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ESTADO DE MINAS D O M I N G O , 3 1 D E M A I O D E 2 0 1 5 13 INT ERNACIONAL E-MAIL: [email protected] TELEFONE: (31) 3263-5575 MAIS RECENTE PAÍS A DESCRIMINALIZAR A MACONHA, A ILHA DO CARIBE SE ADAPTA A NOVA REALIDADE, MAS ERVA AINDA SEGUE MARGINAL E É VENDIDA COM PREÇOS BEM DISTINTOS PARA LOCAIS E TURISTAS DANIEL CAMARGOS ingston, Montego Bay e Nine Mile (Jamaica) – Uma turista belga demons- tra dificuldade em acender um graúdo ci- garro de maconha. Faz um túnel com as mãos para evitar o vento, mas desiste e pede ajuda a outro compatriota mais jo- vem que integra o grupo. Com uma traga- da forte, o jovem carbura o baseado e a se- nhora – que aparenta ser uma singela avó de família – inala a fumaça da erva, cha- mada pelos jamaicanos de ganja. O basea- do na mão dela é apenas um entre os vá- rios acesos no mausoléu de Bob Marley, na vila de Nine Mile, no condado de Sant Ann, um dos 14 do país caribenho. Para quem sai de Montego Bay, o paraíso turís- tico do país, o acesso ao mausoléu da len- da do reggae inclui uma estrada estreitís- sima e sinuosa. A única forma de o moto- rista avisar a existência para um possível carro que surge após a curva na direção contrária é buzinar freneticamente. A tensão provocada no caminho cami- case talvez ajude a entender o mercado frenético de maconha na porta do mauso- léu, pois, depois do sufoco, muitos querem apenas relaxar e desanuviar a mente. Mas outras razões não faltam. Os turistas estão na Jamaica, terra do reggae, dos rastafáris, do maior exportador de maconha para os Estados Unidos e onde a ganja é assunto presente entre a população, que discorre sobre os diferentes tipos, sabores e textu- ras. É como um mineiro de Salinas que fa- la dos aromas da cachaça ou um francês de Bordeaux filosofa sobre o retrogosto do vi- nho. Mas o mais importante: desde o iní- cio do mês passado a erva foi descrimina- lizada. Cada jamaicano pode portar 57 gra- mas e plantar até cinco pés da erva. O que aconteceu na Jamaica é diferente do que ocorre no Uruguai. Durante o go- verno do ex-presidente José Mujica, nossos vizinhos foram os primeiros do mundo a legalizar a droga. Lá, qualquer cidadão pode plantar e usar. Se preferir, pode comprar de um mercado regulado – e taxado – pelo go- verno. Vários outros países já descrimina- lizaram a maconha, mas o que distingue a Jamaica é a quantidade permitida: 57 gra- mas ante a 5 gramas na Holanda, 8 gramas no Peru ou 20 gramas na Colômbia, por exemplo (veja mapa na página 14). A montanhosa região de Nine Mile, on- de Bob Marley nasceu, é uma das princi- pais produtoras de ganja. Os pés de maco- nha são plantados entre outras culturas pa- ra escapar das patrulhas aéreas. “Se eles não fiscalizavam para valer antes, com a nova lei vão fiscalizar menos ainda”, diz um dos motoristas que aguarda um grupo de tu- ristas na porta do mausoléu de Marley. A descriminalização não permite a venda e nem a produção em larga escala, sendo to- lerado apenas para o consumo próprio. Na estrada sinuosa em frente ao mau- soléu, os vendedores oferecem cigarros enrolados. Começam pedindo US$ 20 por unidade. Se o cliente acha caro, a negocia- ção é aberta e um cigarro pode ser vendido até por US$ 5. Vale destacar que o valor é uma cotação turística para a erva. No mer- cado real, de jamaicano para jamaicano, os preços são bem menos inflados. Na periferia de Kingston, a capital do país, a reportagem do Estado de Minas presencia a compra de um pacote de ma- conha por US$ 5. A quantidade é suficien- te para enrolar cerca de oito cigarros ge- nerosos como os vendidos em Nine Mile. O local fica próximo ao gueto de River View e sem a ajuda de um jamaicano é praticamente impossível para um turis- ta chegar ao ponto. Os tipos mais comuns da maconha ja- maicana são white ice, kush, purle skunk, mangonani (com leve cheiro de manga) e sensimilla, esta última a preferida de Bob Marley. A ganja é vendida da forma que é colhida, com a erva no galho e sem aditi- vos químicos comuns na maconha vendi- da no Brasil – a maior parte de procedên- cia do Paraguai. POBREZA E VIOLÊNCIA Kingston tem qua- se 1 milhão de habitantes, mais de um ter- ço dos 2,8 milhões de moradores do país. A cidade não é um ponto turístico. Longe disso. Há quatro anos, foi tomada por uma onda de violência que deixou mais de 30 mortos em confrontos entre traficantes e policiais. O aeroporto da capital chegou a ser fechado. Nas ruas do Centro da cidade, o taxista aponta para uma parede ainda marcada por crivos de bala. O Centro é próximo de Trenchtown, a fa- vela onde Bob Marley cresceu. No gueto, quem desembarca do carro com máquina fotográfica a tiracolo é rapidamente abor- dado por alguém pedindo uma gorjeta. A nota de US$ 1 é a senha para que um senhor com cabelo rastafári sorria para a lente. Trenchtown é citada por Marley nas clássicas Trenchtown rock e No woman no cry. Era lá que havia um terreno onde ele costumava se sentar observando os hipó- critas misturados com as boas pessoas, co- mo cantou no trecho de sua canção mais famosa:“Say I remember when we used to sit / In a government yard in Trenchtown / Observing the hypocrites / As they would mingle with the good people we meet”. Hipocrisia, aliás, é uma boa palavra pa- ra explicar por que a maconha era crimi- nalizada na Jamaica baseada em uma lei de 1948. A erva é considerada sagrada para o movimento religioso rastafári, surgido na ilha do Caribe na década de 1920. Os ras- tas vivem uma vida quase pastoril, longe da febre capitalista. Não cortam o cabelo e fazem o penteado que recebeu o nome do movimento, evitam aparar a barba, se- guem uma dieta vegetariana e não usam drogas (a ganja não é um narcótico para eles, é claro!) e adoram Jah, deus que teria reencarnado no imperador etíope Haile Selassie I (1892-1975). CENTRO DE EXCELÊNCIA Após a descrimi- nalização, os planos jamaicanos são ambi- ciosos. O Ministério da Justiça revelou, em comunicado oficial, que a descriminaliza- ção abre caminho para a criação de uma in- dústria legítima de maconha medicinal, com oportunidades e benefícios econômi- cos significativos. Em novembro, o país se- diará pela primeira vez a Copa da Maconha (Cannabis Cup), um torneio para eleger as melhores cepas das plantas. Será realizado em Negril, no litoral Oeste da ilha. “Se a Jamaica quer se posicionar como um centro de excelência para a pesquisa da ganja, o país deve ser o lugar de pesqui- sa e desenvolvimento da ganja”, já decla- rou o ministro de Ciência, Tecnologia, Energia e Mineração, Phillip Paulwell. Uma das maiores universidades do país, a University of the West Indies (UWI) conse- guiu licença para plantar maconha e criou um grupo para o estudo da erva, o Cannabis Research Institute. O propósito inicial é identificar os diferentes tipos da planta e co- mo eles interagem com o corpo humano, além dos produtos derivados da Cannabis. “O trabalho do instituto vai ter também um impacto econômico direto nos pequenos fa- zendeiros da Jamaica, pois alguns serão con- tratados para produzir plantas de maconha para as pesquisas”, informa o diretor de co- municação da UWI, Carroll Edwards. PACOTEIRA 57 gramas É a quantidade de maconha permitida pela nova legislação jamaicana, a maior entre todos os países que já descriminalizaram a erva Se a Jamaica quer se posicionar como um centro de excelência para a pesquisa da ganja, o país deve ser o lugar de pesquisa e desenvolvimento da ganja’’ Phillip Paulwell, ministro de Ciência, Tecnologia, Energia e Mineração da Jamaica Um rastafári fuma um cigarro de maconha, na perfieria de Kingston. Para a religião rasta, a ganja, como eles se referem à erva, é sagrada Um pacote é vendido nas ruas da capital jamaicana por US$ 5, equivalente a R$ 16 FOTOS: DANIEL CAMARGOS/EM/D.A. PRESS

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INTERNACIONAL E - M A I L : i n t e r n a c i o n a l . e m @ u a i . c o m . b r

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MAIS RECENTE PAÍS A DESCRIMINALIZAR A MACONHA, A ILHA DO CARIBE SE ADAPTA A NOVA REALIDADE,

MAS ERVA AINDA SEGUE MARGINAL E É VENDIDA COM PREÇOS BEM DISTINTOS PARA LOCAIS E TURISTAS

DANIEL CAMARGOS

ingston, Montego Bay e Nine Mile(Jamaica) – Uma turista belga demons-tra dificuldade em acender um graúdo ci-garro de maconha. Faz um túnel com asmãos para evitar o vento, mas desiste epede ajuda a outro compatriota mais jo-vem que integra o grupo. Com uma traga-da forte, o jovem carbura o baseado e a se-nhora – que aparenta ser uma singela avóde família – inala a fumaça da erva, cha-mada pelos jamaicanos de ganja. O basea-do na mão dela é apenas um entre os vá-rios acesos no mausoléu de Bob Marley,na vila de Nine Mile, no condado de SantAnn, um dos 14 do país caribenho. Paraquem sai de Montego Bay, o paraíso turís-tico do país, o acesso ao mausoléu da len-da do reggae inclui uma estrada estreitís-sima e sinuosa. A única forma de o moto-rista avisar a existência para um possívelcarro que surge após a curva na direçãocontrária é buzinar freneticamente.

A tensão provocada no caminho cami-case talvez ajude a entender o mercadofrenético de maconha na porta do mauso-léu, pois, depois do sufoco, muitos queremapenas relaxar e desanuviar a mente. Masoutras razões não faltam. Os turistas estãona Jamaica, terra do reggae, dos rastafáris,do maior exportador de maconha para osEstados Unidos e onde a ganja é assuntopresente entre a população, que discorresobre os diferentes tipos, sabores e textu-ras. É como um mineiro de Salinas que fa-la dos aromas da cachaça ou um francês deBordeaux filosofa sobre o retrogosto do vi-nho. Mas o mais importante: desde o iní-cio do mês passado a erva foi descrimina-lizada. Cada jamaicano pode portar 57 gra-mas e plantar até cinco pés da erva.

O que aconteceu na Jamaica é diferentedo que ocorre no Uruguai. Durante o go-verno do ex-presidente José Mujica, nossosvizinhos foram os primeiros do mundo alegalizar a droga. Lá, qualquer cidadão podeplantar e usar. Se preferir, pode comprar deum mercado regulado – e taxado – pelo go-verno. Vários outros países já descrimina-lizaram a maconha, mas o que distingue aJamaica é a quantidade permitida: 57 gra-mas ante a 5 gramas na Holanda, 8 gramasno Peru ou 20 gramas na Colômbia, porexemplo (veja mapa na página 14).

A montanhosa região de Nine Mile, on-de Bob Marley nasceu, é uma das princi-pais produtoras de ganja. Os pés de maco-

nha são plantados entre outras culturas pa-ra escapar das patrulhas aéreas. “Se eles nãofiscalizavam para valer antes, com a novalei vão fiscalizar menos ainda”, diz um dosmotoristas que aguarda um grupo de tu-ristas na porta do mausoléu de Marley. Adescriminalização não permite a venda enem a produção em larga escala, sendo to-lerado apenas para o consumo próprio.

Na estrada sinuosa em frente ao mau-soléu, os vendedores oferecem cigarrosenrolados. Começam pedindo US$ 20 porunidade. Se o cliente acha caro, a negocia-ção é aberta e um cigarro pode ser vendidoaté por US$ 5. Vale destacar que o valor éuma cotação turística para a erva. No mer-cado real, de jamaicano para jamaicano, ospreços são bem menos inflados.

Na periferia de Kingston, a capital dopaís, a reportagem do Estado de Minaspresencia a compra de um pacote de ma-conha por US$ 5. A quantidade é suficien-te para enrolar cerca de oito cigarros ge-nerosos como os vendidos em Nine Mile.O local fica próximo ao gueto de RiverView e sem a ajuda de um jamaicano épraticamente impossível para um turis-ta chegar ao ponto.

Os tipos mais comuns da maconha ja-maicana são white ice, kush, purle skunk,mangonani (com leve cheiro de manga) esensimilla, esta última a preferida de BobMarley. A ganja é vendida da forma que écolhida, com a erva no galho e sem aditi-vos químicos comuns na maconha vendi-da no Brasil – a maior parte de procedên-cia do Paraguai.

POBREZA E VIOLÊNCIA Kingston tem qua-se 1 milhão de habitantes, mais de um ter-ço dos 2,8 milhões de moradores do país.A cidade não é um ponto turístico. Longe

disso. Há quatro anos, foi tomada por umaonda de violência que deixou mais de 30mortos em confrontos entre traficantes epoliciais. O aeroporto da capital chegou aser fechado. Nas ruas do Centro da cidade,o taxista aponta para uma parede aindamarcada por crivos de bala.

O Centro é próximo de Trenchtown, a fa-vela onde Bob Marley cresceu. No gueto,quem desembarca do carro com máquinafotográfica a tiracolo é rapidamente abor-dado por alguém pedindo uma gorjeta. Anota de US$ 1 é a senha para que um senhorcom cabelo rastafári sorria para a lente.

Trenchtown é citada por Marley nasclássicas Trenchtown rock e No woman nocry. Era lá que havia um terreno onde elecostumava se sentar observando os hipó-critas misturados com as boas pessoas, co-mo cantou no trecho de sua canção maisfamosa:“Say I remember when we used tosit / In a government yard in Trenchtown /Observing the hypocrites / As they wouldmingle with the good people we meet”.

Hipocrisia, aliás, é uma boa palavra pa-ra explicar por que a maconha era crimi-nalizada na Jamaica baseada em uma leide 1948. A erva é considerada sagrada parao movimento religioso rastafári, surgidona ilha do Caribe na década de 1920. Os ras-

tas vivem uma vida quase pastoril, longeda febre capitalista. Não cortam o cabelo efazem o penteado que recebeu o nome domovimento, evitam aparar a barba, se-guem uma dieta vegetariana e não usamdrogas (a ganja não é um narcótico paraeles, é claro!) e adoram Jah, deus que teriareencarnado no imperador etíope HaileSelassie I (1892-1975).

CENTRO DE EXCELÊNCIA Após a descrimi-nalização, os planos jamaicanos são ambi-ciosos. O Ministério da Justiça revelou, emcomunicado oficial, que a descriminaliza-ção abre caminho para a criação de uma in-dústria legítima de maconha medicinal,com oportunidades e benefícios econômi-cos significativos. Em novembro, o país se-diará pela primeira vez a Copa da Maconha(Cannabis Cup), um torneio para eleger asmelhores cepas das plantas. Será realizadoem Negril, no litoral Oeste da ilha.

“Se a Jamaica quer se posicionar comoum centro de excelência para a pesquisada ganja, o país deve ser o lugar de pesqui-sa e desenvolvimento da ganja”, já decla-rou o ministro de Ciência, Tecnologia,Energia e Mineração, Phillip Paulwell.

Uma das maiores universidades do país,a University of the West Indies (UWI) conse-guiu licença para plantar maconha e criouumgrupoparaoestudodaerva,oCannabisResearch Institute. O propósito inicial éidentificarosdiferentestiposdaplantaeco-mo eles interagem com o corpo humano,além dos produtos derivados da Cannabis.“Otrabalhodoinstitutovaitertambémumimpactoeconômicodiretonospequenosfa-zendeirosdaJamaica,poisalgunsserãocon-tratados para produzir plantas de maconhapara as pesquisas”, informa o diretor de co-municação da UWI, Carroll Edwards.

PACOTEIRA

57 gramasÉ a quantidade de maconha permitida

pela nova legislação jamaicana, a maiorentre todos os países que já

descriminalizaram a erva

Se a Jamaica quer se posicionarcomo um centro de excelênciapara a pesquisa da ganja, o paísdeve ser o lugar de pesquisa edesenvolvimento da ganja’’■■ Phillip Paulwell, ministro de Ciência, Tecnologia,

Energia e Mineração da Jamaica

Um rastafári fuma umcigarro de maconha,na perfieria deKingston. Para areligião rasta, aganja, como elesse referem à erva,é sagrada

Um pacote é vendido nas ruas da capitaljamaicana por US$ 5, equivalente a R$ 16

FOTOS: DANIEL CAMARGOS/EM/D.A. PRESS

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INTERNACIONAL

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A ERVA MUNDO AFORAVEJA COMO OS PAÍSES LEGISLAM A RESPEITO DA MACONHA:

URUGUAI

Pioneiro na legalização da venda, cultivo e distribuição.Todas as etaspas são reguladas pelo Estado. A lei é dedezembro de 2013 e começou a vigorar no ano passado. Osmaiores de 18 anos podem comprar até 40g da ervavendida em farmácias, com o controle do Estado. Osuruguaios também podem plantar até seis mudas e osestabelecimentos comerciais cadastrados até 99 plantas.

ESTADOSUNIDOS

A lei federal proíbe amaconha, porém, váriosestados têm regulaçãoprópria, como Alasca,Colorado e Washington,além de Washington D.C,locais onde o uso e cultivopessoais são autorizadosmediante licença estadual.Em vários outros estados,a posse é descriminalizadae o consumo pessoal emedicinal é autorizado,mas cultivo e vendaseguem ilegais.

CANADÁ

Primeiro país apermitir legalmenteo uso para finsmedicinais. O cultivoe o consumo é legalmediante receitamédica e autorizaçãodo governo. Uso,venda e consumonão medicinal aindasão crime.

JAMAICA

Mais recente país a descriminalizar a maconha.Desde o final de fevereiro, o jamaicano podeportar até 56,7g da erva sem cometer crime eplantar até cinco pés. A erva também foi liberadapara fins religiosos pelos rastafáris.

BRASIL

A lei foi alterada em 2006, abrandando a pena para quem faz usopessoal. Apesar de não prever prisão, pode punir com advertência,serviço comunitário e até aulas sobre efeitos da droga para quem éflagrado com pequena quantidade de maconha. A venda e otransporte são considerados tráfico de drogas e a pena podechegar até a 15 anos de prisão.

ARGENTINA

O consumo de pequenas quantidades em locaisprivados é permitido, mas cultivo e venda degrandes quantidades é crime.

PERU

É permitido portar até 8g sem pena,mas cultivo e venda são proibidos.

COLÔMBIA

É permitido portar até 20g, mas o cultivo, venda etransporte de grandes quantidades segue ilegal.

HOLANDA

Após ser pioneira na venda de maconhaem coffeshops, o governo endureceu aregulamentação e limita a venda e possea apenas 5g com fiscalização rigorosa etambém impediu que turistas comprema droga, com exceção de Amsterdã.Além disso, passou a fiscalizar oslocais de cultivo, dificultando oabastecimento dos coffeeshops.

● O Projeto de Lei (PL) mais recentetratando da legalização da maconha noBrasil é o 7187, do ano passado,apresentado pelo deputado federal JeanWyllis (PSOL-RJ). O projeto foi anexado aoutro já existente, de autoria do deputadofederal Eurico Júnior (PV-RJ). O artigo 7º doPL de Wyllis prevê o plantio, o cultivo e acolheita de plantas de Cannabis destinadasao consumo pessoal ou compartilhado nodomicílio de até seis plantas maduras e seisplantas imaturas por indivíduo. Quemcolher até um máximo de 480 gramas,segundo o texto do PL, ficará isento deregistro, inspeção e fiscalização que oprojeto prevê.

● A proposição está pronta para serapreciada no plenário e prevê ainda, noartigo 8º, a possibilidade clubes decultivadores, com no máximo 45 sócios eque podem plantar até 540 plantas,sendo metade madura e outra metadeimatura e a colheita anual não poderáexceder 21,6 quilos. Na justificativa doprojeto, o deputado detalha: “Acriminalização não produz qualquerbenefício à sociedade nem sequer naquiloque implicitamente promete. Alguns,ingenuamente, ainda acreditam que asimples proibição impede que alguémfaça uso de alguma substância, mas estáprovado que isso não acontece”.

● O texto aponta que o consumo dedrogas não foi reduzido pela criminalizaçãoe que o resultado das políticasproibicionistas são crime organizado,violência, corrupção policial, mortes,criminalização de jovens, presídios lotadose drogas de má qualidade, sempagamento de impostos. O caminho,segundo justifica o deputado, é outro:“Regular o consumo é tirar o usuáriorecreativo da inútil marginalidade eestigmatização. Regular a venda e permitira esse usuário que produza o suficientepara seu próprio consumo é reduzir ainfluência do traficante e, portanto, reduzira violência, a criminalidade, amarginalidade e a morte. Este projeto dáum primeiro passo nesse sentido, queesperamos não seja o último”.

PORTUGAL

ITÁLIA

ESPANHA

SUÍÇA

O uso édescriminalizadoem pequenasquantidades,mas aindasegue ilegal.

RÚSSIA

O uso édescriminalizadoem pequenasquantidades, masainda segue ilegal.

FRANÇA

A legislaçãoé rigorosa ea posse dequalquerquantidadeé punidacom prisão.

INGLATERRA

Se uma pessoafor pega compequenaquantidade demaconha portrês vezes podeser presa.

A LEGALIZAÇÃO BRASILEIRA

APESAR DE ONIPRESENTE NO DIA A DIA DA ILHA CARIBENHA, A MACONHA DIVIDE VISITANTES ENTRE

OS QUE CONSOMEM E OS QUE A REJEITAM. AGÊNCIA JAMAICANA EVITA ASSOCIAR O PAÍS À ERVA

DANIEL CAMARGOS

Montego Bay e Nine Mile (Ja-maica) – Fora dos roteiros oficiais épossível contratar um tour por fa-zendas com plantação de maconha,que inclui degustação de diferentestipos de erva e até de cupcackes pre-parados com ganja. O passeio é feitopor motoristas e podem ter a dura-ção de até um dia. Em Montego Bay,custa US$ 200.

Dois meses após a lei da descrimina-lização, a ganja é quase onipresente naJamaica. Na área de desembarque doaeroporto de Mobay, como MontegoBay é chamada pelos moradores, oprincipal ponto de chegada dos turistasao país, ou na praça principal da cidade,a Sam Sharpe Square. Basta olhar parao lado com um jeito de quem procuraalgo que rapidamente aparece a oferta:“Marijuana? Ganja?”.

No Condado de Sant Ann, próximoa Nine Mile, na beira da estrada, um péde maconha cresce vicejante fora dequalquer propriedade privada. Nas lo-jas dos resorts luxuosos é possível en-contrar os artefatos necessários paraenrolar um baseado. São vendidos dife-rentes tipos de sedas (papel para enro-lar a erva), dichavadores (usados paratriturar a erva e facilitar a feitura do ci-garro) e isqueiros com desenhos de fo-lha de maconha.

Apesar do apelo, a Jamaica não

quer atrair fluxo de turistas aprecia-dores de Cannabis. “Essa é uma ques-tão fora de tópico, pois brasileiro as-socia maconha com pobreza e violên-cia. Nos nossos guias nem abordamosesse assunto”, garante a representan-te do Jamaica Tourist Board (JTB) noBrasil, Luciana Alonso. Anualmenteentre 3,5 mil e 4 mil brasileiros visi-tam a Jamaica e o JTB – órgão vincula-do ao Ministério do Turismo da Ja-maica – estima que esse número po-de crescer até 15% neste ano.

Porém, a descriminalização não de-ve ter nenhuma influência. “Nosso pú-blico é com maior poder aquisitivo enão tem esse interesse”, entende Lucia-na. O público-alvo do JTB são casais emlua de mel que buscam resorts luxuo-

sos nas praias de Montego Bay, Negrile Ocho Rios. “Muitas bandeiras hotelei-ras estão investindo no país e estãosurgindo outras opções, além dos re-sorts com modalidade all inclusive”,detalha Luciana.

A Holanda, que descriminalizou amaconha em 1976, passou recente-mente por alterações na regulamenta-ção. Antes permitia aos turistas a con-sumirem nos coffeshops. Com a alte-ração nas regras, em 2013, a grandemaioria dos coffeshops só permitem avenda para holandeses. Porém, comreceio do impacto da medida na eco-nomia do país, algumas cidades, entreelas a capital Amsterdã, seguiram co-mercializando a erva para turistas. Umem cada três dos 7 milhões de turistas

que visitam Amsterdã anualmentecompram maconha em algum co-ffeeshop da cidade.

A estratégia do representante do tu-rismo jamaicano no Brasil pode dis-pensar um mercado volumoso. Deacordo com o Levantamento Nacionalde Álcool e Drogas, realizado pelo go-verno federal em parceria com a Uni-versidade Federal de São Paulo (Uni-fesp), 8 milhões de brasileiros já fuma-ram maconha e aproximadamente 1,5milhão fuma diariamente.

LIDERANÇA LATINA Além de o Uruguaiser o único país em que a maconha élegalizada, outros países latinos comoArgentina, Peru e Colômbia já descri-minalizaram o uso da erva. A posturados latinos é de vanguarda no debatedo assunto. Um dos principais centrosde discussão é a Comissão Latino-Americana sobre Drogas e Democra-cia, iniciativa dos ex-presidentes Fer-nando Henrique Cardoso, do Brasil;César Gaviria, da Colômbia; e ErnestoZedillo, do México, entre outros no-mes de peso.

O grupo sugere que a saída está emenfocar o consumo de drogas comoum tema de saúde pública e em traba-lhar na redução do uso – o que ajudariaa diminuir a produção e a desmantelarredes de traficantes. O tema continua aprovocar debate nos organismos inter-nacionais, como a Organização das Na-ções Unidas (ONU), que prioriza a re-pressão para lidar com o tema. O rela-tório Drogas e democracia: rumo auma mudança de paradigma foi apre-sentado pela comissão na sede da ONUe deixou claro que as políticas repressi-vas de combate às drogas na AméricaLatina fracassaram.

Como não é misturada com qualquerproduto químico, a erva é mais pura

Bolinhos preparados com maconha sãovendidos em bar por US$ 10 a unidade

Detalhe de plantação, em fazenda,próxima ao Centro de Montego Bay

Turista europeia posa para foto diante do mausoléu de Bob Marley, em Nine Mile

FOTOS: DANIEL CAMARGOS/EM