Estagiornal #16

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Estagiornal Fortaleza, 26 de novembro de 2012 - Ed. 16 OPINIÃO A realidade das medidas so- cioeducativas Página 6 Um olhar para a educação dos adolescentes em conflito com a lei Página 5 22 anos de ECA Página 6 Nesta edição O vazio das políticas púclicas de educação para os adolescentes cumpridores de medidas socioeducativas. FOTO: EVELYN ONOFRE ENTREVISTA As várias faces de Amidete Aguiar Páginas 3 e 4 Impressões dos centros socio- educativos Página 2 Um caminho que leva às in- clusão e ressocialização Página 4

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Jornal produzido pelo Grupo de Informação e Consciência Humana do Laboratório de Inclusão da Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social (STDS).

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Estagiornal Fortaleza, 26 de novembro de 2012 - Ed. 16

OPINIÃOA realidade das medidas so-cioeducativasPágina 6 Um olhar para a educação dos adolescentes em conflito com a leiPágina 5

22 anos de ECAPágina 6

Nesta edição

O vazio das políticas púclicas de educação para os adolescentes cumpridores de medidas socioeducativas.

FOTO: EVELYN ONOFRE

ENTREVISTAAs várias faces de Amidete AguiarPáginas 3 e 4

Impressões dos centros socio-educativos Página 2

Um caminho que leva às in-clusão e ressocialização Página 4

2 Editorial O crescimento do número de

adolescentes em conflito com a lei, no Brasil, reflete a realidade do não funcionamento de políticas públicas consistentes. Não é possível desvin-cular exclusão social e concentração de renda ao aumento da violência urbana e corrupção sem controle. A interdependência dos conflitos soci-ais questiona se as políticas públicas funcionam ou as ações são apenas amenizadoras.

Pelas consequências do vazio funcional de políticas públicas sim-bólicas é possível definir e medir os níveis de educação, saúde, emprego, relacionamento familiar e trajetória de futuro de um país. A realidade pode ser dura, mas criar a ilusão de que as políticas públicas estão real-mente funcionando é retardar uma possível reação pública ou privada a outro modelo de gestão.

Outro ponto relevante são as me-didas punitivas, que são bem mais investidas do que as de prevenção. Fala-se bem mais na diminuição da idade penal, na punição mais rígida destes adolescentes e na segurança dos abrigos, do que em investimen-tos na sustentabilidade dos indivídu-os e suas famílias.

A capacitação de famílias excluí-das, acompanhamento da educação humanizada, ampliação do acesso à cultura e ao lazer são fatores geral-mente secundários às ações puni-tivas. Para o comodismo é bem mais fácil punir do que prevenir.

A superlotação nas unidades de internação apenas reforça a ideia de uma “bola de neve” em desenvolvi-mento, um termômetro à ineficiên-cia das políticas públicas, um alerta que já vem sendo questionado há anos.

É preciso que a verdade seja indis-pensável a qualquer política pública para a construção e materializa-ção de projetos consistentes de in-clusão social. A insistência em man-ter este modelo de sociedade, pelas desigualdades e ações incoerentes à realidade, reforça a multiplicação de projetos sociais apenas simbólicos, inúteis à evolução humana.

Impressões e coloridos dos centros socioeducativos

Por Tarcília Silveira

FOTO: TARCÍLIA SILVEIRA

Os centros socioeducativos são divididos em masculinos e femini-nos, com grandes diferenças entre ambos. Os masculinos são em maior número, sete unidades em Fortale-za; já o feminino apenas um para a-tender adolescentes de 12 a 21 anos em regime de internação provisória, privação de liberdade e semiliber-dade. Independente de quantidade, gênero ou tamanho, as medidas so-cioeducativas desses centros são as mesmas para todos os adolescentes. Mas o Centro Educacional Aldaci Barbosa Mota tem o seu jeitinho feminino de ser.

Paredes cor-de-rosa, enfeites, penduricalhos, muros não tão altos, oficinas de bordado, costura, artes, higiene e beleza, aulas de dança - é o forró que domina - cursos de doces e salgados e customização. Nas liga-ções, “mãe traz um creme de pele pra mim”. Um universo feminino que, mesmo na situação em que se encontra, não fica de lado.

Lá, pouco elas ficam trancafiadas nos dormitórios. Na maior parte do tempo, estão concentradas em alguma atividade, oficina ou sala de aula. Observando momentos como o Dia das Crianças ou o Dia das Mães fica até difícil julgar essas me-ninas. Que cometeram roubo, furto ou homicídio; pois ali, quando estão com os pai, filhos - visto que grande parte das adolescentes são mães -

em um momento de festa, emoção edescontração, por um instante, su-peram seus atos infracionais.

Já nas unidades masculinas, o cli-ma e o ambiente são outros. Os me-ninos são divididos por idade, me-dida e gravidade do ato infracional. No Centro Socioeducativo Passaré, estão adolescentes de 12 a 15 anos, cumprindo internação provisória (45 dias). Já no Centro Socioeduca-tivo Dom Bosco, a faixa etária é de 12 a 16 anos, em sanção (máximo de 90 dias), envolvidos com atos infra-cionais graves ou descumprimento de medida.

Nos centros, que atendem ado-lescentes sentenciados, é permitido receber visita de suas companhei-ras, desde que comprove, de fato, a existência de uma união estável. É permitido também o envio de car-tas, contanto que passe pelo setor social para que seja feita uma leitura e comprove que não existe nada de perigoso no conteúdo.

Em visita a esses dois centros masculinos, percebi um clima dife-rente, confesso, um pouco mais ten-so. A começar pelo muro, que é bas-tante alto, diferente do feminino. A quantidade de adolescentes em cada casa é bem maior, os atos cometidos são de natureza mais grave e a es-trutura física é diferente da unidade que atende as meninas. As paredes não são tão coloridas.

Oficina de artes no Centro Educacional Aldaci Barbosa Mota.

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Um pouco sobre Amidete Aguiar, ex-estagiária de artes cênicas que fez a diferença na história do Laboratório de Inclusão.

As várias faces de Amidete AguiarFiz a diferença

FOTO: EVELYN ONOFRE

Por Evelyn Onofre

Estagiornal - Quem é Amidete Aguiar?

Amidete Aguiar - Eu costumo dizer que eu sou uma pessoa hoje bem diferente do que eu poderia ser se não tivesse passado por aqui [Laboratório de Inclusão]. Acho que eu seria uma pessoa muito feia espiri-tualmente. Aqui, aprendi muito com relação a preconceitos, diferenças e vivências com o outro.

Estagiornal - E como surgiu sua paixão pelo teatro?

Amidete - Eu sempre vivi entre artistas. Meu pai era músico, então sempre vivi nesse meio da arte, que é contagiante; quando você vê, já está dentro. Aos 14 anos, comecei, um curso de artes cênicas no colé-gio com o grupo “Arte e Viver”. E me interessei pelo teatro porque ele me possibilita fazer muitas coisas que gosto. Eu trabalharia na arquite-tura, porque adoro desenhar, tenho noção de espaço, organização, e a parte de cenografia me possibilita isso. Eu seria estilista e, no teatro, eu faço figurino. Eu gosto de dar aula, sempre gostei. O teatro me possi-bilitou essas “n” vertentes.

Estagiornal - Como você co-nheceu o Laboratório de Inclusão?

Amidete - Eu estava no 2º semes-

tre (2007.2), quando vi um papel-zinho no flanelógrafo da faculdade informando que tinha uma vaga pra estágio em artes cênicas aqui. Eu passei três dias me remoendo: “Será que eu coloco o currículo?”. Porque só tinha uma vaga. Era toda a facul-dade em prol dessa vaga. No último dia do prazo, resolvi ir deixar o cur-rículo e acabei sendo chamada.

Estagiornal - Quais projetos você desenvolveu no Laboratório de Inclusão?

Amidete - Logo no início do es-tágio, ainda em 2007, fiz contação de histórias no Abrigo de Idosos. Tirava todos eles do enfurnado do quarto pra fazer uma roda entre as árvores, tomando banho de sol ao ar livre. No abrigo, também mon-tamos uma casa de bonecas, que tá lá até hoje, pra fazer show de mari-onetes pros idosos. Nessa mesma época, também fui pro Abrigo Tia Júlia, mas não deu muito certo porque a pedagoga me entregava os alunos antes das atividades e ficava retirando os meninos antes mesmo de a oficina acabar, o que atrapalha-va a continuidade do meu trabalho. Então, acabei saindo de lá. Depois fui para o [Centro Educacional] Dom Bosco. Nos primeiros dias, houve uma pequena rebelião. Um dos me-ninos quebrou o vaso sanitário e en-

fiou no bucho do outro. Aí um deles me falou: “Tia, se eu fosse a senhora, saia logo, porque vai ter um negó-cio aí”. Uma das coisas que aprendi foi a linguagem dos meninos, que era bem diferente da minha. Lá, eu dava oficina de teatro, mas não teve continuidade porque nunca eram os mesmos meninos, devido a ro-tatividade deles. Também passei um tempo no Adoc (Abrigo Desembarga-dor Olívio Câmara), na Casa Abrigo e no Centro Educacional Aldaci Bar-bosa Mota. Nessa época, foi quando conseguimos a parceria com o The-atro José de Alencar e fomos pra lá. Minha primeira apresentação, no primeiro ano de oficina (em 2008), foi “Os saltimbancos” (com elenco for-mado por pessoas com deficiência).

Estagiornal - Qual desses proje-tos você considera o principal?

Amidete - O que eu mais me real-izei foi no Theatro, porque saiu uma coisa muito bonita que foi a “Miralú e a Luneta Encantada” (adaptação do livro “A luneta mágica”, de Joaquim Manuel de Macedo). Foi minha maior satisfação profissional, porque a Mi-ralú fala de uma menina que é cega que precisa enxergar as coisas como são, não com o olho, mas com o co-ração. E eu queria que percebessem o ator e a atriz, não a deficiência de cada um. Foi um grande espetáculo.

4 Um caminho que leva à inclusão e ressocializaçãoPor Jamilia Oliveira

A Secretaria do Trabalho e De-senvolvimento Social (STDS) co-loca em prática alguns projetos com o intuito de ajudar crianças e adoles-centes a serem incluídos no merca-do de trabalho. Dentre eles, existe o Projeto Transformando Vidas, dire-cionado apenas aos adolescentes em conflito com a lei. É um projeto que procura viabilizar a inclusão social e econômica de jovens em cumpri-mento de medidas socioeducativas e egressos de privação ou restrição de liberdade, buscando vencer os pre-conceitos, reduzir a reincidência e ampliar a cidadania.

Para participar do projeto, o jo-vem é encaminhado pela instituição executora da medida socioeducativa ou pelo Juizado da Infância e da Ju-ventude. Feito o encaminhamento, ele participa de entrevista com as-sistente social e psicólogo. Em se-guida, seu nome é incluído em um banco de dados, aguardando, assim, uma vaga para ser lotado. O trabalho é feito em parceria com os projetos Jovem Aprendiz, Jovem Bolsista e Jovem Estagiário, todos da unidade do Projeto Primeiro Passo. Existe uma quantidade de vagas para cada um desses projetos, sendo algumas destinadas aos adolescentes en-

“É necessário um melhor acompanhamento dos jovens que hoje integram os centros socio-educativos.

“O nível escolar exigido au-mentou e o ensino de EJA não é aceito para quem quer tentar vaga no Jovem Estagiário.

caminhados para o Transformando Vidas.

As vagas existem, mas não são todas preenchidas. De acordo com Frans Beno Gadelha, coordena-dor do Transformando Vidas, isso acontece porque a maioria dos jo-vens não tem perfil para ocupá-las. O nível escolar exigido aumentou

e o ensino de Educação de Jovens e Adultos (EJA) não é aceito para quem quer tentar vaga no Jovem Es-tagiário. Outro fator que contribui muito é a má formação dos alunos. Eles estão terminando o ano letivo com grau de instrução insuficiente.

“Se você perguntar a esses jovens se eles têm interesse em participar do projeto, muitos dirão que sim”, afirma Frans Beno. Alguns até de-

vem preferir o estágio à escola, uma vez que, o retorno é quase que imediato. De acordo com dados concedidos pela coordenação do Transformando Vidas, muitos dos adolescentes, que passaram pelo projeto, estão hoje na faculdade e atuando no mercado de trabalho.

O objetivo do Projeto Trans-formando Vidas é muito bom, no entanto, existem alguns pontos a se-rem revistos e melhor trabalhados. Talvez, se existisse uma verba des-tinada ao projeto, o trabalho seria desenvolvido com mais facilidade. É preciso um melhor acompanha-mento dos jovens que hoje integram os Centros Socioeducativos, afinal, de acordo com a coordenação do projeto, 80% deles são usuários e apresentam problemas com drogas. No entanto, não é feito nenhum tra-balho para contornar a situação.

É necessário que estes jovens te-nham uma boa formação pelo pro-fessor em sala de aula e participem de projetos de qualificação e capaci-tação para que o grau de instrução seja mais elevado. Escola e trabalho devem andar juntos, um ao lado do outro. A escolarização é a base para se alcançar um sucesso profissional fora dos centros socioeducativos.

Estagiornal - Como foi tra-balhar com essa diversidade de pes-soas?

Amidete - Foi uma experiência de vida única. Eu me tornei mais humana, mais sensível. Me tornei mais observadora, porque, pra você aprender a conviver com pessoas com deficiência, é preciso primei-ramente observar pra perceber suas limitações e aproveitar o melhor de cada uma. Eu acho que aqui fun-ciona como um aquário, só que não cheio de peixinhos, mas de pessoas. Aqui a gente enxerga as pessoas e suas qualidades.

Estagiornal - O que você gos-taria de ter feito no Laboratório e não fez?

Amidete - Tudo o que eu tinha que fazer, eu fiz. Tudo o que eu tive que aprender aqui, eu aprendi. E aprendi muito.

Estagiornal - Muitas pessoas que passam pelo Laboratório criam um vínculo que as trazem de volta, seja para participar de algum projeto voluntário ou algo do tipo. O que te fez voltar ou continuar aqui?

Amidete - Acho que a ideologia da gente trabalhar com as diferen-ças, trabalhar com o melhor das diferenças, aprender que cada um tem o seu potencial. A possibilidade de ajudar as pessoas e ver as coisas acontecerem.

Estagiornal - Essa entrevista faz parte do quadro “Fiz a diferença”. Que diferença você acha que fez durante seus anos de estágio e vo-luntariado?

Amidete - Da mesma forma que muitas pessoas ajudaram a me fazer diferente, eu acho que eu fiz a diferença aqui evoluindo em um projeto que já existia, acreditando. E foi por acreditar que a Miralú ficou conhecida e hoje é o que é, com um elenco 90% composto por pessoas com deficiência (síndrome de down, baixa visão - não enxerga nada den-tro do teatro, foi preciso muita mar-cação - gago, deficiente cognitivo e Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade – TDAH). No teatro, a gente diz assim: “Se você não acreditar a verdade não surge”. E é a verdade que o público quer as-sistir.

5Um olhar para a educação dos adolescentes em conflito com a lei

FOTO: ARQUIVO PESSOAL

Por Jamilia Oliveira

Um direito de todo ser humano é o acesso à educação, segundo a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) 9.394/96. Foi a partir dela que a educação passou a adquirir outros espaços, diferentes da sala de aula comum. Ela ganhou asas e foi em busca de novos muros, os dos cen-tros socioeducativos.

Os muros são novos, consequen-temente, o público e a atuação pedagógica também. A educação nestes centros é diferenciada. Existe uma equipe, composta por peda-gogos e professores, responsável por administrar o setor pedagógico. O adolescente que cumpre pena já possui vida social. É necessário então um exame inicial para saber em que nível escolar ele se encontra e, em seguida, encaminhá-lo ao tra-balho junto às professoras. Procu-rando conhecer como é que acon-tece o processo educativo dentro de alguns centros de Fortaleza, a equi-pe do Estagiornal visitou dois deles: Centro Educacional Dom Bosco e Centro Socioeducativo Passaré.

No Dom Bosco, existe o aten-dimento em sala de aula de acordo com a área e o grau de escolaridade

Sala de aula da EJA III no Centro Educacional Aldaci Barbosa Mota.

de cada adolescente, através da Edu-cação de Jovens e Adultos (EJA); além do atendimento individual re-alizado pelo setor pedagógico. O centro conta ainda com projeto de informática, sala de leitura e oficinas de artes, marcenaria e vime.

Segundo Nádia Bezerra, respon-sável pelo setor pedagógico do Dom Bosco, atualmente, todos os ado-lescentes estão matriculados pela Secretaria de Educação (Seduc), no entanto, nem todos frequentam a sala de aula. Isso acontece geral-mente por resistência ou por esta-rem na tranca (espaço reservado aos que tiveram mau comportamento no centro). Já Kátia Maciel, pedago-ga e especialista em EJA no Sistema Prisional pela Universidade Federal do Ceará (UFC), afirma nem todos os internos estão em sala de aula, até porque muitos deles não têm docu-mento de identificação.

A cada três meses, o setor pe-dagógico do Dom Bosco é encar-regado de acompanhar o desen-volvimento dos alunos através da elaboração de relatórios. Ao cumpri-rem a pena, ou seja, deixarem o cen-tro, a responsabilidade de acompa-nhar a educação desses adolescentes volta, então, para os familiares.

Já os internos do Passaré passam apenas 45 dias na casa. Devido ao curto período, o trabalho realizado em sala de aula é então o de con-scientizar sobre a importância dos estudos. São desenvolvidos proje-tos, campeonatos, gincanas, jogos e oficinas de aerografia (pintura com jatos de tinta), tecelagem e vime. Os meninos fabricam os objetos, ex-põem e vendem. O dinheiro arreca-dado vai para a unidade.

O setor pedagógico se encarrega de fazer um relatório e encaminhar para a escola. De acordo com as pedagogas Márcia Façanha e Sônia Santiago, os adolescentes também estão matriculados pela Seduc, na Escola Municipal de Ensino Fun-damental e Médio Integrada 2 de Maio, no Castelão, e frequentam a sala de aula do centro. Eles já saem da unidade matriculados na escola do bairro, ficando a cargo da família transferi-lo para outra ou não.

Não existe uma maneira única de se trabalhar educação. É o lugar e o meio que determinam a maneira mais adequada para o setor atuar. O importante é que todos os adoles-centes, que cumprem medidas so-cioeducativas, frequentem as aulas. A atividade faz parte do conjunto de ações pedagógicas que são ofe-recidas aos menores e servem de parâmetro para analisar os avanços e respostas às medidas.

O objetivo da educação, nesses centros, é o de abordar práticas pe-dagógicas adequadas através de me-didas socioeducativas, de forma a promover transformações na vida pessoal, profissional, social e fami-liar para o interno. No entanto, não é apenas com a ajuda de um sistema que os adolescentes podem mudar.

Primeiramente, eles têm que que-rer mudar. O sistema oferece outro caminho, diferente daquele que leva às ruas, drogas e violência. Oferece um caminho por meio da educação e do trabalho profissional e de ca-pacitação. É por meio da reeducação que eles estarão na sociedade nova-mente. Como acontece com alguns deles, que tornam-se funcionários das fábricas que funcionam dentro dos centros ou são contratados por empresas ainda maiores da cidade.

6 Opinião

Por Sérgio Rotschild

A realidade das medidas socioeduca-tivas

As medidas socioeducativas, res-postas dadas pelo Estado aos ado-lescentes que cometem atos infra-cionais - previstas nos artigos 112 e 130 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) - são executadas em centros educacionais, no caso da cidade de Fortaleza, e deveriam ter como principal objetivo preparar estes jovens para sua reinserção na sociedade.

Porém, quando nos deparamos com um ambiente tão inóspito, com um amontoado de jovens, cercados por grades ou trancafiados em ver-

dadeiras “jaulas humanas”, ficamos chocados.

Ao visitar um centro socioedu-cativo de Fortaleza e presenciar, em seus corredores, os braços desses adolescentes pendurados nas grades, como se fossem adultos encarcera-dos, leva-nos a refletir se o artigo 1º do ECA, que garante a proteção integral da criança e do adolescente, tem sido realmente respeitado.

Antes de cometerem os atos in-fracionais, que os levaram a cumprir tais medidas, estes jovens já estavam aprisionados em uma realidade cruel, onde viviam entre as grandes invisíveis do preconceito e discrimi-nação. Uma realidade onde sonhar é bobagem e a luta por melhores condições é narrada através de le-tras de funk, rap ou hip hop, muitas vezes com letras que fazem apologia à violência, dinheiro, drogas e facil-mente tornam-se ideologias distor-cidas.

O Estado, que deveria ser o pri-

meiro a evitar o ingresso dos ado-lescentes na vida criminal, finda não desenvolvendo ações consistentes de integração social. É mais fácil segregar e punir?

De acordo com alguns demago-gos, as medidas socioeducativas não têm caráter de pena, embora este-jam presentes intenções de corrigir e mostrar o lado negativo de suas ações, mas de, primordialmente, res-socializar. Mas não existe ressocia-lização entre grades. Ou existe?

Substituir grades “invisíveis”, im-postas pela sociedade, por grades reais, construídas pelo Estado, é aceitar que este não tem a respon-sabilidade de evitar que os adoles-centes cometam certas infrações; e, caso cometam, procurem assegurar seus direitos básicos, desenvolven-do políticas públicas e ações que fa-cilitem esse retorno à sociedade de maneira sadia e com o acompanha-mento necessário. Sentido o prazer que é o papel de dever cumprido.

22 anos de ECAPor Tarcília Silveira

Em julho último, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) completou 22 anos de existência. Antes do estatuto, crianças e adoles-centes eram assistidos pelo Código de Menores (1979), que esteve em vigor até 1990. No Código, eles não eram vistos como sujeitos de direi-tos, como passaram a ser desde a implantação do ECA.

O Estatuto foi fruto da Lei 8.069,

sancionada em 13 de julho de 1990. Ele informa o tratamento legal e so-cial que deve ser dado às crianças e adolescentes do Brasil, além de ga-rantir educação, saúde, moradia e lazer. Constam ainda os deveres da família e da sociedade para a efeti-vação desses direitos. No código, também estão previstas as medidas socioeducativas, responsáveis por “punir” os adolescentes que co- meterem atos infracionais.

Certamente, o ECA é de bastante significância para as crianças e ado-lescentes, todavia ainda há muitos desafios a serem vencidos. Torna-se

cada vez mais comum o aumento de atos infracionais cometidos por adolescentes, pais que abandonam seus filhos, crianças nas ruas - sem estarem matriculadas na escola, fa-zendo uso de drogas - violência do-méstica cometida contra os benefi-ciados com o estatuto.

De acordo com o ECA, toda cri-ança tem direito à vida, saúde, liber-dade, educação, cultura e dignidade. Existem muitos órgãos empenhados na efetivação desses direitos, mas é preciso uma aproximação maior da sociedade para que estes sejam as-segurados.

Este jornal é uma publicação do Grupo de Informação e Consciência Humana re-alizado pelo Laboratório de Inclusão da Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social (STDS).

Coordenação geral: João Monteiro VasconcelosEdição e diagramação: Evelyn OnofreColaboradores: Paula Castelana, Sérgio Rotschild Estagiárias: Jamilia Oliveira, Tarcília SilveiraEndereço: Rua Soriano Albuquerque, 230, Joaquim Távora, Fortaleza-CEContatos: (85) 3101-2123 | (85) 3101-4583 | [email protected] | laboratorio-deinclusao.wordpress.com

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