Entrevista josé newton

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ENTREVISTA COM O DR. JOSÉ NEWTON

O professor e Doutor José Newton Pires Reis cedeu uma entrevista que durou 30 minutos em seu gabinete no Departamento de Economia Agrícola no Campus do Pici da Universidade Federal do Ceará (UFCE) onde conversamos sobre políticas públicas de convivência com o Semiárido, onde o mesmo possui graduação em Agronomia pela Universidade Federal do Ceará (1990) e Doutorado em Economia Aplicada pela Universidade de São Paulo (1995). Atualmente é Professor Associado 4 da Universidade Federal do Ceará. Tem experiência na área de Economia, com ênfase em Economia Agrária, atuando principalmente nos seguintes temas: agronegócio, comercialização, marketing e empreendedorismo. Também foi o organizador do I Simpósio em Economia Rural_ Políticas Públicas para a Convivência com o Semiárido onde há na descrição do site do simpósio e o currículo do Professor e Doutor Newton:

Site do Simpósiohttp://econruralufc.wix.com/simposio

Currículo do Dr. e Prof. José Newton Pires Reis http://lattes.cnpq.br/6728625638297991

1. OPP_ Quando surgiu essa ideia de convivência com o semiárido no Ceará?

Dr. Newton_ Na medida em que apresenta o surgimento dos trabalhos sobre convivência do semiárido aqui no Departamento de Economia Agrícola, mais precisamente no nosso programa de mestrado, essa ideia de convivência com o semiárido no Ceará é uma ideia histórica, apesar do que era paradigma não era a convivência e sim o combate à seca, mas aqui no Departamento as ultimas turmas que participaram na seleção do nosso mestrado, algo em torno de 80 % dos projetos de pesquisas são vinculadas com políticas públicas voltadas com o Bioma da Caatinga, então quando percebemos esse interesse concentrado em nossas linhas de pesquisas que é o desenvolvimento em políticas públicas surgiu a ideia então de colaborarmos com os trabalhos em forma de seminários

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e simpósios voltada a essa temática de convivência com o semiárido.

2. OPP_ Como foi realizar o I Simpósio em economia rural sobre políticas pública para convivência com o semiárido?

Dr. Newton_ Bem, a consequência do seminário em uma avaliação com a equipe de trabalho foi muito positiva, o fruto do seminário foi suculento. Agora todo o processo de operacionalização dos seminários para o simpósio é um pouco traumático, porque as nossas estruturas locais elas deixam bastante a desejar, de qualquer forma foi um trabalho a custos baixo com apoio de instituições, mas muito pontuais, não por responsabilidade das instituições, que entre a ideia e a execução da ideia para a promoção do evento o tempo foi curto, pois não havia um projeto onde captasse recurso onde essas instituições apoiem, enfim, foi muito rápido. Portanto, na nossa avaliação envolvendo todos os custos envolvidos e o tempo para a organização do evento foi positiva.

3. OPP_ Diante de muitos trabalhos publicados sobre convivência com o semiárido, na sua visão, houve alguma mudança significativa no Estado do Ceará no que diz respeito ao desenvolvimento local em cidades onde estão localizadas no semiárido?

Dr. Newton_ Nós na área de Economia Rural não encontramos uma revisão bibliográfica em muitos trabalhos sobre a convivência do Semiárido, mas certamente existem alguns trabalhos que envolvam esse assunto. Agora, se houve mudanças no Estado quanto ao desenvolvimento local... Houve, frente a meio século de políticas públicas, se nos reportarmos ao crédito rural, essas mudanças não parecem ser significativas, bastou uma nova estiagem no Estado para perceber novamente a carência de água, carros pipas, que é um problema recorrente, sistemático, onde no passado o governo do Estado fez um trabalho em décadas passadas onde se realizaram projetos voltados a gestão dos recursos hídricos que é até referência para outros Estados e até mesmo para outros países, se não fosse o trabalho em recursos hídricos que houve no passado aqui no Ceará, atualmente seria caótica a nossa situação atual. E outras políticas públicas como o programa Fome Zero e posteriormente o Brasil sem Miséria, que o foco é realmente as bolsas para famílias, onde temos o Bolsa Família, nós ainda teríamos retirantes se dirigindo para as capitais ou para a cidade de Fortaleza e isso nós não vemos, ou seja, o homem do campo atualmente está sendo assistido com tais ajudas do Governo, isso se compararmos a algumas décadas atrás. Mas será que isso é desenvolvimento? A lógica assistencialista parece continuar prevalecente e a de desenvolvimento não, porque esse desenvolvimento é visceral, ele é includente, não é assistencialista porque se faz ser necessário ser sustentável. Há mudanças? Sim, há mudanças, porém essas mudanças são muito lentas frente à necessidade do desenvolvimento da região.

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4. OPP_ O senhor consegue enxergar qual seria a política pública sobre convivência com o semiárido mais atuante no Estado do Ceará?

Dr. Newton_ A política de distribuição de renda, como o programa Bolsa Família por exemplo. Agora quando enxergamos a especificidade de convivência com semiárido frente ao governo, pode-se observar um paradigma com políticas de combate a seca que são ações emergenciais quando enxergamos ações estruturantes continuam dentro do paradigma de combate as secas como, por exemplo, a transposição do rio São Francisco que são grandes obras com volume de investimento imenso e com alcances questionáveis, ao passo que outras ações seriam mais locais e mais pontuais, como por exemplo, o programa de cisternas em placa deverá haver uma resposta muito mais sustentável a ponto do Governo do Estado encampar o programa de 1 milhão de cisternas que foi iniciativa da comunidade, algumas instituições que historicamente trabalham com a convivência como a Articulação do Semiárido Brasileiro (ASA) que é uma ação articulada do semiárido onde houve também mais uma polemica sobre as cisternas de plástico que inverte o social, a mobilização da sociedade, a organização de um povo com a proposta educativa e mantém uma visão do paradigma em receber de uma maneira dependente com uma cisterna com o vinculo dependente a partir de recursos naturais não renováveis como o petróleo mas enfim, em termo de convivência com o semiárido no Ceará eu enxergo a política mais atuante vinculada com a produção de cisternas em placa.

5. OPP_ Na sua visão, existe algum tipo de empreendimento ou empreendimentos, além da agricultura, que possa gerar emprego e renda nessas regiões que não são próximas da região metropolitana de Fortaleza?

Dr. Newton_ Sim, com certeza. O bioma Caatinga é riquíssimo em diversidade na flora e na fauna, então, atividades na forma de extração de frutos, atividades na forma de produtos fitoterápicos podem ser alternativas para o homem que mora nessas regiões da caatinga, já a insistência na criação de bovinos que são animais de grande porte e que consomem uma grande quantidade de água e de pasto que precise de uma área considerável de manutenção é incoerente e inviável com a visão que temos do semiárido, daí podemos ter empreendimentos com pequenos animais que aí seria a caprinocultura principalmente como produção de carne, de leite e de peles e com uma demanda de água menor com uma capacidade adaptativa de manejo extensivo na própria Caatinga que pode ser enriquecida através do raleamento e de outras práticas de manejo, enfim, também posso citar o artesanato local com o uso da palha e do barro, instituições como a ASA e a EMBRAPA do semiárido e em Petrolina e vários outros institutos que tem tecnologias capazes para trazer o desenvolvimento para essas regiões em parceria com as comunidades, agora deverá haver os interesses em fazer, por exemplo, a irrigação em pequenas áreas para a

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agricultura familiar, essa irrigação de pivô central ela pode ser desenvolvida por uma agricultura patronal em alguns oásis do semiárido e a identidade do semiárido vai sempre está relacionada com a agricultura familiar.

6. OPP_ O que precisa ainda ser feito para estas pessoas que residem em cidades que ficam no semiárido?

Dr. Newton_ O que precisa ser feito é ter uma visão mais holística e não apenas mais econômica, por exemplo, a questão educacional, os jovens vão ter um atrativo muito forte pela cidade e se não valorizar a sua cultura local ou seu habitat, eu digo que essa valorização ela é ambiental, econômica, social, politica, e no social entra as variáveis da educação, lazer, que pode está relacionada aos esportes, o jovem precisa se identificar com o seu local de origem e ficar, o que precisa ser feito para mudar esse cenário, não é pensar apenas no econômico, mas ter uma visão do todo.

7. OPP_ As políticas públicas atuais são eficientes quanto ao atendimento aos produtores rurais e para as pessoas que moram na região semiárida no Ceará? Comente.

Dr. Newton_ Se essas políticas fossem eficientes os animais desses produtores rurais que dependem disso não teriam morrido, então a eficiência deixa a desejar, ou seja, não é a ideal, voltando a comentar o modelo continua sendo dependente, assistencialista de combate à seca, consequentemente o atendimento dos produtores continua sendo muito próximo as políticas coronelistas que tem estado arraigado na cultura do nosso sertanejo e quebrar esse círculo vicioso não é fácil mas é possível, e você ver crianças recebendo a merenda escolar que é produto de um programa de aquisição de alimentos (PAA), percebo o acontecimento dessas políticas havendo o apoio a essas pessoas, mas temos poucos trabalhos publicados de avaliação de políticas de impactos dessas políticas, de efeitos práticos dessas políticas que represente as condições de vida das pessoas que assistidas por tais políticas.

8. OPP_ Como essas pessoas que residem na região do semiárido poderiam contribuir para a sua convivência nesses locais?

Dr. Newton_ Eu vou radicalizar a minha resposta, como é que os dependentes de crack poderiam contribuir para melhorar sua situação? Eles estão em um estágio de dependência que por si só eles não saem do vício, tem que haver uma variável exógena, uma internação tem que haver uma atitude que venha de fora, que quebre esse ciclo de dependência. Mas professor, a comunidade por si só podem encontrar essas respostas? Com certeza, nós vemos alguns poucos

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exemplos e conheço algumas dessas comunidades, mas de uma dificuldade em que os efeitos finais eles terminam sendo muito pequenos frente à dimensão do desafio que envolve uma região das mais habitadas do país com os menores índices de renda e de desenvolvimento humano e as resposta jamais deverá ser unilateral onde todos participam de forma igualitária com ações integrativas complementares, como associações e cooperativas. Veja bem o homem do sertão continua com práticas nocivas, onde ele desmata a caatinga para vender a madeira como forma de energia, sabe-se e que isso ocasiona um impacto muito grande no solo, porque fica sem a cobertura vegetal ficando exposto o solo aos ventos e ao sol, logo podem ocorrer os processos de desertificação e uma das ultimas edições da revista da UFCE trouxe indicativos de 60 % do território cearense apresentando sinais de desertificação, logo se essas políticas fossem eficientes nós não teríamos esses indicadores que apontam 60 % de desertificação em todo o Estado, se as populações contribuíssem para resolver, isso enxergando se essas comunidades fossem protagonistas, para resolver o problema da desertificação nós não estaríamos tendo esses indicativos como resposta, então há soluções a partir de políticas de baixo custo e eficientes, sendo contrárias as politicas que requer investimentos exorbitantes e que as populações não podem contribuir, mas elas devem contribuir, as respostas devem ser locais, integradas e sustentáveis, visceral, endógena, buscados e encontrados com apoios externos, mas pela própria comunidade, e se isso não acontecer, essas propostas vão ser passageiras, efêmeras que não serão em longo prazo.

9. OPP_ Atualmente o senhor vê mudanças na forma de pensar dessas pessoas que moram nas cidades cearenses que ficam no semiárido?

Dr. Newton_ As mudanças que se percebe é de degradação ambiental, da perca da diversidade, da dependência do homem a interesses políticos partidários, eu até queria apresentar um discurso mais otimista, as respostas são simples, porém não são fáceis, as mudanças são muito pontuais e são muito relevantes. Os nossos 184 munícipios dependem de recursos federais, estaduais de complementações a partir de pensões previdenciárias, de bolsas, agora imagine se retirasse esses recursos ou repasses aos municípios, o que ficaria? A nossa produção é importada e o nosso consumo é fruto da importação, a indústria é localizada, não é a toa que Fortaleza tem mais 2,5 milhões de habitantes então a riqueza é localizada, consequentemente a logística da operacionalização dessas cidades são dependentes, e se você observa a agricultura e a pecuária que historicamente são setores marginalizados, os resultados parecem ser assustadores, mas o modo de pensar tem modificado? Sim, a cada dia as pessoas são renovadas e transformadas, porém viver só de boas intenções o homem não vive em termos práticos e com respostas continua esse paradigma de combate à seca com visão assistencialista e dependente e infelizmente esse é meu entendimento sobre as suas intenções, mas eu imagino que vai nesse rumo

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e nessa direção.