“Equidade não é tratar cada aluno e cada centro da mesma forma” _ Atualidade _ Edição Brasil...

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ANA TERUEL París 3 FEV 2014 - 12:32 BRST ANDREAS SCHLEICHER | DIRETOR DO RELATÓRIO PISA “Equidade não é tratar cada aluno e cada centro da mesma forma” Schleicher sustenta que a educação pode melhorar com menos dinheiro e melhores professores Arquivado em: Informes Pisa Informes Pisa José Ignacio Wert José Ignacio Wert OCDE OCDE Lomce Lomce Legislação educativa Legislação educativa Política educativa Política educativa Educação Educação Organizações internacionais Organizações internacionais Relações exteriores Relações exteriores Andreas Schleicher (Hamburgo, 1964), vice-diretor de Educação da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) e diretor do relatório de referência internacional PISA – que avalia o nível dos alunos de 15 anos – é o intelectual ao qual o ministro da Educação espanhol, José Ignacio Wert, recorre constantemente para defender no Congresso ou em entrevista coletiva a sua reforma educacional. Ambos compartilham da opinião sobre a necessidade de avaliações externas ou as sinergias com o mundo empresarial, mas Schleicher também se preocupa com o progresso a um sistema de maior qualidade, sem comprometer a equidade. O pesquisador abriu no domingo a Semana da Educação da Fundação Santillana. Pergunta. O senhor falará em Madri sobre as forças e fraquezas do sistema educativo espanhol. Não pode antecipar algo? Resposta. Nos últimos 40 anos, a Espanha tem feito grandes progressos em termos de integrar mais pessoas no sistema de ensino. Mas se olhar para os resultados do PISA nos últimos 10 anos, ainda há muito espaço para melhorias. O sistema não é totalmente eficiente: há muito investimento, mas os resultados não corresponderam às expectativas. O copo está meio cheio, mas não cheio. P. Como isso afeta o mercado de trabalho? R. Há muitos graduados desempregados que procuram trabalho e ao mesmo tempo muitos empregadores que dizem que não encontram o perfil adequado. Há um desequilíbrio entre as necessidades da sociedade e o que a escola oferece. É preciso investir nela. A educação de hoje é a economia de amanhã. A Espanha tem um sistema universitário desenvolvido, mas é preciso criar mais variedade na oferta de talentos. P. Como pode ser feito? R. A Espanha tem uma alta taxa de evasão escolar. [Os alunos] ficam entediados, não sentem que o que aprendem na escola se aplica à sua vida atual e futura. Se você gerencia um supermercado e diariamente de cada 100 clientes 30 saem sem comprar nada, muda-se o inventário. É aí que as escolas estão erradas, pois estão muito preocupadas com um currículo prescritivo. P. Como o senhor destaca, há muito desemprego entre os jovens, inclusive entre os graduados. Como as pessoas podem ser motivadas? R. Há explicações no lado da demanda, da flexibilidade do mercado de trabalho. Mas o principal é dispor das qualificações adequadas. Ainda temos a mentalidade de: “Aprendo para Andreas Schleicher. “Equidade não é tratar cada aluno e cada centro da mesma forma” | Atu... http://brasil.elpais.com/brasil/2014/02/02/actualidad/1391367495_762... 1 de 3 04/02/2014 21:13

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ANA TERUEL París 3 FEV 2014 - 12:32 BRST

ANDREAS SCHLEICHER | DIRETOR DO RELATÓRIO PISA

“Equidade não é tratar cada aluno e cada centro da mesma

forma”Schleicher sustenta que a educação pode melhorar com menos dinheiro e melhores professores

Arquivado em: Informes PisaInformes Pisa José Ignacio WertJosé Ignacio Wert OCDEOCDE LomceLomce Legislação educativaLegislação educativa Política educativaPolítica educativa EducaçãoEducação Organizações internacionaisOrganizações internacionais Relações exterioresRelações exteriores

Andreas Schleicher (Hamburgo, 1964), vice-diretor de Educação daOrganização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico(OCDE) e diretor do relatório de referência internacional PISA – queavalia o nível dos alunos de 15 anos – é o intelectual ao qual oministro da Educação espanhol, José Ignacio Wert, recorreconstantemente para defender no Congresso ou em entrevistacoletiva a sua reforma educacional. Ambos compartilham da opiniãosobre a necessidade de avaliações externas ou as sinergias com omundo empresarial, mas Schleicher também se preocupa com oprogresso a um sistema de maior qualidade, sem comprometer aequidade. O pesquisador abriu no domingo a Semana da Educaçãoda Fundação Santillana.

Pergunta. O senhor falará em Madri sobre as forças e fraquezas dosistema educativo espanhol. Não pode antecipar algo?

Resposta. Nos últimos 40 anos, a Espanha tem feito grandesprogressos em termos de integrar mais pessoas no sistema deensino. Mas se olhar para os resultados do PISA nos últimos 10

anos, ainda há muito espaço para melhorias. O sistema não é totalmente eficiente: há muitoinvestimento, mas os resultados não corresponderam às expectativas. O copo está meiocheio, mas não cheio.

P. Como isso afeta o mercado de trabalho?

R. Há muitos graduados desempregados que procuram trabalho e ao mesmo tempo muitosempregadores que dizem que não encontram o perfil adequado. Há um desequilíbrio entre asnecessidades da sociedade e o que a escola oferece. É preciso investir nela. A educação dehoje é a economia de amanhã. A Espanha tem um sistema universitário desenvolvido, mas épreciso criar mais variedade na oferta de talentos.

P. Como pode ser feito?

R. A Espanha tem uma alta taxa de evasão escolar. [Os alunos] ficam entediados, não sentemque o que aprendem na escola se aplica à sua vida atual e futura. Se você gerencia umsupermercado e diariamente de cada 100 clientes 30 saem sem comprar nada, muda-se oinventário. É aí que as escolas estão erradas, pois estão muito preocupadas com um currículoprescritivo.

P. Como o senhor destaca, há muito desemprego entre os jovens, inclusive entre osgraduados. Como as pessoas podem ser motivadas?

R. Há explicações no lado da demanda, da flexibilidade do mercado de trabalho. Mas oprincipal é dispor das qualificações adequadas. Ainda temos a mentalidade de: “Aprendo para

Andreas Schleicher.

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Comparação da OCDE

As diferenças dedesempenho entreos centrosescolares mais emenos favorecidosna Espanha foramrelativamentepequenas em2012: 26 pontosem comparação àmédia da OCDE,de 71 pontos.

Na Espanha, 6%dos estudantessuperam suasdesvantagenssocioeconômicas eexcedem asexpectativas, umaqueda de 2 pontospercentuais desde2003. Mais de 85%das diferençasentre as regiões naEspanha se devema disparidadessocioeconômicas,muito mais do queem qualquer outropaís da OCDEsobre os quais hádados disponíveis(47% na Itália, 16%no Canadá e 26%na Austrália).

Em todos os paísesda OCDE, umestudante maisfavorecidosocioeconomicamenteobtém 39 pontos amais emmatemática – oequivalente aquase um ano deescolaridade – que

trabalhar em um emprego”. E deveria ser: “Aprendo para criar um emprego. Faço parte dafutura economia, não me limito a preencher um vazio já existente”. As escolas devemfomentar este tipo de espírito empresarial.

P. O senhor insiste na diferença entre o conhecimento e sua aplicação.

R. Os espanhóis se dão muito bem ao reproduzir o que aprenderam,mas muitas vezes têm dificuldades de extrapolar e usar seusconhecimentos em diferentes condições. Por que é um problema?Isso pode ser visto no mercado de trabalho. A economia já não pagaàs pessoas pelo que elas sabem, para isso existe o Google. Pagampor aquilo que são capazes de fazer com o conhecimento.

P. O último Relatório PISA destaca uma estagnação da Espanha nadécada passada, apesar de um aumento de 35% do investimento naeducação. Desde 2010, esse investimento caiu. Podemos fazer maiscom menos?

R. Comparações internacionais mostram que é possível. NaEspanha, grande parte dos gastos foi destinada a aulas menores. Ossistemas de ensino com excelentes resultados e pouco investimentodão prioridade à qualidade dos professores. Um bom sistemaeducacional deve buscar como garantir que os mais necessitadostenham os melhores professores. Na Espanha não há perspectivaspara os docentes. É preciso proporcionar um verdadeiro plano decarreira, que possam se tornar professores de professores, porexemplo. A profissão deve ser dona de seus padrões, com muitaautonomia e colaborações entre professores e escolas.

P. O Congresso aprovou uma nova reforma educacional. Como osenhor avalia?

R. Acho que as intenções das reformas são todas importantes. Aquestão é como implementá-las. Percebe-se a lei como o produtofinal, mas é só o começo, estabelece o marco.

P. A reforma recupera as revalidações no ESO (EducaçãoSecundária Obrigatória) e Bacharelado. Não teme que amplie oproblema do abandono escolar?

R. Eu acho que o novo sistema de avaliação é um passo muitoimportante. Não se pode melhorar sem uma avaliação. Os que maissofrem com a falta de avaliações são crianças de famíliasdesfavorecidas, porque ninguém sabe em que ponto estão. Aquestão de quais os fatores que acompanham estes testes épertinente. Não podemos criar barreiras para os alunos. Ter examesrígidos, muito rigorosos e muito focados é muito importante, masdevem ser acompanhados de iniciativas para que os alunos comdificuldades atinjam essas metas.

P. [A reforma] também introduz mudanças nos programas a partir do3º ano da ESO. Há consenso sobre a idade mínima para escolherprogramas?

R. Os programas nunca deveriam ser fixos; um estudante nuncadeveria ter que tomar uma decisão que não possa ser revertida. Épreciso ter uma educação que está sempre aberta, sempre dá outraoportunidade. Se essas opções são permanentes, podem ir contraos estudantes. E, novamente, prejudicam os estudantes de famíliashumildes.

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um estudantemenos favorecido.

P. Em resumo, existe um modelo mágico?

R. Há muitos caminhos em direção ao sucesso! Todos têm altasexpectativas para cada estudante, padrões muito elevados, sistemasde avaliação muito fortes e, com o tempo, muito apoio. Na Espanhase continua pensando que é preciso tratar cada aluno, cada escola, cada professor da mesmaforma e que isso é equidade. Não é. Equidade é investir os recursos apropriados onde sãonecessários.

© EDICIONES EL PAÍS, S.L.

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