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ENTRE TRAMAS DA SALENDA: ALGUNS FORMATOS DO TAIS DÍLI TIMOR-LESTE
Andreza Carvalho Ferreira1
A confecção da salenda inclui várias atividades como: enrolar linha, fazer o duir
(urdume), passar a ordem (encomenda) para o papel, adequar o que foi feito em papel para
o tais, tecer, revisar, cortar a franja, entre outras. Contudo, é necessária uma ordem para
desencadear a produção. As ordens abrangem escolha de cores, negociação de palavras ou
desenhos que vão estar no produto final, assim como a quantidade de salendas e o tamanho
delas.
No Sentru Suku Fundasaum Alola Mercado de Taibesi, a maioria das ordens é feita
por órgãos do governo timorense para seus eventos, onde as salendas comumente circulam
ofertadas pelos timorenses como presentes para visitas estrangeiras. Nesse sentido, é
interessante ressaltar que a salenda é um dos formatos adotados pelo tais, tecido
tradicional timorense, e sua oferta no contexto destes eventos remete a um gesto de
hospitalidade.
Este trabalho foi realizado em Díli, capital de Timor-Leste, em 2014, e contempla
alguns momentos da produção da salenda. No Sentru Suku, a maioria das etapas era
realizada apenas por mulheres que se engajavam de diversas maneiras na feitura do tais e
em múltiplas atividades como enrolar linha, tecer, fazer a ordem e etc. Enfim, trago aqui um
esforço que tenta mostrar um pouco do cotidiano dessa trama.
1 Graduanda DAN/UNB, [email protected]
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1 Ofélia passa a ordem para o papel
quadriculado. Nessa atividade, é
necessário fazer cruzes nos quadrados,
como em ponto-cruz, para dar forma ao
desenho ou a palavra. Muitas vezes
Ofélia tem que adequar desenhos de
forma que fique figurativo dentro das
limitações do tais. No caso de um
desenho, e não de palavras, a conclusão
do molde pode demorar até dois dias.
2 Bendita tenta adequar o molde para o tais. Nem sempre se acerta na primeira tentativa.
Ofélia costuma acompanhar a feitura do primeiro tais da ordem, para perceber se será
necessário refazer o molde. As tecedeiras mais novas não se ariscam a fazer essa primeira
amostra da salenda com receio de errarem. Apenas Bendita e Angelina têm coragem.
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3 Angelina ajuda Balbina a
entender a salenda. Depois que
se tem a primeira amostra pronta
e aprovada, não se recorre mais
ao molde. Assim, as tecedeiras
usam como referência as
salendas prontas. Entretanto,
quando é uma ordem nova, há
um período de adaptação com os
novos padrões a serem feitos.
Angelina é umas tecedeiras mais
antigas e com frequência é
chamada para ajudar nessas
situações.
4 Iza tece. Apesar de existir a encomenda, uma ordem não é totalmente fechada. As tecedeiras
têm a liberdade para fazerem seus padrões preferidos entre as ornamentações da salenda, que
costumam ficar no começo e no final da extensão da peça. É como se cada tecedeira tivesse
sua própria assinatura.
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5 Linda coloca os palitos. No tais, os desenhos ou as palavras surgem através da tecelagem
com os palitos. Os palitos são dispostos respeitando as cruzes no molde, ou os pontos da
salenda pronta. A colocação exata do palito indica tanto o ponto quanto o não ponto do
tecido. É uma atividade que demanda bastante atenção das tecedeiras.
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6 Linda tece. O tear que Linda ocupa nesta foto é o único que não é improvisado em
mesas de máquina de costura. Esse tear é pessoal da Ofélia e costuma ser revezado
entre as tecedeiras. Todavia, é possível tecer apenas com um pedaço de madeira. É
deste modo que as tecedeiras tecem em suas casas. Para a tecelagem do tais o
equipamento não é tão fundamental, a vitalidade está na tensão entre a tecedeira e o
duir.
7 Bendita tece. É curioso perceber que Bendita faz ao mesmo tempo duas salendas.
Afinal, poucas tecedeiras se sentem confiantes para fazer duas salendas ao mesmo
tempo, pois qualquer erro é duplo. Porém, enquanto o tais ainda não está
completamente finalizado pelo corte da franja, sempre é possível desfazer alguma parte
e arrumar algum deslize.
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8 Ofélia e Angelina conferem a salenda. Ofélia observa se as letras ou desenhos estão
legíveis e bem feitos. Mas também confere se a grafia está correta, porque as
tecedeiras são analfabetas. Pois em uma tentativa passada de autogestão do Sentru
Suku, ocorreram problemas com erros envolvendo esquecimento de letras em
ordens inteiras.