ESPAÇOS INFORMAIS E EDUCAÇÃO BÁSICA

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ESPAÇOS INFORMAIS E EDUCAÇÃO BÁSICA

Yvonne P. MascarenhasOrganizadora

Thais Cardosomediadora

V Seminário da Agência CiênciaWeb

São Carlos, Outubro 2016

Instituto de Física de São Carlos

Instituto de Estudos Avançados

São Carlos

2018

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Instituto de Fisica de São Carlos/USPProf. Dr. Vanderlei Salvador BagnatoDiretor

Prof. Igor PolikarpovVice Diretor

Instituto de Estudos Avançados/USPProf. Dr. Renato AnelliCoordenador do Polo de São Carlos

Prof. Dr. Paulo Hilario SaldivaDiretor do IEA/USP

DiagramadorRafael Campelo

Ficha catalográfica elaborada pelo Serviço de Biblioteca e Informação IFSC/USP

E471 Espaços informais e educação básica. V Seminário da Agência CiênciaWeb (outubro, 2016:São Carlos, SP.)/Organizado por Yvonne P. Mascarenhas. São Carlos: IFSC/IEA, 2018.

138p.

1.Educação básica. 2. Espaços informais. I. Mascare-

nhas, Yvonne P. org. II. Cardoso, Thais, med. III. Titulo.

ISBN 978-85-61958-22-0 CDD 370

Apoio InstitucionalInstituto de Estudos Avançados/USP

Apoio

CNPq (Contrato No. 472364/2013-8)Centro de Difusão Científica e Cultural, Campus de São Carlos da USP

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SUMÁRIO

Introdução ....................................................................................................5

Primeira palestra Parque CienTec: Um Museu de Ciências a Céu Aberto ............................7 Fábio Ramos Dias de Andrade

Primeira Mesa Redonda Pesquisa em Educação Não Formal O Museu Itinerante PONTO UFMG ........................................................23 Profa. Tânia Margarida Lima Costa

Aprendemos nos Museus? .........................................................................29 Alessandra Bizerra

Segunda Palestra Catavento Cultural ......................................................................................43 Gabriel Giannini Furruel

Terceira Palestra A Contribuição dos Zoológicos à Educação e à Cidadania. ..................71 Kátia G. de Oliveira Rancura

Quarta Palestra Museu da Língua Portuguesa ....................................................................95 Marina Sartori de Toledo

Segunda Mesa Redonda Interação entre Espaços Não Formais e Escolas em São Carlos

O Laboratório Aberto de Interatividade (LAbI) da UFSCar................107 Adilson Oliveira

Interação das Escolas da Rede Estadual de São Carlos com Espaços Não Formais .......................................................................115 Daniela Isabel Taipeiro

O Centro de Divulgação Científica e Cultural, CDCC, Campus de São Carlos da USP ................................................................121 Valter Líbero

O Museu da Ciência Prof. Mario Tolentino ..........................................125 Paulo Milanez

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IntroduçãoEstamos muito acostumados a associar os museus a ideias de

conservação de patrimônio histórico e cultural. Entretanto, se pen-sarmos que cada vez mais, como afirma J. Amado Mendes que

...a educação continua a ser fator decisivo para o desenvolvimento das pessoas e da sociedade, com o conceito de aprendizagem ao longo da vida – muito

em voga em nossos dias e que constitui uma das ima-gens de marca das políticas educativas do século XXI –, o papel dos museus tem vindo a reforçar-se, como

complemento da educação formal, atribuída às es-colas, mas principalmente como fatores decisivos, no

âmbito da educação não formal.1

A realização deste Seminário visou à discussão e elaboração de sugestões visando o uso efetivo dos espaços não formais com a fina-lidade de apoiar as atividades educacionais formais e envolver cada vez mais os Museus de São Paulo e dos demais Estados Brasileiros nessas ações. Baseados nos resultados alcançados por esse evento pretende-se apresentar às autoridades educacionais e culturais mu-nicipais, estaduais e federais os resultados deste Seminário com so-licitação de medidas adequadas para o cumprimento dos objetivos ora almejados.

Entende-se como espaços científico-culturais não formais mu-seus, planetários, jardins botânicos, zoológicos, aquários, unidades de ciência móvel e associações que atuam na popularização da ciên-cia e tecnologia no País.

Foi nosso objetivo principal reforçar o papel desses espaços tanto na ampliação das possibilidades educacionais de crianças e jovens como no aprimoramento das oportunidades educacionais de todas as esferas sociais. Para tanto, os museus e espaços de divulgação científica existentes deverão aprimorar os recursos educacionais à disposição de seus visitantes.

No decorrer do Seminário procurou-se explorar opções de mu-seus e espaços interativos de ciências exatas, biológicas e humanas para que os professores do ensino básico conheçam formas de com-1  MENDES, J. A. Museus e Educação. Coimbra, Imprensa da Universidade de Coimbra, 2013. p.7. Disponível em: <https://digitalis.uc.pt/files/previews/90697_preview.pdf>. Acesso em 6.mar.2016.

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plementar, explorar, aprofundar e ilustrar o conteúdo estudado em sala de aula. Procurou-se divulgar e apresentar iniciativas desenvol-vidas por esses espaços na área de difusão científica e tecnológica e como as pessoas envolvidas com a educação formal podem aprovei-tar essas ferramentas em sala de aula. Buscou-se também criar uma área de interação entre representantes desses espaços e os professo-res da rede pública visando a troca de informações sobre como os papéis de ambos podem se complementar e de que forma poderiam desenvolver projetos em conjunto.

Não podemos deixar de mencionar que esforços nessa direção vêm sendo realizados no Brasil desde meados do século XX e que em novembro de 1990 foi criada no Rio de Janeiro a Rede de Popula-rização da Ciência e da Tecnologia da América Latina e Caribe (Re-dPOP) para incentivar a popularização da ciência através de vários meios inclusive através de Museus. Tal Rede foi criada com apoio e estímulo do Escritório Regional de Ciências da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) e vem desempenhando importante papel no incentivo dessas ativida-des nos países membros (Brasil, Argentina, México, Colômbia, Cuba e Uruguai). Desejamos que a realização deste Seminário possa con-tribuir para avançar mais um degrau na difícil escalada do desenvol-vimento científico de nosso país que tem sido procurado através de inúmeras atividades por nossas Sociedades Científicas, tanto indivi-dualmente como junto com a Sociedade Brasileira para o Progresso da ciência em suas importantes Reuniões Anuais.

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Primeira palestra

Parque CienTec: Um Museu de Ciências a Céu Aberto

Fábio Ramos Dias de Andrade

Geólogo, pela Universidade Federal do Paraná,

Mestre e Doutor em Geociências, Geologia regional, pela Unesp,

Professor associado da Universidade de São Paulo,

Desde 2012 é Diretor do Parque CienTec da USP

O Parque de Ciência e Tecnologia da USP, Parque CienTec, é um museu de ciências plenamente gratuito, focado na interatividade, na interdisciplinaridade e no protagonismo do público.

Localiza-se na zona sul da Região Metropolitana de São Paulo, no Parque Estadual das Fontes do Ipiranga, uma Unidade de Con-servação instituída no final do século XIX, a primeira no Estado de São Paulo, conhecida popularmente como Parque do Estado e con-cebida para proteger os mananciais de água das nascentes do Riacho do Ipiranga. A Figura 1 mostra o vale do Ipiranga de montante para jusante, ao fundo a cidade de São Paulo. Os cerca de 540 hectares do Parque Estadual das Fontes do Ipiranga representam uma das maio-res reservas de mata do Município de São Paulo (Figura 2).

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Figura 1. Vista da Cidade de São Paulo a partir do Parque CienTec, ao longo do Vale do Ipiranga.

Figura 2. Imagem de satélite da Região Metropolitana de São Paulo, destacando o Parque Estadual das Fontes do Ipiranga (Google Earth).

Uma notícia de jornal não datada (Figura 3), anterior a 1930, anunciava o início das obras do Observatório de Astronomia e Geo-física, com uma concepção artística do futuro prédio. O mesmo ob-servatório que hoje abriga o planetário no local do Parque CienTec (Figura 4). No final do século XIX e início do XX, o Observatório de Astronomia e Geofísica estava situado na Avenida Paulista, mas

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a urbanização trouxe problemas como trepidações do solo e a ilumi-nação pública, prejudicando as observações sísmicas e astronômi-cas. Por este motivo o observatório foi realocado na zona sul de São Paulo, local desabitado à época. Após a fundação da USP, em 1934, o Instituto de Astronomia e Geofísica (IAG) passou a fazer parte da Universidade. O IAG funcionou neste campus avançado por várias décadas e, no final da década de 1990, foi transferido para a Cidade Universitária no Butantã, quando foi então criado, em 2001, o Par-que CienTec.

Figura 3. Anúncio do início das obras do Observatório de Astronomia.

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Figura 4. Planetário do Parque CienTec durante Feira USP e as Profissões, em 2016.

O Parque Estadual das Fontes do Ipiranga (PEFI) abriga, além do CienTec, outras instituições públicas e concessionárias privadas (Figura 5), sendo as maiores o Instituto de Botânica, o Jardim Bo-tânico de São Paulo, a Fundação Jardim Zoológico de São Paulo. O PEFI é uma Unidade de Conservação incomum, cortada por uma avenida com tráfego intenso e linhas de ônibus, tangenciada por uma rodovia de grande porte, e cercada por bairros e comunidades de alta densidade demográfica. Essa situação gera uma pressão do ambiente urbano sobre o Parque, o que requer constante atenção, principalmente ao longo do perímetro do Parque. Em 2012, a Supe-rintendência de Gestão Ambiental da USP publicou uma Resolução que considera os 122 hectares o Parque CienTec como uma Reserva Ecológica da USP.

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Figura 5. Parque Estadual das Fontes do Ipiranga (imagem aérea, Google Earth).

O Parque CienTec é um órgão da Pró-reitoria de Cultura e Exten-são Universitária (PRCEU) da USP. A PRCEU conta com 11 órgãos, três deles dedicados à divulgação científica. Além do Parque Cien-Tec, há o Museu de Ciências, com projetos de exposição no espaço virtual, e a Estação Ciência, que tinha sede no bairro da Lapa, em São Paulo, e que atualmente passa por uma remodelagem, para vol-tar a funcionar em outro local.

O Parque detém cerca de 30 edificações, sendo dez prédios histó-ricos da época de fundação do Observatório. Os prédios históricos são construídos em torno de uma praça central, com vias que se-guem as direções dos pontos cardeais, em função das observações astronômicas ali realizadas. Há duas cúpulas astronômicas preser-vadas, sendo que uma delas conta com telescópio de refração da década de 1920, ainda em operação, onde são feitas sessões abertas de observação do céu. Há, ainda, uma estrutura tensionada com ca-pacidade para abrigar centenas de pessoas, inserida em um nicho na mata e usada no atendimento às escolas e em grandes eventos, como a Feira USP e as Profissões (Figura 6). O prédio principal, em estilo art déco, com vitrais, mosaicos e escadarias de mármore, espa-ço ocupado pela administração do Parque e que tem sido usado em parte para exposições temporárias (Figura 7).

Há também valioso acervo de instrumentos de época, em especial no Museu de Meteorologia. A meteorologia é parte integrante deste espaço desde a fundação do IAG e funciona no local a mais antiga estação meteorológica em atividade ininterrupta em São Paulo.

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Figura 6. Vista panorâmica do Parque CienTec (Fonte: Google Earth)

Figura 7. Vista do prédio da administração e da exposição temporária “O tempo e as plan-tas” (2016), onde plantas fósseis foram contextualizadas no tempo e comparadas com plan-tas atuais existentes no Parque CienTec.

Nas visitas de grupos de estudantes, buscamos diluir os limites entre as disciplinas, mesclando conteúdos de várias áreas do conhe-cimento em uma mesma visita, combinando atividades em labora-tórios e ao ar livre. Ao ar livre temos equipamentos lúdicos de física, como giroscópio, gangorra, bicicleta suspensa, conchas acústicas, uma maquete do Sistema Solar, além dos laboratórios de física, geo-física, microbiologia, solos, música e matemática. As trilhas ecoló-gicas têm graus de dificuldades e duração variados, de acordo com a faixa etária do público, desde crianças de 5 a 6 anos até grupos de terceira idade, incorporando conteúdos variados. Quanto aos for-matos de visita: (i) temática, duas atividades em duas horas, com intervalo para lanche, com um mediador para cada 20 pessoas, (ii) exploratória, percurso por todos os ambientes do parque, com 20 minutos ou menos em cada espaço, e com uma mediação menos intensiva por parte do Setor Educativo, (iii) aberta, visita não-me-

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diada, disponível em áreas restritas do Parque, com atividades livres e autoexplicativas.

A mata é um importante ambiente de observação e aprendiza-gem, onde podem ser feitas observações discussão de conteúdos multidisciplinares de biodiversidade, ciclos da natureza, mudanças climáticas, ocupação urbana, entre outros. As observações em cam-po podem ser retomadas e contextualizadas em laboratório, permi-tindo a construção de conceitos.

Uma de nossas principais metas é a formação de público, já que não temos uma tradição de incluir a visita a museus nas opções de lazer, especialmente os museus de ciências. O público que visita o CienTec é predominantemente escolar, através de contatos com as Secretarias de Educação Municipal e Estadual, e com as agências que atendem as escolas particulares. Procuramos conhecer as mo-tivações do público através de questionários on-line e de entrevistas com os visitantes. Nestes levantamentos, identificamos o planetário como um ponto importante de atração de público, assim como e as trilhas na mata e as ‘Tardes Científicas’, que são ciclos de conversas com pesquisadores sobre temas de interesse geral, realizadas quin-zenalmente aos sábados e que têm se mostrado importantes na fide-lização do público.

Os dados de público mostram um salto a partir de 2014 (Figu-ra 8), quando a Feira USP e as Profissões passaram a acontecer no CienTec. Além do grande número de visitantes da Feira, este evento tem gerado aumento de público ao longo do ano.

Figura 8. Número de visitantes do Parque CienTec, entre 2009 e 2016.

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A formação de público exige, entre outras coisas, a persistência em repetir eventos ano a ano, formando ciclos que acabam se fixan-do na memória coletiva. Este é o caso da Feira “USP e as Profissões”, que ocorre todos os anos na mesma época, atingindo grande sucesso de público, estando já inserido no calendário escolar dos anos finais do Ensino Médio. A participação na Semana Nacional de Ciência e Tecnologia, promovida anualmente pelo Ministério de Ciência, Tec-nologia, Inovação e Comunicação, é igualmente prioritária.

A aproximação com o entorno é outra meta importante desta gestão, em especial porque o CienTec está em uma região carente em termos de urbanização, saneamento, segurança e, claramente, de equipamentos culturais. Dispomos de um valioso acervo público e gratuito, e gostaríamos que a população do entorno usufruísse deste espaço. Enquanto as portarias e a estrutura de atendimento estão voltadas para uma avenida com boa estrutura de transporte e acesso, a parte dos fundos, limítrofe com as comunidades mais carentes, é fechada por um muro. Seria importante ampliar o acesso ao Parque, ampliando sua infraestrutura de atendimento e segurança.

Uma das vias de aproximação com o entorno tem sido a Secreta-ria Estadual de Educação, que tem incentivado as Escolas Estaduais mais próximas a fazerem uso mais intensivo do Parque.

Outra aproximação relevante se dá entre a divulgação científica e a pesquisa científica. Procuramos fomentar o desenvolvimento de projetos de pesquisa nas áreas de educação não formal, comporta-mento animal, biodiversidade, meteorologia, entre outras. Os pes-quisadores que desenvolvem suas pesquisas no Parque têm a opor-tunidade de compartilhar sua experiência com o público nas ‘Tardes Científicas’.

Todas as metas convergem para a formação de público e inserção do Parque no roteiro cultural da cidade de São Paulo.

Mediadora:

Inicialmente gostaríamos de comunicar que o Prof. Fábio e a Prof. Alessandra trouxeram 20 exemplares do livro “Parque de Ciência e Tecnologia da USP: restauração do conjunto arquitetônico de im-portância histórica para abrigar atividades de difusão da ciência e da tecnologia”, que sortearemos entre s presentes.

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Nós agradecemos o Prof. Fábio pela palestra, e agora nós vamos abrir o espaço para perguntas, dúvidas ou comentários da audiência.

Participante Gislene: “Bom dia, me chamou a atenção quando você está descrevendo as metas, a questão do reconhecimento e da aproximação do não-público, como é que isso se dá”.

Prof. Fábio: “A Alessandra é uma pessoa mais habilitada para res-ponder essa questão, mas basicamente, a gente procura através de questionários, vou dar um exemplo prático, nós fizemos um ques-tionário online que foi enviado para toda população da USP, pro-fessores, funcionários, há um ano e meio atrás, e nós coletamos aí um certa população, 4 mil e 500 respostas, da comunidade uspiana, em relação ao Parque CienTec, e também em relação aos espaços de divulgação cientifica, aos museus, aos acervos etc.

O resultado desse questionário revelou como o Parque CienTec é pouco conhecido pela própria da USP. Alessandra poderia falar melhor sobre isso”.

Alessandra:

“Gislene, a nossa preocupação é tentar entender quais as motiva-ções que levariam as pessoas a irem a um espaço como nosso, então nesse questionário que enviamos para comunidade interna uspiana, tínhamos uma questão para isso: se você não conhece, nunca ouviu falar, mas se a pessoa já tinha ouvido falar, e não tinha ido, o porquê que ela não tinha ido.

Verificamos que para comunidade uspiana o problema era o aces-so. Mas não podemos acreditar que essa é uma questão para a cidade de São Paulo, porque o zoológico tem um público numeroso a ponto dos carros, para parar no estacionamento chegarem até a Bandeiran-tes no transito e formare 3km de fila para ir parar no estacionamento do zoológico. Nós, agora, estamos tentando descobrir o que motiva-ria as pessoas a visitarem o museu.

Estou com uma aluna de mestrado que está investigando as mo-tivações que levam as pessoas para o zoológico, para o jardim bo-tânico, e para o CienTec, e uma aluna de IC, que já terminou a IC dela e tentou compreender das famílias que já estão lá aos sábados, o porquê que elas não iam antes e porque que vão agora.

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Então a gente viu por exemplo, que o planetário é um ponto im-portantíssimo, muitas famílias vão ao final de semana, por causa do planetário, e um outro movimento motivador que tem levado a um aumento do número de visitantes são as nossas tardes cientificas, quando fazemos um ciclo de palestras, e conversas entre especialis-tas e público. Outro fator que levou a maior número de visitantes foi o ter aberto o Museu aos sábados. Começamos a acompanhar esse público e entender quais são as demandas desse potencial público.

Porque em alguns países latino americanos, como o México, a cultura de visitação aos espaços não-formais é bastante intensa? No Brasil nós estamos construindo isso, e eu acho que no governo an-terior, com 15 anos de investimento em políticas públicas para isso, tivemos um ganho considerável. Eu sou otimista nesse sentido, esta-mos num caminho positivo, de ampliação de público.

Participante não identificado:

“Bom dia, gostaria de saber se esses monitores, esses mediadores, eles têm uma formação, pelo menos uma base pedagógica, quero dizer, a parte didática, psicológica em relação a contornar problemas comportamentais dos alunos, porque isso é um problema, quando você interage com pessoas de várias comunidades, não importa que tipo de comunidade, a diversidade comportamental, exige uma for-mação para lidar com isso. ”.

Prof. Fábio:

“É uma pergunta dificílima, porque a situações difíceis não se re-petem, elas são quase sempre únicas, é quase tudo inédito quando temos uma crise. O Museu tem um setor educativo e a chefe des-se setor é uma educadora, que trabalhou por mais de 20 anos na Estação Ciência, no espaço original, que era no bairro da Lapa em São Paulo. Essa pessoa tem muita experiência com um público mais carente, então ela fez um projeto que ficou muito famoso, acho que até internacionalmente conhecido, que é o ‘Projeto Clicar’, que é uma história linda, que a gente gostaria de repetir essa história lá no parque e que é o seguinte, a Estação Ciência ficava num prédio histórico, que era uma tecelagem, senão me engano, próximo a um terminal de ônibus, de trem, um mercado municipal, um local de grande circulação, e as crianças de rua, iam lá usar o banheiro, usar o bebedouro, iam correr lá dentro e tal. O Prof. Hamburguer, que foi

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um visionário, que criou a Estação Ciência, ele falou ‘poxa, a gente tem que achar um formato para eles se apoderarem disso aqui e não serem o ruído aqui dentro, para que isso seja deles’.

E esse Projeto Clicar, teve patrocínios também, senão me engano, de grandes empresas de computação, que doaram computadores e programas, e as crianças passam a ir diariamente lá, para usar aquilo como se fosse propriedade deles.

Então, eu não posso dizer que a gente tem todos os elementos para lidar com todos os problemas. Posso citar, por exemplo, que certa vez fazendo uma trilha longa no parque com colegas e estando com o pessoal de segurança, depois de quase 1hora e meia andando no mato, nos deparamos com pessoas consumindo drogas, pessoas que provavelmente estavam armadas. Eles se assustaram conosco e nós nos assustamos com eles.

Então, quando orientamos o público para não circular por tudo livremente, é porque não queremos expor o público a esse tipo de risco, de ser confrontado com uma situação tão inesperada como um grupo numa situação ilícita, que pode ter algum risco.

Mas o que a gente percebe é que não temos tido situações extre-mas com o público, nem o espontâneo e nem o agendado. Apren-demos muito com o público para aperfeiçoar o nosso atendimento.

Um exemplo que eu acho interessante, é que a gente recebe pou-cos cadeirantes, por exemplo, para pegar um grupo de pessoas com algum tipo de dificuldade, o que acontece é que às vezes o banheiro adaptado fica semanas sem uso, e as próprias pessoas às vezes da equipe acham que aquilo não vai ser usado nunca, e alguém tranca, ou usa para guardar alguma coisa.

Então esse tipo de visão a gente vai aperfeiçoando, no momento que alguém fica furioso, ‘poxa, o meu aluno precisou ir ao banheiro e estava trancado’, isso já cria um alerta para que essa situação não se repita, vamos fazendo um polimento das coisas, mas sempre lidando com o imponderável. ”

Prof. Alessandra:

“Eu acho que é uma questão bastante importante que você está trazendo, a formação de mediadores é crucial para esses espaços.

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Vemos nos nossos encontros diários, que é necessária uma formação mais contundente, mais coesa, mais contínua, e não tão pontual, tão momentânea, ainda mais que reconhecemos que os mediadores, são alunos de graduação, tem um tempo de bolsa limitado.

E como poderíamos pensar numa formação mais continua dos mediadores? Temos feito esforços junto a pró-reitoria de graduação da USP visando ter um modelo mais integrado de formação entre a licenciatura e os nossos órgãos de divulgação científica visando aproveitar os nossos espaços para que os alunos possam, também, desenvolver os seus estágios obrigatórios articulados a esses locais.

Existe uma resistência a essa proposta alegando-se que a legisla-ção não permitiria que os estudantes desenvolvessem seus estágios fora da escola, mas foram encontradas possíveis interpretações na legislação que permitem que estudantes façam parte dos seus está-gios nos espaços educacionais não-formais.

Então por exemplo, lá na faculdade de educação, a Profa. Mar-ta Marandino já faz isso com os alunos, permitindo que no estágio obrigatório dos cursos de licenciatura os alunos façam uma parte dele em museus. Entretanto, no Instituto de Biociências, onde eu dou aula, não conseguimos porque legalmente é na escola que o es-tágio tem que ser realizado.

Atualmente estamos tentando que a Pró-reitoria de graduação, junto com a Pró-reitoria de cultura e extensão da USP, montem um programa institucional em que fique muito claro, junto as comissões de graduação, que o aluno pode sim, contar horas de estágio obri-gatório em Museus. Isto levaria a uma formação inicial, articulada a uma formação continuada durante a prática de mediação. Mesmo essa solução não pode ser considerada definitiva e todo o processo é muito complicado, inclusive pela grande rotatividade de mediado-res. Esse é um desafio, um ponto crucial. Tanto assim que em todo encontro que participamos, a formação é um ponto nevrálgico de discussão. ”

Comentário do Prof. Valter Líbero, diretor do CDCC:

“Boa apresentação, foi bom conhecer um pouco mais o parque, embora já tenha estado lá algumas vezes. Você, às vezes, se refere ao parque zoológico como referência, ou talvez, não sei, como uma

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referência para ser alcançada. Nós também, tanto pela restrição de espaço que temos, como pelo tamanho da cidade, às vezes nos refe-rimos ao CienTec como o espaço que nós gostaríamos de ter. Então, todos temos alguma limitação, e isso é pelo anseio, de cada dia poder fazer melhor e mais para comunidade.

Entretanto, acho que há uma diferença muito grande entre aquilo que o zoológico faz, e aquilo que nós fazemos. O zoológico é um lugar em que você se diverte, é um show, você vai ver o macaco pu-lando, admirar os grandes mamíferos e a grande variedade de aves e répteis. Talvez até dentro do zoológico possa ter algum progra-ma educacional que explore questões envolvendo os bichos, mas as famílias vão lá, não é, suponho eu, pelo programa educacional do zoológico, mas é mesmo para olhar os bichos, enquanto nós não fa-zemos um show nesse sentido, não é uma diversão, não vou botar uma gangorra aqui no CDCC, para os alunos se divertirem nela. Se eu colocar a gangorra aqui, provavelmente nós vamos dizer que tem uma força de um lado, uma reação do outro, um peso, uma coisa desse tipo, e aí é que vem, às vezes, o desinteresse na hora que você transformou a gangorra num instrumento de ensino e não numa diversão.

Então a gente não vai conseguir competir com lugares que são pura diversão, enquanto que nós temos uma missão um pouco mais nobre, eu diria, embora, é óbvio que na divulgação cientifica, você também não pode ser tipo escola, por isso nós chamamos de espaços não-formais. Você tem que também explorar o aspecto lúdico, mas na medida certa. ”

Participante não identificado:

A minha pergunta para você é o seguinte: dadas as dimensões do Parque CienTec, a diversidade de programas, com quantas pessoas você trabalha, com quantos monitores, ou mediadores, que rodam a cada ano pelos programas? E quantos são fixos? Quem você diria que são os responsáveis pela formação desses mediadores, ou moni-tores? ”

Prof. Fábio:

“Eu também tenho essa percepção e evito ao máximo usar a pa-lavra entretenimento. O CienTec não é um espaço de diversão, é um

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espaço de uma outra coisa, mais serena, de uma coisa diferente, não é um espaço de diversão.

Precisamos achar uma linguagem que torne esse espaço mais vol-tado para o conhecimento cientifico, não divertida, mas instigante. Não queremos que as pessoas vejam um equipamento e deem garga-lhadas e achem aquilo um máximo, mas que elas fiquem fascinadas. Também a gente não tem dado muita ênfase em explicar todos os fenômenos para as pessoas, a gente fica feliz se alguém for ao parque e sair cheio de dúvidas, e ir até angústias e perguntas: ‘mas caramba, por que que aquilo acontece daquele jeito? ’, ‘então, tal coisa não era assim, como será que é? ’, e provocar dúvida. Isso não é uma coi-sa simples de fazer, mas a gente tem exemplos pelo mundo que são muito bem-sucedidos, tem o CDCC, tem vários lugares que fazem isso muito bem, e a gente vai aprendendo e tentando fazer.

A nossa equipe é enxuta, e se enxugou muito nesses programas da USP de incentivo a demissão. O parque tem um setor educati-vo, com quatro funcionários, dos quais apenas um é educador e três são funcionários fixos de apoio. Nos primeiros 10 anos de vida do Parque CienTec, nós não tínhamos nenhum educador, apenas uma equipe de manutenção, e o setor educativo era auto organizado de um jeito meio caótico, com o apoio mais ou menos engajado de um professor que simpatizava com a causa. Então, por um golpe de sor-te, conseguimos uma educadora, que deu um formato mais formal para nossa ligação com as escolas e é responsável pela formação e agendamento dos mediadores no atendimento aos grupos.

O número de mediadores oscila atualmente entre 30 e 40 mais ou menos, e eles têm resumidamente, três tipos de bolsas dependendo do tempo de participação: apenas aos sábados, 10 horas por semana e 30 ou 20 horas (estas em geral para alunos de curso noturno e po-dem durar até 2 anos).

O que é difícil nesse formato de equipe, é fazer a formação conti-nuada dos mediadores ao longo do semestre, porque tem aluno que só pode ir no sábado, outro só pode na terça, etc.”

Participante Adeilson:

“Olá professor, meu nome é Adeilson, eu venho de Barueri, da

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grande São Paulo, são duas perguntas, uma bem rápida, e uma um pouco mais longa.

A primeira pergunta é se o parque do CienTec está no programa de privatização que o novo prefeito de São Paulo anunciou recen-temente. A segunda é se as vias dos programas de pós-graduação, são vias diretas com vocês ou pelos programas de pós-graduação da USP. ”

Prof. Fábio:

“Adeilson, obrigado pelas perguntas. Em relação a primeira per-gunta, o Parque Estadual das Fontes do Ipiranga, não entrou nesse programa de privatização. Acredito que ele não vai entrar, porque ele é um parque muito complexo atravessado por uma avenida e, além disso, uma parte pertence à USP e já tem uma certa exploração com fundação privada, que é o caso da Fundação do Zoológico, e ainda cede, em concessão por 20 anos renováveis, o uso de terrenos para o zoológico, para o botânico, para a polícia ambiental e para o hospital psiquiátrico.

Quanto à segunda, o CienTec não tem um programa de pós-gra-duação próprio, porque ele não é uma unidade de ensino. Os pro-gramas de pós-graduação são vinculados às unidades de pesquisa, o que pode ocorrer é que um aluno por exemplo, faça o seu projeto de mestrado usando o Parque CienTec. ”

Participante Silvia:

“Professor, eu sou Silvia, eu gostaria de saber, já que o planetário é um dos principais atrativos do parque, se vocês desenvolvem essas seções de planetário, e como essas seções de planetário se relacio-nam com o restante da visita. ”

Prof. Fábio:

“O planetário é um ponto nevrálgico nosso, porque ele é a pri-meira coisa que as pessoas se lembram, em perguntas espontâneas. Quando fazem uma visita ao planetário, as pessoas adoram, mas o planetário é um equipamento muito caro e complexo e, infelizmen-te, tivemos um dano elétrico num projetor e estamos no processo de repara-lo ou mesmo adquirir um novo modelo.

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Comentário do Prof. Valter:

“Bom, como foi mencionado duas vezes o que é o CDCC, gosta-ria de esclarecer que ele não é um órgão da Pró-Reitoria de Cultura e Extensão (ProCEx), tal qual o CienTec, ou a Estação Ciência, ou ou-tros, mas temos uma vinculação muito forte com esse órgão, presta-mos contas a esse órgão. No organograma da USP estamos pendura-dos diretamente na ProCEx, mas dependemos administrativamente, por causa da nossa origem, dos Institutos de Física e de Química e participamos do Conselho de Cultura e Extensão da USP.”

Comentário da Prof. Yvonne:

“Fábio, eu acho que sua palestra foi um estímulo para todos con-tinuarem até o fim, pois levantou muito interesse e suscitou tantas perguntas. Agradeço e o parabenizo pela qualidade da sua apresen-tação, e também por revelar sinceridade de propósitos, que a meu ver, é a coisa mais importante. Obrigada por ter vindo. ”

Mediadora:

Bom pessoal agora eu vou pedir para as bolsistas que nos auxi-liam na recepção venham aqui para frente para fazermos o sorteio dos livros e a seguir teremos uma pausa de 30 minutos para o café.

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Primeira Mesa Redonda Pesquisa em Educação Não Formal

Primeira expositora

O Museu Itinerante PONTO UFMG

Profa. Tânia Margarida Lima Costa

Graduada em Matemática pelo

Instituto Cultural Newton Paiva Ferreira,

Mestre em Educação Matemática pela

Universidade Santa Úrsula do Rio de Janeiro

Doutora em Educação Matemática pela PUC de São Paulo.

Diretora geral da Escola de Educação Básica e Profissional da Universidade Federal de Minas Gerais,

Coordenadora do museu itinerante de Ciência e

Tecnologia da UFMG.

O Museu Itinerante Ponto CP-UFMG é uma estratégia educacio-nal que tem como missão a disseminação da cultura e do conheci-mento científico e tecnológico, produzidos nas universidades e cen-tros de pesquisas. Ele foi concebido para ser itinerante, dinâmico, e trabalhar de forma interativa em diversas áreas da Ciência e Tec-nologia (C&T), sempre considerando a realidade da comunidade a ser visitada. Trata-se de um espaço dedicado a alunos e professores da Educação Básica, que objetiva promover estímulos a favor do co-nhecimento, do método científico e da opinião científica, em que a ciência seja trabalhada como processo em construção, despertan-do vocações científicas e contribuindo para a formação acadêmica e profissional de estudantes de graduação participantes do projeto.

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Figura 1- Museu Itinerante Ponto UFMG

Imagem 2: Museu Itinerante Ponto UFMG na 66ª SBPC/Acre

Desde sua inauguração, em julho de 2012, o Museu Itinerante Ponto UFMG já participou de vários eventos pelo país e em Belo Horizonte e já atendeu a aproximadamente 300.000 pessoas, entre alunos de todas as idades, professores, pesquisadores e comunidade em geral. Foram visitadas as cidades mineiras, como Ouro Branco, Uberlândia, Ituiutaba, Teófilo Otoni, Conselheiro Lafaiete, Januária, Janaúba, Araçuaí, Conceição do Mato Dentro, Montes Claros, Ra-posos, Ribeirão das Neves, Pirapora, Simonésia, Almenara, São Se-bastião do Paraíso, além de Pernambuco, São Paulo, Paraná, Bahia, Rio de Janeiro, Acre e Brasília. Vários eventos foram realizados em Belo Horizonte.

O Museu é constituído por uma carreta baú especialmente adaptado para ser um museu de ciência e tecnologia. Seu espaço in-terior foi adaptado em seis ambientes distintos que abordam temas de ciência e tecnologia, sendo elas: sala do Útero, sala dos Sentidos, sala dos Biomas, sala de Projeção 3D, sala do Submarino e sala das Cidades. Além dessa estrutura, o Museu transporta experimentos e modelos científicos para montagem de exposições externas, atrações e oficinas, em um total de aproximadamente 500 m², ele oferece ati-vidades que utilizam aparatos artísticos tecnológicos nos ambientes internos do baú, sempre integrando a comunidade escolar, a comu-nidade universitária e o público geral das cidades visitadas.

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Um dos grandes desafios é aliar arte, ciência e educação a fim de implantar salas que ambientadas proporcionem aos visitantes experiências estéticas e científicas inéditas.

O Museu Ponto tem como proposta visitas mediadas às ex-posições científicas interativas e interdisciplinares nos municípios. Em cada localidade selecionada para a instalação da exposição, re-cebemos por dia em torno de 2.000 visitantes. Em cada viagem, a exposição permanece na localidade por cinco dias. Assim, o nú-mero de visitantes previsto corresponde a 10.000 visitantes. Além da carreta o Museu ainda possui a exposição externa composta de experimentos que abordam três temáticas: ser vivo, energia e física e desafios lógicos e matemáticos, além de habilitar as demais funcio-nalidades da exposição interna. A exposição é interativa, possibili-tando experiências multissensoriais únicas, através de uma vivência de experimentação.

A equipe que trabalha conosco é composta por alunos bolsistas de todos os cursos porque nos interessa um perfil amplo e dinâmi-co, com autonomia e com uma boa participação em tudo tanto no trabalho de criação e manutenção como participando das viagens. Além de eventos e cursos, também é responsável pela produção de jogos e material de divulgação científica no formato de álbum de figurinhas. A preocupação em acompanhar as discussões da área e fazer uma reflexão mais teórica do trabalho desenvolvido no mu-seu nos motiva a participar de diversos eventos científicos. Desde a inauguração produziu-se artigos para participação em eventos na-cionais e internacionais e de divulgação científica, sendo resultado das inúmeras pesquisas realizadas pela equipe do Museu.

Imagem 3: Alunos durante visitação da exposição externa

Com esses materiais é possível que se tenha uma ampla ideia de como o museu está preparado para agir em prol da ciência e tecno-

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logia em diferentes áreas do conhecimento e a real necessidade de tê-los como auxílio para manuseio.

Implantado pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), o projeto conta com o apoio do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG), Fundação de Desenvolvimen-to e Pesquisa (FUNDEP), Medicina Molecular – Faculdade de Medi-cina da UFMG (INCT) e da Secretaria de Estado de Educação (SEE).

Outros recursos que viabilizam o trabalho do Museu são edi-tais do MEC, do CNPq, da CAPES, da FAPEMIG e do MCTI em que concorremos para ofertar cursos, comprar experimentos para compor a exposição e realizar feiras e outros eventos científicos, nos quais o Museu está incluído para visitação. Temos também o apoio de Secretarias e das Prefeituras das cidades visitadas pelo Museu que arcam com a infraestrutura necessária para a exposição e a alimen-tação e hospedagem da equipe durante a permanência na cidade.

A UFMG disponibiliza 06 bolsistas do programa de bolsas da Pró-reitoria de Extensão para compor a equipe do Museu. Também faz parte da equipe 04 servidores administrativos e a equipe de pro-fessores do CP.

E esse ano foi ofertada a disciplina da graduação que visa conhe-cer um pouco da vivência, da experiência num espaço não formal de aprendizagem. Foram 22 alunos de engenharia, biologia, pedago-gia, museologia. Esta é a nossa primeira experiência oferecendo uma disciplina da graduação chamada Formação Transversal na UFMG que está criando e mudando o modelo na graduação com uma parte básica. Cada aluno faz seu percurso a partir de um leque de discipli-nas diferentes entre as quais os alunos fazem a sua escolha.

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Imagem 4: Aula da Disciplina de Formação Transversal.

A manutenção da pesquisa permitiu que desde a inauguração produziu-se artigos para participação em eventos nacionais e inter-nacionais e de divulgação científica, sendo resultado das inúmeras pesquisas realizadas pela equipe do Museu. Artigos como: Curso de Educação Científica para alunos da Educação Básica: repensando o Currículo escolar (II Congresso ibero-americano de humanidades, ciências e educação); Between fantasy and reality: the conceptions of antarctica on first years of middle school (pcst – public communica-tion of science and tecnology); Parcerias museus e escola: uma abor-dagem CTS na formação de professores ( SBPC – Sociedade Brasi-leira para o Progresso da Ciência); Contextual Model of Learning in Science Museums – an experience in Ponto UFMG Itinerant Museum (International Technology, Education and Development Conferen-ce) e As Tecnologias Da Informação E Comunicação E A Formação Docente Em Educação A Distância: Mídias De Armazenamento On--Line E Blogs (Congresso Brasileiro Ensino Superior a Distância).

O museu mantém as seguintes plataformas na mídia eletrônica:

Canais do YouTube: Museu Itinerante Ponto - https://www.you-tube.com/channel/UCvupIFDuCq8bcHwkDqg4g6Q

Site: www.museu.cp.ufmg.br

Facebook: https://www.facebook.com/MuseuItinerantePontoUfmg/

Instagram: @pontoufmg

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Assim os interessados em nos receber por favor nos contatem por e-mail no endereço [email protected] que teremos o maior prazer em agendar nossa participação em eventos ou outras comemorações.

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Primeira Mesa Redonda Pesquisa em Educação Não Formal

Segunda expositora

Aprendemos nos Museus?

Alessandra Bizerra

Bacharel e Licenciada em Ciências Biológicas,

Mestre em Ciências Biológicas (Zoologia) e

Doutora em Educação, pela Universidade de São Paulo.

Docente do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo e coor-

denadora do grupo de pesquisa CHOICES (Culture and Historicity in

Out-of-school Innovations for Communication and Education in Science).

Agradeço o convite da Professora Yvonne para participar deste seminário. Considero bastante importantes esses espaços de diálo-go. Podermos conversar um pouco sobre pesquisa nessa área é fun-damental. Quando me refiro à pesquisa, não estou usando o sentido de uma avaliação de práticas educativas como as que o Fábio e a Tânia apresentaram tão bem, e aquelas que ainda serão apresentadas durante o dia hoje. Não é nessa perspectiva. Minha fala aqui sobre pesquisa remete à ideia de tentarmos encontrar os elementos que a investigação sobre essas ações educativas podem levantar e como esses elementos contribuem não somente para as ações analisadas mas ainda para uma gama de outras ações educativas relacionadas. Então não abordarei a avaliação de ações educativas isoladas, mas sim a construção de conhecimento que pode dialogar com as ações que estamos desenvolvendo em diferentes instituições.

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Eu sou bióloga de formação, mas em um determinado momento, no mestado, especificamente quando trabalhei com filogenia e his-tória natural de serpentes, ensei: ‘Não, tem algo errrado. Eu gosto de fazer pesquisa, mas não é exatamente esse tipo de pesquisa que eu quero fazer’. Logo após o mestrado, visitei um museu, junto com uma prima, em que havia um celacanto. Para quem é biólogo, o cela-canto é um lindo exemplo para entender a evolução. Eu já havia visto réplicas de celacantos em outros museus, mas quando me deparei com um espécime original comecei a chorar em plena exposição. Minha prima questionou ‘Alê, isso é um peixe, porque você está cho-rando?’. E eu: ‘não, não é qualquer peixe, é um celacanto! Olha isso aqui’.

Eu voltei tão impactada com aquela experiência, indagando-me como esses espaços podem promover interações tão intensas e diversas. Obviamente, depende do background de cada um. Minha prima é fisioterapeuta, para ela aquele peixe não fazia sentido ne-nhum, para mim fazia todo sentido. Pensar nesses espaços como um local de significação cultural foi revelador. Eu adorava os museus, mas eu nunca tinha pensado em um museu nessa perspectiva. Então é desse lugar que eu estou falando com vocês, do lugar de uma pes-soa que vê os museus pelos bastidores tentando compreender como se dá construção desse discurso exposto e como que o público inte-rage com esse recurso.

Falar sobre Educação Não Formal é muito amplo e seria muito difícil fazer uma fala coerente em tão pouco tempo. Então, vou focar na área em que trabalho, que são as pesquisas sobre aprendizagem. Na minha opinião, a aprendizagem em museus é uma moeda políti-ca muito importante porque somos sempre questionados sobre nos-sos impactos, sobre o que o museu é capaz de gerar, as ações que a divulgação científica é capaz de promover. Assim, vou tentar trazer aqui munição para brigarmos politicamente por esses espaços.

Então, qual é minha proposta hoje? É trazer para vocês algumas pesquisas, internacionais e nacionais, voltadas para educação, com foco na aprendizagem. Mas quero trazer as principais questões des-sas pesquisas e não somente seus resultados. Nós criticamos muito que a divulgação científica se pauta só na apresentação de resultados para o público, mas acabamos fazendo o mesmo nas pesquisas em educação e divulgação científica. Então, quero trazer um pouco do processo das pesquisas para vocês, das metodologias, das perguntas. Os resultados são consequência disso. Tudo isso, obviamente, a

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partir da minha leitura, do meu local de fala.

Um primeiro trabalho que trago é a livre-docência da Martha Marandino, professora da Faculdade de Educação da USP, em que ela traça um olhar mais panorâmico na área de educação em mu-seus e traz perspectivas e dimensões diferentes da pesquisa na área, adaptadas para esta apresentação. Uma delas é a dimensão socioló-gica, que inclui os estudos que vão tentar revelar os jogos de poder, as forças políticas que se manifestam na elaboração dos discursos expositivos. E quando eu falo em discurso expositivo, estou falando tanto da ação que o Ponto fez, do dispositivo apresentado no Cien-Tec, da fala do mediador, da exposição que montamos, da ação edu-cativa que é específica, por exemplo, de um museu acessível. Esses são discursos expostos ao público. Em uma dimensão sociológica da pesquisa em educação em museus, buscamos compreender como essa construção se dá socialmente.

Para a Martha, há também uma dimensão mais epistemológica das pesquisas que busca entender como esses conhecimentos são postos no museu, trabalhando a partir da transposição didática e da recontextualização. Essa dimensão refere-se a pesquisar, por exemplo, como vamos trabalhar a física quântica nos museus ou como se dá a construção do conhecimento sobre expografia. Relaciona-se a entender a construção de conhecimento dentro desses espaços.

Já em uma dimensão psicológica da pesquisa na área, que é onde eu trabalho mais, o foco está na análise dos processos de apropriação e recriação cultural nesses espaços, está na interface entre o discur-so expositivo e os públicos. Minha linha de pesquisa situa-se nessa dimensão.

Mas quais são as principais questões de pesquisa nessa dimensão? Tem uma que é básica, acho que a gente já superou, mas tem muita gente que ainda não consegue responder: “aprendemos nos museus?”. Vocês concordam que a gente aprende nos museus? Sim? Muitos de vocês concordam, mas há numerosas pesquisas afirmando que não aprendemos nos museus. Se pegarmos pesquisas das décadas de 80, 90, que faziam pré-teste e pós-teste - testa o conhecimento da pessoa no início, faz a visita, testa no final, era comum o resultado de que não se aprende nada durante uma visita ao museu. Certamente, considerar se aprendemos ou não em museus depende de nossa concepção do que é aprendizagem.

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Então, precisamos entender qual a perspectiva de aprendizagem que está sendo considerada nessas pesquisas, em que se conclui que não ocorre aprendizagem em museus As pesquisas inicias de apren-dizagem tinham uma proposta muito cognitivista, pautada na ideia de aprendizagem enquanto produto. Nessa perspectiva, o visitante participa da atividade, aprende coisas e o produto final poderá ser medido pelo pesquisador. A aprendizagem é vista como um produto mensurável.

São comuns, assim, as brincadeiras que vemos sobre aprender em museus. Há uma piada que diz: ‘então você chega lá, você põe a mão na esfera, o cabelo arrepia e pronto, aprendeu ciências’. Essa é uma crítica à ideia de que basta manipular, agir, para aprendermos ciên-cias. É comum ouvirmos também a crítica de que o visitante passa 15 minutos no museu, clica em um vídeo e não assiste até o final, mexe em tudo e vai embora. A gente sabe que isso acontece, mas isso significa que o visitante não aprende? Temos que discutir então o que é aprendizagem em museus.

Vamos contextualizar essa questão: vocês conhecem os corvos e as galinhas? Conhecem? Vocês conhecem, gente! Quais as diferenças evidentes entre um corvo e uma galinha, fora as diferenças morfoló-gicas? Uma é doméstica, a outra não. Uma é comestível, o outro não.

Em relação aos hábitos, as crenças, como a galinha é vista? A gen-te fala que ela cisca para trás. Por que falamos que ela cisca para trás? Porque é considerada “burra”, é comum ouvirmos que a galinha é burra e o corvo, inteligente. A galinha não consegue resolver tantos problemas como o corvo consegue. Por que será que essas diferenças ocorrem?

Em um experimento, que pode ser visto em https://youtu.be/bXQAgzfwuNQ, feito com uma gralha (parente muito próximo dos corvos), é oferecido alimento a ela em (um recipiente cilíndri-co fundo o bastante para que ela não consiga alcançar com o bico. Entretanto, ela encontra a lado um arame e sabe o que ela faz com o arame? Ela consegue retirar o alimento moldando o arame em for-ma de gancho. Ela resolveu um problema com o qual não havia tido contato até então. Como podemos explicar isso?

Tem gente que vai explicar de forma biológica. O corvo tem uma maior massa cerebral proporcionalmente à massa corpórea então,

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biologicamente, ele teria maior capacidade cognitiva. Outras pessoas vão falar que não é este o ponto central, pois o corvo tem cuidado parental, são meses em que a mãe e o pai do corvo ficam cuidando de seus filhotes, diferentemente da galinha.

Então o que eu queria trazer com esse exemplo, enfatizando que não estou transpondo diretamente para a espécie humana, é que te-mos formas diferentes de encarar a aprendizagem. Muitos dos traba-lhos e pesquisas que falam que as pessoas não aprendem nos museus, em geral veem a aprendizagem como uma perspectiva mais inata, em que já nascemos com capacidades biológicas que vão permitir aprendermos mais ou menos. Outras vão defender que nascemos imersos em uma cultura, e essa cultura interfere no nosso modo de aprendizagem e naquilo que construímos de conhecimento.

Essa é só uma das questões que diferenciam as teorias de apren-dizagem, e poderia trazer muitas outras aqui. A aprendizagem é in-dividual ou social? Aprendemos por acúmulo ou por construção? Então, dependendo de como eu respondo a essas questões e como encaro a aprendizagem, vou fazer a minha pesquisa de forma dife-rente e vou ter resultados diferentes.

A aprendizagem é um processo ou produto? Se eu encaro como produto eu posso fazer um pré e pós-teste, se eu encaro como pro-cesso eu tenho que ver o que as pessoas fazem ao longo da vida delas, ou em um momento da vida delas. Isso remete a formas diferentes de encarar o processo de aprendizagem dentro dos mu-seus. E a minha crítica em relação as pesquisas iniciais que fala-vam que não aprendemos nos museus é que elas estavam em uma visão mais comportamentalista. Eu não estou desmerecendo o comportamentalismo, mas questiono a conclusão de que não se aprende pautando-se somente em uma abordagem do que é aprender dentro dos museus. A partir do momento em que estabelecemos ou-tras formas de fazer pesquisa, temos outras compreensões de apren-dizagem em museus.

Além da concepção de aprendizagem, encontramos diferenças nas metodologias de pesquisa. Há pesquisas, por exemplo, que se utilizam de surveys, são pesquisas mais horizontais, mais quantita-tivas, que vão analisar uma grande amostra. Há também pesquisas mais verticais, geralmente qualitativas. Vou trazer aqui alguns exem-plos dessas duas possibilidades.

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Um exemplo de survey horizontal que considero importante é uma pesquisa de percepção pública sobre hábitos culturais dos pau-listas, que o Instituto Datafolha fez junto com Joao Leiva, em que investigam o engajamento das pessoas para irem às instituições mu-seais, entre outros aparatos culturais (relato de pesquisa disponível em http://www.pesquisasp.com.br/ .

Nesse survey, foram entrevistadas cerca de 8 mil pessoas no esta-do de São Paulo, numa proporção representativa dos dados censitá-rios do IBGE, considerando gênero, etnias, idade, residência, entre outros dados. Uma das perguntas se referia a que o entrevistado faz nas suas horas livres. Nesta nuvem de palavras que representa as res-postas dos entrevistados, não é possível visualizar os museus.

Quando a pessoa espontaneamente é chamada para falar o que ela faz em seu tempo livre, ela não coloca os museus como uma pos-sibilidade de lazer. Mas quando é perguntado sobre o interesse que as pessoas têm por museus, o quadro é diferente. Se considerarmos quem tem médio ou grande interesse, vemos que os museus tem uma porcentagem grande de interessados e ganha de outras ativida-des culturais.

Vemos que há um público frequentador e também um potencial para participar desses espaços. Mas entre os frequentadores, vemos que ainda é um público bastante elitizado, com nível superior com-pleto, classes A e B. Agora, é o fator econômico que leva a pessoa ao museu? Não, não é.

Se olharmos para a visitação, em função da renda e da escolarida-de, veremos que quem é considerado como classe C e tem ensino su-perior vai mais a teatros e museus do que quem pertence às classes A e B, com Ensino Médio. Então, a escolarização é bastante importante para levar as pessoas a esses espaços.

E aqui, trazendo o que a Gislaine tinha perguntado sobre aque-la pesquisa do não-público, trago uma outra pesquisa quantitativa que inclui o CDCC. Quando mandamos, pelo Parque CienTec, um survey para mais de 100 mil pessoas pertencentes à comunidade USP (alunos, funcionários e docentes), recebemos 4.500 respostas. Desses, 8,3% já conhecem o CDCC. Vemos que a Estação Ciência é bastante conhecida pela comunidade uspiana, um grande número de pessoas frequentava esse espaço intensamente. Mas, perto do

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público que poderia visitar órgãos e museus da USP, o número de visitantes ainda é reduzido.

Como já falei, temos também as pesquisas que possuem uma perspectiva de profundidade. Não estou falando que elas são melho-res por serem mais profundas, mas que são mais verticais e buscam compreender os fenômenos com mais densidade. Investigam um público menor e analisam com maior detalhamento. E aí eu trago outra concepção de percepção, que não é a mesma dos grandes sur-veys, porque os surveys que o MCTI faz sobre percepção pública da ciência referem-se a opiniões que os visitantes manifestam sobre os museus e centros de ciências. Abro aqui um parêntesis: quando falo em museus de ciências, eu estou considerando uma definição que o ICOM já utilizou, de qualquer instituição sem fins lucrativos que tem patrimônio natural, arqueológico, histórico, arquitetônico. Essa definição inclui zoológicos, science centers, jardins botânicos, unida-des de conservação... Minha visão de museu é, portanto, bem ampla.

Quero discutir percepção e concepção a partir dessa imagem (peixe em um aquário sendo observado por uma criança e um gato). Ela nos ajuda a pensar em relação a como percebemos e podemos ter compreensões diferentes a partir de um mesmo objeto, nos faz lembrar que temos um público muito diverso, e o objeto que a gente coloca em exposição vai ser interpretado de formas diferentes por esses públicos.

É desse tipo de percepção que eu estou falando. Dependendo das características desse público, da formação dele, do que ele já sabe, ele vai dar um significado diferente ao que percebe do objeto. A gente fala ‘como vamos trabalhar então com essa complexidade toda?’. É complexo? É complexo. E para a pesquisa então! Imagine abarcarmos toda essa complexidade. Hoje, vêm crescendo as pesqui-sas com mega-dados que tem outras perspectivas e que vão tentar trazer essa complexidade para o estudo.

Um exemplo, que talvez seja até mais horizontal, é o trabalho que Falk (autor de Learning from Museums: visitor experiences and the making of meaning, John H Falk and Lynn D Dierking) fez nos Estados Unidos, em que ele queria ver qual é o papel de uma ex-posição específica, de um módulo específico de um museu de Los Angeles. Ele fez, antes da exposição ser implantada, uma pesquisa de percepção sobre homeostase. Ele perguntou para uma amostra

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da população de Los Angeles se sabiam o que era homeostase ‘vocês sabem o que é homeostase?’, ‘quem poderia definir homeostase?’.

Nesta pesquisa, foi escolhido o termo homeostase para análise, já que correspondia a um termo raramente abordado na divulga-ção científica em geral. Na coleta de dados inicial, 7% das pessoas sabiam definir homeostase. Depois de 4 anos dessa exposição imple-mentada, 20% da população de Los Angeles conseguia definir ho-meostase. Essa é uma evidência indireta de que a exposição do mu-seu, frequentada recorrentemente por moradores da cidade, pode influenciar a aprendizagem conceitual de seus visitantes.

Eu trago também as ideias do Vigotski, principalmente a de que os significados não estão prontos, mas que damos significado para as coisas em interação social, como a imagem de um peixe. É im-portante lembrarmos que, para Vigostki, peixe tem um significado compartilhado continuamente construído socialmente, este é rela-tivamente estável. Já o sentido que atribuímos a ele tem um cará-ter mais instável, e pode variar dependendo das interações de um sujeito em grupo em um dado momento. Vigotski nos ainda apre-senta uma ideia bastante interessante, quando afirma que a espécie humana tem uma característica básica que é conseguir integrar o pensamento e a linguagem. Quando integramos o pensamento com a linguagem, temos o significado da palavra. E os museus têm um papel bastante importante nisso, eu vou mostrar para vocês em quê.

Para ilustrar, apresento uma pesquisa do Deb Roy, do MIT, em que gravou o filho dele recém nascido em sua própria casa. Ele colo-cou uma câmera em cada cômodo da residência, coletando as falas que a criança fazia ao longo dos primeiros anos de vida. Vou apre-sentar uma descrição do trecho do vídeo que ele produziu:

[...]And with that, let me take you now for a first tour into the data. So you’ve all, I’m sure, seen time-lapse videos where a flower will blos-som as you accelerate time. I’d like you to now experience the blosso-ming of a speech form. My son, soon after his first birthday, would say “gaga” to mean water. And over the course of the next half-year, he slowly learned to approximate the proper adult form, “water.” So we’re going to cruise through half a year in about 40 seconds. No video here, so you can focus on the sound, the acoustics, of a new kind of trajec-tory: gaga to water.

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[Audio Bebê:] Gagagagagaga Gaga gaga gaga guga guga guga wada gaga gaga guga gaga wader guga guga water water water water water water water water water.

He sure nailed it, didn’t he?

O vídeo completo está em: https://www.ted.com/talks/deb_roy_the_birth_of_a_word?language=pt-br&utm_campaign=tedspread---a&utm_medium=referral&utm_source=tedcomshare).

Ele fez isso com as 533 termos em que conseguiu localizar o nas-cimento da palavra, nesses dois anos. Esse é um gráfico do que acon-tece quando essas palavras nascem. Olha que interessante, no eixo y, temos a complexidade da fala do adulto, a mãe, o pai e a babá, e aqui, no eixo x, o tempo de nascimento da palavras. O que podemos inter-pretar? Que simplificamos a nossa linguagem até a criança conseguir se apropriar daquele termo e depois a complexificamos novamente.

Isso é o que fazemos enquanto espécie humana, e como esta-mos fazendo isso em relação à Educação e à Divulgação? Temos o discurso de que a divulgação científica tem que simplificar as ciências para o público, mas como ficaria a parte de complexificar? Um movimento como esse pode ajudar, como no caso do filho de Deb Roy, em que as palavras nascem a partir da interação entre a criança e os adultos responsáveis com o ambiente em que vivem, a desenvolver o processo de internalização e externalização.

Talvez essa ideia esteja relacionada ao que Vigotski afirmava sobre a reprodução da cultura. Aprender não é só adquirir, é tam-bém expressar. Para o pesquisador bielorrusso, aprender possui um momento de internalização da cultura, mas também um momento de externalização, em que a cultura é re-criada. Em um processo de aprendizagem, a gente adquire e se expressa. Se montamos uma exposição, por exemplo, que em um momento o visitante possa articular um conceito e no segundo momento tenha um novo contato com esse mesmo conceito e que ele possa também se expressar, em outro contexto, essa talvez seja uma ferramenta que possamos criar para facilitar que o visitante faça a transferência de um contexto para o outro. Nessa perspectiva, esse movimento de internalizar e exter-nalizar corresponde à aprendizagem.

Compreender, então, como as pessoas podem aprender nos museus foi minha maior inquietação em meu doutorado. Entre as possibilidades teóricas para estudar a aprendizagem, pautei-me em referências da perspectiva histórico-cultural.

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Resolvi me aprofundar na Teoria da Atividade, desenvolvida por teóricos como Davidov e Leontiev, que analisei em minha tese dis-ponível em: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/48/48134/tde-15092009-132843/pt-br.php) que navegam por águas vigotskia-nas, e bastante aceita como um referencial da aprendizagem es-colar. Segundo essa teoria, há uma diferença entre Aprendizagem e Atividade de Aprendizagem. No primeiro caso, a aprendizagem ocorre dentro de nossas Atividades, como um epifenômeno, como uma consequência. Aprendemos ao brincar, trabalhar, ao jogar… No segundo caso, estamos em Atividade de Aprendizagem quando realmente nos engajamos em aprender, quando temos a intenção de aprender. Nesse processo, partimos do nível empírico de observa-ção, do concreto sentido, de tocar, manusear, cheirar e começamos a fazer abstrações e a traçar um novo concreto, agora o concreto pen-sado, um conceito ou uma prática construídos a partir da realidade. Foi o que Davidov chamou de ascenção do abstrato ao concreto.

Será que esse processo acontece nos museus? Essa era minha principal pergunta de Doutorado. Então eu usei as ideias do Enges-tröm, que desenvolve esse ciclo de ascensão do abstrato ao concreto, com etapas detalhadas. Gravei 15 famílias interagindo no Museu Biológico do Instituto Butantan e conseguimos perceber ciclos de aprendizagem expansivas ocorrendo nos tempos curtos de uma visi-ta museal. (BIZERRA, A. F. Atividade de Aprendizagem em Museus de Ciências. Doutorado em Educação. 274p. Faculdade de Educa-ção/USP. 2009. Disponível em http://www.teses.usp.br/teses/dispo-niveis/48/48134/tde-15092009-132843/pt-br.php

Uma família que tinha, por exemplo, uma forma de identificar serpentes, uma prática social de identificar serpentes, construiu um novo modelo de identificação que foi testado ao final da exposição. A gente consegue ver isso em 40 minutos de visitação.

Então, sim, nós aprendemos nos museus mesmo na perspectiva da Teoria da Atividade. Sempre? Não... Como também não acontece na escola. Agora, o que eu acho que é o diferencial dos museus? Em geral, as pessoas querem ir para o museu para se divertir, e também para aprender, e nesses espaços, temos boas alternativas para não separarmos os aspectos cognitivos e afetivos da aprendizagem.

As pessoas se divertem e aprendem ao mesmo tempo. E o afetivo é fundamental para a aprendizagem. Nosso desafio, aqui, é organizar uma exposição que, ao mesmo tempo, seja lúdica, divertida e inte-ressante, mas que permita às pessoas terem níveis de abstrações dife-

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rentes, caso elas queiram. Sem dúvida, as pessoas podem não querer se engajar em uma Atividade de Aprendizagem, mas temos que dar a possibilidade de o visitante fazer isso, caso queira.

Para finalizar, lembro que, para além da Teoria da Atividade, muitas outras teorias de aprendizagem, incluindo os modelos ori-ginados a partir dos espaços museais, nos ajudam a compreender como aprendemos nesses espaços. Esse entendimento é crucial para pensarmos na interação entre públicos e museus.

Tentei mostrar que pesquisas e práticas em educação museal já resolveram questões como “se aprendemos” e “como aprendemos” nos museus, mas ainda nos resta o desafio de organizarmos uma práxis educativa que realmente otimize o processo de aprendizagem nesses espaços. Penso que, a partir desse aporte teórico e de nossas experiências, podemos pensar em novas formas de organizar expo-sições e promover novas relações com os diversos públicos.

Moderadora:

“Nós agradecemos a Alessandra. Vamos abrir para duas pergun-tas, comentários...”

Participante Gabriela:

“Na verdade, é um pedido, eu gostaria que a professora disponi-bilizasse os slides para a gente, porque eu achei bastante interessante essa perspectiva que você traz do Vygotsky, com essas questões me-nos relacionadas a uma apreciação quantitativa e mais qualitativa, nesse sentido de transformação da sociedade, e esse é um instru-mento que pode fazer isso, então achei muito interessante. Eu fiquei muito frustrada porque foi muito rápido, mas assim, se puder dispo-nibilizar. E parabéns porque a pesquisa está maravilhosa. ”

Profa. Alessandra:

“Gabriela, agradeço as palavras carinhosas, fico muito feliz que a gente tenha tido um diálogo bacana. E eu disponibilizo, claramente.

Só não queria deixar em tese que as pesquisas quali são mais im-portantes que as quanti, acho que estamos até no momento funda-mental de fazermos pesquisas mistas, que incluamos uma perspec-tiva quanti e uma perspectiva quali, porque acho que as duas visões trazem elementos importantíssimos para pensarmos sobre as nossas ações. Desculpa se eu deixei essa imagem que a quali é mais impor-

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tante, eu gosto mais, mas eu não acho que ela é mais importante, acho que ela tem um peso tão importante quanto a quanti. Mas mui-to obrigada pelas palavras. ”

Moderadora:

“Mais uma pergunta...”

Participante Monalisa:

“Eu sou professora, e eu queria saber se vocês já pensaram em fazer uma pesquisa em como convencer nossos colegas de que o es-paço não formal pode ensinar tudo e não apenas a matéria especifica dele? ”

Profa. Alessandra:

“Uma cosia que eu queria falar, a gente não é um complemento da escola, essa visão de que o museu é complemento da escola precisa acabar. Nós não somos complemento, nós temos nossa personalida-de, temos propostas pedagógicas que são próprias dos museus. Nós somos parceiros da escola.

Eu estou lembrando aqui que o público escolar é metade do nosso público, ele é fundamental, mas a gente é parceiro. Um ponto que es-tamos conversando agora, estamos desenvolvendo um projeto a ser submetido ao CNPq, mas que dificilmente vai ser aprovado - para pensarmos em espaços de articulação entre a universidade, os es-paços não formais e a escola. Que sejam espaços de criação, que as pessoas coloquem a mão na massa, desenvolvam seus projetos e que isso seja articulado em rede no estilo dos formulários.

O ponto central, que o Fábio falou ‘como a gente vai estimular o professor para ir? ’, mas tem professor interessado, é com esses que começamos, tem muito professor engajado. Temos uma rede de con-tatos e podemos começar por aí, com aqueles que já vão normal-mente a essas instituições.

E aí é um convencimento Monalisa, que não é só da escola, é da academia, é do próprio museu. Mostrar que a nossa atividade não é menor, de que o tripé não é manco, mas se ele é manco agora, te-mos que colocar politicamente que não é manco e que não deve ser manco. ”

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Profa. Tânia:

“Nós da UFMG vamos fazer essa pesquisa entre as instituições, porque as políticas públicas têm que valorizar, reconhecer e favore-cer as condições para que os professores comecem a perceber esses espaços como um espaço de uso, de apropriação mesmo. ”

Moderadora:

“Última pergunta...”

Participante não identificado:

“Tânia, na sua fala você disse que um museu não quer ser só um evento na cidade, e eu queria saber o que vocês fazem para isso acon-tecer. ”

Profa. Tânia:

“É difícil. Para tentar fazer essa aproximação ser mais efetiva, a primeira é que quando planejamos a visita, já informamos através de um flyer que os alunos e professores podem fazer o curso de edu-cação cientifica a distância. Abrimos inscrição depois que passa a visita e oferecemos duas vezes por ano um curso de três meses, é uma ação.

A outra é que antes de chegar à cidade, fazemos um curso de me-diadores para as pessoas da cidade trabalharem no museu durante aquela semana. Geralmente são alunos da graduação, professores, pessoal que trabalha na secretaria. Já vimos, é superinteressante, as pessoas chegarem e falarem ‘nossa, mas você está aqui’, então come-çam a achar que aquele espaço é deles também, é da cidade. Procu-ramos trazer algumas pessoas que são ícones da cidade para estarem junto conosco.

Moderadora:

Nós agradecemos mais uma vez a participação das professoras Alessandra e Tânia, e disponibilizaremos o contato delas a quem precisar se nos mandarem uma mensagem usando o endereço [email protected].

Muito obrigada e até depois do almoço.

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Segunda Palestra Catavento Cultural

Gabriel Giannini Furruel

Licenciado em física pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnolo-

gia de São Paulo, IFSP campus São Paulo.

Educador responsável pelas áreas de Astronomia, o Universo, e Físi-

ca, o Engenho assim como responsável pela equipe de manutenção do

setor educativo e pelas ações extramuros do Catavento Cultural.

“Boa tarde! Eu vou falar sobre o museu Catavento, como traba-lhamos lá, como pensamos o nosso espaço para poder receber os diversos públicos, e quais são esses públicos; como são os nossos experimentos e o que precisamos fazer para manter tudo atualizado.

Essa aqui é uma foto da frente do prédio. O prédio é o Palácio das Indústrias, vamos ver um pouco da sua história em breve.

E o que é o Catavento? O Catavento Cultural Educacional na ver-dade é uma Organização Social de Cultura que cuida de duas fren-tes: o Museu Catavento e as Fábricas de Cultura.

As Fábricas de Cultura são espaços criados para levar cultura às periferias na cidade de São Paulo. Nós cuidamos de 5, ficam na Zona Leste. Mas, nessa apresentação vamos nos restringir ao Museu Ca-tavento. Para operar o museu temos um contrato com a Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo, e aqui temos a nossa missão, a missão do museu.

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Então, vamos agora falar um pouco do prédio, o Palácio das In-dústrias. Ele foi inaugurado em 1924, levando cerca de 20 anos para ser construído, até porque a arquitetura vivia outro momento, não tão evoluído quanto hoje, bem como a engenharia civil, então se le-vou um bom tempo para chegar ao término do prédio. A foto mostra como foi a exposição de automobilismo em 1924.

O prédio ficou vários anos recebendo exposições daquela indús-tria que começava a crescer na cidade de São Paulo, sendo que ele foi financiado principalmente pelos barões do café, que na época es-tavam em declínio, enquanto a indústria começava a emergir; dessa maneira e nesse cenário nasceu o prédio que hoje abriga o Cataven-to.

Esse prédio já foi Prefeitura de São Paulo, também já recebeu ocupação por parte da polícia, já foi sede da Polícia Civil durante muitos anos e já recebeu uma série de exposições, uma história bas-tante rica.

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Nessa foto temos a visão aérea do prédio estamos muito próximo ao Mercado Municipal, a zona cerealista e ao Parque Dom Pedro; o bairro é o Parque Dom Pedro. A localização nos favorece bastante, pois estamos em uma região muito central de São Paulo, então o acesso do público é fácil, tem metrô perto e passam muitos ônibus na região.

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Nesses 7 anos de vida do Catavento a gente tem sido bastante vi-sitado. O Museu foi inaugurado em 2009, sendo que em outubro desse ano (2016) chegamos a 3.370.000 visitantes. Essas pessoas são visitantes espontâneos, visitantes de grupos agendados de escolas, de ONGs, de tudo quanto é tipo. E isso não foi só de uma vez, a gente tem a seguir um gráfico de como foi essa visitação, de 2009 até setembro de 2016, quando tivemos a última atualização. Em azul a gente tem o público agendado, em laranja os públicos espontâneos.

O público agendado já teve vários períodos no Catavento. Os dois primeiros anos foram mais fracos, a gente não tinha uma política no governo de incentivo a visita ao museu. Aí criou-se o FDE, por parte da Secretaria de Educação, que infelizmente depois foi extinto, e hoje as escolas tem que procurar como ir ao Catavento. Antes a gente tinha um pouco mais de facilidade, nós mesmos podíamos ir atrás das escolas, tínhamos como fazer isso, porém, hoje em dia a dinâmica é outra.

Isso mostra que nos últimos anos nosso público agendado decli-nou, porém, o público espontâneo - até porque o museu é mais co-nhecido hoje em dia - ele cresce cada vez mais, então cada vez mais recebemos o público espontâneo.

Consideramos público espontâneo todo tipo pessoa que acorda de manhã e vai ao museu porque quer, sozinha, ou com a família, sei lá, por ‘N’ motivos. Essencialmente o público espontâneo são aque-las pessoas que não vão ao museu com um grupo agendado, é basi-camente assim que a gente define, e a gente tem o gráfico anterior que mostra como tem sido isso.

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Nos meses de janeiro e julho (férias escolares) temos um boom de visitação, em geral de público espontâneo. Em julho desse ano (2016) recebemos 94.249 pessoas, visitantes espontâneos, nesses meses praticamente não temos agendamento, e o museu fica bem cheio. Os grupos agendados são bem fortes nos períodos escolares.

E o que é o Catavento? A gente poderia definir de várias formas. É um museu de ciência, é um museu ligado à tecnologia, é um espaço de educação não formal, temos várias definições.

Eu trabalho no Catavento há vários anos. Eu comecei lá como monitor, eu era estagiário da área de física, do Engenho - daqui a pouco a gente vai ver o que é o Engenho -, mas basicamente o que nós tentamos é trazer para o público um espaço dinâmico que pro-picie outras experiências que vão além da sala de aula. Em sala de aula a gente consegue garantir uma série de coisas, a gente consegue garantir uma série de experiências, mas o museu tenta trazer essas outras experiências que a sala de aula não vai conseguir garantir.

Obviamente que não vamos complementar a escola. O cara que não for ao Catavento vai deixar de viver, não vai se formar como um cidadão tão bem quanto o outro? Não, na verdade a gente quer que quem vá lá possa aproveitar e ter experiências únicas. Como essa da foto de uma monitoria no estúdio, por exemplo, com o monitor e o visitante.

Eu sou educador atualmente no museu. Eu cuido, entre outras coisas, de exposições externas, mostras itinerantes, manutenções do educativo, que são manutenções nas instalações, ou seja, cuidamos para que esses equipamentos se mantenham e sejam preservados, mas não iremos entrar nesse mérito agora, vamos focar na parte educativa.

Enquanto educador, qual é o meu trabalho? Eu tenho que garantir que os meus monitores estejam atualizados em termos de conteúdo. Mas não só em termos de conteúdo, também em termos de lingua-gem, temos que garantir que a linguagem seja acessível ao público, que é uma dificuldade grande. Porque se pensarmos que temos inú-meros tipos de público, como garantir que esse monitor consiga ter uma linguagem acessível a todos esses públicos? É uma das maiores dificuldades que temos no dia a dia, conseguir trabalhar isso com os monitores para que eles tenham uma linguagem acessível a todos os públicos.

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Outro ponto é a necessidade de atualizar nossos equipamen-tos, porque enquanto o grupo agendado está no museu, podemos receber esse grupo e o monitor irá guia-los por essa visita. Só que quando recebemos o público espontâneo, que é de outra natureza, e por exemplo às vezes temos 5 mil pessoas em um dia, não teremos quantidade suficiente de monitores para atender todas essas pessoas e muitas vezes essas pessoas não querem ser atendidas, elas querem ficar livres para poder visitar o museu tranquilamente.

Por conta disso o espaço também deve ser interativo, com uma linguagem que garanta que pessoas leigas nos assuntos científicos entendam o que queremos passar para elas. Se tivermos uma expe-riência de física, por exemplo, temos que garantir a instalação de física se traduza a todos os públicos, desde o técnico, uma pessoa formada em física, um engenheiro que teve muito contato com físi-ca, até uma pessoa que não frequentou uma escola e simplesmente nunca viu nada parecido com aquilo. Isso é parte do meu trabalho também.

A estrutura museológica do Catavento, como que ela é?

Temos basicamente quatro grandes áreas: o Universo, a Vida, o Engenho e a Sociedade.

A estrutura está ligada a história cronológica do universo. Então primeiro era o nada, aí o Big Bang...

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O Universo surge, depois a Vida, o Engenho seria, na verdade o desenvolvimento das engenhocas humanas, as máquinas que a cons-truímos para o nosso dia a dia, e a Sociedade na verdade, representa o desenvolvimento dessas relações sociais.

Aqui eu vou trazer um pouquinho para vocês de cada uma das se-ções. Eu preparei essa palestra imaginando que tenham pessoas aqui que nunca foram ao Catavento, então é também para vocês entende-rem o que é o Catavento. O Catavento não é só um prédio maravilho-so de 100 anos, e também não é só um museu de ciência e tecnologia dos sonhos, e o que ele tem dentro dele?

Cada uma das 04 grandes áreas é subdividida em seções.

Essa aqui é a primeira seção do Universo, a Astronomia, e na se-ção da Astronomia temos mais de uma sala. Essa aqui, por exemplo, é a sala do Sol.

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Temos um asteroide e aí aparece um monitor fazendo atendi-mento a um grupo, por exemplo, nessa dinâmica o monitor senta os alunos. Em cima, no teto, replicou-se o céu estrelado da noite da inauguração do Museu e os visitantes são convidados, junto a esse monitor, a observar o céu e falar um pouco sobre as constelações, estrelas e tudo o que está ali naquele teto. Apesar de a gente viver em São Paulo, que é um local péssimo para observações astronômicas devido a ‘N’ fatores de poluição de todos de todos os tipos tentamos aproximar os visitantes da observação astronômica. Isso é um pou-quinho da seção da Astronomia.

Essa é a seção Terra, dentro da grande seção Universo. A seção Terra vai falar um pouco do desenvolvimento do nosso planeta.

O Universo nasceu ali no Big Bang, uma grande explosão, se ex-pandiu, e num dado momento dessa expansão nasceu nosso planeta, e esse planeta segue uma série de lógicas para estar como está hoje, e é o que exploramos nessa seção.

Falamos um pouco do núcleo, as lógicas da movimentação de magma, a crosta, formação de rochas. E aqui temos um equipamen-to chamado Sandbox (caixa de areia). O Sandbox na verdade é um equipamento que permite a você formar picos de areia que são tra-duzidos em curvas de nível 3D em uma TV. Dá para fazer inclusive chover.

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Essa outra seção é a Nave, ela foi uma das últimas inauguradas e não é exclusividade do Catavento, existe uma também no CienTec. Percebemos, ao longo do tempo, que o Museu precisaria se adequar um pouco mais às tecnologias. O nosso público estava pedindo isso, vimos que fazia falta, nos últimos anos tivemos grandes avanços na área de tecnologia, chega a ser quase assustador, portanto, tivemos que nos adequar.

Essa seção, na verdade, convida o visitante a entrar em uma sala e nessa sala os visitantes farão uma viagem ao espaço, eles vão visitar o Hubble, visitar a Estação Espacial Internacional, ver outros plane-tas e até passar pela Lua. Tudo isso para mostrar como seria sair da Terra; quais os problemas e quais as dificuldades. Nossos visitantes vivem um dia de manutencistas e vivenciam como que é manter um telescópio ou uma estação em órbita fora do nosso planeta.

Saindo da grande seção Universo, temos a seção da Vida. A gran-de seção Vida, tem uma seção que chama Vida também, cuidado para não se confundirem.

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Essa é a seção Vida e ela vai falar um pouco do desenvolvimen-to do ser humano, mas não só o ser humano. Vai falar também do desenvolvimento dos outros animais. Aqui, por exemplo, temos um Albatroz, que é um pássaro maravilhoso, ele fica muitos meses no ar sem pousar, e aqui ele estaria copulando com a fêmea. Temos tam-bém um Tigre Dente de Sabre um pouco mais ao afundo, que é um animal que viveu na mesma época da Preguiça Gigante e do Tatu Gigante, durante o período que chamamos de Mega fauna, então, nesse espaço exploramos um pouco de tudo isso e falamos também sobre Darwin e sua teoria da evolução.

Temos outra seção também voltada à imersão tecnológica que é o Submarino. O Submarino possui a mesma dinâmica da Nave, po-rém, a viagem dos visitantes é ao fundo do mar. O submarino viaja ao fundo do mar, a fundo mesmo, ao ponto de chegar a Fossas das Marianas que é o lugar mais fundo do planeta conhecido até hoje. A ideia é que esses visitantes sejam cientistas que vão pesquisar e des-cobrir os segredos do fundo do mar, quais bichos vivem ali, até que ponto podem ter seres vivos ou não, o que propícia a vida ou o que não propicia nesse ambiente inóspito.

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E aqui temos a Seção do Macaco ao Homem, que é uma seção sobre evolução que também abrimos recentemente. Ela foi desenvol-vida em paralelo com a USP.

E para terminar a grande seção Vida, temos o Borboletário, onde algumas borboletas se desenvolvem o que é extremamente difícil, sendo que borboletas só são encontradas em locais que tenham uma fauna e flora muito bem reguladas. Não foi simplesmente um pro-cesso de fechar um espaço e colocar as borboletas, na verdade, se você fizer isso elas vão morrer em poucos dias. O Borboletário foi a

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última seção a ser inaugurada inclusive.

Passamos então para a grande seção “Engenho” que, inclusive dentro dela, tem uma seção também chamada Engenho. Apesar desse nome essa é a parte que fala da física, inclusive tem algumas instalações parecidas com o que a gente tem aqui na sala da frente. Falamos das diversas áreas da física como: mecânica, eletromagne-tismo, óptica, som e por aí vai.

Observamos na imagem da direita abaixo o público espontâneo de um dia de final de semana bem cheio na Seção do Engenho.

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E a esquerda, na parte superior observamos o Van der Graaf, que é um equipamento que arrepia os cabelos, super sensação do museu, de qualquer museu de ciência na verdade, ele é muito conhecido, o pessoal já chega perguntando dele, ele é meio que um astro. Não que a gente queira isso, mas ele se tornou isso, foi meio natural. No caso vemos o atendimento a um grupo agendado.

Em seguida, a Sala Lego, onde trabalhamos com uma linha da Lego, que é uma linha ligada a robótica, que inclusive algumas es-colas já estão trabalhando em sala de aula. Na seção não realizamos apenas a montagem do robozinho, os visitantes também conseguem programar esse robozinho e fazer com que ele execute uma série de ações. Isso é muito bacana porque conseguimos dar os primeiros passos em direção ao ensino de robótica, que não estão em todas as escolas, na verdade pouquíssimas escolas têm isso hoje em dia.

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Temos agora a nossa última grande Seção, a Sociedade, que co-meça com uma foto da Ecologia; para quem não sabe isso aqui é um grande Terrário. O Terrário está em bastante foco hoje em dia, a gente vê ele bastante, em vários lugares por aí na internet. As pessoas descobriram que dá para fazer Terrários para enfeitar a casa e que ficam lindos. O Terrário é um sistema fechado, além de bonito faz você se indagar como isso funciona? Um recipiente fechado poder ter vida? A montagem dele é bem simples, colocamos terra, pedras e areia para simular nosso o solo, aí basta plantar, borrifar água e deixar oxigênio. Você fecha e ele se mantém lá por muito tempo. O nosso tem 2 metros de altura, o pessoal fica maravilhado.

Essa é a seção Jogos do Poder, e essa é a escalada, as pessoas são convidadas a escalar e conhecer os grandes cientistas que estão nes-sas telas, quando você alcança algum deles, você toca na tela e o grande cientista fala com você, conta um pouco de sua história.

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Temos nessa sala, a instalação “Política” onde se realizam debates sobre questões polêmicas. Por exemplo, se começarmos a falar de aborto, surgirão opiniões divergentes, então a ideia desse espaço é propiciar essas discussões e mostrar quais os pontos a favor e contra o tema, sem induzir ‘escolham isso’, mas esclarecer o cenário.

Em seguida a seção Nanotecnologia que foi criada em parceria com o pessoal da Unicamp, para falar sobre nanotecnologia, como o nome já diz, que inclusive é uma área da ciência bem recente também, in-clusive o prêmio Nobel de química desse ano.

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O Laboratório de química é de fato laboratório onde realizamos alguns experimentos. Como por exemplo uma bomba de hidrogênio que explode e faz um barulhão, é bem bacana.

Aqui observamos a seção Alertas: Conhecer para prevenir, nesse espaço é discutido sobre o uso de drogas principalmente na adoles-cência. Quais os problemas que o tabaco, o álcool e outras drogas podem oferecer ao seu corpo, e como o seu corpo irá reagir a essas drogas. Não é simplesmente ‘não use droga porque não é pra usar’, mas a visão ligada a ciência sobre a relação do corpo e a droga.

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Em seguido, o Estúdio de TV, que é uma sala de chroma key verde basicamente e nele onde um telejornal ou então algum outro pro-grama, e depois editamos e passamos para os visitantes entenderem como funciona um Estúdio de TV e todo o processo de gravação.

Então isso foi basicamente uma pincelada, de como é nosso Mu-seu, onde estamos instalados, quais as nossas seções, qual é a estru-tura museológica e como pensamos a montagem desse espaço.

Qual seria o sentido de ter um espaço tão bacana se não conse-guíssemos aproveitar tudo dele? Para recebermos as escolas temos que estar preparados. Não é simplesmente as escolas chegarem, des-cerem do ônibus, fazerem uma visita e irem embora, não teria lógi-ca, até mesmo, pois, nem sempre o professor conhece totalmente o espaço. Muitas vezes o professor de física vai e olha a sala de física, ou então professor de química que vai lá antes e conhece a parte de

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química, mas eles não conhecem o resto, e a visita não se restringe apenas a uma área. Assim, se um deles passar, por exemplo, pela As-tronomia, como ele vai fazer essa visita sem ser guiado? É também muito complicado manter o grupo organizado dentro do espaço, as crianças e adolescentes gostam de parar em todos os espaços, mas conforme os monitores vão trabalhando e acompanhando o dia-a--dia, eles obtêm a prática.

Nossos monitores são estagiários de formação em geral de li-cenciatura, e eles sentem bastante essa dificuldade, principalmente quando começam a trabalhar no museu. Porque trabalhar em uma sala de aula, por vezes você tem a lousa, a estrutura da sala, que fun-ciona de um jeito, e aí você chega em um espaço desses, é completa-mente diferente.

Pensamos muito em como estabelecer elos entre as seções e por isso criamos roteiros pré-estabelecidos, por exemplo, o roteiro 2 ‘En-genhos, Astronomia e Naves’, é um roteiro que fala de uma temática mais ligada ao espaço. Nesse roteiro o grupo chegaria a Nave e faria uma viagem no espaço, depois ele iria à seção de Astronomia falar sobre o desenvolvimento desse universo infinito. E aí por fim o ro-teiro passa pelo Engenho para falar sobre física, inclusive pode ser a física dessa viagem, a física de uma estrela e por aí vai, o tema pode variar bastante.

Roteiro 1 Roteiro 2 Roteiro 3 Roteiro 4 Roteiro 5

Nanotecnologia Engenho Do Macaco ao

Homem Submarino Astronomia

Matéria Astronomia Borborletário Vida Vida

Vida Nave Lego Engenho Matéria

Roteiro 6 Roteiro 7 Roteiro 8 Roteiro 9 Roteiro 10

Astronomia Ecologia Jogos do Poder Engenho Terra

Terra EngenhoDo Macaco ao

Homem Estúdio Matéria

Vida Vida Alertas Jogos do Poder Jogos do Poder

De forma geral tentamos não engessar nosso monitor, para ele poder se adaptar ao grupo. Muitas vezes o grupo chega lá e a pro-fessora fala ‘ah, a gente estava conversando sobre ecossistema, tem como você falar disso?’, então nosso monitor estará apto a falar sobre ecossistema. Com os grupos tentamos sempre nos adaptar para dar continuidade ao trabalho do professor.

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O Catavento Acessível foi criado para tentar suprir a demanda de acessibilidade (que é um termo muito grande e compreende uma série de especificidades), mas basicamente o que esse núcleo faz é atender visitantes idosos, que em geral andam mais devagar, que tem algumas dificuldades, eles também atendem grupos de pessoas com qualquer tipo de deficiência física, e também grupo de crianças mui-to pequenas, 2 ou 3 anos de idade.

Esse núcleo também auxilia no preparo dos outros monitores para esse tipo de atendimento mais focado, justamente por não que-rer excluir ninguém, não colocamos todo atendimento ligado a aces-sibilidade a esse núcleo, mas priorizamos o pessoal que tem mais treinamento nessa área, com esse foco, e eles acabam sendo peça chave no treinamento do resto dos monitores nesse assunto.

E como contratamos nossos monitores? Não achamos o monitor pronto, na verdade procuramos alguém que esteja disposto a traba-lhar com educação não formal e que seja, em geral, de licenciatura. O pessoal da licenciatura é geralmente também o que a gente mais recebe nas seleções, mas também recebemos pessoal da engenha-ria, por exemplo, entre outras áreas, em geral a gente acaba optando mais pelos de licenciatura, porque são pessoas que já estão vivendo na área da educação, o licenciando aprende a lidar com o espaço for-mal, então vamos treiná-lo para o espaço não formal de educação.

O Catavento, na verdade, acaba auxiliando esses monitores e tor-na-se uma via de mão dupla, pois esses estagiários terão acesso a uma formação com um diferencial, e em geral encontramos nesses jovens um potencial muito bacana. Temos aqui, por exemplo, uma monitoria na máquina que produz raios. Esses raios são de mesma

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natureza aos que aparecem em dias de chuva, pode-se ver a luz do raio e depois ouvir um pequeno barulho, que não é um trovão, mas dá para ouvir um estalo. O monitor que está trabalhando com esse grupo vai explicar o funcionamento da máquina e depois convidar essas crianças a participar da experiência; nessa máquina em parti-cular nós damos um choque nas crianças, elas costumam gostar, na verdade os adultos sofrem muito mais do que as crianças. A questão do medo ao longo do tempo vira um problema, quando você é crian-ça você não tem muita noção de medo das coisas, então quanto mais jovem mais eles se aventuram.

Mas não podemos pensar nossas instalações só para os grupos agendados, pois recebemos muitos grupos e continuamente nos pre-paramos para recebê-los, mas cada dia mais pensamos o atendimen-to ao público espontâneo, e é isso que nos faz criar instalações que buscam cada vez mais a autonomia dos diferentes públicos espontâ-neos.

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Essa instalação, por exemplo, Tubos Sonoros - é bem parecida com os tubos sonoros que existe aqui na entrada – fizemos uma co-municação visual bem bacana, o rapaz da imagem mostra como usar esse equipamento, atualmente buscamos cada vez mais usar imagens como essa, porque senão acabamos prendendo nosso visitante ao monitor, ou impedindo que o visitante utilize o equipamento de for-ma correta. Aprendemos, com o tempo, como aparece no gráfico ini-cial, que precisamos cada vez mais trabalhar nossa linguagem visual e adequá-la aos nossos visitantes espontâneos para que eles possam ter a mesma qualidade na visita ao espaço que os grupos agendados.

Com o tempo percebemos que muitos alunos das escolas (dos grupos agendados) voltam ao nosso museu por vontade própria e le-vam os pais e a família, pois fica uma vontade ‘de quero mais, quero conhecer um pouco mais o espaço’. Tem muitos adultos que não co-nhecem esse tipo de espaço, porque não tiveram contato com isso na escola e não tem no dia-a-dia; se essas crianças desde cedo já estão vendo isso, elas vão levar suas famílias futuramente e vão mantendo um ciclo.

Continuando na questão do espaço, trago um pouco sobre nossas instalações imersivas. Essa aqui é a Nave por dentro, nos televisores os visitantes podem ver a torre do Catavento antes de partir para viagem, os alunos ficam sentados a frente dos televisores.

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As outras instalações selecionadas para essa apresentação são instalações sem tecnologia, nesses casos abrimos mão da tecnologia para mostrar que toda imersão é necessariamente tecnológica. Tec-nologias propiciam muitos avanços, mas não necessariamente são obrigatórias para instalações imersivas.

Já no alto desse slide temos uma pessoa que está visitando um pedaço do sistema digestivo, no caso esse é o intestino gigante.

E mais abaixo temos uma pista que chama Pista de Embriaguez onde a pessoa é convidada a colocar um óculo que simula o efeito da embriaguez no visual, realmente embaraça tudo e a pessoa deve tentar andar na pista sem bater nos obstáculos, essa dinâmica ocorre na sala dos alertas que vimos anteriormente, lá debatemos as pro-blemáticas em beber e dirigir, sendo que a visão embaçada é apenas um dentre vários efeitos que a ingestão de álcool causa. A ideia é começar desde cedo o debate.

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Por fim, temos algumas fotos de nossas oficinas que geralmente ocorrem no período de férias escolares, e eventualmente durante o período letivo. Nas fotos observa-se a oficina de mini terrário.

Temos também o registro da oficina de light paint, que trata de uma técnica de fotografia.

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E no slide mais acima, vemos a oficina de construção de câmara escura que é um artifício antigo, mas que ainda causa maravilha.

Esse é basicamente um pouquinho do Catavento. Trabalhamos diariamente na busca de um espaço acessível ao nosso público agen-dado e espontâneo, para poder recebê-los da melhor maneira. Perce-bemos o interesse das crianças, adolescentes e adultos; os que nunca foram passam a gostar muito e os visitantes que já foram muitas ve-zes voltam com a família, vão de novo com a escola, temos muitas escolas que voltam várias vezes. Sabemos que existem certas difi-culdades, principalmente no âmbito público para contratar ônibus, para fazer esse passeio acontecer, mas prezamos pelas experiências. Estamos construindo um espaço para isso.

Espero que vocês nos visitem, se alguém tiver alguma pergunta...”.

Mediadora:

“Nós agradecemos o Gabriel pela palestra e agora nós abrimos o espaço para dúvidas do público. Como nós temos uma agenda bem apertada, vou abrir espaço para duas perguntas, ok? Quem gostaria? ”

Participante Monalisa:

“Deixa eu perguntar, além daqueles roteiros que vocês fazem, vo-cês também têm roteiro livre para a gente escolher o que a gente quer, ou são só esses roteiros fechados? E se tem como rever uma

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política que o Catavento tem para visitação de escolas, porque tem um limite de quantas turmas a gente pode levar e isso trava uma es-cola grande como a minha. Estou falando porque já levei esse ano no Catavento minhas turmas e a gente teve problema com isso, com o roteiro e com a quantidade, como a gente faria diferente? Tem como fazer diferente? Como funcionaria? ”

Gabriel:

“A questão do roteiro: não estamos engessados naqueles roteiros, que são 10, já foram mais roteiros e foram reduzidos, eles são sempre repensados, mas nem sempre existiram aqueles 10 roteiros. Já tive-mos outros tipos de roteiro e você pode conhecer o museu sem ser obrigado a usar um roteiro. Normalmente fica a cargo do professor organizar toda a visita, porém a visita monitorada funciona somente dessa forma. Eventualmente, se der algum problema, a gente acaba abrindo outros roteiros, mas é uma questão emergencial, não é algo que funciona no dia a dia.

A outra questão, a quantidade, isso é um problema de várias es-feras que se entrelaçam. Basicamente o número de roteiros de esco-las que a gente pode receber no dia a dia está vinculado ao número de monitores que a gente tem, porque não dá para eu colocar mais roteiros do que a quantidade de gente que tenho para atender esse público. ”

Participante Monalisa:

“Eu tinha, não lembro se era 10 ou 12 turmas para levar, e eu não podia levar todas no mesmo mês, eu tive que dividir em dois meses e isso, para uma rotina da escola, é horrível. Você já para uma sema-na para fazer aquela atividade e aí no outro mês você tem que parar uma semana de novo.”

Gabriel:

“Eu não sou do agendamento, então alguém do agendamento po-deria responder essa pergunta com mais propriedade, mas, a meu ver, isso acaba sendo integrado à questão de que não podemos ter exclusividade de uma escola em um dia. Eu não posso fechar para uma escola para ela ficar com todo o meu roteiro ocupado, eu tenho que receber no mesmo dia várias escolas, até por termos contratuais e outras questões, então eu enxergo dessa forma, acho que deve ser

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isso.

Não posso em um dia falar que vou receber uma escola com 12 turmas, tem várias escolas que nos visitam no mês várias vezes, jus-tamente por essa questão, por ter que dividir os grupos em dias se-parados. Tem escolas realmente muito grandes, que levam todas as turmas de ensino fundamental por exemplo. ”

Participante Monalisa:

“A gente teve dividir em dois meses, esse foi o problema”

Gabriel:

“Infelizmente esse tipo de coisa não dá para mudar muito, bem como o roteiro. Seria muito mais interessante se eu pudesse ter 20 roteiros, mas aí também eu tenho que aumentar o corpo de monito-res, e isso mexe com questões financeiras, que não são as melhores no momento no país”.

Marina:

“Só para completar o que o Gabriel já falou. Meu nome é Mari-na e eu sou do Museu da Língua Portuguesa, e a gente tinha muito essa reclamação. Só que assim, a primeira coisa, e que o Gabriel já respondeu, a gente é um museu público, então todos tem que ter os mesmos direitos. As escolas, muitas vezes vem com 10, 12 ou 15 tur-mas, e a gente teria que fechar ou o dia ou mês para ela, e aí os outros ficam prejudicados.

Qualquer regra tem sempre problemas, o que a gente coloca é que cada escola pode trazer X pessoas naquele mês, porque senão real-mente a gente acabaria fechando o ano para 6 ou 7 escolas, só porque os grupos são muito grandes mesmo. ”

Participante Graziele:

“Oi Gabriel, aqui é Graziele, e eu queria saber quais pesquisas vocês estão desenvolvendo em relação ao público. Você afirmou que as crianças vão com as escolas e depois voltam com as famílias, isso são dados oficiais, ou são dados que você tem de comunicação, de a criança te falar que voltou? Quais pesquisas vocês estão desenvol-vendo em âmbito do educativo mesmo? Queria entender mais. ”

Gabriel:

“Temos várias pesquisas, de várias naturezas, pesquisas vincula-das às faculdades, por exemplo. Recentemente, tivemos uma aluna

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de mestrado da USP, que fez uma pesquisa de como funcionava a re-lação dos pais com o espaço no Catavento. Foi muito bacana porque ela ficou ao longo de 2 ou 3 meses acompanhando visitas de finais de semana para ver como que a mãe interagia com o filho e os espa-ços, e como o pai interagia com o filho e os espaços, e quando tinha um casal de pai e mãe, como eles interagiam com esses espaços, ou então pai e pai, mãe e mãe, independente do casal. Isso é um tipo de pesquisa que a gente tem.

Não sou eu no Catavento, nem o Educativo que desenvolve, isso na verdade é uma universidade que tem uma pessoa que nos procura para realizar projetos de mestrado, doutorado e até de licenciaturas.

O Educativo, por si só, desenvolve outras pesquisas, algumas ligadas a Secretaria, que giram mais em torno de qualidade, dessa monitoria, se o meu monitor está realmente conseguindo fazer essa linguagem ser acessível, se o meu espaço está bom e que vai desde se o banheiro estava limpo, até a qualidade da monitoria. E, além disso, pesquisas sobre se esse público está retornando ou não. A gente tem mais de um tipo de pesquisa, tem pesquisa inclusive digitalizada, que é da Secretaria, os dados vão para a Secretaria, e temos pesquisas que ficam no Catavento.

A gente não consegue, por exemplo, precisar a faixa etária dos nossos visitantes, isso é uma coisa que ainda não conseguimos fazer, até por ser um museu novo, esse tipo de coisa ainda não aconte-ceu, mas sabemos que o nosso público volta bastante. Então nesse 3.370.000 de pessoas, tem bastante gente que já retornou.

É isso gente, muito obrigado, espero que vocês nos visitem! ”

Mediadora:

“Nós agradecemos mais uma vez o Gabriel pela palestra, agrade-cemos a todos que participaram. ”

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Terceira Palestra A Contribuição dos Zoológicos à Educação

e à Cidadania.

Kátia G. de Oliveira Rancura

Chefe da Divisão de Educação e Difusão

da Fundação Parque Zoológico de São Paulo

Docente do programa de pós-graduação em con-

servação da fauna da UFSCar

Boa tarde. Na palestra de hoje vou apresentar para vocês um pou-co do panorama geral dos zoológicos, mostrando como essas ins-tituições podem ser uma ferramenta para educação e qual contri-buição podem dar para o ensino formal. Não vou focar somente no Zoológico de São Paulo, porque acredito que não se aplicaria ao caso da maior parte de vocês, que talvez não sejam da cidade de São Pau-lo, ou não possam levar seus alunos até o zoológico. Pensei em falar das instituições zoológicas de um modo geral, para que se aplicasse a todos. Mas antes de começar, eu queria contextualizar o que vem acontecendo nesse século.

É um século de grandes transformações, políticas, sociais, culturais, tecnológicas e, em decorrência dessas transformações, também temos vivenciado uma crise socioambiental muito grande, que muitas vezes nos leva a refletir se trata apenas de uma crise eco-lógica, ou se é uma crise de valores. Da forma como nos encontra-

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mos no mundo, da forma como nos enxergamos diante da natureza.

Então o grande desafio para superarmos essa crise é principal-mente esse distanciamento que foi criado entre o ser humano e a natureza. Parece que deixamos de fazer parte e passamos a nos ver à parte dela. Esse é um grande desafio: trabalhar essas questões com as pessoas, uma vez que essas não se veem como seres integrantes da própria natureza.

Outra dificuldade também para se falar em conservação é tratar desse assunto quando, às vezes, as necessidades básicas das pessoas não estão sendo supridas. Como você vai falar de conservação do verde, de conservação do meio ambiente, se a pessoa não tem sanea-mento básico, se ela não tem acesso à alimentação, se ela não tem a mínima qualidade e condição de vida? É complicado para mim, por exemplo, ir até uma comunidade que tem inúmeras deficiências e problemas e falar que eles devem conservar um fragmento de Mata Atlântica ou uma determinada espécie que está ameaçada de extin-ção.

Percebemos que o problema é muito maior do que simplesmente um trabalho de uma escola, ou de um zoológico, por isso precisamos dessa integração de todos os meios possíveis onde possamos traba-lhar a educação, para que essa transformação realmente ocorra, e a educação ambiental vem exatamente para suprir essa necessidade.

Existem alguns pontos principais que se destacam nas definições de educação ambiental. Primeiro que é um processo contínuo, não se faz educação ambiental em um dia, você não transforma as ati-tudes das pessoas em um dia, é algo contínuo e que converge para formação integral das pessoas, visa transmitir informações e conhe-cimentos sim, mas também construir valores e atitudes. Isso tudo em prol de uma convivência mais harmônica do ser humano com o meio ambiente.

Daí se destaca o conceito de educação ambiental crítica, que traz exatamente essa questão, de compreendermos um pouco melhor essa relação do ser humano com o meio ambiente e criarmos estra-tégias, refletirmos sobre como podemos transformar as nossas ati-tudes, as nossas ações para efetivamente haver uma mudança nesse panorama.

Nesse sentido foram criados diversos documentos oficiais, para valorizar a educação ambiental e para garantir que ela fosse inserida nos mais diversos contextos e espaços, como por exemplo, a Políti-ca Nacional de Educação Ambiental, que é de 1999, e que coloca a educação ambiental como um componente essencial e permanente da educação nacional.

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Porém sabemos que a legislação educacional ainda é bem frágil nas questões relacionadas à educação ambiental. Normalmente ela é trabalhada dentro de temas transversais e de uma forma bem super-ficial nas escolas. Apesar disso, um senso escolar feito pelo INEP em 2001 considerando escolas de ensino fundamental, indicou que qua-se 95% das instituições de ensino declararam ter educação ambiental de alguma forma inserida dentro do seu currículo, em projetos ou até mesmo como disciplinas específicas da instituição.

No mesmo ano também foi verificado que 25 milhões de crianças tinham acesso à educação ambiental através das escolas. Em 2004 esse número passou para 32 milhões. Diante desses números, é cla-ro que temos que parar para pensar “qual será o tipo de educação ambiental que as pessoas que responderam essa pesquisa estão con-siderando? Talvez algumas pessoas considerem que simplesmente trabalhar a reciclagem com os alunos já é suficiente para considera-rem que fazem educação ambiental na escola. Essa não deixa de ser uma atividade de educação ambiental, mas será que isso por si só vai criar toda aquela transformação que a educação ambiental prevê, para que haja realmente uma mudança desse contexto que vivemos hoje?

Um outro ponto importante também é que se coloca sobre o ensi-no formal toda a responsabilidade de discutir as consequências des-se desafio, desse problema socioambiental que vivenciamos. Então será que é obrigação só da escola discutir isso com os alunos? Será que só a escola tem que trazer essas questões? Não, a educação esco-lar não é a única fonte de aprendizado do ser humano, ela faz parte de um conjunto de espaços, de contextos, com os quais convivemos e interagimos cotidianamente. Ela é um dos espaços onde a educa-ção ambiental pode ser discutida, mas não a única responsável por trabalhar essas questões.

Temos os espaços formais, os informais e os não-formais, todos eles, com grande potencial para discutir a temática ambiental. Em casa, em uma conversa com os pais, uma criança pode aprender muito mais sobre questões ambientais do que, às vezes, na escola. Na escola é possível trabalhar diversos assuntos, desenvolver projetos ambientais que vão levar a uma reflexão, e os espaços de educação não formal também são muito propícios a essas discussões, porque eles vão trazer elementos que colaboram para que isso aconteça. Quais espaços seriam esses? Parques, zoológicos, museus, praças, estações de metrô, jardins botânicos, centros culturais...

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Foto 1- Zoológicos: espaços para a discussão de questões ambientais

Vamos focar nesta palestra em zoológicos porque é minha área de atuação. É sobre isso que eu vou falar um pouquinho com vocês, sobre o potencial dos zoológicos, mas qualquer um desses espaços pode ser propício para a discussão dessas questões. Só que para isso precisa haver também uma mudança de paradigmas, a educação em espaços não formais não pode ser simplesmente um complemento do que é visto em sala de aula, então a gente não pode trabalhar sim-plesmente as práticas do que foi visto em teoria em sala de aula, ou seja, ter uma aula ao ar livre.

Esses espaços vão muito além disso, eles podem dar uma contri-buição muito maior ao permitir a união de estratégias com o intuito de gerar uma reflexão sobre um determinado assunto, sobre uma certa questão. Eles promovem e possibilitam a experimentação, o despertar de sentimentos, de emoções e aí sim podem levar a um pensamento crítico, que vai proporcionar ações que poderão ser transferidas para o dia-a-dia, para o cotidiano daquelas pessoas.

E onde entram os zoológicos em tudo isso? Na aproximação das pessoas com a natureza. Lembra que falamos sobre aquele distancia-mento do ser humano com a natureza, que hoje em dia está cada vez mais evidente? Vamos pensar um pouquinho.... Quando vocês eram crianças, do que vocês gostavam de brincar? Pega-pega, peão, jogar bola, eram diversas as brincadeiras da nossa infância e geralmente

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elas ocorriam ao ar livre, onde interagíamos com o meio natural, dificilmente uma criança ficava dentro de casa o dia todo, a gente estava sempre em outros espaços interagindo com a natureza e com as pessoas.

E hoje em dia, o que as crianças gostam de fazer? Quem tem fi-lhos? O que os filhos de vocês, ou irmãos mais novos, sobrinhos, gostam de fazer, do que eles gostam de brincar? Computador, vídeo game, tablet, celular. Então o que a gente vê é isso, as crianças estão cada vez mais confinadas dentro de ambientes que não tem nada a ver com a natureza e cada vez mais voltadas para questões tecnológi-cas e que, muitas vezes, além de criar um distanciamento delas com os ambientes naturais, criam um distanciamento entre as próprias pessoas, porque elas mesmas quase não interagem mais.

Em compensação os zoológicos têm um potencial para criar essa conexão de pessoas e natureza. Aqui coloco uma frase que acho que demonstra bem isso ‘os animais de zoológicos são as melhores fer-ramentas que a natureza tem para fazer propaganda do seu valor em um mundo tão cheio de estímulos’.

Foto 2 – Animais: ferramentas para conectar as crianças à natureza

Como as crianças hoje são cada vez mais incentivadas a ter hábitos de consumo inadequados e estimuladas a sentir necessidade do “ter” para ser feliz, a proximidade com um animal ou a experiência em um ambiente natural pode ser uma das melhores estratégias para desper-

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tar nela o interesse e a conexão com a natureza.

Os zoológicos e outros espaços promovem experiências que po-dem propiciar essa conexão, e nós temos que saber aproveitar essas oportunidades para trabalhar e para discutir essas questões.

Um outro ponto muito importante para a promoção da educação em zoológicos diz respeito ao seu público. Dizemos que o público de zoológicos é muito democrático, porque ele é composto por pes-soas de todas as idades, de todas as classes sociais e de todas as áreas de interesse. No Zoo de São Paulo, por exemplo, atendemos desde crianças do ensino infantil, com 2 anos de idade, que estão começan-do a andar e já vão ao parque, já começam a ter essa vivência desde pequenos, até idosos, pessoas com deficiências, grupos escolares, grupos espontâneos, de todos os tipos.

Foto 3: Público de zoológicos – altamente diversificado

São muitos visitantes. Para vocês terem uma noção, o levanta-mento da Associação Mundial de Zoológicos e Aquários demons-trou que cerca de 700 milhões de pessoas passam por zoológicos e aquários todos os anos, isso equivale a aproximadamente 10% da população mundial. Se uma pequena parcela dessas pessoas for sen-sibilizada nesses espaços, podemos fazer uma grande diferença no mundo. Só no Brasil são cerca de 20 milhões de visitantes por ano. Eu trouxe um dado comparativo para vocês: o Zoológico de São Pau-lo, que é considerado um dos maiores zoológicos do Brasil, recebe cerca de 1,5 milhão de pessoas todos os anos, sendo que em alguns dias específicos, como finais de semana, feriados, Dia das Crianças,

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chegamos a receber mais de 20 mil pessoas em um único dia. É um público em potencial para a Educação Ambiental, você só tem que ter as estratégias certas para envolve-lo.

E quais são os pilares dessas instituições? Tenho certeza de que muitos de vocês acreditam que os zoológicos são vitrines de animais, que são espaços criados simplesmente para o lazer da população. Essa ideia vem de um conceito antigo dessas instituições, porque realmente elas se originaram de coleções particulares, que tinham esse objetivo simples de expor os animais. Manter animais em ca-tiveiro era até uma questão de status da nobreza no passado, que mantinha essas coleções que depois se tornaram públicas, mas hoje em dia, de acordo com os conceitos de zoológicos modernos, essas instituições tem outro papel.

Mas o lazer continua sendo um dos seus pilares? Continua, pois são espaços importantes para a população, para o entretenimento, para passar momentos agradáveis em família ou entre amigos. Mas é um lazer diferenciado, não é o mesmo tipo de lazer que você bus-ca quando resolve visitar um shopping, por exemplo. Além disso, atualmente os zoológicos também são locais para pesquisa. Hoje se desenvolvem diversas pesquisas nestes locais que contribuem dire-tamente para um outro papel dessas instituições que é o de conser-vação.

Foto 4 – Pesquisa em zoológicos – ferramenta para a conservação

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Os zoológicos trabalham muito com conservação em cativeiro, que chamamos de conservação ex situ, mas algumas instituições também contribuem diretamente com a conservação em natureza, em trabalhos in situ. O trabalho das equipes de cativeiro e de natu-reza se complementam, se integram, porque o objetivo é um só: con-servar as espécies. Às vezes tem coisas que descobrimos em cativeiro que os pesquisadores não teriam condição de estudar em vida livre, e vice-versa, então elas se conversam e são fundamentais, é uma ten-dência dos zoológicos que os trabalhos in situ e ex situ cada vez mais sejam integrados.

Foto 6: Integração de trabalhos in situ e ex situ – articulação para a conservação

Por fim, a conservação não existe sem a educação ambiental, então esse é um pilar fundamental dessas instituições, porque não adianta termos um programa excelente de conservação, conseguir-mos reproduzir uma espécie super ameaçada e até reintroduzi-la na natureza se as pessoas não estiverem conscientes da importância da-quela espécie, da sua função ecológica e da necessidade de preserva-ção dos ambientes naturais.

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Foto 7 – Educação Ambiental: fundamental para a conservação da biodiversidade

Essas coisas estão totalmente entrelaçadas, não se faz conservação sem educação, porque quase todas as ameaças à conservação das es-pécies estão direta ou indiretamente ligadas a interferências huma-nas, então a educação é fundamental nesse processo de conservação.

Pensando nessa articulação entre as escolas e os zoológicos, esse potencial educativo dos zoológicos está relacionado a um elemento central que essas instituições possuem e que gera um interesse muito grande das pessoas, provavelmente até maior do que outros elemen-tos que também estão ligados à natureza: os animais.

As pessoas, em sua grande maioria, têm muito interesse em as-suntos relacionados a animais, então temos que aproveitar o animal como uma ferramenta para gerar discussões. Por meio de uma apre-sentação com um animal você pode, por exemplo, gerar discussões relativas à política, ao meio ambiente, à sociedade, à educação... Você consegue usar o animal como uma ferramenta para abordar qual-quer tema, por isso os zoológicos não são espaços específicos para trabalhos apenas nas áreas de biologia e ciências, qualquer professor pode aproveitar esses espaços para trabalhar conceitos referentes às suas disciplinas, as problemáticas referentes à sua área dentro de um zoológico.

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Foto 8 – Animais: geradores de discussões e reflexões

E quais são as principais atividades que as instituições promovem e que os professores podem aproveitar e explorar? Os próprios recintos dos animais são uma ferramenta educativa. Quando o recinto é bem construído, bem elaborado, traz elementos que remetem ao habitat natural dessas espécies. Então um professor, por exemplo, de geografia pode trabalhar diversas questões referentes à sua matéria através do recinto de um animal.

Foto 9 - Recintos bem planejados: ferramenta educativa

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As placas educativas. Os zoológicos possuem também um apara-to muito grande em termos de comunicação visual. As placas edu-cativas podem ser exploradas por professores, assim como as visitas monitoradas que fazem parte dos Programas de Educação Ambien-tal da maior parte das instituições e são dirigidas especialmente para o público escolar. Os zoológicos ainda possuem exposições e espa-ços educadores e realizam apresentações didáticas, que permitem uma aproximação ainda maior com o animal, possibilitando a sensi-bilização das pessoas que, por estarem vivendo uma experiência que não é comum à elas, tornam-se muito mais abertas para a aquisição de novos conhecimentos e a reflexão.

Foto 10 – Placas educativas e espaços educadores em Zoológicos: fonte de conhecimento para os visitantes

Os zoológicos também promovem diversas campanhas que po-dem ser utilizadas no ambiente escolar, fornecem diversos materiais didáticos e informativos e possuem hoje em dia cada vez mais uma interação virtual com seus visitantes e com a população de um modo geral, através de seus sites, redes sociais e tantas outras ferramentas que permitem o acesso a informações que muitas vezes as pessoas não teriam durante uma visitação simples, como conhecer melhor os bastidores, o funcionamento dessas instituições e a biologia, o comportamento, a ecologia e os manejo dos diversos animais.

Outra coisa que investimos muito no Zoo - falando agora espe-cialmente sobre o Zoo de São Paulo - são os cursos de formação para professores. Porque entendemos que quem visita o Zoológico de São Paulo permanece em média 4 horas no parque, porém como foi mencionado, a educação ambiental é um processo contínuo. Se eu fizer uma visita monitorada com um grupo em 3 horas, eu não vou conseguir trabalhar tudo o que seria necessário para que houvesse

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uma transformação daquelas pessoas, eu posso conseguir despertar algo, mas provavelmente não será o suficiente para uma mudança efetiva.

Por isso, enxergamos o professor como uma peça chave do nosso trabalho, então uma experiência, uma reflexão que começa no zoo-lógico pode ser desdobrada pelo professor, ou vice-versa, o professor pode começar uma discussão em sala de aula e se aprofundar nisso através dos elementos que o zoológico dispõe. Por isso investimos muito na formação desses profissionais no Zoo e eu vou comparti-lhar com vocês algumas de nossas experiências.

Temos o curso ‘O zoológico como instrumento de ensino’ que foi uma das primeiras atividades dentro do Programa de Educação Ambiental do Zoológico de São Paulo. Esse curso tem duração de um único dia e acontece quatro vezes ao ano, duas vezes no primeiro semestre e duas vezes no segundo semestre, sendo teórico-prático, desenvolvido com base em dois eixos temáticos, que são revezados ao longo do ano. Um eixo temático é o “Animais em foco”, cujo obje-tivo é demonstrar como explorar os animais como uma ferramenta educativa. O outro eixo temático é “Sustentabilidade e conservação”, que tem como proposta mostrar como esses assuntos podem ser abordados durante uma visita ao zoológico.

Foto 11 – Curso “O zoológico como instrumento de ensino”: atividades práticas

Uma outra experiência já bem consolidada é o Programa ‘ZooEs-cola’. Esse programa ocorre desde 2010 e conta uma parceria com

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a Secretaria Municipal de Educação de São Paulo. Essa parceria foi fundamental para garantir a adesão dos professores, uma vez que através dela os professores pontuam ao realizar esse curso de forma-ção no zoológico. O ZooEscola tem um ano de duração e seu tema central é a Mata Atlântica, porque o zoológico está inserido em uma Unidade de Conservação de Mata Atlântica, é o bioma da nossa ci-dade e de grande parte do nosso Estado. Por essa razão trabalhamos muitas questões da realidade local, aspectos gerais do bioma e um subtema a cada ano.

Por exemplo, em 2014, ano em que houve a crise da água em São Paulo, que foi muito grave, estávamos trabalhando coincidentemen-te a água e a Mata Atlântica com os professores. Ano passado, 2015, trabalhamos a sustentabilidade e este ano estamos trabalhando as ameaças à biodiversidade.

E qual o objetivo dessa formação? É promover a discussão e o desenvolvimento de projetos ambientais nas escolas, permitindo a construção de valores e formação cidadã de professores e de alunos. Como fazemos isso? O Programa envolve quatro etapas: AA primei-ra delas é a capacitação de professores no início do ano, em três en-contros presenciais no Zoológico, de 8 horas cada. Nessa etapa, eles são capacitados para o desenvolvimento de projetos ambientais nas escolas e para trabalharem aspectos relativos a Mata Atlântica e ao subtema do ano.

Foto 12 – ZooEscola: formação de professores da rede municipal

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Na segunda etapa, eles agendam uma visita monitorada ao zooló-gico com seus alunos. Para os professores que participam do Progra-ma essa visita, para até 40 alunos, é totalmente gratuita, porque ela faz parte de um projeto educativo.

Foto 13 – ZooEscola: visita monitorada ao Zoológico

Depois de participar dessa visita monitorada, que tem um roteiro específico para o Programa, eles retornam para a escola para desen-volver os projetos ambientais referentes a temática do Programa. No final do ano, os professores têm um novo encontro no Zoológico para apresentar os projetos que foram desenvolvidos nas escolas ao longo de todo o período letivo uns para os outros, compartilhando os desafios, os sucessos, as dificuldades, enfim as experiências que eles vivenciaram. Depois de tudo isso, a gente faz em conjunto a es-colha dos trabalhos de maior destaque e realizamos uma cerimônia de encerramento com uma premiação simbólica dos melhores pro-jetos daquele ano. Mas a parte mais importante é esse compartilha-mento de experiências.

De forma resumida, esse é o Programa ZooEscola. Os relatos dos professores a respeito da participação e da mudança que esse progra-ma proporciona e os desafios que eles enfrentam na escola, nos dão forças para acreditar e investir cada vez mais nesse tipo de formação.

E por último, uma experiência mais nova que temos também com formação, é um projeto que começou esse ano e tem como pú-

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blico–alvo as escolas do entorno da Unidade de Conservação onde o Zoológico está inserido, o PEFI - Parque Estadual das Fontes do Ipiranga, que é um fragmento de Mata Atlântica localizado na área urbana de São Paulo, é um resquício desse bioma no meio da cidade.

Foto 14 – ZooEscola: troca de experiências após o desenvolvimento dos projetos ambien-tais nas escolas

Foto 15 – PEFI: fragmento de Mata Atlântica em meio à cidade

Imaginem o tanto de problemas que temos nessa área por estar

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rodeada pela cidade, e imaginem também a importância desse frag-mento para a flora e a fauna local e para toda essa comunidade do entorno, já que ela faz o controle hidrológico e climático da região, abriga diversas espécies, melhora a qualidade do ar, mantém a umi-dade, além de proporcionar qualidade de vida para a população. Nós temos um problema grande com os animais de vida livre dessa área, em decorrência desse contato muito próximo com o meio urbano, como caça, atropelamento, eletrocussão, abandono de animais do-mésticos que acabam se tornando invasores nessa área, predando animais silvestres, transmitindo doenças...

Foto 16: Professores de escolas do entorno do PEFI: diagnóstico para implantação de curso de formação

Por isso, em parceria com um projeto de mestrado profissional, estamos começando um trabalho piloto com duas escolas, uma de ensino fundamental I e a outra de ensino fundamental II e médio para que, nos mesmos moldes do ZooEscola, possamos propiciar uma formação para esses professores e contribuir para o desenvolvi-mento de projetos para a valorização dessa área que muitas vezes os próprios moradores do entorno desconhecem.

Como essa UC inclui diversas instituições, as pessoas a enxergam como o Zoológico, ou o Zoo Safari, o Parque CienTec, o Jardim Botâ-nico, mas não reconhecem o PEFI. Se você falar do Parque Estadual, as pessoas nem sabe que moram ao lado dele, então estamos queren-do fazer um trabalho de valorização dessa área e principalmente que vise minimizar os impactos da comunidade do entorno sobre esse

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fragmento de Mata Atlântica, contribuindo para sua conservação.

Já realizamos um diagnóstico nas escolas e o projeto de formação dos professores começa no ano que vem, então só poderei apresentar os resultados dele numa próxima palestra, mas estamos muito con-fiantes de que vai dar certo.

Espero ter esclarecido qual é o potencial dos zoológicos para a educação e a articulação que esses espaços podem ter com as escolas no intuito de promover uma reflexão sobre as questões ambientais e contribuir para a mudança dessa realidade que vivemos hoje. Qual-quer dúvida fico a disposição. Muito obrigada!”

Créditos das fotos: Acervo/FPZSP

Mediadora Jornalista Thais Cardoso:

Nós agradecemos a professora Kátia pela palestra e vamos abrir agora espaço para questões do público. Quem gostaria de fazer uma pergunta? ”

Participante Adriana:

“Olá Kátia, meu nome é Adriana. E tenho duas questões. A pri-meira, com relação ao primeiro tópico de educação ambiental na sociedade, de que forma você acha que os pais poderiam ter acesso a conteúdos de educação ambiental em casa?

A segunda é se já houve alguma pesquisa, algum questionamento buscando, nas crianças que visitam o zoológico, qual o sentimento delas em relação aos animais mantidos em cativeiro. Enfim, acho que a gente não precisa aprofundar, mas sabemos que a sociedade está vivendo uma transformação e um dos grandes questionamentos está sendo o zoológico, a existência dos zoológicos. Eles têm que ser repaginados, se não, não há possibilidade de educarmos para um futuro sustentável, não tem conexão uma coisa com a outra? ”

Profa. Kátia:

“Sobre o primeiro assunto, de como acessar, os pais poderiam ter acesso de casa à educação ambiental, existem algumas plataformas, programas de TV e sites que poderiam contribuir para levar esse conhecimento. Mas eu concordo com você que isso não é tão di-

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fundido para o público em geral, ficando muitas vezes mais restrito às pessoas que trabalham na área da educação. A Profa. Alessandra depois pode até complementar minha fala, pois ela tem mais expe-riência a respeito desse tema.

Sobre o segundo ponto, como dizer que os zoológicos têm esse potencial todo de educação se muitos deles, às vezes, não represen-tam isso que eu mostrei? Realmente, algumas instituições ainda tra-balham com estruturas ultrapassadas, que representam conceitos do passado, de simples exposição de animais. Outras instituições estão sucateadas, ou não apresentam a qualidade que deveriam ter para propiciar uma experiência que seja realmente positiva para o visitante e isso dificulta trabalhar questões de conservação, se o seu discurso não é coerente com a prática. Mas temos que entender que os zoológicos estão passando por um processo de modernização de conceitos, e isso leva tempo. Então teremos instituições que ainda não contribuem para esse trabalho de reflexão, e outras instituições que já estão em um patamar mais avançado e que podem ser explo-radas nesse sentido.

Porém, existe uma questão que muitas vezes as pessoas não pa-ram para refletir quando criticam a existência dos zoológicos, por-que essas instituições às vezes não tem o aporte financeiro suficiente para se manter em condições adequadas para os animais ou para desenvolver projetos e pesquisas. A maior parte dos zoológicos que estão em condições decadentes não tem praticamente nenhum tipo de arrecadação própria que lhes garanta o investimento em melho-rias, como o Zoológico de São Paulo, por exemplo, que depende praticamente da sua bilheteria para se manter e se modernizar. A maior parte das instituições são municipais e sabemos que nem to-das prefeituras valorizam esse espaço como um espaço de educação não formal, há outras prioridades...

Às vezes o repasse de verbas para que essas instituições possam melhorar sua qualidade, os serviços que prestam para os animais, para o meio ambiente e para as pessoas é insuficiente, então não significa falta de dedicação ou de esforço técnico. ”

Participante Adriana:

“Seria como se eu fosse um animal preso, essa seria a questão.”

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Profa. Kátia

“Antigamente, os animais de zoológicos vinham da natureza, en-tão tinha esse impacto muito grande em relação a adaptação ao cati-veiro e ao bem-estar desses indivíduos. Como um animal que vivia num território enorme e era levado para um zoológico poderia viver bem? O que justificava isso, a promoção de entretenimento para a população?

Mas, considerando os outros papéis dos zoológicos, por que esses animais estão presos? Muitas vezes porque, devido a algum moti-vo, não é possível devolver esses animais à natureza. Outras vezes porque são animais já reproduzidos em cativeiro com a finalidade de educação e pesquisa, para compreendermos melhor o comporta-mento daquela espécie, a sua biologia, realizar estudos importantes para a sobrevivência dessas espécies na natureza. As pessoas acabam pensando no indivíduo, elas não pensam na conservação da espécie pois, às vezes, aquele indivíduo que está no zoológico é um símbolo para a espécie. Quando uma pessoa, por exemplo, teria condição de ver e se sensibilizar ao se aproximar de um elefante? Talvez nunca na natureza. Os zoológicos permitem esse contato e quando você ofere-ce isso com qualidade, você garante o bem-estar para o animal, que talvez tenha sempre vivido em cativeiro e permite uma experiência positiva para as pessoas, que poderão se conectar e passar a ter atitu-des que reflitam na conservação daquela espécie.

Temos que ver os animais de zoológicos, principalmente os nas-cidos em cativeiro, que nunca tiveram esse contato com a natureza, como embaixadores de sua espécie. ”

Participante Adriana:

“Kátia, primeiro ponto eu acho que é uma vaidade muito grande do ser humano ter que limitar um espaço de um elefante, por exem-plo, ou de uma girafa, para algumas crianças poderem ter aquele toque. Eu já acho que estamos sendo demais, a gente está invadindo muito essa natureza selvagem que ama viver livre, tanto quanto nós.

Segundo, eu acho que não é um espaço propício para pesquisa nesse sentido. Espaço de pesquisa é um outro espaço, já predefinido com as suas burocracias, tem todo um suporte por trás que a gente sabe que é necessário.

Terceiro, eu não acredito que seja o melhor lugar para preserva-

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ção da espécie, ela precisa ser livre para viver sem estresse, e ter bons frutos fortes e sobreviver a adaptações. Enfim, você é bióloga, a gente sabe. ”

Profa. Alessandra:

“Adriana, eu acho fundamental essa discussão que você está tra-zendo, a gente pondera exatamente qual é o valor que a gente dá para a vida animal em geral, inclusive a nossa.

Por que a nossa espécie tem mais direito do que outras? Eu con-cordo que temos que parar para pensar sobre isso sim. Eu acredito que a sociedade ideal é aquela em que os zoológicos não fossem ne-cessários, eu acredito nisso, mas eu vejo que hoje eles ainda são. Eu ainda tenho essa visão de que, a sociedade que eu almejo é aquela que não necessite. Agora, se você quer falar da liberdade do animal, tem muitas situações de fragmentos de mata, por exemplo, em que esses animais estão extremamente ameaçados.

No Zoológico de São Paulo, por exemplo, há um trabalho muito bacana com as pererecas de Alcatrazes. São sapinhos que só vivem na Ilha-de-Alcatrazes, são endêmicos de lá, e que estão ameaçados porque a marinha brasileira fica bombardeando a ilha como lugar de teste. Os testes geram incêndios que acabam com a vegetação e a fauna desse local, como ficaria a espécie? Acabaria. Essa espécie só existe lá e o zoológico captura alguns indivíduos, visando manter e reproduzir em cativeiro para poder devolver, se necessário na ilha. ”

Participante Adriana:

“Mas eu acho que o foco tem de ser maior dentro da interdição dessa atitude, entende? ”

Profa. Alessandra

“Exatamente. ”

Profa. Kátia

“Mas é muito difícil você agora reverter uma situação, a gente está remediando uma coisa que já acontece. Os animais foram retirados da natureza no passado porque não existia essa preocupação com bem-estar, com nada. Os zoológicos foram criados, como eu falei

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para vocês, a partir de coleções de animais particulares.

Profa. Alessandra:

“Só lembrando que essas coleções Adriana - acho que é funda-mental a gente tocar nesse assunto - incluía também a espécie hu-mana. Não sei se vocês já viram, e eu recomendo fortemente, o fil-me ‘Vênus Negra’, um filme chocante para alertar a gente do que é a nossa sociedade, que vai dentro daquela lógica da sociedade que tem defesas, mas que gera isso. Os tupiniquins brasileiros foram levados para a Europa, africanos foram levados para a Europa para serem exibidos em exposições zoológicas, ao ar livre, na rua, até no inverno europeu.

E eu acho que isso que você sente em relação aos animais tam-bém, eu vejo como um momento transitório. Os zoos têm um papel hoje que tem que ser transitório, é como as cotas na educação, eu defendo as cotas hoje porque a gente não tem a comunidade negra participativa nas universidades brasileiras, e eu acho que a gente tem que garantir a entrada, mas ela não pode ser uma medida que seja para sempre. Para mim a cota é algo que é paliativo, é o momento que necessita desse tipo de medida paliativa.

Profa. Kátia:

“Na verdade, o que não se justifica, é um zoológico que exista hoje em dia simplesmente para exposição de animais. Nisso eu concordo perfeitamente com você, não se justifica a existência de zoológicos para isso, para essa função que ele tinha no passado.

Mas hoje em dia eles são necessários, como a Alessandra falou, porque a gente não tem o que fazer com muitas espécies que são retiradas da natureza com o avanço do desmatamento, da degra-dação ambiental, você não tem como manter algumas espécies em fragmentos muito pequenos de espaço, eles precisam de territórios grandes.

Muitas espécies não convivem com outras, são territorialistas, en-tão não é em qualquer fragmento que você pode reintroduzir qual-quer animal. Hoje a gente ainda convive com o tráfico de animais, há muitas apreensões, muita coisa que, se os zoológicos e os centros de reabilitação não existissem para receber esses animais, não teríamos

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o que fazer, seria um caos, um colapso ainda maior para a conserva-ção das espécies. Os zoológicos se justificam desde que eles contri-buam com outros pilares, como a educação, para as pessoas entende-rem que é necessário preservar os ambientes naturais, para que essas espécies ainda possam continuar existindo na natureza. Se justifi-cam quando você desenvolve pesquisas com os animais em cativeiro que vão reverter para a conservação daquela espécie na natureza, tanto que existem mais de 30 ou 40 espécies que melhoraram o seu status de conservação na natureza em decorrência da contribuição dada por zoológicos. Isso é resultado de uma pesquisa da Associação Mundial de Zoológicos que apresenta esses dados, o quanto as ati-vidades de zoológicos já beneficiaram ativamente a conservação de espécies na natureza. (WAZA Magazine, vol13/2012). ”

Mediadora:

“Eu tenho mais uma pergunta, que ele solicitou primeiro, sei que tem mais gente, mas vou ter que cortar por conta do tempo. ”

Participante não identificado:

“Dois pontos de vista. Como eu participei do projeto Tamar por alguns anos, eu vejo que das espécies, boa parte delas estão hoje fora de perigo por conta de trabalho feito em cativeiro. Parabéns pelo trabalho.

Sobre capacidade de suporte aos zoológicos, há pesquisas que revelam que existem um milhão e meio de pessoas por ano consu-mindo o zoológico, por exemplo, fazendo um bom trabalho e tudo o mais, como vocês vem fazendo. Mas como fica a relação suporte versus estresse animal com o número de pessoas que frequentam anualmente, vocês estão preparados? Vocês estão preparados para meio milhão a mais de pessoas, fazendo esse vínculo com o estresse animal e a estrutura de vocês? Obrigado. ”

Profa. Kátia:

“Em relação a capacidade e suporte, realmente os zoológicos, como eu falei, enquanto em alguns momentos a gente chega a re-ceber 20 mil pessoas em um dia, que seria um limite do nosso par-que, em outros dias a gente tem mil visitantes. Essas instituições, elas estão se preparando para que esse nível de visitação não influa

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diretamente no bem-estar dos animais, investindo cada vez mais em recintos que criem um isolamento, especialmente acústico, que é a principal coisa que afeta os bichos, o barulho que é produzido pela grande quantidade de pessoas, e em programas de bem-estar animal.

Existem estudos comportamentais que os zoológicos fazem com equipes específicas para desenvolver esses trabalhos, como é o caso do Zoo de São Paulo, e outros que tem funcionários que fazem isso paralelamente ao seu trabalho de veterinária e de biologia, para pro-mover o bem-estar dos animais. Eles estudam o comportamento da-quela espécie, como ela está interagindo no ambiente em cativeiro, vendo os níveis de estresse e introduzem técnicas, como as de enri-quecimento ambiental, social e cognitivo, para diminuir esses níveis de estresse.

O cuidado que muitos zoológicos têm tido em relação a isso, para que o público não influencie tanto na qualidade de vida do bicho é propiciar bons recintos, que representem bem os seus respectivos habitats naturais, cada vez melhor ambientados, com pontos de fuga, para que, quando o animal não quiser ficar exposto ele tenha essa opção, com vidros que façam o isolamento acústico, e trabalhando paralelamente com o comportamento do bicho através desses estu-dos comportamentais que mencionei.

Basicamente, em poucas palavras, é isso, porque não dá para se alongar muito, temos trabalhado dessa forma, lembrando também que existem picos de horários de visitação, ou seja, as pessoas não estão todas no parque ao mesmo tempo, isso é rotativo. Então 20 mil pessoas passam ao longo do dia pelo Zoológico, por isso fica difícil estimar a capacidade limite desses parques, essa capacidade estaria mais relacionada a prestação, com qualidade, de serviços para os vi-sitantes do que ao bem-estar animal. Obrigada. ”

Mediadora:

“Nós agradecemos mais uma vez a professora Kátia. Peço des-culpas, mas tem debates que se alongariam muito, tem muita coisa interessante para discutir, mas realmente o tempo é um problema aqui. Agradeço todo mundo que participou da discussão.

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Quarta Palestra Museu da Língua Portuguesa

Marina Sartori de Toledo

Licenciada em Artes pela Fundação Armando

Alvares Penteado, a FAAP, e Mestre em Artes e

Teatro pela Escola de Comunicação e Artes da USP.

Coordenadora do Núcleo Educativo do Museu da Língua Portuguesa.

Foi professora de artes, teatro, história da arte

em diversos colégios de São Paulo.

Atua na área de exposições e museus desde 2004, coorde-

nando projetos educativos e formação de mediadores e pro-

fessores em exposições temporárias e itinerantes.

Trabalhou ainda como Assistente Educativo do Museu Afro Brasil.

Gostaria de agradecer o convite. É um prazer estar aqui, é sempre muito bom trocar ideias com as pessoas, eu gosto muito disso.

Quando eu recebi o convite para falar sobre por que é importan-te os professores levarem os alunos ao Museu da Língua Portugue-sa, eu falei ‘não vai rolar’, porque o incêndio chegou antes de vocês, de quem não visitou ainda. O Museu está fechado para restauro e reconstrução do prédio porque, em termos físicos, foi bem grande

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o prejuízo, mas como nós tratamos da língua, que é imaterial, não perdemos a língua, nem o acervo. E por isso posso estar aqui conver-sando sobre o tema com vocês.

Aliás, uma das coisas que o nosso diretor costuma sempre falar é que talvez o Museu da Língua Portuguesa seja único em que cada vi-sitante é também parte do acervo, pelo que traz da língua portuguesa dentro de si. Eu então escolhi focar em como é que nós trabalhamos com a língua portuguesa, porque um pouco como a Alessandra ti-nha dito, também não acredito que um seja complementar do outro, pelo menos não da maneira como é colocada, mas eu acredito que todo espaço é um espaço educativo, antes de mais nada, a rua é um espaço educativo, a diferença desses espaços é como eles trabalham e de que forma você potencializa essa educação.

A experiência de alguém com um objeto, por exemplo, um smar-tphone hoje, uma pessoa pode simplesmente pegar aquele objeto e usar como um telefone, teclar como discava antigamente e falar, ao passo que a gente pode cutucá-la, desafiá-la a descobrir a imensa potencialidade que tem dentro daquele micro aparelho, acho que é muito nesse sentido que a gente trabalha a questão da educação.

Dentro disso, o museu trabalha a partir de três premissas. Uma premissa é a língua como um objeto cultural, a língua como algo normativo - esse já tem espaços formais de aprendizagem que tra-balham - então optamos por trabalhar com a língua como objeto cultural.

A segunda premissa é a questão da experiência. Jorge Larrosa Bondia é uma pessoa que vale a pena conhecer, ele fala que a expe-riência é o que nos passa, o que nos toca, o que nos acontece, que é diferente do que passa, do que acontece, do que toca. Um pou-co já foi falado aqui, por exemplo, quando a Alessandra trouxe essa questão da relação com o animal. Claro que existem N maneiras de trabalhar essa relação, a informação é importante, mas a experiência ainda é uma coisa fundamental, acreditamos nisso.

E a terceira premissa, é a questão do lúdico. Quando cheguei hoje cedo alguém estava falando que o conhecimento não é brincadeira, que a visita não pode ser brincadeira. Lúdico não é brincadeira, lúdi-co é um estado. O homem é lúdico praticamente por natureza, é cul-tural, mas a gente pode dizer que é quase por natureza. O sexo entre

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os homens é lúdico, você não copula para reprodução simplesmente, então ele é lúdico, é um estado, é um clima que se forma.

Neste momento a gente está aberto, muito mais do que quando estamos sentados, por exemplo, numa sala de educação formal, e essa foi uma das coisas que eu aprendi com as ciências. A minha área é de artes e de teatro, mas lendo um livro, quando eu dava aula para pré-escola, que fala sobre o conhecimento físico na pré-escola e que traz isso, o lúdico nas experiências infantis. A partir daí eu comecei a desenvolver todo o meu trabalho em cima do lúdico e da experiência.

Hoje tenho um ex-aluno que é um chefe de cozinha, que começou seu desenvolvimento quando ele tinha 4 anos de idade. Ele ia para oficina de artes, que eu tinha e trabalhávamos com diversas lingua-gens e uma delas era a culinária, exatamente por causa de química e física, que eu achava importante. A gente trabalhava para fazer um bolo, eu contava uma história, onde a farinha tinha uma personali-dade que era diferente do ovo e do leite, e todos eles junto criavam o bolo. Só para simplificar, o fermento, por exemplo, não gostava de ir na montanha-russa com os outros, então os outros iam no chapéu mexicano e na montanha-russa, mas ele ficava quieto, ele só entrava na brincadeira depois. Tudo isso para dizer que há dois meses atrás eu encontrei esse chefe e ele falou ‘eu faço experiências hoje em dia na culinária, na gastronomia, por causa das brincadeiras que nós fazíamos na sua oficina, eu acho que exploro e me desafio hoje a buscar novas soluções na gastronomia por causa daquilo’. Isso tudo para defender o lúdico, o lúdico não é inconsequente, ele é um es-tado muito importante para se trabalhar o conhecimento também.

Então esses são os três pilares que trabalhamos no museu. O pró-prio espaço do museu já foi concebido como um espaço lúdico e muito próximo de como a gente aprende o português. Nós sempre perguntamos para as pessoas quando chegam lá ‘onde você apren-deu o português? ’. ‘Ah, na escola’. ‘Mas antes disso você não falava português?’.

Claro que a escola é fundamental para trabalhar a norma, o que permite a gente brincar com a língua é exatamente porque ela tem, usando uma metáfora, uma espinha dorsal e um corpo de músculos que a sustenta, por isso podemos brincar com ela como um ginasta pode fazer o que faz em uma ginástica olímpica e tudo o mais.

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Proporcionamos para as pessoas vivências que as façam refletir sobre a língua, porque nós, como acabei de falar, aprendemos a lín-gua no dia a dia, e o museu procura sempre em suas expografias com que a pessoa possa ler, ver e ouvir, porque isso também são formas de como percebemos a língua.

Qual então o papel do educador? É fazer com que as pessoas pa-rem para refletir sobre essa língua que ele está usando, e perguntar, ‘mas por que isso acontece dessa maneira? Por que esse fenômeno é assim? Qual a relação entre língua e cultura, que vão se construindo o tempo todo? ’. Esse é o nosso trabalho e para mostrar isso, como não temos o museu, eu trouxe a nossa plataforma educativa na inter-net - http://estacaoeducativomlp.com.br/

A primeira coisa: ‘Como fazer uma página na internet que seja para criança, pesquisador, professor, visitante espontâneo, estrangei-ros? ’ Tem muito estudantes dos Estados Unidos, da Rússia – atual-mente o segundo maior público da plataforma é da Rússia - pessoas que querem aprender o português. Nós optamos então por um mapa de metrô onde cada linha discute alguns assuntos. A linha de jogos, da língua portuguesa, a linha do educativo, linha de vídeos, e cada uma tem algumas estações.

Só para dar uma ideia dessa questão do jogo, um jogo bem sim-ples. A língua se aprende primeiro pela oralidade, concordam? Como é que uma criança pode perceber isso, e mesmo um adolescente ou adulto? A gente brinca de telefone sem fio. A palavra ‘bagunça’ veio do Kikongo, uma língua africana onde se pronuncia bulum ungum unzá, como é que vira ‘bagunça’? É só brincar de telefone sem fio! E as pessoas vão percebendo isso. Uma das questões, não é a única, mas é um começo para daí se trazer a conversa e reflexão.

Vou mostrar rapidinho a partir do jogo ‘Na Mosca’, nós começa-mos com ele fisicamente no museu. Deu tão certo para as pessoas entenderem essa relação entre língua e cultura que levamos para a internet. http://estacaoeducativomlp.com.br/jogos/namosca/

Vou fazer um jogo rápido com vocês. Por exemplo, ‘pendurar as chuteiras’, ‘chutar o balde’ são expressões populares para representar ideias de forma figurativa, são expressões geralmente deslocadas de contexto, que ganham novos significados. ‘Pendurar uma chuteira’

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não tem a ver com futebol só, quer dizer se aposentar ou desistir de um jogo.

Então vamos lá. É um jogo da forca. O jogo é randômico e caiu um dos mais difíceis. É uma expressão popular. Quem vai brincar? Tem dica: as nuvens. ‘Estar com a cabeça nas nuvens’. Mais um só. ‘Cartas na mesa’.

Alguém já parou para pensar por que ‘cartas na mesa’? Ou por que ‘estar com a cabeça nas nuvens’ foi escolhido por tanta gente para querer dizer ‘estar distraído’? Tem um outro ‘chá de cadeira’, se você fala isso para um estrangeiro ele chora de rir. ‘Chá de cadeira’ não faz sentido, não é verdade? Mas tem um sentido: alguém sabe a origem do ‘chá de cadeira’? Numa festa ninguém te tira para dan-çar, isso é de uma época onde as pessoas esperavam ser tiradas para dançar, hoje em dia todo mundo dança junto. Olha como é cultural, e tem essa relação, e, no entanto, as pessoas usam essas expressões e não sabem de onde vem.

A ideia do jogo é sempre mostrar isso, que relação sempre tem entre a língua e a cultura. Nós temos outro jogo, com toponímias, sobre a influência do Tupi. http://estacaoeducativomlp.com.br/jo-gos/tupituba/

Por que repetimos muito nesse jogo palavras com ‘ita’ ou com ‘pira’? Pensando nas crianças principalmente, na fixação. Aí temos, por exemplo, Itarema. Itá é pedra. Então aqui tem pedras, no plural. E ‘rema’, alguém sabe? Rema é fedorenta - ‘Pedras fedorentas’. Itare-ma é o nome de um município do Ceará. Vamos escolher uma outra palavra no jogo que tenha ‘rema’. Ibirarema – já sabemos que ‘rema’ é ‘fedorenta’. O que seria ‘ibiá’? Árvore. Ibirarema quer dizer árvore fedorenta e é o nome de um município aqui do estado de São Paulo. Então com esse jogo e a repetição, vamos trazendo para as pessoas essa relação forte da língua Tupi com o espaço geográfico e com a natureza, na criação das toponímias e a influência dessa língua na língua portuguesa.

Novamente, é claro que o jogo é só um princípio. Por exemplo, pensando no Tupi, ele representa principalmente qual universo de palavras da língua portuguesa? Flora e fauna. Por quê? Porque os índios habitavam aqui e eles quem sabiam os nomes das plantas, animais e nomeavam os locais. Essa reflexão que fazemos com as

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crianças pequenas inclusive, e eles vão aprendendo essa relação en-tre língua e cultura.

Agora pergunto a vocês. Palavras do universo cotidiano, vou falar algumas e vocês vão me dizer da onde vem e porquê. Cafuné, den-go, moleque, quindim e bunda? São africanos. Por que esse universo cotidiano veio das línguas africanas? Por que essas entraram para o português brasileiro? Era a ama de leite, aquela que cuidava das crianças, conversava com elas, ela que passava a língua e a linguagem para a criança, e também na cozinha, com a dona de casa. Essa rela-ção é muito imbricada entre língua e cultura, e isso o Museu conse-gue trabalhar, esse é um espaço para essas discussões.

Último exemplo na plataforma, mais relacionado à própria língua. http://estacaoeducativomlp.com.br/linguaportuguesa/vocesabia/ No ‘Você Sabia’ cada um destes posts - já trazendo uma palavra que nós já incorporamos na língua portuguesa - são do nosso facebook e são feitos por educadores do Museu, cada um saía num dia da se-mana, e depois colocamos na plataforma. Nós discutimos a língua assim: ‘O que é uma língua? Nessa sequência vamos chamar você para refletir sobre essa questão’. Isso no Museu conversávamos com o visitante e adaptamos para a internet.

‘Vamos começar pensando o português falado no Brasil como uma língua viva em constante transformação. A cada novidade entre os seus falantes, uma novidade aparece na língua. ’

1. ‘A língua é um fenômeno mental, é difícil a gente imaginar algo sem ter uma palavra que o denomine, ela também tem a personali-dade daquele que a usa. Preste atenção ao jeito das pessoas falando, feche os olhos e escute, tente reconhecer as pessoas pelo seu modo de falar. ’

2. ‘A língua é comunicação, formal, informal, com gírias, expres-sões idiomáticas, palavrões etc., língua é comunicação. Já percebeu que na internet muitos brincam com a língua e nem por isso prejudi-cam o que querem comunicar. ‘Gente, o que tá aconteceno na minha vida? ’

As influências, que acabamos de falar, por exemplo, a influência africana: acarajé, bagunça, cafuné, dengo, quindim etc. A língua como um fato social, ela é nosso melhor retrato, conversamos sobre isso, também com o s jovens.

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Evanildo Bechara, linguista e filólogo membro da Academia Bra-sileira de Letras, diz que ‘língua. ’. É você saber falar com o código do grupo com o qual está se relacionando. Se eu vou à uma entrevista de emprego ou a uma reunião formal dentro da universidade, o meu código é um, se eu estou sentado em um bar, batendo papo com amigos, o código é outro, se eu estou na internet, ou no WhatsApp, o código é ainda um terceiro ou quarto, por isso ele diz ser poliglota em nossa própria língua.

Como tínhamos pouco tempo, eu trouxe só algumas provocações para mostrar porquê museus, escolas e centros culturais, entre ou-tros são espaços de aprendizagem, mas que dependem sem dúvida nenhuma de uma proposta educativa, e de pessoas formadas para isso. Formadas eu digo, em formação continuada também, o Gabriel acabou de falar isso aqui, de ir formando pessoas no trabalho, além da formação inicial.

Então é isso, eu acho que temos que saber usar esses espaços de aprendizagem e tem uma coisa fundamental, são sim espaços de la-zer como a Kátia falou. E isso é uma coisa que discutimos constan-temente com educadores dos museus, os mediadores, é um espaço de lazer cultural, mas é um espaço de conhecimento e que a gente pode aprender e muito, só depende de como a gente trabalha isso também. Obrigada! ”

Mediadora:

“Nós agradecemos a Marina pela palestra e vamos agora às ques-tões. Quem gostaria? ”

Participante Pablo:

“Oi, eu sou o Pablo, e eu fiquei com uma dúvida de que você falou o que é exposto no Museu é a língua, que é um bem imaterial, só que aí tem muita coisa que você poderia colocar a respeito da língua. Como vocês fazem essa seleção? ”

Marina:

“Isso foi uma forma bem enxuta de falar. Qualquer museu, qual-quer espaço é sempre um recorte. O que o museu procurou fazer foi trabalhar a partir do enfoque de que a língua é identidade.

Ele tem algumas linhas curatoriais. Primeiro a língua como iden-tidade e diversidade, o que nos une como língua, desde a forma-ção e o que nos diferencia, os regionalismos. Tínhamos uma linha

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do tempo que era mais tradicional, com leituras, imagens e vídeos, mostrando a construção da língua. E um mapa dos falares que se você clicava por região, você ouvia as pessoas falando, e elas também estavam, por exemplo, comendo tacacá, e nisso eu estou falando da diversidade, os sotaques culturais e os sotaques da língua.

Outra linha curatorial, a da universalidade da língua, de como ela contém outras também nessa construção, para isso tínhamos o Beco das Palavras, um jogo de etimologia, que você tinha que juntar partes, formando uma palavra que existia e era mostrado de onde ela veio, como ela havia se formado. A antiguidade da língua também podia ser percebida nesse jogo.

Também tínhamos a parte de literatura, a ‘Praça da Língua’, um espaço que muita gente comparava com um planetário porque era uma imersão na língua que trazia o som, o ritmo da língua portu-guesa, com trechos de obras de nossos escritores, músicas etc.

Enfim, o museu abordava de várias formas a questão da língua como um objeto cultural. Não trabalhávamos na exposição do museu a abordagem normativa, mas com os visitantes, às vezes quando apa-recia, sim.

Muita gente fala, ‘mas como você vai congelar uma língua, e a língua que está na rua hoje? ’, esse era o papel do educador. O Mu-seu mostrava as gírias da década de 20, 30, 60 e nós, nas mediações, trazíamos para o dia a dia, para a fala do cotidiano. Nós também fazíamos intervenções no saguão da Estação da Luz, a estação de trem onde o Museu se localiza, e de lá coletávamos essa fala cotidia-na, contemporânea e a diversidade, os regionalismos. Por exemplo, íamos com uma provocação - ‘bolacha ou biscoito’? E as pessoas nos diziam como falavam em sua cidade ou região e traziam outras ex-pressões. Então isso já traz a língua do dia a dia, deu uma discussão imensa no hall da Estação da Luz, onde passa gente de tudo quanto é lugar do país. ”

Participante Monalisa:

“Meu nome é Monalisa. Sempre fui muito fã do Museu da Língua Portuguesa. Tem também aquelas exposições temporárias dos gran-des da língua portuguesa. Eu queria saber se por acaso vocês têm uma ideia de fazer, ou já estão fazendo, alguma exposição itinerante do Museu da Língua Portuguesa, para levar para algum lugar e a gente ir. Era muito rico, eu lembro das imagens, dos vídeos, como se fosse hoje, eu fecho os olhos e consigo ver aquele museu inteiro, e eu

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chorei muito quando ele pegou fogo. Queria saber se vocês têm essa ideia, se já existe, como é que está funcionando. ”

Marina:

“As exposições temporárias traziam esse diálogo com a literatura, sempre homenageando um autor ou um aspecto da língua portu-guesa. Mas, temos sim exposições itinerantes. Em abril nós ficamos um mês em Araraquara com uma exposição chamada ‘Estação da Língua’. Essa exposição já foi para nove cidades de São Paulo, e o que procuramos é ir para uma cidade e fazer com que toda a região saiba que estamos naquele lugar e as escolas das outras cidades possam trazer seus alunos.

Ela acabou em Campinas, onde recebemos 11.700 visitantes em um mês, porque a região, não só Campinas, conseguiu mobilizar a população e as escolas. Aqui nessa região, em Araraquara, foi gran-de também, eu acho que foram por volta de 7.000 pessoas. Não sou muito fã de números, mas acho que eles são importantes para dar uma dimensão.

Temos duas exposições itinerando no momento, a ‘Estação da Língua’, e a outra chama-se ‘A Origem dos Nomes dos Municípios Paulistas’. Onde mostramos muitos desses topônimos de Tupi que falamos há pouco no jogo Tupituba, mas também as outras origens dos nomes, como personalidades e a questão da fé que nomeia mui-tas cidades.

Isso, Monalisa, também depende de uma outra questão, a verba. Essas exposições em especial são incentivadas pelo Proac, mas tem que ter empresas que queiram patrocinar. Esse é o lado bom dessas leis de incentivo, as empresas poderem escolher o que querem pa-trocinar. Qual é o lado ruim? Praticamente nenhuma empresa pa-trocina com dinheiro próprio, só com isenção de imposto. Com isso este ano, por exemplo, acabou essa nossa cota das itinerâncias e eu não sei se continuamos no ano que vem, porque temos também que buscar patrocínio para a reconstrução.

É certo que ano que vem não teremos, mas sou uma defensora das exposições itinerantes. Não é fácil itinerar, vocês viram a Tania Cos-ta falando do museu itinerante da UFMG com o caminhão. Como ela disse, abre um edital e todo mundo corre atrás, porque é o único

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jeito que temos de conseguir recursos. Além da própria montagem, sempre vai uma equipe para fazer formação dos mediadores no lo-cal. Sempre preferimos formar pessoas no local, porque eu acredito nisso também, nesse irradiar, no fator multiplicador desses conheci-mentos que as itinerâncias propiciam.

Enfim, eu acho fundamental que aconteça, mas por enquanto acho que vamos parar um pouco, pelo menos um ano.

Participante Adilson:

“Boa tarde Marina, excelente a sua apresentação do Museu. Meu nome é Adilson, eu sou da Universidade Federal de São Carlos e também sou um fã do Museu da Língua Portuguesa. Posso dizer que o Museu também foi muitas vezes inspiração para alguns dos pro-jetos que a gente realiza de divulgação científica, acho que foi uma ideia sensacional, uma coisa eu diria inédita, a nível de Brasil, não sei a nível mundial, mas uma coisa que é tão chata às vezes para as pessoas, a questão da língua. Da mesma forma que as pessoas acham a matemática chata para ensinar, gramática também não precisa ir longe que também fica no mesmo pé. E mostrar o lado belo da nos-sa língua que é única, fantástica, com diferentes sonoridades é uma imersão fantástica naquele espaço. Espero que logo vocês consigam voltar, mais modernos, mais avançados. Tem aqueles males que vem para o bem. ”

Marina:

“Não deixa de ser um privilégio, quantas instituições depois de 10 anos podem parar para olhar para si novamente? Fazemos isso caminhando, e nesse caso pudemos parar, avaliar e rever, para re-construir. ”

Participante Adilson:

“A minha pergunta é a seguinte, no Museu algumas destas expo-sições físicas, a Praça da Língua realmente é uma experiência fan-tástica, é o lugar que eu mais gostei, acho que é o melhor lugar do Museu. Mas o Museu tenta trabalhar com uma espécie de narrativa da própria língua quando você monta a exposição contando a histó-ria da língua, a própria origem da língua e depois chegando algumas coisas com elementos culturais mais recentes.

Acho que a última vez que estive lá era perto da época da Copa do Mundo e acho que o Museu tinha feito alguma coisa especial falando da linguagem com o futebol, não me lembro bem da exposição. Eu

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queria saber na sua opinião, como você encara essa questão de fazer essa divulgação dentro de uma narrativa, dentro de contar uma his-tória, essa é uma preocupação ou isso surge normalmente das pro-postas de exposições que vocês fazem? ”

Marina:

“O próprio Museu, como eu estava respondendo aqui, tem sem-pre uma curadoria e com isso existia uma preocupação didática também de mostrar um pouco como a língua se constrói. Quando a gente trabalha com a linha do tempo da língua portuguesa, mas começando lá no indo-europeu, ela tem, sem dúvida nenhuma, uma narrativa que está lá colocada e não dá para trabalhar todas porque é um universo imenso.

A intenção é, como nunca se esgota uma narrativa, você nunca consegue abarcar o todo, a ideia é sempre que, tanto as exposições temporárias quanto o trabalho do educativo, crie essas outras dis-cussões e narrativas. Por exemplo, uma discussão que estamos tendo agora, algumas pessoas criticavam, educadores inclusive, que a lín-gua nunca é tão passiva assim. Há conflitos, guerras, tem poder, a língua é poder, e muita gente questionava isso não ser colocado.

Tem uma outra coisa que é linda também quando pensamos em discursos narrativos, se a gente conseguir fazer um diálogo entre museus. Um museu de história e o museu da língua, que fala da lín-gua e da relação entre os dois acervos, se constrói o conhecimento. Mas, é um trabalho do educativo ou das exposições que trazemos. Por isso é que queria mostrar que nós temos no Educativo essa nar-rativa de “atualização” da língua, a gente traz na ponta da língua discussões, mimimi, streaming, ‘vida longa e prospera’, ‘delação pre-miada’ ... Estamos sempre atentos ao que acontece nas redes sociais, por exemplo. Assim que surge uma expressão, algo que virou meme, os educadores incorporam em sua mediação, discutindo significado, criação, esse processo cultural e dinâmico da língua. Isso é o que eu acho que são as narrativas que a gente vai criando e é fundamental que se crie essas outras narrativas, exatamente para você não con-gelar a língua dentro do museu, mas ela depende do trabalho do educativo e das exposições. ”

Mediadora:

“Nós agradecemos a professora Marina pela sua palestra. Peço desculpas, mas infelizmente temos nosso horário.

Gostaria de agradecer também a todos que participaram da dis-cussão e agora nós vamos fazer uma pausa para o coffee break.

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Segunda Mesa Redonda Interação entre Espaços Não Formais e

Escolas em São CarlosPrimeiro expositor

O Laboratório Aberto de Interatividade (LAbI) da UFSCar

Adilson Oliveira (LAbl/UFSCar)

Doutor em Ciências, Física da Matéria Condensada, UFSCar.

Fundador e coordenador do Laboratório

Aberto de Interatividade, o LAbI da UFSCar,

Professor titulas do Departamento de Física da UFSCar

Vice-reitor da UFSCar, com o mandato até novembro de 2016.

“Boa tarde a todos, com grande prazer eu volto hoje ao CDCC.

Eu comecei a fazer divulgação científica aqui na CDCC quando eu era estudante de graduação da UFSCar. Fui trabalhar no Obser-vatório da USP, hoje Observatório Dietrich Schiel. Tenho que lem-brar da importante influência do Prof. Schiel naquela época em que, ainda como estudante de graduação, iniciei a minha trajetória na divulgação científica no Observatório. Eu vim fazer o curso de Física porque queria me tornar astrônomo e a oportunidade de trabalhar com isso em São Carlos foi uma benção para mim. Graças também ao Prof. Valter, que era o coordenador do Observatório na época, que foi sempre um grande incentivador desde a primeira vez que cheguei lá, me orientando a como fazer uma boa palestra. Fui aco-lhido de braços abertos e posso considerar que isso foi muito impor-

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tante para toda a minha carreira, principalmente nas minhas ativi-dades de divulgação científica.

Gostaria de começar mostrando para vocês um pouco do nosso trabalho no Laboratório Aberto de Interatividade (LAbI/UFSCar), onde desenvolvemos diversas metodologias de divulgação científi-ca. São muitas atividades que lá realizamos desde a sua criação em 2006, mas não vou ter tempo para apresentar tudo isso para vocês e também porque foge do escopo do encontro de hoje. Contudo, eu queria apenas mostrar alguns dos nossos projetos realizados nos úl-timos 10 anos. O ponto principal sempre foi fazer uma ponte entre artes, ciência e, principalmente, com a cultura científica. Ao longo do tempo trabalhamos com instalações interativas, programas de rá-dio, vídeos, mídias sociais entre outras atividades.

O LAbI faz parte do projeto CDMF - Centro de Desenvolvimen-to de Materiais Multifuncionais, que é um dos CEPIDs da Fapesp, sendo o LAbI é um dos laboratórios associados a esse Centro, pois uma das principais missões dos CEPIDs é fazer a difusão e divulga-ção do conhecimento. O LAbI desenvolve diversos projetos simulta-neamente como a produção de vídeos como Click Ciência, Ciência Explica, Quebra-Cabeça. Esses vídeos são produzidos em um estúdio de TV, que foi um investimento do CDMF. Além disso, trabalha-mos com instalações interativas, programas de rádio e o museu a céu aberto Caminhos do Conhecimento, que é uma importante e inova-dora proposta que estamos desenvolvendo na UFSCar.

As instalações interativas têm o propósito de fazer com que o in-divíduo tenha uma imersão no espaço não formal, e a partir disso, tentar despertar do interesse pela ciência.

A primeira instalação interativa que fizemos foi Escalas: uma jor-nada entre infinitos, montada em 2007. A partir da metáfora da luz como a forma de vermos o mundo, o indivíduo conseguia fazer uma viagem das galáxias até o universo nanométrico. Essa exposição foi montada a primeira vez em 2007, na praça Coronel Salles e depois tivemos a oportunidade de mostrá-la em outros lugares, inclusive no Parque do Ibirapuera em São Paulo. A ideia dessa instalação é fazer as pessoas saírem das galáxias que estão na escala de 10 24 metros e chegar na escala de 10-10 m, que é a escala dos átomos e da mecânica quântica. A partir disso o indivíduo interage com o vídeo projetado com uma lanterna viajando entre diferentes escalas e fenômenos que

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estão na natureza e em criações humanas. Enquanto a lanterna subia e descia, em terminais de computadores pequenos links eram aber-tos para que outras pessoas acessassem conteúdos específicos. Por exemplo, quando aparecia no vídeo um ‘caramujo’ os links podiam exibir uma receita de escargot.[1]

Figura 1 – Instalação Escalas: uma jornada entre infinitos – apresentada a primeira vez em outubro de 2007

Após essa instalação desenvolvemos mais algumas e a última que realizamos foi a “Memória de um Carbono”. A ideia dessa instalação foi fazer uma narrativa ao longo de 6 bilhões de anos. O carbono narra em primeira pessoa o seu nascimento numa estrela há bilhões de anos e vai contando toda a sua história, toda a sua evolução até o momento em que ele acabou de sair do nosso nariz, quando expira-mos o CO

2. O mesmo átomo de carbono que acabamos de expirar

foi criado há 6 bilhões de anos em uma estrela que já morreu.

O conceito dessa instalação partiu de um texto que escrevi para a Ciência Hoje[2]. A narrativa foi construída de forma que quando o indivíduo adentra na instalação, por meio da tecnologia interativa

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do Kinect, que capta os movimentos, principalmente das mãos per-mitindo que se controle um jogo no qual uma espaçonave que parte da praça Coronel Salles de São Carlos e vai para o espaço buscar o Carbono nos corpos celestes. Depois ao voltar para a Terra os indi-víduos fazem uma viagem no tempo, procurando encontrar o átomo de carbono ao longo da História, desde da época dos dinossauros até os dias de hoje.

Figura 2 – Instalação Memórias de um Carbono apresentada pela primeira vez em outubro de 2011

A primeira exposição da instalação foi em outubro de 2011 e nas suas diversas apresentações atingiu mais de 20 mil visitantes. A úl-tima vez que foi exibida foi na SBPC que ocorreu em São Carlos em julho de 2015. Durante a SBPC ela teve mais de 1.500 visitantes ao longo de toda a semana em que ela foi exposta.

Como uma outra alternativa de um espaço não formal de divul-gação e de aprendizado, temos trabalhado o uso do rádio como veí-culo para divulgação científica. Temos desenvolvendo programas de rádio desde 2009. Está no ar, desde essa época, o programa Paideia na rádio UFSCar em 95.3 MHz, que vai ao ar todas as terças-feiras, das 18h às 19h, que a partir de maio de 2017 também é veiculado na forma de videocast nas redes sociais do LAbI e do CDMF [3]. E esse

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programa é onde discutimos a cultura científica, tratando temas de ciências e tecnologia.

Dentre as nossas experiências de divulgação, que considero uma das mais interessantes já realizadas pelo LAbI foi a criação radio-novelas. A nossa experiência melhor sucedida foi “Verdades In-ventadas”. O roteiro de Verdades Inventadas ganhou o prêmio Ro-quette-Pinto de Rádio dramaturgia que financiou a produção dessa radionovela. Verdades Inventadas conta as histórias de Laura, uma garota de 15 anos de idade, do primeiro ano do ensino médio, que no primeiro episódio tem um novo professor de língua portuguesa e literatura. Esse professor estimula os seus alunos a realizarem via-gens imaginárias a partir da sua leitura ou mesmo das suas histórias.

A radionovela tem 37 episódios de 10 minutos, em que a Laura vai visitar os mais diferentes personagens da história da ciência como Einstein, Newton, Kepler, Oswaldo Cruz, Clarice Lispector entre tantos outros. As histórias dos episódios formam um arco, dentro da temática do tempo. O primeiro episódio fala justamente do en-contro dela com o viajante do tempo e no último episódio ela vai fechar essa história toda do tempo encontrando Einstein, Newton e Stephen Hawking, que podem ser ouvidos no site do LAbI. Verda-des Inventadas é uma rádio dramaturgia que também se desenvolve na internet, pois a Laura relata as suas viagens imaginárias em um blog, www.viagensdalaurawordpress.com. No blog as pessoas con-versavam com a Laura, mandavam mensagens, trocavam ideias so-bre as suas viagens imaginárias. No blog a Laura tem uma amiga, a Patrícia. A Laura tem um amiguinho chamado Marquinhos que paquera um pouco a Laura. Tem um pouco de tudo nessa história e foi uma experiência muito interessante porque teve uma repercus-são muito boa. Primeiro porque a gente estava ressuscitando uma forma de narrativa antiga; segundo porque nós estávamos colocan-do o tema sobre ciência; e terceiro, com a tecnologia que você tem hoje no computador, você cria um ambiente sonoro, permitindo um exercício da criatividade para ver isso.

O blog “Viagens da Laura” em 2013 concorreu como melhor blog de língua português num prêmio da Deutsche Welle, ficando em se-gundo lugar, com quase 150 mil votos na competição, justamente por causa dessa narrativa diferenciada que a gente fez [4].

Finalmente, o nosso último projeto foi transformar a UFSCar em

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um museu de ciência a céu aberto. O conceito se baseia em transfor-mar o local no qual se produz Ciência em também um local no qual se divulga a Ciência.

O museu “Caminhos do Conhecimento”, desenvolvido pelo LAbI/UFSCar, oferece outras possibilidades de mediação entre diferentes públicos e o conhecimento científico, para além das já consolida-das em museus e centros de ciência tradicionais [5]. Para tanto, o projeto propõe itinerários sobre as ciências a serem percorridos no campus da Universidade. Tais itinerários são indicados por placas de sinalização do projeto que, além de apresentarem textos de grandes cientistas e pensadores, contêm QR code (códigos gráficos que dire-cionam a sítios na Internet) que permitem o acesso – com o uso de dispositivos móveis, como celulares e tablets – a conteúdos em vídeo e textos produzidos exclusivamente para o museu, relacionados às áreas científicas dos locais onde se encontram. Ao acessar o código pela primeira vez, o aplicativo do projeto inicia um guia pelo itinerá-rio escolhido, indicando os próximos pontos a serem visitados.

O museu também prevê o oferecimento de visitas guiadas, nas quais os participantes podem visitar os laboratórios da Universida-de, conhecendo, para além de onde e de como a ciência é produzida, também quem a produz. O primeiro itinerário, já em funcionamen-to, é denominado “Trilha Epistemológica” e passa por 17 pontos narrando a história das diversas áreas de conhecimento presentes na Universidade.

O próximo itinerário a entrar em funcionamento será a “Trilha da Luz” que foi financiado por meio de um edital do CNPq/TIM, onde os professores da rede estadual do ensino fundamental vão fa-zer o que a gente chama de ACIEPE (Atividade Curricular Integrada de Ensino, Pesquisa e Extensão). Eles irão fazer essa atividade conos-co e vão aprender a produzir vídeos sobre ciência, que vão construir uma trilha da luz dentro do nosso museu.

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Figura 3 – Museu “Caminhos do Conhecimento” da UFSCar outubro de 2011

Finalizando, no LAbI usamos diferentes estratégias de divulgação científica, ligando elementos culturais como vídeos, artes, progra-mas de rádio, levando a perspectiva interessante para a dissemina-ção do conhecimento, sempre tentando fazer uma construção disso de maneira colaborativa com diferentes atores de todas as áreas do conhecimento.

No site do LAbI pode se encontrar quase todos os projetos cita-dos, além de outros como o Click Ciência, que são entrevistas sobre divulgação científica, Quebra-Cabeças são vídeos pequenos sobre ciência, Ciência Explica são agora pequenos vídeos voltados para crianças nas séries iniciais.

Essas atividades são realizadas por uma equipe multidisciplinar que envolve jornalistas, profissionais de imagem e som, e estudantes de computação, de física e de biologia entre outros, permitindo que o nosso laboratório seja um ambiente jovem e animado.

Todas essas atividades somente são possíveis de se realizar com o apoio financeiro principalmente da Fapesp, dentro do projeto CE-PID/CDMF, CNPq e a Pró-Reitoria de Extensão da UFSCar.

Referências

[1] Instalação Escalas: Uma Jornada entre infinitos – Laborató-rio Aberto de Interatividade para a Disseminação do Conhecimento Científico e Tecnológico –http://www.labi.ufscar.br/2016/06/17/ins-talacao-escalas/ - acessado em 18/07/2017

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[2] A. J. A. de Oliveira – Memórias de um Carbono – Ciência Hoje on-line - http://www.cienciahoje.org.br/noticia/v/ler/id/2823/n/me-morias_de_um_carbono. acessado em 18/07/2017

[3] Programa Paideia - Laboratório Aberto de Interatividade para a Disseminação do Conhecimento Científico e Tecnológico – http://www.labi.ufscar.br/category/conteudos/paideia-conteudos/

[4] https://viagensdalaura.wordpress.com/escute-aqui-minhas--aventuras/ acessado em 18/07/2017

[5] www.caminhos.ufscar.br - acessado em 18/07/201

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Segundo expositor

Interação das Escolas da Rede Estadual de São Carlos com Espaços Não Formais

Daniela Isabel Taipeiro

Graduada em Letras, Unesp Araraquara

Mestre em Educação, UFSCar.

Assistente técnico pedagógica da Diretoria

de Ensino da região de São Carlos (formação de professores na área de lín-

gua portuguesa e alfabetização)

Tutora virtual da Universidade Aberta do Bra-

sil no curso de Pedagogia pela UAB UFSCar.

“Boa tarde, primeiramente eu gostaria de agradecer o convite. Em nome da professora Debora, que a dirigente regional de ensino aqui da região de São Carlos, ela é membro do conselho estadual de educação que se reúne regularmente toda a quarta-feira, então hoje ela está em São Paulo nessa reunião, pediu desculpas por não poder estar aqui e pediu para que eu a representasse para falar um pouco sobre como as escolas da rede estadual de São Carlos interagem com esses espaços não formais

Vou partir do pressuposto que vocês não conhecem a diretoria, ok? Vou falar um pouco da Diretoria de Ensino para vocês.

A Diretoria de Ensino de São Carlos abrange os seguintes muni-cípios: Corumbataí, Descalvado, Dourado, Ibaté, Itirapina, Ribeirão Bonito e São Carlos. Sendo que o número a frente é o número de escolas estaduais nesses munícios, o maior número está concentra-do na cidade de São Carlos com 34 escolas. Nós temos também três

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centros de estudos de línguas, conhecidos popularmente como CEU.

Os segmentos de ensino atendidos por essas escolas vão desde os anos iniciais do ensino fundamental, as crianças de 6 anos ingressam no ensino fundamental passando pelo ensino fundamental dos anos finais, que correspondem do sexto ao nono ano. O ensino médio que corresponde da primeira à terceira série, e também educação de jo-vens e adultos que atende tanto o ensino fundamental EJA, quando ao ensino médio EJA.

A Secretaria de Estado da Educação tem um currículo oficial. Não sei vocês têm o conhecimento disso, mas ali tem o currículo da área de ciências da natureza, que abrange as disciplinas de ciências, biologia, física e química. Esse currículo oficial organiza o ensino da área de ciências da natureza em quatro eixos temáticos que são: vida e ambiente, ciência e tecnologia, ser humano e saúde, terra e universo.

Esse currículo está organizado na forma em que nós chamamos em espiral, portanto esses eixos se repetem desde os anos iniciais até o ensino médio mudando a abordagem e o grau de complexidade, o aprofundamento, o vocabulário mais específico.

Por que estou dizendo tudo isso para vocês? Porque para imple-mentação desse currículo oficial na rede, há materiais de apoio ao currículo de subsídio para implementação desse currículo que são os cadernos do aluno, conhecidos também como as apostilas, e o caderno do professor onde tem as orientações para o desenvolvi-mento das atividades que constam no caderno do aluno. Esse é um dos materiais de apoio.

A Secretaria do Estado da Educação também faz parte do PNLD, então também tem conta com livros e manuais didáticos, com textos paradidáticos, além da sala ambiente de informática que todas as escolas da rede estadual tem, onde é bastante incentivado e estimu-lado a utilização e acesso a sites, e também um outro instrumento de incentivo e de apoio a execução desse currículo, é exatamente a visita a museus, centrais de energia, instalações de interesse científico e tecnológico que possam constituir importantes estímulos e reforços a aprendizagem das disciplinas científicas. Aqui está uma foto para quem não conhece, os cadernos do professor e cadernos do aluno.

Falando especificamente dessas visitas que as escolas fazem a

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esses espaços que foram citados anteriormente, e outros que vocês verão que vou citar logo mais, isso tem uma tramitação dentro da escola, acho importante vocês saberem disso. Não é simplesmente o professor decidir sair com os alunos e no dia seguinte sair. Nós temos uma legislação, é tudo pautado no ECA, Estatuto da Criança e do Adolescente, nós estamos lidando com crianças e adolescentes, por isso todos os cuidados necessários são tomados para que essas saídas do ambiente escolar sejam feitas com a maior segurança pos-sível para os alunos. Tem todo um expediente, um procedimento que as escolas têm que montar, e elas são devidamente orientadas para que façam isso da forma correta que aí fica tudo mais rápido. Chegando para nós essa solicitação de saída com os alunos, é coisa de um ou dois dias no máximo e eles já tem autorização para sair.

Sempre orientamos e solicitamos que essas visitas estejam pre-vistas na proposta pedagógica da escola, que não seja a visita pela visita, ou o passeio pelo passeio, como já foi citado aqui a questão do lúdico. O lúdico não é a brincadeira por si só, então mesmo que seja uma visita com essa intenção, tem uma intencionalidade.

Nós solicitamos que essas visitas sejam previstas desde o início do ano para que haja uma organização por parte da escola e também para que haja uma interface com o currículo, com os conteúdos que tem que ser trabalhados. Só para vocês terem uma ideia do que tem que constar dessa solicitação. Como eu disse para vocês todo esse procedimento está pautado no Estatuto da Criança e do Adolescen-te.

Nós chegamos agora a um recorte, quanto ao convite para vir aqui conversar, algumas escolas de livre e espontânea vontade me passaram alguns dados. Nós temos aqui um recorte de mais ou me-nos 10 ou 12 escolas que contaram um pouco dos lugares de onde elas estiveram entre o ano de 2015 e 2016.

Como 2016 ainda está em curso, então pedimos que elas contas-sem um pouco das experiências no ano passado também. E aqui es-tão os locais, podemos dizer um ranking dos lugares visitados pelos alunos da rede nos anos de 2015 e 2016.

O Parque Ecológico de São Carlos ganha disparado, está aqui pertinho, acaba tendo essa facilidade do acesso. Feira de Ciências da USP, o Zoológico de São Paulo, Fazendo Conde do Pinhal, Visita ao Mineirinho, Fazendo Santa Maria, a Bienal do Livro de São Paulo, o próprio CDCC, exposições e feiras, principalmente feiras de profis-sões em universidades aqui da região, Museu Mário Tolentino, Ob-servatório da USP, Museu da Memória de São Carlos, Caravana da

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CPFL, Museu da Língua Portuguesa, Museu Catavento, Museu Afro, Museu Monteiro Lobato, Museu da Imigração e outros.

Por que ‘e outros’? Como eu disse para vocês isso é só um recorte, não é a totalidade das escolas, então tem outros lugares que foram visitados também.

Os componentes curriculares dos professores envolvidos, aqui a gente pode viajar e tirar uma série de conclusões e fazer uma série de inferências, mas quase sempre, via de regra, é liderado pelos profes-sores das áreas de ciências da natureza mesmo. Ou professor de ciên-cias, ou professor de química ou física, são os que mais solicitam são os que mais solicitam esse tipo de visita/excursão pedagógica como nós dizemos. Seguidos pelos professores de língua portuguesa e ma-temática, que uma suposição é, com exceção do Museu da Língua Portuguesa que acaba tendo essa afinidade com a própria disciplina de língua portuguesa, quase sempre são os próprios professores de língua portuguesa que solicitam essa visita, por serem as disciplinas que tem o maior número de aulas.

São professores que acabam criando um vínculo maior com a classe por estarem mais tempo com eles e acabam criando esse vínculo e daí isso de levá-los para outros ambientes. E também os professores de história e geografia, que tem bastante afinidade com a área de ciências, essa questão de contextualização, a sociedade e tudo o mais que está por trás de toda a produção científica. Lem-brando sempre que é do recorte.

E o que as escolas falaram que perceberam e puderam observar e até mesmo aferir em termos de avaliação e observação do impacto dessas visitas, a esses locais, na aprendizagem dos alunos? E aqui são palavras das próprias escolas:

‘Uma participação mais efetiva dos alunos nas aulas; maior inte-resse e comprometimento com a disciplina curricular; contextuali-zação da aprendizagem; envolvimento do aluno com as atividades práticas, o que gera aprendizado em todos os componentes curri-culares e não simplesmente aquele alvo da visita; ampliação e apro-fundamento do currículo; contribuição para o desenvolvimento do projeto de vida dos alunos; discussão sobre as formas de energia re-nováveis e não-renováveis, redução de consumo entre outros; cons-cientização por parte dos alunos quanto aos hábitos em relação ao

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desperdício; maior interesse pelos alunos em ciências, experimentos e pesquisa; constatação da importância das ciências em suas vidas; e estimulação dos docentes e alunos envolvidos a desenvolverem mais projetos ampliando sua percepção de mundo, história, evolução e tecnologia.

Eu gostei muito dessa última colocação. E aqui deixo para vocês também uma frase do Paulo Freire, que na minha humilde concep-ção, não sou da área das ciências, que diz ‘o que move a humanidade é a curiosidade’. Então sem a curiosidade que me move, que me in-quieta, que me insere na busca, não aprendo e nem ensino.

Aqui tem o nosso contato, caso vocês queiram entrar em contato com a Diretoria de Ensino para estabelecer parcerias. A Debora é muito aberta, as escolas também podem nos procurar, é algo que nós fazemos com muito gosto, com muita convicção que é estimular es-sas parcerias tanto com a instituições formais de fomento à pesquisa e a ciência, quanto as não formais também.

Muito obrigada! ”

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Terceiro expositor

O Centro de Divulgação Científica e Cultural, CDCC, Campus de São Carlos da USP

Valter Líbero

Bacharel, mestre e doutor em Física pelo

Instituto de Física de São Carlos/ USP.

Professor do Departamento de Física e

Ciências Interdisciplinares/IFSC/USP.

Atual Diretor do Centro de Divulgação

Científica e Cultural, o CDCC da USP.

“Boa tarde e meus cumprimentos a todos pelo dia de atividades, que foi realmente muito bom, desses que a gente tem horas e horas para pensar depois de ouvir tantas pessoas empolgadas com a divul-gação científica.

Isso nem sempre foi assim. Eu sou de uma época em que divulga-ção científica não era algo visto com tanto gosto como é hoje, nem com a importância que ela de fato tem. Na verdade, eu diria que não se dava importância e nem era vista com bons olhos. O Prof. Adilson lembrou bem, ao docente que se envolvesse com esse tipo de ativi-dade, dir-se-ia que ele estaria perdendo tempo! Uma visão que, gra-ças a Deus, não perdurou, não se sustentou, por uma simples razão ao meu ver: para você se tornar um pesquisador, ou um professor, você precisa fundamentalmente de motivação. Em um momento da vida, principalmente dos jovens, há uma escolha pela carreira a se-guir. Como é que se faz uma escolha se você não tem informação, ou exemplos, que permitam que você possa fazer uma boa escolha?

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A divulgação científica, ou a extensão universitária de um modo geral, é a melhor forma para se mostrar à comunidade linhas de tra-balho, ou incentivar jovens a uma carreira profissional, seja na pes-quisa científica ou na educação básica, particularmente em ciências em nosso caso, já que em São Carlos as universidades são voltadas às áreas científicas.

Não sei ao certo como um dia eu escolhi trilhar o caminho da Física, porque na minha época não havia divulgação científica, ou pelo menos não numa escala que pudesse chegar até mim, em uma escola do interior. Hoje nós estamos vivendo, de uma certa maneira, um momento privilegiado no ensino, apesar de todas as dificuldades que enfrentamos, pois cada vez mais temos melhores grupos de pes-soas voltadas a essa atividade.

Mas de qualquer maneira temos que reconhecer que devido ao esforço de todos nós, hoje temos condições de estimular jovens ou de mostrar a eles que o caminho do cientista não é aquele do sujeito que vai colocar o avental branco e se enfurnar dentro de uma sala e ficar fazendo uma pesquisa que poucos vão saber do que se trata. Ao contrário, ele poderá partir para uma direção em que ele vai fazer uma coisa muito importante para a sociedade. Hoje a gente tem essa capacidade de mostrar aos jovens todas as direções possíveis que ele pode trilhar e aí o gosto dele é que vai decidir para onde ele quer ir.

Eu me sinto assim hoje, de certa forma muito feliz, que ideais do passado tenham sido bastante modificadas, graças, como eu disse, ao trabalho às vezes até muito difícil de todos nós. Eu aqui gostaria muito de lembrar dois nomes importantes nessa caminhada, que eu diria que são responsáveis por essa mudança. Uma dessas pessoas é a professora Yvonne Mascarenhas aqui do meu lado, que poderia muito bem ser uma dessas pessoas com avental branco dentro do la-boratório, mas ela, além do laboratório, também sempre esteve pre-sente nas iniciativas de divulgação científica, haja vista, o programa Ciência Web e outros que ela se envolve.

Não poderia deixar de citar também o professor Dietrich Schiel, responsável por toda evolução do Centro de Divulgação Científica e Cultural, CDCC, pessoa de extrema coragem porque na época de criação do CDCC era visto com esses olhos de quem está perden-do tempo fazendo divulgação ou extensão universitária, e a gente vê hoje que não foi perda de tempo, ao contrário, seu trabalho tem ajudado muitas pessoas a decidirem o que fazer na sua vida profis-

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sional.

Gostaria de lembrar que hoje à noite nós teremos aqui no CDCC o lançamento de um livro que conta a história do CDCC, com de-poimentos daqueles que ajudaram a construir este Centro. É interes-sante ver e sentir que instituições são feitas por pessoas, pela história de cada um, pelo envolvimento e esforço de cada um! Algumas des-sas pessoas estão aqui presentes no auditório. Acredito que hoje te-remos uma dessas noites memoráveis com o lançamento desse livro.

Em termos de proposta para a mesa redonda, colocaria a seguin-te questão: todos nós aqui somos muito entusiasmados com o seu campo de trabalho e nós temos feito todo o possível para que a di-vulgação científica seja cada vez melhor. Fazemos o impossível as ve-zes, dada as circunstâncias orçamentárias das instituições, para que a gente possa ter um ambiente propício à transferência de conhe-cimentos. Apesar de todas as dificuldades, acho que a gente evolui muito bem, todos aqui mostraram uma capacidade bastante grande em seus trabalhos. Às vezes a gente consegue colocar dispositivos, caminhões, televisores, etc., a disposição da comunidade, como fo-ram os exemplos aqui mencionados. O empenho pessoal ficou claro nas apresentações. Acho que essa parte a gente faz muito bem, mas eu pergunto o seguinte: será que, mesmo com toda preparação logís-tica que a gente faz nos centros, como a comunidade está nos vendo? Vocês entendem que a comunidade hoje nos olha como agentes bem preparados para fazer a divulgação cientifica, ou não? Será que para a comunidade é muito importante que sejamos extremamente tec-nológicos ao fazer a divulgação científica, ou não? Às vezes eu penso que o esforço que nós fazemos na divulgação científica ou extensão universitária é enorme perto da resposta que a comunidade nos dá. Não que isso nos desestimule, mas questiono se os nossos esforços estão sendo de fato feitos na direção certa. Nós temos o gosto por fazer divulgação e muitas vezes apelamos para a tecnologia e explo-ramos até ambientes universitários para implementar as ideias. Será que isso tudo está na direção certa para a comunidade que vem aqui esperando alguma coisa de nós? Estamos satisfazendo essa comu-nidade quando apresentamos resultados ou novidades geradas nos ambientes universitários? Logicamente, em um dia tão rico como o de hoje, outras perguntas poderão ser suscitadas também.

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Quarto expositor

O Museu da Ciência Prof. Mario Tolentino

Paulo Milanez

Formado em magistério pelo Instituto de Educação Álvaro Guião,

Foi professor na rede municipal de São Carlos e Ibaté.

Atualmente é coordenador do Museu de Ciência Mário Tolentino.

“Boa tarde. Gostaria de fazer dois agradecimentos muito espe-ciais. Um à professora Yvonne que me deu a chance de escutar tudo isso. Não de participar como palestrante, mas de escutar. Como é gratificante vermos como as pessoas ainda pensam da mesma forma que pensamos. E segundo, agradecer ao Valter pela acolhida tão ge-nerosa que nos fez.

Valter, você falou uma coisa no começo que me toca muito. Você falava que quando chega uma sala a gente se excita, e é verdade. Quando chega uma sala visitando o CDCC ou o Museu da Ciência, de fato ficamos excitados, porque isso faz parte da nossa vocação.

Acho que aqui a maioria trabalha com museus ou é professor. E tanto em uma como a outra a gente tem duas vocações que não po-dem ser dissociadas. Primeiro temos que amar o que fazemos, e de fato amamos, porque se não, não faríamos isso. E quem é professor também ama, porque se não estaria longe, não é Adilson?

E a segunda é ser louco, porque é impossível uma pessoa em ple-na consciência fazer tudo o que a gente quer fazer. Quando você perguntava se a sociedade vê com bons olhos isso e está pronta, não sei.... Talvez até não. Mas se não fizermos agora, as próximas gera-

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ções vão ser da mesma forma, então fazemos o trabalho de formiga, começando agora, plantando nessas crianças para que possam de aqui a alguns anos transformar essa realidade. Alguma hora tem que mudar isso.

Gostaria também de falar um pouco do Museu da Ciência, por-que ele é o primo mais novo de tudo isso. O Museu da Ciência está há quatro quarteirões daqui, para quem não conhece, uma área mui-to grande, de 2.200 metros quadrados, é um órgão público ligado à Secretaria Municipal de Educação, e nós recebemos as pessoas sem cobrar nada. Temos apenas 4 anos.

Há muitas coisas interessantes no Museu da Ciências, apesar de ter 4 anos, já recebemos quase 130 mil pessoas. Hoje a média é de 120 pessoas por dia, é bastante, considerando o que a gente vê. Eu diria que 60% das visitas são espontâneas, não de escolas ou agenda-do, e isso fala muito.

Na verdade, deveria ser o inverso, estamos pronto e somos muito preparados. No nosso caso, por exemplo, todos os nossos educado-res são professores. São pessoas que estão acostumadas a lidar com salas de aula, preparados para receber pessoas de universidades, for-mandos, doutores, mas também crianças de 4 e 5 anos, que na ver-dade são os visitantes que mais temos visto surtir efeito. São essas crianças que entram com uma ânsia tão grande no museu e saem de lá de olhos brilhantes. Acho que é isso que faz a verdadeira diferença.

Alguns não conhecem a importância de museus e não vão conhe-cer. Outros vão ver a importância e vão poder mudar a vida de fato escolhendo a profissão, mudando o rumo da sua vida.

Me lembro, e isso sempre me marca, de uma vez que um senhor de 60 anos de idade, pedreiro, entrou no museu. Para a contextuali-zação, faço um parêntese e falo de nossas exposições permanentes.

Uma com 150 experimentos de física, onde as pessoas podem aprender um pouco de física de forma interativa. Outra, uma expo-sição de paleontologia, parceria com a UFSCar, que já é referência nacional, e outra de acessibilidade onde ensinamos ótica para defi-cientes visuais, em parceria com a USP. Na verdade, o Museu vive de parcerias, com todos.

No museu prezamos três vertentes: primeiro, mostrar o que nor-

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malmente não seria visto de ciência e tecnologia; segundo, desmis-tificar a ciência, porque as pessoas acham que é difícil fazer ciência, ‘física é para louco’, mas hoje mostramos um pouco aqui, o CDCC faz muito isso também, o que é física no dia a dia, que vivenciamos física sem perceber; e o terceiro, como a Kátia falava, formação de professores, nossa obrigação enquanto entidades e museus é a de ajudar a formar o professor.

O professor sai despreparado para ensinar ciência, ele não sabe o potencial que tem nas mãos quando tem um museu, zoológico, Museu da Língua Portuguesa... Ele não tem esse preparo. Não estou falando mal não, porque eu também sou professor, estou falando da realidade. Temos obrigação de ajudar a formar o professor.

Voltando, aquele senhor, um pedreiro de 60 anos, esteve na expo-sição de física e começou a usar um experimento de polias, que tira o peso dos objetos, apresentado a El pela Educadora. No fim da apre-sentação ele falou ‘nossa, mas eu não posso usar isso para levar a lata de massa para cima do telhado quando eu construo alguma coisa?’. Ele tinha 60 anos e aprendeu. A gente vê que o museu, além de estar propiciando a mudança de vida à algumas crianças, está ensinando também as pessoas de mais idade.

É importante atentar para que mesmo que achemos que nosso trabalho não vai surtir efeito nenhum, acaba surtindo. Há um problema sério entre nós: às vezes trabalhamos sozinhos. Deveríamos trabalhar mais unido pensando nos benefícios que isso traria para todos. O CDCC é um parceiro fantástico, a Universidade Federal e a USP também. Nós não temos problemas, mas acho que se nos uníssemos mais teríamos muito mais força, a voz seria muito maior.

Uma outra situação que preciso colocar, porque nosso tema era mais ou menos isso, é a interação com escolas e centros não formais. Como somos um órgão ligado à Secretaria de Educação, somos con-siderados até uma unidade educacional dentro do município, e so-fremos constantemente com a falta de verba.

A verba advinda do município praticamente não existe. Passamos o ano inteiro quase sem receber uma visita de escolas municipais por conta de contenção de gastos. Tínhamos uma parceria muito bacana com o FDE, mas há dois anos eles deixaram de financiar as visitas das escolas do estado aos museus de forma geral. Há dois anos que

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nós não temos mais isso.

Hoje temos 60% ou 70% de visitas não agendadas por causa disso. Os órgãos públicos, municipais, estaduais e federais estão tirando bastante verba desta vertente e isso afeta bastante a visitação. Quem perde não são os museus, quem perde são as pessoas, as escolas. É muito triste ter todo esse aparelhamento, e friso que fiquei muito triste agora em saber, que a equipe do Museu da Língua portuguesa pode ser dispensada porque está em reforma. Não podemos ver isso acontecer porque quem perde de fato não somos nós enquanto mu-seus, quem perde é a população.

Essas situações acontecem e precisamos de fato colocar nossa voz, e a melhor forma de fazer isso é buscando no potencial que temos, que é muito grande. Nós somos capazes de mudar toda uma geração porque a escola atua em um segmento importante, como professor eu sei disso, mas ela não engloba a tudo, e o restante tem que ser complementado por nós, por nossas entidades.

Acho que isso é fundamental, Professora Yvonne, obrigado nova-mente, e espero que esse seja um primeiro passo, que possamos de verdade mostrar aos governantes a importância disso, e conseguir que cada vez mais possamos levar à população o que é direito dela. Hoje, na situação tecnológica que vivemos, é inadmissível as pessoas não terem acesso a isso.

Só vendendo um pouco o peixe, a quem não conhece, o Museu da Ciência fica a quatro quarteirões daqui. Hoje, infelizmente, abrimos apenas de segunda à sexta até 18h. Esperamos uma visita. ”

Mediadora:

“Agora nós abrimos as perguntas do público para gente fazer a interação com a mesa redonda. Quem gostaria de fazer alguma ob-servação? ”

Participante Gabriela

“Daniela, quando você mostra para nós esse material apostilado, muito fechado, e o tema é a educação não formal e as escolas, como esse material permite ao educador a possibilidade de inserir esses espaços? Porque é muito fechado, para mim é um desafio, eu sou totalmente contra, eu acho que o educador perde autonomia e para

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tentar diversificar, levar o aluno já tem toda essa questão orçamentá-ria que barra e ainda tem um material que é super reducionista que fecha essas possibilidades.

Acho que me chamou muito a atenção e uma das coisas que vol-tam ao tema da mesa redonda para gente entender como se dá essa possibilidade, sendo que o professor tem um material até com as orientações de como ele deve fazer as coisas. Eu já dei uma folheada nesse material e é ‘você vai fazer assim, é desse jeito’, como articular essas coisas? ”

Profa. Daniela

“Gabriela, a intenção de colocar a foto do material era justamente uma provocação, porque esse material é bastante polêmico, é bas-tante discutido e questionado desde sempre. Só que, como eu disse, ele é um material de apoio, os professores não são obrigados a utili-zar esse material. Há outros materiais que podem ser utilizados, esse é uma operacionalização, é uma das alternativas para a execução do currículo, o currículo é oficial, ele está posto, tem os seus problemas que constantemente são discutidos e tudo o mais.

Essa é uma situação. Existe um currículo, tem toda uma defesa e um contraditório por trás desse currículo, mas esse currículo tem que acontecer já que nós falamos em uma rede tão gigante quanto é a rede do estado de São Paulo em número de escolas e alunos etc., além de ser um movimento nacional, a questão da base nacional co-mum que está sendo discutida, que está em vias de fato e tudo o mais. Então esse currículo existe.

O material de apoio aos currículos que são os cadernos, ou as apostilas como eu disse, que é o apelido dele por aí, é uma das pos-sibilidades desse currículo acontecer em sala de aula. O professor pode usar outro material? Pode. E esse item que coloquei a respei-to das visitas aos espaços está dentro do currículo, é uma sugestão, orientação do currículo, que outros espaços sejam utilizados, assim como os sites.

Vamos imaginar um tema qualquer da área de ciências, no ca-derno de orientação do professor, ele não tem uma camisa de forças, mas possibilidades de como tratar aquele tema em sala de aula com o seu aluno, que pode ser através daquele material que é distribuído

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como pode ser utilizando, citando alguns exemplos, um filme, ou música, ou museu e outras coisas. “

Então não são excludentes, o fato de existir um material didatica-mente organizado, em uma sequência, e tudo o mais, não exclui as outras possibilidades do professor, muito pelo contrário. Está pos-to em um material que é para o professor utilizar outros espaços e outros materiais, até porque se não, não teríamos esse número que apresentei para vocês, que é representativo, não é nem a totalidade da nossa DE, nós não teríamos tantos alunos indo para tantos luga-res, se esse material não possibilitasse isso. Não sei se respondi sua questão...”

Gabriela:

“Esse discurso, que você acabou de falar, é corrente. Mas acho que um material, para ser opcional, é muito caro. ”

Participante Marcos:

“Boa tarde, meu nome é Marcos, sou professor da UFSCar. E eu queria falar duas coisas rápidas aqui, vou tentar ser o mais rápido possível.

A primeira é que eu presenciei alguns momentos quando o pú-blico se manifestou, são muito interessantes esses momentos porque as pessoas mostram que elas têm postura, tem questionamentos a serem feitos, enquanto a academia costuma organizar os eventos de uma forma às vezes não muito participativa. Em geral ela estabelece os discursos, as falas, são muito auto defensivas, porque elas tentam se fundamentar mostrar que elas são importantes.

Nós estamos ainda nessa etapa de fazer um discurso de mostrar para as pessoas que nós somos importantes, eu acho que a gente pre-cisa passar para uma outra etapa porque se não, ficamos falando com nós mesmos. Talvez se a gente estivesse falando com a sociedade di-retamente seria diferente, mas a gente está falando entre a gente.

A segunda questão que eu queria colocar é a seguinte. São Carlos é uma cidade, eu estou aqui há 10 anos, que tem muitas peculiari-dades em relação a divulgação científica e ao ensino de ciências por conta das instituições, inclusive dos acervos, dos centros, das fazen-das, museus, várias coisas. Eu acho que, como o professor Paulo co-

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locou, nos últimos anos, particularmente nos últimos quatro anos, a coisa se degringolou, porque nos outros 6 anos que eu estava aqui, o trabalho que a prefeitura e as instituições estavam fazendo eram no sentido e naquela direção, que eu acho que seria muito importante nós discutirmos, que é a tal da cidade educadora.

Se tem uma cidade que tem esse potencial de ser uma cidade edu-cadora em ciência e tecnologia no Brasil, eu diria que é São Carlos. E isso ainda não aconteceu, pelo menos no período que eu estou aqui. O que não significa que não existam diversas iniciativas aqui, mas eu acho que elas precisam ser mais discutidas, e como diz o Paulo aqui do Museu Mario Tolentino, mais articuladas entre si.

Nós fizemos um projeto, há uns 3 ou 4 anos atrás, que nós roda-mos pelas escolas. São Carlos tem as escolas do futuro que foram implantadas, que tem bibliotecas em cada uma. Nós fomos em todos esses espaços atendemos crianças de 3 a 7 anos, 3 mil crianças no final, com um projeto que foi financiado pelo CNPq e não custou nem 100 mil reais incluindo a compra de materiais, o transporte das crianças, dos materiais. Tudo isso não custou 100 mil reais.

Então eu acho que nós estamos sim em uma época de escassez financeira, mas o problema é político, ideológico.... De falta de ação da sociedade, vamos dizer assim. Embora a gente tem visto, como vemos aqui e em outros lugares, uma resistência, as pessoas se po-sicionam, não ficam simplesmente quietas, mas isso não tem sido suficiente.

Isso é em uma escala, não só aqui, por exemplo, a Estação Ciên-cia em São Paulo, que representa para São Paulo o que o CDCC re-presenta para São Carlos, foi completamente desmantelada, é um centro histórico na área de divulgação cientifica desde 1987, eu fui na inauguração da Estação Ciência em 1987, e ela foi desmantelada.

Nós temos outros espaços, o Museu do Ipiranga está fechado, o Paulo falou aí do museu que passou o ano sem verba. Esse museu foi instalado por uma administração e a outra administração não deu continuidade ao processo, a gente sente isso. Então ainda tem muita coisa para se fazer aqui em São Carlos, e já se faz bastante coisa, mas eu acho que ainda falta muito.

A gente vai na periferia, tem projetos nas escolas, e a periferia ainda está distante dessas atividades que a cidade oferece. O próprio

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festival Contato que a universidade faz, que é uma coisa fantástica, mas vai lá e vê o público. Eu vou em todos esses lugares quando tem, o povo de São Carlos está longe dessas atividades no geral. Tem algu-mas exceções, mas no geral ainda as atividades são para uma classe média. ”

Participante Pietra:

“Boa tarte, eu sou a Pietra, sou educadora chefe no Museu da Ciência, vou complementar uma coisa que o Paulo falou e o Marcos comentou, dessa questão de você conseguir trazer o público para o seu museu.

Nós tivemos, em parceria com a Ciência Web, a Dona Yvonne, a Thais, no ano passado inteiro, o ciclo de palestras, ‘ciências e riqueza social’, nós chamamos pessoas de renome, cientistas, para falar para a população em geral dos que eles faziam na universidade que tinha a ver com o cotidiano, porque esse é um dos grandes pilares nosso do museu, a ciência no cotidiano, e mostrar que a ciência não é um bicho de sete cabeças.

Fizemos uma divulgação enorme, a Thais que o diga. Muito nas redes sociais e quanto ao público, tivemos que entrar em contato com escolas, chamar salas de EJA, de educação de jovens e adultos, para que a gente pudesse garantir o mínimo de público para assistir as palestrar, porque assim, tinha dias que apareciam 5 pessoas.

Às vezes eu fico pensando, nós como espaços não formais. Nós sozinhos somos poucos, os recursos são poucos, e nós precisamos realmente de políticas públicas, a gente precisa muito de apoios dos governantes, das universidades que são gigantes perto da gente e é por isso que a gente faz tantas parcerias com USP e UFSCar.

Uma das coisas que eu também sou representante da região cen-tral do SISEM, que é o Sistema de Museus da Secretaria da Cultura do Estado, e o que a gente faz? A gente articula todos os museus da nossa região central aqui. A gente fez um chamamento para uma palestra do educativo do Museu do Futebol, porque o educativo do Museu do Futebol é um brilho nos olhos dos educativos que existem. Foram dois lugares que falaram de interesse, e um deles foi a gente do Museu da Ciência.

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Então você abre a possibilidade de ter na cidade uma palestra su-perinteressante, que você vai chamar público para ir no seu espaço, e de repente ninguém aparece. As pessoas não estão abertas, e aí vai também da motivação. Por isso quando a gente ouve a Tânia falar é até gostoso, porque a empolgação dela é algo gostoso de ouvir. Quem dera que todo mundo que está acima da gente também fosse desse jeito. Então eu não sei, eu fico me perguntando ‘o que a gente faz?’. ”

Prof. Adilson:

“Eu queria comentar um pouco sobre essas falas. Até sobre a pro-vocação inicial do Valter sobre essa questão. Uma coisa que nós pre-cisamos prestar muita atenção é qual é o público que nós estamos lidando?

A geração que vem hoje é uma geração que vem com ponto de vista muito diferente. O Valter mesmo lembrou, como eu, não havia espaço de divulgação cientifica que motivava a gente, por exemplo, a fazer física. Mas onde eu fui encontrar a minha motivação para fazer física? Eu fui encontrar na mídia.

Eu tinha 10 ou 12 anos de idade e tinha o programa do Cosmos na televisão, passava na Rede Globo, sábado e domingo de manhã, em um horário ótimo para assistir, não era às 5h da manhã, igual quando se fala tem Globo Ciência e passa às 4h da manhã, onde que isso vai atingir o público, não é verdade?

Hoje nós temos uma juventude que vem muito diferente do que nós fomos, certo? A gente tem uma dificuldade principalmente da linguagem, o que a gente fala para essa pessoa se interessar? Então isso é um desafio, fazer com que as pessoas se interessarem pela ciên-cia, elas tem um monte de outras coisas que talvez sejam muito mais interessante do que ciência. O grande desafio é a gente tentar mos-trar que ciência pode ser uma coisa legal, a ciência pode ser uma coisa fascinante.

Nessa semana mesmo, eu li na Folha de São Paulo a matéria onde a professora Helena Nader fazia uma crítica sobre a questão da PEC 241 que está sendo aprovada e se continuar do jeito que está, vai congelar a verba da ciência brasileira em um patamar extremamente baixo o que significa que nós vamos ter um enorme retrocesso.

Não é nenhum problema com a notícia, mas sim os comentários

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que apareciam no site, uma pessoa escreveu ‘mas o que a ciência brasileira fez de relevante nos últimos 10 anos? Por que eu vou gastar dinheiro com a ciência, o que a ciência fez de relevante nos últimos 10 anos?’. É o leitor comum, do site da Folha que tem acesso à inter-net, se interessou pela notícia e coloca um comentário como esse. Quando eu vi esse comentário eu fiquei preocupado, falei ‘realmente estamos em perigo’, porque a gente precisa de alguma forma de al-guma maneira, fazer com que esse conhecimento se transforme em uma coisa que as pessoas achem interessante.

Vou dar um outro exemplo para vocês. Na década de 90 os Es-tados Unidos estavam construindo o maior acelerador de partícula do mundo que competir com LHC, até aquele momento os Estados Unidos eram o líder mundial em pesquisa de física de partículas. Os Estados Unidos gastaram dois bilhões de dólares cavando um buraco para fazer o acelerador de partículas. Chegou o Congresso americano e ‘por que eu vou montar um equipamento que vai custar bilhões de dólares para saber a origem do universo? O que eu ganho com isso? Ah, corta esse projeto’. Desde aquele momento os Estados Unidos perderam a liderança mundial na física de partículas em re-lação ao CERN na Europa.

Foi naquele momento que caiu a ficha de muito cientista ameri-cano falando em não se conseguir traduzir para a população que é importante isso. O político é movido em função da vontade popular, o povo que coloca ele lá, se aquilo não virar uma pauta importan-te a ciência para. Por isso em todo o projeto aprovado na National Science Foundation dos Estados Unidos o pesquisador tem um com-prometimento de fazer divulgação cientifica, porque não adianta re-ceber 10 bilhões de dólares para fazer projeto se as pessoas daqui a pouco vão falar, mas para que serve esse projeto.

Então há uma necessidade de a academia se comprometer a fazer isso. Como o Valter falou no começo, quando começou esse projeto do CDCC, quando eu estava lá trabalhando no Observatório, fala-vam ‘nossa, você está perdendo tempo fazendo divulgação científica, você pode publicar mais dois ou três artigos’. Isso não é importante, o problema é que se a gente só pensar em publicar os artigos, daqui a pouco ninguém mais vai nos pagar para publicar artigos, porque a população vai questionar, como fez o leitor do jornal da Folha ‘o que a ciência brasileira fez relevante nos últimos 10 anos?’.

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Nesse papel, os espaços não formais são um desafio para levar essa informação. Vamos pegar o exemplo da NASA, Agência Espa-cial Americana. Eles são as pessoas que conseguem fazer o maior estardalhaço por qualquer coisa. Vocês lembram há uns anos atrás que foi achado um meteorito na Antártida que tinha duas ou três bactérias no meteorito e aí era ‘ah, provamos a existência de vida extraterrestre’. Fizeram um carnaval e não era nada, as bactérias que estavam no meteorito eram daqui da Terra mesmo.

A sonda Juno que chegou agora em Júpiter, o vídeo que eles lan-çaram no dia 4 de julho quando ela chegou, foi um vídeo que eles encomendaram para um diretor de cinema de Hollywood. O vídeo parecia aqueles trailers de filmes de ficção científica de ponta, tipo Star Trek, Star Wars, até com aquela expressão ‘e agora, a sonda vai conseguir parar e fechar?’. Você assiste um vídeo daquele e fica entu-siasmado, ou seja, é buscar um espaço de uma linguagem para fazer isso.

Quando falamos das redes sociais, por exemplo, é um espaço muito rico para a gente fazer divulgação científica. Ali é um espaço que a gente tem que estar presente, temos que estar no facebook, no twitter, porque é lá que essas pessoas se encontram.

Quando a gente fez o projeto das viagens da Laura, Verdades In-ventadas, foi impressionante a quantidade e-mails e posts que rece-bemos do Brasil todo, porque a hashtag ‘viagens da Laura’ começou a subir em Twitter, Facebook etc., isso é algo exponencial na web. Um post replicado por outro cai lá nos seus duzentos amigos e assim vai embora.

A gente tem que ter algumas estratégias, tem que conciliar a co-municação. Eu acho que isso falta um pouco na área da divulgação científica, a gente se conciliar um pouco com as próprias estratégias de comunicação.

Acho que espaços não formais, museus de ciências etc. são luga-res para despertar a curiosidade. Toda a vez que um dos projetos que temos financiados pela Fapesp o parecerista falava ‘como você con-segue medir a eficiência do seu projeto? Qual o resultado objetivo? Eu não quero o número de visitantes’. Tem muitas metodologias que se trabalha para isto, mas o Museu Cosmocaixa de Barcelona fala ‘o que paga é o brilho nos olhos’. Como o professor Paulo aqui falou, o pedreiro que você falou que descobriu que com roldanas ele faz me-nos força para levantar um objeto é aí que está o grande resultado: aquela hora que dá o brilho nos olhos e isso é imensurável.

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Há duas semanas atrás a UNESCO publicou um estudo em que existe atualmente no mundo 200 milhões de crianças em idade es-colar fora da escola. Duzentos milhões é a população do Brasil. Es-tamos no século XXI, nós mandamos sonda para Marte, fazemos coisas com átomos e tem gente que não consegue ser alfabetizada no mundo. E outro dado importante, faltam 50 milhões de professores no mundo, e principalmente professores de ensino de ciências, do ensino médio, esse é o que mais faz falta.

Para falar em termos de uma política pública que consiga abran-ger tudo, a gente tem que colocar isso em uma agenda do país que envolva todos os níveis. A formação do professor, o fortalecimento desses espaços, trazer a ciência de uma maneira mais interessante, para que isso avance.

Em maio desse ano eu participei de uma reunião na USP em São Paulo que estava o ministro da ciência, tecnologia, inovação e co-municação, o Kassab. Lá na mesa redonda que a gente participou eu cobrei justamente sobre essa questão da divulgação cientifica, pois, o Ministério dele tem uma Secretaria específica para isso. Essa Secre-taria está sem dinheiro nenhum, dado que não teve edital nenhum esse ano. E o que ele me respondeu: ‘não, agora essa união que nós fazemos com a comunicação vai potencializar a divulgação científi-ca, agora tem a comunicação aqui junto etc.’. Vocês viram que poten-cializou mesmo a divulgação cientifica, né? Então isso acaba sendo exatamente um problema das próprias políticas públicas que estão sendo colocadas aqui no Brasil, a gente precisa realmente avançar isso, e isso tem que partir de nós.

Nós temos que colocar, protestar e levar essas demandas para fa-zer isso, porque senão a ciência vai ficar cada vez menos interessante para as pessoas, você não terá mais alunos, e sem gente interessada em ciência não tem desenvolvimento do Brasil. Sem cientistas, sem engenheiros, sem educadores, você não faz essa nação desenvolver. Qualquer projeto de desenvolvimento que esqueça disso, do cientis-ta, do educador, e das pessoas que trabalham com a tecnologia é um projeto de país que não vai dar certo. ”

Mediadora:

“Eu agradeço a participação de todo mundo. Vou passar agora para a senhora, professora, para fazer o encerramento do evento. ”

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Profa. Yvonne

“Uma coisa que o Adilson mencionou, e que é notória inclusive, é a falta de professores. Na área científica mais do que nas outras, e o que isso mostra? Mostra o que nós temos que fazer - ou deveríamos - em vez de usar um regime em que nós temos escolas iguais para todos, nós deveríamos ter escolas em que o ensino de ciências fosse priorizado com alunos selecionados de acordo com seu desempe-nho.

São as famosas escolas americanas de High School, que eles cha-mam de Science High School, e que são muito valorizadas inclusive pela população. A população americana pelo menos tem consciên-cia de que a elite intelectual, cultural e tecnológica é responsável pela evolução no mundo cientifico e tecnológico que garante a lideran-ça econômica mundial do país. Nós precisamos não deixar perder aquelas crianças e jovens que sem dúvida existem em nossa popu-lação, mas que não tem chance de ter um ensino bom mesmo. Eles entram em uma escola em que todos têm que aprender as mesmas coisas.

Então isso parece uma coisa muito democrática, mas é uma coisa muito ruim para o país, não existe todo mundo com vocação para ciência. Dentro da sua família, da nossa família, você olha as pessoas e elas são diferentes. Tem uma que quer fazer Artes Cênicas, eu não sou contra, acho que precisa ter gente que quer fazer artes cênicas e de repente tem um que quer fazer física, tem um que quer fazer engenharia, tem um que fica louco por computação e informática, então não podemos fazer essas escolas iguais para todos, isso é fora de dúvida. Nós temos que privilegiar em cada município pelo menos uma Science High School, com os melhores professores que nós pu-dermos encontrar. Esses professores estão nos cursinhos, em escolas particulares porque ganham um pouco mais, ensinando apenas para passar em exame vestibular e não realmente educando para desper-tar as vocações.

Nosso sistema peca por não se preocupar em não garimpar as vo-cações, seja ela para o que for, e dirigi-las de uma maneira razoável, de modo que elas possam produzir tão cedo quanto possível. É mui-to triste ver alunos, que passam no vestibular e lá pelo meio do curso vêm que não é isso que querem, eles deveriam ter pensado nisso lá no curso de segundo grau.

Se ele entrar em um Science High School e ele perceber que não é o que ele quer ele muda sem grande prejuízo, nem para vida dele, nem

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desperdiçando um grande custo econômico para a educação, por-que educação custa caro. Não tem numa torneira que solta dinheiro para a educação, tudo é limitado. O uso razoável dos recursos finan-ceiros que vão ser usados na educação tem que visar e priorizar as vocações dos jovens e não simplesmente dar uma escola que parece que é igual para todos e é, de fato, em geral ruim para todos.

A minha opinião, e o que gostaria de lembrar, é que esses espa-ços de educação informal que nós temos e que parece que serem tão limitados, que tem tão pouco resultado, na realidade servem para fazer essa garimpagem, alguns jovens de repente percebem que gostam de ciência e se envolvem. Eu me lembro do professor Mario Tolentino, que não tinha apoio governamental nem nada, mas era um ótimo professor e com boa situação econômica, quando ele dava aula no Álvaro Guião, ou no Colégio Diocesano, ele tinha no porão da sua casa um clube de ciências. Ele pegava todos os alunos e co-locava no clube de ciências? Absolutamente não. Ele pegava aqueles alunos que mostravam interesse, que mostravam desejo e com esses alunos ele fazia pesquisas arqueológicas, experimentos químicos.

Gerou-se muita gente que foi motivada naquela época, que foi despertada pelo Mario Tolentino com uma atividade interessante e criativa. Então, não é ser antidemocrático, é ser muito democrático, porque você não vai pegar uma pessoa que tem muito jeito para jo-gar futebol e querer que ele jogue tênis.

Entre os alunos, tem uns que tem muito jeito para ciências e tem outros que não tem. Não sei se isso é genético, se isso é ambiental, se é o genótipo ou se é fenótipo, sem dúvida é de todas essas coi-sas juntas, mas que nós temos que fazer essa garimpagem dos que são vocacionados para ciências. Eles são tão bons quanto os outros e dirigi-los de uma maneira preferencial, oferecendo o ensino de pri-meira qualidade, como tem em Nova York, como tem em muitas cidades americanas aumenta muito a chance de formarmos recursos humanos para as áreas de ciência, tecnologia engenharia e matemá-tica essenciais para o desenvolvimento econômico do pais.

Obrigada, e quero mais uma vez, já que é para encerrar, agradecer muito a participação de todos. Tenho certeza que essas discussões vão ficar lá fundo da cabeça de cada um e, quem sabe, quando nós tivermos novas ocasiões de nos manifestarmos, que nos manifeste-mos a favor da educação, a favor da ciência. ”