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De Espanhola Até Lutero O PROTESTANTISMO NO SÉCULO XVI NA AMÉRICA LATINA, CARIBE E EUROPA AUTORES Dr. Cornélio (Neal) Hegeman Dr. Derk Oostendorp Dr. Sidney Rooy UM CURSO DO Seminário Internacional de Miami Miami International Seminary (MINTS) 2001

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De Espanhola Até Lutero

O PROTESTANTISMO

NO SÉCULO XVI

NA AMÉRICA LATINA,

CARIBE E EUROPA

AUTORES

Dr. Cornélio (Neal) HegemanDr. Derk Oostendorp

Dr. Sidney Rooy

UM CURSO DO

Seminário Internacional de MiamiMiami International Seminary (MINTS)

2001

CURSO A DISTÂNCIA

DE ESPANHOLA A LUTERO

INTRODUÇÃOBem-vindo ao mundo do século 16! Você escolheu estudar esta época

importantíssima por meio de nosso programa de extensão. Para estudar é necessário ter as seguintes ferramentas:

1. O Livro de Justo González, História do Cristianismo, Volume 2 (Miami: Unilit, 1994), Custo US $24.

2. O Caderno de Trabalho, De Espanhola Até Lutero (MINTS, Miami, 2001). Custo: US $7.

2. RESPONSABILIDADES DO ESTUDANTE

1. Ler os 07 capítulos de De Espanhola Até Lutero e responder as perguntas em seu caderno pessoal. As respostas estão no Apêndice. Use as respostas para autocorrigir as suas respostas (10 pontos).

Lição 1, Introdução Lição 2, Capítulo 1 Lição 3, Capítulo 2 Lição 4, Capítulo 3 Lição 5, Capítulo 4 Lição 6, Capítulo 5 Lição 7, Capítulo 6 Lição 8, Capítulo 7

2. Dirigir ou ser facilitado em, pelo menos, uma classe onde serão revisadas as leituras e as perguntas e respostas de um capítulo de Da Revolução... (10 pontos)

3. Ler os primeiros 28 capítulos do livro História do Cristianismo (páginas 21-254). Para cada capítulo formule uma pergunta e a resposta correspondente para mostrar seu domínio da informação. (10 pontos)

Lição 1. Comece a ler o capítulo 1. Pg. 21-32 Lição 2. Exposições sobre os capítulos 2-4 Lição 3. Exposições sobre os capítulos 5-6 Lição 4. Exposições sobre os capítulos 7-11 Lição 5. Exposições sobre os capítulos 12-14 Lição 6. Exposições sobre os capítulos 15-17 Lição 7. Exposições sobre os capítulos 18-22 Lição 8. Exposições sobre os capítulos 23-28

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4. Apresentar uma pergunta e resposta para, pelo menos, um capítulo de História... (10 pontos)

5. Escrever um trabalho de 10 páginas sobre um tema do curso. Veja no apêndice o formato para escrever um trabalho (20 pontos)

6. Fazer o exame final. (Faça-o sem livros e sem apoio externo, sob a supervisão de uma pessoa designada pelo estudante e aprovada pelo professor.) (20 pontos)

7. Freqüência (um ponto para cada hora) e participação (20 pontos).

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ESTRUTURA DO CURSO1. Normalmente, há 08 aulas de 2 horas cada uma formando um total de 16

horas.- A primeira hora é dedicada à revisão dos capítulos do livro Da... Lutero.- A segunda hora é dedicada à revisão do livro História… Cristianismo.

2. O professor ou facilitador da classe designará aos estudantes o seguinte:- Cada estudante será responsável por dirigir uma aula onde serão revisadas as leituras e perguntas do livro De… Lutero.- Cada estudante exporá na classe um capítulo do livro História… Cristianismo.

3. Um exame será aplicado.4. As tarefas devem ser entregues antes de fazer o exame final.

CUSTO DO CURSO

1. Ouvinte: US $ 50 (Cinqüenta dólares americanos)2. Licenciatura: US $ 300 3. Mestrado: US $ 450

Programa de bolsas de estudo: 1) O estudante pagará 1% do valor anual (veja a folha de inscrição para bolsas de estudo) e 2) Os casais estudam pelo mesmo custo.

AUTORES

Dr. Cornélio Hegeman. Professor e Deão Acadêmico de Miami International Seminary (MINTS). Recebeu seu Doutorado em Ministério (D.Min) do Westminster Theological Seminary em 1985. Continuou com os estudos de pós-graduação na Universidade de Utrecht, Holanda, 1986-2000. Reside em Miami, Flórida.

Dr. Derk Oostendorp. Diretor para América Latina de Missão Mundial da Igreja Cristã Reformada. Obteve seu PhD em Novo Testamento da Vrije Universiteit de Amsterdã, Holanda. Vive em Grand Rapids, Michigan.

Dr. Sidney Rooy. Missionário jubilado da Missão Mundial da Igreja Cristã Reformada e serviu como missionário na Argentina por muitos anos. Sidney recebeu seu PhD da Vrije Universiteit de Amsterdã, Holanda. Reside em San José, Costa Rica.

Dr. Justo González. Nascido em Cuba e educado em Yale University. Professor emérito do Seminário Evangélico em Porto Rico e Emory em Atlanta. Considerado o melhor historiador protestante de língua hispânica.

Equipe editorial. Elena Wybinga, da Universidade Nacional Evangélica em Santo Domingo e Angélica de Ramsay, de MINTS, Miami, Florida.

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PREFÁCIO

Em 1992 publicamos um texto para a Universidade Nacional Evangélica (UNEV) de Santo Domingo chamado, De Lutero Até a República Dominicana. Temos mudado o foco de nosso estudo do protestantismo do século XVI. Agora, vamos ver o protestantismo da perspectiva do descobrimento do novo mundo. Portanto, o título tem mudado para, De Espanhola Até Lutero. Há várias razões para oferecer esta perspectiva. A primeira é a histórica. O descobrimento do novo mundo em 1492 ocorreu mais de 25 anos antes do início da Reforma e os esforços ibéricos foram divididos entre o conflito marítimo no novo mundo e a manutenção do poder no norte da Europa. Os príncipes da Alemanha puderam resistir à Espanha até que a Reforma foi estabelecida. A Espanha não pôde conter os príncipes da Europa do norte e os piratas no novo mundo de uma só vez. A segunda razão para falar sobre a Reforma da perspectiva do novo mundo é sociológica. Os protestantes na América Latina e Caribe (ALC) fizeram parte dos grupos marginalizados nas sociedades hispânicas. Nas sociedades hispânicas os protestantes tinham um status de minoria oprimida assim como a população indígena e africana. Os protestantes na ALC foram perseguidos assim como os huguenotes da França, os reformados na Holanda e os índios e africanos nas Américas. A terceira razão para ver a Reforma da perspectiva da ALC é missiológica e evangelística. A tarefa de evangelizar a todas as pessoas e a todos os grupos étnicos nas Américas com o evangelho bíblico foi retardado pela ICR. A Reforma era necessária, não somente pela decadência do papado na Europa, mas também para a re-evangelização da ALC. Por último, há razões teológicas para analisar a Reforma da perspectiva da ALC. A América Latina e o Caribe chegaram a ser um campo de experimentação para as igrejas protestantes. Durante o século XVI a experiência não terminou bem. É preciso determinar o que aconteceu e o que podemos aprender desta história (1).

1. Veja Justo González, História do Cristianismo, Volume 2, pg. 21-22. González examina a reforma protestante segundo a reforma católica na Espanha. A era dos reformadores (Parte I) é unida com a era dos conquistadores (Parte II) e basicamente é um tratamento do protestantismo no século XVI.

Pergunta para a classe: Segundo o prefácio, quais razões há para falar da Reforma desde o tempo de Colombo?

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DE ESPANHOLA ATÉ LUTERO:O PROTESTANTISMO NO SÉCULO XVI NA AMÉRICA LATINA, CARIBE E EUROPA

3. ÍNDICE

CAPÍTULO 1: OS PROTESTOS DENTRO DA IGREJA CATÓLICA ROMANA NAS AMÉRICAS DURANTE O SÉCULO XVI – Cornélio Hegeman

CAPÍTULO 2: ORIGENS DO PROTESTANTISMO LATINO-AMERICANO NO SÉCULO XVI – Cornélio Hegeman

CAPÍTULO 3: MOTIVAÇÃO DA MISSÃO REFORMADA DE COLIGNY, BRASIL – Cornélio Hegeman

CAPÍTULO 4: MARTINHO LUTERO COMEÇA A REFORMA NA EUROPA – Derk Oostendorp

CAPÍTULO 5: JOÃO CALVINO ORGANIZA A REFORMA – Derk Oostendorp

CAPÍTULO 6: A REFORMA RADICAL – Derk Oostendorp

CAPÍTULO 7: RELAÇÕES DA IGREJA COM O PODER POLÍTICO: MODELO REFORMADO – Sidney Rooy

A CONFISSÃO DE AUGSBURG

CONFISSÃO BELGA

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PLANO DE ESTUDO PARA A LIÇÃO 1

1. Comece a aula com uma oração.2. Leia e explique o seguinte:

Introdução Responsabilidades do estudante O que o professor espera do estudante Custo do curso Autores Prefácio Índice

4. Responda a pergunta sobre o prefácio e escreva a resposta em seu caderno pessoal.

5. Se o tempo permitir, comece a ler no livro de Justo González, História do Cristianismo, começando com o capítulo 1. Relembre ao estudante que eles devem formular uma pergunta e resposta apropriada para cada capítulo. Mostre ao estudante quantos capítulos eles devem ler (são 28 ao todo). Recomendamos que antes da próxima aula os capítulos 1 a 4 sejam lidos. Avise aos estudantes que cada um fará uma apresentação oral de 10 minutos sobre um capítulo do livro História... Cristianismo.

6. Prepare o estudante para a lição 2. A tarefa é ler o capítulo 1 de Da Expansão Espanhola… Para a segunda aula o facilitador designará um estudante para que ele (ou ela) revise as leituras e perguntas e respostas do capítulo com a classe para a próxima lição.

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CAPÍTULO 1

OS PROTESTOS DENTRO DA IGREJA CATÓLICA ROMANA NAS AMÉRICAS DURANTE O SÉCULO XVI

Cornélio (Neal) Hegeman

INTRODUÇÃO

Antes do nascimento e formação das igrejas evangélicas como as igrejas Batista, Metodista, Congregacional, Nazarena, Aliança Cristã e Missionária, e Pentecostal, as igrejas protestantes nasceram na Europa e nas Américas no século XVI. As igrejas protestantes européias são identificadas por sua postura anti Igreja Católica Romana (ICR).

A ICR estava ligada às nações principais do sul da Europa. A Espanha chegou a ser a defensora principal da ICR. Várias nações da Europa do norte começaram a rebelar-se contra a Espanha, incluindo a Alemanha, Inglaterra e Holanda. A rebelião contra a Espanha era não somente contra os reis espanhóis, mas também contra a ICR.

Além dos protestos contra a ICR do século XVI se deve reconhecer a importância do descobrimento do novo mundo pelos esforços ibéricos. Inclusive, a história demonstra que a razão pela qual os protestantes tiveram êxito no norte da Europa é porque os esforços ibéricos estavam preocupados com a conquista do novo mundo e não puderam empregar todos os seus esforços para o controle do norte da Europa.

Estudar o fenômeno do protestantismo do ponto de vista do descobrimento do novo mundo requer uma monumental mudança de paradigma. É não somente “dar razão a Lutero”, mas sim a Colombo também.

Tradicionalmente, a história do protestantismo tem sido escrita da perspectiva da Europa. Porém, há outras perspectivas que podem ser consideradas. Uma delas é uma perspectiva contracultural. Durante a conquista ibérica, os movimentos contraculturais são dos indígenas, escravos e protestantes. Veremos que os protestantes tinham muito em comum com os demais grupos marginalizados.

Sem dúvida, os protestantes não aproveitaram sua identificação com os grupos marginalizados para evangelizá-los. Ao contrário, dada a oportunidade, os cristãos protestantes praticaram mais a exploração do que a libertação dos povos marginalizados até o século XIX.

É interessante que houve muito protesto no novo mundo durante o século XVI, não somente pelos protestantes reconhecidos, mas também havia protestos dentro da ICR. Estas páginas examinarão de uma maneira crítica os ideais e as práticas de tais cristãos e igrejas manifestadas em sua origem e desenvolvimento nas Américas durante o século XVI. Observamos que a ICR teve que ser reformada (capítulo 1). Veremos que por causa da imposição da Inquisição da ICR, a formação da igreja protestante era inevitável, não somente na Europa, mas também no Caribe e América Latina (ACL). Sem dúvida, em uma das ironias religiosas mais significativas para o Caribe e América Latina, as igrejas protestantes transplantadas da Europa, no geral, não trouxeram o evangelho aos grupos marginalizados, antes o conservavam para si mesmos (capítulo 2). Por

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último, a teologia reformada não foi praticada entre os povos hispânicos e marginalizados na ALC até o século XIX (capítulo 3).

Pergunta para a classe: Segundo o autor, por que era inevitável a formação da igreja protestante no Caribe e América Latina?

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OS PROTESTANTES

O protestantismo europeu, associado com Martinho Lutero e "os luteranos" na Alemanha (1517, 1530: Confissão de Augsburg), os huguenotes reformados na França (1520), os reformados na Suíça (1520), os anglicanos na Inglaterra (1530), os presbiterianos na Escócia (1560) e os reformados holandeses (1560) constituíram a reforma eclesiástica que originalmente se separou da Igreja Católica Romana (ICR).

Todos os movimentos protestantes reagiram contra do absolutismo da tradição e poder da Igreja Católica Romana. A “sola Escritura” e não a interpretação papal foi declarada pelos protestantes como a norma máxima para a consciência, a igreja e a sociedade. A Bíblia foi traduzida aos idiomas do povo e o estudo bíblico floresceu. A Reina Valera, a Bíblia dos protestantes de língua espanhola, estava entre as primeiras traduções que foram preparadas.

O evangelho segundo a reforma do século XVI foi definido em termos teológicos de somente a graça, somente a fé, somente Cristo e somente para a glória de Deus. O protestante considerava que o cristão se salvava unicamente pela glória e graça de Deus recebida somente por crer em Cristo. A contra-reforma expressa pelo Concílio de Trento (1545-1563), declarou a crença “somente fé” como anátema, maldita para sempre. A declaração dos mais de 60 anátemas do concílio de Trento formou a base para que a ICR impusesse a Inquisição para deter a influência dos líderes protestantes.

Para os protestantes, o ministério não estava reservado unicamente ao clero. Os leigos e todo o povo de Deus são considerados como sacerdotes (sacerdócio de todos os crentes), profetas e servos de Cristo. Assim, os protestantes não necessitavam da presença de "religiosos" ou a benção da hierarquia para fazer missões. Os “piratas” ou os mercenários protestantes eram, supostamente, emissários cristãos e embaixadores de Cristo, tanto como os pastores.

As primeiras tentativas de religiosos não-católicos de se estabelecer na América Latina e Caribe (ALC) foram em 1528. Havia atividade dos huguenotes no Caribe (Cuba) e os “luteranos” em Espanhola e Venezuela. O protestantismo do século XVI não ficou na América Latina e Caribe por várias razões. Entre elas, o protestantismo se associou com o mercantilismo europeu de tal maneira que as atividades sócio-culturais, tais como a dedicação à pirataria e, sobretudo, a participação no tráfico de escravos, eram contraproducentes para a evangelização. As poucas tentativas de colonizar entre os espanhóis e portugueses foram frustradas, não somente pela oposição ibérica, mas também por conflitos internos tais como em Coligny, Brasil, em meados do século XVI.

O protestantismo não conseguiu permanecer dentro das colônias ibero-americanas do novo mundo até o século XIX. Houve protestos dentro da ICR, que em poucos anos foram silenciados. O protestantismo europeu foi estabelecido no século XVII nas ilhas e colônias holandesas, inglesas e francesas.

A ICR e as igrejas protestantes européias do século XVI, no geral, foram utilizadas pelo imperialismo e mercantilismo europeu para autojustificar a conquista e a colonização. Chegaram a ser participantes na escravidão dos índios e africanos. Ambas as igrejas usaram a espada do estado, não somente para a legítima autoproteção, mas a espada também foi usada violentamente sob as pretensões de evangelizar e cristianizar aos demais. Há exceções documentadas, tais como são vistas nos escritos e serviços de

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Ramón Pané na Espanha, Pedro Claver na Colômbia, Titus Funk na Argentina e Juan de Zumárraga no México, porém, as exceções não chegaram a ser a norma.

Do ponto de vista das caravelas dos protestantes, vemos no século XVI os esforços de estabelecer “uma, santa, igreja católica” e os protestos de muitos acerca de como se realizou a “primeira evangelização” das Américas. Além disso, quando os “piratas protestantes” desceram de suas caravelas, estabeleceram uma sociedade à imagem e tradição de suas atividades piratas. Isso incluiu o tráfico de escravos africanos. Os povos necessitados não foram evangelizados, mas sim explorados.Pergunta para a classe: Qual é o nome do grupo de reformados provenientes da França durante o século XVI?

OS PROTESTOS DENTRO DA IGREJA CATÓLICA ROMANA

A uniformidade sócio-religiosa das colônias ibero-americanas era tão forte que os protestantes não puderam se estabelecer dentro das colônias até o século XIX. Apesar de os “piratas protestantes” permanecerem à margem das colônias, muitos protestos católicos foram realizados dentro das colônias durante o século XVI. Houve protestos sobre como a igreja evangelizou os índios, como era a condição espiritual da igreja e a integridade da vida dos cristãos. As alternativas apresentadas ao status quo da igreja tradicional e ao cristianismo nominal foram evidentes na literatura, nos protestos sociais e nos experimentos comunitários, tais como nas reduções dos jesuítas. Os “luteranos” não foram os únicos que protestaram contra a decadência da igreja e dos cristãos, houve várias expressões de protesto dentro da ICR nas Américas durante os séculos XVI e XVII.

O PROTESTO SOBRE O MÉTODO DE EVANGELIZAR AOS ÍNDIOS

Os historiadores têm produzido mais de 500 livros sobre o descobridor europeu das Américas, Cristovão Colombo (1451-1506). Algumas biografias mencionam as motivações religiosas de Colombo (1). Muita literatura tem criticado o papel de Colombo na primeira evangelização católica nas Américas enquanto que outras o apóiam. (2)

A literatura de protesto, contradizendo as motivações de Colombo como evangelista e apologista católico, está crescendo. Por ocasião do quinto centenário do descobrimento da América por Colombo, houve muita reflexão. O interessante é que vários autores católicos, tais como Enrique Dussel e Frank Moya Pons, eram muito críticos do papel da igreja quanto à conquista e a primeira evangelização. Ao contrário, autores protestantes, tais como Alfonso Lockward e Kay Brigham, trataram Colombo como um defensor do cristianismo.

Colombo não sabia que ia encontrar uma raça nova, os índios. Por tanto não tinha um plano de evangelização. Colombo não viajou com religiosos em sua primeira viagem.

O historiador e sociólogo dominicano, Hugo Tolentino Dipp, expressa dúvida sobre as intenções de Colombo em 1492 de evangelizar aos índios.

Querem que aceitemos a idéia de que iam descobrir novos mundos para cristianizá-los, e isso é uma falsidade. Portugal não fez isso, nem a Itália, nem os

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espanhóis na América. Na primeira viagem do Almirante não veio nem um só sacerdote, porque era uma viagem de negócios (3).

Durante a segunda viagem (1493) Bernardo Boyl e 12 religiosos chegaram com Colombo. Román Pané começou a trabalhar com os taínos. Foi o primeiro a aprender a língua taína e o primeiro europeu que tratou de cristianizar aos índios usando a língua indígena.

Os que insistem que a evangelização das Américas começou com Colombo em 1492 estão falando de uma evangelização na qual houve pouca comunicação verbal sobre Deus ou Jesus com os indígenas. A comunicação era impossível porque nenhum espanhol durante a primeira viagem falava o taíno ou algo semelhante. Seria mais correto dizer, como o autor católico, José Luis Sáez, em Os Primeiros Cinco Séculos, que a evangelização católica começou com Román Pané por volta do ano 1498.

A evangelização dos indígenas na Espanha foi de curta duração. Já o genocídio dos índios estava quase completando 50 anos depois do início da conquista. Ainda que ninguém possa culpar só a igreja pelo genocídio, sem dúvida, o silêncio da igreja pode ser interpretado como sendo cúmplice do genocídio. Os indígenas na Espanha receberam o mesmo tratamento que os protestantes. Não submeter-se à ICR era uma sentença de morte.

Pergunta para a classe: Qual é a posição de Hugo Tolentino Dipp quanto às intenções de Cristovão Colombo para evangelizar aos índios?

Pergunta para a classe: Quem foi o primeiro obreiro religioso a trabalhar com os taínos?

O PROTESTO CONTRA O USO DA VIOLÊNCIA PARA EVANGELIZAÇÃO

Autor López Rodríguez identifica a primeira evangelização com a chegada de Colombo. Porém, querem distanciar a evangelização da igreja das brutalidades da conquista. Rodríguez teria razão se de verdade a igreja tivesse levado a sério a profecia de Antón Montesino.

Estes não são homens? Não têm almas racionais? Não sois obrigados a amá-los como a vós mesmos? Estes não entendem? Estes não sentem? Como estais dormentes em tanta profundidade de sonho letárgico? Tendes por certo que no estado em que estais não podeis sobreviver mais do que os Mouros ou Turcos que carecem e não querem a fé em Jesus Cristo (4).

O historiador católico e dominicano, Frank Moya Pons, em referência à associação da evangelização católica com o genocídio total dos índios na Espanha, protesta:

Por que se celebram e se glorificam hoje aos que cometeram aqueles crimes? Por

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que se critica e se ameaça hoje aos que recordam e ressaltam esta história? Por que alguns preferem honrar e abençoar hoje a Cristovão Colombo, Nicolas de Ovando e os conquistadores?

E foi perguntado se os mais de 400 mil índios assassinados “não eram seres humanos? Era por que não tinham almas? Era porque não eram também filhos de Deus? Por que cometeram e se justificam hoje aquelas matanças e aquela exploração como se fosse à obra abstrata de uma época e não de cristãos maus?" (5).

Para chegar a uma reflexão realista é importante balancear as intenções expressas pela igreja e os conquistadores com suas ações e os resultados destas. No caso da evangelização dos índios na Espanha, os resultados foram horrorosos. O genocídio total dos índios, a morte de mais de 400.000 índios foi o resultado de menos de 50 anos de “evangelização” dos índios.

A justificação das autoridades eclesiásticas romanas continua até hoje em dia. Quando em sua visita à ilha de Cuba em 1997, perguntarem ao Papa João Paulo II sobre a responsabilidade da igreja católica na matança dos índios. O Papa culpou aos espanhóis e não a igreja. Se fosse assim, por que a igreja não disciplinou e excomungou aos culpados?

Quanto aos abusos contra os índios, alguns católicos tentaram exercer a disciplina. Segundo José Luis Sáez, depois do sermão de Antón Montesino (1511):

Os dominicanos haviam se negado a dar a absolvição aos fiéis comendadores, se antes não dessem a liberdade aos índios que tinham a seu serviço (6).

Pergunta para a classe: O que aconteceu com os índios na Espanha depois de 50 anos da conquista?

A hierarquia católica se opôs a estas medidas. Os comendadores puderam permanecer como membros fiéis da igreja sem ter que libertar aos índios.

A crítica sobre a associação da igreja com o estado repressivo tem sido aplicada não somente aos católicos, mas também a Lutero, a Calvino e aos reformadores radicais na Europa. Um argumento tem sido esboçado, "se os protestantes agiram da mesma forma que os católicos, por que a Lenda Negra se aplica somente aos católicos?"

Em A História das Igrejas Evangélicas lemos sobre a relação de Lutero e os camponeses.

A vida dos camponeses na Alemanha ia de mal a pior. Houve várias rebeliões antes da reforma. No ano 1525 os camponeses no sul da Alemanha apresentaram suas queixas diante dos príncipes outra vez. Pensavam que Lutero devia defendê-los. Lutero aconselhou aos príncipes para prestar atenção às reclamações. Os príncipes não escutaram as reclamações. Tomas Munzer, que antes era companheiro de Lutero, pregou que aqueles que eram nascidos de novo deviam levantar-se com armas contra os príncipes. Diante desta rebelião, Lutero escreveu

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que os príncipes tinham todo o direito de matar aos rebeldes para manter-se no estado. Os resultados desta guerra foram muito tristes. Os príncipes mataram mais de 100.000 camponeses. Os príncipes acusaram Lutero de ter fomentado a rebelião camponesa e os príncipes se tornaram católicos mais convictos. Os camponeses criam que Lutero os havia traído e voltaram à Igreja Católica ou se filiaram aos anabatistas (7).

Tal como Lutero, João Calvino teve conflito em distinguir entre a responsabilidade do estado e da igreja. Critica-se Calvino por não parar a execução de Miguel Servet (1511-1553), um inimigo teológico declarado de Calvino.

A reforma anabatista também caiu em extremos. O fracasso dos anabatistas em Munzer, Alemanha, onde estabeleceram violentamente uma teocracia, ao estilo do Antigo Testamento, contribuiu para uma mudança radical entre os anabatistas. Os menonitas, por exemplo, depois de Munzer, adotaram a postura pacifista de jamais usar armas e mantiveram a separação entre a igreja e o estado (8).

A ICR, tanto como as tradições protestantes, estava associada com a violência não-justificada. A autodefesa e a proteção da agressão alheia é uma coisa, o uso da violência para estabelecer a igreja e silenciar os inimigos da igreja é outra. A “lenda negra” sobre o uso da violência para fins religiosos se aplica à ICR tanto como aos protestantes, porém, os protestantes sofreram mais. No ano de 1563, mais de 2.000 huguenotes foram mortos na Florida pelos espanhóis. A cifra é mínima, em comparação com as centenas de milhares de índios. Na Europa, se estima que quase dois milhões de huguenotes franceses tenham perdido suas vidas por causa das guerras religiosas.

Desde o século XVIII até hoje em dia, os movimentos missionários não-violentos, tais como os Morávios, as missões de fé e as agências missionárias não-ligadas ao estado, têm sido instrumentos mais consistentes com os ideais bíblicos para a evangelização.

Pergunta para a classe: De que maneira os protestantes estiveram associados com a violência na Europa?

O PROTESTO CONTRA A INQUISIÇÃO

Além das razões teológicas, os protestantes consideravam a ICR apóstata pela perseguição dos crentes. A Confissão Belga (1559) escrita pelo mártir Guido de Brès e adotada pelas igrejas reformadas, identifica as igrejas falsas da seguinte maneira:

Quanto à falsa igreja, esta atribui a si mesma e às suas ordenanças mais poder e autoridade do que à Palavra de Deus, e recusa submeter-se ao jugo de Cristo, não administra os Sacramentos como Cristo ordenou em Sua Palavra, senão que tira e agrega a eles como melhor lhes parece; se apóia mais nos homens do que em Cristo; persegue aqueles que saudavelmente vivem segundo a Palavra de Deus, e aos que lhe repreendem por seus defeitos, avareza e idolatria. Estas duas igrejas são fáceis de conhecer e distinguir uma da outra. (9)

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A inquisição católica tratou mais de 300 casos durante os primeiros séculos na

ALC. Mais de 27 foram executados (10). Os livros de Erasmo, Lutero e também os do bispo Juan de Zumárraga, foram queimados e proibidos pela Inquisição. A contra-reforma nas Américas foi estabelecida antes da chegada dos protestantes na América do Norte no século XVII.

Não foram somente os protestantes que foram mortos pelos conquistadores religiosos. Justo González escreve sobre o cacique Hatuey em Cuba:

Capturado por fim, e condenado a morrer na fogueira, se diz que Hatuey se negou a receber o batismo, que segundo o sacerdote lhe abriria as portas do céu, pois se os cristãos iam ao céu ele não desejava estar em tal lugar (11).

As atividades da Inquisição contra os Protestantes eram um sinal, para os protestantes, da apostasia da ICR. A matança dos índios, ainda que não expressa em termos religiosos, era do mesmo gênero.

Pergunta para a classe: Segundo a Confissão Belga quais são as marcas de uma igreja falsa?

A BUSCA DE UM CRISTIANISMO AUTÊNTICO

O historiador protestante e dominicano, Alfonso Lockward, em Algumas Cruzes Altas (1992) defende a tese de que Colombo era cristão. Diz que “Colombo descobriu um Novo Mundo porque ele cria em Deus. Porque confiou em Sua Santa Palavra” (12). Esta tese é ancorada por um estudo cuidadoso sobre O Livro das Profecias de Cristovão Colombo. Indica que a meta principal de Colombo era descobrir as Índias com a finalidade de financiar uma cruzada para reconquistar Jerusalém. Fala do subjetivo método de interpretação alegórica de Colombo, tanto como de seu complexo messiânico. Apresenta a idéia de que a visão espiritual de Colombo era mais dominante do que o afã pelo ouro. Menciona os planos que Colombo teve para evangelizar os índios através dos espanhóis. Identifica Colombo como católico romano e não como um protestante em segredo. Um capítulo é dedicado a descrever a devoção que Colombo teve para com a Virgem Maria. Outro capítulo demonstra com muita clareza a pecaminosidade de Colombo. Colombo não negou sua condição de pecador. A conclusão de Lockward é que, depois do advento de Cristo, o descobrimento da América (do novo mundo) "tem sido talvez o de maior impacto para a história da humanidade”. O autor pede para não julgarmos Colombo "a partir das posições da época da Reforma e da Contra-reforma" (13).

Houve crentes fiéis tais como São Francisco Solano (1590-1610). Solano dedicou 20 anos de sua vida a evangelizar aos índios na região de Tucumán (Argentina). Antes de morrer disse:

"Vou ao reino (celestial), sim; porém, não por meus méritos, pois sou o principal dos pecadores, mas sim pelos méritos de Jesus Cristo" (14).

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Román Pané escreve sobre Guaticavá, um índio que sofreu por sua fé na Espanha.

O primeiro que recebeu a morte estando batizado foi um índio chamado Guaticavá, que depois recebeu o nome de João. Este foi o primeiro cristão que sofreu uma morte cruel, e tenho por certo que teve uma morte de mártir. Porque fiquei sabendo por alguns que estiveram presentes quando morreu, que dizia: “Deus naboria daca, Deus naboria daca", que quer dizer "eu sou servo de Deus” (15).

O descobrimento do novo mundo foi visto por alguns religiosos na ICR como uma oportunidade de estabelecer uma comunidade cristã mais pura e mais justa. Esta visão foi expressa por meio de várias obras literárias. O bispo Juan de Zumárraga do México (1528-1547) escreveu A Doutrina Breve, como uma tentativa de alfabetizar e educar aos índios. Em Santo Domingo, Pedro de Córdoba (1482-1521) escreveu um singelo livro doutrinário, Doutrina Cristã Para Instrução dos Índios Por Meio de História (1544). Bartolomé de Las Casas (1474-1566) em História das Índias (1547) expressa a esperança de evangelizar os índios. As idéias reformadoras dos católicos e holandeses Desidério Erasmo (1466-1536) estiveram presentes no século XVI na ALC, porém, não floresceram (16). Há críticas legítimas se os conquistadores e sacerdotes conheciam a fé cristã. Sem dúvida, não podemos chegar a conclusões certas quanto à autenticidade da fé dos conquistadores. O que podemos observar é seu tratamento dos indígenas, protestantes e escravos africanos e perguntar se era consistente com sua fé. A mesma interrogação pode ser feita quanto aos protestantes.

Pergunta para a classe: Qual é a posição de Alfonso Lockward quanto à fé de Cristovão Colombo?

O PROTESTO SOCIAL

Se o protesto de Martinho Lutero foi baseado no redescobrimento das verdades soteriológicas (doutrina da salvação) expressas em Romanos 1.17: “o justo viverá pela fé”, os protestos católicos do outro lado do mar eram sumamente antropológicos (doutrina do homem) focados no ensino bíblico escrito em Gênesis 1.27, "Criou Deus, pois, o homem à sua imagem...".

Os primeiros abusos contra os índios foram registrados em 1493. Colombo havia deixado 39 homens na fortaleza em Natal antes de voltar à Espanha. Segundo a história, os homens violentaram as mulheres índias e como conseqüência disto, foram mortos pelos índios. Isso enfureceu aos espanhóis e legitimou a matança dos índios.

O uso da violência chegou a extremos tão horríveis que o próprio Colombo se queixou do maltrato que os colonos deram aos índios.

Os colonizadores estabeleceram um sistema de comendas, no qual os índios eram capturados para trabalhar de forma forçada.

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Antón de Montesino denunciou os comendadores, aqueles que forçaram os índios a trabalhar. O testemunho de Antón Montesino (1511), o sermão Ego vox clamantis in deserto, é uma denúncia social. Montesino, e mais tarde, Las Casas, se queixaram diante dos reis católicos. Las Casas quase conseguiu convencer ao rei católico que abolisse o sistema de comendas, porém, a reação dos colonizadores foi tão violenta, que isto não foi alcançado (17).

A história nos conta muitos exemplos de defesas feitas pelos religiosos a favor dos índios. Juan MacKay, famoso historiador protestante, faz menção do Jesuíta José de Anchieta (1534-1597) e Manuel da Nóbrega (morreu em 1556), os quais ofereceram suas vidas como presentes pelos índios que estavam em guerra com os portugueses (18). Enrique Dussel, historiador católico, considera Antonio de Valdivieso (morreu em 1550), bispo de Nicarágua, maior do que Las Casas por sua defesa dos índios. Finalmente, foi morto pelos conquistadores (19). Outros, tais como o primeiro bispo do México, Juan de Zumárraga (1528-1547 como bispo); Cristovão de Pedraza bispo de Honduras (1545-1583 em Honduras); Juan do Valle bispo de Popayán (morreu em 1661) e Pablo de Torres (1547-1554 no Panamá) podem ser mencionados como defensores dos direitos dos índios (20).

O estabelecimento de "as reduções” na América do Sul pelos Jesuítas era um experimento que durou de 1607 até 1768. As reduções eram melhores do que as comendas por estarem separadas do poder da colônia. Havia mais autodeterminação da parte dos índios e o trato dado pelos jesuítas era consideravelmente melhor. Não está dentro da época sob estudo (século XVI), porém mostra a necessidade de uma separação da igreja e da colônia tradicionais. Possivelmente o experimento que mais se aproxima – sociologicamente falando – ao protestantismo, que era uma separação total da ICR (21).

Pergunta para a classe: Qual é a posição de Antón de Montesino quanto aos abusos dos índios?

Outra pergunta: Mencione três religiosos que defenderam os direitos dos índios.

O PROTESTO E A ESCRAVIDÃO

William Wipler observa que:

Uma das grandes ironias da história é que os homens que surgiram em defesa da população indígena do novo mundo tenham contribuído a outro de seus trágicos episódios humanos. Em janeiro de 1519, despojados da autoridade para atuar em favor da população nativa e horrorizados pelos efeitos da epidemia de varíola, porém ainda preocupados com o destino dos colonos, os Jerónimos escreveram a Carlos V:

"Não lhe é necessário ao seu generoso e Real coração admoestar-lhe a paciência, mas sim que Sua Majestade mande remediar que a estas partes passem escravos negros e negros sem imposições, e a fazer outras

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mercês aos vizinhos das ilhas, que ficam muito perdidos e destruídos com esta pestilência”.

E as Casas, cego em seus esforços por salvar os índios, propôs o plano de utilizar escravos africanos, somente para arrepender-se mais tarde quando reconheceu que uma injustiça havia sido substituída por outra.

A escravidão negra já era conhecida no Caribe e no México. Ovando havia trazido um reduzido número de escravos para trabalhar nas minas da Espanha por volta do ano de 1505, quando a diminuição da população indígena estava criando problemas de produção (22).

Segundo os estudos de Carlos Esteban Deive, os africanos trazidos por Ovando eram batizados (23). "Os conventos da ilha Espanhola se sustentavam principalmente do trabalho de negros em agrupamentos e propriedades rurais" (24). Continua Deive:

Se oficialmente a igreja dominicana apregoava sua missão evangelizadora, de fato os clérigos e dignidades eclesiásticas viviam mais interessados em tirar proveito dos muitos privilégios que desfrutavam e ao trabalho de seus escravos do que ao doutrinamento dos mesmos. Esta era a denúncia que fazia à rainha o conselho da cidade de Santo Domingo em 01 de dezembro de 1531 (25).

Houve exceções. Uma delas era o jesuíta Pedro Claver (1581-1654), que trabalhou entre os escravos africanos em Cartagena, Colômbia. Milhares de escravos chegaram em péssimas condições. Quantos morreram em suas cadeias ou estavam a ponto de morrer? Claver edificou um pequeno hospital dedicado especificamente aos africanos. Junto com um grupo de ajudantes, montaram barcos para atendê-los. Ensinou as doutrinas básicas do cristianismo. Batizou a dezenas de milhares de africanos. Foi tão dedicado ao serviço dos africanos que os cidadãos de Cartagena se queixaram porque não lhes cumprimentavam. Morreu do mal de Parkinson, uma enfermidade comum entre os africanos (26).

E não só entre os espanhóis houve exceções. Deive conta de uma africana em Santo Domingo que ajudou aos enfermos com as esmolas dos vizinhos. Neste lugar foi construído o primeiro hospital pelo governador Ovando (27).

Foi somente a partir do século XVII que os afro-americanos entraram às ordens religiosas. Tomás Rodríguez de Sosa (1605-1670), filho de uma escrava, chegou a ser Capelão na Capela da Real Audiência em Santo Domingo. Estas realizações foram feitas apesar das decisões tais como as que foram tomadas no Quarto Sínodo Diocesano ou Primeiro Concílio Provincial de Santo Domingo (21 de setembro de 1622-01 de janeiro de 1623) que indicava que:

Os negros sejam admitidos às “Sagradas Ordens", a não ser que estejam distantes "do tronco etíope por três gerações", e se somem outros méritos pessoais. Do contrário, tanto os descendentes de escravos africanos como os "vulgarmente chamados mulatos", não poderão pretender nem serem

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promovidos a dignidades eclesiásticas, porque "de lá, segundo demonstra a experiência e casos concretos, se originam escândalos e desprezo da Igreja" (28).

As vozes de Montesino e as Casas nas Américas e Francisco de Vitória (morreu em 1575) na Espanha haviam defendido os direitos dos índios. Rejeitaram a antropologia aristotélica que considerava os escravos menos humanos. Porém, na prática, os afro-americanos foram considerados como humanos? A defesa dos índios foi valente, porém, quem falou a favor dos escravos negros? Isso não tomou forma até os começos das emancipações no final do século XVIII na América do Norte e no Haiti.

Pergunta para a classe: Quem recomendou aos reis espanhóis enviar escravos africanos ao novo mundo para substituir aos índios?

Quem foi o Jesuíta que ministrou aos escravos africanos em Cartagena, Colômbia?

CONCLUSÃO

O cristianismo que chegou às Américas durante o século XVI – seja católico ou protestante – teve muitas contradições em comparação com o cristianismo apostólico e bíblico. O transplante às Américas de um cristianismo medieval e supersticioso, a continuação do conflito internacional entre os países europeus e, sobretudo, o uso do cristianismo para justificar a violência e tráfico de escravos, fazem parte destas ironias. Pela soberania de Deus, houve conversões autênticas entre os índios, africanos, conquistadores e colonizadores apesar do estado pecaminoso das igrejas e dos cristãos.

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NOTAS DE REFERÊNCIA

1. Carlos Esteban Deive, Heterodoxia e Inquisição em Santo Domingo 1492-1822 (Santo Domingo: Editora Taller, 1983); Alfonso Lockward, Algumas Cruzes Altas (Miami: Editorial UNILIT, 1991).

2. 500 anos de presença cristã na América latina e caribe (Quito: CLAI, 1991).3. Hugo Tolentino Dipp, "Ensinaram o medo e vieram a murchar as flores," O Século

(11 agosto, 1992), p. 8.4. Bartolomé de Las Casas, História das Índias (Hollywood: Ediciones Del

Continente, 1985), Vol. II, Livro III, Cap. IV, pp. 441-442.5. Frank Moya Pons, "Moya pergunta por que celebram a matança dos índios,"

Ultima Hora (30 março, 1992), p. 4.6. José Luis Sáez, Cinco Séculos da Igreja Dominicana (Santo Domingo: Amigo Del

Hogar, 1987), p. 35.7. Derk Oostendorp, A História das Igrejas Evangélicas (Santo Domingo: ICR,

1989), p. 9.8. Oostendorp, op. cit., p. 10-11.9. Confissão Belga, Art. 29.10. Báez-Carmargo, Protestantes condenados pela inquisição na Ibero-América

(México, 1960). Richard Greenleaf, "A Inquisição Mexicana e o Iluminismo", New Mexico Historical Review XLI, 3, (l966), p. 190.

11. Justo González, A Era dos Conquistadores (Miami: Editorial Caribe, 1980). P. 276.12. Lockward, op. cit., p. 4. 13. Ibid., p. 170.14. David Powell, "A presença do cristianismo protestante em Tucumán dos séculos

XVI-XIX," Boletim Teológico (Março, 1991), p. 8.15. Lockward, op. cit. p. 93, citando a Fernando Colombo, Vida do Almirante Don

Cristovão Colombo (México: Fundo de Cultura Econômica, 1984): p. 202.16. Fernando Pérez Memén, "Erasmo de Rotterdam na Espanhola," Estudos de

História das Idéias em Santo Domingo e na América (Santo Domingo: Editorial Tempo, l987): pp. 101-107.

17. Juan Manuel Pérez, Estes não são homens? (Santo Domingo: Fundação García-Arévalo, l984), pp. 43-55.

18. Luis Lugo, "Cristianismo e a Conquista Espanhola das Américas," Atlanta, l991.19. Juan McKay, O Outro Cristo Espanhol, (New York, MacMillan, l933),p. 38. 20. Dussel, Uma História da Igreja Na América Latina (Grand Rapids: W.B. Eerdmans,

l981),pp. 52-53.21. Ibidem, pp. 53-54. 22. Powel, op. cit.23. William Wipfler, Poder, Influência e Impotência (Santo Domingo, CEPAE, l980), pp.

20-21.24. Carlos Esteban Deive, A Escravidão do Negro em Santo Domingo (Santo

Domingo: Museu do Homem Dominicano, l980), p. 380.25. Ibid.26. Ibid, p. 381.

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27.González, op. cit. pp. 122-126.27. Deive, op. cit., pp. 398-399.28. Sáez, op. cit., p. 51, citando a Fr. Cesáreo de Armellada (ed) Atas do Concílio Provincial de Santo Domingo 1622-1623 (Caracas, l970).

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PLANO DE ESTUDO PARA A LIÇÃO 2

1. Boas-vindas aos estudantes.2. Oração. 3. Ler o capítulo 1 por seções e responder as perguntas em seu caderno.4. Formule sua própria pergunta e resposta sobre o capítulo 1. Planeje para que

um estudante novo dirija a próxima sessão (capítulo 2) onde serão revisadas as leituras e perguntas/respostas de De… Lutero.

5. Continue lendo em História do Cristianismo. Designe a um ou mais estudantes para apresentar sua exposição sobre os capítulos 5-6 para a próxima aula.

ESBOÇO DO CAPÍTULO 1

INTRODUÇÃO

1. Colombo e a Reforma. O descobrimento do novo mundo serviu como uma distração por 50 anos, dando oportunidade para que a Reforma na Europa se estabelecesse.

2. A Conquista e a Inquisição como motivação para estabelecer a igreja protestante nas Américas. Os protestantes fizeram parte da sociedade marginalizada na ALC. A contra-reforma, Inquisição e os massacres dos índios na ALC e dos holandeses e huguenotes na Europa tinham muito em comum.

3. Os protestantes, sem dúvida, como a ICR, não cumpriram fielmente a Grande Comissão, de evangelizar a todos os grupos étnicos.

OS PROTESTANTES

1. O protesto na Europa: estabelecido longe do controle da Espanha e Roma- A teologia dos somente: somente a graça, somente a fé, somente Cristo, somente a Bíblia, somente para a glória de Deus.

2. Os protestantes chegam a ALC.- conflito com forças ibéricas. As igrejas protestantes no século XVI como

sacerdócio de todos os piratas.- mercantilismo e tráfico de escravos começando em 1528.

OS PROTESTOS DENTRO DA ICR

1. O protesto sobre o método de evangelizar aos índios- a motivação de Colombo para evangelizar aos índios- Román Pané e os taínos na ilha Espanhola, um exemplo de evangelização

pacífica.2. O protesto contra o uso da violência para evangelizar

- Antón Montesino; Frank Moya Pons; Lutero, Calvino e os Anabatistas na

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Europa.3. O protesto contra a Inquisição

- perseguição dos crentes identificada como marca de apostasia 4. A busca de um cristianismo autêntico

- Cristóvão Colombo, São Francisco Solano, Román Pané, Guaticava, Juan de Zumárraga, Pedro Claver.

5. O protesto social- Antón de Montesino, Las Casas, José de Anchieta, Manuel de Nóbrega e outros

6. A escravidão:- A contradição de Las Casas.- Pedro Claver.- Tomás Rodríguez de Sosa.CONCLUSÃO

O cristianismo que chegou às Américas durante o século XVI – seja católico ou protestante – teve muitas contradições em comparação com o cristianismo apostólico e bíblico. O transplante às Américas de um cristianismo medieval e supersticioso, a continuação do conflito internacional entre os países europeus e, sobretudo, o uso do cristianismo para justificar a violência e tráfico de escravos, fazem parte destas ironias. Pela soberania de Deus, houve conversões autênticas entre os índios, africanos, conquistadores e colonizadores apesar do estado pecaminoso das igrejas e dos cristãos.

PERGUNTAS PARA O CAPÍTULO 1

1. Segundo o prefácio, que razões há para falar da Reforma desde o tempo de Colombo?

2. Segundo o autor, por que foi inevitável a formação da igreja protestante no Caribe e América Latina?

3. Cite o grupo de reformados que vieram da França durante o século XVI.4. Qual é a posição de Hugo Tolentino Dipp quanto às intenções de Cristóvão

Colombo para evangelizar aos índios? 5. Quem foi o primeiro obreiro religioso para trabalhar com os taínos? 6. O que aconteceu com os índios na Expansão Espanhola depois de 50 anos da

conquista? 7. De que maneira os protestantes estiveram associados com a violência na

Europa?8. Segundo a Confissão Belga, quais são as marcas de uma igreja falsa?9. Qual é a posição de Alfonso Lockward quanto à fé de Cristóvão Colombo?10. Qual é a posição de Antón de Montesino quanto aos abusos dos índios?11. Mencione três religiosos que defenderam os direitos dos índios.12. Quem recomendou aos reis espanhóis que enviassem escravos africanos ao novo

mundo para substituir aos índios?13. Quem foi o Jesuíta que ministrou aos escravos africanos em Cartagena,

Colômbia?

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RESPOSTAS PARA O CAPÍTULO UM

1. O autor menciona três razões: 1) a primeira, histórica: o descobrimento do novo mundo em 1492 aconteceu mais de 25 anos antes do início da Reforma na Europa e o descobrimento dividiu os interesses políticos e militares dos reis espanhóis; 2) a segunda, sociológica – os protestantes fazem parte dos grupos marginalizados na cultura hispânica; e 3) a terceira razão é missiológica – a tarefa de evangelizar aos não-cristãos é a tarefa de todos os cristãos.

2. Por causa da imposição da Inquisição da ICR, a formação da igreja protestante era inevitável, não somente em Europa, mas sim no Caribe e América Latina (ACL)

3. Hugenotes.

4. Colombo não veio com intenções de evangelizar.

5. Román Pane.

6. Morreram todos.

7. Lutero apoiou o uso da violência para deter os camponeses na Alemanha. Calvino não tratou de parar a sentença de morte de Miguel Servet.

8. Atribui a si mesma mais poder do que à Palavra, não administra os Sacramentos como Jesus ordenou; perseguem aqueles que vivem segundo a Palavra.

9. Que Cristóvão Colombo era cristão.

10.Condenou aos abusadores.

11.Antón Montesino, Bartolomé de Las Casas, José de Anchieta.

12.Bartolomé de Las Casas.

13.Pedro Claver

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CAPÍTULO 2

ORIGENS DO PROTESTANTISMO LATINO-AMERICANO NO SÉCULO XVI

Cornélio (Neal) Hegeman

INTRODUÇÃO

No Capítulo 1(um) foi destacada a importância da presença da Igreja Católica Romana (ICR) como antagonista aos protestantes. Agora, nos concentraremos no desenvolvimento do protestantismo na América Latina e Caribe. Como evangélicos, ao examinarmos nossas origens, vemos que uma de nossas raízes leva à Genebra de Calvino. O Dr. Sidney Rooy (capítulo 6) vê os começos eclesiásticos e políticos da situação política latino-americana na Genebra de Calvino (1). Enquanto a Reforma se estendia por toda a Europa, também a fé reformada alcançava as nações nas Américas. O Dr. Frans Schalkwijk tem escrito abundantemente sobre a igreja reformada holandesa do século XVII, em Pernambuco, Brasil (2). Assim como o Dr. Neville Smith (3), Graeme Mount (4) e outros autores presbiterianos, têm buscado as raízes do protestantismo latino-americano na Reforma do século XVI. Uma das contribuições tem sido a excelente biografia do Dr. J. M. van der Linde sobre o holandês “Jan Willem Karls”, 1700-1781, pastor reformado e defensor do índio e do negro em Suriname (5).

A primeira influência protestante na América do Sul durante o século XVI se deve aos Welsers, banqueiros de Augsburgo, Alemanha, a quem Carlos V deu permissão para estabelecer-se na Venezuela. A expedição dos Welsers data de 1528-1546 e se caracterizou pelo antagonismo espanhol, o tráfico de escravos, as enfermidades tropicais e o encarceramento de seus dirigentes pelos espanhóis. Não se tentou trabalho missionário algum entre os índios.

Os huguenotes franceses aparecem em Coligny, no Brasil, em 1555. Já haviam tentado estabelecer colônias na Flórida em 1564-1565. Uma colônia de umas 600 pessoas foi destruída pelos espanhóis. Somente trinta pessoas escaparam do massacre e outros vinte e quatro sobreviveram ao renunciar a sua fé protestante.

No século XVI, os huguenotes franceses foram os pioneiros da expansão protestante pelas Américas. No estudo das origens das atividades evangelísticas reformadas transculturais na América Latina e Caribe é fundamental entender a atividade missionária de Calvino a partir de Genebra e a expedição de Villegaignon com os huguenotes para

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Coligny, Brasil.

Pergunta: Qual das regiões das Américas os huguenotes franceses foram durante o século XVI?A REFORMA GENEBRINA E O INÍCIO DA EXPEDIÇÃO DE VILLEGAIGNON A COLIGNY, BRASIL (1555-1567)

Genebra se converteu no centro da Reforma protestante na Europa, durante o século XVI. Genebra funcionou também como o centro de um movimento missionário internacional, que alcançava da Europa o Brasil daquela época. A teologia e a direção de João Calvino (1509-1567) contribuíram não somente à Reforma Protestante, mas também aos esforços missionários do século XVI. A expedição francesa ao Brasil (155-1567) incluía os huguenotes franceses, diretamente relacionados com a igreja genebrina e a Academia de Calvino.

É especialmente importante, do ponto de vista missiológico, prestar atenção à rápida extensão da Reforma por toda a Europa, assim como pela parte sul do hemisfério ocidental. É também importante analisar as razões do fracasso da expedição ao Brasil, e a conseqüente perda da atividade evangelística transcultural.

A expedição francesa ao Brasil pelo vice-almirante Nicholas Durand de Villegainon. Esta expedição foi patrocinada pelo almirante francês Gaspard de Chatillon, almirante de Coligny, que era simpatizante da causa huguenote. Villegaignon havia sido companheiro de estudo de João Calvino em Paris. Villegaignon se tornou militar, enquanto Calvino se dedicou ao estudo de direito. Depois de sua conversão ao cristianismo, Calvino dedicou todos os seus esforços ao avanço da Reforma Protestante. Os dois compatriotas haviam mantido escasso contato por correio (6).

Villegaignon estava interessado em participar na expedição dos huguenotes franceses ao Brasil. O historiador francês Marc Lescarbot escreve:

Como tal empresa não poderia ser bem realizada sem o reconhecimento, cooperação e a autoridade do Lorde Almirante, que então era Gaspard de Coligny, um homem imbuído das idéias da chamada religião Reformada, deu ao citado Lorde Almirante, e a outros nobres da chamada Reforma, a entender, hipocritamente ou não, que ele havia desejado por muito tempo partir a alguma terra distante, onde pudesse servir livre e sinceramente a Deus; porém, também desejava estabelecer ali, para todo aquele que desejasse marchar, um refúgio da perseguição, que de fato, naquele tempo, era tão violenta que os protestantes de ambos os sexos e diferentes posições, haviam sido queimados vivos, e confiscados seus bens, em todo o reino da França, por editos do Rei, e decisão do Alto Tribunal do Parlamento (7).

Pergunta: Qual era o nome do almirante que encabeçou a expedição huguenote ao

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Brasil? De que religião era e quais foram suas aspirações?

A primeira viagem ao Brasil (1555) foi autorizada pelo Rei Henrique II, que deu três barcos, dinheiro e permissão para recrutar voluntários entre os prisioneiros, já que eram difíceis de encontrar. Vários huguenotes, um antigo monge, prisioneiros e soldados, fizeram a longa e difícil viagem através do oceano Atlântico, chegando em 10 de novembro de 1555 à zona hoje conhecida como Rio de Janeiro. Decidiram viver em uma pequena ilha ao lado da costa e construíram um forte. Deram-lhe o nome do almirante, por tanto se chamou Forte Coligny (8).

Logo Villegaignin se deparou com um motim. As queixas eram várias. Alguns se lamentavam do duro trabalho de edificar a colônia, uns queriam companhia feminina, e outros desejavam mais contato com os índios. O motim foi suprimido pela força. Villegaignon fez um chamado por carta ao Almirante Coligny e a João Calvino, pedindo mais colonos huguenotes, assim como pastores para instruir aos colonos na região cristã, e “levar aos selvagens o conhecimento da salvação” (9).

Calvino e a igreja em Genebra receberam a carta com gratidão e fizeram planos para enviar onze artesãos, dois pastores, e um chefe de expedição. Os dois pastores Pierre Richier e Guillaume Chartir. As atas da igreja de Genebra, da reunião de 25 de agosto de 1556, dizem:

Terça-feira, 25 de agosto, como resultado de receber uma carta, pedindo a esta igreja o envio de pastores às novas ilhas, que os franceses têm conquistado, são escolhidos M. Pierre Richier e M. Guillaume Chartier. Sendo, portanto, encomendados aos cuidados do Senhor, e enviados com uma carta desta igreja (10).

As cartas e a correspondência em relação a Calvino, Villegaignon e os responsáveis da igreja de Genebra, mostram que se buscou o conselho e a direção de Calvino (11).

Os três barcos partiram na segunda viagem com uns 300 passageiros. Entre eles, estavam mulheres solteiras, que poderia se casar com alguns dos colonos, assim como alguns jovens que viveriam entre os índios, e atuariam como intérpretes. O chefe da expedição era M. Phillipe Du Pont de Corguilleray, um amigo íntimo de Calvino e Coligny. Também estava a bordo o jovem estudante de teologia, Jean de Lery, que logo escreveria a história da expedição e seu trágico desenlace. O barco chegou em março de 1557 (12).

Lery observou que Villegaignon recebeu os huguenotes franceses de braços abertos. Quando M. Du Pont disse que havia chegado a “estabelecer aqui nossa Igreja Reformada, segundo a Palavra de Deus”, Villegaignon respondeu:

É minha intenção criar neste lugar um refúgio para os fiéis que estão sendo perseguidos na França, Espanha e em outras partes do outro lado do mar,

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para que possa, sem temor ao Rei, Imperador, ou qualquer outro poderoso, servir a Deus em verdade, de acordo com sua vontade (13).

Pergunta: Qual igreja nomeou aos primeiros pastores para a igreja em Coligny?Quem foram os primeiros pastores reformados a ministrar no novo mundo?

PRIMEIROS CULTOS E EVANGELIZAÇÃO

Por vários meses se manteve a relação amistosa entre a Igreja e o administrador da colônia, Villegaignon. Foram celebrados, então, os primeiros cultos protestantes na América do Sul, a Santa Ceia (21 de Março de 1557). E os primeiros casamentos (celebrados por Richier em 3 de abril de 1557). Villegaignon e os pastores se respeitavam entre si, cada um em sua autoridade e posição respectiva. Porém, a “lua de mel” durou pouco, Villegaignon, convertido ao catolicismo, se converteu no principal inimigo da Igreja Reformada (14).

Villegaignon havia recebido cartas do Cardeal de Lorena, apressando-o a renunciar seu apoio às heresias de Calvin. Um dos colonos, Jean Cointac, que havia renunciado anteriormente ao seu catolicismo, convenceu a Villegaignon a adotar a doutrina da transubstanciação na Santa Ceia, e a aceitar a prática católica de misturar azeite, sal e saliva com a água do batismo. Villegaignon começou a contradizer aos pastores reformados diante de toda a congregação e a intervir na ordem e disciplina da igreja. A congregação decidiu enviar o pastor Chartier de volta a Genebra para consultar Calvino (15).

A viagem de Chartier foi inútil. Pouco depois de partir, Villegaignon declarou Calvino herege e tomou o controle da igreja. Os huguenotes não puderam tolerar essa apostasia e Du Pont e Richier enfrentaram o chefe da colônia, declarando que, devido a sua conduta, já não podiam considerar-lhe como sua autoridade temporal, e que, portanto, partiriam com o primeiro barco.

Villegaignon se vingou tentando matar de fome aos huguenotes, porém, estes tinham um armazém escondido com comida, devido a suas relações comerciais com os índios. Em outubro de 1557, Villegaignon ordenou aos huguenotes que abandonassem o forte. Estes entraram terra adentro até um pequeno estabelecimento que Coligny havia abandonado anteriormente. Os huguenotes haviam mantido uma relação amistosa com os índios Tupinambás, que consideravam os franceses como aliados contra os portugueses. E, dessa forma, os huguenotes franceses estabeleceram seus primeiros contatos sociais e evangelísticos com os “pagãos selvagens” (16).

A primeira impressão que os huguenotes tiveram dos índios foi de surpresa. Estavam horrorizados pela prática do canibalismo, a crença em espíritos malignos e o estilo de vida “imoral” dos índios. Richier escreve: “Não guardávamos nenhuma esperança de

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ganhá-los para Cristo, ainda que isso fosse realmente o mais importante de tudo” (17).

Quando desapareceu a impressão inicial, Richier parecia mais otimista:

“Já que é o Todo Poderoso que nos tem dado esta tarefa, devemos esperar que esta terra se converta em futura possessão de Cristo” (18).

Os esforços evangelísticos se baseavam no contato pessoal com os índios. Jean de Lery descreve dois dos encontros.

Em uma ocasião os huguenotes estavam com os índios, quando oraram por sua comida. Os índios perguntaram o que faziam. Lery e seus companheiros explicaram que a oração era dirigida a Deus, o Criador, que havia feito todas as coisas, e ao homem à sua própria imagem. E como o homem havia sido criado à imagem de Deus, não deveria comer carne humana. Depois de uma longa conversa, alguns dos índios expressaram seu desejo de orar e sugeriram que abandonariam o canibalismo (19).

Em outra ocasião, Lery caminhava pela selva com vários índios em busca de comida, e ao ver Lery a beleza da natureza, começou a cantar o Salmo 104. Depois de ter terminado de cantar, os índios lhe perguntaram sobre aquela canção. O que deu a Lery a oportunidade de falar-lhes de Deus. A resposta dos índios foi recordar uma lenda de um Deus similar, do qual haviam ouvido muito a muito tempo por meio de um estrangeiro branco. Essa informação surpreendeu a Lery e abrigou a idéia de que talvez um dos apóstolos tivesse visitado o Novo Mundo, ao princípio de nossa era (20).

A estadia durante seis meses, dos huguenotes com os índios, não levou a nenhuma conversão, da qual tenhamos registro histórico. Lery escreveu que se Villegaignon não tivesse se oposto aos huguenotes, não teria sido possível falar com os índios sobre o cristianismo, como fizeram (21).

Perguntas: Qual é a data do primeiro culto protestante nas Américas?Por que Villegaignon traiu os huguenotes?Qual foi o nome dos índios com os quais os huguenotes viveram por seis meses?Qual é a sua opinião quanto às oportunidades que tinham os huguenotes para evangelizar aos índios?

PRIMEIRA CONFISSÃO DA FÉ REFORMADA

Quando o barco "Lhe Jacques" chegou, em janeiro de 1558, pensava-se em levar quinze huguenotes de volta à França. Mal começara a viagem, quando tiveram que enviar cinco homens de volta em um bote. O barco só podia manter-se flutuando. Os huguenotes que ficaram fizeram a difícil viagem à França, porém muitos quase não sobreviveram à travessia (22).

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Os cinco homens que regressaram foram recebidos por Villegaignon, sob a condição de que não falassem de sua religião aos outros colonos. Esta anistia acabou quando Villegaignon começou a suspeitar dos huguenotes e os mandou pra prisão. Para prová-los, lhes pediu que fizessem uma confissão de fé por escrito. Assim foi escrita a primeira confissão de fé reformada da América Latina. Os homens que se viram obrigados a redigir esta declaração teológica, similar à Confissão de Genebra, foram: Jean de Bordel, Matthieu Verneuil, Pierre Bourdon e André Lafon. Bordel, Verneuil e Bourdon, foram estrangulados e lançados ao mar, ao considerá-los culpados. Foram, portanto, os primeiros mártires protestantes latino-americanos, que morrem pelas mãos de seus compatriotas, os colonos. Lafon foi perdoado, já que, por seus serviços como alfaiate, era chamado por Villegaignon de "o Caim das Américas" (23).

Outros colonos haviam escapado de Coligny, e se encontraram entre os colonos portugueses. O historiador da missão reformada, Henry Beets, escreve sobre Jean Boles que viveu entre os portugueses e foi encarcerado por pregar-lhes o Evangelho. Foi enforcado no Rio de Janeiro em 1567 (24).

Villegaignon voltou à França em 1559, e os portugueses ocuparam a colônia de Coligny pela força em 1567, Villegaignon tentou entrar em contato com Calvino, para justificar-se, porém, Calvino não lhe respondeu (25).

Com a decadência do imperialismo francês na América do Sul, e o crescente antagonismo contra os huguenotes na França, não voltariam a fazer expedições similares (26).

Perguntas: Quais são os nomes dos primeiros três mártires? Em que ano foi ocupada pelos portugueses à colônia de Coligny?

CONCLUSÃO

Conflitos internos, traição e a força militar de Portugal foram às causas principais para a queda da expedição de Coligny. Além disso, os huguenotes não tinham uma estratégia para evangelizar os índios ou outros grupos marginalizados. Uma aliança estratégica entre grupos marginalizados poderia ter sido uma autodefesa contra os portugueses.

Perguntas: A quais cincos conclusões o autor chega quanto ao fracasso da expedição de Coligny? Qual é sua opinião quanto à expedição de Coligny?

NOTAS DE REFERÊNCIA1. O capítulo 2 foi publicado em Cadernos Reforma. Nº. 13 (l990). Sidney Rooy, “O

Poder Político: modelo reformado,” (Buenos Aires: Fraternidade Teológica Latino-americana, 1983).

2. Frans Schalkwijk, Igreja e Estado no Brasil Holandês: 1630-1654, (São Paulo: Sociedade Religiosa Edições Vida Nova, 1986).

3. Neville Smith, Levende stenen. Pedras Vivas. Piedra Bibu: 350 jaran protestantisme op Curacao. Williamstad: Verenigde Protestantse Gemeente, 1985.

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4. Graeme Mount, Missões Presbiterianas a Trinidad e Porto Rico: Os Anos de Formação 1868-1914. Hantsport, NS: Lancelot Press, 1983.

5. Jan M. van der Linde, Jan Willem Kals 1700-1781, (Kampen: Kokm, 1987).6. Jean de Lery, Histoire d’um voyage fait em a terre de Brésil, (Genebra, 1975);

“Journal de Bord de Jean de Lery em a Terre de Bresil, 1557, introduzido e comentado por M.R. Mayeux,” (Paris, 1975) e Baum Guilielmus et. ao. (eds), Corpus Reformatorum, (Brunsvigae, 1877), pp. 278 e ss., 434-443. Mais informação em: Oliver Reverida, Quatorze Calvinistes chez lhes Topinambus, Histoire d’une mission génevoise au Brésil (1556-1558), (Paris: Librarie Minard, 1957); J. Vander Berg, “Tragedie op de kust van Brazilie”, De Heerbaan (Sept./Oct, 1958; pp. 179-184; Justo González, História de a Missões, (Buenos Aires: a Aurora, 1970), pp. 376-377; e William Mulder, “Brazil,” Lengthened Cords, (ed. Roger Greenway) (Grand Rapids: Baker Book House, 1975), pp. 101-104.

7. Marc Lescarbot, História da Nova França (Toronto, 1907), I, p. 48.8. G. Báez Camargo, “As Primeiras Aventuras Missionárias Protestantes da América

Latina”, História da Igreja, XXI (l952), pp. 135-145.9. Lescarbot, op. cit., p. 157: Lery, “Journal”, p. 51: Corpus, XLIV, 442, carta

2613. A carta de resposta da igreja de Genebra, assim como a recepção de Villegaignon aos huguenotes em sua chegada em 1557, é prova suficiente para contradizer a teoria de A. Perbal, de que a carta de Calvino a Villegaignon foi falsificada. “Católicos Não Romanos na América Latina”, International Review of Missions, 41 (l960), pp. 455-459.

10. Phillip Hudges, O Registrador da Companhia de Pastores de Genebra no Tempo de Calvino, (Grand Rapids: Eerdmans, 1966), p. 317.

11. Corpus, cartas 2612 e 2613.12. Carmargo, op. cit., pp. 135-136.13. Lery, Histoire, pp. 64-65.14. Ibid., pp. 65-67.15. Ibid., p. 68.16. Carmargo, op. cit., p. 138.17. Corpus, cartas 2609 e 2612.18. Ibid., carta 2612.19. Lescarbot, Histoire de a Nouvelle France, (Paris: Milot, 1609), p. 323.20. Camargo, op. cit., p. 141.21. Ibid., p. 143.22. Jean Crespin, Atos dos Mártires, (Genebra, Steiger, 1564), pp. 881-898, tal e como

escreveu Lery.23. Mais informacão sobre a confissão em Jean Crespin, Histoire des martyr persécutés

et mis a mort pour a vérité de l’Evangile, II, pp. 510-513.24. Henry Beets, Triumfen van Het Kruis, p. 79.25. Reverdin, op. cit., p. 108.Jean Bastian, “Protestantismo e Colonialismo na América

Latina e Caribe: 1492-1838,” Taller de Teologia (l981), p. 24.26. Jean Bastian, “Protestantismo e Colonialismo na América Latina e Caribe: 1492-

1838”, Seminário de Teologia (l981), p.24.

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PLANO DE ESTUDO PARA A LIÇÃO 3

METODOLOGIA PARA O FACILITADOR

1. Boas-vindas aos estudantes.2. Oração.3. Leia o capítulo, seção por seção.4. Responda as perguntas ao final de cada seção. Escreva as perguntas e as

respostas em seu caderno pessoal.5. Formule sua própria pergunta e resposta sobre o capítulo 2 de De… Lutero6. Designe ao estudante que vai dirigir a próxima seção de revisão de leituras e

perguntas do capítulo 3 de De... Lutero7. Designe os estudantes que vão apresentar a exposição sobre os capítulos 7-

11 de História… Cristianismo.

ESBOÇO DO CAPÍTULO 2

Os huguenotes da França estavam entre os primeiros protestantes que trataram de se estabelecer na ALC. O estudante conhecerá os dados, eventos e personagens mais importantes e formulará a sua própria opinião sobre a expedição a Coligny.

A REFORMA GENEBRINA E O INÍCIO DA EXPEDIÇÃO DE VILLEGAIGNON A COLIGNY

Genebra. Um centro teológico e missionário. A igreja em Genebra é ativa na obra missionária.

Personagens importantes: João Calvino, Almirante Coligny, vice-almirante Villegaignon, Pierre Richier, Guillaume Chartier, Jean de Lery, os Tupinambás, Jean de Bordel, Matthieu Verneuil, Pierre Bourdon.

PRIMEIROS CULTOS E EVANGELIZAÇÃO

21 de março, 1557, a primeira Santa Ceia protestante nas Américas. 3 de abril, 1557, o primeiro culto protestante e casamentos. Traição de Villegaignon. Encontros com os Tupinambás.

-primeiras impressões.-oportunidades para testificar.

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A PRIMEIRA CONFISSÃO DE FÉ REFORMADA NA ALC

Os primeiros mártires nas Américas: Jean de Bordel, Matthieu Verneuil, Pierre Bourdon

CONCLUSÃO

Conflitos internos, traição e a força militar de Portugal foram as causas principais para a queda da expedição de Coligny. Além disso, os huguenotes não tinham uma estratégia para evangelizar os índios ou outros grupos marginalizados. Uma aliança estratégica entre grupos marginalizados poderia ter sido uma autodefesa contra os portugueses.

PERGUNTAS PARA O CAPÍTULO 2

1. Quais as duas regiões das Américas os huguenotes franceses foram durante o século XVI?

2. Qual era o nome do almirante que encabeçou a expedição huguenote ao Brasil? De qual religião era e quais eram suas aspirações?

3. Qual igreja nomeou os primeiros pastores para a igreja em Coligny?4. Qual é a data do primeiro culto protestante nas Américas?5. Quem foram os primeiros pastores reformados a ministrar no mundo novo?6. Por que Villegaignon traiu os huguenotes? 7. Qual era o nome dos índios com os quais os huguenotes viveram por 06 meses?8. Qual é sua opinião quanto às oportunidades que tinham os huguenotes para

evangelizar os índios?9. Quem era Jean de Lery?10.Quais são os nomes dos primeiros três mártires?11.Em que ano foi ocupada a colônia de Coligny pelos portugueses? 12.Quais as cinco conclusões o autor chega quanto ao fracasso da expedição de

Coligny?13.Qual é sua opinião quanto à expedição de Coligny?

RESPOSTAS PARA O CAPÍTULO 2

1 Brasil e Florida.2 O almirante francês Gaspard de Chatillon, almirante de Coligny, era simpatizante

protestante e com o desejo de estabelecer um refúgio à perseguição.3 A igreja de Calvino em Genebra.4 21 de março, a Santa Ceia foi celebrada em Coligny pelos huguenotes.5 Pierre Richier e Guillaume Chartier.6 Por sua conversão ao catolicismo.7 Tupinambás.8 Opinião pessoal.

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9 Estudante de teologia, historiador.10 Jean de Bordel, Matthieu Verneuil, Pierre Bourdon.11 156712 A força dos portugueses; conflitos internos dos imigrantes; traição; falta de

evangelização, falta de aliança com os índios ou outros grupos marginalizados do poder português.

13 Opinião pessoal.

CAPITULO 3

MOTIVAÇÃO DA MISSÃO REFORMADA DE COLIGNY, BRASIL (1555-1567)

Cornélio (Neal) Hegeman

INTRODUÇÃO

A motivação original para os protestantes de colonizar o novo mundo veio dos huguenotes perseguidos da França. Visto que o governo francês era antagonista, os huguenotes estavam buscando um melhor lugar para viver.

As Igrejas Reformadas foram estabelecidas na França (1520), Alemanha (1520), Suíça (1520), Hungria (1530) e Holanda (1568). Você pode ficar muito surpreso por saber que os huguenotes franceses estiveram ativos no Caribe em 1528 (1). Nesse mesmo ano os Von Welzers da Alemanha colonizaram na Venezuela. Em 1555, os huguenotes franceses estabeleceram uma colônia em Coligny, Brasil (2). Antes que os puritanos da Inglaterra chegassem à costa da Virgínia, da qual veio a existir as 13 colônias da América do Norte, os huguenotes franceses haviam estado ativos povoando na Carolina do Sul (1562), Flórida (1562-1565), e por várias tentativas haviam se situado no Peru (1573-1574), Brasil (1594, 1604, 1610), e Trinidad (1604, 1610). A Guiana Francesa foi colonizada em 1616 e uma pequena ilha na costa norte do Haiti, Tortuga, foi habitada desde 1626-1652. A maioria destas missões relata atividades antes do famoso desembarco da Flor de Maio na Virgínia em 1620 (3).

Devido a que a maior atividade de parte dos protestantes era pelos huguenotes calvinistas, seria importante conhecer a teologia e missiologia calvinista do século XVI-XVII para entender a motivação dos huguenotes (4).

Pergunta: Os huguenotes estão associados com a teologia de qual reformador? A TEOLOGIA CALVINISTA

Vamos primeiro observar os pensamentos dos teólogos reformados do século XVI quanto à missão reformada. Os escritos de teologia de Calvino se encontram nos comentários sobre a Bíblia, em seu trabalho sistemático Institutas da Religião Cristã, e em suas cartas de

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correspondência as quais estão sendo preservadas. A teologia de missões e evangelismo de Calvino não se encontra em nenhum comentário sob estes termos nem em nenhum comentário ou seção de as Institutas da Religião Cristã. O uso dos termos teológicos do século XVI difere da terminologia do século XX. Não obstante, havia atividade missionária e, na terminologia contemporânea, um calvinismo indubitável e conseqüentemente uma missiologia reformada. É importante observar que Calvino não tentou criar uma teologia em seu nome, ou inclusive, recomendar algo novo. O espírito verdadeiro da Reforma foi redescobrir a mensagem da Escritura e reforçar sua prática.

Não era o desejo de Calvino formar uma nova escola ou pensamentos teológicos, ele só quis o retorno das fontes puras do Evangelho e demonstrar que o Senhor e Salvador têm sua santa reivindicação sobre todas as relações complexas nas quais o homem tende a estar envolvido (5).

A primeira confissão reformada no hemisfério ocidental foi elaborada pelos primeiros mártires protestantes, Jean du Bourdel, Matthieu Verneuil, Pierre Bourdon e Andre Lafon. Eles foram apressados pelo administrador colonial, Villegaignon, quem havia se reconvertido recentemente ao catolicismo romano. Quando lhes pediu para redigir um testemunho de fé, eles confeccionaram um documento similar à Confissão Helvética de Genebra, da qual tinham conhecimento por seus contatos anteriores com a cristandade reformada em Genebra. Bourdel, Verneuil e Bourdon foram considerados culpados, amarrados e lançados ao mar.

Para poder entender os motivos transcendentais da cristandade na ALC, é imperativo revisar o ponto de vista de Calvino sobre as doutrinas cristãs mais importantes e ver como seus propósitos foram estendidos pelas igrejas reformadas e missões que confessionalmente e pessoalmente afirmaram o cristianismo reformada do século XVI na ALC. Comentaremos sobre o conhecimento de Deus e do homem, a imagem de Deus e a depravação humana, a autoridade da Palavra de Deus, a salvação, as igrejas verdadeiras e falsas, ministérios das igrejas, as relações entre as denominações, missões e evangelismo, e credos confessionais.

Pergunta: Qual é o nome do livro mais importante escrito por João Calvino?

O CONHECIMENTO DE DEUS E O CONHECIMENTO DO HOMEM

As respostas iniciais de Villegaignon e Richier com respeito aos conceitos dos índios acerca de Deus foram negativas. Villegaignon escreveu que os índios estavam “desprovidos de toda cortesia e humanismo... vivendo sem religião, sem honra ou virtude” (6). As primeiras expressões do pastor Richier foram similares. Os índios pareciam que não tinham nenhum conhecimento de Deus e ele expressou a sua frustração ao revelar-lhes Cristo (7). Os huguenotes foram obrigados a sair da fortaleza de Coligny em 1558, devido às hostilidades de Villegaignon. Sem dúvida, ele lhes permitia viver em paz entre os índios.

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Os huguenotes descobriram que os índios tinham conhecimento de Deus, porém esse conhecimento foi se corrompendo com o passar das gerações. Desde as primeiras comunicações com os índios se pode ver de forma evidente que estes tinham um conhecimento de Deus mais avançado do que as expressões iniciais de Villegaignon ilustravam. Os franceses ao não saber o idioma dos Tupinambás, tiveram dificuldades de perceber isso. Os huguenotes se deram conta da necessidade de comunicar-se no idioma dos Tupinambás. Alguns dos jovens foram postos entre os índios com o propósito de aprender o idioma e depois servirem de intérpretes. Eventualmente, os colonizadores mais ambiciosos, como Lery, aprenderam o suficiente do idioma para comunicar-se com eles nas coisas básicas da vida. Foi Lery quem descobriu que os Tupinambás tinham um conceito de Deus, que havia deixado alguns testemunhos de Si mesmo através dos antecessores. O conhecimento original de Deus estava combinado com a veneração espiritual e o espiritismo. O conhecimento de Deus e o conhecimento do homem são os dois pilares do sistema teológico de Calvino.

Quase toda a soma de nossa sabedoria, que deveras deve ter por verdadeira e sólida sabedoria, consiste de dois pontos, a saber: no próprio conhecimento que o homem deve ter de Deus e no conhecimento que deve ter de si (8).

Segundo Calvino, quando o homem verdadeiramente conhece a si mesmo ele se volta a Deus. Quando o homem vê sua pobreza e miséria espiritual, ele se dá conta de sua grande necessidade de Deus.

Assim, pelo sentimento de nossa ignorância, vaidade, pobreza, enfermidade e, finalmente, perversidade e corrupção própria, reconhece-mos que em nenhuma outra parte, se não em Deus, há verdadeira sabedoria, firme virtude, perfeita abundância de todos os bens e pureza de justiça; pelo qual, certamente nos vemos impulsionados por nossa miséria a considerar os tesouros que há em Deus (9).

Aos que não conhecem a Deus em Jesus Cristo, Calvino esboça:

Nós, sem discussão alguma, afirmamos que o homem tem certo sentimento da divindade em si mesmo; e isto, por um instinto natural. Porque, afim de que ninguém se desculpasse com o pretexto da ignorância, o mesmo Deus imprimiu em todos nós certo conhecimento de sua divindade, cuja lembrança se renova, tal como se o destilasse gota a gota, para que quando todos, desde o menos até o maior, entendam que há Deus e que é seu Criador, com seu próprio testemunho sejam condenados por não ter-lhe honrado e por não ter consagrado nem dedicado sua vida à sua obediência (10).

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Pergunta: De que maneira os índios mostraram seu conhecimento de um Deus? Segundo a teologia de João Calvino, este conhecimento é suficiente para

a salvação?

O conhecimento de Deus, o qual o homem obtém através de seus instintos naturais e a observância da lei não são conhecimentos suficientes do verdadeiro Deus. O pecado tem destorcido o conhecimento do homem. Por essa razão, Deus tem dado sua Sagrada Escritura, a qual também revela a obra redentora ao homem.

Porque este gênero de conhecimento com o qual entenderam, que o Deus que criou o mundo e agora o governa precedeu primeiramente; depois seguiu o outro que é interior, o qual, unicamente, vivifica as almas mortas, com o que Deus é conhecido, não só como Criador do mundo e único autor e reitor de tudo quanto há no mundo, mas também como Redentor na pessoa de nosso Mediador Jesus Cristo (11).

Os conceitos de Calvino acerca do conhecimento inato de Deus são também afirmados nas religiões das antepassadas culturas indígenas, tais como a dos Incas, Mayas e Aztecas (12). Todavia o conhecimento inato de Deus nos não crentes necessita ser radicalmente transformado: Calvino conclui:

Porque não se podem desarraigar do coração do homem os erros, enquanto não se plante nele o verdadeiro conhecimento de Deus (13).

Os huguenotes viram bem poucas evidências do que eles perceberam como sendo um verdadeiro conhecimento de Deus entre os índios, e eles só puderam falar de Deus de um modo mui limitado.

Pergunta: Que faltava aos Tupinambás para conhecer ao Deus verdadeiro e ser-lhe fiel?

A IMAGEM DE DEUS E A DEPRAVAÇÃO HUMANA

A depravação humana foi evidente na expedição de Coligny. A depravação dos índios foi comentada por Lery, porém, foi a depravação de Villegaignon, um francês mui educado e “civilizado” o qual conduziu à brutal terminação do esforço missionário huguenote. Jean Pierre Bastian credita a Jean de Lery uma visão balanceada da relação entre os cristãos e os índios não cristãos. Lery asseverou que aos índios devia ser ensinado o conhecimento da vida eterna e que os índios poderiam instruir aos colonizadores acerca da vida contemporânea em seu novo ambiente. Lery reconheceu os valores das qualidades humanas nos índios, ainda que estas qualidades não mudassem em essência a condição da natureza depravada do homem. Ainda que a doutrina da depravação humana tenha sido vista como desumana, Amy Gordon observou uma aplicação positiva deste conceito teológico em relação a expedição Coligny.

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Há a possibilidade que o ponto de vista calvinista do ser humano, sua natureza, e Deus poderiam guiar a uma grandiosa 'habilidade de apreciar a outras culturas’. A atitude calvinista para com a corrupção da natureza humana e a inabilidade dos seres humanos de contribuir com sua própria salvação coloca a todos os seres humanos em um plano de igualdade. Deus nos escolheu sem termos nenhum mérito, e o calvinista não podem exaltar suas próprias habilidades. Se os Tupinambás são moralmente corruptos e viciosos, como Lery às vezes sugeriu, assim também são todos os seres humanos, e ninguém sabe com certeza a quem Deus condena e a quem tem escolhido. Finalmente, alguém pode argumentar que o ponto de vista calvinista da eleição e da condenação conduz, no século dezessete, a uma justificação da desapropriação e destruição dos índios americanos. Em meados do século dezesseis, sem dúvida, muito antes de as nações protestantes terem entrado na competição colonial e tivessem manifestado seus pontos de vista sobre os índios, Lery ilustrou um ponto no qual a teologia calvinista contribuiu para esclarecer a percepção e uma grande aprovação à cultura índia-americana. Desta perspectiva, um ponto de vista fundamentalmente negativo da natureza humana pode ter-nos conduzido, em sentido paradoxo, a um grandioso entendimento de outras culturas e ao mesmo tempo, isso pode também haver criado um sentido de inutilidade que fez aos protestantes em geral se desanimar, sem dúvida, das coisas que haviam prometido fazer no trabalho missionário (14).

É importante notar que o ponto de vista de Calvino da depravação humana se aplica a todos os homens. Era uma depravação total. Os índios como também os colonos foram capazes de cometer horrendos crimes e, se ao menos não foram regenerados pela fé em Jesus Cristo, estiveram sem esperança de salvação. Calvino também afirmou que Deus foi capaz de usar aos não convertidos para seus bons propósitos e para o bem-estar da sociedade (15). Existem ocasiões em que os não convertidos demonstram as altas virtudes humanas que os cristãos professam. Isto, por exemplo, pode ser visto, quando o tratado de Villegaignon com os huguenotes durante os últimos anos de Coligny é comparado com o trato cordial que os huguenotes receberam da parte dos índios.

Pergunta: De que maneira Villegaignon confirmou a doutrina da depravação humana? A AUTORIDADE DA PALAVRA DE DEUS

A morte dos três mártires franceses huguenotes por não se retratarem de sua crença diante de Villegaignon é um testemunho da grande importância que os huguenotes outorgaram à Palavra de Deus. Eles não negaram suas crenças, as quais proclamaram como a verdadeira Palavra de Deus, inclusive frente à pena de morte. Os huguenotes que viveram entre os índios levaram a Palavra de Deus aos índios? Foi a Bíblia traduzida na linguagem indígena? Ainda que grandes esperanças

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tenham sido expressas, não há evidências de que uma tradução fora iniciada ou que porções da Escritura foram traduzidas (16). Com a exceção de várias conversações registradas por Lery, os índios não tinham um grande conhecimento da lei, o Evangelho e outras partes da Palavra de Deus em sua própria língua. As crônicas portuguesas mencionam que Jacques lhe Balleur foi prisioneiro por pregar aos índios. As informações detalhadas acerca de suas atividades aparentemente não estão documentadas. Testemunhar acerca de Cristo entre os índios era mais um fato espontâneo e em tempos de emergência, do que uma estratégia de evangelização organizada pela igreja.

Pergunta: Como os três mártires mostraram a sua devoção à Palavra de Deus?

A SALVAÇÃO

Os huguenotes que escaparam da colônia Coligny estavam realmente preocupados com a salvação dos índios? Os huguenotes fizeram algo substancial acerca da salvação dos índios? Além disso, das pesquisas de Lery, como foram descritas antes, e o relato que Jacques lhe Balleur pregou aos índios, não houve um esforço organizado para evangelizar aos índios. Os documentos não mostram evidências de que algum índio tenha crido em Cristo como Salvador e Senhor. Indubitavelmente, o idioma foi a grande barreira. Foi a aparente inatividade pela salvação dos índios uma dedução lógica das doutrinas calvinistas? O contrário parece ser a verdade. Calvino escreveu:

Porque não sabemos o número de predestinados, ou dos que não são; nossos desejos devem ser que todos sejam salvos: e, por conseguinte, desejamos que cada pessoa que conhecemos esteja conosco como uma participante da paz (17).

Tal doutrina traz uma observação de que Deus poderia ter seus escolhidos e seus não-escolhidos entre os índios. Não há preconceitos raciais para a salvação. A única condição é a graça de Deus revelada pela fé em Jesus Cristo. Os huguenotes buscavam aos escolhidos entre os índios? Segundo Calvino, os escolhidos respondem à pregação da Palavra de Deus e eles encontram sua consolação no Evangelho de Jesus Cristo. Ainda que a comunicação da Palavra e do Evangelho se faça de uma forma mui primitiva, Deus pode atrair aos escolhidos para Ele pelos sermões e testemunhos fiéis de sua Palavra (18).

Pergunta: Qual é a sua opinião quanto à evangelização dos Tupinambás pelos huguenotes?

A IGREJA VERDADERA E A IGREJA FALSA

Não só os huguenotes tiveram dificuldades em estabelecer a Igreja Reformada, mas sim que contaram com o antagonismo da Igreja Católica Romana no Brasil.

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Calvino não só identificou a Igreja Católica Romana (ICR) como falsa, mas também persuadiu o povo a separar-se dela. A igreja falsa foi identificada com o “papado romano” e “o anticristo”. A igreja verdadeira se manifesta com a pregação verdadeira da Palavra de Deus e a guardar dos sacramentos de Cristo pela fé (19). Calvino admitiu que dentro da ICR havia alguns remanescentes da religião verdadeira, tais como o batismo dos infantes e os credos ecumênicos (Credo Apostólico, Credo de Nicéia e Credo de Atanásio), porém, ainda exortava ao povo de Deus a fugir da igreja falsa e ir à verdadeira (20). Em Coligny, a ICR tinha o poder, especialmente depois que Villegaignon se retratou de suas crenças protestantes. Não foi o paganismo que destruiu os esforços dos huguenotes, mas sim os conflitos violentos entre os cristãos.

Pergunta: Segundo os Reformados, como se pode distinguir entre a igreja verdadeira e a igreja falsa?

OFÍCIO DE MINISTÉRIO NA IGREJA

Os huguenotes que foram à expedição Coligny estavam acompanhados por dois pastores que foram enviados pela igreja Reformada de Genebra. A intenção expressada pelos pastores e os huguenotes era estabelecer uma igreja Reformada, para ministrar aos colonos assim como também levar o Evangelho aos “selvagens pagãos” (21). Segundo Calvino, as missões foram feitas através da igreja. A extensão do reino de Deus veio através da operação dos meios da graça, ou seja, pela pregação da Palavra de Deus e a celebração dos sacramentos (22). Se a igreja fosse fervorosa em pregar e obedecer a Palavra e expressar sua comunhão através da observação dos sacramentos, conduziria o povo a Deus. As missões consistiram em plantar igrejas através das quais se realizou o trabalho missionário. O conceito de Calvino de que a igreja tem a responsabilidade da missão e que essa não deve ser a tarefa das ordens religiosas, pode ter sido uma reação contra a ICR. Sem dúvida, a igreja como uma congregação foi chamada às suas responsabilidades em missões e evangelização (23). Não obstante, as congregações locais são expressões de grupos de pessoas com certas características culturais. Os Tupinambás nunca poderiam “ir à igreja” se a igreja não “tivesse ido aos índios”. De fato, assim foi. A igreja protestante foi expulsa do forte Coligny e se dispersou junto aos índios. A visão missionária de Calvino é como uma cadeia. A função dos apóstolos, profetas e evangelistas que estabeleceram a igreja cristã era formar pastores e mestres, trabalhando através do concílio da igreja, assim como com os membros na igreja e as autoridades na esfera social da vida, para que todos tivessem uma participação ativa em missões. Calvino havia falado de 5 ofícios de ministérios da igreja: o apóstolo, profeta, evangelista, pastor e mestre (24).

Somente os últimos dois (pastores e mestres) têm um ministério ordinário na igreja. O Senhor criou os outros três ao princípio de seu reino e, ainda, ocasionalmente os cria, quando a necessidade o requer (25).

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A grande comissão, segundo Calvino, foi primeiramente dada aos apóstolos (26). A comissão dos discípulos originais foi para serem apóstolos. Porém, a grande comissão foi somente para os apóstolos? Deixemos que Calvino responda por si mesmo. Em seu comentário sobre Mateus 28.20:

Deve igualmente ser observado que isto não foi só para os apóstolos; porque o Senhor prometeu a sua assistência não tão somente para um tempo, mas sim, até o final do mundo (27).

Os oficiais da igreja como também os membros dela devem participar das missões. No comentário sobre Isaías 2.3 Calvino diz:

Por estas palavras, ele primeiro declara que o devoto será cheio com o desejo ardente de expandir as doutrinas religiosas, que cada um, não satisfeito com seu próprio chamado e seu conhecimento pessoal, decidirá levar os outros a Ele... Isto nos mostra também um método simples de reunir igrejas, o qual é pela pregação dos homens; para que Deus atraia aos homens a Si mesmo por uma influência secreta, embora Ele empregue a mediação dos homens (28).

O “sacerdócio de todos os crentes” já havia sido enfatizado por Martinho Lutero. Calvino o aprofundou ainda mais. Os membros da igreja poderiam ser escolhidos para servir como presbíteros e diáconos na igreja. Os leigos receberam a oportunidade de participar no governo da igreja local, e formar a maioria no Concílio local. Os pastores, juntos com os presbíteros e diáconos, formam a composição da igreja local. Representantes deles poderiam ser delegados a outros concílios (29). O sistema conciliar de governar a igreja tinha suas vantagens para a igreja local, porém, para o evangelismo e missões atrasa a espontaneidade e a flexibilidade das missões. As igrejas se envolveram em resolver os conflitos internos de uma maneira lenta e deliberada em vez de concentrar-se no desafio externo.

Pergunta: Segundo Calvino, quantos ofícios de ministério normalmente estão presentes na igreja?

RELAÇÕES ENTRE AS DENOMINAÇÕES

A relação entre a congregação de Coligny e a congregação de Genebra formou uma situação interdenominacional e ecumênica, a qual cruzou algumas barreiras internacionais. A igreja reformada em Genebra estabeleceu relações com a igreja reformada dos huguenotes franceses no Brasil. A igreja em Genebra não só reconheceu as igrejas reformadas, mas também as luteranas e depois a presbiteriana. A ICR foi considerada falsa e não se estabeleceram ligações eclesiásticas com ela. Os pastores da congregação de Coligny foram ordenados em Genebra. A congregação foi um transplante desde a Europa em vez de uma igreja independente.

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Pergunta: Realmente haviam denominações em 1557?

MISSÃO E EVANGELISMO

Segundo Calvino, a expansão do Evangelho por todo o mundo ocorreu das seguintes maneiras: 1) Deus levanta novos apóstolos e evangelistas para estender a igreja ou chamar a igreja para voltar ao seu fundamento (30); 2) a igreja, através do ministério do pastor, mestre e membresia, oferece a Palavra de Deus e os sacramentos, os quais atraem aos escolhidos de Deus a juntar-se (31); 3) o governo civil é para proteger e promover o avanço do Evangelho (32); 4) os cristãos devem amar seus vizinhos, orar por eles e desejar que eles sejam atraídos por Cristo. Os cristãos são agentes de Deus para levar os outros a Cristo (33). O ponto central em todos os meios da expansão do Evangelho era a igreja. J. Van den Berg anota:

Todo o trabalho da igreja era "missão”; não havia uma clara distinção entre reforma e a tarefa missionária da igreja no sentido estrito da palavra e por isto nós temos a má perspectiva quando tratamos de aplicar nossos modernos conceitos de missões à visão mundial dos reformados (34).

Ainda que Calvino não tenha ido a Coligny, ele foi o instrumento que recebeu as petições para os huguenotes. Calvino recomendou a dois pastores, a quem ele conhecia bem. João Calvino era francês e a expedição a Coligny constava de franceses. Muitos dos huguenotes, incluindo Calvino, estavam na lista da inquisição para serem julgados. Sem dúvida, Calvino e os refugiados franceses em Genebra, Suíça, continuaram preparando pastores e evangelistas para a França e outros países. O registro de pastores da igreja em Genebra tem mais de 88 homens que foram enviados em os anos 1555-1563. Eles foram enviados por toda a Europa e dois a Coligny. A cifra foi, provavelmente, mais alta, porém, por medo da persecução, não foram registrados (35). Alguns eruditos têm chamado a João Calvino "diretor da missão evangélica", ou “diretor de missões”. Genebra tem sido menciona como “centro missionário de Calvino”. Os títulos mencionados estão em uma descrição do século XX acerca de um evento do século XVI. Calvino pertence a uma larga lista de notáveis missionários teólogos cujas contribuições são freqüentemente mal entendidas e mal interpretadas (36). Calvino foi um homem de sua época. O século XVI significa que as missões foram produtos dessa época. Trabalhar através dos governadores e frotas mercantis não era o ideal para os missionários porque estas instituições não tinham como prioridade pregar o Evangelho aos demais. Por outra parte, quando os governantes e as companhias mercantis quiseram rejeitar a igreja, esta estava indefensa, já que dependia também do sistema colonial. É um fator histórico que em Coligny os administradores da colônia traíram a igreja guiando a destruição de ambos e detendo toda possibilidade de realizar os trabalhos missiológicos entre os índios. Os protestantes poderiam ter feito missões na América Latina dominada pelos católicos sem a assistência militar econômica de nações amigas? O protestantismo devia ter ido mais além do alcance militar do iberianismo e estabelecer colônias de uma maneira menos violenta? O que teria acontecido com os

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protestantes se eles tivessem dedicado mais tempo à colonização nas áreas não alcançadas do que à pirataria?

Pergunta: Como Calvino explica a relação entre a Grande Comissão dada aos apóstolos e a responsabilidade dos membros da igreja?

CREDOS CONFESSIONAIS

Os credos calvinistas do século XVI, os quais foram incorporados nas experiências dos huguenotes em Coligny, podem ser descritos em termos de: separação eclesiástica, oportunismo cultural e pluralismo social. Os últimos dois pontos não são partes das confissões das igrejas para definir a ortodoxia, mas sim, são partes da ortopráxis dos huguenotes. A Confissão das Igrejas da França (1559) foi escrita na França durante a expedição dos huguenotes em Coligny. Pois, não tinha uma relação direta. Sem dúvida, os princípios teológicos entre a confissão dos mártires, chamados A Confissão de Coligny, é mui semelhante às confissões que João Calvino utilizou e A Confissão Belga (1561) composta pelo mártir Guido de Brés, co-autor de A Confissão das Igrejas da França. Os huguenotes se opuseram a aceitar as doutrinas, autoridade e domínio cultural da ICR. O separatismo eclesiástico era necessário para proteger a cristandade reformada da extinção. Por outro lado, Calvino e os huguenotes em sua luta para trabalhar e sobreviver cooperaram com os governadores amigos, pessoal militar, príncipes e outros, que sustentavam diferenças na ideologia, porém, na prática apoiavam a Reforma. Os huguenotes conviviam sem violência com os índios. Nesse sentido, o pluralismo social e religioso foi praticado. Os índios não foram segregados para praticar diferentes religiões. No século XVII no Brasil, os reformados holandeses estabeleceram a primeira sociedade religiosamente pluralista na América. Havia tolerância religiosa em comparação com as amargas experiências da inquisição católica. Calvino ensinou que toda cultura deveria para ser utilizada para a gloria de Deus. Reconheceram a providência de Deus sobre todos os homens (37). O calvinismo viu a presença da providência de Deus no homem, na criação, nas leis e estruturas da sociedade e isso tem levado a outros à lógica conclusão de usar meios não-eclesiásticos para as missões. Assim está escrito no artigo 36 de A Confissão Belga referindo-se à relação entre a igreja e o estado. Sem dúvida, as negativas perseguições culturais como a pirataria e o colonialismo na América Latina e Caribe diretamente o indiretamente associados com a igreja reformada não foram seriamente denunciados nos círculos das igrejas. Eram contemplados como uma atividade cultural legítima neste mundo caído e pecaminoso.

Pergunta: Como se chama a confissão de fé escrita pelos mártires huguenotes em Coligny?

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CONCLUSÃO

Houve um choque entre a ortodoxia das confissões reformadas e a práxis dos piratas e colonos protestantes. Os huguenotes aproveitaram as oportunidades oferecidas pelo mercantilismo e por isso sofreram as conseqüências negativas associadas com o mercantilismo do século XVI. O calvinismo do século XVI que chegou às praias das Américas não foi suficientemente dinâmico para ajustar-se às condições sociais e políticas para preservar-se e estender-se.

NOTAS DE REFERÊNCIA

1. David Barrett, World Christian Encyclopedia (New York: Oxford Univ. Press, l982): pp. 301,320, 321, 367, 513.

2. Neal Hegeman, "Origens do Protestantismo latino-americano" Cadernos Reforma Não. 13 (l990), pp. 3-6.

3. L.J. Joose, 'Scoone dingen sijn swaere dingen (Leiden: Groen em Zoon, l992) examina a missiologia da Companhia das Índias Ocidentais, pela qual vieram os pastores e missionários reformados holandeses durante o século 17-18.

4. Neal Hegeman, "Classical Reformed Missiology" Crossing Latin Borders Vo. 7, (l991), p. 10f.

5. J. van den Berg, "Mensagem Missionária de Calvino..." The Evangelical Quarterly Vol. XXII (l950), p. 174.

6. Baum, G.; et. ao., eds. Corpus Reformatorum, Vol. XVI, Brunsvigae: 1877, letter 2612.

7. Corpus... letter 2609.8. João Calvino, Institutas da Religião Cristã (Grand Rapids: Nova Criação, l967),

1.1.1.9. Institutas, 1.3.1.10. Ibid., 1.3.1.11. Ibid., 1.6.1.12. B.C. Brundage, Império dos Incas (Norman: University of Oklahoma Press, l963),

p. 165; William Madsen, Cristo-Paganismo: Um Estudo do Sincretismo das Religiões Mexicanas (New Orleans: Middle American Research Institute; publications 19, l957), p. 119; Eric J. Thompson, História e Religião Maya (Norman: University of Oklahoma Press, l970); Don Richardson, Eternidade em Seus Corações (Ventura: Regal Press, l981).

13. Institutas, 1.14.1.14. Amy Gordon, "O Primeiro Esforço Missionário Protestante: Por que ele falhou?"

International Bulletin of Missionary Research (Enero, l984), p. 6.15. Institutas 1.10.3.16. Corpus, letter 2612.17. Institutas, 3.23.14.18. Ibid. 19. Ibid, 4.1.19; 4.1.10.20. Ibid. 4.2.11; 4.1.1.

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21. J. De Lery, Histoire d'um voyage fait em a terre de Brésil (Genebra, l975), pp. 64-65

22. Institutas, 4.1.10.23. Comentário, Mateus 23:15.24. Comentário, Efésios 4:11.25. Institutas, 4.3.4.26. Comentário, Mateus 28:19. 27. Ibid.28. Comentário, Isaías 2:3.29. Institutas, 4.3.4.30. Ibid., 4.3.4.31. Ibid., 4.1.1.32. Ibid., 4.20.3; 4.20.9.33. Institutas 3.7.5; 3.20.28; Comentário Isaías. 2:4; 12:1; 12:4-5; Daniel 12:3;

Zacarias. 8:20-23.34. Van den Berg, "Calvino." p. 168.35. Phillip Hudges, "João Calvino: Diretor de Missões", João Calvino, Profeta

Contemporâneo (ed. J. Hoogstra), (Grand Rapids: Baker Book House, l959); pp. 44-45.

36. Standford Reid, "Genebra de Calvino: Um Centro Missionário", The Reformed Journal Review Vol. XLII, Não. 3 (Sept-Dic., l983), p. 67

37. Bernardo Ramm, The Evangelical Heritage (Waco: Word books, l975), p. 133f.

PLANO DE ESTUDO PARA A LIÇÃO 4

1. Boas-vindas aos estudantes.2. Oração.3. Revisar as leituras e perguntas/respostas para o capítulo 3.4. Designar o estudante que exporá o capítulo 3 de De... Lutero para a próxima aula.5. Designar aos estudantes que vão expor na próxima aula sobre os capítulos 12-14

de História… Cristianismo.

ESBOÇO DE ESTUDO PARA O CAPÍTULO 3

Devido ao fato de a principal atividade de parte dos protestantes ter sido concretizada pelos huguenotes calvinistas, seria importante conhecer a teologia e missiologia calvinista do século XVI-XVII para entender a motivação dos huguenotes

A TEOLOGIA CALVINISTA

As Institutas da Religião Cristã. Lutero iniciou a Reforma, Calvino a sistematizou1. O conhecimento de Deus e o conhecimento do homem

-Calvino; os Tupinambás.2. A imagem de Deus e a depravação humana.

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-Bastian Pierrre; Amy Gordon; exemplo de Villagaignon.3. A autoridade da Palavra de Deus

-os mártires e sua confissão; tradução da Palavra de Deus.4. Salvação.

-os Tupinambás não escutaram uma apresentação verbal do Evangelho. Poderiam ser salvos?

5. A igreja verdadeira e a igreja falsa-a perseguição da igreja romana foi um sinal de sua apostasia.

6. Ofício dos ministérios da igreja-os cinco ofícios.

7. Relação entre denominações -Luterana, Reformada, Anglicana e Católica Romana.

8. Missão e evangelismo.-novos apóstolos e evangelistas, a congregação normal, o governo civil da proteção-os cristãos têm que amar a seu próximo e atraí-los a Cristo-o conflito entre a evangelização e a pirataria.

9. Credos confessionais-Confissão de Augsburgo; Confissão de França; Confissão de Genebra; Confissão Belga; Confissão de Coligny; Catecismo de Heidelberg

CONCLUSÃO

Houve um choque entre a ortodoxia das confissões reformadas e a práxis dos piratas e colonos protestantes. Os huguenotes aproveitaram as oportunidades oferecidas pelo mercantilismo e por onde sofreram as conseqüências negativas. O calvinismo do século XVI que chegou às praias das Américas não foi suficientemente dinâmico para ajustar-se às condições sociais e políticas para preservar-se e estender-se.

PERGUNTAS PARA O CAPÍTULO 3

1. Os huguenotes estão associados com a teologia de qual reformador?

2. Qual é o nome do livro mais importante escrito por João Calvino?

3. De que maneira os índios mostraram seu conhecimento de um Deus? Segundo a teologia de João Calvino, este conhecimento é suficiente para a salvação?

4. O que faltava aos tupinambás para conhecer ao Deus verdadeiro e ser-lhe fiel?

5. De que maneira Villegaignon confirmou a doutrina da depravação humana?

6. Como os três mártires mostraram sua devoção à Palavra de Deus?

7. Qual é a sua opinião quanto à evangelização dos

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Tupinambás pelos huguenotes?8. Segundo os reformados, como se pode distinguir entre a

igreja verdadeira e a igreja falsa? 9. Segundo Calvino, quantos ofícios de ministério

normalmente estão presentes na igreja? 10. Pergunta: Realmente havia denominações em 1557? 11. Como Calvino explica a relação entre a Grande Comissão

dada aos apóstolos e a responsabilidade dos membros da igreja?12. Como se chama a confissão de fé escrita pelos mártires

huguenotes em Coligny?13. O que podemos aprender, teologicamente falando, sobre a

teologia dos huguenotes, como foi praticada na expedição a Coligny?

RESPOSTAS PARA O CAPÍTULO 3

1. João Calvino2. Institutas da Religião Cristã. 3. Os índios tinham um conceito de Deus, porém, segundo Calvino é preciso

conhecer sua pobreza e miséria espiritual e pedir a Deus para obter a salvação. Deus tem dado sua Sagrada Escritura que revela a obra redentora de Deus.

4. Crer no conhecimento de Cristo e nas boas novas de salvação em Cristo.5. Não só Villegaignon, quem traiu aos seus companheiros da expedição, mas

cada pessoa mostra sua depravação humana quando rejeita a Deus.6. Estavam convencidos que deviam ser fiéis, até a morte, à Palavra de Deus.7. Opinião própria.8. A igreja verdadeira fielmente prega a Palavra de Deus, administra as

ordenanças e exerce a disciplina. A igreja falsa prática o contrário. 9. Dois: pastor e o mestre.10. Opinião própria.11. A Grande Comissão foi historicamente dada aos apóstolos, que também fizeram

discípulos que por sua vez são responsáveis por obedecer à Grande Comissão.12. A Confissão de Coligny.13. Opinião própria.

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CAPÍTULO 4

MARTINHO LUTERO COMEÇA A REFORMA NA EUROPA

Derk Oostendorp

O MUNDO DE MARTINHO LUTERO.

A VIDA DIÁRIA

Em 1500, na Europa, a vida diária dos camponeses e de muitos trabalhadores não era fácil. A maioria das pessoas era pobre. Havia alguns povos cujos cidadãos ganhavam mais dinheiro por meio de negócios e trabalhos de artesanato. O próprio Lutero nasceu em uma família de artesãos que tinha recursos para enviá-lo à universidade. Por todos os lugares o povo temia as enfermidades e a morte. Durante o século anterior houve uma enfermidade que se chama a peste, que podia repentinamente matar a muitos habitantes de um povo. Também havia temor diante de os Turcos, um inimigo não cristão que ameaçava conquistar toda a Europa. Em meio a estes terrores, a Igreja Católica era o único refugio.

Pergunta: Quais eram os temores d os camponeses e do povo comum?

A IGREJA CATÓLICA ROMANA

Em 1500 quase todos os habitantes da Europa eram membros da Igreja Católica Romana. O Papa em Roma era cabeça da igreja e tinha muito poder espiritual. Muitos se queixavam da corrupção da igreja. Falavam da imoralidade dos sacerdotes. Criticavam a avareza dos poderosos na igreja. Especialmente em Roma, os líderes da igreja buscavam enriquecer. Sem dúvida, o povo cria que a igreja tinha as chaves do reino do céu. Temia que fosse necessário passar muitos anos no purgatório para pagar a pena de seus pecados. Buscavam alívio na igreja. Para resolver seus problemas materiais e espirituais, oravam aos santos e à virgem.

Pergunta: Segundo o povo, qual era o maior poder que tinha a Igreja Católica Romana?

AS TENTATIVAS DE REFORMAR A IGREJA

Antes de Lutero houve várias tentativas de reformar a Igreja Católica. Um destes reformadores se chamou João Huss. Na cidade de Praga, Huss pregou a necessidade de tirar os abusos da igreja. Muitos alunos da universidade e a maior parte dos habitantes da cidade escutavam suas pregações com muito gosto. Um papa atacou a Huss. Huss respondeu que não era necessário obedecer a um papa indigno. Por fim os

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bispos que se reuniam no Concílio de Constança em 1415 condenaram a Huss como herege e o queimaram. Depois da morte de Huss, alguns seguiram suas idéias, porém, estas idéias não tinham muita força no tempo de Lutero. Muitos se lembravam de que Huss era um herege famoso. Um grupo que queria reformar a igreja era os irmãos da vida comum. Estes irmãos organizaram escolas para ensinar aos leigos a viverem com saúde. Eles gostavam de meditar em Cristo. Um dos irmãos escreveu o famoso livro, A Imitação de Cristo. Muitos cristãos no tempo de Lutero estudaram este livro com alegria. O livro ensinava que as boas obras nos salvam, porém, por sua vez dava muita ênfase em Cristo. Este livro preparou o caminho para Lutero. Muitos que amavam os ensinamentos deste livro também chegaram a escutar com gosto as mensagens que Lutero pregava.

Pergunta: O nome do Concílio que em 1415 condenou a João Huss como herege e o queimou.

O HUMANISMO

Antes de Lutero alguns redescobriram os antigos escritos dos famosos latinos e gregos e os estudavam com muito cuidado. Este estudo foi chamado de Humanismo. Para alguns estes escritos eram motivo de abandonar a fé cristã e por toda a sua confiança em sua própria razão. Porém, muitos dos humanistas eram cristãos de boa qualidade. No tempo de Lutero o mais famoso era Desidério Erasmo. Erasmo publicou o Novo Testamento em grego para que os eruditos pudessem estudá-lo com mais cuidado. Também publicou textos de alguns pais antigos da igreja. Assim todos podiam ver que a Igreja Romana havia deixado as práticas destes pais fundadores da Igreja Católica. Erasmo criticava os abusos dos líderes da igreja e animava aos cristãos a viverem honestamente. Por algum tempo Erasmo defendeu algumas das reformas de Lutero. Vários dos seguidores de Erasmo chegaram a ser reformadores depois de Lutero. Desta maneira Erasmo preparou o caminho para a Reforma que Lutero realizou.

Pergunta: O nome do famoso humanista que viveu nos tempos de Martinho Lutero.

AS NAÇÕES MODERNAS

Perto do ano 1500 vários países tinham uma forma de nações poderosas. Os ingleses tinham orgulho de seu idioma e de seu país. Os franceses tinham orgulho dos seus. Os hispanos igualmente. Nestes três países reis poderosos estabeleceram reinos mais poderosos que aqueles que seus pais haviam tido. Os reis católicos, Fernando e Isabel, tornaram a Espanha mais forte do que a Inglaterra ou França. Os alemães não tinham um rei poderoso, porém tinham orgulho de seu idioma e de sua terra. Lutero pregava que Roma estava roubando aos alemães. Muitos alemães pensavam que Lutero tinha razão e isto lhes animava a seguir a reforma de Lutero. O nacionalismo não foi a causa da reforma. Sem dúvida, o nacionalismo dos alemães ajudou a reforma a ganhar força. Um príncipe alemão protegeu a Lutero contra um imperador hispano e um papa italiano. Este príncipe podia fazer isso porque o rei da Espanha temia o poder político do papa e dos

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reis da França e da Inglaterra. Vários príncipes alemães apoiavam Lutero e muita gente da Alemanha chegou a ser evangélica. Por outro lado, o rei da Espanha conseguiu destruir aos poucos evangélicos da Espanha que queriam aceitar os novos ensinos de Lutero. A história da reforma tem muito a ver com a história das nações modernas. Pergunta: Qual fator cultural ajudou Lutero a estabelecer uma igreja não romana?

A IMPRENSA

Johannes Gutenberg, 1456, publicou a Bíblia Vulgata. Alguns anos antes do nascimento de Lutero já se imprimiam livros. Desta maneira era muito mais fácil produzir grandes quantidades de livros. Lutero escreveu muitos livros em alemão e em latim. Por meio de livros suas idéias penetraram em todos os países da Europa. Em alguns países muitos se converteram por causa destes livros. Os livros também entraram na Espanha e América Latina. Nestes reinos foram queimados os escritos de Lutero porque o papa e o imperador os condenaram como heresia. Sabemos que entrara na ilha de Espanhola também, visto que os relatos da história se referem à queima de livros luteranos ali. É claro que Deus preparou o caminho para a reforma de Lutero de muitas maneiras.

Pergunta: Qual o instrumento mediante o qual as idéias de Lutero se dispersaram pela Europa?

O CAMINHO ESPIRITUAL DE MARTINHO LUTERO

O MONGE

Martinho Lutero nasceu em 1483 na Alemanha. Seu pai pagou seus estudos porque queria que seu filho fosse advogado. Um dia em 1505 em meio a uma forte tormenta Martinho prometeu a Santa Ana que se tornaria monge se ela o salvasse. Martinho cumpriu essa promessa ainda que seu pai tenha ficado com muita raiva. A razão principal que levou Lutero a tornar-se monge foi o interesse em sua própria salvação. Queria usar os meios de salvação que a Igreja Católica lhe oferecia. O meio mais seguro para ganhar a salvação lhe parecia ser a vida monástica. Como monge Lutero não tinha paz. Temia a Deus como um juiz terrível que seguramente iria castigá-lo. A igreja o ensinara a fazer boas obras e a confessar seus pecados diante de um sacerdote para justificar-se diante de Deus. Lutero se esforçou para cumprir isso. Porém, não encontrou paz. Tinha um sentimento muito profundo de sua própria pecaminosidade e se deu conta de que o pecado era muito mais poderoso do que ele. O conselheiro espiritual de Lutero lhe recomendou que lesse as obras dos místicos. Os místicos diziam que bastava amar a Deus, visto que tudo mais era conseqüência deste amor. A princípio, Lutero pensava que os místicos lhe haviam ensinado o caminho da salvação. Porém, em pouco tempo Lutero se deu conta de que não podia amar a Deus, que era o juiz terrível.

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Pergunta: Em que ano Martinho Lutero prometeu a Santa Ana que se tornaria monge se ela o salvasse?

O PROFESSOR DA BÍBLIA

O supervisor espiritual julgou que Lutero receberia ajuda em sua luta com suas dúvidas ao estar ocupado com o ensino. Ordenou Lutero a ditar cursos sobre a Bíblia na Universidade de Wittenberg. Em seus estudos Lutero pensava muito na justiça de Deus. Por fim, descobriu que Rm 1.17 tinha uma mensagem surpreendente ao dizer “o justo viverá pela fé”. A justiça de Deus não significa que Deus é o juiz que castiga aos pecadores. Aquele que vive pela fé tem a justiça de Deus porque Deus lhe dá Sua justiça gratuitamente por causa da obra de Cristo. Deus perdoa aos que crêem em Cristo e os considera como justos. Ao descobrir esta verdade bíblica, Lutero não temia mais a Deus como um juiz terrível, mas sim passou a amá-lo como Seu Salvador.

Pergunta: Qual foi o versículo bíblico que foi chave na conversão de Martinho Lutero? Que parte do versículo em especial?

Que verdade foi redescoberta por Martinho Lutero neste versículo?

AS 95 TESES CONTRA AS INDULGÊNCIAS

Muitos dizem que a Reforma começou em 31 de outubro de 1517. Perto de Wittenberg o monge chamado Tetzel vendia indulgências. Pregava que o papa perdoava aos que compravam estas indulgências. Muitos compravam as indulgências porque pensavam que desta maneira podiam resgatar suas próprias almas ou as almas de seus entes queridos dos tormentos do purgatório. Lutero entendeu que a Bíblia não ensinava nada acerca das indulgências e queria afirmar diante de todo o povo que a venda de indulgências se baseava em muitas idéias falsas. Lutero cravara 95 teses contra as indulgências na porta da catedral de Wittenberg para parar a venda. Em poucos meses toda a Alemanha podia ler as idéias de Lutero, visto que por toda parte se vendiam livrinhos com as 95 teses. Muitos aceitaram que Lutero tinha razão. A Reforma da igreja começou.

Pergunta: Qual foi a data (dia, mês e ano) em que Martinho Lutero cravou as noventa e cinco teses contra as indulgências na porta da catedral de Wittenberg?

LUTERO ROMPE COM O PAPA

Durante três anos várias autoridades tentaram calar a Lutero. O próprio Lutero estudou mais e escreveu livros sobre outros temas. Uma vez quando um professor dizia que Lutero cria nas idéias heréticas de João Huss, Lutero se atreveu a afirmar que Huss tinha razão em alguns pontos. Por fim, o papa entendeu que ele havia perdido muitos ganhos e que as idéias de Lutero rompiam com a autoridade da igreja e do papa. Em 1520 o papa enviou uma bula para condenar a Lutero. Lutero também ficou sabendo que não podia reconhecer a autoridade da Igreja Romana. Ao receber a bula, ele a queimou

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publicamente. Lutero se viu forçado a separar-se da Igreja Católica Romana.

Pergunta. Em que ano Martinho Lutero se separou da Igreja Católica Romana?

LUTERO DIANTE DE CARLOS V

Carlos V era o jovem imperador da Alemanha, além de ser rei da Espanha. Ainda que não quisesse submeter-se à autoridade do papa, Carlos V queria defender a Igreja Católica. Fez com que Lutero comparecesse diante dele na dieta do Império, reunida em Worms em 1521. Disseram a Lutero: “Te retratas, ou não?” Diante do imperador, Lutero respondeu: “Não posso nem quero retratar-me de coisa alguma, pois ir contra a consciência não é justo nem seguro. Deus me ajude. Amém”. Carlos V queria condená-lo à morte, porém, o príncipe de Lutero, Frederico da Saxônia, o protegeu contra a ira de Carlos V. Ainda que Carlos V não pudesse realizar a sua vontade na Alemanha, decidiu não deixar esta heresia crescer na Espanha nem entrar em seus novos reinos na América. Esta decisão tornou a entrada da fé evangélica na América Latina quase impossível durante três séculos.

Pergunta: Que disse Lutero ao imperador Carlos V quanto a suas crenças e seus escritos? Qual foi a resposta de Carlos V frente à Reforma?

OS ENSINAMENTOS DE LUTERO

O CREDO APOSTÓLICO

Lutero não rejeitou todas as doutrinas da Igreja Católica Romana. Lutero reconheceu que a igreja romana cria corretamente em muitas das doutrinas básicas sobre Deus o Pai e sobre a obra de Cristo e do Espírito Santo. Lutero seguiu o costume de ensinar aos membros da igreja o Credo Apostólico, o Pai Nosso e os Dez Mandamentos. Seu catecismo para as crianças explica isto. Porém, Lutero estudou todas estas doutrinas à luz de sua experiência de encontrar a salvação somente em Cristo. Viu a necessidade de voltar às doutrinas e às práticas que se encontram na Bíblia.

Pergunta: Lutero não rejeitou todos os ensinamentos da Igreja Católica Romana. Quais ensinamentos ele cria serem corretos e como os avaliou?

SOMENTE CRISTO

Lutero encontrou a graça de Deus em Cristo. Deus enviou a Cristo para reconciliar-se com o homem pecador. Pela morte de Cristo na cruz somos justificados. Em Cristo recebemos o perdão de nossos pecados. Visto que encontramos toda a salvação em Cristo, não devemos recorrer à virgem nem aos santos para pedir-lhes ajuda.

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Pergunta: O que significa a doutrina “somente Cristo”?

SOMENTE A FÉ

Não podemos ganhar a salvação por meio das boas obras. Esta é a mensagem bíblica e Lutero experimentou que estava certa. Fez grandes esforços para fazer boas obras, porém, viu que o pecado ainda manchava as suas boas obras. Sentiu que não podia amar a Deus e ao próximo perfeitamente como Deus manda. Escutou de novo a mensagem dos apóstolos de que somos salvos somente quando temos fé em Cristo e recebemos o perdão como um dom que Cristo nos dá. Desta maneira não se rejeitava as boas obras, porém as boas obras são o fruto da salvação que Cristo nos dá. Por meio delas mostramos nosso agradecimento a Deus e provamos que a fé em Cristo é a verdadeira fé.

Pergunta: Qual é a importância da descrição “somente” em somente a fé.

LEI E EVANGELHO

Lutero pensou muito na pergunta: Por que Deus nos dá a lei? Lutero descobriu que não podemos salvar-nos por meio de cumprir a lei. Quando Cristo nos manda amar ao próximo com todo o coração, experimentamos que não podemos cumpri-lo perfeitamente. Então, o propósito da lei é fazer-nos reconhecer os nossos pecados. A lei nos empurra a buscarmos a salvação. O Evangelho nos prega que a salvação se encontra em Cristo. A igreja sempre tem que pregar a lei e o Evangelho juntos. Desta maneira, por meio da lei o pecador entende melhor a riqueza da graça de Cristo.

Pergunta: Segundo Lutero, qual é a relação entre a lei e o Evangelho?

SOMENTE A BÍBLIA

Quando Lutero ensinou que o cristão somente era salvo por meio da fé em Cristo, os católicos responderam que Lutero não aceitava a doutrina da igreja. Lutero respondeu que a Bíblia é a autoridade máxima para a igreja. Se a Bíblia nos ensina uma doutrina, temos que crer nela, mesmo que os papas e os mestres da Igreja Romana não a ensinem. Para Lutero, a Bíblia é poderosa. Por meio da Bíblia Deus nos encontra e Deus nos dá a Cristo. A Bíblia é para todo cristão e não somente para os sacerdotes. Lutero dedicou muito esforço para traduzir a Bíblia em alemão para que todo o povo escutar Deus falando-lhe em seu próprio idioma.

Pergunta: Segundo Lutero, o que tem mais autoridade do que a igreja?

A TRADICÃO

A Igreja Católica Romana sabia que muitas de suas práticas e doutrinas não se encontravam na Bíblia, porém, eles disseram que a tradição da igreja tinha autoridade

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igual a da Bíblia. Lutero reconheceu que as tradições da igreja podiam ser boas. Ele mesmo estava disposto a aceitar todas as práticas tradicionais que a Bíblia não proibia. Mais tarde, Calvino rejeitaria mais das práticas tradicionais. Sua base era que devemos aceitar somente as práticas tradicionais que têm apoio na Bíblia. Muitos evangélicos seguiram o ensinamento de Calvino com respeito às tradições. Assim, hoje as igrejas luteranas têm algumas práticas católicas que outras igrejas evangélicas não têm.

Pergunta: Qual era a diferença entre Lutero e Calvino quanto ao que é permitido?

TODOS OS CRISTÃOS SÃO SACERDOTES

A Igreja Católica ensinava que os cristãos somente podiam receber a salvação por meio da igreja e os sacramentos. Assim o sacerdote é o mediador entre o membro da igreja e Cristo. Lutero rejeitou esta doutrina. Segundo Lutero, os pastores podem ajudar aos cristãos por meio da pregação e os sacramentos e os conselhos pastorais. Sem dúvida, todos somos sacerdotes de Cristo. Todo cristão tem uma relação direta com Cristo e recebe a promessa de perdão e salvação diretamente da Palavra de Deus. Todos os cristãos – não somente o clero – devem servir a Cristo.

Pergunta: Por que a igreja luterana era uma igreja nacional?

A IGREJA

Quando um príncipe alemão seguiu a Lutero, todos os cidadãos tinham que aceitar os novos ensinamentos também. Lutero considerou que todos eram membros da igreja. Para ele, a tarefa da igreja era ajudar a todos estes membros a se tornarem cristãos verdadeiros por meio da pregação e por meio da administração dos sacramentos. Não usou o latim, mas sim fez todo o culto em alemão para que todos entendessem. Lutero escreveu muitos hinos e encorajou as congregações a cantá-los. Aconselhou ao príncipe a nomear um supervisor para vigiar aos pastores e para dirigir os assuntos eclesiásticos em seu reino. Desta maneira a igreja luterana estava sob o poder do estado em vários países.

Pergunta: Por que a igreja luterana era uma igreja nacional?

OS SACRAMENTOS

A igreja católica tinha sete sacramentos. Lutero aceitou somente dois como sacramentos estabelecidos por Cristo: o batismo e a Santa Ceia. Defendeu o batismo de crianças. Reconheceu a necessidade da fé para o batismo, porém, cria que no batismo de filhos de cristãos, Deus fez uma promessa para dar a fé que seria necessária. Lutero não aceitou o ensino dos católicos de que o pão podia mudar em sua substância em o corpo de Cristo. Sem dúvida, Lutero pensava que de alguma maneira o corpo de Cristo estava presente quando a igreja celebrava a Santa Ceia. Sobre estes dois pontos se levantaram muitas discussões entre os evangélicos mais tarde. Sem dúvida, quase todas as igrejas

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evangélicas têm aprendido de Lutero que a salvação vem somente pela fé em Cristo e que a Bíblia é a autoridade máxima na igreja.

Pergunta: Explique a posição luterana quanto à Santa Ceia.

OS CONFLITOS DE LUTERO

A REVOLUÇÃO DOS CAMPONESES

A vida dos camponeses na Alemanha ia de mal em pior. Houve várias rebeliões antes da Reforma. No ano de 1525 os camponeses no sul da Alemanha apresentaram suas queixas diante dos príncipes outra vez. Pensavam que Lutero devia defendê-los. Lutero aconselhou aos príncipes a darem atenção às queixas. Os príncipes não escutaram as queixas. Tomas Muntzer, que antes era companheiro de Lutero, pregou que os que eram nascidos de novo deviam pegar em armas para trazer o reino de Deus. Os camponeses fizeram guerra contra os príncipes. Frente a esta rebelião, Lutero escreveu que os camponeses deviam obedecer a seus príncipes e que os príncipes tinham todo o direito de matar os rebeldes para manter a ordem no estado. Os resultados desta guerra foram mui tristes. Os príncipes mataram mais de 100.000 camponeses. Os príncipes acusaram Lutero de haver fomentado a rebelião campesina e os príncipes se tornaram católicos mais convictos. Os camponeses criam que Lutero os havia traído e voltaram à Igreja Católica ou se afiliaram aos anabatistas.

CONTRA ERASMO

A princípio, Erasmo, o humanista, defendia a reforma de Lutero. Mas não gostou que Lutero tivesse rompido com a Igreja Católica. Erasmo apoiou uma reforma moral, porém, não viu a necessidade de uma revolução eclesiástica. Não estava de acordo com Lutero que a vontade humana é escrava do pecado até que o Espírito Santo lhe dê poder de crer em Cristo. Lutero respondeu que a Bíblia ensina que estamos mortos no pecado até que nasçamos de novo pelo Espírito. Depois deste conflito Erasmo não pode mais defender a Lutero e muitos humanistas deixaram de apoiar a reforma da igreja que Lutero pregava.

CONFLITO SOBRE A SANTA CEIA

Na Suíça Zwinglio encabeçou a reforma da igreja de Zurique. Ele aceitou muitos ensinamentos de Lutero, porém, não compartilhava sua interpretação da Santa Ceia. Para Zwinglio a Santa Ceia é especialmente um ato de fé no qual os cristãos recordam a morte de Cristo. As palavras de Cristo, “Este é meu corpo”, querem dizer, “O pão significa meu corpo”. Em 1529 Lutero e Zwinglio se reuniram para buscar a unidade das novas igrejas evangélicas. Estavam de acordo em 13 pontos básicos, mas eles não estavam de acordo acerca da Santa Ceia. Lutero insistiu que Cristo nos ensina que Seu corpo humano está presente de alguma maneira no pão. Lutero rejeitou a Zwinglio e o considerou herege.

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Pergunta: Qual era a posição de Zwinglio quanto à Santa Ceia?

PLANO DE ESTUDO PARA A LIÇÃO 5

1. Boas-vindas aos alunos.2. Oração.3. Revisar as leituras e perguntas/respostas para o capítulo 4.4. Designar o estudante que será responsável para o capítulo 4 em De... Lutero para

a próxima aula.5. Designar os estudantes que exporão na próxima aula sobre os capítulos 15-17 de

História… Cristianismo.

ESBOÇO DE ESTUDO PARA O CAPÍTULO 4

O MUNDO DE MARTINHO LUTERO

A VIDA DIÁRIA: Um mundo com muitos temores: pobreza, peste, guerra, inquisiçãoA IGREJA CATÓLICA ROMANA: Havia muitas queixas contra a ICR, sem dúvida, ela era dona da salvação.TENTATIVAS DE REFORMAR A IGREJA. Pedro Waldo e os Valdenses;João Huss (condenado pelo Concílio de Constança, 1415)O HUMANISMO. Erasmo de Rotterdam publicou o NT em grego. Interesse nos livros clássicos e dos pais da igrejaNACIONALISMO. O poder da Espanha era tremendo. Nações satélites começaram a sentir o nacionalismoA IMPRENSA. Johannes Gutenberg, 1456, publicou a Bíblia Vulgata.

O CAMINHO ESPIRITUAL DE MARTINHO LUTERO

O MONGE. Lutero nasceu em 1483. Em 1505, durante uma tormenta, prometeu a Santa Ana ser monge. Lutero estava inquieto quanto ao seu destino final, temor da morte. Confessou muito, sem paz.O PROFESSOR DA BÍBLIA. Era professor da Bíblia na universidade de Wittenberg. Por seus estudos de Romanos chegou a entender que a salvação é pela fé nos méritos de Cristo e não pelas nossas obras meritórias (Rm 1.17).AS 95 TESES CONTRA AS INDULGÊNCIAS. João Tetzel e as indulgências do papado. 31 de outubro, 1517, catedral de Wittenberg.LUTERO ROMPE COM O PAPA. Leão X condenou Lutero (1520) e Lutero queimou a bula em público.LUTERO DIANTE DE CARLOS V. “Ainda que Carlos V não pudesse realizar sua vontade na Alemanha, decidiu não deixar esta heresia crescer na Espanha nem entrar em seus novos reinos na América. Esta decisão tornou a entrada da fé evangélica na

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América Latina quase impossível durante três séculos.

OS ENSINAMENTOS DE MARTINHO LUTERO

O CREDO APOSTÓLICO. Lutero afirmou o credo apostólicoOS 4 SOLOS. Somente a fé, a graça, a Bíblia e Cristo.LEI E EVANGELHO. A lei mostra nossa necessidade de salvação e o Evangelho anuncia a salvação.A TRADICÃO, A IGREJA, OS SACRAMENTOS. Lutero permitiu o que a Bíblia não proibia.TODOS OS CRISTÃOS SÃO SACERDOTES. Todos os crentes, não só o clero, tem que servir a Deus.

OS CONFLITOS DE MARTINHO LUTERO

OS CAMPONESES. Lutero afirmou o direito das autoridades civis de usar a força para responder à rebeldia.CONTRA ERASMO. Erasmo não quis separar-se da ICR.SANTA CEIA. Lutero afirmou que Cristo está presente nos elementos da Santa Ceia.

PERGUNTAS PARA O CAPÍTULO 4

1. Quais eram os temores dos camponeses e do povo comum?2. Segundo o povo, qual era o poder maior que a Igreja Católica Romana tinha?3. O nome do Concílio que em 1415 condenou o João Huss como herege e o queimou. 4. O nome do famoso humanista que viveu nos tempos de Martinho Lutero.5. Qual fator cultural ajudou Lutero a estabelecer uma igreja não-romana?6. O instrumento pelo qual as idéias de Lutero se dispersaram pela Europa.7. A seguinte asseveração é verdadeira ou falsa: O racionalismo alemão foi um

fator importante para a Reforma8. Em que ano Martinho Lutero prometeu a Santa Ana que se tornaria monge se

ela o salvasse? 9. Qual foi o versículo bíblico que foi chave na conversão de Martinho Lutero? Que

parte do versículo em especial?10. Que verdade foi redescoberta por Martinho Lutero neste versículo?11. Qual é a data (dia, mês e ano) em que Martinho Lutero cravou as noventa e

cinco teses contra as indulgências na porta da catedral de Wittenberg. 12. Em que ano Martinho Lutero se separou da Igreja Católica Romana?13. O que disse Lutero ao imperador Carlos V quanto às suas crenças e seus

escritos?14. Qual foi a resposta de Carlos V frente à Reforma?15. Lutero não rejeitou todos os ensinamentos da igreja Católica Romana. Quais

ensinamentos ele cria serem corretos e como os avaliou?

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16. Qual é a importância da descrição “somente” em somente a fé?17. Segundo Lutero, Qual é a relação entre a lei e o Evangelho? 18. Segundo Lutero, o que tem mais autoridade que a igreja? 19. Qual era a diferença entre Lutero e Calvino quanto ao que é permitido?20. O que significa que “todos os cristãos são sacerdotes”?21. Por que a igreja luterana era uma igreja nacional?22. Explique a posição luterana quanto à Santa Ceia.23. Qual era a posição de Zwinglio quanto à Santa Ceia?

RESPOSTAS PARA O CAPÍTULO 4

1. A pobreza, a peste, e as guerras.2. A crença que a igreja tem as chaves do céu, ou seja, que a salvação é dada pela igreja.3. Concílio de Constança em 1415.4. Desidério Erasmo.5. O nacionalismo alemão.6. A imprensa, inventada por Johannes Gutenberg.7. Verdadeira.8. 1505.9. Romanos 1.17, “o justo viverá pela fé”.10. O crente que vive pela fé confia somente nas promessas e nas obras meritórias

de Jesus Cristo para a salvação. A salvação dada por Cristo não é ganha por boas obras nem pode ser comprada por indulgências.

11. 31 de outubro de 1517.12. 1520.13. “Não posso nem quero retratar-me de coisa alguma, pois ir contra a consciência

não é justo nem seguro. Deus me ajude. Amém”.14. Quis matá-lo, porém, não pode devido à intervenção do príncipe Frederico de

Saxônia que o protegeu. Carlos V proibiu os ensinamentos de Lutero na Espanha e nas Américas.

15. Lutero ficou com o Credo Apostólico, o Pai Nosso e os Dez Mandamentos. Ele avaliou todas as doutrinas segundo a Bíblia.

16. Só Cristo pode salvar-nos, não devemos recorrer à virgem Maria nem aos santos para pedir sua ajuda.

17. A lei nos condena pelo pecado e nos faz reconhecer a necessidade de salvação. O Evangelho nos diz como sermos salvos.

18. A Bíblia.19. Lutero aceitava as práticas que a Bíblia não proibia. Calvino aceitava as práticas

que tinham apoio na Bíblia.20. Todos os cristãos têm uma relação direta com Deus por meio de Cristo. Cada

cristão deve servir a Deus segundo sua vocação na igreja.21. Todos os habitantes da província eram membros da religião do príncipe. O estado

tinha um conselheiro para dirigir os assuntos eclesiásticos em sua província.22. Lutero pensava que de alguma maneira o corpo de Cristo estava presente quando

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a igreja celebra a Santa Ceia. A posição de Calvino era que Cristo está presente na Santa Ceia pelo Espírito Santo e pela Palavra de Deus (a Bíblia).

23. A Santa Ceia é uma recordação da morte de Cristo.

CAPÍTULO 5

JOÃO CALVINO ORGANIZA A REFORMA

Derk Oostendorp

CALVINO REFORMA GENEBRA PARA CRISTO

A VIDA DE CALVINO

João Calvino nasceu em um povoado da França em 1509. Seu pai trabalhava para líderes da Igreja Católica. Assim Calvino tinha os recursos para estudar nas melhores universidades da França. Seu pai queria que Calvino fosse advogado. Mas quando seu pai morreu Calvino deixou de estudar a jurisprudência para dedicar-se a estudos humanistas. Escreveu um livro em 1532 sobre o famoso filósofo romano, Sêneca. Calvino não nos diz muito acerca de sua conversão, porém, em 1534 já havia se convencido que Lutero tinha razão contra a Igreja Católica. Neste ano o rei da França se irou contra os luteranos e Calvino teve que buscar exílio na Suíça. Calvino viu que havia muita confusão entre os franceses que deixaram a Igreja Católica. Ele também queria que o rei entendesse os ensinamentos luteranos. Portanto, em 1536 Calvino publicou o livro, As Institutas, para explicar as doutrinas evangélicas claramente.

Pergunta: Qual é o nome do país onde João Calvino nasceu?

CALVINO ENSINA EM GENEBRA

Os cidadãos de Genebra escutaram a pregação de um zeloso evangélico, Farel, e toda a cidade decidiu deixar a Igreja Católica. Farel sabia que não tinha a capacidade de levar a cabo a reforma de Genebra. Aproveitou uma visita de Calvino para rogar-lhe a ajudar com a obra. Calvino não queria, porém, não conseguiu resistir à maldição de Farel: Deus amaldiçoe teu descanso, e a tranqüilidade que buscas para estudar, se diante de uma necessidade tão grande te retiras, e te negas a prestar socorro e ajuda. Contra seus desejos Calvino começou sua obra em Genebra em 1536. Sua obra era pregar e ensinar a palavra de Deus. Logo havia conflitos porque os cidadãos de Genebra não gostaram do zelo de Calvino para reformar a igreja. Em 1538 o governo de Genebra baniu a Calvino. Depois de três anos, muitos cidadãos e o governo se deram conta de que a reforma não marchava bem em Genebra. Em 1541 o governo convidou a Calvino para voltar a dirigir a reforma. Calvino não tinha muita vontade de voltar, mas aceitou porque cria que Deus estava chamando-o para trabalhar em Genebra. Calvino voltou a ser pregador e mestre da Palavra de Deus em Genebra. Pregou várias vezes a cada

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semana. Deus aulas acerca da Bíblia para os que queriam se tornar pastores. Deu conselho como pastor. De seu posto como pastor principal de Genebra, Calvino influenciou muito em toda a vida da cidade. Formou uma igreja que tinha conhecimento dos ensinamentos bíblicos. Fomentou a obra pastoral de maneira que em Genebra se fazia um esforço sério para viver segundo os mandamentos de Cristo. Quando o governo buscava sua ajuda, Calvino lhes aconselhava. Em seus conselhos, Calvino promova a justiça social para que todos os cidadãos pudessem melhor viver. Um visitante disse que a cidade de Genebra era uma escola de Cristo por causa da obra de Calvino. Quando Calvino morreu em 1564, já havia reformado toda a cidade.

Pergunta: Por quantos anos Calvino esteve exilado de Genebra?

A ORGANIZAÇÃO DA IGREJA

Calvino levou muito seriamente a organização da igreja. Ele acreditava que todos os cidadãos deviam ser membros de uma só igreja. Por isso, não estava de acordo com os anabatistas de que era necessário fazer uma separação entre o estado e a igreja. O estado deve proteger a igreja e assegurar que haja pregação da Palavra de Deus. Porém, Calvino viu que era necessário que a igreja tivesse a liberdade de dirigir sua vida. Para Calvino, os pastores tinham um ofício essencial na igreja. Somente os pastores tinham o direito de pregar e administrar os sacramentos na igreja. Calvino formou uma junta de pastores na quais todos os pastores se reuniam a cada semana. Nesta junta os pastores poda estudar problemas de doutrinas e cuidado pastoral. Quando uma igreja precisava de um novo pastor, a junta de pastores fazia uma recomendação e a igreja o recebia por votação de todos os membros. Houve outra junta que se chamou o conselho. Esta junta tomava as decisões para a igreja de Genebra. No Conselho havia presbíteros, governantes e pastores. Os governantes tinham a responsabilidade de ajudar aos pastores com o cuidado pastoral. Cada presbítero tinha um distrito da cidade no qual ele tinha que visitar a todos os lares regularmente. Além disso, a igreja nomeou diáconos em Genebra. A tarefa especial dos diáconos era atender às necessidades dos pobres e dos enfermos.

Pergunta: O nome da junta que reunia os presbíteros, governantes e pastores.

LUTAS ESPIRITUAIS

Nem todos os cidadãos de Genebra estavam contentes com a presença de Calvino. Muitas vezes havia conflitos entre o conselho e o governo de Genebra. O conselho queria pôr em execução as regras cristãs. Às vezes, ele colocava sob disciplina até os líderes do governo que não obedeciam a estas regras. Por isso, muitos lutavam contra Calvino e anelavam uma igreja que os deixasse em paz para fazer tudo o que quisessem.

Também havia lutas acerca de doutrina. Alguns foram banidos porque não queriam ensinar as doutrinas que Calvino considerava bíblicas. O conflito mais famoso foi

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contra Serveto. Serveto não aceitou a doutrina da trindade. Cria na doutrina que dizia que Cristo não era igual ao Pai e que não era eterno. Outros governos haviam condenado a Serveto como herege. Serveto visitou Genebra, e o governo da cidade o prendeu. Em juízo, Calvino demonstrou que Serveto era herege. O governo queimou a Serveto. Por causa destas lutas, muitos chamam Calvino de o tirano de Genebra. Calvino não era tirano, mas sim um pregador que tinha muito poder. Porém, esta história nos mostra a necessidade de separação entre o estado e a igreja.

Pergunta: Serveto não aceitou a doutrina da __________. Pelo conflito e morte de Serveto, que diz o autor que devia ser mudado?

UMA UNIVERSIDADE

Em 1559 Calvino fundou a universidade de Genebra para preparar aos futuros pastores e líderes da sociedade. O próprio Calvino havia aprendido a entender a Bíblia muito mais claramente por causa de seus estudos humanistas na universidade. Pensou que o porvir da igreja e da cidade seria mui triste se os líderes não recebessem uma boa educação. Nesta universidade muitos exilados de outros países aprenderam as doutrinas de Calvino e voltaram aos seus lares para fundar igrejas calvinistas.

Pergunta: O que Calvino usou para treinar aos líderes?

CALVINO ESCREVE UMA TEOLOGIA SISTEMÁTICA.

AS INSTITUTAS

Quando Calvino escreveu As Institutas da Religião Cristã em 1536, o livro não era muito grande, mas já continha uma exposição clara de muitos temas da teologia. Durante sua vida Calvino continuou trabalhando neste livro. Fez 04 edições, a última em 1559. Escreveu em latim e cada vez fez uma tradução em francês. Os 4 volumes são divididos em 4 partes: Deus o Pai, Deus o Filho, Deus o Espírito Santo e a Igreja.

Ao mesmo temo, Calvino escrevia comentários e pregava sobre muitos livros da Bíblia. Os comentários de Calvino cobrem toda a Bíblia, com exceção do livro de Apocalipse.

Escreveu outros livros para defender sua teologia contra os que atacavam seus ensinos. Desta maneira o livro “As Institutas” se tornou a melhor exposição sistemática da teologia dos reformadores. Este livro influenciou muito o pensamento de muitos pastores e igrejas. Foi usado durante muitos anos no ensino de teologia em várias universidades. Ainda vale a pena estudá-los com cuidado.

Pergunta: Quais são os temas principais de As Institutas da Religião Cristã? Qual foi o único livro da Bíblia sobre o qual Calvino não escreveu um comentário?

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O CONHECIMENTO DE DEUS

Para Calvino o mais importante é conhecer a Deus corretamente. Da Bíblia se aprende que Deus é santo, justo e todo-poderoso. O homem deve reconhecer suas falhas ao pensar neste Deus. Porém, a grandeza de Deus é que este Deus justo e santo também ama de tal maneira que nos deu a Seu Filho para salvar-nos. O homem que o conhece deve dedicar toda a sua vida para dar graças a Deus. Calvino estava consciente o tempo todo que vivia diante deste Deus santo que nos ama.

A PALAVRA DE DEUS

Calvino reconheceu o problema com respeito à autoridade da Bíblia. A Igreja Católica afirmava que se podia confiar na Bíblia visto que a igreja confessava que era a verdade. Porém, a Bíblia é o fundamento da igreja. Portanto, é necessário reconhecer que a Bíblia tem autoridade porque Deus fala nela. O Espírito testifica em nosso coração que é certo que Deus fala na Bíblia. Segundo Calvino, não se pode separar a Bíblia e o Espírito Santo. Contra os que tinham orgulho de revelações diretas do Espírito, Calvino ensinou que a obra mais importante do Espírito era fazer-nos entender claramente a mensagem de Deus na Bíblia. Na Bíblia há desenvolvimento, porém, tanto o Antigo Testamento como o Novo Testamento fala a verdade de Deus. O Novo Testamento é mais completo porque diz claramente que Cristo nos salva para a vida eterna. Esta mensagem se encontra no Antigo Testamento também, porém, de uma forma mais obscura.

A OBRA DO ESPÍRITO SANTO

Muitos chamam Calvino de “o teólogo do Espírito Santo”. A obra do Espírito Santo é entrar em nosso coração para dar-nos a fé e para unir-nos a Cristo. Calvino considerava seriamente os textos que ensinam o poder do pecado no homem. A Bíblia diz que o pecador está morto (Ef 2.1) em seu pecado e que tem que nascer de novo (Jo 3.3). Calvino insiste em que a vontade do pecador está escravizada ao pecado de tal maneira que não pode ter fé a menos que o Espírito Santo a mude. O Espírito nos faz nascer de novo. Esta obra é muito misteriosa porque não podemos explicar com Ele a faz. Sem dúvida, devemos crer nisso porque a Bíblia ensina assim. Além disso, o Espírito ajuda aos convertidos a viverem de maneira sã.

A SANTIFICAÇÃO

Calvino aceita tudo o que Lutero ensina acerca da justificação somente pela fé em Cristo. Mas Calvino ensina que os convertidos recebem duas bênçãos de Cristo: a justificação e a santificação. Não devemos confundir as duas porque assim podemos cair no erro de pensar que por meio da santificação o cristão pode ganhar uma parte de sua salvação. Sem dúvida, é necessário reconhecer que quando Deus justifica ao pecador, também o santifica. A santificação é um processo que dura a vida toda. O cristão não chega à perfeição nesta vida, mas somente depois de sua morte e acesso à vida celestial. A santificação é uma luta na qual o cristão deve vencer mais e mais ao pecado. Por causa

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de seu grande interesse na santificação, Calvino estuda cuidadosamente o que a Bíblia ensina acerca da vida cristã.

Pergunta: Segundo Calvino, como o Espírito Santo nos une a Cristo?

A ELEIÇÃO DE DEUS

Alguns chamam Calvino de “o teólogo da predestinação”. Segundo Calvino, Deus decidiu antes de criar o mundo a quem Ele iria salvar e a quem Ele iria condenar eternamente. Calvino reconhece que este é um grande mistério, porém, a Bíblia ensina a eleição de Deus em Ef 1.4 e outros textos. A Bíblia também diz que Deus tem misericórdia de quem quer e endurece a quem quer (Rm 9.18). Calvino nos encoraja a não termos vãos pensamentos acerca do mistério da eleição, mas sim que tenhamos fé que somos escolhidos em Cristo como Deus nos promete na Bíblia. Para Calvino a eleição é um motivo para reconhecermos a grandeza do amor de Deus para conosco. Esta doutrina tira todo o orgulho do pecador que se salva e lhe ajuda a reconhecer o poder soberano de Deus. Calvino sabia muito bem que esta doutrina parece fazer de Deus injusto visto que Ele condena alguns ao inferno antes de criá-los. Calvino responde que aqui há um mistério horrível que não entendemos, porém, é impossível que Deus seja injusto. Deus os condena por causa dos pecados que Ele sabe que eles vão cometer. Nenhum pecador pode queixar-se da injustiça de Deus, já que ele sabe que permanece no pecado porque o pecado lhe agrada mais que arrepender-se.

A IGREJA

Para Calvino a igreja é muito importante. Calvino dedica muito tempo explicando a melhor forma de organizar a igreja. Segundo Calvino, a igreja é nossa mãe que nos ajuda a sermos salvos. Calvino estava muito triste por causa da divisão entre os reformadores e fazia grandes esforços para buscar a unidade da igreja. Com respeito à discussão sobre a santa ceia, Calvino buscou uma resolução para unir os dois partidos. Reconheceu com Zwinglio que Cristo não estava fisicamente presente no pão. Porém, Calvino se aproximou d Lutero ao ensinar que o Espírito nos unia com o corpo humano de Cristo no céu por meio da Santa Ceia. Para Calvino este é um grande mistério, porém, devemos crer nele porque Cristo disse, “Este é meu corpo”. Ainda que Calvino tenha buscado a paz com os luteranos, eles o condenaram mais como herege. Com respeito à discussão sobre o batismo, Calvino entendia bem o problema. Como os bebês podem ter fé? Sua resposta era enfatizar a promessa que Deus fez a Abraão em Gn 17.7, “Eu sou o teu Deus e o Deus te teus filhos” [Tradução original do autor]. Calvino ensinou que os cristãos devem batizar a seus filhos como Deus ordenou a Abraão para circuncidar aos seus filhos.

Pergunta: Calvino compara a igreja a uma ____________.

A REFORMA DE CALVINO SE ESTENDE A OUTROS PAÍSES

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GENEBRA: CIDADE PARA EXILADOS

Quando Calvino vivia em Genebra, o papa e os reis e príncipes católicos tentavam destruir as igrejas evangélicas. A cidade de Genebra recebia muitos exilados. Havia alguns da Itália e Espanha. Muitos vinham da França. Outros saiam dos países do norte da Europa. Os inimigos pensavam que assim podiam pôr um fim à reforma. Mas na realidade forçaram aos evangélicos a viverem na cidade onde podiam aprender os ensinamentos bíblicos da pregação de Calvino e ver a maneira de reformar a vida de um povo inteiro. Regressaram aos lares com o elo e o conhecimento para edificar a igreja reformada em vários países.

FRANÇA: IGREJA DOS MÁRTIRES

Os reis da França oprimiam muito aos evangélicos. Sem dúvida, pouco a pouco, em vários povos, grupos de evangélicos cresciam secretamente. Em 1559 era possível organizar a igreja nacional abertamente. Os líderes se reuniam em uma assembléia. Eles aceitaram uma confissão de fé e escrevera uma constituição para a igreja. A confissão de fé continha os ensinamentos básicos da Bíblia como Calvino a interpretava. A constituição se baseou na organização da igreja de Genebra, porém, era necessário atender às necessidades de cada país. Foi inventada a forma presbiteriana de governar a igreja. Cada congregação escolhia seu pastor e os presbíteros e diáconos. O pastor e os presbíteros formavam um corpo para governar a igreja. O pastor e um presbítero de cada igreja eram os representantes em uma assembléia regional. Cada assembléia regional nomeava a dois pastores e dois presbíteros para formar uma assembléia nacional que era a autoridade máxima da igreja. Mais tarde muitas igrejas reformadas e outras denominações usaram esta forma de representantes porque pensavam que era a melhor maneira de organizar as igrejas. Às vezes, as igrejas evangélicas da França sofriam, às vezes tinham paz. Sob sofrimento as igrejas demonstravam sua fé por meio de cantar salmos nas ruas. Alguns chegaram à conclusão de que os cristãos tinham o direito de rebelar-se contra um rei se o rei não cumprisse seus deveres para com Deus e com seu povo. Durante muitos anos a igreja de Genebra enviou dezenas de pastores à França para ajudar as igrejas. Estes pastores cumpriam sua missão no conhecimento de que podiam morrer se governo os levasse presos. Em 1572 o rei decidiu pôr um fim nos evangélicos e na matança da festa de São Bartolomeu mataram 70.000 evangélicos. Porém, a igreja evangélica continuou. Mais tarde as igrejas viveram em paz de 1598 até 1685. Neste ano o rei decidiu destruir as igrejas evangélicas. Mais de 400.000 fugiram da França e fortalecerão as igrejas reformadas de outros países. Todo o país sofria porque alguns dos melhores trabalhadores e cidadãos da França deixavam seu país e davam seus labores a outros países. Um pequeno grupo de evangélicos permaneceu no país. Por isso, quando o Haiti era colônia dos franceses, a igreja reformada não tinha a força para pregar o Evangelho no Haiti. A única influência da igreja reformada francesa no Haiti se vê em alguns hinos que os evangélicos ainda cantam.

Pergunta: Quantos evangélicos, segundo o autor, morreram na matança de São

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Bartolomeu na França no ano 1572?

ESCÓCIA: UM PAÍS REFORMADO

A reforma também chegou à Escócia em meio a conflitos. João Knox é o famoso reformador da Escócia. A regente queria defender a Igreja Católica. Knox se atreveu a pregar contra ela. Em 1560 Knox persuadiu os nobres a aceitarem a fé evangélica. Escreveu uma confissão de fé que seguia os ensinamentos de Calvino. Knox os havia aprendido quando vivia como exilado em Genebra. Knox também preparou um livro de disciplina e um livro de ordem comum das igrejas. Usaram a organização presbiteriana para atender às necessidades das igrejas em todo o país. Mais tarde os nobres derrotaram os católicos e respaldaram a obra de Knox. Desta maneira os ensinamentos da reforma penetraram mais amplamente a todos os habitantes de Escócia do que em nenhum outro país da Europa. Uma característica importante da igreja reformada de Escócia é sua ênfase na educação. Segundo a lei, toda igreja tinha que manter uma escola para educar a todos as crianças. Quando a reforma entrou na Escócia, ele era um país muito pobre e atrasado. Pouco a pouco a reforma transformava toda a vida do país. A igreja, que tomou o nome de presbiteriana, esteve forte durante muitos anos. Mais tarde, esta igreja se tornou a fonte de várias denominações fortes nos Estados Unidos. No século passado os presbiterianos da Escócia e de os Estados Unidos eram líderes de missões em muitos países da América Latina, Ásia e África.

Pergunta: Qual foi o nome da igreja protestante que se formou na Escócia e por que foi chamada assim?HEIDELBERG: UM CATECISMO FAMOSO

Heidelberg é um pequeno povo na Alemanha que tem fama nas igrejas reformadas. Em 1563 o príncipe que governava o povo queria tirar a confusão das igrejas de seu reinado. Para por um fim às discussões teológicas, ordenou a um pregador e a um professor de teologia que escrevesse um catecismo que fosse mui apegado à Bíblia. O professor entendia muito bem dos ensinamentos dos reformadores e pode expressá-los claramente. O pregador sabia fazer as perguntas e as respostas de maneira que o aluno pudesse experimentar pessoalmente a riqueza de nossa consolação em Cristo. Por isso, este catecismo chegou a ser uma confissão de fé para as igrejas reformadas da Alemanha, Holanda e muitos outros países. É um dos tesouros das igrejas reformadas.

Pergunta: O catecismo de Heidelberg usa o método pedagógico de ____ ___ e ____________

HOLANDA: UM TIRANO DERROTADO

A igreja reformada da Holanda também se estabeleceu em meio a conflitos. Antes de sua chegada havia muitos luteranos e anabatistas na Holanda. Naqueles dias os reis da Espanha governavam os países baixos, que hoje são Holanda e Bélgica. Carlos V matou a muitos dos anabatistas. Mais tarde, pregadores zelosos estabeleceram igrejas

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reformadas em muitas cidades. Felipe II se dedicou a destruir a todos os hereges que viviam sob seu reinado. Os exércitos de Felipe passaram muitos anos nos países baixos. Mataram a muitos evangélicos, porém, os católicos do país também sofreram muito. Por fim, o líder dos holandeses, Guillermo de Orange, se afiliou com a igreja reformada. Durante os anos de 1568 a 1648 os holandeses resistiram a todos os ataques dos espanhóis. Ganharam sua liberdade da tirania da Espanha em 1648. A igreja reformada ficou como a igreja nacional d Holanda.

PLANO DE ESTUDO PARA A LIÇÃO 6

1. Boas-vindas.2. Oração.3. Revisar as leituras e perguntas/respostas para o capítulo 5.4. Designar o estudante que vai ser responsável pelo capítulo 5(cinco) de Lutero

para a próxima aula.5. Designar os estudantes que expor na próxima aula sobre os capítulos 18-22 de

História… Cristianismo.

ESBOÇO DE ESTUDO PARA O CAPÍTULO 5

CALVINO REFORMA A GENEBRA PARA CRISTO

A VIDA DE CALVINO. Nasceu na França em 1505. Converteu-se em 1534 e escreveu As Institutas da Religião Cristã ao rei da França em 1536.CALVINO ENSINA EM GENEBRA. Calvino foi persuadido por Farel a pastorear em Genebra. Pela intervenção do Pequeno Conselho, Calvino foi exilado em 1538. Em 1541 foi convidado a voltar. Calvino organizou a igreja, re-estabeleceu a importância da pregação, ensinou a líderes e pastores na academia e promoveu a reforma da cidade. Morreu em 1564.A IGREJA. Calvino organizou o Conselho de pastores, o conselho e os diáconos. LUTAS ESPIRITUAIS. Conflitos com o Pequeno Conselho e com Miguel Serveto.UMA UNIVERSIDADE. Foi fundada em 1559.

CALVINO ESCREVE UMA TEOLOGIA SISTEMÁTICA

AS INSTITUTAS DA RELIGIÃO CRISTÃ. As Institutas têm 4 divisões: Deus o Pai, Deus o Filho, Deus o Espírito Santo e a Igreja. Escreveu comentários, livros, tratados e cartas.A MAJESTADE DE DEUS. Para conhecer a si mesmo é preciso conhecer a Deus.A PALAVRA DE DEUS. Além daquilo que Lutero ensinou, Calvino afirma o papel do testemunho do Espírito Santo para a interpretação da Bíblia.A OBRA DO ESPÍRITO SANTO. A regeneração, a santificação e a iluminação são obras do Espírito Santo.A ELEIÇÃO DE DEUS. A eleição: pela graça de Deus e é conhecida pela fé em Cristo Jesus.

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A IGREJA. Além daquilo que Lutero ensinou, Calvino promoveu um sistema democrático de governar a igreja. Os pastores, presbíteros e diáconos são partes do conselho.

A REFORMA DE CALVINO SE ESTENDE A OUTROS PAÍSES

GENEBRA: CIDADE PARA EXILADOS. Havia exilados da Itália, Espanha, Inglaterra, Escócia, França, Holanda e outras nações. Por meio dos exilados, a Reforma foi estendida.FRANÇA: IGREJA DOS MÁRTIRES. 1572, o massacre de São Bartolomeu, 70.000 mortos.ESCÓCIA. A reforma de João Knox e o começo da Igreja Presbiteriana.ALEMANHA. Além dos luteranos, havia igrejas “evangélicas” com doutrina reformada (Catecismo de Heidelberg, 1563)HOLANDA. A guerra de 80 anos contra a ICR e Espanha termina em 1648.

PERGUNTAS PARA O CAPÍTULO 5

6. Qual é o nome do país onde João Calvino nasceu?7. Por quantos anos Calvino esteve exilado de Genebra?8. O nome da junta que reuniu os presbíteros, governantes e pastores. 9. Serveto não aceitou a doutrina da __________.10. Pelo conflito e morte de Serveto o que diz o autor que devia ser mudado?11. O que Calvino usou para treinar a líderes cristãos?12. Quais são os temas principais de As Institutas da Religião Cristã?13. Qual foi o único livro da Bíblia sobre a qual Calvino não escreveu um comentário?14. Segundo Calvino, como o Espírito Santo nos une a Cristo? 15. Calvino compara a igreja a uma ________.16. Quantos evangélicos, segundo o autor, morreram na matança de São

Bartolomeu na França no ano 1572?17. Qual foi o nome da igreja protestante que se formou na Escócia e por que foi

assim nomeada? 18. O catecismo de Heidelberg usa o método pedagógico de ____ ___ e

____________19. Os holandeses e os espanhóis lutaram por ____ anos.

RESPOSTAS PARA O CAPÍTULO 51. França.2. Três anos.3. Conselho.4. Trindade.5. Esta história nos mostra a necessidade de separação entre igreja e estado.6. Uma universidade. Também conhecida como a Academia de Genebra e Escola

de Profetas.7. Deus o Pai, Filho, e Espírito Santo.

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8. Apocalipse.9. O Espírito Santo entra no coração humano para dar-lhe fé para crer em Cristo.

Não podemos ter fé se não formos regenerados pelo Espírito Santo.10. Uma mãe.11. 70.000.12. Presbiteriana. A Igreja Presbiteriana é governada pelo presbitério regional.13. Perguntas e respostas.14. 80 anos.

CAPÍTULO 6

A REFORMA RADICAL

Derk Oostendorp

OS ANABATISTAS

Surgiu outro movimento evangélico muito mais radical que Lutero. Ao estudar o Novo Testamento, se convenceram de que somente adultos que tinham fé em Cristo poderiam ser batizados. Decidiram se batizarem de novo. Por isto, os outros os chamavam de “anabatistas” ou os que se batizam de novo. Porém, eles não aceitavam este nome, visto que consideraram que o primeiro batismo não era válido. Tanto os católicos como os outros evangélicos os condenaram como hereges e os perseguiam muito.

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OS ANABATISTAS REVOLUCIONÁRIOS

Em 1534 um anabatista chamado Melchor Hoffman pregou que Deus o havia mandado estabelecer a Nova Jerusalém. Hoffman e seus seguidores conquistaram a cidade de Munster na Alemanha. Eles nomearam um dos anabatistas como o rei Davi. Ensinavam que a lei do Antigo Testamento era a lei da cidade. Portanto, um homem podia ter mais de uma esposa. Em poucos meses os católicos venceram os anabatistas. Os anabatistas sofreram muito por causa destes revolucionários em Munster. Todo o mundo perseguiu mais os anabatistas e os acusaram de serem rebeldes.

OS MENONITAS

A maior parte dos anabatistas queria uma reforma radical, porém, não apoiavam uma revolução armada. Menno Simons reuniu um grupo destes anabatistas. Eis aqui alguns de seus ensinamentos principais. 1. Os membros de uma igreja devem decidir voluntariamente fazerem-se membros por meio de seu batismo como adultos. Todo membro tem que ser discípulo de Cristo e mostrar em sua vida que segue a Jesus. 2. Todo membro tem que cumprir o mandamento de amor que Jesus ensinou no Sermão do Monte em Mateus 5 a 7. Praticam a paz com todos e proíbem que o cristão possa usar armas ou participar em uma guerra. Os membros devem ajudar uns aos outros. 3. A igreja é uma família. A congregação tem toda a autoridade. Todos os membros de uma congregação decidem os assuntos de doutrina e de disciplina. 4. Há separação entre a igreja e o estado. O estado não deve forçar uma pessoa a se tornar membro de uma igreja.

Perguntas: Qual era o nome do líder dos menonitas? O que significa o nome “anabatista”?

Como se chama a cidade alemã onde os anabatistas estabeleceram uma comunidade separatista?

A HISTÓRIA DOS ANABATISTAS

Os governos no tempo de Lutero pensavam que todos os habitantes de um lugar deviam ser membros da mesma igreja. Portanto, os anabatistas sofreram muito. Os grupos menores como os menonitas buscavam refugio em vários países. Por fim, havia liberdade de religião em países como os Estados Unidos. Muitos menonitas migraram aos Estados Unidos, mas perderam sua força. No tempo de Lutero os anabatistas eram missionários que pregavam o Evangelho por todas as partes. Por muitos anos nos Estados Unidos os anabatistas viviam como grupos pequenos que queriam manter-se por meio do legalismo e da separação de todos os demais. Finalmente, estes grupos têm uma visão missionária de novo. Os menonitas têm a fama de trabalhar muito em obras de ajuda social. Também enviam missionários para estabelecer igrejas em outros países.

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A INFLUÊNCIA DOS ANABATISTAS

Hoje em dia quase todos os evangélicos estão de acordo que os anabatistas tinham razão em um ponto. O estado não deve envolver-se nos assuntos da igreja. Quando há separação, o estado é mais forte e as igrejas têm uma vida melhor porque os membros têm o direito de entrar na igreja que querem por sua própria vontade. Depois da reforma muitos evangélicos chegaram a aceitar o ensino de que somente os adultos que tem fé podem ser batizados. Muitos outros evangélicos crêem que a Bíblia nos indica que devemos batizar aos filhos dos crentes. A discussão sobre o batismo dos filhos dos crentes é muito forte até hoje e a causa de grande divisão grande nas igrejas evangélicas.

Perguntas: Em que sentido os anabatistas são um protesto duplo? Qual é a diferença entre os protestantes e os anabatistas?

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O MUNDO DE OS PURITANOS

A REFORMA EM INGLATERRA

Na Inglaterra a reforma da igreja dependia dos desejos dos reis. Quando Lutero começou a reforma na Alemanha, o rei da Inglaterra, Enrique VIII (reinou desde 1509 até 1547), escreveu um livro contra as heresias de Lutero. Mais tarde, Enrique VIII quis a anulação de seu matrimônio com Catarina. O papa não quis fazê-lo. Portanto, em 1534 o Parlamento da Inglaterra declarou que o rei era “o cabeça” supremo da igreja da Inglaterra. Também, declarou o matrimonio do rei inválido e fez leis que proibiam a entrega de contribuições a Roma.

Ainda que Enrique VIII somente quisesse realizar seus desejos políticos, outros buscaram a reforma espiritual da igreja. A cada ano havia mais líderes da igreja que estudavam os ensinamentos de Lutero e Calvino, criam neles e os pregavam. Conseguiram reformar a igreja sob os filhos de Enrique VIII. Sob Eduardo VI (reinou de 1547 até 1553) foi escrito o Livro de Oração Comum para ajudar aos pastores que não sabiam orar e dirigir a adoração a Deus. Neste livro há leituras em inglês para os cultos da igreja durante o ano. O livro contém muito do que todo evangélico poderia usar com proveito. Maria (reinou desde 1553 até 1558, a filha de Enrique VIII e Catarina) quis forçar a igreja nacional a voltar à Igreja Católica Romana. Maria queimou alguns bispos evangélicos e matou muitos evangélicos. Muitos fugiram aos países evangélicos da Europa. Maria buscou o respaldo dos católicos da Espanha e se casou com Felipe II, o rei da Espanha. O resultado dos esforços de Maria foi o contrario do que ela queria. Os ingleses odiavam a Igreja Católica Romana ainda mais. Durante três séculos muitos ingleses na Inglaterra e nos Estados Unidos temiam muito o poder da Igreja Católica Romana. Também aumentou a inimizade dos ingleses contra a Espanha. No século dezessete os exércitos ingleses iam atacar as colônias espanholas do Caribe em nome de Deus para defender a igreja evangélica. Isabel, outra filha de Enrique VIII que governou de 1558 a 1603, queria que a igreja fosse cômoda para todos os habitantes da Inglaterra. Isabel insistia que todos a reconhecessem como rainha e que a igreja respaldasse a sua luta contra o país católico da Espanha. Depois da morte de Isabel, surgiram conflitos entre os reis e os puritanos que queriam purificar a igreja. Na luta, os reis Tiago I (reinou de 1603 até 1625) e seu filho, Carlos I (reinou de 1625 até 1649), declararam que Cristo havia posto aos bispos como a autoridade da igreja. Também, defenderam algumas práticas católicas no culto. Um rei atacou aos puritanos porque eles ensinavam que era necessário guardar o repouso do dia de domingo cuidadosamente. Os puritanos sofreram muito, porém, durante alguns anos os puritanos obtiveram a vitória sobre os reis.

Perguntas: O que significa o nome puritano?Por que o rei Enrique VIII quis encabeçar a Igreja Protestante na Inglaterra?Como se chama o livro que os Anglicanos usaram para seus cultos?

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AS CONTRIBUIÇÕES DOS PURITANOS

Os reis não defenderam os ensinos de Calvino, porém, de várias maneiras, depois de 1550, seus ensinamentos tinham muito poder na Inglaterra. Os exilados ingleses que haviam vivido em Genebra voltaram a seu país com as idéias que aprenderam em Genebra. Alguns professores das igrejas reformadas foram à Inglaterra para ensinar teologia nas universidades. Foram traduzidos os livros de Calvino ao inglês, e muitos os estudaram (1).

Entre os muitos livros escritos pelos autores puritanos, tais como Baxter, Owen e Sibbs, temos o livro alegórico, O Progresso do Peregrino, escrito por John Bunyan. John, um pregador batista, passou muito tempo encarcerado. Quando o juiz ia livrar-lhe com a admoestação de não mais pregar, Bunyan disse: “Se me deixarem livre, pregarei de novo”. Assim era a fé dos puritanos.

Os puritanos não formaram sua própria denominação, mas sua influência teológica e prática são evidentes nas igrejas da Grã Bretanha tais como a Anglicana, a Batista, a Congregacional, a Presbiteriana e a Reformada.

Perguntas: Como se chama o autor do livro, O Progresso do Peregrino?Como se chama a denominação que os puritanos formaram?

(2) Derk Oostendorp, A História das Igrejas Evangélicas: De Lutero até a República Dominicana (Santo Domingo: Igreja Cristã Reformada,1989), p. 4-24. Usado com permissão.

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PLANO DE ESTUDO PARA A LIÇÃO 7

1. Boas-vindas.2. Oração.3. Revisar as leituras e perguntas/respostas para o capítulo 64. Designar o estudante que será responsável para o capítulo 7 De Lutero para a

próxima aula.5. Designar os estudantes que irão expor na próxima aula sobre os capítulos 23-28

de História… Cristianismo.

PERGUNTAS PARA O CAPÍTULO 6

1. Qual era o nome do líder dos menonitas?2. O que significa o nome ‘anabatista’?3. Como se chama a cidade alemã onde os anabatistas estabeleceram uma

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comunidade separatista?4. Em que sentido os anabatistas são um protesto duplo?5. Qual é a diferença entre os protestantes e os anabatistas?6. O que significa o nome puritano?7. Por que o rei Enrique VIII quis encabeçar a Igreja Protestante na Inglaterra?8. Como se chama o livro que os Anglicanos usaram para seus cultos?9. Como se chama o autor do livro, O Progresso do Peregrino? 10. Como se chama a denominação que os puritanos formaram?

RESPOSTAS PARA O CAPÍTULO 61. Meno Simons.2. Re-batismo.3. Munster.4. Protestaram contra os católicos romanos e os protestantes5. Os protestantes originais, tais como os luteranos, os reformados, os anglicanos,

eram protegidos por governos nacionais. Os anabatistas advogaram a separação da igreja e o estado. Além disso, rebatizaram as pessoas que haviam sido batizadas como crianças nas igrejas protestantes. Por último, deram mais ênfase no governo da igreja local do que na igreja nacional.

6. O puritano quis purificar a igreja por crer em e obedecer à Palavra de Deus.7. O rei Enrique VIII quis divorciar-se de sua esposa e a Igreja Católica Romana não

quis dar o divórcio. Além disso, o rei não quis dar doações a Roma.8. O Livro de Oração Comum9. Juan Bunyan.10. Os puritanos não formaram uma só denominação. As igrejas Anglicana,

Presbiteriana, Congregacionalista e Batista, todas essas foram influenciadas pela teologia e prática dos puritanos.

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ESBOÇO PARA O CAPÍTULO 6

OS ANABATISTAS

OS ANABATISTAS

Movimento para re-batizar os que foram batizados como crianças.

OS ANABATISTAS REVOLUCIONÁRIOS

Melchor Hoffman, em 1534, conquistou Munster, Alemanha para formar uma comunidade estilo Antigo Testamento. Depois da destruição da comunidade um grupo de anabatistas, os menonitas adotaram o pacificismo.OS MENONITAS

- começaram na Holanda sob Menno Simons, um sacerdote convertido. - foram perseguidos pelos católicos e mais tarde pelos protestantes

- rejeitaram o batismo de crianças, a influencia do estado na igreja, denominações nacionais, - afirmavam o batismo de crentes, a separação da igreja do estado e a autonomia da congregação local.

A REFORMA RADICAL

- É um duplo protesto: contra a ICR e contra o protestantismo nacionalista.

OS PURITANOSA REFORMA NA INGLATERRA

-Enrique VIII, Catarina, Eduardo VI, Maria, Isabel, Tiago I, Carlos IA IGREJA EPISCOPAL OU ANGLICANA, primeiro sob a autoridade do rei, depois sob os bispos (epíscopos).OS PURITANOS.

- Os que queriam purificar a igreja. Nunca formaram sua própria denominação.OS BATISTAS, CONGREGACIONALISTAS, PRESBITERIANOS E O MOVIMENTO EVANGÉLICO dentro da Igreja Anglicana são descendentes dos puritanos.

A REFORMA RADICAL na Europa era um movimento contra o protestantismo. Na Inglaterra, a reforma radical fica dentro da Igreja Anglicana por muito tempo.

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CAPÍTULO 7

RELAÇÕES DA IGREJA COM O PODER POLÍTICO

MODELO REFORMADO (1)

Sidney H. Rooy

INTRODUÇÃO

No ano de 1947 apareceu o livro A Estirpe Calvinista de Nossas Instituições Políticas de Alfonso López Michelsen. No prólogo, monsenhor Carlos José Romero comenta que este é “um dos livros mais substanciais para o pensamento católico que já apareceu na Colômbia”.

A análise de Romero é sumamente interessante. Segundo ele, existem basicamente três concepções políticas que influem no mundo: a maniqueísta com seu dualismo absoluto entre a matéria e o espírito, a pelagiana com sua fé em que o homem se salvará por seu próprio esforço, e a cristã com sua crença em que Cristo ajuda ao homem por sua graça de tal modo que possa com seu esforço alcançar a salvação. Romero afirma que desde o Renascimento duas tendências se enfrentam no mundo:

A católica, que afirma que a graça de Deus pode e deve santificar ao homem e a todas as instituições humanas; e a protestante, herança do dualismo maniqueísta, revivida por Lutero e Calvino, segundo a qual a santidade é impossível ao homem, corrompido totalmente, e cujos atos todos são maus; e a quem só a fé pode salvar, sem que seus próprios esforços possam ajudar-lhe em nada para sua salvação. É daí que a política prescinde de toda consideração moral já que a atividade exterior do homem jamais pode ser boa e nem contribuir com seu destino futuro.1

São Tomás, por sua vez, afirma que o homem, com a ajuda da graça divina, está no mundo para conquistar sua salvação. Portanto, a posição do governo temporal é a de conduzir aos homens à felicidade eterna por meio da prática da virtude. “Os homens se reúnem em sociedade para viver bem, e a boa vida consiste na virtude: assim a vida virtuosa é o fim da sociedade humana”. 2

Por outro lado,

Para Lutero e Calvino, a virtude não tem nenhum valor, o homem é mau 1    ? Alfonso López Michelsen, La Estripe Calvinista de Nuestras Instituciones Políticas (A Estirpe Calvinista de Nossas Instituições Política) (Bogotá: Ediciones Tercer Mundo, 1966),p. 112    ? De Regime Principium, L. I, cap. XIV, citado por Carlos José Romero em Lopéz Michelsen, Estirpe Calvinista, p. 12.

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irremediavelmente: portanto, e daí que se façam boas obras ou não? O estado se encarregará somente de manter a ordem pública, a qual consiste em que ninguém impeça a liberdade dos demais: toda outra consideração está sobrando.

Por outra parte, o homem é movido por uma concupiscência cega e incontida, cujo objeto é o prazer, o qual se alcançou com o dinheiro. O protestantismo deixa para Deus só o cuidado da salvação das almas, e ele se preocupa somente em regular a economia, o campo dos instintos materiais. De moral que era o Estado se converteu em econômico e seu fim é dar aos associados a máxima prosperidade.3

Os lamentáveis elementos calvinistas que entraram na Constituição de 1811 devem sua aparição principalmente à Constituição do diretório na França, que foi resultado da Revolução Francesa. As características calvinistas sobressalentes elaboradas e expedidas pelos próprios granadinos em 4 de abril de 1811 incluem:

1. A autoridade tem sua origem no consentimento dos cidadãos;2. A autoridade deve ser exercida em conformidade com um documento

denominado a Constituição;3. Por meio da Representação, o Poder Legislativo, os cidadãos moderarão a

gestão política e administrativa do governante;4. Das leis;5. Nenhuma lei ou ato legislativo contrário às disposições da Constituição

poderá ser obrigatório para os cidadãos. O Poder Judicial terá a missão de ditar acerca da constitucionalidade ou inconstitucionalidade garantida aos cidadãos a vida, a liberdade e a propriedade;

6. O exercício do direito de propriedade é uma livre faculdade de cada cidadão que pode usar e gozar de seus bens conforme o tenha.4

Pergunta: Qual foi a perspectiva do monsenhor Carlos José Romero quanto a Lutero e Calvino?

Alfonso López Michelsen conclui seu livro afirmando que a teoria da separação da Igreja e o Estado, e sua divisão da vida do homem e da sociedade é a raiz do mau político contemporâneo.

Aqui tropeçamos uma vez mais com o conceito calvinista e puritano do Universo, segundo o qual a vida do homem se encontra divididas em distintas esferas e atividades, sem conexão nem conseqüência nenhuma entre si. Como temos repetido em muitas ocasiões, o primeiro postulado que separa o calvinista do católico é o de que os atos que o homem realiza

3    ? Ibid.4    ? Ibid., p. 46.

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neste mundo nem o prejudicam nem lhe servem na vida eterna.5

Mas adiante, Michelsen adiciona: “As esferas inconciliáveis do político e do econômico, do religioso e do político... haviam sido a conseqüência obrigada do calvinismo na separação da Igreja e o Estado”.6

Chama a atenção o fato de que enquanto alguns autores protestantes insistem que Calvino em Genebra lutou para estabelecer uma teocracia, como observaremos mais adiante, os autores católicos atribuem a ele a heresia de ter dissolvido a relação entre Igreja e o Estado e ter criado um divórcio absoluto entre o material e o espiritual como os maniqueístas de outrora. De todos os modos, isto nos serve de introdução à problemática de hoje. Qual deve ser a relação entre o Estado e a Igreja, entre o poder e a justiça? Como foi enfocado este problema nas correntes protestantes do século XVI e especialmente na tradição calvinista reformada?

Pergunta: Qual foi o conceito de Michelsen quanto à influência de Lutero e Calvino na sociedade?

O MARCO HISTÓRICO-TEOLÓGICO DO SÉCULO XVI

Muitas novas forças estiveram sendo gastas nos crepúsculos da Idade Média: novas escolas filosóficas como o humanismo, o fortalecimento da navegação e o comércio – especialmente marítimo, a centralização das monarquias e o novo espírito nacionalista, o avanço da ciência e artes, a extensão não só da educação, mas também de um conhecimento mais amplo do mundo por meio da imprensa, o crescimento de certa intranqüilidade e consciência popular que brotaram repentinamente durante os séculos XIII ao XV através de novos movimentos e protestos sociais.

As relações entre a Igreja e o Estado já haviam sofrido numerosos ajustes segundo a situação regional ou nacional. A Concordata de Worms (1122), a Carta Magna (1215), as Constituições de Clarendon (1164), o Estatuto de Praemunire (1393), a Sanção Pragmática de Bourges (1438), a Concordata de Viena com Alemanha (1448) e a Concordata de Bologna com França (1516) expressam diversas concepções segundo as diferentes situações nacionais. Também houve numerosas bulas papais de importância, como a Unam Sanctam (1302), Execrabilis sobre os apelos aos imperadores (1460) e Inter Caetera Divinae sobre o descobrimento de América (1493). As diversas situações políticas e eclesiásticas exemplificadas pelo avançado nacionalismo da Espanha e Portugal, os trezentos principados feudais da Alemanha, a debilidade dos Estados Papais na Itália frente à França e Espanha, o crescente poder real em oposição à nobreza na França e Inglaterra, e a Confederação de Cidades Livres na Suíça, mostram claramente que a antiga unidade do Império já havia sido relegada ao reino dos sonhos. Alguns na verdade sonharam com a restauração do Sacro Império, porém, poucos creram nele e menos ainda se esforçaram para realizá-lo.

Não é preciso ficar surpreso, portanto, frente à diversidade dos modelos de

5    ? Ibidem, pp. 86-87.6    ? Ibidem, p. 90.

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relação entre a Igreja e o Estado durante este período. Podemos afirmar que a forma de relacionar-se foi diferente em cada país segundo as forças políticas, econômicas, sociais e eclesiásticas existentes. Não é que surgiu um líder como Zwinglio, Lutero, Calvino ou Hooker e impôs seu sistema ideológico sobre a relação ideal entre a Igreja e o Estado. Cada um desenvolveu suas idéias sobre o particular com em suas luta local e contextual. A tradição da Idade Média havia sido que o Estado (o príncipe) estava sob a autoridade da lei e das cortes.7

Segundo Claude de Seyssel, arcebispo de Turim a serviço de Luis XII da França (1497-1517), o poder absoluto do príncipe estava regulado por três freios: a religião, a justiça e a "política". Por meio destes freios a tirania natural do príncipe se via reduzida à “civilité”, especialmente por meio do Parlemans. O rei estava sujeito a este corpo.8

Existiam três estados no reino, Além disso, da Igreja: os nobres, as classes médias (le peuple gras) e as classes baixas (le peuple menu). Em assuntos de grande importância, o rei devia buscar o conselho deles por meio do Grande Concílio, que tinha pessoas dos distintos grupos, tanto seculares como eclesiásticos. O significativo é que a tradição medieval, segundo a qual o rei estava sujeito à lei, continuou na França do século XVI.9

Sem dúvida, em certas ocasiões os reis da França parecem reclamar a isenção dos Parlamentos e lhes dão instruções de não interferir em suas decisões. Alguma ambigüidade havia em tudo isto, porém, em geral, os reis das nações emergentes tinham certas formas de buscar o conselho e apoio das diferentes classes da sociedade para aqueles assuntos que eram de importância para todo o povo.

Pergunta: Durante a idade média, qual foi a relação do estado frente à lei?

A importância deste conceito da subordinação do rei às leis e costumes de seu país em graus diversos se vê quando consideramos o conceito de Lutero. Aqui é necessário distinguir entre o Lutero jovem e o Lutero maduro. Até 1529, Lutero insistiu com base em Romanos 13 e a relação entre Davi e Saul (1 Samuel) na não resistência ao governo temporal, em contraposição com a tradição medieval. Lutero se identifica basicamente com a posição de Gregório o Grande, Wycliff e alguns outros da época medieval. Em seu tratado sobre a autoridade secular (Von Weltlichen Obrigkeit, 1523) Lutero mostra que a lei e a força são necessárias para governar aos não crentes, enquanto que os cristãos são guiados pelo Evangelho e o amor. O governo civil existe para os primeiros, porém, os segundos acatam a lei civil não para eles mesmos, mas sim para o bem de seus concidadãos.10 Em seu tratado de autodefesa expressa a mesma idéia (julho de 1525)

7    ? Para Tomás havia três tipos de lei, as quais participam da lei divina e eterna: 1) a lei natural que conhecemos pela razão; 2) a lei divina que conhecemos pela revelação; e, 3) a lei humana que é derivada da lei natural e está formulada na lei civil (Summa Theologica, I-II, Preg. 90-95).8    ? Carlyle, R. W. y Carlyle, A. J. A History of Mediaeval Political Theory in the West, (Uma História da Teoria Política Medieval no Ocidente) vol. 6: Political Theory from 1300 to 1600 (Teoria Política de 1.300 a 1.600) (New York: Barnes & Noble, 1936), pp. 219-221.9    ? Ibidem, pp. 224-225.10    ? Lutero, Martinho. "A Autoridade Secular", em Obras, vol.2 (Buenos

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depois do duro tratado que havia escrito contra os camponeses (maio de 1525). Lutero afirma:

Há dois reinos: um é o reino de Deus, o outro é o reino secular, do mundo presente. Sobre isto já escrevi tão freqüentemente que não posso menos que assombrar-me de que ainda haja pessoas que ignorem isto ou não se dê conta disso...O reino de Deus é um reino de graça e misericórdia, não um reino de ira ou castigo; pois ali tudo é perdão, respeito, amor, servir, fazer o bem, gozar de paz e alegria, etc. O reino secular por sua vez é um reino de ira e severidade, pois ali tudo é castigar, proibir, julgar e condenar, para reprimir aos maus e proteger aos bons. Para isto leva e maneja também a espada.11

Lutero repete o mesmo conceito dos dois reinos em sua obra “É possível ser cristão?” de 1526. Deus estabeleceu dois regimes no mundo, segundo Lutero. Ele é fundador e Senhor dos dois – o espiritual e o temporal – e, portanto, os dois têm autoridade divina. Também em seu tratado Contra As Hordas de Camponeses Selvagens E Ladrões ele admoesta aos camponeses porque tratam de igualar a todos os homens, o que seria pretender converter o reino temporal no reino espiritual. Segundo ele, no primeiro sempre haverá desigualdade.

É importante sublinhar que freqüentemente se encontra esta posição. A mesma poderia ter sua base em De Civitate Dei de Agustín. A ordem político surge da necessidade humana causada pelo pecado e como um remédio divino para a contenção do mal. De modo que é uma instituição divina que resulta do estado pecaminoso do homem e traz a autoridade do Senhor dos senhores. Portanto, o poder político deve ser obedecido. Assim como um rei temporal não deve resistir ao Senhor supremo (Deus), tampouco um príncipe ao rei ou um Senhor ao príncipe. Cada um em sua ordem deve ser obedecido. Paulo em Romanos 13 exige a obediência de cada um à autoridade superior. O que desobedece deprecia a ordenança divina e será condenado pelo juízo de Deus. Sob nenhuma circunstância o homem pode rebelar-se em questões temporais contra a autoridade estabelecida por Deus. Até mesmo os tiranos devem ser obedecidos, de modo tal que não haja lugar algum para a resistência à autoridade. Ainda em 1529, Lutero não permitiu a consideração do estabelecimento de uma liga de príncipes cristãos para defender-se contra o imperador.

Não obstante, Lutero mudou a sua posição durante os anos 1530 e 1531. Em suas cartas ao Eleitor da Saxônia, Lutero e seus colegas dizem claramente que antes não sabiam o que os magistrados lhes mostravam agora quando a lei do Império permitia a resistência em certos casos. Se a lei o permite, não há objeção em casos de grande injustiça. Isso significou uma mudança substancial da autoridade absoluta do rei à autoridade suprema da lei. 12

Aires: Editorial Paidós, 1966), pp.128-162.11    ? Ibidem, p. 287.12    ? Para um desenvolvimento mais completo da posição de Lutero e sua

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Pergunta: Qual é a posição de Lutero quanto ao reino de Deus e o estado?

CALVINO E GENEBRA

É nosso propósito fazer um estudo mais detido da relação entre Igreja e o Estado em Calvino e na cidade de Genebra. Para tanto, será de grande ajuda avaliar as afirmações de Alfonso López Michelsen e buscar linhas de abordagem ao nosso contexto latino-americano.

Em primeiro lugar, consideraremos o marco e o desenvolvimento da Reforma em Genebra. Desterrar definitivamente ao mui católico Duque de Sabóia e ao bispo romano que era seu estreito colaborador na região custou dez anos de luta aos cidadãos genebrinos. A opção pela fé protestante foi estimulada por Guillermo Farel. Porém também foi importante a luta contra as autoridades seculares com a intenção de transformar Genebra em uma cidade livre, tal como eram Berna, Zurique e Basiléia. Genebra era muito pequena para se opor sozinha ao poder do Duque. Porém, graças ao apoio do exército da cidade de Berna ela conseguiu sua liberdade.

Em 21 de maio de 1536 a Assembléia de cidadãos aceitou oficialmente a Reforma como a religião oficial de seu povo. Dois meses mais tarde, por insistência de Farel, Calvino foi convencido a trabalhar em Genebra, primeiro como orador e instrutor e depois como pastor. Em somente um ano e meio Calvino e Farel acabaram sendo despedidos pelo rigor com que empreenderam sua reforma. Sem dúvida alguma, como resultado da desordem e controvérsias internas o Conselho da cidade resolveu trazer de volta a seus pastores. A duras penas Calvino foi convencido a regressar de Estrasburgo, onde havia trabalhado com sumo agrado por três anos em uma congregação de refugiados franceses. Farel continuou seu ministério em Neuchatel e não regressou. Começaram assim vinte e três anos de liderança de Calvino em Genebra junto com outros cinco ou seis pastores. Todos eles formavam a venerável Companhia de Pastores, como foi chamada e tomaram seu lugar no governo para os assuntos eclesiásticos e diaconais.

O governo de Genebra pode ser concebido em termos de círculos concêntricos começando desde o Pequeno Conselho no centro, seguido pelo Conselho dos Sessenta, o dos Duzentos e o dos cidadãos. Quanto mais numerosos os membros do Conselho, mais generalizado o poder. O poder centralizado esteve em mãos do Pequeno Conselho. Vinte e cinco cidadãos se reuniam semanalmente, e às vezes com mais freqüência, para conduzir os assuntos de toda a comunidade. Anualmente eram eleitos quatro magistrados e o tesoureiro da cidade. Cada magistrado nomeava quatro membros do Conselho e normalmente permanecia por um segundo ano de serviço.

Pergunta: Em Genebra, que conselho era o mais poderoso?

mudança de conceitos, veja Carlyle, Political Theory (Teoria Política), parte III, capítulo IV, onde se faz referência ao estudo do Prof. K. Müeler, "Luthers Aüsserungen über das Recht des Widerstands", publicado em 1915.

O Pequeno Conselho nomeava a outras pessoas para constituir junto com elas o Conselho dos Setenta e o Conselho dos Duzentos. Além disso, existia a Assembléia Geral de todos os cidadãos cuja tarefa era a de determinar a política general da cidade frente a questões como a guerra e a paz, a religião da comunidade, a eleição dos magistrados, etc. Aos pastores não lhes estava permitido ser membros dos Conselhos e tampouco aos estrangeiros que se tornavam cidadãos. A estes últimos se lhes permitiu serem nomeados somente para o Conselho dos Duzentos depois de 1555.

A organização da sociedade afetou a forma de trabalhar do corpo pastoral. Os assuntos eclesiásticos e as tarefas diaconais constituíram dois aspectos importantes do trabalho do Pequeno Conselho. A Companhia de Pastores recomendava a este Conselho a nomeação dos novos pastores. Os candidatos eram aprovados pelo Conselho e depois eram propostos para a aprovação final da congregação. Os ministros só podiam ser designados ao trabalho pastoral depois de receberem a correspondente aprovação destas três instâncias. Os presbíteros e parte dos diáconos eram nomeados diretamente pelo Conselho. Às vezes, alguns deles eram membros do próprio Conselho. Pergunta: Que relação tinha o Conselho de Pastores com o Pequeno Conselho de Genebra?

Pelo menos em teoria, Calvino quis a separação entre a Igreja e o Estado e lutou toda a sua vida contra a intromissão do Conselho nos assuntos eclesiásticos, o cuidado espiritual dos membros e o direito da Igreja de exercer a excomunhão e administrar os sacramentos segundo sua compreensão da Bíblia. De fato, a Igreja dependia financeiramente do Estado, com uma exceção notável: o chamado “Fundo francês”. Além disso, Calvino e o corpo de pastores eram freqüentemente consultados sobre questões morais e doutrinárias dado que o governo civil se considerava responsável pela observância das duas tábuas da lei quando o descuido delas afetava a ordem pública. Apesar da insistência de Calvino pelo contrario, durante boa parte de sua vida a disciplina eclesiástica e o direito de excomungar ficaram sob o poder do Pequeno Conselho. Com certa razão histórica, o Conselho temia permitir um excesso de clericalismo, ainda que fosse de tipo protestante. O caráter do Conselho era eclesiástico, porém, o presidente era um dos magistrados escolhidos anualmente pelo povo. Os presbíteros puderam exercer a supervisão moral sobre os crentes, porém, até 1555 dependeram da aprovação do Conselho para efetuar a disciplina. Recém chegado, Calvino conseguiu mais independência de ação para o Conselho. Não devemos subestimar este temor pela dominação eclesiástica que os novos líderes temporais mostraram durante este período.

Os vários membros do Pequeno Conselho eram designados às distintas comissões segundo seu interesse e capacidade. Uma das comissões mais importantes, a de defesa, se encarregava da fabricação de munições, artilharia, pólvora, da cavalaria, e os mercenários para o pequeno exército; e de todo o necessário para proteger a cidade e seus habitantes. O Conselho nomeava diáconos responsáveis de toda a área de diaconia, que incluía responsabilidades quanto ao funcionamento do hospital e a assistência social aos pobres.

Toda esta área e as demais estavam delimitadas previamente à chegada de Calvino a cidade. Antes da mudança à fé reformada havia uns sete hospitais privados,

geralmente ligados a uma ordem religiosa. Em troca de terra ou ajuda, oferecidas pelos nobres ou famílias ricas, se faziam missas em beneficio dos doadores. Ao serem expulsos os católicos, o Conselho tomou a propriedade das religiosas claretianas e abriu um só hospital para atender às necessidades de todo o povo. Foi proibida a prática medieval da mendicidade e se insistiu em que todas as necessidades humanas deviam ser atendidas no hospital. Ali eram recebidos órfãos e anciãos sem família, enfermos de todo tipo, famintos, viajantes e gente que necessitava de trabalho. Aos domingos se repartiam grandes quantidades de pão às famílias aprovadas como necessitadas. Um diácono "hospitaleiro" e sua esposa, que viviam no hospital eram responsáveis por sua direção. Havia outros diáconos "Procuradores" responsáveis da assistência social na cidade, que visitavam os lares buscando solução dos problemas domésticos de quem encontrava em apuros.

Neste contexto, é importante notar como Calvino se adaptou à situação existencial. Elevou a dignidade do oficio eclesiástico de diácono ou ministério dos "hospitaleiros" e os "procuradores" do hospital, que haviam sido nomeados pelo Pequeno Conselho para responder às necessidades do povo. Em um sermão sobre 1 Timóteo 3.8-13, Calvino se referiu a estas duas classes de diáconos com toda naturalidade, como se o texto se referisse a elas. Também em Ordenanças Eclesiásticas, escritas quando regressou de Estrasburgo em 1541, definia as duas funções dos diáconos neste mesmo sentido. Sem dúvida, em Ordenanças Calvino propunha que o Pequeno Conselho tinha que consultar a Companhia de Pastores sobre a nomeação dos diáconos assim como dos presbíteros. Apesar da aprovação das Ordenanças da parte do Conselho, não existe evidencia de que se tenha feito esta consulta até 1547 no caso dos presbíteros e até 1562 quanto aos diáconos, dois anos após a morte de Calvino.

Pergunta: Quanto à relação entre o Conselho de Pastores e o Pequeno Conselho, qual foi à posição de Calvino?

Quando Calvino chegou a Genebra, a cidade contava com apenas onze mil habitantes. Havia casas e outros edifícios fora das muralhas da cidade. O perigo de um contra-ataque por parte do Duque de Sabóia para retomar seus territórios convenceu ao Pequeno Conselho da necessidade de demolir essas casas e edifícios e convidar a todos os residentes a viverem dentro da cidade. Isto significou que para receber aos novos habitantes como refugiados foi necessário edificar para cima (até três ou quatro pisos) e ocupar os terrenos baldios. Basta dizer aqui que Genebra se transformou em uma cidade de refúgio, tanto que o número foi duplicado entre 1545 e 1560. Chegaram refugiados de muitos países: italianos, espanhóis, alemães, holandeses, ingleses, escoceses e, sobretudo, franceses. O motivo principal foi a perseguição político-religiosa desatada em suas respectivas nações.

A chegada destes refugiados não foi vista de igual modo por todos os genebrinos. Para Calvino e outros refugiados como ele – seis dos sete pastores da cidade – esta era uma responsabilidade humana e pastoral de grande urgência. Porém muitos não queriam ver a tranqüilidade e a ordem tradicional perturbadas pela chegada de tantos estrangeiros. Especialmente algumas famílias com poder na cidade e seu governo se opuseram. Produziu-se uma crise em 1555 quando um grupo de cidadãos liderado pela

família de Ami Perrín se levantou em rebelião. Seus adeptos passaram pelas ruas gritando: "Morram os franceses!" Não há dúvida de que incluíam Calvino e a Companhia de Pastores dentro do Grupo rejeitado. A rebelião foi suprimida, Perrín e sua família fugiram, e certos líderes foram executados. Este fato consolidou o poder nas mãos dos que favoreceram Calvino e deu a este mais apoio durante os últimos nove anos de sua vida para a realização de seus programas.13

Pergunta: Por que havia muitos refugiados em Genebra?

A POSIÇÃO DO ESTADO NA IGREJA

O Estado tinha ingerência na nomeação dos oficiais da Igreja. Os pastores propunham o nome do candidato, o Conselho dava seu bom visto e a congregação tinha a palavra final. Durante a vida de Calvino, o Conselho nunca rejeitou uma proposta. Em seus votos, o pastor esplêndido jurava pelos magistrados e pelo Conselho que serviria a Deus com fidelidade, pregaria sua Palavra, edificaria a Igreja, admoestaria aos errantes sem temor ou favoritismo, buscaria o bem tanto do Conselho como da cidade, porém, sobretudo, daria a Deus a lealdade absoluta. Os presbíteros e parte dos diáconos eram nomeados diretamente pelo Conselho, ainda que depois de alguns anos a orientação dos pastores foi aceita por meio de um representante.

Na prática era sumamente difícil manter separadas as funções eclesiásticas e políticas. Os salários dos pastores assim como os gastos de sua obra ministerial e os custos da obra diaconal provinham da tesouraria da cidade. Como observamos, as nomeações passavam de uma forma ou de outra pelas mãos do governo civil. Às vezes surgiam controvérsias mui azedas sobre a política eclesiástica a seguir. Dois ou três exemplos são suficientes para ilustrar o problema. Durante os dezenove meses da primeira estadia de Calvino em Genebra, ele e Farel foram citados para comparecer na reunião do Pequeno Conselho e foram re-conveniados por terem se imiscuído nos assuntos dos magistrados. O fato de que Calvino em um sermão dominical tenha qualificado de “Conselho do diabo” ao Conselho da cidade não foi de grande ajuda. O motivo da expulsão de Calvino e Farel de Genebra em 22 de abril de 1538 foi a decisão do Conselho de que a Ceia não devia ser negada a ninguém. Os pastores insistiram em que a administração e o controle da Ceia do Senhor pertenciam exclusivamente ao poder eclesiástico e viram a decisão do Conselho como uma intromissão. Quando os pastores se recusaram a cumprir as exigências sobre a Ceia estabelecidas pelo Conselho, lhes deram três dias para sair da cidade. Os conflitos se prolongaram por três anos depois da partida de Calvino e até o convite que se lhe fizeram em 1541 para que regressasse. As Ordenanças Eclesiásticas escritas por Calvino foram adotadas pelo Conselho naquele mesmo ano, com o acordo de que a disciplina da excomunhão era um direito da Igreja. Porém isto se transformou em um ponto de controvérsia com o decorrer dos anos. Por

13 ? Sem dúvida, Calvino confessa em uma carta em 1562 haver alguns aspectos de seu programa que não podia ser realizados e teriam que ser realizados pelos que o seguissem na luta.   Um ponto importante foi a freqüência da celebração da comunhão.   Se bem que Calvino cria que o sacramento devia ser  acompanhado regularmente da Palavra como sinal de confirmação dela, em Genebra lutou por sua celebração mensal.  O Conselho da cidade insistia que ela fosse trimestral, e assim o foi.

exemplo, em 1549 o Conselho decidiu mudar a liturgia do culto ordenando aos pastores que recitassem o Pai Nosso com mais freqüência e dissessem os mandamentos do Senhor como havia sido antes. O célebre compositor Louis Bourgeous foi encarcerado por haver publicado seu saltério de forma diferente da que queria o Conselho.

Tampouco houve acordo entre o Conselho e os pastores quanto à posição do Estado com relação à Igreja. Em as Institutas da Religião Cristã, Calvino anuncia o dever do Estado frente aos cristãos em geral: promover o cumprimento das duas tábuas da Lei, guardando a honra devida a Deus e exercendo o juízo e a justiça na defesa dos débeis, pobres e prejudicados, sem distinção de pessoas. Calvino disse: “Quanto à segunda tábua, Jeremias admoesta aos reis que façam juízo e justiça, que liberem ao oprimido da mão do opressor, que não enganem nem roubem ao estrangeiro, nem ao órfão, nem à viúva, nem derramem sangre inocente” (Institutas, IV, XX,9).14 Calvino cita aqui a Jeremias 22.3-4, Salmo 82 e Deuteronômio 1.16-17. “Vemos, pois, que os governantes são constituídos como protetores e conservadores da tranqüilidade, honestidade, inocência e modéstia públicas (Rm 13.3) e que devem se ocupar de manter a saúde e a paz comum”.

Calvino insiste que os governantes – como diz o profeta (Jr 21.12; 22.3) – devem fazer juízo e justiça. “Justiça é acolher aos inocentes sob seu amparo, protegê-los, defendê-los, sustentá-los e libertá-los. O juízo é resistir ao atrevimento dos malvados; reprimir suas violências e castigar seus delitos”. Para que o Estado possa cumprir com estes deveres, Calvino se pronuncia a favor de: 1) a legitimidade da pena de morte, ainda que “a clemência é a principal virtude dos príncipes”; 2) a legitimidade das guerras justas, que são exclusivamente “para defender a terra confiada a seu cuidado”; 3) a legitimidade e bom uso das taxas e impostos, porém, recordando aos governantes que seus domínios não são “arcas particulares”, mas sim “tesouros da comunidade” e que os impostos são "subsídios da necessidade pública" (Institutas, IV, XX, 10-13).

Pergunta: Como Calvino define a justiça civil e o juízo civil?

A POSIÇÃO DA IGREJA FRENTE AO ESTADO

HONRAR E RESPETAR AS AUTORIDADES

O primeiro dever e obrigação dos súditos para com seus superiores é o de ter em grande estima e reputação a suas autoridades, reconhecendo-as como algo posto por Deus. Por esta razão devem honrar e reverenciar a seus governantes como vigários e tenentes de Deus. “Não há, pois, dúvida de que a qualquer um que esteja em superioridade se lhe deve obediência e submissão" (Institutas, IV.XX, 28). Uma obediência servil e de má vontade, como se o governo fosse “um mal necessário”, não corresponde ao cristão segundo 1 Pedro 2.17 (Institutas, IV,XX 23). Alguns pensam erroneamente que a vocação de magistrado é inútil entre os cristãos. Muito pelo contrario, sua vocação é defender e amparar a todos os súditos contra a maldade e a injustiça. É lícito pedir auxílio contra a injustiça, para defender a própria pessoa ou os próprios bens e para 14 ? Diante das referências a esta obra, os comentários e os sermões de Calvino serão incluídas no texto de forma abreviada.

exigir que sejam castigados “os ímpios e malvados” (Institutas, IV.XX, 17-25).

PERMANECER SUBMISSA À PROVIDÊNCIA E AO PODER DE DEUS. REPRESENTADOS NOS GOVERNANTES

É Deus quem distribui os reinos e põe os reis que Lhe agrada. Por tanto, sua tarefa não é algo leviano ou de pouca importância. “Sua vocação não é coisa profana nem alheia a um servo de Deus, mas sim um cargo sagrado; já que ao exercer seu ofício às vezes se fazem como Deus” (Institutas, IV. XX, 6). Se o governante nos trata cruel e desumanamente devemos fazer duas coisas como “pessoas particulares”: 1) estar dispostos a sofrer seguindo o exemplo de nosso Senhor; e 2) trazer à memória nossas próprias ofensas para nos humilharmos e nos arrependermos diante de Deus (Institutas, IV.xx, 26-31).

Pergunta: Que texto bíblico Calvino usa para provar que o cristão deve submeter-se ao governo?

ORAR POR TODAS AS AUTORIDADES, AS BOAS E AS MAS.

Os "fanáticos" (aqui Calvino pensa em certos grupos de espiritualistas de seus dias) querem remover todas as autoridades, porém, estão longe de toda humanidade.

Visto que Deus nomeou os magistrados e príncipes para a preservação da humanidade, ainda que falhem muito em sua tarefa divina, não obstante não devemos por este motivo deixar de amar o que pertence a Deus e desejar que permaneça em vigência. Esta é a razão pela qual os crentes, em qualquer país onde vivam, devem não só obedecer as leis e o governo dos magistrados, mas sim igualmente em suas orações rogar a Deus por sua salvação (Comentário sobre 1 Timóteo 2.2).

Portanto, segundo Calvino nós devemos orar pelos que não o merecem com o fim de que Deus transforme os homens maus em homens bons. O princípio fundamental é este: que os magistrados de Deus foram nomeados para produzir os frutos da proteção da religião, a paz e a decência da sociedade, exatamente da mesma forma em que a terra tem sido destinada a conferir seus dons. Os governantes, por sua parte, devem promover a religião e regular a moral por meio de uma disciplina sã. Por isso, Isaías os chama de “aios” e “amas" da Igreja (Is 49.23).

Pergunta: Segundo 1 Timóteo 2.2, por que é preciso orar por todas as autoridades?

ADVERTIR OS GOVERNANTES ACERCA DE SEUS DEVERES E OBRIGAÇÕES

Um governo justo e bem ordenado se conhece por sua proteção aos direitos dos pobres e aflitos. O profeta no Salmo 82 ensina que os governantes são nomeados para serem defensores dos que sofrem e são oprimidos. O propósito pelo qual o Estado traz a

espada é restringir os maus e impedir a violência entre os homens. Os governantes são culpáveis de negligência diante Deus se não ajudam aos que necessitam de seu cuidado (Comentário sobre Salmo 82.3-4).

Sobre a tarefa profética dos líderes da Igreja, Calvino fala com uma clareza inegável. Muitas vezes existe grande culpabilidade por parte dos governantes.

Por esta razão os profetas falam tão fortemente contra eles. O povo comum falha muito, ou por omissão ou por erro ou pelo exemplo dos outros; porém, os que governam são geralmente os que pervertem toda lei e equidade... Pois não é razão para admirar-se se nosso Senhor mediante seus profetas os ataca com tanto vigor (Comentário sobre Amós 8.4).

Assim, os ministros, falando em nome da Igreja de Jesus Cristo, têm o dever de reclamar do governo civil o fiel cumprimento de sua vocação. Foi precisamente o cumprimento de este dever que fez do calvinismo uma força impulsionadora dos movimentos de crítica contra os governos de seu tempo. Para corrigir a arrogância dos que governam segundo suas próprias paixões e deixam para trás toda equidade, o profeta proclama que Deus é o governante supremo e quem julga toda potestade terrena (Comentário sobre Salmo 82.2). A autoridade do rei é secundária, relativa, condicionada e limitada por Deus, diante de quem todo príncipe e governante é responsável.

Aqui o profeta demonstra que não importa o quão eminentes sejam os dotados com poder sobre o povo, eles mesmos não são sagrados nem estão absolvidos de toda lei por algum privilégio peculiar, porque Deus os julga livremente por seu Espírito e os censura por meio de seus profetas (Comentário sobre Ezequiel 11.1-2).

Pergunta: A autoridade do rei é _____ por Deus.

DEFINIÇÃO TEOLÓGICA DA POLÍTICA

Para entender qual era o modelo de governo mais consoante com a perspectiva bíblica segundo Calvino, temos que considerar sua definição teológica da vida não eclesiástica. O que significava para ele esta área da realidade, e como se relacionava com a parte chamada "espiritual"?O REINO DE DEUS

Em primeiro lugar, devemos considerar da perspectiva de Calvino a centralidade da presença do Reino de Deus. “Se diz”, afirma Calvino, que Deus “reina entre os homens quando eles se dedicam e se submetem voluntariamente para serem governados por ele” (Harmonia de Mateus, Marcos e Lucas, Mt. 6.10, Lc 11.2). O reinado de Deus se "faz em parte por meio da pregação da Palavra e em parte por meio do poder secreto do Espírito... ambos devem estar unidos para que o Reino de Deus seja estabelecido”. É a justiça de Deus em operação no mundo que constitui a meta do Evangelho. A essência da oração "Venha a nós o teu Reino” é que Deus ilumine o mundo pela luz de sua

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Palavra, que molde os corações dos homens pela influência de seu Espírito para que obedeçam a sua justiça, e restaure a ordem toda a desordem que existe no mundo pelo exercício benévolo de seu poder. Ele começa agora seu Reino mediante a sujeição dos desejos de nossa carne. Além disso, como o reino de Deus está crescendo continuamente e avançando para o fim do mundo, devemos orar diariamente que venha: porque onde existe a iniqüidade no mundo, o reino de Deus, que traz consigo a justiça perfeita, ainda não tem chegado (Ibidem).

Visto que o Reino de Deus consiste no governo de Deus sobre toda a vida e opera sobre toda a vida, devemos considerar de que maneira existe um duplo regime para o homem, “um espiritual, mediante o qual se instrui a consciência na piedade e o culto a Deus; o outro, político, pelo qual o homem é instruído em suas obrigações e deveres de humanidade e educação, que devem presidir as relações humanas” (Institutas, III.xix, 15).

Estes dois aspectos da vida cristã são independentes, ainda que não se oponham, mas sim que se complementam um ao outro. Neste contexto, Calvino define cabalmente os deveres políticos do Estado.

O fim do governo temporal é manter e conservar o culto divino externo, a doutrina e a religião em sua pureza, o estado da Igreja em sua integridade, fazer-nos viver com toda justiça segundo temos de viver entre eles, instruir-nos na justiça social, colocar-nos de acordo uns com os outros, manter e conservar a paz e tranqüilidade comum. Todas estas coisas são supérfluas se o Reino de Deus, que atualmente está entre nós, destrói esta vida presente. Porém se a vontade de Deus é que caminhemos sobre a terra enquanto suspiramos por nossa verdadeira pátria, e se, além disso, tais ajudas nos são necessárias para nosso caminho, àqueles que querem privar aos homens delas, querem impedir que eles sejam homens (Institutas, IV.xx, 2).

Resumimos o que foi dito até aqui sobre o Reino de Deus desta maneira: 1) o Reino de Deus é uma realidade presente; 2) a vida em sua totalidade está compreendida no Reino de Deus; 3) todos os homens devem se submeter ao governo divino; 4) os meios que Deus usa para avançar seu Reino são a Palavra e o Espírito juntos; 5) a meta do Evangelho é o estabelecimento da justiça em todo o mundo; 6) existem dois regimes – um espiritual e outro político – que são necessários tanto para os cristãos como para os demais homens e, 7) as coisas temporais são essenciais para que os homens sejam homens.

Pergunta: Segundo Calvino, o que o reino de Deus tem a ver com a política?

A ORDEN CIVIL

A função política do Estado é indispensável para todo homem. Calvino afirma que seria uma “barbárie desumana” não admiti-lo. “Sua necessidade não é menor entre os homens

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que a do pão, a água, o sal e o ar” (Institutas, IV.xx, 3). Isto é assim não somente porque os homens têm que comer e beber para manter-se com vida, ou seja, para “que exista humanidade entre os homens", mas também para que haja "uma forma pública de religião entre os cristãos". Diz Calvino: “Aprovo uma forma de governo que tenha cuidado de que a verdadeira religião contida na Lei de Deus não seja violada nem corrompida com uma licença impune” (Ibid.).

Disto se depreende que o cuidado da Lei de Deus nas duas tábuas é tarefa do governo civil. Fica claro, então, que a vocação dos magistrados seja de origem divina e que eles devam funcionar como os ministros e vigários de Deus. É uma tarefa tão sagrada e de tanta responsabilidade (e talvez ainda mais) como a dos outros ministros da área eclesiástica. “Portanto, não se deve por em dúvida que o poder civil é uma vocação, não somente santa e legítima diante de Deus, mas também mui sacrossanta e honrosa entre todas as vacações" (Institutas, IV.xx, 4).

Os reis são as mãos de Deus (Sermão sobre Jó 34.10-15). Os reis, os príncipes e os magistrados são chamados filhos de Deus porque neles manifesta Deus a sua majestade (Homilia sobre 1 Samuel 10).

São duas as coisas que distinguem Calvino dos demais reformadores: por um lado, o caráter essencial do governo civil para os cristãos em igualdade com os demais homens; e por outro, o uso da Lei de Deus como guia tanto para a vida política como para a vida eclesiástica. Lutero e Calvino têm em comum dois usos da lei moral: o uso pedagógico, para instruir-nos e fazer-nos conhecer a nossa própria injustiça e chegar assim ao arrependimento; e o uso político, para restringir o mal e manter a ordem no mundo. A estes dois usos, Calvino agrega um terceiro: a lei como guia para conhecer a vontade de Deus e acercar-nos assim mais e mais ao perfeito conhecimento dela (Institutas, IV.vii, 6-17). “O ofício da Lei consiste em advertir-nos de nosso dever e incitar-nos a viver em santidade e inocência” (Institutas, III.xix, 2). Assim, todos os homens estão sob a lei moral. Todos os ministros de Deus (sejam políticos ou eclesiásticos) têm o dever de ensinar e cuidar da observância desta lei.

As duas ordens – a religioso e a política – que estão integradas na vida do individuo, devem vincular-se em uma unidade comum. O governo político não é indispensável aos crentes nem é primeiramente um instrumento para a repressão do mal, como em certo momento haviam pensado Lutero e os anabatistas. “A autoridade que os reis e outros governantes possuem sobre todas as coisas da terra não é conseqüência da perversidade dos homens, mas sim da providência e da santa lei de Deus” (Institutas, IV.xx, 4). Calvino inaugurou uma nova etapa na Reforma ao estabelecer uma estrutura política e eclesiástica para assegurar a solidariedade e a continuidade da Reforma.

Pergunta: Lutero ensinou que havia dois usos para a lei de Deus: para restringir o mal e manter a ordem no mundo. Qual foi o terceiro uso da lei, segundo Calvino?

TEOCRACIA OU DEMOCRACIA

Temos visto que o Estado e a Igreja em si não são opostos, mas que quando estas duas ordens estão corretamente constituídas “não divergem entre si de modo algum”

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(Institutas, IV.XX, 2). Alguns intérpretes crêem que a relação entre a Igreja e o Estado em Genebra constituiu uma teocracia. Reinhold Seeberg afirma: “A reforma de Calvino, pois, foi realizada sob a forma de uma teocracia. Deus é o Senhor: a Igreja deseja adorá-lo; o estado obriga a fazê-lo".15 Ernst Troeltsch diz: "A teocracia calvinista chega a ser uma aliança divina com a Igreja sobre as bases da revelação, na qual o Estado está para servir a Igreja, à maneira dos reis de Israel, e na qual a vida pública é controlada pelos pastores à maneira de os profetas16

Estes enfoques têm certa base no que foi a prática político-eclesiástica de Genebra. Porém suas afirmações tão dogmáticas pressupõem sua própria definição de teocracia e não fazem jus à tentativa de Calvino de separar os dois terrenos, não tanto na responsabilidade mútua para com Deus, mas sim em seus objetivos e esferas de ação. Os dois autores citados têm razão se quer afirmar que Calvino, com sua teologia do senhor universal de Jesus Cristo e sua convicção na presença criativa do Reino de Deus atuando pela Palavra e pelo Espírito, não aceitaria jamais a idéia moderna de um Estado neutro e a - religioso. O conceito de Calvino é outro.

Segundo a Real Academia Espanhola "teocracia" vem de duas palavras gregas: theos (Deus) e kratos (poder). O dicionário apresenta duas definições: por um lado, se refere ao governo exercido diretamente por Deus, como no caso dos hebreus antes que tivessem reis; por outro, aponta a um governo no qual o poder supremo está submetido ao sacerdócio, o qual se conhece como hierocracia ou governo dos sacerdotes. Segundo estas definições, Genebra esteve longe de ter uma teocracia. O governo real esteve nas mãos de um grupo de comerciantes, artesãos, família tradicional e outros, todos escolhidos ou nomeados pelos cidadãos, e que tinham o controle absoluto sobre os assuntos do povo. Os membros dos Conselhos eram escolhidos e nomeados exclusivamente pelos cidadãos. Durante a maior parte de seu ministério, Calvino e os outros pastores lutaram pela independência da Igreja em três áreas: o direito de definir as doutrinas, o direito de elaborar as leis e regras internas (liturgia, nomeação de seus próprios oficiais, a vida moral dos crentes), e o direito a uma jurisdição própria, particular-mente no que diz respeito à disciplina eclesiástica.

O progresso da Reforma foi tal que, quase vinte anos depois da primeira chegada de Calvino a Genebra, os que lhe apoiaram chegaram a ganhar o controle do Conselho da cidade. Assim, durante os últimos nove anos de sua vida, Calvino viu incrementado o poder de sua palavra e força moral. Em 1555 conseguiu que a jurisdição sobre a disciplina cristã fosse outorgada ao Consistório, alcançando assim o reconhecimento deste direito para a Igreja, reconhecimento deste direito para a Igreja, reconhecimento que tanto havia anelado durante sua vida. Outras reformas que desejava como certos aspectos da liturgia, incluindo a maior freqüência na celebração da Ceia, tiveram que ficar para os que lhe seguiram. Assim o confessou em uma carta a um amigo pouco antes de sua morte.

Para Calvino, a Igreja era o corpus mysticum – o corpo místico de Jesus Cristo – que não deve ser confundido com o corpo político. Trata-se de dois regimes, como observamos mais acima, distintos, porém, complementares e os dois indispensáveis para

15 ? Seeberg, Reinhold, Manual de História das Doutrinas 2 vols. (El Paso: Casa Bautista de Publicaciones, 1965), 2:398.16 ? Troeltsch, Ernst, O Ensino Social das Igrejas Cristãs, 2 vols. (New York: Harper and Brothers, 1960), 2:627.

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o bem da humanidade. O que aconteceu foi que freqüentemente o Pequeno Conselho tomava decisões com implicações eclesiásticas. Os pastores eram consultados e às vezes eles mesmos trataram de impor seu parecer sobre o Conselho. A mudança da mentalidade medieval foi muito lenta, porém, as diretrizes para o caminho à modernidade estavam traçadas.

Calvino comenta as diversas formas de governo e seus defeitos. Fala da monarquia, na qual o rei facilmente se converte em tirano; a aristocracia, na qual os nobres podem construir uma dominação iníqua; e a democracia, na qual se levantam sedições com suma facilidade. Calvino prefere a aristocracia sobre a monarquia, porque é quase um milagre que um rei dispense equidade e justiça. Porém, sua preferência final é o governo de muitos. “O vício e os defeitos dos homens são a razão de que a forma de governo mais transmissível e segura seja aquela em que governam muitos, ajudando-se uns aos outros e sendo advertidos de seu dever; e se alguém se levanta mais do que o conveniente, que os outros lhe sirvam de censuras e amos” (Institutas, IV.xx,8).

Desta forma se alcança com maior facilidade o objetivo desejado, que é a equidade e a justiça. Sheldon S. Wolin afirma que o governo que Calvino desejava e apoiava “não era uma teocracia, mas sim uma comunidade corporativa que não era puramente religiosa nem puramente laica, mas sim uma composta de ambas”.17

Pergunta: Em sua opinião, Genebra era uma teocracia?

OBEDIÊNCIA E RESISTÊNCIA

Como temos observado a insistência de Calvino na obediência às autoridades civis, não somente às boas, mas também às más, é muito categórica. É a mensagem que se escuta em todo o tratado acerca do governo e também nos comentários. Parece-me que não é necessário que consideremos isto agora. Porém, quase ao final deste mesmo tratado, Calvino deixa cair uma bomba de tempo. Abre uma porta rumo à modernidade, por isso alguns o louvam e outros o amaldiçoam. No penúltimo parágrafo de As Institutas Calvino levanta a questão: “Em que medida e como resistir à tirania de certas autorida-des?” Calvino vê que na história alguns reis maus e senhores intoleráveis foram lançados por terra por outros magistrados, às vezes por mandato do próprio Senhor. Ele adverte: “Considerem bem, pois, os príncipes estas coisas e tremam". Aqui faz uma distinção que se encontra também em seu comentário sobre Romanos 13. A correção e o castigo dos maus reis Deus não "a põe nas mãos daqueles a quem não tem ordenado, mas sim obedecer e sofrer. Falo sempre de pessoas particulares” (Institutas, IV. xx, 31. A ênfase é minha)... “Porque não é da competência de um particular tirar o poder a quem o Senhor constituiu em autoridade sobre ele” (Comentário sobre Romanos 13.5. A ênfase é minha).

Se aos particulares não lhes é permitido resistir, quem pode fazê-lo? A resposta é simples: isso corresponde às autoridades menores, como os nobres, os magistrados, e as cortes onde os três estados (prelados, nobres e cidadãos) estão presentes ou representados. Para tais intermediários, sempre que não seja uma minoria pequena, o

17 Wolin, Sheldon S., Política e Perspectiva (Buenos Aires: Amorrortu Editores, 1960), p. 182.

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conselho é diferente:

Assim proíbo a tais estados a se oporem e resistirem, conforme o ofício que têm, à excessiva licença dos reis, que se eles dissimulassem com aqueles reis, que se eles dissimulassem com aqueles reis que desordenadamente oprimem ao povo infeliz, eu afirmaria que tal dissimulação tem de ser detida por uma grave traição. Porque maliciosamente como traidores de seu país levam a perder a liberdade de seu povo, para cuja defesa e amparo devem saber que têm sido colocados por ordem divina como tutores e defensores (Institutas, IV.xx, 31).

No último parágrafo Calvino comenta a desobediência de Daniel (6.20-22) ao rei: “Porque o rei havia ultrapassado seus limites; e não somente havia se excedido com respeito aos homens, mas também havia degradado e perdido sua autoridade" (Institutas, IV.xx, 32).

Calvino, nas passagens citadas, sugere mais que uma desobediência passiva. Em seu Comentário de Daniel faz da resistência ativa uma obrigação para os súbditos quando os príncipes exigem desobediência a Deus. Em seu comentário sobre Daniel 6.22 desafia aos governantes temporais: "Os príncipes terrenos colocam de lado todo seu poder quando se levantam contra Deus, e são indignos de serem incluídos na humanidade. Antes, devemos cuspir sobre suas cabeças e não obedecer quando são tão revoltosos e querem roubar a Deus de seus direitos”. Calvino mostra a mesma atitude desafiante para com os príncipes rebeldes em seu sermão sobre o mesmo texto:

Deus deseja que haja oficiais civis e graus de honra, e quer que alguns governem e outros se sujeitem. Como nos mostra São Paulo, o poder vem somente de Deus. Os que desprezam aos superiores deste mundo fazem guerra contra Deus. Porém, quando os principados se levantam contra Deus, não se mostram indignos de qualquer consideração? Isto é muito certo... Devemos obedecer a nossos príncipes, que têm sido postos sobre nós. Ainda que nos torturem corporalmente e utilizem da tirania e crueldade contra nós, é necessário agüentar tudo isto, como diz Paulo. Porém, quando se levantam contra Deus, devem ser abatidos e não devem ser considerados de maior valor que sapatos estropiados. E por quê? Porque o fundamento de tudo é destruído. 18

Pergunta: Qual é a motivação principal, segundo Calvino, para resistir às autoridades civis?

CONCLUSÃO19

18 Harkness, George, John Calvin, the Man and his Ethics (João Calvino, o Homem e Sua Ética) (New York: Abingdon Press, 1958), p. 230.19 O material apresentado neste relatório é um capítulo preparado pelo autor para o livro Os Evangélicos e o Poder Político na América Latina (Grand Rapids: Eerdmans, 1986), pp. 41-72.

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Como indicamos na introdução, não é possível traçar convergências ou estabelecer comparações entre a situação histórica do século XVI e a do século XX. Podemos sim destacar alguns pontos que podem esboçar interrogações e sugerir diretrizes úteis para nossa atual problemática ética, política e eclesiástica. Não pretendo mais que propor uma série de indicadores para o caminho, que podemos aceitar o rejeitar, porém, aos quais devemos pelo menos responder.

Em primeiro lugar, a relação entre a Igreja e o Estado se define sempre de novo segundo a constelação dos fatores históricos e religiosos de um determinado momento. Calvino não propõe uma relação ideal, mas sim que se vá adaptando as exigências sobre o que cada instituição pode esperar da outra. Isto se vê tanto em sua sacralização das tarefas dos hospitais e procuradores, no ofício eclesiástico de diácono, como em sua implacável insistência de que à Igreja pertence o direito à disciplina eclesiástica.

Segundo, a participação significativa dos leigos, tanto no governo da Igreja por meio dos presbíteros como na direção exclusiva do governo político, foi um passo à frente na compreensão do significado do sacerdócio universal de todos os crentes. Esta participação se baseia no caráter sagrado de todos os aspectos da vida humana dentro da perspectiva totalizadora do Reino de Deus presente como princípio ativo na história humana.

Terceiro, existe uma relação de tensão entre as duas ordens da sociedade mediante as quais Deus manifesta seu senhorio no mundo. Aqui se destaca a importância da ordem como estrutura criada no mundo para realizar os princípios de justiça e equidade, que são fundamentais para a realização plena do homem. Por parte do Estado, isto significa a realização destes princípios com atenção prioritária aos débeis e prejudicados da sociedade. Por parte da Igreja, isto significa o exercício de uma posição profética com respeito ao Estado e ao cumprimento de uma tarefa de pregação e caridade.

Quarto, a lei moral dada por Deus constitui o guia principal tanto para o Estado como para a Igreja. Não só a segunda tábua da Lei, mas também a primeira, vêm a ser responsabilidade do Estado. A neutralidade sobre qualquer aspecto da vida pública ou humana é algo inimaginável para Calvino. Porém, a interdependência das duas ordens se presta a grandes confusões na realização da obediência a estas duas tábuas. Quando a Igreja e o Estado se baseiam em os mesmos grupos humanos, a tendência rumo a uma religião civil ou a um mimetismo excessivo é perigosa. De Genebra aprendemos que a Igreja tende a refletir as mesmas debilidades e forças que existem na vida pública em seu momento histórico, ou seja, um governo civil democrático (ver, por exemplo, o contraste de Genebra com as igrejas territoriais da Alemanha e as igrejas com tendências monárquicas na França e Inglaterra), e um governo civil monárquico tende a ser refletido em um governo eclesiástico hierarquizado.

Em quinto lugar, deve-se esperar de as ambas partes a confrontação dos dois regimes com posições opostas sobre questões básicas que são orientadoras da vida pública. De sua parte, o Estado corre um duplo perigo: pretender ser o único e final determinador da consciência humana, ou ser instrumentado por uma corrente religiosa para alcançar a imposição de uma religião civil. A Igreja também confronta um duplo perigo: impor sua interpretação da existência humana como a única verdade e perseguir

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aos não conformistas, ou abençoar uma tendência político-ideológica e perder sua capacidade profética frente ao Estado. Genebra deve ensinar-nos a evitar os casamentos fáceis entre os dois regimes.

Sexto, quando o regime político rejeita seu dever primordial de instituir a equidade e a justiça, quando exige desobedecer à vontade clara do soberano Senhor da história, quando se rebela contra a lei moral das duas tábuas, tal regime perde sua autoridade divina sobre os súditos de seu reino. A ordem primária de obediência passiva mesmo frente à perseguição, as crueldades e a tortura corporal, fica suspendida em tais casos, não para os indivíduos e as pequenas minorias, porém, sim para os magistrados e os governos representativos dos diferentes grupos sociais.

Pergunta: Segundo Rooy, Quais são as 6 conclusões que podemos tirar quanto à relação entre a igreja e o estado como foi praticado em Genebra nos dias de Calvino?

Finalmente, o governo que serve melhor é aquele no qual muitos têm a responsabilidade de assegurar a administração eqüitativa da justiça e evitar a tendência humana de concentrar o poder nas mãos de uns poucos e de exercer uma tirania desumana sobre os demais. Calvino aceitou a estrutura do governo político existente em Genebra, porém, exigiu sua submissão a uma ordem superior, a autoridade de Deus. Desta forma Calvino definiu o poder político como derivado, secundário e limitado por estar condicionado ao fiel cumprimento da equidade e a justiça, encomendadas pelo Criador para a sociedade humana.

Sobre a base destas considerações é possível estabelecer alguns indicadores para o caminho Latino-Americano, que seguidamente enumero:

1. A base da tarefa política da parte do cristão radica na presença dinâmica do Reino de Deus em todos os aspectos da realidade histórica.

2. A plena soberania de Deus, tanto sobre a natureza como sobre toda a sociedade humana, exige a obediência à lei moral por parte de todas as pessoas, sejam governados ou governantes,

3. A vida plena e integral do homem inclui os aspectos afetivo, físico e espiritual, sem os quais não se pode chegar a se realizar como ser humano segundo a meta estabelecida por Deus.

4. O cristão tem a vocação sagrada de responsabilizar-se pelo que acontece em sua área de atuação, particularmente na política. Não deve atuar como um indivíduo isolado dos demais, mas sim como um membro de uma comunidade de pessoas que se preocupam pelo bem da vida civil.

5. O objetivo primordial do governo e, portanto, do político cristão é o de alcançar a equidade e a justiça em todo seu território, dando prioridade aos pobres e oprimidos. A autoridade de todo governo é derivada, secundária e limitada porque está condicionada ao fiel cumprimento da tarefa que lhe foi encomendada.

6. Os instrumentos que guiam o político cristão são os disponíveis em seu tempo e espaço histórico, vistos sob a luz da Palavra e do Espírito divinos.

7. O dever do cristão como cidadão particular é o de obedecer às leis, orar pelas autoridades, sofrer se for perseguido, e reclamar pela justiça quando as autoridades são

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infiéis ao seu mandato.8. Recomenda-se a resistência pacífica sob condições normais quando o governo

não cumpre com seu mandato de administrar justiça. Sem dúvida, em casos excepcionais poderia ser necessário recorrer a uma resistência aberta com o uso da força como último recurso. Tal ação só será possível quando tenha sido autorizada por uma organização social qualificada e depois de uma consideração profunda e cuidadosa, que haja determinado a necessidade de rebelar-se contra um governo que sistematicamente atua contra o bem dos governados.

9. Todo governo que trai sua vocação e em lugar de promover o bem e castigar o mal faz o inverso, perde sua autoridade para governar.

10. A Igreja cristã é chamada para realizar uma tarefa profética frente às autoridades, uma tarefa didática com referência aos que estão dentro de sua esfera de ação, e uma tarefa de serviço com respeito às vítimas de uma política inadequada ou perversa.

11. O sacerdócio universal dos crentes mostra a necessidade da participação de todos, sejam leigos ou pastores, na tarefa política. A capacitação de certos membros do corpo de Cristo com dons especiais requer a seleção e preparação de certas pessoas da comunidade cristã para a participação ativa nos partidos políticos e nos distintos níveis governamentais.

(1) Sidney Rooy, "Relações da Igreja com o Poder Político”, Os Evangélicos e o Poder Político na América Latina (Grand Rapids: W.B. Eerdmans, l986), p. 41-72. Usado com permissão.

PLANO DE ESTUDO PARA A LIÇÃO 7

1. Boas-vindas.2. Oração.3. Revisar as leituras e perguntas/respostas para o capítulo 6.4. Preparar-se para o exame final revisando todas as perguntas e respostas.

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PERGUNTAS PARA O CAPÍTULO 7

1. Qual foi à perspectiva do monsenhor Carlos José Romero quanto a Lutero e Calvino?2. Qual foi o conceito de Michelsen quanto à influência de Lutero e Calvino na sociedade? 3. Durante a idade média, qual foi a relação do estado frente à lei?4. Qual é a posição de Lutero quanto ao reino de Deus e o estado?5. Em Genebra, que conselho era o mais poderoso?6. Que relação tinha o Conselho de Pastores com o Pequeno Conselho de Genebra? 7. Quanto à relação entre o Conselho de Pastores e o Pequeno Conselho, qual foi a posição de Calvino?8. Por que havia muitos refugiados em Genebra?9. Segundo Calvino, que propósito tem a justiça e o juízo civil?10. Que texto bíblico usa Calvino para provar que o cristão deve submeter-se ao governo?11. Segundo 1 Timóteo 2.2, por que tem que orar por todas as autoridades?12. A autoridade do rei é __________ por Deus.13. Segundo Calvino, que tem ver o reino de Deus com a política?14. Lutero ensinou que havia dois usos para a lei de Deus: 1) restringir o mal e 2) para manter a ordem no mundo. Qual é o terceiro uso da lei, na opinião de Calvino?15. Em sua opinião, era Genebra uma teocracia?16. Qual é a motivação principal, segundo Calvino, para resistir às autoridades civis?17. Segundo Rooy, quais são as 6 conclusões que podemos tomar quanto à relação entre a igreja e o estado como foi praticado em Genebra nos dias de Calvino.

RESPOSTAS PARA O CAPÍTULO 7

1. Romero acusou Lutero e Calvino de serem dualistas com respeito ao homem não poder fazer boas obras.2. Ele disse, equivocadamente, que Lutero e Calvino eram dualistas, separando a religião do estado.3. O príncipe estava sob a autoridade da lei e das cortes.4. Lutero afirmou que existiam dois reinos: um é o reino de Deus e o outro é o reino secular.5. Pequeno Conselho.6. Estava estritamente ligados, o Pequeno Conselho nomeou aos pastores, diáconos,

e intervieram em outros casos eclesiásticos.7. Tratou, sem êxito, de tornar independente a igreja do Pequeno Conselho.8. Por perseguição religiosa em muitas nações.9. A justiça é defender aos inocentes e pobres e o juízo é resistir ao mal e castigar-lhe.10. 1 Pedro 2.1711. Para a proteção da religião verdadeira, pela paz, e para promover a religião

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verdadeira.12. Secundária, relativa, condicionada e limitada.13. O reino de Deus opera no estado e na igreja.14. Como guia para conhecer a vontade de Deus.15. Sua própria opinião.16. Quando as autoridades exigem desobediência a Deus.17. A relação entre a igreja e o estado se define segundo os fatores históricos e religiosos.

1. A importância dos leigos no sacerdócio universal de todos os crentes.2. O Senhor é rei sobre as duas ordens na sociedade.3. A tendência rumo a uma religião civil.4. É preciso esperar uma confrontação entre ambas as partes.5. Há razões para rejeitar a ordem política.

ESBOÇO DE ESTUDO DO CAPÍTULO 7

PERCEPÇÃO: A posição de Alfonso López Michelsen.MARCO HISTÓRICO: Sacro Império ou nacionalismo? Os dois reinos de Lutero.CALVINO E GENEBRA: Duque de Sabóia, Guillermo Farel, 1536, O Pequeno Conselho,Conselho de pastores e a diaconia.A POSIÇÃO DO ESTADO NA IGREJA1. Honrar e respeitar as autoridades (1 Pedro 2.17)2. Permanecer submissa à providência e ao poder de Deus que estão representados nos governantes (Rm 13.1-4)3. Orar por todas as autoridades, as boas e as más (1 Tm 2.2)4. Advertir aos governantes acerca de seus deveres e obrigações (Salmo 82.3-4)

CONCLUSÃO SOBRE A RELAÇÃO ENTRE A IGREJA E O ESTADO

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