Equilibrio Acido Base

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PARTE 1 INTRODUÇÃO AO EQUILÍBRIO ÁCIDO-BASE OBJETIVOS: Descrever a importância da concentração do íon hidrogênio nos líquidos do organismo. Analisar os principais mecanismos de regulação da concentração do íon hidrogênio para a preservação das funções celulares. CONCEITOS GERAIS A regulação dos líquidos do organismo compreende a manutenção de concentrações adequadas de água e eletrólitos e a preservação da concentração de íons hidrogênio dentro de uma faixa estreita, adequada ao melhor funcionamento celular. A manutenção da quantidade ideal de íons hidrogênio nos líquidos intracelular e extracelular depende de um delicado equilíbrio químico entre os ácidos e as bases existentes no organismo, denominado equilíbrio ácido-base. Quando a concentração dos íons hidrogênio se eleva ou se reduz, alteram-se a permeabilidade das membranas e as funções enzimáticas celulares; em consequência, deterioram-se as funções de diversos órgãos e sistemas. Os pacientes com disfunção de órgãos frequentemente apresentam alterações no equilíbrio ácido-base. Nos pacientes graves, especialmente os que necessitam de terapia intensiva, aquelas alterações são mais manifestas e, não raro, assumem a primazia do quadro clínico. O diagnóstico e o tratamento dos desvios do equilíbrio ácido-base, geralmente, resultam em reversão do quadro geral do paciente e garantem a sua sobrevida. A frequente determinação dos parâmetros que avaliam o equilíbrio ácido-base do organismo é parte importante da monitorização do paciente grave, em qualquer protocolo de terapia intensiva. Um grande número de doenças ou condições podem ser melhoradas ou curadas, se o paciente puder ser mantido vivo por um tempo mais prolongado. Determinados procedimentos terapêuticos ou de suporte vital, como a ventilação mecânica e o uso intensivo de diuréticos, podem produzir alterações do equilíbrio ácido-base, o que reforça a necessidade da sua monitorização criteriosa e da detecção precoce das suas alterações. METABOLISMO A função normal das células do organismo depende de uma série de processos bioquímicos e enzimáticos do metabolismo celular. Diversos fatores devem ser mantidos dentro de estreitos limites, para preservar a função celular, como a osmolaridade, os eletrólitos, os nutrientes, a temperatura, o oxigênio, o dióxido de carbono e o íon hidrogênio. Um dos fatores mais importantes para o metabolismo celular é a quantidade de hidrogênio livre existente dentro e fora das células. As variações da concentração do hidrogênio podem produzir grandes alterações na velocidade das reações químicas celulares. O metabolismo é o conjunto das transformações de matéria e energia que ocorrem nos sistemas biológicos. Como resultado do metabolismo, as células preservam a

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PARTE 1

INTRODUÇÃO AO EQUILÍBRIO ÁCIDO-BASE

OBJETIVOS: Descrever a importância da concentração do íon hidrogênio

nos líquidos do organismo. Analisar os principais mecanismos de regulação da concentração do íon hidrogênio para a preservação das funções

celulares.

CONCEITOS GERAIS

A regulação dos líquidos do organismo compreende a manutenção de

concentrações adequadas de água e eletrólitos e a preservação da concentração de íons hidrogênio dentro de uma faixa estreita, adequada ao melhor funcionamento

celular. A manutenção da quantidade ideal de íons hidrogênio nos líquidos intracelular e

extracelular depende de um delicado equilíbrio químico entre os ácidos e as bases existentes no organismo, denominado equilíbrio ácido-base.

Quando a concentração dos íons hidrogênio se eleva ou se reduz, alteram-se a

permeabilidade das membranas e as funções enzimáticas celulares; em consequência, deterioram-se as funções de diversos órgãos e sistemas.

Os pacientes com disfunção de órgãos frequentemente apresentam alterações no equilíbrio ácido-base. Nos pacientes graves, especialmente os que necessitam de terapia intensiva, aquelas alterações são mais manifestas e, não raro, assumem a primazia do quadro clínico. O diagnóstico e o tratamento dos desvios do equilíbrio

ácido-base, geralmente, resultam em reversão do quadro geral do paciente e

garantem a sua sobrevida. A frequente determinação dos parâmetros que avaliam o equilíbrio ácido-base do organismo é parte importante da monitorização do paciente grave, em qualquer

protocolo de terapia intensiva. Um grande número de doenças ou condições podem ser melhoradas ou curadas, se o paciente puder ser mantido vivo por um tempo

mais prolongado. Determinados procedimentos terapêuticos ou de suporte vital, como a ventilação

mecânica e o uso intensivo de diuréticos, podem produzir alterações do equilíbrio ácido-base, o que reforça a necessidade da sua monitorização criteriosa e da

detecção precoce das suas alterações.

METABOLISMO

A função normal das células do organismo depende de uma série de processos bioquímicos e enzimáticos do metabolismo celular. Diversos fatores devem ser mantidos dentro de estreitos limites, para preservar a função celular, como a

osmolaridade, os eletrólitos, os nutrientes, a temperatura, o oxigênio, o dióxido de carbono e o íon hidrogênio.

Um dos fatores mais importantes para o metabolismo celular é a quantidade de hidrogênio livre existente dentro e fora das células. As variações da concentração

do hidrogênio podem produzir grandes alterações na velocidade das reações químicas celulares.

O metabolismo é o conjunto das transformações de matéria e energia que ocorrem nos sistemas biológicos. Como resultado do metabolismo, as células preservam a

capacidade de reproduzir, crescer, contrair, secretar e absorver. As transformações da matéria são produto das reações químicas que ocorrem no organismo e se

acompanham da produção ou consumo de energia. Existem quatro grandes formas de energia nos organismos vivos: as energias química, mecânica, elétrica e

térmica. A energia química pode ser transformada em energia mecânica, elétrica e térmica; entretanto, essas transformações são irreversíveis. Isto significa que as energias mecânica, elétrica ou térmica não podem ser transformadas em energia

química. Portanto, a energia química resultante do metabolismo é a única fonte da energia utilizada pelo organismo, para a manutenção da vida e para as suas

diversas atividades.

EFEITOS DO ÍON HIDROGÊNIO NO ORGANISMO

A unidade de medida da concentração dos íons hidrogênio nos líquidos do organismo é denominada pH. A redução do pH é denominada acidose, enquanto o

seu aumento é chamado de alcalose. Ambos, acidose e alcalose, são consequências de alterações da concentração do íon hidrogênio no organismo. A ocorrência de

acidose ou de alcalose reduz a eficiência de uma série de reações químicas celulares, das quais depende a função dos órgãos e sistemas.

O metabolismo intracelular exige uma faixa estreita da concentração de íon hidrogênio (pH), para que os processos enzimáticos e bioquímicos possam ocorrer

eficiente e apropriadamente. Os ácidos e as bases afetam o comportamento químico da água; alterações na

concentração de ácidos ou bases, em consequência, interferem nas reações químicas que ocorrem nas soluções do organismo, nas quais a água é o solvente

universal. Os íons hidrogênio são partículas extremamente móveis; as alterações da sua

concentração afetam a distribuição celular de outros íons, como sódio, potássio e cloretos e modificam a atividade das proteinas, em especial das enzimas.

Diversas atividades fisiológicas são afetadas pela concentração dos íons hidrogênio. Variações do pH podem produzir alterações significativas no funcionamento do

organismo, tais como:

Aumento da resistência vascular pulmonar; Redução da resistência vascular sistêmica; Alterações da atividade elétrica do miocárdio; Alterações da contratilidade do miocárdio; Alterações da atividade elétrica do sistema nervoso central; Alterações da afinidade da hemoglobina pelo oxigênio; Modificação da resposta a certos agentes químicos, endógenos e exógenos,

como por exemplo, hormônios e drogas vasoativas.

Desvios importantes do pH, especialmente se ocorrem em curtos intervalos, são mal tolerados e podem ameaçar a vida. Os pacientes que permanecem em acidose severa e prolongada, geralmente morrem em estado de coma; os pacientes que

permanecem em alcalose severa e prolongada, geralmente morrem por convulsões ou lesões neurológicas irreversíveis.

A concentração do hidrogênio livre no organismo depende da ação de substâncias que disputam o hidrogênio entre sí. Essas substâncias são as que cedem hidrogênio e as que captam o hidrogênio. As substâncias que podem ceder hidrogênio em uma

solução, são chamadas de ácidos, enquanto as substâncias que podem captar o hidrogênio nas soluções, são as bases. A concentração final do hidrogênio livre nos líquidos orgânicos, resulta do equilíbrio entre aqueles dois grupos de substâncias,

ácidos e bases. Na presença de oxigênio (metabolismo aeróbico), o principal produto final do

metabolismo celular é o ácido carbônico, prontamente eliminado nos pulmões,

durante os processos de ventilação pulmonar. Na ausência ou na insuficiência de oxigênio (metabolismo anaeróbico) os principais produtos finais do metabolismo

são ácidos não voláteis, principalmente o ácido lático, cuja eliminação é mais lenta e requer metabolização adicional no fígado para excreção pelos rins.

ÁCIDOS DO ORGANISMO

O metabolismo celular produz ácidos, que são liberados continuamente na corrente sanguínea e que precisam ser neutralizados, para impedir as variações do pH.

O principal ácido do organismo é o ácido carbônico, um ácido instável, que tem a propriedade de se transformar facilmente em dióxido de carbono e água. O dióxido

de carbono é transportado pelo sangue e eliminado pelos pulmões, enquanto o excesso da água é eliminada pela urina.

Os demais ácidos do organismo são fixos, ou seja, permanecem em estado líquido e são, principalmente, os ácidos alimentares, o ácido lático e os ceto-ácidos; o metabolismo das proteinas também produz alguns ácidos inorgânicos. O ácido

lático, em condições normais, é produzido, em pequena quantidade pelas hemácias, pelo cérebro e pela contração dos músculos estriados. Quando a oxigenação dos

tecidos é inadequada (hipóxia), o metabolismo passa a produzir energia utilizando vias químicas que não dependem do oxigênio e, ao invés de produzir o ácido

carbônico, os tecidos passam a produzir ácido lático, como produto metabólico final. O lactato em excesso, dentro de certos limites, é metabolizado no fígado.

Quando a ingestão de alimentos é insuficiente para a oferta de glicose, o organismo lança mão de outras vias de metabolização, as chamadas vias alternativas, nas

quais o produto final são ceto-ácidos. Se a glicose não pode ser utilizada devido à

falta de insulina, como acontece com os diabéticos, o mesmo fenômeno ocorre; a ceto-acidose resultante é chamada de ceto-acidose diabética.

BASES DO ORGANISMO

A principal base do organismo é o bicarbonato, produzido à partir do metabolismo

celular pela combinação do dióxido de carbono com a água. As demais bases são os fosfatos, numerosas proteinas e a hemoglobina. As bases do organismo não atuam

livremente mas em associação com ácidos da mesma natureza química, com os quais formam "pares" ou "duplas" de substâncias denominadas "tampão", cuja

finalidade é impedir variações bruscas do pH.

REGULAÇÃO DOS ÁCIDOS E BASES DO ORGANISMO

A manutenção do pH dos líquidos orgânicos dos tecidos, dentro da faixa compatível com o funcionamento celular ótimo, exige a regulação da quantidade de ácidos e das bases livres nos compartimentos intra e extracelular. Essa regulação depende

da participação de um conjunto de pares de substâncias chamadas sistemas tampão, que existem nos líquidos intracelular e extracelular, principalmente no

sangue. Depende também dos pulmões, que eliminam o ácido carbônico produzido

pelo metabolismo celular e dos rins que promovem a eliminação de íons hidrogênio e bicarbonato.

Figura 1. Representa esquematicamente a atuação dos principais mecanismos reguladores do equilíbrio ácido-base, na defesa do organismo contra as variações do pH. O sangue, por intermédio dos sistema tampão, promove a regulação rápida da concentração de íons hidrogênio dos tecidos. O esquema ilustra ainda a interação com os pulmões e os rins, para a eliminação ou a retenção de substâncias reguladoras da concentração do íon hidrogênio. A frequência respiratória é regulada pelo centro respiratório, em resposta ao estímulo da concentração dos íons hidrogênio no sangue.

O mecanismo de neutralização química no líquido extracelular é imediato; a neutralização através da eliminação respiratória é rápida, sendo eficaz em 1 a 15

minutos, enquanto o mecanismo de regulação renal, apesar de bastante eficiente, é mais lento, tardando horas ou dias, para ser completamente eficaz. A disfunção de qualquer desses sistemas de regulação, pode produzir ou agravar as alterações do

equilíbrio ácido-base do organismo. O mecanismo respiratório funciona com a intermediação do centro respiratório do cérebro. Quando a concentração dos íons hidrogênio no sangue se eleva, o centro

respiratório é estimulado e emite impulsos que aumentam a frequência e a profundidade das respirações (hiperpnéia), para aumentar a eliminação do CO2 pelos pulmões e, em consequência, diminuir a quantidade de ácido carbônico no sangue. Quando a concentração do CO2 está baixa, o centro respiratório reduz a

frequência respiratória, para favorecer a normalização do CO2. O mecanismo renal consiste, principalmente, em eliminar íons hidrogênio em troca

por outros cátions, para manter estável o número de bases do organismo ou, quando necessário, eliminar os íons bicarbonato, que tornam a urina alcalina,

retendo os cloretos e outros radicais alcalinos.

RESUMO DA PARTE 1

A regulação dos líquidos do organismo inclui a regulação da concentração

do íon hidrogênio, para assegurar o ambiente ótimo para as funções celulares. A energia para todos os processos celulares e orgânicos, provém

da energia química produzida pelo metabolismo celular. A concentração dos íons hidrogênio nos líquidos do organismo é medida

pela unidade denominada pH. A redução do pH é denominada acidose e o seu aumento constitui a alcalose. Ambos, acidose e alcalose, podem

diminuir acentuadamente a eficiência das reações químicas celulares; o metabolismo celular exige um estreito limite para a concentração do íon

hidrogênio. O metabolismo celular produz ácidos que devem ser neutralizados, a fim de preservar o pH ou, em outras palavras, manter estável a concentração

do íon hidrogênio. A principal base do organismo é o íon bicarbonato, produzido à partir da

combinação do dióxido de carbono com a água. O bicarbonato e as demais bases do organismo atuam em associação com ácidos da mesma natureza

química, formando pares de substâncias chamadas sistema tampão. A regulação do equilíbrio entre os ácidos e as bases do organismo depende de um mecanismo imediato, representado pelos sistema tampão e de um

mecanismo respiratório rápido, que elimina ou retém o dióxido de carbono e, portanto, reduz ou aumenta o ácido carbônico. Depende também do mecanismo renal, mais lento, que elimina íon hidrogênio e retém ou

elimina o íon bicarbonato, moderando a quantidade de bases disponíveis

no organismo.

PARTE 2

CONCEITOS DE ÁCIDO, BASE E pH

OBJETIVOS: Descrever o conceito de ácidos e bases. Analisar a concentração dos íons hidrogênio nos líquidos do organismo e a

determinação do pH. Descrever os mecanismos de regulação do pH. Definir acidose e alcalose.

CONCEITOS GERAIS

O metabolismo celular produz ácidos que são lançados, continuamente, nos líquidos intracelular e extracelular e tendem a modificar a concentração dos íons hidrogênio.

A manutenção da concentração dos íons hidrogênio dentro da faixa ótima para o metabolismo celular, depende da eliminação do ácido carbônico nos pulmões, da eliminação de íons hidrogênio pelos rins e da ação dos sistemas tampão intra e

extracelulares. O modo como o organismo regula a concentração dos íons hidrogênio (H+) é de fundamental importância para a compreensão e a avaliação das alterações do

equilíbrio entre os ácidos e as bases no interior das células, no meio líquido que as cerca (líquido intersticial) e no sangue (líquido intravascular).

CONCEITO DE ÁCIDO E BASE

Os elementos importantes para a função celular estão dissolvidos nos líquidos intra e extracelular. Sob o ponto de vista químico, uma solução é um líquido formado

pela mistura de duas ou mais substâncias, homogeneamente dispersas entre sí. A mistura homogênea apresenta as mesmas propriedades em qualquer ponto do seu

interior e não existe uma superfície de separação entre os seus componentes. A solução, portanto, consiste de um solvente, o composto principal, e um ou mais

solutos. Nos líquidos do organismo a água é o solvente universal; as demais substâncias em solução, constituem os solutos.

Em uma solução, um soluto pode estar no estado ionizado ou no estado não ionizado. Nos líquidos do organismo, os solutos existem em ambas as formas, em

um tipo especial de equilíbrio químico. Quando um soluto está ionizado, os elementos ou radiciais químicos que o

compõem, estão dissociados uns dos outros; a porção da substância que existe no estado ionizado é chamada íon. O soro fisiológico, por exemplo, é uma solução de

água (solvente) contendo o cloreto de sódio (soluto). Uma parte do cloreto de sódio está no estado dissociado ou ionizado, constituida pelos íons Cl- (cloro) e Na+ (sódio), enquanto uma outra parte está no estado não dissociado, como NaCl

(cloreto de sódio); ambas as partes estão em equilíbrio químico. Existem substâncias, como os ácidos fortes, as bases fortes e os sais, que

permanecem em solução, quase completamente no estado ionizado. Outras substâncias, como os ácidos e as bases fracas, ao contrário, permanecem em

solução em graus diversos de ionização. A água tem sempre um pequeno número de moléculas no estado ionizado.

Os íons combinam-se entre si conforme a sua carga elétrica. Os cátions são os íons

com carga elétrica positiva, como o hidrogênio (H+) e o sódio (Na+). Os ânions são os íons com carga elétrica negativa, como o hidróxido ou hidroxila (OH-) e o cloreto

(Cl-). Para ser um ácido, é necessário que a molécula da substância tenha, pelo menos, um hidrogênio ligado ionicamente. O hidrogênio ionizado, simplesmente

representa um próton. Um ácido é uma substância que, em solução, é capaz de doar prótons (H+). Uma base é uma substância que, em solução, é capaz de receber prótons. Em outras palavras, os ácidos são substâncias que, quando em solução, tem capacidade de ceder íons hidrogênio; as bases são substâncias que, quando em solução, tem

capacidade de captar íons hidrogênio. Um ácido forte pode doar muitos íons hidrogênio para a solução, porque uma

grande parte das suas moléculas se encontra no estado dissociado (estado iônico). Do mesmo modo, uma base forte pode captar muitos íons hidrogênio de uma

solução.

CONCEITO DE pH

A atividade dos íons hidrogênio em uma solução qualquer, depende da quantidade de hidrogênio livre na solução. Para a avaliação do hidrogênio livre nas soluções, usa-se a unidade chamada pH. O termo pH significa potência de hidrogênio e foi

criado para simplificar a medida da concentração de íons hidrogênio (H+) na água e

nas soluções. A água é a substância padrão usada como referência, para expressar o grau de acidez ou de alcalinidade das demais substâncias. A água se dissocia em

pequena quantidade em íons hidrogênio (H+) e hidroxila (OH-).

Figura 2 ilustra a dissociação da água e as diversas formas de expressar a concentração dos íons hidrogênio dissociados.

A água é considerada um líquido neutro por ser o que menos se dissocia ou ioniza. A quantidade de moléculas dissociadas ou ionizadas na água é muito pequena, em relação ao total de moléculas, bem como são pequenas as quantidades de íons H+

e OH-, em solução. Para cada 1 molécula de água dissociada em H+ e OH-, há 10.000.000 de moléculas não dissociadas. A concentração do H+ na água,

portanto, é de 1/10.000.000 ou seja 0,0000001, conforme representado na figura 2.

Para facilitar a comparação dessas pequenas quantidades de íons, foi adotada a fração exponencial, ao invés da fração decimal. Assim, pela fração exponencial o

valor de 0,0000001 é expresso como 10-7, chamada "potência sete do hidrogênio", e significa a sua concentração na água. Para evitar a utilização de frações

exponenciais negativas, foi criada a denominação pH, que representa o logarítmo negativo, ou seja, o inverso do logarítmo, da atividade do íon hidrogênio. O pH de

uma solução, portanto, representa o inverso da sua concentração de íons hidrogênio. Esta forma de representação permite que os valores da atividade do

hidrogênio nas soluções, sejam expressos com números positivos. Como as quantidades dos íons nas soluções se equivalem, a água tem partes iguais

do cátion (H+) e do ânion (OH-), ou seja, a concentração de (H+) é de 10-7 e a concentração de (OH-) também é de 10-7. A água, portanto, tem o pH=7. H2O Û

H+ (10-7) + OH- (10-7) A água é considerada uma substância neutra. Isto equivale a dizer que a água não

é ácido nem base e serve de comparação para as demais soluções. Um ácido forte, em solução, libera uma quantidade de íons hidrogênio (H+), muito maior que a água. O seu pH, portanto será inferior ao da água. Ao contrário, uma base forte, por aceitar muitos prótons ou íons hidrogênio da solução, permitirá que apenas uma pequena parte dos íons fique livre, em comparação à água. O pH da

base forte, portanto, será superior ao pH da água. O pH é expresso por uma escala numérica simples que vai de 0 (zero) a 14. O

ponto 7 da escala é o ponto de neutralidade e representa o pH da água. As soluções cujo pH está entre 0 e 7 são denominadas ácidas; as que tem o pH entre

7 e 14 são denominadas básicas ou alcalinas. Quanto maior a concentração de hidrogênio livre em uma solução, tanto mais baixo

será o seu pH.

REGULAÇÃO DO pH NO ORGANISMO

Quando se adiciona ácido à água, mesmo em pequenas quantidades, o pH da solução se altera rapidamente. O mesmo fenômeno ocorre com a adição de bases.

Pequenas quantidades de ácido ou de base podem produzir grandes alterações do pH da água.

Se adicionarmos ácido ou base ao plasma sanguíneo, veremos que há necessidade de uma quantidade muito maior de um ou de outro, até que se produzam

alterações do pH. Isto significa que o plasma dispõe de mecanismos de defesa contra variações bruscas ou significativas do pH. O balanço entre os ácidos e as

bases no organismo se caracteriza pela busca permanente do equilíbrio; o plasma resiste às alterações do pH, por meio de pares de substâncias, capazes de reagir tanto com ácidos quanto com bases, chamadas sistemas "tampão". Os mesmos

mecanismos de defesa existem nos líquidos intracelular e intersticial.

Figura 3. Representa os três mecanismos que regulam o equilíbrio ácido-base do organismo.

Três mecanismos regulam o pH dos líquidos orgânicos, conforme demonstra a figura 3. O mecanismo químico é representado pelos sistemas tampão, capazes de

neutralizar ácidos e bases em excesso, dificultando as oscilações do pH. O mecanismo respiratório, de ação rápida, elimina ou retém o dióxido de carbono do

sangue, conforme as necessidades, moderando o teor de ácido carbônico. O mecanismo renal é de ação mais lenta e, fundamentalmente, promove a poupança ou a eliminação do íon bicarbonato, conforme as necessidades, para, à semelhança

dos demais mecanismos, assegurar a manutenção do pH dentro dos limites normais.

VALORES NORMAIS DO pH

A água é o solvente universal dos líquidos orgânicos; a sua concentração de hidrogênio livre ou ionizado é utilizada como valor de comparação para as demais soluções. O pH normal da água, considerada um líquido neutro é 7. As soluções

com pH inferior a 7 são consideradas ácidas e as soluções com pH superior a 7 são

consideradas alcalinas. Os líquidos orgânicos são constituidos de água contendo uma grande quantidade de

solutos de diversas características químicas e iônicas. A solução orgânica padrão para a avaliação do pH é o sangue. O pH normal do sangue varia dentro da

pequena faixa de 7,35 a 7,45. Em comparação com a água, portanto, o sangue normal tem o pH levemente alcalino. Essa alcalinidade do sangue representa a atividade iônica de numerosas substâncias incluindo-se os sistemas tampão.

O sangue arterial é o padrão habitual para avaliação do pH; seu valor se situa na porção mais alcalina da faixa normal, entre 7,4 e 7,45. O sangue venoso tem maior

concentração de hidrogênio livre, recebido do líquido intersticial pelos capilares

venosos. Em consequência, o pH do sangue venoso se situa na faixa menos alcalina do pH normal, geralmente entre 7,35 e 7,40.

Figura 4. Representa a faixa do pH normal do sangue e as suas principais alterações.

As principais alterações do pH do sangue estão representadas na figura 4. Quando o pH do sangue está abaixo de 7,35 existe acidose; se o pH do sangue é superior a 7,45, existe alcalose. Quando a acidose é severa e o pH alcança valores abaixo de 6,85, em geral as funções celulares se alteram de tal forma que sobrevém a morte

celular; o distúrbio é irreversível. Do mesmo modo, nas alcaloses severas e persistentes, os valores de pH superiores a 7,95 são incompatíveis com a

normalidade da função celular. O distúrbio é irreversível e, em geral, ocorre a morte celular.

pH INTRACELULAR

O interior das células reflete uma realidade metabólica diferente do plasma sanguíneo. A atividade celular gera permanentemente subprodutos ácidos como resultado de numerosas reações químicas. Em consequência, o pH habitual do líquido intracelular é mais baixo que o pH do plasma. O pH intracelular é de

aproximadamente 6,9 nas células musculares e pode cair a 6,4 após um exercício extenuante. Nas células dos túbulos renais, o pH é de cerca de 7,3, de acordo com a predominância de substâncias alcalinas, podendo se alterar com as necessidades

do organismo. Em geral, as células dos tecidos com maior atividade metabólica tem um pH levemente ácido, em relação ao pH do sangue.

RESUMO DA PARTE 2

O metabolismo celular produz ácidos que tendem a modificar a concentração dos íons hidrogênio nos líquidos do organismo. A

manutenção da concentração ideal de íons hidrogênio depende da ação de ácidos e bases existentes nos líquidos, da eliminação de ácido carbônico

pelos pulmões e da eliminação de íons hidrogênio pelos rins. Os ácidos são as substâncias que podem ceder íons hidrogênio para uma solução; bases são as substâncias que podem receber íons hidrogênio em

uma solução. A quantidade de íons hidrogênio livres nas soluções é quantificada pelo pH.

Quanto maior a quantidade de íons hidrogênio nas soluções, tanto mais baixo será o seu pH; ao contrário, as soluções com baixa concentração de

íons hidrogênio, tem o pH mais elevado. A água é a substância padrão para comparação com as demais substâncias. A dissociação da água é

desprezível; apenas uma molécula, em cada 10 milhões, se dissocia. A água é, portanto, uma substância neutra, ou seja não é ácido nem é base.

O pH da água é 7; a água ocupa o ponto neutro da escala do pH, que vai de 0 a 14. As soluções com pH inferior ao da água, são consideradas ácidas;

as soluções cujo pH é superior a 7, são consideradas bases. O pH do sangue reflete a atividade iônica de numerosas substâncias e é

ligeiramente maior que o pH da água. O sangue normal tem o pH que varia entre 7,35 e 7,45. O sangue normal, portanto, é levemente alcalino, em

relação à água. Quando o pH do sangue está abaixo de 7,35 dizemos que existe acidose;

quando o pH do sangue supera o valor de 7,45, dizemos que há alcalose.

PARTE 3

SISTEMAS "BUFFER" OU TAMPÃO

OBJETIVOS: Descrever o sistema de defesa contra as variações importantes do pH dos líquidos do organismo. Analisar a composição, propriedades e mecanismo de ação dos sistemas tampão. Descrever a

composição dos principais tampões do organismo.

CONCEITOS GERAIS

O organismo dispões de três importantes mecanismos reguladores do pH, que atuam em sincronia, com a finalidade de preservar as condições ótimas para as

funções celulares. O mecanismo respiratório, de ação rápida, o mecanismo renal, de ação lenta e o mecanismo químico, de ação imediata, representado por pares de

substâncias chamados sistemas "tampão", que podem reagir com ácidos ou com bases em excesso nos líquidos do organismo.

SISTEMAS TAMPÃO

Os tampões, denominação traduzida do original inglês "buffer" (amortecedor), são as substâncias que limitam as variações do pH do sangue e demais líquidos

orgânicos, ao se combinarem com os ácidos ou as bases que alcançam aqueles líquidos. As substâncias que constituem os tampões agem aos pares ou, menos

comumente, em grupos, constituindo um sistema protetor. Um sistema tampão é constituído por um ácido fraco e o seu sal, formado com uma

base forte. O ácido fraco e o sal do sistema tampão, em condições normais, existem em uma relação constante, que o organismo tende a preservar. Se

gotejarmos continuamente ácido clorídrico em água durante um intervalo de 90 minutos, verificamos que o pH da água passa de 7 para 1,84. Se administrarmos proporcionalmente, a mesma quantidade de ácido clorídrico a um cão no mesmo período de tempo, verificamos que o pH do sangue do animal passa de 7,44 para

7,14. A diferença de comportamento diante da mistura com o ácido clorídrico reflete a atuação dos sistemas tampão do plasma do animal, que impedem a

variação mais acentuada do pH. O sistema tampão do bicarbonato e ácido carbônico corresponde a cerca de 64% do

total de tampões. Esse sistema é essencial à regulação do equilíbrio ácido-base, porque o metabolismo celular gera muito ácido como produto final, sob a forma de

ácido carbônico.

Composição do Sistema Percentual

Bicarbonato/Ácido Carbônico 64%

Hemoglobina/Oxihemoglobina 28%

Proteinas ácidas/Proteinas básicas

7%

Fosfato monoácido/Fosfato diácido

1%

A Tabela da figura 5 (acima) lista os sistemas tampão que existem no sangue (líquido intravascular), nos tecidos (líquido intersticial) e no interior das células

(líquido intracelular). Quando um ácido se acumula em maior quantidade no organismo, é neutralizado

no sangue, no líquido intersticial e no interior das células, em partes

aproximadamente iguais, ou seja, 1/3 do ácido é neutralizado no sangue, 1/3 é neutralizado no líquido intersticial e 1/3 no líquido intracelular. O processo

intracelular é mais lento e pode demorar cerca de duas horas, para compensar uma alteração.

Figura 6. Composição do principal

sistema tampão do organismo. O

sistema tampão bicarbonato/ácido

carbônico é o mais importante na

regulação do pH. O ácido fraco do

sistema é o ácido carbônico e a base

forte é o bicarbonato. A relação

constante desse sistema tampão é de

20:1, conforme representado na figura.

Quando um ácido é adicionado ao sangue, o bicarbonato do tampão prontamente

reage com ele; a reação produz um sal, formado com o sódio do bicarbonato e ácido carbônico. Essa reação diminui a quantidade de bases e altera a relação entre

o bicarbonato e o ácido carbônico. O ácido carbônico produzido pela reação do bicarbonato do tampão, se dissocia em CO2 e água; o CO2 é eliminado nos

pulmões, recompondo a relação de 20:1 do sistema protetor. Quando uma base invade o organismo, o ácido carbônico prontamente reage com

ela, produzindo bicarbonato e água. O ácido carbônico diminui. Os rins aumentam a eliminação de bicarbonato ao invés do íon hidrogênio, reduzindo a quantidade de

bicarbonato no organismo, para preservar a relação do sistema tampão. Todos os sistemas tampão do organismo atuam da mesma forma que o sistema

bicarbonato/ácido carbônico. O sistema neutraliza o excesso de ácidos ou de bases e em seguida o organismo tenta recompor a relação normal do tampão. O princípio

fundamental da regulação do equilíbrio ácido-base é a manutenção da relação constante entre o numerador e o denominador do sistema tampão.

O bicarbonato total disponível no organismo é de aproximadamente 1.000 mEq, dos quais cerca de 450 mEq. estão imediatamente disponíveis, distribuidos em 15

litros de líquido extracelular, sendo 3 litros de plasma e 12 litros de líquido intersticial.

Nas alcaloses o organismo tolera a redução dos íons hidrogênio em cerca da metade do seu valor normal, até alcançar o pH incompatível com a vida celular.

Nas acidoses, o organismo tolera a elevação dos íons hidrogênio 3 vezes acima do normal, até alcançar o pH incompatível com a vida.

INTEGRAÇÃO DA DEFESA CONTRA VARIAÇÕES DO pH

Os sistemas de defesa que mantém o pH dos líquidos orgânicos dentro de uma faixa estreita, atuam perfeitamente integrados em suas funções.

Todos os líquidos do organismo possuem sistemas tampão, para impedir alterações significativas da concentração dos íon hidrogênio ou, em outras palavras, do pH. Se a concentração do íon hidrogênio aumenta ou diminui significativamente, o centro respiratório é imediatamente estimulado, para alterar a frequência respiratória e

modificar a eliminação do dióxido de carbono. As variações da eliminação do dióxido de carbono, tendem a retornar o pH aos seus valores normais. Quando o pH

se afasta da faixa normal, os rins eliminam urina ácida ou alcalina, contribuindo para o retorno da concentração dos íons hidrogênio aos valores normais.

O TAMPÃO BICARBONATO/ÁCIDO CARBÔNICO

O sistema tampão constituido pelo bicarbonato e pelo ácido carbônico tem características especiais nos líquidos do organismo. O ácido carbônico é um ácido

bastante fraco e a sua dissociação em íons hidrogênio e íons bicarbonato é mínima, em comparação com outros ácidos. Em cada 1.000 moléculas de ácido carbônico,

cerca de 999 estão em equilíbrio sob a forma de dióxido de carbono (CO2) e água (H2O), do que resulta uma alta concentração de dióxido de carbono dissolvido e

uma baixa concentração de ácido. O sistema tampão do bicarbonato/ácido carbônico é muito poderoso porque os seus

componentes podem ser facilmente regulados. A concentração do dióxido de carbono é regulada pela eliminação respiratória e a concentração do bicarbonato é

regulada pela eliminação renal.

OUTROS SISTEMAS TAMPÃO

Além do principal sistema tampão, o bicarbonato/ácido carbônico, outros sistemas são importantes na manutenção do equilíbrio ácido-base. No líquido intracelular,

cuja concentração de sódio é baixa, o tampão do ácido carbônico consiste

principalmente de bicarbonato de potássio e de magnésio. O sistema tampão fosfato, formado pelo fosfato de sódio e ácido fosfórico é eficaz

no plasma, no líquido intracelular e nos túbulos renais onde se concentra em grande quantidade.

O sistema tampão das proteinas é muito eficaz no interior das células, onde é o sistema mais abundante.

O tampão hemoglobina é exclusivo das hemácias; colabora com a função de

transporte do CO2 e com o tampão bicarbonato. Os sistemas tampão não são independentes entre sí, mas cooperativos. Qualquer

condição que modifique um dos sistemas também influirá no equilíbrio dos demais; na realidade, os sistemas tampão auxiliam-se uns aos outros.

RESUMO DA PARTE 3

O organismo dispõe de três mecanismos reguladores do pH, que funcionam em sincronia, para preservar as condições ótimas para o metabolismo

celular: o mecanismo respiratório, de ação rápida, que elimina o dióxido de carbono, reduzindo a quantidade de ácido carbônico; o mecanismo renal,

de ação lenta, que elimina ou economiza íons hidrogênio e bicarbonato e o mecanismo químico, de ação imediata, constituído pelos sistemas tampão,

que neutralizam ácidos ou bases que se acumulam no organismo. O sistema tampão bicarbonato/ácido carbônico é o mais importante e

corresponde a 64% do poder tamponante do plasma. A principal característica do sistema tampão é a relação constante que

deve existir entre o sal (numerador) e o ácido (denominador) do sistema. Quando um ácido é produzido no organismo, o sal do sistema tampão

reage com o mesmo, produzindo um novo sal de sódio e ácido carbônico ou dióxido de carbono e água. O dióxido de carbono em excesso é eliminado

pelos pulmões. Quando uma base é produzida no organismo, o ácido do sistema tampão

reage com a mesma, produzindo bicarbonato de sódio e água. O bicarbonato em excesso é eliminado pelos rins.

O princípio fundamental da regulação do equilíbrio ácido-base é a manutenção da relação constante entre o sal e o ácido do sistema tampão. O organismo tenta preservar a relação, para manter sempre disponível o

seu sistema de defesa.

Além do sistema bicarbonato/ácido carbônico, existem os sistemas tampão fosfato, da hemoglobina e das proteinas.

PARTE 4

REGULAÇÃO RESPIRATÓRIA DO pH

OBJETIVOS: Descrever a ventilação pulmonar, a produção e o transporte

de dióxido de carbono para os alvéolos pulmonares. Analisar a pressão parcial do dióxido de carbono e a eliminação pulmonar na regulação do pH

do sangue. Descrever o mecanismo de ação do centro respiratório.

CONCEITOS GERAIS

Os principais mecanismos reguladores do equilíbrio ácido-base do organismo são os sistemas tampão, a regulação respiratória e a regulação renal. Esses mecanismos

atuam em conjunto e, em circunstâncias normais, mantém inalterada a concentração de íons hidrogênio dos líquidos orgânicos, assegurando as condições

ideais para a função celular. A alimentação e a atividade física produzem desvios do pH que são prontamente compensados, quando as funções respiratória e renal são

adequadas. Em determinados estados patológicos ou em certas alterações pulmonares ou

renais, a produção de ácidos ou a retenção de bases no organismo, podem ser tão intensos que os mecanismos de compensação tornam-se incapazes de manter o equilíbrio adequado. Nessas condições, o sistema regulador colapsa e o pH dos

líquidos orgânicos se altera; as funções celulares deterioram e quando a condição persiste, em geral, ocorre a morte do indivíduo.

Os sistemas tampão e os mecanismos respiratórios são os principais reguladores do pH dos líquidos do organismo diante de alterações bruscas do equilíbrio entre os

ácidos e as bases.

VENTILAÇÃO PULMONAR

O pulmão humano possui cerca de 300 milhões de alvéolos, que equivalem a uma superfície de aproximadamente 70 metros quadrados, destinada a trocar gases com

o ar atmosférico. A função respiratória se processa mediante três atividades distintas, mas interrelacionadas e coordenadas:

ventilação, que consiste no processo através do qual o ar atmosférico alcança os alvéolos, para as trocas gasosas;

perfusão, que consiste no processo pelo qual o sangue venoso alcança os capilares dos alvéolos, para as trocas gasosas;

difusão, o processo pelo qual o oxigênio da mistura gasosa alveolar passa para o sangue, ao mesmo tempo em que o dióxido de carbono (CO2) contido no sangue passa para o gas dos alvéolos.

O sistema respiratório pode ser representado simplificadamente, por uma membrana com enorme superfície em que, de um lado existe o ar atmosférico e do outro lado o sangue venoso. Através desta membrana, ocorrem as trocas gasosas.

A enorme superfície disponível para as trocas gasosas permite que em um minuto o organismo possa eliminar até 200 mL de dióxido de carbono (CO2). Por esta grande capacidade de eliminar o CO2 do sangue, o pulmão é o mais importante regulador do equilíbrio ácido-básico do organismo. O mecanismo regulador respiratório pode

manter o pH na faixa normal, variando a quantidade de dióxido de carbono eliminada nos alvéolos.

PRODUÇÃO DO DIÓXIDO DE CARBONO (CO2)

Figura 7. Representa o dióxido de carbono produzido pelo metabolismo, a sua pequena dissociação em íons e o equilíbrio sob a forma de CO2 dissolvido e água.

As etapas terminais do metabolismo celular consistem na combustão da glicose e de outros metabólitos, com liberação de energia química e produção de dióxido de

carbono e água. O dióxido de carbono formado no organismo difunde-se para os líquidos intersticiais e destes para o sangue. O dióxido de carbono (CO2) combina-se com a água (H2O), para formar o ácido carbônico (H2CO3); uma pequena parte

se dissocia nos íons bicarbonato (HCO3-) e hidrogênio (H+), conforme esquematizado na figura 7. A maior parte do ácido carbônico existe no sangue

como CO2 dissolvido e água, em equilíbrio. O dióxido de carbono é transportado pelo sangue venoso para os capilares

pulmonares, sob três formas:

Gás dissolvido - Cerca de 5% do CO2 é transportado simplesmente dissolvido na água do plasma.

Íon bicarbonato - Cerca de 75% do total de CO2 é transportado sob a forma de íon bicarbonato, produto da reação com a água das hemácias, catalizada pela enzima anidrase carbônica, que torna a reação 5.000

vezes mais rápida. O íon hidrogênio resultante da reação é captado pela hemoglobina (sistema tampão das hemácias).

Combinado à hemoglobina - Os restantes 25% do CO2 ligam-se à hemoglobina em local diferente do que se liga o oxigênio, mediante uma ligação química facilmente reversível, para transporte pelo sangue (carbamino hemoglobina).

ELIMINAÇÃO DO DIÓXIDO DE CARBONO

Figura 8.

Represent

a a

eliminaçã

o do CO2,

muito

volátil, ao

nível da

membran

a alvéolo-

capilar.

A produção díária de dióxido de carbono é elevada e depende da atividade metabólica dos indivíduos. O índice metabólico é o fator determinante da produção

do CO2 e, portanto, da sua eliminação pelos pulmões. Os gases tem um comportamento especial quando estão em solução. A quantidade

de gás existente em uma solução é medida pela sua pressão parcial, ou seja, a pressão ou a tensão exercida pelo gás na solução, independente da presença de outros gases. A pressão parcial é proporcional à quantidade de gás existente na

solução. Por essa razão, a quantidade de CO2 existente no sangue é medida pela sua pressão parcial. A pressão parcial do dióxido de carbono é representada pelo

símbolo PCO2.

Nos capilares alveolares, o dióxido de carbono do sangue venoso se difunde para o gas dos alvéolos. A difusão do CO2 para os alvéolos é comandada pela diferença de

pressão parcial (PCO2) entre o sangue venoso e o gas alveolar; esta difusão rápidamente equilibra a pCO2 do sangue com a PCO2 do gas dos alvéolos pulmonares. A eliminação do CO2, reduz a quantidade de ácido carbônico,

conforme representado na figura 8. A redução do CO2 do sangue, elimina ácido e eleva o pH.

O aumento da quantidade de dióxido de carbono no sangue, altera o pH para o lado ácido; a redução da quantidade (ou da tensão parcial) do dióxido de carbono no sangue, altera o pH para o lado alcalino. É com base nessa relação que o sistema

respiratório modifica o pH.

MECANISMO DA AUTO-REGULAÇÃO DO ph

Figura 9. Mecanismo de regulação

respiratória do pH, através da

variação da eliminação do CO2.

A concentração de íons hidrogênio do sangue ou, em outras palavras, o pH do sangue, modifica a ventilação alveolar, através do centro respiratório. Esta

estrutura do sistema nervoso central se comporta como um "sensor" do pH do sangue. Quando a concentração de íons hidrogênio do sangue está elevada (pH baixo) o centro respiratório aumenta a frequência dos estímulos respiratórios,

produzindo taquipneia. Com o aumento da frequência respiratória, aumenta a eliminação do CO2 do sangue; a redução dos níveis sanguíneos do CO2 eleva o pH.

A concentração de H+ no sangue é permanentemente acompanhada pelo centro respiratório, que regula seus estímulos de acordo com ela, conforme demonstra o

diagrama da figura 9. Ao contrário, quando a concentração de íons hidrogênio (H+) está baixa (pH elevado), o centro respiratório diminui a frequência dos estímulos à respiração e ocorre bradipneia, que reduz a eliminação do CO2 tentando corrigir o

pH do sangue. Na realidade, a regulação respiratória do pH, por estímulos do centro respiratório,

não normaliza o pH do sangue, porque, à medida que a concentração do íon hidrogênio se aproxima do normal, o estímulo que modifica a atividade respiratória

vai desaparecendo. Apesar disso, a compensação respiratória é extremamente eficaz para impedir grandes oscilações do pH.

RESUMO DA PARTE 4

A função respiratória se processa mediante três mecanismos interligados: a ventilação pulmonar, através da qual o ar atmosférico alcança os

alvéolos; a perfusão pulmonar, através da qual o sangue venoso alcança os capilares alveolares para as trocas gasosas e a difusão pulmonar, através da qual o dióxido de carbono do sangue é eliminado para os alvéolos e o

oxigênio do ar inspirado é captado pelo sangue venoso. O dióxido de carbono (CO2) é o produto final do metabolismo aeróbico. O

CO2 alcança o líquido extracelular e o sangue para eliminação nos alvéolos. A quantidade de CO2 é expressa pela sua pressão parcial,

representada pela sigla PCO2. Como a PCO2 do sangue venoso é maior que a PCO2 do gas alveolar, o CO2 se difunde do sangue para os alvéolos.

Quando o CO2 deixa o sangue, diminui a quantidade de ácido carbônico e

em consequência o pH tende a se elevar. Se, ao contrário, a eliminação do CO2 for reduzida, haverá acúmulo de ácido carbônico no sangue, com

consequente redução do pH. A concentração do íon hidrogênio no sangue ou, em outras palavras, o pH

do sangue, modifica a ventilação pulmonar, através de estímulos do centro respiratório.

Quando o pH do sangue está baixo (acidose), o centro respiratório

aumenta a frequência respiratória e, desse modo, acentua a eliminação do CO2.

Quando o pH do sangue está elevado (alcalose), o centro respiratório

diminui a frequência respiratória e, desse modo, acumula CO2 no sangue, reduzindo a sua eliminação.

REGULAÇÃO RENAL DO pH

OBJETIVOS: Descrever a função renal e o mecanismo de eliminação

através da secreção tubular. Analisar os mecanismos de eliminação do íon hidrogênio e de eliminação do íon bicarbonato na regulação tardia do pH.

CONCEITOS GERAIS

Os principais mecanismos reguladores do equilíbrio ácido-base do organismo são os sistemas tampão, a regulação respiratória e a regulação renal. A regulação respiratória é de ação rápida, capaz de controlar a eliminação do dióxido de

carbono e dessa forma, moderar a quantidade de ácido carbônico e a concentração de hidrogênio livre no plasma sanguíneo.

Quando a concentração de íons hidrogênio se afasta do normal, os rins eliminam urina ácida ou alcalina, conforme as necessidades, contribuindo para a regulação da

concentração dos íons hidrogênio dos líquidos orgânicos. O mecanismo renal de

regulação faz variar a concentração de íons bicarbonato (HCO3-) do sangue, mediante reações que se processam nos túbulos renais. É o mecanismo definitivo

de ajuste na maioria dos desequilíbrios ácido-básicos de origem metabólica.

FUNÇÕES RENAIS

Os rins podem excretar diariamente cerca de 50mEq. de íons hidrogênio (H+) e

reabsorver 5.000 mEq. de íon bicarbonato (HCO3-). Os rins eliminam material não volátil que os pulmões não tem capacidade de

eliminar. A eliminação renal é de início mais lento, torna-se efetiva após algumas horas e demora alguns dias para compensar as alterações existentes. A eliminação de bases e seus cátions é feita exclusivamente pelos rins. Os rins tem a capacidade de reabsorver o sódio (Na+) e o potássio (K+) filtrados para a urina, eliminando o

íon hidrogênio (H+) em seu lugar; o sódio reabsorvido pode ser usado para produzir mais bicarbonato e reconstituir a reserva de bases do organismo. Além de influir na restauração do equilíbrio ácido-base, os rins reagem à

desidratação, à hipotensão, aos distúrbios da osmolaridade e eliminam ácidos fixos. Os rins desempenham fundamentalmente duas funções no organismo:

1. eliminação de produtos terminais do metabolismo, como uréia, creatinina e ácido úrico e,

2. controle das concentrações da água e de outros constituintes dos líquidos do

organismo como sódio, potássio, hidrogênio, cloro, bicarbonato e fosfatos. A unidade funcional dos rins é o néfron. Existem cerca de 2.400.000 néfrons nos

dois rins. Cada néfron é formado de um novelo de capilares para filtração do sangue, chamado glomérulo e um conjunto de túbulos que recebem o filtrado dos glomérulos, reabsorvem a sua maior parte e eliminam substâncias na sua luz para a formação da urina. Os rins cumprem as suas funções no organismo através de 3

mecanismos principais:

Filtração gromerular - O sangue que alcança os glomérulos é filtrado para os túbulos renais. O líquido filtrado é chamado filtrado glomerular

e corresponde a aproximadamente 180 litros por dia. O filtrado é transformado em urina à medida que atravessa os túbulos renais.

Reabsorção tubular - Cerca de 99% do filtrado glomerular são reabsorvidos para o sangue. O restante, cerca de 1,8 L constitui a

urina, que representa um concentrado do filtrado glomerular. Secreção tubular - A secreção tubular atua em direção oposta à

reabsorção tubular. As substâncias são transportadas do interior dos capilares sanguíneos para a luz dos túbulos para mistura com a urina e subsequente eliminação. Esse transporte ativo de substâncias, a secreção tubular, é desempenhado pelas células dos túbulos renais. A secreção tubular é fundamental à manutenção do equilíbrio ácido-base.

REGULAÇÃO RENAL DO pH

Os rins regulam a concentração de íon hidrogênio (H+), promovendo o aumento ou a diminuição da concentração dos íons bicarbonato (-HCO3), nos líquidos do

organismo. Essa variação dos íons bicarbonato ocorre em consequência de reações nos túbulos renais, às custas do mecanismo da secreção tubular.

Figura 10. Representa o mecanismo renal de retenção de bicarbonato e eliminação de íons hidrogênio (H+).

O dióxido de carbono do líquido extracelular penetra nas células tubulares e, com o auxílio da anidrase carbônica, combina-se com a água, para formar ácido

carbônico, que se dissocia em íons bicarbonato e hidrogênio, conforme a reação:

O hidrogênio assim formado é secretado para a luz do túbulo renal, sendo misturado ao filtrado glomerular. As células dos túbulos renais absorvem sódio do

filtrado glomerular e o combinam ao íon bicabonato, produzindo o bicarbonato de sódio, que é devolvido ao líquido extracelular. A formação do bicarbonato depende

da produção e secreção de H+ pelas células tubulares e mantém a reserva de bases do organismo. A figura 10 representa a atividade de uma célula tubular, nas trocas

de íons hidrogênio (H+) pelos íons sódio (Na+) do filtrado glomerular, para a formação de bicarbonato.

O excesso de íon hidrogênio no filtrado tubular é neutralizado pelos tampões do líquido tubular, principalmente o fosfato, a amônia, os uratos e citratos.

O resultado final da excessiva secreção de íons hidrogênio nos túbulos renais é o aumento da quantidade de bicarbonato de sódio no líquido extracelular. Isso aumenta a quantidade de bicarbonato do sistema tampão bicarbonato/ácido

carbônico, que mantém a normalidade do pH. Quando a quantidade de bicarbonato no sangue está aumentada, a sua proporção,

em relação ao ácido carbônico, é maior e o pH está acima do normal. Nestas circunstâncias, aumenta a filtração renal dos íon bicarbonato, em relação aos íons

hidrogênio secretados. A concentração mais baixa de dióxido de carbono, diminui a secreção de íons hidrogênio. Maiores quantidades de íons bicarbonato que de íons hidrogênio passam a penetrar nos túbulos. Como os íons bicarbonato não podem ser

reabsorvidos sem antes reagir com o hidrogênio, todo o íon bicarbonato em excesso passa à urina, carregando com ele íons sódio e outros íons positivos. Deste

modo o íon bicarbonato é removido do líquido extracelular. A perda de bicarbonato diminui a sua quantidade no sistema tampão

bicarbonato/ácido carbônico o que desloca o pH dos líquidos do organismo na direção ácida. A urina eliminada contém maior quantidade de bicarbonatos e se

torna alcalina.

RESUMO DA PARTE 5

O mecanismo renal de compensação do equilíbrio ácido-base é o mais lento e demorado, embora o definitivo. Quando o pH do sangue se altera, os rins eliminam urina ácida ou alcalina, conforme as necessidades, contribuindo

para regular a concentração de íons hidrogênio do sangue e demais líquidos orgânicos.

Os três principais mecanismos funcionais do sistema renal são a filtração glomerular, a reabsorção tubular e a secreção tubular.

Através o mecanismo de secreção tubular, os rins transformam o dióxido de carbono em ácido carbônico ionizado. O íon hidrogênio é eliminado para

a urina em troca por sódio ou potássio que combinando-se ao íon bicarbonato, retorna ao líquido extracelular, para alcançar a corrente

sanguínea. Quando há bicarbonato em excesso no sangue, os rins eliminam o íon

bicarbonato em conjunto com o íon hidrogênio, o que torna a urina alcalina

e contribui para a regulação das bases existentes.

Distúrbios do equilíbrio ácido-base

OBJETIVOS: Descrever as principais alterações do equilíbrio ácido-base. Analisar os desvios do pH. Descrever os distúrbios de origem respiratória e

os de origem metabólica. Conceituar acidose e alcalose.

CONCEITOS GERAIS

Os desvios da concentração de íons hidrogênio são ocorrências relativamente comuns nos pacientes graves, nos pacientes sob regime de terapia intensiva,

especialmente quando a ventilação depende de respiradores mecânicos e nos que apresentam doença significativa pulmonar ou renal, devido à interferência com os mecanismos reguladores naturais. São ainda comuns em pacientes com doenças

sistêmicas severas, de qualquer natureza, em que haja comprometimento das funções metabólicas ou respiratórias.

DESVIOS DO pH

O pH é o indicador do estado ácido-base do organismo. Os desvios do equilíbrio

ácido-base refletem-se nas alterações do pH do sangue. O pH normal do sangue, situa-se entre 7,35 e 7,45. Quando o pH está abaixo do valor mínimo normal, existe acidose. Se o pH está acima da faixa normal, existe

alcalose. A prática tem demonstrado que o organismo humano tolera um certo grau de

alcalose, melhor que graus idênticos de acidose. A severidade dos distúrbios do equilíbrio ácido-base pode ser apreciada pelo grau

de alteração do pH. Quanto mais baixo o pH, mais severa é a acidose; do mesmo modo um pH muito elevado, indica a presença de alcalose grave.

Figura 11. Representa o pH na acidose e na

alcalose. Demonstra também os limites de tolerância do organismo aos desvios do pH.

Desvios extremos do equilíbrio ácido-base, em geral se acompanham de alterações profundas da função dos órgãos vitais e podem determinar a morte do indivíduo.

Em geral, o valor mínimo do pH, compatível com a vida nas acidoses é de 6,85; nas alcaloses, o valor máximo de pH, tolerado pelo organismo é de aproximadamente

7,95, conforme representado na figura 11. As variações da concentração dos íons hidrogênio no organismo podem ser de

origem interna (endógena) ou externa (exógena).

O acúmulo de ácidos no organismo pode ser consequência da retenção do CO2 no sangue por dificuldade de eliminação nos alvéolos pulmonares, pode ocorrer em

consequência do aumento da produção de ácido lático e por incapacidade de eliminação de ácidos fixos pelos rins (causas endógenas). Pode também ocorrer, em consequência da ingestão acidental de grande quantidade de ácidos, como o

ácido acetil-salicílico (aspirina) ou outros agentes de natureza ácida (causas exógenas).

A redução dos ácidos no organismo pode ser consequência da eliminação excessiva do CO2 (causa endógena), da perda de ácidos fixos ou da administração excessiva

de bases, como o bicarbonato de sódio, por exemplo (causa exógena). Sempre que há tendência a desvios do equilíbrio ácido-base, o organismo

intensifica a atuação dos mecanismos de compensação, na tentativa de impedir grandes desvios do pH. Nestas circunstâncias os desvios podem ser parcialmente

compensados. A compensação completa do desvio, entretanto, depende da remoção da sua causa primária.

CLASSIFICAÇÃO DOS DESVIOS DO EQUILÍBRIO ÁCIDO-BASE

Figura 12. Classificação dos distúrbios do

equilíbrio ácido-base, conforme o seu mecanismo de produção.

Os distúrbios do equilíbrio ácido-base são classificados conforme os seus mecanismos de produção. Dessa forma, as alterações podem ter origem

respiratória ou metabólica. Esses desvios correspondem, portanto, a quatro tipos de alterações, relacionadas na figura 12.

Os desvios do tipo respiratório devem-se à alterações da eliminação do dióxido de carbono. Os desvios do tipo metabólico não sofrem interferência respiratória na sua

produção. Conforme a duração, os desvios do equilíbrio ácido-base podem ser agudos ou crônicos. Os distúrbios crônicos, em geral, acompanham doenças crônicas do

sistema respiratório ou dos rins. Os distúrbios crônicos costumam ser de intensidade mais leve, parcialmente compensados e melhor tolerados.

ACIDOSES

Ocorre acidose quando a concentração de íons hidrogênio livres nos líquidos do organismo está elevada; em consequência, o pH, medido no sangue arterial, está

abaixo de 7,35. As acidoses podem ser de dois tipos: acidose respiratória e acidose metabólica.

A acidose respiratória ocorre em consequência da redução da eliminação do dióxido de carbono nos alvéolos pulmonares. A retenção do CO2 no sangue que atravessa

os capilares pulmonares, produz aumento da quantidade de ácido carbônico no sangue, com consequente redução do pH, caracterizando a acidose de origem

respiratória. A acidose metabólica ocorre em consequência do aumento da quantidade de ácidos fixos, não voláteis, no sangue, como o ácido lático, corpos cetônicos ou outros. O

pH do sangue se reduz, devido ao acúmulo de íons hidrogênio livres; não há

interferência respiratória na produção do distúrbio. As acidoses, como distúrbio primário do equilíbrio ácido-base, são encontradas na

prática clínica, mais frequentemente que as alcaloses.

ALCALOSES

Ocorre alcalose quando a concentração de íons hidrogênio livres, nos líquidos do organismo está reduzida. Em consequência, o pH medido no sangue arterial está

acima de 7,45. Conforme o mecanismo de produção, as alcaloses podem ser de dois tipos, alcalose

respiratória e alcalose metabólica.

A alcalose respiratória ocorre em consequência do aumento da eliminação de dióxido de carbono nos alvéolos pulmonares. A eliminação excessiva do CO2 do

sangue que atravessa os capilares pulmonares, produz redução da quantidade de ácido carbônico no sangue, com consequente elevação do pH, caracterizando a

alcalose de origem respiratória. A alcalose metabólica ocorre em consequência do aumento da quantidade de bases no sangue, como o íon bicarbonato. O pH do sangue se eleva, devido à redução de íons hidrogênio livres; não há interferência respiratória na produção do distúrbio. As alcaloses como alterações primárias do equilíbrio ácido-base, são encontradas

na prática clínica, com menos frequência que as acidoses.

RESUMO DA PARTE 6

Os desvios da concentração de íons hidrogênio são ocorrências relativamente comuns nas práticas de emergência, terapia intensiva e

grandes cirurgias. O pH indica o estado ácido-base do organismo. O pH normal do sangue

oscila dentro da faixa de 7,35 a 7,45. Quando o pH do sangue é inferior a 7,35, existe acidose; quando o pH é superior a 7,45 existe alcalose. Os valores de pH abaixo de 6,85 ou acima de 7,95 indicam acidose e

alcalose extremas, respectivamente e, de um modo geral, são incompatíveis com a vida.

Os distúrbios do equilíbrio ácido-base podem ser produzidos por alterações respiratórias ou por alterações metabólicas.

Os desvios do tipo respiratório devem-se à alterações da eliminação do dióxido de carbono. Os desvios do tipo metabólico não sofrem interferência

respiratória na sua produção; correspondem à produção excessiva de ácidos, dificuldade de eliminação de ácidos, perda excessiva de bases do

organismo ou à perda de ácidos. As acidoses (pH inferior a 7,35), portanto, podem ser: respiratória ou

metabólica. As alcaloses (pH superior a 7,45), também podem ser respiratórias ou metabólicas, conforme a natureza da sua produção.

Fundamentos do Equilíbrio Ácido-Base

PARTE 7

AVALIAÇÃO DO EQUILÍBRIO ÁCIDO-BASE

OBJETIVOS: Descrever os exames que indicam o estado do equiíbrio ácido-base. Detalhar a coleta da amostra de sangue arterial e os cuidados na realização do exame. Analisar o significado dos resultados do exame.

CONCEITOS GERAIS

A normalidade do pH, da PCO2 e das bases do sangue e demais líquidos do organismo é representada por faixas, ao invés de um valor simples e absoluto, por

duas razões principais:

1. As medidas de parâmetros biológicos em uma grande quantidade de indivíduos são semelhantes, mas não são exatamente iguais. Um mesmo exame, realizado em

um grande número de indivíduos, mostrará uma curva de distribuição de resultados. O valor encontrado o maior número de vêzes representa o ponto médio da curva. Os valores encontrados em 95% dos indivíduos, formam um segmento

simétrico da curva, acima e abaixo do ponto médio e constituem o desvio padrão. A faixa de normalidade nessa curva abrange o ponto médio e o desvios padrão

inferior e superior. 2. Os valores do equilíbrio ácido-base refletem a atividade metabólica das células e a atividade química de um grande número de substâncias existentes no sangue e

nos líquidos intracelular e intersticial, onde ocorrem intercâmbio e reações químicas muito rápidas. O conceito de normalidade e seus valores numéricos, portanto,

devem ser abrangentes e devem considerar as variações individuais.

AVALIAÇÃO DO EQUILÍBRIO ÁCIDO-BASE

A avaliação do estado ácido-base do organismo, na prática clínica, é feita pela análise de quatro parâmetros principais, determinados em amostras de sangue

arterial. Esses parâmetros são o pH, a PCO2, o bicarbonato e a diferença de bases (excesso ou déficit).

Gasometria é o exame que fornece os valores que permitem analisar os gases sanguíneos e o equilíbrio ácido-base; os aparelhos utilizados para a determinação dos gases sanguíneos e do pH são os analisadores de gases, dos quais existem vários tipos e modelos, disponíveis no mercado. Os aparelhos mais sofisticados fazem correções automáticas para o valor da hemoglobina e da temperatura e

emitem os resultados já impressos em formulários próprios. Por se tratar da análise de gases, inclusive o CO2, muito volátil, diversos cuidados

são essenciais em relação à coleta das amostras de sangue, transporte ao laboratório e realização imediata do exame, para assegurar a fidelidade dos

resultados. A velocidade com que as condições do equilíbrio ácido-base podem se modificar, principalmente na terapia intensiva, requer a imediata análise dos resultados do

exame, que refletem as condições do paciente, no momento da coleta da amostra.

AMOSTRAS DE SANGUE

A amostra de sangue deve ser colhida por meio da punção cuidadosa de uma artéria periférica, geralmente a artéria radial ou a femural. A punção da artéria

femural é usada, quando a palpação dos pulsos radiais é difícil, devido à hipotensão

arterial ou baixo débito cardíaco. Em pacientes com instabilidade cardio-respiratória, frequentemente se usa um cateter intra-arterial para a monitorização contínua da pressão arterial e análise

seriada da gasometria arterial. Nesses casos o procedimento da coleta da amostra fica simplificado. Isso é comum nas unidades de terapia intensiva, durante

procedimentos cirúrgicos de grande porte, como na cirurgia cardiovascular ou nos laboratórios de hemodinâmica, durante o cateterismo cardíaco.

A amostra deve ser coletada com anticoagulante (heparina), para manter a fluidez do sangue. A técnica recomendada para a coleta consiste em aspirar cerca de 1 mL de heparina sódica (1.000 U/mL) e movimentar o líquido na seringa, apenas para "lavar" as paredes internas; logo após, desprezar todo o conteudo. O resíduo que

fica no espaço morto do bico da seringa e na agulha é de cerca de 0,15mL.. Essa quantidade de heparina é suficiente para anticoagular cerca de 2 a 4 mL. de

sangue. O volume mínimo da amostra deve ser de 2 mL., para manter a heparina bem diluida. Esse cuidado é importante, porque a heparina é ácida (pH em torno de

6,8). Heparina em excesso, na amostra, pode falsear a determinação do pH. Na prática, 0,05 mL. de heparina sódica são suficientes para anticoagular 1 mL. de

sangue. As amostras de sangue devem ser isentas de ar. As bolhas de ar porventura

existentes, devem ser imediatamente removidas. Quando a amostra contém ar, ocorre o equilíbrio gasoso com o sangue. A PCO2 da amostra será mais baixa

enquanto a PO2 poderá ser mais alta e o resultado pode não refletir as condições reais do paciente.

Quando o laboratório é distante do local da coleta, a amostra deverá ser transportada em gelo. O metabolismo do sangue da amostra continua; há consumo

de oxigênio e produção de CO2. Este cuidado é importante, quando o transporte produz demora na análise da amostra de sangue.

Decisões clínicas importantes são baseadas nos resultados da gasometria arterial; é fundamental, portanto, que os resultados do exame sejam absolutamente

confiáveis.

TÉCNICA DA PUNÇÃO ARTERIAL

A técnica da punção radial é simples mas requer alguma experiência, para ser realizada com sucesso.

* A artéria radial é puncionada na altura do punho. Devemos inicialmente palpar a artéria para assegurar a sua perfeita localização; a mão do paciente é posicionada

mantendo o punho em extensão ampla, para facilitar a palpação da artéria. A posição é mantida com apoio sobre uma compressa dobrada ou enrolada, conforme

demonstra a figura 13; * A pele no local da punção é limpa e desengordurada com algodão embebido em

álcool ou solução de álcool iodado;

* Faz-se um pequeno botão anestésico no local da punção, com agulha 25, que permite várias tentativas sem produzir dor no local;

Figura 13. Ilustra a técnica da punção da artéria radial, no punho do paciente.

* A artéria é palpada com uma das mãos, enquanto a outra empunha a seringa com agulha 20 ou 21; * A agulha deve fazer um ângulo de trinta graus com a pele, para perfurar a artéria em posição oblíqua, que facilita a hemostasia natural pelas fibras musculares da parede arterial; * Ao ser alcançada a luz da artéria, observa-se o fluxo sanguíneo no interior da seringa que em geral impulsiona o êmbolo. Esta manobra é mais fácil com as seringas de vidro que com as de plástico. Nestas últimas, em geral, é necessário

puxar levemente o êmbolo para estabelecer o fluxo sanguíneo para o interior da seringa; * Se a punção transfixa a artéria, a agulha deve ser retirada vagarosamente, até que a sua ponta alcance a luz do vaso, quando se estabelecerá o fluxo sanguíneo;

* A aspiração vigorosa com o êmbolo favorece a entrada de ar na amostra e deve ser evitada. Quando necessário, aspirar o sangue suavemente; * Após remover 2 mL. de sangue, retirar a agulha e comprimir o local da punção com algodão embebido em álcool ou álcool-iodado, por três minutos, para evitar a formação de hematomas no local da punção. * A punção em crianças pequenas deve ser feita com um escalpe fino (calibre 21), não adaptado à seringa, para permitir o livre fluxo do sangue. Um auxiliar deve conectar a seringa e aspirar a amostra quando o escalpe estiver cheio. A punção em crianças requer mais experiência com a técnica, embora as linhas gerais do procedimento sejam as mesmas.

ANALISADORES DE GASES

Os analisadores de gases sanguíneos utilizam eletrodos especiais para a determinação do pH, da pressão parcial de dióxido de carbono (PCO2) e da pressão parcial de oxigênio (PO2). A pressão parcial de oxigênio é determinada ao mesmo tempo que os demais parâmetros; contudo, sua análise não tem implicações nos

mecanismos do equilíbrio ácido-base. A PO2 do sangue arterial nos informa sobre a eficiência da oxigenação realizada nos alvéolos pulmonares.

Os eletrodos de pH, pCO2 e de pO2 são contidos em um pequeno reservatório, cuja temperatura é controlada. O aparelho requer calibração prévia para uso, que é

obtida por comparação com soluções padronizadas. Os aparelhos modernos calculam os parâmetros que não são diretamente medidos

pelos eletrodos e são de grande precisão. A taxa de hemoglobina do sangue do paciente deve ser informada, para a correção do valor das bases em excesso ou em déficit. Estes cálculos consideram a presença

do sistema tampão da hemoglobina.

INTERPRETAÇÃO DO EXAME

A interpretação da gasometria arterial, para a identificação de distúrbios do equilíbrio ácido-base é feita em etapas sucessivas:

* Verificação do pH; * Verificação da PCO2;

* Verificação das bases (bicarbonato); * Verificação da diferença de bases (excesso ou déficit).

VERIFICAÇÃO DO pH

O valor do pH da amostra indica o estado do equilíbrio ácido-base. Um pH normal demonstra a ausência de desvios ou sua completa compensação. Se o pH está

abaixo de 7,35, dizemos que existe acidose; quando o pH está acima de 7,45, dizemos que existe alcalose, conforme representado na figura 14.

Figura 14. Comportamento do pH nos distúrbios do equilíbrio ácido-base.

A análise do pH demonstra, simplesmente, a existência de acidose ou alcalose. Podemos, com base na experiência clínica, estimar a gravidade dos distúrbios pelos

níveis do pH. Um pH igual ou inferior a 7,25 é indicativo de acidose severa, enquanto que um pH, igual ou superior a 7,55 é indicativo de alcalose severa. A avaliação isolada do pH, obviamente, não oferece qualquer indicação sobre a

origem do distúrbio, que pode ser respiratória ou metabólica.

VERIFICAÇÃO DA PCO2

Após determinar a presença de acidose ou alcalose, devemos investigar a origem do distúrbio. O passo seguinte é avaliar o componente respiratório do equilíbrio

ácido-base.

Figura 15. Comportamento da pCO2, nos distúrbios de natureza respiratória.

O componente respiratório é avaliado pela quantidade de ácido carbônico existente no sangue. O ácido carbônico existe quase completamente sob a forma de CO2 +

H2O. A sua quantidade, portanto, pode ser determinada pela pressão parcial do dióxido de carbono (PCO2).

A pressão parcial do CO2 no sangue arterial normal oscila entre 35 e 45mmHg. Um valor anormal da PCO2, acima de 45mmHg ou abaixo de 35mmHg, indica a origem

respiratória do distúrbio. Quando a PCO2 está acima de 45mmHg significa que há retenção de CO2 no

sangue, o que, em consequência reduz o pH. Existe, portanto, acidose respiratória. Quando, ao contrário, a PCO2 está abaixo de 35mmHg significa que há excessiva

eliminação de CO2 do sangue e, em consequência, o pH se eleva. Nessas circunstâncias, estamos diante de um quadro de alcalose respiratória. A figura 15

ilustra o comportamento da PCO2 que origina os dois distúrbios de natureza respiratória.

NOTA: Embora na prática, o termo PCO2 seja de uso corrente, a expressão da pressão parcial de gases, deve respeitar a seguinte convenção:

PACO2: refere-se à pressão parcial do CO2 no gas alveolar (com A maiúsculo). PaCO2: refere-se à pressão parcial do CO2 no sangue arterial (com a minúsculo). PvCO2: refere-se à pressão parcial do CO2 no sangue venoso (com v minúsculo).

VERIFICAÇÃO DAS BASES

A quantidade de bases disponíveis no sangue, indica o estado do componente metabólico do equilíbrio ácido-base. As bases disponíveis no organismo para a neutralização dos ácidos, não são medidas diretamente na amostra do sangue,

como acontece com o pH e a pCO2; na realidade, a medida das bases é derivada das medidas anteriores. Os analisadores de gases de uso corrente calculam aqueles

valores. A relação entre o bicarbonato plasmático, controlado pelos rins, e o ácido

carbônico, controlado pelos pulmões, determina o pH. Esse princípio permite o cálculo das bases, em função da sua relação com o pH e a PCO2.

Figura 16. Comportamento do bicarbonato real (BR), nos distúrbios de natureza metabólica.

Existem diversos modos de expressar as bases existentes no sangue. Os dois parâmetros mais correntemente utilizados na prática, são o bicarbonato real e o

base excess. No analisador de gases, a amostra de sangue é colocada em presença de uma solução padronizada, cuja PCO2 é de 40mmHg. Após o equilíbrio, a PCO2 da

amostra será de 40mmHg, independente do seu valor inicial. O bicarbonato real existente no sangue é calculado à partir do pH e do CO2. Os

valores das bases são expressos em miliequivalentes por litro ou, mais comumente em milimols/litro (mM/L).

O valor normal do bicarbonato real (BR), oscila de 22 a 28mM/L. A figura 16 ilustra o comportamento do bicarbonato real nos distúrbios metabólicos do equilíbrio

ácido-base. Quando o bicarbonato real (BR) está baixo, inferior a 22mM/L, significa que parte

da reserva de bases foi consumida; em consequência o pH do sangue se reduz, configurando o quadro de acidose metabólica. Quando, ao contrário, o bicarbonato

real (BR) está elevado, acima de 28mM/L, significa que há excesso de bases disponíveis no sangue. O excesso das bases eleva o pH, configurando o quadro da

alcalose metabólica.

VERIFICAÇÃO DA DIFERENÇA DE BASES

Figura 17. Comportamento da diferença de bases nos distúrbios metabólicos do equilíbrio ácido-base.

O cálculo do bicarbonato ignora o poder tamponante do fosfato e das proteinas (principalmente a hemoglobina) do sangue e, portanto, não permite quantificar o distúrbio com precisão. A capacidade total de neutralização das bases é melhor

refletida pelo cálculo da diferença de bases (excesso ou déficit de bases existentes). Este parâmetro é calculado à partir das medidas do pH, da PCO2 e da hemoglobina.

O resultado expressa o excesso de bases existentes nas alcaloses metabólicas ou o déficit de bases existentes nas acidoses metabólicas. O valor aceito como normal para a diferença de bases é de 2mEq/L ou, em outras palavras: a diferença de

bases oscila entre um déficit (BD) de -2,0mEq/l e um excesso (BE) de +2,0mEq/l. Usa-se o termo excesso de bases, do inglês "base excess" (BE) para exprimir o

resultado positivo e o termo déficit ou deficiência de bases, "base deficit" (BD) para exprimir o resultado negativo.

Um déficit de bases indica a existência de acidose metabólica, enquanto o excesso de bases indica alcalose metabólica. O comportamento da diferença de bases está

representado na figura 17. A diferença de bases calculada, na realidade, representa o número de

miliequivalentes de bases que faltam ou que excedem para que o pH do sangue seja normal (7,40).

DISTÚRBIOS COMPENSADOS

Os distúrbios do equilíbrio ácido-base ativam os mecanismos de compensação. Dessa forma, se o distúrbio se prolonga, os exames poderão mostrar também o

resultado da ação dos mecanismos compensadores. O resultado dos exames laboratoriais representa o distúrbio primário e as tentativas

de compensação do organismo. Por essa razão, quando a alteração primária tem duração suficiente, os exames podem expressar a resultante da compensação do

distúrbio. Esses distúrbios são chamados compensados ou parcialmente compensados. Nas fases agudas, mais comum nas unidades de terapia intensiva, a

compensação raramente ocorre, pelo menos ao ponto de mascarar o resultado dos exames.

RESUMO DA PARTE 7

Os valores normais dos parâmetros biológicos são representados por faixas, que representam pelo menos 95% dos indivíduos.

A avaliação do equilíbrio ácido-base é feita pela determinação do pH, da PCO2, do bicarbonato e da diferença de bases em amostras de sangue

arterial. Para que o resultado seja confiável, a amostra de sangue deve ser coletada em heparina, em condições anaeróbicas, refrigerada e

imediatamente analisada. A verificação do pH indica o estado do equilíbrio ácido base. Um pH abaixo

de 7,35 indica a existência de acidose, enquanto o pH superior a 7,45 indica a presença de alcalose.

A verificação da PCO2 demonstra o estado do componente respiratório do equilíbrio ácido-base. Se a PCO2 está anormal, a origem do distúrbio é respiratória. A PCO2 acima de 45mmHg significa retenção de CO2 no

sangue e indica acidose de origem respiratória. A PCO2 está abaixo de 35mmHg, significa que há excessiva eliminação de CO2 do sangue e indica

alcalose de origem respiratória. A verificação do bicarbonato demonstra o estado do componente

metabólico do equilíbrio ácido-base. Se o bicarbonato está anormal, a origem do distúrbio é metabólica. Se o bicarbonato real é inferior a

22mM/L, significa que parte das bases foram consumidas e indica acidose

de origem metabólica. Se o bicarbonato real é superior a 28mM/L, significa que há excesso de bases no sangue e indica alcalose de origem metabólica.

A verificação da diferença de bases permite avaliar a severidade do distúrbio metabólico. Uma deficiência de bases (BD) indica a existência de acidose metabólica. Quanto maior o déficit de bases, tanto mais severa é a

acidose. Um excesso de bases (BE) indica alcalose metabólica. Quanto maior o excesso de bases, tanto mais severa é a alcalose.

A diferença de bases representa o número de miliequivalentes de bases que faltam ou que excedem para que o pH do sangue seja normal.

Fundamentos do Equilíbrio Ácido-Base

PARTE 8

ACIDOSE RESPIRATÓRIA

OBJETIVOS: Descrever a acidose de origem respiratória e suas principais causas. Analisar as consequências do acúmulo de dióxido de carbono e

ácido carbônico no sangue. Analisar os resultados da gasometria arterial na acidose respiratória.

CONCEITOS GERAIS

Os quatro grandes distúrbios do equilíbrio ácido-base são de origem respiratória ou metabólica. Os distúrbios de origem respiratória decorrem de alterações da

eliminação do dióxido de carbono (CO2) do sangue, ao nível das membranas alvéolo-capilares.

A redução da eliminação do dióxido de carbono nos pulmões, faz elevar o seu nível no sangue; em consequência, eleva-se o nível do ácido carbônico. Há maior

quantidade de íons hidrogênio livres no organismo e o pH cai. O distúrbio resultante é a acidose respiratória.

A quantidade aumentada de dióxido de carbono no sangue, em consequência da redução da sua eliminação é denominada hipercapnia.

A acidose respiratória é, portanto, consequência de alterações da ventilação pulmonar, caracterizadas por hipoventilação pulmonar e insuficiência respiratória. A acidose respiratória pode estar relacionada a alterações de diversas naturezas que comprometem a adequada eliminação do dióxido de carbono produzido pelo

organismo. As alterações podem ser do sistema nervoso central, da caixa torácica ou do parênquima pulmonar. As alterações do sistema nervoso que deprimem a função respiratória são relativamente comuns nas unidades de emergência e, em

geral, são de fácil identificação.

CAUSAS DE ACIDOSE RESPIRATÓRIA

A acidose respiratória é consequência da insuficiente eliminação do dióxido de carbono nos alvéolos pulmonares. Como a eliminação do dióxido de carbono depende fundamentalmente da ventilação pulmonar, as condições que geram

hipoventilação pulmonar, são causas de acidose respiratória.

A hipoventilação pulmonar pode ser produzida por diversos tipos de alterações, como:

Alterações do sistema nervoso que podem dificultar a respiração:

traumatismos crânio-encefálicos,

intoxicações exógenas, comas de qualquer natureza, resíduo de drogas depressoras, lesão medular, lesão do nervo frênico, bloqueadores neuromusculares.

Alterações tóraco-pulmonares:

obstrução das vias aéreas altas, atelectasias, pneumonias extensas, derrame pleural, pneumotórax extenso ou hipertensivo, afogamento, traumatismo torácico, hipercapnia permissiva.

Os traumatismos crânio-encefálicos, o coma barbitúrico e outros tipos de coma podem produzir insuficiência respiratória por alterações do controle neuromuscular

da respiração ou por interferência com a função do centro respiratório.

ALTERAÇÕES DA FISIOLOGIA

O distúrbio primário da acidose respiratória é a redução da eliminação do dióxido de carbono ao nível das membranas alvéolo-capilares dos pulmões. O CO2 acumulado no sangue mantém elevada a quantidade de ácido carbônico e de íons hidrogênio

livres. O hidrogênio tende a penetrar nas células em troca pelo potássio, que

aumenta seu valor no plasma nas primeiras horas do início da alteração. Os rins procuram eliminar o máximo de íons hidrogênio, que tornam a urina

excessivamente ácida.

QUADRO LABORATORIAL

Figura 18. Representa as alterações laboratoriais da acidose respiratória.

Os resultados da gasometria arterial permitem o diagnóstico da acidose respiratória:

1. O pH está baixo (inferior a 7,35); 2. A PCO2 está elevada (acima de 45mmHg).

A associação daquelas alterações do pH e da pCO2, permitem o diagnóstico da

acidose respiratória, conforme ilustra a figura 18. Em geral, nos distúrbios agudos a reserva de bases (bicarbonato real) é normal.

COMPENSAÇÃO DA ACIDOSE RESPIRATÓRIA

A acidose respiratória em geral é um distúrbio agudo que pode ser grave e rapidamente fatal. Casos de enfisema pulmonar e outras doenças crônicas do

parênquima pulmonar, podem desenvolver graus leves de acidose respiratória crônica, cuja duração permite compensação relativamente eficaz. A retenção

crônica de dióxido de carbono, aumenta o teor de ácido carbônico do organismo. Os rins eliminam íons hidrogênio e retém os íons bicarbonato, o que aumenta a

reserva de bases e mantém o pH nos limites normais ou muito próximo deles. Infecções respiratórias podem descompensar estes pacientes levando-os a grandes

aumentos da PCO2 e grandes quedas do pH resultando em acidose respiratória crônica agudizada.

TRATAMENTO DA ACIDOSE RESPIRATÓRIA

O tratamento da acidose respiratória depende da causa e da severidade do distúrbio. Em linhas gerais, contudo, o tratamento consiste de medidas para

estimular a ventilação pulmonar que vão desde o incentivo à tosse e eliminação de secreções bronco-pulmonares até a entubação traqueal e ventilação mecânica. Um plano adequado de toilete bronco-pulmonar e fisioterapia respiratória são

importantes medidas auxiliares que, em certas circunstâncias podem contribuir

para reduzir a necessidade de ventilação mecânica. A ventilação mecânica, quando utilizada, deve ser cuidadosamente conduzida e

monitorizada. A ventilação mecânica inadequada também pode ser causa de hipoventilação e retenção de dióxido de carbono, com produção de acidose

respiratória.

RESUMO DA PARTE 8

Os distúrbio do equilíbrio ácido-base podem ser de origem respiratória ou de origem metabólica. A eliminação respiratória do dióxido de carbono é o

grande regulador da concentração do ácido carbônico no organismo.

Quando a eliminação do dióxido de carbono nos alvéolos pulmonares está reduzida, o CO2 se acumula no sangue e, em consequência, aumenta a

quantidade de ácido carbônico e de íons hidrogênio livres. Estas circunstâncias originam a acidose de natureza respiratória.

Devido à maior quantidade de íons hidrogênio livres o pH se reduz. Os valores do pH inferiores a 7,35 caracterizam a existência da acidose.

O acúmulo do dióxido de carbono no sangue é representado pela elevação

da sua pressão parcial (PCO2). Quando a PCO2 supera 45mmHg, configura a natureza respiratória da acidose.

Em geral os quadros de acidose respiratória são de instalação rápida; não há tempo para que os mecanismos de compensação sejam eficazes.

O tratamento da acidose respiratória consiste de medidas destinadas a estimular a ventilação pulmonar e inclui estímulo à tosse, toilete bronco-

pulmonar, fisioterapia respiratória e ventilação com respiradores

mecânicos. Quando a acidose respiratória é leve e causada por doença pulmonar

crônica, a compensação renal consiste em reter íons bicarbonato, aumentando a reserva de bases e normalizando o pH.

Fundamentos do Equilíbrio Ácido-Base

PARTE 9

ALCALOSE RESPIRATÓRIA

OBJETIVOS: Descrever a alcalose de origem respiratória e suas principais

causas. Analisar as consequências da excessiva redução do dióxido de carbono e do ácido carbônico no sangue. Analisar os resultados da

gasometria arterial na alcalose respiratória.

CONCEITOS GERAIS

Os quatro grandes distúrbios do equilíbrio ácido-base são de origem respiratória ou metabólica. Os distúrbios de origem respiratória decorrem de alterações da

eliminação do dióxido de carbono (CO2) do sangue, ao nível das membranas alvéolo-capilares.

A eliminação respiratória regula a quantidade de dióxido de carbono no sangue e, dessa forma, regula o nível de ácido carbônico. Quando a eliminação do dióxido de carbono nos pulmões é elevada, o nível sanguíneo de ácido carbônico se reduz; há

menor quantidade de íons hidrogênio livres. A quantidade reduzida de dióxido de carbono no sangue, em consequência da

hiperventilação é denominada hipocapnia.

O distúrbio resultante é a alcalose respiratória. A alcalose respiratória é, portanto, consequência da hiperventilação pulmonar.

CAUSAS DE ALCALOSE RESPIRATÓRIA

A alcalose respiratória é sempre consequência da hiperventilação pulmonar, tanto na sua forma aguda como na crônica. A hiperventilação pulmonar pode ser

secundária a doença pulmonar ou não. A hiperventilação pode também ser devida à resposta quimioceptora do organismo em consequência de hipoxemia, disfunção do sistema nervoso central ou mecanismo de compensação ventilatória, na presença

de acidose metabólica.

A hiperventilação que acompanha certos quadros de agitação psico-motora pode produzir alcalose respiratória aguda que leva a tonteiras ou desmaios.

Na terapia intensiva a alcalose respiratória é frequentemente produzida pelo uso da ventilação artificial com respiradores mecânicos. Nessas circunstâncias um leve

grau de alcalose, com PCO2 entre 30 e 34mmHg contribui para reduzir o estímulo respiratório e manter o paciente ligeiramente sedado com menores doses de tranquilizantes. Outras causas de alcalose respiratória como subproduto da

hiperventilação podem ser enumeradas como: angústia, dor, febre elevada com calafrios, insuficiência hepática, meningoencefalites, sepsis e hipertireoidismo.

Hiperventilação intencional, com níveis de PaCO2 entre 28 e 30 mmHg são utilizados clinicamente objetivando reduzir a pressão intracraniana.

ALTERAÇÕES DA FISIOLOGIA

O distúrbio primário da alcalose respiratória é a eliminação excessiva de dióxido de carbono ao nível das membranas alvéolo-capilares dos pulmões. A tensão parcial

do CO2 no sangue se reduz, bem como reduz-se a quantidade de ácido carbônico e a quantidade de íons hidrogênio livres. Há o deslocamento de íons hidrogênio do interior das células para o interstício, em troca pelo potássio, cujo teor no sangue

se reduz.

QUADRO LABORATORIAL

Os resultados da gasometria arterial mostram os principais achados que permitem o diagnóstico da acidose respiratória: 1. O pH está elevado (acima de 7,45);

Figura 19. Representa as alterações laboratoriais da alcalose respiratória.

2. A PCO2 está baixa (abaixo de 35mmHg). A existência dessas duas alterações permitem firmar o diagnóstico da alcalose

respiratória, conforme ilustra a figura 19.

COMPENSAÇÃO DA ALCALOSE RESPIRATÓRIA

A alcalose respiratória é um distúrbio menos severo que a acidose respiratória. Frequentemente é induzida por terapia respiratória que inclui ventilação mecânica. Quando o distúrbio se prolonga, os rins diminuem a absorção de íon bicarbonato do

filtrado glomerular, promovendo maior eliminação pela urina, que se torna excessivamente alcalina.

TRATAMENTO DA ALCALOSE RESPIRATÓRIA

Em geral os quadros de alcalose respiratória são leves e de baixa gravidade. O tratamento em todos os casos consiste em remover a causa da hiperventilação. Nos

casos mais severos pode ocorrer hipopotassemia, capaz de gerar arritmias

cardíacas, pela entrada rápida de potássio nas células em troca pelos íons hidrogênio.

Os casos mais frequentes de alcalose respiratória severa são secundários à ventilação mecânica prolongada; o tratamento consiste em ajustar os controles do

aparelho adequando a ventilação às necessidades do paciente.

RESUMO DA PARTE 9

Os distúrbios do equilíbrio ácido-base podem ser de origem respiratória ou de origem metabólica. A eliminação respiratória do dióxido de carbono é o

grande regulador da concentração do ácido carbônico no organismo. Quando a eliminação do dióxido de carbono nos alvéolos pulmonares é

excessiva, a quantidade de CO2 e, em consequência, a quantidade de ácido carbônico do sangue estão diminuidos. Estas circunstâncias originam a

alcalose de natureza respiratória. Devido à menor quantidade de íons hidrogênio livres, o pH se eleva. Os valores do pH superiores a 7,45 caracterizam a existência da alcalose.

A redução do dióxido de carbono no sangue é representada pela queda da sua pressão parcial (PCO2). Quando a PaCO2 é inferior a 35mmHg.,

configura-se a natureza respiratória da alcalose. Em geral os quadros de alcalose respiratória ocorrem em pacientes sob

ventilação mecânica nas unidades de terapia intensiva. São de instalação rápida e não há tempo para que os mecanismos de compensação sejam

eficazes. O tratamento consiste em remover as causas da hiperventilação. Quando o distúrbio é leve e persistente a compensação renal consiste em reduzir a absorção dos íons bicarbonato do filtrado glomerular, mantendo

a relação do sistema tampão constante. A urina se torna alcalina.

Fundamentos do Equilíbrio Ácido-Base

PARTE 10

ACIDOSE METABÓLICA

OBJETIVOS: Descrever a acidose de origem metabólica e suas principais causas. Analisar as consequências do excesso de ácidos não voláteis no

sangue. Analisar os resultados da gasometria arterial na acidose metabólica.

CONCEITOS GERAIS

Os quatro grandes distúrbios do equilíbrio ácido-base são de origem respiratória ou metabólica. Os distúrbios de origem metabólica são produzidos pelo acúmulo de

ácidos fixos (acidose metabólica) ou de bases (alcalose metabólica) nos líquidos do organismo.

Ocorre acidose metabólica quando há predomínio da quantidade de ácidos fixos em relação às bases disponíveis para a sua neutralização. Estas circunstâncias podem

ser consequência do aumento da produção de ácidos, da ingestão de ácidos fixos ou da perda excessiva de bases pelo organismo.

CAUSAS DE ACIDOSE METABÓLICA

A acidose metabólica é um distúrbio bastante comum nas unidades de emergência,

de pós-operatório e de terapia intensiva. É um distúrbio sério, capaz de produzir complicações severas ou mesmo levar à morte.

A acidose metabólica, de um modo geral, ocorre em quatro circunstâncias: 1. Aumento da produção de ácidos não voláteis, que supera a capacidade de

neutralização ou de eliminação do organismo; 2. Ingestão de substâncias ácidas;

3. Perdas excessivas de bases do organismo;

4. Dificuldade de eliminação de ácidos fixos. A acidose metabólica mais frequente nas unidades de terapia intensiva é

consequência do aumento da produção de ácidos lático e pirúvico. A causa mais comum do acúmulo de ácido lático é a hipóxia dos tecidos. Em condições de baixa oxigenação, os tecidos são forçados a recorrer ao metabolismo anaeróbico para

manter a produção de energia. A via anaeróbica tem como produtos finais os ácidos fixos, principalmente o ácido lático. A reduzida perfusão dos tecidos que ocorre nos

quadros de choque ou de baixo débito cardíaco é a causa da hipóxia tissular. Nos casos de parada cardio-respiratória em que a recuperação não é muito rápida, sempre ocorre acidose metabólica. Esta, por sua vez, reduz a qualidade da resposta

às medidas de recuperação. A entrada e a combustão da glicose nas células, requer a presença da insulina e do

potássio. Quando a insulina falta ou é insuficiente, como no caso do diabetes mellitus, a glicose não é corretamente utilizada; a via metabólica alternativa produz

corpos cetônicos como produto final, que tem caráter ácido. A acidose metabólica, produzida pelo acúmulo dos corpos cetônicos corresponde a um tipo especial,

conhecida como ceto-acidose diabética. A ingestão acidental de grande quantidade de aspirina, comum em crianças, produz

acidose metabólica por absorção maciça do ácido acetil salicílico. Quando ocorre redução da função tubular renal ou do número de néfrons

funcionantes, há grande limitação na capacidade do organismo eliminar ácidos fixos

originários do metabolismo. Isto é o que ocorre na insuficiência renal. A quantidade total de bases do organismo pode ser reduzida em certas condições que se

acompanham de perda importante de bases. As diarréias das crianças que levam à desidratação, podem gerar acidose metabólica por perda excessiva de bases; a diarréia da cólera, também se acompanha de distúrbios da mesma natureza.

As acidoses metabólicas mais frequentemente encontradas são produzidas por: choque e hipotensão arterial, diabetes descompensado, cirurgias prolongadas,

insuficiência renal, diarréias e obstrução intestinal alta.

ALTERAÇÕES DA FISIOLOGIA

Os íons hidrogênio liberados pela dissociação do ácido em excesso reduzem o pH. Os radicais dos ácidos fixos em excesso nos líquidos do organismo e no sangue

reagem com o bicarbonato do tampão, do que resulta maior produção de sais de sódio (lactato, por exemplo) e ácido carbônico que, sob a forma de CO2 é eliminado

pelos pulmões. Como o bicarbonato do sistema tampão é consumido pelo ácido em excesso, a sua quantidade diminui; altera-se a relação normal do sistema tampão e

há déficit de bases. Quando a causa da acidose é a perda excessiva de bases, o bicarbonato total está

diminuído e a relação normal do sistema tampão, igualmente se altera, com predomínio de ácido e aumento dos íons hidrogênio.

QUADRO LABORATORIAL

Os resultados da gasometria arterial permitem o diagnóstico da acidose metabólica:

Figura 20. Representa os resultados da

gasometria arterial nas acidoses

metabólicas.

1. O pH está baixo, inferior a 7,35;

2. A PCO2 está normal;

3. O bicarbonato real está baixo, inferior

a 22mEq/l;

4. Há déficit das bases disponíveis. O

déficit de bases (BD) calculado é sempre

superior a -2mEq/l, frequentemente

ultrapassando o valor de -5mEq/l.,

conforme representado na figura.

COMPENSAÇÃO DA ACIDOSE METABÓLICA

O mecanismo mais imediato de compensação do aumento exagerado dos ácidos no organismo consiste na sua neutralização pelas bases do sistema tampão.

O ácido em excesso ao reagir com o bicarbonato forma ácido carbônico que é eliminado pelos pulmões, sob a forma de dióxido de carbono. O pH baixo estimula o centro respiratório que aumenta a frequência respiratória produzindo a taquipnéia

compensatória, reduzindo a PaCO2. A compensação renal, mais lenta, é pouco importante na fase inicial das acidoses severas e consiste em aumentar a reabsorção de bicarbonato e a eliminação de

íons hidrogênio, em troca por sódio e potássio.

TRATAMENTO DA ACIDOSE METABÓLICA

O tratamento das acidose metabólicas é variado; consiste fundamentalmente na eliminação das causas de hipóxia que, em geral inclui a reposição hídrica e

volêmica, normalização do débito cardíaco e correção da hipotensão arterial. A administração de bicarbonato de sódio pode corrigir a acidose do sangue e

minimizar os seus efeitos ao nível do interstício e do espaço intracelular. A reversão do processo contudo, depende da correção das causas básicas da acidose. A

resposta do sistema circulatório aos agentes vasoativos e inotrópicos depende da

manutenção do pH na faixa normal. Quando há excesso de íons hidrogênio livres, a função das membranas celulares se deteriora, a contratilidade miocárdica fica deprimida e o coração deixa de responder adequadamente ao estímulo dos

inotrópicos, como a dopamina e dobutamina. A dose de bicarbonato de sódio para a correção da acidose metabólica pode ser

estimada, à partir do déficit de bases (BD). Considera-se que a acidose consome as bases do líquido intravascular (plasma) e

do líquido intersticial, cuja soma corresponde a aproximadamente 30% do pêso corporal.

O déficit de bases (BD) representa a quantidade de bases necessárias para elevar o pH até o valor médio de 7,40 para cada litro de líquido do espaço extravascular

(30% do peso corporal). A seguinte fórmula:

mEq = Pêso (Kg) x 0,3 x BD permite o cálculo da quantidade de miliequivalentes de bases a ser reposta, para elevar o pH a 7,40. Os cálculos acima são apenas aproximações; o uso da fórmula

admite que há equilíbrio entre o líquido intracelular e o extracelular, o que nem sempre é verdadeiro em todos os instantes. Por estas razões, na prática

recomenda-se administrar a metade da dose calculada e repetir o exame após 15 minutos, para nova reavaliação. Esta prática evita a sobrecarga de sódio e a

possibilidade de originar alcalose metabólica por administração de bicarbonato de

sódio em excesso. Se usamos para a correção da acidose metabólica, o bicarbonato de sódio a 8,4% (mais comum no mercado), em que cada 1mL da solução contém 1mEq, a fórmula

completa a ser usada passa a ser: V (ml)= Pêso (Kg) x 0,3 x BD

V = representa o volume de bicarbonato de sódio a 8,4% a ser administrado. Peso = representa o peso do indivíduo, expresso em Kg.

0,3 = representa a constante para o líquido extracelular (30% do peso corporal), e BD = representa o déficit de bases obtido na gasometria arterial.

O produto do cálculo inicial é dividido por 2 para administrar apenas a metade da dose.

Nos casos de parada cardio-respiratória, podemos administrar 1 a 2mEq de bicarbonato de sódio a 8,4% por quilo de pêso do paciente, a cada 15 ou 30

minutos ou mais frequentemente, se necessário, até que se consiga realizar a

gasometria arterial ou haja a recuperação dos batimentos cardíacos. A acidose inibe a resposta do miocárdio ao estimulo da adrenalina e outras drogas inotrópicas e

antiarrítmicas. A tendência atual é limitar muito ou mesmo abolir o uso de bicarbonato de sódio

nesta situação. Há diversos estudos mostrando aspectos negativos do uso de bicarbonato na recuperação da contração miocárdica. O bicarbonato administrado

neutraliza o ácido láctico produzido pelo metabolismo anaeróbico e o ácido

carbônico resultante se dissocia em CO2 e água. O CO2 se acumula no sangue e, sendo extremamente difusível, penetra nas células causando acidose respiratória

intracelular, o que dificulta muito a recuperação do miocárdio. Nos casos de insuficiência renal podem ser indicados os métodos de depuração

extrarrenal: diálise peritoneal ou hemodiálise.

RESUMO DA PARTE 10

Os distúrbios do equilíbrio ácido-base podem ser de origem metabólica ou respiratória.

A acidose metabólica ocorre em uma de quatro circunstâncias: 1. Quando há excesso de produção de ácidos fixos,não voláteis, como o

ácido lático ou ácidos cetônicos, por exemplo. 2. Quando há ingestão de substância ácida.

3. Quando os ácidos fixos não podem ser eliminados devido à insuficiência renal.

4. Quando há perda excessiva de bases, como na obstrução intestinal alta e nas diarréias intensas, por exemplo.

A acidose metabólica é acompanhante comum dos quadros de hipotensão arterial severa, choque de todos os tipos e parada cardio-respiratória.

Pode ocorrer ainda nas diarréias severas, no diabetes descompensado e na obstrução intestinal alta.

Os íons hidrogênio liberados pela dissociação do ácido em excesso reduzem o pH; os radicais negativos dos ácidos fixos reagem com o

bicarbonato, produzindo sais de sódio e ácido carbônico. Na insuficiência de bases, o bicarbonato total está diminuido, com

predomínio dos ácidos e aumento dos íons hidrogênio livres. A gasometria arterial mostra o pH abaixo de 7,35, caracterizando a

acidose. A PaCO2 é normal e o bicarbonato padrão ou standard é baixo, inferior a 22mEq/L. Há também um déficit de bases, maior que -2mEq/L. O principal tratamento da acidose metabólica consiste na remoção das

causas do distúrbio. A administração de bicarbonato de sódio pode controlar a acidose

metabólica, enquanto as medidas dirigidas à remoção da causa primária são providenciadas ou tornam-se eficazes.

Nos casos de parada cardio-respiratória podemos administrar 1 a 2 mEq.

de bicarbonato de sódio por quilograma de peso a cada 15 ou 30 minutos.

Fundamentos do Equilíbrio Ácido-Base

PARTE 11

ALCALOSE METABÓLICA

OBJETIVOS: Descrever a alcalose de origem metabólica e suas principais causas. analisar as consequências do excesso de bases no sangue. Analisar

os resultados da gasometria arterial na alcalose metabólica.

CONCEITOS GERAIS

Os principais distúrbios do equilíbrio ácido-base são de origem respiratória ou metabólica. Quando há acúmulo de bases no organismo, em relação à quantidade

de ácidos a serem neutralizados, configura-se o quadro da alcalose metabólica. Isto pode ocorrer em consequência de ganho real de bases ou em consequência da

perda de ácidos. Este distúrbio não é muito frequente na prática médica; a alcalose metabólica é, frequentemente, produzida pela administração vigorosa ou

intempestiva de álcalis, como o bicarbonato de sódio, com a finalidade de tamponar acidoses pré-existentes.

CAUSAS DE ALCALOSE METABÓLICA

A alcalose metabólica pode surgir em duas circunstâncias principais: 1. Ganho excessivo de bases. Em geral as bases em excesso são administradas aos pacientes, sob a forma de bicarbonato de sódio, com o intuito de tamponar acidose

pré-existentes. Com o manuseio adequado dos demais distúrbios do equilíbrio ácido-base, essa causa de alcalose metabólica se torna cada vez mais rara.

2. Perda de ácidos ou íons hidrogênio. A perda de íon hidrogênio mais comum ocorre na estenose pilórica, onde os vômitos produzidos pela dilatação do estômago

eliminam grande quantidade de ácido clorídrico. O uso imoderado de diuréticos também acentua a eliminação de íons hidrogênio pela urina e pode produzir

alcalose metabólica.

Nas alcaloses os íons hidrogênio e potássio são trocados pelos íons sódio; pode, portanto, ocorrer hipopotassemia associada nas alcalose metabólicas.

ALTERAÇÕES DA FISIOLOGIA

Quando ocorre um excesso de bases, estas captam os íons hidrogênio, cuja concentração fica menor; o pH se eleva. As bases em excesso reagem com o ácido

carbônico, produzindo bicarbonato e outros. O bicarbonato total e o bicarbonato standard se elevam.

A perda de íons hidrogênio também eleva o pH. O bicarbonato deixa de ser reabsorvido do filtrado glomerular e a urina se torna mais alcalina.

QUADRO LABORATORIAL

Os resultados da gasometria arterial permitem o diagnóstico da alcalose metabólica:

Figura 21. Representa os resultados da gasometria arterial nas alcaloses metabólicas.

1. O pH está elevado, superior a 7,45; 2. A PaCO2 está normal; não há interferência respiratória na produção do distúrbio;

3. O bicarbonato real está elevado, acima de 28mM/L; 4. Há um excesso de bases (BE), superior a +2mEq/L.

COMPENSAÇÃO DA ALCALOSE METABÓLICA

O mecanismo de compensação respiratória é pouco expressivo, nas alcaloses respiratórias. A redução da eliminação de dióxido de carbono produziria hipóxia

concomitante; como o centro respiratório é extremamente sensível ao teor de CO2, esta compensação é limitada.

Os rins diminuem a produção de amônia e trocam menos ión hidrogênio por sódio,

para permitir sua maior eliminação. A reabsorção tubular do íon bicarbonato também fica deprimida. A urina resultante é bastante alcalina.

TRATAMENTO DA ALCALOSE METABÓLICA

De um modo geral a alcalose metabólica é leve ou moderada e não requer

tratamento especial a não ser a remoção da sua causa, quando possível. A reposição líquida nos casos de estenose pilórica, com frequência contribui para

normalizar o total das bases. O uso mais moderado dos diuréticos e a administração de cloreto de potássio tendem à normalizar os demais quadros.

Em casos excepcionais, a alcalose metabólica é tão severa que pode justificar a necessidade de se administrar soluções de ácidos por via venosa. Nesses raros

casos usam-se soluções de ácido clorídrico. Essas soluções, contudo, não existem em nosso mercado.

RESUMO DA PARTE 11

Os distúrbios do equilíbrio ácido-base podem ser de origem metabólica ou respiratória.

A alcalose metabólica é um distúrbio pouco frequente, na prática clínica, em relação aos demais distúrbios. Em geral, a alcalose metabólica ocorre

em uma de duas circunstâncias: 1. Quando há excesso de bases, geralmente por administração

intempestiva de bicarbonato de sódio, para corrigir acidose pré-existente; 2. Quando há perda de ácidos fixos, como pode ocorrer na estenose pilórica em que o ácido clorídrico do estômago é perdido através os

vômitos. As bases em excesso nos líquidos captam os íons hidrogênio; o pH se

eleva. O bicarbonato real está elevado e o excesso de bases supera o valor de +2mEq/L.

A eliminação acentuada de íons hidrogênio por uso de diuréticos, também pode causar alcalose metabólica.

A gasometria arterial mostra o pH acima de 7,45, o bicarbonato real superior a 28mM/L e um BE maior que +2.

O tratamento da alcalose metabólica consiste em atuar sobre as causas

primárias do distúrbio.

Fundamentos do Equilíbrio Ácido-Base

PARTE 12

ESTUDO DE CASOS SELECIONADOS

OBJETIVOS: Estudar uma série de casos clínicos representativos dos distúrbios do equilíbrio ácido-base. Descrever os casos clínicos incluindo a

etiologia, o diagnóstico e o tratamento dos distúrbios. Analisar os resultados da gasometria arterial, comentar o diagnóstico do distúrbio e

discutir a condução do tratamento.

CASO 1.

Paciente de 30 anos chega ao Setor de Emergência em estado de coma, apenas respondendo aos estímulos dolorosos. Sua respiração é superficial e com frequência

normal. Familiares encontraram próximo a ela diversas caixas de tranquilizantes vazias. Gasometria arterial: pH= 7,20; PaCO2= 80mmHg; BR= 23 mM/L; BE= -

1,2. Qual(is) o(s) distúrbio(s) ácido-básico(s) apresentado(s), seu(s) mecanismo(s), causa mais provável, outros exames a serem solicitados e

tratamento ? Como o pH está menor que 7,35 trata-se de uma acidose. A PaCO2 maior que 45 mmHg mostra que existe um importante componente respiratório. O BR normal mostra que não há compensação metabólica. Portanto o distúrbio ácido-básico é

acidose respiratória aguda. O mecanismo do distúrbio nesta paciente é a diminuição da eliminação de CO2 por redução da ventilação alveolar; insuficiência respiratória aguda, tipo hipoventilação.

A causa provável, em função da história, é depressão do centro respiratório por excesso de tranquilizantes. Dois outros exames a serem solicitados são: 1 -

radiografia de tórax a fim de verificar se não há outras causas para o distúrbio ou a complicação mais frequente em intoxicações deste tipo - pneumonia por aspiração

de conteudo gástrico; 2 - Análise toxicológica no sangue para confirmar o tipo de medicamento ingerido e orientar o tratamento definitivo.

Neste caso o tratamento inicial é o suporte da vida: estabelecer vias aéreas permeáveis através de intubação traqueal e normalizar a ventilação alveolar com

uso de ventiladores mecânicos. Só então indica-se a lavagem gástrica para retirada de resíduos de medicamentos. Dependendo do(s) agente(s) ingerido(s) o

tratamento definitivo pode se dirigir para o uso de antagonistas específicos, para retirada do agente do organismo através de hemofiltração ou diálise ou

simplesmente aguardar a metabolização, mantendo o suporte ventilatório.

CASO 2.

Após 24 horas de tratamento no CTI, a paciente do caso 1 ainda se encontra torporosa e submetida a ventilação artificial. Gasometria arterial: pH= 7,52;

PaCO2= 26 mmHg; BR= 25,6 mM/L; BE= +1,2. Qual(is) o(s) distúrbio(s) ácido-básico(s) apresentado(s), seu mecanismo, a causa provável e o tratamento?

Como o pH está maior que 7,45, trata-se de uma alcalose. A PaCO2 está menor que 35 mmHg, sugerindo um componente respiratório. O BR normal mostra não

haver componente metabólico, nem tentativa de compensação. Em função disto o distúrbio ácido-básico é alcalose respiratória aguda.

O mecanismo mais provável neste caso é ventilação alveolar excessiva, que

aumenta a eliminação de CO2, embora a diminuição da produção de CO2 pelo organismo também tenha que ser considerada, com uso de tranquilizantes

potentes. A causa mais provável é a regulagem inadequada do ventilador mecânico, gerando

ventilação alveolar muito elevada. O tratamento se baseia no ajuste do ventilador, usando volume corrente em torno

de 7 - 8 mL/kg e frequência respiratória entre 8 e 12 por minuto. Caso ainda persista a alcalose, pode-se adicionar espaço morto entre o ventilador e a via aérea

da paciente.

CASO 3.

Paciente de 50 anos chega ao Setor de Emergência torporoso, desidratado, com

respiração profunda, pausa inspiratória e aumento da frequência respiratória. Ao exame clínico nota-se hálito cetônico. Gasometria arterial: pH= 7,10; PaCO2= 20

mmHg; BR= 5 mM/L; BE= -18. Qual(is) o(s) distúrbio(s) ácido-básico(s) apresentado(s), seu mecanismo, sua causa, outros exames a serem solicitados e

tratamento? A análise do pH muito menor que 7,35 sugere acidose importante. A PaCO2 menor

que 35 mmHg exclui causa respiratória, sugerindo ao contrário, ser uma

compensação. O BR muito baixo confirma ser de origem metabólica. O distúrbio é uma acidose metabólica com tentativa de compensação respiratória. Este padrão

gasométrico e o exame clínico são típicos de pacientes diabéticos descompensados com cetoacidose. Nestes casos há uma grande produção de ácidos fixos -

cetoácidos - responsáveis pelo enorme consumo de bicarbonato e pelo hálito cetônico. A acidose é primariamente metabólica e ativa o centro respirátorio bulbar que, tentando normalizar o pH, aumenta a ventilação alveolar eliminando CO2 em

excesso, mas sem conseguir compensar o distúrbio. Se não houvesse a participação respiratória, o pH estaria muito mais baixo.

Outros exames importantes neste caso são: glicemia, glicosúria, cetonúria e dosagem de eletrólitos no sangue, principalmente potássio e fosfato.

O tratamento visa a correção da causa, ou seja, reduzir a produção de cetoácidos através da utilização da glicose pelo metabolismo, fornecendo-se insulina ao

paciente. Esta deve ser feita inicialmente por via venosa começando com 0,15 U/kg em bolo e mantendo-se infusão contínua de 0,1 U/kg/h com controle glicêmico

frequente. Paralelamente e igualmente importante é a reidratação do paciente com volumes generosos de soro fisiológico com potássio e fosfato.

Este é um dos casos de acidose metabólica em que o bicarbonato de sódio somente é necessário quando o baixo nível de pH coloca a vida do paciente em risco (abaixo

de 7,00).

CASO 4.

Atleta de 20 anos está sendo submetido a avaliação funcional respiratória em repouso. Após ser colhida amostra de sangue arterial, verifica-se que o analisador

de gases sanguíneos está com defeito e leva-se a amostra a outro laboratório. Gasometria arterial: pH= 7,30; PaCO2= 50 mmHg; BR= 19 mM/L; BE= -3,5. Qual(is) o(s) distúrbio(s) ácido-básico(s) apresentado(s), causa provável e

conduta? O pH menor que 7,35 indica acidose. A PaCO2 maior que 45 mmHg sugere

componente respiratório. O BR menor que 22 aponta para causa metabólica. O distúrbio ácido-básico é acidose mista (respiratória e metabólica).

Por se tratar e pessoa assintomática, com bom preparo físico e em repouso não se espera nenhuma alteração ácido-básica. A história sugere demora no

processamento da amostra, o que pode ter permitido a produção de CO2 e de ácidos fixos pelas células do sangue, principalmente pelos leucócitos, alterando o

resultado do exame. Nos casos em que a amostra não puder ser rapidamente analizada, sugere-se

guardá-la e transportá-la em recipiente térmico com gelo, para reduzir a atividade metabólica do sangue.

CASO 5.

Paciente jovem chega ao Centro Cirúrgico com história de traumatismo abdominal há duas horas. No local do acidente foi encontrado lúcido, hipocorado e com sinais de choque hipovolêmico. Foi reposto rapidamente com solução fisiológica, albumina humana e bicarbonato de sódio. Chegou à Emergência estável e equilibrado, o que permitiu avaliação adequada e pronta indicação cirúrgica. Gasometria arterial: pH=

7,55; PaCO2= 35 mmHg; BR= 32 mM/L; BE= +5,8. Qual(is) o(s) distúrbio(s)

ácido-básico(s) apresentado(s), mecanismo provável e conduta ? O pH está maior que 7,45 configurando alcalose. A PaCO2 está normal, mostrando não haver componente respiratório. O BR está aumentado, indicando componente

metabólico. O distúrbio ácido-básico é alcalose metabólica pura. Nos casos de choque hipovolêmico a alteração ácido-básica esperada é acidose

metabólica com compensação respiratória devida à hipoperfusão sistêmica levando a metabolismo celular anaeróbico. Quando se restaura a perfusão com reposição

volêmica adequada, ocorre rápida normalização ácido-básica. Neste caso houve desnecessária administração de bicarbonato de sódio, o que acarretou excesso de bicarbonato circulante que, enquanto não for eliminado pelos rins leva à alcalose

metabólica. Neste distúrbio normalmente não há compensação respiratória. Não há necessidade de nenhuma conduta terapêutica, a não ser manter perfusão

renal adequada para permitir a eliminação do excesso de base.

CASO 6.

Paciente de 23 anos está no CTI com quadro de choque sético consequente a peritonite e insuficiência respiratória grave, tipo síndrome de angústia respiratória

aguda (SARA) em fase avançada. Suporte circulatório com aminas vasoativas, reposição de volume e suporte respiratório com ventilador mecânico estão sendo empregados. Gasometria arterial: pH= 7,21; PaCO2= 54 mmHg; BR= 19 mM/L;

BE= -6,5. Qual(is) o(s) distúrbio(s) ácido-básico(s) apresentado(s), mecanismos e

conduta? O pH menor que 7,35 indica acidose. A PaCO2 maior que 45 mmHg sugere

componente respiratório. O BR menor que 22 mM/L sugere componente metabólico. O distúrbio ácido-básico é acidose mista (respiratória e metabólica).

Nos casos de choque circulatório, as células do organismo não recebem a quantidade de oxigênio necessária ao seu metabolismo, transformando-o em

anaeróbico, o que causa acúmulo de ácido láctico (ácido fixo). Este é o mecanismo do componente metabólico desta acidose. Na SARA só costuma ser observada

retenção de CO2, responsável pelo componente respiratório nas fases mais avançadas, quando a complacência pulmonar está muito diminuida ou quando se

usa a técnica de hipercapnia permissiva. Esta é uma técnica ventilatória em que se empregam pequenos volumes correntes (3-5 mL/kg) para evitar lesão pulmonar

pelo ventilador, comum nesta síndrome. A conduta quanto à parte metabólica é melhorar ao máximo a perfusão para

normalizar o metabolismo, utilizando o tipo de suporte já empregado e lançando mão do bicarbonato de sódio apenas em níveis muito baixos de pH (menor que

7,20) ou quando a acidose estiver impedindo o funcionamento das aminas. Quanto à parte respiratória, se for necessário normalizar a PaCO2, será preciso aumentar a

ventilação alveolar.

CASO 7.

Paciente de 70 anos em pós-operatório de cirurgia abdominal queixa-se de caimbras e prostração. Ao exame clínico minucioso observam-se abalos musculares e drenagem elevada pela sonda nasogástrica (2.000mL/24 h). Gasometria arterial: pH= 7,62; PaCO2= 40 mmHg; BR= 36 mM/L; BE= +8,0. Qual(is) o(s) distúrbio(s) ácido-básico(s) apresentado(s), mecanismo, outros exames importantes e conduta?

O pH maior que 7,45 indica alcalose. A PaCO2 normal exclui componente respiratório. O BR aumentado sugere componente metabólico como o responsável.

O distúrbio é alcalose metabólica pura. Quando ocorre drenagem alta pela sonda gástrica ocorre grande perda de ácido, potássio e cloreto, componentes do suco gástrico. Ocorre alcalose metabólica por perda de ácido fixo, elevação do bicarbonnato secundária à perda de cloreto (para manter a eletroneutralidade) e perda de potássio causando dor muscular. Alcalose

reduz os níveis de cálcio ionizado, ocasionando contraturas musculares.

Outros exames necessários para confirmar o diagnóstico da alcalose hipocalêmica e hipoclorêmica e para acompanhar o tratamento são as dosagens de potássio, cloro

e cálcio ionizado no sangue. A conduta é aumentar a reposição de potássio e cloreto sob a forma de solução

fisiológica de cloreto de sódio 0,9% com cloreto de potássio, além de determinar a causa da drenagem excessiva. Normalmente não é preciso repor cálcio.

CASO 8.

Criança de 7 anos chega ao hospital com história de redução do volume urinário e edema de membros inferiores. Há história prévia de vários episódios de amigdalite.

Gasometria arterial: pH= 7,30; PaCO2= 28 mmHg; BR= 18 mM/L; BE= -6,5. Qual(is) o(s) distúrbio(s) ácido-básico(s) apresentado(s), mecanismo, causa e

conduta? O pH menor que 7,35 indica acidose. A PaCO2 menor que 35 mmHg, sugere que a causa da acidose não seja respiratória e que haja tentativa de compensação. O BR diminuido sugere que a causa seja metabólica. O distúrbio é acidose metabólica

com compensação respiratória parcial. Neste caso há dificuldade de eliminação pelos rins de ácidos fixos produzidos pelo

metabolismo. A redução de pH estimula o centro respiratório, aumenta a ventilação alveolar e reduz a PaCO2, tentando normalizar o pH.

A causa da alteração nesta criança é insuficiência renal aguda, secundária a provável glomerulonefrite aguda de etiologia estreptocócica.

O tratamento agudo visa melhorar a função renal, se ainda for possível, ou lançar mão de métodos extrarrenais de depuração como a diálise (hemo ou peritoneal)

nos casos de acidose grave, hipervolemia, hiperpotassemia, uremia sintomática etc. O controle da doença de base pode reverter a insuficiência renal.

CASO 9.

Paciente de 80 anos com septicemia secundária a pneumonia de aspiração está sendo ventilada artificialmente. Ocorre queda súbita do nível de consciência

sugestiva de acidente vascular cerebral. Gasometria arterial: pH= 7,42; PaCO2= 36 mmHg; BR= 27,6 mM/L; BE= +1,3. Qual(is) o(s) distúrbio(s) ácido-básico(s)

apresentado(s), mecanismo e conduta? O pH é normal, bem como a PaCO2 e o BR. Não há distúrbio ácido-básico. O exame

é normal. Embora seja uma paciente muito grave e instável, seu quadro ácido-básico está

sendo mantido normal pelo suporte oferecido. O exame em nada contribuiu para a avaliação do episódio agudo.

CASO 10.

Paciente de 65 anos, fumante, procura o ambulatório queixando-se de dispnéia, cansaço e tosse acompanhada por secreção clara. O exame clínico revela aumento

do diâmetro ântero-posterior do tórax, baqueteamento digital e alguns sibilos esparsos. Gasometria arterial: pH= 7,40; PaCO2= 58 mmHg; BR= 34 mM/L; BE= +7,2. Qual(is) o(s) distúrbio(s) ácido-básico(s) apresentado(s), mecanismo, causa

e conduta? O pH é normal. A PaCO2 está elevada indicando acidose respiratória. O BR também está elevado indicando alcalose metabólica. Em função da história e do exame físico

o diagnóstico é acidose respiratória com compensação metabólica completa. Neste caso o distúrbio inicial foi a retenção de CO2 pela doença pulmonar. Face à

sua cronicidade, os rins baixaram seu limiar de reabsorção de bicarbonato a fim de normalizar o pH, conseguindo com uma alteração secundária compensar totalmente

a primária. A causa dos distúrbios é a doença pulmonar obstrutiva crônica que inclui enfisema

e bronquite crônica, levando a alterações de trocas gasosas pelos pulmões que ativam alterações renais, hematológicas, cardícas, ósseas etc. A conduta, neste

caso, é dirigida à causa e não ao distúrbio ácido-básico.

CASO 11.

O paciente anterior (caso 10) apresentou, após dois meses, quadro de tosse produtiva, secreção amarelada e febre. A dispnéia piorou, fazendo com que fosse levado à Emergência. Gasometria arterial: pH= 7,20; PaCO2= 75 mmHg; BR= 30 mM/L; BE= +5,0. Qual(is) o(s) distúrbio(s) ácido-básico(s), mecanismo, causa e

conduta? O pH muito reduzido indica acidose. A elevada PaCO2 evidencia componente

respiratório. O BR, embora elevado, não é mais suficiente para compensar completamente o desequilíbrio primário. O distúrbio é acidose respiratória com

tentativa de compensação metabólica. Neste caso aumentou muito a dificuldade de eliminação de CO2, acumulando ácido

carbônico e reduzindo muito o pH. A retenção renal de bicarbonato já não é suficiente para normalizar o pH.

A causa provável é pneumonia, descompensando a insuficiência respiratória crônica deste paciente, levando-o à agudização.

O tratamento inclui suporte respiratório precoce, drenagem da secreção brônquica e tratamento do broncoespasmo e da infecção. A eliminação da secreção e a

redução do broncoespasmo facilitam a melhora da ventilação e eliminação de CO2.

CASO 12.

Paciente em pós-operatório de cirurgia de aneurisma de aorta abdominal

desenvolveu insuficiência renal aguda. Embora estável do ponto de vista hemodinâmico e respiratório, está dependente de hemodiálise em dias alternados.

Avaliações ácido-básicas diárias mostram acidose metabólica compensada. A última gasometria arterial foi: pH= 7,14; PaCO2= 30 mmHg; BR= 19 mM/L; BE= -2,5. Qual(is) o(s) distúrbio(s) ácido-básico(s) apresentado(s), mecanismo e conduta?

O pH está extremamente baixo, sugerindo acidose metabólica grave. A PaCO2 está levemente diminuida, sugerindo tentativa de compensação respiratória. O BR está

levemente diminuido, revelando pequeno déficit de bicarbonato. Os dados do exame são incompatíveis entre si, sugerindo erro na sua realização. A gasometria

deve ser repetida.

CASO 13.

Paciente de 55 anos com infarto agudo do miocárdio está na Unidade Coronariana em choque cardiogênico. Apesar de suporte farmacológico com dobutamina,

dopamina e adrenalina, a perfusão é inadequada, apresentando extremidades frias, cianose periférica, anúria e sonolência. Gasometria arterial: pH= 7,10; PaCO2= 35

mmHg; BR= 12 mM/L; BE= -15. Qual(is) o(s) distúrbio(s) ácido-básico(s) apresentado(s), mecanismo, causa e conduta?

O pH baixo sugere acidose grave. A PaCO2 está normal não havendo alteração

respiratória. O BR está baixo indicando distúrbio metabólico. O distúrbio é acidose metabólica sem tentativa de compensação.

O mecanismo da acidose metabólica é o mesmo dos outros tipos de choque; metabolismo celular anaeróbico com acúmulo de ácido láctico e dificuldade de

eliminação de ácidos fixos em decorrência da hipoperfusão renal. É interessante observar, neste caso, a falta de compensação respiratória de uma acidose tão

grave. O motivo provável é hipoperfusão dos músculos respiratórios limitando sua

atividade. Embora este paciente esteja recebendo suporte adequado do ponto de vista

farmacológico, a gasometria mostra que a perfusão está severamente comprometida. Possibilidade a ser aventada é uma eventual inibição da ação das catecolaminas decorrente da acidose grave. Impõe-se, então, a correção parcial

com bicarbonato de sódio calculado segundo o peso do paciente e o nível de déficit de bases.

CASO 14.

Paciente de 17 anos chega à Emergência sem falar, apresentando batimento palpebral e frequência respiratória de 50 incursões por minuto. Gasometria arterial: pH= 7,63; PaCO2= 18 mmHg; BR= 26 mM/L; BE= -5,9. Qual(is) o(s) distúrbio(s)

ácido-básico(s) apresentado(s), mecanismo, causa e conduta?

O grande aumento do pH indica alcalose. A PaCO2 reduzida sugere componente respiratório. O BR é normal, não indicando alteração metabólica. O distúrbio é

alcalose respiratória pura. O mecanismo é hiperventilação de origem central aumentando muito a eliminação

de CO2, reduzindo a PaCO2 e aumentando o pH. Distúrbios de origem psicológica, além de algumas lesões do sistema nervoso central são causas frequentes de alcalose respiratória aguda. Se o distúrbio se

mantiver por tempo suficiente, pode-se observar compensação metabólica através

de eliminação renal de bicarbonato. A conduta nestes casos deve ser simplesmente sedar a paciente e observar a sua

evolução.

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