EQUIPES NOVAS - ens.org.br · nuar a viver a vida da equipe, quer entrando para outra, quer...

36
EQUIPES NOVAS CARTA No 9 EQUIPES DE NOSSA SENHORA SÃO PAULO- 1974 , ..

Transcript of EQUIPES NOVAS - ens.org.br · nuar a viver a vida da equipe, quer entrando para outra, quer...

EQUIPES NOVAS

CARTA No 9

EQUIPES DE NOSSA SENHORA

SÃO PAULO- 1974

, ..

í

"Quem, depois de deitar a mão ao arado, olha para trás, não está apto para o Reino de Deus".

Lucas, 9, 62

"Esquecido do que fica para trás e lançando-me para aquilo que tenho na frente, continuo a minha corrida, olhar fixo na meta, rumo à palma, à qual Deus lá no alto me chama em Crlsto Jesus".

Fi!. 3, 13-14

EDITORIAL

"APóLOGO"

Por ser, segundo dizem, muito elucidativo, quero voltar a falar-vos do apólogo que contei às equipes parisienses durante um dos seus encontros gerais.

A Senhora Fulana de Tal vem ao gabinete do Diretor ma­tricular o seu filho Alberto.

- Senhor Diretor, espero que concorde em o Alberto não vir à aula aos sábados à tarde. O meu marido preocupa-se muito com a educação estética do filho e insiste em que ele vi­site, todos os sábados, os museus de Paris.

- Peço imensa desculpa, minha Senhora, mas é-me im­possível aceder ao seu pedido. A nossa tarde livre é a de quinta-feira .

- E porque não ao sábado? A escolha de quinta-feira é arbitrária .

- Concordo consigo. A sra. prefere o sábado; o farma­cêutico, sem dú,vida, prefere a segunda-feira, porque nesse dia fecha a loja e poderia ir passear com os filhos; outros... E preciso escolher.

Os mesmos - seis meses depois .

- Com grande pesar, minha Senhora, não posso conti­nuar a ter aqui o Alberto. Apesar de todas as nossas observa­ções, chega normalmente atrasado na parte da tarde.

-3-

- Senhor Diretor, o meu marido e eu achamos que uma hora de sesta depois do almoço é necessária para um certo equi­líbrio fisico e psíquico. Aliás, tem de reconhecer que o traba­lho do Alberto não ficou prejudicado, pois tem sido o melhor desde março.

É evidente que o seu trabalho não foi prejudicado. Mas, se não defendermos a disciplina, cai-se na anarquia e todo o colégio sofrerá com isso. Peço-lhe que compreenda. Nós que­remos tomar o compromisso de levar até ao fim do curso as crianças que nos são confiadas mas é preciso que os pais, p!!lo seu lado, tomem o compromisso de respeitar as nossas condi­ções de horário, de programa e de disciplina.

Terei de explicar mais?

Quando um grupo de casais se liga às Equipes de Nossa Senhora, sentimos profundamente, na Equipe Responsável, que assumimos uma responsabilidade, que nos comprometemos a ajudá-lo na sua procura de Deus. Talvez nunca tenhais pen­sado nisso a sério?

Mas não .podemos assumir esse compromisso se não ti­rvermos os meios de o levar a cabo: os Estatutos e as suas obrigações.

Que há uma certa arbitrariedade na escolha de algumas obrigações dos Estatutos - como no colégio a quinta-feira ·­é verdade. Por exemplo, poderia ter-se adotado um outro ritmo para o "dever de sentar-se" (quinze dias, dois meses ... ). Foi preciso escolher.

Também não discuto que determinado casal possa alcan­çar profunda vida interior sem fazer um retiro por ano. .No entanto, não se cria uma regra para os casos especiais mas para o conjunto. E, para o conjunto, pareceu-nos essencial esta obrigação do retiro anual. Admitir que alguém se po:::sa sub­trair ao seu cumprimento a pretexto de que não tem necessi­dade dela (aliás, discutível) é abrir a brecha por onde esca­pariam aqueles a quem custa cumprir esta obrigação. É por

-4-

esse motivo que pedimos àqueles que pensam poder dispensá-la. que a cumpram como todos os outros .

Retomo a minha idéia. A Equipe Responsável, quando re­cebe uma equipe nova, assume por isso mesmo um compromis­so perante ela, o compromisso de a ajudar no caminho de Deus - e asseguro-vos que em certos momentos este compromisso não nos parece leve. No entanto, só estaremos em condições de o manter se a equipe respeitar a disciplina do Movimento. 11: por isso que lhe pedimos que se comprometa também.

Estou convencido ser uma segurança para vós que a Equipe Responsável saiba e queira comprometer-se a ajudar-vos no caminho de Deus. Acontece o mesmo conosco, sabendo-vos "comprometidos".

HENRICAFFAREL

-5-

DEVORADO. . . MAS NUTRITIVO

"Excelência, estou sendo devorado"... Queixava-se, re­centemente, um padre junto do seu bispo. "E, meu amigo, está sendo nutritivo?", respondeu este, a quem não faltava humor.

Devorado .. . todos o somos, ou julgamos sê-lo . O turbi­lhão da vida atual - em certos dias devia dizer-se o tufão -o ritmo dos negócios, arrastam-nos e devoram-nos.

Devorados pelos chamados ao telefone. Os que recebe­mos e os que fazemos. Devorados pelos deslocamentos exi­gidos pelo trabalho. O automóvel, o trem, quando não é o avião a jato. Devorados pelos Jazeres... Devorados, quer dizer, arrastados pelos acontecimentos ou pelos homens, sem nos pertencermos já a nós mesmos. Na realidade, estranhos a nós próprios, "alienados", como dizem os marxistas. Do­minados ou dominadores por uma agitação pseudo-católica. Sem nada de comum com a verdadeira ação do cristão que é apenas e realmente a irradiação de Cristo através do seu discípulo.

Não importa que se seja devorado desde que se seja nu­tritivo, como notava o nosso bispo. Desde que se leve a quem nos devora alguma coisa mais do que celulose para ruminar. Vitaminas, sim. Estão na moda. Alimentos nutritivos e as­similáveis, e não essas guloseimas que enganam o estômago e a fome.

Só seremos nutritivos com uma condição: se transmitir­mos Cristo, uma "virtude", uma força Sua, como diz o Evan-

-6-

gelho. Ora Cristo não irradiará através de nós e pór nosso intermédio se não estivermos unidos a Ele. Particularmente, mas não exclusivamente, pelo recolhimento e pela oração. Agi­mos segundo aquilo que efetivamente somos.

A trepidação atual e a febre profana não deixam de con­taminar a nossa vida religiosa . .. Não queremos calar-nos. temos medo do silêncio, e não gostamos de rezar. O trabalho é oração, diz-se, e a ação também . Com certeza. A Igreja ensinou-o ao mundo e não se cansa de o repetir. Mas a ação também pode ser apenas socos no ar ou ruído de metais, como diz s. Paulo. E não passa disso se não for vivificada pela nossa oração com Cristo, a oração em nós do Senhor Jesus. Para que o trabalho se torne oração é preciso haver oração pura. Neste ponto os autores espirituais, sem exceção, e qualquer que seja a escola a que pertençam, são. unânimes ...

Se a nossa atenção estiver sempre desperta, o nosso es­forço sempre tenso, poderemos ser verdadeiramente devora­dos. l: mesmo muito natural que o sejamos porque desperta­remos o apetite dos outros. Mas seremos sempre nutritivos porque damos o Senhor Jesus. Nutritivos para os que nos de-­vorarem, mas nós próprios alimentados por essa passagem através de nós, e muitas vezes sem o sabermos, de Cristo, Senhor de todos nós.

JEAN ROCHE, s. j .

-7-

O COMPROMISSO NAS EQUIPES DE NOSSA SENHORA

Já há qua.se um ano que vocês vêm adquirindo o conheci­mento concreto da vida numa equipe de Nossa &mhora, refle­tindo sobre os objetivos e métodos do Movimento, começando a cumprir as obrigações, experimentando o que é a entre-ajuda dentro duma equipe.

Ao fazê-lo, puderam tomar consciência da importância da espirltualidade conjugal que o movimento se propõe ajudá-los a aprofundar e a viver, e os convida a espalhar ao redor de si.

Vocês estão, portanto, no momento exato para decidirem com conhecimento de causa se o seu lugar como casal é nas E. N. S. Encontram-se perante a opção que lhes foi anunciada logo na Carta N9 2: permanecer no Movimento, "comprome­tendo-se a jogar o jogo" ou a dar por finda uma experiência que lhes revelou que o Movimento não convem por esta ou aquela razão.

Cabe-lhes agora interrogar a si mesmos e sobretudo pro­curar a vontade de Deus sobre o casal: "Deveremos compro­meter-nos com estes ca.sais que nos rodeiam e adotar os seus Estatutos, e entrar mais longe na vida das E.N.S. "? O com­promisso não é qualquer coisa de completamente novo mas a conclusão de uma experiência leal ; responde a determinado chamamento.

Comprometer-se a jogar o jogo não significa que já se tenha conseguido realizá-lo completamente mas sim que:

-8-

a) Estão convencidos, depois de terem orado e refletido, que as E. N. S. podem ajudá-los neste perfodo da própria vida a corresponder melhor aos chamamentos do Senhor;

b) estã.o decididos a fazer tudo para o alcançar, utili­zando os meios que o Movimento põe à .;ua disposição e os recursos da vida de equipe.

"Assim como me parece essencial que nunca se desen­coragem os casais que, cheios de boa vontade, têm düiculdades em cumprir as obrigações dos Estatutos, também me parece ilógico e perigoso que entrem ou permaneçam no Movimento aqueles que não concordem com o.s fins ou os meios, ou mesmo que, estando de acordo, não tenham vontade de fazer "jogo franco". (1)

Encontrarão a seguir algumas reflexões que poderão aju­dá-los a tomar uma decisão sobre o compromisso, para o pre­pararem e, em suma, para o viverem, ao longo dos anos.

I . A SIGNIFICAÇAO PROFUNDA DO COMPROMISSO

O compromisso é simultâneamente, uma atividade e uma atitude.

- Atividade através da qual um casal escolhe, com co­nhecimento de causa e de maneira explícita, dar-se mais a Deus e aos outros, no e pelo Movimento.

- Atitude, porque esta atividade só tem valor na medida em que é a expressão duma atitude que o casal resolve tornar e conservar enquanto fizer parte das E. N. S. , sendo evidente que tem e continua a ter sempre a liberdade de as abandonar.

Poder-se-ia dizer que o compromisso é o ato ou a atitude do casal cristão que resolve assumir plenamente o seu papel de testemunha de Deus no mundo em que vive.

(1) "As Equipes de Nossa Senhora lace ao ateísmo", por H. CJI!arel.

-9-

Há um compromisso fundamental para com Deus, que é o compromisso do batismo. Mas tal compromisso pode ser vivido de maneiras muito düerentes.

Se decidiram fazer parte das E. N. S. é porque lhes pare­ceu que as características deste Movimento lhes convinham.

O compromísso nas Equipes é assumido pelo casal - vive­-se no seio duma equipe - no Movimento .

1 Q Faz-se o compromisso enquanto casal As Equipes de Nossa Senhora querem ajudar os casais a

viverem melhor o sacramento do matrimônio. Assim, é no casamento e através dele, meihor compreendido e vivido, que querem chegar até Deus. O casal deve ser "Imagem de Deus", como dizia o Papa Paulo VI aos casais das Equipes presentes em Roma, em 1970 . Portanto, o compromisso deve ajudar os esposos a desenvolverem, aprofundando-os, os laços que os unem um ao outro e a assumírem melhor a responsabilidade que têm um pelo outro.

29 O Compromisso é feito dentro duma equipe

A lei da entreajuda é o ponto central da vida das Equipes de Nossa Senhora. Ora seria um contrasenso viver sozinho a vida de membro duma equipe. Pode-se imaginar numa equi­pe de futebol , um goleiro sem os r estantes companheiros da equipe? Quando um casal assume o compromisso nas Equipes, está implícito que considera o fato de fazer parte duma equipe como necessário para viver esse compromisso. Conse­qüentemente, se tiver de deixar a sua equipe por qualquer ra­zão, só continuará "compromissado" na medida em que conti­nuar a viver a vida da equipe, quer entrando para outra, quer fundando uma nova, quer continuando, pelo menos por algum tempo, como " correspondente" da sua equipe no caso de ser a mudança de residência que o obrigue a deixlÍI-la .

Por outro lado, o compromisso implica o tomar a cargo reciproco os membros da equipe, tal como são, pessoas imper­feitas .. . como todos nós, aceitando cada um deles ajudar todos os outros e pedir-lhes ajuda pessoalmente .

-10-

39 O compromisso é feito dentro do Movimento

Isto pressupõe que se aceita, em princípio: - as GRANDES ORIENTAÇOES das Equipes de Nossa

Senhora, tal como as definem, especialmente, os Estatutos e a conferência do Cônego Caffarel em Roma, sendo evidente que quando se fala de "Movimento" se pressupõe "dinamismo e evolução", em função de novas necessidades;

- as OBRIGAÇOE.S tal como existem, e especialmente o retiro anual. Para fazer o compromisso é preciso estar to­talmente decidido a aceitar todas as obrigações de que se des­cobriram os benefícios e também as dificuldades durante o pe­ríodo de experiência; mas isto não implica que já se tenha conseguido inseri-los totalmente na própria vida, no dia do compromisw.

- A DISCIPLINA DO MOVIMENTO e a confiança a ter naqueles que aceitam as responsabilidade, o que, aliás, implica também que os membros das equipes contribuam com as suas sugestões ou críticas construtivas.

Mas este compromisso "no Movimento" implica igual­mente que cada casal comprometido aceite estender a todo o Movimento a entre-ajuda fraterna de que pôde avaliar o valor a nível de sua equipe. :É neste sentido que, logo de início, se pede que aceite, eventualmente, a responsabilidade de tomar a cargo, espiritualmente, os casais das E. N. S. de todo o mundo. Este tomar a cargo espiritual traduz-se, especialmen­te, pela recitação diária do Magnificat.

11. MODALIDADES PRATICAS

Já compreenderam, através da leitura no final do editorial do Cônego Caffarel, que este ato comporta dois aspectos: Fazem o compromisso perante o Movimento e o Movimento também se compromete com vocês e com a sua equipe.

Assim, é perfeitamente normal que aqueles que aceitarem responsabilizarem-se pela vida das E.N .S., no seu Setor ou

-11-

Região, também estejam dispostos a aceitar ou recusar a en­trada da sua equipe no Movimento.

Portanto, nenhuma equipe se poderá preparar para fazer o compromisw sem ter sido para tal convidada pelo seu Res­ponsável de Setor.

Depois de um contato com o Casal de Ligação e, seja di­retamente ou por intermédio de outro casal, com o Respon­sável de Setor, será marcada a data de uma reunião a que poderá assistir o Responsável de Setor ou um casal por ele de­signado. Será a oportunidade desse casal conhecer melhor a sua equipe e de lhes dizer franca e diretamente o que pensa dela .

Além disso, vocês têm certamente pontos a esclarecer ou aprofundar sobre a vida e as orientações do Movimento, per­guntas a fazer sobre a organização das E.N.S. , etc. Seria pena ficar ou começar com pontos mal entendidos e nada é mais útil do que o contato direto e vivo com um casal mais antigo nas E. N. S., que possa partilhar com vocês a sua experiência.

Normalmente, depois desta reunião, o Responsável de Setor convida os casais da equipe a prepararem o seu com­promisso. No entanto, quando achar necessário, pode sar obrigado a pedir-lhes que suspendam o compromisso, caso ve­rifique, por exemplo, que existe desacordo com a finalidade ou métodos propostos pelo Movimento ou falta, não t alvez boa vontade, mas apenas vontade. Será então marcado um pra­zo, passado o qual será tomada uma decisão, agora definitiva.

111. AS REUNiõES ESPECIAIS

Quando forem assim convidados pelo Responsável de Se­tor a preparar o compromisso, devem dedicar duas reuniões a este assunto.

Na primeira reunião, será proposto para o tema de estu­dos, a reflexão sobre "0 Espírito e as Grandes Linhas do Movimento".

-12-

Na segunda reunião o tema de estudos será baseado na primeira conferência do Pe. Caffarel no Brasil, sobre o sen­tido da reunião de equipe - e numa reflexão sobre o sentido espiritual do compromisso. Será feita, ainda, uma partilha aprofundada sobre os meios de aperfeiçoamento e a vida da equipe .

Para estas duas reuniões, serão fornecidos questionários especiais que deverão ser respondidos por escrito.

Se, no decurso destas duas reuniões, um casal chega à conclusão de que, decididamente, a disciplina ou o ideal das E.N.S. não correspondem às suas aspirações ou à sua vocação, deve com toda a franqueza e simplicidade declarar que se re­tira . Os laços de amizade poderão evidentemente subsistir entre ele e os outros casais, mas seria ilógico e pouco leal que continuasse a seguir com os outros, um caminho que não lhe convém.

Depois destas duas reuniões, o Responsável de Equipe en­via um relatório ao Casal de Ligação, juntamente com as res­postas dos casais aos temas, indics,ndo a decisão tomada por cada um deles, bem como a data fixada para o compromisso.

Cada equipe tem plena liberdade de escolha sobre a ma­neira como entende levar a efeito a decisão dos casais. A cerimônia deverá ser assistida pelo Responsável de Setor ou por um casal por ele designado e que representará o Movimento.

Poderá acontecer que a equipe tenha admitido, depois de sua formação, um ou dois casais novos. Neste caso, é natural que estes casais esperem ainda algum tempo para assumir o compromisso, sem retardar por isso o compromisso dos outros. Deverão oportunamente, também eles, tomar a decisão de per­manecer na equipe, assumindo o compromisso de fidelidade aos Estatutos, ou retirar-se da equipe.

Finalmente, é preciso lembrar que o compromi~so deve ser reatualizado periodicamente. ll: para isso que as equipes de­vem proceder anualmente à renovação do compromisso.

-13-

O compromisso de uma equipe deverá ser imediatamente comunicado pelo Setor ao Secretariado da ECffi, que pas>ará a enviar aos casais a Carta Mensal normal.

CONCLUSAO

Todos os cristãos são chamados à santidade, como decor­rência de seu batismo.

Todos os cristãos casados são chamados à santidade, no e pelo casamento.

Para responder a este apelo, alguns casais cristãos resol­vem ingressar nas Equipes de Nossa Senhora. Elas são um caminho, entre outros, para ajudá-los a haurir do sacramento do matrimônio, não só as graças especiais que sustentam o casal na sua vida conjugal e familiar, como também e princi­palmente para firmar neles a vontade de melhor compreender e conhecer a Deus, melhor amá-lo e melhor serví-lo, assu­mindo, outrossim, o papel de testemunha de Deus em meio aos homens . O compromisso é o momento oferecido aos ca­sais para a escolha a fazer, de acordo com a própria vocação: tendo experimentado lealmente que a mística e a disciplina do Movimento os ajuda a melhor corresponderem à sua voca­ção, decidem engajar-se nesse caminho. Alguns haverá, tam­bém, que irão perceber que as E.N.S. não correspondem ao que nelas esperavam encontrar. Outros não estão decididos a fazer os esforços necessários. Embora por motivos bem di­versos, uns e outros devem renunciar a continuar a experiên­cia e deixar o Movimento .

:É: preciso portanto, considerar como normal a retirada de um ou outro casal por ocasião da decisão a ser tomada . Fre­qüentemente, o que os retém, são os laços de amizade que se estabeleceram . Ora, a separação é mais fácil ao fim de 12 ou 18 meses; depois disso torna-se bem mais difícil.

Quanto ao significado do compromisso, poderíamos citar aqui a defin ição dada por um casal membro da Equipe Res­ponsável Internacional: "0 compromisso é o gesto ou a ati­tude de um casal que, tendo tomado consciência de que é parte

-14-

constitutiva do Movimento, renuncia a uma posição de especta­dor e se põe a serviço de Deus, da Igreja e do mundo".

ll: um GESTO, ou seja, a concretização explícita de uma ATITUDE . ll: a exteriorização por um ato, de uma atitude interior.

Para um cristão, um compromisso domina todos os outros : é o batismo, que o faz membro do Corpo Místico de Cristo, a Igreja. Outros grandes compromissos podem suceder-se a este: seja o da Ordem, para o sacerdote; seja o do Matrimônio, para dois jovens cristãos que unem as suas vidas.

Tais compromissos implicam responsabilidades peculiares. Para seu desempenho, as graças dos Sacramentos são fontes de energias sempre renovadas, mas não dispensam a procura de meios concretos e adequados, que sustentem o esforço e preservem da rotina ou desânimo.

As Equipes de Nossa Senhora propõem aos cristãos casa­dos meios próprios para ajudá-los na sua marcha para Deus . Ingressar nas E. N . S . é adotar tais meios.

O "Compromisso" é, portanto, a adoção consciente de todos os meios propostos pelo Movimento para ajudar os cristãos casados a serem perseverantes no esforço de fidelidade aos dois grandes compromissos: o Batismo e o Matrimônio. Estes sacramentos são duas fontes de dinamismo para sustentar e soerguer sempre mais as nossas forças. E vamos às Equipes de Nossa Senhora, movidos pela caridade fraterna, a fim de por em comum as nossas forças e assim corresponder mais perfeitamente à missão que nos foi confiada .

• "No fundo das almas, em certas equipes, quão diversas são

as intenções! Este vem mais ou menos por causa do cônjuge, para lhe ser agradável; aquele casal, recém-chegado à cida­de, está contente por fazer novas relações; outro decidiu-se

- 15 -

porque realmente é preciso "fazer alguma coisa"; encontra· -se também, muitas vezes, o caso do casal atraído pela espe­rança de encontrar certo apoio para a sua vida conjugal; e talvez mesmo, em certas cidades, é de bom tom pertencer às Equipes.

Depois, ll.á aqueles que não têm intenção alguma, só vêm por rotina, para não causar aos seus companheiros de equipe o desgosto de os ver partir.

Ora digo-lhes que nenhum desses motivos justifica a pre­sença numa equipe . Alguns não são maus mas nenhum é o verdadeiro, aquele que corresponde à razão de ser do Movi­mento. ll: natural que algum destes motivos acompanhe o verdadeiro, mas não deverá ser o determinante .

A única intenção verdadeira, aquela que corresponde à fi. nalidade das Equipes, é a vontade de compreender melhor Deus, de O amar melhor e de O servir melhor. Vem-se para as Equipes por Deus. O motivo de entrada, o motivo de permanência é religioso, ou seja, relativo a Deus.

ll: forte o Movimento em que cada um dos membros só entrou depois de ter consultado Deus. ll: preciso que as nossas equipes sejam fortes. Ouso acreditar que a Igreja tem necessi­dade delas". (H.C.)

-16-

FATIGUEI-ME A PROCURA DE DEUS ...

Para encontrar é preciso procurar, ter o desejo de encon­trar; para desejar encontrar necessita-se acreditar que há alguma coisa a encontrar.

Vocês acreditam ter ainda alguma coisa para encontrar? Ou serão desses cristãos que, tendo adquirido algumas noções so­bre a grandeza do matrimônio, pensam que já dominam tudo sobre esse "grande mistério", para falar como S. Paulo? Que tendo assistido a alguns retiros e conferências, se contentam com os que fixaram e deixam a outros as "insondáveis rique­zas de Cristo" , como também diz S. Paulo?

No caso de acreditarem que ainda têm muito a encontrar - nunca termina a descoberta da verdade infinita - estarão possuídos pelo desejo de encontrar? Têm fome de luz? A inapetência espiritual é doença vulgar entre os cristãos. Não têm fome e, então, não se preocupam com a alimentação e a que tomam não lhes aproveita. A saúde espiritual reconhe­ce-se por esse sinal, que é a fome do conhecimento de Deus, do Seu pensamento e da Sua palavra .

. . . Se têm fome, procuram o alimento? Consagram, dia­riamente, tempo para ler as Escrituras? Sabem reservar, na vida sobrecarregada, momentos para aprofundarem a sua fé? Lê-se no livro dos Provérbios : "Fatiguei-me à procura de Deus". E vocês? Estudam o tema mensal nesse espírito de descoberta de que eu falava?

17-

A discussão do tema na reunião será de tipo intelectual, ou seja, a pesquisa ardorosa das verdades de que se tem ne­cessidade vital? Sabem que o Conselheiro Espiritual não é apenas aquele que dispensa os sacramentos de Cristo mas também a Palavra de Deus? Na reunião apelam, freqüente­mente, para ele?"

HENRI CAFFAREL

-18-

TESTEMUNHO

"Rezarei muitas vezes pelos instruídos, os intelectual­mente ricos, porque lhes é mais difícil apreenderem as ver­dades simples que os pobres compreendem por instinto. Deus quer assim evitar aos ricos a vaidade de tudo com­preenderem, tudo explicarem, tudo racionalizarem e lerem sempre razão. Ele quer que não compreendamos tudo, para que possamos permanecer humildes e obedientes, para que sejamos sempre crianças perante este bocado de sombra.

Mas o coração sente muito bem o que escapa à inteli­gência e isto te agradeço, Senhor. Mostra aos ricos que não é vergonha esclarecerem-se antes ao fogo do Amor do que à luz da razão. E lemos por acréscimo o calor".

Durante uma sessão, após alguns membros das equipes "diplomados" Ee terem lamentado de que a conferência tinha sido difícil de seguir e outros terem querido arrastar o padre conferencista a uma discuSEão bizantina, um membro das equipes que não acabou os seus estudos, entregou ao padre este texto acima. Quer sejamos ricos ou pobres, tanto no plano ma­terial como no plano intelectual, podemos pedir ao Senhor, que nos dê perante estes mistérios a verdadeira "inteligência" de coração cristão e o espírito de infância, perante o que resta "parte de sombra" no nosso tema, num artigo, numa confe­rência.

-19-

NÃO SE ESQUEÇAM DO SAL ...

Vocês já se reunem há nove ou dez meses. Fizeram a ex­periência de uma vida de equipe. Apreciaram de modos diversos as exigências que as Equipes comporiam . No caso do Movimento ler correspondido positivamente à ex­pectativa, não é de temer, a curto ou longo prazo, certo lorpor?

t para prevenir a mediocridade, a insipidez que lhes confiamos estas linhas de um Conselheiro Espiritual:

"Pertencemos às Equipes de Nossa Senhora", "temos Es­tatutos", "cumprimo-los".

Cuidado! Não repousem nisto, como os Judeus na sua Lei. Chegou a hora de sacudir a sonolência ; é preciso acor­dar, abalar a indüerença, é preciso optar, destruir a indolên­cia, é preciso caminhar. Mesmo que acumulassem todas as "obrigações" dos Estatutos, se faltasse o sal, Deus não as acha­ria a seu gosto.

"Vós sois o .sal da terra" (Mt. 5, 13). Jesus repete-nos o que ouviu dizer a Seu Pai. Jâ encontramos no Lev!tico 2, 13) :

"Temperarás com sal tudo o que ofereceres em sacrifício, e não tirarãs do teu sacrifício o sal da aliança do teu Deus ... Em toda oferta acrescentarás sal".

-29-

Na realidade, o sal evoca a perfeição de um dom que torna saboroso e protege da alteração. Os nômades utilizam-no nas refeições de amizade ou de aliança. Deus espera por ele em todas as no~sas oferendas, das nossas pessoas e dos nossos bens. Desde o Batismo nós lhes somos apresentados depois da imposição do sal, que se segue logo ao desejo da Paz. Como está adaptado ao rito da Aliança!

Portanto, façam reviver em vocês a virtude do sal. Ele dá sabor às nossas relações com Deus. Na oração é

o fervor da atenção; no sacrifício a perfeição da dádiva; no amor, a delicadeza, sem a qual o conjunto dos testemunhos e das dedicações deixa ao amado mais a impressão de peso do que a de força para o coração.

Ele manifesta igualmente a refeição da amizade onde a vida fraterna se exprime. A caridade dos nossos pensamen­tos, tão afastados da indiferença como da crítica malévola. Que náuseas não teria, por vezes, o nosso próximo se tivesse de provar o que pensamos dele!

O sal, nas nossas palavras, tiraria a insipidez das nossas banalidades, dos lugares-comuns. Neutralizaria os fermentos da discórdia.

Nos nossos silêncios, à escuta dos outros, calaria o que nos parece faltar às suas palavras para serem aceitas por todos .

Nos nossos atos, corrigiria tudo o que têm de impessoal, de inexpressivo, em suma de triste. Porque o sorriso é o sal do rosto .

"O Reino dos céus, diz-nos o Senhor, é semelhante a um banquete ... '' a nossa vida na terra passa-se em prepará-lo:

"Não se esqueçam do sal".

PAUL MARIE WECXSTEEN

-21 -

TESTEMUNHAS DO DEUS VIVO

Na sua conferência aos peregrinos de Roma, em Maio de 1970, o Cônego CAFF AREL começou por descrever o ateísmo como falo . Recordando uma frase do Concílio (1),

.mostrava, a parte de responsabilidade dos crentes, que fre­qüentemente apresentam uma falsa imagem de Deus.

Sublinhou a seguir que o casal é chamado, de manei­ra especial, a ser testemunha do Deus vivo, da verdadeira imagem de Deus .

Mas é preciso estar preparado . Estarão os casais? Estará o Movimento? Não de forma suficiente nem com profundidade. Daí o final de sua conferência que vão ler.

Em prioridade, parecem impôr-se-nos três orientações de ordem geral : o estudo e a prática da ascese cristã, a escuta da Palavra de Deus, a prá tica da oração mental. Não me li­mitarei a definir estas orientações; sublinharei as suas apli­cações na vida, visto que o perigo está sempre em nos conten­tarmos com !delas bonitas e por aí ficarmos.

(1) Na crenese do ateísmo, também os crentes têm o seu quinhão de res­ponsabilidade . (Gaudium e! Spes)

-22-

ASCESE CRISTA

Importa em primeiro lugar que o Movimento ajude os casais a darem lugar na sua vida à ascese cristã, que provi.m­riamente defino assim: uma Imitação de Jesus Cristo na vida quotidiana. Estou convencido, na verdade, de que o desco­nhecimento das exigências de ascese está na origem das defi­ciências do Movimento. Ao dizer-vos isto, não estou tanto a. censurar-vos a vós, como a mim próprio. Pensava um pouco ingenuamente, já lá vão trinta anos, diante destes jovens ca­sais vivendo um amor cristão alegre e fervoroso, que o seu entusiasmo bastaria para os conduzir à santidade. Depois de ter ob.servado a sua evolução e também de ter aprofunda­do o pensamento de Cristo, compreendo hoje que a muitos falta conhecer as exigências evangélicas. Sem um esforço leal e corajoso para cada um purificar o seu coração, é inútil pre­tender conhecer a Deus, viver de Deus e dar testemunho dele. Cristo disse: "Bem-aventurados os de coração puro, porque verão a deus". Disse também: "Aquele que quer ser meu discípulo tome a sua cruz de cada dia e siga-me" (Lc. 9, 23). Quando se fala de ascese, alguns pensam nem sei em que peni­tências dignas dos Padres do deserto. ~ ao mesmo tempo mais simples, mais profundo e mais alegre. Em todos nós coabi­tam duas forças incompatíveis, o que a Escritura chama "co­biça" - ou se preferis, egoismo - e a caridade, que é amor de Deus e dos nossos irmãos por Deus. No decorrer de vinte séculos de vida cristã, foram sendo elaboradas uma ciência e uma arte, qÜe ensinam os meios para fazer triunfar a ca­ridade sobra a cobiça, "o homem novo" sobre o "homem velho", sobre o pecador que nós somos. Jl: inadmissível que nas Equipes de Nossa Senhora, Movimento de Espiritualidade, os casais se não iniciem lealmente nesta ciência de progresso espiritual que é a ascese cristã.

Mas a ascese cristã tem modalidades diferentes conforme os estados de vida: a ascese do leigo casado não deve ter as mesmas formas da dos religiosos . Infelizmente, se, no decor­rer dos tempos, as regras e os meios da ascese religtQSI)s {Q~a.m

-23-

largamente estudados e também, graças aos agrupamentos de leigos, se foi aperfeiçoando pouco a pouco uma ascese da vida laical, quase tudo está por fazer, no que respeita a uma ascese própria dos cristãos casados. Que enorme serviço poderiam prestar as Equipes de Nossa Senhora, primeiro aos seus mem­bros, e à Igreja em seguida, ao empreenderem este trabalho esboçado. Para o realizar, temos agora esta luz incompará­vel, que é o discurso de Paulo VI.

Não desanimeis antecipadamente: a ascese cristã não é triste nem opressiva, é uma abertura ao wpro do Espírito; prepara-nos para o Pentecostes, esse Pentecostes que cada cris­tão é convidado a conhecer pessoalmente . A esta orientação de ascese juntarei a nossa intenção de, para o futuro, dar uma importância maior ao compromisso e à renovação anual do compromisso nas Equipes. Comprometer-se num Movimento, aceitar um quadro, submeter-se a uma disciplina, observar uma regra, é uma ascese, um meio de se precaver contra a incons­tância, contrariar o nosso gosto da independência, que muitâs vezes não é mais do que uma forma de orgulho e presunção, reagir contra uma tendência para o individualismo espiritual, desinteressar-se dos outros no caminho da santidade. Mas é bem claro que, para ter o seu pleno sentido, esta ascese deve ser conscientemente escolhida e lealmente levada por diante. :1!: por isso que, para o futuro, ao fazer o compromisso e ao renová-lo, deverá especificar-se que se está bem de acordo com a natureza das Equipes de Nossa Senhora, as suas orientações e a sua pedagogia . Assim como me parece essencial que nun­ca se desencoragem os casais que, cheios de boa vontade, têm dificuldades em cumprir as obrigações de nossos Estatutos, também me parece ilógico e perigo~o que entrem ou permane­çam no Movimento aqueles que não concordem com os fins ou os meios, ou mesmo que, estando de acordo, não tenham von­tade de "fazer jogo franco".

A prática do compromisso e da sua renovação anual con­tribuiu largamente para a força e desenvolvimento do nosso Movimento. Mas, nestes últimos anos muitos membros das equipes têm aaap ' ~mpressão de não âvallarem bem tóda á.

-24-

sua importância. É preciso, reabilitá-lo. E o nooso Movi­mento será jovem, animado, inventiva, criador, obreiro de uni­dade na Igreja, visto ele próprio realizar a unidade dos seus membros

ESCUTAR A PALAVRA DE DEUS

O escutar a palavra de Deus é a segunda otientação geral que voz proponho. - A ascese, no sentido do caminho para a santidade, exige uma ativa e perseverante busca de Deus, especialmente através do estudo das Escrituras. Ora esta lei­tura ocupa um lugar demasiado fraco na vida pessoal dos es­posos, na vida do lar, na vida de equipe. Doravante será ne­cessário lançarmo-nos nela mais decididamente. Veremos então os milagres que a Palavra de Deus opera, pois ela é criadora: faze viver aqueles que se abrem à sua virtude, faz surgir a alegria no lar.

Pareceu-nos que se tantos casais, se tantos cristãos des­cuidam o estudo e a meditação da Palavra de Deus é por não serem ajudados a descobri-la. Não faltam livros e revistas, é certo, mas nada substitui a procura em comum. Razão por­que, de futuro, além dos temas sobre espiritualidade conju· gal, que se irão basear no discurso de Paulo VI, todos os ou­tros serão centrados na Palavra de Deus. fundamento de toda a vida espiritual. E estou convencido de que as nossas reu­niões de equipe conhecerão aquele fervor que reina sempre nos criStãos reunidos para meditar as Escrituras.

ORAÇAO MENTAL

A oração mental é a terceira orientação. - Para encon­trar Deus não basta escutá-lo, é preciso responder-lhe, abrin­do e entregando à sua Palavra o mais íntimo do nosso ser. Isto exige aquela oração a que damos o nome de "oração mental". Onde falta a oração tudo definha, onde existe a oração tudo renasce, tudo amadurece. Temos de reconhecer que, se na reunião de equipe a oração ocupa um lugar de

-25-

honra, o mesmo não acontece na vida pessoal da maior parte dos esposos. Longe disso! Ora, seria vão pretender tornar-se testemunha de Deus vivo, sem se estar decidido a rezar. Só se pode testemunhar o que se conhece. Só os seres que rezam - quer sejam sábios ou sem grande cultura - não decepcio­·nam quando falam de Deus. E só aquele que reza pode de vez em quando dizer, como Job ao dirigir-se a Deus: "Até agora conhecia-Te por ouvi dizer; agora os meus olhos viram-Te' (Jb. 42, 5) o

Doravante, será pedido a todos os membros do Movimento que, a partir do compromisso, consagrem diariamente à ora­ção mental o modesto mínimo de dez minutos. Simultânea­mente, a todos os escalões, far-se-á um grande esforço de ini­ciação na oração, para que ela se torne no que é já para muitos de vós, um encontro quotidiano com o Senhor. As Equipes, Movimento de Espiritualidade, serão lógicamente um Movi­mento de Oração.

• "Inquieto e febril, o nosso mundo oscila entre o medo e a

esperança, e grande número de jovens abordam, hesitantes, o caminho que se abre perante eles. Que isto seja para vós es­timulo e apelo. Com a força de Cristo podeis e, portanto, de­veis realizar grandes coisas. Meditai a Sua Palavra, recebei a sua graça na oração e nos sacramentos da penitência e da eucaristia, confortai-vos uns aos outros, testemunhando com simplicidade e discrição a vossa alegria. Um homem e uma mulher que se amam, um sorriso de criança, a paz de um lar; pregação sem palavras mas tão extraordinariamente persuasi­va, onde qualquer homem pode já pressentir, como por trans­parência, o reflexo de um outro amor e o seu apelo infinito".

PAULO VI

-26-

RENUNCIAR AS COISAS DE MENOS IMPORTÂNCIA

O Pe. Caflarel, na sua conferência aos peregrinos de Roma, que acabamos de citar, convida os membros das Equipes a darem lugar na sua vida à ascese. Esta pas­sagem de GUARDINI dá-nos orieniações muito concretas sobre este assunto.

"Se um homem quiser tirar da vida - que dura tão pou­cos anos, pois passa tão depreEsa - o que ela tem de mais precioso para dar, tem de saber que só o consegue se renun­ciar às coisas menores para obter as maiores ...

O homem não é impelido para Deus pela violência. Se não fizer a sua própria educação neste sentido, se não come­guir à noite e de manhã, tempo para rezar, se não considerar a solenidade do dia do Senhor como circunstância importan­te, se não tiver, junto de si, o livro que mostra "A Largura e o 'Comprimento, a Altura e a Profundidade" das coisas de Deus (Ef . 3, 18) , para este homem a vida desenrola-se cons­tantemente sem que dê conta das ligeiras exortações que vêm do seu íntimo. Quando tem de estar perto de Deus, aborre­ce-se porque tudo lhe parece vazio. As conferências, o jornal, o rádio ensinam-lhe que os valores e as relações religiosas já não existem para o homem moderno e ele não só se sente jus­tificado, mas dentro do progresso universal. . . Para se sentir

-27-

em sua casa quando junto de Deus, de forma a apreciar estar numa relação com ele, no sentimento de uma presença reali­zável, é necessário de novo "exercitar-se", como para qualquer assunto sério . lt preciso querer fazê-lo dominando-se sem cessar: então a santa proximidade dá-se sob a forma de graça.

'Nós deveríamos aprender a considerar a ascese como um elemento de qualquer vida vivida com retidão. Faríamos bem em nos treinar a pôr barreiras aos nossos impulsos para con­servar a justa medida, a abandonar tudo o que tem menos im­portância, embora seja atraente, em favor do que importa mais e de tomarmos o pulso a nós próprios para nos libertarmos espiritualmente.

Poder-se-ia, por exemplo,. . . antes de circular na cidade, decidir não se deixar absorver pelos cartazes ou pelos tran­seuntes, mas conservar o espírito num bom pensamento ou numa liberdade tranquila - ou poder-se-ia fechar o rádio, para que o silêncio reine no quarto - ou ficar uma noite em casa em vez de sair- ou então dizer, por vezes, "não" quando se come, bebe ou fuma - ou adotar outras atitudes semelhan­tes. Desde que nos tenhamos tornado atentos a :isso, encon­traremos, sem cessar, ocasião para um "exercício" que seja libertador: suportar a dor em vez de a reduzir Jogo com re­médios, aceitar interio;:mente uma privação que por qualquer motivo seria boa, mostrar uma amabilidade serena a certa pessoa antipática ...

Estas e outras atitudes semelhantes nada têm de subli­me. Não se trata de jejuns rigorosos, ou de vigUias, ou de duras penitências, mas de exercícios numa vida bem conduzida, dessa verdade que a nossa vida é diferente da de um animal. lt a vida humana na qual os impulsos internos são delimitados pelo espírito numa magnífica liberdade, que é também peri­gosa. Este espírito dá-lhe todo o seu dinamismo e deve tam­bém exercer o poder ordenador através do qual a vida não é destruída mas conduzida à plenitude.

ROMANO GUARDINI

-28-

A GERAÇÃO NOVA INTERPELA-NOS

"Por favor, ouçam também a interpelação da nova ge­ração. Que não se perca na indiferença, depois de um momento de emoção, o trágico apelo desse estudante que há algumas semanas se suicidava pelo fogo perante os seus colegas. Depois da sua morte podia-se ler, no seu caderno, esta confissão dolorosa: "Deus. . . é difícil acre­ditar nele .. . " . Seria preciso que, graças às vossas fa­mílias onde irradia a presença do "Deus bem-aventura­do", do Deus Amor, já não fosse tão difícil acreditar nele.'

O Padre Caffarel terminava assim a sua conferência em Roma, em maio de 70. Pouco antes tinha recebido uma car­ta de um casal, citada a seguir bem como o comentário que ele próprio fez sobre ela, na Carta das Equipes de Março de 1970:

"... O jantar assemelhava-se a muitos outros: mutismo de G. . . (rapaz de 18 anos), boa disposição de L. . . (moça de 19 anos); quanto ao mais velho, H . .. (21 anos), conver­sava com o pai, sem convicção, sobre a situação econômica. Não sei que imponderável me fazia pressentir que este jan­tar seria diferente dos outros.

-29-

"De fato, já passava muito da meia-noite quando nos separámos, depois de uma conversa alternadamente tensa, do­lorosa, apaixonada, grave, mas onde não houve violência ver­bal. Todos acharam natural a proposta de G. . . para ter­minarmos com um Pai-Nosso este serão que ficará na me­mória de todos como um dos momentos mais marcantes da nossa vida familiar .

"0 assunto - ou mais exatamente o ponto de partida -desta conversa· foi o suicídio de dois estudantes do liceu de Lille que, com quatro dias de intervalo, depois de terem re­gado com gasolina as roupas, lhes lançaram fogo, ardendo à vista dos Eeus camaradas. No caderno de um deles, que os jornais diziam ser cristão militante, o motivo do seu ge.;t.o: "Ofereço a minha vida p::tra resgatar os erros cometidos no Biafra". O outro explicava-se numa carta : "Não podia adap­tar-me a este mundo . .. " e, mais adiante, escrevia estas pa­lavras desconcertantes: "Deus, é difícil acreditar n'E!e .. . ".

"Estávamos longe de pensar que estes dois suicídios que, confesso com vergonha, tinha lido no jornal quREe como se fossem um acontecimento banal, tivessem tido tanta reper­cussão na alma dos nossos filhos. As suas reações foram vi­vas, variadas, incertas, contraditórias. Duas, no entanto, so­bressaíam: uma admiração (não digo aprovação) pelos dois es­tudantes e uma adesão em profundidade à frase "Não podia adaptar-se a este mundo ... ".

Falámos muito, meu marido e eu antes de adormecermos. Nunca tínhamos sentido como nessa noite a nossa responsabi­lidade de adultos para com todos os jovens, cristãos ou não, que não se podem habituar ao mundo que lhes oferecemos ... ".

Depois de ter recebido esta carta, soube que em muitas outras casas este terrível acontecimento foi assunto de con­versas familiares - por vezes violentas.

Adivinho sem dificuldade que, entre vocês, vários pais e mães sentiram um arrepio ao lerem este gesto desesperado. Quantos pais poderão dizer que esta tentação não ameaça os nossos filhos? Depois dos acidentes de estrada, dizem que

-30-

é o suicídio o responsável por maior número de mortes de jovens entre os 15 e os 25 - e quantos suicídios falhados? Foi por intermédio de pais das Equipes - porque não hei-de dizê-lo - que aprendi o terrível significado da lacônica e pudica "morte acidental" que acompanha a participação da morte de um filho ou de uma filha.

"Nada mais se podia fazer do que rezar. Insuficiente mas necessário". Assim termina o artigo duma das nossas jornalistas mais em voga, num jornal semanal muito pou­co ... "católico".

Os rapazes de 17-18 anos ac..ham que há certos gestos que se impõem e que devem ser públicos. Por que é que os pais não hão de também proclamar, através de um ato público, que recusam a barbaria da nqssa civilização, o massacre dos inocentes no seu corpo e na sua alma (pensam principalmen­te na maré de erotismo), que querem trabalhar na transfor­mação da sociedade não apenas através de discursos? Ah, sei bem, que se sentem terrivelmente impotentes perante as montanhas que é necessário levantar - mais uma razão pa­ra pedir a Deus que intervenha "com mão forte e braço es­tendido''.

Não se pode aceitar que para os jovens só haja duas saí­das: o desespero ou o emburguesamento!

HENRI CAFFAREL

- 31-

ORAÇÃO PARA A PRóXIMA REUNIÃO

TEXTO DE MEDITA'ÇÃO (Mateus 20, 1-7}

Naquele tempo Jesus contou à multidão e3ta parábola:

"O Reino dos Céus é semelhante a um proprietário que saiu de manhã cedo a contratar trabalhadores para a sua vinha. E, tendo ajustado com os trabalhadores a um dinheiro por dia, mandou-os para a sua vinha. Saindo depois, cerca da tercei­ra hora, viu outros que estavam na p:aaça ociosos e disse-lhes: "Ide também vós para a minha vinha e dar-vos-ei o que for justo". E eles foram. Tornando a sair cerca da hora sexta e da nona, fez o mesmo. Enfim, cerca da undecima hora, saindo encontrou lá outros parados e disse-lhes:

"Por que estais aqui todo o dia sem fazer nada?" Res­ponderam-lhe:

"Porque ninguém nos contratou". Disse-lhes : "Ide tam­bém vós para a minha vinha".

Deus chama-nos, ao longo dos séculos, para colaborarmos na Sua obra. A aceitação desta vocaçio é a verdadeira ofe­renda que podemos fazer a Deus, através da graça de Cristo e à Sua Imagem, conforme está escrito na Epístola aos De­breus (Heb. 10, 5-7), segundo o Salmo 40:

-32-

Não quiseste sacrifício nem oblação, mas preparaste-me um corpo.

Não te agradam holocaustos nem sacrifícios pelos pecados.

Então disse Eu: "Eis que venho - está escrito de Mim no volume do livro - para fazer, ó Deus, a Tua vontade.

ORAÇÃO LITúRGICA (Salmo 40)

Com Cristo, que faz até ao fim a vontade do Pai, e que dá. testemunho aos homens do amor infinito de Deus, dize­mos:

ANTíFONA (para utilizar como refrão):

Eis-me aqui, Senhor, para fazer a Tua vontade.

Senhor, Deus meu, tens feito obras maravilhosas, e não há quem te seja semelhante nos Teus desígnios para CO!'lOECO.

Eu quereria narrá-los e proclamá-los, mas são demasia­damente numerosos para que se possam contar.

Não quiseste sacrifício nem oferenda, mas abriste-me os ouvidos. Não pediste holocausto e vítima pelo pecado. En­tão eu disse: Eis que venho.

No rolo do livro está escrito de mim: Em fazer a tua vontade, ó meu Deus, me deleito, e a tua lei está no íntimo do meu coração.

Anunciei a Tua justiça na grande assembléia ; não conti­ve os meus lábios. Senhor, Tu o sabes.

Não escondi a tua justiça no meu coração; publiquei a Tua fidelidade e o Teu socorro.

Não ocultei a Tua graça e a Tua fidelidade à grande assembléia.

Tu, Senhor, não afastes de mim as tuas misericórdias; a Tua graça e a Tua fidelidade sempre me amparam.

Glória ao Pai, ao Filho, ao Espírito Santo, agora e sem­pre, ao Deus que é, que era e que vem, j:.elos séculos dos séculos!

EQUIPES NOTRE DAME 49 Rue de la Glaciêre

Paris XIII

EQUIPES DE NOSSA SENHORA 04530 - Rua Dr. Renato Paes de Barros, 33 - Tel. : 80-48~

- São Paulo, SP -