Estatuto Da Criança e Do Adolescente e a Redução Da Maioridade Penal
-
Upload
ciciliamaria -
Category
Documents
-
view
79 -
download
23
Transcript of Estatuto Da Criança e Do Adolescente e a Redução Da Maioridade Penal
ASSOCIAÇÃO TERESINENSE DE ENSINO - ATE
FACULDADE SANTO AGOSTINHO – FSA
ÍTALO BRUNO DE MELO MOTA
ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE E A REDUÇÃO DA MAIORIDADE
PENAL
TERESINA, PI
2012
ÍTALO BRUNO DE MELO MOTA
ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE E A REDUÇÃO DA MAIORIDADE
PENAL
Monografia submetida à Banca Examinadora do curso de Direito da Faculdade Santo Agostinho – FSA, como parte dos requisitos para obtenção do título de Bacharel em Direito.
TERESINA, PI
2012
ÍTALO BRUNO DE MELO MOTA
ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE E A REDUÇÃO DA MAIORIDADE
PENAL
Monografia submetida à Banca Examinadora do curso de Direito da Faculdade Santo Agostinho – FSA, como parte dos requisitos para obtenção do título de Bacharel em Direito, sob orientação do Profº Msc. Juliano de Oliveira Leonel.
Aprovado em _____/_____/______.
BANCA EXAMINADORA
___________________________________________
Profº Msc Juliano de Oliveira Leonel Orientador
___________________________________________
Profº Alexandre Noleto
Examinador
___________________________________________
Profº Gustavo Tupinambá
Examinador
Este trabalho vai para minha mãe que
sempre me apoiou, e sempre me deu força.
Agradeço a Deus por ter me
dado o dom da vida, e a todos os meus mestres que
apontaram os caminhos do conhecimento.
RESUMO
Este trabalho consiste em uma monografia jurídica, apresentada como requisito para a obtenção do titulo de Bacharel em Direito e tem como alvo, através de uma visão acadêmica, discorrer sobre a questão da redução da maioridade penal, uma das grandes discussões em foque na atualidade. Para melhor compreensão do tema, buscamos sua legislação vigente bem como Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, Lei 8.069/90 Estatuto da Criança e do Adolescente, Código Penal Brasileiro. Com base nestas legislações, procuramos clarear a visão de que a redução da maioridade penal afrontaria o texto constitucional e só anteciparia a violência e a criminalidade. Neste contexto, veremos que há divergências doutrinárias quanto a redução da maioridade, também veremos que a inimputabilidade aos menores de 18 anos não é impunidade e que a circunstância de o menor de dezoito anos não responder pelos atos delituosos tipificados pelo Direito Penal não o faz impune, mas inimputável ficando submetido às medidas sócio-educativas da Lei 8.069/90.
PALAVRAS-CHAVES: Redução da maioridade penal. Divergências doutrinárias.
Inimputabilidade
SÚMARIO
1.Introdução..............................................................................................................07
1.1. O sistema jurídico vigente.................................................................................08
1.2. Da imputabilidade penal....................................................................................09
1.3. A inimputabilidade dos menores de 18 anos é um direito
fundamental..............................................................................................................11
1.4. Inimputabilidade não é impunidade...................................................................13
1.5. Análises do projeto de Emenda Constitucional nº. 171/93................................15
2. Argumentos favoráveis e contrários a redução da maioridade penal..................16
2.1. Argumentos favoráveis......................................................................................16
2.2. Argumentos contrários.......................................................................................18
3. O adolescente e o ECA.........................................................................................21
3.1 As causas determinantes do aumento dos atos infracionais praticados por
menores....................................................................................................................23
4. Metodologia..........................................................................................................26
5.Considerações Finais ...........................................................................................27
Referências...............................................................................................................30
7
1 Introdução
A referida pesquisa visa mostrar uma possível inconstitucionalidade da
redução da maioridade penal e o crescente aumento de atos infracionais praticados
por adolescentes infratores demonstrando que a redução da maioridade não é a
solução para a diminuição desse problema que vem se alastrando em todo território
nacional. Tendo em vista que uma possível diminuição da maioridade iria gerar um
custo altíssimo para o Estado que já não cumpre com suas responsabilidades e
possivelmente demonstrar uma possível inconstitucionalidade referente a tal redução,
pois o problema do aumento de atos infracionais, não está na diminuição da idade de
18 para 16 no que tange a responsabilidade penal, mas, na própria estrutura do
Estado que não consegue aplicar o mínimo de recursos com eficácia em projetos
sociais, trabalhando na questão da prevenção.
O presente trabalho, tem o objetivo geral de analisar as causas do aumento
de atos infracionais cometidos por adolescentes infratores bem como discutir a
redução da maioridade penal. Pretende-se, então, suscitar reflexão e análise da
polêmica possibilidade, necessidade e utilidade da redução da maioridade penal no
ordenamento jurídico vigente. Saber se é ou não constitucional a redução da
maioridade penal. O Código Penal, o Estatuto da Criança e do Adolescente e a
Constituição Federal prevê a idade mínima de 18 anos para a responsabilidade penal.
Parte da doutrina afirma ser a questão da maioridade penal uma cláusula pétrea.
Existem inúmeros fatores por trás dos inúmeros cometimentos de atos infracionais. A
questão é mais complexa do que a quantidade de anos para a imputação penal.
A escolha do tema deveu-se, ao fato do pesquisador ter percebido, que a
questão da redução da maioridade penal não está totalmente vinculada a questões,
de grande tolerância do ECA, mas também sociais e democráticas do país. Basta
saber como se sentem as famílias atingidas por jovens infratores. Esses não serão
punidos e continuarão no atual momento cometendo barbáries na sociedade.
A questão norteadora dessa pesquisa foi desenvolvida a partir da seguinte
indagação: Qual a melhor solução para que ocorra a diminuição de atos infracionais
graves? Redução da maioridade penal, cumprimento efetivo das leis vigentes ou uma
mudança no Estatuto da Criança e do Adolescente.
8
A partir dessa questão, a pesquisa busca fundamentar-se na concepção de
vários autores sobre o tema proposto, afim de apresentar a perspectiva de cada um,
assim como, a intervenção crítica do pesquisador frente as informações relevantes
sobre esse estudo.
1.1 O sistema jurídico vigente
De acordo com o sistema jurídico vigente, a maioridade penal se dá aos 18
anos de idade consoante o artigo 27 do Código Penal, o artigo 104 do Estatuto da
Criança e do Adolescente e o artigo 228 da Constituição Federal.
Para o legislador a pessoa menor de 18 anos não possui desenvolvimento
mental completo para compreender o caráter ilícito de seus atos, ou de determinar-
se de acordo com esse entendimento, erigindo o dogma constitucional disposto no
art. 228. Adotou-se o sistema biológico, no qual se considera somente a idade do
agente, independentemente de sua capacidade psíquica.
Países como Estados Unidos e Inglaterra, por outro lado, levam em conta a
índole do criminoso e sua consciência a respeito da gravidade do ato cometido. Na
Inglaterra, a idade mínima é de 10 anos, enquanto que nos Estados Unidos varia
conforme a legislação estadual, sendo que alguns fixaram entre 6 e 12 anos.
Em curto, mas útil artigo, Dyanndra Lisita Célico traz relevantes informações
sobre como a legislação brasileira tratou do assunto ao longo do tempo. Ela tratou
da questão etária quanto à imputabilidade penal, além de referir como outros países
do mundo atualmente enfrentam o tema. Afirma tal autora que em outros países a
idade mínima para a responsabilidade criminal é variável, sendo, por exemplo, de 07
anos na Austrália e Egito; 08 anos na Líbia; 09 anos no Iraque; 10 anos na Malásia;
12 anos no Equador, Israel e Líbano; 13 na Espanha; 14 na Armênia, Áustria, China,
Alemanha, Itália, Japão e Coréia do Sul. (Dyanndra Lisita Célico – 2005).
O Decreto-lei nº 1.004/69 (Código Penal de 1969), que não chegou a viger,
embora já estivesse em período de vacatio legis, possibilitava a imposição de
sanção penal a menores entre 16 e 18 anos, se esses revelassem suficiente
desenvolvimento psíquico, bastante para entender o caráter ilícito do fato e de
9
determinar-se de acordo com esse entendimento. No decreto, o sistema adotado foi
o biopsicológico, ou seja, o de submissão da pessoa entre 16 e 18 anos a avaliação
psicológica para saber se, ao tempo do fato, possuía discernimento sobre a ilicitude
de seus atos.
No atual Código Penal, na exposição de motivos, item 23, a opção legislativa
foi justificada da seguinte forma: com a legislação de menores, recentemente
editada (Lei nº 6.697/79), dispunha o Estado dos instrumentos necessários ao
afastamento do jovem delinquente, menor de 18 (dezoito) anos, do convívio social,
sem sua necessária submissão ao tratamento do delinquente adulto, expondo-o à
contaminação carcerária, conforme descrito no artigo “Redução da Maioridade
Penal” do Juiz de Direito de Goiás Eder, Jorge.
O que se discute no Brasil não é a alteração do sistema biológico, atualmente
adotado, mas sim a diminuição da idade mínima de 18 para 16 anos.
1.2 Da imputabilidade penal
Imputar significa atribuir. Assim, um sujeito imputável é aquele a quem pode
ser atribuído uma pena, como sanção de seu crime ou contravenção.
Conforme a doutrina penalista, crime pode ser conceituado sob três
perspectivas: formal, material e analítica. A primeira considera-se crime toda conduta
descrita no tipo penal, não importando o seu conteúdo, bastando, para ser crime,
estar previsto no ordenamento jurídico. Pela segunda, o seu conteúdo de lesividade
é fundamental, apenas sendo tidas como crime as condutas que violem ou expõem
em perigo bens jurídicos considerados fundamentais para a existência humana em
coletividade. Por fim, pela óptica analítica, segundo a corrente tripartida, crime é a
conduta humana típica, antijurídica e culpável, ou ainda, conforme a corrente
bipartida, crime é a conduta humana típica, antijurídica, sendo a culpabilidade
apenas um pressuposto para a punibilidade do agente. Sobre a imputabilidade
Penal, Greco(2010) afirma:
10
Para que o agente possa ser responsabilizado pelo fato típico e ilícito por ele cometido é preciso que seja imputável. A imputabilidade, portanto, é a possibilidade de se atribuir, imputar o fato típico e ilícito ao agente. A imputabilidade é a regra; a inimputabilidade, a exceção(GRECO; 2010 p.73)”.
No que refere-se, ao conceito de imputabilidade Penal, Capez(2008)
preconiza:
É a capacidade de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo com esse entendimento. O agente deve ter condições físicas, psicológicas, morais e mentais de saber que está realizando um ilícito penal. Além dessa capacidade plena de entendimento, deve ter totais condições de controle sobre sua vontade (CAPEZ, 2008 p.310).
Em suma, para ser imputável, o agente deve entender e querer. Desta forma,
três são os critérios para a averiguação da inimputabilidade:
a) Sistema biológico – leva-se em consideração a causa e não o efeito.
Ou seja, basta que o indivíduo esteja acometido de alguma doença mental,
desenvolvimento mental incompleto ou deficiente, ou algum transtorno psíquico no
momento da conduta para ser considerado inimputável.
O sistema biológico foi adotado, como exceção, no caso dos menores de 18
anos, nos quais o desenvolvimento incompleto presume a incapacidade de
entendimento e vontade (CP, art. 27). Pode até ser que o menor entenda
perfeitamente o caráter criminoso do homicídio, roubo ou estupro, por exemplo, que
pratica, mas a lei presume, ante a menoridade, que ele não sabe o que faz,
adotando claramente o sistema biológico nessa hipótese. (CAPEZ; 2008 ,p.314)
b) Sistema psicológico – este sistema não se preocupa com a existência
de perturbação mental no agente, mas apenas se, no momento da ação ou omissão
delituosa, ele tinha ou não condições de avaliar o caráter criminoso do fato e
orientar-se de acordo com esse entendimento. O sistema psicológico não é adotado
pelo nosso Código Penal, tendo em vista, que suas atenções estão apenas voltadas
para o momento da prática do crime.
c) Sistema biopsicológico - a análise é psicossomática, sendo relevante
tanto o efeito como a causa, considerando-se inimputável quem, além de detentor
de uma analogia psíquica, não entendia o caráter ilícito do fato (capacidade
11
intelectual) e /ou não se determinava conforme esse entendimento (capacidade
volitiva) no momento do delito. Sendo este o sistema adotado pelo Código Penal
brasileiro (artigos 26 caput e 28 §1º, Código Penal).
É de se notar que as causas de inimputabilidade penal estão descritas no
artigo 26 do Código Penal Brasileiro e o art. 27 do mesmo código também contempla
a inimputabilidade penal do menor de 18 (dezoito) anos de idade.
Insta realçar que para a averiguação de inimputabilidade para os menores de
18 (dezoito) anos é utilizado o sistema biológico não sendo levados em
consideração os elementos intelectuais e volitivos do agente, bastando para a
caracterização da inimputabilidade penal a prova de sua menoridade no momento
da ação ou omissão.
Desta forma os menores de dezoito anos, então, são considerados
inimputáveis, não sendo-lhes aplicado pena, mas sim, medidas de proteção ou
sócio-educativas, conforme a lei 8.069/90.
1.3 A inimputabilidade dos menores de 18 anos é direito fundamental
Os direitos fundamentais seriam os direitos imprescindíveis à condição
humana. Assim considerados, seriam os direitos inerentes ao homem, respeitados e
merecedores de proteção constitucional tendo em vista a consagração do princípio
da dignidade humana como alicerce da República brasileira, art. 1º, III, da CF.
Ao se situar a questão dos direitos fundamentais com cláusulas pétreas
explícitas, observa-se que pela letra fria da lei, são considerados como cláusula
pétrea os direitos e garantias individuais. No entanto, numa interpretação
teleológica, a proteção como cláusula pétrea merece também ser estendida também
a todos os direitos fundamentais. A interpretação tão-somente gramatical em tal
caso poderia levar o intérprete a inferências grosseiras. Desse modo, parece mais
sensato considerar no art. 60, § 4º, IV, da CF, como cláusula pétrea todos os direitos
e garantias fundamentais e não tão-só os direitos e garantias individuais.
12
A maioridade penal tem sua base constitucional no artigo 228 da CF. A
principal dificuldade seria verificar se nessa norma estaria ou não consubstanciada
um direito fundamental, sendo, portanto, considerado uma cláusula pétrea.
É de relevo o fato de que nem todos os direitos e garantias fundamentais
estão sob a rubrica do Título II, da CF. Aliás, a própria Carta Magna brasileira admite
outras fontes de leis, por exemplo, a possibilidade de incorporação de outros direitos
humanos como emendas constitucionais, art. 5º, § 3º, da CF. Portanto, fica claro que
o rol dos artigos situados sob a rubrica de Direitos e Garantias Fundamentais é
meramente exemplificativo, sendo possível a existência de outros direitos e
garantias fundamentais espalhados por qualquer lugar na Lei Maior.
Diante disso, tendo-se em vista que o art. 228, da CF, dispõe um limite ao
direito de punir do Estado, evidencia-se sua característica de direito fundamental.
Fundamental e individual, por chancelar a inimputabilidade dos menores de 18 anos,
assegurado ao infrator menor à proteção constitucional de não ter deflagrado contra
si a persecução penal por parte do Estado. Nesse sentido, fundamental mencionar
que a norma constitucional originária do art. 228, da CF, é essencialmente um direito
fundamental, eis que depura as dimensões e as fronteiras jurídicas, com esteio no
princípio da legalidade e do devido processo penal, a fim de que assim se legitime a
persecução penal a ser deflagrada pelo Estado e se impeçam os casos de abuso de
poder.
Nessa esteira, importante a lição de Montesquieu consubstanciada no fato de
que quem detém o poder tende a abusá-lo, por isso, a necessidade do sistema de
pesos e contrapesos. Um poder complementa e fiscaliza o outro, cada qual dentro
de suas funções. Ademais, a própria história da humanidade já mostrou
suficientemente que a falta de normas concretas impondo limites ao jus puniendi
infringe, por si só, os direitos fundamentais, eis que, em tal caso, o suposto
criminoso não terá bases concretas para a realização de sua defesa e não disporá
de prévio conhecimento da consequência que seus supostos crimes causariam.
Finalmente, conclui-se que caso o constituinte originário ao elaborarem a
Constituição, não quisessem que o art. 228 fosse um direito fundamental e, portanto,
merecedor de proteção constitucional tal como cláusula pétrea, não o teriam
inserido, de forma a se deixar expressa a inimputabilidade aos menores de 18 anos,
13
na Constituição. Bastaria apenas o constituinte ter disposto que são penalmente
inimputáveis os menores assim definidos em lei, sujeitos a penalidades desta.
1.4 Inimputabilidade não é impunidade
Existe expressa previsão constitucional sobre a inimputabilidade penal aos
menores de dezoito anos, quando a constituição cidadã prescreveu no artigo 228
que “São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas
da legislação especial.” Contrário ao que equivocadamente apresenta e tenta fazer
crer os meios de comunicação, os menores de dezoito anos são sim puníveis, não
pelo Código Penal, mas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. O que a mídia
tenta apresentar é uma questão equivocada, distorcida, sem apresentar os números
da criminalidade por parte dos menores.
Inimputabilidade não é o mesmo que impunidade.”(Estevan Faustino Zibordi,
2008). Portanto resta, a questão legislativa de possibilidade de redução de
menoridade penal pela edição de lei. O que é impossível. Somente poderia ocorrer a
redução de menoridade penal por intermédio de edição de emenda constitucional,
ainda assim questionável.
A Constituição Federal prevê expressamente sobre a proteção especial às
crianças e adolescentes, com atenção aos artigos 3º, III, 5º, 6º e 204. De modo
ainda mais incisivo, o artigo 227 coloca a obrigatoriedade da sociedade em geral, ali
incluída família e Estado, a proteção e especial dedicação às crianças e
adolescentes. Questiona-se, então, se a menoridade penal é um direito fundamental,
uma cláusula pétrea?
E a resposta é negativa. Conclui-se, que a busca pela redução da menoridade
penal por intermédio de edição de lei, mostra-se inconstitucional, já que tal situação
somente poderia ser efetivada com a edição de emenda constitucional. A questão
enfrenta vedação na Constituição Federal no que concerne às cláusulas pétreas.
A intenção de reduzir a idade penal para satisfazer apenas ao interesse de
imediatismo e publicidade barata, não merece prosperar em um estado democrático
14
de direito. Investir em educação de qualidade, como meio a resolver os problemas
de criminalidade, não é de interesse para aqueles que apenas buscam soluções
paliativas. Mais vale, a tais, fazer de conta, do que simplesmente fazer.
O crescimento do volume de ocorrências envolvendo cada vez mais os
menores de idade é reflexo de décadas de ausência e omissão estatal, que
culminou com o comprometimento da família, sua célula inatingível.
Nesse país, existe um péssimo costume de resolver todo e qualquer problema
com lei. O costume poderia ser tolhido, mas haveria afronta ao processo legislativo e
ao estado democrático de direito.
Uma possível solução para o problema da criminalidade de crianças e
adolescentes seria investir em uma fundação educacional para o procedimento de
semi-internação, onde os menores infratores cumpririam suas penas.
Nesse local, haveria estudo, atividades profissionalizantes, equipe
multidisciplinar (psicólogos, assistentes sociais, advogados, etc.) com a família por
perto, a qual necessariamente participaria do processo de recuperação, com visitas
programadas. Não é suficiente a criação de um procedimento judicial especial para o
menor, que, por vezes, acaba sendo jogado em uma instituição imprópria para a
formação e ressocialização ao convívio em sociedade.
A missão do Poder Judiciário é a pacificação social. Na ausência de uma
legislação eficiente, resta ao menor infrator uma prisão disfarçada.
Admitindo que a redução da idade penal seja aprovada, resta claro que as
situações terão de ser resolvidas no Poder Judiciário, e uma avalanche de ações
terão seu curso obstado pela invocação de inconstitucionalidade, que,
inevitavelmente, vão parar no Supremo Tribunal Federal.
Por tudo que fora exposto, conclui-se que o projeto de emenda constitucional
ou projeto em tramitação de leis que objetivem diminuir a maioridade penal, apesar
de irem ao encontro dos anseios da maior parte da população, chocam-se
inevitavelmente com as cláusulas pétreas, acarretando, por conseguinte, a sua
inconstitucionalidade. Dessa maneira, para a redução da maioridade penal, faz-se
necessário a realização de uma nova assembleia constituinte, eis que somente o
15
Poder Constituinte Originário, por ser ilimitado e incondicionado ao arcabouço
jurídico antecessor, dispõe de poderes suficientes para fazê-lo legitimamente.
1.5 Análises do projeto de Emenda Constitucional nº. 171/93
O projeto de Emenda Constitucional nº 171/93, de autoria do ex-deputado
Benedito Domingos, tem por finalidade a redução da maioridade penal de
18(dezoito) para 16 (dezesseis) anos.
Tal projeto encontra-se em trâmite no Congresso Nacional por mais de 14
(quatorze) anos, e até o presente momento não foi votado.
Contudo, todas as vezes que ocorrem crimes envolvendo menores de idade,
a própria sociedade, imprensa, familiares de vítimas, cobram de seus representantes
algum posicionamento. Com isso, tal projeto de emenda constitucional ganha força a
fim de ser votado, mas com o fim do clamor social e da mídia todos acabam
esquecendo.
Existem vários opositores em relação a tal projeto de emenda, pois esses
defendem a corrente de que o artigo 228 da Constituição Federal é considerado
cláusula pétrea, e com isso não poderia ser objeto de alteração constitucional
através de emenda constitucional. Pois só o poder constituinte originário poderia
fazer essa alteração, por ser inicial, ilimitado, autônomo e incondicionado.Nesse
sentido Canotilho sintetiza essas características dizendo que:
o poder constituinte, na teoria de Sieyés, seria um poder inicial, autônomo e omnipotente. É inicial porque não existe, antes dele, nem de facto nem de direito, qualquer outro poder. É nele que se situa, por excelência, a vontade do soberano (instância jurídico-política dotada de autoridade suprema). É um poder autônomo: a ele e só a ele compete decidir se, como e quando, deve „dar-se‟ uma constituição à Nação. É um poder omnipotente, incondicionado: o poder constituinte não está subordinado a qualquer regra de fora ou de fundo.
16
O citado projeto de alteração constitucional trata-se de matéria que envolvem
direitos e garantias individuais, e, portanto, não podem sofrer alteração.Nesse
sentido Silva (2008, p.1) dispõe que:
Todavia, não é só o fato de ser matéria constitucional que tem gerado certa polêmica em torno de uma possível alteração na maioridade penal, pois se tal artigo fosse uma norma constitucional comum, bastaria à aprovação de emenda constitucional, nos parâmetros do art. 60 CF, para que tal artigo fosse alterado. No entanto, as discussões estão verdadeiramente fundadas no fato de o art. 28 ser considerado por alguns, como cláusula pétrea, e, portanto não podendo ser alterada.”
No meu entendimento o referido artigo, realmente constitui cláusula pétrea, por se tratar de direito e garantia individual, qual seja os dos menores de dezoito anos, e que de acordo com o art. 60, § 4º, IV CF, não pode ser alterado.
Desta forma, cria-se uma verdadeira tese de incerteza, pois a grande maioria
dos cientistas jurídicos afirma que tal projeto não poderia nem ao menos ter passado
pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça).
Nossos representantes políticos estão querendo resolver o referido problema
com apenas uma alteração de um dispositivo legal, mas isso não é capaz de
solucionar o aumento da criminalidade juvenil.
Se tal projeto de emenda realmente fosse aprovado estaríamos diante de um
problema maior, visto que, um grande número de adolescentes seriam encarcerados
juntamente com presos com idade superior.
Todos os setores da sociedade devem ter como principal objetivo a criação de
uma política de prevenção junto aos adolescentes e não simplesmente se
preocuparem exclusivamente com a punição aferida a eles, no caso de cometimento
de alguma infração. Com todas essas mudanças em nossas atitudes, teremos a
chance de presenciar um futuro melhor aos adolescentes.
2 Argumentos favoráveis e contrários a redução da maioridade penal
2.1 Argumentos favoráveis
17
O principal argumento dos defensores da redução da maioridade penal se
alberga no cotego com a maioridade civil, trabalhista, e eleitoral.Vejamos:
a) O artigo 1.517, do código civil, permite que uma pessoa, com a autorização
dos pais (ou suprimento judicial), case a partir dos 16 (dezesseis) anos;
b) O artigo 1.860, parágrafo único, do Código Civil, prevê que os maiores de
16 (dezesseis) anos podem testar;
c) O artigo 5º, do Código Civil, prevê a possibilidade de emancipação a partir
dos 16 (dezesseis) anos, situação em que a pessoa pode, por si só, exprimir sua
vontade para a realização dos negócios jurídicos;
d) A Constituição Federal, no artigo 7º, inciso XXXIII, possibilita o trabalho
para a pessoa a partir dos 16(dezesseis) anos de idade, e a partir de 14 (quatorze)
anos na condição de aprendiz;
e) A Constituição Federal, no artigo 14, inciso II, §1º, alínea c, permite o voto
a partir dos 16 (dezesseis) anos, tornando-se obrigatório aos 18 (dezoito) até os 70
(setenta);
Assim, argumenta-se: se uma pessoa, menor de 18(dezoito) anos, pode
trabalhar contratar, casar, testar e votar, por que não pode responder
criminalmente? Confira-se o posicionamento de PIERANGELI (2003, p. 27):
As opções de nossas legislações atuais possibilitam, sem arranhar critérios e até para uniformizá-los, uma redução da idade da imputabilidade para os 16 anos. Se o menor pode votar, casar, e construir família, gerir e dispor de seus bens pode, com folga, também responder penalmente por seus atos, como salienta PAULO JOSÉ DA COSTA JÚNIOR.”
No mesmo sentido, posiciona-se o desembargador do Tribunal de Justiça de
São Paulo, PINHEIRO (2001, p.12):
Raciocinando logicamente, se os maiores de 16 e menores de 18 anos, pelo art. 14,§1º, alínea c, da CF, podem se alistar e votar, porque constitucionalmente são iguais aos outros brasileiros maiores de 18 anos, não poderiam estes, menores de 18 anos ser considerados penalmente inimputáveis. [...] Efetivamente, na
18
atualidade deste mundo moderno, repleto de informações cotidianas, não tem sentido presumir, de forma absoluta, que o menor de 18 anos seja inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo com este entendimento. Assim, seria irreal equiparar esse menor a um doente mental.
Outro argumento utilizado pelos defensores encontra guarida no Direito
Comparado. Embora o critério de 18 (dezoito) anos seja o mais utilizado em
legislações alienígenas, inúmeros países reduziram o limite etário visando combater
a “delinquência juvenil”. Neste norte, explana o advogado RIMONATO (2007, p.
197):
De forma mais sábia, países como os Estados Unidos e a Grã-Bretanha observam antes da idade do criminoso a gravidade do delito. Também há diversos países onde a maioridade penal inicia-se aos 16 anos (Argentina, Espanha, Bélgica e Israel), aos 15 anos (Índia, Egito, Síria, Honduras, Guatemala, Paraguai, Líbano) aos 14 anos (Alemanha e Haiti). Assim, levando em conta a baixa criminalidade nesses países, a redução da maioridade penal, no Brasil, precisa ser discutida de forma positiva, pois não é impossível apesar de trabalhosa.
Por derradeiro, outro argumento plausível levantado pelos defensores é a
consciência da impunidade. Entende-se que o adolescente em conflito com a lei, ao
saber que não receberá as mesmas penas de um adulto, não se inibe de cometer
mais atos infracionais. Sobre isto, defendia Reale (apud Rimonato, 2007, p.197):
Tendo o agente ciência de sua impunidade, está dando justo motivo à imperiosa mudança na idade limite da imutabilidade penal, que deve efetivamente começar aos dezesseis anos, inclusive, devido à precocidade da consciência delitual resultante dos acelerados processos de comunicação que caracterizam nosso tempo.
Desta forma foram expostas as considerações sobre os principais argumentos
que visam reduzir a maioridade penal, passa-se aos argumentos contrários.
2.2 Argumentos contrários a redução da maioridade penal
19
A redução da maioridade penal de 18(dezoito) para 16 (dezesseis) anos gera
dúvidas acerca da constitucionalidade da norma. Pois poderia esbarrar acerca da
natureza jurídica de cláusula pétrea do art. 228 da Constituição Federal de 1988, o
que poderia impossibilitar tal alteração, em face ao disposto no art. 60, § 4º, IV da
Carta Suprema como se vê.
Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:
§ 4o Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
IV – os direitos e garantias individuais.
Art. 228. São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial.
É importante observar que pela redação da norma, face ao texto
constitucional, não há restrição ao mencionado dispositivo no sentido de se delimitar
o qual trata apenas dos Direitos e Garantias Fundamentais Individuais. Pelo
contrário, conforme o Supremo Tribunal Federal, em diversas decisões, tais direitos
e garantias acham-se espalhados no texto da Constituição Federal.
Entre as decisões neste sentido, cite-se a emitida na Ação Direta de
Inconstitucionalidade nº 2.666, Rel. Min. Ellen Gracie, julgada em 03/10/02 e
publicada no Diário de Justiça em 06/12/02. Nesta situação, o Supremo Tribunal
Federal manifestou-se no sentido de que é proibida a deliberação de emenda
constitucional que se destine a suprimir do texto constitucional o § 6º do art. 195, ou
que exclua a incidência desse dispositivo a uma hipótese em que, pela vontade do
constituinte originário, devesse ele ser aplicado.
Ou seja, já existe o reconhecimento expresso da Corte Suprema do
Judiciário, de um dispositivo fora do art. 5º da CF/88.
A redução da maioridade penal mostra claramente um obstáculo jurídico-
constitucional à alteração. É que a inimputabilidade dos menores de 18 (dezoito)
anos possui previsão constitucional no artigo 228, ou seja, a impossibilidade de
receber sanções iguais a de adultos é uma garantia da criança e do adolescente,
20
portanto, parte do núcleo constitucional intangível. Tal argumento é corroborado com
o entendimento do Supremo Tribunal Federal, no sentido de que os direitos e
garantias individuais não se encontram topologicamente apenas no artigo 5º, mas
estão espalhados no texto constitucional (ADI nº 939/93). Nesse sentido, discorre
GOMES ; BIANCHINI (2007, p. 8):
Do ponto de vista jurídico é muito questionável que se possa alterar a Constituição brasileira para o fim de reduzir a maioridade penal. A inimputabilidade do menor de dezoito anos foi constitucionalizada (CF, art. 228). Há discussão sobre tratar-se (ou não) de cláusula pétrea (CF, art. 60, §4º). Pensamos positivamente, tendo em vista o disposto no art. 5º, §2º da CF, c/c os arts. 60, §4º, e 228. O art. 60, § 4º, antes citado, veda a deliberação de qualquer emenda constitucional tendente a abolir direito ou garantia individual.
O segundo argumento defende, estatisticamente, que a quantidade de atos
infracionais, diferentemente do que nos mostra a mídia, é muito pequena em relação
aos crimes cometidos por adultos. Neste particular, expõe Prudente (2007, p. 199):
A título de comparação, em 2006, o sistema prisional contava com 401, 236 pessoas adultas - entre presos provisórios e condenados – em face de 15,426 jovens internados no meio fechado. Isto representa que, dos crimes praticados e apurados 96,3% são cometidos por adultos e 3,7% são cometidos por adolescentes.
Por terceiro, argumenta-se que colocar menores de 18 (dezoito) anos em
estabelecimentos penais junto com adultos seria medida altamente desastrosa.
GOMES ; BIANCHINI (2007, p.8) profligam:
Se os presídios são reconhecidamente “faculdades do crime”, a colocação dos adolescentes neles (em companhia de criminosos adultos) teria como consequência inevitável a sua mais rápida integração nas organizações criminosas. Recorde-se que os dois grupos que mais amedrontam, hoje, o Rio de Janeiro e São Paulo (Comando Vermelho e PCC) nasceram justamente dentro dos presídios.
Por fim, um último argumento aponta para a necessidade do Estado, ao invés
de enfrentar a questão legislando, deveria implementar políticas públicas de
inserção social de crianças e adolescentes em conflito com a lei. É dizer: é
21
necessário se concentrar nas causas sociais que levam os jovens à prática do ato
infracional e não investir em reprimendas punitivas. Sobre isto, pontifica OLIVA:
Faltam medidas integradas em todas as esferas de governo”. Faltam investimentos em medidas preventivas. Acesso à Educação, à Saúde e à Assistência Social. A redução da maioridade Penal é apenas ilusória. Esse não é um problema de segurança pública, mas de políticas públicas. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) já prevê a resposta e medidas socioeducativas, que têm caráter pedagógico, de ressocialização. Não adianta mexer na lei e sim colocar em prática o que já existe.
3. O Adolescente e o ECA
O Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, Lei nº 8.069/90 que
regulamentou o artigo 227 da Constituição Federal que atribui à criança e ao
adolescente, prioridade absoluta no atendimento aos seus direitos como cidadãos
brasileiros. A aprovação desta Lei representa um esforço coletivo dos mais diversos
setores da sociedade organizada.
Revela ainda um projeto de sociedade marcado pela igualdade de direitos e
de condições que devem ser construídas, para assegurar acesso a esses direitos. É,
portanto, um instrumento importante nas mãos do Estado Brasileiro (sociedade e
poder público) para transformar a realidade da infância e da juventude de jovens
historicamente vítimas do abandono e da exploração econômica e social por parte
da sociedade.
Após tal conceituação nota-se tratar de uma lei protetiva em razão da
necessária proteção às crianças e aos adolescentes por serem pessoas ainda em
formação.
Especificamente, quanto ao adolescente, é natural a instabilidade e a
fragilidade emocional nessa fase. “É comum períodos de serenidade suceder-se a
outros de extrema fragilidade emocional com demonstração frequente de
instabilidade. Sentem-se imortais, fortes, capazes de tudo. As emoções são
contraditórias. Deprimem-se com facilidade, passando de um estado meditativo e
infeliz para outro pleno de euforia.” (Zagury, 2000, p. 82).
22
Com muito mais peso àqueles que vivem em um ambiente nada salutar para
a formação de uma pessoa. A autodeterminação dos adolescentes em meio familiar
e/ou social negativo torna-se incompleta, por força dos fatores endógenos e é
influenciado pelos fatores ambientais.
Logo, não há como tratar esses adolescentes em formação da mesma forma
que aqueles já prontos, com caráter definido, e com menor possibilidade de
ressocialização. Pensar assim nada mais é do que a aplicação do princípio
constitucional da igualdade material, onde se tratam igualmente os iguais e
desigualmente os desiguais na proporção de sua desigualdade.
Ao contrário, portanto, do que muitas pessoas pensam, não há no Estatuto
um sistema de impunidade. Por outro lado, a internação é uma das medidas sócio-
educativas mais severas que visam aplicar uma medida “punitiva e ressocializadora”
após a apuração do ato infracional e consequentemente provado a participação do
mesmo no ato-infracional (equivalente à uma prisão após a condenação aplicável
aos imputáveis).
É preciso, porém, que se observem o disposto nos art. 121 e 122, §1, do
Estatuto da Criança e do Adolescente: a medida deve ser reavaliada, ao menos, a
cada semestre; não pode exceder três anos ou persistir quando o infrator completar
21 anos de idade. Terminado o procedimento, o juiz aplicará a medida adequada ou
liberará o jovem a depender de cada caso concreto.
É ilusório pensar que a simples redução da maioridade penal é um remédio
para todos os males, pois os presídios para adultos estão superlotados além de não
terem, na quase totalidade, condições de recuperar alguém. Some-se o fato de o
adolescente, ao conviver com criminosos adultos, receber forte carga negativa de
influência quando ainda está em processo de amadurecimento emocional.
Em pesquisa coordenada por Volpi, consultor da UNICEF no Brasil, observou-
se que, entre 1995 a 1997, dos adolescentes internados houve 14% autores de
homicídio e, 4,5% por latrocínio, dados que revelam não ser a situação alarmante a
ponto de se clamar pela redução da maioridade penal (João Batista Saraiva, 1999).
É preciso, sim, o Estado e a sociedade se unirem para por em prática uma política
preventiva do aumento dessas infrações, dando assistência adequada às crianças
23
para que não sejam futuros adolescentes infratores, dar aos adolescentes condições
de não se envolverem em infrações e oferecer aos infratores os meios necessários à
sua reinserção na sociedade.
De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)
referentes aos anos de 2005 e 2006, o Brasil tinha 24.461.666 de adolescentes
entre 12 e 18 anos. Em uma comparação entre população total de adolescentes
entre 12 e 18 anos, e aqueles em conflito com a lei – 2005 / 2006 - apenas 0,14%
estavam em conflito com a lei (IBGE / Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
(PNAD) – 2005/2006). Não faz o menor sentido promover uma alteração na
Constituição da República, para aqueles que entendem ser possível, para reduzir a
menoridade penal com menos de 1% dos adolescentes do país em conflito com a
lei.
A tentativa de modificar-se o ECA, como forma de implantar por lei ordinária
algum desvio que drible a vedação constitucional, também é indefinida e mascara
com remédio errado diagnóstico conhecido, mas não revelado. O antitérmico que
abaixa a febre pode matar, se impede a descoberta da causa. Não resolve aumentar
o tempo das medidas.
Claro que são necessárias mudanças no ECA. Não existe construção humana
perfeita, logo, é possível que o ECA precise de escoras e reparos. Mas, nesse clima,
rascunhando sobre a perna, com as apressadas opiniões públicas manipuladas pela
imprensa pressionando o legislativo, como pensar em mudar lei à qual se quer se
deu chance de ação ampla e aplicação efetiva das normas já existentes.
3.1. As causas determinantes do aumento dos atos infracionais praticados por
menores
As principais causas que determinam o aumento alarmante da criminalidade
infantil e adolescente em nosso País, como se pode ver nos principais meios de
comunicação, não se alteraram muito com o decorrer dos anos.
Dentro dessas causas destaca-se, o problema social que agride a maioria da
população brasileira há muito tempo, haja vista os altos níveis de miséria e pobreza,
24
em que vivem os brasileiros, ocasionando o aumento, cada vez maior, do número de
menores abandonados nas ruas das cidades, sobretudo nos grandes centros, onde
o crescimento demográfico salta aos olhos. É incontestável o grande número de
menores que cometem atos infracionais encontra-se entre aqueles de baixa ou
nenhuma renda, comprovando que a questão econômica é o carro chefe da origem
e do aumento da criminalidade.
Já nos primeiros dias de sua vida, a criança é carente dos mais básicos de
seus direitos, que é a alimentação. Essa carência já determina o que será do menor
em termos de funcionamento cerebral, uma vez que a desnutrição na infância, na
maioria das vezes, já condena o indivíduo para o resto da vida a uma situação de
inferioridade intelectual, que o levará, a enfrentar dificuldades de enquadramento
socioeconômico e como consequência a marginalização.
Essa marginalização integra vários outros fatores, vinculados à família da
criança e do adolescente, tais como, desemprego, baixa renda, falta de moradia ou
até em mendicância. Esses fatores levam, na maioria das vezes, os pais dos
menores a adquirirem vícios, sobretudo do álcool, e a desenvolverem
comportamentos nada aconselháveis ao desenvolvimento de uma criança, como
violência com os filhos, seja ela moral, física ou sexual.
É alarmante o número de menores que sofrem violência dos pais, desde a
infância, devendo merecer uma profunda análise da sociedade e do governo, que
não possa mais se abster de aceitar esse problema como uma das causas principais
do aumento da criminalidade dos menores de idade (Márcia Maria Milanez Carneiro,
1999). Além disso, na maioria dos casos, menores que sofrem violência da família,
transmitirão esta violência para seus filhos, gerando um círculo vicioso, que contribui
para transportar esta violência para as ruas.
Conjugado a esse problema, há a prostituição infantil, o uso de drogas, como
por exemplo, a ingestão de cola, para enganar a fome, uso do crack que gera
dependência imediata ao ser fumado, a ausência ou insuficiência de escolaridade,
famílias numerosas, dando origem às favelas que geralmente encontram-se
distribuídas nos arredores dos bairros mais ricos, localizados nas melhores zonas
das cidades, gerando, com isso, o aumento ainda maior da revolta e da
marginalização, cada vez mais violentas.
25
As causas dessa criminalidade, todavia, atravessam os problemas de ordem
socioeconômico, alcançando, sobretudo, famílias que não sofrem destas carências.
Entre elas, encontramos a principal que é a permissividade dos pais, que não
impõem limites de ordem disciplinar ao menor, criando verdadeiros transgressores
da ordem social.
Destacam-se, ainda, outras causas como a instabilidade emocional, como
problemas psicológicos, interesse por jogos de fliperama, que acabam viciando o
menor desde criança, crise conjugal dos pais, desestrutura familiar, precedente
infracional familiar, ócio e tédio, influência dos meios de comunicação, que levam ao
menor, imagens de violência, sexo, drogas, de maneira explícita e chocante,
embutido no mesmo que, sem possibilidade mental de filtrá-las, acaba por absorvê-
las psicologicamente como algo normal.
Finalmente, hoje em dia, uma grave causa dessa criminalidade, é o
aliciamento de adolescentes e crianças pelos maiores para a prática de atos
infracionais, formando verdadeiras "quadrilhas de menores", aproveitando da
inimputabilidade daqueles, sobretudo no caso de tráfico de drogas.
O problema da criminalidade e marginalização do menor vem crescendo
assustadoramente no Brasil, trazendo a questão da maioridade penal com um dos
temas mais polêmicos e discutidos em nossa sociedade, colocando, de um lado, em
julgamento a eficácia e aplicabilidade das medidas sócio-educativas contida no
Estatuto da Criança e do Adolescente e, de outro, a discussão daquelas causas, no
entendimento que o seu combate é a única maneira capaz de diminuir o problema.
26
4.Metodologia
O presente estudo, suscitou reflexão e análise da polêmica possibilidade,
necessidade e utilidade da redução da maioridade penal no ordenamento jurídico
vigente. Para estudar o tema, foram utilizados procedimentos metodológicos
científicos para realizar os objetivos propostos, através de uma pesquisa, de
abordagem qualitativa e de natureza bibliográfica. Segundo Minayo(2002, p.22), no
que refere-se, sobre o estudo qualitativo, preconiza:
A pesquisa qualitativa se preocupa com um nível de realidade que
não pode ser quantificado trabalho com universo de significados,
motivos, aspirações, crenças. Valores e atitudes a que corresponde
há um espaço mais profundo das relações do processos e dos
fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de
variáveis.
Na revisão de literatura, foi feita uma pesquisa bibliográfica, afim de
fundamentar a proposta da pesquisa. Diante, essa realidade, com relação ao
método de procedimento técnico bibliográfico, Gil (2007, p.44) afirma:
a pesquisa bibliográfica é desenvolvida a partir de material já elaborado, constituído principalmente de livros e artigos científicos. Embora em quase todos os estudos seja exigido algum tipo de trabalho desta natureza, há pesquisas desenvolvidas exclusivamente a partir de fontes bibliográficas. Boa parte dos estudos exploratórios pode ser definida como pesquisas bibliográficas.
Foram analisados através da fundamentação teórica as informações
coletadas, as quais compõe o conhecimento teórico acumulado sobre o assunto em
questão.
27
5.Considerações finais
Há quem argumente que a redução da maioridade seria plenamente
justificável em face da capacidade de entendimento do menor de dezesseis anos,
pois, a ele é dado o direito de votar. Tal argumento não merece respaldo, pois além
do fato de o voto para eles não ser obrigatório, também estão sujeitos às medidas
do Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA, inclusive à medida máxima da
internação, que equivale à prisão para os adultos.
Defender a postura de redução da maioridade penal de dezoito para
dezesseis anos é andar na contramão da história, pois se sabe da falência do
sistema prisional brasileiro. As pessoas pouco informadas, que tendem a defender a
redução, e isto o fazem impulsionado pelo calor dos acontecimentos, por mero
casuísmo, com sede de vingança, deveriam examinar com atenção quais seriam as
medidas mais justas para conter a criminalidade.
Conforme noticiários dos telejornais, os dois maiores grupos de criminosos
que atualmente aterrorizam as maiores cidades do Brasil nasceram dentro de
nossos presídios: o Comando Vermelho, no Rio de Janeiro, e o Primeiro Comando
da Capital, em São Paulo. Isso reforça a ideia da ineficiência dos nossos presídios
para a recuperação ou ressocialização dos criminosos, pois dificilmente um
condenado que ali permaneça por um determinado período conseguirá reabilitar-se
para o convívio social, sem praticar mais crimes.
No contexto deste trabalho, analisamos as duas correntes que se posicionam
de maneira sólidas, argumentadas e patrocinadas por juristas renomados no cenário
penal brasileiro quanto as propostas de emendas à Constituição. Aqueles que
defendem a redução alegam que o jovem com dezesseis anos já se encontra
maduro em todos os sentidos, de modo a entender claramente o caráter ilícito de
sua conduta e a determinar-se de acordo com esse entendimento. Outros entendem
que o amadurecimento ainda não é pleno e que a redução da idade penal traria um
retrocesso, pois, o sistema penitenciário aplicado ao maior de dezoito anos é ainda
arcaico e rudimentar.
Questiona-se: Se o menor hoje com dezesseis anos tem o senso de
discernimento mínimo para saber com segurança o que é uma ilicitude, e o mais
importante, reconhecendo o caráter errado de sua atuação.
28
Diante dos avanços verificados na sociedade e do progresso intelectual vivido
pelo jovem com dezesseis anos, não há dúvida que a resposta é afirmativa,
principalmente levando-se em consideração que nessa idade, é permitido exercer o
direito soberano do voto. No entanto, existe um grande abismo entre a aptidão à
maioridade plena, ou seja, estar apto a assumir a responsabilidade por um crime
praticado, e a estrutura de que dispõe o sistema penitenciário brasileiro para
albergar criminosos, hoje corrompido, cruel, e, o que é mais grave, dissociado do
princípio basilar do estado de direito.
Nesse sentido, a idade penal não deve ser reduzida enquanto existir a atual
estrutura, pois como já ocorre com os criminosos, a cadeia de hoje, longe de cumprir
com sua função ressocializadora, funciona como uma espécie de escola para
formação de delinquentes. Inserir nessa estrutura menores de dezoito anos seria
uma agressão à sociedade e um retrocesso às funções do Estado que em última
análise tem o dever constitucional de prover o bem estar e a dignidade da pessoa
humana, princípios, excessivamente enfatizados e valorizados no novo Código Civil.
A solução para o problema da violência entre crianças e jovens é a prevenção
primária, por meio das estratégias cientificamente comprovadas, facilmente
replicáveis e definitivamente muito mais baratas do que a recuperação de crianças e
adolescentes que cometem atos infracionais graves contra a vida.
A prevenção primária da violência inicia-se com a construção de um tecido
social saudável e promissor, que começa antes do nascer, com um bom pré-natal,
parto de qualidade, aleitamento materno exclusivo até seis meses e o complemento
até mais de um ano, vacinação, educação infantil, principalmente propiciando o
desenvolvimento e o respeito à fala da criança, a oração, o brincar, o andar, o jogar;
uma educação para a paz e a não violência.
A segunda área da maior importância nessa prevenção primária da violência
envolvendo crianças e adolescente é a educação, a começar pelas creches, escolas
infantis e de educação essencial e de nível médio, que devem valorizar o
desenvolvimento do raciocínio e a matemática, a música, a arte, o esporte e a
prática da solidariedade humana, princípio fundamental para o crescimento
intelectual do ser humano.
Desta forma, se a análise for feita no sentido de se saber o que o legislador
objetiva com a mudança na lei, chega-se à conclusão de nada adiantará reduzir a
idade de imputação para dezesseis anos ou para qualquer idade. Compromissos
29
com os resultados implicam em implantação dos programas sócio-educativos para
os que já infringiram a lei, programas preventivos para aqueles que ainda não
inflacionaram e, obviamente, políticas sociais básicas e políticas compensatórias
para corrigir as desigualdades sociais.
Vale ressaltar que as medidas urgentes para aplacar o clamor popular,
resultam em legislações com imperfeições que podem complicar em vez de dirimir
conflitos. Por esses motivos, as propostas de redução da maioridade penal
apresentam-se eivadas de inconstitucionalidade, tanto por afrontar os princípios e
racionalidades constitucionais, como também por violar cláusulas pétrea consagrada
pela Constituição Federal, regra do art. 228, que o Estado Brasileiro se
comprometeu a cumprir por ocasião da Convenção sobre os Direitos da Criança,
ratificada pelo Brasil em 1990.
Com base nessa visão, acredita-se que a redução do índice de delinquência
da massa juvenil somente será alcançada mediante a concretização de uma efetiva
justiça social, com melhor distribuição de renda, respeito aos direitos e garantias
individuais, mediante a sintonia de todos os segmentos da sociedade (família,
sociedade, incluindo a escola) e estado fortalecendo a ideia daqueles que acreditam
e apostam no potencial da nova geração, sem rótulos ou estigmas, apenas jovens
brasileiros.
Portanto, admiti-se que a cadeia não é a solução, pois, não adianta reduzir o
limite de idade para efeitos penais se não se buscar reduzir, principalmente, os
índices de analfabetismo e desigualdades que vigoram no país.
30
5 Referências
CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal.13.ed. São Paulo : Saraiva, 2009. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988.<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso 12 Nov. 2012. GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas,
2007.
GRECO, Rogério. Código Penal.4. ed.Niterói, RJ: Impetus, 2010.
MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. São Paulo : Atlas, 2009.
MINAYO, Maria Cecília de Souza. Pesquisa Social: Teoria, método e criatividade,
2002.
PESSANHA, B. L. Juliana. Redução da Maioridade Penal: Esse é o caminho? Disponível em: <http://www.emerj.tjrj.jus.br/paginas/trabalhos_conclusao/1semestre2009/trabalhos_12009/julianapessanha.pdf>. Acesso em 10. Nov 2012.
RANGEL,Mauricio. A Constitucionalidade da Redução da Maioridade penal em face de sua Natureza de Regra de Política Criminal. Disponível em: <http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=8036> Acesso em 17 Nov 2012.
REVISTAVIRTUAL. Disponível em <http://www.revistavirtual.net/index1.asp?qm=p&ed=2&c=234. Acesso em 14 Nov. 2012.
RECANTODASLETRAS. Prós e contras: Uma breve análise da redução da maioridade penal no Brasil. Disponível em: <http://www.recantodasletras.com.br/textosjuridicos/2640833>. Acesso em 15 Nov 2012.