Estagiornal #15

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Estagiornal Fortaleza, 27 de abril de 2012 - Ed. 15 >>Opinião O aborto e o direito à vida PÁG. 4 O consentimento do aborto causado pelo estupro PÁG. 5 e 6 O ato da entrega e do abandono PÁG. 6 Nesta edição Aborto é tema do XXX Fóruns Universitários do Laboratório de Inclusào da Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social (STDS). Expediente: Laboratório de Inclusão | Grupo de Informação e Consciência Humana | Coordenador: João Monteiro Vasconcelos | Assistentes técnicos: Evelyn Onofre (Comunicação Social), Paula Castelana (Direito), Sérgio Rotschild (As- sessor de arte e cultura inclusiva) | Estagiária: Rebecca Silveira (Jornalismo). FOTO: EVELYN ONOFRE >>Fiz a diferença... Fiz a diferença: Horácio Neto PÁG. 2 e 3 Abandono e tempo de espera por adoção PÁG. 3

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Jornal produzido pelo Grupo de Informação e Consciência Humana do Laboratório de Inclusão da Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social (STDS).

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Estagiornal Fortaleza, 27 de abril de 2012 - Ed. 15

>>OpiniãoO aborto e o direito à vidaPÁG. 4 O consentimento do aborto causado pelo estupro PÁG. 5 e 6O ato da entrega e do abandonoPÁG. 6

Nesta edição

Aborto é tema do XXX Fóruns Universitários do Laboratório de Inclusào da Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social (STDS).

Expediente: Laboratório de Inclusão | Grupo de Informação e Consciência Humana | Coordenador: João Monteiro Vasconcelos | Assistentes técnicos: Evelyn Onofre (Comunicação Social), Paula Castelana (Direito), Sérgio Rotschild (As-sessor de arte e cultura inclusiva) | Estagiária: Rebecca Silveira (Jornalismo).

FOTO: EVELYN ONOFRE

>>Fiz a diferença...

Fiz a diferença: Horácio NetoPÁG. 2 e 3 Abandono e tempo de espera por adoção PÁG. 3

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2 Fiz a diferença...

por Evelyn Onofre

Formado em administração pela Estácio Fic, Horácio Neto, 23, fez parte da equipe do Laboratório de Inclusão de 2009 a 2011, como es-tagiário universitário. Além das suas atividades de estágio, Horácio foi membro do Grupo de Informação e Consciência Humana e o Grupo dos Fóruns Universitários, ambos desenvolvidos pelos estagiários da Secretaria do Trabalho e Desen-volvimento Social (STDS). Atual-mente, é técnico administrativo na Coordenação de Empreendedoris-mo da STDS.

O “Fiz a diferença...” é um es-paço dedicado àqueles que colabo-raram com o trabalho desenvolvido no Laboratório de Inclusão. Vamos resgatar amigos distantes, que não vemos há um bom tempo. Outros mais próximos, que, mesmo não trabalhando oficialmente no Labo-ratório ainda apoiam o nosso tra-balho, como é o caso de Horácio que você acompanha nesta entre-vista ao Estagiornal.

Estagiornal - Como você co-nheceu o Laboratório de Inclusão?

Horácio Neto - Eu conheci o Laboratório quando eu ainda era estudante universitário. Abriu uma vaga, para o meu curso de admi-

nistração aqui [na STDS], e eu me inscrevi. Passei um mês como vo-luntário no setor de Apoio a Mi-cro e Pequenas Empresas. Quando vim trabalhar aqui, eu participei do Fóruns Universitários, que aconte-ceu em dezembro de 2009, no mo-mento em que o grupo estava pre-cisando de novos integrantes e João Monteiro [coordenador do Laboratório de Inclusão] me convidou para par-ticipar. Uma semana depois desse convite, João mudou de ideia e disse que achava melhor que eu partici-passe do Grupo de Informação e Consciência Humana. Eu entrei no grupo ainda em dezembro de 2009. Passei a vir ao Laboratório uma vez por semana, conhecer mais o tra-balho daqui, as atividades desen-volvidas e participando do grupo.

Estagiornal - Você fez parte da criação e produção do vídeo “Ba-ter a ideia desse jogo doido”, de-senvolvido para o XXVIII Fóruns Universitários. A intenção é que o vídeo fosse apresentado apenas neste evento, mas acabou caindo no conhecimento de pesquisadores e a equipe foi convidada para apresen-tar o vídeo no “Pelo direito de viver com dignidade”, evento realizado pela Associação Nacional dos Cen-tros de Defesa da Criança e do A-dolescente (Anced) e pela Secretaria de Direitos Humanos do governo federal. Como é ver a continuidade e reconhecimento desse trabalho?

Horácio Neto - É muito bom ter o reconhecimento de um tra-balho que nós fizemos. No dia da reunião - acho que umas duas se-manas antes de acontecer o Fóruns Universitários - a equipe estava re-unida e eu dei a ideia de fazer um vídeo com os adolescentes em con-flito com a lei pra mostrar a situação deles nos centros educacionais. A equipe gostou e a gente fez o vídeo “Bater a ideia desse jogo doido”. De acordo com as gírias desses adoles-centes, “bater a ideia” é dizer o que pensa e “jogo doido” é uma situa-ção séria, tensa. Depois da reper-cussão, nós fomos chamados para

FOTO: EVELYN ONOFRE

exibir o vídeo nesse evento [“Pelo direito de viver com dignidade”] na UFC. No início, a gente do grupo teve receio de apresentar publicamente o vídeo porque ele tinha caráter de denúncia. E, além disso, mostrava a realidade aqui das próprias uni-dades [centros educacionais] da STDS. Mas, quando surgiu esse convite na UFC, nós pedimos autorização à Coordenação de Proteção Social Especial, responsável pelos centros educacionais, e à STDS, pra poder exibir o vídeo no evento com mais segurança.

Estagiornal - Há alguma coisa que você não fez, mas gostaria de ter feito no seu período de estágio no Laboratório de Inclusão?

Horácio Neto - Sim, o “Gestores da Informação”, projeto que estava no planejamento do Grupo de In-formação e Consciência Humana. O projeto tinha o objetivo de ten-tar fazer com que as informações de eventos e trabalhos desenvolvidos pelo Laboratório chegassem a todos os estagiários. No caso, selecionaría-mos um estagiário, em cada unidade da STDS, para ficar responsável de repassar as informações aos demais. Na época, isso diminuiria de 150 a pouco mais de 30 estagiários, o que facilitaria nosso trabalho através dos multiplicadores da informação.

Estagiornal - Como foi receber a premiação de Estagiário Nota 10?

Horácio Neto - Eu comecei meu estágio no setor de Apoio a Micro e Pequenas Empresas, onde passei um ano e quatro meses, e depois fui transferido para o Laboratório. Esse prémio Estagiário Nota 10 ajudou bastante na minha contratação em dezembro de 2011. No meu cur-rículo, esse prêmio teve um peso maior do que outras atividades. Eu não sabia disso. Quando eu fui chamado para trabalhar na Coorde-nação de Empreendedorismo, que ficou no lugar da extinta célula de Apoio a Micro e Pequenas Empre-sas. E minha chefe [Janemary Nasci-mento, coordenadora de empreendedorismo da STDS] me apresentou: “Olha, esse aqui é o Horácio, ele agora está trabalhando com a gente, foi esta-giário aqui. Inclusive, ele recebeu uma premiação de Estagiário Nota

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por Rebecca Silveira

Para que ocorra a adoção é ne-cessário a separação da criança do seio familiar, ou seja, romper os “la-ços”, que muitas vezes se iniciam a partir da vida intrauterina. Segundo o psicólogo José Eduardo Ge-remias, em seu artigo Adoção: Fa-cilidades e dificuldades é importante salientar que os chamados “laços afetivos” embora possam se mani-festar antes do parto, em muitos dos casos surgem após o nascimento com o progressivo estabelecimento de vínculo. Este fenômeno é mais comum nos pais, pois não participa da fase intrauterina. Assim, quando ocorre esta ruptura entre a criança e a família biológica, isto pode signifi-car uma experiência complexa para a criança, pois os laços intrauterinos não podem ser deixados de lado.

Ao nascer, o bebê necessita geral-mente de um adulto para suprir suas necessidades básicas, como alimen-tação e higiene. O primeiro contato afetivo deveria acontecer com sua mãe. No entanto, quando a criança é privada desse tipo de relação, acar-reta efeitos prejudiciais que variam de acordo com o grau desta rup-tura. Segundo Eduardo Geremias, quando a privação é parcial, tende a gerar angústia, exagerada neces-sidade de amor, forte sentimento de vingança, culpa e depressão. A privação quase total - muitas vezes observada em instituições de abri-gos, creches e hospitais - aumenta a severidade dos danos psicoafetivos e é denominada “hospitalismo”. Por último, a privação total, que pode aniquilar completamente a capaci-dade da criança estabelecer relações

futuras com outras pessoas.Para os bebês abandonados, o

nascimento representa um corte radical em relação a tudo o que eles conhecem: a voz da mãe, os ruídos de seu corpo, a voz do pai, o ambi-ente familiar. Tudo aquilo, que per-mite a um recém-nascido se situar nos primeiros momentos de vida, desaparece (BÖING e CREPALDI, 2004, p.216). É certo que existem inúmeros outros efeitos prejudiciais desta ruptura de laços, mas, apesar de não ter uma complexa com-preensão do que está acontecendo, o bebê sente o efeito, e estes efeitos terão consequências a longo prazo.

A adoção pode ser considerada uma maneira de reconstrução fa-miliar. Todavia, este processo ne-cessita de amparo e acompanha-mento jurídico e psicológico. Nesse processo, podemos vislumbrar três situações: 1) A primeira, uma famí-lia prestes a perder seu filho devido à incapacidade de gerir de maneira saudável sua família; 2) Em seguida, uma criança que necessita ser in-serida em um modelo que mais se assemelhe à família original; 3) E, por fim, uma família que não pôde de ter uma criança natural e que se coloca à disposição de suprir as ne-cessidades desta criança.

Este processo de adoção precisa de acompanhamento, para que os efeitos negativos da quebra dos vínculos da família natural sejam os menores possíveis. Dessa forma, o processo é bem sucedido. A adoção pode ser considerada uma prática comum em nossa sociedade. No entanto, a adoção legal ainda não é o meio mais utilizado. Assim, o número de crianças abandonadas e o tempo de espera para a efetivação do processo de adoção, leva ao aumento do número de crianças adotadas sem acompanhamento jurídico e psicossocial, podendo ocasionar problemas ainda maiores para a criança.

Adotadas sem acompanhamento, estas crianças ficam vulneráveis a outros tipos de problemas como vi-olência doméstica, abuso e trabalho infantil, que somados ao fato de já ter sido abandonada, pode levá-la a traumas irreparáveis.

Abandono e tempo de espera por adoção: uma balança desfavorável

10 - que contou muito, viu, Horá-cio?”. Ela disse pra mim. E, até então, eu não sabia que essa minha premiação tinha sido tão importante pra minha contratação no setor.

Estagiornal - Antes do Labo-ratório, você já havia trabalhado com pessoas com deficiência?

Horácio Neto - Não, e isso foi uma experiência muito grande pra mim. Um crescimento enorme, não só profissional, mas pessoal, no sen-tido de respeitar os limites do próxi-mo, ser mais humano, conviver com as diferenças. No primeiro Fóruns Universitários que eu participei, o Thiago de Sandes tocou. Quando eu vi, fiquei impressionado com a capacidade que ele tinha tanto de tocar, quanto de cantar. Foi o pri-meiro contato que eu tive com pes-soas com deficiência.

Estagiornal - Que tipo de dificuldades você enfrentou ao tra-balhar com pessoas com deficiên-cia? Alguma situação engraçada?

Horácio Neto - Que eu me lem-bre, só uma vez que eu tentei falar com o Geraldo [Geraldo Venceslau, o instrutor de letras/libras da Oficina de Cultura Surda do Laboratório de In-clusão. É deficiente auditivo e não oral-izado] e ele não poder ouvir.

Estagiornal - Você já presenciou alguma situação de alguém sendo vítima de preconceito?

Horácio Neto - Escutei um co-mentário de um motorista da STDS, quando ele parou numa vaga para pessoas com deficiência. Ele pergun-tou se as pessoas não tinham mais o que fazer do que ficar fiscalizando as vagas e tentando prejudicá-lo. Fiquei na minha, escutando porque, até então, eu não sabia que naquele episódio ele se referia ao pessoal do Laboratório de Inclusão. Porque existe o Laboratório e a Célula da Diversidade. Mas eu fiquei sentido com aquele comentário. Também já ouvi comentários preconceituosos contra gays do tipo “Ah, ele é gay, não vou ficar perto, cumprimentá-lo”, enfim. Até situação da pessoa se retirar da mesa ao chegar um ho-mossexual, porque não quer estar no mesmo ambiente que ele.

Estagiornal - O que você acha do trabalho desenvolvido pelo La-

boratório em prol da inclusão so-cial?

Horácio Neto - É um trabalho que tem uma importância enorme, porque o preconceito acaba inferi-orizando essas pessoas e o Labo-ratório de Inclusão combate isso.

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4 Opinião

O aborto e o direito à vida

por João Monteiro coordenador do Laboratório de Inclusão

Tudo que existe ou existiu teve um princípio intencional ou casual. A vida, como sequência evolutiva, assume com naturalidade sua maior essência: passar a existir. Falam so-bre a sustentabilidade da vida no planeta, da preservação da biodi-versidade, da recuperação de áreas degradadas, do salvamento das es-pécies em extinção. Falam do abor-to do corpo hídrico, da retirada de vegetação nas áreas naturais de nas-centes, das zonas de produtividade, afetando a procriação da água que a cada período fértil não encontra a-colhida. Falam também da violência contra a mulher, contra a criança. Falam da necessidade de um novo modelo social.

Como podemos entender esta vida que estamos usufruindo e so-brevivendo, sem questioná-la, sem buscar respostas e encarar a reali-dade sem medo, sem dogmas e inco-erências? Devemos ser contra ou a favor do aborto? Quantos conflitos devemos enfrentar para descobrir o significado de nascer ou morrer, de interromper ou preservar uma vida? Se combatemos o aborto do

“corpo híbrido, podemos promover o aborto do corpo humano? Afinal, que vida estamos defendendo? Que vida estamos condenando?

A legislação atual no Brasil, sobre aborto do corpo humano, considera o aborto uma conduta penalizada

ou despenalizada, dependendo da circunstâncias. O aborto é consi-derado um crime contra a vida pelo Código Penal Brasileiro. Porém, não é considerado crime quando prati-cado pelo médico, com consenti-mento da gestante, quando há risco de vida da mãe causado pela gravi-dez e quando a gravidez é resultado de estupro.

Escolher entre duas vidas é uma tarefa de alta complexidade, diante de quem vai nascer ou morrer, mesmo que estas vidas estejam ex-postas ao destino de uma mãe que vai escolher entre a própria vida e a vida que gerou e está carregando, ou abortar para continuar viva. Es-colher entre as consequências da violência do estupro, mesmo que o feto seja tão vítima quanto à mãe, faz também do destino um vilão que a vida tem que enfrentar para poder sobreviver.

Refletindo sobre gravidez in-

desejada, lembro-me de um caso marcante, que acompanhamos no Laboratório de Inclusão, de um pai que afirmou ser a favor do aborto para mulheres que comprovassem, na gestação, um feto com suspeita de síndrome de down, ou qualquer deficiência, alegando que ninguém poderia desejar um filho anormal. Do outro lado da vida, uma mãe, cujo filho nasceu com amiotrofia espinhal, verbaliza o seu sentimento pela dedicação e afetividade: “Hoje eu vivi um momento inesquecível em minha vida. Andar de carrossel com o Lucas. Ele dava gargalha-das que me contagiaram. Meu filho como você me faz feliz”.

A interrupção ou destruição da vida humana, porque ela é indese-jada, promove a ideia de uma socie-dade decadente pela simples razão de não conseguir ser justa e genero-sa para preservar a vida. A gravidez indesejada não reflete somente no

nascimento de bebês com deficiên-cia, mas na incapacidade humana de ser pai ou mãe por afinidade natu-ral. Nascer e morrer são condições naturais do homem, são interde-pendentes. Nascemos porque mor-remos.

O direito de nascer, como princípio, retrata a condição da de-pendência acentuada, indefesa, de uma maior vulnerabilidade. Um feto não tem como se defender da ação de um aborto. Um não tem esco-lha, o outro está definindo todas as escolhas. Falar sobre aborto e sus-tentabilidade, sobre morrer e nascer, sobre significados, interpretações, é exercício da própria mente. A mente que consegue controlar os precon-ceitos, a violência. A mente que não evoluiu o suficiente para entender que nascer é o princípio de toda vida e viver é um direito natural de qualquer ser.

A vida, como sequên-cia evolutiva, assume com naturalidade sua maior es-sência: passar a existir.

“Escolher entre duas vidas é uma tarefa de alta complexidade, diante de quem vai nascer ou morrer...

Últimas

INCLUSÃO SEM CENSURAO IV Inclusão sem Censura, que acontece em 18 de junho, terá como tema “Patrimônios históricos: Aces-sibilidade x Tombamento”. Gostou? Em breve, mais informações.

GRUPOS DE ESTUDOSOs grupos de estudos Casas de Luz e Poetas Urbanos estão com vagas abertas para novos estagiários. Aces-sem o link “Grupos de Estudos” no nosso blog: laboratoriodeinclusao.wordpress.com para conhecer as atividades desenvolvidas em cada um dos grupos e entre em contato com o Laboratório de Inclusão.

FORTANGO SEM LIMITESFortango sem Limites, grupo de tango e dança de salão para defici-entes físicos e visuais, está com in-scrições abertas para novos alunos. Interessados, entrar em contato com o professor de tango Gagá Azevedo através do e-mail [email protected] ou dos números (85) 9982 2123 e (85) 8899 2123.

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5O consentimento do aborto causa-do pelo estupropor Paula Castelana

No Brasil, o aborto é tipificado como crime contra a vida humana pelo Código Penal Brasileiro (CPB), em vigor desde 1984, prevendo de-tenção de um a três anos, em caso de aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento (art. 124) ou de três a 10 anos de reclusão, a aborto provocado por terceiros, sem o consentimento da gestante (art.125).

Porém, não é qualificado como crime, quando praticado por médi-co (art.128), nas seguintes situações: 1) Aborto necessário: se não há outro meio de salvar a vida da ges-tante; e 2) Aborto no caso de gravi-dez resultante de estupro. Nesses casos, o governo brasileiro fornece gratuitamente o aborto legal pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Essa permissão para abortar não signifi-ca uma exceção ao ato criminoso, mas sim uma escusa absolutória. Também não é considerado crime o aborto realizado fora do Brasil, sendo possível realizá-lo em países que permitem a prática.

Existe grande esforço, por parte da população considerada pró-es-colha, em tornar legal o aborto no Brasil como escolha da gestante. Sendo um dos argumentos utiliza-dos o de que manter a prática ilegal, não evita que o aborto seja realizado, mas faz com que as mulheres recor-ram a meios alternativos e inseguros de fazê-lo.

Em outubro de 2011, a Confe-rência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) lançou a Semana da Vida, de 1 a 7 de outubro, e o dia do Nascituro, 8 de outubro, resultado da Campanha da Fraternidade de 2011, com o tema “Vida, ecologia humana e meio ambiente”. A Igreja Católica disse que a Semana da Vida e o dia do Nascituro não apenas ser-viram para “defender a vida”, mas também para “promovê-la”.

Em 9 de março, a CNBB lançou oficialmente a Campanha da Frater-nidade de 2012, que tem como tema a saúde pública. O aborto, como questão de saúde pública, logo veio à discussão e a Igreja Católica rea-firmou sua posição quanto ao tema. Apesar de existirem rivalidades, católicos e evangélicos costumam fazer alianças políticas quando se trata de aborto.

Todavia, a maior parte da popula-ção do país é contra a prática, con-corda com a situação atual ou ainda quer sua proibição em todos os ca-sos. Um plebiscito para consultar a população já foi algumas vezes pro-posto com a intenção de decidir o que se deve fazer na legislação sobre o aborto.

Existe também a opinião de que o aborto não é matéria para plebis-cito, mas sim, uma questão de saúde pública e que, como tal, deve ser decidida pelo Estado e não julgada pela maioria. Segundo a antropóloga Débora Diniz, em algumas cidades do Brasil, o aborto clandestino é a segunda maior causa de morte ma-terna.

Relata a história, que a Colônia do Brasil era, pela influência de Por-tugal, uma nação essencialmente católica. Sendo assim, o aborto e outras práticas condenadas pela Igreja, em Portugal, também eram tratadas assim no Brasil. O aborto, porém, só foi citado explicitamente na legislação em 1830, no Código Penal do Império. A interrupção voluntária da gravidez, na consti-tuição de 1824, era considerada um crime grave contra a vida humana.

Na época, havia certo cuidado com a punição de mulheres, e, quan-do estas praticavam o aborto auto-induzido, estavam livres de pena. Durante o Brasil República, vi-gorou o Código Penal da República (1890), em que o aborto novamente foi tratado como crime grave. Ainda com ressalvas para o aborto auto-in-duzido, a prática da interrupção da gravidez é punida quando feita por terceiros e a pena é agravada em um terço, quando o procedimento re-sulta em lesão corporal de natureza grave. A pena é duplicada, quando, por qualquer dessas causas, lhe so-

brevém à morte (art.127 do CPB). A legislação sobre o tema, a partir

do Código Penal de 1940, tornou-se mais clara e específica e seu con-teúdo permanece em vigor até hoje. Ele instituiu que o aborto é um dos “crimes contra a vida” e que apenas pode ser feito em casos de estupro e risco de vida da mulher. O Código Penal de 1969, que não entrou de fato em vigor, mantinha as carac-terísticas do código anterior, mas enrijecia as penas para mulheres que provocassem em si mesmas o aborto.

Em 2012, um grupo de juristas elaborou um anteprojeto para o novo CPB, onde o aborto se torna legal em outras situações, além dos dois casos já permitidos: estupro e risco de vida à mulher. Com isso, o Supremo Tribunal Federal (STF), composto por 11 ministros, decidiu, no último 12 de abril, por oito votos a dois, com apenas uma abstenção, que o aborto de fetos com má for-mação do cérebro (anencefalia) não pode ser mais considerado crime. Os ministros finalizaram o julga-mento de um processo da Confe-deração Nacional dos Trabalha-dores na Saúde (CNTS).

O ministro Marco Aurélio Mello, relator do caso julgado pela Corte, defendeu, em seu voto, que “o Es-tado não pode impor a continuidade de uma gravidez inviável, sob pena de violar o princípio da dignidade da mulher e de aplicar à gestante uma tortura psicológica”. Ele afir-mou que o próprio Conselho Fed-eral de Medicina, na Resolução nº. 1.752, de 2004, classifica os anencé-falos como “natimortos cerebrais” e disse que a gravidez, em casos de anencefalia, tem índice de mortali-dade de 100% para o feto. Por isso, a interrupção da gestação não pode, segundo Mello, ser criminalizada. “Cabe à mulher, e não ao Estado, sopesar valores e sentimentos de ordem estritamente privada, para deliberar pela interrupção, ou não, da gravidez de anencéfalos”, disse o ministro.

Assim, as gestantes que quiserem interromper a gravidez de fetos di-agnosticados com a anomalia não precisarão mais de autorização judi-

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por Sérgio Rotschild

cial. Os profissionais de saúde que realizarem o procedimento também não poderão ser responsabilizados criminalmente.

Apesar do aumento dos casos em que a mulher poderá abortar, os ju-ristas, ao longo do julgamento que durou dois dias, não discutiram situ-ações diferentes da anencefalia, em que o aborto poderia futuramente ser permitido. Os casos em que o aborto seria permitido são, além dos casos já previstos hoje em lei: 1) Quando a mulher sofrer insemi-nação artificial sem o seu consenti-mento; 2) Por escolha da gestante, mas com a confirmação do médico de que a mulher não tem condições mentais de arcar com a gravidez.

O caso é polêmico e ainda se tem muito o que regulamentar. Ocorre-ram, ao longo dos anos, várias ten-tativas para se modificar a legislação brasileira em referência ao abor-to. Desde quando a Constituição Brasileira de 1988 entrou em vigor, poucas mudanças de fato ocorre-ram, estendendo-se até hoje o de-bate sobre o aborto e as tentativas de descriminalizá-lo.

O ato da entrega e do aban-dono

No Brasil, existem aproxima-damente oito milhões de crian-ças abandonadas, segundo a Pas-toral do Menor. Destas, cerca de dois milhões vivem permanente-mente nas ruas, envolvidas com prostituição, drogas e pequenos furtos. Uma das estatísticas mais tristes revela que no estado de São Paulo, a cada dia, duas crian-ças são abandonadas na cidade, em abrigos ou nas ruas. Uma das causas disto é o abandono desumano de crianças, que são lançadas nas ruas à própria sorte e, com isso, acabam tendo que

encontrar uma maneira de so-breviver a esta realidade.

De acordo com o Estatuto da Criança o do Adolescente (ECA), “toda criança tem direito à vida, saúde, liberdade, educa-ção, cultura e dignidade”. Mas até que ponto esta lei está sendo cumprida? Aqueles, que deve-riam cumpri-la, abandonam seus filhos, muitas vezes nas ruas, nem mesmo em abrigos. Quando são abrigadas, as crianças ficam nas mãos de pessoas que não desen-volvem estratégias para que o período de permanência em um abrigo seja reduzido.

Crianças que vivem nas ruas, que deveriam estar sob os cui-dados do Estado, acabam cres-cendo, sem saber o que é viver em um círculo familiar, e se en-volvendo com a criminalidade. Passam a seguir regras que já deveriam não mais existir. Uma realidade de animalização. A lei dos mais fortes acaba sendo, in-felizmente, necessária.

De acordo com dados da ONG Cidade Viva, no ano de 2011, 52 bebês foram abando-nados em lugares como lixeiras e caixas de sapatos em todo Brasil. O abandono, de acordo com a nova lei que altera 55 artigos do Estatuto da Criança e do Adoles-cente, deve ser substituído pela doação às famílias que desejam adotar. Estas alterações acabam reduzindo o número de abando-nos desumanos e dá liberdade para que o ato de entrega de pais, que não podem ou não desejam criar seus filhos, torne-se uma manifestação de amor e carinho.

Com isso, percebe-se a neces-sidade de serem desenvolvidos meios que facilitem o processo de adoção. A cada dia, mais e mais crianças estão sendo colo-cadas em abrigos e o tempo, que estas esperam por uma adoção, acaba sendo negativo ao de-senvolvimento psicossocial das mesmas. Será que é justo existir tanta burocracia para encarar o processo de adoção? Para uma criança conseguir um novo lar?

Espaço do EstagiárioÉ estagiário de alguma das unidades

da STDS, gosta de escrever ou tem al-gum artigo ou denúncia que gostaria de publicar? O Estagiornal também é de vocês. Seja um colaborador e envie sua notícia, artigo, fotografia, comentário, sugestão para [email protected]. Interessados em participar de al-gum dos grupos do Laboratório de In-clusão também podem ligar para (85) 3101-2123 ou (85) 3101-4583.

@labdeinclusao

Inclusão em Verso, Prosa e Melodia

Desenvolvido pelo Grupo de Arte e Cultura Inclusiva (Gaci), o Inclusão em Verso, Prosa e Melodia é um projeto que tem como objetivo realizar oficinas, rodas de discussões e palestras, com temáticas ligadas à inclusão social, sempre contando com a participação de acadêmicos e pesquisadores que atuam nas áreas da inclusão e acessibilidade humana.

O projeto, coordenado por Sér-gio Rotschild, assessor de arte e cultura inclusiva do Laboratório de Inclusão, desenvolve, junto ao es-tagiário Ítalo Gutyerrez, a oficina Ponto de Vista, que realiza a forma-ção de críticos sociais, abordando assuntos como relações humanas, ética e sexualidade. A oficina tem como público-alvo os adolescentes do projeto Primeiro Passo da STDS.

FOTO: EVELYN ONOFRE

O músico Ítalo Gutyerrez.