ESTIMATIVA DO BALANÇO HÍDRICO NA BACIA -UBÁ

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ESTIMATIVA DO BALANO HDRICO NA BACIA EXPERIMENTAL/REPRESENTATIVA DE SANTA MARIA/CAMBIOC MUNICPIO DE SO JOS DE UB - RJ

MARCONI FONSECA DE MORAES

TESE SUBMETIDA AO CORPO DOCENTE DA COORDENAO DOS PROGRAMAS DE PS-GRADUAO DE ENGENHARIA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO COMO PARTE DOS REQUISITOS

NECESSRIOS PARA A OBTENO DO GRAU DE DOUTOR EM CINCIAS EM ENGENHARIA CIVIL.

Aprovada por: ______________________________________ Prof. Rui Carlos Vieira da Silva, D.Sc.

______________________________________ Profa. Luciene Pimentel da Silva, Ph.D.

______________________________________ Prof. Jos Paulo Soares de Azevedo, Ph.D.

______________________________________ Prof. Flvio Csar Borba Mascarenhas, D.Sc.

______________________________________ Profa. Yvonilde Dantas Pinto Medeiros, Ph.D.

RIO DE JANEIRO, RJ - BRASIL MARO DE 2007

MORAES, MARCONI FONSECA DE Estimativa do Balano Hdrico na bacia Experimental/Representativa de Santa

Maria/Cambioc - Municpio de So Jos de Ub [Rio de Janeiro] 2007. XVIII, 233p. 29,7cm (COPPE/UFRJ, D.Sc. Engenharia Civil, 2007). Tese - Universidade Federal do Rio de Janeiro, COPPE 1. 2. 3. 4. Microbacias Balano hdrico Bacia experimental Pequenas bacias I. COPPE/UFRJ II. TTULO (Srie)

II

Ao amor, que nos faz sentir: leve, solto, feliz, ..... e vivo, personificado em minha esposa. Dedico.

III

" Se teus esforos forem vistos com indiferena, nunca desanimes, pois o sol, ao nascer, d o maior espetculo e, mesmo assim, a maioria da platia continua dormindo."(Autor desconhecido)

IV

AGRADECIMENTOS

A Deus, fora sempre presente em minha vida, pela luz mostrando o caminho a seguir. Profa. Luciene Pimentel da Silva por ter me orientado com extrema dedicao e sensatez, pelo apoio e confiana. Ao Prof. Rui Carlos Vieira da Silva, sempre confiante, pela orientao e acompanhamento neste trabalho. Ao D.Sc. Jos Ronaldo de Macedo pelo constante incentivo e apoio nas visitas de Campo. Ao Prof. Theophilo Benedicto Ottoni Filho pelo acompanhamento no incio do projeto de pesquisa. Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico CNPq pela concesso da bolsa de estudos para a realizao deste trabalho. Ao FINEP/CT-HIDRO, bolsa do Programa de Iniciao Cientfica PIBIC/UERJ atravs do Projeto Estudos hidrolgicos de balano hdrico da bacia hidrogrfica do rio So Domingos, RJ e bolsa de doutorado. EMBRAPA-CNPS, coordenadora do Projeto de Gesto Participativa de Subbacias do rio So Domingos (GEPARBH - Edital 02/2002). Ao Programa de Ps-Graduao em Engenharia de Computao - rea de concentrao Geomtica, Universidade Estadual do Rio de Janeiro UERJ. Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM) pelo apoio ao monitoramento, atravs do funcionrio Eugnio Batista. equipe da EMBRAPA-CNPS, em especial aos pesquisadores Slvio Bhering, Beth Brando, Rachel Prado, Alexandre Ortega e Elaine Fidalgo e aos tcnicos Fabiano e Gustavo, pelo apoio e colaborao ao longo do trabalho. minha esposa, Cristiane Campos de Oliveira Moraes, pela compreenso e carinho nos momentos difceis, estando sempre ao meu lado. minha famlia, base que me sustenta emocionalmente, pelo incentivo. s alunas Priscila Ribeiro Moreira e Daniele Pereira Batista pelo apoio e dedicao aos trabalhos realizados. Ao amigo Ernani Bellon pela ateno e apoio no desenvolvimento da tese. Yda de Alcntara Machado, pessoa de grande sabedoria, pela amizade e carinho.V

Resumo da Tese apresentada COPPE/UFRJ como parte dos requisitos necessrios para obteno do grau de Doutor em Cincias (D.Sc.). ESTIMATIVA DO BALANO HDRICO NA BACIA EXPERIMENTAL/REPRESENTATIVA DE SANTA MARIA/CAMBIOC MUNICPIO DE SO JOS DE UB Marconi Fonseca de Moraes Maro/2007 Orientadores: Rui Carlos Vieira da Silva Luciene Pimentel da Silva Programa: Engenharia Civil

Esta tese se baseou no estudo dos processos fsico-ambientais, atravs do monitoramento de regio hidrogrfica experimental e representativa tanto das caractersticas fisiogrficas quanto da organizao social e caractersticas

socioeconmicas da Regio Noroeste do Estado do Rio de Janeiro - Brasil, com vistas ao estudo da disponibilidade hdrica e recuperao da degradao ambiental em que se encontra a regio como um todo. Os estudos experimentais esto inseridos na bacia hidrogrfica do rio So Domingos, afluente do rio Muria, e este, do rio Paraba do Sul, abrange, principalmente, o municpio de So Jos de Ub, um dos que apresentam situao mais crtica na Regio. A bacia do rio So Domingos, que tem limites praticamente coincidentes com os do Municpio, apresenta rea de 280km2 e expressa a realidade fundiria da Regio, guardando similaridades com outras regies inseridas nas zonas montanhosas do Sudeste brasileiro. Foi implantado um posto fluviomtrico, localizado logo a jusante da juno dos crregos de Santa Maria e de Cambioc, denominado localmente de Valo Preto, com uma rea de aproximadamente 13,5km2, que drena suas guas para o rio So Domingos. No posto fluviomtrico, foram monitorados nveis dgua e concentrao de sedimentos em suspenso. A partir dos nveis dgua e de medies de descarga, foram obtidas sries de vazes observadas. Alm do monitoramento fluviomtrico, foi estabelecida tambm a observao da precipitao e da temperatura em trs locais na bacia de Santa Mara/Cambioc. Todos os dados foram registrados a cada quinze minutos e considerou-se, para estes estudos, o perodo entre abril de 2005 e agosto de 2006.

VI

Abstract of Thesis presented to COPPE/UFRJ as a partial fulfillment of the requirements for the degree of Doctor of Science (D.Sc.).

ESTIMATIVE OF WATER BALANCE IN CATCHMENT EXPERIMENTAL/REPRESENTATIVE OF SANTA MARIA/CAMBIOC MUNICIPALITY OF SO JOS DE UB

Marconi Fonseca de Moraes March/2007

Advisors: Rui Carlos Vieira da Silva Luciene Pimentel da Silva

Department: Civil Engineering

This thesis is based on the study of the physical and environmental processes that have been monitored on an experimental catchment which typifies both the physiographic characteristics and social- economic organization of the northwest of Rio de Janeiro state in Brazil. It concerns the study of water availability and the retrieval of regions environmental conditions as a whole. The experimental studies have taken place in the So Domingos river catchment, a tributary of the Muria river, which is a tributary of the Paraba do Sul, flowing through the municipality of Sao Jos de Ub, one of the most seriously degraded areas in the region. So Domingos watershed , practically coincides with the limits of the municipality, complying an area of 280 km2 , that typifies the land property system of the mountainous regions of the southeast of Brazil. A gauge station was set up downstream of the confluence of Santa Maria and Cambioc streams, a river reach locally known as Valo Preto (Dark Ditch). There, comprising a drainage area of approximate 13 km2, the water levels and the suspension sediment concentrations were monitored. Based on water levels and discharge measurements a temporal streamflow series were generated. Besides the streamflow, the precipitation and the temperature were also monitored in three plots of Santa Maria / Cambioc catchment. The data was recorded every 15 minutes during the period ranging from April 2005 to August 2006.

VII

LISTA DE FIGURAS

Figura 2.1 Figura 2.2 Figura 2.3 Figura 2.4

Transformao demogrfica no Brasil................................................. Percentuais de uso da gua.................................................................... Consumo de gua para produzir uma tonelada do produto............... Produtividades mdias de culturas irrigadas e no irrigadas no Brasil........................................................................................................

10 12 15

16

Figura 3.1

Representao

esquemtica

das

fases

associadas

ao

ciclo 43

hidrolgico............................................................................................... Figura 3.2 Situao estimada atual das captaes de gua doce no Brasil por setor.......................................................................................................... Figura 4.1 Figura 4.2 Figura 4.3 Figura 4.4 Figura 4.5 Figura 4.6 Diviso poltica do estado do Rio de Janeiro....................................... Distribuio da populao na regio Noroeste Fluminense................ Comparativo da evoluo do PIB (R$ correntes)................................ Bacia hidrogrfica do Paraba do Sul................................................... Vulnerabilidade atual eroso na bacia do rio Muria...................... Localizao das comunidades no municpio So Jos de Ub: bacia do rio So Domingos.............................................................................. Figura 4.7 Nmero de habitantes nas maiores comunidades rurais do municpio de So Jos de Ub............................................................... Figura 4.8 Figura 4.9 Anos de estudo por populao acima de 10 anos de idade.................. Cenas registradas em So Jos de Ub, na estao seca de 1999........

56 59 60 63 66 69

74

76 77 79

Figura 4.10 Localizao do municpio de So Jos de Ub na bacia hidrogrfica do Paraba do Sul................................................................................... Figura 4.11 Construes de reservatrios nas comunidades rurais municpio de So Jos de Ub.................................................................................. Figura 4.12 Localizao da bacia experimental/representativa de Santa Maria/ Cambioc, municpio de So Jos do Ub RJ................................... Figura 4.13 Acesso bacia Santa Maria/Cambioc (RJ-186)................................ Figura 4.14 Localizao da bacia representativa/experimental de Santa Maria/ Cambioc em relao s bacias vizinhas RJ...................................... 86 85 85 81 80

VIII

Figura 4.15 Localizao dos perfis de solos, na microbacia de Santa Maria (azul) e Cambioc (rosa)......................................................................... Figura 4.16 Rede de drenagem da microbacia experimental/representativa de Santa Maria/Cambioc........................................................................... Figura 4.17 Modelo digital do terreno, localizao geogrfica da rede de drenagem.................................................................................................. Figura 4.18 Ocorrncia da elevao na microbacia de Santa Maria/Cambioc... Figura 4.19 Modelo digital do terreno, declividade da microbacia de Santa Maria/Cambioc...................................................................................... Figura 4.20 Exemplos de tempos de concentrao calculados em bacias rurais... Figura 5.1 Barragem e reservatrio construdos por agricultores para fins lucrativos.................................................................................................. 100 Figura 5.2 Evoluo do nmero de ocorrncias de doenas infecciosas e parasitrias com necessidade de internao no municpio de So Jos de Ub.............................................................................................. 101 Figura 5.3 Pontos de instalao dos pluvimetros na microbacia de Santa Maria e Cambioc................................................................................... 104 Figura 5.4 Diagrama do sistema de coleta de dados meteorolgicos da estao termopluviomtrica de baixo custo...................................................... Figura 5.5 Instrumentos de monitoramento termopluviomtrico no posto Santa Maria (C12), altitude 156m........................................................ Figura 5.6 Sensor de temperatura e pluvimetro (C13), instalado junto estao fluviomtrica.............................................................................. Figura 5.7 Figura 5.8 Figura 5.9 106 105 105 93 94 90 90 89 87

Local da estao fluviomtrica - leito rochoso...................................... 108 Vertedor em funcionamento (maro 2005)........................................... 110 Ponte construda para monitoramento fluviomtrico (dez. 111

2004)....................................................................................................... Figura 5.10 Detalhamento do posto fluviomtrico Santa

Maria/Cambioc...................................................................................... 112 Figura 5.11 Calibrao do vertedor: uso micro molinete....................................... Figura 5.12 Curva-chave seo vertedouro posto fluviomtrico Fazenda Joo Linhares.......................................................................................... 114 114

IX

Figura 5.13 Medies de velocidades com molinete, perodo de cheia: posto fluviomtrico Joo Linhares.................................................................. Figura 5.14 Curva-chave seo vertedor afogado posto fluviomtrico Joo Linhares................................................................................................... Figura 5.15 Posicionamento das Referncias de Nvel posto fluviomtrico Joo Linhares.......................................................................................... Figura 5.16 Tela de configurao da estao SOLAR, ajustada para intervalos de quinze minutos entre as leituras....................................................... 118 Figura 5.17 Tela para a edio da expresso de escolha ou edio da curva chave......................................................................................................... 119 Figura 5.18 Localizao das estaes SOLAR e NOVUS ....................................... Figura 5.19 Comparao dos dados de chuva entre os postos da bacia Santa Maria/Cambioc e Itaperuna: anos 2005 e 2006 ................................. 122 Figura 5.20 Comparao entre os dados pluviomtricos coletados na 120 117 116 115

microbacia representativa de Santa Maria/Cambioc e o posto de Itaperuna.................................................................................................. 125 Figura 5.21 Temperaturas mdias dirias - 2005..................................................... 129 Figura 5.22 Temperaturas mdias dirias - 2006..................................................... 131 Figura 5.23 Anlise das temperaturas nas estaes C11 e C13 exutrio da microbacia Santa Maria/Cambioc....................................................... 132 Figura 5.24 Horrio de ocorrncia das temperaturas mximas e mnimas........... 133 Figura 5.25 Variao diria das temperaturas......................................................... 134 Figura 5.26 Anlise das temperaturas mdias mensais na bacia de Santa Maria/Cambioc..................................................................................... Figura 5.27 Temperaturas mdias mensais na bacia experimental e em Itaperuna - ano 2005............................................................................... 135 Figura 5.28 Temperaturas mdias mensais na bacia experimental e em Itaperuna - ano 2006............................................................................... 136 Figura 5.29 Temperaturas mdias mensais na bacia experimental e em Miracema - ano 2005............................................................................... 137 Figura 5.30 Temperaturas mdias mensais............................................................. Figura 5.31 Comparao mensal entre os dados de temperatura e de chuva Anos: 2005 e 2006.................................................................................... 139X

134

137

Figura 5.32 Comparao diria entre os dados do posto C12 e Itaperuna janeiro e junho de 2006......................................................................... Figura 5.33 Comparao diria entre os dados de temperatura e de chuva dos postos (27/01/2006).................................................................................. 141 Figura 5.34 Variao dos nveis dgua no posto fluviomtrico da bacia experimental/representativa de Santa Maria/Cambioc Estao SOLAR .................................................................................................... 145/146 Figura 5.35 Comparao da variao dos nveis dgua no posto fluviomtrico da bacia experimental/representativa de Santa Maria/Cambioc Estao SOLAR e NOVUS................................................................... 149 Figura 5.36 Comparao dos dados nveis dgua SOLAR x NOVUS.................. Figura 5.37 Registros de vazes no posto fluviomtrico da bacia experimental/ representativa de Santa Maria /Cambioc........................................... 153/154 Figura 5.38 Comparao dados do termopluvimetro: chuva e os dados da estao fluviomtrica - nveis dgua e vazes...................................... 156 Figura 5.39 Comparao das vazes mdias mensais entre posto fluviomtrico Joo Linhares e posto de Itaperuna.................................................... Figura 5.40 Variao da carga de slidos suspensos no posto fluviomtrico da bacia experimental/representativa de Santa Maria/Cambioc Estao SOLAR...................................................................................... 159/160 Figura 5.41 Local de monitoramentos do consumo de gua em propriedades pilotos em diferentes etapas do cultivo do tomate (comunidade de 157 150 140

Barro Branco).......................................................................................... 164 Figura 5.42 Localizao das principais comunidades da bacia do rio So Domingos: em destaque Barro Branco, Santa Maria e Cambioc.... Figura 5.43 Culturas de inverno e vero na bacia hidrogrfica do rio So Domingos: em destaque, a microbacia de Santa 167 164

Maria/Cambioc............................................................................ Figura 6.1 Totais mensais de precipitao em Santa Maria/Cambioc e em Itaperuna.......................................................................................

174

XI

Figura 6.2

Totais dirios de evapotranspirao em Itaperuna e no posto de Cambioc na bacia experimental de Santa Maria/Cambioc............. 177

Figura 6.3

Comparao entre as temperaturas mensais de Miracema e Cambioc (bacia experimental) - maro a outubro - 2005................ 179

Figura 6.4

Totais mensais de evapotranspirao calculadas pelo mtodo combinado de Penman (Miracema) e Thornthwaite (Cambioc na bacia experimental de Santa Maria/Cambioc) abril a 180

outubro de 2005............................................................................. Figura 6.5 Totais mensais de evapotranspirao em Itaperuna e no posto de Cambioc na bacia experimental de Santa Maria/Cambioc Mtodo Penman............................................................................. Figura 6.6 Balano hdrico para a bacia experimental/representativa de Santa Maria/Cambioc............................................................................

180

185

XII

LISTA DE TABELAS

Tabela 2.1

Vazo

per

capita

no

meio

rural,

conforme

o

estado 13 42

considerado............................................................................................. Tabela 3.1 Tabela 3.2 Perodo de renovao da gua em diferentes reservatrios na Terra Populao e rea agrcola sustentvel para as regies do mundo....................................................................................................... Tabela 3.3 Consumo mdio dirio, em litros/hab.dia, para reas rurais em pases em desenvolvimento..................................................................... Tabela 3.4 Tabela 3.5 Tabela 3.6 Demanda anual de gua para a irrigao nas regies do Brasil......... reas irrigadas pelos diferentes mtodos de irrigao em 2001......... Evoluo das reas irrigadas no mundo e na Amrica do Sul (mil hectares): perodo de 1975 a 2000.......................................................... Tabela 4.1 Tabela 4.2 Variao na produo de culturas de 2002 a 2003............................... Mapeamento do uso do solo e cobertura vegetal no Estado do Rio de Janeiro................................................................................................. Tabela 4.3 Comunidades Ub................. Tabela 4.4 Tabela 4.5 Tabela 4.6 Tabela 4.7 Tabela 4.8 Tabela 4.9 Populao residente no municpio de So Jos de Ub..................... Unidades Ambulatoriais do municpio de So Jos de Ub................ Critrio para escolha da microbacia hidrogrfica (MBH)................. Descrio geral dos solos da microbacia Santa Maria/Cambioc...... Declividade e comprimento do curso dgua principal....................... Valores obtidos para o Tempo de concentrao.................................. das caractersticas fsicas da microbacia existentes no municpio de So Jos de

54

55 57 58

58 65

70 73

75 78 86 88 93 94

Tabela 4.10 Quadro-resumo

experimental/representativa de Santa Maria/Cambioc.................... Tabela 5.1 Resultado do censo populacional das comunidades de Santa Maria e Cambioc em 2004............................................................................... Tabela 5.2 Tabela 5.3 Tabela 5.4 Percentagem da populao adulta em atividades no rurais 2004.. Ocupao dos adultos das duas comunidades 2004.......................... Maiores dificuldades das comunidades de Santa Maria e Cambioc

95

97 97 98

em sade................................................................................................... 102 Tabela 5.5 Cabealho das cadernetas utilizadas para anotar diariamente asXIII

leituras registradas pelos pluvimetros ............................................... Tabela 5.6 Estao hidrossedimentolgica SL 2000 MIM, SOLAR

107

Instrumentao Ltda.............................................................................. 113 Tabela 5.7 Tabela 5.8 Classificao das intensidades de chuva............................................... Percentual de falhas ocorridas no posto fluviomtrico, de abril/2005 a agosto/2006 (Estao SOLAR)......................................... Tabela 5.9 Dados registrados de nveis dgua, cotas mximas e mnimas para as estaes NOVUS e SOLAR............................................................... Tabela 5.10 Percentual de falhas ocorridas no posto fluviomtrico, 148 146 126

monitoramento de slidos suspensos de abril/2005 a julho/2006 (Estao SOLAR 2000)........................................................................... 161 Tabela 5.11 Consumo de gua por propriedade por tipo de irrigao................... 166 Tabela 5.12 Plantaes desenvolvidas em Santa Maria/Cambioc......................... 167 Tabela 5.13 Consumo mensal de gua para abastecimento na bacia de Santa Maria/Cambioc..................................................................................... Tabela 5.14 Estimativa do consumo de gua na irrigao para o cultivo de inverno na bacia de Santa Maria/Cambioc........................................ 169 Tabela 5.15 Estimativa do consumo de gua na irrigao para o cultivo de inverno e vero na bacia de Santa Maria/Cambioc........................ Tabela 6.1 Altura de chuva mdia mensal em Santa Maria/Cambioc............... Tabela 6.2 Evapotranspirao em Santa Maria/Cambioc pelo mtodo de Thornthwaite................................................................................. Tabela 6.3 Vazes mdias mensais, bacia experimental/representativa de Santa Maria/Cambioc............................................................................ Tabela 6.4 Estimativa do armazenamento de gua na bacia (s) bacia 184 181 176 169 173 168

experimental/representativa de Santa Maria/Cambioc.................. Tabela 6.5 Dficits (DEF), Excessos (EXC) anuais, para regio Norte Fluminense (1971-2000).................................................................. Tabela 6.6 Anlise das vazes e do armazenamento na bacia de Santa Maria/Cambioc com restituio do consumo na irrigao.............

185

187

XIV

SUMRIO 1 INTRODUO........................................................................................................ 1.1 Justificativa e relevncia do tema.................................................................... 1.2 Objetivos............................................................................................................. 1.2.1 Objetivos gerais.......................................................................................... 1.2.2 Objetivos especficos.................................................................................. 1.3 Metodologia e estrutura de apresentao da tese........................................... 2 BACIAS RURAIS E GESTO PARTICIPATIVA............................................. 2.1 Caracterizao das bacias rurais..................................................................... 2.2 Uso dos recursos hdricos em bacias rurais..................................................... 2.2.1 Consumo de gua em bacias rurais: atividade de irrigao....................... 2.2.2 Uso de gua e o aumento da produtividade em bacias rurais.................... 2.2.3 Reduo do uso dos recursos hdricos em bacias rurais............................ 2.3 Impactos das atividades antrpicas................................................................. 2.3.1 Perda de solo Eroso.............................................................................. 2.3.2 Contaminao dos recursos hdricos pela agricultura............................... 2.3.3 O uso de agrotxicos................................................................................. 2.4 Estratgias para reduo dos impactos e recuperao da 27 29 1 1 3 3 4 5 9 9 11 14 15 16 18 20 22 25

disponibilidade hdrica.................................................................................... 2.4.1 Gesto participativa.................................................................................. 2.4.2 Mtodos alternativos ou complementares de controle de pragas e doenas de plantas e de ervas daninhas.................................................. 2.4.3 Controle biolgico e manejo integrado de pragas.................................... 2.4.4 Sistema de manejo do solo....................................................................... 2.5 Bacias experimentais e representativas .......................................................... 3 ESTUDOS DE BALANO HDRICO.................................................................. 3.1 Fundamentos das anlises de balano hdrico................................................ 3.2 Equaes de balano hdrico ............................................................................ 3.2.1 Evapotranspirao...................................................................................... 3.2.2 Precipitao................................................................................................ 3.2.3 Interceptao pela cobertura vegetal......................................................... 3.2.4 Infiltrao...................................................................................................

32 33 34 37 41 41 44 44 46 47 48XV

3.2.5 Armazenamento superficial....................................................................... 3.2.6 Escoamento superficial.............................................................................. 3.3 Demanda em bacias rurais................................................................................ 4 CARACTERIZAO DA REA DE ESTUDO................................................. 4.1 A regio Noroeste Fluminense.......................................................................... 4.1.1 Histrico.................................................................................................... 4.1.2 A agricultura fluminense nas ltimas dcadas.......................................... 4.1.3 Anlise de atores dos recursos hdricos ................................................... 4.1.4 Modificaes dos padres do solo............................................................ 4.1.5 Impactos das aes antrpicas ................................................................. 4.2 Municpio de So Jos do Ub: a bacia hidrogrfica do rio So Domingos........................................................................................................... 4.2.1 Populao e indicadores socioeconmicos.............................................. 4.2.2 Caractersticas fsico-ambientais.............................................................. 4.3 A bacia experimental e representativa de Santa Maria/Cambioc............... 4.3.1 Estratgia e escolha da bacia de Santa Maria/Cambioc......................... 4.3.2 Localizao da bacia experimental/representativa de estudo................... 4.3.3 Caractersticas fisiogrficas do stio experimental................................... 5 MONITORAMENTO SOCIOAMBIENTAL....................................................... 5.1 Indicadores socioeconmicos............................................................................

49 51 53 59 59 59 63 66 68 71

72 74 78 82 82 84 86 96 96

5.2 Monitoramento hidroclimatolgico................................................................. 102 5.3 Monitoramento hidrossedimentomtrico........................................................ 108 5.3.1 Escolha do local........................................................................................ 108 5.3.2 Estabelecimento do posto fluviomtrico................................................... 110 5.4 Anlise de consistncia de dados hidroclimticos e fluviomtricos............... 120 5.4.1 Dados pluviomtricos................................................................................ 120 5.4.1.1 Anlise das intensidades de chuva............................................... 126 5.4.1.2 Anlise dos perodos mais chuvosos e mais secos...................... 127 5.4.2 Dados de temperaturas............................................................................... 127 5.4.2.1. Anlise das temperaturas mdias dirias.................................... 128 5.4.2.2 Avaliao do horrio de ocorrncia dos registros mximos e mnimos de temperatura............................................................. 132 5.4.2.3 Anlise da variao diria das temperaturas................................ 133XVI

5.4.2.4 Anlise das temperaturas mdias mensais.................................. 134 5.4.2.5 Anlise integrada das observaes de chuva e de

temperatura................................................................................ 138 5.4.3 Dados fluviomtricos.................................................................................. 141 5.4.3.1 Nveis d' gua................................................................................ 142 5.4.3.2 Dados de vazes........................................................................... 150 5.4.3.3 Slidos suspensos......................................................................... 158 5.5 Estudo das demandas e do consumo de gua.................................................. 162 5.5.1 Estimativa do consumo de gua na tomaticultura irrigada....... 164

5.5.2. Levantamento das reas das culturas na bacia de Santa Maria/ Cambioc............................................................................................ 166 6 ANLISE DOS RESULTADOS........................................................................... 170 6.1 Anlise do balano hdrico mensal................................................................... 170 6.1.1 Estabelecimento da equao de balano hdrico....................................... 172 6.1.2 Precipitao mensal................................................................................... 173 6.1.3 Evapotranspirao mensal......................................................................... 174 6.1.4 Vazo mdia mensal.................................................................................. 181 6.1.5 Armazenamento na bacia........................................................................... 182 6.2 Disponibilidade hdrica e o consumo de gua na irrigao........................... 186 6.3 Anlise das vazes regionais............................................................................. 188 7 CONCLUSES E SUGESTES PARA TRABALHOS FUTUROS................. 190 8 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS.................................................................. 200 ANEXOS Anexo A - Fichas descritivas das estaes termopluviomtricas......................... 222 Anexo A I - Ficha descritiva da estao termopluviomtrica (C10).................. 222 Anexo A II- Ficha descritiva da estao termopluviomtrica (C11).................. 223 Anexo A III - Ficha descritiva da estao termopluviomtrica (C12)................ 224 Anexo A IV - Ficha descritiva da estao termopluviomtrica (C13)............... 225 Anexo B - Diagrama de instalao dos sensores - Estao SOLAR 2000........... 226 Anexo C - Medio da carga lquida - vertedor Cipoletti.................................... 227 Anexo C I - Tabela para clculo das velocidades - micro molinete................... 227 Anexo C II - Vazes obtidas com micro molinete............................................. 228 Anexo D - Medio da descarga lquida - vertedor afogado............................... 229XVII

Anexo E - Levantamento planialtimtrico no posto fluviomtrico - bacia Santa Maria/Cambioc...................................................................... 230 Anexo F - Algoritmo de programao da estao SOLAR 2000......................... 231 Anexo G - Ficha descritiva de estao fluviomtrica........................................... 232 Anexo H - Cronograma de falhas no monitoramento de nveis d' gua (estao SOLAR 2000)....................................................................... 233

XVIII

1 INTRODUO

1.1 Justificativa e relevncia do tema

Os impactos das aes antrpicas no meio ambiente tm sido evidenciados em diferentes partes do mundo, as questes relacionadas ao aquecimento global vm motivando pesquisas de ordem fsico-ambiental e scio-econmica. Os impactos tambm so evidenciados nas alteraes observadas tanto na disponibilidade hdrica quanto na degradao da qualidade das guas. Recentemente, foi publicado o relatrio Mudana de clima, mudanas de vidas - Como o aquecimento global j afeta o Brasil(Greenpeace Brasil, 2006), que trata das questes do aquecimento global e apresenta cenrios scio-econmicos para o futuro, revelando impactos graves, entre eles a migrao populacional, seja devido a elevao do nvel do mar, seja pelas mudanas de tempo e clima e, pela intensificao de eventos extremos como furaces e grandes tempestades. A presso do crescimento populacional em alguns locais do planeta aumenta a presso nos recursos hdricos e pode contribuir para o agravamento da degradao da qualidade e, conseqentemente, da sade coletiva. Os pases em desenvolvimento, entre eles o Brasil, freqentemente pela falta de polticas pblicas efetivas, j sofrem com a migrao interna com razes profundas nas recorrentes crises scio-econmicas. Este cenrio torna as populaes dos pases em desenvolvimento ainda mais frgeis aos impactos do aquecimento global. As atividades agrcolas tm uma participao significativa no PIB brasileiro. A falta de poltica efetiva para o desenvolvimento sustentvel de regies rurais promove em muitas regies brasileiras o esvaziamento das mesmas e o inchamento dos grandes centros. A populao urbana cresceu 6% no Brasil nos ltimos 10 anos (LIMA et al. 2000). A falta1

de infra-estrutura para recebimento desse contingente leva presso pela ocupao desordenada do solo, o uso da gua, o aumento de efluentes, o agravamento das condies de sade e, conseqentemente, a degradao da qualidade de vida. Polticas para o controle da degradao ambiental e crescimento sustentvel das regies rurais contribuem indiretamente para o controle do crescimento das regies urbanas. Grandes cidades brasileiras, como So Paulo, Recife, Salvador e Rio de Janeiro apresentam grande contingente de pessoas favelizadas, onde as condies de vida so muito precrias. Observa-se tambm no Brasil uma mudana na gesto dos recursos hdricos. A nova legislao introduzida a partir de 1997 incluiu a implementao de novos instrumentos como o plano de recursos hdricos, o sistema de informaes de recursos hdricos, a outorga e a cobrana. Nesse contexto, apesar de vrios esforos implementados recentemente, observa-se ainda uma lacuna nas informaes e dados para a efetiva implementao dos novos instrumentos de gesto. A regio Noroeste do estado do Rio de Janeiro, embora sob caractersticas climticas que levam a uma menor pluviosidade em relao a outras regies do estado, aps vrios ciclos agrcolas, como o da cana, o do caf e o do fumo, apresenta atualmente, sinais graves de degradao ambiental, ocasionando, inclusive restrio hdrica e degradao da qualidade das guas. Com o aparente

desaparecimento/migrao de muitas nascentes, h um aumento da presso no sistema de guas subterrneas e o favorecimento da proliferao de pequenos reservatrios no incio da estiagem como garantia de abastecimento de gua para as atividades agrcolas de inverno. Em decorrncia dessa situao, estabeleceu-se na regio um ciclo de decadncia econmica baseado no binmio pobreza - degradao ambiental. Isso contribui para que a regio, atualmente, apresente os menores ndices de desenvolvimento e maior taxa de indigncia do estado, somente comparveis aos das regies mais pobres do pas. Ainda, observa-se alto nvel de desemprego, analfabetismo e evaso rural. A bacia hidrogrfica do rio So Domingos, afluente do rio Muria, localizada na regio Noroeste abrange principalmente o municpio de So Jos de Ub, um dos que apresenta situao mais crtica na regio. A bacia do rio So Domingos, que tem limites praticamente coincidentes com os do municpio, apresenta rea de 280 km2 e expressa a realidade fundiria da regio, guardando similaridades com outras regies inseridas nas2

zonas montanhosas do Sudeste brasileiro, apresentando grande concentrao de pequenas propriedades rurais. As principais atividades econmicas na bacia so a pecuria leiteira, a olericultura e a monocultura da plantao de tomate. Em 1999, houve um evento de estiagem crtico que atingiu toda a regio e fortemente o municpio de So Jos de Ub. Isso tem motivado desde ento, um olhar especial sobre o municpio e o investimento em vrios projetos de pesquisa, que visam, em ltima anlise, propor polticas pblicas e medidas que promovam o controle da degradao ambiental, recuperao dos nveis de base dos cursos dgua, a revitalizao das nascentes, a melhoria da qualidade de vida da populao e, conseqentemente, a minimizao do xodo rural.

1.2 ObjetivosOs estudos compreendidos no desenvolvimento dessa tese de doutorado esto contextualizados no Projeto de Pesquisa Gesto Participativa da Sub-bacia do Rio So Domingos, RJ1 (GEPARMBH) que teve financiamento da FINEP atravs do Fundo Setorial de Recursos Hdricos e foi realizado no perodo de 2003 a 2005. Os objetivos gerais da tese guardam semelhanas com os objetivos do Projeto GEPARMBH.

1.2.1 Objetivos geraisEntre os objetivos gerais da tese, destacam-se:

1

O projeto incorporou o conhecimento, j parcialmente gerado por projetos em desenvolvimento na regio, como o de "Sistemas pastoris sustentveis utilizando prticas de plantio direto para recuperao de reas degradadas em relevo movimentado do Bioma Mata Atlntica na Regio Noroeste do Estado do Rio de Janeiro (Projeto RADEMA). 3

Contribuir para a gesto sustentvel de bacias hidrogrficas, desenvolvendo aes que visem ampliar o conhecimento e buscar uma conscientizao face aos problemas scio-ambientais ocorridos nas microbacias hidrogrficas

(MBHs), que compem a sub-bacia do rio So Domingos.

Monitorar e avaliar os recursos naturais nas microbacias como subsdio auto-gesto participativa da sub-bacia.

Realizar estudos scio-ambientais complementares ao diagnstico para conservao e minimizao dos impactos.

Iincentivar o planejamento e gesto participativa conservacionista em MBHs, buscando o desenvolvimento rural sustentvel na regio Noroeste.

1.2.2 Objetivos especficos

Monitorar

a

microbacia

experimental/representativa

de

Santa

Maria/Cambioc, objetivando obter os dados pluviomtricos (instalando na regio estaes pluviomtricas e termopluviomtricas) e os dados fluviomtricos (instalando uma estao fluviomtrica).

Estimar a oferta x demanda dos recursos hdricos da regio de estudo, atravs dos dados obtidos no monitoramento e por meio das outras vertentes2 de estudo do projeto GEPARMBH.

O projeto de "Gesto Participativo da Bacia de So Domingos - RJ" objetiva as seguintes Metas Fsicas: (i) realizar estudos scio-ambientais; (ii) desenvolver uma metodologia de classificao fsicohdrica das terras; (iii) estimar balano hdrico das MBHs; (iv) elaborar o plano de manejo sustentvel das micro bacias; (v) implantar modelo de gesto comunitria dos recursos naturais em MBHs; (vi) implantar sistemas de produo conservacionistas nas MBHs; (vii) monitorar parmetros de qualidade de solo e gua; (viii) elaborar um prottipo de mecanismo de compensao financeira para auto-gesto da subbacia; (ix) disseminar os resultados e tecnologias gerados (FNDCT, 2002). 4

2

Caracterizar hidrolgicamente a regio a partir das variveis monitoradas na bacia experimental/representativa de Santa Maria/Cambioc.

Determinar o balano hdrico da microbacia experimental/representativa.

Analisar as disponibilidades hdricas locais e de consumo nas atividades de agricultura irrigada no contexto do planejamento e gesto de recursos hdricos na regio.

Avaliar as vazes de estiagem como suporte aos processos de outorga dos recursos hdricos.

1.3 Metodologia e estrutura de apresentao da tese

A metodologia do projeto de pesquisa se baseou no estudo dos processos fsicoambientais atravs do monitoramento de regio hidrogrfica experimental e representativa, tanto das caractersticas fisiogrficas quanto da organizao social e caractersticas scio-econmicas da regio Noroeste Fluminense, com vistas ao estudo da disponibilidade hdrica a recuperao da degradao ambiental em que se encontra a regio como um todo. Foi implantado na bacia hidrogrfica de Santa Maria/Cambioc, selecionada para os estudos, um posto fluviomtrico localizado logo a jusante da juno dos crregos de Santa Maria e de Cambioc, denominado localmente de Valo Preto. No posto fluviomtrico foram monitorados nveis dgua e concentrao de sedimentos em suspenso. A partir dos nveis dgua e de medies de descarga, obteve-se sries de vazes observadas. Alm do monitoramento fluviomtrico, foi estabelecida tambm a observao da precipitao e da temperatura em trs locais na bacia hidrogrfica. Todos5

os dados foram registrados a cada quinze minutos e considerou-se para esses estudos, o perodo de abril de 2005 a agosto de 2006. Os dados foram analisados e consistidos e, confrontados com sries temporais regionais existentes, em benefcio dos estudos de balano hdrico a partir da equao de conservao de massa, realizado para intervalos mensais. Os valores das taxas evaporimtricas foram determinados a partir das temperaturas pelo mtodo de Thornthwaite. Estes valores foram confrontados com estimativas pelo mtodo combinado de Penman para o posto climatolgico de Miracema (distante 50 km do local em estudo). Foram tambm, analisados os consumos humano e nas atividades de irrigao face disponibilidade hdrica atual. Adicionalmente, foi desenvolvido, baseado em outros estudos da literatura, cenrio no sentido de especular sobre as vazes e armazenamento na bacia, caso no fossem realizados consumos para a agricultura irrigada, tanto de inverno, como de vero.

Para a bacia de Santa Maria /Cambioc foram feitas, ainda estimativas do valor de Q7 (mdia mnima de durao de 7 dias) para o ano de 2005 e 2006. Esses valores foram, ento analisados face ao valor estimado adotando o estudo de regionalizao de vazes da bacia do rio Paraba do Sul, desenvolvida pela CPRM.

A tese foi dividida em sete captulos:

Captulo 2 - faz-se uma caracterizao das bacias rurais, onde relatada a realidade presente nas reas consideradas rurais e analisa-se os impactos das atividades antrpicas que acontecem, principalmente, pelo fato dos agricultores utilizarem, de forma incorreta, os agrotxicos, acarretando a perda do solo e a contaminao dos recursos hdricos. Apresenta-se algumas solues para reduzir e/ou minimizar os

impactos nas cabeceiras das bacias, que so responsveis pela formao das nascentes e conseqente drenagem dos crregos e riachos. Enfatiza-se que a agricultura irrigada desvia uma quantidade excessiva de gua para satisfazer as necessidades humanas. Mostra como est acontecendo a gesto participativa.

Captulo 3 - trata do balano hdrico apontando os seus fundamentos e detalhando o ciclo hidrolgico, demonstra as equaes de balano hdrico, citando suas6

metodologias e aborda a demanda em bacias rurais que de grande relevncia para o estudo apresentado.

Captulo 4 - busca-se caracterizar a rea de estudo, detalhando sobre: a regio Noroeste Fluminense, a bacia hidrogrfica do Rio So Domingos, localizada no municpio de So Jos de Ub e a microbacia experimental/ e representativa de Santa Maria/Cambioc. Destaca-se ainda, as estratgias seguidas para a escolha da rea de estudo, os critrios para a sua seleo, bem como a sua localizao em relao ao municpio e suas caractersticas fisiogrficas.

Captulo 5 - trata do monitoramento scio-ambiental, analisando os indicadores scio-econmicos e a consistncia dos dados hidroclimticos e fluviomtricos. Procura tambm verificar os monitoramentos: - Hidroclimtico: Obteno dos dados de precipitao e de temperatura., comparao dos mesmos, com dados de outros postos existentes na regio Noroeste Fluminense, anlises dos perodos chuvosos e dos perodos secos, obteno dos dados de temperaturas, anlises das temperaturas mdias e horrios de ocorrncia de mxima e mnimas. - Hidro-sedimentolgico: dados de nveis dgua, com os quais foram estimadas as vazes mdias mensais e os dados de slidos em suspenso. - Demandas de irrigao: dados de culturas desenvolvidas na microbacia nos perodos do inverno e do vero. Apresenta todo detalhamento utilizado no monitoramento, na operao dos postos pluviomtricos e termopluviomtricos e na estao fluviomtrica, bem como os equipamentos utilizados.

Captulo 6 - apresenta-se a anlise dos resultados, face aos dados monitorados da precipitao mensal, das taxas de evapotranspirao mensal, das vazes mdias mensais e do armazenamento na bacia, sendo esse ltimo reconstitudo, para a rea em estudo, considerando o consumo de gua utilizado pelas culturas de inverno e vero. Destacase, ainda na anlise para vazes obtidas, o valor de Q7,10 comparado com o valor estimado adotando o estudo de regionalizao de vazes da bacia do Rio Paraba do Sul.

7

Concluso - mostra-se que, o monitoramento hidroclimatolgico aqui estabelecido, com obras hidrulicas do tipo vertedor, para anlise fluviomtrica e postos termopluviomtricos, para anlise de precipitao e temperaturas, representam um procedimento adequado para avaliao das pontencialidades hdricas em regies onde, a carncia de dados, no permite um estudo de viabilidade econmica para o aproveitamento dos recursos hdricos disponveis.

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2 BACIAS RURAIS E GESTO PARTICIPATIVA

2.1 Caracterizao das bacias rurais

Um dos pontos que emergem quando se enfoca a questo do gerenciamento de bacias hidrogrficas a separao entre os espaos urbano e rural. Analisando historicamente, as reas consideradas rurais eram aquelas que se dedicavam essencialmente s atividades agrcolas e pecurias, sendo caracterizadas por uma baixa densidade populacional e uma categoria residual frente ao progresso da urbanizao. Tratava-se de reas opostas ao meio urbano. Em face do crescimento das reas urbanas no Brasil, durante a segunda metade do sculo passado, houve o crescente fenmeno de abandono do campo. Os habitantes se transferiam de regies de menos condies de sustentabilidade econmica para outras, em busca de melhores condies de vidas. O xodo rural assim configurado era acompanhado pela misria de milhes de retirantes e, s vezes, at a morte de milhares por fome, sede e doenas ligadas desnutrio. Para Veiga (2004), a falta de uma poltica de desenvolvimento das zonas rurais, tais como as construes de infra-estrutura bsica estradas, escolas e hospitais , contribuiu para o esvaziamento dessas regies agrcolas que representaram, ao longo do tempo, estado de empobrecimento e de decadncia. A Figura 2.1 mostra os dados do censo demogrfico de 1940, os quais indicam que, naquela poca, cerca de 69% da populao brasileira vivia no campo, contra menos de 19% no censo de 2000.

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Figura 2.1 Transformao demogrfica no Brasil Fonte: Adaptada do Censo Demogrfico (2000)

Entretanto, Marsden (1998) observou nos ltimos anos muitas mudanas importantes no meio rural dos pases desenvolvidos, que deixou de ser exclusivamente agrcola para caracterizar-se por um conjunto de atividades produtivas e de servios das mais diferentes naturezas. Moyano e Paniagua (apud CAMPANHOLA; GRAZIANO, 2000) relatam que essa diviso clara entre rural e urbano deixou de ser importante, pois as relaes de troca se diversificam e o enfoque passa a ser os espaos, o local (territrios), que do o suporte fsico aos fatores socioeconmicos. No Brasil, grandes mudanas tambm tm ocorrido no meio rural devido incorporao de atividades tipicamente urbanas. Ao analisar a crise de desemprego das reas urbanas, que vem se acentuando desde a dcada de 1980, percebe-se que houve maior procura pelo meio rural, no somente para moradia, mas tambm para ocupar postos de trabalho: prestao de servios domsticos, trabalhos por conta prpria, empregos em servios pblicos, professores de 1 grau, pedreiros, balconistas, atendentes, entre outros (GRAZIANO DA SILVA, 1999). Essas novas atividades no agrcolas e outras agrcolas no tradicionais tm representado fonte de renda complementar para muitas famlias rurais que dependiam10

exclusivamente da agricultura, contribuindo para a fixao da populao em reas ou regies que passam a oferecer melhores oportunidades e condies de vida (GROSSI, 1999). Uma das alternativas para superar essas dicotomias tradicionais seja rural ou urbana, agrcola ou no agrcola a classificao de microbacias. Teixeira (2005) relaciona microbacia a uma rea associada realizao de programas de desenvolvimento sustentvel, tendo como beneficirias diretas as comunidades rurais. A microbacia, como unidade geogrfica, consubstanciou tais programas inicialmente idealizados por tcnicos da extenso rural pblica do Estado do Paran, Programa Paran rural, no fim dos anos de 1970, sendo um dos fatores motivadores a dificuldade de se planejar a interveno em bacias hidrogrficas, com toda a sua complexibilidade e infinitas variveis socioeconmicas e ambientais. Assim os programas de microbacias surgiram contrapondo-se ao gigantismo das bacias hidrogrficas. Entre as diversas conceituaes para microbacias, Tito Ryff (apud TEIXEIRA, 2005, p.4) assim as define:

Unidade natural de planejamento agrcola e ambiental adequada implantao de novos padres de desenvolvimento rural, que representa uma etapa no processo de aproximaes sucessivas rumo ao ideal de um desenvolvimento rural sustentvel.

Em face dessa definio, pode-se concluir que as microbacias so reconhecidas como unidades de planejamento, interveno e monitoramento em que se consegue deduzir as variveis ambientais (chuvas, temperaturas, vazes, relevo, etc.) e socioeconmicas, permitindo planejamento e gesto integrada.

2.2 Uso dos recursos hdricos em bacias rurais

O aumento da demanda pelo uso da gua evidenciado ao longo do tempo, sobretudo nas ltimas dcadas, vem causando srios conflitos entre os seus usurios em muitas regies da Terra, fazendo, em muitos casos, com que a gua se torne o fator limitante do desenvolvimento sustentvel.11

Segundo Oliveira e Ferreira (2005), atividade econmica alguma no mundo se desenvolve sem gua. As atividades desenvolvidas em reas rurais, sobretudo a agricultura, esto entre aquelas que mais demandam, em volume, os recursos hdricos. A produo de alimentos mundial responde por 70,2% do consumo de gua que vem dos mananciais. A seguir, os maiores usos so a produo industrial e o abastecimento humano domiciliar. No Brasil, os ndices no so muitos diferentes. De acordo com Christofidis (2005), os dados de 2002 publicados nos Cadernos Setoriais dos Recursos Hdricos pelo Ministrio do Meio Ambiente, em bacias rurais, a agropecuria representa 61% do volume de gua retirado dos mananciais. O abastecimento domstico e a atividade industrial esto na seqncia como maiores usurios, com 21% e 18% respectivamente. Na Figura 2.2, apresentam-se os dados da Agncia Nacional de gua (ANA), de acordo com estudos que regulam o uso da gua no Brasil. Os percentuais que correspondem s vazes efetivamente consumidas por diversas categorias.

Uso Industrial 7% Abastecimento Animal 11%

Abastecimento Rural 2%

Uso Urbano 11%

Irrigao 69%

Figura 2.2 Percentuais de uso da gua Fonte: ANA, 2005

Conforme Gondenfum e Tucci (1998), para esses diferentes tipos de demanda considerados definiu-se, com base em pesquisa junto s companhias estaduais de abastecimento de gua, indstrias usurias, estatsticas oficiais e relatrios de projetos, os seguintes coeficientes para clculo da demanda hdrica:

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a) Abastecimento humano e animal Para o abastecimento humano, so sugeridos coeficientes de demanda de gua diferentes, caso se trate de populao que ocupe os ncleos urbanos ou as reas rurais. Populao urbana: no caso da demanda para atendimento da populao urbana, so propostos coeficientes diferenciados em funo do porte de cada municpio. Populao rural: a literatura tcnica registra que populaes de baixa renda e no habituadas utilizao de gua encanada podem satisfazer-se com dotaes dirias de 50 a 70 l/hab. Desta forma prope-se para o atendimento populao rural um per capita de 70 l/hab x dia. Abastecimento animal: em trabalhos realizados por instituies de pesquisa, servios de extenso rural e entidades de crdito, tem havido um consenso sobre os valores adotados para dotao diria de gua para dessedentao dos rebanhos. Baseados nesses trabalhos, prope-se como coeficiente de demanda o valor de 50 l/cabea x dia. b) Irrigao Com base nos critrios especficos para esse setor, a demanda de gua para irrigao em funo dos dados evaporimtricos e pluviomtricos caractersticos de cada regio e do tipo de cultura. c) Agroindstrias A demanda de gua nas agroindstrias como nos demais casos industriais extremamente varivel segundo a tipologia industrial, sendo difcil estabelecer valores de consumo homogneos. Nesse contexto, caracterizando as bacias rurais, na Tabela 2.1, apresenta-se ainda a determinao da vazo per capita no meio rural, segundo critrios propostos pela ANA (2003), no documento Base de Referncia para o Plano Nacional de Recursos Hdricos.Tabela 2.1 Vazo per capita no meio rural, conforme o estado consideradoESTADOS AL, GO, PI AC, BA, CE, DF, ES, MA, MS, MT, PA, PB, PE, PR, RN, RO, SE, SC, TO AM, AP, MG, RJ, RS, RR, SP VAZO PER CAPITA L/ (HAB.D) 70 100 125

Fonte: ANA, 2003

13

2.2.1 Consumo de gua em bacias rurais: atividade de irrigao

O dado apresentado na figura 2.2, em que a agricultura irrigada brasileira consome cerca de 69% da demanda total de gua, quase sempre associado idia de que esse volume na sua maior parte desperdiado e perdido por evaporao e que, portanto, a irrigao a maior responsvel pelas perdas de gua existentes. Associa-se ento a idia de que a populao pode ser castigada pela escassez da gua. Essas idias so geradas, muitas vezes, pela falta de conhecimento sobre a verdadeira participao da gua na produo das atividades rurais. Segundo Ferreira (1997), a produo de alimentos uma atividade essencial para a existncia humana que demanda efetivamente muita gua. A chuva a sua principal fonte e, na falta desta, a irrigao supre essa necessidade, de forma parcial ou integral, dependendo da regio do pas. Conforme Lima e Leopoldo (1999), para atingir o potencial produtivo, uma planta requer um volume de gua para seu metabolismo que pode ser considerado extremamente alto quando comparado com outros tipos de usurios. Por exemplo, o milho cultivado na poca em que ocorrem normalmente as chuvas (outubro a maro), nas condies climticas mdias do municpio de Campinas (no Estado de So Paulo), pode chegar a consumir, durante todo o ciclo produtivo, um total aproximado de 500mm ou 5.000m3 de gua por hectare. De acordo com os autores, a irrigao no gasta muita gua, no entanto a produo de alimentos que precisa de um volume significativo de gua para se viabilizar. A Figura 2.3 apresenta a quantidade mdia de gua requerida em metros cbicos (m3) para se produzir uma tonelada (t) de diferentes produtos agrcolas, nas condies climticas normais do municpio de Campinas, SP.

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Figura 2.3: Consumo de gua para produzir uma tonelada do produto Fonte: LIMA, 2000

2.2.2 Uso de gua e o aumento da produtividade em bacias ruraisEstudos cientficos demonstram que o estresse causado pela falta de gua reduz sensivelmente a produo vegetal, inviabilizando-a, por exemplo, em regies de clima rido ou semi-rido, onde a falta de gua constante e limita a atividade agrcola. Por outro lado, como conseqncia de uma irrigao realizada no momento certo, utilizando os mtodos corretos, aplicando-se a quantidade certa de gua, tem-se ndices de produtividade acima das mdias das culturas quando cultivadas sob condio de chuva somente (tambm chamados de cultivos de sequeiro). Exemplos de produtividade de algumas culturas brasileiras sob condies de cultivos de irrigao e apenas de chuva so mostrados na Figura 2.4 com o respectivo percentual de aumento de produtividade. Com exceo de poucas culturas, o percentual de aumento da produtividade quase sempre superior a 100% em relao cultura no irrigada (LIMA; LEOPOLDO,1999).

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92%

71%

208%

35%

100% 129% 100% 114%

Figura 2.4 Produtividades mdias de culturas irrigadas e no irrigadas no Brasil Fonte: LIMA; LEOPOLDO, 1999

2.2.3 Reduo do uso dos recursos hdricos em bacias ruraisNa tentativa de buscar sempre um menor custo e reduzir os desperdcios possibilitando assim, maiores retornos, a escolha do mtodo ou sistema mais adequado para uso dos recursos hdricos nas bacias rurais, principalmente na atividade de irrigao, depende de vrios fatores, entre eles o tipo de solo, as culturas a serem manipuladas, a quantidade de gua disponvel etc. Testezlaf (1997) cita a existncia de trs mtodos utilizados no processo de cultura irrigada na bacias rurais:

a) Irrigao por superfcie ou por gravidade

Mtodo bastante utilizado em quase todo o mundo. A gua aplicada sobre o solo e, devido gravidade, escorre penetrando at as razes pela infiltrao. O melhor exemplo desse mtodo a irrigao por sulcos. Esse mtodo fcil de manejar, mas exige a preparao do terreno, como nivelamento, e necessita de bastante gua para irrigar.

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b) Irrigao por asperso

o mtodo mais usado atualmente. Esse tipo de irrigao imita a chuva. Permite o seu emprego em diversas culturas, em diferentes tipos de solos e topografia. Necessita da utilizao de motobombas para gerar presso, tubulaes para conduzir a gua e de aspersores (bicos) para lanar a gua sobre o terreno. Um sistema de asperso muito conhecido o Piv Central. As desvantagens desse mtodo so o vento que atrapalha a distribuio da gua e o aumento no custo com combustvel ou energia eltrica para o bombeamento da gua.

c) Irrigao localizada

A gua aplicada ao p da planta, na regio onde esto as razes. Por utilizar menos gua, geralmente esse mtodo recomendado para regies de escassez de gua, a qual deve ser aproveitada ao mximo. Esse mtodo de irrigao mais utilizado em culturas com alto rendimento na colheita, como a fruticultura, para compensar o elevado custo de instalao. Um exemplo a irrigao por gotejamento, ou seja, a gua aplicada no solo de forma lenta e baixa presso atravs de gotejadores. As vantagens desse mtodo so: gasta pouca gua e energia e permite ainda o uso de fertirrigao, que consiste na aplicao de adubos e fertilizantes junto com a gua de irrigao. Para Paz (2000), com a produo sempre crescente de alimentos, a alternativa est na produo agrcola sob irrigao localizada, que tem possibilitado um nmero maior de safras por ano, principalmente em pases do Hemisfrio Sul. Tendo em vista ser o setor agrcola o maior consumidor de gua e como esta o componente essencial e estratgico do desenvolvimento das reas rurais, o controle e a administrao adequada, buscando atravs de planejamento, o fortalecimento local, juntamente com o manejo mais adequado e os melhores mtodos de irrigao utilizados, possibilitaro a preservao dos recursos naturais, em face dos impactos das atividades antrpicas ocorridas no ambiente rural.

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2.3 Impactos das atividades antrpicasLogo aps o incio de sua colonizao, a economia brasileira era baseada no extrativismo e na monocultura. O primeiro ciclo foi o da cultura da cana-de-acar, iniciado em 1532. O plantio foi seguido de um imenso desmatamento da rea de Mata Atlntica. Todo esse processo s veio a aumentar as variaes climticas (GALLETI, 1998). Atravs dos sculos, a complexidade dos usos da gua pelo homem aumentou, desencadeando degradao e poluio acarretadas pela presso imposta pelo crescimento demogrfico, aumento das reas incorporadas agricultura etc. Um dos primeiros pontos a se destacar quanto aos impactos que a irrigao representa o maior consumo do uso da gua, por isso demanda cuidados e tcnicas especiais para o aproveitamento racional com o mnimo de desperdcio. Quando utilizada de maneira incorreta, alm de causar problemas quantitativos, a irrigao pode afetar a qualidade do solo e dos recursos hdricos superficiais e subterrneos (fertilizantes, agrotxicos, entre outros). Segundo Brown et al. (2000), a crescente demanda de gua para irrigao, aliada ao desperdcio, est ocasionando problemas aos recursos hdricos em muitas partes do mundo. Em alguns casos, o uso indiscriminado da gua tem levado ao secamento de rios, audes, lagos e aqferos subterrneos. Sob o aspecto tcnico e ambiental, preciso alinhar as tcnicas agrcolas em uso no Brasil s necessidades do solo e do clima tropical. Os imigrantes europeus que vieram para o pas no fim do sculo XIX trouxeram tcnicas agrcolas em uso, na poca, nos pases temperados. Estas tcnicas no se adaptaram s condies do Brasil e acabaram causando a degradao crescente dos solos que, dessa forma manejados, para manterem a produtividade, necessitam cada vez mais de insumos caros e danosos ao ambiente. E, mesmo assim, a sua degradao continua avanando. Graziano (1998) relata que milhes de toneladas de defensivos e fertilizantes qumicos so aplicados no campo, a prtica das queimadas adotada, alm do fato de que em muitas reas se realiza o processo de cultivo da monocultura. Essas aes implicam impactos ambientais negativos, tudo isso para fazer o que o solo e o ambiente poderiam fazer por si mesmos, se recebessem o tratamento adequado.

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Para Choncohol (1996), a poluio provocada pela agricultura pode ocorrer de forma pontual ou difusa. A primeira refere-se, por exemplo, contaminao causada pela criao de animais em sistemas de confinamento, nos quais grandes quantidades de dejetos so produzidas e lanadas diretamente no ambiente ou aplicadas nas lavouras. J a poluio difusa causada, principalmente, pelo deflvio superficial, a lixiviao e o fluxo nos macroporos que, por sua vez, esto relacionados com as propriedades do solo, tais como a infiltrao e a porosidade. Assim, solos mais arenosos teriam o processo de lixiviao e fluxo nos macroporos favorecidos. J em situaes em que os solos so manejados de forma incorreta (preparo excessivo do solo associado ao insuficiente aporte de biomassa), podero ocorrer as degradaes de sua estrutura, favorecendo, ento, o deflvio superficial. Por outro lado, em solo bem manejado, que tem uma estrutura formada por agregados estveis e uma boa distribuio de poros, o processo de eroso reduzido (CARVALHO, 1994). Um dos grandes problemas de impactos resultantes das atividades no meio rural devido, tambm, s altas concentraes de fsforo, decorrentes do lanamento indiscriminado de dejetos orgnicos, esgotos sanitrios e agrotxicos. De acordo com estudo apresentado por Aquino et al. (2006) para o rio Banabui, no Cear, quanto ao teor de fsforo presente na gua, verificou-se uma maior concentrao desse elemento nas reas de dessedentao de animais bovinos e pontos de descarga dos efluentes sanitrios, acarretando srios problemas de eutrofizao dos corpos dgua. O crescimento excessivo de algas e plantas reduz a disponibilidade de oxignio dissolvido nas guas, afetando adversamente o ecossistema aqutico e causando, algumas vezes, mortandade de peixes. Alm desses impactos, o aumento dos nveis de nutrientes na gua pode comprometer, inclusive, sua utilizao para o abastecimento domstico nas comunidades rurais, devido s alteraes no seu sabor e odor ou presena de toxinas liberadas pela florao de alguns tipos de algas. Com todas essas implicaes, advindas do uso de nutrientes aos recursos hdricos, necessrio considerar, tambm, a contribuio dos agroqumicos e dos metais pesados. Levando-se em considerao todas essas atividades que so realizadas em uma bacia hidrogrfica rural, conforme Lucas et al. (2003), existe um consenso de que a atividade agropecuria rege uma importante funo na contaminao dos mananciais, sendo uma atividade com alto potencial degradador, e de que a qualidade da gua um19

reflexo do uso e manejo do solo da bacia hidrogrfica. Neste sentido, a seguir, pretendese abordar os principais aspectos nos sistemas agrcolas, citando algumas atividades e os processos de poluio do solo e da gua.

2.3.1 Perda de solo: erosoNas cincias ambientais, define-se eroso como o desgaste e/ou arrastamento da superfcie da terra pela gua corrente, vento, gelo ou outros agentes geolgicos, incluindo processos como o arraste gravitacional (SILVA MAGALHES, 2001). A eroso um processo complexo no qual vrios fatores influenciam, de forma e grau diferenciados, conforme o local de ocorrncia. Entre esses fatores, destacam-se o solo, o embasamento geolgico, o clima, a topografia e a cobertura do solo. A eroso natural ou geolgica o desgaste da superfcie da terra sob condies naturais de meio ambiente em termos de clima e vegetao, sem perturbaes provocadas por aes antrpicas. J a eroso acelerada ou induzida primariamente resultado da influncia das atividades antrpicas, sendo as atividades agrcolas e a pecuria um de seus principais agentes. Em se tratando de bacias caracteristicamente rurais, sem dvida o solo um dos recursos naturais mais importantes e sua capacidade de produo pode ser limitada pela adoo de um manejo inadequado. Assim, para que seja estabelecido um eficiente sistema de manejo, necessrio, entre muitas condies, que haja um conhecimento adequado do fenmeno eroso nos seus aspectos qualitativos e nas suas relaes com vrios fatores, como os que agravam o processo da eroso hdrica: chuva, solo, cobertura vegetal e topografia. Segundo Bertol et al. (2002), desses quatro fatores, as chuvas como fonte de energia tm um papel ativo nos processos de eroso. Wischmeier e Smith (apud MONTENEGRO et al., 2006) verificam que, quando todos esses fatores mencionados, com exceo da chuva, so mantidos constantes, a perda de solo por unidade de rea de um terreno desprotegido de vegetao diretamente proporcional ao produto de duas caractersticas da chuva: a energia cintica (E) multiplicada por sua intensidade mxima em 30 minutos (I30). Esse produto foi denominado de EI30, ndice de erosividade, um fator que, segundo Montenegro et al. (2006), tem sido amplamente utilizado pelos pesquisadores brasileiros, objetivando identific-lo em relao s diferentes regies fisiogrficas. Este ndice o que melhor20

expressa o potencial da chuva em causar eroso, considerando as fases de impacto das gotas da chuva, a desagregao do solo, a turbulncia do escoamento e o transporte das partculas. Montenegro et al. (2006), por exemplo, utilizaram o ndice de erosividade (EI30) da chuva na bacia experimental de Jatob e identificaram os perodos crticos quanto erosividade. Outro ponto relevante a ser considerado referente eroso do solo devido ao escoamento superficial que transporta partculas de solo, nutrientes, matria orgnica, sementes e agrotxicos, causando prejuzos produo agropecuria e a poluio dos recursos hdricos. As perdas de solo decorrentes desses processos tendem a elevar os custos de produo agrcola, aumentando a necessidade do uso de corretivos e fertilizantes. A eroso causa tambm problemas qualidade e disponibilidade de gua, devido poluio e ao assoreamento dos mananciais, favorecendo a ocorrncia de enchentes no perodo chuvoso e aumentando a escassez de gua no perodo de estiagem (STEFANO, 2005). Para Bertoni e Neto (1999), a quantidade de material em suspenso arrastado pela gua depende da velocidade com que ela escoa. Essa velocidade uma resultante do comprimento do lanante e do grau de declividade do terreno. Com base nesse contexto, vrios autores, como Borst e Woodburn (1970), Duley e Hays (1990), Neal (1994), reconhecem que a topografia do terreno, representada pela declividade e pelo comprimento dos lanantes, exerce acentuada influncia sobre a eroso, destaca-se a importncia para o controle desse fenmeno do uso de tcnicas para aumentar a resistncia do solo ou diminuir as foras do processo erosivo. Benatti et al. (1998) afirmam que o esgotamento dos solos pela eroso pode ser controlado. Segundo os autores, as tcnicas utilizadas para evitar ou minimizar o processo erosivo podem ser divididas em: vegetativas, edficas e mecnicas (estruturas artificiais construdas mediante a remoo ou disposio adequada de pores de terra). Ressaltam ainda que as prticas de conservao do solo resolvem apenas parcialmente o problema e que, para melhor soluo, essas prticas devero ser aplicadas simultaneamente, a fim de abranger, com uma maior amplitude possvel, os diversos aspectos do problema. A conservao do solo no se reduz simples aplicao de um nmero de prticas conservacionistas. No item 2.4.3, destaca-se o sistema de manejo do solo, que assegura a obteno dos maiores lucros possveis no sistema agrcola sem diminuir a21

produtividade do terreno (MARQUES; BERTONI, 1990). A eroso tambm causa a reduo na qualidade da cultura (BERTONI; NETO, 1999). Realmente, quando os nutrientes so erodidos do solo, no somente a produo das culturas diminuda como tambm as culturas crescem com baixa qualidade e podem ainda apresentar carncia de alguns elementos nutritivos.

2.3.2 Contaminao dos recursos hdricos pela agriculturaSegundo Legg (apud PINHEIRO et al., 2005), os recursos hdricos so afetados pelas atividades humanas e em especial por suas atividades agrcolas. Uma das maiores conseqncias ambientais da agricultura intensiva pode ser a degradao da qualidade das guas. Para melhor caracterizar os riscos da poluio agrcola aos recursos hdricos em bacias rurais, Toledo e Ferreira (2000) propem agrupar as atividades agrcolas em trs situaes: (i) sistemas agrcolas praticados em ambientes ecologicamente frgeis; (ii) sistemas de agricultura intensiva; (iii) sistemas de produo com criao de animais em confinamento. (i) Sistemas agrcolas praticados em ambientes ecologicamente frgeis: a respeito das reas ecologicamente frgeis em bacias rurais, deve-se considerar que nascentes e margens dos rios so reas de recarga dos aqferos, reas declivosas etc. Isso porque muitas dessas regies so bacias vertentes do complexo sistema formador da drenagem de grandes rios que, por sua vez, fornecero gua para o abastecimento dos centros urbanos. Dessa forma, elas devem ser preservadas, ou ento exploradas por sistemas agroflorestais de baixo impacto ambiental, que preservam a matria orgnica do solo e a manuteno da gua no sistema, atravs da infiltrao da chuva. Sabe-se que a contaminao da gua potencializada quando prticas agrcolas conflitantes so empregadas segundo o potencial de uso das terras, como, por exemplo, os agricultores que cultivam solos em reas declivosas e frgeis. Nestes casos, o processo de eroso hdrica severo e a contaminao dos recursos hdricos ocorre pela grande quantidade de sedimentos que chegam at os corpos de gua. Com a eroso hdrica, tambm a qualidade do solo alterada por meio da perda de carbono e nutrientes e, conseqentemente, a capacidade produtiva dos solos comprometida. Para22

compensar o desequilbrio produtivo, os agricultores aumentam o aporte de agroqumicos (adubos solveis e agrotxicos), tornando crescentes os nveis de degradao do solo e da gua. O deflvio superficial em bacias hidrogrficas com topografia acentuada exploradas por agricultura intensiva (culturas anuais, por exemplo) apresenta grande energia para desagregar o solo exposto e transportar sedimentos para os corpos de gua. Estes sedimentos so capazes de carregar, absorvidos na sua superfcie, tanto nutrientes, como o fsforo e os compostos txicos, conforme os agroqumicos. Isso freqente em sistemas de produo de fumo no Sul do Brasil. (ii) Sistemas de agricultura intensiva: esses sistemas so caracterizados pela utilizao intensiva de tecnologia, que envolve a mecanizao e o alto uso de insumos como fertilizantes, herbicidas e inseticidas. De uma maneira geral, as reas que so utilizadas com agricultura intensiva so de boa aptido agrcola. Assim, o uso inadequado das terras menos freqente e com isso os problemas de poluio das guas causados pela eroso hdrica ocorrem com menos intensidade, quando comparados ao cultivo de reas de baixa aptido agrcola. Nesses sistemas, o problema de eroso pode ocorrer quando o manejo de solos inadequado, devido principalmente ao preparo excessivo do solo e reposio insuficiente de carbono orgnico. Essas duas condies favorecem a degradao fsica do solo, que tem como conseqncia o aumento do deflvio e a conseqente contaminao das guas superficiais devido aos sedimentos, nutrientes solveis e particulados e dos agroqumicos, que se encontram absorvidos aos sedimentos. No entanto, Thompson (1995) diz que se verifica nesses ltimos anos uma mudana na maneira de cultivar o solo, uma vez que o intenso revolvimento vem sendo substitudo pela semeadura direta. Exemplo dessa realidade ocorre nos estados da regio Sul e em algumas regies do Cerrado, onde a semeadura direta tem sido amplamente utilizada, atualmente praticada em 14 milhes de hectares. A semeadura direta, ainda que seja eficiente no controle da eroso hdrica, pode causar problemas de contaminao da gua subterrnea e superficial. No primeiro caso, os mecanismos atuantes so: o fluxo de macroporos e a lixiviao (TOLEDO; FERREIRA, 2000). J a contaminao da gua superficial pode ocorrer devido ao transporte de poluentes solveis pelo escoamento superficial. O deflvio gerado em reas de semeadura direta potencialmente perigoso em situaes nas quais a23

semeadura realizada no sentido do declive e na ausncia de estruturas de controle para o escoamento. A contaminao da gua via fluxo de macroporos ocorre, principalmente, quando as aplicaes de agroqumicos so seguidas de chuvas de grande intensidade. Nessas condies, a gua que infiltra via macroporos apresenta a capacidade de transportar poluentes para a zona saturada. J os problemas de poluio, causados pelo deflvio superficial, esto associados, principalmente, ao transporte de fsforo solvel para os corpos de gua, uma vez que a frao solvel predomina sobre a particulada nos solos submetidos semeadura direta. Com isso, o risco de poluio maior, j que a forma solvel prontamente utilizada pelas algas. (iii) Sistemas de produo com criao de animais em confinamento: outra fonte importante de contaminao das guas refere-se poluio causada pelas atividades de pecuria em sistemas de confinamento, como a suinocultura, a pecuria de leite e a avicultura. Os problemas gerados por essas atividades tendem a crescer no Brasil, devido, principalmente, ao crescimento do consumo interno e da exportao de carne de aves e sunos. Entre as atividades de pecuria, a que representa maior risco contaminao das guas a suinocultura, devido grande produo de efluentes altamente poluentes produzidos e lanados ao solo e nos cursos de gua sem tratamento prvio (VIEIRA, 1995). O problema de poluio causado pela suinocultura concentra-se nos Estados da regio Sul Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paran , uma vez que nesses estados esto quase 70% do rebanho suno do Brasil. O material produzido por sistemas de criao de sunos rico em nitrognio, fsforo e potssio e seu material orgnico apresenta uma alta DBO5. O fsforo e a alta DBO5 so os responsveis pelos grandes impactos ao ecossistema aqutico de superfcie, sendo o primeiro responsvel pelo processo de eutrofizao das guas e a segunda pela reduo do oxignio disponvel. J o nitrognio oferece mais risco de contaminao da gua subterrnea quando lixiviado. A utilizao de dejetos de sunos como fertilizantes orgnicos tambm pode contribuir para a contaminao dos recursos hdricos, caso as quantidades aplicadas sejam superiores capacidade do solo e das plantas de absorverem os nutrientes presentes nesses resduos. Dessa forma, poder haver contaminao das guas superficiais pelo deflvio quando a capacidade de infiltrao da gua no solo for baixa,

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e das guas subterrneas, se a infiltrao da gua no solo for elevada (POTE; HILL, 2001).

2.3.3 O uso de agrotxicosOs agrotxicos so compostos utilizados para destruir, prevenir ou controlar insetos, roedores, plantas, sementes e outras formas de vida. Os agrotxicos podem ser agrupados quimicamente em: inorgnicos, orgnicos naturais e orgnicos sintticos (BULL, 1982). De acordo com o seu objetivo de controle biolgico, os agrotxicos classificam-se ainda em inseticidas (insetos), herbicidas (plantas), algicidas (algas), fungicidas (fungos), nematocidas (vermes) e rodenticidas (roedores). Os herbicidas so a classe de agrotxico com mais larga aplicao, chegando a 84% do consumo total nos Estados Unidos e 78% do volume de agrotxicos consumidos no Brasil. Na dcada de 90, a produo mundial excedeu a dois milhes de toneladas (MILLER, apud BENETTI, 2005). Os agrotxicos sintticos tiveram grande desenvolvimento aps a Segunda Guerra Mundial. Os principais tipos de agrotxicos sintticos so os hidrocarbonetos clorados, os organofosforados, os carbonatos e os s-triazina. Os organofosforados caracterizam-se por possurem fsforo, enxofre e algumas vezes nitrognio em sua estrutura qumica. So usualmente solveis em gua, possuindo um grande potencial de contaminao dos recursos hdricos (SAWYER; MACCART; PARKIN, 2003). A degradao atinge guas superficiais e subterrneas, atravs dos aportes agrcolas (agrotxicos). Assim, dentro do contexto atual da necessidade de desenvolvimento sustentvel, essencial a adoo de uma melhor gesto dos aportes agrcolas visando preservar os recursos hdricos, sejam eles superficiais (rios, lagos, reservatrios) ou subterrneos (aqferos livres ou artesianos). No solo, as substncias so submetidas a diversos processos: a degradao, a reteno no solo at a formao de resduos ligados, o transporte em direo a outros compartimentos ambientais por outros processos fsico-qumicos (volatilizao) ou atravs do vetor gua, pela lixiviao ou escoamento, ou ainda, pelas partculas erodidas do solo (ORTIZ, 2003).

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Visando analisar o transporte de nitrognio e de fsforo sob a forma de nitrato e ortofosfato em microbacias, cujas atividades so essencialmente agrcolas, Pinheiro et al. (2005) desenvolveram um monitoramento em duas mirobacias, a do Ribeiro do Pedro e a do Ribeiro Areado, em Santa Catarina. Atravs de coletas realizadas em diferentes sees fluviomtricas, foi possvel calcular a carga transportada e estabelecer uma correlao entre vazo escoada e a carga de ortofosfato e nitrato. Assim, analisouse o uso do solo em termos de cada bacia a contribuio de carga transportada. importante ressaltar que a Empresa de Pesquisa Agropecuria e Extenso Rural de Santa Catarina EPAGRI realiza, desde 1997, o monitoramento da guas em microbacias rurais. Neto et al. (2006) destacam que a poluio dos rios est relacionada a diversas fontes, desde os efluentes municipais como a carga difusa agrcola. A carga difusa agrcola depende das prticas agrcolas utilizadas na regio de abrangncia do rio e da poca do ano, em funo do perodo de preparo da terra para plantio e aplicao dos agrotxicos. No estado do Cear, por exemplo, o monitoramento da gua de audes nas bacias do Curu e Acara, que so mananciais de abastecimento humano, indica concentraes elevadas de nutrientes, algo que causa preocupao ao poder pblico e s populaes usurias dessas guas. De acordo com estudos realizados por Arajo (2006), o monitoramento trimestral e em vrios pontos dos reservatrios Araras, Edson Queiroz e Jaibaras apresentou estado de eutrofizao nesses corpos dgua em todos os pontos, na maioria do tempo, quando aplicado o ndice de Eutrofizao. Arajo et al. (2006) avaliaram o alto nvel de vulnerabilidade do reservatrio Edson Queiroz ao processo de eutrofizao, considerando fatores de presso relativos ao transporte de sedimentos na sua microbacia, carga de fsforo proveniente das reas ativamente agrcolas. Outro aspecto relevante a ser considerado o uso seguro e eficiente dos agrotxicos por meio dos mtodos de aplicao: polvilhamento, pulverizao, iscas e grnulos. Matuo (1982) aponta diversas causas como responsveis pelo fracasso no uso destes produtos, como falha na seleo ou uso do equipamento, calibrao inadequada, inabilidade para controlar o tamanho e colocao das partculas de pulverizao, faixa de aplicao inadequada, escolha incorreta dos bicos, entre outros. A aplicao incorreta, de acordo com o autor, acarreta diversos problemas, tais como: custo de26

aplicao extremamente alto; desperdcio de produtos caros; intoxicaes; destruio de organismos benficos; danos cultura devido deriva e manuseio errado de produto. O Centro Nacional de Pesquisa de Monitoramento e Avaliao de Impacto Ambiental (CNPMA) da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuria (EMBRAPA) realizou um levantamento de opinio de especialistas sobre os cenrios da agricultura brasileira e os rumos que a pesquisa agropecuria dever desenvolver nos prximos dez anos. De acordo com Lopes (2001), os impactos ambientais da agropecuria podem ser mais ou menos negativos, dependendo do uso de fatores de produo e do modo como esses fatores so usados. Os mais importantes desses impactos negativos da agricultura no Brasil nos prximos dez anos tero sido causados: a) pelo uso inadequado do solo (82% de concordncia); b) pelo uso de agentes qumicos, como agrotxicos, fertilizantes e corretivos (74%); c) pelo desmatamento para fins agrcolas (59%); e d) pelo uso de recursos hdricos (46%). Esses impactos negativos so conseqncias da falta de educao ambiental direcionada para a aplicao equilibrada de insumos, os quais podem ser usados apropriadamente do ponto de vista agronmico e, ainda assim, exceder a capacidade ambiental de assimil-los, desequilibrar o balano ambiental, tornando-se, desse modo, poluentes. O uso da gua pode redundar em problemas semelhantes pela mesma causa.

2.4 Estratgias para reduo dos impactos e recuperao da disponibilidade hdrica

As estratgias para reduo da poluio devido s atividades agrcolas devem ter como meta a diminuio do deflvio superficial e do uso de agroqumicos, bem como o manejo adequado dos efluentes produzidos pelos sistemas de criao de animais em confinamento. As prticas relacionadas com o controle do escoamento superficial so baseadas na melhoria da qualidade da estrutura do solo e, conseqentemente, do sistema poroso. Isso possibilita que as taxas de infiltrao se mantenham elevadas, minimizando o volume escoado superficialmente. Uma vez formado o deflvio superficial, possvel atenuar a sua potncia hidrulica por meio da construo de barreiras fsicas que cortem27

a direo de seu fluxo por meio da implantao de terraos ou cordes vegetados (AMORE, 2004). Segundo Albuquerque (2005), importante tambm estar atento ao manejo da zona ripria a faixa de vegetao prxima aos rios , uma vez que a utilizao dessa zona extremamente importante para reduzir a carga poluente, que introduzida para os corpos de gua atravs do escoamento. Para cumprir essa funo, necessria a manuteno ou recomposio da mata ciliar e o estabelecimento de uma faixa de vegetao densa junto a ela, para servir de filtro dos poluentes transportados pelo deflvio. O manejo dos dejetos provenientes de confinamentos e de efluentes da irrigao torna-se fundamental. De acordo com Silva Magalhes (2001), os novos sistemas devem observar as seguintes premissas: (a) utilizao de recursos, atendendo s taxas permitidas pelo meio; (b) estabelecimento de atividades em reas e em ecossistemas com uma alta capacidade de suporte e (c) que a emisso de efluentes de determinada atividade no ultrapasse a capacidade de assimilao do meio ambiente (sistemas semi-intensivos e extensivos, por exemplo). Algumas tcnicas e equipamentos destacam-se para o tratamento e/ou disposio dos resduos de animais, tais como: biodigestores, esterqueiras e bioesterqueiras, compostagem e vermicompostagem (adubao), reutilizao como rao, lagoas de estabilizao etc. (SILVA; MAGALHES, 2001). Deve-se considerar que a reduo do uso de agrotxicos e o manejo adequado de dejetos de animais constituem prticas tambm essenciais para reduzir os problemas de poluio da gua. No que se refere ao primeiro, preciso direcionar os esforos para resgatar o conhecimento de tecnologias menos intensivas em sua utilizao e mais aplicadas no uso de tcnicas agrnomas e da compreenso das interaes dos ecossistemas agrcolas. Esse conhecimento fundamentado em princpios como a rotao de culturas, o manejo integrado de pragas, o uso de adubos verdes etc. Uma das prticas que tambm pode ser utilizada consiste em aumentar a fertilidade do solo e diminuir a lixiviao pelas guas de percolao. Consiste em corrigir a acidez do solo com a aplicao de clcio. Essa operao conhecida como calagem (BULL, 1982). O papel do clcio proporcionar melhor cobertura vegetal que28

se refletir em uma maior proteo contra impactos de gotas de chuva, diminuindo, portanto, a perda de solo e gua, alm de possibilitar maior infiltrao, resultando no aumento da disponibilidade hdrica no solo. Outro ponto a se destacar, conforme Vianna e Albuquerque (2006), se refere aos conflitos que surgem pelo uso da gua, os quais devem ser analisados individualmente, pois, na maioria das vezes, apresentam particularidades que podem estar relacionadas com a histria de ocupao e dominao poltica e econmica do territrio, com os fatores ambientais e com o tipo de uso dos recursos hdricos de cada regio, dificultando uma anlise generalizada dos conflitos. Cabe ressaltar ainda que o manejo integrado dos recursos hdricos baseia-se na percepo da gua como parte integrante do ecossistema, um recurso natural, bem econmico e social, cujas quantidades e qualidades determinam a natureza de sua utilizao. O manejo integrado dos recursos hdricos, inclusive a integrao de aspectos relacionados terra e gua, deve ser feito em nvel de bacia ou sub-bacia de captao. Segundo Lima e Leopoldo (1999), devem-se traar, implementar e avaliar projetos e programas que sejam economicamente eficientes e socialmente adequados no mbito de estratgias definidas com clareza, baseadas numa abordagem que inclua ampla participao pblica, e das comunidades locais, no estabelecimento de polticas e nas tomadas de deciso do manejo hdrico.

2.4.1 Gesto participativaUm componente importante no fortalecimento do espao local tem sido as exigncias e as preocupaes crescentes com a gesto e conservao dos recursos naturais. Cabe enfatizar, nesse caso, os espaos rurais, devido sua representatividade nos recursos naturais do pas. O Brasil, h mais de uma dcada, vive um sentido de mudana do seu sistema federativo no que se refere ao discurso poltico, apontando para a descentralizao, com o fortalecimento da capacidade decisria das instncias subnacionais (ALMEIDA, 1996). Para Almeida (1996), a descentralizao como transferncia de competncia e atribuies de outras esferas estatais para municpios deve ser feita com concomitante descentralizao na gesto dos recursos. O processo de municipalizao adquiriu29

expresso no pas a partir da constituio de 1988. Esse processo se deu principalmente em decorrncia de uma reforma poltica fiscal, com a instituio do Fundo de Participao dos Municpios (FPM). Os municpios recebem parcelas de recursos do Imposto sobre Circulao de Mercadorias e Prestao de Servios (ICMS), do Imposto Territorial Rural (ITR), do Fundo de Sade, Assistncia Social, Educao e mais recentemente do Programa nacional de fortalecimento da agricultura familiar (PRONAF) um fundo destinado a municpios que submetem propostas de aes aprovadas pelo Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural. Silva (2005) v a descentralizao como uma ferramenta importante para o desenvolvimento rural e para a reduo da pobreza. Os benefcios alcanados pela descentralizao so muitos, destacando-se entre eles, segundo Bava (1996): o aumento do retorno do governo sociedade; a formao de maiores atividades de participao e associativismo; a ampliao do escopo do projeto para alm da agricultura; o reforo do compromisso do governo central com o desenvolvimento rural; a ateno maior aos fatores socioculturais e a adaptao do desenvolvimento s condies locais.

Acredi