos laços

sociais e vivências no Programa de Pós-Graduação PPGE/UFMT-Cuiabá, em Mato

Grosso, um estado desconhecido até então, significou “sair da zona de conforto”

literalmente.

Devido à graduação em Psicologia, esse deslocar-se denotou uma cotidiana

transformação pessoal, uma busca incessante para ampliar conhecimentos. A graduação

em Psicologia abriu portas para análises que permitiram a compreensão da dominação

patriarcal que sobrevive em nossa sociedade. Proporcionou, ainda, a reflexão a respeito

de políticas públicas curriculares de formação de professores em exercício em salas de

aula frente a questões como gênero, raça, condições sexuais e sociais vivenciadas pelas

pessoas. Projetos e pesquisas dos quais partilhei voltavam-se para a militância a favor

das minorias, isto é, para pessoas com deficiência, brasileiros afrodescendentes,

mulheres e população LGBT, entre tantas outras que abordavam temáticas afins.

O ingresso no mestrado em Educação no PPGE/UFMT-Cuiabá foi com o

projeto “A representação social dos haitianos em Cuiabá/MT”. Entretanto, esse projeto

não se mostrou o melhor caminho. O conhecimento das pesquisas e projetos de

extensão desenvolvidos no âmbito Centro Memória Viva de Mato Grosso, o CMV, no

qual eram abordadas pesquisas relacionadas à Educação Feminina, mudou meu foco.

Mudando o objeto da pesquisa, minha orientadora e eu “nos sentimos em

casa”: encontramo-nos em um lugar composto por mulheres às quais levam em suas

histórias de vida momentos de sensibilização referentes às relações estabelecidas entre

os gêneros. Mulheres que lutaram e resistem lutando todos os dias para desconstruir a

intensa existência da dominação patriarcal que, infelizmente, domina e, muitas vezes,

adoece nossa cultura.

O aporte na literatura da área trouxe a percepção de que há inúmeras diferenças

na formação ofertada para as mulheres ao longo da história, o que alterou

historicamente o empoderamento social dos homens frente ao das mulheres.

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A partir daí, enveredamos pelos caminhos da História da Educação Feminina,

questionando: Como a educação das moças se deu em Porto Velho, no âmbito de uma

instituição de ensino salesiana, no recorte de tempo de 1930 a 1946, em especial nos

anos de 1937 a 1946, tendo em vista que foi esse o período no qual a escola se voltou

para a formação de professoras normalistas rurais?

Na presente investigação, direcionamos nosso olhar para os estudos da História

Nova, apoiando-nos na concepção de Fernand Braudel (1978, p. 95), que assinalou que,

atualmente, estudar história “não é escolher entre rotas e pontos de vistas diferentes,

mas aceitar, adicionar essas definições sucessivas nas quais se tentou em vão, encerrá-

las”. Isto é, a história que ficou no passado, que já aconteceu, não pode se dar por

encerrada, haja vista que a “história é filha de seu tempo”, jamais cessou em suas

mudanças, uma vez que depende de condições sociais concretas (BRAUDEL, 1978, p.

17).

Tivemos como objetivo geral investigar como se deu a formação de

professoras na ENRA, em Porto Velho, nos anos de 1930 a 1946. Os objetivos

específicos foram: i) analisar a instituição educativa do ponto de vista histórico, no

sentido de examinar o processo de criação, organização e consolidação em Porto

Velho/Rondônia; ii) descrever e analisar, a partir das fontes documentais encontradas,

como se dava a escolarização das alunas na ENRA, considerando essa formação a partir

dos valores ideológicos, políticos e religiosos estabelecidos no ambiente educacional.

Com o questionamento em mente e a partir de nossos objetivos, foi possível

formular a seguinte hipótese: as Irmãs Salesianas de Dom Bosco Filhas de Maria

Auxiliadora tinham a função de coordenar as atividades pedagógicas da ENRA e ao

promover a formação das moças, tinham também o intuito de difundir os valores

católicos cristãos e a doutrina salesiana à comunidade na qual se inseriram em uma

região, pouco habitada no período, atraindo o olhar de famílias abastadas para

matricularem suas filhas. A partir da Proclamação da República, com o Estado

brasileiro declarando-se laico, a Igreja Católica viu-se obrigada a abrir novas frentes de

atuação. Com isso, a educação oferecida pelas Irmãs Salesianas de Dom Bosco, Filhas

de Maria Auxiliadora, para as jovens matriculadas na ENRA, visavam a formação da

professora rural, educadora missionária, a partir dos ensinamentos salesianos, a

população porto-velhense, doutrinando as filhas de famílias abastadas de Porto Velho e,

consequentemente, aumentando o prestígio da instituição salesiana.

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Munidas de nossos questionamentos, nossos objetivos e hipótese, fomos em

busca de fontes que nos permitissem uma análise da educação que a ENRA

proporcionou a meninas e moças. Desse modo, buscamos documentos do acervo da

própria escola, como por exemplo, atas, livros de matrícula, anuários, fotografias,

jornais que circulavam na época pesquisada, legislações entre outros. Também

buscamos bibliografias pertinentes ao tema pesquisado, revistas, dissertações, teses,

relatórios, sites entre outros.

Na coleta de fontes documentais, em um primeiro momento, fomos em busca

de jornais que circulavam no período em estudo na cidade Cuiabá e de Porto Velho,

livros e fotos que pudessem ser coletados no acervo da instituição de ensino pesquisada.

Michel De Certeau (1982) ressaltou que é preciso compreender o cotidiano

para a construção do embasamento necessário a um trabalho historiográfico. Segundo

esse autor, explicar o passado não significa desconsiderar o que diferencia, o que existe

e o que está presente no material analisado, ou seja, nos documentos. Desse modo, a

história não é apenas como um acontecimento ou apenas um procedimento de análise de

um texto produzido, mas sim, que a história faz parte de uma realidade da qual tratamos

e que deve ser compreendida e analisada enquanto prática, enquanto atividade humana.

Com essas concepções em mente, fomos ao Arquivo Público de Cuiabá/MT em

busca de documentos que descrevessem as Missões Salesianas, as escolas por elas

organizadas, periódicos, leis, decretos e pareceres que vigoravam à época pesquisada.

Após as primeiras idas ao Arquivo Público de Cuiabá, dirigimo-nos ao arquivo

da ENRA, na cidade de Porto Velho. Nessa instituição, encontramos fontes que nos

levaram a reestruturar os referenciais teóricos e históricos para nos permitir responder

satisfatoriamente aos questionamentos e procedermos a uma organização e seleção de

fontes secundárias e primárias para a escrita da dissertação.

Nos arquivos da escola, encontramos atas de visitas, grade curricular dos

cursos disponíveis, livros de matrículas das alunas, histórico da instituição escrito pelas

Irmãs Salesianas responsáveis pela direção da escola, registro de diplomas, ata de

promoções das alunas e algumas fotos. Essa documentação importante coletada nos

acervos da ENRA, ainda hoje administrada pelas Irmãs Salesianas, foi essencial à nossa

análise.

Também buscamos consultar leis e decretos que vigoraram no país desde a

criação da escola, em 1930, para compreendermos o contexto de fundação da escola até

os anos de 1937, quando a escola passou a se denominar Escola Normal Rural Nossa

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Senhora Auxiliadora. Delimitamos o período da pesquisa até o ano de 1946, quando a

escola mudou sua denominação e foco de ensino. Outros lugares aos quais fomos em

busca de fontes, principalmente leis, decretos e regimentos para funcionamento e

financiamento da educação no país no período em estudo, foram Instituto Nacional de

Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP, Conselho Nacional de

Educação – CNE, ambos em Brasília, bem como ao IBGE/Distrito Federal.

Na medida em que procedíamos à seleção de documentos considerados

pertinentes para a pesquisa, fomos também selecionando obras que nos permitissem

avançar em nossas leituras e escrita.

Nesse percurso de coleta de fontes, apoiamo-nos nas obras de Peter Burke

(1992), Jacques Le Goff (1990) e Marc Bloch (2002) que adotaram os princípios da

Nova História, ou seja, da “história escrita como uma reação deliberada contra o

‘paradigma’ tradicional”, ou seja, investigamos uma história que foge da “visão do

senso comum da história” (BURKE, 1992, p. 10).

Burke (1992) assinalou que houve um aumento na última geração de

historiadores, o qual acabou desencadeando o surgimento da Nova História. Essa nova

forma de se fazer história voltou-se para a escrita da atividade humana. Considerando

nosso objeto de estudo e aproximando-nos do que foi dito por Burke, voltamo-nos para

os estudos da História das Mulheres que impactou a escrita da história, principalmente,

a partir da terceira geração dos Annales com estudos iniciados por Michelle Perrot, pois,

das três gerações da Escola dos Annales, esta geração foi a primeira que incluiu,

sobretudo, o estudo de mulheres.

Michele Perrot (2006) escreveu sobre a história do trabalho e a história da

mulher. A autora, em especial na obra Os Excluídos da História, tratou de evidenciar

atores que estiveram sempre alheios à historiografia e, dessa forma, ampliou os estudos

a respeito das mulheres, pois estas, durante muito tempo, estiveram à margem dos

relatos e acontecimentos. Assim, a autora buscou romper com o silêncio historiográfico

a respeito das mulheres.

No que concerne à análise dos documentos, Certeau (1982, p. 33) mencionou

que por mais que a “leitura do passado” ofereça um conhecimento limitado àquilo que

está escrito no documento, esse conhecimento, essa leitura sempre será dirigida pelo

presente, isto é, embora falemos do passado, nosso ponto de vista é marcado pelo nosso

presente, pelos nossos estudos, pelas nossas leituras.

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No que se refere à abordagem do assunto, Maria Cecília de Souza Minayo

(2001) nos auxiliou ao caracterizar essa forma de análise como qualitativa, pois

“trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e

atitudes” (MINAYO, 2001, pp. 21-22).

Segundo Minayo (2010), na análise de dados podemos nos utilizar da

triangulação de dados, abrangendo diferentes possibilidades de interpretação, dentre

elas, ponderamos aspectos externos, além dos internos, o que nos possibilita

“combinação e cruzamento de múltiplos pontos de vista”, a análise do “contexto, da

história, das relações, das representações [...], visão de vários informantes e o emprego

de uma variedade de técnicas de coleta de dados que acompanha o trabalho de

investigação” (MINAYO, 2010, pp. 28- 29).

Para narrar a história da instituição, objeto de nossa pesquisa, recorremos a

Ester Buffa e Paolo Nosella (2009) que destacaram questões fundamentais no estudo

das instituições escolares e seus processos de formação. Para esses autores, o estudo das

instituições pode possibilitar “melhor compreensão em educação brasileira e, assim,

talvez, contribuir para sua transformação” (BUFFA; NOSELLA, 2009, p. 23).

Décio Gatti Júnior (2000) salientou que a História das Instituições

Educacionais deve considerar os vários atores envolvidos no processo educativo, pois é

preciso investigar o que se passa no interior das escolas, o que nos permite gerar um

conhecimento mais aprofundado desses espaços sociais destinados aos processos de

ensino e de aprendizagem.

Justino Pereira de Magalhães (2004) afirmou que a escola enquanto objeto

historiográfico permite evidenciar a educação como uma construção histórica, o que nos

possibilita identificar e analisar um objeto de pesquisa em um marco teórico

interdisciplinar em uma hermenêutica cruzada entre memórias, arquivos e museus. Esse

autor assevera que ao pesquisar a história de uma instituição é preciso identificar a

“relação entre culturas gerais e locais, sua simbolização, instrucionalização,

normatização, transmissão; quadros, normas e atitudes no plano social, [...];

ação/práticas didático-pedagógicas, representação, apropriação” (MAGALHÃES, 2004,

p. 119). Investigar a história de uma instituição escolar, portanto, implica abrir-se para

um universo de possibilidades e limitações ou, como dito por Minayo (2010), para o

emprego em nossas análises de múltiplas técnicas de análise dos dados.

Na coleta dos documentos religiosos no acervo da ENRA, encontramos os

primeiros obstáculos. Carlos Bacellar (2008, p. 39) descreveu que, no Brasil, os

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documentos de natureza religiosa apesar de serem em grande número, não são de fácil

acesso. São arquivos que estão reunidos nas cúrias diocesanas sob “cuidados precários”

e “desconfortável”. A instituição investigada também se trata de uma instituição

confessional particular, o que nos leva a aquiescer com o mesmo autor quando

mencionou que “no Brasil não há uma prática corriqueira de preservação documental

privada, e as notícias de destruição de importantes conjuntos documentais infelizmente

não são raras” (BACELLAR, 2008, p. 42).

Nas visitas aos arquivos públicos ou pessoais igualmente nos deparamos com

situações inquietantes. Dentre essas situações, deparamo-nos com o fato de que

instituições e pessoas que detinham importantes acervos para o avanço da pesquisa não

de dispuseram a colaborar ou disponibilizar esse acervo para que fosse possível uma

análise mais acurada. O acesso a essa documentação poderia propiciar outras

descobertas, pois, como mencionou Carlo Ginzburg (1989, p. 144), ao analisarmos uma

obra, “é necessário examinar os pormenores”, isto é, fazer uma análise detalhada,

minuciosa. Ainda assim, essa não foi das maiores limitações encontradas.

Outro problema emergiu quando constatamos o estado de conservação dos

documentos a que tivemos acesso no acervo da instituição em estudo. No pouco que nos

foi permitido ver, percebemos que a documentação carece de adequados cuidados

visando a sua preservação, fato que nos chamou atenção na obra organizada por Maria

do Pilar de Araújo Vieira et al. (1989), cujos autores abordaram a importância da

preservação desses registros. Segundo os autores, com o incremento de “novas

linguagens e, portanto, a novas formas de registro” (VIEIRA et. al., 1989, p. 28), passou

a ser possível pensar a forma de como preservar a documentação ainda existente nas

instituições.

Mesmo com as dificuldades enfrentadas, coletamos relatórios, livros de

matrículas, atas e livros de arguições, publicações no Jornal Alto Madeira, fotografias e

mapas coletados em arquivos públicos de Cuiabá e Porto Velho.

Com as fontes em mãos, fomos compondo a memória da instituição, apoiando-

nos na concepção de Le Goff, na certeza de que “memória, onde cresce a história, que

por sua vez a alimenta, procura salvar o passado para servir o presente e o futuro” (LE

GOFF, 1990, p. 477). Ou, como dito por Lucien Febvre (1989), que nos ajudou a pensar

sobre o sentido, caminho, marcos e representações de nosso estudo histórico,

ressaltando que é preciso estar disposto a aprofundar no movimento de nosso tempo

para adentrarmos na história.

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Vera Teresa Valdemarin (2010), ao tratarem da construção contínua de um

objeto de pesquisa, destacaram que no delinear da construção desse objeto há a

emergência de sua permanente elaboração, pois, ao nos deparamos com as fontes

encontradas e com a abordagem que, de antemão, nos dispomos a utilizar, a

investigação tomou corpo, se constituindo, visto que o passado não é uma realidade fixa

e imutável; ele sofre influências do presente e contribui para o entendimento daquilo

que almejamos analisar e compreender no tempo presente.

Na análise dos documentos que tivemos acesso, fomos nos aproximando dos

objetivos propostos, entretanto, devido à dificuldade ou impossibilidade de acesso a

outras fontes como, por exemplo, os regimentos da instituição no período em estudo ou

os materiais didáticos utilizados, restringimos nossas pesquisas às seguintes categorias

de análise: os cursos, as professoras e o currículo da escola.

A respeito da história da educação das moças, ponderamos que, conforme os

estudos de Jane Soares de Almeida (2007), no Brasil, “a submissão pela doutrinação

religiosa era representada principalmente pela igreja que instalou o mito da mulher-

mãe-redentora, isenta de qualquer pecado”. A autora ressaltou que ideias disseminadas a

partir do positivismo e do higienismo reservaram à mulher o espaço doméstico e quando

elas fossem educadas deveriam adotar o papel de “redentora da família e da pátria”, isto

é, uma mulher recatada, contida segundo os padrões europeus, cabendo a elas as

funções domésticas (ALMEIDA, 2007, p. 109).

Nessa mesma concepção, Maria Lúcia de Arruda Aranha (1996, p. 139)

destacou que o positivismo exprimia a exaltação provocada no Século XIX pelo avanço

da ciência moderna, atribuindo à ciência o poder de revolucionar o mundo com uma

tecnologia cada vez mais eficaz. O positivismo do Século XIX, a partir de Augusto

Comte, declarava a confiança do homem no conhecimento científico.

Nicanor Palhares Sá (2012) assinalou que o positivismo surgiu como um

movimento intelectual de oposição a todo o idealismo anterior. Esse autor ressaltou que

surgia, assim, uma filosofia da ordem e uma ciência baseada na objetividade e na

neutralidade científica.

Outro autor, Afonso Soares de Oliveira Sobrinho (2013, p. 213), em seus

estudos acerca da origem das medidas higienistas-disciplinadoras dos espaços nos

primórdios da República em São Paulo – Séculos XIX e XX, descreveu que naqueles

anos prevalecia a ideia de ordem e disciplina das condições de vida e do próprio

trabalho por meio da higiene pública. O médico, principalmente o médico-sanitarista, e

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o engenheiro apareceram como personagens que a elite demandava e que oferecia as

intervenções necessárias à consolidação da nova ordem higienista: ações sanitárias

foram desenvolvidas com vistas a combater epidemias, um ideal de limpeza e, ao

mesmo tempo, desejo utópico do progresso (SOBRINHO, 2013, p. 215).

Corroborando com o que Almeida (2007) relatou a respeito da educação das

moças, Maria Izilda Santos de Matos (1996) expôs que “desde muito cedo, as crianças

de famílias pobres, principalmente as meninas, eram introduzidas nos trabalhos

domésticos, cozinhando, lavando, passando e cuidando dos irmãos menores”, uma

necessidade que fazia com que, ainda na infância, as meninas fossem treinadas para o

ofício considerado tipicamente feminino (MATOS, 1996, pp. 139-140).

A partir daí, buscamos produções que tinham como objeto de estudo a temática

Escola Normal Rural, escolas confessionais femininas e seus desdobramentos. No que

concerne à temática que aborda as instituições educativas que se voltaram para a

formação de professoras normalistas rurais, algumas delas foram significativas para

nossa investigação.

Martha Maria Macêdo Bezerra (2013) defendeu sua dissertação de mestrado na

Universidade Estadual do Ceará, intitulada “De aluno a professor a formação docente de

egressos da escola normal rural de Juazeiro do Norte CE”, voltando seu olhar para a

Escola Normal Rural de Juazeiro do Norte-CE, destacando a formação docente na

instituição. A dissertação buscou compreender como as práticas e formação de

professores egressos dessa escola e os processos de (re) construção identitária

vivenciados por esses docentes foram influenciados pelas mudanças ocorridas na

educação no final do Século XX. O percurso percorrido pela autora para realizar sua

investigação, consistiu em associar um conjunto de técnicas de análise, com abordagem

qualitativa a partir das narrativas dos docentes egressos da Escola Normal Rural de

Juazeiro do Norte. Levantamento bibliográfico e análise documental também foram

instrumentos cruciais para a preparação do homem do campo, objetivando desenvolvê-

lo e integrá-lo ao meio onde vivia.

Quitéria Lúcia Ferreira de Alencar Ribeiro (2015), em sua dissertação de

Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de

Educação da Universidade Federal do Ceará, recuperou a história do antigo Museu

Vilas Nova Portugal e, para isso, precisou voltar seus estudos para a criação da primeira

escola normal rural do Brasil, a Escola Normal Rural de Juazeiro do Norte. A autora

também tratou da criação e existência da Sala de Memória Amália Xavier de Oliveira,

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inaugurada em 2008 e que, atualmente, encontra-se com suas atividades paralisadas

devido à falta de incentivo político para a sua preservação. Com essa pesquisa,

intitulada “Escola Normal Rural de Juazeiro do Norte: do Museu Vilas Nova Portugal à

Sala de Memória Amália Xavier de Oliveira”, a autora buscou reconstruir a história dos

dois museus, interpretando e analisando as entrevistas realizadas e documentos

encontrados, voltando-se para a história de criação da escola, sua instalação e

manutenção.

Pascoal de Aguiar Gomes (2007), em sua dissertação de mestrado, mencionou

a existência da instituição de ensino da presente pesquisa, a ENRA. Nesse estudo,

Gomes (2007) defendeu sua dissertação na Universidade Federal de Mato Grosso, com

o título “A Educação Escolar no Território Federal do Guaporé (1943-1956)”. O

pesquisador analisou a implantação, organização e desenvolvimento da educação

escolar no atual estado de Rondônia e descreveu as escolas que oferecem ensino

secundário no recorte de tempo selecionado pelo autor. A investigação baseou-se na

análise de documentos coletados no Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP),

de fotos, de dados estatísticos para compreender o processo de organização escolar.

Em Campo Grande, a dissertação de Fernanda Ros Ortiz (2014), defendida no

Programa de Pós-Graduação em Educação, no Centro de Ciências Humanas e Sociais,

da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, destacou-se, apesar de não se tratar de

uma escola normal rural, essa instituição, bem como a ENRA, é uma instituição com

influência Salesiana de ensino e, também, fundada pelas Filhas de Maria Auxiliadora.

Ortiz investigou e analisou práticas escolares, culturais e sociais empreendidas pela

Escola Normal Nossa Senhora Auxiliadora, no período de 1946 a 1961, destacando a

divergência existente nas práticas educativas para as mulheres comparadas às práticas

educativas ofertadas para os homens. A autora analisou bancos de dados a partir de

palavras-chave que tratavam do tema, revisão de literatura e aprofundamento teórico,

documentos encontrados no acervo da instituição pesquisada e as legislações

concernentes ao período do estudo.

Dessa maneira, reiteramos a importância da temática de nossa investigação

voltar-se para o reconhecimento da história de uma instituição de ensino,

especificamente ao tratar da influência de instituições religiosas na formação de

professoras e para a educação brasileira como um todo.

Organizamos nossa narrativa em três capítulos. No primeiro capítulo, expomos

a trajetória histórica que os Salesianos de Dom Bosco e as Filhas de Maria Auxiliadora

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realizaram até aportarem em Porto Velho e situamos o objeto de estudo abordando o

contexto sociopolítico da cidade de Porto Velho. Apresentamos as leis de constituição

da cidade e os movimentos que ocorreram no início do Século XX e que contribuíram

para a atração de um grande número de migrantes para Rondônia. Abordamos o

momento de constituição da Prelazia1 de Porto Velho, uma divisão com fins

eclesiásticos da Igreja Católica criada durante o pontificado do Papa Pio XI2.

Procuramos rever o percurso do contexto sociopolítico brasileiro no momento de

chegada das FMA em Porto Velho, expondo um breve relato das atividades das irmãs

salesianas na região.

No segundo capítulo, apresentamos o modelo de escolarização da ENRA desde

a sua fundação em 1930 até os anos de 1937, remetendo-nos ao contexto local, regional

e nacional, analisando as legislações e o aporte teórico pertinente referente à História da

Educação, em específico, da história da educação feminina, estabelecendo as relações

com o modelo salesiano de ensino adotado.

Por fim, no terceiro capítulo expomos saberes e currículos escolares adotados

pela ENRA e abordamos a formação normal rural, descrevendo o percurso da

instituição entre os anos de 1937 a 1946 quando ela se tornou Escola Normal Rural

Nossa Senhora Auxiliadora.

1Prelazia: S. f. 1 Cargo ou dignidade de prelado ou prelada 2 jurisdição do prelado ou prelada 3 tempo

durante o qual o prelado ou a prelada exerce o cargo 4 DIOCESE (‘divisão territorial’). (HOUAISS;

VILLAR, 2009, p. 1542)

Prelado: S. m. 1 título honorífico de alguns dignitários eclesiásticos (como, p.ex., bispos, abades,

provinciais etc). [...] 3 oficial da residência do papa, que está autorizado a vestir hábito roxo.

(HOUAISS; VILLAR, 2009, p. 1542) 2Papa Pio XI (1857-1939) tornou-se papa em 2 de fevereiro de 1922 permanecendo no cargo até 1939,

ano de sua morte. O Papa Pio XI escolheu a paz como lema de seu pontificado, acreditando a Igreja

Católica, viver um momento de paz religiosa. Disponível em: <http://w2.vatican.va/content/pius-

xi/it/biography/documents/hf_p-xi_bio_20070330_biography.html> Acesso em: 1 de abril de 2017.

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CAPÍTULO I

AS FILHAS DE MARIA AUXILIADORA RUMO A PORTO VELHO

A história não deve apenas confortar; deve

apresentar um desafio, e uma compreensão

que ajude no sentido de mudança.

(THOMPSON, 1992, p. 43).

Neste capítulo, buscamos enfatizar o percurso que as Filhas de Maria

Auxiliadora percorreram até aportarem em Porto Velho. Para isso, foi necessário

destacar as origens da Família Salesiana, a formação da Congregação Salesiana e o

início da Associação das Filhas de Imaculada, que se tornaram as Filhas de Maria

Auxiliadora, as FMA, de modo a analisar fundamentos, ideais e o público que

buscavam alcançar.

A epígrafe com a qual iniciamos o capítulo nos leva a pensar que nossa

pesquisa nos auxilia na compreensão da história da educação feminina brasileira. Ao

investigarmos a educação que foi oferecida às mulheres na ENRA, encontramos uma

afirmação de June Edith Haner (1981, p. 14), a qual destacou que na medida em que as

atividades dos homens se diferenciavam daquelas atribuídas às mulheres, as atividades

femininas foram consideradas “sem significação e até indignas de menção”.

Com essa concepção em mente, visualizando em nossas leituras os conflitos e

desigualdades internas ao próprio “sistema educacional brasileiro”, compreendemos que

isso acabou por articular uma produção e sustentação de desigualdades de formação e

escolarização oferecida a homens e mulheres.

A ENRA, na cidade de Porto Velho, em Rondônia, foi fundada pelas Filhas de

Maria Auxiliadora. Elas iniciaram seus trabalhos na cidade em 1930 (IMA, 2000). A

fundação da instituição decorreu com a ida de padres e sacerdotes Salesianos e Irmãs

Salesianas para a região Norte.

Nessa linha de raciocínio, cabe-nos compreender o percurso que os Salesianos

de Dom Bosco fizeram até chegarem a Porto Velho, sendo necessário retornarmos à

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origem da Congregação Salesiana e da Associação das FMA, a fim de assinalar a

presença das FMA no Brasil, especialmente, em Porto Velho.

Foi em Turim, na Itália, que Dom Bosco iniciou os trabalhos salesianos, em

1859, com a fundação da Família Salesiana. D. Bosco, reunido com um grupo de

sacerdotes e irmãos, decidiu fundar uma congregação com regras definidas,

direcionadas às atividades paroquiais, apostolado, prática de caridade cristã e ensino,

inspirados na vida de São Francisco de Sales que vivera entre os anos de 1565 a 1622 de

quem se originaria o nome de salesianos e que inspiraria D. Bosco em seu humanismo

otimista e sua dedicação absoluta ao cuidado pastoral das almas. Os salesianos

acabariam por atuar em diversas obras educativas, inspirando a criação de várias outras

ramificações, contando com o apoio integral da igreja e de colaboradores leigos. Essa

visão se manteria ao longo dos anos e o Marco Referencial do Projeto Pedagógico da

Rede Salesiana de Educação de 2005 estabeleceu:

Construir um projeto de escola centrado nas relações entre pessoas

comprometidas com a transformação da realidade em que estão

inseridas, visando à contínua e indispensável formação de uma

comunidade educativa: é esse o desafio que o legado pedagógico de

Dom Bosco (1815-1888) e da Madre Mazzarello (1837-1881),

fundadores da Família Salesiana, coloca para a RSE. Desde sua

origem no Século XIX, o estilo salesiano de educar inspira-se nos

valores cristãos e pauta-se no paradigma de educar pelo amor, sob o

prisma da inclusão e da reciprocidade (DOCUMENTO DA RSE,

2005, p. 4).

Contudo, somente a partir de 1870, a Congregação foi aprovada pelo Papa Pio

XI. D. Bosco tinha a intenção de “se dedicar ao bem dos jovens necessitados”,

oferecendo valores como afeição e amor pela formação pregada nas instituições

salesianas como uma oportunidade de melhoria de suas vidas, como descrito por Afonso

de Castro (2014):

[...] Sempre se valeu de ações práticas para expressar o seu método

educativo e apresentar suas normas pedagógicas, valeu-se também da

convivência intensa com atitudes profundamente pedagógicas. De

forma clara, apareceu um conjunto de valores que sustentam a

finalidade de seu trabalho pedagógico: - o bem dos jovens com uma

finalidade sobrenatural de lutar para viver sempre na graça de Deus

(CASTRO, 2014, p. 92).

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Em Mornese, também na Itália, uma jovem, Maria Domingas Mazzarello, foi

reconhecida pelo Padre Pestarino como uma mulher predestinada às obras do Senhor

devido ao que o Padre chamou de fervor religioso e disciplina (PENTEADO, 1996, p.

17).

Segundo Yara Penteado (1996, pp. 18-19), Angela Maccagno, outra jovem de

Mornese, visava à criação de uma irmandade ou associação leiga que tivesse como foco

as atividades da Igreja e as obras de Deus, e contava com o apoio do Pe. Pestarino e Pe.

Frassinetti, este de Gênova, para a criação dessa associação. No clima de movimentação

pela reunificação3, Angela juntamente com os padres Pestarino e Frassinetti criaram a

Associação das Filhas da Imaculada4, em 1855.

Todavia, a autora ressalta ainda que apenas em 1857 a Associação Filhas da

Imaculada tornou-se oficial, contando com Maria Mazzarello à frente da obra. Maria

Mazzarello começou a aprender bordado e costura com vistas a ensinar meninas e reuni-

las para esse trabalho e para a catequese.

Em 1862, as irmãs da Associação Filhas da Imaculada abriram uma pequena

sala de costura chamada “Alfaiates para Senhoras”, objetivando uma futura

congregação das irmãs, a qual primeiramente se chamou Filhas da Imaculada, passando

a denominarem-se Filhas de Maria Imaculada e, mais tarde, Filhas de Maria

Auxiliadora, como é conhecida atualmente. Enquanto as irmãs davam continuidade às

atividades de bordado, costura e catequese para as moças da região na Associação

Filhas de Maria Imaculada, o Padre Pestarino foi ao encontro de D. Bosco e entrou para

congregação dos Sacerdotes Salesianos, “eram os primeiros laços, que se apertaram

cada vez mais, pois o objetivo de todos era o mesmo: o trabalho com os jovens: as

meninas, pelas Filhas; os meninos, pelos Salesianos” (PENTEADO, 1996, p. 19). Dessa

maneira, incentivado por D. Bosco, Pe. Pestarino inicia, no terreno de sua propriedade,

em Borgoalto, na Itália, a construção de uma escola para os meninos de Mornese

(PENTEADO, 1996, p. 20).

3Sob forte influência da Igreja, pois possuía muitas terras, e devido à maneira como estava organizada a

Itália (como um conglomerado de reinos e educados), iniciou-se no país um movimento pela

reunificação. O primeiro alvo foi o poder da Igreja que sofreu limitações e dificuldades. O movimento

transformou-se em uma guerra civil em 1848 e o debate para definir o que seria uma lei que suprimisse

as comunidades religiosas e confisco dos bens da Igreja, tomou conta da movimentação. Um sentimento

anticlerical dominou o período sob a perspectiva de um estado nacional e de igualdades (PENTEADO,

1996, p. 19). 4Fizeram parte desta primeira fase da Associação cinco jovens: Angela Maccagno, Maria Mazzarello,

Maria Areco, Joana Ferrentino e Josina Mazzarello (PENTEADO, 1996, p. 19).

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De acordo com Penteado (1996), em 1864, D. Bosco visitou Mornese para

conhecer as Filhas de Maria Imaculada e reconheceu “o sopro do Espírito Santo” em

Maria Mazzarello.

Dom Bosco, em 9 de julho de 1871, chama o Pe. Pestarino e

Valdocco, Turim, e lhe comunica que o Capítulo Superior dos

Salesianos havia concordado com a criação de uma congregação

feminina. [...] o Papa havia aprovado e homologado a ideia. [...] – o

futuro Instituto das Filhas de Maria Auxiliadora (PENTEADO, 1996,

p. 20).

Nesse contexto, Ivone Goulart Lopes (2010) narrou a história das FMA no

projeto de D. Bosco. De acordo com seus estudos, a origem do Instituto data de 5 de

agosto de 1872. Foi inaugurado com a presença do bispo D. Sciandra e do próprio D.

Bosco: “[...] acontecia a profissão religiosa de onze candidatas entre as quinze, que

nesse dia, receberam o hábito religioso” (LOPES, 2010, p. 33).

Para atender os apelos da Santa Sé, D. Bosco, seus discípulos e as Irmãs

Salesianas deslocaram-se para a América com o objetivo de evangelizar os povos

indígenas: “daí o termo ‘missionários’ adotado com relação aos que partiam da Itália,

tanto padres como freiras” (AZZI, 1999, p. 14). Muito embora a Congregação visou, na

América, à evangelização de povos indígenas, em Porto Velho, ela voltou-se para as

atividades nos âmbitos da saúde e educação.

Pensamos ser relevante contextualizar a trajetória de chegada das FMA ao

Brasil, abordando, primeiramente, a chegada dos sacerdotes Salesianos de Dom Bosco,

pois eles antecederam a vinda das Irmãs Salesianas.

Observando dentro da realidade geográfica, eclesial e congregacional do

período das missões salesianas, de acordo com os estudos de Lopes (2010), os cristãos

europeus sentiam-se interessados pelas populações não evangelizadas, principalmente,

após serem expulsos de suas terras pela Secularização5 disseminada pela Europa e pelo

5Secularização foi o nome dado ao processo de retirada de símbolos e práticas religiosas do âmbito

público. A secularização representou “a perda do caráter sagrado dos acontecimentos”, uma perda do

controle territorial e poder eclesiástico por parte da Igreja Cristã Católica (EMMERICK, 2010, p. 9). No

Brasil, o projeto de romanização da Igreja, influenciado pela Secularização, destacou-se ao final do

Século XIX e durante o período republicano, quando a Igreja Católica se organizou para recristinizar a

sociedade a partir de uma orientação política: “era uma forma de sistematizar os dogmas católicos,

centralizados em Roma, e atrair fiéis por meio de ações distintas”, como formação de padres, aumento

do número de dioceses, entre outros (ORTIZ, 2014, p. 54). Segundo Ortiz (2014), “se, por um lado, era

necessário modernizar para difundir o capitalismo, por outro não se viam com bons olhos a liberdade,

igualdade e profissionalização feminina” (ORTIZ, 2014, p. 55).

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o estímulo da Igreja que os enviava para a colonização e exploração de outros lugares

para espalhar a sua fé.

Esse interesse pelas populações não evangelizadas partiu por um lado de

pretensões materiais e por outro ligado à esfera espiritual e, segundo Beleni Salete

Grando (2004), esses interesses advinham desde os anos de 1500, pois “por

determinação de D. João, tornava-se imperativo povoar as terras conquistadas em 1500

e converter os gentios à fé católica” (GRANDO, 2004, p. 74).

Nessa linha de raciocínio, nos anos finais do Século XIX, de acordo com Lopes

(2010), o mundo estava inserido no caminho ao laicismo. Para essa autora, após a

realização do Congresso de Viena (1815), depois das perseguições dos católicos e a

descristianização da sociedade, intensificada após a Revolução Francesa, provocaram

um novo anticlericalismo e uma ampla secularização da sociedade (LOPES, 2010, p.

29).

Impedidos de atuarem na saúde e na educação, consoante Riolando Azzi

(1999), no ano de 1875 a primeira embarcação de missionários salesianos aportou em

Buenos Aires, na Argentina e fundaram uma capela San Nicolás de los Arroyos.

Em 1875 D. Bosco enviava a primeira expedição missionária para a

América Latina, com destino de Buenos Aires, os salesianos fundaram

logo uma obra em San Nicolás de los Arroyos6. Os imigrantes

italianos tiveram de início, a preferência dos salesianos, segundo as

recomendações da Santa Sé (AZZI, 1999, p. 24).

Apesar de a primeira embarcação missionária ter seguido rumo a Buenos Aires,

na Argentina, encontramos nos estudos do Padre Luiz Marcigaglia (1955, p. 13),

registros de que a primeira terra americana em que os salesianos “pousaram o pé” foi o

Brasil, “isto aconteceu em 1875 com a chamada ‘1ª Expedição Missionária’”. O autor

retratou que no percurso da expedição enviada para a Argentina, o navio passou pelo

Rio de Janeiro, na época, capital do Império do Brasil.

Lopes (2010) assinalou que no ano seguinte, em 1876, o Padre Luigi Lasagna7

desembarcou no Uruguai e fundou o primeiro colégio salesiano. Porém, somente no ano

seguinte, partiu de Mornese a primeira expedição missionária das FMA para o mesmo

destino. O Instituto das FMA manteve a característica de seguir com as atividades

missionárias.

6Cidade argentina.

7Na época, Luigi Lasagna era Superior da Inspetoria uruguaio-brasileira (COSTA, 2009, p. 15).

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1879 (1º de janeiro) – 2ª expedição; 1881 (20 de janeiro) – 3ª

expedição; 1883 (14 de novembro) – 4ª expedição; 1885 (3 de

fevereiro) – 5ª expedição; 1885 – as Constituições delineiam

claramente a dimensão missionária e confiam essa responsabilidade à

Vigária Geral. 1886 (4 de dezembro) – 6ª expedição (LOPES, 2010, p.

34, grifos da autora).

Analisando as obras de Azzi (1999), podemos observar que apesar de se

estabelecerem no Uruguai, inicialmente as FMA mantiveram suas atividades juntos ao

Colégio de Villa Colón. Após o decreto episcopal de 18758, Lasagna comprou um

terreno para um colégio de irmãs, o que resultou na abertura de uma escola primária, e

recebia semanalmente a visita de Lasagna.

No Brasil, Azzi (1999) descreveu que a chegada dos salesianos foi resultado de

dois projetos: de um lado, o desejo de D. Bosco e seus discípulos por iniciar atividades

educativas no Império Brasileiro, e de outro, a insistência dos bispos brasileiros para

obter a colaboração desses religiosos na implantação e consolidação do modelo

tridentino9 de fé católica.

Bispos do Pará e Amazonas, na região Norte Brasileira, começaram a enviar

cartas para Dom Bosco, na Itália, solicitando a presença Salesiana com a vinda de novas

ordens religiosas para a região. Atendendo às solicitações, D. Bosco recomendou ao

Padre Lasagna que, ao viajar pelo território brasileiro, fosse até a região Norte para

estudar a possibilidade de estabelecer uma fundação salesiana na diocese do Pará

(COSTA, 2009, p. 15).

O ano de 1881 datou a nomeação do Padre Lasagna como inspetor do Uruguai

e do Brasil, por Dom Bosco (AZZI, 1999, p. 29). Segundo o autor, essa nomeação foi

decisiva, pois ainda não havia nenhuma casa salesiana no Brasil.

Em 1882, o Inspetor Padre Lasagna, embarcou para a região de Belém

entusiasmado com os horizontes missionários. A diocese paraense foi a pioneira na

iniciativa missionária dos Salesianos na região Norte do país, porém, com insucesso

(COSTA, 2009, p. 16). Postergada por motivos diversos, a ida dos salesianos ao Pará

não pôde ser realizada, conduzindo o Padre Lasagna a ocupar e manter o controle dos

territórios mato-grossense e amazônico.

8Decreto episcopal de 3 de março de 1879 estabeleceu que os salesianos fossem encarregados da direção

da paróquia de Las Piedras (AZZI, 1999, p. 26). 9Modelo Tridentino de fé Católica referiu-se ao ritual tradicional dos cultos religiosos, padronizado a

partir do Concílio de Trento que unificou a prática litúrgica na Igreja Ocidental: uma igreja “una, santa,

católica e romana” (PACE, 2013).

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Mauro Gomes da Costa (2009) fez considerações acerca da presença da Igreja

na região amazônica e, segundo o autor, não se tratava apenas de uma questão

evangelizadora, mas, também, de uma questão geopolítica. Precedidos por outras ordens

eclesiásticas, os Salesianos participaram da reabertura da Amazônia pelas missões

religiosas (COSTA, 2009, p. 13).

Assim, o estudo da geopolítica dos limites internacionais do Brasil

oferece elementos importantes para o entendimento da presença de

ordens religiosas na Amazônia. Com a proclamação da República

(1889), há um deslocamento do catolicismo da posição privilegiada

que até então tivera. O Estado republicano rompe com o regime do

padroado, proclama-se laico e obriga a Igreja a uma nova tomada de

posição (COSTA, 2009, p. 14).

Para esse autor, após a proclamação da República em 1889, o catolicismo viu-

se obrigado a abrir novas frentes. O Estado, ao se proclamar laico, levou a Igreja a

estabelecer-se em novas regiões. Com isso, a perspectiva de reestruturação e

evangelizadora no Brasil trouxe novas ordens religiosas para o país. Costa (2009)

afirmou que ao procurar novos caminhos e tomar novas decisões, a Igreja passou a

orientar as instituições escolares segundo normas do ensino religioso. Para isso, criou

instituições que formavam professores segundo preceitos do catolicismo, mas utilizando

métodos mais modernos para essa formação.

Ao final do Século XIX, o Inspetor Lasagna decidiu enviar as primeiras Filhas

de Maria Auxiliadora para o Brasil, deixando Montevidéu em 5 de março de 1892 e

chegando no porto do estado do Rio de Janeiro em 10 de março daquele mesmo ano.

Contudo, seria apenas em 1894 que os Padres Salesianos chegariam ao Mato Grosso.

Chegados no parque hontem, ao meio dia, acham-se nesta capital o

Exm. e Rvm. Sr. Dr. D. Luiz Lasagna, dignissimo Bispo titulas de

Tripoli e Superior das missões salesianas do Brasil, Uruguay e

Paraguay e os rvms. destinados às missões neste Estado. [...] e os

Rvds. missionarios, que, a pedido do Exm. Sr. Dr. presidente do

Estado e a instancias nossas, vêm encarregar-se da catechese e

civilisação de nossos indios (O APOSTOLO, 1894, p. 3).10

De acordo com os estudos de Lopes (2010, pp. 39-40), apenas em 1895 a

primeira expedição das Filhas de Maria Auxiliadora se estabeleceu em Cuiabá,

objetivando dar início à Missão da Colônia Teresa Cristina. Segundo a autora, D.

10

Transcrito conforme original.

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Lasagna redigiu e leu uma carta na Abertura das Missões em Mato Grosso, a qual

objetivava arrecadar auxílios para a Colônia Teresa Cristina, uma colônia bororo que

recebeu esse nome em honra ao da esposa de Dom Pedro II. A colônia foi fundada por

Joaquim Galdino Pimentel, governador da Província de Mato Grosso em 1886 e

encontrava-se localizada em Mato Grosso, às margens do Rio São Lourenço entre os

estados de Minas Gerais e São Paulo (LOPES, 2010, p. 40).

A primeira expedição missionária das FMA para Mato Grosso foi organizada

pelo Inspetor Padre Lasagna acompanhado de quatro Irmãs da Visitadoria do Brasil e de

quatro Irmãs da Visitadoria do Uruguai. Muitos centros missionários foram instalados

em Mato Grosso, mas a expansão salesiana avançou para a região amazônica apenas em

1908. Em Mato Grosso, as FMA iniciaram suas ações atuando na evangelização dos

povos indígenas Xavante e Bororo. As regiões de Mato Grosso e regiões da Amazônia

eram espaços nos quais a presença de indígenas era marcante, e “por essa razão, os

salesianos decidiram iniciar suas atividades missionárias no Mato Grosso, atuando

numa segunda etapa também na Amazônia” (AZZI, 1999, p. 223).

Figura 1: Mapa da localização de aldeias indígenas Xavante e Bororo, 2010.11

Fonte: FUNAI.

12

11

Não conseguimos ter acesso a mapas elaborados próximos às datas de colonização e missões.

Elaboramos esse mapa com base nas informações contidas no site da FUNAI.

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De acordo com Lopes (2010, p. 69), “a história contemporânea do povo

Xavante se iniciou em 1862, na região leste do atual estado de Mato Grosso, conhecida

como Serra do Roncador, em terras pertencentes à Amazônia Legal”.

Conforme pode ser observado na figura 1, o mapa apresenta, nos números de 1

a 6, territórios indígenas da etnia Bororo, e a leste de Cuiabá, na área destacada como

Serra do Roncador, estão as aldeias dos povos indígenas de etnia xavante. Segundo a

FUNAI, há 6 territórios indígenas bororo e 13 territórios indígenas xavante. Os

territórios indígenas Bororo são: Perigara, Tereza Cristina, Tadarimana, Jarudore,

Sangradouro e Merure; e os territórios indígenas xavante correspondem ao Areões,

Chão Preto, Xavante de Sangradouro13

, Etarairebere, Huuhi, Maraiwatsede, Marechal

Rondon, Norotsurã, Paraburure, Pimentel Barbosa, São Marcos, Ubawawe e Isoupá.

Consoante Costa (2009), os diversos interesses salesianos uniam-se aos

interesses do Estado brasileiro. Desse modo, a Santa Sé desejosa de expandir a fé

católica enviou ordens missionárias para fora da Europa e criaram dioceses que

prezavam a aliança com os setores econômicos, a política local. As ordens religiosas

buscavam novos territórios, aliavam-se aos governantes no intuito de pacificação e

docilização dos povos que ali viviam.

Padre Antonio Malan14

foi importante figura entre os irmãos salesianos. O ano

de 1912 datou o primeiro relatório enviado ao Presidente do estado de Mato Grosso, Sr.

Dr. Joaquim Augusto da Costa Marques, feito pelo Inspetor das Missões Salesianas,

Padre Antonio Malan. Nesse relatório, Padre Antonio Malan relatou suas observações

sobre o serviço catequético da Missão Salesiana com povos Bororo15

, em Mato Grosso.

Como V. Excia. não ignora, cheguei há pouco, de visitar, cumprindo

dever de ofício, as futurosas colônias indígenas “S. José” no rio

Sangradouro, “Sagrado Coração” no córrego dos Tachos, e

“Immaculada Conceição” no ribeirão Aracy, pertencentes as três a

esta mesma missão. Encontrei todas a funcionar regularmente, quer na

parte material, como na intelectual e moral (MATO GROSSO, 1913,

p. 2).

12

Encontramos as informações no site da FUNAI, entretanto, também é possível encontrar um mapa

representando os territórios indígenas na tese de Beleni Salete Grando (2004, p. 185). 13

Atualmente ainda há a Missão Salesiana de Sangradouro, agregando duas etnias: os Bororo e os

Xavantes, os quais chegaram à Missão vindos de Meruri devido aos conflitos com os Bororo, em 1957

(GRANDO, 2004, p. 154). 14

Inspetor da Missão Salesiana em Mato Grosso em 1912. 15

O relatório de 1912 descrito pelo Padre Antonio Malan apresentou apenas descrições sobre a Missão

Salesiana com povos Bororo. Nada consta sobre os povos Xavante.

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O “Relatório16

sobre o serviço de catechese da Missão Salesiana em Matto-

Grosso durante o anno de 1912”, apresentado ao Presidente do estado de Mato Grosso

(MATO GROSSO, 1913, p. 2) narra a visita inspetorial do Pe. Antonio Malan, em

1912, apresentando, também, três colônias indígenas que se encontravam sob

supervisão da Missão Salesiana: Colônia São José, no rio Sangradouro; Sagrado

Coração no córrego dos Tachos, e Immaculada Conceição, no Ribeirão Aracy.

Nessas colônias, o trabalho realizado pelas missões salesianas além da

escolarização cabia ao padres “civilizarem” os povos indígenas e incluía ainda

estabelecer normas para casamentos, organização familiar, enfim, para as rotinas

daquelas sociedades indígenas que passaram a ser realizadas conforme princípios17

europeus cristãos pregados pelos salesianos. Cabia a “civilização dos gentios”.

Em toda parte, difundiu-se a crença no poder da escola como fator de

progresso, modernização e mudança social. A ideia de uma escola

nova para a formação do homem novo articulou-se com as exigências

do desenvolvimento industrial e o processo de urbanização. O

fenômeno de âmbito mundial foi alimentado pela circulação de ideias

e modelos gerados nos países ditos “civilizados” na época. (SOUZA,

2000, p. 11).

De acordo com esse relatório, em se tratando da divisão de tarefas em cada

colônia de povos indígenas, Antonio Malan relatou que um visitante oficial, Horacio

Souza, Inspetor de Meteorologia18

, que viera a Mato Grosso para remontar a estação do

morro “Santa Cruz”, descreveu que as mulheres aprendiam os afazeres domésticos e

havia pequenas academias nas colônias nas quais as FMA lecionavam Português.

Visitei a casa das Irmãs Salesianas, e foi com verdadeira emoção que

assisti a uma pequena academia feita pelas indígenas, dentre as quais

algumas falam já correntemente o português. Tive também então

oportunidade de ver as mulheres aprendendo os vários afazeres

domésticos (MATO GROSSO, 1913, p. 4).

16

O “Relatório sobre o serviço de catequese da Missão Salesiana em Mato Grosso durante o ano de 1912”

referiu-se ao ano de 1912, entretanto, foi produzido e apresentado ao Presidente do estado de Mato

Grosso apenas em 1913. 17

O Marco Doutrinal do Projeto de Pessoa e Sociedade de utilizado até hoje pela Congregação Salesiana

está voltado aos modelos, estilos e conteúdos educativos para a formação crítica, ética, social e política

da pessoa. Tem uma visão humanista cristã em sintonia com o carisma da educação salesiana, visando

formar integralmente a pessoa como “honesto cidadão e bom cristão”. (DOCUMENTOS DA RSE,

2005, p. 5). 18

A meteorologia estuda a atmosfera terrestre, focando nos estudos de previsão do tempo. No Brasil,

havia algumas instituições onde se realizavam observações meteorológicas. A partir da iniciativa da

Repartição Hidrográfica, instituição ligada ao Ministério da Marinha, criou-se um projeto, em 1886,

com o objetivo de criar uma rede de estações meteorológicas no Brasil. (BARBOZA, 2006, p. 2).

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Mais à frente no relatório, Malan relatou que outro visitante oficial, José

Morbeck, funcionário federal, Diretor da Repartição de Terras e colonização, em visita

oficial, visitou a casa das Irmãs de Maria Auxiliadora e observou que as mulheres

indígenas, além de serem iniciadas nos afazeres domésticos, também aprendiam a

cardar19

, fiar e tecer algodão.

Foi-me franqueada também a casa das Irmãs de Maria Auxiliadora,

onde as índias, como nas outras colônias, são iniciadas nos trabalhos

domésticos nos serviços de cardar, fiar e tecer o algodão. Foram-me

apresentados vários tecidos, entre os quais uma bonita toalha de rosto

fabricada com algodão de duas cores, branco e pardo, digna de ser

vista (MATO GROSSO, 1913, p. 12).

As Irmãs Salesianas educavam e instruíam as crianças indígenas ao mesmo

tempo no qual assistiam as mulheres indígenas no trabalho com a tecelagem. Às

mulheres dos territórios indígenas cabia exercitarem-se nos trabalhos domésticos,

estarem preparadas para atender as exigências de administração dos seus lares, casando-

se com seu cônjuge obedecendo às leis cristãs e trabalhando com afazeres apropriados

ao seu sexo, iniciadas nos serviços de cardar, fiar e tecer o algodão (MATO GROSSO,

1913).

Podemos dizer que havia uma predominância cultural europeu frente à cultura

indígena. Remontamos aos primórdios da história que nos revela, como por exemplo, a

percepção negativa de um povo e cultura diante de outro povo e cultura. Tzvetan

Todorov (1993) tratou do tema ao analisar alguns pensadores que foram representativos

para a história do pensamento e para a reflexão sobre a história. No que se refere ao

etnocentrismo, encontramos apoio em seus estudos para compreender o julgamento de

costumes ditos “selvagens” por meio da analogia tirada do próprio costume daquele que

julga.

Por esses caminhos, intuímos que as religiosas de D. Bosco acreditavam que

povos indígenas eram seres “selvagens” e que precisavam ser “civilizados” pela

doutrina cristã e modo de vida europeu, e essa realidade só mudaria a partir da educação

e instrução oferecidas por eles para os povos colonizados. Essa ideia pode ser

considerada a partir do ponto de vista etnocêntrico, o qual privilegia alguma raça, etnia

19

Cardar: Cardo. Cardo: sm. Do lat. cardûus. Carda: sf. instrumento que serve para desembaraçar o

cânhamo, a lã etc. (CUNHA, 2010, pp. 127-128).

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ou povo considerado como modelo em detrimento de outras culturas, ou seja, segundo

Todorov (1993), o etnocêntrico “segue a linha do menor esforço e procede de maneira

não crítica: crê que seus valores são os valores e isso lhe basta; nunca busca

verdadeiramente prová-lo” (TODOROV, 1993, p. 21).

No mesmo relatório de 1912 encontramos o número de pessoas que viviam

naquelas colônias. A Colônia Sagrado Coração contava com 105 homens e 106

mulheres, totalizando 211 pessoas. A Colônia Immaculada Conceição contava com 64

homens e 59 mulheres, totalizando o número de 123 pessoas. Já, a Colônia São José

com 49 homens e 42 mulheres, totalizava 91 pessoas. Nessas colônias havia, portanto,

425 indígenas que estavam sob tutela dos ensinamentos das FMA como podemos ver no

Quadro 1.

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Quadro 1. Quadro demonstrativo do Pessoal Indígena por sexo

Quadro demonstrativo de atividades educativas

Sexo

Núcleos indígenas Homens Mulheres Total

Colônia Sagrado Coração 105 106 211

Colônia Immaculada 64 59 123

Colônia São José 49 42 91

Escola Agrícola S. Antônio (Coxipó da

Ponte) 15 - 15

Lyceu de Cuiabá 3 - 3

Total 236 207 443

Artes e Ofícios

Seção masculina

Colônia

Sagrado

Coração

Immaculada Conceição São José Coxipó Cuiabá Total

Carpinteiros 4 2 3 - - 9

Ferreiros 2 1 - - - 3

Pedreiros 4 2 3 - - 9

Curtidores 3 - 1 - - 4

Oleiros 8 6 7 - - 21

Agricultores * * *20

15 - 15

Vaqueiros 6 2 4 - - 12

Tropeiros 6 - 3 - - 9

20

Consta no relatório de 1912 que, além dos 15 jovens de etnia bororo matriculados no curso teórico-prático da Escola Agrícola do Coxipó da Ponte, todos os índios das

colônias, exceto as meninas, exercitam-se, de acordo com o horário conveniente, em vários e apropriados serviços de lavoura. Outra informação é que o arado de disco

reversível foi instalado na colônia “Immaculada”, que é a mais distante da capital, em comemoração à visita do Inspetor Agrícola Federal (MATO GROSSO, 1913, p. 16).

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41

Fazedores de açúcar e rapadura 6 2 2 - - 10

Total 39 15 23 15 * 92

Seção feminina S. Coração Immaculada Conceição S. José Total

Tecedeiras 12 6 5 23

Costureiras 18 15 11 44

Fazedoras de farinha 6 6 4 16

Saboeiras 2 2 2 6

Lavadeiras 10 4 3 17

Cozinheiras 2 2 2 6

Total 50 35 27 112

Fonte: Acervo do IMA. Porto Velho/RO.

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42

No quadro 1, observamos a divisão de atividades educativas que eram

denominadas “Artes e Ofícios”. Essas atividades eram diferentes para homens e

mulheres. As mulheres aprendiam atividades relacionadas ao cuidado com o ambiente

doméstico, tais como as atividades de tecedeiras, costureiras, fazedoras de farinha,

saboeiras, lavadeiras e cozinheiras. Os homens aprendiam atividades que exigiam

esforço braçal, tais como os serviços de carpinteiros, ferreiros, pedreiros, curtidores,

oleiros, agricultores, vaqueiros, tropeiros e fazedores de açúcar e rapadura. A nosso ver,

essas foram as primeiras atividades educativas promovidas pelas Irmãs Salesianas na

região mato-grossense que mais tarde as levariam a avançar para Porto Velho e voltar

sua atenção para a educação das moças rondonienses.

Conforme apresentado no quadro 1, 236 totaliza a quantidade de homens e 207

corresponde ao número de mulheres, somadas as cinco missões: missão da Colônia

Sagrado Coração, Immaculada Conceição, São José, Escola Agrícola S. Antonio

(Coxipó da Ponte) e Lyceu de Cuiabá. Quando observamos a quantidade de homens e

de mulheres distribuídos e distribuídas nas variadas atividades de Artes e Ofícios,

percebemos que os números não batem perfeitamente com os correspondentes da

quantidade de pessoas das cinco colônias. A demonstração da quantidade de homens

das cinco colônias corresponde a 236, entretanto, a distribuição nas atividades

correspondeu apenas a 92, ou seja, o relatório não apresentou registro dos afazeres dos

outros 144 homens que não estão sendo representados no quadro. Podemos supor que

esses homens não frequentavam as atividades promovidas pelos salesianos.

Percebemos que o quadro 1 também apresentou outros dados, dos quais

destacamos: a atividade de oleiros totaliza o maior número de homens trabalhando; a

colônia que mais apresenta a quantidade de homens em atividade é a colônia

Immaculada Conceição, a atividade que continha maior número de mulheres

correspondia à atividade de costureira e a colônia com maior número de mulheres em

atividade era a Sagrado Coração; e a quantidade de mulheres que somam 207, porém,

apenas 112 exerciam alguma atividade, nesse caso, o relatório não apresentou o que as

outras 95 mulheres faziam ou onde estavam.

Podemos relacionar a diferença das atividades destinadas para os homens e as

destinadas para as mulheres. Conforme observado, o ensinamento no estilo europeu

também correspondeu a segregar as atividades relacionadas para ambos os sexos. Perrot

(2007) tratou desse tema e, segundo a autora, “o trabalho doméstico é fundamental na

vida das sociedades, ao proporcionar seu funcionamento e reprodução, e na vida das

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mulheres” (PERROT, 2007, p. 114). Compartilhamos o pensamento de Perrot (2007)

quando notamos que as atividades exercidas pelas mulheres eram, em sua maioria,

voltadas para o âmbito doméstico. Diferentemente do homem, o caráter doméstico

marcou o trabalho feminino, “a mulher é sempre uma dona-de-casa” (PERROT, 2007,

p. 114).

Azzi (1999) relatou que a vida das Irmãs de Maria Auxiliadora foi vista como

uma vantagem para os missionários salesianos, pois o apoio e a dedicação delas

poupariam contatos inconvenientes e ofícios para os quais eles seriam pouco aptos. Isto

é, elas tomariam conta “das mulheres e das crianças, para ensinar-lhes os elementos da

religião e das letras, os princípios rudimentares do asseio, da higiene, dos trabalhos

próprios de seu sexo, e de tudo o que se refere à vida de família” (AZZI, 1999, p. 235).

No relatório de 1912, as autoridades que visitaram as colônias também se

referiram à contribuição que as Irmãs Salesianas deram ao ajudar os missionários

sacerdotes de Dom Bosco.

Neste sentido, fazem também jus aos mais calorosos encômios as

Irmãs Missionárias, Filhas de Maria Auxiliadora, sob cuja direção

materna e carinhosa, as índias vão-se exercitando em vários trabalhos

domésticos apropriados ao seu sexo (MATO GROSSO, 1913, p. 7).

Percebemos que, para os colonizadores religiosos, a educação dos povos

indígenas deveria pautar-se no ponto de vista do colonizador, o qual visava “civilizar”

esses povos, negligenciando os ensinamentos e aprendizados da própria cultura

autóctone, que eram transmitidos por gerações e fazem parte da história e cultura desses

povos. Entendemos que o intuito dos colonizadores religiosos era o de propagar a fé

católica e converter os nativos à fé cristã, estendendo esses ensinamentos aos saberes

básicos de letramento, estabelecendo atividades distribuídas de acordo com o sexo.

Notamos que as missões religiosas objetivavam educar esses povos por meio da

catequese: afirmavam as diferenças existentes entre as duas realidades, a etnocêntrica e

a dos nativos, objetivando combater um “atraso” por parte dos povos indígenas

acreditando que a maneira como civilizavam, com doutrinamento cristão católico, era

um ato piedoso e necessário e que, consequentemente, resultava na submissão e controle

do indígena pelo europeu.

Com as expedições em Mato Grosso logrando sucesso, a atenção dos

salesianos voltou-se para as dioceses do Amazonas.

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A ação salesiana na Amazônia remonta à criação pela Santa Sé da

Prefeitura Apostólica do Rio Negro, em 1910, confiada à

Congregação Salesiana em 1914, mas o início efetivo se deu com a

fixação da comunidade salesiana e do prefeito apostólico em São

Gabriel da Cachoeira em 1916, precedida de uma visita de

reconhecimento em 1915 (COSTA, 2009, p. 7).

Para as missionárias salesianas, o objetivo de suas atividades era,

principalmente, educar a juventude carente e abandonada dos centros urbanos. Todavia,

parece-nos que a atividade missionária salesiana visava ainda mais à disseminação dos

valores da cultura europeia cristã entre os povos indígenas e a população dos estados

das regiões Centro-Oeste e Norte brasileiras. Havia interesses da Igreja em disseminar a

religião e, assim, controlar os povos indígenas e “civilizar” a população sob os dogmas

de suas crenças.

Essa ideia de civilizar ficou clara a partir do relatório da Missão Salesiana de

1912 (MATO GROSSO, 1913), quando constatamos a satisfação de inspetores e

autoridades locais quando visitavam as colônias e relatavam como estavam organizadas,

com a divisão de tarefas por sexo, um povo “pacificado”, “civilizado”, “controlado”.

Com essa intenção, a Missão Salesiana estendeu-se até o estado do Amazonas,

e contou com a fundação de quatro comunidades missionárias na Prelazia do Rio

Negro21

.

Desse modo, as Filhas de Maria Auxiliadora consolidaram sua presença no

Brasil no período que correspondeu aos anos de 1917 a 1942. Elas atuavam na

educação, na área hospitalar e assistencial e embarcavam nas missões salesianas

buscando novas localidades para semear os princípios morais e religiosos salesianos

para a população (PENTEADO, 1996).

As irmãs mantiveram o caráter de “irmãs de caridade” e começaram a firmar-se

no setor educacional, consolidando a imagem das escolas salesianas de Dom Bosco e

destacando-se como religiosas educadoras (AZZI, 2002, p. 14).

O pensamento da hierarquia eclesiástica da época envolvia dois pontos:

primeiro, a necessidade de maior presença na sociedade brasileira como maneira de

marcar de forma ostensiva a presença da Igreja na política, com vistas a incutir na

sociedade um respeito aos valores tradicionais do catolicismo. Um segundo ponto era

21

As comunidades missionárias fundadas na Prelazia do Rio Negro, no Amazonas, foram as de São

Gabriel das Cachoeiras, Taracuá, Jaureté e Barcelos. (AZZI, 2002, p. 341)

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visto pelos salesianos como necessário à maior aproximação e colaboração entre Igreja

e Estado (AZZI, 2008).

Dessa maneira, as Irmãs Salesianas chegaram ao Amazonas, em 1923, nas

missões de São Gabriel da Cachoeira e Taracuá. No ano de 1925 foi criada a Prelazia de

Porto Velho22

, entretanto, as atividades das irmãs nos âmbitos hospitalar e educacional

só tiveram início em 1930.

Por esses caminhos, podemos estabelecer uma relação entre Estado, política e

Igreja, o qual nos leva a compreender que, na época, nascia uma sociedade brasileira

destinada à expansão do ensino. De acordo com Aranha (1996, p. 163), as propostas

educacionais apresentavam a necessidade de uma escola pública, leiga, gratuita e

obrigatória. Nos primeiros anos do Brasil República, “a Igreja Católica reagia de forma

negativa às novidades positivistas atribuídas ao governo republicano, que na

Constituição estabelecera a separação da Igreja e do Estado e a laicização do ensino nos

estabelecimentos públicos” (ARANHA, 2006, p. 299).

1.1 O contexto sociopolítico de Porto Velho

Magalhães (2004) contribuiu com seus estudos para a nossa pesquisa, pois, ao

investigar a história de uma instituição educativa, o autor afirmou que para compormos

uma narrativa historiográfica é preciso considerar o contexto histórico e geográfico bem

como as questões de representatividade e inovação que aquela instituição representou

para a localidade.

O Brasil, no início do Século XX, passava por grandes transformações e o

interesse dos poderes governamentais voltou-se para educar e instruir a sociedade.

Buscava-se a construção de uma identidade nacional, voltada para a modernização da

sociedade e o progresso da nação.

As transformações das cidades que se verificam nas últimas décadas

dos século XIX e início do século XX – crescimento urbano,

desenvolvimento do comércio, melhoramentos como saneamento

básico, água, iluminação, transportes públicos, ferrovias,

22

A Prelazia de Porto Velho foi criada pelo Papa Pio XI com a bula Christianae Religionis, de 1 de maio

de 1925. O território da Prelazia foi desmembrado das dioceses de Manaus e São Luís de Cáceres e

correspondia à localidade desde as Três Casas acima da cidade de Borba, seguindo até Porto Velho, a

sede (AZZI, 2002, p. 341).

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ajardinamentos, teatros, jardins públicos – são denotativas deste

desenvolvimento (SOUZA, 1998, p. 91).

Para contextualizar o surgimento e implantação da ENRA pelas FMA na região

porto-velhense, julgamos necessário apresentar o cenário no qual Porto Velho estava

inserida. Para isso, voltamos ao final do Século XIX e início do Século XX: momento

em que se iniciam os planos para a construção de uma ferrovia que facilitasse a

circulação de mercadorias, já que o trecho encachoeirado do Rio Madeira dificultava a

comercialização de produtos via fluvial.

Nos anos de 1877 a 1920, de acordo com Walfredo Tadeu (2010), a

vulgarização do uso da borracha nas indústrias de bicicletas e vestuários fez com que a

atenção se voltasse para a região Amazônica, tornando-a prioritária para o capital

estrangeiro que desejava ampliar a produção do látex nos seringais nativos da região.

Muitas províncias optaram por escoar sua produção tantos pelos rios da Amazônia

Brasileira, como também, para os demais países e continentes fronteiriços ao Oceano

Atlântico. Buscando viabilizar o transporte de mercadorias, durante os anos de 1872 a

1882, houve tentativas23

de elaboração de um projeto para a construção de uma ferrovia

que ligasse as regiões de Santo Antônio e Guajará-Mirim.

Nos anos de 1920, a população brasileira era de 30.635.605 habitantes, dentre

os quais 24,45% tinham grau de instrução sabendo ler e escrever, logo, os outros

75,55% da população brasileira era analfabeta, segundo dados do Instituto Nacional de

Estatística de 1936 (RIO DE JANEIRO, 1936, p. 43). Na região Norte, com as

Unidades Políticas do Amazonas, Pará e Território do Acre, o índice de alfabetizados

era de 28,61%, já o de analfabetos era de 71,38% da população (RIO DE JANEIRO,

1936, p. 53). Portanto, constatamos que a maior parte da população brasileira e da

nortista não sabiam ler e escrever.

23

Os generais bolivianos Juan Palácios e Quentin Quevedo contrataram o Coronel norte-americano

George Earl Church que, em 1871, criou a Madeira Mamoré & Mamoré Railway Company, com

empréstimo inicial na Bolsa de Londres de 1 milhão de libras esterlinas. Church contratou a construtora

inglesa Public Works que mandou para Santo Antônio engenheiros para preparar laudos iniciais sobre a

obra. Em 1872, a Public Works chegou a Santo Antônio e percebeu que a região era inóspita, e após

várias mortes por doenças tropicais e outras enfermidades, a construtora abandonou a obra. Em 1873,

Church contratou nova construtora, Dorsay & Caldwell, que abandonou a empreitada. Em 1875, Church

contratou a Red e Brothers Company, que desistiu ao saber dos anteriores boatos sobre as tentativas de

construção e abandonou a obra antes da assinatura de contrato. Outra tentativa deu-se em 1877, quando

Church contratou a construtora P&T Collins, que iniciou os trabalhos em 1878, mas após acidente no

percurso da primeira locomotiva na Amazônia e a disposição às doenças, ataques de povos indígenas e

insalubridade, também abandonou a construção (TADEU, 2010, pp. 90-91).

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As tentativas de construção de uma ferrovia tiveram insucesso devido aos

males que assolavam a região. Dada como uma região em condição inóspita, as

empreiteiras viram a proposta da construção de uma ferrovia como algo lucrativo. Os

construtores sofriam inúmeras enfermidades como malária, sarampo, tuberculose entre

outras; recebiam baixos salários; havia escassez de mão de obra e sofriam ataques de

povos indígenas que resistiam e lutavam por suas terras, o que levou a região a ser

considerada “um verdadeiro inferno verde, afugentando os primeiros trabalhadores que

chegaram ao lugar” (TADEU, 2010, pp. 98-99).

Passado os anos, um conflito armado colocou brasileiros e bolivianos uns

contra os outros, disputando a região do Acre devido à exploração da borracha. O

conflito surgiu, pois, a área era considerada território da Bolívia, contudo, ocupada por

migrantes brasileiros (FAUSTO, 1995, p. 248). De acordo com o autor, a solução

resultou em um acordo conhecido como Tratado de Petrópolis (1903), pelo qual a

Bolívia reconheceu a soberania brasileira no Acre e, como indenização, recebeu em

troca 2,5 milhões de libras esterlinas.

Em 1903, o Tratado de Petrópolis24

trouxe para o Brasil a obrigatoriedade de

construir uma ferrovia que ultrapassasse o trecho compreendido entre os rios Madeira e

Mamoré até a cidade de Guajará-Mirim. Todavia, a efetivação da obra férrea Madeira

Mamoré25

deu-se apenas em 1907, quando o empresário norte-americano Percival

Farqhuar conseguiu os direitos da construção e criou a Madeira-Mamoré Railway

Company. Essa empresa somou esforços juntamente com a empreitera May, Jeckill &

Randolph e realizaram estudos preliminares na obra, concluindo que seria inviável

instalar o ponto inicial em Santo Antônio.

Assim, orientaram a modificação do ponto inicial para sete quilômetros abaixo

da 1ª cachoeira do Rio Madeira, resultando no redescobrimento26

da região até então

conhecida como “Porto Velho dos Vapores” (GOMES, 2004, p. 57).

24

Tratado que determinou a renúncia da Bolívia ao Acre em troca de uma indenização de dois milhões de

libras esterlinas e concessões territoriais no estado do Mato Grosso; o trecho Delta do Rio Madeira,

formado pelos rios Beni e Mamoré, retomou ao território boliviano; foi celebrada a paz entre os dois

países e permitida a extraterritorialidade de passageiros e cargas no trecho ferroviário (TADEU, 2010, p.

97). 25

As referências utilizadas nesta pesquisa apresentam o nome Madeira Mamoré grafado de duas formas

distintas: com ou sem hífen. Dessa forma, o critério determinante para apresentação de uma ou de outra

forma dependeu do registro que consta nas referências. 26

“Porto Velho dos Vapores” era vista como uma localidade acessível, situada em terras pertencentes ao

estado do Amazonas, durante a Guerra do Paraguai (1864-1970). O exército brasileiro instalou

acampamento nessa região para fornecer lenha aos vapores que trafegavam o Rio Madeira. Seu

abandono deu-se devido à falta de interesse por parte do governo brasileiro em continuar mandando

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De acordo com Júlio César de Carvalho (2009), May, Jekill & Randolph

instalou-se na cidade de Porto Velho em 1908 estruturando um canteiro de obras para

“dar início à construção da Estrada de Ferro, construindo oficinas, serraria, galpões,

alojamentos, sede administrativa e algumas residências”. Dois anos mais tarde, Porto

Velho já contava com o número de 800 habitantes (CARVALHO, 2009, p. 39).

Figura 2: Mapa do percurso de construção da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré, 1909

Fonte: site

27.

Carvalho (2009) ressaltou ainda que, embora poucas ruas já existissem em

1910, somente quando o Superintendente Fernando Guapindaia administrou a cidade

que as primeiras ruas e os primeiros lotes urbanos foram organizados.

recursos para promover o desenvolvimento da região, e também, devido ao Mato Grosso ter

reestabelecido a rota de ligação pela Bacia do Rio Prata (GOMES, 2004, p. 57). 27

Disponível em: <https://efmm100anos.wordpress.com/2011/12/27/mapa-da-efmm-novembro-de-

1909/>. Acesso em: 13 de dezembro de 2016.

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O comércio que se desenvolvia ao longo das Avenidas Sete de

Setembro, Rua Natanael de Albuquerque – antiga Rua da Palha –

Barão do Rio Branco, Genrique Dias e Travessa Floriano Peixoto,

tinha um acabamento melhor nas fachadas, eram de alvenaria e alguns

proprietários moravam no próprio comércio. A ocupação da cidade vai

acontecendo com a criação da primeira praça – Praça Amazonas, atual

Jonathan Pedrosa, com arruamento do primeiro bairro criado, em

1917, chamado de Favella, e depois, com o prolongamento da Rua

Prudente de Moraes e a construção da ponte sobre o Igarapá Favella,

surge o Mocambo. (CARVALHO, 2009, p. 40).

A construção da Ferrovia foi finalizada em 1912, mas até os anos de 1914 a

região de Porto Velho sofreu negligência por parte dos governantes, atendendo apenas

ao escoamento da produção boliviana e vivendo um momento de letargia econômico-

administrativa (TADEU, 2010).

Porto Velho ficou dividida em duas partes: antes da avenida divisória (na

planta da figura abaixo, localizada acima da Avenida Matto Grosso), atualmente

denominada “Presidente Dutra” onde se encontravam os ex-trabalhadores da Ferrovia e

seringalistas imigrantes e, após a Avenida Farqhuar (na planta da figura abaixo,

denominada Boulevard Farqhuar), os engenheiros e algumas autoridades da região,

permanecendo assim até hoje.

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Figura 3: Planta da cidade de Porto Velho, 1912

Fonte: Acervo do Palácio da Memória Rondoniense

28. Porto Velho/RO.

28

Encontramos esse mapa no acervo do Palácio da Memória Rondoniense, entretanto, o mapa também pode ser visto no livro de Carvalho (2009), arquiteto historiador que

publicou um livro sobre construções históricas de Porto Velho.

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Conforme podemos observar, a planta da cidade de Porto Velho apresentada na

figura 3 mostrou-nos onde o comércio, ruas e avenidas estavam localizados: todos

próximos à Estrada de Ferro Madeira Mamoré, construída às margens do Rio Madeira.

Carvalho (2009) destacou que o desenvolvimento da cidade de Porto Velho se deu em

torno de um rio e após a construção de uma ferrovia, o que, de acordo com o autor, era

comum acontecer em um mundo entusiasmado com e pela Revolução Industrial.

Uma cidade nasce em determinado local por diversas razões: às

margens de um curso d’água, de um rio, por uma questão de

sobrevivência ou para o uso do curso d’água como via de locomoção;

em um ponto geográfico, para defesa de uma região, para convívio e

troca; ao longo de uma estrada ou de uma ferrovia, mas sempre por

uma razão predeterminada. [...] Com a Revolução Industrial e com o

domínio da tecnologia de construção de estradas de ferro pelos

Ingleses e Norte-Americanos, inúmeras cidades foram criadas ao

longo das ferrovias – inclusive em outros países – a partir de um

posto, entreposto ou vila. Nessa época, as locomotivas eram movidas

a vapor e necessitavam de um espaço curto para se reabastecerem de

água e lenha, o que levou ao surgimento de vilas e entrepostos. Porto

Velho é uma cidade que nasceu em consequência da Estrada de Ferro

Madeira-Mamoré – nasceu como ponto inicial da ferrovia

(CARVALHO, 2009, p. 33).

A Lei nº 757, de 2 de outubro de 1914, no Artigo 1º, instituiu o município de

Porto Velho, à margem direita do Rio Madeira.

Art. 1º - Fica criado o município de Porto Velho, com sede na

povoação de mesmo nome, à margem direita do Rio Madeira tendo os

limites estabelecidos pelo Decreto nº 1.063 de 17 de março do

corrente ano para aquele Termo Judiciário (AMAZONAS, 1914, p. 1).

Essa mesma Lei instituiu que o governo poderia aproveitar as obras de

saneamento realizadas pela companhia Madeira Mamoré Railway Company e adquirir

as terras necessárias para a fundação do município.

Art. 2º - O Poder Executivo fica autorizado a entrar em acordo com o

Governo Federal, a Madeira Mamoré Railway Company e os

proprietários de terras para a fundação imediata da povoação,

aproveitando na medida do possível, as obras do saneamento feitas ali

por aquela companhia, e abrir créditos necessários à execução da

presente lei (AMAZONAS, 1914, p. 1).

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Nesse período, a Congregação Salesiana já havia se instalado nas regiões

Sudeste, Sul, Nordeste, Centro-Oeste e Norte do país. As duas primeiras décadas

corresponderam às realizações de missões29

salesianas em colônias indígenas de povos

da etnia Bororo em mato grosso, conforme mencionado anteriormente. Muito embora a

Congregação já houvesse estabelecido inspetorias e instituições educacionais em outras

regiões do país, as Irmãs iniciariam suas atividades em Porto Velho apenas 16 anos

mais tarde.

Figura 4: Mapa dos estados do Amazonas, Acre, Mato Grosso e Pará, 1915

Fonte: IBGE.

Utilizamo-nos do mapa da figura 4 para ilustrar a forma como o Brasil estava

configurado no início do Século XX. Conforme a figura nos apresenta, notamos que o

país ainda não havia constituído o estado de Roraima, Amapá, Rondônia e Mato Grosso

do Sul, além também, de contar com a localização do município de Porto Velho como

unidade do Amazonas, que em 1913 foi reconhecido como uma vila próspera do estado

do Amazonas. Em 1914, tornou-se município e apenas em 1919 foi elevado à categoria

de cidade, com a Lei nº 1.011 de 7 de julho de 1919. Uma publicação do Dr. José

29

Os anos de 1912, 1915, 1917 e 1919 dataram a realização de relatórios da Missão Salesiana feitos pelo

Pe. Antonio Malan, prelado, bispo e superior da referida missão. Descobrimos durante a pesquisa e ida

ao Arquivo Público de Cuiabá que também houve relatório em 1914, entretanto, esse relatório não se

encontrava na instituição.

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Firmino da Paz, deputado estadual do Piauí e político em Porto Velho (ALTO

MADEIRA, 1917, p. 2) relatou o comércio existente na localidade:

Comercialmente, Porto Velho não pode deixar de ser uma vila de

grande movimento e muito futuro, porquanto é o ponto inicial da

navegação do Madeira e sede da Estrada de Ferro Madeira Mamoré

[...]. É, relativamente, extraordinário o comércio ali. [...]. A Madeira

Mamoré de muita vida a Porto Velho. [...] (PAZ, 1917, p. 2).

Embora Porto Velho se encontrasse em desenvolvimento e apresentando

progresso, vale ressaltar o número de indígenas que estavam sendo afastados da região.

Os constantes embates com construtoras, empreiteiras, seringalistas e seringueiros, a

disputa pelo espaço ocupado, foram justificativas usadas pelos povos não índios para a

eliminação de nações indígenas que ali habitavam. Segundo Gomes (2007, p. 47), o

espírito de aventura dos exploradores da imensidão verde do Guaporé “caracterizava a

conquista do daquele espaço geográfico e da mentalidade dominante do colonizador”,

mentalidade concentrada em explorar o potencial existente visando apenas ao súbito

lucro, desvalorizando e desconsiderando qualquer compromisso de integração com a

região e com os povos indígenas.

Gradativamente, no Primeiro Ciclo da Borracha Porto Velho foi sendo habitada

por seringueiros e por trabalhadores para a construção da Estrada de Ferro Madeira

Mamoré. A mão de obra utilizada na construção da Ferrovia foi contratada tanto no

Brasil como no exterior.

A questão de atração da mão de obra foi resolvida pelo aliciamento de

trabalhadores nas colônias inglesas da América Central, que já

possuíam experiência na construção de ferrovias e o Canal do

Panamá. [...] Esses trabalhadores chegaram de diversas colônias

centro-americanas, com destaque para Barbados, Trinidad, Jamaica,

Santa Lúcia, Martinica, São Vicente, Guianas, Granada e outras ilhas

Antilhanas e de modo geral são chamados de “Barbadianos30

”, que

apresentaram 60% da mão de obra no empreendimento (TADEU,

2010, p. 99).

30

Vindos das áreas de colonização inglesa, Barbados, o nome “Barbadianos” foi dado aos trabalhadores

negros vindos do Caribe no início do Século XX para trabalhar na construção de ferrovias (como por

exemplo, a Ferrovia Madeira Mamoré) ou nas selvas. Alguns se voltaram para a abertura de pequenos

comércios (TADEU, 2010).

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Com o final da Primeira Grande Guerra (1918) e o enfraquecimento da

produção de borracha em seu primeiro ciclo (1920), Porto Velho voltou ao estado de

letargia31

econômico-administrativa.

Nos estudos de Gomes (2007, p. 48) encontramos algumas informações sobre a

implantação de escolas no Vale do Guaporé, região em que se encontrava Porto Velho.

Em 1913 foi criada, pelo Dr. Joaquim Augusto Tanajura, a primeira escola pública

municipal, na localidade de Santo Antônio do Alto Madeira, pertencente, na época, ao

Mato Grosso; a segunda escola foi a Escola Mista Municipal, em 1915, criada pelo

primeiro prefeito de Porto Velho, Major Fernando Guapindaia de Souza Brejense. De

acordo com o autor,

Tanto no período da exploração e produção de ouro e de especiarias

vegetais (as drogas do sertão), como no período intensivo de produção

da borracha, a partir de 1850, e até mesmo quando o seringal perdeu o

sentido de aventura pela conquista da terra, dando lugar à ocupação

populacional, não havia qualquer preocupação com a oferta de

educação formal (GOMES, 2007, p. 47).

Dessa maneira, ao estabelecermos um diálogo entre a história de Porto Velho e

o ensino estabelecido pelas FMA, percebemos que as iniciativas direcionadas à

educação, em Porto Velho, estiveram durante muito tempo associadas à disposição de

religiosos, conforme afirma Gomes (2007), “quando padres, em suas missões,

ensinavam a escrita, a leitura e a matemática aos índios, elementos facilitadores do

ensinamento do catecismo” (GOMES, 2007, p. 47).

Ao aportarem em Porto Velho, as FMA dedicaram-se às atividades no Hospital

São José e, mais tarde, ampliaram sua atuação para a área da educação com a criação da

escola pesquisada. Porto Velho enfrentava as transformações que resultaram do

primeiro Ciclo da Borracha e da primeira Grande Guerra enquanto, no contexto

nacional, o país caracterizava-se com a entrada na modernidade.

Fátima Maria Leitão Araújo (2006) descreveu que até os anos de 1920 o país

buscava superar o sentimento de inferioridade em relação aos países mais desenvolvidos

e, após a proclamação da República, buscou instituir um plano político-institucional e

nacional de educação que aspirava despertar na sociedade um forte sentimento de

nacionalidade.

31

Devido à produção da borracha encontrar-se em declínio na Amazônia e aos prejuízos financeiros que a

Railway Company obteve (TADEU, 2010, p. 105).

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Entre os anos 1920 e 1930, os pressupostos da Escola Nova começaram a

chamar a atenção da burguesia brasileira. O conjunto das principais características do

escolanovismo: uma educação integral, moral, física e intelectual, ativa, prática, com

obrigatoriedade dos trabalhos manuais, do exercício de autonomia, da vida no campo,

do internato, da coeducação e ensino individualizado parecia atender aos interesses

burgueses (ARANHA, 2006, p. 247).

Desse modo, ponderamos que a orientação de ensino e o pragmatismo para o

qual a educação se voltava possibilitaram a criação e a expansão da instituição das

Filhas de Maria Auxiliadora na cidade de Porto Velho. Parece-nos que a presença das

Irmãs Salesianas na cidade porto-velhense significou um reforço da identidade

nacionalista no local, pois ao mesmo tempo em que buscavam a expansão dos

princípios religiosos cristãos que professavam também suscitavam no âmbito político o

ideário redentor e regenerador que a educação religiosa se encarregava.

Embora a planta da figura 5, apresentada a seguir, tenha sido feita para mostrar

a rede de canalização de acordo com o contrato firmado com a Superintendência

Municipal, buscamos retratar a disposição das ruas e avenidas na cidade de Porto Velho

e o lote onde foi construída a escola das Irmãs Salesianas.

A planta da cidade de Porto Velho (figura 5) configura a disposição de ruas e

avenidas no ano de 1925 e, para representar a ENRA, desenhamos um capelo, local

onde até os dias de hoje a escola das FMA se encontra, entretanto, as ruas onde a escola

se localiza tiveram seus nomes alterados com o decorrer do tempo.

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Figura 5: Planta de Porto Velho em 1925

Fonte: Acervo do Palácio da Memória Rondoniense

32. Porto Velho/RO.

32

Encontramos esse mapa no acervo do Palácio da Memória Rondoniense, mas o mapa também pode ser visto no livro de Carvalho (2009), arquiteto historiador que publicou

um livro sobre construções históricas de Porto Velho.

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Os primeiros anos da década de 1940, no período conhecido como o Segundo

Ciclo da Borracha, ocorreu a assinatura do Tratado de Washington. A Amazônia havia

se tornado um reservatório natural de borracha para a produção da quantidade

necessária para atender às demandas norte-americanas. Todavia, não havia

trabalhadores suficientes para a produção em massa. O Tratado de Washington

determinou que o governo norte-americano investisse no financiamento do crescimento

da produção de borracha amazônica, em contrapartida, o governo brasileiro deveria

enviar um número significativo de trabalhadores para os seringais (TADEU, 2010, p.

116).

No discurso do Presidente Getúlio Vargas, proferido em 9 de outubro de 1940,

o presidente referiu-se às riquezas da Amazônia e às necessidades de povoamento da

região:

Até agora, o clima caluniado impediu que de outras regiões com

excesso demográfico viessem os contingentes humanos de que carece

a Amazônia. Vulgarizou-se a noção, hoje, desautorizada, de que as

terras equatoriais são impróprias à civilização. Os fatos e as

conquistas da técnica provam o contrário e mostram, com o nosso

próprio exemplo, como é possível, às margens do grande rio,

implantar uma civilização única e peculiar, rica de elementos vitais e

apta a crescer e prosperar. [...] A coragem empreendedora e a

resistência do homem brasileiro já se revelaram, admiravelmente, nas

“entradas e bandeiras do ouro negro e da castanha”, que consumiram

tantas vidas preciosas. Com elementos de tamanha valia, não mais

perdidos na floresta, mas concentrados metodicamente localizados,

será possível, por certo, retomar a cruzada desbravadora e vencer,

pouco a pouco, o grande inimigo do progresso amazonense, que é o

espaço imenso e despovoado. É tempo de cuidarmos, com sentido

permanente, do povoamento amazônico. Nos aspectos atuais, o seu

quadro ainda é o da dispersão (VARGAS, 1940, pp. 77-78).

Vargas (1940, pp. 77-78) ressaltou, nesse mesmo discurso, que era preciso

cuidar permanentemente do povoamento amazônico, pois naquele momento, o

povoamento vivia uma dispersão: os nordestinos embrenhavam-se pela floresta, abrindo

trilhas e talhando a seringueira silvestre para deslocar-se segundo as exigências da

própria atividade nômade. Isto é, o nomadismo prevalecia e era natural à margem dos

rios, com a atividade da população limitando-se à caça, à pesca e à lavoura de vazante,

para consumo doméstico. Getúlio Vargas, nesse mesmo ano, visitaria aquela região. A

visita foi noticiada pelo jornal Alto Madeira.

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[...] A cidade de Porto Velho, que se orgulha de também ter sido

agraciada com a visita do Supremo dirigente do País, que de visu bem

ajuizará do seu progresso, atestado eloquente do esforço dinâmico e

eficiente do grande bandeirante Major ALUIZIO FERREIRA, e dos

olhares atentos e benéficos do Chefe da Nação [...]. Bendita seja a

visita presidencial à Amazônia (ALTO MADEIRA, 1940, p.1, grifo

nosso33

).

Sopesamos que Porto Velho era uma cidade em desenvolvimento. A maioria da

população encontrava-se nos trabalhos da Ferrovia Madeira Mamoré e em pequenos

comércios pelo centro da cidade. As FMA constataram que as moças, em sua maioria,

não eram instruídas. Iniciar atividades com foco para o público feminino poderia atrair o

olhar da sociedade para as iniciativas cristãs e aumentar o prestígio da instituição

salesiana no local. Essa preparação das moças voltava-se à “formação na prática das

virtudes, enobrecimento do espírito com o saber humano, educação pela doutrina

católica e ornamental cultural”, diretamente ligado ao lugar social que ocupava ou iriam

ocupar as alunas (ORTIZ, 2014, p. 61). Nesse contexto, a autora referiu-se ao momento

de transição para ingressar na vida urbana, burguesa e letrada e que, portanto, era

repleta de limites e regras.

Em 13 de setembro de 1943, com o Decreto-Lei nº 5.812, foi criado o

Território Federal do Guaporé, formado por terras desmembradas dos estados do

Amazonas (14%) e Mato Grosso (86%), composto por quatro municípios: Porto Velho

– a capital, Santo Antônio, Lábrea e Guajará-Mirim; e nomeação de governador e

Secretário-Geral34

(TADEU, 2010, p. 123).

Destacamos os artigos35

considerados relevantes para a compreensão da

criação do Território Federal do Guaporé.

Art. 1º São criados, com partes desmembradas dos Estados do Pará,

do Amazonas e de Mato Grosso, do Paraná e de Santa Catarina, os

Territórios Federais do Amapá, do Rio Branco, do Guaporé, de Ponta

Porã e do Iguassú. [...] § 3º O Território, do Guaporé terá os seguintes

limites: - a Noroeste, pelo rio Ituxí até à sua foz no rio Purús e por este

descendo até à foz do rio Mucuim; - a Nordeste, Leste e Sueste, o rio

Curuim da sua foz no rio Purús até o paralelo que passa pela nascente

do Igarapé Cuniã, descendo por este até sua confluência com o Rio

33

“De visu bem” foi uma expressão encontrada no excerto extraído do jornal Alto Madeira a qual não

encontramos definição. 34

O primeiro governador do Território foi o Major Aluizio Pinheiro, nomeado pelo presidente Getúlio

Vargas. O cargo de governador estava ligado diretamente à presidência da República, articulando as

orientações do Ministério da Justiça e dos Negócios Interiores. Em alguns casos, o Secretário-Geral

podia substituir o governador do Território (TADEU, 2010, p. 123). 35

Transcrito conforme original.

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Madeira, e por este abaixo até à foz do rio Gi-Paranã (ou Machado)

subindo até à foz do rio Comemoração ou Floriano prossegue por este

até à sua nascente, daí segue pelo divisor de águas do planalto de

Vilhena, contornando-o até À nascente do rio Cabixí e descendo pelo

mesmo até à foz no rio Guaporé; - ao Sul, Sudoeste e Oeste pelos

limites com a República da Bolívia, desde a confluência do rio Cabixí

no rio Guaporé, até o limite entre o Território do Acre e o Estado do

Amazonas, por cuja linha limítrofe continua até encontrar a margem

direita do rio Ituxí, ou Iquirí; [...] (BRASIL, 1943, p. 1).

A partir da segunda década do Século XX, a região começou a vivenciar um

período de crise econômica com o fim da exportação da borracha e o abandono da

Ferrovia por parte da Madeira Mamoré Railway Company do tráfego entre Porto Velho

e Guajará-Mirim. Getúlio Vargas decidiu, então, transformar o Vale do Guaporé em um

território único. Com o Decreto-Lei nº 5.812 de 13 de setembro de 1943, a configuração

do Brasil sofreu transformações, como podemos observar a mudança no mapa da figura

6. Para Getúlio Vargas, presidente do país no período, era necessário “integrar a região

ao cenário econômico do país” (TADEU, 2010, p. 122).

Figura 6: Mapa do Brasil em 1943

Fonte: IBGE.

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O novo território consolidou-se após a visita do Presidente Getúlio Vargas a

Porto Velho em outubro de 1940. Em 1930, a cidade de Porto Velho ainda estava

sediada no estado do Amazonas e, em 1943, Vargas instituiu o Território Federal do

Guaporé, composto pelos municípios de Porto Velho, Santo Antônio, Lábrea e Guajará-

Mirim. Porto Velho, no período em estudo, de 1930 a 1946, pertencia primeiro ao

estado do Amazonas, depois ao Território Federal do Guaporé e, mais tarde, em 1956,

ao estado de Rondônia.

1.2 A Prelazia de Porto Velho

O início da trajetória das Filhas de Maria Auxiliadora em Porto Velho data do

ano de 1925, quando o Papa Pio XI criou a Prelazia de Porto Velho, a partir da Bula

Christianae Religionis36

(AZZI, 2002, p. 341). O jornal Alto Madeira registrou esse

fato.

Como já tivemos ocasião de noticiar, por Bula de 1º de maio do

corrente ano, do Santo Padre Pio XI, foi criada a Prelatura37

de Porto

Velho, com sede nesta cidade. Por informações prestadas ao nosso

diretor pelo Rvmo. Padre Dr. Raymundo Oliveira, digno Governador

do Bispado, sabemos que no dia 25 de Dezembro próximo aqui estará

o Rvmo. Padre Ghislandi, distinto sacerdote já conhecido pela nossa

população, que virá instalar a Prelatura em nome do Monsenhor Pedro

Massa, nomeado seu administrador apostólico. É um fato auspicioso

para a nossa população católica que, brevemente, irá gozar deste

grande benefício (ALTO MADEIRA, 1925, p. 1).

A citação mencionada acima faz referência à visita do Reverendíssimo Padre

Ghislandi, na época, sacerdote salesiano que veio para concluir a instalação da Prelatura

de Porto Velho, em nome do já Prelado e, agora, administrador apostólico, Monsenhor

Pedro Massa. O excerto nos leva a pensar sobre como a imprensa concebia a ida de

sacerdotes salesianos para a região porto-velhense. O editor parece entusiasmado com a

36

Não encontramos a descrição da Bula de criação da Prelazia de Porto Velho na íntegra, apenas

informações nas quais a Prelazia surgira a partir dela. Bula: s.f. 1 selo ou sinete, ger. de forma redonda,

que se prendia a um documento o u acompanhava uma carta, atestando-lhe a autenticidade 2 p.met.

decreto ou documento com tal selo ou sinete 3 ECLES escrito solene ou carta aberta provida de tal selo,

expedida em nome do papa, com ordens, concessão de enefícios etc. (HOUAISS; VILLAR, 2009, p.

336) 37

Prelatura é o mesmo que Prelazia, já explanada na Introdução.

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presença dos religiosos na localidade e a ressalta como algo relevante e necessário para

a população. Menciona que os católicos que habitavam a vila de Porto Velho

aguardavam ansiosos o estabelecimento do pastorado para “gozarem de um grande

benefício”. Cabe aqui uma ressalva: parece-nos uma campanha estabelecida pela pelos

sacerdotes para divulgar a existência da Prelazia e uma maneira de convencimento da

população dos intuitos dos religiosos como um “benefício” para o povo.

Encontramos uma carta de aforamento38

de 1916 descrevendo a posse de um

terreno por José Maria da Costa entre os documentos fornecidos pela escola. A partir da

análise desse documento, identificamos que o terreno passou a pertencer à Prelazia, em

1934.

Figura 7: Carta de Aforamento da Intendência Municipal, 1916

Fonte: Acervo do IMA. Porto Velho/RO.

38

Carta de Aforamento diz respeito ao documento que comprova o aforamento ou aforação. Aforar: v. 1

JUR dar ou tomar por aforamento ou enfiteuse <aforou a sede do clube> <costumam aforar terras aos

sertanejos>. 2 conceder (a alguém ou a si mesmo) certos direitos, privilégios ou honrarias. (HOUAISS;

VILLAR, 2009, p. 63). Enfiteuse: s.f. JUR direito real em contrato perpétuo, alienável e transmissível

para os herdeiros, pelo qual o proprietário atribui a outrem o domínio útil de imóvel, contra o pagamento

de uma pensão anual certa e invariável; aforamento. (HOUAISS; VILLAR, 2009, p. 757)

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Abaixo, segue a transcrição da Carta de Aforamento da figura 7:

A Intendência Municipal de Porto Velho faz saber aos que a presente

Carta de Aforamento virem, que foi aforada ao Sr. José Maria da

Costa em 16 de Maio de 1916, o lote de terras urbano nº três, de

patrimônio desta Municipalidade, situada na quadra nº XXIII, tendo

uma área de seiscentos cinqüenta e um mts. e 87 centímetros

quadrados e os seguinte limites: ao norte com o lote número dois; ao

sul com o lote número quatro; a leste com a rua Duque de Caxias; e a

oeste com a avenida Osorio, medindo dezessete e meio metros de

frente por trinta e seis e vinte e cinco centímetros. O enfiteuta, por

termo de contrato lançado a fls 117 do livro respectivo, fica obrigado

ao cumprimento das cláusulas abaixo, estabelecidas pela Lei nº 13, de

27 de Novembro de 1915, que regula as concessões de terras deste

Município: 1ª) A pagar o foro de treze mil e quarenta reis

correspondente a seiscentos cinqüenta e um mts e 87 centímetros

quadrados da área ocupada pelo lote nº três da quadra vinte e três do

patrimônio Municipal, assim como o direito dominical em laudêmio

correspondente à percentagem que estiver determinada por Lei. 2ª) A

efetuar esse pagamento na Tesouraria Municipal, dentro de cada ano

financeiro. 3ª) A não fazer venda, doação, transação, permuta, cessão,

divisão, penhor, hipoteca, constituição de servidão, doação em

pagamento, cessão enfiteuta ou qualquer outra alienação sem prévia

audiência e expresso consentimento da Intendência Municipal, como

direta Senhoria, cabendo a esta o direito de opção, sob pena de

nulidade. 4ª) A tornar útil o terreno do lote aforado, cercando-o no

prazo de seis meses, da data da concessão, edificando-o, em todo ou

em parte como for conveniente, fazendo-lhe qualquer outra sorte de

benfeitorias, de modo a torná-lo proveitoso, o prazo de um ano, bem

como ceder para servidão pública, quando for necessário, sem

estrépito judicial, sem ônus ou qualquer embaraço, a quantidade de

terreno precisa, salvo a indenização de benfeitorias úteis. 5ª) A

destocar e aplainar a parte da rua fronteira ao lote nº três e plantar as

árvores que forem determinadas pelo engenheiro da Intendência

Municipal. 6ª) A sujeitar-se às penas de comisso e devolução à

Intendência Municipal do lote de terreno nº três aforado, na falta de

pagamento do foro por dois anos consecutivos e na do cumprimento

das cláusulas acima e aqui estabelecidas, incorrendo, por cada ano que

faltar ao pagamento dentro do prazo, na multa de 10% sobre o valor

do mesmo lote de terreno. E como tenha o mesmo enfiteuta pago

todas as despesas, de conformidades com a tabela vigente, passou-se-

lhe esta Carta de Aforamento, ficando por esta forma investido de

todos os direitos e regalias sobre o domínio útil do referido lote de

terreno, por lei conferidos. Intendência Municipal de Porto Velho, em

16 de Maio de 1916 (PORTO VELHO, 1916, p. 1).

O documento destacou que a Intendência Municipal de Porto Velho, com a

Carta de Aforamento de 1916, designava ao Sr. José Maria da Costa, em 16 de maio de

1916, o lote de terras urbano número três, do patrimônio da Municipalidade, situado na

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quadra número XXIII, com uma área de seiscentos e cinquenta e um metros e oitenta e

sete centímetros quadrados e os seguintes limites: ao norte, com o lote número dois; ao

sul com o lote número quatro; a leste com a Rua Duque de Caxias, e a oeste com a

Avenida Osório, medindo dezessete e meio metros de frente por trinta e sete e vinte e

cinco centímetros (PORTO VELHO, 1916, p. 1), assinada pelo Superintendente

Municipal Major Guapindaia e pelo Secretário João Alfredo de Mendonça.

Constituía uma área significativa e estava bem localizada no ponto mais alto da

Rua Riachuello, bem ao centro da cidade de Porto Velho. Ali seria possível a instalação

de um belo edifício com salas de aula amplas, auditório e capela para dar continuidade

às atividades religiosas como missas, comunhão, Oratório Festivo, Sacramentos entre

outros.

Figura 8: Termo de Transferência, 1934

Fonte: Acervo do IMA. Porto Velho/RO.

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Esse mesmo terreno foi transferido à Prelazia Apostólica de Porto Velho em

1934. Consta no termo de transferência do terreno no ano de 1934 “Transferido nesta

data para a Prelazia Apostólica de Porto Velho. Registrado fls. 69 do Livro Termos de

Transferência nº 2 – Porto Velho, 19 de maio de 1934” (PORTO VELHO, 1934, p. 1).

De acordo com o jornal Alto Madeira, além da criação da Prelazia de Porto

Velho, em 1925, também ficou determinado o seu administrador, sendo nomeado

Monsenhor Pedro Massa, “cujos serviços no Rio Negro, prestados com a maior

abnegação e devotamento, são um penhor recomendável para o sucesso da feliz

organização de que está incumbido” (ALTO MADEIRA, 1925, p. 2).

Encontravam-se sob a jurisdição da Prelazia de Porto Velho as localidades de

Guajará-Mirim, Santo Antônio e Humaitá (ALTO MADEIRA, 1925, p. 2).

Figura 9: Mapa das localidades sob jurisdição da Prelazia de Porto Velho39

39

Adaptado pela pesquisadora. localização das cidades que se encontravam sob a jurisdição da Prelazia

de Porto Velho foi observada a partir da disposição dos mapas encontrados no site do IBGE. O mapa

que a autora utilizou como parâmetro encontra-se disponível em:

<ftp://geoftp.ibge.gov.br/cartas_e_mapas/mapas_do_brasil/politico/brasil_politico5000k_2004.pdf>.

Acesso em: 28 dez. 2016.

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Em 1931, uma notícia procedente da Prefeitura Municipal de Porto Velho

comunicou sobre o auxílio oferecido para a Prelazia de Porto Velho para que fossem

iniciados os trabalhos na cidade.

O município, a título de subvenção (!) conferiu a essa Prelazia a

importância de seis contos de réis, como auxílio à instalação dos seus

trabalhos nesta cidade. Não podendo de vez ser paga dita importância,

deliberou a Prefeitura levar a sua conta o consumo mensal de água e

luz da Prelazia na importância de 70$000, em média. O ato nº 152 de

8 de janeiro findo, de V. Exc. sobre instruções aos prefeitos

municipais, proíbe as subvenções. Tendo em consideração, porém, as

indiscutíveis utilidades dessa Prelazia, já mantendo à pobreza no

hospital, com quinze leitos bem confortáveis, médico, farmácia e

enfermarias; já cogitando de instalações de engenhos para

beneficiamento de arroz; e sobretudo pela sementeira de moral cristã,

que realiza cotidianamente na alma em formação de criancinhas, na

maioria, carentes de melhor assistência paterna: eu peço a V. Ex.

continuar a Prefeitura com o insignificante auxílio de pagar por conta

da aludida subvenção (!) o consumo de água e luz (ALTO

MADEIRA, 1931, pp. 1-2).

Percebemos ao ler esse excerto que a prefeitura se coadunava com a vinda e

instalação dos Salesianos em Porto Velho. Podemos inferir ainda que a instalação da

Prelazia se inseria em um contexto que previa uma intenção educacional sobretudo pela

“sementeira de moral cristã”. Esse período em Porto Velho ocorreu paralelamente a um

momento no qual a Igreja Católica procurava fundar uma série de colégios por todo o

país na tentativa de formar uma elite nos moldes do catolicismo que deveria reproduzir

o discurso católico nas diversas instâncias públicas influenciando a elaboração das leis,

a administração burocrática de estados e municípios, ou seja, deveria introduzir os

dogmas da Igreja Católica sobre a sociedade, utilizando-se da elite política.

Podemos ponderar que a Igreja, após o advento da República brasileira,

movimentou-se no sentido de reaproximação com as elites brasileiras, principalmente

com aqueles que iriam dirigir o país, visando garantir sua independência e ao mesmo

tempo sua influência na administração de estados e municípios. Para isso, juntou-se aos

governantes para combater as ideias que ameaçavam o Estado, como o socialismo. Em

contrapartida, exigiu a aceitação do pensamento ideológico e religioso nas instituições

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do Estado, conforme consta na lei do ensino de 193140

que a educação religiosa deveria

ser implantada no ensino público. Municípios e estados, por sua vez, incapazes de

atender às demandas educacionais, utilizavam-se dos estabelecimentos particulares de

ensino no país, como a instituição salesiana em estudo. Dessa maneira, podemos

ponderar que o Estado, de certa forma, transferia suas responsabilidades relacionadas à

educação.

A esse respeito Ivan Aparecido Manoel (1996), relatou que a figura do Padre

de pequenas vilas e cidades no interior brasileiro muitas vezes era o único ponto de

referência cultural e a doutrinação católica representava “uma das poucas, senão a

única, ação educativa que atingia o povo”. Desse modo, o projeto educacional dos

católicos agradava ao governo, e juntos movimentaram-se no sentido de educar as

moças e foi se consolidando uma educação conservadora difundida pela Igreja, em um

contexto educacional marcado pela falta de opções, em contrapartida à politica liberal

republicana e sua proposta de uma educação leiga a cargo do Estado (MANOEL, 1996,

p. 54-55).

Na Encíclica Divini Illius Magistri41

de 1929, notamos vestígios da tentativa da

Igreja em monopolizar a educação nos seus diversos níveis, apontando, essa atitude,

como uma necessidade para a manutenção e ordenamento pacífico da sociedade:

Temos, portanto, como já notamos, no nosso citado discurso, dois

fatos de altíssima importância: “a Igreja que põe à disposição das

famílias o seu ofício de mestra e educadora, e as famílias que ocorrem

a aproveitar-se dele, e dão à Igreja, a centenas e milhares, os seus

filhos, e estes dois fatos recordam e proclamam uma grande verdade,

importantíssima na ordem social e moral. Eles dizem que a missão de

educar pertence, antes, de tudo e acima de tudo, em primeiro lugar, à

Igreja e à família, pertence-lhes por direito natural e divino, e por isso

de um modo inderrogável, inatacável, insubstituível” (ROMA, 1929,

p. 8).

A Igreja investiu na “catequese escolar42

”, principalmente por meio da

formação de professores e catequistas com intenção de alcançar a hegemonia religiosa

40

Decreto nº 19.941, de 30 de abril de 1931. Disponível em:

<http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1930-1939/decreto-19941-30-abril-1931-518529-

publicacaooriginal-1-pe.html>. Acesso em: 22 jul. 2016. 41

Encíclica: s.f. 1 carta circular do papa abordando algum tema da doutrina católica (HOUAISS;

VILLAR, 2009, p. 749). 42

Para compreender o significado de catequese escolar é necessário entender que catequese “é um

conceito que diz respeito à ação eclesial, que conduz tanto os indivíduos quanto as comunidades à

maturidade da fé” e catequese escolar foi uma estratégia adotada pela Igreja a fim de transformar a

catequese em disciplina escolar e assegurar uma função formativa (ORLANDO, 2013, pp. 69; 73).

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sobre o conjunto da sociedade. Portanto, durante o período investigado, a educação

serviria para que a Igreja Católica reunisse em seu interior uma camada de intelectuais

que a ajudaram, mais tarde, a exercer uma força hegemônica junto a todas as classes,

congregando as massas da sociedade nos apostolados, pastorais e escolas sob sua tutela.

Nesse viés, notamos que, em Porto Velho, o jornal Alto Madeira também relatou a

criação da Prelazia como sendo relevante para toda a população, o que coaduna a ideia

de que os habitantes seriam “favorecidos” pelos benefícios da Igreja.

[...] o Exmo. Sr. Dr. Superintendente Municipal recebeu do ilustre Sr.

Monsenhor Pedro Massa um telegrama comunicando a criação de uma

Prelatura Apostólica nesta cidade, acontecimento de significativa

importância que não pode passar despercebido ao apreço da nossa

população católica, que o terá com muita relevância para o seus

sentimentos religiosos. [...] Na sua última viagem à Roma, Monsenhor

Pedro Massa tratou com vivo interesse desse assunto, conseguindo

como se vê, a criação de uma Prelatura para esta cidade, prestando

assim um grande serviço à região do Madeira, cujos habitantes dentro

de pouco tempo fruirão os seus benefícios. É motivo pois, de grande

contentamento para todos nós, tão auspiciosa notícia; e, ao tempo em

que transmitimos parabéns à nossa população por este notável

acontecimento, felicitamos igualmente ao Rvmo. Padre Dr. Raymundo

Oliveira, digno pároco desta freguesia e ao ilustre Monsenhor Pedro

Massa, por verem realizada ideia que tão nobremente defenderam

(ALTO MADEIRA, 1925, p. 1).

Pensamos que o investimento que religiosos e autoridades locais estavam

destinando à criação da diocese apostólica em Porto Velho foi um instrumento eficaz

para empreender um projeto de cristianização no local, o que acabou contribuindo

diretamente para a propagação da fé católica na região. Um aspecto importante que deve

ser considerado é que a imprensa, como um meio de comunicação, acabava cumprindo

um papel de apoio à vinda dos religiosos ao local e discernindo o acontecimento como

uma benfeitoria, algo grandioso e auspicioso para a população.

Azzi (2002, p. 341) relatou que “foram enviados para Porto Velho alguns

missionários em repetidas visitas apostólicas, destacando-se os padres Antônio Carlos

Peixoto e Nicoletti; estes procuraram desde logo fundar os primeiros centros de missão

em Porto Velho e Guajará-Mirim”.

Em 1930, as FMA chegaram à região de Porto Velho. A vinda das Irmãs

Salesianas foi dirigida pelos padres Antônio Carlos Peixoto e João Nicoletti,

missionários que desde cedo procuraram fundar os primeiros centros de missão

salesiana em Porto Velho e Guajará-Mirim (AZZI, 2002, p. 341).

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Ressaltamos que na cidade de Porto Velho ainda não havia escolas religiosas, e

intuímos que, tampouco, escolas bem estruturadas ou com frequência significativa de

alunos. A região ainda era pouco habitada, encontrava-se em desenvolvimento, havendo

apenas um pequeno comércio e poucas famílias que se dedicavam a enviar seus filhos

para as escolas.

Segundo Gomes (2007), o desenvolvimento tanto do município de Porto

Velho, quanto da Empresa Madeira-Mamoré “impulsionou melhorias na educação

formal da região, requisitando escolas para os filhos dos trabalhadores” (GOMES, 2007,

p. 49). O autor ressalta ainda que o Governo Estadual investiu na educação somente

anos mais tarde, enquanto isso, as primeiras escolas que iam surgindo na região eram

instituições particulares.

Com isso, as atividades decorrentes das missões salesianas no Brasil iniciaram-

se com a educação e evangelização de povos indígenas como descrito no relatório das

missões salesianas de 1912. O trabalho das FMA, aos poucos, voltou-se também para o

atendimento às atividades de saúde e educação da população desassistida das regiões

Centro-Oeste e Norte e que se encontrava reunida em centros urbanos como o que

existia no povoado de Porto Velho, à qual cabia “vigiar por toda a educação de seus

filhos, os fiéis, em qualquer instituição, quer pública, quer particular, não só no atinente

ao ensino religioso aí ministrado, mas em qualquer outra disciplina ou disposição,

enquanto estão relacionadas com a religião e a moral”, segundo o Código de Direito

Canônico, cânon 1381 e 1832, como descrito na Encíclica Divini Illius Magistri de 1929

(ROMA, 1929, p. 5).

1.3 As Filhas de Maria Auxiliadora aportam em Porto Velho: revendo o percurso

A instituição das Filhas de Maria Auxiliadora, a partir de 1937, dedicou-se a

formar professoras normalistas rurais. Lembramos que a Escola Normal no Brasil

surgiu da necessidade que o país tinha de formar professores para ensinar no ensino

primário. Para tanto, foram necessárias algumas transformações no ideário social,

político, econômico e cultural para que se consolidasse esse tipo de instituição

educativa.

Destacamos que, desde 1920, católicos e representantes do movimento

escolanovista entraram em contradição, o que originou uma reação dos conservadores

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que se opuseram à política de laicização da escola pública, isto é, “os pensadores

católicos preconizam a reintrodução do ensino religioso nas escolas por considerar que a

verdadeira educação apenas pode ser aquela vinculada à visão moral cristã”. Para eles,

as escolas leigas “só instruem, não educam” (ARANHA, 1996, p. 199).

A “República Educadora” foi maior proposta do Governo Federal para a

democratização do país, a qual entendia a escolarização como alavanca para o

progresso, criando para a sociedade um novo projeto de vida (LEITE, 1999, p. 27).

O governo republicano não buscou desenvolver políticas de educação

destinada às áreas rurais, de modo que, para Sérgio Celani Leite (1999), a sociedade só

vai despertar para a educação rural durante o forte período migratório interno nos anos

de 1910 a 1920, quando um grande número de população rural deixou o campo visando

às áreas onde já havia um processo de industrialização maior (LEITE, 1999, p. 28).

Iraídes Marques de Freitas Barreiro (2010) elucidou sobre esse momento de

migração campo/cidade e de que forma a educação rural passou a ser vista como

possibilidade de valorização de vida no campo com vistas a diminuir grande imigração

nas cidades encaminhando a educação rural para os pressupostos do ruralismo

pedagógico – tendência educacional que confiou aos conhecimentos do homem rural

uma maneira de fixá-lo à terra – e, em 1935, iniciaram os rumores de criação das

escolas normal rural acompanhando os objetivos do ruralismo pedagógico

(BARREIRO, 2010, pp. 28-29).

Segundo Josemir Almeida Barros (2013), a proposta de ruralismo “estava

vinculada ao repensar das ações para o meio rural”, tornando a educação um dos

principais investimentos, entretanto, isso ficou apenas no discurso das autoridades da

época (BARROS, 2013, p. 101). Além disso, esse autor destacou que a reorganização

da forma e conteúdo do novo sistema político republicano fazia parte de proposta dos

setores das elites, havendo uma inversão, pois os princípios que regulamentavam a

República eram diferentes dessa forma estruturante de sistema.

Junto ao advento da transformação resultante dos movimentos da Escola Nova

estava a participação da Igreja nesse contexto. Segundo Dóris Bittencourt Almeida

(2005), os setores da Igreja participaram ativamente nesse momento:

[...] O natural é que fosse um ensino laico, sem interferência religiosa

alguma, e a isso a Igreja se opunha, da mesma forma que também

percebia tendências socialistas pelo fato de estende o acesso à

escolarização a todos. [...] Talvez isso explique os motivos pelos quais

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a Igreja preservou seu lugar no desenvolvimento educacional e

interferiu diretamente nas iniciativas relacionadas ao ensino rural, com

a participação direta na estruturação das primeiras Escolas Normais

Rurais, além de demonstrar constante preocupação em criar escolas

rurais comunitárias, muito antes do Estado tomar qualquer atitude.

Provavelmente, junto com o incentivo à escolarização estava também

o interesse em manter vivos e presentes os ensinamentos da Religião

Católica nos currículos escolares (ALMEIDA, 2005, p. 285).

Com um intenso movimento em favor da educação, os anos de 1930 trouxeram

consigo novo governo, novo presidente, novos instrumentos legais para o âmbito

educacional e várias reformas educacionais tiveram início em diferentes unidades da

federação. Também foi criado o Ministério da Educação e Saúde Pública, cujo foco das

ações da pasta seria as reformas do ensino superior e secundário (RIBEIRO, 1993),

considerado por Capanema que “a fundação do Ministério da Educação e Saúde, cuja

obra, em quinze anos de progressivo desenvolvimento, representa o ponto de partida,

realmente decisivo” para o desenvolvimento da educação brasileira. (CAPANEMA,

1946, p. 1).

A educação brasileira teve maior destaque a partir da década 1930, consoante

Aranha (2006, p. 295), devido aos movimentos dos educadores e iniciativas

governamentais, com a criação do Ministério da Educação e Saúde que foi relevante

para o planejamento das reformas em âmbito nacional e para a estruturação da

universidade. Gustavo Capanema (1946) destacou que o Ministério da Educação e

Saúde, quanto ao ensino, “passou a constituir um centro nacional de estudos e pesquisas

sobre o problema da educação nos seus diferentes ramos e graus” (CAPANEMA, 1946,

p. 1).

A esfera educacional do país, em 1930, “era de uma intensa agitação de ideias

e tendências diversas” (LOURENÇO FILHO, 2002, p. 24). A criação do Ministério da

Educação e Saúde Pública permitiu que fossem planejadas as reformas em âmbito

nacional e, pela primeira vez, empreendeu-se “uma ação planejada que visava à

organização nacional, já que as reformas anteriores tinham sido estaduais” (ARANHA,

2006, p. 305). Ruy Lourenço Filho e Carlos Monarcha (2002) destacou que a criação de

um ministério especializado corporificou novas tendências a serem salientadas, visando

a uma melhor articulação das instituições de educação e cultura em todo o País,

tendendo à organização de técnica e de objetivos nacionais.

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A Reforma Francisco Campos43

configurou um conjunto de decretos que

representaram a retomada da centralização da política educacional pela União. Segundo

Lourenço Filho e Monarcha (2002), o ano de 1931 datou da reorganização do ensino

secundário, substituindo o regime de exames parcelados pelo regime de cursos seriados;

houve a admissão do ensino religioso facultativo44

nas escolas; remodelação do ensino

superior e firmação de um “convênio interestadual” para o levantamento das estatísticas

de educação (LOURENÇO FILHO, 2002, p. 26).

Foi nesse contexto de efervescência e busca pela prevalência dos valores

religiosos na educação que as FMA avançaram para a região do Amazonas e

estabeleceram-se na Prelazia de Porto Velho para auxiliar o Padre João Nicoletti frente

às atividades do Hospital São José45

. O trabalho das FMA voltou-se para o atendimento

às atividades da saúde e educação da população (AZZI, 2002, p. 341).

Assim que fundaram a escola, em 1930, as irmãs estabeleceram o Curso

Preliminar e Elementar na Escola Paroquial. Azzi (1999) destacou que durante o

período inicial das escolas das FMA no Brasil, a organização escolar deu-se com a

abertura apenas do curso primário, nos primeiros anos apenas as séries elementares,

sendo as aulas “ministradas exclusivamente pelas irmãs, não havendo então professoras

externas” (AZZI, 1999, p. 74). No que concerne às bancas examinadoras das provas do

final dos anos, os convidados eram sacerdotes salesianos e algumas figuras

representativas do governo, conforme ressaltou Aluízio Pinheiro Ferreira, na época,

fiscal do governo: “o estabelecimento tem sido franqueado a quantas autoridades se tem

dignado de visitá-lo. Os exames finais de cada ano têm sido presididos por diversas

delas” (FERREIRA, 1937, p. 18).

Nesse período, Porto Velho era uma cidade ainda ambientada em um país rural,

mas que estava prestes a passar por transformações significativas. De acordo com

Almeida (2001, p. 34), após as primeiras décadas do Século XX, houve uma “tendência

43

A Reforma Francisco Campos correspondeu aos Decretos nº 19.850, 19.851 e 19.852, de 11 de abril de

1931, e referiam-se à Criação do Conselho Nacional de Educação, à organização do ensino superior e à

organização da Universidade do Rio de Janeiro, respectivamente. Algumas medidas referentes ao ensino

secundário – Decreto nº 19.890, de 18 de abril de 1931, ensino comercial e regulamentação da profissão

de contador – Decreto nº 20.158, de 30 de junho de 1931, também foram configuradas. 44

Decreto nº 19.941, de 30 de abril de 1931 que dispôs sobre a instrução do ensino religioso em cursos de

escolas primárias, secundárias e normais, em caráter facultativo e que impactava diretamente a

instituição em estudo. 45

O Hospital São José, pela sociedade da época, era visto como uma grandiosa e humanitária instituição

que prestava atendimentos gratuitos para os habitantes da região de “classe menos favorecida da

fortuna” que ali encontrava “o acolhimento generoso dado indistintamente a todos, quer pelo virtuoso

padre João Nicoletti, o incansável velho herói dessa cruzada bendita, como por parte das carinhosas

Irmãs da Caridade, encarregadas do tratamento dos enfermos.” (ALTO MADEIRA, 1931, p. 3).

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irreversível” do aumento da população urbana e diminuição da população das áreas

rurais. A autora destacou que esse contexto era marcado por uma ideia de atraso do

meio rural em relação ao meio urbano.

Embora tenha voltado seus estudos para a região mineira, Barros (2013)

verificou que “a política educacional esteve mais preocupada com o desenvolvimento

de áreas urbanas por ser o rural sinônimo de atraso” (BARROS, 2013, p. 38).

Predominava o pensamento de que para formar a mão de obra que atendesse os

preceitos capitalistas significava incluir o ambiente rural, direcionando a ele toda a

responsabilidade pelo não desenvolvimento, resultando na isolação do meio rural

(BARROS, 2013, p. 77).

A educação rural passou a ser vista como um instrumento capaz de aproximar

o país da modernização, modelando cidadãos adaptados ao seu meio de origem, mas

disseminando conhecimentos assegurados pela cultura das cidades. A utilização do

termo “moderno” refere-se à articulação do discurso que opõe o antigo ao moderno, e

vice-versa, e à exaltação da importância dos feitos republicanos que, implicitamente,

acabou por considerar o tradicional/antigo como algo ruim, atrasado, e o

moderno/recente como algo bom. Desse modo, a modernidade pode ser vista como uma

reação à agressão promovida pelo avanço industrial como dito por Le Goff.

O par antigo/moderno está ligado à história do Ocidente, embora

possamos encontrar equivalentes para ele em outras civilizações e em

outras historiografias. Durante o período pré-industrial, do século X

ao XIX, marcou o ritmo de uma oposição cultural que, no fim da

Idade Média e durante as Luzes, irrompeu na ribalta da cena

intelectual. Na metade do século XIX transforma-se, com o

aparecimento do conceito de ‘modernidade’, que constitui uma reação

ambígua da cultura à agressão do mundo industrial. Na segunda

metade do século XX generaliza-se no Ocidente, ao mesmo tempo que

é introduzido em outros locais, principalmente no Terceiro Mundo,

privilegiando a ideia de ‘modernização’, nascida do contato com o

Ocidente (LE GOFF, 1990, p. 167).

Conforme dito por Barros (2013, p. 74) “o pensamento moderno criou normas

e convenções capazes de racionalizar a escola com objetivos de disciplinar seus alunos e

formar hábitos culturais”. Segundo o autor, nesse período, a educação passou a ser vista

como um empreendimento, de um lado ela significava superar o atraso e, por outro,

fazia parte de um amplo projeto de redenção, afinal cabia modernizar cidades, estado, o

país.

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Durante o período de 1930 a 1935, na Escola Paroquial, observamos, como

reflexo da política nacional, ações educacionais iniciadas a partir de 1930 pelos

salesianos. Para Vargas, a nacionalização deveria atingir o país por inteiro, buscando

integrar as regiões periféricas. Esta integração se operaria por meio de políticas voltadas

à modernização e ao desenvolvimento do interior. Para tanto, criou campanhas como a

“Marcha para Oeste” e os territórios federais, como o Vale do Guaporé nas zonas de

fronteira. Vargas pregava que bastaria “cuidar dessas gerações, defendendo-as contra as

moléstias, preparando-as física e culturalmente, dando-lhes educação moral e cívica

para transformá-las em valiosos fatores do povoamento da região” (VARGAS, 1940, p.

404).

Nesse discurso, Vargas explicitou que a colonização teria uma orientação

técnica, tanto para a escolha das terras, como para a instalação dos colonos e seriam

fundados “núcleos agrícolas, servidos de escolas rurais e aprendizados”, nos quais os

filhos dos colonos recebam instrução e conhecimentos de lavoura.

Saneamento e colonização – Essas possibilidades são evidentes, e o

plano, já delineado de modo geral, compreende duas partes:

saneamento e colonização. O saneamento terá feito com uma

organização técnica de execução progressiva, até conseguirmos

extinguir o impaludismo, existente apenas em algumas zonas do

território amazonense. A propósito, convém observar que o clima da

Amazônia, ao contrário do que muitos pensam, é geralmente salubre e

possui condições favoráveis a uma vida saudável e ao trabalho

produtivo. Prova-o o fato de encontrarmos, a cada passo, famílias

numerosas e uma grande população infantil. O crescimento

demográfico é evidente. E bastará cuidar dessas gerações,

defendendo-as contra as moléstias, preparando-as física e

culturalmente, dando-lhes educação moral e cívica para transformá-las

em valiosos fatores do povoamento da região. É o que queremos fazer

sem perda de tempo. A política povoadora será iniciada com grupos

de nacionais que aqui se fixem e prosperem. Tal colonização também

terá uma orientação técnica, tanto para a escolha das terras, como para

a instalação dos colonos. Fundar-se-ão núcleos agrícolas, servidos de

escolas rurais e aprendizados onde os filhos dos colonos recebam

instrução e conhecimentos de lavoura (VARGAS, 1940, pp. 504-505).

Desse modo, ponderamos que levar a escola ao interior do país era uma das

políticas de modernização pretendidas por Vargas e, portanto, aliou-se aos salesianos,

como no caso em estudo, para conseguir atingir esse fim, logo favorecendo a instalação

da ENRA.

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Ressaltamos a trajetória realizada pelas FMA até chegarem e se instalarem em

Porto Velho e retomamos a origem da Congregação Salesiana a qual criou a Associação

das Filhas de Imaculada que passou a se chamar Filhas de Maria Auxiliadora.

Destacamos que as atividades realizadas pelas religiosas só se tornaram possível após a

criação da Prelazia de Porto Velho pelo Papa Pio XI, em 1925.

De acordo com Louro (2013, p. 443), percebemos que a proclamação da

República se alimentou da necessidade de se construir uma imagem do país que

transformasse seu “caráter marcadamente colonial, atrasado, inculto e primitivo” para

uma concepção de país moderno.

Segundo Almeida (2007), “ao se consolidar, a República acomodou-se ao novo

regime político, reagindo contra a invasão protestante nos campos religioso, político e

educacional”, e começou a estabelecer trabalhos pastorais significativos (ALMEIDA,

2007, p. 40), lutando contra a secularização que fora instalada na América Latina com a

criação de dioceses, novas ordens religiosas, internatos para as filhas das oligarquias,

colégios católicos para meninos e desenvolvimento de obras de caridade. Para essa

autora, “os colégios internos femininos alcançavam somente um público restrito, e as

jovens das famílias abastadas continuaram recebendo uma educação que primava pelo

desenvolvimento das prendas domésticas” (ALMEIDA, 2007, p. 41).

A educação passou, assim, a fazer parte dos discursos dos governantes como

uma forma de civilizar, modernizar as mais distantes localidades. A diferença da

instrução ofertada para homens era explicitamente diferente daquela ofertada para

mulheres.

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CAPÍTULO II

SEMEANDO VALORES: A OBRA DAS FILHAS DE MARIA AUXILIADORA

EM PORTO VELHO

A mulher deve se bater pela liberdade de

consciência e de agir, mas sempre no seu

papel de mãe e de educadora, em que as

suas faculdades e virtudes podem esplender

aos raios refulgentes de uma verdadeira

glorificação. [...] Compenetrem-se todas as

mulheres, que sua missão é nobilíssima. [...]

Legionária no lar, legionária na escola, em

suas mãos encerra o destino da Pátria.

(BARROS, 1931, p. 3)

Trouxemos na epígrafe um texto publicado no jornal Alto Madeira, no dia 4 de

outubro de 1931. Optamos em destacar esse excerto, pois nos parece que traduz o

espírito nacionalista que se espalhava pelo país e que preconizava a imagem e postura

que a mulher deveria exercer na sociedade da época, diante o julgamento do jornal.

Cabia à mulher não só o papel de educadora, como também o de mãe, esposa, uma

“legionária” das virtudes morais, uma missão “nobilíssima”, fosse no lar ou na escola.

Refletimos ser pertinente analisar a instituição em estudo partindo do ponto de

vista histórico. Desse modo, analisamos o processo de fundação e início das atividades

da instituição de ensino administrado pelas Filhas de Maria Auxiliadora, bem como o

desenvolvimento e o percurso da educação ofertada nessa instituição que se voltou para

a educação de moças. Escola Paroquial foi a primeira nomenclatura da escola no ano de

1930.

Quando abordamos a questão da educação das moças, não podemos esquecer a

significativa relação entre educação e a catequese desde os tempos do Brasil Colônia.

Dermeval Saviani (2008, p. 47) investigou a temática e destacou que ao se considerar a

educação como elemento para aculturação, temos na catequese sua “ideia-força”. Para

Saviani, o ato de difundir conceitos religiosos para evangelizar e civilizar um povo com

a intenção de contribuir para um conjunto de mudanças sociopolíticas de uma sociedade

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tem na catequese a sua origem. Para ele, foi a partir da catequese e da instrução que “o

processo de aculturação da população colonial nas tradições e costumes do colonizador”

foi cumprido (SAVIANI, 2008, p. 47). Na instituição em estudo, a catequese também

foi um método utilizado para que as moças seguissem e defendessem a instrução

salesiana na região.

Sobre o catolicismo no Brasil, Thales de Azevedo (2002) realizou estudos que

apontaram o Brasil como a maior nação católica dos nossos tempos:

Poder-se-iam apontar outros de uma melhor integração do catolicismo

brasileiro no corpo da doutrina e da estrutura da Igreja universal.

Alguns dos desenvolvimentos assinalados pelos líderes do

pensamento e da ação religiosa são: 1º) a organização de uma ativa

elite de católicos piedosos e instruídos; 2º) a popularização do culto

eucarístico fomentado pelos grandes congressos eucarísticos nacionais

e diocesanos, os quais promovem o aumento da freqüência dos

sacramentos e uma integração religiosa mais completa de muitas

pessoas, especialmente nos centros urbanos; 3º) a substituição gradual

das antigas irmandades religiosas, [...]; 4º) a expansão do sistema

educacional católico no nível secundário e, no universitário, a criação

de universidades católicas (AZEVEDO, 2002, p. 34).

Esse mesmo autor fez uma ressalva: a partir da proclamação da República, a

Igreja interessou-se em reorganizar sua estrutura e restaurar as ordens religiosas cujas

comunidades haviam sido quase extintas devido ao fechamento dos seus noviciados nas

últimas décadas do Século XIX (AZEVEDO, 2002, p. 35). Podemos ponderar, portanto,

que os salesianos, em particular, as FMA, ao estabelecerem suas atividades educativas

em Porto Velho, intentaram expandir sua área de influência avançando para a região

Norte brasileira com a intenção de dar continuidade às ações salesianas. Dessa maneira,

cogitamos que as FMA encararam as meninas e moças porto-velhenses como aquelas

que deveriam ser instruídas para dar prosseguimento à obra salesiana na região.

Almeida (2007, p. 48) destacou que o catolicismo no Brasil ocupou uma

realidade a qual a religião produziu sentido e tomou um lugar significativo nas

manifestações culturais brasileiras. Não obstante, o Brasil incorporou uma sacralidade

original da “simbologia européia luso-cristã” que assumiu desmensurada proporção.

Em sua obra, Azzi (1999, p. 82) descreveu os princípios católicos que

estiveram diretamente ligados à educação das mulheres, a qual estava restrita ao espaço

doméstico, distante da vida social onde o “risco de perder os valores morais era

considerado mais frequente”. Esses princípios católicos foram escritos em Cartas

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Pastorais pelo bispo Dom Macedo Costa, a partir de um resumo de catecismo de

conduta moral que delineava os valores que a Igreja desejava impor às mulheres.

Obrigações de uma jovem: 1º Ser muito modesta em todas as suas

ações; 2º Andar acautelada a cada passo; 3º Ser grave e sempre

decente nas falas e maneiras; 4º Gostar de estar em casa, e ajudar a sua

mãe; 5º Aplicar-se de contínuo ao trabalho; 6º Raras vezes sair, e só

por necessidade; 7º Aborrecer a vaidade nos vestidos e enfeites; 8º

Evitar conversações indiscretas com pessoas do sexo diferente; 9º

Detestar dissipações e profanos investimentos; 10º Amar os exercícios

de piedade; 11º Ser muito franca, leal e amorosa para com sua mãe, e

não ter segredos para ela; 12º Edificar com bom exemplo e doutrina

seus irmãozinhos menores. (AZZI, 1999, p. 83).

Essas eram as ideias transmitidas a partir de uma educação cristã para as alunas

em escolas administradas por Irmãs Salesianas. Ensinamentos que envolviam os

princípios da virtude da pureza para as jovens solteiras e da mulher casada para o lar e

para o amor de seu marido e filhos.

Parece-nos que as FMA perceberam que a região Norte era pouco cuidada ou

mesmo negligenciada pelos governantes brasileiros. Naquela região inexistiam escolas e

ali poderia ser um campo vasto para que as concepções salesianas prosperassem.

Consoante essa ideia, Ribeiro (1993) apontou que a maioria das mulheres no final do

Século XX eram analfabetas ou, quando muito, conheciam as primeiras letras.

Dado o grau de subordinação da mulher no período, a maioria dessa

faixa da população era analfabeta. Uma pequena parte era

tradicionalmente preparada na família pelos pais e preceptores,

limitando-se, entretanto, às primeiras letras e ao aprendizado das

prendas domésticas e de boas maneiras (RIBEIRO, 1993, pp. 67-68).

Sopesamos que Porto Velho era uma cidade em desenvolvimento. A maioria da

população encontrava-se nos trabalhos da Ferrovia Madeira Mamoré e em pequenos

comércios pelo centro da cidade. As FMA constataram que as moças, em sua maioria,

não eram instruídas. Iniciar atividades com foco para o público feminino poderia atrair o

olhar da sociedade para as iniciativas cristãs e aumentar o prestígio da instituição

salesiana no local. Essa preparação das moças voltava-se à “formação na prática das

virtudes, enobrecimento do espírito com o saber humano, educação pela doutrina

católica e ornamentação cultural”, diretamente ligado ao lugar social que ocupava ou

iriam ocupar as alunas (ORTIZ, 2014, p. 61). Nesse contexto, a autora referiu-se ao

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momento de transição para ingressar na vida urbana, burguesa e letrada e que, portanto,

era repleta de limites e regras.

No que concernia às atividades educacionais, as religiosas FMA também

tinham bem definida a finalidade da educação feminina. Era necessário preparar as

jovens para se inserirem na sociedade urbana, de forma a seguir o padrão de

comportamento considerado aceitável pela igreja. Os governantes das cidades

perceberam que o processo de urbanização e modernização das cidades demandava que

sua população fosse instruída, com isso, passaram a contar com o auxílio das

instituições religiosas para educar as/os jovens. Em Porto Velho, essa educação voltou-

se para a formação das mulheres para que elas instruíssem as novas gerações no

conhecimento das virtudes cristãs, das boas maneiras no espaço doméstico e social

(AZZI, 2008, p. 91).

2.1 A instituição educativa, fundações e origens

Retomando o percurso histórico, em 1929, o Reverendo Padre Antônio

Peixoto46 viajou para Manaus para encontrar as Irmãs Salesianas que estavam para

chegar à prelazia porto-velhense. As primeiras religiosas designadas a constituir a

comunidade da Prelazia de Porto Velho vieram de São Paulo, acompanhadas das irmãs

destinadas às novas comunidades de Manaus e Jaureté (AZZI, 2002). Os padres e as

Irmãs Salesianas instalaram-se em Porto Velho em março de 1930 e tinham como

coordenador de suas atividades o Padre João Nicoletti.

O Revd. Padre Antonio Peixoto encontra-se em viagem, para Manaus,

onde foi ao encontro das Irmãs Salesianas, que deverão chegar em

breve a esta cidade e também se dedicarão a prestar seus valiosos

serviços no nosso Hospital e como, geralmente, são uns verdadeiros

modelos de virtude, muito farão também em benefício dos deserdados

da sorte que, ali, encontrarão grande lenitivo para as suas dores

(ALTO MADEIRA, 1930, p. 1).

Em 1930, as FMA perceberam que havia um vasto campo educacional a ser

explorado e fundaram o Instituto Maria Auxiliadora, doravante denominado IMA, com

46

Padre auxiliar da Prelazia de Porto Velho.

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a intenção de educar e instruir mulheres na cidade de Porto Velho, ofertando uma

educação pautada nos valores salesianos.

Os valores cristãos eram uma referência para a comunidade de Porto Velho e

esses valores continuavam a prevalecer nas escolas, embora desde a proclamação da

República a educação devesse ser laica. Louro (2013) expressou muito bem esse ideário

de boa instrução destinada à mulher a partir de uma educação pautada nos valores

cristãos.

Para muitos, a educação feminina não poderia ser concebida sem uma

sólida formação cristã, que seria a chave principal de qualquer projeto

educativo. Deve-se notar que, embora a expressão cristã tenha um

caráter mais abrangente, a referência para a sociedade brasileira da

época era, sem dúvida, o catolicismo. Ainda que a República

formalizasse a separação da Igreja católica do Estado, permaneceria

como dominante a moral religiosa, que apontava para as mulheres a

dicotomia entre Eva e Maria (LOURO, 2013, p. 447).

A instalação do IMA, em 1930 na cidade de Porto Velho, contou com a

participação da Irmã Carolina Rena, diretora da Comunidade das FMA até 1931, e Irmã

Elizabetta Negri (IMA, 2000). Em 4 de maio do mesmo ano, chegou a Irmã Petrina

Pinheiro responsável por coordenar as atividades pedagógicas e o Oratório Festivo.

O Oratório Festivo, na obra de D. Bosco, para Carlos Nazareno Ferreira Borges

(2005), constituía-se como um ambiente físico de educação, mas era também uma

atividade pedagógica orientada por princípios que se articulavam ao Sistema Preventivo

de D. Bosco, para quem existiam dois sistemas de educar: um sistema repressivo que se

munia da punição, da ameaça, do autoritarismo e outro sistema: preventivo que se mune

da assistência, da persuasão e da afetividade para educar.

Cabe-nos esclarecer que o sistema de ensino salesiano é conhecido até os dias

de hoje como Método de Dom Bosco. O método educativo de D. Bosco tem como

objetivo colaborar no desenvolvimento de consciência crítica que há em cada pessoa,

quer adulto, quer criança, a partir do ensino de Português, as operações básicas da

Matemática, formando não só um aluno, mas um ser humano. O fundamento dessa

forma de ensino é denominado Sistema Preventivo de Dom Bosco, o qual corresponde

às atitudes humanas que podem ser modificadas para o bem a partir de exemplos da

experiência de Jesus com as pessoas, tendo como último recurso o castigo e jamais a

violência, com vistas à prevenção de possíveis erros ou pecados. Desse modo, o ensino

deve se dar a partir do diálogo, perdão e compaixão. Desde a fundação das primeiras

escolas, a Rede Salesiana de Escolas – RSE acompanhou as orientações das leis

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vigentes no país, mas principalmente instituiu o diálogo entre carisma e missão

salesiana com as políticas públicas da educação. Esse método educativo é baseado na

religião e na “amorevolezza”, palavra sem tradução na língua portuguesa que alguns

identificam como bondade. Pode-se dizer que esse é “o evangelho em termos de

pedagogia”47

.

Desse modo, a Escola Paroquial, fundamentada nessa ideologia, na oferta de

ensino no estilo salesiano, Azzi (1999, p. 78) descreveu que “a formação cristã das

meninas era, sem dúvida, a razão principal da atividade educativa das irmãs”. Mais que

instruir os ideais de D. Bosco, tinham como principal meta um objetivo religioso que

era o de “oferecer à sociedade bons cristãos, exemplares na prática de seus deveres

religiosos” (AZZI, 1999, p. 78). Segundo o autor, a Missa e a Prática Sacramental eram

instrumentos indispensáveis para a formação religiosa dos educandos, como forma de

manter fidelidade aos princípios de D. Bosco, princípios estes praticados desde o século

passado na Itália como forma de reafirmação do catolicismo romano. A Prática

Sacramental, em especial, condizia à prática da fé girando em torno de um “eixo

devocional” (ibid.), ou seja, o louvor aos santos, às procissões, romarias, folias de Reis

e das bandeiras do Divino, promessas e benzedores.

As atividades educacionais salesianas, desde o início, foram bem aceitas pela

população de Porto Velho. Ressaltamos que, desde a fundação da escola das Irmãs, a

sociedade acolheu a vinda dos salesianos e a obra das FMA na qual o ensino era

balizado pelo catecismo ministrado diariamente aos filhos e filhas, “pelo infatigável e

bondoso padre João Nicoletti e respeitabilíssimas Irmãs de Caridade, vem formando a

futura geração regional sobre o mais sólido de todos os alicerces, – o pedestal da Moral

Cristã” (ALTO MADEIRA, 1931, p. 1).

Outro documento coletado, a Ata de Inauguração da Secretaria do Instituto

Nossa Senhora Auxiliadora, trouxe uma mensagem registrada e assinada pelo Inspetor

escolar Gonzaga Pinheiro, que destacou a obra que estava sendo feita pelas Irmãs

Salesianas.

Ao penetrar este ambiente edificante de educação, que só os

Salesianos sabem criar, senti-me como que reintegrado em mim

mesmo à sensação intensa da fresca mutação: lei fora, a desordem nas

47

O Sistema Preventivo pode ser identificado como o próprio espírito salesiano. Envolve ao mesmo

tempo, pedagogia, pastoral e espiritualidade. Todas as escolas salesianas seguem o mesmo princípio.

Uma descrição a respeito pode ser encontrada em

<http://www.domboscoitaquera.org.br/dbosco/sisprev.htm>. Acesso em 1 0 de outubro de 2016.

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causas, a vida infrene e tumultuaria no desperdício de saúde

arruinando a moral; aqui, a harmonia da disciplina, o labor da virtude

assegurando a perfectibilidade humana na realização da mulher cívica-

católica, da mulher padrão, que se posta antes a Pátria, voltada para o

Bem, na direção de Deus (IMA, 1931).

O excerto nos parece coerente com a concepção de Georges Duby e Michelle

Perrot (1993, p. 80) quando descreveram que cada país tem suas referências históricas

ou literárias, às vezes religiosas, para se voltarem para as mulheres como as

“semeadoras de valor”, coadunando com a ideia de realização da mulher na moral

cívica-católica, o ideal para a difusão dos valores sociais prestigiados pela sociedade

burguesa e urbana do período em estudo.

Em 1929, os religiosos salesianos aportaram em Porto Velho e, em 1930, as

FMA fundaram o Instituto Maria Auxiliadora. As famílias porto-velhenses receberam

muito bem a vinda desses religiosos e mostravam-se a favor de que os salesianos

dessem continuidade em suas atividades educativas no local. Isso pode ser notado nas

publicações do jornal Alto Madeira e no relato dos visitantes da instituição conforme

consta nos livros de Termo de Visitas da Escola, tanto pais e mães, quanto autoridades

que destacavam as atividades das religiosas no trabalho de formação das moças, uma

educação conservadora e tradicional.

Desse modo, ao definirmos nosso objeto de estudo, buscamos estabelecer

conexões com as várias transformações que a sociedade veio sofrendo e que refletiram

no âmbito educacional, a história da escolarização feminina e as interfaces com a

educação das religiosas salesianas em Porto Velho.

Desde sua fundação, como podemos ver no quadro a seguir, a instituição

passou por inúmeras alterações e arrazoamos que o objetivo dessas transformações tem

sua razão fundamentada no aprimoramento de projetos educativos salesianos, tais como

o Oratório Festivo, Sacramento e Catecismo diário, em consonância com as políticas

públicas, as transformações da sociedade e com a própria instituição no sentido de

arrebanhar mais alunas e alunos no país.

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Quadro 2. Nomes da Instituição e Cursos

Data Legislação Nome da instituição Curso

1930 a 1935

Processo nº 4.296/31

Escola Paroquial

Curso Preliminar com

1ª, 2ª e 3ª séries;

Curso Preparatório,

Curso Elementar - 1º,

2º e 3º ano e trabalhos

manuais.

1936

-

Escola Nossa

Senhora Auxiliadora

Curso Preliminar

séries 1ª, 2ª e 3ª;

Curso Elementar - 1º,

2º, 3º e 4º anos, Curso

Médio 1º e 2º anos,

Maternal ou Jardim da

Infância e trabalhos

manuais.

1937 a 1946

Art. 3º Portaria

ministerial nº 378 de

10/out/50

Escola Normal Rural

Nossa Senhora

Auxiliadora

Jardim da Infância (até

1937 e depois em

1941); Curso Normal

1ª, 2ª e 3ª séries (3ª a

partir de 1940);

Curso Preliminar 1ª e

2ª séries; Curso

Elementar 1º, 2º e 3º

anos; Curso

Preparatório e Curso

Definitivo 1º e 2º anos

(a partir de 1939) e

trabalhos manuais.

Portaria ministerial nº

521 de 31/ago/46

Ginásio Maria

Auxiliadora

Departamento

feminino do Ginásio

Dom Bosco

Curso médio.

1947 a 1950

Art. 4º Portaria nº 375

de 16/ago/49

Instituto Maria

Auxiliadora

Curso Primário,

Jardim da Infância,

Curso Elementar,

Escola doméstica,

Escola de pintura,

piano e aula de corte e

costura (trabalhos

manuais).

1951 a 1972 Portaria nº 390 de

17/ago/51

Ginásio Maria

Auxiliadora.

-

1972

Parecer nº 117 do

Conselho Estadual de

Educação de

Rondônia de

20/dez/89

Instituto Maria

Auxiliadora.

-

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1973 a 1997

Parecer nº 117 do

Conselho Estadual de

Educação de

Rondônia de

20/dez/89

Em 1976 Pareceres

034/CTE de 1976 e

043/CTE de 1976*

Instituto Maria

Auxiliadora.

Ensino fundamental:

1º grau menor (1ª a 4ª

série, no Laura Vicuña

de 1973 a 1976); 1º

grau maior (5ª a 8ª

série, no IMA);

Ensino Médio, de

acordo com a Lei

5.692/71.

-

*1976 adicionou o 2º

grau profissionalizante

(Magistério –

professores de 1ª a 4ª

séries, de 1976 a

1983); e Curso de

Laboratorista de

Análises Clínicas (de

1976 a 1980)*.

1998 a 2000

Lei Nacional 9.394/96

Instituto Maria

Auxiliadora.

Ensino Fundamental,

de 5ª a 8ª séries

(matutino e

vespertino); Ensino

Médio, três anos do 1º

a 3º ano (matutino e

vespertino – neste, só

até o 2º ano).

A partir de agosto de

2000 ofereceu o Curso

Pré-Vestibular

(vespertino);

Alfabetização de

Adultos (noturno).

2001 a 2017

Processo 094/01,

Parecer 008/02 e

Resolução 007/02

Instituto Maria

Auxiliadora

Ensino Fundamental

de 1ª a 4ª série. A

partir de 2008, Ensino

Fundamental com

duração de 9 anos no

sistema gradativo;

Ensino Médio.

Fonte: Acervo do IMA. Porto Velho/RO.

No quadro 2, observamos as denominações e cursos do Instituto Maria

Auxiliadora ao longo dos anos. Observe que no período pesquisado, de 1937 a 1946, a

escola denominou-se Escola Normal Rural Nossa Senhora Auxiliadora com a Portaria

Ministerial nº 378 de 10 de outubro de 1950 e ofertou os cursos: Jardim da Infância, que

durou apenas o ano de 1937 e retornou em 1941; o Curso Normal de 1ª a 3ª séries,

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surgindo a 3ª apenas em 1940; o Curso Preliminar de 1ª a 2ª séries; Curso Elementar do

1º ao 3º ano; Curso Preparatório, o qual tinha como foco capacitar as alunas para

adentrarem ao Curso Normal ou Ginasial; Curso Definitivo, do 1º ao 2º ano e trabalhos

manuais.

Segundo o Histórico do IMA, além das atividades na escola e no hospital, as

Irmãs também deram início ao Catecismo diário com 80 jovens e à Associação dos

Santos Anjos com 10 crianças. Azzi (1999, p. 79) descreveu que para promover a

formação religiosa das alunas era necessário adotar duas associações – neste caso, a dos

Santos Anjos e da “Pia União das Filhas da Imaculada” – as quais, no IMA, contou com

a participação de 24 jovens e a Irmã Carolina Rena como presidente da União.

Em 1931, um aspecto relevante compôs o cenário educacional brasileiro. O

Decreto nº 19.941, de 30 de abril de 1931, dispôs sobre a instrução do ensino religioso

em cursos de escolas primárias, secundárias e normais, ainda que em caráter facultativo.

Art. 1º Fica facultado, nos estabelecimentos de instrução primária,

secundária e normal, o ensino da religião. Art. 2º Da assistência às

aulas de religião haverá dispensa para os alunos cujos pais ou tutores,

no ato da matrícula, a requererem. Art. 3º Para que o ensino religioso

seja ministrado nos estabelecimentos oficiais de ensino é necessário

que um grupo de, pelo menos, vinte alunos se proponha a recebê-lo.

Art. 4º A organização dos programas do ensino religioso e a escolha

dos livros de texto ficam a cargo dos ministros do respectivo culto,

cujas comunicações, a este respeito, serão transmitidas às autoridades

escolares interessadas. Art. 5º A inspeção e vigilância do ensino

religioso pertencem ao Estado, no que respeita a disciplina escolar, e

às autoridades religiosas, no que se refere à doutrina e à moral dos

professores. Art. 6º Os professores de instrução religiosa serão

designados pelas autoridades do culto a que se referir o ensino

ministrado. Art. 7º Os horários escolares deverão ser organizados de

modo que permitam os alunos o cumprimento exato de seus deveres

religiosos. Art. 8º A instrução religiosa deverá ser ministrada de

maneira a não prejudicar o horário das aulas das demais matérias do

curso. Art. 9º Não é permitido aos professores de outras disciplinas

impugnar os ensinamentos religiosos ou, de qualquer outro modo,

ofender os direitos de consciência dos alunos que lhes são

confiados. Art. 10. Qualquer dúvida que possa surgir a respeito da

interpretação deste decreto deverá ser resolvida de comum acordo

entre as autoridades civis e religiosas, afim de dar à consciência da

família todas as garantias de autenticidade e segurança do ensino

religioso ministrado nas escolas oficiais. Art. 11. O Governo poderá,

por simples aviso do Ministério da Educação e Saúde Pública,

suspender o ensino religioso nos estabelecimentos oficiais de

instrução quando assim o exigirem os interesses da ordem pública e a

disciplina escolar (BRASIL, 1931, p. 1).

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Conforme observado, a Igreja obteve vitória com a promulgação do Decreto nº

19.941, de 30 de abril de 1931, ao tornar facultativo o ensino religioso nas escolas

públicas. Percebemos que a criação desse decreto significou maior autonomia da Igreja

no setor educacional. Segundo Saviani (2008), essa, dentre a criação de outras medidas

do início do governo provisório, acabou resultando no tratamento da educação como

questão nacional convertendo-se em objeto de regulamentação nos seus diversos níveis

e modalidades.

O Decreto nº 19.941, introduzindo pela primeira vez na história da República o

ensino religioso nas escolas oficiais e, de acordo com Saviani (2008, p. 196), “o novo

ministro atendeu a uma insistente reivindicação da Igreja Católica”. Para o autor,

parecia contraditória a aliança do Estado com a Igreja, ao tentar explicar como um

adepto do escolanovismo, assumindo o posto de autoridade máxima dos assuntos

educacionais da República, tomou uma medida em benefício da Igreja Católica.

Por um lado, essa situação não se configurava tão estranha, uma vez

que estava respaldada por importantes precedentes históricos, como se

pode ver pelos processos de restauração na Europa em meados do

século XIX. O exemplo mais contundente desse fenômeno deu-se na

França, onde a burguesia, após ter atacado violentamente a Igreja

enquanto componente do “Antigo Regime”, a ela se aliou diante do

temor do avanço do movimento operário. E no Brasil das décadas de

1920-1930 também estava em causa esse temor num momento em que

se procurava converter a questão social de caso de política, como fora

tratada na República Velha, em questão política. E a Igreja aparecia,

aí, como um antídoto importante com sua doutrina social, formulada

na Encíclica Rerum Novarum, de Leão XIII, em 1891, e reiterada por

Pio XI na Encíclica Quadragesimo Anno, promulgada exatamente em

1931 para comemorar os quarenta anos da Rerum Novarum

(SAVIANI, 2008, p. 196).

Apoiada no modus operandi de inspirar na sociedade o sentimento de caridade

e solidariedade social, a Igreja Católica beneficiou-se e obteve a hegemonia frente a

outras ordens religiosas do campo educacional no Brasil mobilizando-se ao lado do

governo e empenhando forças católicas para o controle da ordem social.

Naquele momento, o cenário educacional brasileiro encontrou-se atendendo

aos interesses da Igreja Católica no que se referiu aos assuntos no âmbito da política

educacional. Podemos considerar esse fato como o que Aranha (2006) destacou ser uma

força conservadora politicamente representada. Segundo a autora, os pensadores

católicos movimentavam-se contra a tendência laica instalada pela República e,

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considerando que a verdadeira educação devia estar vinculada à orientação moral cristã,

apregoavam a reintrodução do ensino religioso nas escolas, e assumiam o receio de uma

escola de caráter comunista. Dessa maneira, parece-nos que esse fato acabou

fortalecendo a influência que a Igreja exercia socialmente e, principalmente, no que se

referiu à educação moral, cívica e religiosa.

Almeida (2007) também fez considerações acerca do decreto da instrução do

ensino religioso em cursos de escolas primárias, secundárias e normais. Para essa

autora, a Igreja procurou ocupar postos no governo e ampliou as atividades religiosas no

país.

Nos anos 30/40 do século 20, inaugurou-se uma era mais harmoniosa

entre igreja e Estado, com consequente retomada de poder católico, o

que se deu por meio da ação coordenada dos bispos, com a ocupação

de postos no governo por homens católicos, a atividade dos religiosos

leigos, a fundação e ampla divulgação de revistas eclesiásticas. [...]

Com isso iniciou-se uma nova colaboração entre igreja e Estado

(ALMEIDA, 2007, p. 96).

Ao tratar do pertencimento de um conhecimento histórico como componente

do presente, Certeau (1982, p. 143) apresentou as determinações que a história social

exerce e que a história religiosa acaba se tornando tanto vítima como beneficiária dessas

imposições. Nesse contexto, o autor abordou como o “setor definido como ‘religioso’”

ensina sobre uma sociedade. Para o autor, é necessário compreendermos que os

fenômenos religiosos são sempre algo além do que eles nos são apresentados.

Nesta perspectiva “compreender” os fenômenos religiosos é, sempre,

perguntar-lhes outra coisa do aquilo que eles quiseram dizer; é

interrogá-los a respeito do que nos podem ensinar a respeito de um

estatuto social através das formas co-letivas ou pessoais da vida

espiritual; é entender como representação da sociedade aquilo que, do

seu ponto de vista, fundou a sociedade (CERTEAU, 1982, p. 143).

Dessa maneira, buscamos entender o cenário que envolveu as atividades

pedagógicas da Congregação Salesiana na criação de uma escola para meninas na

capital de Rondônia. Compreendemos que método e pedagogia salesiana se referiam à

prevenção do mal, antecipando o bem. Isso significa colaborar para que tanto o adulto

quanto a criança tenham consciência de sua realidade, dando conta dos perigos e de suas

capacidades. Outra característica explorada era a tarefa de instruir pelo bem, isto é, os

conhecimentos técnicos eram ofertados aliados às virtudes que deveriam ser

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exercitadas, tais como, a caridade e a obediência às normas católicas, ou seja, a moral

religiosa.

Delineamos caminhos para tentar explicar as conexões que se estabeleceram

entre a resistência de uma cultura pautada na doutrina católica e as aspirações, costumes

e vida social almejada para as mulheres aqui no Brasil, já que a influência da Igreja

Católica no âmbito educacional fica-nos evidente, principalmente, no que diz respeito à

escolarização feminina, como discutido por Louro (2013) e Almeida (2007).

Louro (2013) ressaltou que mesmo que a proclamação da República

representasse a separação da Igreja Católica do Estado, seria conservada como

dominante a moral religiosa, apontando para as mulheres a dicotomia entre Eva e Maria;

- Eva, a diabolização da mulher, símbolo do pecado e da tentação e Maria, a Virgem,

pura e inocente mulher - uma escolha que representava “uma não escolha, pois se

esperava que as meninas e jovens construíssem suas vidas pela imagem de pureza da

Virgem”, implicando em um ideal feminino voltado para o recato e pudor, “a busca

constante de uma perfeição moral, a aceitação de sacrifícios, a ação educadora dos

filhos e filhas” (LOURO, 2013, p. 447).

Para nos auxiliar na compreensão sobre a instrução e educação que era imposta

às mulheres, os estudos de Almeida (2007, p. 90) assinalaram que “das mulheres

esperava-se a permanência no espaço doméstico, o recato, a submissão, o acatamento da

maternidade” como o maior dos sonhos de consumo.

Na educação feminina permaneciam as tradições religiosas que

giravam em torno do destaque das prendas domésticas, como bordado,

falar francês, saber dançar, tocar piano, conversar, com recato,

conhecer as regras de etiqueta, enfim, o que se esperava que uma

mulher soubesse antes do casamento (ALMEIDA, 2007, p. 97).

Almeida (2007) assinalou ainda que a mulher era educada, principalmente,

para ser “o esteio moral da família”, as que preservariam a tradição e perpetuaria as

regras religiosas. Esses ensinamentos tinham efeito direto, principalmente, nos

momentos de comemorações de datas festivas e cívicas, ou a simples exposição das

alunas nesses momentos de celebração em que poderiam apresentar-se de forma

disciplinada, organizada e a instituição poderia apresentar para a sociedade todo o

trabalho que estava sendo desenvolvido com as alunas na escola.

Encontramos outra notícia publicada no jornal Alto Madeira, em 1932 que

confirma essa concepção de ensino. A abertura das aulas de bordado para as senhoritas

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que estivessem interessadas foi publicitada: “Avisa-se aos Srs. Pais, que no dia 1 de

Maio, iniciam-se as aulas de bordado em branco, matizes e fantasia, para as senhoritas

que desejem aprender. Para a matrícula e mais informações à Diretora” (ALTO

MADEIRA, 1932, p. 2). A abertura da Escola de Trabalhos, com atividades de pintura,

bordados, corte e costura, flores e arte culinária reafirmam as expectativas sobre a

conduta feminina impostas pela Igreja Católica.

A escola também organizava as alunas para passeatas e procissões. Essas

comemorações incluíam celebrações do mês de Maria ou Mês Mariano, datas religiosas,

entre outras. Quando se tratava de missas aconteciam no próprio auditório do teatro da

escola.

Organizadas pelas Irmãs, as alunas ocupavam as ruas da cidade com desfiles,

passeatas e procissões. Encontramos no jornal Alto Madeira avisos para celebrar datas

comemorativas, entre elas, o Festival em benefício das Obras da Catedral.

Será levado a efeito no dia de São João, 24 do corrente, no teatrinho

do club Internacional, um festival lírico-musical, promovido pelas

Irmãs Salesianas em benefício das obras da nossa Catedral e como

singela homenagem às virtudes do digno Vigário de Paróquia, Pe.

João Nicoletti. O elenco é composto das alunas da Escola Paroquial e

de meninos de catecismo, os quais, admiravelmente ensaiados, irão

proporcionar honras de agradável humor e fina espiritualidade ao

público porto-velhense, que, de certo, comparecerá em peso para

aplaudir os gentis artistas e contribuir para as obras do grande

santuário de Cristo (ALTO MADEIRA, 1932, p. 1).

Podemos afiançar que era necessária uma formação das moças para os

princípios salesianas. As festas Paroquiais eram momentos nos quais havia a

participação de autoridades da região e a instituição mostrava à população a educação

que oferecia às mulheres, ou seja, momentos nos quais os pais deviam ser convencidos

de que suas moças recebiam uma boa educação.

Conforme estava anunciado, realizou-se na noite de sábado, dia 26 de

novembro, no Club International, a festa do encerramento das aulas

neste ano, da Escola Paroquial Feminina, da Prelazia Apostólica,

dirigida pelas Irmãs de Maria Auxiliadora. Os vastos salões do

Internacional encheram-se completamente tendo comparecido as

autoridades locais, sendo a festa presidida pelo Sr. Cap. Aluizio

Ferreira, sendo representadas pelas alunas da Escola algumas

pequenas comédias, recitativos, etc. terminando pela distribuição de

prêmios às alunas que fizeram exames. Foi uma festa que deixou uma

ótima impressão a todas pessoas que nela tomaram parte, pois assim

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puderam verificar o adiantamento das alunas da Escola Paroquial.

Felicitamos a diretoria da Escola pelo êxito alcançado, e, ao mesmo

tempo, enviamos às meninas que tomaram parte no festival os nossos

parabéns (ALTO MADEIRA, 1932, pp. 1-2).

Quermesse48

também eram realizadas contando com a participação das

estudantes em benefício das obras da igreja e constituíam-se verdadeiros

acontecimentos festivos na cidade, um marco significativo na proposta educativa da

instituição em estudo, mas sempre mantendo a perspectiva de uma educação centrada na

Religião.

Por iniciativa da arquiconfraria Maria Auxiliadora, realizar-se-á na

tarde de hoje, na praça da Catedral, uma quermesse, em benefício das

obras da Igreja. Constituindo esta festividade a nota sensacional do

programa geral da comemoração do Mês Mariano, nesta cidade, é de

presumir que a afluência de visitantes na tarde de hoje à praça da

Catedral seja notável. O programa especial da Quermesse, que consta

de números surpreendentes e inéditos, deixa de ser publicado para

melhor efeito (ALTO MADEIRA, 1933, p. 4).

Percebemos que os eventos eram realizados com finalidade lucrativa e as

alunas eram “usadas” como “atração”. O excerto acima, uma publicação do jornal Alto

Madeira, reforça a concepção de que a Escola Paroquial exercia algumas atividades para

a arrecadação de recursos e, portanto, promovia eventos religiosos, como as quermesses

e outras festividades com o comparecimento das autoridades locais e regionais,

utilizando as alunas como atração.

Retomando o percurso histórico da ENRA, em meio às obras da Prelazia na

cidade, no ano de 1933, a Congregação Salesiana em Porto Velho deu início à

construção do novo edifício estilo internato para meninas órfãs, localizado na rua Duque

de Caxias. Outro prédio seria o que acolheria internas cujas famílias “residentes em

qualquer parte desta região” seriam educadas.

Causou-nos verdadeira surpresa o encontrarmos, dias passados, à rua

Duque de Caxias, uma turma de homens trabalhando no lançamento

dos alicerces de um edifício que, pela área que abrange, se nos

afigurou grandioso. Indagando dos obreiros, laconicamente nos

responderam ser para o Colégio de Meninas. [...] procuramos o

Revmo. Padre João Nicoletti, nosso incansável pároco, que nos

48

Quermesse: s.f. 1 designação dada, nos Países Baixos, às festas paroquiais e às feiras anuais celebradas

com grandes festejos 2 p.ext. qualquer feira paroquial 3 p.ana. feira pública com barracas ao ar livre,

com leilão de prendas e sorteios, ger. com fins beneficentes (HOUAISS; VILLAR, 2009, p. 1592).

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recebeu benevolamente, como de costume, e que se prontificou a dar-

nos os esclarecimentos precisos que, a título de furo jornalístico,

transmitimos aos nossos amáveis leitores que, como nós, estavam na

ignorância dessa construção. [...] Para o custeio de tão avultada

despesa, conta o Revdmo. Prelado, além da dotação decretada pelo

Governo Provisório, como auxílio à Missão Salesiana no Amazonas,

com a cooperação eficiente do Povo e das Autoridades locais que,

reconhecendo os meritórios serviços de ordem moral e material que a

Prelazia vem difundindo nesta região, certamente a não deixarão lutar

a sós, contribuindo cada qual, conforme suas possibilidades

financeiras com o respectivo óbolo para a realização desse vasto

programa, que muito concorrerá para o progresso e embelezamento de

Porto Velho (ALTO MADEIRA, 1933, p. 1).

Yêdda Pinheiro Borzacov (2007) destacou que desde a chegada das FMA,

tanto os padres como as irmãs idealizavam a construção de um colégio grande, para

atender a população estudantil. No início, as aulas aconteciam em pequenas casas de

taipa49 cobertas de zinco, na quadra 23, terreno doado pela municipalidade, localizado

na Rua Riachuelo – hoje Rua Capelli, com a Av. 24 de Janeiro - atual Rua Paulo Leal,

local no qual a instituição permanece até hoje.

As obras foram iniciadas sob a responsabilidade dos Padres João

Nicoletti e Dr. Antônio Carlos Peixoto. Com três pavimentos, o prédio

se destacava, comparado aos demais da cidade de Porto Velho. [...] As

dependências internas do Instituto são amplas e claras. Após o

vestíbulo de entrada que conserva ainda os móveis originais, vê-se a

escadaria que conduz aos outros pavimentos cujas divisões são as

salas de aula. No grande pátio do andar térreo há um afresco, de

autoria da Irmã Helena Lima Verde, retratando o sonho de D. Bosco –

a congregação salesiana, e a aparição da Virgem Santíssima rodeada

de meninas, na rua Emanuelle, em Turim – Itália, momento em que

sorrindo para D. Bosco exclamou: ‘cuide delas, são também minhas

filhas! (BORZACOV, 2007, p. 131).

Em 1º de março de 1935, o IMA passou a ocupar o prédio próprio no local

onde a escola está localizada ainda hoje. O Fiscal Escolar, Aluízio Pinheiro Ferreira,

relatou ao Diretor do Departamento de Educação e Cultura do estado do Amazonas que

o prédio da escola era “um grande prédio, situado em um dos pontos mais altos e

pitorescos, [...] é sem favor o mais majestoso que existe nesta cidade” (IMA, 2000, p.

6).

49

Taipa: sf. tabique, estuque, pau a pique (CUNHA, 2010 p. 619)

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Figura 10: Fachada do Instituto Maria Auxiliadora, 1935

Fonte: Acervo do IMA. Porto Velho/RO.

As aulas passaram a funcionar no novo prédio e, conforme nos mostra a foto e

o relato do Fiscal Escolar Aluízio Pinheiro Ferreira (IMA, 2000), era um prédio

majestoso. A figura focaliza a fachada, de modo a chamar atenção para o específico do

prédio, como as árvores, a calçada para caminhar e sua monumentalidade.

A escolha de construção desse prédio, um edifício monumental para a época,

parece ter como objetivo destacar os investimentos realizados pelos salesianos em uma

edificação construída e planejada para servir ao ensino, mas buscando finalidades

próprias, isto é, ser reconhecido pela população como lugar de ensino, confortável,

asseado e agradável às crianças e aos jovens, uma instituição integrada à igreja e à vida

urbana.

A ENRA serviria como instrumento difusor do ideário de modernização e de

progresso. Rosa Fátima de Souza (1998) mencionou em sua obra “Templos de

civilização: a implantação da escola primária graduada no Estado de São Paulo (1890-

1910)”, na qual se referiu à implantação da escola primária graduada de São Paulo, que

os prédios têm uma função primária, ou seja, uma utilidade prática com funções

secundárias ou simbólicas, o que implica “considerar que os artefatos são indicadores de

relações sociais e como parte da cultura material atuam como direcionadores e

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mediadores das atividades humanas, o que confere aos objetos um significado humano”

(SOUZA, 1998, p. 169).

Também como Souza (1998), podemos notar que o edifício escolar erigido

pelos salesianos em Porto Velho naquela época era “portador de uma identificação

arquitetônica que o diferenciava dos demais edifícios públicos e civis ao mesmo tempo

em que o identificava como um espaço próprio, lugar específico para as atividades de

ensino e do trabalho docente” (SOUZA, 1998, p. 123). Analisamos que naquele deífico

monumental, cuidado por padres e freiras, os porto-velhenses confiaram e permitiram

que suas filhas pudessem estudar.

Essa nossa análise encontra eco nos autores Buffa e Nosella (1996) quando

ressalvaram a importância da representação de uma arquitetura para com a sociedade e

contexto na qual está inserida.

É importante esclarecer que a arquitetura, enquanto expressão

humana, nunca é arbitrária, casual e sim, uma linguagem orgânica aos

valores e potencialidades de uma determinada sociedade. À primeira

vista, é possível não se perceber o significado dos elementos da

composição arquitetônica de um edifício, mas, na verdade, cada

elemento materializa concepções, opções, valores, preocupações

humanas (BUFFA; NOSELLA, 1996, p. 42).

Desse modo, observamos que a construção do novo edifício concretizou o

espírito que os salesianos propunham para a cidade. Uma instituição modelo que estava

disposta a se destacar na região. Um prédio que chamava e ainda chama atenção,

localizado no ponto mais alto do centro da cidade de Porto Velho.

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Figura 11: Área que dá acesso ao salão do Auditório/ Vista de frente e fundo do Auditório

Fonte: Acervo do IMA. Porto Velho/RO.

O grande espaço dos corredores, salas de aula, auditórios representavam a

suntuosidade dos prédios da Congregação Salesiana. Confirmamos com Buffa e Nosella

(1996) que a construção da escola se igualava à construção dos antigos mosteiros e

sinalizava sua a importância para a sociedade.

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Assim como os antigos mosteiros que, pela imponência arquitetônica

externa, sinalizavam para a sociedade o prestígio da vida religiosa,

enquanto o claustro interno abrigava e escondia o cotidiano –

corredores, pátios, portas das salas de aula e dos laboratórios – as

atividades escolares cotidianas, enquanto evidencia à cidade, através

de suas grades externas, sacadas e janelas, escadaria, fachada, a

sacralidade, o prestígio, a autoridade do saber (BUFFA; NOSELLA,

1996, p. 46)

Em Porto Velho, o edifício do IMA representava para a população a disciplina,

organização e conforto que a vida religiosa desfrutava. Do lado de dentro encontrava-se

a “melhor” escola para formação intelectual, moral e espiritual que os pais poderiam

desejar para as jovens da região. Do lado de fora, um templo sacrossanto de moral, de

educação e religião. Percebemos isso a partir das impressões deixadas no Livro Ata de

Inauguração da Secretaria do IMA – Termo de Visita – 1947 (relato de uma senhora que

visitou a instituição):

Foi para mim fonte de mínima satisfação e honra encontrar nesta

cidade, um educandário – pode dizer o melhor – para a formação

intelectual, moral e espiritual da sociedade amazonense. Um

estabelecimento como este com fundadores e mantenedores e serviços

para a civilização. Somente admiração pela virtuosa, piedosas e

religiosas da Congregação Salesiana, me foi dado, com

desvanecimento a “alguma coisa” edificante deste templo sacrossanto

de moral, de educação e religião que é a Escola Nossa Senhora

Auxiliadora, para a população feminina de Porto Velho. Aplausos,

louvores, mestras de completa prosperidade para sua continuação,

merece de toda patriota, de todo cristão, de toda “alguma coisa” esta

obra formidável que forma a harmonia de um concerto sua força, uma

virtude exemplar, uma instrução aperfeiçoada de mulher, apta para

entrar com uma mentalidade nova, uma educação aprimorada, uma

instituição da família, onde é o auge tutelar. O nosso educandário [...]

é majestosa manifestação da boa vontade e do interesse que vem de

Deus, a Prelazia de Porto Velho vem distribuindo o bem,

aperfeiçoando a santidade, onde a doação são os santos ensinamentos

de Cristo. Como disse, é adorável consignar felicitações, pela higiene

moderna que estão fazendo introduzida nesse estabelecimento,

melhorando a pedagogia hoje em dia (AYREDA, 1936, p. 4).

Na descrição da visita, Ayreda (1936) reproduziu a satisfação por ter visitado

um estabelecimento tão imponente como o “educandário” das religiosas da

Congregação Salesiana. Os estudos de Louro (1997, p. 58) contribuíram para

compreendermos os sentidos e representações que a obra transparecia para a sociedade.

Segundo a autora, não só a escola, seus símbolos e códigos instituiu algo a alguém, mas

também “o prédio escolar informa a todos/as sua razão de existir. Suas marcas, seus

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símbolos e arranjos arquitetônicos ‘fazem sentido’, instituem múltiplos sentidos,

constituem distintos sujeitos” (LOURO, 1997, p. 58).

Uma “mentalidade nova”, como dito por Ayreda (1936), parece-nos que se

refereao preparo as jovens para serem boas esposas, mães e professoras que

transmitissem a educação pautada nos valores e princípios cristãos para a infância.

Tratava-se de deixar de lado algo antigo, como por exemplo, o distanciamento que

havia das mulheres para a educação e a busca por algo novo, o acesso da mulher à

educação e como ela deveria ser instruída ao ter acesso ao letramento e instrução, a fim

de acompanhar as mudanças que estavam ocorrendo em um país que se queria

articulado ao mundo moderno, oferecendo, também para as mulheres, a instrução e

letramento, ambos embasados na ideologia cristã. A mentalidade nova pode ser

equiparada ao que Le Goff (1990, p. 191) se referiu à modernidade, ou seja, o impulso

para a criação, ruptura com o antigo, com aquilo que estava em vigor nos anos

anteriores à República.

Quanto às leis que vigoravam no país, nesse contexto, encontramos a

Constituição de 1934, expressando um momento de anseio pela mudança e assinalando

duas tendências ideológicas predominantes no campo educacional comandadas pelos

católicos e os liberais. O Artigo 153 da Constituição de 1934 assinalava que o ensino

religioso continuaria de frequência facultativa e ministrado de acordo com os princípios

da confissão religiosa do aluno manifestada pelos pais ou responsáveis, e constituiria

matéria dos horários nas escolas públicas primárias, secundárias, profissionais e

normais.

De acordo com o Decreto nº 19.941 de 30 de abril de 1931, conforme o artigo

1º era facultado nos estabelecimentos de instrução primária, secundária e normal, o

ensino da religião e segundo o artigo 2º poderia haver dispensa às aulas de religião para

os alunos cujos pais ou tutores, no ato da matrícula, a requeressem. (BRASIL, 1931).

O Artigo 154, da Constituição de 1934, previa que os estabelecimentos

particulares de educação, gratuita primária ou profissional, oficialmente considerados

idôneos, seriam isentos de qualquer tributo. O parágrafo único do Artigo 156 previa que

para realizar o ensino em zonas rurais, a União reservaria no mínimo, vinte por cento

das cotas destinadas à educação no respectivo orçamento anual (BRASIL, 1934).

Pensamos que esse possa ter sido um dos motivos que levaria a escola a se denominar

Escola Normal Rural Nossa Senhora Auxiliadora, em 1937.

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Segundo Otaíza de Oliveira Romanelli (1978), a questão do ensino religioso

poderia ser considerada uma questão de ordem secundária na evolução do sistema

educacional brasileiro se não tivesse havido lutas ideológica no país que envolveram o

período. A autora destacou que essas lutas tiveram o ponto culminante no início dos

anos de 1930 ao serem retomadas as questões das reformas educacionais que

começaram a serem implantadas em alguns estados e assumirem um perfil renovador de

educação que dava ênfase à necessidade de se laicizar o ensino.

Porto Velho ainda era unidade administrativa do estado do Amazonas e, em

sua maioria, seguia também, portanto, as decisões quanto às leis e decretos educacionais

e administrativos em vigor naquele estado. De acordo com a Constituição promulgada

de 1935 do Amazonas, assuntos referentes à Educação e Cultura seguiriam as diretrizes

traçadas pela União, visando combater o analfabetismo dentro do seu território,

organizando o ensino em todos os graus, incentivando o desenvolvimento das letras e

das artes, das ciências e da cultura em geral (AMAZONAS, 1935, p. 324).

[...] Art. 148 - O ensino primário integral dos menores, brasileiros ou

estrangeiros, será gratuito, cabendo à família e aos poderes públicos a

responsabilidade de proporcioná-los, de acordo com as normas gerais

traçadas pela União e com o sistema educativo organizado e mantido

pelo Estado. [...] Art. 149 – Nos estabelecimentos de ensino público

de qualquer categoria, tornar-se-ão obrigatórios os exercícios

ginásticos, devendo ser estimulada e fiscalizada a prática dos

desportos nas instituições particulares. [...] Art. 151 – O ensino

religioso será facultativo e administrado de harmonia com os

princípios da confissão dos alunos, manifestada por seus pais ou

responsáveis, e constituirá matéria dos horários nas escolas públicas

primárias, secundárias, profissionais e normais, desde que um grupo

de vinte estudantes pelo menos, se proponha a recebê-lo. [...] Art. 154

– Fica instituído o Conselho de Educação, com funções similares às

do mesmo órgão nacional e atribuições definidas em lei. Art. 155 – De

suas receitas orçadas, o Estado e os municípios, respectivamente,

aplicarão nunca menos de 20 a 10% da renda dos impostos na

manutenção e no desenvolvimento do ensino (AMAZONAS, 1935,

pp. 324-325).

A Constituição de 1937, Artigo 133, prescreveu que o ensino religioso poderia

ser contemplado como matéria do curso ordinário das escolas primárias, normais e

secundárias, não podendo, porém, constituir objeto de obrigação dos mestres ou

professores, nem de frequência compulsória por parte dos alunos (BRASIL, 1937).

Romanelli (1978) também fez ressalvas acerca do ensino religioso nesse período:

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Além da laicidade, o movimento renovador reivindicava a

institucionalização da escola pública e sua expansão, assim como a

igualdade de direitos dos dois sexos à educação. Estes três aspectos –

laicidade, obrigatoriedade do Estado de assumir a função educadora e

a coeducação – constituíram o pomo da discórdia entre os educadores

que, pela Associação Brasileira de Educação, acorriam às

Conferências Nacionais de Educação. Logo, dois grupos se definiram:

o dos que promoviam e lideravam as reformas e o movimento

renovador, e o dos que, em sua maioria católicos, combatiam

sobretudo os três aspectos acima citados. A Igreja Católica, que até

então praticamente monopolizava, no Brasil, o ensino médio, estava,

desde a proclamação da República, agastada com a laicidade do

ensino, instituída pela 1ª Constituição Republicana (ROMANELLI,

1978, p. 143).

Agastada com o avanço da laicidade, a Igreja Católica ameaçada de perder o

seu quase monopólio, tratou de abrir escolas para que pudesse conquistar fieis e

conseguir garantir a sua manutenção em solo brasileiro.

No que se refere às exigências do ensino religioso, por ser uma instituição

salesiana de ensino, esse ensino era obrigatório, além de outras atividades como o

catecismo, Sacramento diário e Oratório Festivo, todas essas atividades envolviam os

ensinamentos e educação pautados em valores cristãos.

2.2 Escola Paroquial (1930-1935)

Retomando a origem da história da Escola Normal Rural Nossa Senhora

Auxiliadora, a Escola Paroquial Nossa Senhora Auxiliadora foi seu início, cujos

princípios e objetivos sempre se mantiveram pautados nas crenças professadas pelos

salesianos, o que a diferenciava das escolas públicas republicanas brasileiras, cujos

princípios naquele período eram difundir os valores republicanos e comprometer-se com

a “construção e a consolidação do novo regime”, as escolas públicas eram

características “da República e para a República”, havia um vínculo entre educação

popular e novo regime que era exaltado por profissionais da educação (SOUZA, 1998,

pp. 27-28).

Ao estabelecerem-se em Porto Velho, consoante o Histórico da instituição, as

primeiras Irmãs a iniciarem as atividades desempenharam-nas “com muito empenho,

esforço e audácia apostólica em prol da juventude, numa escola paroquial com

aproximadamente 30 crianças” (IMA, 2000). A chegada das FMA na cidade de Porto

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Velho e o início das atividades educacionais para com as jovens da região foi motivo de

orgulho para a população local. Outro visitante deixou suas impressões no livro Termo

de Visita, em 1933, confirmando como a escola era bem vista pela sociedade porto-

velhense.

É com desvanecido jubilo que assinalo nesta pagina a ótima impressão

colhida, a visita que hoje fiz, ás escolas Salesianas de Porto Velho.

Dia de exames, em que professores e alunos comungam da mesma

sensação de respeito e afeto mútuo, respira-se, nesse mesmo tumulto

de alegrias, o ar da disciplina, da ordem, de veneração recíproca por

todos cultivada. O aproveitamento do ano escolar, demonstrado por

todos os alunos arguidos, surge logo como índice da sábia organização

salesiana, no afã magnânimo de expandir bondade e educação por

onde quer que se lhe note a estadia. Efetivamente, é de elogiar-se sem

reservas tudo o que se vê neste ambiente cristalino, de pura moral

cristã, onde salienta-se a dedicação das eméritas educadoras que

dirigem o conceituado Colégio de N. S. Auxiliadora. Com os meus

mais acentuados aplausos á grandiosa obra de preparar os meus

pequeninos patrícios para os dias incertos de amanhã, - é – me

gratíssimo deixar aqui consignados os meus ardentes votos pela

crescente prosperidade de tão distinguidos templos da instrução

(RAMOSISIFAV, 1933, p. 2).

No primeiro ano da Escola Paroquial, além das aulas de catecismo e Oratório

Festivo, funcionavam as aulas de trabalhos manuais e pintura. Borzacov (2007)

assinalou que durante muitos anos, além da administração pedagógica e do hospital, as

Irmãs “abriram cursos de corte e costura, bordado, pintura, arte culinária e confecções

de flores” (BORZACOV, 2007, p. 130).

No período correspondente aos anos de 1930 a 1935, com o Processo de nº

4.296 de 1931, as FMA deram início às atividades a Escola Paroquial, ainda sob a

direção da Irmã Carolina Rena. A partir do ano de 1932 até o ano de 1937, o Instituto

Maria Auxiliadora esteve sob a direção da Irmã Caterine Capelli (IMA, 2000).

Encontramos em 1931 uma notícia do jornal Alto Madeira fazendo um

comunicado sobre o início das aulas em 1º de maio de 1931, sob a direção das Irmãs

Salesianas de D. Bosco.

A 1º de Maio abrir-se à as aulas da Escola Paroquial confiada às irmãs

salesianas de D. Bosco. O ensino abrange o curso preliminar e

elementar. Advertências: 1º Não se admitem alunas com ida de menor

de sete anos. 2º As alunas devem ser fornecidas de farda e apresentar-

se diariamente decentemente trajadas. 3º Os pais contribuirão com a

cota de 5$000 mensais. A diretora. (ALTO MADEIRA, 1931, p. 2).

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Ressalvamos que, apesar de obterem um perfil de “irmãs de caridade”,

notamos que as FMA cobravam pela atividade oferecida à população. No trecho

destacado identificamos a advertência assinalada logo abaixo do aviso de abertura das

aulas, a qual constava que os pais deveriam contribuir com uma cota mensal de 5$000

réis, o que contradiz ao apresentado no histórico da instituição, o qual alegava que as

Irmãs estavam fundando uma escola sem fins lucrativos. A esse respeito, encontramos

nos estudos de Boris Fausto (1995, p. 339) o conhecimento de que era comum que as

escolas religiosas fossem subvencionadas pelo Estado. Isso é confirmado com o Decreto

nº 16.728ª de 13 de janeiro de 1925.

[...] à Seção do Ensino cabe o estudo de todos os assuntos peculiares

aos estabelecimentos federais de ensino superior e secundário e a estes

equiparados, às escolas e estabelecimentos de ensino científico,

literário, artístico e profissional, subordinados ao Ministério da Justiça

e Negócios Interiores, subvencionados, mantidos ou fiscalizados pela

União, e aos institutos de ensino primário por esta subvencionados,

assim como a fiscalização dos estabelecimentos de ensino particular,

como for regulada (Art. 8º). Art. 11. A Seção do Ensino organizará a

estatística do ensino, compreendendo o ensino primário

subvencionado, o profissional, o artístico, o secundário e o superior,

subordinados ao Ministério da Justiça e Negócios Interiores, assim

como os estabelecimentos particulares de ensino primário, secundário

e superior. [...] Capítulo III – Do ensino primário. Art. 24. O Governo

da União, com o intuito de animar e promover a difusão do ensino

primário nos Estados, entrará em acordo com estes para o

estabelecimento e manutenção de escolas do referido ensino nos

respectivos territórios. Art. 25. Os acordos obedecerão ás seguintes

bases: b) as escolas subvencionadas serão de natureza rural; [...]

(BRASIL, 1925, p. 2).

Em 1932, o comunicado que encontramos referiu-se ao Curso Preparatório e

Elementar abrangendo o 1º, 2º e 3º anos:

Avisa-se aos senhores pais que a Diretora das Irmãs Filhas de M.

Auxiliadora, aceita a matrícula de meninas, todos os dias úteis para

curso preparatório, e do Primeiro, Segundo e Terceiro elementar. As

aulas começarão a 15 de Fevereiro. A taxa escolar ficou reduzida para

4$000 mensais. A diretora. Nota – Não se admitem meninas trajando

os exageros da moda (ALTO MADEIRA, 1932, p. 2).

Constatamos, assim, que as matrículas eram efetuadas pela secretaria da

instituição e, ao depararmo-nos com os livros de matrículas encontrados na instituição,

confirmamos que as matrículas eram registradas em livros próprios, com dados como

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nome, filiação, naturalidade, idade, local de residência, datas de matrículas anteriores e

atuais e observações, este último referia-se à série que a aluna estava cursando e a

escola e série que frequentou o ano anterior.

Os livros de matrículas nos apresentaram os vestígios necessários para

compreendermos a proximidade ou não das famílias para com a escola, descobrindo

assim a provável condição social em que as famílias das alunas se encontravam. Além

disso, o número de alunas matriculadas e de alunas que continuaram na escola nos anos

seguintes, as respectivas séries, possíveis repetências e promoções das alunas nas séries.

Além disso, o livro também informava a procedência das escolas das alunas e, dessa

forma, foi possível descobrir que ao mesmo tempo no qual as Irmãs atuavam na Escola

Paroquial, existiam outras escolas ativas em Porto Velho. O quadro 3 apresenta-nos as

informações contidas no livro Matrícula Geral – 1931 a 1932.

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Quadro 50

3: Livro de Matrícula, 1932

50

Transcrito conforme original, entretanto, as linhas foram transpostas para as colunas para melhor enquadramento do quadro na página.

Nome

61 62 63 64 65

Marina Pereira dos

Santos Madalena Gomes Luzia Bento de Mélo

Raimunda Bento

de Mélo Oneida Sousa

Filiação

Benedito Pereira dos

Santos

Maria dos Santos

Candido Correia Gomes

Elisa Ferreira Gomes

Teofilo Bento de Mélo

Maria de Jesus

Teofilo Bento de

Mélo

Maria de Jesus

Antonio Souza

Isabel de Souza

Naturalidade Porto Velho Jaci-Paraná Porto Velho Porto Velho Porto Velho

Idade 10 ânos 9 ânos 9 ânos 15 ânos 6 ânos

Residência Avenida Osório Rua Julho de Castilho Rua Riachuelo Rua Riachuelo Alto da Favela

Data 1ª Matrícula 1 - 5 - 1931 1 - 3 - 1931 1 - 3 - 1931 1 - 5 - 1931 1 - 3 - 1931

Matrícula atual 16 - 2 - 1932 16 - 2 - 1932 16 - 2 - 1932 16 - 2 - 1932 17 - 2 - 1932

Observações

Anteriormente

frequentava a 1ª série do

Curso preliminar, este

ano frequenta a 2ª série

do mesmo curso.

Anteriormente

frequentava a escola

publica estadual, este âno

frequenta o Curso prel.

Anteriormente frequentava

a escola publica estadual,

este âno frequenta o Curso

prelim.

No âno passado

frequentou a 2ª

serie do 2º ano,

nesta escola, este

âno frequenta o 3º

ano.

Anteriormente

frequentava a escola

publica estadual; este âno

frequenta o Curso

Preliminar.

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102

No período de 1931 a 1935, encontramos no acervo da escola o livro Matrícula

Geral – 1931 a 1932, o qual trazia as seguintes informações: número de matrícula,

nome, filiação, naturalidade, idade, residência, data da primeira matrícula, data

matrícula atual e observações, conforme observamos no quadro 3. No livro Matrícula

Geral – 1933 a 1935 não aparece, contudo, as informações sobre as séries que as alunas

estavam matriculadas, tampouco, se elas eram alunas que deram continuidade na escola

ou se procediam de outras instituições de ensino.

Analisando essas observações, sopesamos que data da primeira matrícula se

referia ao início da vida escolar da aluna e a data da matrícula atual referia-se à data de

matrícula no ano em que foi registrada.

A partir da análise do livro Matrícula Geral – 1931 a 1932 constatamos que,

em 1930, além das atividades de trabalhos manuais, catecismo e Oratório Festivo, as

Irmãs haviam iniciado também as atividades do Curso Preliminar com 1ª e 2ª séries,

bem como do Curso Elementar, com a 1ª classe. Utilizamo-nos dos registros que

constavam o espaço reservado para “observações” do livro de matrículas

correspondente ao ano de 1931 para compreender e abordar o ano de 1930, pois

apareciam informações referentes ao ano escolar anterior a ele, ou seja, a vida escolar

das alunas em 1930 (IMA, 1931-1932).

No primeiro ano de funcionamento da Escola Paroquial, a escola matriculou

alunas com idade entre 5 a 11 anos distribuídas entre o Curso Preliminar e Elementar,

havendo apenas uma aluna matriculada na 1ª classe do ensino Elementar. No ano de

1931, a escola atendeu a 80 alunas matriculadas, 38 no Curso Preliminar e 42 no Curso

Elementar.

Notamos que o maior número de matrículas no ano de 1931, aproximadamente

57%, ocorreu no primeiro dia de aula, enquanto que 21,6% das matrículas ocorreram no

mês de junho, exatamente um mês após o início das aulas. Esse fato pode decorrer de

que alguns pais esperaram para ver se a escola iria se manter, ao mesmo tempo

demonstra o interesse dos pais em matricularem suas filhas, pois o maior número de

matrículas foi feito no primeiro dia.

Aparentemente, em resposta aos chamamentos públicos, como por exemplo, a

notícia do jornal Alto Madeira, citada anteriormente. Ainda em 1931, notamos, também,

que a maioria das alunas eram naturais de Porto Velho. Apenas quatro alunas procediam

de outras localidades, como Santo Antônio, Abunã, Belém e Paraíba. Todas residiam

em casas próximas à escola.

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Não foi possível identificar a profissão ou condição social que essas famílias se

encontravam nos anos de 1930 a 1935. No entanto, como já sabemos que a escola

cobrava mensalidade, consideramos que essas famílias deveriam ter boas condições

financeiras.

Com base no livro Matrícula Geral – 1933 a 1935, os anos de 1933, 1934 e

1935 continham as seguintes categorias: número de matrícula, nome, filiação,

naturalidade, idade, residência, data da matrícula atual e observações. Pudemos analisar

o número de alunas matriculadas e concluintes a partir do livro Matrícula Geral – 1933

a 1935 e livro Atas Finais Promoções – 1932 a 1944 (IMA, 1933-1935).

Quadro 4. Matrículas no período de 1930 a 1935 dos Cursos Preliminar e Elementar 51

Curso Preliminar Curso Elementar

Total

Ano

Mat.

série

Mat.

série

Mat.

série

Total

Mat.

classe

Mat. 2ª

classe

Mat.

classe

Total

1930 6 1 9 16 1 0 0 1 17

1931 16 6 16 38 20 18 4 42 80

1932 23 24 4 51 28 24 8 60 111

1933 - 19 6 25 12 16 6 34 140

1934 - - 15 15 6 12 11 29 175

1935 - - - - 13 7 11 30 170

Fonte: Livro de Matrícula Geral – 1931 a 1935. Acervo do IMA. Porto Velho/RO.

Em consonância com os livros de Matrícula Geral dos anos de 1931 a 1935

fontes encontrados e coletados, pudemos identificar duas situações. Conforme

observado no quadro 3, no ano de 1933 encontramos alunas matriculadas que estudaram

em 1932 (e continuaram em 1933) e alunas novatas. Dessa forma, em 1933, a ENRA

contava 59 estudantes que haviam adentrado na escola em 1932 e continuaram seus

estudos e 81 alunas novatas. No ano de 1934, adentraram mais 87 alunas novatas e a

instituição passou a atender 175 alunas. O ano de 1935 totalizou 169 alunas

matriculadas. Dentre elas, 80 eram alunas novatas, como apresentado no quadro número

3.

51

Nos anos de 1930 prevaleciam organizações diversas do ensino primário brasileiro com leis dispersas.

Desse modo, inferimos com dados descritos nos livros de Matrículas que ensino preliminar equivaleria

hoje ao ensino primário e ensino elementar equivaleria ao ensino fundamental.

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Quadro 5. Disposição e denominações dos anos e séries dos Cursos Preliminar e Elementar

Curso Preliminar Ano Curso Elementar

1ª, 2ª e 3ª séries 1930-1931 1ª, 2ª e 3ª classes

1ª e 2ª séries

1932

1º ano; 1ª e 2ª séries, 2º

ano; 1ª e 2ª séries e 3º ano;

1ª, 2ª e 3ª séries

Fonte: Acervo do IMA. Porto Velho/RO.

Analisando o livro de matrículas, notamos que houve uma mudança com

relação à nomenclatura/classificação das séries e classes dos cursos Preliminar e

Elementar. De 1930 a 1931, as Irmãs referiam-se à distribuição em 1ª, 2ª e 3ª séries do

Curso Preliminar. Para o Curso Elementar, elas referiam-se às distribuições em 1ª, 2ª e

3ª classes. Já, em 1932, as Irmãs referiram-se às seguintes distribuições: 1ª e 2ª séries do

Preliminar. O ensino Elementar passou a ser distribuído em sete séries divididas em 3

classes, 1º, 2º e 3º ano do elementar, cada um com duas séries e este último com três

séries. Muito embora a maioria dos registros utilizassem os “novos” termos, ainda

haviam alguns registros escritos com grafia diferente utilizando os termos usados nos

anos anteriores.

Quadro 6. Concluintes no período de 1930 a 1935 dos Cursos Preliminar e Elementar

Curso Preliminar

Anos

Curso Elementar

Matrícula Concluintes Matrícula Concluintes

- 16 1930-1931 - 1

38 23 1931-1932 42 27

61 30 1932-1933 50 37

- 53 1933-1934 - 48

- 62 1934-1935 - 58

- 33 1935-1936 - 58

49 40 193652-1937 74 64

Fonte: Acervo do IMA, Porto Velho/RO

52

Em 1936 houve 11 matrículas sem registro de séries ou sobre as escolas das quais as alunas procederam.

42 no Maternal, 13 no Curso Médio e 16 registrada como “Pren” quais imaginamos que poderia ser

alunas matriculadas apenas nas atividades de Prendas Domésticas.

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Percebemos a irregularidade no número de matrículas e conclusões dos cursos

nos distintos anos. O ingresso nos Cursos Preliminar e Elementar variava de maior e

menor procura com o passar dos anos, entretanto, o Curso Elementar sempre apresentou

maior número de alunas matriculadas. Parece-nos que isso se deu devido ao número de

alunas que deram continuidade a seus estudos na instituição.

A procura por vagas no Curso Elementar era, em sua maioria, de alunas que

permaneceram nos estudos desde os primeiros anos de atividade da escola. Grande parte

do número de evasões foi percebida por alunas com idade entre 14 e 18 anos, o que nos

permite intuir ter a ver com abandono e não com a reprovação, já que na época, no

Brasil era comum que muitas moças se casassem com essa idade.

Podemos ainda pensar em outros motivos para o grande número de evasão que

poderiam ser citados: impossibilidade dos pais cumprirem com as obrigações das taxas

mensais; o fracasso da proposta pedagógica em curso que não conseguiria atender as

necessidades das moças e suas famílias; descontentamento com os processos de ensino;

a mulher na condição de mãe, esposa e do lar pode ter contribuído para o afastamento

das moças da escola; o sistema de internato que levava alunas a sofrerem com a saudade

da família; uma rotina menos regrada que talvez as moças encontrassem fora da escola e

o modo de pensar da sociedade patriarcal, conservadora e machista da época que

também pode ter contribuído para o impedimento da conclusão do curso.

As fontes, livros de Matrículas confirmaram-nos que a evasão não se deu

devido à reprovação, pois tivemos acesso aos livros de Promoções que destinou um

espaço exclusivo para falar sobre as alunas reprovadas e, conforme observado nesses

livros, poucas eram as alunas reprovadas.

A nosso ver, o Curso Preliminar dizia respeito ao curso frequentado por alunas

nos anos iniciais da infância até início da adolescência. Dentre as disciplinas ofertadas

pelo curso, deveria haver uma sala apropriada para a disciplina de Trabalhos Manuais,

pois as alunas realizavam as atividades de bordado, corte e costura, produção de

artesanatos e pintura. Disciplinas básicas e iniciais como História do Brasil, Geografia,

leitura ou Português e noções de Matemática também são ministradas em cursos

equivalentes ao que atualmente conhecemos como ensino fundamental ou ginasial (1o

grau).

O Curso Elementar nos apresentou como sendo um curso frequentado por

alunas que se demonstrassem habilitadas nas matérias ensinadas no Curso Preliminar,

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106

pois percebemos que as alunas matriculadas em determinado ano no Curso Preliminar

estavam matriculadas no ano seguinte no Curso Elementar. Esse curso apresentou-se

como sendo um curso composto por classes, no caso da ENRA, 1ª, 2ª e 3ª classes, o que

possivelmente equivaleria ao ensino secundário, correspondendo cada uma a um ano

escolar, destinado a ser equivalente ao colegial ou ensino médio. Entretanto, são apenas

suposições, pois não encontramos registros sobre a grade curricular ou regimentos desse

período, na escola.

No ano de 1936, a escola passou a ser denominada Escola Nossa Senhora

Auxiliadora, pelo que podemos observar no Livro Matrícula Geral – 1936 a 1949, e

ofertava Curso Preliminar séries 1ª, 2ª e 3ª; Curso Elementar - 1º, 2º, 3º e 4º anos; Curso

Médio 1º e 2º anos; Maternal ou Jardim da Infância e trabalhos manuais.

Conforme observado, o IMA continuou oferecendo o Curso Elementar,

Preliminar e passou a oferecer o Curso Médio. Ao final do ano, a escola realizou um

exame de admissão para as alunas que estivessem aptas para iniciarem o Curso Normal

Rural, que teve seu início na escola em 1937.

As FMA dedicavam-se a formar uma mulher feminina, dócil, religiosa, cuja

pureza e virtude eram exaltadas. Ofereciam cursos para preparação inicial das alunas

que, ainda muito pequenas, já adentravam a vida escolar na Escola Paroquial,

absorvendo os valores cristãos desde novas.

O edifício escolar era um monumento arquitetônico para as pessoas da cidade.

Uma grande obra construída e localizada no ponto mais alto e central da localidade. O

colégio chamava a atenção de todos que por ali passavam. Desse modo, a ENRA

prosperaria ao longo dos anos.

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CAPÍTULO III

ESCOLA NORMAL RURAL NOSSA SENHORA AUXILIADORA EM PORTO

VELHO: A ESCOLARIZAÇÃO FEMININA NA ENRA (1937 A 1946)

A educação é o elemento de defesa para o

homem e para a mulher, quando

conhecedores dos deveres para consigo

mesmo e para com os seus semelhantes. Só

assim poderão conhecer Deus e amá-lo. A

verdadeira educação transforma as almas,

tornando-as virtuosas, dando-lhes os

elementos de que carecem para serem feliz.

(ALTO MADEIRA, 1932, p. 2)

Destacamos na epígrafe acima um excerto do editorial do Jornal Madeira que

declaradamente era uma apologia aos princípios da educação religiosa como era aquela

oferecida pela ENRA.

Neste capítulo, portanto, analisamos o percurso do curso de formação de

professoras normalistas rurais na ENRA entre os anos de 1937 a 1946. Aqui analisamos

como ocorreu a educação na ENRA, como eram as aulas, perfil de professoras e alunas

que frequentavam a escola, normas, disciplinas e regras estabelecidas para a formação

das moças.

No período de 1937 a 1946, ainda vigoravam as tendências escolanovistas, e o

período também foi identificado como uma época de “otimismo pedagógico”, pois

predominava um sentimento “de esperança de democratizar e de transformar a

sociedade por meio da escola” (ARANHA, 1996, p. 198).

Para Jorge Nagle (2001), a consequência desse estado de espírito republicano

no movimento social e político, principalmente, na Primeira República evidencia

múltiplos aspectos de conflitos sociais, com a coexistência do “entusiasmo” e do

“otimismo” que colocam a educação no centro do debate social, com o surgimento de

amplas discussões e frequentes reformas da escolarização.

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O que distingue a última década da Primeira República das que

a antecederam, foi justamente isso: a preocupação bastante

vigorosa em pensar e modificar os padrões de ensino e cultura

das instituições escolares, nas diferentes modalidades e nos

diferentes níveis. Com isso, aparecem novos esquemas de

enquadramento desse processo ou, pelo menos, velhos esquemas

são repensados e antigas aspirações são revigoradas, com o que

se procura criar as condições institucionais apropriadas para a

sua aplicação e realização (NAGLE, 2001, p. 134).

Segundo Barros (2013), após ser proclamada a República, muitos estados

brasileiros passaram por reformas de ensino. Por um lado, predominava a promoção do

acesso da população pobre à instrução e, por outro, a garantia do acesso ao novo tempo,

o tempo moderno. Nesse momento de transformações, mesmo com a obrigatoriedade do

ensino e sua gratuidade no que dizia respeito à instrução pública primária, a realidade da

educação no ambiente rural configurava-se marcada pelo caos e por fragilidades de

políticas públicas (BARROS, 2013, p. 169).

Utilizando-nos das palavras de Maria de Fátima Cavalcanti Machado Cruz

(2000), surgiram pressões sobre a necessidade de aumentar as oportunidades

educacionais. Profundamente influenciados pelas teorias positivistas, que consideravam

a mulher, naturalmente dotada da capacidade de cuidar das crianças”, os representantes

do governo republicano encaravam o magistério como profissão para mulheres (CRUZ,

2000, p. 90).

Nesse contexto, os princípios e fundamentos do movimento escolanovista do

Brasil República iriam fundamentar as reformas estaduais do ensino primário e normal e

fornecer elementos para uma revisão crítica dos padrões de escola normal existentes.

As críticas já antigas sobre o reduzido caráter profissional das escolas

normais e a predominância dos estudos de cultura geral em seu

currículo ganhavam maior ênfase, num momento em que a “nova”

orientação do ensino requeria conhecimentos sobre o desenvolvimento

e a natureza da criança, os métodos e técnicas de ensino a ela

adaptados e os amplos fins do processo educativo. Em tais condições,

consolida-se nesse período a ideia de desdobramento dos estudos

propedêuticos e profissionais, em dois cursos distintos, quando então

são dados dois importantes passos nesse sentido: a criação ou

ampliação dos estudos complementares, preparatórios ao normal, e,

em alguns estados, a divisão do curso normal em dois ciclos: um geral

ou propedêutico e outro especial ou profissional, ainda que nem

sempre completamente diferenciados (TANURI, 2000, p. 70).

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A Igreja Católica passou a tratar a formação do professor como uma

necessidade e uma urgência, pois associava a escola pública ao comunismo53

ao mesmo

tempo em que intentava garantir espaço junto ao governo para manter suas atividades

educativas e religiosas na população brasileira. De acordo com Flávia Obino Corrêa

Werle (2012), o esforço de formação de um contingente de professores católicos para a

zona rural era no sentido de que os mesmos poderiam atuar como um antídoto contra o

comunismo vinculado à disseminação de escolas públicas estaduais (WERLE, 2012, pp.

37-38).

No período de 1937 a 1945, estava em vigor o Governo de Getúlio Vargas,

conhecido como Estado Novo. O Brasil vivenciava um amplo processo de

industrialização do país. Com relação à matrícula de estudantes, durante a seleção nas

escolas, persistia um aspecto discriminador e a continuidade de aplicação de exames e

provas que tornavam o ensino cada vez mais seletivo, bem como prosseguia a

recomendação explícita no Decreto-Lei Nº 4.244, de 9 de abril de 1942, a Lei orgânica

do ensino secundário, de encaminhar as mulheres para os “estabelecimentos de ensino

de exclusiva frequência feminina”. (BRASIL, 1942).

Nos anos de 1937 a 1946, a ENRA se dedicou a formar professoras normalistas

rurais na cidade de Porto Velho. Portanto, houve a criação da primeira escola normal

rural de Porto Velho, a Escola Normal Rural Nossa Senhora Auxiliadora, nível médio,

no ano de 1937 (IMA, 2000). Parece-nos que a instalação do curso de magistério

atendia a uma necessidade de expansão da Igreja, do conhecimento que padres e irmãs

tinham da concepção da educação regional, da falta de instituições escolares e da

necessidade que as Irmãs encontraram de fundar escolas para conquistar mais

seguidores para suas causas.

Analisando o contexto sociopolítico da época, as FMA aderiram à mudança de

foco da educação que estava sendo ofertada para a população feminina. Almeida (2001)

mencionou essa articulação entre Estado e Igreja relacionado ao ensino rural que

determinava a importância do professor rural, cuja formação era marcada por um

discurso tradicionalista de moral e ética cristãs.

As ligações entre Estado e a Igreja no plano do ensino rural são

determinantes para a compreensão do significado e da importância

53

Aranha (1996, p. 199) destacou que a reação católica, contra os representantes da escola nova, surgiu a

partir de 1920 e foi retomada na década de 1950. Configurou-se uma reação dos conservadores que se

opunham à política de laicização da escola pública.

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do/da professor/a rural e de seu trabalho junto às comunidades do

interior. A influência da Igreja e seus discursos possibilitou

difundirem-se concepções acerca do papel do/da professor/a, a própria

noção de vocação para o magistério, encarando-o menos como uma

profissão e mais como um sacerdócio. A valorização de parâmetros

culturais rurais sob a visão do catolicismo são exemplos das relações

que se estabelecem entre Igreja e educação rural. Enfim, pode-se dizer

que a construção das identidades dos/das professores/as também era

mediada pela Igreja e pelos discursos de uma moral e ética cristãs

(ALMEIDA, 2001, pp. 98-99).

Essa mesma autora ressaltou que as primeiras Escolas Normais Rurais

mantinham vínculo com a Igreja e, além disso, destacou a relação de proximidade entre

Igreja e as pequenas comunidades rurais. Assim como a figura do padre era uma

referência – representando autoridade moral, exemplo de conduta e de postura

adequadas –, o/a professor/a, de certa forma, também deveria assumir esse lugar junto

às comunidades (ALMEIDA, 2001).

A respeito da escola normal, Sud Menucci (1934) descreveu que a formação de

professores rurais, deveria ter pelo menos três diretrizes básicas: formar um profissional

entendido de agricultura, formar um professor que seja ao mesmo tempo um enfermeiro,

formar um mestre que entre para o campo com a convicção inabalável de que precisa

ser ali um incentivador de progresso, seja qual for o atraso, a desconfiança ou a

hostilidade do meio (MENNUCCI, 1934). Defensor da escola normal rural, mais tarde

sua voz encontraria eco na configuração das escolas normais rurais que surgiriam Brasil

afora, como a ENRA, marcadas e reconfiguradas, contudo, pela influência da Igreja e de

suas preleções o que possibilitou difundirem-se concepções acerca do papel do/da

professor/a menos como uma profissão e mais como um sacerdócio como dito por

Almeida (2001).

Com a intenção de formar professoras rurais, a ENRA escola mudou seu foco

de ensino após a visita do Governador do Amazonas, Dr. Álvaro Maia.

No dia 21 de julho de 1937, Dr. Álvaro Maia, governador do

Amazonas em visita a Porto Velho, a noite vindo ao colégio, para uma

simples, mas bem preparada e apresentada academia em sua

homenagem, comovido ao ver o progresso da escola, entre outras

recomendações disse: “vocês com o colégio que dispõem já tem o

privilégio de criar uma Escola Normal Rural” (IMA, 2000, p. 3).

No livro “Ata de Inauguração da Secretaria do IMA – Termo de Visita - 1947”,

encontramos o “Relatório de Inspeção” elaborado pelo Fiscal Escolar Aluízio Ferreira

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para o Diretor do Departamento de Educação e Cultura do Estado do Amazonas, em 7

de outubro de 1937, possibilitando a compreensão sobre o funcionamento do Curso

Normal e outras especificidades da escola, relacionado à sua arquitetura, logística das

aulas, entre outros.

Segundo esse relatório, a escola funcionava “em um grande prédio54

,

ultimamente inaugurado”, situada à Rua Duque de Caxias, “em um dos pontos altos e

pitorescos”, com três andares, 40 metros de comprimento, “possuindo todos os

requisitos higiênicos modernos e de elegante arquitetura”. E continua, “possui, no 3º

andar, três vastos dormitórios para alunas internas, medindo cada um 108 metros

quadrados e uma cubagem de 440 metros”. O 2º andar encontrava-se dividido em seis

amplas salas para aulas, servidas por um largo corredor de comunicação e o primeiro e

último andar era ocupado por “um único e bem arejado salão”, medindo 32 metros de

comprimento por 9 de largura, destinado aos atos escolares, servido, também por um

aparelho cinematográfico moderno, e, simultaneamente, por um grande palco para

exibições teatrais e conferências escolares”, além disso, tinha o edifício vasta área

coberta, “com 250 metros quadrados, 2 amplos recreios arborizados, refeitórios

condignos, copa, cozinha, sanitários e o mais exigido para o preciso conforto e higiene

de uma casa educacional”, e possuía ainda, “número suficiente de carteiras escolares

modernas, abundante material didático para o ensino de desenho, geografia e ciências”

(IMA, 1937, p. 1).

Dessa maneira, podemos observar que os eventos publicados no jornal Alto

Madeira e realizados para arrecadar fundos, ou simplesmente expor as jovens à

sociedade, apresentando o trabalho realizado pelas irmãs, na escola, eram realizados no

“grande palco para exibições teatrais e conferências escolares”, conforme descrito no

Relatório de Inspeção. As noções de higiene e questões sanitárias também foram

destacadas no relatório, o que nos leva a pensar na rigidez das autoridades em

inspecionar as instituições escolares que promovessem noções de bem-estar e saúde; um

país ainda impregnado pelos ideais higienistas.

Louro (2013) destacou que, com o passar do tempo, aumentou a procura das

famílias pelas escolas normais. Nos dizeres da autora, “a princípio são algumas, depois

muitas; por fim os cursos normais tornam-se escolas de mulheres. Seus currículos, suas

normas, seus uniformes, o prédio, os corredores, os quadros, as mestras e mestres”,

54

A imagem do prédio pode ser vista na página 89, figura 10 (IMA, 1937).

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todos os detalhes faziam desse um espaço com um único foco: “transformar

meninas/mulheres em professoras” (LOURO, 2013, p. 454).

A organização das Irmãs mostrava-se impecável. Além das mensagens do

jornal Alto Madeira que, embora apresentem um posicionamento do jornal a favor das

atividades das FMA, os visitantes que frequentavam a escola deixavam suas impressões

no livro Termo de Visita sempre com elogios e apontando os pontos positivos. A

educação oferecida pela escola era comparada a das escolas oficiais.

Tem a Escola Normal, perfeitamente organisados e em dia, os livros

de matricula, frequencia e visitas. O estabelecimento tem sido

franqueado a quantas autoridades se tem dignado de o visitar. Os

exames finaes de cada anno teem sido presididos por diversas dellas.

No cumprimento dos deveres civicos, a Escola festeja e commemora

sempre, com galhardia e pompa, as grandes datas da patria. É de

justiça que se coroe de exito a pretensão da Missão Salesiana de

equipàrar ao ensino official sua casa de educação, o que será um dos

mais relevantes serviços pelo Governo do Estado prestado á infancia

desta região, pois os Salesianos, é notorio e sabido, veem, aqui,

desenvolvendo, dentro dos moldes christãos, um verdadeiro programa

instructivo de que resultará incalculaveis beneficios para a Familia e

para a patria (IMA, 1937, p. 2).55

Aranha (1996) ressaltou o perfil tendencioso fascista do Estado Novo,

assinalando o impacto que a Constituição de 1937 atenuou. Essa Constituição não

declarava o poder dos estados referentes à organização de seus sistemas de ensino,

porém, passava para a União, a responsabilidade para com a educação nacional,

conforme apresentado no Art. 15, § 9: “IX - fixar as bases e determinar os quadros da

educação nacional, traçando as diretrizes a que deve obedecer a formação física,

intelectual e moral da infância e da juventude”. Deslocou-se a ênfase para a sugestão da

liberdade da iniciativa privada; “no período da ditadura, o movimento renovador entra

em recesso”, entretanto, há a ampliação da oferta de escolarização (ARANHA, 1996, p.

203).

Werle (2012) destacou “o caráter seletivo da ENR”, ficando explícito a partir

da forma de admissão dos candidatos. A autora se volta para uma prova de seleção que

era exigida aos interessados no curso normal rural.

Algumas escolas organizavam um cursinho preparatório para o

processo seletivo. Esse cursinho e o exame de admissão subsequente

55

Transcrito conforme original.

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contribuíam para o reconhecimento da qualidade do ensino e

indicavam a seletividade de que o ingresso na ENR se revestia. Em

alguns casos, a escolha do estabelecimento de ensino era mais por

condicionamentos e contingências do que pelas possibilidades que o

curso traria e a formação profissional prometida. A relação espacial

entre a escola e a residência, assim como o conceito altamente

positivo que a instituição gozava na comunidade, entrava nas

justificativas de escolha da escola. Por serem escolas de

funcionamento integral (internato), o currículo era amplo, exigente

(WERLE, 2012, p. 35).

Em consonância com o posicionamento de Werle (2012), encontrava-se a

ENRA que, conforme observado nas partes extraídas do livro Atas Escolar Normal

Rural – 1937 a 1942 o registro de 13 de novembro de 1937, quando foram realizadas as

provas orais de Português, Matemática elementar, História Pátria, Geografia, Ciências

físicas e naturais, Desenho e Caligrafia (IMA, 1937) na presença de figuras de

autoridade. Além disso, todos os livros de matrículas e termos de visita comprovam a

existência de um curso preparatório para a promoção de alunas ao Curso Normal.

Por esses caminhos, apoiamo-nos nos estudos de Louro (2015) para tentar

compreender o que representava a formação que era dada às alunas da ENRA

relacionando história, sociedade e cultura, pois “é, então, no âmbito da cultura e da

história que se definem as identidades sociais. Essas múltiplas e distintas identidades

constituem os sujeitos, na medida em que esses são interpelados a partir de diferentes

situações, instituições ou agrupamentos sociais” (LOURO, 2015, p. 12).

Nilce Vieira Campos Ferreira (2014, p. 90), ao analisar um curso normal rural

assinalou que na instituição pesquisada vigorava uma tentativa de tornar a escola um

mecanismo que promovesse a transformação do indivíduo, atrelando a educação

feminina à formação para cidadania, o comportamento considerado adequado na

sociedade e o cuidado com a família.

Em um contexto de exigências pela educação, Cruz (2000) assinalou que a

educação passou a ser vista como possibilidade de ascensão social e passou a ser uma

exigência da classe média. Consoante isso e da falta de professores, pois muitos já

haviam desistido do magistério em busca de outras opções de trabalho, a mulher foi

“chamada” a completar o quadro de professores com vistas a preencher as escolas e

possibilitar a expansão da educação nas cidades que se desenvolviam (CRUZ, 2000, p.

90).

A educação voltada para as mulheres sempre a acolheu como uma educadora

por vocação. A mulher, além de ser uma pessoa que dispunha de todas as habilidades

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para ensinar às crianças os fundamentos básicos da ação feminina em uma sociedade

conservadora, como a porto-velhense da época, deveria ser educada. Desde 1932, eram

publicadas notas que ressaltavam que a professora deveria pautar-se por um

comportamento moral impecável e a elas cabia atender de forma assídua as exigências

determinadas por um contexto sociopolítico, conforme o excerto do jornal Alto

Madeira.

A verdadeira educação transforma almas, tornando-as virtuosas,

dando-lhes os elementos de que carecem para serem feliz. A educação

é o elemento transformador da humanidade, fazendo desaparecer da

face da terra o egoísmo, a vaidade e o orgulho, víboras de cem

cabeças que corroem a felicidade na terra. Hoje conhecedor das

misérias humanas, venho-vos: educai vossos filhos, preparando assim

para o complemento das suas provações, para que quando chamados

possam ser dos escolhidos e passar à direita do Pai Celeste (ALTO

MADEIRA, 1932, p. 2).

Aliada a essas prerrogativas de educação feminina, os princípios religiosos

deviam ser seguidos. Para Almeida (2007), a educação feminina acontecia marcada por

questões culturais modeladas pela religiosidade. Desse modo, observamos que a

educação feminina foi moldada por rígidas normas sociais. Percebemos que na

instituição em estudo, a partir do trecho de um texto publicado no jornal Alto Madeira,

clara alusão que cabia à educação feminina o papel de tornar as mulheres almas

virtuosas.

Muito embora o excerto do jornal tenha se referido à educação como um todo,

notamos que o vocabulário usado esteve sempre envolto de termos os quais,

rapidamente, associamos às questões religiosas. De acordo com o texto, a educação

transforma a humanidade para afastá-la da vaidade, egoísmo e orgulho, um dos pecados

capitais que distanciam as pessoas da salvação, do reino do céu, do Pai Celeste.

Para Almeida (2007), durante muito tempo a educação para as mulheres foi

negada. Quando essa lhe foi possibilitada passou a estar vinculada à domesticidade,

portanto, à educação caberia docilizar as mulheres. Consoante o padrão de docilidade da

época, padrão que correspondia a se submeter à doutrinação religiosa que era

representada, principalmente, pela Igreja, a qual “instalou o mito da mulher isenta de

qualquer pecado, porque a ela caberia a reprodução da raça, derivando-se desse fato

biológico uma ideia de superioridade moral, que, no entanto, não seria suficiente para

proporcionar maiores direitos ao sexo feminino” (ALMEIDA, 2007, p. 109).

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3.1 Professoras e alunas da Escola Normal Nossa Senhora Auxiliadora

Partindo da concepção de que professoras e alunas são sujeitos históricos,

ativos, produtos e produtoras de cultura, procuramos analisar os livros de matrículas,

termo de visitas, livros das médias de arguições e de promoções encontrados na ENRA.

Nesse ponto, trataremos das características que envolviam as alunas e professoras da

escola normal rural das religiosas salesianas em Porto Velho, constitutivas do processo

de formação profissional.

Werle (2012) relatou que a escola normal rural já se encontrava ativa em vários

estados brasileiros nos anos de 1930, 1940 e 1950 e tinha como propósito declarado

formar professores para a docência em escolas do interior, escolas em geral isoladas, de

uma sala de aula e um professor.

No caso da ENRA, o público a ser atendido seriam as filhas das famílias que

residiam na região de Porto Velho no período correspondente aos anos de 1937 a 1946.

Apesar de ser nomeado Matrícula Geral – 1936 a 1949, esse livro de matrículas contém

informações apenas até 1944, incluindo a profissão dos pais que matricularam suas

filhas na escola. Segundo essa fonte, as profissões dos pais, mães ou responsáveis eram

militar, agricultor, ferroviário, telegrafista, costureira, negociante, ferreiro, político,

carpinteiro, contador, viajante, comerciante, vaqueiro, escrivão, sapateiro, alfaiate e

pedreiro. Outras informações contidas no mesmo livro traziam informações como data

da matrícula, nome das alunas matriculadas, sexo, data de nascimento, naturalidade,

nome e ano do curso, residência, nome dos pais, profissão dos pais e observações.

No caso da ENRA, todas as estudantes eram mulheres e somados todos os

dados, nos anos de 1937 a 1946, a partir dos livros de matrículas encontrados na ENRA,

a instituição teve 136 matrículas e 160 concluintes. Nos anos de 1937 a 1938, não

encontramos os dados de matrícula e conclusão de onde podemos inferir que não houve

registro ou eles não foram nos disponibilizados por parte das Irmãs, como podemos ver

no quadro 7.

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Quadro 7. Situação de matrículas no período de 1937 a 1946 do Curso Normal da ENRA

Anos

1ª Série do

Curso Normal

2ª Série do

Curso Normal

3ª Série do Curso

Normal

Mat. Concl. Mat. Concl. Mat. Concl.

1937-1938 - - - - - -

1938-1939 11 11 - - - -

1939-1940 7 7 8 8 - -

1940-1941 10 9 6 6 6 7

1941-1942 7 6 5 6 5 5

1942-1943 10 9 3 4 5 5

1943-1944 9 10 4 7 3 -

1944-1945 7 15 3 7 3 -

1945-1946 8 - 9 - 7 -

1946-1947 - 31 - - - 7

Fonte: Acervo do IMA. Porto Velho/RO.

Conforme apresentado pelo quadro 7, a matrícula das alunas no Curso Normal

oscilou no decorrer dos anos em que a escola esteve funcionando com o referido curso.

Encontramos algumas dificuldades para poder explanar mais sobre o quadro, devido à

falta de informações. Embora conseguíssemos ter acesso às fontes do acervo da escola,

no momento de analisá-las, faltavam muitas informações. Os números de algumas

matrículas não batem com o número de alunas que chegaram a concluir o curso,

entretanto, podemos afirmar que no livro de matrícula há determinados nomes das

alunas, já, no livro de conclusão, há apenas alguns outros, por isso, a discrepância nos

números.

Não conseguimos obter as publicações do jornal Alto Madeira entre os anos de

1937 a 1939. Somente a partir de 1940 é que obtivemos mais detalhes das atividades da

ENRA em Porto Velho.

Outro documento o “Relatório de Inspeção” feito pelo Fiscal Escolar Aluízio

Ferreira para o Diretor do Departamento de Educação e Cultura do Estado do

Amazonas, em 7 de outubro de 1937, encontrado no livro “Ata de Inauguração da

Secretaria do IMA – Termo de Visita - 1947”, apresentou as impressões que o Fiscal

Aluízio Ferreira teve ao inspecionar o colégio.

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De acordo com ele, o corpo docente da instituição era “idôneo e com seus

títulos devidamente registrados na Diretoria do Departamento de Educação e Cultura”.

De acordo com o relatório, e conforme já sabemos, a instituição pertencia à

Congregação das Filhas de Maria Auxiliadora, “sobejamente conhecida, pelos seus

primores educativos, em todo o Brasil” (IMA, 1937, pp. 1-2).

São professoras do estabelecimento as Irmãs Salesianas: Elvira

Pedrelli, Maria Cecilia Galvão, Maria Letice Furtado, Catharina

Capelli e Antonia Alves, 4 das quaes são brasileiras natas. Todas ellas

teem attestado de vaccina contra variola e gosam sobeja saúde, de par

com longo tirocinio, assim reconhecida cultura e aptidão para o mistér

a que se votam (IMA, 1937, p. 2)56

.

Além da formatura da primeira turma de professoras normalistas da ENRA, o

ano de 1940 foi importante para Porto Velho, também, devido à visita do Presidente

Getúlio Vargas. Às vésperas da visita presidencial, encontramos a publicação da

divulgação e convite para pais e/ou responsáveis para um “modesto entretenimento”

organizado pelas alunas da ENRA. Nesse evento, haveria também uma palestra pelo

Rvdmo. Pe. Luiz de Vasconcellos, Diretor do Colégio Dom Bosco com o tema “A

grandeza da missão da mãe cristã no lar”.

As alunas mestras da Escola Normal N. S. Auxiliadora convidam aos

DD. Pais para um modesto entretenimento organizado pelas mesmas

amanhã, 31 do corrente às 19h. Nesta ocasião, terá lugar uma

conferência pelo Rvdmo. P. Luiz de Vasconcellos DD. Diretor do

Colégio Dom Bosco, com o tema: A grandeza da missão da mãe cristã

no lar. (ALTO MADEIRA, 1940, p. 1).

No início do mês de novembro, de 1940, o jornal publicou a matéria sobre o

fim do ano escolar na ENRA. Na publicação, podemos observar a exposição das alunas

para a sociedade configurando a representação da mulher na sociedade da época ao

apresentar as atividades realizadas pelas jovens na escola.

No dia 18, perante as bancas examinadoras, as alunas dos cursos

primários deste modelar Estabelecimento de Ensino, prestando seus

exames finais, cujo resultado será depois publicado neste jornal.

Comemorando a data da festa da bandeira, todas as alunas desfilarão

no dia 19 pelas ruas da cidade, depois de terem assistido às

festividades oficiais. No dia 23, às duas horas da tarde, no salão de

Atos haverá disputadíssimo torneio religioso, no qual será proclamada

56

Transcrito conforme original.

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a mais aplicada aluna de catecismo. No dia 24, Missa de ação de

graças a Maria Auxiliadora. Às 7 horas, na Catedral, assistida por

todas as alunas. Dia 25 às 7,30 da noite, distribuição de prêmios e

encerramento do ano escolar do Curso Primário. Dias 27 e 28 e dia 1º

de Dezembro até às 11 horas. A exposição dos trabalhos escolares e

prendas domésticas estarão abertas ao público. 1º de Dezembro, Festa

da Colação de Grau da primeira turma de professoras formadas pela

Escola Normal. Paraninfará o ato o Sr. Major Aluízio Ferreira. Desta

solenidade, que irá se revestir de um brilho excepcional, publicaremos

mais tarde o programa (ALTO MADEIRA, 1940, p. 1).

No livro Termo de Visita, encontramos uma mensagem escrita por dois

visitantes que foram à ENRA conhecer as atividades realizadas pelas FMA.

Enchi-me de muita satisfação visitando hoje a “Escola Normal Rural

‘Maria Auxiliadora’”. Aqui, sob a proteção de Deus e com a

orientação bemfaseja de suas dedicadas mestras, a mocidade se

prepara para viver no lar e na sociedade, elevando-se para engrandecer

o Brasil (FILHO; DINIZ, 1940, p. 9).

Essa forma de realização das atividades pelas FMA ministrando uma educação

para que elas se fossem as formadoras das infância e se tornassem boas esposas, mães e

professoras leva-nos à reflexão de que quando a normalista optasse pela carreira

docente, “o trabalho deveria ser exercido de modo a não afastar da vida familiar, dos

deveres domésticos, da alegria da maternidade, da pureza do lar”, como dito por Louro

(2013, p. 453).

Em 1940, ocorreu a formatura da primeira turma de professoras normalistas da

ENRA. A notícia mereceu capa no jornal Alto Madeira:

A celebração que se efetuará hoje, às 20h, no Teatro do Colégio de

Maria Auxiliadora, colando grau de professoras as senhoritas Alzira

Moreira Lima, Aurelia Banfield, Christina Courinos, Iracema

Cavalcante, Maria de Nazareth Zeed, Maria da Silva Santos e

Maturina Cavalcante, é um acontecimento que honra grandemente a

nossa cidade. A Escola Normal “Maria Auxiliadora”, embora

oficializada como Escola Normal Rural, entrega hoje ao magistério

público as sete primícias do curso e tem a convicção de dar o diploma

de “professoras” a sete senhoritas perfeitamente habilitadas no

exercício da profissão de mestras. A seriedade com que são educadas

as alunas, o completo desenvolvimento do programa das Escolas

Normais, ampliado por aulas suplementares de prendas domésticas e

sobretudo a aprimorada formação religiosa ministrada pelas religiosas

Filhas de Maria Auxiliadora, são a melhor garantia do diploma ganho

pelas novéis professoras. É por isso que a população desta cidade, que

tanto se sente orgulhosa quando aplaude as alunas do Colégio Maria

Auxiliadora, quer nas paradas cívicas, quer nas festas de arte e

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inteligência por elas levadas a efeito, hoje com maior orgulho aplaude

estas sete prendadas senhoritas primícias da Escola Normal “Maria

Auxiliadora”. O ato será solene e o paraninfo da turma é o Exmº Snr.

Major Aluizio Ferreira. Agradecemos o gentil convite que nos foi

enviado pela Diretoria d’aquele educandário, para assistirmos ao ato

que ali será levado a efeito, hoje, às 20 horas (ALTO MADEIRA,

1940, p. 1).

A figura 12 mostra a placa de formatura da turma das primeiras professoras

normalistas da ENRA.

Figura 12: Formandas da primeira turma de professoras normalistas da ENRA

Fonte: Acervo do IMA. Porto Velho/RO.

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Um elemento que aparece na Placa de Formatura acima é a presença de

militares. Cabe-nos lembrar que o período era marcado pela militarização comum ao

Estado Novo. Assim, cabia homenagens aos militares, que representeavam a ordem e o

progresso lemas do período. Outro momento de presença militar era nas arguições

avaliativas, nos eventos, entre outros. Esse é um elemento que, de certa forma, sinaliza a

educação alinhada aos ideários da ditadura que vigorava no período.

As Irmãs que participavam do grupo da Pia União das Filhas de Maria

encontravam-se mensalmente. Comprovamos esse fato com a publicação no jornal Alto

Madeira sobre a reunião mensal do grupo “o vigário e o Conselho convidam

encarecidamente para que todas compareçam na hora pontual” (ALTO MADEIRA,

1941, p. 2).

No documento Histórico do Instituto Maria Auxiliadora, encontramos uma lista

das irmãs que dirigiram e ministraram aulas na instituição, a partir de 1940, quando se

denominava Escola Normal Rural Nossa Senhora Auxiliadora, até 1946, período ao

qual se limita nossa pesquisa.

Quadro 8. Quadro de diretoras e professoras que trabalharam na Escola Normal Rural Nossa

Senhora Auxiliadora (1940-1945)

Ano Irmãs Diretora Irmãs Professoras

1940

Elisa Ferreira da Silva

Ir. Cecília Galvão

Ir. Maria de Lourdes M.

Ir. Etelvina Cerqueira

Ir. Elvira Pedrelli

Ir. Luisa Ghinaudo

1941

Elisa Ferreira da Silva

Ir. Cecília Galvão

Ir. Maria de Lourdes M.

Ir. Etelvina Cerqueira

Ir. Elvira Pedrelli

Ir. Maria Rosa Meroni

1942

Elisa Ferreira da Silva

Ir. Maria de Lourdes M.

Ir. Etelvina Cerqueira

Ir. Maria Rosa Meroni

Ir. Joanita Furtado

Ir. Sílvia Moura

1943

Elisa Ferreira da Silva

Ir. Maria de Lourdes M.

Ir. Etelvina Cerqueira

Ir. Maria Rosa Meroni

Ir. Joanita Furtado

Ir. Antonieta Barbosa

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1944

Elisa Ferreira da Silva

Ir. Etelvina Cerqueira

Ir. Maria Rosa Meroni

Ir. Silvia Moura

Ir. Joanita Furtado

Ir. Antonieta Barbosa

Ir. Djanira Araujo Lima

Ir. Luisa O. Guedes

Ir. Zelia Machado

1945

Elisa Ferreira da Silva

Ir. Etelvina Cerqueira

Ir. Silvia Moura

Ir. Joanita Furtado

Ir. Maria Antonieta Valente

Ir. Maria Antonieta

Cavalcante

Ir. Djanira Araujo Lima

Ir. Luisa O. Guedes

Ir. Luisa Ghinaudo

Ir. Luisinha Pasi

Ir. Maria de Lourdes

Garcia

1946

Elisa Ferreira da Silva

Ir. Anna Ferreira

Ir. Anete Marinho

Ir. Djanira Araujo Lima

Ir. Joanita Furtado

Ir. Luisinha Pasi

Ir. Etelvina Cerqueira

Ir. Luisa Ghinaudo

Ir. Maria Antonieta Valente

Ir. Maria Antonieta

Cavalcante

Ir. Maria de Lourdes

Garcia

Ir. Sílvia Moura

Fonte: Acervo do IMA. Porto Velho/RO.

Conforme apresentado no quadro 8, as Irmãs administravam e dirigiam a

escola, bem como ministravam aulas. Percebemos que houve um aumento no corpo

pedagógico da instituição a partir do ano de 1941, e associamos esse fato ao aumento,

também, do número de alunas matriculadas na escola a partir daquele ano.

Ressaltamos que, de acordo como mostra o quadro 8, a partir de 1932, ano no

qual encontramos registro de matrículas, até ao ano 1946, comprovamos o progressivo

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aumento57

no número de alunas matriculadas. Desse modo em 1930, 17 alunas foram

matriculadas, em 1931, 80 alunas. Em 1933, 140 alunas matriculadas. 175 foram os

registros de matrículas do ano de 1934. Em 1935, 170 matrículas. No ano de 1937, 254

matrículas. Em 1938 e 1939 houve uma diminuição no número de registros de

matrículas, se comparado ao ano anterior de 1937, pois apenas 153 e 175 alunas foram

registradas, respectivamente. Em 1940, voltou a aumentar a frequência de alunas na

escola, com o registro de 225 matrículas. Em 1941, 300 alunas foram matriculadas. Em

1942, o número voltou a diminuir, sendo apenas 248 alunas registradas no livro de

matrícula. Os anos de 1943, 1944 e 1945 o número permanece menor que o de 1941,

totalizando 244, 271 e 248 alunas matriculadas, respectivamente. Em 1946, mais alunas

voltaram a procurar a instituição e o número de matrículas aumentou para 370. Como

podemos notar, o número dos registros de matrículas oscilou durante os anos de 1930 a

1946 na instituição, mas progrediu significativamente.

Em 1941, também houve publicação sobre a colação de grau das alunas que

entraram em 1938 no mês de novembro. Formava-se, então, a segunda turma de

professoras normalistas da ENRA, totalizando o número de 5 alunas:

Perante uma numerosa e seleta assistência, realizou-se na noite de

Sábado do dia 22 do corrente no amplo salão de festa do Colégio N. S.

Auxiliadora a solenidade de colação de grau das alunas do curso

normal, que neste ano terminaram os estudos. Entre os diversos

números da festa, destacou-se pela sua originalidade, a “Homenagem

das Bonecas” desempenhados pelo Jardim da Infância, que muito

agradou e recebendo calorosos aplausos. Em nome das normalistas

falou a normalistanda Iracema Oliveira, tendo o Ver. Padre Adriano

Tourinho, como representando do paraninfo Dr. Álvaro Maia,

pronunciado um belo discurso. Nos intervalos foram executados pelas

alunas diversos trechos musicais, merecendo justos aplausos. Mais

uma vez enviamos as nossas felicitações as senhoritas Eladia Campos,

Iracema Oliveira, Julieta Mateus, Odaléa B. Costa e Sebastiana Brito

pela terminação do curso normal, ao mesmo tempo que nos

congratulamos com a diretoria do Colégio de N. S. Auxiliadora pelo

brilhantismo da festa (ALTO MADEIRA, 1941, p. 1).

Segundo Erinalva Lopes dos Santos (2010), a imprensa oferece ao pesquisador

uma amplitude de perspectivas, ao expor uma diversidade de personagens, de planos,

temáticas, entre outros. Segundo a autora, o uso da imprensa como fonte de pesquisa

caracteriza “uma perspectiva historiográfica disseminada pelos ventos da Nova História

57

Vide quadro 4, página 100.

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Cultural”, tornando acessível novas fontes, novas abordagens, e “à entrada de

indivíduos outrora ignorados como sujeitos da historiografia” (SANTOS, 2010, p. 32).

Em 1942, a ENRA começou a divulgar as matrículas para alunas externas e

semi-internas.

Acham-se abertas, desde hoje, 1º de Fevereiro, as matrículas para

alunas externas, internas e seminternas deste Colégio. Afim de que as

alunas do ano passado possam ter direito ao mesmo número de

matrícula, pedimos aos senhores responsáveis que nos participem

quanto antes a volta das mesmas para o Colégio. As aulas começarão

no dia 2 de Março. A diretoria. (ALTO MADEIRA, 1942, p. 2).

Apresentar as alunas para a sociedade mostrando as tarefas desenvolvidas por

elas na ENRA, conforme observamos, era comum. Sempre com chamadas para eventos

convidando a sociedade. Constatamos que o jornal Alto Madeira era utilizado como

importante fonte para divulgação das atividades realizadas pela instituição e como

forma de divulgar a matrícula, favorecendo a entrada de mais alunas na ENRA.

De acordo com Louro (2013), muitos rituais, doutrinas e normas eram

mobilizados para a formação dessas mulheres professoras.

Na noite do dia 24 do corrente, no elegante salão do teatro Salesiano

do Colégio Maria Auxiliadora, realizou-se um festival dos

Congregados Marianos, tendo ocupado a tribuna o Exmo. Sr. Dr.

Araújo Lima, que pronunciou uma brilhante peça oratória alusiva à

festividade, havendo também uma representação teatral que muito

agradou à numerosa e seta assistência. Hoje, quinta-feira 28, às 20

horas, haverá no Salão do Colégio Maria Auxiliadora, um pequeno

festival que as alunas e ex alunas farão em benefício da futura Capela

de Maria Auxiliadora. Confiamos no apoio generoso dos amigos das

obras Salesianas. 1ªs cadeiras, 5$000; 2ªs cadeiras, 3$000. Vendem-se

entradas na Bilheteria do Colégio (ALTO MADEIRA, 1942, p. 3).

O ano de 1942 datou a colação de grau da terceira turma formada pela Escola

Normal Rural Nossa Senhora Auxiliadora.

No próximo Sábado, dia 21 do corrente, a nossa cidade vai assistir a

colação de grau da 3ª turma de normalistas da Escola Normal de N. S.

Auxiliadora. É mais uma etapa vencida, é mais um grupo de moças

distintas que venceram galhardamente a difícil tarefa e estão prontas

para exercer a nobre profissão de ensinar a instrução primária. No

próximo número daremos os nomes das moças que vão colar grau.

Sabemos que a exposição dos trabalhos escolares, será realizada nos

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dias 19, 20, 21 e 22 do corrente, nos amplos salões do colégio (ALTO

MADEIRA, 1942, p. 2).

As alunas que formaram em 1942 foram Eléa Batalha da Costa, Inêz Guzmán,

Izaura Helena Menezes, Ruth Tancredi Rodrigues e Wanda Campos de Souza. A turma

teve como paraninfo a figura de autoridade Sr. Dr. Joaquim de Araujo Lima, diretor

interino da Madeira Mamoré (IMA, 2000).

Em 1943, outro visitante que foi à instituição conhecer a ENRA deixou suas

impressões no livro Termo de Visita:

Ficamos verdadeiramente impressionados com a notável organização

do Colégio N. S. Auxiliadora, sob a esclarecida direção da Irmã Elisa

Ferreira da Silva. Instalações sem luxo, revelando, entretanto,

extremos cuidados higiênicos deixariam certamente a melhor das

impressões. Mas, não são estes cuidados materiais que cativam os

visitantes, sim a evidente educação religiosa, carinhosamente

destinada a mais de uma centena de meninas patrícias, que ao

imperceptível comando da Irmã Diretora sabem se manifestar a ponto

de comover a assistência. Saímos certos de que esse estabelecimento

educacional esta concorrendo sabiamente, para o engrandecimento de

nosso querido Brasil (JORGE, 1943, p. 11).

Conforme podemos perceber com a mensagem escrita por Fernando Jorge ao

visitar a escola, em 1943, o fato crucial da boa educação das moças e funcionamento da

ENRA era o perfil religioso da escola.

Podemos observar, como dito por Perrot (2007), que sempre, e em toda parte,

existiu uma relação forte e direta entre religião e mulher. No que concerne à educação,

era preciso educar as meninas e instruí-las apenas o necessário para “torná-las

agradáveis e úteis: um saber social” (PERROT, 2007, p. 93).

3.2 As Orientações da Instituição: normas, disciplinas, regras

Compreender o processo pelo qual as alunas matriculadas na ENRA

consolidaram sua formação profissional no contexto de nossa sociedade tornou-se para

nós, uma necessidade de tentar desvelar essa trajetória. Impõe-se, assim, o cuidado de

buscar atentar para os diferentes fios que tecem este intricado processo que representa a

constituição do ideário feminino da formação das moças na ENRA.

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O quadro 9 apresenta os cursos ofertados pela escola no período de 1937 a

1946. Esses cursos incluíam a oferta dos cursos: Jardim da Infância, a partir de 1937, e

depois, apenas em 1941, com a duração de um ano; Preliminar, Elementar I, II e III até

1943, a partir de 1944 contando, também, com Elementar IV e Elementar V, que

imaginamos ser equivalente ao Definitivo I; Definitivo I, entre os anos de 1937 a 1938 e

Definitivo II a partir de 1938 até 1943; Preparatório; I Série Normal Rural de 1937 a

1938, II Série Normal Rural de 1939 a 1945 e III Série Normal Rural em 1946.

Provavelmente, podemos afirmar que o Jardim da Infância era o curso que

atendia às crianças, ou seja, a educação da infância. O Curso Preliminar referia-se ao

ensino que atualmente conhecemos como 1ª e 2ª séries do ensino fundamental, o Curso

Elementar I e II ao que hoje conhecemos por 3ª e 4ª séries, Curso Elementar III à 5ª

série, Definitivo I, 6ª série, Definitivo II, 7ª série e Preparatório provavelmente um

curso que preparava as alunas para adentrarem no curso profissionalizante Normal

Rural.

O Curso Normal da ENRA atendia às exigências de ser um curso com duração

de três anos. A primeira formatura ocorreu no ano de 1940, o que leva a ponderar que

em 1937 teve início a primeira turma, muito embora não tenhamos encontrado os dados

de matrícula, e portanto, a primeira turma o concluiu o curso em 1939, mas as notícias

sobre a formatura foram publicadas em 1940.

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Quadro 9. Cursos da Escola Normal Rural Nossa Senhora Auxiliadora (1937-1946)

Quadros - Cursos

Ano 1937 1938 1939 1940 1941 1942 1943 1944 1945 1946

Curso

Jardim da

Infância Preliminar Preliminar Preliminar

Jardim da

Infância Preliminar Preliminar Preliminar Preliminar Preliminar

Preliminar I Elementar I Elementar I

Elementar Preliminar I Elementar I Elementar I Elementar

I

Elementar

I

Elementar

I Elementar II Elementar II

Elementar

II

Elementar I Elementar

II

Elementar

II

Elementar

II

Elementar

II

Elementar

II

Elementar

II

Elementar

III

Elementar

III

Elementar

III

Elementar II Elementar

III

Elementar

III

Elementar

III

Elementar

III

Elementar

III

Elementar

III

Elementar Definitivo I Definitivo I Definitivo III Elementar I Definitivo I Definitivo

IV

Elementar

IV

Elementar

IV

Elementar

Definitivo Preparatório II

Definitivo

II

Definitivo I Definitivo II Definitivo II Definitivo V Elementar

I Série

Normal

Rural

I Série

Ginasial58

Preparatório

I Série

Normal

Rural

Preparatório I Série

normal II Definitivo Preparatório Preparatório Preparatório

II Série

Normal

Rural

III Série

Normal

Rural Normal

Rural

I Série

Normal

Rural II Série

Normal

Rural

Preparatório

I Série

Normal

Rural

I Série

Normal

Rural

I Série

Normal

Rural

II Série

Normal

Rural

I Série

Normal Rural II Série

Normal

Rural

II Série

Normal

Rural

II Série

Normal

Rural II Série

Normal Rural Fonte: Acervo do IMA. Porto Velho/RO.

58

Observamos que em 1946, no registro do livro, o curso IV Elementar passou para I Série Ginasial e não para II Série Normal Rural, apenas por associação do curso normal

rural ao curso ginasial. Provavelmente, nesse ano não teve o I Série Normal Rural e II Série Normal Rural, pois seria o último ano do referido curso na ENRA.

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127

Analisando o quadro acima, é possível perceber que as FMA formavam as

professoras e provavelmente contavam com elas para a monitoria, auxílio ou mesmo

como um “sistema de estágio” para atuarem nas séries iniciais ou no Jardim da Infância.

Certamente, também perceberam que formar professoras rurais seria uma saída para

obterem recursos junto ao governo local, regional ou nacional, para manterem a

instituição em funcionamento, bem como para conquistarem mais alunas. Avaliamos

que, dessa forma, ao lado do ensino elementar, as Irmãs deram início ao curso normal

rural como descrito no histórico da instituição. Cabe lembrar que no período vivia-se o

movimento ruralista:

Trata-se do movimento ruralista – oriundo já do final da segunda

década –, com propostas e iniciativas no sentido de ajustar os

currículos da escola primária e normal às peculiaridades do meio.

Buscava-se utilizar a escola para reforçar os valores rurais da

civilização brasileira, para criar uma consciência agrícola e assim se

constituir num instrumento de fixação do homem ao campo. Com

vistas à preparação de professores especializados para o magistério na

zona rural, defendeu-se a criação de “escolas normais rurais”, cuja

denominação expressava não apenas a localização da escola em zonas

agrícolas e pastoris, mas sobretudo o objetivo de transmitir

conhecimentos de agronomia e higiene rural (TANURI, 2000, p. 75).

Tratava-se de um período59

em que a maior parte do território brasileiro se

encontrava denominado como rural, inclusive Porto Velho, que na época poderia ser

considerada assim.

As disciplinas ministradas para as alunas do curso normal rural da ENRA

podem ser visualizadas no quadro a seguir, cuja composição mostra a concepção de

educação e formação projetadas para as moças da ENRA no período analisado. Na

Constituição Federal de 1937 ficou estabelecido, em seu Artigo 131, que a disciplina de

educação física, o ensino cívico e o de trabalhos manuais seriam obrigatórios em todas

as escolas primárias, normais e secundárias, sem exceção, estabelecendo, assim, uma

orientação comum ao período, que praticamente configurava um treinamento militar, o

ideário preconizado pelo governo getulista que estava no poder na época: era preciso

alfabetizar, mas sem descuidar dos princípios de disciplina e civismo.

59

No período do movimento ruralista a primeira escola normal rural do país foi instalada, conforme

compreendido a partir dos estudos de Ribeiro (2015) que, ao investigar a história do Museu Vilas Novas

Portugal, voltou aos anos de criação da primeira escola normal rural do Brasil, Escola Normal Rural de

Juazeiro do Norte, em 1934. A respeito ver:

<http://www.repositorio.ufc.br/bitstream/riufc/11771/1/2015_dis_qlfaribeiro.pdf>. Acesso em: out.

2015.

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Quadro 10. Disciplinas do Curso Normal Rural (1937 – 1941)

Disciplinas ministradas/Ano

1938 1939 1940 e 1941

1ª série 1ª série 2ª série 1ª série 2ª série 3ª série

Português Português Português Português Português Português

Matemática Matemática Matemática Matemática Matemática Matemática

Trabalhos

Manuais

Trabalhos

Manuais

Trabalhos

Manuais

Trabalhos

Manuais

Trabalhos

Manuais

Trabalhos

Manuais

Música Metodologia

Música Música Música Desenho Desenho

Música Desenho Desenho Desenho Francês História da

Civilização

Desenho Francês Francês Francês Geografia Física e

Química

Francês Geografia Coreografia Geografia Educação

Física

Educação

Física

Geografia

Educação

Física

Educação

Física

Educação

Física Pedagogia Psicologia

Ginástica

(ou

Educação

Física)

Ciências Enfermagem Enfermagem

Fonte: Acervo do IMA. Porto Velho/RO.

Podemos notar, também, que as alunas frequentavam diversas aulas. As

disciplinas incluíam: Matemática, Português, Música, Desenho, Francês, História da

Civilização, Física e Química, Geografia, Ciências e Ginástica ou Educação Física e

conhecimentos específicos como Trabalho Manuais, Pedagogia, Enfermagem e

Psicologia. Com isso, percebemos uma maneira pela qual a mulher deveria ser formada:

As escolas normais deveriam formar professoras para um desempenho

profissional calcado no humanismo, na competência e na moralidade.

Às mulheres, essa educação, em nível médio, deveria bastar,

mantendo-se o sexo feminino com um destino profetizado e ocupando

o segundo lugar na esfera social (ALMEIDA, 2007, p. 99).

Na ENRA, na disciplina Trabalhos Manuais era ensinado corte e costura,

pintura, bordados, aulas de culinária, artesanato entre outros (IMA, 2000).

Embora Almeida (2007) tenha tratado das escolas normais no geral,

observamos que o Curso Normal Rural da ENRA deveria formar professoras para

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129

atuarem no meio rural, uma vez que as localidades onde iriam atuar estavam situadas

distantes dos centros urbanos. Mesmo as disciplinas de formação geral como Português,

Matemática, Geografia Nacional, História do Brasil e Geral, História Sagrada,

Catecismo, Pedagogia, Psicologia, Economia doméstica, Trabalhos Manuais, Higiene

Escolar, Sociologia entre outras, eram permeadas pelos valores religiosos na ENRA.

Cabe, ainda, uma ressalva: mesmo o curso sendo nomeado como Curso Normal Rural,

não identificamos nenhuma disciplina que estivesse voltada especificamente para essa

realidade.

Primeiramente, a escola buscou educar e instruir as jovens sob o ensino de

disciplinas destinadas a desenvolver o conhecimento, prescritas pelas políticas públicas

educacionais juntamente com a transmissão de valores católico-cristãos. Embora ainda

sob os princípios religiosos, estaria, agora, organizada e focada em formar professoras

normalistas rurais (AZZI, 2002).

O “Relatório de Inspeção” elaborado pelo Fiscal Escolar Aluízio Ferreira para

o Diretor do Departamento de Educação e Cultura do Estado do Amazonas, na data de 7

de outubro de 1937, permitiu saber alguns detalhes sobre o funcionamento do curso

normal na instituição. Segundo ele, “tem a Escola Normal, perfeitamente organizados e

em dia, os livros de matrícula, frequência e visitas”, bem como estaria prestes a ser

realizado o registro das matrículas referentes ao ano de 1937, a fim de ser enviado ao

Departamento de Inspetoria Escolar Regional o registro quando concluído, por

solicitação do Sr. Presidente da Inspetoria Escolar Regional. Isso significa que a escola

preparava o registro de matrículas das alunas ao final do ano letivo, e após finalizá-lo,

encaminhava para a Inspetoria Escolar Regional. Em 1937, tinha a Prelazia

encomendado, da capital da República, um laboratório de física e química (IMA, 1937,

p. 1).

Quanto ao funcionamento das aulas, elas aconteciam de forma regular, com as

cadeiras exigidas para o curso oficial do Estado (IMA, 1937, p. 1).

As aulas funccionam das 8 ás 11 e das 14,30 ás 17,30 horas, com

maximo de 40 alumnas em cada classe. No presente anno, a matricula

attingiu a 254 alumnas, assim distribuidas: Jardim da Infancia – 60;

Curso Infantil – 90; 1º anno – 34; 2º anno – 26; 3º anno – 24 e 4º anno

– 16; curso de preparatorio – 10. - As ferias escolares são de dois

meses e meio, começando em fim de Novembro e terminando a 15 de

Fevereiro.60

60

Transcrito conforme original.

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130

Interessante notar que o cotidiano das moças era rigorosamente planejado e

controlado e os “movimentos e suas ações são distribuídos em espaços e tempos

regulados e reguladores. Elas devem estar sempre ocupadas, envolvidas em atividades

produtivas” (LOURO, 2013, p. 455).

Em 13 de novembro de 1937, foram realizadas as provas orais de Português,

Matemática elementar, História Pátria, Geografia, Ciências físicas e naturais, Desenho e

Caligrafia (IMA, 1937). Um dos documentos encontrado na escola, intitulado Livro

Atas Escolar Normal Rural – 1937 a 1942, aberto e encerrado por Joaquim Valente,

fiscal do Governo Estadual, descreveu o acontecimento no dia do exame oral, as

autoridades presentes e a sua satisfação em comprovar o trabalho realizado pelas Irmãs:

Ata 1ª. Aos treze de novembro de mil novecentos e trinta e sete, às

nove horas, no edifício da Escola Normal Rural “Nossa Senhora

Auxiliadora” desta cidade de Porto Velho Estado do Amazonas,

estando presentes o Senhor Joaquim Rodrigues Valente, d. Fiscal do

Governo Estadual junto à dita Escola e as Rvdas. Irmãs Catarina

Capelli e Elvira Pedrelli, respectivamente Diretora e Secretaria da

Escola, reuniu-se a comissão abaixo mencionada e assinada afim de se

proceder a uma prova oral parcial prestada pelas alunas do Curso

Preparatório desta Escola Normal e cujo resultado concorreria para a

formação da media mensal do corrente mês letivo de novembro. Tinha

a comissão como presidente o Rvmo. Pe. Antonio Carlos Peixoto, e

como examinadores o Dr. José Ferreira Sobrinho, d. Prefeito

Municipal o acadêmico Roosevelt Pereira de Melo e o Professor

Carlos Costa. À convite da Diretoria da Escola achava-se também

presente ao ato o Exmo. Sr. Dr. José, da Silva Castanheira, d. Juiz de

Direito da Comarca. Não podia ser mais satisfatório o resultado desta

prova em que as alunas revelaram conhecimento cabal das diferentes

matérias constitutivas do programa. Finalizado o ato o Exmo. Sr. Dr.

juiz de Direito tomou a palavra e em veemente improviso felicitou o

Corpo Docente da Escola na pessoa da sua Diretora, pelo brilhante

êxito da presente prova, enalteceu a atividade prodigiosa das R. Irmãs

Salesianas e fez notas para que a instrução tivesse em toda a parte

mestras tão dedicadas e sacrificadas. [...] (IMA, 1937, pp. 1-2).

De acordo com o registro citado acima, arguições de prova oral parcial para

obter a média do mês letivo aconteciam a cada dois meses e meio. Além disso, também

é possível analisar a partir desse excerto que as Irmãs tratavam de ser reconhecidas pela

sua capacidade de agir, dialeticamente, entre modernidade e tradição para conquistar a

população porto-velhense. O Fiscal do Governo Estadual, Joaquim Valente, demonstrou

o sentimento de enaltecimento das pessoas ao compartilharem momentos solenes na

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escola das religiosas, enaltecendo a “atividade prodigiosa das R. Irmãs Salesianas”,

elogiando as professoras como mestras “dedicadas e sacrificadas” (IMA, 1937, 2).

Sopesamos que o labor educativo das Irmãs deveria ser descrito para a

sociedade e encontrar crescentes oportunidades para propagar sua missão específica,

interagindo com a comunidade, com o grupo de educadores que se manifestavam na

imprensa e jornais e que ressaltavam seu empenho no campo educativo. Ao agir dessa

forma, ponderamos que as Irmãs acreditavam que cada vez mais seus pais confiariam a

educação de suas filhas à ENRA.

Em 1938, o Curso Normal foi reconhecido pelo governo e começou a

funcionar regularmente na ENRA. No histórico da instituição consta que a escola foi

reconhecida pelo Art. 3º da Portaria Ministerial nº 378 de 10 de outubro de 195061

. O

livro Atas Escolar Normal Rural-1937 a 1942 e o livro Média das Arguições Curso

Preparatório-1938 a 1946 permitiram identificar as disciplinas ministradas no Curso

Normal Rural.

Gomes (2007) ressaltou que a ENRA estava inscrita na instrução pública do

estado do Amazonas, em 1938, mantendo os cursos Jardim da Infância, Elementar,

Médio ou Definitivo, preparatório e Normal, permanecendo ainda o Oratório Festivo e

cursos dominicais de catecismo, “nos quais poderiam comparecer pessoas estranhas à

casa, desde que sua conduta fosse isenta de costumes prejudiciais à boa ordem e à moral

do Instituto” (GOMES, 2007, p. 109).

No livro Ata de Inauguração da Secretaria do Instituto Nossa Senhora

Auxiliadora, de Porto Velho, Território Federal de Guaporé (IMA, 1938) percebemos a

concepção de educação que era preconizada na instituição.

É justo salientar que este Colégio que honra e enobrece esta terra, tem

como padrão: irrepreensível e moderna metodização de ensino a par

de impecável ordem e disciplina moral-religiosa, o que é comum a

todos os educandários salesianos, os quais, como nossos milenaicos ai

estão para atentar, os relevantes e inolvidáveis serviços prestados a

sacrossanta causa do combate ao analfabetismo, por esse abençoado

exército de servos e servas de Deus, moldados nos grandiosos e

glorificados exemplos do inesperado fundador de sua ordem: S. João

Bosco (IMA, 1938).

61

A ENRA no mesmo período ofertou outros cursos como Jardim da Infância (até 1937 e depois voltou

em 1941); Curso Preliminar 1ª e 2ª séries; Curso Elementar 1º, 2º e 3º anos; Curso Preparatório e Curso

Definitivo 1º e 2º ano. Porém, nesse estudo ateremos nossa análise ao Curso Normal Rural.

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Como podemos notar no excerto acima, eram ressaltados o método de ensinar

de D. Bosco e as virtudes da ordem e da moral religiosa. O Fiscal da ENRA, Joaquim

Valente, em 1938 relatou essas impressões no livro de visitas da escola. Para Joaquim

Valente, as 11 alunas matriculadas no Curso Normal da ENSA transpareciam “o grau de

aproveitamento” da disciplina e ordem empreendidas pela escola, ressaltando a

grandiosidade da obra, como um “educandário modelar, reflexo moral da grandiosa

obra de São João Bosco em prol da educação da mocidade” (IMA, 1938).

[...] Aqui deixo consignado o meu voto de louvor a Reverenda

Diretora do Estabelecimento e ao corpo docente da Escola Normal

Rural, pelo acentuado progresso das jovens educandas, nas diversas

matérias do seu curso; e, em nome do Governo do Estado, que

represento, os meus agradecimentos, pelo muito que vem fazendo em

prol da difusão do ensino nesta afastada missão do Amazonas (IMA,

1938).

Conforme mencionado anteriormente, ingressaram 11 alunas na turma do

Curso Normal da ENRA, no ano de 1938, e 11 concluíram o curso. Na busca dos dados

de matrículas das alunas, encontramos informações que nos indicaram a provável

realidade social das alunas que frequentavam a ENRA, bem como de suas famílias,

sendo possível identificar um perfil socioeconômico das jovens educandas.

No livro Atas Escolar Normal Rural - 1937 a 1942 (IMA, 1937-1942)

encontramos as descrições de aprovações em provas e as respectivas médias das alunas

que realizaram as provas de cada disciplina.

No outro importante livro do qual encontramos informações relevantes, o livro

Ata de Inauguração da Secretaria do IMA – Termo de visita – 1947 (IMA, 1947)

contém informações e relatos dos visitantes da instituição. A exemplo, a impressão do

Coronel Inspetor de Fronteiras e sua esposa, Maria Alice Andrinsf da Cunha, em 1938:

Educando as crianças no amor a patria, o fazem atraves do amor a

Deus, porque esses elevados sentimentos a completam, dignificando a

creatura aos olhos do Creador. As de Barcelos S. Gabriel, Taracuá,

Jaureretê, nos Rios Negro e Waupés (hoje, Uaupés), assim procedem

com as nossas irmãs da selva, incorporando-as á nova civilização

cristã. Ainda mais, o ensino que ministram, por meio de suas escolas

profissionais, completam a obra a que se dedicam com amor e

renuncia. Desse modo, essas missionarias transformam as nossas

selvagens em elementos sociaes e economicos, fasendo deles boas

brasileiras em quem a Patria muito espera e já confia. Neste Colegio

de Porto Velho que tenho a satisfação de visitar, não se fas exceção:

essas meninas, educadas na atmosféra do espirito salesiano, serão, sem

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duvida, as bôas esposas de amanhã, fatores incontestes da grandesa

moral da nossa Patria. Meus parabens, Exma. Diretora deste colegio,

parabens que peço tornar extensivo a todas as suas dedicadas

colaboradoras e as suas dignas alunas. Porto Velho, 4 de Junho de

1938 (CUNHA, 1938, p. 7).

Nos arquivos do Instituto Maria Auxiliadora, atual escola das FMA, no livro de

matrículas de 1939, identificamos que as Irmãs começaram a registrar a profissão dos

Pais, titulares ou responsáveis das alunas matriculadas. Para nós, foi interessante ter

conhecimento sobre os locais de residência das famílias das alunas e da profissão de

seus pais, para ser possível analisar sobre a ligação entre os grupos sociais das alunas da

escola e a localização de suas residências com os objetivos almejados pela instituição.

Buffa e Nosella (1996) escreveram sobre a Escola Normal de São Carlos e

destacaram que, algumas alunas eram filhas de pais fazendeiros, outras de negociantes,

médicos, advogados, entre outros. Ou seja, os autores abordaram da questão da

aceitação da escola normal para os pais ou responsáveis de filhas pertencentes a

variados segmentos da classe social.

Em Porto Velho não foi diferente. Conforme mencionado anteriormente,

apesar de ser uma escola “beneficente e sem fins lucrativos”, a ENRA cobrava não só

taxas mensais, mais ainda um valor extra para aqueles pais que gostariam que suas

filhas fizessem as disciplinas de Desenho, Música e Francês. Localizada no centro da

cidade, a escola era muito frequentada por filhas de famílias que tinham um poder

aquisitivo bom. Entretanto, após o início do Curso Normal Rural da ENRA, os

segmentos médios da cidade começaram a se interessar em matricular suas filhas na

escola.

O Livro Matrícula Geral - 1936 a 1949 (IMA, 1936-1949) continha

informações sobre as profissões dos pais das alunas matriculadas na ENRA. As

profissões variavam entre ferroviário, pedreiro, ferreiro, comerciante, militar,

carpinteiro, negociante, escrivão, telegrafista, alfaiate, viajante, agricultor, tabelião,

marceneiro, padeiro, seringueiro, soldado, barbeiro, guarda da Estrada de Ferro Madeira

Mamoré, entre outros.

Em 1941, o jornal Alto Madeira publicou outra notícia acerca do início das

aulas em março do referido ano:

Este educandário de ensino reabre suas aulas a 1º de Março próximo.

A Diretoria pede e espera dos Srs. Pais e demais interessados o mútuo

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auxílio para a frequência assídua de seus filhos e protegidos afim de

obterem eles ótimas médias nos exames finais (ALTO MADEIRA,

1941, p. 1).

Com esse fragmento do jornal já foi possível observar a disciplina exigida pela

escola para com as futuras alunas. Também dessa forma era apresentado o regime

disciplinar:

Segundo os Estatutos do estabelecimento e para a regular disciplina

educacional das alunas a Diretoria pede a atenção e apoio dos Srs.

Pais e interessados para o que segue: 1º - Visitas às alunas –

Domingos e dias santificados – de manhã das 9 horas às 11 hs.; à

tarde: das 14 às 17 horas. N. B. – As alunas só serão visitadas pelos

Srs. Pais ou pessoas por eles apresentadas pessoalmente ou por

escrito. 2º - As saídas (que serão consideradas como prêmios) mais

resumidamente possível, ficando estas ao critério da Diretoria. As

alunas não poderão pernoitar fora do estabelecimento durante o

período letivo. 3º - Aos Srs. Pais pede-se a coadjuvação para a

máxima disciplina, escolar, aconselhando as filhas ao ótimo

comportamento, diligência nos estudos. Para maior estímulo das

educandas vai ser inaugurado neste mês, em honra de N. S.

Auxiliadora, o Livro de Ouro exposta na Sala de Visitas do Colégio.

Neste serão colocados os retratos e cartões das Distintas em

Procedimento, Estudo, Disciplina escolar. À Diretoria. (ALTO

MADEIRA, 1941, p. 1).

Essa postura é confirmada em Louro (2013) pelo perfil disciplinador

característico das instituições que ofereciam os cursos normais:

É importante notar que o tempo escolar se constituiu, em suas origens,

como um “tempo disciplinar”. Mestres e estudantes tiveram (e têm) de

aprender uma lógica e um ritmo próprios da escola. O tempo escolar,

como um fato cultural, precisa ser interiorizado e aprendido. A

formação das professoras, portanto, também se faz pela organização e

ocupação de seu tempo, pelo uso dos espaços, pelas permissões e

proibições para onde ir ou não ir (LOURO, 2013, p. 455).

Em seus estudos, Gomes (2007) investigou a educação escolar no Território

Federal do Guaporé. Em 1943, após ser criado o Território, houve consequências

positivas para o desenvolvimento da região. Segundo o autor, até 1943 o sistema

educacional local pautava-se nas leis estaduais do Amazonas e de Mato Grosso, e após a

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criação do Território, o governador Aluízio Ferreira, criou o Departamento de

Educação, pelo Decreto Territorial nº1362

de 10 de abril de 1944.

Um documento expedido pelo primeiro Promotor Público e diretor de

Educação, Attila Sayol de Sá Peixoto, representou as referências que o Território

Federal do Guaporé seguia para efetivação da educação na região, que no caso, eram as

práticas utilizadas no Distrito Federal. Segundo a Portaria de nº 5, de 13 de março de

1944,

O Diretor de Educação, em obediência à recomendação do senhor

Governador, resolve adotar nas escolas primárias do Território, com

as alterações feitas por este departamento, os programas mínimos de

Linguagem, Matemática, Geografia, História, Educação Moral e

Cívica, Higiene, Ciências Naturais, Desenho e de Artes Aplicadas, em

uso nas escolas do Distrito Federal. Os programas serão distribuídos

às escolas e deverão ser executados no corrente ano letivo

(GUAPORÉ, 1944, p. 1).

Segundo Gomes (2007), os recursos financeiros, em sua grande maioria, eram

provenientes do Governo Federal a partir do Fundo Nacional de Ensino Primário, pelo

Decreto-Lei nº 4.958, de 14 de novembro de 1942, “era formado com renda proveniente

dos tributos federais” (GOMES, 2007, p. 79).

A partir de decretos-leis federais promulgados em 1942 a 1946, o contexto da

política educacional no país foi traduzido na tentativa de organizar o funcionamento de

todos os tipos de ensino existentes no Brasil, a partir das Leis Orgânicas de Ensino. A

Lei Orgânica do Ensino Normal, Decreto-Lei nº 8.530 de 2 de janeiro de 1946, previa o

funcionamento das aulas e cronograma das disciplinas:

CAPÍTULO IV - TÍTULO II - Da estrutura do ensino normal -

CAPÍTULO I - DO CURSO DE REGENTES DE ENSINO

PRIMÁRIO: Art. 7º O curso de regentes de ensino primário se fará em

quatro séries anuais, compreendendo, no mínimo, as seguintes

disciplinas: Primeira série: 1) Português. 2) Matemática. 3) Geografia

geral. 4) Ciências naturais. 5) Desenho e caligrafia. 6) Canto

orfeônico. 7) Trabalhos manuais e economia doméstica. 8} Educação

física. Segunda série : 1) Português. 2) Matemática. 3) Geografia do

Brasil. 4) Ciências naturais. 5) Desenho e caligrafia. 6) Canto

orfeônico. 7) Trabalhos manuais e atividades econômicas da região. 8)

Educação física. Terceira série: 1) Português. 2) Matemática. 3)

História geral. 4) Noções de anatomia e fisiologia humanas. 5)

Desenho. 6) Canto orfeônico. 7) Trabalhos manuais e atividades

62

As atividades desenvolvidas pelo Departamento seriam executadas pelo Diretor ou através das seguintes

instituições: I – Serviço de Ensino Primário e Normal; Centro de Ensino Grupos Escolares; Escolas

Primárias e Postos de Ensino; Escolas Normais II – Serviço de Ensino Profissionalizante; Escolas

Domésticas; Aprendizado Industrial (GOMES, 2007, p. 68)

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econômicas da região. 8) Educação física, recreação e jogos.

Quarta série: 1) Português. 2) História do Brasil. 3) Noções de

Higiene. 4) Psicologia e pedagogia. 5. Didática e prática de ensino. 6)

Desenho. 7) Canto orfeônico. 8) Educação física, recreação e jogos. §

1º O ensino de trabalhos manuais e das atividades econômicas da

região obedecerá a programas específicos, que conduzam os alunos ao

conhecimento das técnicas regionais de produção e ao da organização

do trabalho na região (BRASIL, 1946, p. 2).

De acordo com o livro Registro de Diploma 1º Livro – 1940 a 1977, podemos

confirmar que a ENRA seguia o previsto pelo Decreto-Lei nº 8.530/46, exceto pelas

disciplinas de Jogos e Canto orfeônico, entretanto, encontravam-se acrescidas no

registro de diplomas das normalistas formadas as disciplinas de Música e Francês (IMA,

1946).

Figura 13: Diploma de alunas da Escola Normal Rural Nossa Senhora Auxiliadora, 1946

Fonte: Acervo do IMA. Porto Velho/RO.

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De acordo com o diploma da aluna Emília de Araújo Pinto, destacado acima, a

aluna do Curso Normal Rural formava-se como Professora Normalista Rural dando-lhe

o direito de exercer o magistério público primário nos termos das leis do Território. As

notas/médias das disciplinas também podem nos dizer algo. As disciplinas ministradas

correspondiam às disciplinas de Português, Matemática, Enfermagem, Ciências Físicas

e Naturais, Psicologia, Metodologia, Pedagogia, Música, Francês, História da

Civilização, Geografia e História do Brasil, Educação Física, Desenho Caligrafia e

Trabalhos Manuais e Aula Prática a qual não conseguimos descobrir como era

realizada.

Outra observação que fizemos foi a de que a aluna apresentou notas como 49

em Geografia e História do Brasil, 43 em Pedagogia e em Desenho Caligrafia e

Trabalhos Manuais, ou seja, embora a aluna não tivesse obtido nem 50% de

aproveitamento nessas matérias, a aluna formou-se como professora normalista rural.

Em 1946, a ENRA encerrou a oferta do Curso Normal Rural. Provavelmente,

isso se deveu as novas orientações expedidas pelas Leis Orgânicas do Ensino, de 1946,

que previa o funcionamento das aulas e cronograma das disciplinas que estabeleceu

nova forma de organização do Ensino Normal.

Gomes (2007) ressaltou que em meio a intensa movimentação legislativa, D.

Pedro Massa, até então o administrador apostólico da Prelazia de Porto Velho,

almejando ampliar o Curso Normal, solicitou do governador Joaquim de Araújo Lima

juntamente ao Ministério da Educação e Saúde, a autorização para funcionar o anexo ao

Departamento Feminino do Ginásio Dom Bosco: a Escola Normal a ser mantida pelas

FMA. Desse modo, a instituição não mais iria oferecer o Curso Normal Rural.

O requerimento foi prontamente atendido pelo Governador Joaquim

de Araújo Lima através do ofício n. 60 de 17 de abril de 1949,

argumentando de acordo com o que estabelecia o Artigo 170 da

Constituição Federal e o Artigo 44 da Lei Orgânica do Ensino

Normal, Decreto-lei 8.530/46, Portaria n. 585 de 9/de dezembro de

1947. Solicitava do Senhor Ministro da Educação e Saúde Clemente

Mariani que fosse concedida autorização para funcionamento, em

Porto Velho, capital do território Federal do Guaporé, de um

estabelecimento de ensino do tipo Escola Normal, sob os cuidados das

irmãs de Maria Auxiliadora, da Congregação Salesiana. Esclarecia o

Governador que essas religiosas já dirigiam o Departamento Feminino

do Ginásio Dom Bosco e o Instituto Maria Auxiliadora, que

compreendia curso Pré-Primário (Jardim da Infância) e curso

Primário, organizados segundo as exigências do Decreto-lei 8.529/46

(GOMES, 2007, p. 109).

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Segundo o Histórico da escola (IMA, 2000), a ENRA estaria aguardando para

iniciar as atividades do Departamento Feminino do Ginásio Dom Bosco para satisfazer

as exigências pedagógicas do Decreto-Lei nº 8.530/46. A Portaria nº 390 de 17 de

agosto de 1951 estabeleceu os termos do § 2º da Portaria Ministerial 585 de 1947,

devendo o Curso Normal funcionar no mesmo prédio (GOMES, 2007, p. 110). O que

foi confirmado no Artigo 4º do Decreto-Lei nº 8.530/46.

CAPÍTULO III - DOS TIPOS DE ESTABELECIMENTOS DE

ENSINO NORMAL: Art. 4º Haverá três tipos de estabelecimentos de

ensino normal: o curso normal regional, a escola normal e o instituto

de educação. § 1º Curso normal regional será o estabelecimento

destinado a ministrar tão somente o primeiro ciclo de ensino normal. §

2º Escola normal será o estabelecimento destinado a dar o curso de

segundo ciclo desse ensino, e ciclo ginasial do ensino secundário. § 3º

Instituto de educação será o estabelecimento que, além dos cursos

próprios da escola normal, ministre ensino de especialização do

magistério e de habilitação para administradores escolares do grau

primário. § 4º Os estabelecimentos de ensino normal não poderão

adotar outra denominação senão as indicadas no artigo anterior, na

conformidade dos cursos que ministrarem. Parágrafo único. É vedado

a outros estabelecimentos de ensino o uso de tais denominações, bem

como o de nomes que incluam as expressões normal, pedagógico e de

educação (BRASIL, 1946, p. 2).

No período de 1937 a 1946, a ENRA alicerçou-se como uma instituição muito

procurada também pelos segmentos médios da sociedade, incumbida de formar as

futuras professoras que Porto Velho necessitava para o ensino primário. As cidades das

redondezas também visavam matricular suas filhas na instituição, onde também havia

alunas filhas de pais com alto poder aquisitivo, influentes da região. Gomes (2007)

destacou que a ENRA havia sido criado para preparar professoras para atuar na zona

rural.

O fim da ENRA deu-se após a criação do Curso Ginasial, médio, como

Departamento Feminino do Ginásio Dom Bosco, no colégio dos salesianos até cumprir

as exigências pedagógicas necessárias para manter o referido curso, sendo reconhecido

pelo Ministério da Educação e Saúde a partir da Portaria 521, em 31 de agosto de 1946.

Ao enveredarmos pelos caminhos da História das Mulheres investigamos uma

instituição de educação feminina em Porto Velho, atual capital de Rondônia, escolhendo

como objeto de pesquisa no Mestrado em Educação, o Instituto Maria Auxiliadora,

quando este iniciou suas atividades, em 1930, como Escola Paroquial. Mais tarde a

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instituição passou a ser denominada Escola Normal Rural Nossa Senhora Auxiliadora e

dedicou-se a formar professoras normalistas rurais em Porto Velho, nos anos de 1937 a

1946. É nesse período que nos detemos mais demoradamente em nossa análise.

Consideramos que a relevância dessa investigação se materializa na

possibilidade de enveredar pelas fontes, pelos documentos, pelos caminhos da história

da própria escola e da formação de professoras, buscando identificar o que os vestígios

deixados pelo tempo têm a nos dizer sobre a história da formação de mulheres em Porto

Velho, na ENRA no período em análise.

Percebemos que a educação das alunas na ENRA era, principalmente, voltada a

uma educação conservadora e preservadora das tradições religiosas e socialmente

construída. Quando professoras, deveriam difundir as regras religiosas transmitidas

durante sua formação para os futuros alunos. As moças, além das disciplinas de

conhecimentos gerais, aprendiam as prendas domésticas, como o bordado, o francês, a

música, regras de etiqueta. As professoras deveriam ser formadas com as características

consideradas femininas: paciente, afáveis, buscando na docência a extensão da

maternidade, ampliando seu universo, que antes estava restrito ao lar e à igreja, para

dentro das salas de aula.

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CONSIDERAÇÕES

Na construção desta narrativa aproximamos dos pressupostos da História Nova

para investigar a história da educação feminina que foi ofertada na ENRA.

Ao enveredarmos pelos caminhos da História das Mulheres investigamos uma

instituição de educação feminina em Porto Velho, atual capital de Rondônia, escolhendo

como objeto de pesquisa no Mestrado em Educação, o Instituto Maria Auxiliadora,

quando este iniciou suas atividades, em 1930, como Escola Paroquial. Mais tarde a

instituição passou a ser denominada Escola Normal Rural Nossa Senhora Auxiliadora e

dedicou-se a formar professoras normalistas rurais em Porto Velho, nos anos de 1937 a

1946. É nesse período que nos detemos mais demoradamente em nossa análise.

Consideramos que a relevância dessa investigação se materializa na

possibilidade de enveredar pelas fontes, pelos documentos, pelos caminhos da história

da própria escola e da formação de professoras, buscando identificar o que os vestígios

deixados pelo tempo têm a nos dizer sobre a história da formação de mulheres em Porto

Velho, na ENRA no período em análise.

Consumida pela curiosidade em desvendar a formação de professoras

normalistas pela Escola Normal Rural Nossa Senhora Auxiliadora, tivemos que buscar

fundamentos na História da Educação e na História das Mulheres.

Dessa maneira, nas leituras realizadas, tornou-se perceptível que muito embora

a carreira docente fosse a porta inicial para a mulher entrar no mundo do trabalho era

também o meio encontrado pelo catolicismo para a propagação dos valores católicos

cristãos, princípios e condutas sociais. Tanto religiosas, quanto religiosos e os governos

brasileiros encararam a mulher como aquela que seria responsável por instruir e educar

a infância, suas filhas e filhos de modo a formar um “novo homem” como a República

idealizava.

Percebemos, durante a busca por fontes que conseguissem responder nossas

indagações, a dificuldade em ter acesso a alguma delas. Em se tratando de documentos

religiosos, notamos o difícil acesso para entrar em contato com registros que continham

informações indispensáveis para a análise a qual nos propusemos.

Na escola, não conseguimos ter acesso a todas as fontes que almejávamos

encontrar, o que trouxe algumas dificuldades à nossa análise. Entretanto, conseguimos

ter acesso aos livros de matrícula, atas de visitas, livros de diplomas, fotografias, livros

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de arguições, promoções e algumas informações que nos permitiram alguma

configuração de como estava estruturado o ensino ministrado pelas FMA.

Algumas publicações do jornal Alto Madeira mostraram como as FMA se

utilizaram da imprensa para publicitarem as atividades da ENRA, ao mesmo tempo,

tornou-nos perceptível a maneira como a imprensa local enxergava as ações educativas

que ali eram desenvolvidas.

A Escola Normal Nossa Senhora Auxiliadora, hoje Instituto Maria

Auxiliadora, faz parte da paisagem urbana, social e cultural da cidade de Porto Velho.

Criada pelas Irmãs Salesianas, Filhas de Maria Auxiliadora, a escola teve, no período

em estudo, o objetivo de formar professoras normalistas rurais, nível médio, para

trabalharem em escolas rurais da região.

Propondo-nos a responder à pergunta de como se deu a formação das

professoras normalistas rurais da ENRA, percebemos que o ensino das moças se

encontrava vinculado às próprias representações de uma mulher idealizada. Uma mulher

de conduta social ilibada, recatada e seguidora da fé cristã. Além disso, esperava-se

formar mulheres capazes de cuidar bem de seus lares e, se seguissem a carreira docente,

capazes de serem boas educadoras das crianças, ou seja, mulheres exemplares segundo

as normas salesianas.

As aulas ministradas na ENRA continham disciplinas gerais como Português,

Matemática, Ciências Naturais e Física. Entretanto, havia uma diferença para as

disciplinas ofertadas para a educação feminina que também aprendiam os trabalhos

manuais como corte e costura, bordado e produção de artesanatos. O bordado, a

confecção de artesanatos, as “prendas domésticas” sempre estiverem envolvendo o

contexto escolar das alunas. A escola era, depois da Igreja, o primeiro espaço público

que as moças porto-velhenses passaram a frequentar. O sistema de internato da ENRA

comprovou a preocupação que as FMA tinham em manter as alunas longes “do

pecado”, da desonra/depravação social. Ao mesmo tempo que as isolava do convívio

social, era mais fácil levar as meninas e moças a tornarem-se seguidoras de suas

crenças.

As FMA mantinham rígido controle sobre o cotidiano das alunas, tanto internas

quanto externas, sobrecarregando-as de atividades escolares. As alunas deveriam

cumprir a carga horária das disciplinas, frequentar o Catecismo Diário, catequese

escolar, o Oratório Festivo e participar de outros rituais cívicos e religiosos.

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No contexto da instituição em estudo, cabe lembrar que as congregações

salesianas, como muitas outras, haviam sido proibidas de exercer suas atividades na

França. Em solo brasileiro era preciso conquistar as populações ribeirinhas e rurais,

avessas à religião. Dessa forma, encararam como um dever para com suas congregações

a educação das moças como uma forma de educar a infância e a juventude segundo seus

preceitos. As moças uma vez formadas ou “doutrinadas” dariam sequência aquilo que

haviam aprendido e difundiriam entre suas famílias e nas escolas nas quais fossem atuar

os princípios religiosos salesianos.

Os anos de 1930, no Século XX, marcaram a história da educação em Porto

Velho, proporcionando à população o encontro com educação salesiana. De certa forma,

a representatividade do papel da Igreja Católica e seu poder se espalhou para a região

que se encontrava “abandonada” pelo poder público que não conseguia atender

satisfatoriamente a população com escolas para suas filhas e filhos. Assim, a educação

salesiana encontrou espaço e configurou uma formação feminina, um modelo formativo

de mulher, inspirado na doutrina cristã.

No Brasil República, no período do Estado Novo, de 1937 a 1945, estava

disseminada uma aliança entre Igreja e Estado para uma oferta de educação feminina na

qual era preciso cuidar da disciplina e do civismo. Na ENRA, esse perfil de educação

feminina voltou-se para o cuidado do corpo feminino, cultivando valores como pureza,

docilidade, brandura, uma mulher que deveria espelhar-se na Virgem Maria.

O modelo de mulher, mãe, abnegada, afável e pura perpassou a

profissionalização feminina; o mesmo modelo seguiu a carreira docente: a professora

deveria ter, dentre outras características, aquelas que corroborassem com a mulher ideal

para educar as/os filhas/os, e a ENRA contribuiu para a difusão desse ideário de mulher:

uma professora virtuosa, modelo de filha, mãe, esposa.

Na ENRA, a educação destinada às mulheres dava ênfase às noções de

disciplina, ordem e autoridade, na medida em que eram ministradas a formação

religiosa, intelectual e moral de forma controladora e constante, objetivando a educação

católica. Dentre as atividades desenvolvidas pelas Irmãs, estava a prática sacramental,

confissão semanal e comunhão. O modelo considerado adequado era o de mulher

voltada para a maternidade e a vida no lar, mas a atuação como professora seria

aceitável. O arquétipo de mulher, mãe, bondosa e amável foi transmitido e sustentado

no ideário da professora, que passaria seu aprendizado para as/os alunas/os e filhas/os.

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Desde muito cedo, as meninas já eram introduzidas ao trabalho doméstico, e

essa necessidade fez com que, ainda na infância, as mulheres já fossem preparadas e

instruídas para esse ofício, característica que reforçava a ideia do “ser mulher”.

Por último, cabe destacar que analisar a instituição educativa do ponto de vista

histórico, no sentido de examinar o processo de criação, organização e consolidação em

Porto Velho/Rondônia, possibilitou a percepção de que havia uma singularidade tanto

do cotidiano escolar de uma escola religiosa quando das jovens normalistas que, a partir

da análise das fontes e literatura pertinente à temática, conseguimos relacionar a

educação ofertada pela ENRA às moças como intrinsecamente voltadas às relações

sociais e de gênero, ou seja, cabia educar uma mulher para o cuidado com a educação da

infância, exercer o ofício de professora de crianças era aceitável e a profissão

podia ser comparada às aspirações maternais, qualidades que todas as mulheres,

futuras esposas e mães, seguidoras da Virgem maria, deveriam ter.

A partir de nosso questionamento a respeito de como foi a formação oferecida

às meninas e moças na ENRA, comprovamos que as FMA estabeleceram as atividades

pedagógicas da ENRA com o objetivo de formar professoras normais rurais que depois

de formadas também prosseguiriam difundindo os valores que haviam seguido na

instituição, ou seja, os valores tradicionais católicos cristãos, ampliando o alcance da

doutrina salesiana na comunidade à qual estavam inseridas.

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Discursos

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